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Processo nº 1019367-47.2024.8.11.0041

ID: 306315113

Tribunal: TJMT Órgão: 5ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1019367-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A.

Ato ordinatório

Advogados:

EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1019367-47.2024.8.11.0041. AUTOR(A): ROSILENE SOUZA ANDRADE REQUERIDO: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGI… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1019367-47.2024.8.11.0041. AUTOR(A): ROSILENE SOUZA ANDRADE REQUERIDO: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. Vistos. Trata-se de ação de revisão de faturas de consumo de energia elétrica cumulada com indenização por danos morais e pedido de tutela de urgência ajuizada por Rosilene Souza Andrade em face de Energisa Mato Grosso Distribuidora de Energia S.A. A parte autora relatou que é consumidora da requerida através da unidade consumidora nº 6/2112258-5, localizada em sua residência no Município de Cuiabá/MT, onde reside com sua família composta por dois adultos e duas crianças. Segundo afirma, sempre manteve o adimplemento regular de suas obrigações contratuais, entretanto, a partir do mês de novembro de 2023, as faturas de energia passaram a registrar consumos de energia elétrica muito superiores à média histórica da residência, gerando cobranças elevadas e incompatíveis com seu padrão de consumo e capacidade financeira. Aduziu que as faturas de novembro/2023, dezembro/2023, janeiro/2024 e abril/2024 apresentaram valores excessivos, sendo imputados consumos de, respectivamente, 771 kWh (R$ 1.213,63), 706 kWh (R$ 1.140,01), 540 kWh (R$ 955,00) e 540 kWh (R$ 650,44), montantes muito acima da média dos seis meses anteriores, que era de 478 kWh. Em razão do acúmulo dos débitos impugnados, o fornecimento de energia elétrica foi suspenso por duas vezes — em dezembro de 2023 e abril de 2024 — sendo restabelecido após intervenção administrativa do Procon. Destacou que, mesmo após a abertura de reclamação administrativa junto ao Procon sob o nº 23110207002008433 (ID 155309373), a requerida limitou-se a afirmar que o consumo registrado estaria correto, deixando de apresentar laudo técnico sobre eventual aferição do medidor. A autora sustentou a inexistência de qualquer alteração na rotina da residência, número de moradores ou aquisição de novos equipamentos que justificasse o aumento do consumo, alegando ausência de falha de sua parte na utilização dos serviços. Argumentou, ainda, sobre a falha na prestação do serviço e a prática abusiva por parte da concessionária, pleiteando, ao final, a revisão das faturas com recálculo do consumo conforme a média habitual de 478 kWh, a abstenção da requerida em suspender o fornecimento de energia elétrica e inscrever seu nome em cadastros restritivos de crédito relativamente aos débitos discutidos, bem como a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais. Formulou pedido de tutela de urgência, com vistas à suspensão imediata de qualquer interrupção no fornecimento do serviço essencial, bem como à sustação de cobranças e da inscrição em cadastros de inadimplentes durante o curso da demanda. A inicial veio instruída com os documentos de identificação, comprovante de renda, histórico de consumo, cópias das faturas impugnadas, reclamação administrativa junto ao Procon e resposta da concessionária (IDs 155308229, 155309373, 155366447 e demais documentos correlatos). Requereu, ainda, os benefícios da justiça gratuita, os quais foram deferidos por este Juízo, conforme decisão lançada sob o ID 155960483. No mesmo ato decisório, o pedido de tutela de urgência foi apreciado e deferido parcialmente, sendo determinada a manutenção do fornecimento de energia elétrica à unidade consumidora da autora, independentemente do inadimplemento das faturas objeto de controvérsia (ID 155960483). Regularmente citada (ID 162595630), a ré apresentou contestação (ID 163357970), em que argumentou, em síntese, inexistir qualquer irregularidade nas medições realizadas, sustentando a regularidade dos lançamentos de consumo e dos valores faturados. Aduziu que não houve falha na prestação do serviço e que inexistem elementos probatórios suficientes a demonstrar qualquer ilicitude de sua parte. Contestou, ainda, a pretensão indenizatória, afirmando que não houve ofensa a direito de personalidade da autora e pugnando pela total improcedência dos pedidos. Em réplica, a parte autora apresentou impugnação à contestação (ID 171077939), reiterando integralmente os termos da inicial, reafirmando a ausência de justificativas técnicas plausíveis para o expressivo aumento de consumo registrado e defendendo a procedência dos pedidos formulados, inclusive com a inversão do ônus da prova em razão da hipossuficiência da parte autora e da incidência da legislação consumerista. É o relatório. A presente demanda trata da revisão de faturas de energia elétrica emitidas pela concessionária ré, com base em alegado aumento abrupto e injustificado do consumo registrado na unidade consumidora da autora, além de pleito indenizatório decorrente da interrupção do fornecimento do serviço em duas ocasiões. Inicialmente, é importante ressaltar que se trata de relação de consumo, nos termos do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), estando a parte autora na condição de destinatária final do serviço prestado, e a ré como fornecedora de serviço público essencial, prestado sob concessão. Dessa forma, são plenamente aplicáveis os princípios e garantias do microssistema consumerista, dentre os quais se destaca o princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, CDC) e a possibilidade de inversão do ônus da prova em favor da parte hipossuficiente (art. 6º, VIII, CDC). No caso em exame, a autora demonstrou ser pessoa de baixa renda, com atividade laboral informal (ID 155368399), fato que, inclusive, justificou o deferimento da gratuidade da justiça (ID 155960483). Aliado a isso, os documentos da inicial indicam de forma verossímil a discrepância entre o padrão de consumo anterior e os valores abruptamente registrados a partir de novembro/2023. A média de consumo da unidade, conforme demonstrado no histórico acostado aos autos (ID 155366442), era de 478 kWh/mês, nos seis meses anteriores à elevação. A partir de novembro de 2023, as faturas passaram a apontar 771 kWh, 706 kWh, 540 kWh e 540 kWh, valores significativamente superiores, sem que haja nos autos qualquer demonstração objetiva de alteração na rotina da residência que justificasse tal elevação. A ré, por sua vez, não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, já que, invertido o ônus com base no art. 6º, VIII, do CDC, caberia a ela demonstrar, de forma técnica e válida, que os registros de consumo decorrem de medição regular, realizada por equipamento aferido e em conformidade com as normas técnicas. O único elemento técnico apresentado nos autos e não pela ré e sim pela autora é um relatório unilateral de inspeção (ID 155309374), produzido pelos próprios técnicos da Energisa, sem qualquer ciência ou acompanhamento da consumidora, tampouco referência à rastreabilidade da metodologia aplicada. Referido procedimento viola a Resolução Normativa ANEEL nº 1000/2021, em especial os artigos 264 a 273, que disciplinam a “Inspeção do Sistema de Medição”. Entre os requisitos obrigatórios estão: · A comunicação prévia e formal ao consumidor (§2º, art. 264); · A garantia de que o consumidor possa acompanhar a inspeção; · A realização do teste por técnico habilitado ou laboratório acreditado pelo INMETRO; · A elaboração de laudo com dados técnicos, metodologia e resultados auditáveis. Nenhum desses parâmetros foi observado no relatório apresentado pela requerida, que se limita a afirmar a ausência de irregularidade de forma genérica. Em outras palavras, o documento é prova unilateral, destituída de credibilidade técnica e insuficiente para afastar a presunção de veracidade das alegações iniciais, mormente diante da ausência de inspeção contraditória. A alegação de que os valores elevados decorreriam de “mudanças climáticas” também não subsiste, por carecer de comprovação pericial, técnica ou estatística aplicável ao caso concreto. Trata-se de argumento genérico, sem relação causal demonstrada com o consumo da unidade em questão. Também não se sustenta a tese de que o aumento de valores se deu por inclusão de parcelas antigas, já que a única negociação de débito anterior à controvérsia foi o parcelamento das faturas de setembro e outubro/2023, no valor de R$ 291,33. Esse parcelamento foi devidamente reconhecido pela autora e não é objeto da presente ação, tendo sido firmado com o intuito de manter-se adimplente e evitar a suspensão do serviço — o que evidencia sua boa-fé contratual. Ou seja, o acréscimo questionado refere-se exclusivamente ao consumo faturado, e não à agregação de débitos pretéritos. O simples cotejo entre a média histórica (478 kWh) e os lançamentos de até 771 kWh evidencia o excesso injustificado, em percentual relevante e sem base técnica que o ampare. Dessa forma, diante da ausência de demonstração técnica da regularidade do sistema de medição, da produção unilateral de prova, da desproporcionalidade dos valores lançados e do comportamento omissivo da ré frente às reclamações administrativas, resta caracterizada a falha na prestação do serviço, com violação aos princípios da boa-fé objetiva, do equilíbrio contratual e do dever de informação (arts. 4º e 6º, CDC). Por consequência, devem ser revistas as faturas impugnadas (novembro/2023, dezembro/2023, janeiro/2024 e abril/2024), com base na média de consumo apurada anteriormente (478 kWh), sendo declarada a inexigibilidade do montante excedente, sem prejuízo da manutenção do parcelamento anterior firmado pela autora (referente aos meses de setembro e outubro de 2023), por não ser objeto de impugnação nestes autos. No tocante ao dano moral, entendo que este também se encontra presente. A autora não apenas buscou solução junto ao Procon (ID 155309373), sem obter resposta efetiva, como também teve o fornecimento de energia elétrica suspenso em duas oportunidades — uma em dezembro/2023 e outra em abril/2024 —, mesmo diante da pendência sobre a legalidade dos valores, inclusive a requerida sequer refuta a alegação. A energia elétrica é bem essencial à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), e sua interrupção, especialmente em contexto de controvérsia legítima e pendente de solução, configura violação ao dever de cuidado, ensejando reparação pelos prejuízos extrapatrimoniais sofridos. O dano moral, nesse contexto, é presumido (in re ipsa), pois decorre diretamente falha na prestação do serviço e suspensão indevida do serviço essencial, bem como do constrangimento que ela gera, conforme entendimento da jurisprudência: “APELANTE: ENERGISA S.A APELADO: PAULO ROBERTO DE MORAES DELGADO JUNIOR EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA DE FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA COM VALOR ACIMA DA MÉDIA MENSAL DE CONSUMO – REGULARIDADE DAS FATURAS NÃO COMPROVADAS – ABUSIVIDADE CONFIGURADA –DETERMINAÇÃO DE REVISÃO DAS FATURAS – POSSIBILIDADE – REITERADAS TENTATIVAS INFRUTÍFERAS PARA SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA (PROCON) – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – VALOR INDENIZATÓRIO – ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS – REDUÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Havendo comprovação que o valor apurado diverge da média registrada na unidade consumidora, sem justificativa para o excesso, é devido o recálculo pela média dos meses antecedentes . 2. Deve ser responsabilizada a concessionária de energia elétrica, pelos prejuízos causados ao consumidor, em virtude da cobrança de fatura com valor acima da média de seu consumo mensal. 2. As reiteradas tentativas infrutíferas do consumidor para solucionar a questão administrativamente, sem dúvida, gera desconforto, aflição e transtornos e, têm a extensão suficiente para configurar a reparação por danos morais . 4. Percebendo-se o descompasso entre o valor indenizatório e a extensão do prejuízo moral experimentado, deve ser feita a adequação jurídica da indenização estabelecida a tal título.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10594100220198110041, Relator.: SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Data de Julgamento: 30/04/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/05/2024) “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - VALOR DE FATURA DESTOANTE DA MÉDIA DE CONSUMO - FATURA CONTESTADA - NÃO COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - REFATURAMENTO - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - DANO MORAL CONFIGURADO - MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Se a fatura impugnada pela consumidora possui valor exorbitante e destoante da média de consumo, e não havendo nos autos elementos hábeis a justificar a cobrança, deve o valor da fatura ser adequado à média apurada. 2. A elevação do consumo de energia elétrica, sem fator que a justifique e em valor exorbitante, enseja a revisão do valor constante da fatura discutida. 3. Apesar de a concessionária ré alegar que a cobrança é devida, não apresenta qualquer documento apto a comprovar suas alegações, se limitando a trazer documentos unilaterais. (...)(N.U 1003672-45.2021.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/01/2023, Publicado no DJE 30/01/2023) Considerando a natureza e a extensão do dano, as duas suspensões efetivadas, a tentativa frustrada de solução extrajudicial e os parâmetros jurisprudenciais desta unidade judiciária, fixo a indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor proporcional à gravidade do dano e adequado ao seu caráter reparatório e pedagógico. Mantém-se, por fim, a tutela de urgência deferida, a qual impediu novo corte do fornecimento de energia, por estar plenamente demonstrado o periculum in mora, aliado à plausibilidade do direito alegado. Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Rosilene Souza Andrade em face de Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A., para: a) declarar a inexigibilidade das cobranças referentes às faturas dos meses de novembro/2023, dezembro/2023, janeiro/2024 e abril/2024, exclusivamente quanto ao valor que exceder a média de consumo de 478 kWh, devendo a concessionária proceder ao refaturamento com base nesta média sem prejuízo da manutenção do parcelamento anterior firmado pela autora (referente aos meses de setembro e outubro de 2023). b) confirmar a tutela de urgência anteriormente deferida, tornando definitiva a proibição de suspensão do fornecimento de energia elétrica da unidade consumidora da autora em razão dos débitos ora reconhecidos como inexigíveis; c) condenar a requerida ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais, com correção monetária pelo INPC desde esta sentença e juros de mora de 1% ao mês desde a citação. As custas e despesas processuais deverão ser suportadas integralmente pela ré, a quem também condeno ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do CPC. Após o trânsito em julgado, intime-se a parte autora para eventual requerimento de cumprimento de sentença. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Sinop/MT, data registrada no sistema. Melissa de Lima Araújo Juíza de Direito Cooperadora do NAE Portaria TJMT/PRES 866/2025

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Processo nº 1001131-47.2024.8.11.0041

ID: 293755517

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001131-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

