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"1036733-90.2022.8.11.0002" - Resultados da Busca – Página 3 de 3

Antonio De Oliveira Costa x Municipio De Varzea Grande

ID: 310680013

Tribunal: TJMT Órgão: JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E FAZENDÁRIO DE VÁRZEA GRANDE Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública Nº Processo: 1010139-34.2025.8.11.0002

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

ANTONIO DE OLIVEIRA COSTA

Polo Passivo:

MUNICIPIO DE VARZEA GRANDE

Sentença

Advogados:

JULIANA VETTORI SANTAMARIA STABILE

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E FAZENDÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo: 1010139-34.2025.8.11.0002. REQUERENTE: ANTONIO DE OLIVEIRA COSTA REQUERIDO: MUNICIPIO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E FAZENDÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo: 1010139-34.2025.8.11.0002. REQUERENTE: ANTONIO DE OLIVEIRA COSTA REQUERIDO: MUNICIPIO DE VARZEA GRANDE Vistos etc., Desnecessidade de relatório, por força da normativa disposta no art. 38 na Lei nº 9099/95. Fundamentação Não havendo necessidade de dilação probatória, passo ao julgamento antecipado do mérito, eis que presente in casu a hipótese do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Trata-se de ação de cobrança proposta por VALTEIR FERREIRA DE ALMEIDA em MUNICÍPIO DE VÁRZEA GRANDE a declaração de nulidade dos contratos temporários e o recebimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), férias e terço constitucional. Na contestação o Requerido alegou improcedência do pedido. Preliminarmente Em consulta ao sistema PJE identificou-se os processos que tramitou no Juizado Especial Criminal e Fazendário de Várzea Grande: 1018303-90.2022.8.11.0002 – Reclamante requer a condenação do ente público ao pagamento de Férias acrescida do Terço Constitucional dos exercícios de 2017 a 2021, sob o mesmo fato alegado na presente ação, mesmas partes, pedido e causa de pedir cuja sentença resolveu o mérito e já foi expedido o alvará dos valores até dezembro de 2021. 1018303-90.2022.8.11.0002 – Reclamante requer a condenação do ente público ao pagamento de FGTS dos exercícios de 2017 a 2021, sob o mesmo fato alegado na presente ação, mesmas partes, pedido e causa de pedir cuja sentença resolveu o mérito, foi expedido o alvará dos valores até dezembro de 2021e já se encontra arquivado. Configura-se, pois, a coisa julgada sobre o pleito de FGTS, Férias acrescida do terço constitucional referente aos anos de 2017 a 2021, nos termos do § 4º do art. 337 e do art. 485, V, ambos do CPC, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba mais recurso, o que é exatamente o caso dos autos. Passo analisar o pedido referente ao período posterior, a partir de 2022. Prescrição Nos termos do artigo 1º do Decreto Federal nº 20.910/1932, "as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem". Ultrapassado o prazo quinquenal, verifica-se que a presente demanda foi ajuizada em 20/03/2025. Dessa forma, impõe-se o reconhecimento da prescrição quinquenal em relação às parcelas cujo vencimento tenha ocorrido anteriormente a 20/03/2020. Mérito A Constituição Federal, em seu artigo 37, inciso II, reza que: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] II - a investidura em cargo ou emprego público depende de prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração; [..] § 2º A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei. As contratações temporárias no serviço público possuem regramento jurídico próprio, uma vez que constituem exceção à regra do concurso público para ingresso no serviço público, conforme estabelece o artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal. Referidos contratos estão submetidos ao regime jurídico-administrativo, não se lhes aplicando, portanto, os preceitos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, portanto, a Constituição Federal em seu artigo 37, §2º, prevê a nulidade de contratos irregulares. Por outro lado, a nulidade do contrato de trabalho não afasta por completo os direitos do trabalhador, fazendo jus o contratado à percepção do salário, décimo terceiro salário baseado em sua remuneração integral, férias acrescidas de um terço constitucional e recolhimento de FGTS, nos termos do art. 19-A da Lei nº 8.036/90. O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, apreciando o tema 551 de repercussão geral, fixou a seguinte tese: “Servidores temporários não fazem jus a décimo terceiro salário e férias remuneradas acrescidas do terço constitucional, salvo (I) expressa previsão legal e/ou contratual em sentido contrário, ou (II) comprovado desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações”, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão, Plenário, Sessão Virtual de 15.5.2020 a 21.5.2020. Analisando o direito ao recolhimento do FGTS, no julgamento do Tema n. 916, o Supremo Tribunal Federal firmou a seguinte tese: “A contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público realizada em desconformidade com os preceitos do art. 37, IX, da Constituição Federal não gera quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos servidores contratados, com exceção do direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.” No âmbito do Município de Várzea Grande, a matéria é disciplinada pela 1.164, de 20 de novembro de 1991, em seus artigos 244 e 245, dispõe as hipóteses de contratação por tempo determinado no Poder Executivo Municipal, estabelecendo critérios e prazos para sua validade, vejamos: Art. 244. Para atender as necessidades temporárias de excepcional interesse público, poderão ser efetuadas contratações de pessoal por tempo determinado, mediante contrato de locação de serviços. Art. 245. Consideram-se como de necessidade temporária de excepcional interesse público as contratações que visem a: I – combater surtos epidêmicos; II – fazer recenseamento; III – atender situações de calamidade pública; IV – substituir ou admitir professor visitante, inclusive estrangeiro, conforme lei específica do magistério; V – permitir a execução de serviço por profissional de notória especialização, inclusive estrangeiro, nas áreas de pesquisa científica e tecnológica; VI – atender a outras situações de urgência que vierem a ser definidas em lei. §1º - as contratações de que trata este artigo terão dotação específica e não poderão ultrapassar o prazo de seis meses, exceto nas hipóteses dos incisos III e IV, cujo prazo máximo será de doze meses, e inciso V, cujo prazo máximo será de vinte e quatro meses prazos esses improrrogáveis. §2º - O recrutamento será feito mediante processo seletivo simplificado, sujeito a ampla divulgação em jornal de grande circulação, exceto nas hipóteses dos incisos III e IV. Ainda no âmbito municipal, a Lei nº 2.613, de 05 de novembro de 2003, legisla sobre a contratação de pessoal por tempo determinado, vejamos: Art. 1º Para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, os órgãos da Administração Municipal Direta, as Autarquias e as Fundações Públicas deverão efetuar contratação de pessoal por tempo determinado, nas condições e prazos previstos nesta Lei. Art. 2º Considera-se necessidade temporária de excepcional interesse público no âmbito do município: [...] IV - qualquer atividade que necessite ser assegurada pelo Poder Público: a) limpeza pública; b) construções públicas; c) serviços na área de saúde; d) atividades administrativas inerentes à manutenção dos serviços públicos nas secretarias municipais; [...] Art. 4º As contratações serão feitas por tempo determinado, podendo ser prorrogadas pelo mesmo período, observados os seguintes prazos máximos: I - até doze meses, no caso dos incisos I e II do art. 2º; II - até doze meses, no caso do inciso III do artigo 2º; III - até dois anos, nos casos dos incisos IV, V, VI e VII do art. 2º Na presente hipótese, as fichas financeiras anexadas no ID. 187795142, revelam que desde 2022, o autor laborou anualmente junto ao requerido nos meses de janeiro a dezembro. Além disso, se observa que se trata de renovação contratual já que em cada ano o autor possuiu o mesmo número de matrícula o que demonstra que a contratação excedeu ao tempo previsto no art. 4º, III, da Lei Municipal n. 2.613/2003, o que reforça a unicidade dos contratos, vejamos: 2022: Matrícula 143541 – Cargo: Agente de apoio aos serviços externos; 2023: Matrícula 143541 – Cargo: Agente de apoio aos serviços externos; 2024: Matrícula 143541 – Cargo: Agente de apoio aos serviços externos. Ainda, analisa-se no anexo à contestação o relatório apresentado pelo requerido da vida funcional do requerente (ID 192216894), onde demonstra que o respectivo contrato está vigente desde 2021, corroborando a unicidade contratual. Portanto, o vínculo sob a matrícula nº 143541, desde 01 de janeiro de 2021 e situação se perdura até a presente data, desse modo, resta comprovado que o autor excedeu o lapso temporal de dois anos de exercício contínuo previsto no artigo 4º, inciso III, da Lei Municipal nº 2.613/2003. Acerca deste ponto, o STF atribuindo repercussão geral, firmou que são devidos o saldo de salário e o pagamento de verba indenizatória de FGTS nas hipóteses de contratação temporária, cuja contratação não observou as regras legais: CONSTITUCIONAL E TRABALHO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO. NULIDADE. EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS (RE 596.478 - REPERCUSSÃO GERAL). INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1. Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável (CF, art. 37, § 2º). 2. No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido. (RECURSO EXTRAORDINÁRIO 705.140 RIO GRANDE DO SUL). Deste modo, reconheço a nulidade dos contratos firmados com a Administração Pública, impõe-se o deferimento de efeitos meramente indenizatórios, com o consequente pagamento da indenização substitutiva referente ao FGTS, ante a configuração de vínculo sucessivo. Superada a análise do primeiro pleito, passa-se ao exame do segundo pedido formulado na exordial. Neste, a parte autora postula o pagamento de férias acrescidos do terço constitucional, alegando que não houve a devida quitação da referida verba por parte da requerida. Nesse contexto, a Lei municipal n. 2.613/2003, estabelece que apenas que: “Art. 10. Os contratados nos termos desta Lei perceberão férias remuneradas inclusive 1/3 de abono e décimo terceiro, se o contrato estiver na faixa salarial beneficiada por Ato Normativo.” Portanto, verifica-se que, independentemente se o contrato temporário foi ou não desvirtuado, a parte reclamante tem direito ao 13º salário, e às férias com acréscimo 1/3, ex vi legis, com base no Tema 551 do STF. No caso, competia ao Réu a prova do pagamento das férias e do terço constitucional pleiteados, ante a impossibilidade de produção de prova negativa pela autora. Analisando as fichas financeiras anexadas aos autos ID. 187795142, verifica-se que não há registro de pagamento de férias. Logo, não tendo o Requerido demonstrado estar adimplente com o pagamento das referidas verbas, o pedido da autora comporta acolhimento. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados na inicial: a) Declarar a nulidade dos contratos temporários do período 01/2022 a 12/2024; b) Declarar prescritas as parcelas cujo vencimento tenha ocorrido anteriormente a 20/03/2020; c) Condenar o requerido a pagar ao requerente 8% sobre a remuneração bruta, do período não prescrito, a título de FGTS, respeitando a prescrição quinquenal; d) Condenar o requerido ao pagamento de 30 dias de férias acrescidas do terço constitucional, referente as parcelas não prescritas e deduzidas as parcelas já liquidadas. Para atualização do valor deverá incidir correção monetária pelo IPCA-E, desde a data que deveria ter sido paga, bem como juros de mora pela remuneração oficial da caderneta de poupança desde a data da citação. Se a citação ocorreu antes de dezembro de 2021, os índices retro mencionados deverão permanecer até esse período, quando deverá incidir exclusivamente a taxa SELIC para os encargos moratórios (correção e juros). Caso a citação ocorreu a partir de dezembro de 2021, deverá incidir desde logo somente a taxa Selic para os encargos moratórios (correção e juros). De toda forma, o valor deverá respeitar o teto do Juizado Especial Fazendário. (ex vi Tema 810 do STF, Tema 905 do STJ e Emenda Constitucional nº 113/2021). Via de consequência, EXTINGUE-SE o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Por ocasião da fase de cumprimento de sentença, a parte autora deverá apresentar memória de cálculo nos exatos limites declinados nesta decisão. Desnecessidade de reexame necessário, por força do que dispõe o art. 11 da Lei nº 12.153/09. Sem custas nem honorários, em conformidade com o art. 54 e art. 55, ambos da Lei n. 9.099/95. À consideração ao Excelentíssimo Juiz de Direito do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande para homologação, conforme o artigo 40, da Lei n. 9.099/95. Várzea Grande/MT. José Eduardo Rezende de Oliveira Juiz Leigo Vistos etc., HOMOLOGO o projeto de sentença retro, na forma do art. 40, da Lei 9.099/95, e art. 8º, parágrafo único da Lei Complementar Estadual nº 270/2007. Preclusa a via recursal e nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Várzea Grande, data registrada no sistema. (assinado digitalmente) Hugo José Freitas da Silva Juiz de Direito

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Processo nº 1007852-49.2023.8.11.0041

ID: 259432025

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007852-49.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

IZAURA CLARA DE MOURA K. E. L. D. M.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ELLEN LANARA SILVA DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

