Processo nº 0003100-86.2024.8.13.0582
ID: 314965442
Tribunal: TJMG
Órgão: Vara Única da Comarca de Santa Maria do Suaçuí
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0003100-86.2024.8.13.0582
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HELIO GERALDO DA SILVA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Santa Maria Do Suaçuí / Vara Única da Comarca de Santa Maria do Suaçuí Rua Uberaba, 918, Parque das Esmeraldas, San…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Santa Maria Do Suaçuí / Vara Única da Comarca de Santa Maria do Suaçuí Rua Uberaba, 918, Parque das Esmeraldas, Santa Maria Do Suaçuí - MG - CEP: 39780-000 PROCESSO Nº: 0003100-86.2024.8.13.0582 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) ASSUNTO: [Furto Qualificado] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: MATHIAS CARDOSO HAMMER CPF: 176.663.356-01 SENTENÇA I – RELATÓRIO: O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, no exercício de suas atribuições legais, ofereceu denúncia contra MATHIAS CARDOSO HAMMER, devidamente qualificado nos autos, pela suposta prática do delito previsto no art. 155, § 1º e § 4º, inciso I, do Código Penal. Sustentou a acusação que: “(...) Em 13/10/2024, na Rua Vereador José Lopes, n.º 114, Centro, Município de Santa Maria do Suaçuí/MG, o denunciado, consciente e voluntariamente, subtraiu para si, mediante rompimento de obstáculo e durante o repouso noturno, coisa alheia móvel pertencente à vítima, Maurício Pereira Temponi. Segundo foi apurado, o denunciado, durante a noite, adentrou no estabelecimento comercial denominado “Agroveterinaria Temponi”, de propriedade da vítima. Utilizando-se de uma cavadeira de aço, o denunciado arrombou a porta lateral e adentrou no recinto, subtraindo para si a quantia aproximada de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), que estavam dentro de um cofre, além da quantia aproximada de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) em espécie que estavam no balcão. No dia seguinte aos fatos, o proprietário do estabelecimento acionou a Polícia Militar para efetuar o registro da ocorrência, relatando que o denunciado havia desabilitado o sistema de filmagens por volta das 20h45, conforme último dado captado pelo sistema. Constatou-se, ainda, que o autor dos fatos havia danificado 03 (três) gabinetes de computadores, tendo-os abandonado em um terreno vago situado na parte de trás do fundo comercial. Auto de apreensão colacionado à fl. 27. Relatório circunstanciado de investigação juntado às fls. 122/132, informando que o denunciado possui diversas passagens criminais. Laudo constatando a qualificadora do rompimento de obstáculo às fls. 67/69. (…)”. A denúncia foi acompanhada do Inquérito por Portaria nº 16423990. Boletim de ocorrência (ID 10371015263, págs. 5/11). Auto de apreensão (ID 10371015263, pág. 27). Laudo de Constatação de Crime de Dano (ID 10371015263, pág. 54; ID 10371020664, págs. 1/2). Link com imagens do local do crime (ID 10371020664, pág. 8). Link com imagens das câmeras de segurança próximas ao local do crime (ID 10371020664, pág. 10). Laudo de Constatação do Crime de Dano (ID 10371020664, págs. 14/16). Representação da autoridade policial pela expedição de mandado de busca e apreensão na residência do réu, bem como pelo afastamento do sigilo de dados telefônicos, telemáticos e informáticos do celular REDMI, modelo 12 (ID 10371020664, págs. 22/25). Decisão deferindo o pedido de busca e apreensão na residência do réu e afastamento do sigilo de dados telefônicos, telemáticos e informáticos do celular REDMI, modelo 12 (ID 10371469345). Cumprimento do mandado de busca e apreensão (ID 10371020664, págs. 32/41). Relatório circunstanciado de investigação (ID 10371020665, págs. 15/34). Representação da autoridade policial pela prisão preventiva do réu e nova busca e apreensão em sua residência (ID 10371020666, págs. 62/64; ID 10371020667, págs. 1/5). Decisão decretando a prisão preventiva do réu e deferindo nova busca e apreensão em sua residência (ID 10371020667, págs. 6/13). Cumprimento do mandado de prisão e busca e apreensão (ID 10371020667, págs. 19/46). Audiência de custódia realizada em 21/12/2024 (ID 10371020668, pág. 10). CAC do réu em id 10371156946. Recebimento