HELDER MASSAAKI KANAMARU

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001131-47.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Pagamento com Sub-rogação, Seguro, Indenização… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001131-47.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Pagamento com Sub-rogação, Seguro, Indenização por Dano Material, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. - CNPJ: 61.074.175/0001-38 (APELANTE), HELDER MASSAAKI KANAMARU - CPF: 105.425.788-40 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELADO), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO. DANOS ELÉTRICOS EM EQUIPAMENTOS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. EXCLUDENTE DE FORÇA MAIOR. LAUDOS TÉCNICOS SEM VALIDADE PROBATÓRIA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Ação regressiva de ressarcimento ajuizada por seguradora em face de concessionária de energia elétrica, visando ao reembolso de valores pagos a segurados por danos em equipamentos eletrônicos supostamente causados por oscilação na rede elétrica. Sentença de improcedência que se mantém. II. Questão em discussão Há duas questões em discussão: (i) saber se a concessionária de energia deve ser responsabilizada objetivamente pelos danos ocorridos; e (ii) saber se os documentos técnicos apresentados são idôneos para comprovar o nexo de causalidade entre a falha na prestação do serviço e os danos alegados. III. Razões de decidir A responsabilidade civil da concessionária de serviço público é objetiva, conforme previsto no art. 37, § 6º, da CF/1988, aplicando-se a teoria do risco administrativo. Restou comprovado que, no caso de uma das seguradas, os danos decorreram de descarga atmosférica, hipótese de força maior, excludente de responsabilidade. Em relação aos demais segurados, os laudos técnicos apresentados são insuficientes, por não conterem elementos técnicos mínimos ou qualificação profissional dos signatários, o que inviabiliza a comprovação do nexo causal. A ausência de relatório técnico da concessionária, por si só, não induz à responsabilidade, quando a parte autora não cumpre seu ônus probatório. IV. Dispositivo e tese Recurso de apelação conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. A concessionária de energia elétrica responde objetivamente pelos danos causados a terceiros, exceto quando comprovada causa excludente de responsabilidade, como a força maior. 2. Laudos técnicos desprovidos de rigor técnico e qualificação profissional do signatário são inaptos para comprovar o nexo de causalidade necessário ao ressarcimento pleiteado.” R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por Mapfre Seguros Gerais S.A. em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 9ª Vara Cível da Capital, que nos autos da ação regressiva que move contra a Energisa Mato Grosso Distribuidora de Energia S.A, julgou improcedente os pedidos formulados na inicial, condenando a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios arbitrados em 10%, sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Irresignada, a apelante alega que realizou o pagamento de indenizações securitárias em razão de danos materiais causados por oscilação na rede elétrica, sub-rogando-se nos direitos dos segurados nos termos do art. 786 do Código Civil, defendendo que os laudos apresentados pelos segurados e juntados aos autos comprovam a origem elétrica dos danos. Assevera que a distribuidora de energia não apresentou os relatórios técnicos exigidos pelo Módulo 9 do PRODIST da ANEEL para comprovar a inexistência de falhas na rede, sendo-lhe imputada a responsabilidade objetiva, conforme o art. 37, § 6º da Constituição Federal, art. 25 da Lei nº 8.987/95, art. 14 do CDC e a Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010. Diante disso, requer, ao final, a condenação da apelada ao ressarcimento do valor pago pela seguradora (R$ 43.759,47), devidamente corrigido e acrescido de juros, além da condenação ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da condenação. A apelada apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 286504881). É o relatório. Inclua-se na pauta. Cuiabá, 04 de junho de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Mapfre Seguros Gerais S.A. ajuizou ação regressiva contra Energisa Mato Grosso Distribuidora de Energia S.A, aduzindo que em decorrência do contrato firmado com os segurados Adriane Aparecida da Silva ME, Udegar Carlos Truilho, Valerio Ricardo Amorim Silva, Celso Fontes Lozano, Fernanda Marcela da Silva, Everaldo Luiz Endrigo e Todeschini Exportacao e Import, arcou com as despesas referentes à danificação de equipamentos eletrônicos, no montante R$43.759,47 (quarenta e três mil e setecentos e cinquenta e nove reais e quarenta e sete centavos). Após o trâmite processual, o d. magistrado julgou improcedente os pedidos formulados na inicial, condenando a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Irresignada, a apelante alega que realizou o pagamento de indenizações securitárias em razão de danos materiais causados por oscilação na rede elétrica, sub-rogando-se nos direitos dos segurados nos termos do art. 786 do Código Civil, defendendo que os laudos apresentados pelos segurados e juntados aos autos comprovam a origem elétrica dos danos. Assevera que a distribuidora de energia não apresentou os relatórios técnicos exigidos pelo Módulo 9 do PRODIST da ANEEL para comprovar a inexistência de falhas na rede, sendo-lhe imputada a responsabilidade objetiva, conforme o art. 37, § 6º da Constituição Federal, art. 25 da Lei nº 8.987/95, art. 14 do CDC e a Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010. Diante disso, requer, ao final, a condenação da apelada ao ressarcimento do valor pago pela seguradora (R$ 43.759,47), devidamente corrigido e acrescido de juros, além da condenação ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da condenação. Pois bem. Após detida análise dos autos, tenho que a razão não acompanha a apelante. Explico. Incialmente é necessário constar que resta incontroverso que Adriane Aparecida da Silva ME, Udegar Carlos Truilho, Valerio Ricardo Amorim Silva, Celso Fontes Lozano, Fernanda Marcela da Silva, Everaldo Luiz Endrigo e Todeschini Exportacao e Import, são beneficiários de seguros administrados pela seguradora apelante, que abrangem a cobertura de danos elétricos no imóvel. Também resta incontroverso que a seguradora pagou o valor total de R$43.759,47 (quarenta e três mil e setecentos e cinquenta e nove reais e quarenta e sete centavos) aos segurados referente aos danos ocasionados nos aparelhos eletrônicos, sub-rogando em todos os direitos e ações, conforme estatui o art. 786, do CC, sendo aplicável, portanto, a responsabilidade objetiva. Portanto, é irrelevante para o deslinde do feito se a concessionária de energia agiu com ou sem culpa, pois, nesse caso aplica-se a chamada teoria do risco administrativo. Nesse sentido é o entendimento do STJ, confira: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - TRAUMATISMO INTRACRANIANO - ACIDENTE - QUEDA DE OBJETO DA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - CONDUTA OMISSIVA E NEGLIGENTE DA COMPANHIA ENERGÉTICA - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - NEXO CAUSAL EVIDENCIADO - DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO DANO MORAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ. IMPUGNAÇÃO FUNDAMENTOS. SUMULAS Nº 126/STJ E Nº 283/STF...”. (AgInt no Ag em REsp n. 999.188/MT, 3ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 14.03.2017 – negritei) “RESPONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. ELETROCUSSÃO. MORTE DE MENOR. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CÓD. DE PROC. CIVIL. INOCORRÊNCIA. TEORIA DO RISCO OBJETIVO. APLICABILIDADE. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. INADMISSIBILIDADE. DESPESAS DE LUTO E FUNERAL. FATO CERTO. PENSIONAMENTO DOS PAIS. POSSIBILIDADE. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. PRECEDENTES. DANOS MORAIS. VALOR RAZOÁVEL [...] II - A obrigação das empresas concessionárias de serviços públicos de indenizar os danos causados à esfera juridicamente protegida dos particulares, a despeito de ser governada pela teoria do risco administrativo, de modo a dispensar a comprovação da culpa, origina-se da responsabilidade civil contratual. III - Consoante deflui do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, basta ao autor demonstrar a existência do dano para haver a indenização pleiteada, ficando a cargo da ré o ônus de provar a causa excludente alegada, o que, segundo as instâncias ordinárias, não logrou fazer...”.” (REsp n. 506.099/MT, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, j. 10.02.2004 – negritei). Outrossim, tratando-se de responsabilidade civil da empresa ré, também se aplica ao caso o disposto nos arts. 14 e 22, ambos do CDC, verbis: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” “Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.” Contudo, a despeito das ilações da recorrente, verifica-se que o laudo apresentado na inicial, em relação à segurada Adriane Aparecida da Silva ME, ocorreu em decorrência das descargas elétricas provocadas por raios. Dessa forma, o pedido autoral não merece acolhimento, pois, restou demonstrado que o evento ocorrido é de força maior, o qual exclui o nexo de causalidade entre o defeito do serviço e o prejuízo, e, por conseguinte, exclui a responsabilidade civil da concessionária de serviço público. Neste sentido, já julgou esta 3ª Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO DE DANO – SEGURO – DANO ELÉTRICO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA – QUEIMA DE EQUIPAMENTOS CAUSADOS POR DESCARGAS ATMOSFÉRICAS – RAIO – DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA REFORMADA – REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Ainda que a responsabilidade da fornecedora de energia elétrica seja objetiva, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, restou comprovado nos autos a ocorrência de força maior (queda de raio) em 3 (três) dos 4 (quatro) sinistros apontados na exordial, causa excludente de tal responsabilidade. O sinistro que não indicou a ocorrência de evento de força maior concluiu por meio de laudo técnico que não foram encontrados indícios e nem evidências de que tenha ocorrido sobre tensão de origem da rede de concessionária, portanto, para este, também, deve ser excluída a responsabilidade pelo pagamento, pois não há nexo de causalidade.” (Rac n. 1017282-35.2017.8.11.0041, 3ª Câm. de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 11.11.20) A mesma sorte acompanha a pretensão em relação aos demais segurados, isso porque, a apelante pretende comprovar o nexo de causalidade correspondente entre a responsabilidade da concessionária e os danos nos aparelhos, mediante apresentação de laudos desprovidos das qualificações técnicas dos profissionais responsáveis pela análise dos equipamentos danificados. Tenho que o laudo técnico particular é admitido como meio de prova, contudo, o seu valor probatório varia de acordo com as circunstâncias da lide e o seu conteúdo com os demais elementos probatórios. E, a despeito das alegações da apelante, não há vias de reconhecer a obrigação de ressarcimento pela concessionária de energia aos segurados, isso porque, os laudos colacionados são desprovidos de qualquer indicação de qualificação técnica do profissional que os elaboraram, não sendo suficientes para esclarecer se os prejuízos decorreram da suposta oscilação de energia. Como se vê, os referidos documentos atestam os defeitos verificados nos referidos aparelhos de forma superficial e genérica, carecendo do rigor técnico necessário para justificar o ressarcimento pretendido, não sendo possível aferir, ainda, quais técnicas, quesitos e/ou métodos utilizados para alcançar a conclusão indicada. Em outras palavras, o documento é inapto à comprovação da responsabilidade da empresa concessionária pelos danos nos aparelhos. Neste sentido, é o posicionamento desta Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO – DANOS MATERIAIS – SEGURADORA CONTRA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA – DANO ELÉTRICO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – QUEIMA DE EQUIPAMENTOS CAUSADOS POR DESCARGAS ATMOSFÉRICAS – LAUDO TÉCNICO GENÉRICO, INCAPAZ DE TRAZER VEROSSIMILHANÇA EM RELAÇÃO AO NEXO CAUSAL – LAUDO ASSINADO POR TÉCNICO RESPONSÁVEL SEM QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL – DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Ainda que a responsabilidade da fornecedora de energia elétrica seja objetiva, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, restou comprovado nos autos a ocorrência de força maior (descarga atmosférica), o que afasta a responsabilidade quanto ao dever de indenizar. O laudo técnico juntado pela autora/seguradora que não é suficiente para demonstrar o nexo de causalidade, por ser genérico, unilateral e atestado por técnico sem qualificação profissional, razão pela qual não é capaz de trazer verossimilhança em relação ao nexo causal necessário para autorizar a reparação pretendida”.(Rac n. 1036595-69.2023.8.11.0041, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 12.06.2024). Portanto, sob qualquer ótica que se analise a questão, tenho que a sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, estando desprovido o recurso da apelante, majoro a condenação em honorários advocatícios para 15% (quinze por cento), atendendo ao que dispõe o art. 85, §11, do CPC. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 04 de junho de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 04/06/2025

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Processo nº 1001131-47.2024.8.11.0041

ID: 293755518

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001131-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Acórdão

Advogados:

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001131-47.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Pagamento com Sub-rogação, Seguro, Indenização… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001131-47.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Pagamento com Sub-rogação, Seguro, Indenização por Dano Material, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. - CNPJ: 61.074.175/0001-38 (APELANTE), HELDER MASSAAKI KANAMARU - CPF: 105.425.788-40 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELADO), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO. DANOS ELÉTRICOS EM EQUIPAMENTOS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. EXCLUDENTE DE FORÇA MAIOR. LAUDOS TÉCNICOS SEM VALIDADE PROBATÓRIA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Ação regressiva de ressarcimento ajuizada por seguradora em face de concessionária de energia elétrica, visando ao reembolso de valores pagos a segurados por danos em equipamentos eletrônicos supostamente causados por oscilação na rede elétrica. Sentença de improcedência que se mantém. II. Questão em discussão Há duas questões em discussão: (i) saber se a concessionária de energia deve ser responsabilizada objetivamente pelos danos ocorridos; e (ii) saber se os documentos técnicos apresentados são idôneos para comprovar o nexo de causalidade entre a falha na prestação do serviço e os danos alegados. III. Razões de decidir A responsabilidade civil da concessionária de serviço público é objetiva, conforme previsto no art. 37, § 6º, da CF/1988, aplicando-se a teoria do risco administrativo. Restou comprovado que, no caso de uma das seguradas, os danos decorreram de descarga atmosférica, hipótese de força maior, excludente de responsabilidade. Em relação aos demais segurados, os laudos técnicos apresentados são insuficientes, por não conterem elementos técnicos mínimos ou qualificação profissional dos signatários, o que inviabiliza a comprovação do nexo causal. A ausência de relatório técnico da concessionária, por si só, não induz à responsabilidade, quando a parte autora não cumpre seu ônus probatório. IV. Dispositivo e tese Recurso de apelação conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. A concessionária de energia elétrica responde objetivamente pelos danos causados a terceiros, exceto quando comprovada causa excludente de responsabilidade, como a força maior. 2. Laudos técnicos desprovidos de rigor técnico e qualificação profissional do signatário são inaptos para comprovar o nexo de causalidade necessário ao ressarcimento pleiteado.” R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por Mapfre Seguros Gerais S.A. em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 9ª Vara Cível da Capital, que nos autos da ação regressiva que move contra a Energisa Mato Grosso Distribuidora de Energia S.A, julgou improcedente os pedidos formulados na inicial, condenando a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios arbitrados em 10%, sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Irresignada, a apelante alega que realizou o pagamento de indenizações securitárias em razão de danos materiais causados por oscilação na rede elétrica, sub-rogando-se nos direitos dos segurados nos termos do art. 786 do Código Civil, defendendo que os laudos apresentados pelos segurados e juntados aos autos comprovam a origem elétrica dos danos. Assevera que a distribuidora de energia não apresentou os relatórios técnicos exigidos pelo Módulo 9 do PRODIST da ANEEL para comprovar a inexistência de falhas na rede, sendo-lhe imputada a responsabilidade objetiva, conforme o art. 37, § 6º da Constituição Federal, art. 25 da Lei nº 8.987/95, art. 14 do CDC e a Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010. Diante disso, requer, ao final, a condenação da apelada ao ressarcimento do valor pago pela seguradora (R$ 43.759,47), devidamente corrigido e acrescido de juros, além da condenação ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da condenação. A apelada apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 286504881). É o relatório. Inclua-se na pauta. Cuiabá, 04 de junho de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Mapfre Seguros Gerais S.A. ajuizou ação regressiva contra Energisa Mato Grosso Distribuidora de Energia S.A, aduzindo que em decorrência do contrato firmado com os segurados Adriane Aparecida da Silva ME, Udegar Carlos Truilho, Valerio Ricardo Amorim Silva, Celso Fontes Lozano, Fernanda Marcela da Silva, Everaldo Luiz Endrigo e Todeschini Exportacao e Import, arcou com as despesas referentes à danificação de equipamentos eletrônicos, no montante R$43.759,47 (quarenta e três mil e setecentos e cinquenta e nove reais e quarenta e sete centavos). Após o trâmite processual, o d. magistrado julgou improcedente os pedidos formulados na inicial, condenando a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Irresignada, a apelante alega que realizou o pagamento de indenizações securitárias em razão de danos materiais causados por oscilação na rede elétrica, sub-rogando-se nos direitos dos segurados nos termos do art. 786 do Código Civil, defendendo que os laudos apresentados pelos segurados e juntados aos autos comprovam a origem elétrica dos danos. Assevera que a distribuidora de energia não apresentou os relatórios técnicos exigidos pelo Módulo 9 do PRODIST da ANEEL para comprovar a inexistência de falhas na rede, sendo-lhe imputada a responsabilidade objetiva, conforme o art. 37, § 6º da Constituição Federal, art. 25 da Lei nº 8.987/95, art. 14 do CDC e a Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010. Diante disso, requer, ao final, a condenação da apelada ao ressarcimento do valor pago pela seguradora (R$ 43.759,47), devidamente corrigido e acrescido de juros, além da condenação ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da condenação. Pois bem. Após detida análise dos autos, tenho que a razão não acompanha a apelante. Explico. Incialmente é necessário constar que resta incontroverso que Adriane Aparecida da Silva ME, Udegar Carlos Truilho, Valerio Ricardo Amorim Silva, Celso Fontes Lozano, Fernanda Marcela da Silva, Everaldo Luiz Endrigo e Todeschini Exportacao e Import, são beneficiários de seguros administrados pela seguradora apelante, que abrangem a cobertura de danos elétricos no imóvel. Também resta incontroverso que a seguradora pagou o valor total de R$43.759,47 (quarenta e três mil e setecentos e cinquenta e nove reais e quarenta e sete centavos) aos segurados referente aos danos ocasionados nos aparelhos eletrônicos, sub-rogando em todos os direitos e ações, conforme estatui o art. 786, do CC, sendo aplicável, portanto, a responsabilidade objetiva. Portanto, é irrelevante para o deslinde do feito se a concessionária de energia agiu com ou sem culpa, pois, nesse caso aplica-se a chamada teoria do risco administrativo. Nesse sentido é o entendimento do STJ, confira: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - TRAUMATISMO INTRACRANIANO - ACIDENTE - QUEDA DE OBJETO DA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - CONDUTA OMISSIVA E NEGLIGENTE DA COMPANHIA ENERGÉTICA - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - NEXO CAUSAL EVIDENCIADO - DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO DANO MORAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ. IMPUGNAÇÃO FUNDAMENTOS. SUMULAS Nº 126/STJ E Nº 283/STF...”. (AgInt no Ag em REsp n. 999.188/MT, 3ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 14.03.2017 – negritei) “RESPONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. ELETROCUSSÃO. MORTE DE MENOR. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CÓD. DE PROC. CIVIL. INOCORRÊNCIA. TEORIA DO RISCO OBJETIVO. APLICABILIDADE. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. INADMISSIBILIDADE. DESPESAS DE LUTO E FUNERAL. FATO CERTO. PENSIONAMENTO DOS PAIS. POSSIBILIDADE. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. PRECEDENTES. DANOS MORAIS. VALOR RAZOÁVEL [...] II - A obrigação das empresas concessionárias de serviços públicos de indenizar os danos causados à esfera juridicamente protegida dos particulares, a despeito de ser governada pela teoria do risco administrativo, de modo a dispensar a comprovação da culpa, origina-se da responsabilidade civil contratual. III - Consoante deflui do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, basta ao autor demonstrar a existência do dano para haver a indenização pleiteada, ficando a cargo da ré o ônus de provar a causa excludente alegada, o que, segundo as instâncias ordinárias, não logrou fazer...”.” (REsp n. 506.099/MT, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, j. 10.02.2004 – negritei). Outrossim, tratando-se de responsabilidade civil da empresa ré, também se aplica ao caso o disposto nos arts. 14 e 22, ambos do CDC, verbis: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” “Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.” Contudo, a despeito das ilações da recorrente, verifica-se que o laudo apresentado na inicial, em relação à segurada Adriane Aparecida da Silva ME, ocorreu em decorrência das descargas elétricas provocadas por raios. Dessa forma, o pedido autoral não merece acolhimento, pois, restou demonstrado que o evento ocorrido é de força maior, o qual exclui o nexo de causalidade entre o defeito do serviço e o prejuízo, e, por conseguinte, exclui a responsabilidade civil da concessionária de serviço público. Neste sentido, já julgou esta 3ª Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO DE DANO – SEGURO – DANO ELÉTRICO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA – QUEIMA DE EQUIPAMENTOS CAUSADOS POR DESCARGAS ATMOSFÉRICAS – RAIO – DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA REFORMADA – REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Ainda que a responsabilidade da fornecedora de energia elétrica seja objetiva, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, restou comprovado nos autos a ocorrência de força maior (queda de raio) em 3 (três) dos 4 (quatro) sinistros apontados na exordial, causa excludente de tal responsabilidade. O sinistro que não indicou a ocorrência de evento de força maior concluiu por meio de laudo técnico que não foram encontrados indícios e nem evidências de que tenha ocorrido sobre tensão de origem da rede de concessionária, portanto, para este, também, deve ser excluída a responsabilidade pelo pagamento, pois não há nexo de causalidade.” (Rac n. 1017282-35.2017.8.11.0041, 3ª Câm. de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 11.11.20) A mesma sorte acompanha a pretensão em relação aos demais segurados, isso porque, a apelante pretende comprovar o nexo de causalidade correspondente entre a responsabilidade da concessionária e os danos nos aparelhos, mediante apresentação de laudos desprovidos das qualificações técnicas dos profissionais responsáveis pela análise dos equipamentos danificados. Tenho que o laudo técnico particular é admitido como meio de prova, contudo, o seu valor probatório varia de acordo com as circunstâncias da lide e o seu conteúdo com os demais elementos probatórios. E, a despeito das alegações da apelante, não há vias de reconhecer a obrigação de ressarcimento pela concessionária de energia aos segurados, isso porque, os laudos colacionados são desprovidos de qualquer indicação de qualificação técnica do profissional que os elaboraram, não sendo suficientes para esclarecer se os prejuízos decorreram da suposta oscilação de energia. Como se vê, os referidos documentos atestam os defeitos verificados nos referidos aparelhos de forma superficial e genérica, carecendo do rigor técnico necessário para justificar o ressarcimento pretendido, não sendo possível aferir, ainda, quais técnicas, quesitos e/ou métodos utilizados para alcançar a conclusão indicada. Em outras palavras, o documento é inapto à comprovação da responsabilidade da empresa concessionária pelos danos nos aparelhos. Neste sentido, é o posicionamento desta Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO – DANOS MATERIAIS – SEGURADORA CONTRA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA – DANO ELÉTRICO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – QUEIMA DE EQUIPAMENTOS CAUSADOS POR DESCARGAS ATMOSFÉRICAS – LAUDO TÉCNICO GENÉRICO, INCAPAZ DE TRAZER VEROSSIMILHANÇA EM RELAÇÃO AO NEXO CAUSAL – LAUDO ASSINADO POR TÉCNICO RESPONSÁVEL SEM QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL – DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Ainda que a responsabilidade da fornecedora de energia elétrica seja objetiva, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, restou comprovado nos autos a ocorrência de força maior (descarga atmosférica), o que afasta a responsabilidade quanto ao dever de indenizar. O laudo técnico juntado pela autora/seguradora que não é suficiente para demonstrar o nexo de causalidade, por ser genérico, unilateral e atestado por técnico sem qualificação profissional, razão pela qual não é capaz de trazer verossimilhança em relação ao nexo causal necessário para autorizar a reparação pretendida”.(Rac n. 1036595-69.2023.8.11.0041, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 12.06.2024). Portanto, sob qualquer ótica que se analise a questão, tenho que a sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, estando desprovido o recurso da apelante, majoro a condenação em honorários advocatícios para 15% (quinze por cento), atendendo ao que dispõe o art. 85, §11, do CPC. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 04 de junho de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 04/06/2025