FABIO ALVES DE OLIVEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007852-49.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). MAR… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007852-49.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [IZAURA CLARA DE MOURA - CPF: 043.947.831-60 (APELANTE), FABIO ALVES DE OLIVEIRA - CPF: 902.012.991-00 (ADVOGADO), ELLEN LANARA SILVA DOS SANTOS - CPF: 050.324.551-80 (ADVOGADO), K. E. L. D. M. - CPF: 116.968.021-64 (APELANTE), A L BORBA - CNPJ: 37.479.219/0001-25 (APELADO), HELIO MACHADO DA COSTA JUNIOR - CPF: 779.969.921-34 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), IZAURA CLARA DE MOURA - CPF: 043.947.831-60 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Indenização por danos morais. Exames laboratoriais com resultados divergentes. Internação de recém-nascido. Ausência de nexo de causalidade entre a conduta do laboratório e o dano alegado. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de indenização por danos morais. Os apelantes sustentaram que os laudos laboratoriais reiteradamente equivocados quanto à dosagem de bilirrubina de recém-nascido teriam provocado internação hospitalar desnecessária, ocasionando sofrimento emocional à genitora. A sentença reconheceu a ausência de provas quanto à conduta ilícita e ao nexo causal, e a decisão foi mantida em grau recursal. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se a divergência nos resultados laboratoriais apresentados justifica a responsabilização civil da empresa demandada por danos morais, em razão da suposta internação indevida e sofrimento psicológico da genitora. III. Razões de decidir 3. A conduta médica baseou-se em um conjunto de fatores clínicos, como ausência de pré-natal, baixo peso ao nascer, alterações em exame de PCR e avaliação clínica constante, não havendo demonstração de que a manutenção da internação do recém-nascido tenha decorrido exclusivamente dos exames laboratoriais impugnados. IV. Dispositivo e tese 4. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A divergência entre resultados laboratoriais não configura, por si só, falha na prestação do serviço. 2. A responsabilização civil exige prova do nexo causal entre a conduta do fornecedor e o dano alegado”. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 2º, 3º e 14. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.358.513/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 12.05.2020, DJe 04.08.2020; TJMT, Apelação Cível n. 1032659-90.2022.8.11.0002, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, j. 01.04.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por IZAURA CLARA DE MOURA e K. E. L. D. M. contra a sentença prolatada pelo MM. Dr. Alexandre Elias Filho, Juiz de Direito da 8ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que, nos autos da Ação de indenização por Danos Morais ajuizada em face de A. L. BORBA- EPP, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, ao fundamento de que não restou demonstrada nos autos a ocorrência de erro laboratorial por parte da empresa demandada, tampouco se verificou a existência de nexo de causalidade entre a conduta imputada e o dano moral alegadamente suportado pelos autores, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, com a ressalva de que a exigibilidade das verbas restou suspensa, ante a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça. Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta que a parte apelada incorreu em falha na prestação do serviço ao emitir, de modo reiterado, laudos laboratoriais incorretos relativos à dosagem de bilirrubina do recém-nascido K. E. L. D. M., os quais apontavam índices elevados de forma injustificada. Alega que essa circunstância levou à indicação de tratamento médico intensivo, inclusive com internação hospitalar e encaminhamento à UTI neonatal, sem que houvesse necessidade clínica real, o que somente foi constatado após a realização de novos exames em laboratório diverso, cujos resultados evidenciaram normalidade nos parâmetros bioquímicos. Aduz que o episódio ocasionou considerável angústia psíquica e sofrimento moral, notadamente à genitora apelante, diante da apreensão experimentada frente à hipótese de estado grave de saúde do filho recém-nascido. Por fim, argumenta que se configura responsabilidade objetiva da empresa apelada, nos moldes do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de típica relação de consumo. Com essas considerações, requer o provimento do presente recurso para reformar a sentença recorrida, a fim de condenar a empresa apelada ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O recurso é tempestivo e a parte apelante é beneficiária da justiça gratuita (ID 275747925 e 276068369). A parte apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do presente recurso (ID 275747926). A d. Procuradoria-Geral de Justiça, em seu parecer, manifestou-se pelo parcial provimento do recurso, por entender que restou demonstrada falha na prestação do serviço por parte do laboratório apelado, diante da reiteração de resultados laboratoriais equivocados que implicaram na internação desnecessária de recém-nascido em UTI, causando abalo psicológico à genitora apelante e configurando dano moral in re ipsa, motivo pelo qual opinou pela fixação de indenização a título de danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) (ID 276923864). É o relatório. Inclua-se em pauta V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Extrai-se da origem que IZAURA CLARA DE MOURA e K. E. L. D. M. ajuizaram Ação de indenização por Danos Morais em face de A. L. BORBA – EPP, alegando erro na análise de exames laboratoriais realizados pelo laboratório requerido, os quais teriam apontado alterações significativas nos níveis de bilirrubina do recém-nascido requerente, ora apelante. Na petição inicial, a parte requerente relatou que, durante a internação hospitalar, o recém-nascido foi submetido a exames diários realizados pelo laboratório requerido, que apontaram alterações significativas nos níveis de bilirrubina. Em razão desses resultados, foi indicado tratamento com fototerapia e cogitada sua transferência para a UTI, o que teria causado intenso sofrimento emocional à genitora, especialmente por estar em período de puerpério. Aduziu que, desconfiada dos resultados, a genitora solicitou contraprova em outro laboratório, a qual indicou normalidade nos níveis de bilirrubina. Diante disso, requereram a condenação do laboratório ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Em contestação, o laboratório requerido alegou que sua atuação se restringiu ao fornecimento de insumos laboratoriais, sendo a coleta e o manuseio inicial das amostras de responsabilidade dos profissionais do hospital. Argumentou, ainda, que eventuais falhas na coleta ou fatores externos podem ter interferido nos resultados dos exames, e que não houve comprovação de dano moral, uma vez que a equipe médica prontamente encaminhou o recém-nascido para outro laboratório, evitando qualquer agravamento no quadro clínico (ID 275747899). Regularmente processado o feito, o Juízo a quo prolatou sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial, fundamentando-se nos seguintes termos: “[...] Deveras, da análise de todo o conteúdo probatório produzido, verifico que não ficou comprovada a prática de conduta ilícita pela empresa requerida, que dê ensejo ao dever de indenizar. Isto porque incumbia aos autores comprovarem a conduta ilícita, os danos sofridos e o nexo de causalidade entre os danos e a conduta da ré, o que não ocorreu no presente caso. No objetivo de comprovar o alegado na inicial, os postulantes se limitaram em apresentar cópia do prontuário médico do atendimento prestado pelo Hospital e Pronto Socorro de Várzea Grande (Id. 111371511), do exame questionado (Id. 111371508) e do novo exame (Id. 111371507). Ocorre que somente os referidos documentos não possuem o condão de provar a conduta ilícita supostamente perpetrada pelo laboratório requerido, algo que deveria ser respaldado por outras provas. Por outro lado, os elementos que se tem nos autos não comprovam que houve erro efetivo nos exames laboratoriais que possa ser imputado ao requerido. Conforme alegado e demonstrado na contestação, o laboratório limitou-se à análise do material enviado, não sendo responsável pela coleta ou pela interpretação médica dos resultados. Não é possível imputar ao réu uma conduta errônea na realização do exame somente pelo fato de um novo exame, efetivado em outro laboratório, ter indicado resultado diferente. Ademais, os próprios documentos médicos indicam que, ao notar desconformidades clínicas, a equipe médica rapidamente encaminhou o recém-nascido para outro laboratório, afastando qualquer piora no quadro clínico. Não há provas de que a conduta do requerido tenha causado prejuízo efetivo à saúde do infante ou à integridade emocional dos autores. Assim, da análise de todo o acervo probatório, verifico que inexistem nos autos provas suficientes que amparem o pedido de indenização por dano moral formulado na inicial. Isso porque, os parcos documentos apresentados pelos requerentes não demonstram de forma inequívoca que o réu procedeu de modo irregular na realização do exame do recém-nascido. Ora, é sabido que no Direito Processual Civil Brasileiro vige o sistema do ônus da prova, significando que ao afirmar os fatos o autor e o réu têm o ônus de provar as suas alegações, sob pena de não serem consideradas verdadeiras. [...] Deste modo, considerando quea distribuição do ônus da prova definida no Código de Processo Civil (CPC – inciso I, art. 373), dispõe que o ônus da prova incumbe “ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito”, entendo que a configuração dos danos morais não ficou comprovada no presente caso. Portanto, sem a prova dos fatos, as alegações se tornam frágeis e inconsistentes, desautorizando a reparação pretendida, tendo em vista que a requerente desatendeu à regra do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC. [...]” (ID 275747922). Irresignada, a parte apelante interpôs o presente recurso visando à reforma da sentença, alegando a ocorrência de ato ilícito que teria causado grave abalo psicológico e internação desnecessária do recém-nascido à época dos fatos. Pois bem. Inicialmente, cumpre reconhecer a incidência do Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica estabelecida entre as partes, uma vez que a parte apelante se enquadra no conceito de consumidor (art. 2º do CDC) e a apelada no de fornecedora de serviços (art. 3º do CDC). Todavia, para que se configure o dever de indenizar, é imprescindível a presença dos pressupostos da responsabilidade civil, quais sejam: (i) conduta ilícita; (ii) dano; e (iii) nexo de causalidade entre a conduta e o dano. A ausência de qualquer desses elementos afasta a obrigação de reparar. Nesse sentido, dispõe a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “[...] 2. Nos termos da jurisprudência do STJ, "É objetiva a responsabilidade do fornecedor (fabricante, o produtor, o construtor e o importador) na hipótese de defeito na prestação do serviço, e, desde que demonstrado o nexo causal entre o defeito do serviço e o acidente de consumo ou fato do serviço, nascerá o dever reparatório, cuja isenção apenas será possível nos casos em que constatada a culpa exclusiva do consumidor ou uma das causas excludentes de responsabilidade genérica - força maior ou caso fortuito externo" (REsp 1.358.513/RS, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, julgado em 12/5/2020, DJe de 4/8/2020). [...]” (STJ - AgInt no AREsp: 2495741 DF 2023/0350148-3, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 27/05/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/06/2024 – grifo nosso). No caso concreto, porém, não se verifica a presença do nexo causal entre a conduta da apelada e os alegados danos suportados pela parte apelante — elemento essencial à responsabilização civil. Vejamos. Embora a parte apelante sustente que a permanência hospitalar do recém-nascido por 9 (nove) dias decorreu exclusivamente de supostos erros em exames de bilirrubina, os elementos constantes dos autos demonstram que a conduta médica esteve pautada em um conjunto mais amplo de fatores clínicos, e não apenas nos resultados laboratoriais (ID 275747901). Primeiramente, destaca-se a ausência de acompanhamento pré-natal por parte da genitora, circunstância que, por si só, justifica maior vigilância da equipe médica, diante da impossibilidade de aferição prévia de eventuais riscos gestacionais ou complicações (ID 275747901, pp. 20 e 21). Ademais, o exame de Proteína C Reativa (PCR), realizado em 19/08/2022, apresentou valores elevados, indicando processo inflamatório/infeccioso ativo e exigindo acompanhamento hospitalar contínuo (ID 275747901, p. 17; ID 275747903, p. 2). Soma-se a isso o diagnóstico de “RNT/PIG/BAIXO PESO”, ou seja, recém-nascido a termo, pequeno para a idade gestacional e com baixo peso ao nascer — condição que, rotineiramente, demanda observação hospitalar prolongada para assegurar uma transição segura à vida extrauterina e prevenir complicações iniciais (ID 275747901, p. 3). Importante ressaltar que a médica responsável, ao notar discrepância entre o quadro clínico e os resultados laboratoriais, registrou em 20/08/2022: “RESULTADO DE EXAMES DE ONTEM NÃO CONDIZ COM A CLÍNICA” [sic] (ID 275747901, p. 15), demonstrando que a conduta médica não se baseava exclusivamente nos exames laboratoriais, mas na avaliação clínica global do paciente. Além disso, como consta nas razões recursais da própria apelante, a recomendação de encaminhamento à UTI não se concretizou, veja-se: “O desgaste imposto aos Apelantes, como já relatado, é ainda maior pelo fato de terem sidos obrigados a permanecerem internados no hospital por 9 dias de forma desnecessária, chegando quase ao ponto do 2º Recorrente ser internado na UTI, estando totalmente saudável” (ID 275747924, p. 6). Portanto, ainda que se admita a possibilidade de erro nos exames realizados pela apelada, não se pode afirmar que esse tenha sido fator determinante para a manutenção da internação ou para qualquer sofrimento relevante da parte apelante. A divergência entre os resultados dos exames (23,91 mg/dL e 9,40 mg/dL – ID’s 275746882 e 275746881) não constitui, por si só, erro técnico incontestável, sendo possível sua ocorrência por variáveis como diferenças metodológicas, fatores biológicos e condições pré-analíticas, como coleta ou transporte das amostras. Por fim, o estado emocional da genitora apelante, apontado como fonte de sofrimento, já se mostrava fragilizado antes mesmo da controvérsia acerca dos exames de bilirrubina. Conforme consta do prontuário, em 20/08/2022, a médica registrou: “MÃE CHOROSA, POLIQUEIXOSA, POUCO COLABORATIVA, APÁTICA, NÃO MOSTRA SATISFAÇÃO COM NOSSAS CONDUTAS E ORIENTAÇÕES. EXPLICO NOVAMENTE CASO CLÍNICO E A MESMA REFERE DESEJO DE EVASÃO. SOLICITO PSICOLOGIA PARA A MESMA” [sic] (ID 275747901, p. 15), revelando que seu abalo emocional mãe decorreu de um conjunto de fatores relacionados ao puerpério e à internação do recém-nascido, e não exclusivamente dos exames questionados. Dessa forma, conclui-se que a internação do recém-nascido resultou de múltiplos fatores clínicos, que o encaminhamento à UTI não se concretizou e que o sofrimento da genitora não possui vínculo direto e comprovado com o exame contestado. Assim, não se verifica a configuração da responsabilidade civil da apelada, diante da ausência de nexo causal entre eventual falha laboratorial e os danos alegados, motivo pelo qual a sentença recorrida deve ser mantida em sua integralidade. A propósito: “DIREITO CIVIL – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS [...] A ausência de elementos que demonstrem ato ilícito ou o nexo causal rompe a cadeia de responsabilidade civil, impedindo o dever de indenizar [...]” (N.U 1000790-80.2021.8.11.0023, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 06/04/2025 – grifo nosso). “[...] AUSÊNCIA DE ILICITUDE E NEXO DE CAUSALIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL AFASTADA. RECURSO DESPROVIDO. [...] A ausência de provas robustas que demonstrem o nexo de causalidade entre a conduta do cartório e o prejuízo alegado inviabiliza a responsabilização civil e a condenação por danos morais. [...]” (N.U 1032659-90.2022.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025 – grifo nosso). À vista disso, com a devida vênia ao entendimento manifestado pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, este relator diverge da conclusão apresentada no parecer, o qual opinou pelo parcial provimento do recurso e pela fixação de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando que a análise dos autos não permite concluir, de forma inequívoca, pela existência de nexo causal entre a conduta do laboratório e os danos alegados, conforme fundamentado anteriormente. Por todo o exposto, conheço e NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto por Izaura Clara De Moura e K. E. L. D. M., mantendo-se a r. sentença incólume. Por conseguinte, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro a condenação em honorários advocatícios de 10% para 15% (quinze por cento), mantida a suspensão da exigibilidade, tendo em vista a gratuidade da justiça deferida (art. 98, § 3º, do CPC). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1007852-49.2023.8.11.0041

ID: 259432026

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007852-49.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

A L BORBA

Acórdão

Advogados:

HELIO MACHADO DA COSTA JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007852-49.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). MAR… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007852-49.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [IZAURA CLARA DE MOURA - CPF: 043.947.831-60 (APELANTE), FABIO ALVES DE OLIVEIRA - CPF: 902.012.991-00 (ADVOGADO), ELLEN LANARA SILVA DOS SANTOS - CPF: 050.324.551-80 (ADVOGADO), K. E. L. D. M. - CPF: 116.968.021-64 (APELANTE), A L BORBA - CNPJ: 37.479.219/0001-25 (APELADO), HELIO MACHADO DA COSTA JUNIOR - CPF: 779.969.921-34 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), IZAURA CLARA DE MOURA - CPF: 043.947.831-60 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Indenização por danos morais. Exames laboratoriais com resultados divergentes. Internação de recém-nascido. Ausência de nexo de causalidade entre a conduta do laboratório e o dano alegado. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de indenização por danos morais. Os apelantes sustentaram que os laudos laboratoriais reiteradamente equivocados quanto à dosagem de bilirrubina de recém-nascido teriam provocado internação hospitalar desnecessária, ocasionando sofrimento emocional à genitora. A sentença reconheceu a ausência de provas quanto à conduta ilícita e ao nexo causal, e a decisão foi mantida em grau recursal. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se a divergência nos resultados laboratoriais apresentados justifica a responsabilização civil da empresa demandada por danos morais, em razão da suposta internação indevida e sofrimento psicológico da genitora. III. Razões de decidir 3. A conduta médica baseou-se em um conjunto de fatores clínicos, como ausência de pré-natal, baixo peso ao nascer, alterações em exame de PCR e avaliação clínica constante, não havendo demonstração de que a manutenção da internação do recém-nascido tenha decorrido exclusivamente dos exames laboratoriais impugnados. IV. Dispositivo e tese 4. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A divergência entre resultados laboratoriais não configura, por si só, falha na prestação do serviço. 2. A responsabilização civil exige prova do nexo causal entre a conduta do fornecedor e o dano alegado”. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 2º, 3º e 14. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.358.513/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 12.05.2020, DJe 04.08.2020; TJMT, Apelação Cível n. 1032659-90.2022.8.11.0002, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, j. 01.04.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por IZAURA CLARA DE MOURA e K. E. L. D. M. contra a sentença prolatada pelo MM. Dr. Alexandre Elias Filho, Juiz de Direito da 8ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que, nos autos da Ação de indenização por Danos Morais ajuizada em face de A. L. BORBA- EPP, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, ao fundamento de que não restou demonstrada nos autos a ocorrência de erro laboratorial por parte da empresa demandada, tampouco se verificou a existência de nexo de causalidade entre a conduta imputada e o dano moral alegadamente suportado pelos autores, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, com a ressalva de que a exigibilidade das verbas restou suspensa, ante a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça. Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta que a parte apelada incorreu em falha na prestação do serviço ao emitir, de modo reiterado, laudos laboratoriais incorretos relativos à dosagem de bilirrubina do recém-nascido K. E. L. D. M., os quais apontavam índices elevados de forma injustificada. Alega que essa circunstância levou à indicação de tratamento médico intensivo, inclusive com internação hospitalar e encaminhamento à UTI neonatal, sem que houvesse necessidade clínica real, o que somente foi constatado após a realização de novos exames em laboratório diverso, cujos resultados evidenciaram normalidade nos parâmetros bioquímicos. Aduz que o episódio ocasionou considerável angústia psíquica e sofrimento moral, notadamente à genitora apelante, diante da apreensão experimentada frente à hipótese de estado grave de saúde do filho recém-nascido. Por fim, argumenta que se configura responsabilidade objetiva da empresa apelada, nos moldes do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de típica relação de consumo. Com essas considerações, requer o provimento do presente recurso para reformar a sentença recorrida, a fim de condenar a empresa apelada ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O recurso é tempestivo e a parte apelante é beneficiária da justiça gratuita (ID 275747925 e 276068369). A parte apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do presente recurso (ID 275747926). A d. Procuradoria-Geral de Justiça, em seu parecer, manifestou-se pelo parcial provimento do recurso, por entender que restou demonstrada falha na prestação do serviço por parte do laboratório apelado, diante da reiteração de resultados laboratoriais equivocados que implicaram na internação desnecessária de recém-nascido em UTI, causando abalo psicológico à genitora apelante e configurando dano moral in re ipsa, motivo pelo qual opinou pela fixação de indenização a título de danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) (ID 276923864). É o relatório. Inclua-se em pauta V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Extrai-se da origem que IZAURA CLARA DE MOURA e K. E. L. D. M. ajuizaram Ação de indenização por Danos Morais em face de A. L. BORBA – EPP, alegando erro na análise de exames laboratoriais realizados pelo laboratório requerido, os quais teriam apontado alterações significativas nos níveis de bilirrubina do recém-nascido requerente, ora apelante. Na petição inicial, a parte requerente relatou que, durante a internação hospitalar, o recém-nascido foi submetido a exames diários realizados pelo laboratório requerido, que apontaram alterações significativas nos níveis de bilirrubina. Em razão desses resultados, foi indicado tratamento com fototerapia e cogitada sua transferência para a UTI, o que teria causado intenso sofrimento emocional à genitora, especialmente por estar em período de puerpério. Aduziu que, desconfiada dos resultados, a genitora solicitou contraprova em outro laboratório, a qual indicou normalidade nos níveis de bilirrubina. Diante disso, requereram a condenação do laboratório ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Em contestação, o laboratório requerido alegou que sua atuação se restringiu ao fornecimento de insumos laboratoriais, sendo a coleta e o manuseio inicial das amostras de responsabilidade dos profissionais do hospital. Argumentou, ainda, que eventuais falhas na coleta ou fatores externos podem ter interferido nos resultados dos exames, e que não houve comprovação de dano moral, uma vez que a equipe médica prontamente encaminhou o recém-nascido para outro laboratório, evitando qualquer agravamento no quadro clínico (ID 275747899). Regularmente processado o feito, o Juízo a quo prolatou sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial, fundamentando-se nos seguintes termos: “[...] Deveras, da análise de todo o conteúdo probatório produzido, verifico que não ficou comprovada a prática de conduta ilícita pela empresa requerida, que dê ensejo ao dever de indenizar. Isto porque incumbia aos autores comprovarem a conduta ilícita, os danos sofridos e o nexo de causalidade entre os danos e a conduta da ré, o que não ocorreu no presente caso. No objetivo de comprovar o alegado na inicial, os postulantes se limitaram em apresentar cópia do prontuário médico do atendimento prestado pelo Hospital e Pronto Socorro de Várzea Grande (Id. 111371511), do exame questionado (Id. 111371508) e do novo exame (Id. 111371507). Ocorre que somente os referidos documentos não possuem o condão de provar a conduta ilícita supostamente perpetrada pelo laboratório requerido, algo que deveria ser respaldado por outras provas. Por outro lado, os elementos que se tem nos autos não comprovam que houve erro efetivo nos exames laboratoriais que possa ser imputado ao requerido. Conforme alegado e demonstrado na contestação, o laboratório limitou-se à análise do material enviado, não sendo responsável pela coleta ou pela interpretação médica dos resultados. Não é possível imputar ao réu uma conduta errônea na realização do exame somente pelo fato de um novo exame, efetivado em outro laboratório, ter indicado resultado diferente. Ademais, os próprios documentos médicos indicam que, ao notar desconformidades clínicas, a equipe médica rapidamente encaminhou o recém-nascido para outro laboratório, afastando qualquer piora no quadro clínico. Não há provas de que a conduta do requerido tenha causado prejuízo efetivo à saúde do infante ou à integridade emocional dos autores. Assim, da análise de todo o acervo probatório, verifico que inexistem nos autos provas suficientes que amparem o pedido de indenização por dano moral formulado na inicial. Isso porque, os parcos documentos apresentados pelos requerentes não demonstram de forma inequívoca que o réu procedeu de modo irregular na realização do exame do recém-nascido. Ora, é sabido que no Direito Processual Civil Brasileiro vige o sistema do ônus da prova, significando que ao afirmar os fatos o autor e o réu têm o ônus de provar as suas alegações, sob pena de não serem consideradas verdadeiras. [...] Deste modo, considerando quea distribuição do ônus da prova definida no Código de Processo Civil (CPC – inciso I, art. 373), dispõe que o ônus da prova incumbe “ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito”, entendo que a configuração dos danos morais não ficou comprovada no presente caso. Portanto, sem a prova dos fatos, as alegações se tornam frágeis e inconsistentes, desautorizando a reparação pretendida, tendo em vista que a requerente desatendeu à regra do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC. [...]” (ID 275747922). Irresignada, a parte apelante interpôs o presente recurso visando à reforma da sentença, alegando a ocorrência de ato ilícito que teria causado grave abalo psicológico e internação desnecessária do recém-nascido à época dos fatos. Pois bem. Inicialmente, cumpre reconhecer a incidência do Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica estabelecida entre as partes, uma vez que a parte apelante se enquadra no conceito de consumidor (art. 2º do CDC) e a apelada no de fornecedora de serviços (art. 3º do CDC). Todavia, para que se configure o dever de indenizar, é imprescindível a presença dos pressupostos da responsabilidade civil, quais sejam: (i) conduta ilícita; (ii) dano; e (iii) nexo de causalidade entre a conduta e o dano. A ausência de qualquer desses elementos afasta a obrigação de reparar. Nesse sentido, dispõe a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “[...] 2. Nos termos da jurisprudência do STJ, "É objetiva a responsabilidade do fornecedor (fabricante, o produtor, o construtor e o importador) na hipótese de defeito na prestação do serviço, e, desde que demonstrado o nexo causal entre o defeito do serviço e o acidente de consumo ou fato do serviço, nascerá o dever reparatório, cuja isenção apenas será possível nos casos em que constatada a culpa exclusiva do consumidor ou uma das causas excludentes de responsabilidade genérica - força maior ou caso fortuito externo" (REsp 1.358.513/RS, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, julgado em 12/5/2020, DJe de 4/8/2020). [...]” (STJ - AgInt no AREsp: 2495741 DF 2023/0350148-3, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 27/05/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/06/2024 – grifo nosso). No caso concreto, porém, não se verifica a presença do nexo causal entre a conduta da apelada e os alegados danos suportados pela parte apelante — elemento essencial à responsabilização civil. Vejamos. Embora a parte apelante sustente que a permanência hospitalar do recém-nascido por 9 (nove) dias decorreu exclusivamente de supostos erros em exames de bilirrubina, os elementos constantes dos autos demonstram que a conduta médica esteve pautada em um conjunto mais amplo de fatores clínicos, e não apenas nos resultados laboratoriais (ID 275747901). Primeiramente, destaca-se a ausência de acompanhamento pré-natal por parte da genitora, circunstância que, por si só, justifica maior vigilância da equipe médica, diante da impossibilidade de aferição prévia de eventuais riscos gestacionais ou complicações (ID 275747901, pp. 20 e 21). Ademais, o exame de Proteína C Reativa (PCR), realizado em 19/08/2022, apresentou valores elevados, indicando processo inflamatório/infeccioso ativo e exigindo acompanhamento hospitalar contínuo (ID 275747901, p. 17; ID 275747903, p. 2). Soma-se a isso o diagnóstico de “RNT/PIG/BAIXO PESO”, ou seja, recém-nascido a termo, pequeno para a idade gestacional e com baixo peso ao nascer — condição que, rotineiramente, demanda observação hospitalar prolongada para assegurar uma transição segura à vida extrauterina e prevenir complicações iniciais (ID 275747901, p. 3). Importante ressaltar que a médica responsável, ao notar discrepância entre o quadro clínico e os resultados laboratoriais, registrou em 20/08/2022: “RESULTADO DE EXAMES DE ONTEM NÃO CONDIZ COM A CLÍNICA” [sic] (ID 275747901, p. 15), demonstrando que a conduta médica não se baseava exclusivamente nos exames laboratoriais, mas na avaliação clínica global do paciente. Além disso, como consta nas razões recursais da própria apelante, a recomendação de encaminhamento à UTI não se concretizou, veja-se: “O desgaste imposto aos Apelantes, como já relatado, é ainda maior pelo fato de terem sidos obrigados a permanecerem internados no hospital por 9 dias de forma desnecessária, chegando quase ao ponto do 2º Recorrente ser internado na UTI, estando totalmente saudável” (ID 275747924, p. 6). Portanto, ainda que se admita a possibilidade de erro nos exames realizados pela apelada, não se pode afirmar que esse tenha sido fator determinante para a manutenção da internação ou para qualquer sofrimento relevante da parte apelante. A divergência entre os resultados dos exames (23,91 mg/dL e 9,40 mg/dL – ID’s 275746882 e 275746881) não constitui, por si só, erro técnico incontestável, sendo possível sua ocorrência por variáveis como diferenças metodológicas, fatores biológicos e condições pré-analíticas, como coleta ou transporte das amostras. Por fim, o estado emocional da genitora apelante, apontado como fonte de sofrimento, já se mostrava fragilizado antes mesmo da controvérsia acerca dos exames de bilirrubina. Conforme consta do prontuário, em 20/08/2022, a médica registrou: “MÃE CHOROSA, POLIQUEIXOSA, POUCO COLABORATIVA, APÁTICA, NÃO MOSTRA SATISFAÇÃO COM NOSSAS CONDUTAS E ORIENTAÇÕES. EXPLICO NOVAMENTE CASO CLÍNICO E A MESMA REFERE DESEJO DE EVASÃO. SOLICITO PSICOLOGIA PARA A MESMA” [sic] (ID 275747901, p. 15), revelando que seu abalo emocional mãe decorreu de um conjunto de fatores relacionados ao puerpério e à internação do recém-nascido, e não exclusivamente dos exames questionados. Dessa forma, conclui-se que a internação do recém-nascido resultou de múltiplos fatores clínicos, que o encaminhamento à UTI não se concretizou e que o sofrimento da genitora não possui vínculo direto e comprovado com o exame contestado. Assim, não se verifica a configuração da responsabilidade civil da apelada, diante da ausência de nexo causal entre eventual falha laboratorial e os danos alegados, motivo pelo qual a sentença recorrida deve ser mantida em sua integralidade. A propósito: “DIREITO CIVIL – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS [...] A ausência de elementos que demonstrem ato ilícito ou o nexo causal rompe a cadeia de responsabilidade civil, impedindo o dever de indenizar [...]” (N.U 1000790-80.2021.8.11.0023, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 06/04/2025 – grifo nosso). “[...] AUSÊNCIA DE ILICITUDE E NEXO DE CAUSALIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL AFASTADA. RECURSO DESPROVIDO. [...] A ausência de provas robustas que demonstrem o nexo de causalidade entre a conduta do cartório e o prejuízo alegado inviabiliza a responsabilização civil e a condenação por danos morais. [...]” (N.U 1032659-90.2022.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025 – grifo nosso). À vista disso, com a devida vênia ao entendimento manifestado pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, este relator diverge da conclusão apresentada no parecer, o qual opinou pelo parcial provimento do recurso e pela fixação de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando que a análise dos autos não permite concluir, de forma inequívoca, pela existência de nexo causal entre a conduta do laboratório e os danos alegados, conforme fundamentado anteriormente. Por todo o exposto, conheço e NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto por Izaura Clara De Moura e K. E. L. D. M., mantendo-se a r. sentença incólume. Por conseguinte, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro a condenação em honorários advocatícios de 10% para 15% (quinze por cento), mantida a suspensão da exigibilidade, tendo em vista a gratuidade da justiça deferida (art. 98, § 3º, do CPC). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1001863-62.2023.8.11.0041

