Resultados para o tribunal: TJMT

Resultados para "1002476-97.2022.8.26.0268" – Página 3 de 3

Processo nº 1003229-94.2025.8.11.0000

ID: 308346659

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1003229-94.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

ALEXANDER DE OLIVEIRA ZANETTE

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

JOAO PEDRO DA SILVA MACHADO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete 1 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Gabinete 1 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo AGRAVO DE INSTRUMENTO … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete 1 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Gabinete 1 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1003229-94.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: ALEXANDER DE OLIVEIRA ZANETTE AGRAVADO: ESTADO DE MATO GROSSO Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA PROVISÓRIA. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO EM RAZÃO DA PROLAÇÃO DE SENTENÇA DE MÉRITO NA AÇÃO ORIGINÁRIA. RECURSO NÃO CONHECIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto por Alexander de Oliveira Zanette contra decisão que indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, no âmbito da Ação Declaratória de Nulidade nº 1000054-98.2025.8.11.0095, em trâmite no Núcleo de Justiça Digital dos Juizados Especiais. O agravante buscava a suspensão dos efeitos do Auto de Infração nº 5182001424 e do Termo de Embargo nº 5182001524, lavrados pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso (SEMA), sob o argumento de prescrição da pretensão punitiva e da existência de prejuízos econômicos decorrentes da manutenção do embargo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em verificar se o agravo de instrumento perdeu seu objeto em razão da superveniência de sentença de mérito na ação originária, a qual examinou de forma exaustiva as mesmas matérias objeto do recurso. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A superveniência de sentença de mérito na ação principal torna prejudicado o agravo de instrumento interposto exclusivamente contra decisão interlocutória que indeferiu tutela provisória, em razão da absorção e substituição da decisão recorrida pelo novo pronunciamento judicial definitivo. 4. O entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça e no Tribunal de Justiça de Mato Grosso é de que a sentença proferida no processo de origem esvazia o interesse recursal relativo ao agravo de instrumento, independentemente do teor da decisão final ou da interposição de recurso contra ela. 5. O Código de Processo Civil, em seu art. 932, III, autoriza o relator a não conhecer monocraticamente de recurso prejudicado por perda superveniente de objeto, aplicando-se, no caso, os princípios da economia processual e da duração razoável do processo. 6. A natureza provisória e precária da decisão interlocutória sobre tutela de urgência, conforme os arts. 296 e 304, §3º, do CPC, reforça a perda de eficácia dessa decisão diante de sentença de mérito superveniente. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso não conhecido. Tese de julgamento: "O agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória que indefere tutela provisória perde seu objeto com a superveniência de sentença de mérito na ação principal, que absorve e substitui integralmente a decisão recorrida." Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 296, 304, §3º, e 932, III. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.701.403/RS; TJ-MT, AI nº 1000584-67.2023.8.11.0000; TJ-MT, AI nº 1002476-84.2018.8.11.0000; TJ-MT, AI nº 1030315-74.2024.8.11.0000. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, interposto por ALEXANDER DE OLIVEIRA ZANETTE contra decisão proferida nos autos da Ação Declaratória de Nulidade nº 1000054-98.2025.8.11.0095, em trâmite perante o Núcleo de Justiça Digital dos Juizados Especiais, que indeferiu o pedido liminar para suspensão dos efeitos do Auto de Infração nº 5182001424 e do Termo de Embargo nº 5182001524, lavrados pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso (SEMA). Em suas razões recursais, o agravante sustenta a ocorrência de prescrição intercorrente e da pretensão punitiva da Administração Pública, argumentando que os fatos que ensejaram a autuação teriam ocorrido em 2019, enquanto o auto de infração somente foi lavrado em 2024. Alega, com base no art. 1º, §2º, da Lei nº 9.873/99, c/c art. 109, V, do Código Penal, que seria aplicável o prazo prescricional penal de 4 (quatro) anos, considerando que a pena máxima para o tipo penal análogo (art. 46 da Lei nº 9.605/98) é de um ano. Argumenta, ainda, que a manutenção do embargo sobre sua propriedade gera impedimentos ao acesso a linhas de crédito, financiamentos, comercialização de produtos e aquisição de insumos, comprometendo a viabilidade econômica de sua atividade e causando-lhe prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação. Por tais motivos, requereu a concessão de efeito suspensivo ao recurso, para que fossem imediatamente suspensos os efeitos do Auto de Infração e do Termo de Embargo (Id 267043270). Em decisão de Id 269909292, a Desembargadora Maria Aparecida Ribeiro, em análise do pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, indeferiu a liminar pleiteada. Fundamentou que, diversamente do alegado pelo agravante, o Auto de Infração mencionava infrações ambientais ocorridas nos anos de 2021 e 2023, e não apenas em 2019, o que afastaria a alegada prescrição. Consignou também que não haveria comprovação concreta do periculum in mora, destacando a ausência de elementos objetivos que demonstrassem a inviabilidade econômica decorrente das restrições administrativas. Devidamente intimado, o Estado de Mato Grosso não apresentou contraminuta, conforme certificado nos autos (Id 283446356). O Ministério Público Estadual, em parecer de Id 288382387, manifestou-se pelo desprovimento do recurso, argumentando que: a tese de prescrição não encontra respaldo na jurisprudência do TJMT, fixada em IRDR sobre a matéria (Incidente nº 1012668-37.2022.8.11.0000); o Auto de Infração menciona fatos ocorridos em 2019, 2021 e 2023, não tendo transcorrido o prazo prescricional; não haveria comprovação de paralisação do processo administrativo por prazo superior a três anos, afastando a prescrição intercorrente; e não restaram demonstrados prejuízos concretos advindos da manutenção do embargo. É o relatório. Decido. DA POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO MONOCRÁTICO. Inicialmente, cumpre ressaltar que, embora a regra geral seja o julgamento colegiado dos recursos, o art. 932, III, do Código de Processo Civil autoriza o relator a não conhecer, monocraticamente, de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida. Especificamente quanto à perda superveniente do objeto, ocorre quando, no curso do processo, surge fato novo que torna desnecessário ou impossível o julgamento do mérito do recurso, uma vez que a tutela jurisdicional postulada já não pode mais ser prestada de forma útil ao recorrente. Tal previsão normativa concretiza o princípio da economia processual e da duração razoável do processo, evitando o dispêndio desnecessário de recursos e tempo com a tramitação de um recurso que já não tem mais finalidade prática, contribuindo para a racionalização da atividade jurisdicional. DA PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO DO RECURSO. No caso em exame, após consulta ao Sistema PJe de primeiro grau, verifica-se que foi proferida sentença nos autos da ação originária (Processo nº 1000054-98.2025.8.11.0095), em 29 de maio de 2025, que julgou improcedentes todos os pedidos formulados pelo autor, ora agravante, tendo sido interposto recurso de apelação, que se encontra pendente de julgamento. A referida sentença examinou de forma exaustiva todas as questões deduzidas na ação originária, inclusive as que são objeto do presente agravo de instrumento, notadamente a alegação de prescrição da pretensão punitiva e as supostas nulidades do processo administrativo ambiental. Na ocasião, o juízo a quo rejeitou a tese prescricional, fundamentando que, conforme jurisprudência consolidada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso no IRDR nº 1012668-37.2022.8.11.0000, aplica-se à matéria o prazo prescricional quinquenal previsto no Decreto Estadual nº 1.986/2013. Destacou também que as infrações constatadas ocorreram em datas distintas (2019, 2021 e 2023), conforme demonstrado no Auto de Infração nº 5182001424 e no Relatório Técnico Nº 0000011627, de modo que não teria transcorrido o prazo prescricional entre o último fato e a lavratura do auto em 2024. Além disso, a sentença reconheceu a legalidade dos procedimentos administrativos adotados pela SEMA no exercício regular do poder de polícia ambiental. Diante desse cenário, é forçoso reconhecer a perda superveniente do objeto do presente agravo de instrumento. Isso porque a superveniência da sentença de mérito no processo principal absorve e substitui a decisão interlocutória que indeferiu a tutela provisória, tornando prejudicada a análise do recurso que visava apenas à reforma da decisão liminar. A jurisprudência Desta Corte já consolidou o entendimento no sentido de que a superveniência da sentença de mérito absorve a decisão interlocutória combatida, tornando prejudicada a análise do agravo de instrumento que a impugna: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA NO PROCESSO PRINCIPAL. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. RECURSO NÃO CONHECIDO. I. Caso em exame: 1. Agravo de Instrumento interposto pelo Estado de Mato Grosso contra decisão que concedeu liminar em Mandado de Segurança impetrado por Uarlei Ribeiro da Costa. Após a interposição do recurso, sobreveio sentença no processo principal. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o Agravo de Instrumento perdeu seu objeto em razão da superveniência de sentença no processo principal. III. Razões de decidir 3. É entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça que a prolação de sentença no processo principal acarreta a perda de objeto do Agravo de Instrumento interposto contra decisão interlocutória . 4. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso alinha-se a esse entendimento, reconhecendo a perda superveniente do objeto do Agravo de Instrumento quando proferida sentença na ação originária. 5. No caso concreto, a superveniência de sentença no Mandado de Segurança esvaziou o interesse recursal do agravante, tornando prejudicada a análise do Agravo de Instrumento . IV. Dispositivo e tese 6. Agravo de Instrumento não conhecido, em razão da perda superveniente do objeto. Tese de julgamento: "O Agravo de Instrumento interposto contra decisão interlocutória perde seu objeto quando sobrevém sentença no processo principal, devendo o recurso não ser conhecido em razão da perda superveniente do interesse recursal ." Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 932, III. Jurisprudência relevante citada: STJ - REsp 1701403/RS; TJ-MT - AI 10005846720238110000; TJ-MT - AI 10024768420188110000 MT. (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10192571120238110000, Relator.: LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Data de Julgamento: 24/09/2024, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 28/09/2024 – destaquei.) “AGRAVO DE INSTRUMENTO C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – EXECUÇÃO FISCAL – DECISÃO QUE REJEITOU A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA RECURSAL (EFEITO ATIVO) – DEFERIMENTO - JUÍZO DE RETRATAÇÃO - SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE MÉRITO – PERDA DO OBJETO – JULGAMENTO PREJUDICADO. Segundo orientação da jurisprudência emanada do Tribunal da Cidadania, por ensejar a perda de objeto, a reconsideração da decisão agravada com a superveniência de sentença de mérito prolatada na ação de base torna prejudicado o julgamento do recurso de agravo de instrumento.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10303157420248110000, Relator.: MARIA APARECIDA RIBEIRO, Data de Julgamento: 22/01/2025, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 28/01/2025 – destaquei). É imperioso destacar que a perda de objeto do agravo de instrumento ocorre independentemente do conteúdo da sentença proferida na ação originária (seja ela procedente ou improcedente) e da interposição de recurso contra essa sentença. Isso porque a decisão final incorpora e substitui a tutela provisória anteriormente concedida ou negada. Com a prolação da sentença, a medida antecipatória perde sua autonomia e deixa de produzir efeitos próprios, passando a prevalecer, de forma integral, o conteúdo do comando jurisdicional definitivo. Nesse contexto, o agravo de instrumento interposto contra decisão que trata de tutela provisória torna-se prejudicado com a posterior prolação da sentença, independentemente do teor do seu dispositivo. Ou seja, pouco importa se a decisão final manteve, reformou ou concedeu a tutela anteriormente indeferida, pois a sentença substitui integralmente a decisão interlocutória impugnada. Tal entendimento tem amparo no próprio sistema de tutelas provisórias delineado pelo Código de Processo Civil, especialmente em seu art. 296, que estabelece o caráter provisório e revogável das medidas concedidas em cognição sumária, e no art. 304, §3º, segundo o qual "a tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação". O dispositivo evidencia a relação de subordinação da tutela provisória à tutela definitiva, que a absorve e substitui assim que proferida. No caso concreto, a sentença de mérito proferida na ação originária, que julgou improcedentes os pedidos do autor, ora agravante, substituiu e absorveu por completo a decisão interlocutória que indeferiu a tutela provisória, esvaziando o conteúdo e a finalidade do presente agravo de instrumento. A pendência de julgamento do recurso de apelação não modifica essa conclusão, pois, como salientado, a perda de objeto do agravo ocorre com a mera prolação da sentença, independentemente de seu trânsito em julgado. Assim, tendo em vista que o presente agravo de instrumento tinha por objeto exclusivamente a reforma da decisão que indeferiu o pedido de tutela provisória, e considerando que essa decisão foi completamente absorvida pela sentença de mérito superveniente, impõe-se o reconhecimento da perda de objeto do recurso e, consequentemente, sua extinção sem resolução de mérito. Em face do exposto, com fundamento no art. 932, inciso III, c/c art. do Código de Processo Civil, NÃO CONHEÇO do presente agravo de instrumento, em razão da perda superveniente de interesse recursal, decorrente da prolação de sentença nos autos da ação originária (Processo nº 1000054-98.2025.8.11.0095). Comunique-se ao juízo de primeiro grau. Transitada em julgado esta decisão, arquivem-se os autos com as baixas e anotações necessárias. Publique-se. Intimem-se. JONES GATTASS DIAS Desembargador Relator

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Maria Auxiliadora Trindade x Serasa S.A.

ID: 316530469

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1013382-97.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

MARIA AUXILIADORA TRINDADE

Polo Passivo:

SERASA S.A.