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Processo nº 1003576-30.2025.8.11.0000

ID: 259331172

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1003576-30.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

ARLINDO CESAR FERREIRA DOS SANTOS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MARCIO TADEU SALCEDO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003576-30.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). T… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003576-30.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MARCIO TADEU SALCEDO - CPF: 571.100.771-87 (ADVOGADO), ARLINDO CESAR FERREIRA DOS SANTOS - CPF: 503.124.561-15 (AGRAVANTE), STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 03.502.961/0001-92 (AGRAVADO), ANDRE LUIS FEDELI - CPF: 260.857.338-01 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNANIME. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REQUISITOS PARA CONSTITUIÇÃO EM MORA. COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO DAS PARCELAS EM ATRASO ANTES DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. REVOGAÇÃO DA ORDEM DE BUSCA E APREENSÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.Trata-se de Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu liminar em ação de busca e apreensão, consolidando a posse do bem em favor do credor fiduciário. O recorrente alega que quitou as parcelas indicadas na notificação extrajudicial antes da efetiva constituição em mora, tornando indevida a apreensão do veículo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se a constituição em mora do devedor foi válida para fins de viabilizar a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente; e (ii) analisar se é cabível a condenação da Credora a repetição de indébito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69 estabelece que a mora decorre do simples vencimento do prazo para pagamento e pode ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, sem a exigência de assinatura do próprio destinatário. 4. A Súmula nº 72 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que a comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. 5. No caso concreto, os documentos apresentados demonstram que as parcelas indicadas na notificação extrajudicial foram quitadas antes do Devedor ser notificado e antes da distribuição da ação de busca e apreensão. 6. A jurisprudência do Tribunal reforça que o pagamento da parcela em atraso antes da propositura da ação descaracteriza a mora, tornando indevida a busca e apreensão do bem. 7. O pedido de repetição de indébito não deve ser apreciado neste momento, pois não foi objeto de análise pelo juízo de primeiro grau, devendo ser submetido ao crivo do contraditório. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido para confirmar a liminar, suspendendo a ordem de busca e apreensão e mantendo a restituição do veículo ao agravante. Tese de julgamento: 1. O pagamento das parcelas em atraso antes da constituição válida da mora descaracteriza o inadimplemento e impede a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. 2. A constituição da mora deve observar os requisitos do artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69, sendo inválida a notificação que se refira a débitos pretéritos já quitados. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara, Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por ARLINDO CESAR FERREIRA DOS SANTOS em face da decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá – MT, na Ação de Busca e Apreensão de n. 1051571-47.2024.8.11.0041, ajuizada pela agravada STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. em face da ora Agravante. O Agravante afirma que na origem trata-se de Ação de Busca e Apreensão proposta pela Agravada sob a alegação de que o Recorrente estaria em mora contratual por não ter atendido os termos da Notificação Extrajudicial datada de 29/08/2024, parcelas 29 a 32, vencimento de 28/05/2024 a 28/08/2024, relativas ao veículo Citroen C4 CACTUS SHINE T, Ano 2021/2022, Placa RRI2H75. Aduz que quando da expedição da notificação extrajudicial em 29/08/2024 não estava inadimplente em relação as parcelas 29 a 31, tendo em vista que efetuou a quitação destas em 29/05/2024, 15/07/2024 e 31/07/2024, respectivamente. Aponta que a parcela 32 foi paga na mesma data da expedição da notificação (29/08/2024), sendo que o Recorrente quitou a parcela 33 em 14/10/2024. Argumenta que não se pode acatar a tese de que o Agravante estava constituído em mora, o que impede a manutenção da decisão que concedeu a liminar de busca e apreensão. Pontua ainda que em 31/10/2024, antes da distribuição da ação de origem, efetuou a quitação da parcela 34, conforme comprovante anexado. Sustenta que o Agravado praticou o ato previsto no artigo 940 do Código Civil e 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, devendo ser aplicada a repetição do indébito em desfavor do Recorrido por demanda por dívida já adimplida. Assim, requer a antecipação dos efeitos da tutela para reformar a decisão do Juízo singular, no sentido de descaracterizar a mora contratual do Agravante, com a consequente restituição do veículo apreendido em favor do Recorrente, bem como, a aplicação da repetição do indébito. No mérito, pugna pela confirmação da tutela. O pedido de liminar foi deferido (id. 268331278). E sede de Contrarrazões (id. 274327888) a Agravada sustenta que restou caracterizada a mora contratual, diante do atraso no pagamento das parcelas 29 a 32, além da necessidade do pagamento integral da dívida pendente, conforme o valor informado pela Credora. Pleiteia o desprovimento do Agravo. É o relato do necessário. V O T O R E L A T O R O cerne da controvérsia diz respeito a averiguar se foram observados, a priori, os requisitos para caracterização da mora do Devedor de maneira a viabilizar a ordem de busca e apreensão do bem. Como é cediço, o proprietário fiduciário ou credor pode, desde que comprovada à mora, conforme estabelecido no artigo 3º do Decreto-Lei nº 911/69, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. Para corroborar, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do Enunciado nº 72, já assentou que: "A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”. Ademais, conforme dispõe o artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69, com a redação dada pela Lei nº 13.043/2014: "A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não sendo exigido que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”. Isso significa que a mora decorre do simples vencimento do prazo para pagamento e pode ser comprovada mediante o envio da notificação extrajudicial, desde que devidamente encaminhada ao endereço fornecido pelo devedor no respectivo contrato. No caso concreto, quando se verifica a notificação expedida pela Instituição Financeira juntada na origem (id. 173975543), percebe-se que esta foi expedida em 29/08/2024, constava que as parcelas vencidas eram as de n. 29 a 32, vencimento 28/05/2024 a 28/08/2024, tendo sido a correspondência recebida pelo Devedor em 03/09/2024, vejamos: Entretanto, conforme se observa pelos comprovantes de pagamento acostados pelo Agravante a este recurso, as parcelas 29, 30, 31 e 32 foram adimplidas, ao que tudo indica, antes mesmo do Devedor ser cientificado para purgar a mora, vejamos: A) Parcela 29 – vencimento em 28/05/2024 – paga em 29/05/2024 (id. 267432282); B) Parcela 30 – vencimento em 15/07/2024 – paga em 15/07/2024 (id. 267432295); C) Parcela 31 – vencimento em 28/07/2024 – paga em 31/07/2024 (id. 267433753); D) Parcela 32 – vencimento em 28/08/2024 – paga em 29/08/2024 (id. 267433765). Logo, ao menos por ora, está demonstrado que o Recorrente quitou as parcelas mencionadas pelo Credor antes mesmo do prazo para purga da mora e, pelos elementos que constam no feito, o Agravante aparentemente estava em dia com o pagamento da obrigação quando do ajuizamento da ação de origem, conforme se vê dos comprovantes de id. 267433769 (parcela 33) e id. 267433775 (parcela 34), o que torna indevido o deferimento da busca apreensão pleiteada na origem. Nesse sentido: DECRETO LEI N.º 911/1969. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO E INDEFERIU PEDIDO RECONVINTE DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA. PURGAMENTO DA MORA PELO PAGAMENTO DA PARCELA EM ATRASO ANTES DA DISTRIBUIÇÃO DA AÇÃO. CONDUTA DO BANCO INCOMPATÍVEL COM OS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E LEALDADE. “VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM”. AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO VÁLIDA E REGULAR DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SÚMULA N.º 72 DO STJ. SENTENÇA ANULADA. EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. PEDIDO RECONVINTE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. PROCEDÊNCIA. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedente a Ação de Busca e Apreensão, consolidando a posse do bem em favor do credor fiduciário e indeferindo o pedido de indenização por danos morais postulado em contestação pelo réu. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão preliminar em discussão consiste em saber se a sentença deve ser anulada em razão da ausência de constituição válida de mora, uma vez que foi realizado o pagamento da parcela em atraso antes da propositura da ação. (...). III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A purgação da mora foi comprovada pelo pagamento da parcela em atraso antes da distribuição da ação de busca e apreensão, afastando o pressuposto essencial para o prosseguimento da ação, conforme art. 2º do Decreto-Lei n.º 911/69. 5. A conduta da apelada, de distribuir e manter a ação de busca e apreensão após o recebimento da parcela em atraso, é incompatível com os princípios da boa-fé e lealdade, configurando o "venire contra factum proprium". A apreensão indevida do veículo causou danos morais, justificando a procedência do pedido de indenização, com fixação do valor em R$ 8.000,00, conforme os arts. 186 e 927 do Código Civil. (...). IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido para anular a sentença e extinguir a ação de busca e apreensão sem resolução do mérito, além de condenar a apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais e verbas sucumbenciais. Tese de julgamento: "O pagamento da parcela em atraso, antes da propositura da ação de busca e apreensão, descaracteriza a mora e configura ausência de pressuposto de constituição válida e regular do processo, nos termos do art. 2º, do Decreto-Lei n.º 911/69; arts. 401, I e 1.425, inciso III, última parte, do Código Civil brasileiro; do art. 485, IV, do Código de Processo Civil, e da Súmula n.º 72 do Superior Tribunal de Justiça.” (...). (N.U 1007035-82.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 22/10/2024, Publicado no DJE 24/10/2024). (Destaquei). RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL REFERENTE A DÉBITO PRETÉRITO DEVIDAMENTE PAGO – INVALIDADE DA NOTIFICAÇÃO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Nas ações de busca e apreensão, a caracterização da mora do devedor está delineada no artigo 2º, § 2º, da citada legislação, que dispõe: “A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.” No presente caso, verifico que apesar da notificação extrajudicial ter sido enviada no endereço do contrato, esta se refere a débito pretérito, devidamente pago, portanto, não é considerada válida. (N.U 1021459-24.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/09/2024, Publicado no DJE 01/10/2024). (Destaquei). RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – RECORRENTE QUE DEMONSTROU NOS AUTOS O PAGAMENTO DO INADIMPLIDO – LIMINAR DEFERIDA SOMENTE PARA SUSPENDER O ENCAMINHAMENTO DO CARRO A LEILÃO – AUTOS QUE DEMANDAM CONTRADITÓRIA E AMPLA DEFESA PARA REAL AFERIMENTO DA COMPROVAÇÃO DA MORA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. De fato, a documentação anexa comprova que a referida operação foi realizada no dia 02/08/2023, data de vencimento da parcela em atraso. Além disso, a documentação apresentada pela instituição financeira por ocasião da propositura da Ação de Busca e Apreensão atesta que a parcela do mês subsequente, ou seja, com vencimento em setembro de 2023, já estava quitada na data do ajuizamento da demanda. Assim, ad cautelam, prudente sobrestar em parte os efeitos da liminar deferida pelo Juízo de primeira instância tão somente para obstar eventual alienação do veículo, até que as questões subjacentes sejam melhor esclarecidas à luz do contraditório e ampla defesa, em especial aquelas relativas ao equívoco no pagamento da parcela e tentativa de solução administrativa da contenda, levando-se em consideração o regular recebimento das parcelas subsequentes pela instituição financeira, inclusive de mensalidade vencida antes do ajuizamento da Ação de Busca e Apreensão. (N.U 1028265-12.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/03/2024, Publicado no DJE 11/03/2024). (Destaquei). Dessa maneira, o provimento do recurso é a medida escorreita. Quanto ao pedido de condenação da parte Agravada à repetição de indébito, tal pleito ainda não foi analisado em primeiro grau, demanda o respeito ao contraditório, de modo que se mostra prudente que a questão seja submetida a apreciação pelo Juízo a quo. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto para confirmar a liminar deferida em id. 268331278, suspendendo-se a ordem de busca e apreensão e mantendo a determinação de restituição do veículo ao Agravante. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Processo nº 1003576-30.2025.8.11.0000

ID: 259331181

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1003576-30.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

Acórdão

Advogados:

ANDRE LUIS FEDELI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003576-30.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). T… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003576-30.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MARCIO TADEU SALCEDO - CPF: 571.100.771-87 (ADVOGADO), ARLINDO CESAR FERREIRA DOS SANTOS - CPF: 503.124.561-15 (AGRAVANTE), STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 03.502.961/0001-92 (AGRAVADO), ANDRE LUIS FEDELI - CPF: 260.857.338-01 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNANIME. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REQUISITOS PARA CONSTITUIÇÃO EM MORA. COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO DAS PARCELAS EM ATRASO ANTES DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. REVOGAÇÃO DA ORDEM DE BUSCA E APREENSÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.Trata-se de Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu liminar em ação de busca e apreensão, consolidando a posse do bem em favor do credor fiduciário. O recorrente alega que quitou as parcelas indicadas na notificação extrajudicial antes da efetiva constituição em mora, tornando indevida a apreensão do veículo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se a constituição em mora do devedor foi válida para fins de viabilizar a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente; e (ii) analisar se é cabível a condenação da Credora a repetição de indébito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69 estabelece que a mora decorre do simples vencimento do prazo para pagamento e pode ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, sem a exigência de assinatura do próprio destinatário. 4. A Súmula nº 72 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que a comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. 5. No caso concreto, os documentos apresentados demonstram que as parcelas indicadas na notificação extrajudicial foram quitadas antes do Devedor ser notificado e antes da distribuição da ação de busca e apreensão. 6. A jurisprudência do Tribunal reforça que o pagamento da parcela em atraso antes da propositura da ação descaracteriza a mora, tornando indevida a busca e apreensão do bem. 7. O pedido de repetição de indébito não deve ser apreciado neste momento, pois não foi objeto de análise pelo juízo de primeiro grau, devendo ser submetido ao crivo do contraditório. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido para confirmar a liminar, suspendendo a ordem de busca e apreensão e mantendo a restituição do veículo ao agravante. Tese de julgamento: 1. O pagamento das parcelas em atraso antes da constituição válida da mora descaracteriza o inadimplemento e impede a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. 2. A constituição da mora deve observar os requisitos do artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69, sendo inválida a notificação que se refira a débitos pretéritos já quitados. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara, Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por ARLINDO CESAR FERREIRA DOS SANTOS em face da decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá – MT, na Ação de Busca e Apreensão de n. 1051571-47.2024.8.11.0041, ajuizada pela agravada STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. em face da ora Agravante. O Agravante afirma que na origem trata-se de Ação de Busca e Apreensão proposta pela Agravada sob a alegação de que o Recorrente estaria em mora contratual por não ter atendido os termos da Notificação Extrajudicial datada de 29/08/2024, parcelas 29 a 32, vencimento de 28/05/2024 a 28/08/2024, relativas ao veículo Citroen C4 CACTUS SHINE T, Ano 2021/2022, Placa RRI2H75. Aduz que quando da expedição da notificação extrajudicial em 29/08/2024 não estava inadimplente em relação as parcelas 29 a 31, tendo em vista que efetuou a quitação destas em 29/05/2024, 15/07/2024 e 31/07/2024, respectivamente. Aponta que a parcela 32 foi paga na mesma data da expedição da notificação (29/08/2024), sendo que o Recorrente quitou a parcela 33 em 14/10/2024. Argumenta que não se pode acatar a tese de que o Agravante estava constituído em mora, o que impede a manutenção da decisão que concedeu a liminar de busca e apreensão. Pontua ainda que em 31/10/2024, antes da distribuição da ação de origem, efetuou a quitação da parcela 34, conforme comprovante anexado. Sustenta que o Agravado praticou o ato previsto no artigo 940 do Código Civil e 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, devendo ser aplicada a repetição do indébito em desfavor do Recorrido por demanda por dívida já adimplida. Assim, requer a antecipação dos efeitos da tutela para reformar a decisão do Juízo singular, no sentido de descaracterizar a mora contratual do Agravante, com a consequente restituição do veículo apreendido em favor do Recorrente, bem como, a aplicação da repetição do indébito. No mérito, pugna pela confirmação da tutela. O pedido de liminar foi deferido (id. 268331278). E sede de Contrarrazões (id. 274327888) a Agravada sustenta que restou caracterizada a mora contratual, diante do atraso no pagamento das parcelas 29 a 32, além da necessidade do pagamento integral da dívida pendente, conforme o valor informado pela Credora. Pleiteia o desprovimento do Agravo. É o relato do necessário. V O T O R E L A T O R O cerne da controvérsia diz respeito a averiguar se foram observados, a priori, os requisitos para caracterização da mora do Devedor de maneira a viabilizar a ordem de busca e apreensão do bem. Como é cediço, o proprietário fiduciário ou credor pode, desde que comprovada à mora, conforme estabelecido no artigo 3º do Decreto-Lei nº 911/69, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. Para corroborar, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do Enunciado nº 72, já assentou que: "A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”. Ademais, conforme dispõe o artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69, com a redação dada pela Lei nº 13.043/2014: "A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não sendo exigido que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”. Isso significa que a mora decorre do simples vencimento do prazo para pagamento e pode ser comprovada mediante o envio da notificação extrajudicial, desde que devidamente encaminhada ao endereço fornecido pelo devedor no respectivo contrato. No caso concreto, quando se verifica a notificação expedida pela Instituição Financeira juntada na origem (id. 173975543), percebe-se que esta foi expedida em 29/08/2024, constava que as parcelas vencidas eram as de n. 29 a 32, vencimento 28/05/2024 a 28/08/2024, tendo sido a correspondência recebida pelo Devedor em 03/09/2024, vejamos: Entretanto, conforme se observa pelos comprovantes de pagamento acostados pelo Agravante a este recurso, as parcelas 29, 30, 31 e 32 foram adimplidas, ao que tudo indica, antes mesmo do Devedor ser cientificado para purgar a mora, vejamos: A) Parcela 29 – vencimento em 28/05/2024 – paga em 29/05/2024 (id. 267432282); B) Parcela 30 – vencimento em 15/07/2024 – paga em 15/07/2024 (id. 267432295); C) Parcela 31 – vencimento em 28/07/2024 – paga em 31/07/2024 (id. 267433753); D) Parcela 32 – vencimento em 28/08/2024 – paga em 29/08/2024 (id. 267433765). Logo, ao menos por ora, está demonstrado que o Recorrente quitou as parcelas mencionadas pelo Credor antes mesmo do prazo para purga da mora e, pelos elementos que constam no feito, o Agravante aparentemente estava em dia com o pagamento da obrigação quando do ajuizamento da ação de origem, conforme se vê dos comprovantes de id. 267433769 (parcela 33) e id. 267433775 (parcela 34), o que torna indevido o deferimento da busca apreensão pleiteada na origem. Nesse sentido: DECRETO LEI N.º 911/1969. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO E INDEFERIU PEDIDO RECONVINTE DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA. PURGAMENTO DA MORA PELO PAGAMENTO DA PARCELA EM ATRASO ANTES DA DISTRIBUIÇÃO DA AÇÃO. CONDUTA DO BANCO INCOMPATÍVEL COM OS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E LEALDADE. “VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM”. AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO VÁLIDA E REGULAR DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SÚMULA N.º 72 DO STJ. SENTENÇA ANULADA. EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. PEDIDO RECONVINTE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. PROCEDÊNCIA. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedente a Ação de Busca e Apreensão, consolidando a posse do bem em favor do credor fiduciário e indeferindo o pedido de indenização por danos morais postulado em contestação pelo réu. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão preliminar em discussão consiste em saber se a sentença deve ser anulada em razão da ausência de constituição válida de mora, uma vez que foi realizado o pagamento da parcela em atraso antes da propositura da ação. (...). III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A purgação da mora foi comprovada pelo pagamento da parcela em atraso antes da distribuição da ação de busca e apreensão, afastando o pressuposto essencial para o prosseguimento da ação, conforme art. 2º do Decreto-Lei n.º 911/69. 5. A conduta da apelada, de distribuir e manter a ação de busca e apreensão após o recebimento da parcela em atraso, é incompatível com os princípios da boa-fé e lealdade, configurando o "venire contra factum proprium". A apreensão indevida do veículo causou danos morais, justificando a procedência do pedido de indenização, com fixação do valor em R$ 8.000,00, conforme os arts. 186 e 927 do Código Civil. (...). IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido para anular a sentença e extinguir a ação de busca e apreensão sem resolução do mérito, além de condenar a apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais e verbas sucumbenciais. Tese de julgamento: "O pagamento da parcela em atraso, antes da propositura da ação de busca e apreensão, descaracteriza a mora e configura ausência de pressuposto de constituição válida e regular do processo, nos termos do art. 2º, do Decreto-Lei n.º 911/69; arts. 401, I e 1.425, inciso III, última parte, do Código Civil brasileiro; do art. 485, IV, do Código de Processo Civil, e da Súmula n.º 72 do Superior Tribunal de Justiça.” (...). (N.U 1007035-82.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 22/10/2024, Publicado no DJE 24/10/2024). (Destaquei). RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL REFERENTE A DÉBITO PRETÉRITO DEVIDAMENTE PAGO – INVALIDADE DA NOTIFICAÇÃO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Nas ações de busca e apreensão, a caracterização da mora do devedor está delineada no artigo 2º, § 2º, da citada legislação, que dispõe: “A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.” No presente caso, verifico que apesar da notificação extrajudicial ter sido enviada no endereço do contrato, esta se refere a débito pretérito, devidamente pago, portanto, não é considerada válida. (N.U 1021459-24.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/09/2024, Publicado no DJE 01/10/2024). (Destaquei). RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – RECORRENTE QUE DEMONSTROU NOS AUTOS O PAGAMENTO DO INADIMPLIDO – LIMINAR DEFERIDA SOMENTE PARA SUSPENDER O ENCAMINHAMENTO DO CARRO A LEILÃO – AUTOS QUE DEMANDAM CONTRADITÓRIA E AMPLA DEFESA PARA REAL AFERIMENTO DA COMPROVAÇÃO DA MORA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. De fato, a documentação anexa comprova que a referida operação foi realizada no dia 02/08/2023, data de vencimento da parcela em atraso. Além disso, a documentação apresentada pela instituição financeira por ocasião da propositura da Ação de Busca e Apreensão atesta que a parcela do mês subsequente, ou seja, com vencimento em setembro de 2023, já estava quitada na data do ajuizamento da demanda. Assim, ad cautelam, prudente sobrestar em parte os efeitos da liminar deferida pelo Juízo de primeira instância tão somente para obstar eventual alienação do veículo, até que as questões subjacentes sejam melhor esclarecidas à luz do contraditório e ampla defesa, em especial aquelas relativas ao equívoco no pagamento da parcela e tentativa de solução administrativa da contenda, levando-se em consideração o regular recebimento das parcelas subsequentes pela instituição financeira, inclusive de mensalidade vencida antes do ajuizamento da Ação de Busca e Apreensão. (N.U 1028265-12.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/03/2024, Publicado no DJE 11/03/2024). (Destaquei). Dessa maneira, o provimento do recurso é a medida escorreita. Quanto ao pedido de condenação da parte Agravada à repetição de indébito, tal pleito ainda não foi analisado em primeiro grau, demanda o respeito ao contraditório, de modo que se mostra prudente que a questão seja submetida a apreciação pelo Juízo a quo. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto para confirmar a liminar deferida em id. 268331278, suspendendo-se a ordem de busca e apreensão e mantendo a determinação de restituição do veículo ao Agravante. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Cooperativa De Crédito De Livre Admissão Do Sudoeste Da Amazônia Ltda - Sicoob Credisul e outros x Francisco Gemelli e outros

ID: 256972501

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: IMPUGNAçãO DE CRéDITO Nº Processo: 1079313-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DO SUDOESTE DA AMAZÔNIA LTDA - SICOOB CREDISUL LA ADMINISTRACAO JUDICIAL LTDA

Polo Passivo:

FRANCISCO GEMELLI ROSA MARIA DE ABREU PAULA GEMELLI ROSA MARIA DE ABREU PAULA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO ROSA MARIA DE ABREU PAULA GEMELLI

Sentença

Advogados:

EUCLIDES RIBEIRO DA SILVA JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

EDUARDO HENRIQUE VIEIRA BARROS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RENATO AVELINO DE OLIVEIRA NETO

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

ALLISON GIULIANO FRANCO E SOUSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1079313-47.2024.8.11.0041. IMPUGNANTE: COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DO SUDOESTE DA AMAZÔNIA LTDA - SICOOB… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1079313-47.2024.8.11.0041. IMPUGNANTE: COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DO SUDOESTE DA AMAZÔNIA LTDA - SICOOB CREDISUL IMPUGNADO: FRANCISCO GEMELLI, FRANCISCO GEMELLI, ROSA MARIA DE ABREU PAULA GEMELLI, ROSA MARIA DE ABREU PAULA GEMELLI Trata-se de Impugnação à relação de credores proposta por COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DO SUDOESTE DA AMAZÔNIA LTDA - SICOOB CREDISUL, distribuído por dependência aos autos do processo de recuperação judicial de FRANCISCO GEMELLI, com o intuito de ver reconhecido e incluído seu crédito no quadro de credores da devedora. A impugnante, em manifestação de Id. 178880144, requer, em síntese, o reconhecimento da extraconcursalidade do crédito que lhe é devido, sob o argumento de que as operações realizadas entre a cooperativa e os devedores recuperandos são atos cooperativos típicos, nos termos do artigo 79 da Lei nº 5.764/71, e, por essa razão, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, conforme expressa dicção do artigo 6º, §13º, da Lei nº 11.101/2005, com a redação conferida pela Lei nº 14.112/2020. Inicialmente, a cooperativa havia sido relacionada pelos próprios devedores como credora no montante de R$ 378.861,58, alocado na Classe III – Quirografários. Em manifestação administrativa junto ao Administrador Judicial, a impugnante contestou tal valor e apresentou documentação que comprovaria a existência de créditos bem superiores, no importe de R$ 2.447.552,51, relativos a operações financeiras garantidas por penhor rural e hipoteca. Sustentou, ademais, que tais operações decorreram do vínculo estatutário cooperativo e, portanto, revestem-se da natureza jurídica de atos cooperativos típicos, que, por disposição legal expressa, estão excluídos do concurso de credores no regime recuperacional. No decorrer da tramitação, sobreveio a informação de que parte do crédito da cooperativa, especificamente aquele lastreado na Cédula de Crédito Bancário n.º 174450-0, fora integralmente quitado por avalista, a Sra. Lourdes Regina Gemelli Taparello. Por conseguinte, o Administrador Judicial procedeu à sub-rogação do respectivo crédito, transferindo a titularidade à referida avalista, mantendo o crédito na Classe II – Garantia Real, no valor de R$ 2.334.653,27. Remanesceu, todavia, em nome da cooperativa impugnante, crédito no valor de R$ 327.226,50, referente à Cédula de Crédito Bancário n.º 104256-9. Em decisão administrativa, o Administrador Judicial concluiu que tal operação não foi firmada com finalidade social da cooperativa, tampouco se amolda ao conceito de ato cooperativo nos moldes do artigo 79 da Lei n.º 5.764/71, razão pela qual deveria permanecer sujeita aos efeitos da recuperação judicial. Contudo, reconheceu-se a existência de garantia real, promovendo a reclassificação do crédito para a Classe II – Garantia Real, no valor atualizado informado. Em sequência, os devedores, regularmente intimados, apresentaram contestação, através de Id. 181878783, pugnando pela manutenção da habilitação do crédito na recuperação judicial, em consonância com a decisão do Administrador Judicial. Alegam que, não obstante a condição formal de cooperado dos devedores, a operação realizada — consubstanciada em Cédula de Crédito Bancário — constitui, em sua essência, operação típica de mercado, dotada de remuneração, prazos de vencimento, incidência de encargos e destinação financeira desvinculada de qualquer elemento mutualista. Defendem, com apoio na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que a qualificação do crédito como extraconcursal não decorre da mera natureza jurídica do credor (cooperativa), mas da análise substancial da operação contratada. Deste modo, sustentam que o ato negocial realizado pela SICOOB CREDISUL configura verdadeira operação bancária com características típicas de mercado, o que afasta a aplicação da exceção legal prevista no artigo 6º, §13º da Lei nº 11.101/2005. Concluíram requerendo o indeferimento da impugnação e a integral manutenção do crédito no quadro de credores sujeitos à recuperação judicial, especialmente diante da análise detalhada e técnica já realizada pela administração judicial. Posteriormente, os autos foram encaminhados ao CEJUSC para a realização de audiência de conciliação, conforme se depreende do documento de Id. 184270748. Na sequência, o Administrador Judicial foi intimado por duas vezes, conforme se observa nos documentos de Ids. 184277302 e 185575396, a se manifestar, porém quedou-se inerte. Vieram os autos conclusos para decisão. É o relatório. Decido. O objeto da presente IMPUGNAÇÃO À RELAÇÃO DE CREDORES apresentado é a exclusão do crédito listado na lista de credores da classe garantia real, por se tratar de créditos que decorrem de contratos cooperativos típicos, alinhados aos objetivos sociais da cooperativa. Pois bem, É de conhecimento geral que a Lei de Recuperações Judiciais e Falências, passou por uma recente reforma legislativa, promovida pela Lei 14.112/2020, que trouxe alterações substanciais e incluiu dispositivos legais que, aparentemente, têm impacto no caso em questão. Dentre as modificações, foi acrescido o §13 ao artigo 6º da LRJF, que dispõe o seguinte: Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica: [...] §13. Não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas com seus cooperados, na forma do art. 79 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, consequentemente, não se aplicando a vedação contida no inciso II do art. 2º quando a sociedade operadora de plano de assistência à saúde for cooperativa médica. Já o artigo 79 da Lei 5.764/1971, tem a seguinte redação: Art. 79. Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais. Parágrafo único. O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria. Em vista disso, o ponto da presente controvérsia resida na definição do que seria ato cooperado. A Lei das Cooperativas define os “atos cooperativos” como aqueles praticados para a consecução dos objetivos sociais e que não impliquem operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria (art. 79, caput e parágrafo único da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971). Entretanto, o STJ firmou entendimento de que a relação jurídica estabelecida entre a sociedade cooperativa e seus associados na realização de seu objeto social, possui atributos próprios e não perde sua natureza de ato cooperativo apenas por se tratar de operação financeira ou bancária ou por existir oferta de bens ou serviço semelhante no mercado. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. COOPERATIVA DE CRÉDITO. IMPOSTO DE RENDA. DISTRIBUIÇÃO DAS SOBRAS LÍQUIDAS AOS COOPERADOS. NÃO INCIDÊNCIA. SÚMULA N. 141/CARF. 1. No caso exclusivo das cooperativas de crédito, já assentou este Superior Tribunal de Justiça que o ato cooperativo típico abarca também toda a movimentação financeira das cooperativas de crédito, incluindo a captação de recursos, a realização de empréstimos aos cooperados, bem como a efetivação de aplicações financeiras no mercado. Especificamente para essas sociedades, em razão de sua finalidade singular, foi excepcionada a aplicação da Súmula n. 262/STJ ("Incide o imposto de renda sobre o resultado das aplicações financeiras realizadas pelas cooperativas"). Precedentes: AgRg no AgRg no REsp. 717.126/SC, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 09.02.2010; REsp. n. 591.298/MG, Primeira Seção, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Rel. p/acórdão Min. Castro Meira, julgado em 24.10.2004; REsp. n. 1.305.294/MG, decisão monocrática, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 28.05.2013. 2. O tema inclusive já foi objeto de enunciado sumular no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Súmula n. 141/CARF: "As aplicações financeiras realizadas por cooperativas de crédito constituem atos cooperativos, o que afasta a incidência de IRPJ e CSLL sobre os respectivos resultados". 3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.951.158/CE, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 25/10/2021, DJe de 28/10/2021). Nessa perspectiva, os Tribunais de Justiça de SP e de MT passaram a entender que tais créditos não se sujeitão ao processo de recuperação judicial. In verbis: AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – IMPUGNAÇÃO DE CRÉDITO – Cooperativa de crédito – Decisão judicial que acolheu o incidente, reconhecendo a extraconcursalidade de créditos decorrentes de atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas com seus cooperados (LREF, art. 6º, § 1) – Alegação de que operações financeiras ou bancárias em condições normais de juros e prazos de mercado não caracterizam "atos cooperativos" nos termos do parágrafo único, do art. 79, da Lei n. 5.764/71 – Descabimento – Atos cooperativos são aqueles praticados entre "as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais" (art. 79, caput, Lei n. 5.764/71)– Não obstante as cooperativas de crédito constituam instituições financeiras, não se confundem com outras entidades do Sistema Financeiro Nacional – Relação jurídica estabelecida entre a cooperativa e seus associados na realização de seu objeto social, como a que deu origem ao crédito discutido nos presentes autos, possui atributos próprios e não perde sua natureza de ato cooperativo apenas por se tratar de operação financeira ou bancária ou por existir oferta de bens ou serviços semelhante no mercado – Parágrafo único, do art. 79, da Lei n. 5.764/71 que não exclui as operações de mercado do conceito de "ato cooperativo" – Inconstitucionalidade formal – Impertinância – Alegação de inconstitucionalidade que recai sobre excerto do texto legal que não tem aplicação no caso concreto – Decisão singular mantida – Agravo desprovido. Dispositivo: negam provimento ao recurso. (TJ-SP - AI: 22356936120228260000 SP 2235693- 61.2022.8.26.0000, Relator: Ricardo Negrão, Data de Julgamento: 17/02/2023, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 17/02/2023). RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECUPERAÇÃO JUDICIAL - INCIDENTE DE IMPUGNAÇÃO DE CRÉDITO – DECISÃO QUE JULGOU IMPROCEDENTE A IMPUGNAÇÃO – PRETENSÃO DE EXCLUIR DO CONCURSO DE CREDORES O CRÉDITO DA COOPERATIVA FINANCEIRA – POSSIBILIDADE – EMPRÉSTIMO AO COOPERADO QUE SE CONFIGURA ATO COOPERATIVO – CRÉDITO DE ATO COOPERATIVO QUE NÃO SE SUJEITA AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL - DECISÃO REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Para o STJ, quando se trata de Cooperativa de Crédito a concessão de empréstimo ao cooperado se configura como “ato cooperativo”. (TJMT, 1035245-80.2022.8.11.0041, RELATORA: EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES, DJ 23/04/2024). RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECUPERAÇÃO JUDICIAL – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – COOPERATIVA DE CRÉDITO – ATO COOPERATIVO CONFIGURADO - ARTIGO 6º, § 13, DA LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL E ARTIGO 79 DA LEI Nº 5.764/71 – CRÉDITO EXTRACONCURSAL – DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO. A alteração da Lei de Falência e Recuperação Judicial trazida pela Lei nº 14.112/2020, deu nova redação ao § 13 do artigo 6º, o qual prevê expressamente que todos os créditos decorrentes de atos cooperativos, praticados entre sociedades cooperativas e seus associados, serão extraconcursais, assim não se submetem aos efeitos da ação de recuperação judicial. Relação jurídica estabelecida entre a cooperativa e seus associados na realização de seu objeto social, como a que deu origem ao crédito discutido nos presentes autos, possui atributos próprios e não perde sua natureza de ato cooperativo apenas por se tratar de operação financeira ou bancária ou por existir oferta de bens ou serviços semelhante no mercado. Inteligência do parágrafo único do art. 79 da Lei n. 5.764/71. (TJMT, RAI nº 1004778-76.2024.8.11.0000, Relator: Des(a). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DJ 26/04/2024). Basicamente, a circunstância de as cooperativas de crédito realizarem operações financeiras similares às executadas pelos bancos tradicionais não altera a natureza e a qualificação dessas operações como atos cooperativos típicos, realizados entre as sociedades cooperativas e seus cooperados, conforme disposto no art. 79 da Lei nº 5.764/1971. Por fim, por força legal do artigo 6° §13 da Lei 11.101/2005, entendo que os créditos derivados de atos cooperativos não se sujeitam a recuperação judicial. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECLARAÇÃO E RECONHECIMENTO DE SUSPEIÇÃO. CONTAMINAÇÃO DE TODOS OS ATOS DO PROCESSO. REMESSA DO PROCESSO AO MAGISTRADO SUBSTITUTO. CONTRATOS FIRMADOS COM COOPERATIVA. ATO COOPERATIVO CONFIGURADO. CRÉDITO EXTRACONCURSAL. POSSIBILIDADE DE DESCONTOS DAS PARCELAS NA CONTA DA RECUPERANDA. [...] 4) CRÉDITO EXTRACONCURSAL - O crédito da cooperativa agravante não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial por força do disposto no parágrafo 13 do artigo 6º da Lei nº 11.101/2005, tendo em vista que em ambos os contratos firmados entre as partes consta a expressa previsão de que a operação de crédito perfectibilizada caracteriza-se como um "ATO COOPERATIVO". 5) Embora o parágrafo único do artigo 79 da Lei nº 5.764/1971 estabeleça que "o ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria", o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido que os empréstimos realizados pelas cooperativas aos cooperados constituem atos cooperativos. 6) Sendo o crédito da agravante extraconcursal, ou seja, não sujeito aos efeitos da recuperação judicial, descabe determinar a suspensão dos descontos relativos aos financiamentos, assim como a devolução dos valores já debitados. 7) Mister ressaltar que dinheiro não é considerado bem de capital, motivo pelo qual não está protegido pelo stay period, podendo o credor permanecer realizando os descontos relativos aos financiamentos contratados pela recuperanda diretamente de sua conta bancária. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (TJRS, Agravo de Instrumento, Nº 50330461620228217000, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em: 30-06-2022). Destarte, é medida necessária excluir o crédito da requerente COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DO SUDOESTE DA AMAZÔNIA LTDA - SICOOB CREDISUL da relação de credores do grupo recuperando. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO e DETERMINO: 1. A intimação da Administradora Judicial para proceder com a EXCLUSÃO do crédito no valor de R$ 327.226,50 (trezentos e vinte e sete mil duzentos e vinte e seis reais e cinquenta centavos), da lista de credores. 2. A intimação da Administradora Judicial para proceder com a atualização da lista de credores, colacionando-a aos autos principais. 3. Condeno a requerida/recuperanda ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do §2º do artigo 85 do CPC. 4. JULGO EXTINTA AÇÃO COM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 487, inciso I do CPC. Sem custas. Transitada em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos. Expeça-se o necessário. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá-MT, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Juiz de Direito