ID: 331243785

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001863-62.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001863-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001863-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Tratamento médico-hospitalar, Fornecimento de medicamentos] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES] Parte(s): [MARIA DAS GRACAS RODRIGUES - CPF: 062.169.861-04 (APELADO), RENYL FERREIRA BRITO CANDIDO - CPF: 012.481.671-12 (ADVOGADO), LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA - CPF: 947.708.911-72 (APELADO), UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA - CPF: 947.708.911-72 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A DIREITO À SAÚDE. RECURSO DE APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. RECUSA DE COBERTURA DE TRATAMENTO DE ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT). ROL DA ANS. DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação interposto por operadora de plano de saúde contra sentença que determinou o custeio de tratamento de ECT prescrito por médica responsável para paciente com depressão grave e risco suicida, além de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é devida a cobertura de tratamento não previsto no rol da ANS, quando comprovada a urgência, a eficácia e a prescrição médica; (ii) saber se a recusa de cobertura enseja reparação por danos morais. III. Razões de decidir 3. A prescrição médica, a urgência do quadro clínico e a ausência de tratamento alternativo eficaz impõem a cobertura do tratamento, mesmo fora do rol da ANS, conforme jurisprudência consolidada. 4. A recusa injustificada de custeio, diante do grave risco à saúde da paciente, constitui ato ilícito, apto a ensejar indenização por danos morais. 5. A Lei nº 14.454/2022 reforça o caráter exemplificativo do rol da ANS, ampliando a proteção ao consumidor. 6. O valor da indenização por danos morais foi fixado dentro dos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: "1. É devida a cobertura de tratamento médico não previsto no rol da ANS, desde que haja prescrição médica fundamentada, comprovação de eficácia e ausência de alternativa terapêutica eficaz. 2. A recusa indevida de cobertura em situações de urgência e gravidade clínica configura dano moral indenizável." R E L A T Ó R I O Trata-se de Recurso de Apelação interposto por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá – MT, nos autos da ação nº 1001863-62.2023.8.11.0041, ajuizada por MARIA DAS GRAÇAS RODRIGUES, representada por LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, confirmando a decisão liminar que determinara à ré o custeio do tratamento por eletroconvulsoterapia (ECT), conforme prescrição médica, além de condená-la ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de indenização por danos morais. Na petição inicial, a autora alegou ser usuária do plano de saúde UNIMED FÁCIL INDIVIDUAL/FAMILIAR, encontrando-se adimplente, e que apresenta quadro de depressão grave com ideação suicida e refratariedade medicamentosa (CID X32.3). Sustentou que a médica responsável, Dra. Andrea Fetter – CRM/MT 3723, prescreveu tratamento por ECT com indicação inicial de 12 sessões, diante da ineficácia de abordagens medicamentosas anteriores. Aduziu que a negativa de cobertura pela operadora, sob o fundamento de exclusão do procedimento do rol da ANS, é abusiva, considerando o laudo médico que atesta a urgência do tratamento. Postulou, com base nesses elementos, a concessão de tutela de urgência para determinar o custeio imediato do tratamento, bem como indenização por danos morais. Nas razões recursais a Apelante, alega, que a negativa de cobertura é legítima, pois o procedimento de ECT não está inserido no rol da ANS e não há cláusula contratual prevendo sua obrigatoriedade; ainda, que o rol da ANS é taxativo, conforme entendimento consolidado pelo STJ, admitindo-se exceções apenas quando presentes requisitos técnicos específicos que não foram demonstrados no caso, Destaca que inexiste comprovação suficiente da eficácia do tratamento pleiteado à luz da medicina baseada em evidências ou aprovação de órgãos técnicos como CONITEC ou NATJUS, assim, que a negativa de cobertura ampara-se em cláusula contratual válida e expressa, não havendo ilicitude na conduta da operadora. Defende que não há falar em dano moral, visto que não se verifica ato ilícito ou abuso de direito por parte da ré, tendo esta atuado no exercício regular de direito amparado por lei. Por fim, postula a reforma integral da sentença com a consequente improcedência dos pedidos formulados na exordial. É o relatório. V O T O R E L A T O R Conforme relatado, cuida-se de Recurso de Apelação interposto por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá – MT, nos autos da ação nº 1001863-62.2023.8.11.0041, ajuizada por MARIA DAS GRAÇAS RODRIGUES, representada por LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, confirmando a decisão liminar que determinara à ré o custeio do tratamento por eletroconvulsoterapia (ECT), conforme prescrição médica, além de condená-la ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de indenização por danos morais. A insurgência recursal funda-se na alegação de que a negativa de cobertura encontra respaldo contratual e na taxatividade do rol de procedimentos da ANS, além de não haver, no caso concreto, conduta apta a ensejar reparação extrapatrimonial. Com base nos elementos dos autos, verifica-se que a parte autora/apelada apresenta quadro de depressão grave com sintomas psicóticos, com histórico de tentativas de suicídio, conforme extensamente demonstrado por laudos médicos (273743471). Diante da refratariedade ao tratamento convencional, houve prescrição fundamentada para a realização de ECT. No que se refere à obrigatoriedade de cobertura, cumpre destacar que esta Corte Estadual tem jurisprudência consolidada no sentido de que, estando o procedimento indicado por profissional habilitado, evidenciada a urgência e inexistência de tratamento substitutivo eficaz, impõe-se a cobertura, ainda que o procedimento não esteja inserido no rol da ANS. Aplica-se ao caso o entendimento já assentado por este Tribunal: “A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser taxativo, em regra, o rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista. Contudo, o colegiado fixou parâmetros para que, em situações excepcionais, os planos custeiem procedimentos não previstos na lista, a exemplo de terapias com recomendação médica, sem substituto terapêutico no rol, e que tenham comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições que regulam o setor. “4. Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da saúde suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS” (tese jurídica - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1886929 - SP (2020/0191677-6)) Se ao aplicar os parâmetros definidos para a superação, no caso sub judice, da taxatividade do Rol da ANS (item 4), verifica-se que a parte autora faz jus à cobertura pretendida do tratamento por ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT). Somente se configura hipótese ensejadora de danos morais a exposição da consumidora a situação humilhante, angústia e transtornos exacerbados ou quando há ofensa à honra, à imagem ou qualquer dos direitos personalíssimos tutelados no artigo 5.º V e X da CRFB/88. (N.U 1015296-90.2022.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Terceira Turma Recursal, Julgado em 11/10/2023, Publicado no DJE 11/10/2023)3). Outrossim, com a vigência da Lei nº 14.454/2022, tornou-se inequívoca a natureza exemplificativa do rol da ANS, sendo exigida a cobertura de tratamentos não listados quando houver prescrição médica, comprovação de eficácia e ausência de substituto terapêutico. No tocante ao dano moral, entendo configurado. A jurisprudência deste Tribunal também já assentou: “EMENTA APELAÇÃO CÍVEL – OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA – PLANO DE SAÚDE – ELETROCONVULSOTERAPIA – TRATAMENTO INDICADO POR MÉDICO ESPECIALISTA – IMPRESCINDIBILIDADE – RECUSA INDEVIDA DE COBERTURA – DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE E À VIDA – DANO MORAL – VALOR JUSTO E ADEQUADO – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. A negativa de cobertura do tratamento de Eletroconvulsoterapia (ECT), indicado por médico especialista para paciente com depressão grave e sem resposta a tratamentos convencionais, configura violação ao direito à saúde, previsto na Constituição Federal, e configura ato ilícito, gerando direito à reparação por danos morais. Com efeito, ante a publicação da Lei nº 14.454/22, que entrou em vigor em 21.09.2022, entendo que restou parcialmente superado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da taxatividade do rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), estabelecida agora a cobertura de tratamentos eficazes e internacionalmente recomendados, ainda que não previstos no rol. O tratamento adequado foi determinado pelo médico assistente, e a recusa da operadora de plano de saúde ao custeio do procedimento, em quadro de grave risco à saúde da paciente, resulta em dano moral, cuja indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) foi fixada em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista o sofrimento causado pela negativa de cobertura. Sentença Mantida. Recurso desprovido. (N.U 1013202-52.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Vice-Presidência, Julgado em 12/05/2025, Publicado no DJE 12/05/2025). No caso em apreço, a recusa ao custeio de tratamento indicado para controle de crise suicida, sem justificativa técnica idônea e em desconsideração à gravidade do quadro clínico da autora, revela conduta atentatória à boa-fé objetiva e ao dever de cuidado, ensejando legítima reparação por danos morais. O valor fixado a título indenizatório – R$ 10.000,00 – mostra-se proporcional, considerando os parâmetros desta Corte em situações análogas, não comportando redução ou majoração. Diante do exposto, nego provimento ao recurso de apelação, mantendo-se integralmente a sentença de primeiro grau. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1001863-62.2023.8.11.0041

ID: 331243808

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001863-62.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARIA DAS GRACAS RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

RENYL FERREIRA BRITO CANDIDO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001863-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001863-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Tratamento médico-hospitalar, Fornecimento de medicamentos] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES] Parte(s): [MARIA DAS GRACAS RODRIGUES - CPF: 062.169.861-04 (APELADO), RENYL FERREIRA BRITO CANDIDO - CPF: 012.481.671-12 (ADVOGADO), LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA - CPF: 947.708.911-72 (APELADO), UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA - CPF: 947.708.911-72 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A DIREITO À SAÚDE. RECURSO DE APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. RECUSA DE COBERTURA DE TRATAMENTO DE ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT). ROL DA ANS. DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação interposto por operadora de plano de saúde contra sentença que determinou o custeio de tratamento de ECT prescrito por médica responsável para paciente com depressão grave e risco suicida, além de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é devida a cobertura de tratamento não previsto no rol da ANS, quando comprovada a urgência, a eficácia e a prescrição médica; (ii) saber se a recusa de cobertura enseja reparação por danos morais. III. Razões de decidir 3. A prescrição médica, a urgência do quadro clínico e a ausência de tratamento alternativo eficaz impõem a cobertura do tratamento, mesmo fora do rol da ANS, conforme jurisprudência consolidada. 4. A recusa injustificada de custeio, diante do grave risco à saúde da paciente, constitui ato ilícito, apto a ensejar indenização por danos morais. 5. A Lei nº 14.454/2022 reforça o caráter exemplificativo do rol da ANS, ampliando a proteção ao consumidor. 6. O valor da indenização por danos morais foi fixado dentro dos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: "1. É devida a cobertura de tratamento médico não previsto no rol da ANS, desde que haja prescrição médica fundamentada, comprovação de eficácia e ausência de alternativa terapêutica eficaz. 2. A recusa indevida de cobertura em situações de urgência e gravidade clínica configura dano moral indenizável." R E L A T Ó R I O Trata-se de Recurso de Apelação interposto por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá – MT, nos autos da ação nº 1001863-62.2023.8.11.0041, ajuizada por MARIA DAS GRAÇAS RODRIGUES, representada por LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, confirmando a decisão liminar que determinara à ré o custeio do tratamento por eletroconvulsoterapia (ECT), conforme prescrição médica, além de condená-la ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de indenização por danos morais. Na petição inicial, a autora alegou ser usuária do plano de saúde UNIMED FÁCIL INDIVIDUAL/FAMILIAR, encontrando-se adimplente, e que apresenta quadro de depressão grave com ideação suicida e refratariedade medicamentosa (CID X32.3). Sustentou que a médica responsável, Dra. Andrea Fetter – CRM/MT 3723, prescreveu tratamento por ECT com indicação inicial de 12 sessões, diante da ineficácia de abordagens medicamentosas anteriores. Aduziu que a negativa de cobertura pela operadora, sob o fundamento de exclusão do procedimento do rol da ANS, é abusiva, considerando o laudo médico que atesta a urgência do tratamento. Postulou, com base nesses elementos, a concessão de tutela de urgência para determinar o custeio imediato do tratamento, bem como indenização por danos morais. Nas razões recursais a Apelante, alega, que a negativa de cobertura é legítima, pois o procedimento de ECT não está inserido no rol da ANS e não há cláusula contratual prevendo sua obrigatoriedade; ainda, que o rol da ANS é taxativo, conforme entendimento consolidado pelo STJ, admitindo-se exceções apenas quando presentes requisitos técnicos específicos que não foram demonstrados no caso, Destaca que inexiste comprovação suficiente da eficácia do tratamento pleiteado à luz da medicina baseada em evidências ou aprovação de órgãos técnicos como CONITEC ou NATJUS, assim, que a negativa de cobertura ampara-se em cláusula contratual válida e expressa, não havendo ilicitude na conduta da operadora. Defende que não há falar em dano moral, visto que não se verifica ato ilícito ou abuso de direito por parte da ré, tendo esta atuado no exercício regular de direito amparado por lei. Por fim, postula a reforma integral da sentença com a consequente improcedência dos pedidos formulados na exordial. É o relatório. V O T O R E L A T O R Conforme relatado, cuida-se de Recurso de Apelação interposto por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá – MT, nos autos da ação nº 1001863-62.2023.8.11.0041, ajuizada por MARIA DAS GRAÇAS RODRIGUES, representada por LAURO LUCIANO RODRIGUES DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, confirmando a decisão liminar que determinara à ré o custeio do tratamento por eletroconvulsoterapia (ECT), conforme prescrição médica, além de condená-la ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de indenização por danos morais. A insurgência recursal funda-se na alegação de que a negativa de cobertura encontra respaldo contratual e na taxatividade do rol de procedimentos da ANS, além de não haver, no caso concreto, conduta apta a ensejar reparação extrapatrimonial. Com base nos elementos dos autos, verifica-se que a parte autora/apelada apresenta quadro de depressão grave com sintomas psicóticos, com histórico de tentativas de suicídio, conforme extensamente demonstrado por laudos médicos (273743471). Diante da refratariedade ao tratamento convencional, houve prescrição fundamentada para a realização de ECT. No que se refere à obrigatoriedade de cobertura, cumpre destacar que esta Corte Estadual tem jurisprudência consolidada no sentido de que, estando o procedimento indicado por profissional habilitado, evidenciada a urgência e inexistência de tratamento substitutivo eficaz, impõe-se a cobertura, ainda que o procedimento não esteja inserido no rol da ANS. Aplica-se ao caso o entendimento já assentado por este Tribunal: “A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser taxativo, em regra, o rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista. Contudo, o colegiado fixou parâmetros para que, em situações excepcionais, os planos custeiem procedimentos não previstos na lista, a exemplo de terapias com recomendação médica, sem substituto terapêutico no rol, e que tenham comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições que regulam o setor. “4. Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da saúde suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS” (tese jurídica - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1886929 - SP (2020/0191677-6)) Se ao aplicar os parâmetros definidos para a superação, no caso sub judice, da taxatividade do Rol da ANS (item 4), verifica-se que a parte autora faz jus à cobertura pretendida do tratamento por ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT). Somente se configura hipótese ensejadora de danos morais a exposição da consumidora a situação humilhante, angústia e transtornos exacerbados ou quando há ofensa à honra, à imagem ou qualquer dos direitos personalíssimos tutelados no artigo 5.º V e X da CRFB/88. (N.U 1015296-90.2022.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Terceira Turma Recursal, Julgado em 11/10/2023, Publicado no DJE 11/10/2023)3). Outrossim, com a vigência da Lei nº 14.454/2022, tornou-se inequívoca a natureza exemplificativa do rol da ANS, sendo exigida a cobertura de tratamentos não listados quando houver prescrição médica, comprovação de eficácia e ausência de substituto terapêutico. No tocante ao dano moral, entendo configurado. A jurisprudência deste Tribunal também já assentou: “EMENTA APELAÇÃO CÍVEL – OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA – PLANO DE SAÚDE – ELETROCONVULSOTERAPIA – TRATAMENTO INDICADO POR MÉDICO ESPECIALISTA – IMPRESCINDIBILIDADE – RECUSA INDEVIDA DE COBERTURA – DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE E À VIDA – DANO MORAL – VALOR JUSTO E ADEQUADO – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. A negativa de cobertura do tratamento de Eletroconvulsoterapia (ECT), indicado por médico especialista para paciente com depressão grave e sem resposta a tratamentos convencionais, configura violação ao direito à saúde, previsto na Constituição Federal, e configura ato ilícito, gerando direito à reparação por danos morais. Com efeito, ante a publicação da Lei nº 14.454/22, que entrou em vigor em 21.09.2022, entendo que restou parcialmente superado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da taxatividade do rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), estabelecida agora a cobertura de tratamentos eficazes e internacionalmente recomendados, ainda que não previstos no rol. O tratamento adequado foi determinado pelo médico assistente, e a recusa da operadora de plano de saúde ao custeio do procedimento, em quadro de grave risco à saúde da paciente, resulta em dano moral, cuja indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) foi fixada em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista o sofrimento causado pela negativa de cobertura. Sentença Mantida. Recurso desprovido. (N.U 1013202-52.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Vice-Presidência, Julgado em 12/05/2025, Publicado no DJE 12/05/2025). No caso em apreço, a recusa ao custeio de tratamento indicado para controle de crise suicida, sem justificativa técnica idônea e em desconsideração à gravidade do quadro clínico da autora, revela conduta atentatória à boa-fé objetiva e ao dever de cuidado, ensejando legítima reparação por danos morais. O valor fixado a título indenizatório – R$ 10.000,00 – mostra-se proporcional, considerando os parâmetros desta Corte em situações análogas, não comportando redução ou majoração. Diante do exposto, nego provimento ao recurso de apelação, mantendo-se integralmente a sentença de primeiro grau. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1000940-90.2022.8.11.0002