Sentença

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LEAL TADEU DE QUEIROZ

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1013382-97.2024.8.11.0041. REQUERENTE: MARIA AUXILIADORA TRINDADE REQUERIDO: SERASA S.A. VISTOS. Trata-se de Ação Dec… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1013382-97.2024.8.11.0041. REQUERENTE: MARIA AUXILIADORA TRINDADE REQUERIDO: SERASA S.A. VISTOS. Trata-se de Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais proposta por MARIA AUXILIADORA DA TRINDADE, em face da SERASA S.A. No id. 194803284, este Juízo proferiu a seguinte decisão saneadora: “Nos termos do art. 357, caput e incisos, do Código de Processo Civil, passo a SANEAR O FEITO. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. Em primeiro momento, é fato que a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela requerida, sob o argumento de que atua apenas como arquivista das informações prestadas por terceiros, sendo sua atividade meramente de recepção, armazenamento e disponibilização de dados, sem qualquer ingerência quanto à veracidade ou legitimidade da inscrição, não merece prosperar. Pois, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (SJT) já está pacificada no sentido de que as entidades mantedoras de cadastro de inadimplentes possuem o dever de observar cuidados mínimos na inclusão de dados negativos, especialmente quanto à existência de elementos que indiquem a regularidade da cobrança, sob pena de responderem solidariamente pelos danos causados ao consumidor. Portanto, deve ser reconhecida a responsabilidade objetiva dos órgãos de proteção ao crédito por manutenção de registros indevidos. Elucida o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJMT): DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DO SERASA. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. EMBARGOS REJEITADOS. I. CASO EM EXAME. Embargos de declaração opostos por Serasa S.A. contra acórdão que rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva e reconheceu a responsabilidade civil por inclusão indevida do nome da parte autora em cadastro de inadimplentes, com fundamento na responsabilidade objetiva prevista no CDC. A embargante sustentou que atuou apenas como depositária de informações oriundas de cartório e, por isso, não poderia ser responsabilizada. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO. A questão em discussão consiste em saber se o acórdão deixou de se manifestar sobre a alegada ausência de responsabilidade da Serasa S.A., o que configuraria omissão passível de correção por meio de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR. Não há omissão na decisão embargada, pois o acórdão enfrentou expressamente a preliminar de ilegitimidade passiva, reconhecendo a responsabilidade objetiva dos órgãos de proteção ao crédito por manutenção de registros indevidos. A decisão embargada destacou que, mesmo sendo a Serasa mera depositária das informações, subsiste o dever de conferir a veracidade e correção dos dados divulgados, sendo presumido o dano em razão da indevida negativação. IV. DISPOSITIVO E TESE. Embargos de declaração rejeitados. Tese de julgamento: “Não configura omissão o acórdão que expressamente analisa e afasta a preliminar de ilegitimidade passiva. A empresa responsável por cadastro de inadimplentes responde objetivamente pela inclusão indevida de dados, ainda que repassados por terceiro." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 93, IX; CPC, arts. 489, § 1º, e 1.022; CDC, arts. 6º, VIII, 14, § 3º, II, e 20, § 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 1307477/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 07.02.2019; TJMT, RAC nº 9614/2010, 5ª Câm. Cív., Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 14.04.2010. (N.U 1002476-39.2023.8.11.0023, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 05/04/2025). Nesse sentido, REJEITO a preliminar arguida. VALOR DA CAUSA. No que concerne a impugnação ao valor dado à causa, denota-se que a parte autora pleiteia a declaração de nulidade de dívida decorrente de anotação prescrita registrada no sistema de análise de crédito do Banco Central (SCR – SISBACEN), no valor de R$ 2.228,80 (dois mil, duzentos e vinte e oito reais e oitenta centavos), referente aos contratos nº 0000313063202303, 0000313063202304, 0000313063202305, Ao atribuir o valor da causa, a requerente realizou a soma do débito ao pedido de indenização por danos morais e materiais sofridos. Destarte, nesse caso, o valor da causa ocorreu com observância ao que preceitua o artigo 292, incisos V e VI, do CPC. Confira-se: RECURSO INOMINADO Nº 1024760-73.2024.8.11.0001. ORIGEM: 1º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ RECORRENTE: ANTONIO DA COSTA SOUZARECORRIDO: MOVIDA LOCACAO DE VEICULOS S.A., BV LEASING - ARRENDAMENTO MERCANTIL S.A. JUIZ RELATOR: ARISTEU DIAS BATISTA VILELLADATA DO JULGAMENTO: 02/12 a 05/12/2024 ( PLENÁRIO VIRTUAL) SÚMULA DO JULGAMENTORECURSO INOMINADO –AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS- LOCAÇÃO DE VEÍCULO-COBRANÇA INDEVIDA- PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALOR DE FORMA DOBRADA- AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ- PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALOR DE FORMA SIMPLES- INOCORRÊNCIA DE INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES - MERA COBRANÇA INDEVIDA - AUSÊNCIA DE PROVAS QUE DEMONSTREM OCORRÊNCIA DE COBRANÇA INSISTENTE, VEXATÓRIA OU ABUSIVA – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO-SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. PRELIMINAR DE IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA A parte reclamada impugna o valor atribuído à causa por entendê-lo excessivo, contudo, o valor não apresenta descompasso com os pedidos contidos da inicial e atende os requisitos do art. 292, V e VI do CPC. Outrora, o valor não apresenta discordância com os pedidos contidos na inicial e atende os requisitos previstos no Código de Processo Civil. Logo, inexiste óbice para que seja alterado, razão pela qual afasto a preliminar arguida. Inexistindo outras preliminares, e não havendo qualquer questão prejudicial a ser apreciada ou irregularidade a ser expurgada, DOU POR SANEADO O PROCESSO, passando à organização de sua instrução. A par disso, FIXO as seguintes questões fáticas/jurídicas como pontos controvertidos: a) A existência ou não do débito apontado pela parte requerida como fundamento da inscrição do nome da parte autora no sistema SRC-SISBACEN; b) A regularidade ou não da referida inscrição no sistema mantido pelo Banco Central (SRC-SISBACEN); c) A ocorrência ou não de eventual falha na prestação do serviço, com responsabilidade da requerida; d) A existência ou não de dano moral decorrente da inscrição no sistema SRC-SISBACEN. Na hipótese, a parte autora busca a declaração de inexistência do débito e ter reparados os danos decorrentes desse fato, de modo que é evidente sua hipossuficiência em relação ao requerido para a comprovação das mencionadas alegações, não se apresentando razoável impor a parte autora a realização de prova negativa quando o réu é quem detém os documentos relativos à suposta relação jurídica firmada, razão pela declaro a inversão do ônus da prova, na forma do art. 6º, inciso VIII, do CDC. No mais, quanto ao pedido de depoimento pessoal do autor, entendo que a presente ação demanda unicamente da produção de prova documental, razão pela qual INDEFIRO o pedido de designação de audiência de instrução, formulado pelo requerido. Publique-se esta decisão e, decorrido o prazo, retornem os autos conclusos para sentença, devendo ser observada a ordem cronológica dos julgamentos conforme estabelecida no art. 12 do CPC. Às providências. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário.” Os atos foram devidamente expedidos. Após os autos vieram conclusos para sentença. É o relatório. Decido. Cuida-se de Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais proposta por MARIA AUXILIADORA DA TRINDADE, em face da SERASA S.A., alegando que ao tentar realizar compras no comércio local, foi surpreendida com a informação de que seu nome constava como negativado junto aos cadastros de proteção ao crédito. Diante dessa informação, procedeu à consulta do seu CPF e, para sua surpresa, constatou a existência de uma anotação restritiva referente a um débito no valor de R$ 2.228,80, originado de três contratos identificados pelos números 0000313063202303, 0000313063202304 e 0000313063202305, oriunda com a ré. Alega, ainda, que não reconhece a origem da dívida e jamais firmou qualquer relação contratual que pudesse ter ensejado a inscrição de seu nome nos órgãos de restrição ao crédito. Afirma, ainda, que não recebeu qualquer cobrança, aviso ou boleto relacionado aos débitos supostamente existentes, reforçando o argumento de que não houve contratação válida com a entidade responsável pelo apontamento. Por fim, relata que a inclusão de seu nome nos cadastros restritivos tem lhe causado significativos prejuízos de ordem moral e patrimonial, especialmente por ter comprometido sua imagem e impedido o acesso ao crédito, razão pela qual busca judicialmente a declaração de inexistência do débito e a reparação pelos danos morais sofridos. Pois bem. Da análise dos autos, verifico que a presente demanda foi proposta por MARIA AUXILIADORA DA TRINDADE, visando à declaração de inexistência de um suposto débito no valor de R$ 2.228,80, vinculado aos contratos nº 0000313063202303, 0000313063202304 e 0000313063202305, cuja origem e contratação são expressamente desconhecidas pela autora. Afirma a parte autora que tais dívidas ensejaram a inclusão indevida de seu nome nos cadastros de inadimplentes, especificamente administrados pela empresa demandada, SERASA S.A., razão pela qual busca a tutela jurisdicional para reconhecimento da inexistência da dívida, exclusão do apontamento negativo e indenização por danos morais. Todavia, conforme se depreende do exame técnico e jurídico da demanda, é possível identificar que a controvérsia central reside na inexistência de relação contratual entre a autora e o suposto credor originário, identificado nos autos como ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGISA, portanto, a verdadeira detentora do crédito impugnado. Importante, ressaltar que, embora em momento anterior tenha sido proferida decisão de saneamento na qual rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela parte ré, em nova análise, mais aprofundada dos elementos constantes dos autos, à luz do amadurecimento da instrução e da jurisprudência consolidada sobre a matéria, impõe o reconhecimento da ilegitimidade passiva da SERASA S.A., por ausência de vínculo jurídico-material com a relação contratual discutida. Nesse cenário, a empresa SERASA S.A. não figura como parte na relação contratual do débito, bem como não detém a titularidade do crédito em questão, não atua como endossatária ou cessionária, e tampouco é responsável pela origem ou cobrança do débito. Trata-se, tão somente, de instituição mantenedora de banco de dados, cuja atuação consiste em armazenar e divulgar informações repassadas por terceiros, no caso a ENERGISA MATO GROSSO, como prevê a Lei n.º 12.414/2011 (Lei do Cadastro Positivo), sem que lhe caiba avaliar a validade ou veracidade da relação obrigacional subjacente. Neste, sentido, a jurisprudência pátria é assente no sentido de que os órgãos de proteção ao crédito, a exemplo da SERASA S.A., não possuem legitimidade passiva para figurar no polo das demandas judiciais que visam discutir a existência ou a validade de relação contratual entre o consumidor e o suposto credor, porquanto atuam unicamente como repositórios de dados fornecidos por terceiros. Somente se excepciona tal entendimento quando demonstrada falha funcional atribuível diretamente à entidade mantenedora do banco de dados, o que, não é o caso. “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. DANO MORAL. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA QUE RECONHECEU A ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SERASA. O SERASA, na condição de mero banco de dados, se limita a reproduzir as informações que constam dos cadastros restritivos, e, portanto, não é responsável pela exatidão dessas informações. É pacífico que não compete à apelada verificar a veracidade de tais informações, principalmente por não ter acesso à relação negocial que ensejou o pedido de inclusão, considerando que a responsabilidade por tal ato é única e exclusiva da empresa que requer a negativação. Precedentes do STJ e TJRJ. Manutenção da sentença. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.” (TJ-RJ - Apelação Cível: 0049929-96.2020.8.19.0001, Rel. Desª Helda Lima Meireles, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 01/03/2021, pub. 08/03/2021)” Neste caso, o autor não alega qualquer conduta culposa ou omissiva por parte da ré que pudesse fundamentar a sua responsabilização, tais como: ausência de notificação prévia, manutenção indevida após ordem judicial, erro operacional ou falha no procedimento de baixa de apontamento. O questionamento se dirige, exclusivamente, à origem do débito e à inexistência do vínculo contratual, o que impõe necessariamente a inclusão no polo passivo da empresa credora responsável pelo lançamento da negativação, no caso identificado como ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA, que sequer integra a presente lide. Dessa forma, torna-se manifesta a ausência de legitimidade passiva da SERASA S.A., porquanto ausente qualquer relação jurídica de direito material que a vincule ao objeto da demanda. A ausência de pertinência subjetiva entre a ré e o litígio inviabiliza o prosseguimento da demanda em seu desfavor, ante a falta de um dos pressupostos processuais específicos da ação. Diante do exposto, RECONHEÇO a ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM da ré SERASA S.A., e, por conseguinte, JULGO EXTINTO o feito, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, 03 de julho de 2025. Ana Cristina Silva Mendes. Juíza de Direito

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou o que procurava? Faça login para ver mais resultados e detalhes completos.