da denúncia em 10/01/2025 (ID 10371321086). Citação regular do réu, que apresentou resposta à acusação por meio de advogado constituído (ID 10379421077; ID 10387411723). A Audiência de Instrução e Julgamento foi realizada em 24/02/2024 (ID 10400063272), ocasião em que foram colhidos: depoimento da vítima; oitiva das testemunhas arroladas pela acusação/defesa: Saulo Alves Souza, Dickson Lima Linhares e Marcos Aparecido Carvalho Aredes; interrogatório do réu. Em alegações finais orais, o Ministério Público sustentou que as provas constantes dos autos demonstram, de forma robusta, tanto a materialidade quanto a autoria delitiva. Argumentou que os requisitos essenciais para a condenação foram plenamente preenchidos, uma vez que a materialidade do delito foi confirmada por meio de documentos, relatórios, inspeções e laudos periciais acostados aos autos. Quanto à autoria, afirmou que esta restou comprovada tanto pela prova testemunhal quanto pelo próprio informante ouvido em juízo, o qual declarou que o objeto apreendido próximo ao local do crime pertencia ao réu. Destacou que as investigações demonstraram que o modus operandi do acusado é compatível com a forma como o delito ocorreu, conforme os depoimentos dos policiais ouvidos em audiência. Ressaltou, ainda, que o próprio réu confessou a prática delitiva, de modo que não restam dúvidas acerca das circunstâncias fáticas que embasaram a denúncia. Diante disso, requereu a condenação do acusado nos termos do artigo 155, §4º, inciso I, do Código Penal, em razão do rompimento de obstáculo, circunstância esta que foi inclusive admitida pelo próprio réu. No que tange à dosimetria da pena, pontuou que, embora o Superior Tribunal de Justiça entenda que o furto praticado no período noturno não é compatível, para fins de majorante, com a qualificadora do §4º, inciso I, tal circunstância deve ser considerada para agravar a pena-base, especialmente no tocante à culpabilidade do réu, nos termos do artigo 59 do Código Penal. Reconheceu, no entanto, que o réu confessou espontaneamente a prática do crime, razão pela qual pugnou pela aplicação da atenuante da confissão na segunda fase da dosimetria da pena. Ressaltou que não há majorantes ou minorantes a serem examinadas na terceira fase. Por fim, mencionou que, embora houvesse indícios da prática do delito de dano, optou por não promover a mutatio libelli, uma vez que a ação penal, nesse caso, exigiria a demonstração de prejuízo considerável à vítima, o que não foi comprovado nos autos. Dessa forma, reiterou o pedido de condenação do acusado nos exatos termos da denúncia. Em alegações finais orais, a Defesa requereu: a) aplicação da pena mínima ao acusado; b) reconhecimento da atenuante da confissão espontânea; c) isenção das custas processuais; fixação de regime mais brando para o cumprimento da pena, em caso de condenação. Após a apresentação das alegações finais, os autos vieram-me conclusos para julgamento. É o relatório. Decido. II – FUNDAMENTAÇÃO: Não há vícios que comprometam a validade deste procedimento processual, tampouco foram arguidas questões preliminares pela Defesa, razão pela qual passo à análise do mérito da demanda penal. A materialidade delitiva restou devidamente comprovada pelos seguintes elementos de prova: a) Boletim de ocorrência (ID 10371015263, págs. 5/11); b) Auto de apreensão (ID 10371015263, pág. 27); c) Laudo de constatação do crime de dano (ID 10371015263, pág. 54; ID 10371020664, págs. 1/2); d) Link contendo imagens do local do crime (ID 10371020664, pág. 8); e) Laudo complementar de constatação do crime de dano (ID 10371020664, págs. 14/16); f) Link com imagens de câmeras de segurança próximas ao local do crime (ID 10371020664, pág. 10); g) Relatório circunstanciado de investigação (ID 10371020665, págs. 15/34). A autoria, por sua vez, encontra-se devidamente comprovada, tanto pelos elementos probatórios acima mencionados quanto pela prova oral colhida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. A vítima, Maurício Pereira Temponi, em seu depoimento prestado em juízo, relatou que, ao chegar à sua loja na segunda-feira pela manhã, percebeu que o padrão de energia elétrica havia sido desligado. Ao inspecionar os fundos do estabelecimento, constatou