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Sebastiao Rodrigues Soares x Banco Bmg S.A.

ID: 299010495

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE JAURU Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000598-70.2024.8.11.0047

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

SEBASTIAO RODRIGUES SOARES

Polo Passivo:

BANCO BMG S.A.

Intimação

Advogados:

TAMARA RITA SERVILHA DONADELI NEIVA

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BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE JAURU SENTENÇA AUTOS DO PROCESSO: 1000598-70.2024.8.11.0047 REQUERENTE: SEBASTIÃO RODRIGUES SOARES REQUERIDO: BANCO BMG S.A. RELATÓRIO Trata-se de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE JAURU SENTENÇA AUTOS DO PROCESSO: 1000598-70.2024.8.11.0047 REQUERENTE: SEBASTIÃO RODRIGUES SOARES REQUERIDO: BANCO BMG S.A. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ajuizada por SEBASTIÃO RODRIGUES SOARES em face de BANCO BMG S.A., ambos devidamente qualificados nos autos. Narra a inicial, que o requerente, aposentado que recebe seu benefício previdenciário, descobriu recentemente, ao consultar seu extrato de empréstimo consignado na autarquia previdenciária, que havia diversos descontos em seus proventos, dentre eles valores debitados sob a denominação Reserva de Cartão Consignado (RCC). Indica que desde janeiro de 2023, tais descontos somam determinada quantia, estando atrelados a contratos distintos, sendo que um deles, consta como ativo desde novembro de 2022. Alega o requerente, que jamais teria contratado qualquer serviço ou recebido cartão de crédito da instituição financeira requerida, tampouco autorizado os descontos em seu benefício. Afirma não ter consentido com o uso de seus dados previdenciários, bancários ou pessoais para realização de empréstimos ou descontos. Diz que os débitos indevidos têm comprometido sua renda mensal, essencial para sua subsistência e de sua família, causando-lhe prejuízos materiais e morais. Diante da situação, ingressou com esta ação visando o cancelamento dos descontos, a declaração de nulidade dos contratos fraudulentos, a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados e a reparação pelos danos morais sofridos (ID n.º 161370384). Com a inicial, documentos (IDs nn.º 161370388 a 161370390, 161372041 a 161372043). Recebida a inicial, foi concedido os benefícios da justiça gratuita em favor do requerente, indeferido o pedido de tutela de urgência, designado audiência de conciliação e mediação, e determinou a citação do banco requerido (ID n.º 161416859). Apresentou contestação o banco requerido, arguindo preliminares de inépcia da inicial por carência da ação, em razão da ausência prévia de reclamação na via administrativa e inexistência de pretensão resistida, combateu os argumentos do requerente e, no mérito, pugnou pela improcedência dos pedidos existentes na petição inicial (ID n.º 163713955). Anexo à contestação, documentos (IDs nn.º 163713959, 163713960, 163713963 e 163713965). Realizada a audiência de conciliação e mediação, não houve composição entre as partes (ID n.º 172118438). Ostentou impugnação à contestação o requerente, impugnando as razões trazidas pelo banco requerido, requereu o afastamento das preliminares, reiterou os pedidos constantes da petição inicial e propugnou pela produção de prova pericial (ID n.º 176496313). Vieram-me conclusos os autos. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. PRELIMINARES INÉPCIA DA INICIAL Alega, o banco requerido, que a petição inicial é inepta por não descrever com precisão os fatos, bem como por formular pedidos genéricos. Entretanto, a inicial atende aos requisitos dos arts. 319 e 320 do Código de Processo Civil (CPC), expondo os fatos de forma compreensível e articulando fundamentos jurídicos suficientes para o processamento da demanda. Assim, rejeito a preliminar de inépcia da inicial. CARÊNCIA DE AÇÃO - AUSÊNCIA DE PRÉVIA RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA O banco requerido sustenta a carência de ação sob o argumento de que o requerente não formulou reclamação na via administrativa antes de ajuizar a demanda. Todavia, é pacífico na jurisprudência que a prévia reclamação administrativa não é condição para o ajuizamento da ação judicial, uma vez que não há previsão legal nesse sentido, ainda mais se tratando de relação consumerista. Portanto, afasto a preliminar de carência de ação. INEXISTÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA Suscita preliminar de inexistência de pretensão resistida, pois o requerente sequer tentou resolver a questão diretamente com a instituição financeira. A existência de resistência à pretensão decorre do próprio ajuizamento da demanda e da contestação apresentada pelo banco requerido, de modo que essa preliminar também não merece acolhimento. CONEXÃO Arguiu a conexão do presente feito com outras demandas similares em trâmite, visando à reunião dos processos. Nos termos do art. 55 do CPC, a conexão é reconhecida quando duas ou mais ações possuem idêntica causa de pedir e pedido. No presente caso, ainda que existam demandas semelhantes, a individualização das partes e das circunstâncias fáticas impede a conexão. Rechaço a preliminar. PRODUÇÃO DE PROVA PROVA PERICIAL A parte requerente postula a produção de prova pericial digital em sua impugnação à contestação. Considerando que os documentos apresentados pelo banco requerido são suficientes para a formação do convencimento judicial, nos termos do art. 370 do CPC, é desnecessária a realização de prova pericial. Ademais, a matéria é exclusivamente de direito e dispensa dilatação probatória. Logo, INDEFIRO a produção de prova pericial. JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO Ao analisar o conjunto probatório verifico que este admite o julgamento no estado em que se encontra, na medida em que desnecessário se mostra a produção de outras provas, além das já existentes nos autos, sobretudo por se tratar de matéria de cunho documental a conferir plausibilidade ao pleito. Ressalto ainda que, não há que se falar em cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide, sob a égide do art. 355, inciso I do CPC. A essa mesma linha, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando o Ministro Humberto Martins proferiu decisão no Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial, dizendo que “[...] O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. [...]” “(STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023).” Em casos semelhantes aos dos autos, o Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem entendido que “Não configura cerceamento de defesa a dispensa da produção de prova oral, quando entende o magistrado pela suficiência dos elementos juntados ao processo, até porque é cediço que o juiz é o destinatário das provas, lhe sendo facultada a dispensa de provas que entender desnecessárias ou protelatórias, e autorizado o julgamento antecipado da lide, conforme dispõe o art. 355, I, do CPC. [...]” (N.U 1005146-38.2022.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/02/2024, Publicado no DJE 09/02/2024). De mais a mais, é cediço, ainda, que o ordenamento jurídico processual, à luz do dever constitucional dos atos judiciais, consoante ao art. 93, inciso IX da Constituição Federal de 1988 (CF/88), adotou o princípio da persuasão racional, segundo o qual o juiz, ao proferir decisão, formará livremente o seu convencimento. Nesse sentido também é o art. 370 do CPC que prevê que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”, cabendo-lhe indeferir, como destinatário das provas, as diligências inúteis ou meramente protelatórias, analisando a conveniência e necessidade de sua efetiva realização, evitando-se que a causa tenha seu desfecho protraído, em atenção a tão colimada celeridade processual. Assim, restando evidenciado que a causa se encontra madura, o que com esteio na jurisprudência pátria dos Tribunais Superiores e legislação processual supramencionada, diante das provas já produzidas e coligidas nos autos, passo ao julgamento antecipado da lide nessa oportunidade. MÉRITO Inicialmente, consigno não constar questões pendentes e preliminares, nem mesmo prejudiciais a serem analisados, presentes, então, os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, razão pela qual se tem como possível conhecer diretamente o mérito da lide. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA O requerente pleiteia a declaração de inexistência de relação jurídica, alegando que não contratou a modalidade de cartão de crédito consignado e que jamais autorizou os descontos em seu benefício previdenciário. No entanto, os documentos apresentados pelo banco requerido (IDs nn.º 163713959 e 163713960) demonstram de forma inequívoca que houve a adesão expressa do requerente ao contrato, com a formalização por meio de assinatura eletrônica, selfie e cópias de documentos pessoais. Além disso, há prova da efetiva liberação dos valores contratados na conta bancária do requerente, o que confirma que ele se beneficiou da contratação (IDs nn.º 163713963, págs. 24/25. O Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso possui entendimento consolidado no sentido de que, havendo demonstração clara da contratação e da disponibilização do crédito, não há que se falar em inexistência de relação jurídica. Nesse sentido: “[...] 1. Se restar evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável – RMC e/ou Cartão de Crédito Consignado em Benefício (RCC), mediante a juntada de contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como mediante a comprovação de que o consumidor se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito, há que ser reconhecida a validade da contratação. 2. No presente caso, restou comprovado nos autos que o Apelante aderiu à Proposta de Adesão ao serviço de Cartão Consignado de Benefício (RCC), formalizada em meio digital, mediante a captura de selfie da Requerente, com cópia dos documentos pessoais. 3. Não se verificam elementos capazes de ensejar a nulidade do contrato e/ou determinar a conversão da modalidade de empréstimo, uma vez que ao aderir à proposta de contratação descrita nos autos, o Apelante deu ciência expressa quanto às condições da contratação, taxas, encargos, assim como a ciência quanto aos seus termos, inclusive que não se tratava de empréstimo consignado, razão pela qual a sentença deve ser mantida. 4. Recurso desprovido. (N.U 1001907-47.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/02/2025, Publicado no DJE 25/02/2025)”. Assim, não há fundamento para o pedido de declaração de inexistência do contrato. REPETIÇÃO DE INDÉBITO Deseja o requerente a devolução dos valores descontados em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), sob a alegação de que os descontos foram indevidos. Contudo, para que se configure a repetição do indébito em dobro, é necessária a comprovação de que houve cobrança indevida acompanhada de má-fé da parte credora. No caso, os documentos juntados demonstram a legalidade da contratação e a regularidade dos descontos, afastando qualquer ilicitude na conduta do banco requerido. O Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso, ao interpretar o art. 42 do CDC, entende que a devolução em dobro somente se aplica quando há erro injustificável na cobrança. Com efeito: “[...] 7. A ausência de comprovação de má-fé da instituição financeira afasta o direito à repetição do indébito em dobro, conforme art. 42, p.u., do CDC. [...] (N.U 1014243-83.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025)”. (negritei) Dessa forma, a devolução dos valores em dobro é incabível. DANOS MORAIS Pleiteia o requerente, a condenação do banco requerido ao pagamento de indenização por danos morais, alegando que os descontos indevidos lhe causaram prejuízos financeiros e abalo emocional. Entretanto, para que se configure o dano moral, é necessário que a parte requerente comprove a existência de lesão à sua dignidade. No caso em análise, a regularidade da contratação e a ausência de qualquer conduta ilícita do banco afastam a existência de ato ensejador de dano moral. O Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem reiteradamente decidido que a simples cobrança de valores não configura, por si só, dano moral, sendo necessária a comprovação de constrangimento indevido. Colaciono o seguinte julgado: [...] IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável (RMC), realizada por meio de assinatura digital com biometria facial e geolocalização, é válida e eficaz, desde que não haja prova de fraude ou vício de consentimento. 2. A responsabilidade objetiva da instituição financeira exige comprovação de defeito na prestação do serviço ou falha na informação, o que não se presume. 3. A mera alegação de desconhecimento da contratação não afasta a validade do negócio jurídico quando demonstrada a regularidade da adesão e a efetiva utilização do crédito. 4. A inexistência de conduta ilícita ou falha no dever de informação afasta o dever de indenizar por danos morais. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 2º, 3º, 6º, VIII, e 14; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 297; STJ, Súmula 479; TJ-MT, N.U 1037665-24.2023.8.11.0041, Rel. Rubens de Oliveira Santos Filho, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 03/04/2024; STJ, AREsp 1.882.881/SP, Rel. Min. Humberto Martins, j. 02.06.2021. (N.U 1003886-61.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/02/2025, Publicado no DJE 23/02/2025)”. (negritei) Portanto, não há elementos para o deferimento do pedido indenizatório. CONVERSÃO DO CONTRATO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO Deseja, ainda, o requerente, a conversão do contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo consignado tradicional. Todavia, não cabe ao Poder Judiciário reconfigurar um contrato regularmente firmado entre as partes, especialmente quando não há demonstração de vício de consentimento ou prática abusiva. O contrato foi firmado de maneira válida e clara, inexistindo fundamentos legais para sua conversão compulsória. O entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem sido o seguinte: “[...] 1. Se restar evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, mediante a juntada de contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como mediante a comprovação de que o consumidor se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito, há que ser reconhecida a validade da contratação. 2. No presente caso, restou comprovado que o Apelado contratou junto ao Apelante o serviço de cartão de crédito consignado à margem (RMC), conforme consta no contrato denominado “Termo de adesão à consignação em folha de pagamento para empréstimos e cartão de crédito autorizado para descontos em folha”, contratado em 05/12/2017, contendo todas as informações inerentes à contratação do serviço Cartão BMG CARD, inclusive com cláusula especifica de autorização de desconto em folha de pagamento; bem como, restou comprovada a disponibilização de valores (via TED) para saque mediante cartão de crédito. 3. Ausentes elementos capazes de ensejar a nulidade contratual há que ser reformada a r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para determinar a conversão da modalidade de empréstimo, de modo que se reconheça a improcedência dos pedidos ante a constatação da legalidade do contrato. 4. Sentença reformada, recurso provido. (N.U 1019394-64.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/02/2025, Publicado no DJE 25/02/2025)”. Logo, como dito alhures, não cabe ao Poder Judiciário a conversão propugnada pelo requerente. É o quanto basta. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos da parte requerente, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I do CPC, declarando a validade dos contratos de empréstimos nn.º ADE 80103251 e 83717541, objetos da lide. CONDENO a parte requerente em custas, despesas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, o que fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 1º e 2º do CPC. Todavia sendo a parte requerente beneficiário da justiça gratuita, fica suspensa a exigibilidade de tais valores, nos termos do art. 98, § 3º do CPC. Diante da inexistência de juízo de admissibilidade recursal no primeiro grau de jurisdição, com eventual apresentação de recurso, INTIME-SE o recorrido para ofertar suas contrarrazões. Em seguida, se for o caso, REMETAM-SE os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Não cabendo, CONCLUSOS para deliberações. Após o trânsito em julgado, CERTIFIQUE-SE e ARQUIVEM-SE os autos com as baixas e anotações de praxe. CUMPRA-SE, expedindo o necessário e com as cautelas de estilo. À secretaria, para providências. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Jauru/MT, datado e assinado digitalmente. MARILIA AUGUSTO DE OLIVEIRA PLAZA Juíza de Direito