Fazer Login para Ver Mais

Processo nº 1002476-07.2022.8.11.0045

ID: 312521775

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1002476-07.2022.8.11.0045

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

YAM MATHEUS DE SANTANA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

SUZANA BATISTA DA SILVA OLIVEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1002476-07.2022.8.11.0045. REQUERENTE: YAM MATHEUS DE SANTANA REQUERIDO: ESTADO DE MATO GROSSO Vistos etc… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1002476-07.2022.8.11.0045. REQUERENTE: YAM MATHEUS DE SANTANA REQUERIDO: ESTADO DE MATO GROSSO Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, MATERIAL E ESTÉTICO ajuizada por YAM MATHEUS DE SANTANA em face do ESTADO DE MATO GROSSO, ambos devidamente qualificados nos autos. Alega a parte autora que, em 30/04/2019, enquanto estava custodiado no presídio de Lucas do Rio Verde/MT, foi atingido por um tiro de bala de borracha em seu olho direito, ocasionando lesão de natureza gravíssima e resultando na perda total da visão nesse olho. Refere, ainda, que seus pais só souberam do ocorrido uma semana depois, quando familiares de outros detentos os informaram, sendo que apenas após a visita de sua advogada é que passou a receber tratamento adequado. Nesse cenário, discorre sobre a ilicitude do ato praticado pelos agentes do Estado e os danos advindos de tal conduta, os quais resultaram em danos morais, estéticos e materiais, estes configurados pela redução de sua capacidade laborativa. Por tais fundamentos, pugna pelo reconhecimento da responsabilidade objetiva do requerido e requer a procedência dos pedidos para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), danos estéticos no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e pensão vitalícia correspondente a um salário mínimo em razão da redução da capacidade laborativa. Com a inicial, juntou documentos, incluindo prontuários médicos e laudos que atestam a lesão sofrida. Recebida a inicial e deferida a gratuidade da justiça (ID 85413376). O Estado de Mato Grosso apresentou contestação (ID 89164970), alegando, em síntese: (i) inexistência de comprovação de responsabilidade objetiva do estado; (ii) improcedência do pedido de danos materiais e lucros cessantes por ausência de provas de que o autor já trabalhava antes do incidente e de que a lesão impossibilitou sua inserção no mercado de trabalho; (iii) que a perda do globo ocular não enseja indenização por danos estéticos; (iv) que não há redução da capacidade laborativa, uma vez que o autor nunca trabalhou; (v) que o autor participava de um motim no presídio quando foi atingido pela bala de borracha, havendo, portanto, culpa concorrente pelo dano sofrido; (vi) que o valor pleiteado a título de danos morais é excessivo. O réu sustenta ainda que o autor foi prontamente atendido após o incidente, sendo encaminhado ao Hospital São Lucas e posteriormente transferido para Cuiabá para tratamento especializado. Impugnação à contestação (ID 109857489). Decisão de saneamento do processo (ID 119551355). Instadas as partes sobre o interesse na produção de outras provas (ID. 166280935), o requerido requer o julgamento antecipado do feito (ID. 167026890), enquanto a parte autora não manifestou nos autos (ID. 172028653). Vieram os autos conclusos. É o sucinto relatório. Fundamento e Decido. De pronto, importa mencionar que a responsabilidade civil do Estado está consagrada no art. 37, §6º, da Constituição Federal, que estabelece: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa." Trata-se de responsabilidade objetiva, que prescinde da demonstração de culpa ou dolo, bastando a comprovação do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. No caso em comento, é incontroverso que o autor foi atingido por uma bala de borracha disparada por agente penitenciário enquanto se encontrava sob a custódia do Estado no presídio de Lucas do Rio Verde/MT, consoante documentos médicos acostados aos autos, em especial o prontuário do Hospital São Lucas (ID 83494889) e a ficha de regulação do paciente (ID. (ID 83494882), os quais informam “trauma de globo ocular por projetil de borracha com lesão contusa em pálpebra e perda de humor vítreo”. Observa-se que o Estado não nega o fato em si, mas alega que o disparo de bala de borracha ocorreu para conter um motim do qual o autor participava, havendo culpa concorrente da vítima. Entretanto, o réu não produziu prova convincente de que o autor efetivamente participava de um motim. O ofício nº 10117/2022 (ID. 91481860) sobre a localização do autor no momento do incidente. Além disso, o conceito de motim pressupõe uma revolta organizada por grupo numeroso de pessoas, e não há evidências nos autos de que havia tal organização, tampouco que o autor tenha agido de forma a justificar o uso de força letal direcionada ao seu rosto. Portanto, o Estado de Mato Grosso falhou no seu dever constitucional de garantir a integridade física do detento sob sua custódia, sendo objetivamente responsável pelo dano causado ao autor. Diante desse contexto, postula o autor a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais, estéticos e material, este caracterizado pelo pensionamento vitalício em decorrência da redução da capacidade laborativa. No que diz com o dano moral, resta caracterizado in re ipsa, ou seja, decorre do próprio fato, ou seja, lesão no olho suportada pelo autor enquanto sob a custódia do Estado, situação que causa sofrimento físico e psíquico no agente, não havendo prova de que tenha contribuído para a ocorrência do fato. O sofrimento causado pela lesão ocular, a dor física, o tratamento médico ao qual foi submetido são circunstâncias que, por si só, caracterizam abalo moral passível de indenização. Contudo, embora o autor alegue ter ocorrido a perda da visão, nada há nos autos que corrobore sua afirmação, porquanto os documentos que instruem a inicial, datados da época do fato (abril de 2019 – ID. 83494889) apenas informam trauma de globo ocular por projetil de borracha com lesão contusa em pálpebra e perda de humor vítreo. Ressalto, ainda, que a parte autora, embora intimada sobre o interesse na produção de prova, manteve-se silente. Logo, não há nos autos prova capaz de comprovar a alegada perda da visão pelo autor. Desta feita, a apuração do quantum indenizatório deve considerar a gravidade do dano, a repercussão do fato na vida do ofendido, sua idade, condição social e econômica, bem como o caráter pedagógico da indenização. Nesse sentido, tenho que o valor pleiteado (R$ 300.000,00) mostra-se excessivo diante dos parâmetros jurisprudenciais para casos similares. Cumpre salientar que em situações de perda da visão de um olho, os Tribunais têm fixado indenizações que variam entre R$ 30.000,00 e R$ 100.000,00, conforme as particularidades de cada caso. Considerando a espécie de lesão, a ausência de prova de sequelas, a idade do autor na época dos fatos, o fato de estar sob custódia do Estado, e o caráter pedagógico da medida, fixo a indenização por danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor que considero adequado e proporcional às circunstâncias do caso concreto. Com relação ao dano estético, correspondem a lesões que deixam marcas permanentes no corpo ou que diminuam sua funcionalidade como: cicatrizes, sequelas, deformidades ou outros problemas que causem mal estar ou insatisfação. Como já referido anteriormente, a parte autora não comprova que em decorrência do ocorrido tenha resultado com cicatriz ou deformidade aparente, razão pela qual não faz jus à reparação postulada. Nesse sentido, veja-se o seguinte julgado: E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C LUCROS CESSANTES, PERDAS E DANOS DECORRENTE DE ACIDENTE COM FOGOS DE ARTIFICIO – PARCIAL PROCEDENCIA – RESPONSABILIDADE CIVIL COMPROVADA – DANO MATERIAL – NÃO COMPROVAÇÃO – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – DANO ESTÉTICO – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM DANO MORAL – SÚMULA 387 DO STJ – COMPROVAÇÃO – LESÃO FÍSICA DE CARÁTER PERMANENTE – LESÃO TOTAL NO OLHO ESQUERDO – DANO MORAL E DANO ESTÉTICO – VALORES ARBITRADOS EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – MANUTENÇÃO – PENSÃO VITALÍCIA – ART. 950 DO CÓDIGO CIVIL – INDEVIDA – REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA – RETORNO ÀS FUNÇÕES HABITUAIS SEM DESCRÉSCIMO NA SUA REMUNERAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Demonstrado que responsabilidade pelo acidente se deu por culpa exclusiva dos requeridos, ora apelantes, ao utilizar-se de fogos de artifício na tradicional festa e estourá-los de maneira a causar risco e prejuízos aos presentes no evento, dando causa aos danos à autora. Apesar de a autora comprovar que foi submetida a tratamento médico no seu olho esquerdo, em razão do acidente, não fez prova das despesas médicas despendidas por ela, devendo ser excluída a indenização por danos materiais . Não faz jus à pensão vitalícia à autora que após sofrer o acidente, com a perda total da visão do olho esquerdo, retorna às suas funções habituais, sem sofrer descrécimo na sua remuneração. No que tange aos danos morais, nao há dúvida acerca do seu cabimento, isso porque por força do evento a autora teve sua visão do olho esquerdo comprometida, com perda total da visão, que acompanhara a vítima em toda sua existência, com efeito estético negativo, afetando a sua imagem e autoestima, resultando em sentimentos de contransgimento, dor, aflição, isso sem contar o sofrimento causado diretamente pelo evento, com queimadura e submissão a longo tratamento médico. Dano estético pode ser cumulado com dano moral, nos termos da Súmula nº 387 do STJ. A lesão permanente no olho esquerdo, com a perda total da visão, constitui em dano estético passível de reparação . Os valores arbitrados para reparação dos danos morais (R$ 40.000,00) e danos estéticos (R$ 40.000,00) devem ser mantidos, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Não constatando o excesso na fixação do valor, há que ser mantido o valor fixado na sentença .- (TJ-MT 00033983120128110008 MT, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 05/10/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/10/2022) Indevido, portanto, o pedido de indenização por dano estético. No mesmo sentido quanto ao pedido de pensionamento, cujo fundamento diz com a perda da visão do olho lesionado, fato que não restou minimamente demonstrado nos autos. Nos termos do art. 950 do Código Civil: "Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu." Para que seja devida a pensão por redução da capacidade laborativa, é necessária a comprovação de que a lesão efetivamente prejudicou o exercício da atividade profissional anteriormente desempenhada pela vítima ou impediu o desenvolvimento de atividade para a qual estava se preparando. No caso dos autos, o autor não comprovou que exercia atividade laborativa antes do acidente, nem que estava se preparando para determinada profissão que tenha sido inviabilizada. Os documentos juntados aos autos, em especial a Carteira de Trabalho (IDs 83494842 e 83494846), não indicam registro de emprego anterior. Ademais, mesmo quando demonstrada a perda da visão de um olho a jurisprudência reconhece que a visão monocular não impede o desempenho da maioria das atividades laborais, salvo aquelas que exijam acuidade visual binocular específica, situação que resulta na improcedência do pedido de pensionamento. Sobre tema: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C LUCROS CESSANTES, PERDAS E DANOS DECORRENTE DE ACIDENTE COM FOGOS DE ARTIFICIO – PARCIAL PROCEDENCIA – RESPONSABILIDADE CIVIL COMPROVADA – DANO MATERIAL – NÃO COMPROVAÇÃO – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – DANO ESTÉTICO – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM DANO MORAL – SÚMULA 387 DO STJ – COMPROVAÇÃO – LESÃO FÍSICA DE CARÁTER PERMANENTE – LESÃO TOTAL NO OLHO ESQUERDO – DANO MORAL E DANO ESTÉTICO – VALORES ARBITRADOS EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – MANUTENÇÃO – PENSÃO VITALÍCIA – ART. 950 DO CÓDIGO CIVIL – INDEVIDA – REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA – RETORNO ÀS FUNÇÕES HABITUAIS SEM DESCRÉSCIMO NA SUA REMUNERAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Demonstrado que responsabilidade pelo acidente se deu por culpa exclusiva dos requeridos, ora apelantes, ao utilizar-se de fogos de artifício na tradicional festa e estourá-los de maneira a causar risco e prejuízos aos presentes no evento, dando causa aos danos à autora. Apesar de a autora comprovar que foi submetida a tratamento médico no seu olho esquerdo, em razão do acidente, não fez prova das despesas médicas despendidas por ela, devendo ser excluída a indenização por danos materiais. Não faz jus à pensão vitalícia à autora que após sofrer o acidente, com a perda total da visão do olho esquerdo, retorna às suas funções habituais, sem sofrer descrécimo na sua remuneração. No que tange aos danos morais, nao há dúvida acerca do seu cabimento, isso porque por força do evento a autora teve sua visão do olho esquerdo comprometida, com perda total da visão, que acompanhara a vítima em toda sua existência, com efeito estético negativo, afetando a sua imagem e autoestima, resultando em sentimentos de contransgimento, dor, aflição, isso sem contar o sofrimento causado diretamente pelo evento, com queimadura e submissão a longo tratamento médico. Dano estético pode ser cumulado com dano moral, nos termos da Súmula nº 387 do STJ. A lesão permanente no olho esquerdo, com a perda total da visão, constitui em dano estético passível de reparação . Os valores arbitrados para reparação dos danos morais (R$ 40.000,00) e danos estéticos (R$ 40.000,00) devem ser mantidos, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Não constatando o excesso na fixação do valor, há que ser mantido o valor fixado na sentença). (TJ-MT 00033983120128110008 MT, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 05/10/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/10/2022) Outrossim, verifica-se que não foi realizada perícia médica para aferir o grau exato da redução da capacidade laborativa do autor, o que seria imprescindível para eventual fixação de pensão. Portanto, ante a ausência de prova da perda da visão e sequelas que carretassem na efetiva redução da capacidade laborativa e seu impacto concreto na vida profissional do autor, não há como acolher o pedido de pensão vitalícia. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR o ESTADO DE MATO GROSSO ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos monetariamente pelo IPCA-E a partir da data desta sentença (Súmula 362 do STJ) e acrescidos de juros de mora pela taxa SELIC a partir do evento danoso (30/04/2019), nos termos do art. 398 do Código Civil e das Súmulas 43 e 54 do STJ, observando-se a sistemática de juros e correção monetária aplicável à Fazenda Pública, conforme definido pelo STF no RE 870947. Tendo em vista a sucumbência mínima do requerido, condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (doze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, I, do CPC, suspensa a exigibilidade, pois beneficiário da gratuidade da justiça. Sentença não sujeita a reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, II, do CPC, por não exceder a condenação a 500 (quinhentos) salários mínimos. P.R.I.C. Após o trânsito em julgado, não havendo manifestação das partes, arquive-se com as baixas e anotações necessárias. Às providências. Sorriso/MT, datado e assinado digitalmente. Paula Saide Biagi Messen Mussi Casagrande Juíza de Direito designada para o NAE Portaria TJMT/CM n. 103 de 8 de janeiro de 2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0000695-16.2010.8.11.0003

ID: 319646858

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000695-16.2010.8.11.0003

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

MONGERAL AEGON SEGUROS E PREVIDENCIA S/A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