que o portão lateral fora arrombado, assim como a porta de seu escritório e o cofre. Informou, ainda, que alguns computadores foram subtraídos e posteriormente encontrados em um terreno situado nos fundos da loja. Diante da situação, acionou a Polícia Militar e relatou que havia uma quantia significativa de dinheiro no cofre, sem, contudo, precisar o valor exato naquele momento. Inicialmente, estimou um prejuízo entre R$ 60.000,00 e R$ 70.000,00, montante que não foi recuperado. Destacou que, devido ao desligamento do padrão de energia, as câmeras de segurança não registraram imagens do crime, razão pela qual não conseguiu identificar o autor. Declarou, ainda, que não conhecia o acusado Matias Cardoso Hammer e que apenas tomou ciência de sua suposta autoria após as investigações policiais. Ressalto que a vítima prestou seu depoimento de forma serena, e seu relato está em plena consonância com os demais depoimentos e provas constantes dos autos. Além disso, não há contradições substanciais entre as declarações prestadas na fase policial e aquelas apresentadas em juízo, reforçando a credibilidade de suas afirmações. A testemunha Dickson Lima Linhares, policial militar, ouvida em juízo, afirmou conhecer o réu Matias Cardoso Hammer em razão de seu envolvimento em outras ocorrências policiais. Relatou que o réu já havia sido preso por porte ilegal de arma de fogo em duas ou três ocasiões, além de crimes relacionados a furto, tráfico de drogas e um roubo à mão armada ocorrido recentemente na saída de Santa Maria do Suaçuí para São Sebastião do Maranhão. Ao ser questionado sobre o modus operandi do acusado em furtos, declarou que ele costumava utilizar cavadeiras, barras de ferro ou pedaços de madeira para forçar portas e grades, rompendo cadeados a fim de ter acesso ao interior dos locais. Acrescentou que, em algumas ocorrências, o acusado defecava no interior dos estabelecimentos furtados, especialmente em locais públicos, como postos de saúde e prédios da assistência social do município. O policial confirmou ter comparecido à Agro Veterinária Temponi, local do crime, bem como a um terreno ao lado do estabelecimento. Informou que, no referido terreno, foram encontrados três gabinetes de computador e uma camisa. Durante as diligências, buscou identificar a quem pertencia a peça de roupa, sendo que, posteriormente, no quartel, o pai biológico do acusado, conhecido como "Jamaica", compareceu para registrar uma reclamação contra Matias, alegando que este tentava expulsá-lo de casa. Na ocasião, ao avistar a camisa sobre a mesa, Jamaica espontaneamente reconheceu a peça como sendo do acusado, sem saber que este estava sendo investigado. Acrescentou que, até aquele momento, Matias era apenas suspeito do crime, razão pela qual não haviam sido realizadas diligências em sua residência. Informou, contudo, que outra equipe policial, comandada pelo tenente Wallace e acompanhada pelo soldado Saulo, possivelmente teria ido até o local antes. A testemunha Saulo Alves Souza, policial militar, ouvido em juízo, declarou que participou das diligências relacionadas ao furto ocorrido na Agro Veterinária Temponi. Relatou que a equipe policial recebeu a denúncia do crime, ocorrido na noite de 13 de outubro de 2024, pouco antes da madrugada, e deu início às investigações. Destacou que, ao analisar o caso, identificaram semelhanças com o modus operandi do acusado Matias Cardoso Hammer, além de imagens de câmeras de segurança que registraram um indivíduo com características semelhantes às do acusado saindo de um terreno próximo ao estabelecimento. Relatou que, ao realizarem buscas no terreno ao lado da agro veterinária, encontraram uma camisa, posteriormente reconhecida pelo padrasto do acusado como sendo de sua propriedade. Afirmou que, além disso, Matias costumava adotar a prática de desligar o padrão de energia elétrica dos locais para inutilizar os sistemas de monitoramento, além de arrombá-los, o que também foi constatado nessa ocorrência. Informou que a polícia tentou localizar Matias no dia seguinte ao furto, conversando com o pai da namorada do acusado e com sua avó, em cuja casa ele costumava pernoitar. Ambos afirmaram não tê-lo visto no dia do crime. Posteriormente, receberam denúncia anônima