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Processo nº 1046430-47.2024.8.11.0041

ID: 322166881

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA ESP. DA FAZENDA PÚBLICA DE CUIABÁ Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1046430-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA DE OBRAS LTDA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

HIGOR LUCAS OLIVEIRA DA SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA ESP. DA FAZENDA PÚBLICA DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1046430-47.2024.8.11.0041. IMPETRANTE: MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA ESP. DA FAZENDA PÚBLICA DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1046430-47.2024.8.11.0041. IMPETRANTE: MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA DE OBRAS LTDA REPRESENTANTE: GUSTAVO MARQUES NUNES IMPETRADO: SECRETARIO DA SECRETARIA MUNICIPAL DE FAZENDA DO MUNICIPIO DE CUIABA, MUNICÍPIO DE CUIABÁ I - RELATÓRIO Vistos. Trata-se de mandado de segurança impetrado por MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA DE OBRAS LTDA-EPP, pessoa jurídica de direito privado, contra alegado ato ilegal praticado pelo Secretário de Fazenda do Município de Cuiabá/MT. A impetrante afirma que que é proprietária imóvel localizado na rua 04, Lote 30, Quadra 12, Chácara São José, em Cuiabá-MT, com inscrição municipal imobiliária 058130040391001, onde edificou residência unifamiliar, utilizando recursos próprios, mão de obra própria e terreno próprio, caracterizando incorporação imobiliária direta. Ainda, aduz que não houve prestação de serviços a terceiros, mas construção em terreno próprio para futura venda, não configurando o fato gerador do ISS; não obstante, afirma que a autoridade coatora condicionou indevidamente a emissão do habite-se ao pagamento do tributo, mesmo após contestação administrativa. Em vista dessa cobrança que reputa ilegal, impetra o presente writ, requerendo a concessão de liminar para cancelamento/suspensão do lançamento do ISS e, no mérito, a confirmação da medida com declaração de inexigibilidade do tributo. Liminar concedida (Id. 172862379). Manifestação da autoridade coatora (Id. 176682185) Manifestação do Ministério Público (Id. 185473428). Vieram-me conclusos. Decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Segundo dispõe o artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição da República, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de autoridade pública for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”. Assim, dois são os pressupostos para a concessão da segurança: a) existência de direito líquido e certo; b) ameaça ou lesão decorrente de ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública. Esses pressupostos são analisados em dois momentos distintos: (a.) no juízo de admissibilidade da ação e sob a forma de condição da ação, na modalidade interesse de agir, onde o Juízo, em cognição sumária fundada na plausibilidade da alegação e documentação apresentada pelo impetrante, recebe a inicial, analisa o pedido de liminar e determina a notificação da autoridade coatora; (b.) no mérito, depois de prestadas as informações, onde o Juízo, em cognição final exauriente, reconhece ou não o mérito do “mandamus”, ou seja, existência do direito líquido e certo e da ameaça ou lesão ao direito por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública. No caso em tela, a impetração do presente mandamus cinge-se à emanação de ordem para declarar ilegal a cobrança de ISS promovida pela autoridade coatora, ao fundamento de que o empreendimento imobiliário foi realizado em terreno próprio, com mão de obra própria, o que descaracterizaria a prestação de serviços a terceiros. O tema referido foi tratado por ocasião da decisão liminar nos seguintes termos: O cerne da questio gira em torno da legalidade ou não da cobrança do imposto ao caso concreto, visto que conforme previsão contida no art. 156, inciso III da Constituição Federal e regulamentado pela LC n. 116/2013, somente é devido em contraprestação ao desenvolvimento de atividade economicamente apreciável, produtiva e de utilidade para outrem, sem subordinação, não sendo o mesmo contemplado pelo trabalho realizado para “si próprio”, desprovido de conteúdo econômico. Inclusive, este é o entendimento da Corte Estadual: “DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. ISSQN. CONSTRUÇÃO EM TERRENO PRÓPRIO. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS A TERCEIROS. NÃO INCIDÊNCIA. EXPEDIÇÃO DE HABITE-SE. ERRO MATERIAL NA SENTENÇA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação contra sentença que concedeu a segurança para determinar a expedição de "Habite-se" sem condicionar ao pagamento de ISSQN, em caso de construção residencial unifamiliar realizada pelo proprietário com recursos próprios e mão de obra diretamente contratada. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se há erro material na sentença ao utilizar o termo "suspensão da exigibilidade do crédito tributário" ao invés de "anulação do crédito tributário". III. Razões de decidir 3. O ISSQN não incide sobre construções realizadas pelo próprio proprietário, em terreno próprio, com mão de obra própria, sem prestação de serviços a terceiros, conforme jurisprudência pacificada do STJ e do TJMT. 4. A sentença corretamente reconheceu a não incidência do ISSQN, mas utilizou terminologia inadequada ao referir-se à "suspensão da exigibilidade" do crédito tributário, quando o correto seria sua anulação. 5. O erro material na redação da sentença não altera seu mérito, mas deve ser corrigido para evitar interpretações conflitantes e refletir adequadamente o ato jurídico necessário. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de Apelação provido para retificar a sentença. Tese de julgamento: "1. Não incide ISSQN sobre construção realizada pelo proprietário em terreno próprio, com recursos próprios e mão de obra diretamente contratada, por ausência de prestação de serviços a terceiros. 2. A expedição de 'Habite-se' não pode ser condicionada ao pagamento de ISSQN nessas circunstâncias. 3. O reconhecimento da não incidência do ISSQN implica a anulação do crédito tributário, e não mera suspensão de sua exigibilidade." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 156, III; LC 116/2003, art. 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no REsp 1295814/MS; TJ-MT, Apelação Cível 1047618-51.2019.8.11.0041; TJ-MT, Apelação Cível 10303756020208110041; TJ-MT, Remessa Necessária 10264809120208110041”. (N.U 1036293-11.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, Julgado em 24/09/2024, Publicado no DJE 28/09/2024) “RECURSO INOMINADO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. CONSTRUÇÃO CIVIL. MORADIA PRÓPRIA. CONSTRUÇÃO EM TERRENO PRÓPRIO. EXPEDIÇÃO DE “HABITE-SE” CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE ISSQN. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Trata-se de ação anulatória proposta pela Reclamante em desfavor da Reclamada, em razão da cobrança de ISSQN para liberação do “habite-se” no valor de R$ 18.203,06. 2. A parte Recorrida assinou termo de confissão de débitos (id 220100653) perante a Recorrente e realizou pagamento de parcela no valor de R$ 1.820,31, referente à primeira parcela, com o que pleiteia a repetição do indébito. 3. Não há se falar em incidência de ISSQN na hipótese de construção civil feita pelo próprio incorporador em terreno próprio, eis que, nessa hipótese, a construção civil constitui mero meio para a consecução do objetivo final (incorporação), o que não caracteriza prestação de serviço a terceiros, mas a si mesmo, afastando o fato gerador do tributo. 4. Não pode a administração pública, condicionar à expedição de auto de conclusão de imóvel (“habite-se”) à quitação prévia de tributo, por constituir sanção política, cuja imposição é vedada nos termos das Súmulas n.º 70, 323 e 547, do Supremo Tribunal Federal. 5. Sentença mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do artigo 46, da Lei n.º 9.099/95 c.c. art. 60, §§1º e 2º do Regimento Interno das Turmas Recursais Cíveis e Criminais dos Juizados Especiais do Estado de Mato Grosso (Resolução TJMT/OE n.º 016/23/TJMT), fazendo parte integrante deste voto. 6. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO”. (N.U 1023028-88.2023.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, JORGE ALEXANDRE MARTINS FERREIRA, Primeira Turma Recursal, Julgado em 23/09/2024, Publicado no DJE 27/09/2024) É dos autos que a impetrante é proprietária do imóvel LOTE 30, Quadra 12, Loteamento “São José”, Mat. 12.104 do 5° Serviço Notarial e Registral de Imóveis da Comarca de Cuiabá, e que em razão do seu ramo de atividade, construção civil, edificou na área, de modo que não prestou qualquer tipo de serviço. Atento a estes aspectos que cercam o mandamus, denota-se que não incide o referido imposto, sendo possível observar que a referida empresa construiu em terreno próprio e com meios próprios, para, posteriormente alugar ou vender, conforme dito na inicial, constituindo-se sua atividade em meio, e não fim. Assim sendo, entendo presente a probabilidade do direito, pelas razões acima expostas e, quanto ao resultado útil do processo, denota-se que o referido débito poderá ser inscrito, se a liminar não for deferida, em dívida ativa, que, por consequência, poderá gerar entraves à CND. Desta feita, com fulcro no artigo 7°, inciso III, da Lei 12.016/2009, DEFIRO a liminar vindicada nos autos para DETERMINAR que o impetrado proceda com a expedição do HABITE-SE, bem como suspenda a exigibilidade do tributo em nome da impetrante, excluindo-o do rol de negativação da dívida ativa municipal, até ulterior decisão deste juízo. As premissas estabelecidas na decisão referida não foram infirmadas pela autoridade coatora, não havendo nos autos qualquer elemento de convicção que permita conclusão em sentido diverso daquele já alcançado. Em reforço, anote-se que a questão encontra-se pacificada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que firmou entendimento no sentido de que não incide ISS na construção feita pelo próprio incorporador em terreno próprio, por ausência de prestação de serviços a terceiros. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ISS. EMPRESA INCORPORADORA. CONSTRUÇÃO POR CONTA PRÓPRIA E EM IMÓVEL PRÓPRIO, PARA FUTURA ALIENAÇÃO DE UNIDADES AUTÔNOMAS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PARA TERCEIRO. INEXISTÊNCIA. FATO GERADOR NÃO CONFIGURADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 83/STJ. 1. A construção feita pelo incorporador por conta própria e em terreno próprio não dá ensejo à tributação pelo ISS. Precedentes: AgRg no AREsp 49.946/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 11/06/2014; REsp 922.956/RN, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 01/07/2010; REsp 1.166.039/RN, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 11/06/2010; REsp 766.278/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 4/9/2007, DJ 26/9/2007. 2. Incide, na espécie, o óbice de conhecimento estampado na Súmula 83/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no AREsp n. 602.251/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 10/3/2015, DJe de 17/3/2015.) TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ISS. EMPRESA INCORPORADORA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONSTRUÇÃO A TERCEIROS. INEXISTÊNCIA. ISS. AFASTAMENTO. APRECIAÇÃO DE ALEGADA OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. COMPETÊNCIA DO STF. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, não incide ISS na hipótese de construção feita pelo próprio incorporador, haja vista que se a construção é realizada por ele próprio, não há falar em prestação de serviços a terceiros, mas a si próprio, o que descaracteriza o fato gerador. Precedentes: REsp 1.263.039/RN, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 19/09/2011, REsp 922.956/RN, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010, EREsp 884.778/MT, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/09/2010, DJe 05/10/2010. In casu, extrai-se dos autos que a agravante é empresa incorporadora e construiu em terreno próprio unidades autônomas para venda futura.2. Não cabe ao Superior Tribunal de Justiça, ainda que para fins de prequestionamento, examinar na via especial matéria constitucional, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp n. 49.946/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 5/6/2014, DJe de 11/6/2014.) Por fim, conforme prova pré-constituída, a impetrante, durante o procedimento administrativo, apresentou todas as notas fiscais dos serviços contratados de terceiros e demonstrou que houve o recolhimento do ISS correspondente, circunstância essa não elidida pela autoridade coatora. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se posicionado no sentido de que "a responsabilidade da incorporadora como tomadora de serviços exige prova concreta da prestação por terceiros e da ausência de retenção tributária, não sendo admissível o lançamento fundado em presunções genéricas". Confira-se: DIREITO TRIBUTÁRIO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. ISSQN. INCORPORAÇÃO DIRETA. CONSTRUÇÃO EM TERRENO PRÓPRIO. INEXISTÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO TOMADOR. AUSÊNCIA DE PROVA DE CONTRATAÇÃO DE TERCEIROS SEM RETENÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de recurso de apelação cível interposta pelo Município de Cuiabá contra sentença que julgou procedente a ação anulatória ajuizada pela MRV Prime Parque Chapada Mantiqueira Incorporações SPE Ltda., reconhecendo a inexigibilidade do crédito de ISSQN fundado na suposta omissão da incorporadora quanto à retenção do imposto incidente sobre serviços prestados por terceiros. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se (i) a atividade de incorporação direta é fato gerador do ISSQN e (ii) se a incorporadora é responsável tributária, por não ter retido imposto sobre eventuais serviços contratados de terceiros, sem que haja prova concreta do inadimplemento. III. Razões de decidir 3. A incorporação direta, quando realizada em terreno próprio e com recursos da própria incorporadora, não configura hipótese de incidência do ISSQN por ausência de prestação de serviços a terceiros. 4. A responsabilidade tributária da tomadora depende de prova específica da contratação de serviços sem a devida retenção, o que não se verificou nos autos. 5. A ausência de procedimento fiscal regular, bem como a inexistência de elementos que apontem para a efetiva prestação de serviços tributáveis sem recolhimento, impedem o arbitramento do imposto com base em presunções genéricas, sob pena de violação ao art. 148 do CTN. 6. A pretensão do Fisco municipal não se sustenta diante do ônus probatório que lhe incumbia (CPC, art. 373, II), nem se harmoniza com os princípios constitucionais da legalidade tributária e da segurança jurídica. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: "1. A incorporação direta de imóveis, realizada pela própria incorporadora em terreno de sua titularidade, com recursos próprios, não constitui fato gerador do ISSQN. 2. A responsabilidade da incorporadora como tomadora de serviços exige prova concreta da prestação por terceiros e da ausência de retenção tributária, não sendo admissível o lançamento fundado em presunções genéricas." (TJMT, N.U 1021658-64.2017.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, DEOSDETE CRUZ JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 27/06/2025, Publicado no DJE 27/06/2025) Assim, autoridade impetrada não logrou demonstrar, de forma específica e concreta, quais serviços teriam sido prestados por terceiros sem a devida retenção do tributo, fundamentando a cobrança em meras presunções, o que contraria os princípios da legalidade tributária e da segurança jurídica. Cumpre destacar que a responsabilidade tributária de terceiros, nos termos do art. 134 do Código Tributário Nacional, não pode ser aplicada de forma arbitrária, exigindo-se a comprovação de vínculo efetivo com o fato gerador da obrigação e a demonstração inequívoca da omissão ou inadimplemento por parte do responsável. A doutrina tributária é uníssona ao estabelecer que "a definição do responsável pela obrigação tributária não pode ser feita de maneira arbitrária, não sendo possível atribuir a condição de responsável a quem não tenha qualquer relação com o fato gerador da obrigação", conforme preceitua o art. 128 do CTN. Portanto, diante da ausência de prova concreta da omissão alegada, da inexistência de vínculo jurídico que justifique a responsabilidade tributária imputada e da comprovação do regular recolhimento do ISSQN pelos prestadores de serviços contratados, impõe-se o reconhecimento da ilegalidade do ato coator e a concessão da ordem mandamental. III – DISPOSITIVO Dessa forma, JULGO PROCEDENTE a presente ação mandamental, na forma do art. 487, I, do CPC, pelo que CONCEDO A ORDEM e convolo em definitivos os efeitos da liminar outrora deferida, razão pela qual DECLARO inexigível o tributo ISS no valor de R$ 3.341,08 (três mil, trezentos e quarenta e um reais e oito centavos)., referente ao processo administrativo PD00204388/2024, por ausência de fato gerador, devendo proceder ao cancelamento definitivo da sua cobrança. Sem custas conforme o disposto no artigo 10, inciso XXII da Constituição Estadual de Mato Grosso. Sem honorários (Súmulas 512 STF e 105 STJ). Nos termos do artigo 14, §1º, da Lei n. 12.016/2009, a presente sentença está sujeita a reexame necessário. Razão disso, decorrido o prazo para recursos voluntários, remetam-se os autos ao TJMT, com nossas homenagens. Cumpra-se. Datado e assinado digitalmente. Laura Dorilêo Cândido Juíza de Direito