EDUARDO CHALFIN

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000695-16.2010.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Seguro, Indenização do Prejuízo] Relator: Des(… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000695-16.2010.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Seguro, Indenização do Prejuízo] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [MAURO AUGUSTO SANTOS DE OLIVEIRA - CPF: 353.513.491-91 (APELADO), WILSON MOLINA PORTO - CPF: 395.103.281-20 (ADVOGADO), MONGERAL AEGON SEGUROS E PREVIDENCIA S/A - CNPJ: 33.608.308/0001-73 (APELANTE), EDUARDO CHALFIN - CPF: 689.268.477-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E PRESCRIÇÃO. REJEITADAS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. NEGATIVA DA SEGURADORA SOB ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE COBERTURA E RESPONSABILIDADE. DEVER DE INDENIZAÇÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Devidamente demonstrada a relação jurídica entre a parte autora e a requerida, ora apelante, sendo esta a parte legítima para figurar na ação. “O prazo prescricional para cobrança de seguro de vida é de um ano e o marco inicial é a data da ciência inequívoca da incapacidade.” (N.U 0005270-84.2012.8.11.0007, NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 30/01/2018, publicado no DJE 05/02/2018). Tanto a seguradora, quanto a estipulante ou subestipulante que atuam como intermediárias na contratação de seguro, são partes legítimas e solidárias para responderem pelo pagamento do prêmio de indenização securitária. R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação cível interposta por MONGERAL AEGON SEGUROS E PREVIDENCIA S/A contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis que, nos autos da Ação de Indenização n. 0000695-16.2010.811.0003, promovida por MAURO AUGUSTO SANTOS DE OLIVEIRA, julgou procedente os pedidos da inicial nos seguintes termos: “Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a requerida ao pagamento da indenização securitária ao autor, em razão da constatação da invalidez permanente, no montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Sobre o valor da condenação, deverão incidir juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (23/02/2010), bem como correção monetária pelo INPC/IBGE a contar da data da contratação do seguro (09/06/2006), até o efetivo pagamento. Em decorrência do princípio da causalidade, CONDENO a parte requerida no pagamento das custas e taxas judiciárias, bem como em honorários advocatícios no montante correspondente a 15% (quinze por cento) do valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §2°, incisos I a IV, do NCPC.” Em suas razões recursais, a apelante aponta, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, alegando que na data do sinistro não detinha qualquer responsabilidade pela apólice. Diz que a pretensão está abarcada pelo instituto da prescrição, afirmando que o direito prescreve em 01 (um) ano. No mérito, alega que não houve qualquer vício na prestação do serviço fornecido, excluindo-se a sua responsabilidade nos termos do Art. 14, §3º, inciso I do CPC. Diz ainda, que o contrato não prevê cobertura para invalidez laborativa, mas funcional nos casos de invalidez por acidente e invalidez total por doença. Em suma, pede o acolhimento das preliminares para extinguir o feito, subsidiariamente pede o provimento do recurso para reformar a sentença julgando improcedente a ação. Contrarrazões apresentada no ID 287866853. É o relatório Peço dia para o julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS RELATOR V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara. A) PRELIMINARES I) Ilegitimidade Passiva Quanto à alegada ilegitimidade passiva, sob a alegação de que o contrato em discussão foi cancelado na data de 31/12/2006, não assiste razão a apelante. Como bem destacou o juiz de primeiro grau: “Contudo, ao compulsar os autos, verifica-se que, mesmo após a alegada extinção do contrato de seguro em grupo, a requerida continuou a descontar valores a título de seguro de vida diretamente do contracheque do autor. Conforme demonstram os documentos acostados aos autos, foram realizados descontos no valor de R$ 18,00 (dezoito reais) nos salários referentes ao mês de janeiro de 2007 (id. 76585685 - Pág. 38), janeiro de 2008 (id. 76585685 - Pág. 39), fevereiro de 2008 (id. 76585685 - Pág. 40) e março de 2008 (id. 76585685 - Pág. 41), ou seja, em meses posteriores à data na qual a requerida afirma ter ocorrido o cancelamento do contrato. Dessa maneira, a requerida adota comportamento processual contraditório, ao sustentar, por um lado, a inexistência de qualquer relação jurídica com o autor a partir de 31 de dezembro de 2006 e, por outro, ao auferir vantagem financeira por meio dos descontos realizados diretamente em sua folha de pagamento após essa data. Tal conduta se amolda à vedação do ordenamento jurídico ao comportamento contraditório, consubstanciada no princípio da boa-fé objetiva e na aplicação do brocardo latino "nemo potest venire contra factum proprium", segundo o qual ninguém pode se beneficiar de sua própria torpeza ou adotar posicionamento contraditório em prejuízo de terceiros. Além disso, verifica-se que a requerida não juntou aos autos qualquer documento que demonstre a veracidade de sua alegação de cancelamento definitivo do contrato. [...]” (id. 287866041) Desta forma, restou devidamente demonstrada a relação jurídica entre a parte autora e a requerida, ora apelante, sendo esta a parte legítima para figurar na ação, conforme expressamente previsto no contrato, o qual visa justamente garantir-lhe o recebimento dos valores devidos pelo segurado, sendo a sua responsabilidade. Dessa forma, rejeito a preliminar. II) Prescrição ânua O recorrente sustenta ainda que a pretensão do autor estaria prescrita, pois, o acidente que resultou em sua invalidez foi na data de 24/02/2008 e, por isso, a ação deveria ser movida até 24 de fevereiro de 2009, enquanto que a ação foi promovida somente no ano de 2010. Em se tratando de ação envolvendo contrato de seguro, em que a parte pretende a condenação da seguradora ao pagamento de indenização, é aplicável a prescrição ânua, consoante o que dispõe o artigo 206, §1º, inciso II, alínea “b”, do Código Civil. A sentença recorrida acertadamente pontuou que: “[...] A jurisprudência dos tribunais pátrios, inclusive consolidada na Súmula 278 do Superior Tribunal de Justiça, estabelece que "o termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral". Assim, o prazo prescricional não se inicia na data do acidente, mas sim no momento em que o autor obteve o diagnóstico definitivo sobre a invalidez permanente que lhe acomete. No caso concreto, o conjunto probatório revela que o autor somente teve ciência inequívoca de sua invalidez em 25 de janeiro de 2010, data em que foi emitido o laudo médico conclusivo pelo profissional responsável, documento este acostado aos autos sob o id. 76585685 - Pág. 43. Desse modo, considerando que a ação foi ajuizada em 27 de janeiro de 2010, é evidente que a pretensão indenizatória do autor foi exercida dentro do prazo legal, não havendo que se falar em prescrição. [...]” Fundamento que coaduna com o entendimento deste E. Tribunal: “O prazo prescricional para cobrança de seguro de vida é de um ano e o marco inicial é a data da ciência inequívoca da incapacidade.” (N.U 0005270-84.2012.8.11.0007, NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 30/01/2018, publicado no DJE 05/02/2018). “As ações de cobrança de seguro ajuizadas contra as seguradoras possuem a chamada prescrição ânua, consoante disposto no art. 206, §1º, II, alínea “b”, do C. Civil e súmulas 101 e 278 do STJ, cujo termo inicial se dá no momento da ciência inequívoca da incapacidade laboral. Após o julgamento de recurso repetitivo perante o STJ, tendo como acórdão paradigma o REsp n. 1.388.030/MG, restou firmado o entendimento de que “exceto nos casos de invalidez permanente notória, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico, sendo relativa a presunção de ciência.” (N.U 1002476-54.2018.8.11.0010, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/06/2024, Publicado no DJE 26/06/2024) Portanto, verifica-se que o autor somente tomou conhecimento de sua incapacidade em 25 de janeiro de 2010, conforme Laudo Médico assinalado pelo médico Marcus A. dos Santos (CRM 5374) (id. 287866011 – pg. 43), que atestou que do acidente ocorrido em 24/02/2008, resultou “hoje ao exame física apresenta dor crônica de fluxo extensão, limitação funcional aos esforços, o mesmo esta com debilidade parar exercer as atividades habituais no trabalho”. Portanto, sendo a ação protocolada em 27/01/2010, não há que se falar em prescrição, razão pela qual também rejeito a preliminar. B) MÉRITO A controvérsia gira em torno da negativa de indenização securitária por parte da companhia apelante, sob o argumento de que o segurado, ao tempo do acidente que lhe causou invalidez, não estaria sob a cobertura do contrato em discussão. No caso em concreto, resta incontroverso nos autos a existência do contrato de seguro/apólice, consoante documentos de Id. 287866011 (pg. 42). Igualmente, comprovado a ocorrência do evento danoso (invalidez permanente) em razão do acidente ocorrido em 24/02/2008, da qual somente tomou conhecimento inequívoco na data de 25/01/2010 (laudo médico id. 287866011 - 43), o qual possui cobertura contratual, no importe de R$ 20.000,00, quanto à segurada (Id. 287866011 - 42). Aliás, bem destocou a decisão de primeiro grau: “No curso da instrução processual, restou demonstrado que o autor é titular de um contrato de seguro de vida em grupo, mantido com a requerida, conforme documentação anexada aos autos, a qual comprova o vínculo contratual e os descontos efetuados diretamente em seu contracheque, inclusive após a data em que a seguradora alegou o cancelamento do contrato. Assim, conforme já analisado na apreciação da preliminar de ilegitimidade passiva, há comprovação da relação jurídica entre as partes e da legitimidade da requerida para figurar no polo passivo da demanda. Além disso, a documentação acostada ao feito comprova que o autor preencheu todos os requisitos necessários para o recebimento da indenização securitária. O valor devido a título de indenização por invalidez permanente encontra-se especificado no contrato de seguro, conforme documento anexado ao id. 76585685 - Pág. 42. Ademais, o grau da invalidez restou devidamente atestado por meio do laudo pericial acostado ao id. 108868444, que confirma a incapacidade permanente decorrente do acidente sofrido pelo autor. Dessa forma, restando devidamente comprovados o vínculo contratual, a legitimidade passiva da requerida, o valor da indenização e a caracterização da invalidez permanente do autor, conclui-se que o demandante demonstrou de forma satisfatória seu direito ao recebimento da indenização securitária pleiteada.” No que se refere à vigência do contrato, ainda que o contrato estivesse cancelado, os descontos em folha de pagamento permaneceram vigente, não se avista comprovação da comunicação formal ao segurado de que o contrato não estaria mais vigente, bem como não haveria motivos para continuar desconto o valor do contrato, ônus que incumbia a apelante. Nessa perspectiva, estabelece a Súmula 616 do Superior Tribunal de Justiça: “A indenização securitária é devida quando ausente a comunicação prévia do segurado acerca do atraso no pagamento do prêmio, por constituir requisito essencial para a suspensão ou resolução do contrato de seguro”. Portanto, sendo a comunicação prévia requisito essencial para a resolução do contrato de seguro e não comprovada a adoção desta medida, o contrato estava em plena vigência na ocasião do sinistro, sendo devida a indenização. Demais disso, a empresa estipulante possui responsabilidade pela indenização securitária, tendo em vista que a negativa de cobertura decorreu da alegação de ausência de cobertura, o que não há nada nos autos que corrobore com sua afirmativa, desta quanto ao repasse dos prêmios recolhidos pelos segurados. A propósito: “APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE SEGURO DE VIDA - AUSÊNCIA DE REPASSE DA CORRETORA - ILEGITIMIDADE PASSIVA DA SEGURADORA - REJEIÇÃO. - A seguradora é parte legítima e solidária para responder por ato ilícito da estipulante/corretora - Tendo em vista a ausência de repasse do valor do prêmio descontado do segurado pela corretora à seguradora, nos termos do disposto no artigo 34 do CDC, deve a seguradora responder de forma solidária com a corretora a obrigação de efetuar o pagamento do prêmio e da indenização por danos morais - A ausência de comunicação do cancelamento do contrato ao segurado gera o dever da seguradora (de forma solidária com a estipulante) de indenizá-lo - O que não pode ocorrer, no caso, é a penalização do segurado que pagou pontualmente os valores do prêmio, cumprindo, pois, com a obrigação que lhe competia” (TJMG - AC: 10024131015364002 MG, Relator: Mariangela Meyer, j. 06/10/2015, p. 23/10/2015). “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. SEGURO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ESTIPULANTE. LEGITIMIDADE PASSIVA. RISCO CARACTERIZADO. TEORIA DA APARÊNCIA. APLICABILIDADE. PRELIMINAR REJEITADA. OFERTA DE SEGURO. COBERTURA DE DIÁRIA PARA INTERNAÇÃO HOSPITALAR. SEGURADORA. ESTIPULANTE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DE AMBAS. PRECEDENTE DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. I - A estipulante de seguro possui legitimidade para integrar o polo passivo de ação ordinária visando ao recebimento de indenização securitária por invalidez é decorrente de internação hospitalar e por danos morais, uma vez que age como se fosse a própria seguradora, realizando a contratação e prestando todas as informações referentes ao contrato de seguro. II - É aplicável a teoria da aparência na hipótese vertente, pois a contratante, com base em engano plenamente justificável pelas circunstâncias do caso, acreditava que a estipulante, em verdade, era a própria seguradora. III - Conforme orienta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a oferta de seguro por companhia seguradora vinculada a instituição financeira implica responsabilidade solidária de ambas perante o consumidor. IV - Preliminar rejeitada. Recurso de apelação conhecido e não provido” (TJMG - AC: 10105140159242002 MG, Relator: Vicente de Oliveira Silva, j. 08/04/0018, p. 20/04/2018). Igualmente, dispõe a jurisprudência acerca das responsabilidades dos estipulantes: “SEGURO DE VIDA E ACIDENTES PESSOAIS - CONTRATO RESCINDIDO NO BOJO DE AÇÃO ORDINÁRIA PRETÉRITA - PARCELAS DO PRÊMIO DEBITADAS APÓS O ENCERRAMENTO DA RELAÇÃO JURÍDICA - INADMISSIBILIDADE - SOLIDARIEDADE DOS RÉUS PARA RESPONDER PELOS PREJUÍZOS OCASIONADOS AO SEGURADO - DISCIPLINA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - SENTENÇA MANTIDA - RECURSOS IMPROVIDOS, REJEITADAS AS PRELIMINARES. O estipulante ou subestipulante não se exime da responsabilidade pelos danos ocasionados ao segurado em decorrência do contrato de seguro diante da solidariedade agasalhada pelo Código Consumerista como medida básica de proteção ao consumidor.” (TJSP - AC: 10092688820158260114 SP 1009268-88.2015.8.26.0114, Relator: Renato Sartorelli, 26ª Câmara de Direito Privado, j. 07/12/2017, p. 13/12/2017). Logo, cabe à requerida, ora recorrente, a obrigação de efetuar o pagamento da indenização no valor da apólice contratada, no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), conforme estipula o Certificado acostado em Id. 287866011 (pg. 42). Sem motivos, portanto, para modificar a sentença. Dispositivo. Com tais considerações, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO. Consequentemente, majoro os honorários para 20% sobre o valor da condenação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 02/07/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0000695-16.2010.8.11.0003

ID: 319646859

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000695-16.2010.8.11.0003

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MAURO AUGUSTO SANTOS DE OLIVEIRA

Acórdão

Advogados:

WILSON MOLINA PORTO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000695-16.2010.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Seguro, Indenização do Prejuízo] Relator: Des(… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000695-16.2010.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Seguro, Indenização do Prejuízo] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [MAURO AUGUSTO SANTOS DE OLIVEIRA - CPF: 353.513.491-91 (APELADO), WILSON MOLINA PORTO - CPF: 395.103.281-20 (ADVOGADO), MONGERAL AEGON SEGUROS E PREVIDENCIA S/A - CNPJ: 33.608.308/0001-73 (APELANTE), EDUARDO CHALFIN - CPF: 689.268.477-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E PRESCRIÇÃO. REJEITADAS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. NEGATIVA DA SEGURADORA SOB ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE COBERTURA E RESPONSABILIDADE. DEVER DE INDENIZAÇÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Devidamente demonstrada a relação jurídica entre a parte autora e a requerida, ora apelante, sendo esta a parte legítima para figurar na ação. “O prazo prescricional para cobrança de seguro de vida é de um ano e o marco inicial é a data da ciência inequívoca da incapacidade.” (N.U 0005270-84.2012.8.11.0007, NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 30/01/2018, publicado no DJE 05/02/2018). Tanto a seguradora, quanto a estipulante ou subestipulante que atuam como intermediárias na contratação de seguro, são partes legítimas e solidárias para responderem pelo pagamento do prêmio de indenização securitária. R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação cível interposta por MONGERAL AEGON SEGUROS E PREVIDENCIA S/A contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis que, nos autos da Ação de Indenização n. 0000695-16.2010.811.0003, promovida por MAURO AUGUSTO SANTOS DE OLIVEIRA, julgou procedente os pedidos da inicial nos seguintes termos: “Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a requerida ao pagamento da indenização securitária ao autor, em razão da constatação da invalidez permanente, no montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Sobre o valor da condenação, deverão incidir juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (23/02/2010), bem como correção monetária pelo INPC/IBGE a contar da data da contratação do seguro (09/06/2006), até o efetivo pagamento. Em decorrência do princípio da causalidade, CONDENO a parte requerida no pagamento das custas e taxas judiciárias, bem como em honorários advocatícios no montante correspondente a 15% (quinze por cento) do valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §2°, incisos I a IV, do NCPC.” Em suas razões recursais, a apelante aponta, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, alegando que na data do sinistro não detinha qualquer responsabilidade pela apólice. Diz que a pretensão está abarcada pelo instituto da prescrição, afirmando que o direito prescreve em 01 (um) ano. No mérito, alega que não houve qualquer vício na prestação do serviço fornecido, excluindo-se a sua responsabilidade nos termos do Art. 14, §3º, inciso I do CPC. Diz ainda, que o contrato não prevê cobertura para invalidez laborativa, mas funcional nos casos de invalidez por acidente e invalidez total por doença. Em suma, pede o acolhimento das preliminares para extinguir o feito, subsidiariamente pede o provimento do recurso para reformar a sentença julgando improcedente a ação. Contrarrazões apresentada no ID 287866853. É o relatório Peço dia para o julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS RELATOR V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara. A) PRELIMINARES I) Ilegitimidade Passiva Quanto à alegada ilegitimidade passiva, sob a alegação de que o contrato em discussão foi cancelado na data de 31/12/2006, não assiste razão a apelante. Como bem destacou o juiz de primeiro grau: “Contudo, ao compulsar os autos, verifica-se que, mesmo após a alegada extinção do contrato de seguro em grupo, a requerida continuou a descontar valores a título de seguro de vida diretamente do contracheque do autor. Conforme demonstram os documentos acostados aos autos, foram realizados descontos no valor de R$ 18,00 (dezoito reais) nos salários referentes ao mês de janeiro de 2007 (id. 76585685 - Pág. 38), janeiro de 2008 (id. 76585685 - Pág. 39), fevereiro de 2008 (id. 76585685 - Pág. 40) e março de 2008 (id. 76585685 - Pág. 41), ou seja, em meses posteriores à data na qual a requerida afirma ter ocorrido o cancelamento do contrato. Dessa maneira, a requerida adota comportamento processual contraditório, ao sustentar, por um lado, a inexistência de qualquer relação jurídica com o autor a partir de 31 de dezembro de 2006 e, por outro, ao auferir vantagem financeira por meio dos descontos realizados diretamente em sua folha de pagamento após essa data. Tal conduta se amolda à vedação do ordenamento jurídico ao comportamento contraditório, consubstanciada no princípio da boa-fé objetiva e na aplicação do brocardo latino "nemo potest venire contra factum proprium", segundo o qual ninguém pode se beneficiar de sua própria torpeza ou adotar posicionamento contraditório em prejuízo de terceiros. Além disso, verifica-se que a requerida não juntou aos autos qualquer documento que demonstre a veracidade de sua alegação de cancelamento definitivo do contrato. [...]” (id. 287866041) Desta forma, restou devidamente demonstrada a relação jurídica entre a parte autora e a requerida, ora apelante, sendo esta a parte legítima para figurar na ação, conforme expressamente previsto no contrato, o qual visa justamente garantir-lhe o recebimento dos valores devidos pelo segurado, sendo a sua responsabilidade. Dessa forma, rejeito a preliminar. II) Prescrição ânua O recorrente sustenta ainda que a pretensão do autor estaria prescrita, pois, o acidente que resultou em sua invalidez foi na data de 24/02/2008 e, por isso, a ação deveria ser movida até 24 de fevereiro de 2009, enquanto que a ação foi promovida somente no ano de 2010. Em se tratando de ação envolvendo contrato de seguro, em que a parte pretende a condenação da seguradora ao pagamento de indenização, é aplicável a prescrição ânua, consoante o que dispõe o artigo 206, §1º, inciso II, alínea “b”, do Código Civil. A sentença recorrida acertadamente pontuou que: “[...] A jurisprudência dos tribunais pátrios, inclusive consolidada na Súmula 278 do Superior Tribunal de Justiça, estabelece que "o termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral". Assim, o prazo prescricional não se inicia na data do acidente, mas sim no momento em que o autor obteve o diagnóstico definitivo sobre a invalidez permanente que lhe acomete. No caso concreto, o conjunto probatório revela que o autor somente teve ciência inequívoca de sua invalidez em 25 de janeiro de 2010, data em que foi emitido o laudo médico conclusivo pelo profissional responsável, documento este acostado aos autos sob o id. 76585685 - Pág. 43. Desse modo, considerando que a ação foi ajuizada em 27 de janeiro de 2010, é evidente que a pretensão indenizatória do autor foi exercida dentro do prazo legal, não havendo que se falar em prescrição. [...]” Fundamento que coaduna com o entendimento deste E. Tribunal: “O prazo prescricional para cobrança de seguro de vida é de um ano e o marco inicial é a data da ciência inequívoca da incapacidade.” (N.U 0005270-84.2012.8.11.0007, NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 30/01/2018, publicado no DJE 05/02/2018). “As ações de cobrança de seguro ajuizadas contra as seguradoras possuem a chamada prescrição ânua, consoante disposto no art. 206, §1º, II, alínea “b”, do C. Civil e súmulas 101 e 278 do STJ, cujo termo inicial se dá no momento da ciência inequívoca da incapacidade laboral. Após o julgamento de recurso repetitivo perante o STJ, tendo como acórdão paradigma o REsp n. 1.388.030/MG, restou firmado o entendimento de que “exceto nos casos de invalidez permanente notória, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico, sendo relativa a presunção de ciência.” (N.U 1002476-54.2018.8.11.0010, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/06/2024, Publicado no DJE 26/06/2024) Portanto, verifica-se que o autor somente tomou conhecimento de sua incapacidade em 25 de janeiro de 2010, conforme Laudo Médico assinalado pelo médico Marcus A. dos Santos (CRM 5374) (id. 287866011 – pg. 43), que atestou que do acidente ocorrido em 24/02/2008, resultou “hoje ao exame física apresenta dor crônica de fluxo extensão, limitação funcional aos esforços, o mesmo esta com debilidade parar exercer as atividades habituais no trabalho”. Portanto, sendo a ação protocolada em 27/01/2010, não há que se falar em prescrição, razão pela qual também rejeito a preliminar. B) MÉRITO A controvérsia gira em torno da negativa de indenização securitária por parte da companhia apelante, sob o argumento de que o segurado, ao tempo do acidente que lhe causou invalidez, não estaria sob a cobertura do contrato em discussão. No caso em concreto, resta incontroverso nos autos a existência do contrato de seguro/apólice, consoante documentos de Id. 287866011 (pg. 42). Igualmente, comprovado a ocorrência do evento danoso (invalidez permanente) em razão do acidente ocorrido em 24/02/2008, da qual somente tomou conhecimento inequívoco na data de 25/01/2010 (laudo médico id. 287866011 - 43), o qual possui cobertura contratual, no importe de R$ 20.000,00, quanto à segurada (Id. 287866011 - 42). Aliás, bem destocou a decisão de primeiro grau: “No curso da instrução processual, restou demonstrado que o autor é titular de um contrato de seguro de vida em grupo, mantido com a requerida, conforme documentação anexada aos autos, a qual comprova o vínculo contratual e os descontos efetuados diretamente em seu contracheque, inclusive após a data em que a seguradora alegou o cancelamento do contrato. Assim, conforme já analisado na apreciação da preliminar de ilegitimidade passiva, há comprovação da relação jurídica entre as partes e da legitimidade da requerida para figurar no polo passivo da demanda. Além disso, a documentação acostada ao feito comprova que o autor preencheu todos os requisitos necessários para o recebimento da indenização securitária. O valor devido a título de indenização por invalidez permanente encontra-se especificado no contrato de seguro, conforme documento anexado ao id. 76585685 - Pág. 42. Ademais, o grau da invalidez restou devidamente atestado por meio do laudo pericial acostado ao id. 108868444, que confirma a incapacidade permanente decorrente do acidente sofrido pelo autor. Dessa forma, restando devidamente comprovados o vínculo contratual, a legitimidade passiva da requerida, o valor da indenização e a caracterização da invalidez permanente do autor, conclui-se que o demandante demonstrou de forma satisfatória seu direito ao recebimento da indenização securitária pleiteada.” No que se refere à vigência do contrato, ainda que o contrato estivesse cancelado, os descontos em folha de pagamento permaneceram vigente, não se avista comprovação da comunicação formal ao segurado de que o contrato não estaria mais vigente, bem como não haveria motivos para continuar desconto o valor do contrato, ônus que incumbia a apelante. Nessa perspectiva, estabelece a Súmula 616 do Superior Tribunal de Justiça: “A indenização securitária é devida quando ausente a comunicação prévia do segurado acerca do atraso no pagamento do prêmio, por constituir requisito essencial para a suspensão ou resolução do contrato de seguro”. Portanto, sendo a comunicação prévia requisito essencial para a resolução do contrato de seguro e não comprovada a adoção desta medida, o contrato estava em plena vigência na ocasião do sinistro, sendo devida a indenização. Demais disso, a empresa estipulante possui responsabilidade pela indenização securitária, tendo em vista que a negativa de cobertura decorreu da alegação de ausência de cobertura, o que não há nada nos autos que corrobore com sua afirmativa, desta quanto ao repasse dos prêmios recolhidos pelos segurados. A propósito: “APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE SEGURO DE VIDA - AUSÊNCIA DE REPASSE DA CORRETORA - ILEGITIMIDADE PASSIVA DA SEGURADORA - REJEIÇÃO. - A seguradora é parte legítima e solidária para responder por ato ilícito da estipulante/corretora - Tendo em vista a ausência de repasse do valor do prêmio descontado do segurado pela corretora à seguradora, nos termos do disposto no artigo 34 do CDC, deve a seguradora responder de forma solidária com a corretora a obrigação de efetuar o pagamento do prêmio e da indenização por danos morais - A ausência de comunicação do cancelamento do contrato ao segurado gera o dever da seguradora (de forma solidária com a estipulante) de indenizá-lo - O que não pode ocorrer, no caso, é a penalização do segurado que pagou pontualmente os valores do prêmio, cumprindo, pois, com a obrigação que lhe competia” (TJMG - AC: 10024131015364002 MG, Relator: Mariangela Meyer, j. 06/10/2015, p. 23/10/2015). “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. SEGURO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ESTIPULANTE. LEGITIMIDADE PASSIVA. RISCO CARACTERIZADO. TEORIA DA APARÊNCIA. APLICABILIDADE. PRELIMINAR REJEITADA. OFERTA DE SEGURO. COBERTURA DE DIÁRIA PARA INTERNAÇÃO HOSPITALAR. SEGURADORA. ESTIPULANTE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DE AMBAS. PRECEDENTE DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. I - A estipulante de seguro possui legitimidade para integrar o polo passivo de ação ordinária visando ao recebimento de indenização securitária por invalidez é decorrente de internação hospitalar e por danos morais, uma vez que age como se fosse a própria seguradora, realizando a contratação e prestando todas as informações referentes ao contrato de seguro. II - É aplicável a teoria da aparência na hipótese vertente, pois a contratante, com base em engano plenamente justificável pelas circunstâncias do caso, acreditava que a estipulante, em verdade, era a própria seguradora. III - Conforme orienta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a oferta de seguro por companhia seguradora vinculada a instituição financeira implica responsabilidade solidária de ambas perante o consumidor. IV - Preliminar rejeitada. Recurso de apelação conhecido e não provido” (TJMG - AC: 10105140159242002 MG, Relator: Vicente de Oliveira Silva, j. 08/04/0018, p. 20/04/2018). Igualmente, dispõe a jurisprudência acerca das responsabilidades dos estipulantes: “SEGURO DE VIDA E ACIDENTES PESSOAIS - CONTRATO RESCINDIDO NO BOJO DE AÇÃO ORDINÁRIA PRETÉRITA - PARCELAS DO PRÊMIO DEBITADAS APÓS O ENCERRAMENTO DA RELAÇÃO JURÍDICA - INADMISSIBILIDADE - SOLIDARIEDADE DOS RÉUS PARA RESPONDER PELOS PREJUÍZOS OCASIONADOS AO SEGURADO - DISCIPLINA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - SENTENÇA MANTIDA - RECURSOS IMPROVIDOS, REJEITADAS AS PRELIMINARES. O estipulante ou subestipulante não se exime da responsabilidade pelos danos ocasionados ao segurado em decorrência do contrato de seguro diante da solidariedade agasalhada pelo Código Consumerista como medida básica de proteção ao consumidor.” (TJSP - AC: 10092688820158260114 SP 1009268-88.2015.8.26.0114, Relator: Renato Sartorelli, 26ª Câmara de Direito Privado, j. 07/12/2017, p. 13/12/2017). Logo, cabe à requerida, ora recorrente, a obrigação de efetuar o pagamento da indenização no valor da apólice contratada, no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), conforme estipula o Certificado acostado em Id. 287866011 (pg. 42). Sem motivos, portanto, para modificar a sentença. Dispositivo. Com tais considerações, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO. Consequentemente, majoro os honorários para 20% sobre o valor da condenação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 02/07/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1024563-13.2023.8.11.0015