informando que Matias estaria hospedado em um hotel no mesmo bairro. Diante dessa informação, dirigiram-se ao local e confirmaram com a recepcionista que Matias havia se hospedado ali pela primeira vez. Indagado se o acusado apresentou justificativa para estar no hotel, declarou que Matias não forneceu explicações. Ressalto que as testemunhas prestaram seus depoimentos de forma clara, não havendo elementos que comprometam sua credibilidade. Além disso, os relatos foram coerentes e compatíveis com as declarações colhidas na fase policial, merecendo plena confiança. Ademais, o informante Marcos Aparecido Carvalho Aredes, ouvido em juízo, declarou ser pai biológico do réu, embora este tenha sido registrado por outro homem. Confirmou que compareceu ao quartel para relatar os fatos e, ao ser questionado sobre uma camisa, afirmou ter reconhecido de imediato a peça como sendo do acusado. Esclareceu que, no momento em que fez tal afirmação, ainda não sabia o motivo da pergunta e tampouco que estava sendo averiguado o envolvimento de seu filho no crime. Descreveu a camisa como sendo de cor vermelha com argolas e um desenho na parte frontal, sem, no entanto, saber precisar qual era a imagem. Questionado se já havia visto Matias usando a camisa, respondeu afirmativamente, reafirmando que a peça pertencia ao acusado. O réu, interrogado em juízo, confirmou que, na noite de 13 de outubro de 2024, ingressou na Agro Veterinária Temponi, localizada na Rua Vereador José Lopes, nº 114, Centro, em Santa Maria do Suaçuí, e subtraiu valores em espécie que estavam dentro de um cofre e no balcão do estabelecimento. Esclareceu que, apesar de a denúncia indicar um montante de aproximadamente R$ 72.000,00, o valor subtraído foi inferior, estimando que havia entre R$ 20.000,00 e R$ 30.000,00. Declarou que as cédulas eram predominantemente de R$ 100,00, R$ 50,00 e R$ 2,00, e que, no balcão, havia apenas R$ 150,00. Relatou que utilizou o dinheiro para pagar dívidas, adquirir móveis e entorpecentes e custear despesas com transporte para Belo Horizonte, não restando qualquer quantia. Sobre a forma de ingresso no estabelecimento, afirmou ter arrombado a porta dos fundos. Indagado se estava acompanhado, respondeu que agiu sozinho. Confessou que já havia cometido furtos anteriormente, estimando que teria praticado o delito em duas ou três outras ocasiões. No entanto, declarou que, embora já tenha sido preso anteriormente, nunca foi condenado. Perguntado se causou danos ao estabelecimento, admitiu ter danificado a CPU do computador, utilizando uma cavadeira. Justificou sua conduta alegando que acreditava que o equipamento armazenava imagens das câmeras de segurança e, por isso, decidiu destruí-lo. Após a análise da prova documental juntada aos autos, bem como da prova testemunhal e da confissão do réu em juízo, conclui-se que a condenação é medida que se impõe. O crime restou consumado com a inversão do animus possidendi, no momento em que a res furtiva foi retirada do estabelecimento. Além disso, o rompimento e a destruição de obstáculo ficaram suficientemente demonstrados pelos elementos probatórios já mencionados, em especial pelos laudos de constatação do crime de dano. Não há causas excludentes de tipicidade, ilicitude ou culpabilidade, tampouco causas extintivas da punibilidade. Assim, a condenação do réu é medida de rigor. No que se refere à dosimetria da pena, incide a atenuante prevista no art. 65, I, do Código Penal, uma vez que, na data dos fatos (13/10/2024), o réu era menor de 21 anos. A aplicação dessa atenuante será oportunamente analisada. Igualmente, deve ser reconhecida a atenuante da confissão espontânea, nos termos do art. 65, III, "d", do Código Penal, cuja aplicação será avaliada na segunda fase da dosimetria da pena. Não há agravantes, tampouco causas de aumento ou diminuição de pena aplicáveis ao caso concreto. Quanto à majorante prevista no §1º do art. 155 do Código Penal, que prevê o aumento de pena para furtos praticados durante o repouso noturno, o legislador buscou punir com maior rigor aqueles que se aproveitam da menor vigilância e tranquilidade do período noturno para a prática delitiva. Conforme leciona Guilherme de Souza Nucci: "Entende-se por repouso noturno, a fim de dar segurança à interpretação do tipo penal, uma vez que as pessoas podem dar início ao repouso noturno em variados horários, mormente em grandes cidades, o período que medeia entre o início da noite, com o pôr do sol, e o surgimento do dia, com o alvorecer. A vigilância tende a ser naturalmente dificultada quando a luz do dia é substituída pelas luzes artificiais da urbe, de modo que o objetivo do legislador foi justamente agravar a pena daquele que se utiliza desse período para praticar o delito contra o patrimônio." (NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal - Parte Especial - Vol. 2. 