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Marilza Domingos Do Nascimento x Arthur Lundgren Tecidos S A Casas Pernambucanas

ID: 321411157

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1066315-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

MARILZA DOMINGOS DO NASCIMENTO

Polo Passivo:

ARTHUR LUNDGREN TECIDOS S A CASAS PERNAMBUCANAS

Sentença

Advogados:

JOAO FERNANDO BRUNO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

JULIA MARIA ALVES DE OLIVEIRA JAQUES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

DAVID WENER FARINELLI SERILO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso Comarca de Cuiabá Juízo da 3ª Vara Cível Avenida Desembargador Milton Figueiredo Ferreira Mendes, Telefones: (65) 3648-6424/6427 - (65) 3648-6422 - WhatsApp … Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso Comarca de Cuiabá Juízo da 3ª Vara Cível Avenida Desembargador Milton Figueiredo Ferreira Mendes, Telefones: (65) 3648-6424/6427 - (65) 3648-6422 - WhatsApp Secretaria: (65) 99227-4375 - WhatsApp Gabinete: (65) 99229-2500- Centro Político Administrativo, Cuiabá - MT - CEP: 78049-075 e-mail: cba.gab3varacivel@tjmt.jus.br (gabinete) Processo nº 1066315-47.2024.8.11.0041 Requerente(s): MARILZA DOMINGOS DO NASCIMENTO Requerido(s): ARTHUR LUNDGREN TECIDOS S A CASAS PERNAMBUCANAS SENTENÇA Trata-se de ação declaratória de inexigibilidade de débito cumulada com pedido de indenização por danos morais, com pedido de tutela de urgência, ajuizada por Marilza Domingos do Nascimento em face de Arthur Lundgren Tecidos S.A. (Casas Pernambucanas), ambas qualificadas. Narra a parte autora que firmou negócio jurídico e obteve cartão de crédito fornecido pela loja da ré, utilizando-o para compras regulares. A partir de abril de 2024, entretanto, passou a identificar, nas faturas do referido cartão, cobranças indevidas correspondentes a serviços de seguros não contratados. Afirma que ao tomar ciência dessas cobranças, entrou em contato com a ré requerendo o estorno de R$ 214,76 na fatura do mês de julho/2024, ou seja, seu pedido foi parcialmente atendido, uma vez que não houve a devolução integral dos valores cobrados indevidamente e tampouco o cancelamento das referidas cobranças. Informa que em novo contato, pois as cobranças continuaram, recebeu cópia de oito contratos supostamente assinados por ela, sendo: 1. Bilhete de Seguro Bolsa Protegida; 2. Bilhete de Microsseguro de Pessoas Cuidar Mais Pernambucanas; 3. Bilhete de Microsseguro de Danos Residencial e de Pessoas; 4. Bilhete de Seguro Desemprego perda de Renda Individual 5. Bilhete de Seguro Proteção Financeira; 6. Prime – Clube de Vantagens Pernambucanas; 7. Bilhete de Seguro de Garantia Estendida Original; 8. Proteção Digital Pernambucanas. Destaca que a somatória dos valores indevidamente cobrados até o momento do ajuizamento da ação é R$ 615,48. Sustenta que nunca celebrou esses contratos e que as assinaturas não são suas, até porque claramente divergem das assinaturas constantes em seus documentos. Aduz que em decorrência da ausência de recursos para quitação do valor total da fatura de agosto/2024, em que constou R$ 225,37 indevidamente, seu nome foi inscrito em cadastro de inadimplentes, conforme extrato do SERASA juntado aos autos. Postulou a concessão de tutela de urgência, para exclusão de seu nome do cadastro de inadimplentes. Ao final, requer a procedência dos pedidos para confirmar a tutela provisória; declarar nulo os contratos de seguro; e condenar a ré à devolução em dobro dos valores indevidamente descontados, a saber, R$ 601,46; bem como ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 15.000,00. Instruiu a inicial com documentos. A tutela provisória foi deferida, determinando a exclusão da autora dos cadastros de inadimplentes. Houve deferimento da Justiça Gratuita à autora (Id. 177237661). Contestação da ré juntada ao Id. 179243655, em que a mesma defende que a autora formalizou os contratos acessórios por livre vontade. Defende, ainda, que realizou o cancelamento dos contratos e estornou os valores cobrados na fatura do mês de julho/2024, inexistindo direito à restituição. Argumenta que não houve ato ilícito capaz de ensejar o dever de reparação civil e pugna pela improcedência dos pedidos. Realizada a audiência de conciliação, não houve acordo entre as partes (Id. 185572655). A ré manifestou pelo julgamento antecipado da lide (Id. 188439962). Impugnação à contestação (Id. 189630571). Os autos vieram conclusos para julgamento. É o relatório. Fundamento. Decido. Inexistindo pedido de provas e estando o feito instruído com documentos suficientes ao deslinde, passo ao julgamento de mérito nos termos do artigo 355, inciso I, c/c artigo 12, ambos do Código de Processo Civil. De início, consigno que a relação existente entre as partes é de consumo. Logo, aplico ao presente caso as regras dispostas no Código de Defesa do Consumidor, inclusive, com a inversão do ônus da prova previsto no art. 6º, inc. VIII, do CDC. Infere-se dos autos que a controvérsia cinge-se à alegação de contratação indevida de diversos seguros vinculados ao cartão de crédito da autora obtido junto à Lojas Pernambucanas, ora ré, os quais geraram cobranças recorrentes e indevidas em suas faturas, culminando na negativação do seu nome junto ao SERASA. A parte autora impugnou especificamente a autenticidade das assinaturas constantes nos supostos contratos de adesão (Ids. 175927328 a 175927335), sustentando que não foram por ela firmados, tratando-se de fraude. A ré, por sua vez, sustenta que as contratações foram efetivadas pela consumidora, por livre e espontânea vontade. Embora não tenha sido produzida perícia grafotécnica nestes autos, é notória a discrepância gráfica entre as assinaturas apostas nos contratos e a rubrica da autora constante de seus documentos pessoais e da procuração (Ids. 175927313 e 175927315), o que salta aos olhos mesmo de um observador leigo. De todo modo, sobre o assunto decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através do Tema 1061, que nas hipóteses em que o consumidor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato juntado ao processo, cabe à instituição financeira, enquanto fornecedora de bens/produtos, o ônus de provar essa autenticidade. O Código de Processo Civil, em seu artigo 429, estabelece claramente que: “Art. 429. Incumbe o ônus da prova quando: I - se tratar de falsidade de documento ou de preenchimento abusivo, à parte que a arguir; II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento.” (Negritei) Assim, considerando que a autora apresentou com a inicial os contratos afirmando que as assinaturas incluídas nos documentos não são suas, sendo que, oportunizado às partes a especificação de provas, a ré requereu o julgamento do feito no estado em que se encontra, possível a procedência dos pedidos. Outrossim, é certo que a ré já efetuou o cancelamento dos contratos, entretanto, a mesma efetuou o estorno apenas de parte dos valores indevidamente cobrados. Logo, tenho que a ré não desincumbiu-se de seu ônus probatório (artigo 373, inciso II, CPC c/c artigo 6º, inciso VIII, CDC). Nesse sentido: AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANO MORAL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CONTRATO APRESENTADO. IMPUGNAÇÃO DA ASSINATURA PELA AUTORA. ÔNUS DO BANCO EM COMPROVAR A AUTENTICIDADE. STJ. REPETITIVO (TEMA 1061). RESP 1.846.649/MA. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES. DANO MORAL AFASTADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ALTERAÇÃO DO PARÂMETRO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Conforme dispõe o art. 373, inc. I e II, do CPC, cabe ao autor comprovar o fato constitutivo de seu direito, determinando que é ônus do réu apresentar provas hábeis a demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito por aquele postulado. Conforme entendimento firmado no RESP/MA 1.846.649, sob o rito dos recursos repetitivos, o STJ definiu que "Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, I)". O entendimento dominante no c. STJ é no sentido de admitir a repetição do indébito na forma simples, devidamente atualizado, e não em dobro, salvo prova da má-fé, o que não ocorreu no caso. Segundo entendimento consolidado no STJ, o dano moral deve ser demonstrado quando houver a falha na prestação ou cobrança do serviço, mas inexiste ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes. (TJMT; AC 1000153-08.2022.8.11.0052; Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha; Julg 08/05/2024; DJMT 11/05/2024) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS E AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. IMPUGNAÇÃO DE AUTENTICIDADE DAS ASSINATURAS APOSTAS EM CONTRATO APRESENTADO PELO BANCO. ÔNUS PROBATÓRIO DA PARTE QUE PRODUZIU O DOCUMENTO. TEMA 1.061/STJ. SENTENÇA ANULADA. PRELIMINAR ACOLHIDA. RECURSO PROVIDO. Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade (CPC, arts. 6º, 369 e 429, II) (Superior Tribunal de Justiça, RESP 1.846.649-MA, tema 1061). Configurado cerceamento de defesa, que demanda anulação da sentença e retorno dos autos à origem, porquanto, ainda que devidamente impugnadas as assinaturas apostas no contrato apresentado pelo banco, não foi determinada a realização de perícia grafotécnica. (TJMT; AC 1039522-96.2021.8.11.0002; Quarta Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges; Julg 31/01/2024; DJMT 31/01/2024) APELAÇÃO. Ação declaratória cumulada com pedido de reparação de danos morais e materiais. Sentença de procedência. Empréstimo consignado. Negativa de contratação. Apresentação, pela defesa, do termo de adesão. Impugnação da assinatura. Ônus da prova incumbe à parte que produziu o documento, no caso o réu. Art. 429, II, CPC. (Tema 1061 do STJ. Recursos repetitivos). Perícia grafotécnica, única pertinente, não realizada. Ausente prova segura da contratação. Falha na prestação do serviço caracterizada. Responsabilidade objetiva da instituição financeira. Débito declarado inexigível. Retorno das partes ao statu quo ante. Danos materiais. Valores das parcelas indevidamente descontados que devem ser restituídos. Compensação admitida. Realização de descontos, em benefício previdenciário, de valores relativos ao contrato. Medida que importou na redução de verba de natureza alimentar. Danos morais caracterizados. Dever de indenizar. Dano moral in re ipsa. Precedentes. Verba indenizatória bem fixada (R$ 5.000,00). Sentença mantida. Honorários recursais. Art. 85, §11, CPC inaplicável no caso concreto. Recurso parcialmente provido. (TJSP; AC 1006895-15.2021.8.26.0554; Ac. 17944501; Santo André; Vigésima Primeira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Décio Rodrigues; Julg. 28/05/2024; DJESP 04/06/2024; Pág. 2021) Demonstrada a falha na prestação dos serviços fornecidos pela ré e, considerando que a sua responsabilidade é objetiva, conforme disposição do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, não pode a autora ser responsabilizada e amargar as consequências da sua desídia, que não tomou os devidos cuidados. Até porque, sendo a atividade da ré considerada de risco, deve ser prudente quando do aperfeiçoamento do negócio jurídico. Registro que estão comprovados nos autos as cobranças realizadas pela ré a título dos contratos acessórios, cabendo a restituição integral dos valores. À respeito do pedido de restituição do indébito em dobro, embora o parágrafo único, do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor, estabeleça que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, é certo que a jurisprudência firmou entendimento no sentido de que é necessária a demonstração de má-fé do cobrador, o que não restou comprovado no caso em comento. Portanto, a indenização pela repetição do indébito deverá ocorrer na forma simples, eis que não restou caracterizada a má fé da ré. Nesse sentido: RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. CONTRATO NÃO APRESENTADO. FALHA CONSTATADA. RECONHECIDA A INEXISTÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA. DANO MORAL EVIDENCIADO. DEVIDA A INDENIZAÇÃO. MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. JUSTO. VALOR AQUÉM DO ADEQUADO. DESCONTOS INDEVIDOS. APOSENTADORIA. RESTITUIÇÃO DEVIDA. NA FORMA SIMPLES. MÁ-FÉ NÃO DEMONSTRADA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. AMBOS OS RECURSOS PROVIDOS EM PARTE. 1. As controvérsias de direito material devem ser dirimidas à luz das normas protetivas da Lei nº 8.078/1990. 2. Cumpre ao réu comprovar a regularidade da contratação (art. 373, II, do CPC). 3. Considerando que não foi apresentado o contrato, tem-se que não restou comprovada a existência da relação jurídica. 4. Diante das cobranças indevidas no benefício previdenciário é indispensável a restituição dos valores, todavia, na forma simples, uma vez que não comprovada a má-fé do banco, que, aliás, não se presume. 5. Não comprovada a contratação, justo o arbitramento de indenização, porquanto é o bastante para a configuração do dano moral suportado pela parte autora, que decorre diretamente do ato ilícito perpetrado pelo fornecedor, tendo em vista que esse tipo de dano é in re ipsa, ou seja, prescinde de comprovação, nos termos do verbete da Súmula nº 479 do Superior Tribunal de Justiça. Ademais, as deduções indevidamente efetivadas na aposentadoria configuram ato ilícito passível de reparação. 6. O valor da indenização por dano moral deve ser arbitrado em consonância com princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, promovendo-se de modo justo a compensação do ofendido e a punição do ofensor. (TJMT; AC 1001366-43.2021.8.11.0033; Quarta Câmara de Direito Privado; Relª Desª Serly Marcondes Alves; Julg 08/05/2024; DJMT 09/05/2024) Esclareço que em razão de a ré ter comprovado o estorno de parte dos valores, está autorizada a abater referido valor da quantia a ser devolvida. No que concerne ao pedido de indenização por dano moral, o Código Civil, em seu artigo 186, dispõe que aquele que causa dano a outrem, seja por ação ou omissão, comete ato ilícito, in verbis: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Em complemento, o artigo 927 do Código Civil prevê a obrigação de reparar civilmente os danos causados, em especial quando a atividade do causador importar em risco para os direitos do outro, como é o presente caso. “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.” Por fim, a Constituição Federal do Brasil ratifica o dever de reparação civil, ainda que exclusivamente moral (art. 5º, inc. X, CF/88). Restando patente a obrigação da ré em reparar moralmente a autora, eis que os transtornos causados ultrapassam o limite do mero aborrecimento, inexiste necessidade de comprovação do dano moral, dada a inferência lógica que se pode extrair. O quantum indenizatório deve atentar aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, quantificado segundo os critérios da efetiva reparação do sofrimento, observando-se a teoria do desestímulo e capacidade econômica, bem como evitando o enriquecimento ilícito da parte vencedora. Atenta a esses parâmetros, fixo o dano moral no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais). DISPOSITIVO Posto isto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por MARILZA DOMINGOS DO NASCIMENTO em desfavor da empresa ARTHUR LUNDGREN TECIDOS S.A. (CASAS PERNAMBUCANAS), para: 1. Confirmar a liminar de Id. 177237661; 2. Declarar a nulidade dos contratos acessórios firmados em nome da autora e assim denominados: 1. Bilhete de Seguro Bolsa Protegida; 2. Bilhete de Microsseguro de Pessoas Cuidar Mais Pernambucanas; 3. Bilhete de Microsseguro de Danos Residencial e de Pessoas; 4. Bilhete de Seguro Desemprego perda de Renda Individual 5. Bilhete de Seguro Proteção Financeira; 6. Prime – Clube de Vantagens Pernambucanas; 7. Bilhete de Seguro de Garantia Estendida Original; 8. Proteção Digital Pernambucanas; 3. Determinar que cessem os descontos efetuados na fatura do cartão de titularidade da autora; 4. Condenar a ré à devolução na forma simples dos valores efetivamente descontados da autora, abatido o valor estornado na fatura do mês de julho/2024. O valor deverá ser acrescido de juros de mora de acordo com a taxa SELIC partir da citação e correção monetária pelo IPCA a partir da data do efetivo desembolso; e 5. Condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais à autora, no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acrescidos de juros de acordo com a taxa SELIC a partir do evento danoso e correção monetária pelo IPCA a partir da data desta sentença (Súmulas 54 e 362-STJ). Como a autora decaiu de parte mínima do pedido, condeno a ré ao pagamento das custas e despesas processuais, assim como honorários advocatícios de sucumbência, que fixo em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, nos termos dos artigos 82, §2º e 85, §2º, ambos do CPC. Após o trânsito em julgado, arquive-se com baixa na distribuição. P.I. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Ana Paula da Veiga Carlota Miranda Juíza de Direito