ID: 326981464

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000940-90.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

VANDO BASTO DO NASCIMENTO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

HERNANI ZANIN

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1000940-90.2022.8.11.0002 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [IMISSÃO, IMISSÃO NA POSSE] RELATOR: EXMO. SR. … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1000940-90.2022.8.11.0002 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [IMISSÃO, IMISSÃO NA POSSE] RELATOR: EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES, EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA, EXMO. SR. DES. SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO - CPF: 031.410.001-66 (APELADO), CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO - CPF: 031.410.001-66 (ADVOGADO), GABRIELLE ANDRADE DE CARVALHO - CPF: 056.817.251-54 (APELADO), Naldo (APELANTE), VANDO BASTO DO NASCIMENTO - CPF: 872.117.691-49 (APELANTE), HERNANI ZANIN - CPF: 250.606.511-34 (ADVOGADO), MARCIO KNOPF - CPF: 838.951.161-49 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência da EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO”. E M E N T A direito civil e direito processual civil. apelação cível. ação de imissão na posse. alegação de posse advindo de sucessão intermitente. usucapião como matéria defensiva. imóvel registrado em nome dos autores. inexistência de posse com animus domini. propriedade formal e posse indireta comprovadas pelos autores. recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação cível interposto contra sentença que julgou procedente ação de imissão na posse ajuizada pelos autores, reconhecendo-lhes o direito à posse direta do imóvel registrado em seu nome, tendo em vista a indevida ocupação pelo réu/apelante, ora recorrente, que alegava deter posse há mais de 30 anos por meio de cadeia possessória, invocando a prescrição aquisitiva (usucapião) como matéria de defesa. II. Questão em discussão 2. A controvérsia recursal cinge-se às seguintes questões: (i) saber se o réu detinha posse com animus domini apta a ensejar o reconhecimento da usucapião; (ii) saber se a posse alegada pelo réu seria capaz de afastar o direito de imissão na posse dos autores, legítimos proprietários formais do imóvel conforme registro público. III. Razões de decidir 3. O próprio recorrente afirma em suas razões recursais que a origem de sua posse decorre de mera permissão concedida por terceiro, que “cedeu” o imóvel para que nele residisse e desempenhasse funções de “caseiro”. Tal circunstância evidencia a existência de vínculo de natureza precária, oriundo de liberalidade de terceiro, o qual jamais se converte, por si só, em posse “ad usucapionem”. 4. A utilização da usucapião como matéria de defesa (art. 191 do CPC) exige demonstração cabal do preenchimento dos requisitos legais, o que não se verifica no presente caso 5. A mera alegação de sucessão possessória não é suficiente para configurar a usucapião especial urbana, em especial diante da ausência de prova robusta acerca do tempo e da natureza da posse. 6. O registro imobiliário dos autores/apelados foi devidamente formalizado, conferindo-lhes o direito à posse indireta, sendo legítima a pretensão de imissão na posse diante da ocupação indevida. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. Para o reconhecimento da prescrição aquisitiva como matéria de defesa, é imprescindível a demonstração inequívoca da posse mansa, pacífica, contínua e com animus domini pelo prazo legal. 2. O registro imobiliário em nome do autor confere-lhe o direito à imissão na posse, diante da ocupação indevida por terceiro que não detém posse qualificada. ________________________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 1.238, 1.239 e 1.240; CPC/2015, art. 191. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.301.843/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 14.05.2013. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES (RELATOR – JUIZ DE DIREITO CONVOCADO): Egrégia Câmara, Cuida-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por VANDO BASTO DO NASCIMENTO contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, que nos autos da ação de “Imissão na Posse” (Proc. nº 1000940-90.2022.8.11.0002), ajuizada contra o apelante por CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO E GABRIELLE ANDRADE DE CARVALHO, julgou o pedido procedente para imitir os autores/apelados na posse do imóvel objeto da demanda, qual seja, terreno de 360m², localizado na Rua 13 (Rua Capitão Alberto Aguiar), n. 09, da Quadra n. 26, Loteamento Jardim Marajoara I, Várzea Grande/MT, registrado no 1º Serviço Notarial e de Registro do Município de Várzea Grande/MT, sob a matrícula nº 13.634; a r. sentença condenou o réu/apelante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes, fixados em 10% sobre o valor da causa (cf. Id. nº 242049720). O apelante alega que os depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo não podem ser considerados para fins comprobatórios, com destaque para as declarações prestas por Edileuza Mendes, antiga possuidora do terreno que afirmou que o Lote nº 09, de propriedade dos autores/apelados, “é totalmente murado”, e que o réu/apelante “se utilizando do acesso existente no muro usufruiu indevidamente do terreno lindeiro, constituindo posse precária”, mas, a verdade é que o Lote nº 9, nunca foi murado e tampouco desmembrado dos lotes lindeiros, de nº 10 e 11, fato que, por si só, demonstra a fragilidade do seu depoimento. Alega, ainda, que, detém a posse do terreno há mais de 30 anos através “de sucessão singular”, dizendo que a linha sucessória “se iniciou por Luiz Antônio do Carmo Costa, que passou a posse para Edvaldo Araujo da Silva em 28/04/1992, que repassou para Edvaldo Araujo da Silva, que repassou para Edileuza Mendes, que repassou na data de 07/12/2005 para Jeane Cruz de Oliveira, que repassou Antônio Caleijas, que repassou para Zenildo Moya, que repassou para Rafael de Pieri Sandrini em 22/11/2018, que exerceu a posse juntamente com o seu funcionário Vando Bastos do Nascimento (réu/apelante) e, atualmente exerce a posse indireta do imóvel juntamente com o inquilino Moacir Oliveira dos Santos”, razão pela qual, o réu/apelante faz jus ao reconhecimento da prescrição aquisitiva da propriedade. Insiste em que desde o ano de 2005, a cadeia sucessória, que se estendeu desde a antiga possuidora Jeane Cruz de Oliveira até os atuais moradores, revela a posse mansa, pacífica e ininterrupta do Lote nº 09, tanto que realizaram benfeitorias, limpeza, e algumas edificações, pois o terreno objeto da demanda serve de passagem para os Lotes nº 10 e nº 11, não havendo separação por nenhum tipo de muro ou cerca, o acesso é em comum com passagem e transição livre, compondo um único terreno, cuja posse pertence ao apelante. Aduz que preenche os requisitos da usucapião especial, cuja matéria suscitou como defesa em sua contestação, porém, o MM. Juiz, ignorando totalmente o acervo probatório contido nos autos, julgou improcedente o pedido, o que deve ser modificado nesta instancia recursal, porque preenche todos os requisitos da usucapião, tendo dentro do lapso de tempo a posse mansa, pacífica e tranquila no uso, cuidado e conservação do imóvel. Pede, pois, o provimento do recurso, para que o pedido de imissão na posse seja julgado improcedente, reconhecendo, porém, “a caracterização da prescrição aquisitiva” em favor do Apelante (cf. Id. nº 242049729). O apelado ofertou contrarrazões ao recurso, com réplica às razões recursais e requerimento de desprovimento do apelo (cf. Id. nº 242050264). É o relatório. SUSTENTAÇÃO ORAL USOU DA PALAVRA O ADVOGADO HERNANI ZANIN, OAB/MT Nº 11770. V O T O EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES (RELATOR – JUIZ DE DIREITO CONVOCADO): Egrégia Câmara, Os autores/apelados Carlos Augusto Leite de Carvalho Filho e Gabrielle Andrade de Carvalho ajuizaram a presente ação de Imissão na Posse contra o réu/apelante Vando Basto do Nascimento, alegando serem eles os legítimos proprietários de um terreno com área de 360m² localizado na Rua 13 (atualmente denominada Rua Capitão Alberto Aguiar), nº 09, Quadra 26, no Loteamento Jardim Marajoara I, no município de Várzea Grande/MT, cuja posse sobre o imóvel pertencia ao pai dos autores, que o adquiriu por meio de quitação de dívida da senhora Edileuza Mendes, que entregou o terreno como forma de pagamento, sendo a transação formalizada por procuração lavrada no dia 04/08/2005. Esclarecem que não houve averbação da transferência na matrícula do imóvel, sendo a regularização registral efetivada apenas em 15/11/2020, perante o 1º Serviço Notarial e de Registro de Imóveis de Várzea Grande/MT, sob a matrícula nº 13.634, contudo, após a regularização da propriedade, os autores tomaram conhecimento de que o imóvel estava indevidamente ocupado pelo réu. Ressaltam que informaram o réu Vando Basto sobre sua indevida permanência no local já que eles são os legítimos proprietários do imóvel e requereram a imediata desocupação, mas, o réu se recusou a deixar o imóvel, fato que motivou o ajuizamento da ação com requerimento de imediata imissão na posse do bem. Ao contestar o feito, o réu/apelante disse que realmente “não é o verdadeiro possuidor do lote 09”, mas que reside há sete anos no imóvel edificado nos lotes nº 10 e nº 11, sendo que tais lotes são indivisos com o lote 09, onde “exerce tão somente a função de caseiro”, e que “o verdadeiro possuidor”, é o seu patrão, Rafael De Pieri Sandrini, que também detém a posse dos lotes nº 10 e nº 11, desde o ano de 1992, de modo que, ele, réu/apelante, através da sucessão singular “preenche os requisitos à usucapião extraordinária urbana, pois, mantém a posse do imóvel”, tanto que “pavimentou e ergueu um toldo, pois, o usa como deposito de garrafões de água mineral, bem como, o mantem murado e limpo, fato que demonstra o comportamento de proprietário” (cf. Id. nº 242049675). A r. sentença julgou procedente o pedido de imissão na posse formulado pelos autores sob os seguintes fundamentos: Da prejudicial de mérito Afirma o requerido Vando Basto do Nascimento que preenche os requisitos da usucapião especial, cuja matéria aduziu como defesa na contestação. De início, é possível a alegação da usucapião como matéria de defesa nos termos da Súmula 237 do STF (...). Assim, por ser a matéria alegada em contestação, é questão prejudicial a pretensão possessória pretendida pelos autores, razão pelo qual passo a análise do pedido de usucapião especial formulado pelo requerido. Pois bem. A usucapião especial urbana está positivada no art. 183, da Constituição da República, sendo repetido em sua integralidade no art. 1.240, do Código Civil, com a seguinte redação: “Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a como sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”. Observa-se, a partir da análise dos preceitos normativos acima mencionados que a aquisição da propriedade, a partir da usucapião, necessita do preenchimento dos seguintes requisitos específicos, além da demonstração da justa posse: a) posse mansa e pacífica e com animus domini; b) exercício ininterrupto e sem oposição da posse da área durante 15 (quinze) anos; c) se o bem for destinado à moradia do possuidor ou à sua família o tempo se reduz para 10 (dez) anos. No caso em deslinde, o requerido afirma que sucedeu a posse dos antigos adquirentes do imóvel, cuja soma de tempo remonta a 30 (trinta) anos, pois a sucessão vem se contabilizando desde o ano de 1992. Para comprovar a posse, juntou registro fotográfico do terreno em litígio para justificar que utiliza a área para armazenamento de garrafões de água, e demonstrativo de imposto de renda em nome do autor em que consta débito fiscal. Nos termos do art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil o requerido não desincumbiu do ônus probatório de comprovar fato impedido do direito dos autores já que os documentos juntados nos autos não são capazes de provar a justa posse e lapso temporal. Em contrapartida, a prova oral realizada em juízo revelou a posse precária do requerido. Isso porque a testemunha Edileuza Mendes, antiga possuidora do lote 09, afirmou que comprou um veículo do Sr. Carlos Augusto no ano de 2005, genitor dos autores, dando em pagamento o lote 09 e desde então ele passou a exercer a posse sobre o bem. Explicou que quando comprou o imóvel do Sr. Edvaldo, passou a residir no lote 10 e 11 e no lote 09 existia um muro com uma pequena passagem de acesso aos lotes 10 e 11. Asseverou que vendeu os lotes 10 e 11 para Jeane Cruz de Oliveira Zanin, mas não vendeu e tampouco passou a posse do lote 09 para Jeane, o que refuta a tese do requerido de que sucedeu a posse da antiga proprietária. Ademais, a testemunha Edileuza acrescentou que o lote 09 era totalmente murado o que reflete que o requerido, utilizando-se do acesso existente no muro usufruiu indevidamente da posse do terreno lindeiro, constituindo assim uma posse precária. Desta feita, a possível existência de posse do requerido teria ocorrido em razão da relação negocial com a antiga proprietária do imóvel sobre os lotes limítrofes, sendo certo que tinha conhecimento sobre a titularidade do imóvel, retirando desta forma, a intenção de ser dono. (...). Corrobora ainda a precariedade da posse o fato de o imóvel em questão ter sido alienado aos autores no dia 28.06.2021, conforme documento de ID 73701090. No mais, as testemunhas arroladas pelo requerido não demonstraram de forma clara a aquisição do lote lindeiro não impondo em sucessão possessória como já apontado pela antiga possuidora evidenciando, assim, ato próprio, originário, de aquisição da posse por invasão. De mais a mais, não há um elemento de prova sequer indicando que a área objeto da presente ação foi efetivamente adquirida pelo requerido ou mesmo que pudesse qualificar uma suposta ocupação anterior já que a antiga possuidora afirmou que não lhe passou a posse. Assim, não produziu o requerido prova alguma do exercício da posse do lote 09, ônus que lhes incumbia (artigo 373, I, do CPC). Assim, uma vez que na usucapião se prestigia a aquisição justa com intenção de dono, de forma mansa e pacífica, verifica-se que não foram preenchidos os requisitos basilares do instituto. Do mérito Trata-se de ação de imissão de posse proposta por Carlos Augusto Leite de Carvalho Filho e Gabrielle Andrade de Carvalho em desfavor de Vando Basto do Nascimento. Pois bem, a ação de imissão de posse, conquanto não prevista no novo estatuto processual civil, ainda encontra agasalho na atual sistemática e tem como pressuposto essencial a prova do domínio, título hábil devidamente transcrito no registro imobiliário, o que se constata no ID 73701089. Assim, os requerentes, por serem titulares do imóvel em questão, possuem legitimidade ativa para promoverem a ação de imissão na posse contra alienantes ou terceiros que o detenham. A via eleita é seguramente a adequada a atender a pretensão da parte requerente que, possuindo o domínio do imóvel, e, para vindicar tal posse, utilizou-se do instituto da imissão de posse, que é cabível nos casos em que o proprietário almeja lograr posse que nunca teve. E este direito de posse decorre do direito de sequela conferido ao proprietário. É o caso dos autos. Com efeito, infere-se dos autos que os autores adquiriram a propriedade do imóvel “sub judice” diretamente do genitor por meio de contrato de compra e venda e averbado da matrícula 13.634. Logo, tem eles a faculdade de reaver o imóvel de quem quer