6ª edição. Rio de Janeiro: ed Forense, 2022. E-book.) O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado de que não há um horário fixo e predeterminado para caracterizar o repouso noturno, devendo o julgador considerar as circunstâncias do caso concreto. No julgamento dos Recursos Especiais nº 1.979.989/RS e nº 1.979.998/RS, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1144), foram fixadas as seguintes teses: "1. Nos termos do § 1º do art. 155 do Código Penal, se o crime de furto é praticado durante o repouso noturno, a pena será aumentada de um terço. 2. O repouso noturno compreende o período em que a população se recolhe para descansar, devendo o julgador atentar-se às características do caso concreto. 3. A situação de repouso está configurada quando presente a condição de sossego/tranquilidade do período da noite, caso em que, em razão da diminuição ou precariedade de vigilância dos bens, ou, ainda, da menor capacidade de resistência da vítima, facilita-se a concretização do crime. 4. São irrelevantes os fatos das vítimas estarem ou não dormindo no momento do crime, ou o local de sua ocorrência, em estabelecimento comercial, via pública, residência desabitada ou em veículos, bastando que o furto ocorra, obrigatoriamente, à noite e em situação de repouso." (Tema Repetitivo 1144) No caso concreto, não há controvérsia quanto ao fato de que o crime ocorreu em horário de reduzida vigilância, razão pela qual, em tese, seria aplicável a majorante prevista no §1º do art. 155 do Código Penal. Contudo, a referida causa de aumento não incide quando o furto for qualificado nos termos do §4º do dispositivo, conforme entendimento vinculante da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, firmado no julgamento dos Recursos Especiais Representativos de Controvérsia nº 1.888.756/SP, nº 1.890.981/SP e nº 1.891.007/RJ (Tema 1.087): "A causa de aumento prevista no § 1° do art. 155 do Código Penal (prática do crime de furto no período noturno) não incide no crime de furto na sua forma qualificada (§ 4°)" Tal precedente possui força vinculante, nos termos do art. 927, III, do Código de Processo Civil: "Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão (...): III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos". Dessa forma, deve ser afastada a incidência da causa de aumento. No entanto, a circunstância será valorada na primeira fase da dosimetria da pena, em observância ao entendimento jurisprudencial consolidado. Por todo o exposto, reconheço que o réu incorreu nas sanções do art. 155, §4º, inciso I, do Código Penal. DANO MORAL Destaco que a Lei nº 11.719/2008 introduziu, no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, a obrigatoriedade de o Juiz, ao proferir sentença penal condenatória, fixar o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. No presente caso, faz-se necessário destacar que a postulação da verba indenizatória na peça inaugural é imprescindível, uma vez que sua aplicação de ofício conflita com o princípio do contraditório. É essencial que o acusado, desde o início da ação penal, tenha conhecimento pleno de que o processo também visa à reparação civil dos danos causados pela infração penal. Esse direito, intrinsecamente relacionado à ampla defesa, encontra-se preservado nos autos, uma vez que, conforme se observa da denúncia, o Ministério Público expressamente requereu a fixação do montante indenizatório em favor do ofendido (ID 10371015262). Dessa forma, não houve qualquer cerceamento ao direito do réu de impugnar o requerimento acusatório. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou sobre a possibilidade de fixação de indenização por danos morais em crimes patrimoniais, desde que haja pedido expresso e elementos suficientes nos autos para tanto: RECURSO ESPECIAL. ROUBO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. JULGADO PROFERIDO EM HABEAS CORPUS. PARADIGMA. IMPOSSIBILIDADE. MAJORANTE EMPREGO DE ARMA. ART. 157, § 2º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. PARADIGMA EM HABEAS CORPUS. VEDAÇÃO. APREENSÃO E PERÍCIA. POTENCIAL LESIVO. CONSTATAÇÃO. DESNECESSIDADE. REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. ART. 387, INCISO IV, CPP. PEDIDO EXPRESSO. NECESSIDADE. QUANTUM LÍQUIDO E CERTO. NÃO EXIGÊNCIA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO. 1 - (...) 3 - A aplicação do instituto disposto no art. 387, inciso IV, do CPP, referente à reparação de natureza cível, quando da prolação da sentença condenatória, requer a dedução de um pedido expresso do querelante ou do Ministério Público, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa. 4 - Neste caso houve pedido expresso por parte do Ministério Público, na exordial acusatória, o que é suficiente para que o juiz sentenciante fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos causados pela infração. 5 - Assim sendo, não há que se falar em iliquidez do pedido, pois o quantum há que ser avaliado e debatido ao longo do processo, não tendo o Parquet o dever de, na denúncia, apontar valor líquido e certo, o qual será devidamente fixado pelo Juiz sentenciante. 6 - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. (REsp 1265707/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 10/06/2014) - (ementa parcial - grifei). PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO. REPARAÇÃO CIVIL POR DANOS MORAIS. VALOR MÍNIMO FIXADO PELA SENTENÇA CONDENATÓRIA. POSSIBILIDADE. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA. DESNECESSÁRIA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. DEFERIMENTO. 1. Admite-se a fixação de valor mínimo para reparação de danos morais, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, desde que haja pedido expresso do Ministério Público na denúncia. (...) (REsp 1739851/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe 06/11/2018) - (ementa parcial - grifei). Quanto à quantificação do dano, apesar da dificuldade ou impossibilidade de mensurar a dor moral e a humilhação sofridas pelas vítimas, o julgador deverá, à luz das particularidades do caso concreto, considerar diversos fatores, tais como a extensão do sofrimento psíquico suportado e o caráter pedagógico da medida, fixando um valor mínimo com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Além disso, deve-se observar o binômio necessidade/possibilidade, ou seja, para o arbitramento do quantum indenizatório, é imprescindível considerar a situação socioeconômica das partes. Diante da gravidade da conduta atribuída ao acusado, que causou sofrimento psicológico à vítima, decorrente da violação de sua integridade psíquica e patrimonial, e em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, fixo o valor mínimo de um salário-mínimo a título de reparação por danos morais em favor da vítima Maurício Pereira Temponi, sem prejuízo de eventual apuração complementar pelas vias processuais adequadas. III – DISPOSITIVO: Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva deduzida na denúncia para CONDENAR o réu MATIAS CARDOSO HAMMER, qualificado nos autos, pela prática do delito tipificado no art. 155, § 4º, inciso I, do Código Penal. Passo, agora, à dosimetria da pena do réu, nos termos do princípio da individualização da pena, previsto no art. 68 do Código Penal. 1. Da pena base Nos termos do art. 59 do Código Penal, passo à análise das circunstâncias judiciais: a) Culpabilidade: o juízo de reprovação sobre a conduta do acusado não excede o necessário para sua condenação; b) Antecedentes: o acusado não possui registros de antecedentes criminais; c) Conduta social: não há elementos nos autos que indiquem má conduta social por parte do acusado; d) Personalidade: não há nos autos elementos suficientes para aferir traços negativos na personalidade do acusado; e) Motivos: os motivos do crime são inerentes ao tipo penal em questão; f) Circunstâncias: o crime foi praticado durante o repouso noturno, circunstância que será valorada negativamente em desfavor do réu; g) Consequências: normais à espécie delitiva, sem repercussões extraordinárias; h) Comportamento da vítima: em nada contribuiu para a prática do delito. Nesse sentido, considerando a existência de uma circunstância judicial desfavorável ao réu, aplico a fração de 1/8 (um oitavo) do intervalo da pena, fixando a pena-base em 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de reclusão e 53 (cinquenta e três) dias-multa. 