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Processo nº 1022277-47.2024.8.11.0041

ID: 310045530

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1022277-47.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

HELDER MASSAAKI KANAMARU

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1022277-47.2024.8.11.0041 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Pagamento com Sub-rogação, Indeni… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1022277-47.2024.8.11.0041 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Pagamento com Sub-rogação, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A. - CNPJ: 01.378.407/0001-10 (EMBARGANTE), HELDER MASSAAKI KANAMARU - CPF: 105.425.788-40 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELADO), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), GEORGE OTTAVIO BRASILINO OLEGARIO - CPF: 058.141.644-92 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU OS EMBARGOS. E M E N T A EMBARGANTE(S): ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A. EMBARGADO(S): ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A EMENTA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO - NÃO VERIFICADO - REDISCUSSÃO DE MATÉRIA - IMPOSSIBILIDADE – DESNECESSIDADE DE IMPUGNAR PONTO A PONTO DOS DISPOSITIVOS E ARGUMENTOS - MATÉRIA SUFICIENTEMENTE ANALISADA – PREQUESTIONAMENTO - REJEIÇÃO - RECURSO CONHECIDO E REJEITADO. Embargos de declaração são cabíveis somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado, ou, ainda, para sanar erro material. Ausente qualquer dessas hipóteses, devem ser rejeitados, sob pena de se abrir a possibilidade de rediscussão da matéria de mérito já decidida e encartada nos autos. O prequestionamento da matéria, por si só, não tem o condão de viabilizar o acolhimento dos embargos de declaração, pois é indispensável a demonstração inequívoca da ocorrência dos vícios enumerados no artigo 1.022 do CPC. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA Egrégia Câmara Trata-se de Embargos de declaração opostos por ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A. contra o acórdão de ID nº 290967859, exarado pela Colenda Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, que, por unanimidade de votos, negou provimento ao recurso, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. A parte embargante assevera que o v. acórdão padece de vícios de omissão, notadamente quanto à análise da situação de vulnerabilidade da embargante em face da embargada, bem como no que tange à inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Alega, ainda, a ausência de manifestação expressa acerca da responsabilidade objetiva da concessionária de energia elétrica, nos termos do art. 14 do CDC e do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Aduz, por fim, contradição na não aplicação da responsabilidade objetiva da concessionária, mesmo diante da alegada falha na prestação do serviço e da existência de elementos técnicos que corroboram o nexo causal. Apresenta prequestionamento visando viabilizar a interposição de recurso especial, caso não seja revista a decisão. Dessa forma, pugna pelo acolhimento do recurso para sanar os alegados vícios, para conceder efeito infringente e para fins de prequestionamento. Por sua vez, a parte Embargada apresentou contrarrazões em ID. 292865388, pugnando pelo desprovimento do recurso. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R EMBARGANTE(S): ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A. EMBARGADO(S): ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A VOTO Egrégia Câmara Conforme relatado, trata-se de Embargos de declaração opostos por ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A. contra o acórdão de ID nº 290967859, exarado pela Colenda Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, que, por unanimidade de votos, negou provimento ao recurso, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. O recurso de embargos de declaração tem fundamentação vinculada e estrita, possuindo a finalidade de esclarecer obscuridades, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material observados na sentença, acórdão ou decisão, conforme disposto no artigo 1.022, CPC, vejamos: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Caso não existam, na decisão judicial embargada, tais defeitos de forma, não há que interpor embargos de declaração, pois estes não devem ser utilizados para reexame e novo julgamento do que já foi decidido, dado que, para tanto, há o recurso próprio previsto na legislação. O acórdão Embargado restou assim proferido: “RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por Aliança do Brasil Seguros S/A, ora Apelante, contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível de Cuiabá - MT, que, nos autos de Ação Regressiva de Ressarcimento de Danos ajuizada em face da empresa recorrida Energisa Mato Grosso Distribuidora De Energia S.A., julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: “(...) Posto isso, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil,JULGO IMPROCEDENTEo pedido formulado por Aliança do Brasil Seguros S.A em desfavor de Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. Condeno a parte autora ao pagamento integral das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, este que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. (grifo original) Em suas razões recursais a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Mérito Recursal Da responsabilidade objetiva da concessionária de serviços. Da conduta ilícita praticada pela concessionária; Do nexo de causalidade. Dos laudos acostados aos autos. Recurso tempestivo e custas recolhidas. (ID 283723365) A parte recorrida apresentou suas contrarrazões, nas quais impugnou, no mérito, os argumentos deduzidos pela parte recorrente, pugnando, ao final, pelo desprovimento do recurso (ID nº 282756360). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: ALIANCA DO BRASIL SEGUROS S/A. APELADO: ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A VOTO Egrégia Câmara: 1. Das razões recursais invocadas pela parte recorrente Aliança Do Brasil Seguros S/A: Mérito Recursal. Da conduta ilícita praticada pela concessionária de serviços energéticos. Do nexo de causalidade. Do dever de indenizar. Dos danos materiais suportados. Conforme relatado anteriormente, extrai-se do conjunto probatório, que a empresa Aliança do Brasil Seguros S/A, ajuizou Ação Regressiva em face da concessionária de serviços energéticos Energisa Mato Grosso – Distribuidora De Energia S/A, afirmando, em síntese, que firmou contrato de seguro com os sub-rogados, e de acordo com a apólice dos segurados, estaria obrigada a ressarcir o contratante caso algum dos riscos do seguro ocorresse nos endereços constantes nos respectivos contratos, durante o período de vigência destes. Assevera, que os consumidores noticiaram dano elétrico, tendo sido instaurados os respectivos processos de sinistro, nos quais passou a proceder as regulações e verificações necessárias à constatação do evento e, tendo identificado o nexo de causalidade entre os eventos e os danos. Alega ainda, que tais danos foram decorrentes de oscilações de tensão na rede de energia elétrica e, em razão do ressarcimento aos segurados do valor total de R$ 52.284,49 (cinquenta e dois mil e duzentos e oitenta e quatro reais e quarenta e nove centavos), e pretende se sub-rogar nos direitos e ações que competiam aos contratantes do seguro, visando cobrar o ressarcimento, por meio desta ação regressiva. Lado outro, a apelada concessionária de energia elétrica, assevera que não restou demonstrado qualquer conduta/ato comissivo ou omissivo e seu nexo de causalidade entre o dano relatado, bem como, restou incomprovado os supostos danos suportados. Pois bem. É cediço que a responsabilidade da recorrente por falha na prestação de seus serviços de fornecimento de energia elétrica é objetiva, isentando-se apenas quando verificadas excludentes de responsabilidade, tais como caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima, o que não se verificou no presente caso, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Nesta senda, o art. 786 do Código Civil dispõe: “paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano”. No mesmo sentido, sobre o tema da ação regressiva, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 188, nos seguintes termos: “O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato de seguro”. Compulsando os autos, percebo que não há razão à seguradora recorrente, ante a falta de comprovação de nexo de causalidade entre a suposta conduta ilícita praticada pela empresa concessionária de energia e os danos suportados. Explico. Com efeito, percebe-se, pela leitura atenta dos autos, que não restou suficientemente comprovado o nexo de causalidade entre a suposta conduta ilícita praticada pela empresa concessionária de energia e os danos suportados pelo recorrente. Verifica-se, pela leitura dos laudos por meio dos quais se pretende demonstrar o nexo de causalidade e o resultado danoso, que estes foram elaborados de forma superficial, tratando-se, portanto, de documentos unilaterais que não apresentam metodologia detalhada, sendo insuficientes para comprovar o nexo causal entre a oscilação de energia e os danos alegados (ID 282755366 – páginas 26 e seguintes). Portanto, não há prova da relação de causalidade entre os afirmados defeitos e a atuação da concessionária de energia elétrica, impedindo, por indispensabilidade, a responsabilização civil, ainda que neste caso seja de natureza objetiva. Nesse sentido, é a jurisprudência hodierna desta Egrégia Quinta Câmara de Direito Privado: “DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DE CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. AÇÃO REGRESSIVA DE SEGURADORA. DANOS ELÉTRICOS. AUSÊNCIA DE PROVA TÉCNICA CONCLUSIVA. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. RECURSO PROVIDO. (...) 5. Os laudos juntados pela seguradora são unilaterais, sem identificação técnica adequada, ausentes elementos que comprovem a vinculação entre os danos relatados e eventual falha da rede elétrica. 6. A ausência de prova pericial impossibilita a formação de juízo conclusivo sobre a responsabilidade da concessionária. 7. Não demonstrado o nexo causal, deve ser reformada a sentença para julgar improcedente o pedido indenizatório. 8. A inversão dos ônus sucumbenciais é medida impositiva, devendo a parte autora arcar com os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso provido. Tese de julgamento: “1. A responsabilidade objetiva da concessionária de energia elétrica exige a comprovação do nexo causal entre sua conduta e o dano alegado. 2. Laudos unilaterais e sem suporte técnico adequado não são suficientes para demonstrar a responsabilidade da concessionária. 3. A ausência de prova pericial impede o reconhecimento do dever de indenizar por falha na prestação do serviço”. (...) (N.U 1045411-74.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025). DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO REGRESSIVA. SEGURADORA. DANOS ELÉTRICOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE. LAUDOS TÉCNICOS UNILATERAIS. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. DESCARGA ATMOSFÉRICA COMO CASO FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (...) 4. No caso concreto, os laudos técnicos apresentados pela seguradora são unilaterais, sem assinatura de profissional habilitado e sem metodologia detalhada, sendo insuficientes para comprovar a relação entre os danos elétricos e eventual falha no fornecimento de energia elétrica. Tese de julgamento: “1. A concessionária de energia elétrica responde objetivamente pelos danos decorrentes de falha na prestação do serviço, salvo quando demonstrada excludente de responsabilidade. 2. Laudos técnicos unilaterais, sem assinatura de profissional habilitado e sem metodologia detalhada, são insuficientes para comprovar o nexo causal entre oscilações na rede elétrica e danos a equipamentos. (...) (N.U 1037101-45.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/03/2025, Publicado no DJE 30/03/2025) Ademais, é importante registrar que as informações constantes nos relatórios gerados pelos sistemas computacionais da concessionária de serviços energéticos ENERGISA S.A. são auditadas periodicamente pela ANEEL e gozam de presunção de legitimidade e veracidade (ID nº 282755391 e 282755392 – pág. 1-13;). A propósito, trago precedente deste Egrégio Tribunal de Justiça/MT: “AGRAVO INTERNO – APELAÇÃO – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO DE DANOS – EQUIPAMENTOS AVARIADOS POR SUPOSTA DESCARGA DE ENERGIA ELÉTRICA – COMPROVAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE PERTURBAÇÃO NA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA PELA CONCESSIONÁRIA – RESTITUIÇÃO INDEVIDA – AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO CAPAZ DE ALTERAR O DECISUM – RECURSO NÃO PROVIDO. A concessionária de energia elétrica não é responsável pelos reparos em equipamentos do segurado quando comprova a ausência de registro de perturbação ou oscilação de energia elétrica na data do sinistro. Mantém-se a decisão agravada quando não apresentado nenhum fundamento novo capaz de alterá-la.” (TJMT - N.U 1008935-71.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/03/2023, Publicado no DJE 09/03/2023) Assim, a seguradora autora não demonstrou provas de fatos constitutivos de seu direito, ônus que lhe cabia, enquanto a concessionária ré/apelada demonstrou a existência de fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito da autora, nos termos do artigo 373 e incisos do CPC, sendo, a meu ver, indevido o ressarcimento postulado. Senão vejamos: Art. 373.O ônus da prova incumbe: I- ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II- ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados pelo Juízo de 1º Grau, em desfavor da empresa recorrente, para o importe de 13% (treze por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC. É como voto.” A parte Embargante assevera que o acórdão apresenta vícios de omissão e contradição, entretanto, revisando a mencionada decisão, verifica-se que a matéria foi amplamente analisada e fundamentada com base jurídica e jurisprudencial suficiente para compreender o entendimento aplicado. Além disso, importa salientar que o prequestionamento da matéria, por si só, não tem o condão de viabilizar o acolhimento dos embargos de declaração, pois é indispensável a demonstração inequívoca da ocorrência dos vícios enumerados no artigo 1.022 do CPC. Nesse sentido é a jurisprudência desta Egrégio Câmara: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – ERRO MATERIAL – VÍCIO SANADO – ALEGAÇÃO DE CONTRADIÇÃO – INEXISTÊNCIA – REDISCUSSÃO DA MATÉRIA – PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO – DESNECESSIDADE - RESULTADO MANTIDO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE ACOLHIDO. 1. Se no acórdão há o vício apontado pela Embargante, o recurso de embargos de declaração deve ser acolhido para sanar o erro material. 2. “Os embargos de declaração são cabíveis somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado, ou, ainda, para sanar erro material. Ausente qualquer dessas hipóteses, devem ser rejeitados os embargos, sob pena de se abrir a possibilidade de rediscussão da matéria de mérito encartada nos autos e já decidida.” (N.U 0015718-93.2019.8.11.0000, Maria Aparecida Ribeiro, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 25/06/2018, publicado no DJE 03/07/2018) 3. Entende-se como prequestionada a matéria que foi objeto de análise e decisão no acórdão recorrido, sendo despicienda a referência expressa a dispositivo de lei federal (prequestionamento explícito), bastando que a questão jurídica tenha sido efetivamente decidida (prequestionamento implícito). (N.U 0011076-95.2012.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, EDSON DIAS REIS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 19/03/2024, publicado no DJE 22/03/2024) (grifo nosso) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – AGRAVO INTERNO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – TUTELA ANTECIPADA – INVIABILIDADE – OMISSÃO – NÃO CONSTATAÇÃO – PRONUNCIAMENTO SOBRE TODOS OS PONTOS RELEVANTES SUSCITADOS – PREQUESTIONAMENTO – ACLARATÓRIOS REJEITADOS. 1 – Não há que se falar em omissão se a decisão recorrida deliberou sobre todos os pontos relevantes para o deslinde da causa. 2 – O órgão julgador não está obrigado a se manifestar sobre todos os pontos alegados pela parte, mas somente sobre os que entender necessários ao deslinde da controvérsia, de acordo com o livre convencimento motivado. 3 – O prequestionamento, nos Embargos de Declaração, ainda deve seguir os pressupostos de admissão do aludido recurso, qual seja, a presença de omissão, contradição, obscuridade e erro material. (N.U 1012212-53.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 18/03/2024, publicado no DJE 26/03/2024) (grifo nosso) Desta feita, conforme se extrai da jurisprudência hodierna, o órgão julgador não está obrigado a se manifestar sobre todos os pontos alegados pela parte, mas tão somente sobre os que entender necessários ao deslinde da controvérsia, seguindo o seu livre convencimento. Em outras palavras, desde que suficientemente analisada a matéria posta nos autos, o órgão julgador não está obrigado a manifestar ponto a ponto sobre todos os argumentos e/ou dispositivos legais invocados pelas partes, mas sim realizar a devida entrega jurisdicional. Dito isso, a irresignação do Embargante não ultrapassa o mero descontentamento com o entendimento aplicado, inexistindo vícios quando a matéria que foi suficientemente enfrentada. Portanto, a decisão é clara, em seus fundamentos, há lógica entre a conclusão e suas premissas a não ensejar contradição, como todas as matérias questionadas na pretensão subjetiva foram examinadas a contento, não existindo, ainda, erro material a ser suprido. O mero inconformismo do Embargante não pode ensejar a oposição de embargos de declaração, os quais não são apropriados para rediscussão da matéria já decidida, ainda que, supostamente, incoerente, segundo o entendimento dele. Evidente, assim, a impropriedade do manejo dos embargos de declaração, que não se configuram como outra instância recursal, pois, mesmo para fins de prequestionamento, o uso deste recurso se limita à demonstração de ocorrência das hipóteses contempladas no art. 1.022, CPC. Por essas razões, CONHEÇO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO opostos, PORÉM, REJEITO-OS. Por fim, fica a parte embargante advertida de que a oposição de novos embargos de declaração manifestamente protelatórios, em que não aponte, de modo concreto e consistente, quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do CPC, prolongando indevidamente a conclusão da demanda e distorcendo a finalidade do recurso, resultará na aplicação de multa sobre o valor da causa atualizado, conforme preceitua o art. 1.026, § 2º, do CPC. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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