ID: 259832908

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1024563-13.2023.8.11.0015

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JAIR APARECIDO AVANSI

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1024563-13.2023.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1024563-13.2023.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Bancários] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA - CPF: 048.080.111-82 (APELANTE), JAIR APARECIDO AVANSI - CPF: 099.843.618-61 (ADVOGADO), EUCLIDES LUIS AVANSI - CPF: 074.837.698-40 (ADVOGADO), LETICIA GOIS AVANSI - CPF: 059.928.719-50 (ADVOGADO), NU PAGAMENTOS S.A. - CNPJ: 18.236.120/0001-58 (APELADO), GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU - CPF: 129.040.678-25 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. GOLPE BANCÁRIO VIA WHATSAPP. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1.. Apelação Cível interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais em ação de indenização por danos materiais e morais, ajuizada por consumidora que alega ter sido vítima de golpe da falsa central de atendimento, com subtração da quantia de R$ 46.682,00 via transferências PIX. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se houve cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide sem apreciação do pedido de inversão do ônus da prova formulado pela autora, e se tal omissão prejudicou a instrução probatória necessária ao deslinde da controvérsia. III. Razões de decidir 3. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC constitui regra de instrução e não regra de julgamento, devendo ser decretada pelo juízo antes de finda a instrução probatória, sob pena de ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. 4. O pedido de inversão do ônus da prova formulado expressamente pela autora na petição inicial, ainda que impugnado pela instituição financeira em contestação, não foi objeto de apreciação judicial, seja na fase de saneamento, seja na sentença. 5. A falta de definição prévia sobre a distribuição do ônus probatório impossibilita impor ao autor o dever de provar os fatos alegados, pois as partes devem saber, de antemão, quais provas devem produzir, sendo vedada a prolação de decisão judicial implícita, conforme art. 93, IX, da Constituição Federal. 6. O julgamento antecipado da lide sem a apreciação do pedido de inversão do ônus da prova caracteriza cerceamento de defesa, em especial por se tratar de relação consumerista envolvendo golpe bancário, onde há evidente hipossuficiência técnica do consumidor. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Apelação Cível provido para cassar a sentença e determinar o retorno dos autos à fase saneadora. Tese de julgamento: "A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC configura regra de instrução processual, devendo ser decidida antes da fase instrutória ou, quando proferida posteriormente, assegurar à parte onerada a oportunidade de produzir as provas necessárias, sob pena de nulidade processual por cerceamento de defesa." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LV, e art. 93, IX; CPC, arts. 370 e 373; CDC, art. 6º, VIII. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 422.778/SP, Rel. p/ Acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, j. 29/02/2012; STJ, REsp 1286273/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 08/06/2021; TJ-MT, Apelação Cível 10060746620208110003, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 26/06/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação cível interposto por MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT, nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais n. 1024563-13.2023.8.11.0015 ajuizada em desfavor de NU PAGAMENTOS S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais de restituição de valores transferidos mediante fraude eletrônica e de indenização por danos morais. Alega a recorrente que foi vítima de fraude bancária praticada por terceiros, que se passaram por funcionários do banco apelado e conseguiram ludibriá-la, obtendo acesso à sua conta e realizando transferências via Pix que totalizaram R$ 46.682,00 (quarenta e seis mil seiscentos e oitenta e dois reais). Sustenta que a fraude só foi possível em razão da falha na segurança do sistema da instituição financeira, a qual permitiu o acesso indevido às suas informações bancárias, além de não adotar mecanismos de alerta e bloqueio para transações atípicas ou suspeitas. Em suas palavras, “[...] o estelionatário solicitou que a requerente acessasse a aba de segurança do aplicativo do banco, realizasse nova validação com reconhecimento biométrico e alterasse sua senha, tudo dentro da própria plataforma da instituição requerida, citando informações pessoais que apenas o banco detinha, como número da conta” (fl. 5). Argumenta, portanto, que não foi ela quem realizou as transferências, mas sim os fraudadores que conseguiram acesso indevido por fragilidade no sistema de proteção da requerida. Aduz que a sentença é omissa quanto à inversão do ônus da prova, direito previsto no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, tendo sido desconsiderada a hipossuficiência técnica da consumidora frente ao poderio tecnológico do banco. Reforça que nenhum documento foi trazido pela instituição financeira, tampouco houve demonstração do alegado reconhecimento facial ou da confiabilidade do aparelho de origem das transações. Sustenta, ainda, que a sentença apelada violou a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), notadamente o art. 6º, VII e X; art. 7º; art. 17; e art. 42, o Código de Defesa do Consumidor, especialmente os arts. 6º, VI e VIII; 14; 20; 39, V; e 51; e a Resolução BCB nº 147/2021, que impõe ao banco a obrigação de bloqueio de transações suspeitas. Narra, ainda, que "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". A apelante reforça a existência de julgados recentes de diversos Tribunais – inclusive deste Egrégio Tribunal – reconhecendo a responsabilidade objetiva dos bancos em casos semelhantes, dado o dever de segurança e a falha na prestação de serviços que permitem ou não impedem a consumação de fraudes. Por fim, requer a reforma integral da sentença, com aplicação do CDC, da LGPD e da Súmula 479 do STJ; o reconhecimento da inversão do ônus da prova; e a condenação da requerida à restituição dos valores transferidos (R$ 46.682,00); e a fixação de indenização por danos morais no valor sugerido de R$ 15.000,00; bem como a condenação da apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Recolhimento do preparo, id. 275406488. Contrarrazões, id. 275406492. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Conforme o explicitado, cuida-se de recurso de apelação cível interposto por MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT, nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais n. 1024563-13.2023.8.11.0015 ajuizada em desfavor de NU PAGAMENTOS S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais de restituição de valores transferidos mediante fraude eletrônica e de indenização por danos morais. Inicialmente, conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade. Cinge-se dos autos que a parte apelante ajuizou a ação de indenização por dano material e moral arguindo, em síntese, que foi vítima de golpe da falsa central de atendimento, tendo recebido ligação via WhatsApp de pessoa que se identificou como funcionário da instituição financeira ré, solicitando que realizasse procedimentos para atualizações no sistema. Após seguir as instruções, que incluíram reconhecimento facial e alteração de senha, seu telefone "apagou" momentaneamente, e quando recuperou o acesso à sua conta, verificou a subtração da quantia de R$ 46.682,00 (quarenta e seis mil, seiscentos e oitenta e dois reais), transferida via PIX para quatro pessoas diferentes. A sentença julgou improcedentes os pedidos, fundamentando que a situação não configuraria fortuito interno, mas culpa exclusiva da consumidora, que por "mera liberalidade" teria efetuado as transferências por meio de reconhecimento facial e uso de senha pessoal, assim grafada: “[...] Deveras, segundo a norma de regência, todo comportamento, comissivo ou omissivo, realizado por parte do fornecedor, que revela a existência de defeito na prestação do serviço, fruto da violação dos deveres de qualidade-segurança, de cuidado, de cooperação e de informação adequada/suficiente, e que se caracterize como fator determinante para dinamizar a ocorrência de dano ao consumidor, induz, de maneira automática, na obrigação do fornecedor de serviço promover a reparação civil, independentemente de investigação sobre a existência de culpa do agente que causou a lesão. De fato, o defeito/falha na prestação do serviço, que dá substrato jurídico à responsabilidade civil do fornecedor, traduz situação de responsabilidade civil objetiva, que parte do pressuposto da existência do ato lesivo, do dano e do nexo causal. Interpretação que resulta da exegese do conteúdo normativo do art. 14 da Lei n.º 8.078/1990. Pois bem. Compulsando os elementos informativos produzidos no processo deflui-se pelo teor da peça exordial, que no dia 10/07/2023, a autora, ludibriada por um terceiro-fraudador, efetuou diversas operações financeiras, diretamente de seu celular, mediante a realização de reconhecimento facial e de senha pessoal, que culminaram, em quatro transferências de valores, via pix, para a conta de quatro destinatários diferentes, e que totalizaram a quantia de R$ 47.682,00 (ID 130778071). Segundo a narrativa tecida na inicial, aliada ao Boletim de Ocorrência (evento nº 130778070) e print da tela do aplicativo do banco (ID 130778071, pág. 03), verifica-se que as transações ocorreram entre 12h30min a 12h46min. e, logo em seguida, a autora entrou em contato com a instituição financeira para tentar reaver os valores, bem como registrou a ocorrência do crime contra seu patrimônio perante a autoridade policial, no intuito de reaver a quantia. Da análise meticulosa do conjunto de provas produzido no processo, máxime do teor do documento arquivado ao evento nº 130778071, págs. 01/02, denota-se que a instituição financeira atendeu a solicitação da autora, no mesmo dia, às 23h17min, mas infelizmente, logrou êxito em encontrar quantia ínfima em uma das contas que foi direcionado os valores. Ademais, conforme relatado pelos prepostos da requerida, na conversa pelo aplicativo de mensagens colacionada ao evento nº 130778072, a instituição iniciou o procedimento para tentar recuperar o valor contestado, contudo, não poderia garantir um resultado positivo, já que as transferências foram realizadas de um “aparelho confiável”, por meio da “leitura do rosto” em tempo real, que visa a garantir que o titular da conta é o dono do aparelho que está sendo utilizado para efetuar as transações. Aliás, essas informações restaram como pontos incontroversos no processo, uma vez que a autora confirma que realizou a leitura facial e utilizou sua senha de acesso ao aplicativo, por “orientação” do estelionatário. Consequentemente, diante desta perspectiva, levando-se por linha de estima a noção de ideias de que a responsabilidade da instituição financeira se limita a fomentar sistemas de segurança e exigir maiores informações a fim de confirmar a legitimidade e a identidade do consumidor, e que estas medidas foram tomadas pela requerida, no caso concreto, conclui-se, por inferência racional, a ausência de falha na prestação de serviço. Aliás, neste ponto, a requerida asseverou que além de tomar medidas de segurança por meio do reconhecimento facial e exigência de senha, possui outros mecanismos de defesa para evitar práticas maliciosas, como a que ocorreu, por meio da ativação de limites para efetuar transações via pix durante o dia e noite, a fim de minimizar eventuais danos, os quais também não foram utilizados pela autora. Diante deste cenário, a situação vivenciada pela autora não se equipara a fortuito interno[1], por fato exclusivo de terceiro, na medida em que não houve utilização indevida de seus dados pelo terceiro ou por falha de segurança do sistema do banco, mas todas as transações decorreram de atos perpetrados por ela mesma, embora, ludibriada por esse terceiro. A guisa de ilustração, a corroborar tais assertivas, colho do repertório de jurisprudência do Tribunal de Justiça deste Estado, o seguinte precedente, o qual, mutatis mutandis, versa a respeito de situação semelhante à presente: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. TRASNFERÊNCIA BANCÁRIA. GOLPE PIX PRATICADO POR TERCEIRO. UTILIZAÇÃO DE CELULAR HABILITADO E SENHA PESSOAL – CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR – ARTIGO 14, § 3º, II DO CDC – AFASTADA A RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA – SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O artigo 14, § 3º, inciso II do CDC prevê que o fornecedor de serviços não será responsabilizado em caso de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 2. É fato público e notório que as transações realizadas via PIX somente são autorizadas através de celular pessoal, devidamente habilitado para tal, com a utilização de senha pessoal. Assim, a concretização da fraude somente foi possível em razão da falta de zelo da parte promovente, inexistindo qualquer responsabilidade a ser imputada à instituição bancária. 3.Sentença reformada. 4. Recurso Provido. (N.U 1030702-23.2023.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 28/11/2023, Publicado no DJE 29/11/2023) Por via de consequência, nesse influxo de ideias, a instituição financeira logrou êxito em comprovar fato impeditivo do direito da autora (art. 373, II do CPC), qual seja, sua culpa exclusiva, pois por mera liberalidade, entendeu por bem efetuar transferências de valores para conta bancária de terceiros, mediante a utilização do aplicativo do banco, em celular cadastrado e com a utilização de biometria facial e senha pessoal. Por decorrência lógica, considero que não se encontram presentes os requisitos mínimos que dão ensejo ao dever de restituir/reparar os danos suportados, pois inexistente a falha na prestação do serviço [art. 14 da Lei n.º 8.078/1990]. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial por Marina Maria Barbieri de Souza contra Nu Pagamentos S.A. e, como consequência, DECLARO encerrada a atividade cognitiva, resolvendo-se o mérito do feito, com supedâneo no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil. [...]” Ausência de inversão do ônus da prova – Cerceamento de defesa de oficio. A apelada em suas razões recursais sustenta a omissão da sentença quanto ao pedido de inversão do ônus da prova. É sabido que, em virtude do princípio da livre persuasão racional, o juiz possui a prerrogativa de indeferir, motivadamente, a produção de provas desnecessárias ou inúteis, sem que isso represente ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, consagrados no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Prosseguindo, como sabido, embora se reconheça o direito fundamental da parte ao devido processo legal, do qual desdobra o direito à produção probatória, tal direito não é absoluto, encontrando limites de exercício no próprio ordenamento jurídico. Dentre os princípios processuais que decorrem do devido processo legal, destacam-se o da ampla defesa e o do contraditório, previstos expressamente também no art. 5º, LV, da CF/88. Sobre o princípio do contraditório, destaco a doutrina de Humberto Theodoro Júnior e Dierle Nunes: "Em relação às partes, o contraditório aglomera um feixe de direitos dele decorrentes, entre eles: [...] (b) o direito à prova, possibilitando-lhe sua obtenção toda vez que esta for relevante; (c) em decorrência do anterior, o direito de assistir pessoalmente a assunção da prova e de se contrapor às alegações de fato ou às atividades probatórias da parte contrária ou, mesmo, oficiosas do julgador [...]". (NUNES, Dierle e THEODORO JR., Humberto. Uma dimensão que urge reconhecer ao contraditório no direto brasileiro: sua aplicação como garantia de influência, de não surpresa e de aproveitamento da atividade processual. In: Revista de Processo. Ano 34, n; 168, fev/2009, p. 126). Já o princípio da ampla defesa proporciona às partes a possibilidade de promover a defesa de seus direitos e interesses, utilizando-se de todos os meios permitidos em lei para atuar da maneira mais efetiva possível dentro do processo. Diante disso, para que tais princípios sejam colocados em prática, deve-se permitir às partes a prática dos atos necessários à comprovação de suas assertivas, para que o Julgador, a partir disso, decida de forma coerente com tudo aquilo que foi devidamente produzido nos autos, fundamentando sua decisão e discorrendo sobre os pontos abordados na fase instrutória. Ainda, não se pode perder de vista que o julgador é o verdadeiro destinatário da prova, a qual visa a formação do seu convencimento. Cabe a ele, portanto, avaliar a necessidade de produção de cada um dos meios probatórios postulados pelas partes, indeferindo aqueles que se revelarem desnecessários, sob pena de se atentar contra os princípios da celeridade e economia processual, onerando, injustificadamente, o trâmite processual. Neste sentido o art. 370 do Código de Processo Civil/15: "Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias". Dito isso, reexaminando os autos e a documentação acostada, neste ponto, vê-se que na inicial, a parte autora, friso, hipossuficiente, formula expressamente o seguinte pedido: “ [...]b) A aplicação do Código de Defesa do Consumidor, bem como a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º , VIII, da Lei 8.078/90; [...]” A instituição financeira, em sua contestação, impugna a inversão do ônus da prova no item 2.3, vejamos: “ [...]2.3. IMPOSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA (...)2.3.4. Nesse contexto, não sendo verossímeis as alegações da Autora e carecendo a demanda de elementos a indicar ser ela hipossuficiente, impõe-se o indeferimento do pedido de inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor. Assim, deve o caso seguir o estabelecido no artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, de que “o ônus da prova incumbe aa Autora quanto a fato constitutivo de seu direito [...]”. Prosseguindo no exame dos atos processuais levados a efeito no processo de origem, em nenhum momento, nem na inicial, nem em fase de saneamento e nem, no último caso, na sentença se vê alguma análise do juízo de origem quanto ao pedido de inversão do ônus probatório formulado pela autora e impugnado pelo requerido. Disso resulta, portanto, que foi precipitado o julgamento antecipado da lide, pois faltam elementos técnicos para se chegar à verdade dos fatos. Destarte, como não houve o deferimento ou indeferimento do pedido de inversão do ônus, que entendo ser indispensável à solução da controvérsia, resta caracterizado o cerceamento de defesa com evidente necessidade de instrução probatória no feito em análise, sendo possível concluir que houve, de fato, cerceamento da defesa, motivo pelo qual se impõe a anulação do feito a partir da decisão que suprimiu a fase de instrução e, consequentemente, a cassação da sentença proferida pelo juiz de 1º grau, para o devido prosseguimento do processo. De modo que, repito, observa-se que o autor, em manifestação a tempo e modo quando lhe era devido, formulou pedido de inversão do ônus da prova, contudo, pelo magistrado sentenciante, sem nenhuma manifestação, proferiu sentença julgando improcedentes os pedidos iniciais. Pois bem. De fato, tenho que a inversão do ônus da prova é regra procedimental. Portanto, deve ser decretada pelo Juiz antes de finda a instrução probatória, sob risco de lesão ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, princípios basilares do Estado Democrático de Direito. A matéria era objeto de acalorada divergência no Superior Tribunal de Justiça, mas restou pacificada no julgamento do EREsp 422.778/SP, cuja ementa abaixo transcrevo: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. LEI 8.078/90, ART. 6º, INC. VIII. REGRA DE INSTRUÇÃO. DIVERGÊNCIA CONFIGURADA. O cabimento dos embargos de divergência pressupõe a existência de divergência de entendimentos entre Turmas do STJ a respeito da mesma questão de direito federal. Tratando-se de divergência a propósito de regra de direito processual (inversão do ônus da prova) não se exige que os fatos em causa no acórdão recorrido e paradigma sejam semelhantes, mas apenas que divirjam as Turmas a propósito da interpretação do dispositivo de lei federal controvertido no recurso. Hipótese em que o acórdão recorrido considera a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, inciso VIII, do CDC regra de julgamento e o acórdão paradigma trata o mesmo dispositivo legal como regra de instrução. Divergência configurada. A regra de imputação do ônus da prova estabelecida no art. 12 do CDC tem por pressuposto a identificação do responsável pelo produto defeituoso (fabricante, produtor, construtor e importador), encargo do autor da ação, o que não se verificou no caso em exame. Não podendo ser identificado o fabricante, estende-se a responsabilidade objetiva ao comerciante ( CDC, art. 13). Tendo o consumidor optado por ajuizar a ação contra suposto fabricante, sem comprovar que o réu foi realmente o fabricante do produto defeituoso, ou seja, sem prova do próprio nexo causal entre ação ou omissão do réu e o dano alegado, a inversão do ônus da prova a respeito da identidade do responsável pelo produto pode ocorrer com base no art. 6º, VIII, do CDC, regra de instrução, devendo a decisão judicial que a determinar ser proferida "preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade" ( RESP 802.832 , STJ 2ª Seção, DJ 21.9.2011). (EREsp 422.778/SP, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Relª. p/ Acórdão Minª MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, j. 29/02/2012, DJe 21/06/2012). Fixando-se, portanto, que a inversão do ônus da prova é regra procedimental e que, portanto, deve ser decretada pelo Juiz antes de finda a fase de instrução, a doutrina contemporânea estabelece: "...A regra de inversão do ônus da prova é regra de processo, que autoriza o desvio da rota; não se trata de regra de julgamento, como a que distribui o ônus da prova. Assim, deve o magistrado anunciar a inversão antes de sentenciar e em tempo do sujeito onerado se desincumbir do encargo probatório, não se justificando o posicionamento que defende a possibilidade de a inversão se dar no momento do julgamento, pois 'se fosse lícito ao magistrado operar a inversão do ônus da prova no exato momento da sentença, ocorreria a peculiar situação de, simultaneamente, se atribuir um ônus ao réu, e negar-lhe a possibilidade de desincumbir-se do encargo que antes inexistia'. Uma coisa é a regra que se inverte (a regra do ônus), outra é a regra que inverte (a da inversão do ônus). (...) Reservar a inversão do ônus da prova para o momento da sentença representa ruptura com o sistema do devido processo legal, ofendendo a garantia do contraditório. Não se pode apenar a parte que não provou a veracidade ou inveracidade de uma determinada alegação sem que se tenha conferido a ela a oportunidade de fazê-lo (lembre-se que o ônus subjetivo acaba por condicionar a atuação processual da parte). Por outro lado, exigir que o fornecedor, apenas por vislumbrar uma possível inversão do ônus da prova em seu desfavor, faça prova tanto dos fatos impeditivos, extintivos ou modificativos que eventualmente alegar, como da inexistência do fato constitutivo do direito do consumidor, é tornar legal a inversão que o legislador quis fosse judicial (tanto que exigiu o preenchimento, no caso concreto, de certos requisitos). (FREDIE DIDIER JR, Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, 2ª ed., Salvador: JusPodivm, p. 81/83). Conclusão irrefragável: a inversão do ônus da prova, apesar de requerida, sequer, foi apreciada na fase de saneamento, ou mencionada na sentença. Antes da definição de como será distribuído o ônus da prova, é impossível impor-se ao autor o ônus de provar os fatos alegados. O requerimento de inversão enseja decisão expressa sobre, a fim de que as partes saibam, de antemão, quais provas devem produzir. Não poderia a parte autora presumir que o ônus lhe incumbia ante o silêncio do Juízo, considerada a vedação à prolação de decisão judicial implícita (art. 93, IX, da Constituição). Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL - NEGATIVA DE PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA PELA SEGURADORA FUNDADA EM SUPOSTA APURAÇÃO DE FRAUDE - PROCEDIMENTO ILÍCITO DOLOSAMENTE ENGENDRADO PARA POSSIBILITAR A RECUSA DO PAGAMENTO DO CAPITAL SEGURADO, VISANDO A CONSUMAÇÃO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO, COM O ENVOLVIMENTO DE DOCUMENTOS FALSOS OBTIDOS NO ESTRANGEIRO - TRIBUNAL DE ORIGEM QUE MANTEVE A CONDENAÇÃO COM BASE NA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA APLICADA ENQUANTO REGRA DE JULGAMENTO NO ÂMBITO RESTRITO DA SEGUNDA INSTÂNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ. 1. Existência de omissões relevantes cujo saneamento, pelo Tribunal a quo, se afigura imprescindível ao correto deslinde da controvérsia. 2. Julgamento empreendido pela Corte local mediante a aplicação da inversão do ônus da prova, como regra de julgamento, já em sede de apelação. 2.1 A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina deve ocorrer antes da etapa instrutória, ou quando proferida em momento posterior, garantir a parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas. Precedentes. 2.2 Inviabilidade da inversão do ônus probatório em sede de apelação, notadamente quando fundado em premissa equivocada atinente a suposta hipossuficiência da parte autora, visto que o órgão do Ministério Público não é de ser considerado opositor enfraquecido ou impossibilitado de promover, ainda que minimamente, o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito. 3. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, provido, para cassar os acórdãos dos embargos de declaração e apelação relativamente ao recurso manejado pela seguradora e determinar o retorno dos autos à instância precedente para, uma vez afastada a inversão probatória, proceda a Corte local a análise da apelação interposta pela ré como entender por direito. Ficam prejudicadas as demais teses arguidas no reclamo. (REsp 1286273/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 08/06/2021, DJe 22/06/2021) PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. EXAME ANTERIOR À PROLAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES DO STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de instrução e não regra de julgamento, sendo que a decisão que a determinar deve - preferencialmente - ocorrer durante o saneamento do processo ou - quando proferida em momento posterior - garantir a parte a quem incumbia esse ônus a oportunidade de apresentar suas provas. Precedentes: REsp 1395254/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2013, DJe 29/11/2013; EREsp 422.778/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 29/02/2012, DJe 21/06/2012. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1450473/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014) No mesmo sentido este Tribunal já decidiu: APELAÇÕES – AÇÃO DECLARATÓRIA –CERCEAMENTO DE DEFESA - PROTESTOS EM NOME DA AUTORA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA DEFERIDA NA SENTENÇA - REGRA DE PROCEDIMENTO/INSTRUÇÃO, E NÃO DE JULGAMENTO - VIOLAÇÃO À AMPLA DEFESA DA RÉ - EVIDENTE PREJUÍZO - CAUSA DE NULIDADE DA DECISÃO – PRELIMINAR ACOLHIDA - DECISUM ANULADO – RECURSO DA RÉ PROVIDO E RECURSO DA AUTORA PREJUDICADO. A inversão do ônus da prova deferida apenas na sentença gera a sua nulidade por se tratar de regra de procedimento/instrução, e não de julgamento, sendo evidente a violação ao direito de defesa da parte ré. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10060746620208110003, Relator.: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 26/06/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/06/2024) AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR – PESSOA JURÍDICA QUE SE ENCAIXA COMO DESTINATÁRIA FINAL DOS SERVIÇOS DE TELEFONIA – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INTELIGÊNCIA DO ART. 6º, VIII, DO CDC – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A legislação consumerista regula relações de fornecedores direcionadas a consumidores caracterizados como destinatários finais, ou seja, que adquirem produtos ou serviços para uso próprio sem finalidade de produção de outros produtos ou serviços. Aplica-se as normas consumeristas à relação jurídica entre pessoa jurídica e empresa de telefonia se aquela utiliza os serviços de telefonia para exercer a atividade empresarial, sendo destinatária final do produto, não reinserindo o serviço de telefonia no mercado de consumo, sendo possível a inversão do ônus da prova . (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1002476-74.2024.8.11 .0000, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 03/04/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/04/2024) Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso acolhendo a preliminar suscitada de ofício, de nulidade processual, por cerceamento de defesa, para cassar a sentença e determinar o retorno do feito à fase saneadora, com o enfrentamento do pedido de inversão do ônus da prova e a reabertura da fase probatória após análise do referido pedido. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1024563-13.2023.8.11.0015