que seja (erga omnes). Indubitável, portanto, que a pretensão dos requerentes de se imitirem na posse do imóvel adquirido é legítima, haja vista que a compra e venda do imóvel, com consequente registro são atos jurídicos perfeitos que não foi desconstituído pela via judicial e, portanto, aptos a produzir efeito imediato no mundo jurídico. Reforço, por fim, que o simples fato de os autores possuírem título legítimo acerca do imóvel em questão já lhe dá o direito de ser imitido na posse, em especial, porque a parte requerida não demonstrou, por meio de qualquer outro título ou justificação jurídica plausível, a legitimidade da sua ocupação sobre o bem. Nestas condições, comprovado “quantum satis” os pressupostos informadores da espécie, impõe-se a procedência do pedido de imissão de posse. Pelo exposto, julgo procedentes os pedidos iniciais para imitir, em definitivo, os requerentes na posse do imóvel descrito na inicial, tornando definitiva a liminar concedida. Em consequência, resolvo o mérito, na forma do art. 487, I do CPC. Condeno ainda a parte requerida ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. O réu/apelante refuta, de início, o depoimento prestado pela testemunha Edileuza Mendes, antiga possuidora do terreno objeto da presente ação de imissão na posse. Alega que a referida testemunha afirmou, em juízo, que o Lote nº 09 era totalmente murado, quando, na realidade, tal lote jamais foi desmembrado dos Lotes nºs 10 e 11, constituindo, portanto, um imóvel indiviso. Ocorre que o fato de o Lote nº 09 estar murado, ou de ter sido desmembrado, é irrelevante para o preenchimento dos requisitos legais exigidos para o ajuizamento da ação de imissão na posse. Referida ação tem por finalidade assegurar ao legítimo proprietário, ou ao titular de direito real sobre bem imóvel determinado, o ingresso na posse direta do bem, quando esta se encontra injustamente exercida por terceiro ou, simplesmente, ainda não tenha sido entregue. Exige-se, como pressuposto essencial, a demonstração do domínio ou de outro título jurídico hábil que justifique a pretensão possessória, nos termos do art. 1.228 do Código Civil. No caso concreto, a propriedade dos autores/apelados sobre o imóvel é incontroversa, estando demonstrada por meio da escritura pública registrada sob o Id nº 242049153, além das demais provas constantes dos autos. Tais elementos evidenciam que a testemunha Edileuza Mendes foi, de fato, a antiga possuidora do Lote nº 09, tendo-o transferido ao pai dos autores/apelados como forma de pagamento de dívida reconhecida na "Nota Promissória e Termo de Confissão de Dívida" (cf. doc. Id nº 242049155). Ademais, seu depoimento, ainda que eventualmente contrário à pretensão autoral, não teria o condão de infirmar a situação fática posta nos autos: a escritura pública e a matrícula registrada do terreno atestam a propriedade dos autores/apelados. O instituto da imissão na posse deriva do direito real de propriedade, e, assim, está, assentado no pressuposto da titularidade do domínio, cuidando-se de instrumento colocado à disposição do proprietário que pretende obter a posse do imóvel nunca dantes exercida, e, assim, para que o pedido seja prestigiado, basta que comprove o domínio, individualize a coisa e demonstre a existência de posse injusta de quem esteja obstaculizando ou impedindo o exercício pleno do seu direito (CC, art. 1.228); em síntese objetiva, para o sucesso da pretensão petitória, o autor deve comprovar a reunião de três elementos: (I) domínio; (II) individualização da coisa e (III) posse injusta do réu. Em relação ao primeiro requisito, verifica-se que se trata da existência ou não da propriedade, a qual só é comprovado mediante registro na matrícula competente; no caso, como já dito, os documentos apresentados pelos autores/apelados comprovam a aquisição do imóvel com área de 360 m2, localizado na Rua 13 (Rua Capitão Alberto Aguiar), nº 09, quadra 26, Bairro Loteamento Jardim Marajoara I, Cidade de Várzea Grande/MT, que está devidamente registrado no 1º Serviço Notarial e de Registro de Várzea Grande/MT, sob a matricula nº 13.634, por força de Escritura Pública e Compra e Venda lavrada no dia 28/06/2021 (cf. Id. nº 242049153), sendo, portanto, inequívoca a titularidade do imóvel pertencente aos autores. A individualização do bem está igualmente demonstrada pela Certidão de Registro do Imóvel (cf. Id. nº 242049171). Quanto à posse injusta, verifica-se que a ocupação do imóvel pelo réu/apelante decorreu de mera permissão de um terceiro (Rafael de Pieri Sandrin), este que, supostamente “cedeu” o local para ele morar e desempenhar as funções de “caseiro”. Tal circunstância, por si só, demonstra a precariedade da posse do réu. O réu/apelante apresentou como matéria de defesa o decurso do prazo de prescrição aquisitiva para a concessão de usucapião, justificando a posse dizendo que há mais de sete anos reside no imóvel edificado nos lotes nº 10, e nº 11, exercendo posse mansa, pacífica e tranquila no uso, cuidado e conservação do imóvel, porém, não acostou aos autos nenhuma prova de título dominial, concluindo-se, portanto, que a posse do réu/apelante não é mansa, pacífica e ininterrupta, sendo, portanto, considerada injusta. Ademais, o próprio recorrente diz expressamente em suas razões recursais que a origem de sua posse decorre de mera permissão concedida por terceiro, identificado como Rafael de Pieri Sandrin, o qual “cedeu” o imóvel para que o réu nele residisse e desempenhasse funções de “caseiro”, circunstância que revela um vínculo de natureza precária, derivado de tolerância ou liberalidade de terceiro, que jamais se converte, por si, em posse “ad usucapionem”. A jurisprudência pacífica do eg. Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que o detentor por mera permissão de uso, ainda que prolongada no tempo, não possui o “animus domini” necessário à aquisição da propriedade por usucapião; senão vejamos: EMENTA: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. POSSE PRECÁRIA. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante dispõe o art. 1.208 do Código Civil de 2002, os atos de mera permissão não ensejam a aquisição originária de propriedade, tendo em vista que se trata de posse precária, com o condão de afastar o ânimo de dono, caracterizando, portanto, a parte como mera detentora. 2. No caso concreto, o Tribunal a quo não afastou somente a prescrição aquisitiva, mas também a posse ad usucapionem, exercida com animus domini, consignando expressamente que o ora recorrente agia como mero detentor do imóvel, sendo a posse exercida precariamente, não havendo, portanto, comprovação de transmutação do caráter da posse. 3. Esta Corte Superior entende que não é possível rever a análise do Tribunal a quo acerca da presença dos requisitos para a aquisição da propriedade pela usucapião, sem a perquirição do substrato fático-probatório presente nos autos, situação que, na hipótese vertente, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – Quarta Turma - relator Ministro Raul Araújo - AgInt no AREsp n. 2.008.958/GO, julgado em 3/10/2022, DJe de 21/10/2022). EMENTA: RECURSO ESPECIAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CORREDOR DE 60 CM EXISTENTE ENTRE OS IMÓVEIS DAS PARTES. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. ATOS POSSESSÓRIOS PRATICADOS SOBRE A COISA INSUFICIENTES À CONFIGURAÇÃO DE POSSE QUALIFICADA. (...). 1. 2. (...). 3. Qualquer que seja a espécie de usucapião alegada, a comprovação do exercício da posse sobre a coisa será sempre obrigatória, sendo condição indispensável à aquisição da propriedade. Isso porque a usucapião é efeito da posse, instrumento de conversão da situação fática do possuidor em direito de propriedade ou em outro direito real. 4. Se não se identificar posse com ânimo de dono, acrescido do despojamento da propriedade, que qualifica a posse, o exercício de fato sobre a coisa não servirá à aquisição da propriedade. 4. 5. 6. 7. (...) 8. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ – Quarta Turma - relator Ministro Luis Felipe Salomão, REsp n. 1.644.897/SP, julgado em 19/3/2019, DJe de 7/5/2019). Registre-se, ainda, que a posse injusta, para os fins previstos na parte final do art. 1.228 do Código Civil, é aquela exercida por quem não seja dono (independentemente de boa ou má-fé), exatamente como se deu na hipótese dos autos, pois, embora o recorrente alegue exercer posse há mais de sete anos sobre o imóvel, não demonstrou a existência de qualquer justo título ou qualquer manifestação inequívoca de posse exclusiva e autônoma, tampouco promoveu qualquer ato revelador de sua intenção de exercer domínio sobre o bem de maneira incompatível com a permissão inicial, limitando-se a descrever, de forma genérica, que realiza cuidados e manutenção no imóvel. Tais condutas, todavia, estão em harmonia com as funções que ordinariamente cabem a um caseiro ou ocupante por liberalidade, não configurando, por si, posse qualificada como pretende. Quanto a alegação do apelante de que sucedeu a posse dos antigos adquirentes do imóvel, cuja soma de tempo remonta a 30 (trinta) anos, pois a sucessão vem se contabilizando desde o ano de 1992, não há provas da aquisição do referido lote nos moldes da sucessão possessória afirmada. As declarações do recorrente são vagas e imprecisas quanto à existência de qualquer ato jurídico, formal ou informal, de transferência da posse entre os antigos ocupantes ao recorrente, tampouco evidenciaram qualquer relação de continuidade material entre os respectivos exercícios possessórios. Como bem apontado pela antiga possuidora Edileuza em manifestação constante nos autos (cf. Id. nº 242049714), o requerido não a sucedeu na posse, mas se estabeleceu no imóvel por ato próprio e desvinculado de qualquer cadeia possessória legítima ou anterior, o que corrobora as próprias arguições do recorrente de que está no local por mera permissão de um terceiro que o contratou para tomar conta do imóvel. A posse é, por sua própria natureza, fato jurídico que se evidencia no plano material por meio de atos externos e contínuos de domínio, ainda que sem o título de propriedade, no entanto, para que se reconheça sua legitimidade e eventual proteção jurisdicional, é indispensável a demonstração de que o exercício possessório se deu em conformidade com os requisitos legais, o que não se verifica no presente caso. Diante de todas as considerações feitas, inafastável o reconhecimento de que os autores/apelados se desincumbiram satisfatoriamente do ônus de comprovar o fato constitutivo do seu direito (CPC, art. 373, I), ou seja, a propriedade do imóvel e a posse injusta exercida pelo réu, sendo certo, por outro lado, que o réu não produziu nenhuma prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado pelos autores (CPC, art. 373, II), de modo que a procedência do pedido de imissão na posse reconhecida pela sentença é irretocável. Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a r. sentença recorrida. Custas pelo apelante, observada a regra do art. 98, §3º, do CPC/2015. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. SEBASTIAO BARBOSA FARIAS (1º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. V O T O EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (2º VOGAL): Aguardo o pedido de vista dos autos. SESSÃO DE 08 DE JULHO DE 2025 (CFONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O EXMO. SR. DES. SEBASTIAO BARBOSA FARIAS (1º VOGAL): Egrégia Câmara, Cinge-se a controvérsia à pretensão de reconhecimento da prescrição aquisitiva do lote n.º 09, da quadra 26, do Loteamento Jardim Marajoara I, situado em Várzea Grande/MT, conforme registro sob a matrícula n.º 13.634 do 1º Serviço Notarial e de Registro do Município de Várzea Grande. Pedi vista dos autos para melhor exame da matéria. Após detida análise, acompanho integralmente o voto do eminente Relator, que manteve a respeitável sentença de improcedência. Com efeito, a ausência do animus domini, elemento nuclear da usucapião, revela-se de forma incontestável nos autos. Conforme destacado pelo ilustre Relator, a posse alegada pelo apelante revela-se precária, pois exercida sob tolerância e em nome de outrem, o que desqualifica a posse ad usucapionem. O próprio apelante, reconhece que exercia mera detenção do bem: “O Apelante em observância o que preceitua o art. 337, XI, do CPC, em sede de contestação (Id.84560097), alegou a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda pelo fato que era funcionário da empresa do verdadeiro possuidor do imóvel Sr. Rafael de Pieri Sandrini, ou seja, era mero detentor do imóvel sub judice. Juntou documentos para comprovar o seu vínculo laboral, bem como, com fulcro no art. 339, do CPC, indicou o verdadeiro possuidor do imóvel sub judice. (...) Nobre Des(a) desembargador(a) Relator(a), com o devido respeito, a r. decisão que indeferiu o ingresso do Sr. Rafael de Pieri Sandrini no polo Passivo da presente demanda merece reforma, pelo fato que o Sr. Vando Basto do Nascimento, à época da citação era funcionário do Sr. Rafael e, hoje não é mais, inclusive, não mora em Cuiabá e, sim, na Cidade de Curitiba/PR. Está provado nos autos por meio da testemunha Sr. Moacir Oliveira dos Santos, de que é o mesmo quem aluga atualmente o imóvel que está edificado nos lotes lindeiro ao lote 09, objeto da presente demanda. Destarte, imperioso destacar que o Apelante Vando Basto do Nascimento detinha a posse do lote 09, na condição de mero detentor (famulo da posse), pois, agia a mando do seu patrão, Sr. Rafael de Pieri Sandrini, que é o verdadeiro possuidor indireto do lote 09, pois, é quem integra a relação jurídica de direito material deduzida nos autos”. (destaquei) Além disso, invocando o art. 339 do CPC, o apelante indicou o Sr. Rafael de Pieri Sandrini como o real possuidor, inclusive apresentando documentos que atestam vínculo laboral com este. Destaca-se também a prova oral colhida, segundo a qual a atual ocupação do imóvel se dá por terceiros, não havendo demonstração de posse contínua e exclusiva pelo apelante. Dessa forma, não se comprova o exercício de posse mansa, pacífica, contínua, com ânimo de dono e por prazo suficiente, conforme exigido pelas diversas modalidades de usucapião previstas na legislação vigente. Relevante registrar que a tentativa de ingresso nos autos do suposto possuidor indireto – Sr. Rafael de Pieri Sandrini – foi indeferida, e não houve insurgência recursal contra tal decisão. Assim, o que se tem é a mera detenção exercida por preposto, posse em nome de outrem, desprovida de qualquer traço de domínio ou autonomia possessória. Em outras palavras, os atos de permissão ou tolerância não ensejam a aquisição originária da propriedade, como reiteradamente reconhecido pela jurisprudência nacional. Não se trata aqui de negar a viabilidade da usucapião como forma de aquisição do domínio, mas sim de reafirmar que tal instituto exige a comprovação de todos os seus requisitos legais, o que inequivocamente não se verifica no caso dos autos. Diante desse contexto, e considerando a inexistência de posse qualificada para fins aquisitivos, não há como acolher a pretensão recursal de reconhecimento do domínio por usucapião. Ante o exposto, acompanho o Eminente Relator, para negar provimento ao recurso de apelação, mantendo a sentença que acolheu o pedido de imissão na posse dos apelados e julgou improcedente a ação de usucapião, por seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto. V O T O EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (2º VOGAL): Acompanho o voto do relator. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025.