1.2. Da pena provisória: Aplico as atenuantes previstas no art. 65, incisos I e III, alínea "d", do Código Penal, observando o entendimento consolidado na Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. Assim, atenuo a pena e fixo a pena provisória em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. 1.3. Da Pena definitiva: Não havendo causas de aumento ou de diminuição de pena, fixo a pena definitiva do acusado em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. O valor de cada dia-multa fica estabelecido em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época do crime. 4. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA Considerando a pena aplicada e a existência de uma circunstância judicial desfavorável ao acusado, FIXO o REGIME SEMIABERTO para o INÍCIO do CUMPRIMENTO da PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE, por entender que se revela necessário à punição e suficiente para a efetiva reprovação e prevenção do delito, nos termos do art. 33, § 2º, "b", c/c § 3º, c/c art. 59 do Código Penal. 5. DETRAÇÃO Eventual detração de pena deverá ser realizada pelo Juízo da Execução de Pena, na forma do art. 66, inc. III, "c", da LEP. Nego ao acusado a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, bem como a suspensão condicional da pena, com fundamento, respectivamente, nos arts. 44, III, e 77, II, do Código Penal. REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA E EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA O réu poderá recorrer em liberdade, uma vez que não estão presentes os requisitos para a manutenção da prisão preventiva, conforme os arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal. Dessa forma, revogo a prisão preventiva do réu. EXPEÇA-SE ALVARÁ DE SOLTURA, COM URGÊNCIA, E CUMPRA-SE, COLOCANDO O RÉU EM LIBERDADE, SALVO SE ESTIVER PRESO POR OUTRO MOTIVO. A autoridade policial ou o agente policial competente deverá consultar o SETARIN. A vítima deverá ser previamente intimada. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO Nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, condeno o réu ao pagamento de 01 (um) salário-mínimo para a vítima Maurício Pereira Temponi. Sobre o valor da condenação: Incidirão juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso(13/10/2024) (Súmula 54 do STJ), até 27/08/2024, além de correção monetária a partir da publicação desta sentença (Súmula 362 do STJ). A partir de 28/08/2024, juros e correção monetária seguirão a taxa SELIC, nos termos do art. 406, § 1º, do Código Civil. IV – PROVIDÊNCIAS FINAIS: Após o trânsito em julgado: a) lance-se o nome do réu no rol dos culpados; b) insiram-se os dados desta condenação no sistema; c) envie-se CDJ ao Instituto de Identificação; d) expeça-se a guia de execução definitiva, instruindo-a com as respectivas peças, consoante prevê o art. 105 da Lei n.º 7.210/84; e) expeça-se guia para o pagamento da pena de multa aplicada; f) comunique-se o TRE para os fins do inciso III do art. 15 da Constituição Federal de 1988; g) tome a Secretaria todas as demais providências pertinentes à execução da pena aplicada; h) havendo bens apreendidos proceda-se conforme o disposto no Provimento-Conjunto n.º 24 do TJMG; i) após, inexistindo requerimentos, arquivem-se estes autos com baixa no sistema. Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais. Intimem-se pessoalmente a vítima, o acusado, o Ministério Público e o(a) Advogado(a) Constituido(a) do réu, desta sentença condenatória. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Santa Maria Do Suaçuí, data da assinatura eletrônica. SUELEN LUCZYNSKI FLORENTINO Juíza de Direito Vara Única da Comarca de Santa Maria do Suaçuí
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