ID: 259832910

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1024563-13.2023.8.11.0015

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

NU PAGAMENTOS S.A.

Acórdão

Advogados:

GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1024563-13.2023.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1024563-13.2023.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Bancários] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA - CPF: 048.080.111-82 (APELANTE), JAIR APARECIDO AVANSI - CPF: 099.843.618-61 (ADVOGADO), EUCLIDES LUIS AVANSI - CPF: 074.837.698-40 (ADVOGADO), LETICIA GOIS AVANSI - CPF: 059.928.719-50 (ADVOGADO), NU PAGAMENTOS S.A. - CNPJ: 18.236.120/0001-58 (APELADO), GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU - CPF: 129.040.678-25 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. GOLPE BANCÁRIO VIA WHATSAPP. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1.. Apelação Cível interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais em ação de indenização por danos materiais e morais, ajuizada por consumidora que alega ter sido vítima de golpe da falsa central de atendimento, com subtração da quantia de R$ 46.682,00 via transferências PIX. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se houve cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide sem apreciação do pedido de inversão do ônus da prova formulado pela autora, e se tal omissão prejudicou a instrução probatória necessária ao deslinde da controvérsia. III. Razões de decidir 3. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC constitui regra de instrução e não regra de julgamento, devendo ser decretada pelo juízo antes de finda a instrução probatória, sob pena de ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. 4. O pedido de inversão do ônus da prova formulado expressamente pela autora na petição inicial, ainda que impugnado pela instituição financeira em contestação, não foi objeto de apreciação judicial, seja na fase de saneamento, seja na sentença. 5. A falta de definição prévia sobre a distribuição do ônus probatório impossibilita impor ao autor o dever de provar os fatos alegados, pois as partes devem saber, de antemão, quais provas devem produzir, sendo vedada a prolação de decisão judicial implícita, conforme art. 93, IX, da Constituição Federal. 6. O julgamento antecipado da lide sem a apreciação do pedido de inversão do ônus da prova caracteriza cerceamento de defesa, em especial por se tratar de relação consumerista envolvendo golpe bancário, onde há evidente hipossuficiência técnica do consumidor. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Apelação Cível provido para cassar a sentença e determinar o retorno dos autos à fase saneadora. Tese de julgamento: "A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC configura regra de instrução processual, devendo ser decidida antes da fase instrutória ou, quando proferida posteriormente, assegurar à parte onerada a oportunidade de produzir as provas necessárias, sob pena de nulidade processual por cerceamento de defesa." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LV, e art. 93, IX; CPC, arts. 370 e 373; CDC, art. 6º, VIII. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 422.778/SP, Rel. p/ Acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, j. 29/02/2012; STJ, REsp 1286273/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 08/06/2021; TJ-MT, Apelação Cível 10060746620208110003, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 26/06/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação cível interposto por MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT, nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais n. 1024563-13.2023.8.11.0015 ajuizada em desfavor de NU PAGAMENTOS S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais de restituição de valores transferidos mediante fraude eletrônica e de indenização por danos morais. Alega a recorrente que foi vítima de fraude bancária praticada por terceiros, que se passaram por funcionários do banco apelado e conseguiram ludibriá-la, obtendo acesso à sua conta e realizando transferências via Pix que totalizaram R$ 46.682,00 (quarenta e seis mil seiscentos e oitenta e dois reais). Sustenta que a fraude só foi possível em razão da falha na segurança do sistema da instituição financeira, a qual permitiu o acesso indevido às suas informações bancárias, além de não adotar mecanismos de alerta e bloqueio para transações atípicas ou suspeitas. Em suas palavras, “[...] o estelionatário solicitou que a requerente acessasse a aba de segurança do aplicativo do banco, realizasse nova validação com reconhecimento biométrico e alterasse sua senha, tudo dentro da própria plataforma da instituição requerida, citando informações pessoais que apenas o banco detinha, como número da conta” (fl. 5). Argumenta, portanto, que não foi ela quem realizou as transferências, mas sim os fraudadores que conseguiram acesso indevido por fragilidade no sistema de proteção da requerida. Aduz que a sentença é omissa quanto à inversão do ônus da prova, direito previsto no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, tendo sido desconsiderada a hipossuficiência técnica da consumidora frente ao poderio tecnológico do banco. Reforça que nenhum documento foi trazido pela instituição financeira, tampouco houve demonstração do alegado reconhecimento facial ou da confiabilidade do aparelho de origem das transações. Sustenta, ainda, que a sentença apelada violou a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), notadamente o art. 6º, VII e X; art. 7º; art. 17; e art. 42, o Código de Defesa do Consumidor, especialmente os arts. 6º, VI e VIII; 14; 20; 39, V; e 51; e a Resolução BCB nº 147/2021, que impõe ao banco a obrigação de bloqueio de transações suspeitas. Narra, ainda, que "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". A apelante reforça a existência de julgados recentes de diversos Tribunais – inclusive deste Egrégio Tribunal – reconhecendo a responsabilidade objetiva dos bancos em casos semelhantes, dado o dever de segurança e a falha na prestação de serviços que permitem ou não impedem a consumação de fraudes. Por fim, requer a reforma integral da sentença, com aplicação do CDC, da LGPD e da Súmula 479 do STJ; o reconhecimento da inversão do ônus da prova; e a condenação da requerida à restituição dos valores transferidos (R$ 46.682,00); e a fixação de indenização por danos morais no valor sugerido de R$ 15.000,00; bem como a condenação da apelada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Recolhimento do preparo, id. 275406488. Contrarrazões, id. 275406492. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Conforme o explicitado, cuida-se de recurso de apelação cível interposto por MARINA MARIA BARBIERI DE SOUZA contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT, nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais n. 1024563-13.2023.8.11.0015 ajuizada em desfavor de NU PAGAMENTOS S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais de restituição de valores transferidos mediante fraude eletrônica e de indenização por danos morais. Inicialmente, conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade. Cinge-se dos autos que a parte apelante ajuizou a ação de indenização por dano material e moral arguindo, em síntese, que foi vítima de golpe da falsa central de atendimento, tendo recebido ligação via WhatsApp de pessoa que se identificou como funcionário da instituição financeira ré, solicitando que realizasse procedimentos para atualizações no sistema. Após seguir as instruções, que incluíram reconhecimento facial e alteração de senha, seu telefone "apagou" momentaneamente, e quando recuperou o acesso à sua conta, verificou a subtração da quantia de R$ 46.682,00 (quarenta e seis mil, seiscentos e oitenta e dois reais), transferida via PIX para quatro pessoas diferentes. A sentença julgou improcedentes os pedidos, fundamentando que a situação não configuraria fortuito interno, mas culpa exclusiva da consumidora, que por "mera liberalidade" teria efetuado as transferências por meio de reconhecimento facial e uso de senha pessoal, assim grafada: “[...] Deveras, segundo a norma de regência, todo comportamento, comissivo ou omissivo, realizado por parte do fornecedor, que revela a existência de defeito na prestação do serviço, fruto da violação dos deveres de qualidade-segurança, de cuidado, de cooperação e de informação adequada/suficiente, e que se caracterize como fator determinante para dinamizar a ocorrência de dano ao consumidor, induz, de maneira automática, na obrigação do fornecedor de serviço promover a reparação civil, independentemente de investigação sobre a existência de culpa do agente que causou a lesão. De fato, o defeito/falha na prestação do serviço, que dá substrato jurídico à responsabilidade civil do fornecedor, traduz situação de responsabilidade civil objetiva, que parte do pressuposto da existência do ato lesivo, do dano e do nexo causal. Interpretação que resulta da exegese do conteúdo normativo do art. 14 da Lei n.º 8.078/1990. Pois bem. Compulsando os elementos informativos produzidos no processo deflui-se pelo teor da peça exordial, que no dia 10/07/2023, a autora, ludibriada por um terceiro-fraudador, efetuou diversas operações financeiras, diretamente de seu celular, mediante a realização de reconhecimento facial e de senha pessoal, que culminaram, em quatro transferências de valores, via pix, para a conta de quatro destinatários diferentes, e que totalizaram a quantia de R$ 47.682,00 (ID 130778071). Segundo a narrativa tecida na inicial, aliada ao Boletim de Ocorrência (evento nº 130778070) e print da tela do aplicativo do banco (ID 130778071, pág. 03), verifica-se que as transações ocorreram entre 12h30min a 12h46min. e, logo em seguida, a autora entrou em contato com a instituição financeira para tentar reaver os valores, bem como registrou a ocorrência do crime contra seu patrimônio perante a autoridade policial, no intuito de reaver a quantia. Da análise meticulosa do conjunto de provas produzido no processo, máxime do teor do documento arquivado ao evento nº 130778071, págs. 01/02, denota-se que a instituição financeira atendeu a solicitação da autora, no mesmo dia, às 23h17min, mas infelizmente, logrou êxito em encontrar quantia ínfima em uma das contas que foi direcionado os valores. Ademais, conforme relatado pelos prepostos da requerida, na conversa pelo aplicativo de mensagens colacionada ao evento nº 130778072, a instituição iniciou o procedimento para tentar recuperar o valor contestado, contudo, não poderia garantir um resultado positivo, já que as transferências foram realizadas de um “aparelho confiável”, por meio da “leitura do rosto” em tempo real, que visa a garantir que o titular da conta é o dono do aparelho que está sendo utilizado para efetuar as transações. Aliás, essas informações restaram como pontos incontroversos no processo, uma vez que a autora confirma que realizou a leitura facial e utilizou sua senha de acesso ao aplicativo, por “orientação” do estelionatário. Consequentemente, diante desta perspectiva, levando-se por linha de estima a noção de ideias de que a responsabilidade da instituição financeira se limita a fomentar sistemas de segurança e exigir maiores informações a fim de confirmar a legitimidade e a identidade do consumidor, e que estas medidas foram tomadas pela requerida, no caso concreto, conclui-se, por inferência racional, a ausência de falha na prestação de serviço. Aliás, neste ponto, a requerida asseverou que além de tomar medidas de segurança por meio do reconhecimento facial e exigência de senha, possui outros mecanismos de defesa para evitar práticas maliciosas, como a que ocorreu, por meio da ativação de limites para efetuar transações via pix durante o dia e noite, a fim de minimizar eventuais danos, os quais também não foram utilizados pela autora. Diante deste cenário, a situação vivenciada pela autora não se equipara a fortuito interno[1], por fato exclusivo de terceiro, na medida em que não houve utilização indevida de seus dados pelo terceiro ou por falha de segurança do sistema do banco, mas todas as transações decorreram de atos perpetrados por ela mesma, embora, ludibriada por esse terceiro. A guisa de ilustração, a corroborar tais assertivas, colho do repertório de jurisprudência do Tribunal de Justiça deste Estado, o seguinte precedente, o qual, mutatis mutandis, versa a respeito de situação semelhante à presente: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. TRASNFERÊNCIA BANCÁRIA. GOLPE PIX PRATICADO POR TERCEIRO. UTILIZAÇÃO DE CELULAR HABILITADO E SENHA PESSOAL – CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR – ARTIGO 14, § 3º, II DO CDC – AFASTADA A RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA – SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O artigo 14, § 3º, inciso II do CDC prevê que o fornecedor de serviços não será responsabilizado em caso de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 2. É fato público e notório que as transações realizadas via PIX somente são autorizadas através de celular pessoal, devidamente habilitado para tal, com a utilização de senha pessoal. Assim, a concretização da fraude somente foi possível em razão da falta de zelo da parte promovente, inexistindo qualquer responsabilidade a ser imputada à instituição bancária. 3.Sentença reformada. 4. Recurso Provido. (N.U 1030702-23.2023.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 28/11/2023, Publicado no DJE 29/11/2023) Por via de consequência, nesse influxo de ideias, a instituição financeira logrou êxito em comprovar fato impeditivo do direito da autora (art. 373, II do CPC), qual seja, sua culpa exclusiva, pois por mera liberalidade, entendeu por bem efetuar transferências de valores para conta bancária de terceiros, mediante a utilização do aplicativo do banco, em celular cadastrado e com a utilização de biometria facial e senha pessoal. Por decorrência lógica, considero que não se encontram presentes os requisitos mínimos que dão ensejo ao dever de restituir/reparar os danos suportados, pois inexistente a falha na prestação do serviço [art. 14 da Lei n.º 8.078/1990]. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial por Marina Maria Barbieri de Souza contra Nu Pagamentos S.A. e, como consequência, DECLARO encerrada a atividade cognitiva, resolvendo-se o mérito do feito, com supedâneo no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil. [...]” Ausência de inversão do ônus da prova – Cerceamento de defesa de oficio. A apelada em suas razões recursais sustenta a omissão da sentença quanto ao pedido de inversão do ônus da prova. É sabido que, em virtude do princípio da livre persuasão racional, o juiz possui a prerrogativa de indeferir, motivadamente, a produção de provas desnecessárias ou inúteis, sem que isso represente ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, consagrados no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Prosseguindo, como sabido, embora se reconheça o direito fundamental da parte ao devido processo legal, do qual desdobra o direito à produção probatória, tal direito não é absoluto, encontrando limites de exercício no próprio ordenamento jurídico. Dentre os princípios processuais que decorrem do devido processo legal, destacam-se o da ampla defesa e o do contraditório, previstos expressamente também no art. 5º, LV, da CF/88. Sobre o princípio do contraditório, destaco a doutrina de Humberto Theodoro Júnior e Dierle Nunes: "Em relação às partes, o contraditório aglomera um feixe de direitos dele decorrentes, entre eles: [...] (b) o direito à prova, possibilitando-lhe sua obtenção toda vez que esta for relevante; (c) em decorrência do anterior, o direito de assistir pessoalmente a assunção da prova e de se contrapor às alegações de fato ou às atividades probatórias da parte contrária ou, mesmo, oficiosas do julgador [...]". (NUNES, Dierle e THEODORO JR., Humberto. Uma dimensão que urge reconhecer ao contraditório no direto brasileiro: sua aplicação como garantia de influência, de não surpresa e de aproveitamento da atividade processual. In: Revista de Processo. Ano 34, n; 168, fev/2009, p. 126). Já o princípio da ampla defesa proporciona às partes a possibilidade de promover a defesa de seus direitos e interesses, utilizando-se de todos os meios permitidos em lei para atuar da maneira mais efetiva possível dentro do processo. Diante disso, para que tais princípios sejam colocados em prática, deve-se permitir às partes a prática dos atos necessários à comprovação de suas assertivas, para que o Julgador, a partir disso, decida de forma coerente com tudo aquilo que foi devidamente produzido nos autos, fundamentando sua decisão e discorrendo sobre os pontos abordados na fase instrutória. Ainda, não se pode perder de vista que o julgador é o verdadeiro destinatário da prova, a qual visa a formação do seu convencimento. Cabe a ele, portanto, avaliar a necessidade de produção de cada um dos meios probatórios postulados pelas partes, indeferindo aqueles que se revelarem desnecessários, sob pena de se atentar contra os princípios da celeridade e economia processual, onerando, injustificadamente, o trâmite processual. Neste sentido o art. 370 do Código de Processo Civil/15: "Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias". Dito isso, reexaminando os autos e a documentação acostada, neste ponto, vê-se que na inicial, a parte autora, friso, hipossuficiente, formula expressamente o seguinte pedido: “ [...]b) A aplicação do Código de Defesa do Consumidor, bem como a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º , VIII, da Lei 8.078/90; [...]” A instituição financeira, em sua contestação, impugna a inversão do ônus da prova no item 2.3, vejamos: “ [...]2.3. IMPOSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA (...)2.3.4. Nesse contexto, não sendo verossímeis as alegações da Autora e carecendo a demanda de elementos a indicar ser ela hipossuficiente, impõe-se o indeferimento do pedido de inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor. Assim, deve o caso seguir o estabelecido no artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, de que “o ônus da prova incumbe aa Autora quanto a fato constitutivo de seu direito [...]”. Prosseguindo no exame dos atos processuais levados a efeito no processo de origem, em nenhum momento, nem na inicial, nem em fase de saneamento e nem, no último caso, na sentença se vê alguma análise do juízo de origem quanto ao pedido de inversão do ônus probatório formulado pela autora e impugnado pelo requerido. Disso resulta, portanto, que foi precipitado o julgamento antecipado da lide, pois faltam elementos técnicos para se chegar à verdade dos fatos. Destarte, como não houve o deferimento ou indeferimento do pedido de inversão do ônus, que entendo ser indispensável à solução da controvérsia, resta caracterizado o cerceamento de defesa com evidente necessidade de instrução probatória no feito em análise, sendo possível concluir que houve, de fato, cerceamento da defesa, motivo pelo qual se impõe a anulação do feito a partir da decisão que suprimiu a fase de instrução e, consequentemente, a cassação da sentença proferida pelo juiz de 1º grau, para o devido prosseguimento do processo. De modo que, repito, observa-se que o autor, em manifestação a tempo e modo quando lhe era devido, formulou pedido de inversão do ônus da prova, contudo, pelo magistrado sentenciante, sem nenhuma manifestação, proferiu sentença julgando improcedentes os pedidos iniciais. Pois bem. De fato, tenho que a inversão do ônus da prova é regra procedimental. Portanto, deve ser decretada pelo Juiz antes de finda a instrução probatória, sob risco de lesão ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, princípios basilares do Estado Democrático de Direito. A matéria era objeto de acalorada divergência no Superior Tribunal de Justiça, mas restou pacificada no julgamento do EREsp 422.778/SP, cuja ementa abaixo transcrevo: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. LEI 8.078/90, ART. 6º, INC. VIII. REGRA DE INSTRUÇÃO. DIVERGÊNCIA CONFIGURADA. O cabimento dos embargos de divergência pressupõe a existência de divergência de entendimentos entre Turmas do STJ a respeito da mesma questão de direito federal. Tratando-se de divergência a propósito de regra de direito processual (inversão do ônus da prova) não se exige que os fatos em causa no acórdão recorrido e paradigma sejam semelhantes, mas apenas que divirjam as Turmas a propósito da interpretação do dispositivo de lei federal controvertido no recurso. Hipótese em que o acórdão recorrido considera a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, inciso VIII, do CDC regra de julgamento e o acórdão paradigma trata o mesmo dispositivo legal como regra de instrução. Divergência configurada. A regra de imputação do ônus da prova estabelecida no art. 12 do CDC tem por pressuposto a identificação do responsável pelo produto defeituoso (fabricante, produtor, construtor e importador), encargo do autor da ação, o que não se verificou no caso em exame. Não podendo ser identificado o fabricante, estende-se a responsabilidade objetiva ao comerciante ( CDC, art. 13). Tendo o consumidor optado por ajuizar a ação contra suposto fabricante, sem comprovar que o réu foi realmente o fabricante do produto defeituoso, ou seja, sem prova do próprio nexo causal entre ação ou omissão do réu e o dano alegado, a inversão do ônus da prova a respeito da identidade do responsável pelo produto pode ocorrer com base no art. 6º, VIII, do CDC, regra de instrução, devendo a decisão judicial que a determinar ser proferida "preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade" ( RESP 802.832 , STJ 2ª Seção, DJ 21.9.2011). (EREsp 422.778/SP, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Relª. p/ Acórdão Minª MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, j. 29/02/2012, DJe 21/06/2012). Fixando-se, portanto, que a inversão do ônus da prova é regra procedimental e que, portanto, deve ser decretada pelo Juiz antes de finda a fase de instrução, a doutrina contemporânea estabelece: "...A regra de inversão do ônus da prova é regra de processo, que autoriza o desvio da rota; não se trata de regra de julgamento, como a que distribui o ônus da prova. Assim, deve o magistrado anunciar a inversão antes de sentenciar e em tempo do sujeito onerado se desincumbir do encargo probatório, não se justificando o posicionamento que defende a possibilidade de a inversão se dar no momento do julgamento, pois 'se fosse lícito ao magistrado operar a inversão do ônus da prova no exato momento da sentença, ocorreria a peculiar situação de, simultaneamente, se atribuir um ônus ao réu, e negar-lhe a possibilidade de desincumbir-se do encargo que antes inexistia'. Uma coisa é a regra que se inverte (a regra do ônus), outra é a regra que inverte (a da inversão do ônus). (...) Reservar a inversão do ônus da prova para o momento da sentença representa ruptura com o sistema do devido processo legal, ofendendo a garantia do contraditório. Não se pode apenar a parte que não provou a veracidade ou inveracidade de uma determinada alegação sem que se tenha conferido a ela a oportunidade de fazê-lo (lembre-se que o ônus subjetivo acaba por condicionar a atuação processual da parte). Por outro lado, exigir que o fornecedor, apenas por vislumbrar uma possível inversão do ônus da prova em seu desfavor, faça prova tanto dos fatos impeditivos, extintivos ou modificativos que eventualmente alegar, como da inexistência do fato constitutivo do direito do consumidor, é tornar legal a inversão que o legislador quis fosse judicial (tanto que exigiu o preenchimento, no caso concreto, de certos requisitos). (FREDIE DIDIER JR, Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, 2ª ed., Salvador: JusPodivm, p. 81/83). Conclusão irrefragável: a inversão do ônus da prova, apesar de requerida, sequer, foi apreciada na fase de saneamento, ou mencionada na sentença. Antes da definição de como será distribuído o ônus da prova, é impossível impor-se ao autor o ônus de provar os fatos alegados. O requerimento de inversão enseja decisão expressa sobre, a fim de que as partes saibam, de antemão, quais provas devem produzir. Não poderia a parte autora presumir que o ônus lhe incumbia ante o silêncio do Juízo, considerada a vedação à prolação de decisão judicial implícita (art. 93, IX, da Constituição). Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL - NEGATIVA DE PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA PELA SEGURADORA FUNDADA EM SUPOSTA APURAÇÃO DE FRAUDE - PROCEDIMENTO ILÍCITO DOLOSAMENTE ENGENDRADO PARA POSSIBILITAR A RECUSA DO PAGAMENTO DO CAPITAL SEGURADO, VISANDO A CONSUMAÇÃO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO, COM O ENVOLVIMENTO DE DOCUMENTOS FALSOS OBTIDOS NO ESTRANGEIRO - TRIBUNAL DE ORIGEM QUE MANTEVE A CONDENAÇÃO COM BASE NA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA APLICADA ENQUANTO REGRA DE JULGAMENTO NO ÂMBITO RESTRITO DA SEGUNDA INSTÂNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ. 1. Existência de omissões relevantes cujo saneamento, pelo Tribunal a quo, se afigura imprescindível ao correto deslinde da controvérsia. 2. Julgamento empreendido pela Corte local mediante a aplicação da inversão do ônus da prova, como regra de julgamento, já em sede de apelação. 2.1 A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina deve ocorrer antes da etapa instrutória, ou quando proferida em momento posterior, garantir a parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas. Precedentes. 2.2 Inviabilidade da inversão do ônus probatório em sede de apelação, notadamente quando fundado em premissa equivocada atinente a suposta hipossuficiência da parte autora, visto que o órgão do Ministério Público não é de ser considerado opositor enfraquecido ou impossibilitado de promover, ainda que minimamente, o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito. 3. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, provido, para cassar os acórdãos dos embargos de declaração e apelação relativamente ao recurso manejado pela seguradora e determinar o retorno dos autos à instância precedente para, uma vez afastada a inversão probatória, proceda a Corte local a análise da apelação interposta pela ré como entender por direito. Ficam prejudicadas as demais teses arguidas no reclamo. (REsp 1286273/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 08/06/2021, DJe 22/06/2021) PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. EXAME ANTERIOR À PROLAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES DO STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de instrução e não regra de julgamento, sendo que a decisão que a determinar deve - preferencialmente - ocorrer durante o saneamento do processo ou - quando proferida em momento posterior - garantir a parte a quem incumbia esse ônus a oportunidade de apresentar suas provas. Precedentes: REsp 1395254/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2013, DJe 29/11/2013; EREsp 422.778/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 29/02/2012, DJe 21/06/2012. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1450473/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014) No mesmo sentido este Tribunal já decidiu: APELAÇÕES – AÇÃO DECLARATÓRIA –CERCEAMENTO DE DEFESA - PROTESTOS EM NOME DA AUTORA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA DEFERIDA NA SENTENÇA - REGRA DE PROCEDIMENTO/INSTRUÇÃO, E NÃO DE JULGAMENTO - VIOLAÇÃO À AMPLA DEFESA DA RÉ - EVIDENTE PREJUÍZO - CAUSA DE NULIDADE DA DECISÃO – PRELIMINAR ACOLHIDA - DECISUM ANULADO – RECURSO DA RÉ PROVIDO E RECURSO DA AUTORA PREJUDICADO. A inversão do ônus da prova deferida apenas na sentença gera a sua nulidade por se tratar de regra de procedimento/instrução, e não de julgamento, sendo evidente a violação ao direito de defesa da parte ré. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10060746620208110003, Relator.: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 26/06/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/06/2024) AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR – PESSOA JURÍDICA QUE SE ENCAIXA COMO DESTINATÁRIA FINAL DOS SERVIÇOS DE TELEFONIA – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INTELIGÊNCIA DO ART. 6º, VIII, DO CDC – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A legislação consumerista regula relações de fornecedores direcionadas a consumidores caracterizados como destinatários finais, ou seja, que adquirem produtos ou serviços para uso próprio sem finalidade de produção de outros produtos ou serviços. Aplica-se as normas consumeristas à relação jurídica entre pessoa jurídica e empresa de telefonia se aquela utiliza os serviços de telefonia para exercer a atividade empresarial, sendo destinatária final do produto, não reinserindo o serviço de telefonia no mercado de consumo, sendo possível a inversão do ônus da prova . (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1002476-74.2024.8.11 .0000, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 03/04/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/04/2024) Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso acolhendo a preliminar suscitada de ofício, de nulidade processual, por cerceamento de defesa, para cassar a sentença e determinar o retorno do feito à fase saneadora, com o enfrentamento do pedido de inversão do ônus da prova e a reabertura da fase probatória após análise do referido pedido. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou 27 resultados. Faça login para ver detalhes completos e mais informações.

Fazer Login para Ver Detalhes