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Processo nº 1000940-90.2022.8.11.0002

ID: 326981475

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000940-90.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO GABRIELLE ANDRADE DE CARVALHO

Acórdão

Advogados:

CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1000940-90.2022.8.11.0002 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [IMISSÃO, IMISSÃO NA POSSE] RELATOR: EXMO. SR. … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1000940-90.2022.8.11.0002 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [IMISSÃO, IMISSÃO NA POSSE] RELATOR: EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES, EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA, EXMO. SR. DES. SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO - CPF: 031.410.001-66 (APELADO), CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO - CPF: 031.410.001-66 (ADVOGADO), GABRIELLE ANDRADE DE CARVALHO - CPF: 056.817.251-54 (APELADO), Naldo (APELANTE), VANDO BASTO DO NASCIMENTO - CPF: 872.117.691-49 (APELANTE), HERNANI ZANIN - CPF: 250.606.511-34 (ADVOGADO), MARCIO KNOPF - CPF: 838.951.161-49 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência da EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO”. E M E N T A direito civil e direito processual civil. apelação cível. ação de imissão na posse. alegação de posse advindo de sucessão intermitente. usucapião como matéria defensiva. imóvel registrado em nome dos autores. inexistência de posse com animus domini. propriedade formal e posse indireta comprovadas pelos autores. recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação cível interposto contra sentença que julgou procedente ação de imissão na posse ajuizada pelos autores, reconhecendo-lhes o direito à posse direta do imóvel registrado em seu nome, tendo em vista a indevida ocupação pelo réu/apelante, ora recorrente, que alegava deter posse há mais de 30 anos por meio de cadeia possessória, invocando a prescrição aquisitiva (usucapião) como matéria de defesa. II. Questão em discussão 2. A controvérsia recursal cinge-se às seguintes questões: (i) saber se o réu detinha posse com animus domini apta a ensejar o reconhecimento da usucapião; (ii) saber se a posse alegada pelo réu seria capaz de afastar o direito de imissão na posse dos autores, legítimos proprietários formais do imóvel conforme registro público. III. Razões de decidir 3. O próprio recorrente afirma em suas razões recursais que a origem de sua posse decorre de mera permissão concedida por terceiro, que “cedeu” o imóvel para que nele residisse e desempenhasse funções de “caseiro”. Tal circunstância evidencia a existência de vínculo de natureza precária, oriundo de liberalidade de terceiro, o qual jamais se converte, por si só, em posse “ad usucapionem”. 4. A utilização da usucapião como matéria de defesa (art. 191 do CPC) exige demonstração cabal do preenchimento dos requisitos legais, o que não se verifica no presente caso 5. A mera alegação de sucessão possessória não é suficiente para configurar a usucapião especial urbana, em especial diante da ausência de prova robusta acerca do tempo e da natureza da posse. 6. O registro imobiliário dos autores/apelados foi devidamente formalizado, conferindo-lhes o direito à posse indireta, sendo legítima a pretensão de imissão na posse diante da ocupação indevida. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. Para o reconhecimento da prescrição aquisitiva como matéria de defesa, é imprescindível a demonstração inequívoca da posse mansa, pacífica, contínua e com animus domini pelo prazo legal. 2. O registro imobiliário em nome do autor confere-lhe o direito à imissão na posse, diante da ocupação indevida por terceiro que não detém posse qualificada. ________________________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 1.238, 1.239 e 1.240; CPC/2015, art. 191. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.301.843/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 14.05.2013. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES (RELATOR – JUIZ DE DIREITO CONVOCADO): Egrégia Câmara, Cuida-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por VANDO BASTO DO NASCIMENTO contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, que nos autos da ação de “Imissão na Posse” (Proc. nº 1000940-90.2022.8.11.0002), ajuizada contra o apelante por CARLOS AUGUSTO LEITE DE CARVALHO FILHO E GABRIELLE ANDRADE DE CARVALHO, julgou o pedido procedente para imitir os autores/apelados na posse do imóvel objeto da demanda, qual seja, terreno de 360m², localizado na Rua 13 (Rua Capitão Alberto Aguiar), n. 09, da Quadra n. 26, Loteamento Jardim Marajoara I, Várzea Grande/MT, registrado no 1º Serviço Notarial e de Registro do Município de Várzea Grande/MT, sob a matrícula nº 13.634; a r. sentença condenou o réu/apelante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes, fixados em 10% sobre o valor da causa (cf. Id. nº 242049720). O apelante alega que os depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo não podem ser considerados para fins comprobatórios, com destaque para as declarações prestas por Edileuza Mendes, antiga possuidora do terreno que afirmou que o Lote nº 09, de propriedade dos autores/apelados, “é totalmente murado”, e que o réu/apelante “se utilizando do acesso existente no muro usufruiu indevidamente do terreno lindeiro, constituindo posse precária”, mas, a verdade é que o Lote nº 9, nunca foi murado e tampouco desmembrado dos lotes lindeiros, de nº 10 e 11, fato que, por si só, demonstra a fragilidade do seu depoimento. Alega, ainda, que, detém a posse do terreno há mais de 30 anos através “de sucessão singular”, dizendo que a linha sucessória “se iniciou por Luiz Antônio do Carmo Costa, que passou a posse para Edvaldo Araujo da Silva em 28/04/1992, que repassou para Edvaldo Araujo da Silva, que repassou para Edileuza Mendes, que repassou na data de 07/12/2005 para Jeane Cruz de Oliveira, que repassou Antônio Caleijas, que repassou para Zenildo Moya, que repassou para Rafael de Pieri Sandrini em 22/11/2018, que exerceu a posse juntamente com o seu funcionário Vando Bastos do Nascimento (réu/apelante) e, atualmente exerce a posse indireta do imóvel juntamente com o inquilino Moacir Oliveira dos Santos”, razão pela qual, o réu/apelante faz jus ao reconhecimento da prescrição aquisitiva da propriedade. Insiste em que desde o ano de 2005, a cadeia sucessória, que se estendeu desde a antiga possuidora Jeane Cruz de Oliveira até os atuais moradores, revela a posse mansa, pacífica e ininterrupta do Lote nº 09, tanto que realizaram benfeitorias, limpeza, e algumas edificações, pois o terreno objeto da demanda serve de passagem para os Lotes nº 10 e nº 11, não havendo separação por nenhum tipo de muro ou cerca, o acesso é em comum com passagem e transição livre, compondo um único terreno, cuja posse pertence ao apelante. Aduz que preenche os requisitos da usucapião especial, cuja matéria suscitou como defesa em sua contestação, porém, o MM. Juiz, ignorando totalmente o acervo probatório contido nos autos, julgou improcedente o pedido, o que deve ser modificado nesta instancia recursal, porque preenche todos os requisitos da usucapião, tendo dentro do lapso de tempo a posse mansa, pacífica e tranquila no uso, cuidado e conservação do imóvel. Pede, pois, o provimento do recurso, para que o pedido de imissão na posse seja julgado improcedente, reconhecendo, porém, “a caracterização da prescrição aquisitiva” em favor do Apelante (cf. Id. nº 242049729). O apelado ofertou contrarrazões ao recurso, com réplica às razões recursais e requerimento de desprovimento do apelo (cf. Id. nº 242050264). É o relatório. SUSTENTAÇÃO ORAL USOU DA PALAVRA O ADVOGADO HERNANI ZANIN, OAB/MT Nº 11770. V O T O EXMO. SR. DR. MARCIO APARECIDO GUEDES (RELATOR – JUIZ DE DIREITO CONVOCADO): Egrégia Câmara, Os autores/apelados Carlos Augusto Leite de Carvalho Filho e Gabrielle Andrade de Carvalho ajuizaram a presente ação de Imissão na Posse contra o réu/apelante Vando Basto do Nascimento, alegando serem eles os legítimos proprietários de um terreno com área de 360m² localizado na Rua 13 (atualmente denominada Rua Capitão Alberto Aguiar), nº 09, Quadra 26, no Loteamento Jardim Marajoara I, no município de Várzea Grande/MT, cuja posse sobre o imóvel pertencia ao pai dos autores, que o adquiriu por meio de quitação de dívida da senhora Edileuza Mendes, que entregou o terreno como forma de pagamento, sendo a transação formalizada por procuração lavrada no dia 04/08/2005. Esclarecem que não houve averbação da transferência na matrícula do imóvel, sendo a regularização registral efetivada apenas em 15/11/2020, perante o 1º Serviço Notarial e de Registro de Imóveis de Várzea Grande/MT, sob a matrícula nº 13.634, contudo, após a regularização da propriedade, os autores tomaram conhecimento de que o imóvel estava indevidamente ocupado pelo réu. Ressaltam que informaram o réu Vando Basto sobre sua indevida permanência no local já que eles são os legítimos proprietários do imóvel e requereram a imediata desocupação, mas, o réu se recusou a deixar o imóvel, fato que motivou o ajuizamento da ação com requerimento de imediata imissão na posse do bem. Ao contestar o feito, o réu/apelante disse que realmente “não é o verdadeiro possuidor do lote 09”, mas que reside há sete anos no imóvel edificado nos lotes nº 10 e nº 11, sendo que tais lotes são indivisos com o lote 09, onde “exerce tão somente a função de caseiro”, e que “o verdadeiro possuidor”, é o seu patrão, Rafael De Pieri Sandrini, que também detém a posse dos lotes nº 10 e nº 11, desde o ano de 1992, de modo que, ele, réu/apelante, através da sucessão singular “preenche os requisitos à usucapião extraordinária urbana, pois, mantém a posse do imóvel”, tanto que “pavimentou e ergueu um toldo, pois, o usa como deposito de garrafões de água mineral, bem como, o mantem murado e limpo, fato que demonstra o comportamento de proprietário” (cf. Id. nº 242049675). A r. sentença julgou procedente o pedido de imissão na posse formulado pelos autores sob os seguintes fundamentos: Da prejudicial de mérito Afirma o requerido Vando Basto do Nascimento que preenche os requisitos da usucapião especial, cuja matéria aduziu como defesa na contestação. De início, é possível a alegação da usucapião como matéria de defesa nos termos da Súmula 237 do STF (...). Assim, por ser a matéria alegada em contestação, é questão prejudicial a pretensão possessória pretendida pelos autores, razão pelo qual passo a análise do pedido de usucapião especial formulado pelo requerido. Pois bem. A usucapião especial urbana está positivada no art. 183, da Constituição da República, sendo repetido em sua integralidade no art. 1.240, do Código Civil, com a seguinte redação: “Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a como sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”. Observa-se, a partir da análise dos preceitos normativos acima mencionados que a aquisição da propriedade, a partir da usucapião, necessita do preenchimento dos seguintes requisitos específicos, além da demonstração da justa posse: a) posse mansa e pacífica e com animus domini; b) exercício ininterrupto e sem oposição da posse da área durante 15 (quinze) anos; c) se o bem for destinado à moradia do possuidor ou à sua família o tempo se reduz para 10 (dez) anos. No caso em deslinde, o requerido afirma que sucedeu a posse dos antigos adquirentes do imóvel, cuja soma de tempo remonta a 30 (trinta) anos, pois a sucessão vem se contabilizando desde o ano de 1992. Para comprovar a posse, juntou registro fotográfico do terreno em litígio para justificar que utiliza a área para armazenamento de garrafões de água, e demonstrativo de imposto de renda em nome do autor em que consta débito fiscal. Nos termos do art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil o requerido não desincumbiu do ônus probatório de comprovar fato impedido do direito dos autores já que os documentos juntados nos autos não são capazes de provar a justa posse e lapso temporal. Em contrapartida, a prova oral realizada em juízo revelou a posse precária do requerido. Isso porque a testemunha Edileuza Mendes, antiga possuidora do lote 09, afirmou que comprou um veículo do Sr. Carlos Augusto no ano de 2005, genitor dos autores, dando em pagamento o lote 09 e desde então ele passou a exercer a posse sobre o bem. Explicou que quando comprou o imóvel do Sr. Edvaldo, passou a residir no lote 10 e 11 e no lote 09 existia um muro com uma pequena passagem de acesso aos lotes 10 e 11. Asseverou que vendeu os lotes 10 e 11 para Jeane Cruz de Oliveira Zanin, mas não vendeu e tampouco passou a posse do lote 09 para Jeane, o que refuta a tese do requerido de que sucedeu a posse da antiga proprietária. Ademais, a testemunha Edileuza acrescentou que o lote 09 era totalmente murado o que reflete que o requerido, utilizando-se do acesso existente no muro usufruiu indevidamente da posse do terreno lindeiro, constituindo assim uma posse precária. Desta feita, a possível existência de posse do requerido teria ocorrido em razão da relação negocial com a antiga proprietária do imóvel sobre os lotes limítrofes, sendo certo que tinha conhecimento sobre a titularidade do imóvel, retirando desta forma, a intenção de ser dono. (...). Corrobora ainda a precariedade da posse o fato de o imóvel em questão ter sido alienado aos autores no dia 28.06.2021, conforme documento de ID 73701090. No mais, as testemunhas arroladas pelo requerido não demonstraram de forma clara a aquisição do lote lindeiro não impondo em sucessão possessória como já apontado pela antiga possuidora evidenciando, assim, ato próprio, originário, de aquisição da posse por invasão. De mais a mais, não há um elemento de prova sequer indicando que a área objeto da presente ação foi efetivamente adquirida pelo requerido ou mesmo que pudesse qualificar uma suposta ocupação anterior já que a antiga possuidora afirmou que não lhe passou a posse. Assim, não produziu o requerido prova alguma do exercício da posse do lote 09, ônus que lhes incumbia (artigo 373, I, do CPC). Assim, uma vez que na usucapião se prestigia a aquisição justa com intenção de dono, de forma mansa e pacífica, verifica-se que não foram preenchidos os requisitos basilares do instituto. Do mérito Trata-se de ação de imissão de posse proposta por Carlos Augusto Leite de Carvalho Filho e Gabrielle Andrade de Carvalho em desfavor de Vando Basto do Nascimento. Pois bem, a ação de imissão de posse, conquanto não prevista no novo estatuto processual civil, ainda encontra agasalho na atual sistemática e tem como pressuposto essencial a prova do domínio, título hábil devidamente transcrito no registro imobiliário, o que se constata no ID 73701089. Assim, os requerentes, por serem titulares do imóvel em questão, possuem legitimidade ativa para promoverem a ação de imissão na posse contra alienantes ou terceiros que o detenham. A via eleita é seguramente a adequada a atender a pretensão da parte requerente que, possuindo o domínio do imóvel, e, para vindicar tal posse, utilizou-se do instituto da imissão de posse, que é cabível nos casos em que o proprietário almeja lograr posse que nunca teve. E este direito de posse decorre do direito de sequela conferido ao proprietário. É o caso dos autos. Com efeito, infere-se dos autos que os autores adquiriram a propriedade do imóvel “sub judice” diretamente do genitor por meio de contrato de compra e venda e averbado da matrícula 13.634. Logo, tem eles a faculdade de reaver o imóvel de quem quer que seja (erga omnes). Indubitável, portanto, que a pretensão dos requerentes de se imitirem na posse do imóvel adquirido é legítima, haja vista que a compra e venda do imóvel, com consequente registro são atos jurídicos perfeitos que não foi desconstituído pela via judicial e, portanto, aptos a produzir efeito imediato no mundo jurídico. Reforço, por fim, que o simples fato de os autores possuírem título legítimo acerca do imóvel em questão já lhe dá o direito de ser imitido na posse, em especial, porque a parte requerida não demonstrou, por meio de qualquer outro título ou justificação jurídica plausível, a legitimidade da sua ocupação sobre o bem. Nestas condições, comprovado “quantum satis” os pressupostos informadores da espécie, impõe-se a procedência do pedido de imissão de posse. Pelo exposto, julgo procedentes os pedidos iniciais para imitir, em definitivo, os requerentes na posse do imóvel descrito na inicial, tornando definitiva a liminar concedida. Em consequência, resolvo o mérito, na forma do art. 487, I do CPC. Condeno ainda a parte requerida ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. O réu/apelante refuta, de início, o depoimento prestado pela testemunha Edileuza Mendes, antiga possuidora do terreno objeto da presente ação de imissão na posse. Alega que a referida testemunha afirmou, em juízo, que o Lote nº 09 era totalmente murado, quando, na realidade, tal lote jamais foi desmembrado dos Lotes nºs 10 e 11, constituindo, portanto, um imóvel indiviso. Ocorre que o fato de o Lote nº 09 estar murado, ou de ter sido desmembrado, é irrelevante para o preenchimento dos requisitos legais exigidos para o ajuizamento da ação de imissão na posse. Referida ação tem por finalidade assegurar ao legítimo proprietário, ou ao titular de direito real sobre bem imóvel determinado, o ingresso na posse direta do bem, quando esta se encontra injustamente exercida por terceiro ou, simplesmente, ainda não tenha sido entregue. Exige-se, como pressuposto essencial, a demonstração do domínio ou de outro título jurídico hábil que justifique a pretensão possessória, nos termos do art. 1.228 do Código Civil. No caso concreto, a propriedade dos autores/apelados sobre o imóvel é incontroversa, estando demonstrada por meio da escritura pública registrada sob o Id nº 242049153, além das demais provas constantes dos autos. Tais elementos evidenciam que a testemunha Edileuza Mendes foi, de fato, a antiga possuidora do Lote nº 09, tendo-o transferido ao pai dos autores/apelados como forma de pagamento de dívida reconhecida na "Nota Promissória e Termo de Confissão de Dívida" (cf. doc. Id nº 242049155). Ademais, seu depoimento, ainda que eventualmente contrário à pretensão autoral, não teria o condão de infirmar a situação fática posta nos autos: a escritura pública e a matrícula registrada do terreno atestam a propriedade dos autores/apelados. O instituto da imissão na posse deriva do direito real de propriedade, e, assim, está, assentado no pressuposto da titularidade do domínio, cuidando-se de instrumento colocado à disposição do proprietário que pretende obter a posse do imóvel nunca dantes exercida, e, assim, para que o pedido seja prestigiado, basta que comprove o domínio, individualize a coisa e demonstre a existência de posse injusta de quem esteja obstaculizando ou impedindo o exercício pleno do seu direito (CC, art. 1.228); em síntese objetiva, para o sucesso da pretensão petitória, o autor deve comprovar a reunião de três elementos: (I) domínio; (II) individualização da coisa e (III) posse injusta do réu. Em relação ao primeiro requisito, verifica-se que se trata da existência ou não da propriedade, a qual só é comprovado mediante registro na matrícula competente; no caso, como já dito, os documentos apresentados pelos autores/apelados comprovam a aquisição do imóvel com área de 360 m2, localizado na Rua 13 (Rua Capitão Alberto Aguiar), nº 09, quadra 26, Bairro Loteamento Jardim Marajoara I, Cidade de Várzea Grande/MT, que está devidamente registrado no 1º Serviço Notarial e de Registro de Várzea Grande/MT, sob a matricula nº 13.634, por força de Escritura Pública e Compra e Venda lavrada no dia 28/06/2021 (cf. Id. nº 242049153), sendo, portanto, inequívoca a titularidade do imóvel pertencente aos autores. A individualização do bem está igualmente demonstrada pela Certidão de Registro do Imóvel (cf. Id. nº 242049171). Quanto à posse injusta, verifica-se que a ocupação do imóvel pelo réu/apelante decorreu de mera permissão de um terceiro (Rafael de Pieri Sandrin), este que, supostamente “cedeu” o local para ele morar e desempenhar as funções de “caseiro”. Tal circunstância, por si só, demonstra a precariedade da posse do réu. O réu/apelante apresentou como matéria de defesa o decurso do prazo de prescrição aquisitiva para a concessão de usucapião, justificando a posse dizendo que há mais de sete anos reside no imóvel edificado nos lotes nº 10, e nº 11, exercendo posse mansa, pacífica e tranquila no uso, cuidado e conservação do imóvel, porém, não acostou aos autos nenhuma prova de título dominial, concluindo-se, portanto, que a posse do réu/apelante não é mansa, pacífica e ininterrupta, sendo, portanto, considerada injusta. Ademais, o próprio recorrente diz expressamente em suas razões recursais que a origem de sua posse decorre de mera permissão concedida por terceiro, identificado como Rafael de Pieri Sandrin, o qual “cedeu” o imóvel para que o réu nele residisse e desempenhasse funções de “caseiro”, circunstância que revela um vínculo de natureza precária, derivado de tolerância ou liberalidade de terceiro, que jamais se converte, por si, em posse “ad usucapionem”. A jurisprudência pacífica do eg. Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que o detentor por mera permissão de uso, ainda que prolongada no tempo, não possui o “animus domini” necessário à aquisição da propriedade por usucapião; senão vejamos: EMENTA: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. POSSE PRECÁRIA. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante dispõe o art. 1.208 do Código Civil de 2002, os atos de mera permissão não ensejam a aquisição originária de propriedade, tendo em vista que se trata de posse precária, com o condão de afastar o ânimo de dono, caracterizando, portanto, a parte como mera detentora. 2. No caso concreto, o Tribunal a quo não afastou somente a prescrição aquisitiva, mas também a posse ad usucapionem, exercida com animus domini, consignando expressamente que o ora recorrente agia como mero detentor do imóvel, sendo a posse exercida precariamente, não havendo, portanto, comprovação de transmutação do caráter da posse. 3. Esta Corte Superior entende que não é possível rever a análise do Tribunal a quo acerca da presença dos requisitos para a aquisição da propriedade pela usucapião, sem a perquirição do substrato fático-probatório presente nos autos, situação que, na hipótese vertente, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – Quarta Turma - relator Ministro Raul Araújo - AgInt no AREsp n. 2.008.958/GO, julgado em 3/10/2022, DJe de 21/10/2022). EMENTA: RECURSO ESPECIAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CORREDOR DE 60 CM EXISTENTE ENTRE OS IMÓVEIS DAS PARTES. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. ATOS POSSESSÓRIOS PRATICADOS SOBRE A COISA INSUFICIENTES À CONFIGURAÇÃO DE POSSE QUALIFICADA. (...). 1. 2. (...). 3. Qualquer que seja a espécie de usucapião alegada, a comprovação do exercício da posse sobre a coisa será sempre obrigatória, sendo condição indispensável à aquisição da propriedade. Isso porque a usucapião é efeito da posse, instrumento de conversão da situação fática do possuidor em direito de propriedade ou em outro direito real. 4. Se não se identificar posse com ânimo de dono, acrescido do despojamento da propriedade, que qualifica a posse, o exercício de fato sobre a coisa não servirá à aquisição da propriedade. 4. 5. 6. 7. (...) 8. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ – Quarta Turma - relator Ministro Luis Felipe Salomão, REsp n. 1.644.897/SP, julgado em 19/3/2019, DJe de 7/5/2019). Registre-se, ainda, que a posse injusta, para os fins previstos na parte final do art. 1.228 do Código Civil, é aquela exercida por quem não seja dono (independentemente de boa ou má-fé), exatamente como se deu na hipótese dos autos, pois, embora o recorrente alegue exercer posse há mais de sete anos sobre o imóvel, não demonstrou a existência de qualquer justo título ou qualquer manifestação inequívoca de posse exclusiva e autônoma, tampouco promoveu qualquer ato revelador de sua intenção de exercer domínio sobre o bem de maneira incompatível com a permissão inicial, limitando-se a descrever, de forma genérica, que realiza cuidados e manutenção no imóvel. Tais condutas, todavia, estão em harmonia com as funções que ordinariamente cabem a um caseiro ou ocupante por liberalidade, não configurando, por si, posse qualificada como pretende. Quanto a alegação do apelante de que sucedeu a posse dos antigos adquirentes do imóvel, cuja soma de tempo remonta a 30 (trinta) anos, pois a sucessão vem se contabilizando desde o ano de 1992, não há provas da aquisição do referido lote nos moldes da sucessão possessória afirmada. As declarações do recorrente são vagas e imprecisas quanto à existência de qualquer ato jurídico, formal ou informal, de transferência da posse entre os antigos ocupantes ao recorrente, tampouco evidenciaram qualquer relação de continuidade material entre os respectivos exercícios possessórios. Como bem apontado pela antiga possuidora Edileuza em manifestação constante nos autos (cf. Id. nº 242049714), o requerido não a sucedeu na posse, mas se estabeleceu no imóvel por ato próprio e desvinculado de qualquer cadeia possessória legítima ou anterior, o que corrobora as próprias arguições do recorrente de que está no local por mera permissão de um terceiro que o contratou para tomar conta do imóvel. A posse é, por sua própria natureza, fato jurídico que se evidencia no plano material por meio de atos externos e contínuos de domínio, ainda que sem o título de propriedade, no entanto, para que se reconheça sua legitimidade e eventual proteção jurisdicional, é indispensável a demonstração de que o exercício possessório se deu em conformidade com os requisitos legais, o que não se verifica no presente caso. Diante de todas as considerações feitas, inafastável o reconhecimento de que os autores/apelados se desincumbiram satisfatoriamente do ônus de comprovar o fato constitutivo do seu direito (CPC, art. 373, I), ou seja, a propriedade do imóvel e a posse injusta exercida pelo réu, sendo certo, por outro lado, que o réu não produziu nenhuma prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado pelos autores (CPC, art. 373, II), de modo que a procedência do pedido de imissão na posse reconhecida pela sentença é irretocável. Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a r. sentença recorrida. Custas pelo apelante, observada a regra do art. 98, §3º, do CPC/2015. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. SEBASTIAO BARBOSA FARIAS (1º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. V O T O EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (2º VOGAL): Aguardo o pedido de vista dos autos. SESSÃO DE 08 DE JULHO DE 2025 (CFONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O EXMO. SR. DES. SEBASTIAO BARBOSA FARIAS (1º VOGAL): Egrégia Câmara, Cinge-se a controvérsia à pretensão de reconhecimento da prescrição aquisitiva do lote n.º 09, da quadra 26, do Loteamento Jardim Marajoara I, situado em Várzea Grande/MT, conforme registro sob a matrícula n.º 13.634 do 1º Serviço Notarial e de Registro do Município de Várzea Grande. Pedi vista dos autos para melhor exame da matéria. Após detida análise, acompanho integralmente o voto do eminente Relator, que manteve a respeitável sentença de improcedência. Com efeito, a ausência do animus domini, elemento nuclear da usucapião, revela-se de forma incontestável nos autos. Conforme destacado pelo ilustre Relator, a posse alegada pelo apelante revela-se precária, pois exercida sob tolerância e em nome de outrem, o que desqualifica a posse ad usucapionem. O próprio apelante, reconhece que exercia mera detenção do bem: “O Apelante em observância o que preceitua o art. 337, XI, do CPC, em sede de contestação (Id.84560097), alegou a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda pelo fato que era funcionário da empresa do verdadeiro possuidor do imóvel Sr. Rafael de Pieri Sandrini, ou seja, era mero detentor do imóvel sub judice. Juntou documentos para comprovar o seu vínculo laboral, bem como, com fulcro no art. 339, do CPC, indicou o verdadeiro possuidor do imóvel sub judice. (...) Nobre Des(a) desembargador(a) Relator(a), com o devido respeito, a r. decisão que indeferiu o ingresso do Sr. Rafael de Pieri Sandrini no polo Passivo da presente demanda merece reforma, pelo fato que o Sr. Vando Basto do Nascimento, à época da citação era funcionário do Sr. Rafael e, hoje não é mais, inclusive, não mora em Cuiabá e, sim, na Cidade de Curitiba/PR. Está provado nos autos por meio da testemunha Sr. Moacir Oliveira dos Santos, de que é o mesmo quem aluga atualmente o imóvel que está edificado nos lotes lindeiro ao lote 09, objeto da presente demanda. Destarte, imperioso destacar que o Apelante Vando Basto do Nascimento detinha a posse do lote 09, na condição de mero detentor (famulo da posse), pois, agia a mando do seu patrão, Sr. Rafael de Pieri Sandrini, que é o verdadeiro possuidor indireto do lote 09, pois, é quem integra a relação jurídica de direito material deduzida nos autos”. (destaquei) Além disso, invocando o art. 339 do CPC, o apelante indicou o Sr. Rafael de Pieri Sandrini como o real possuidor, inclusive apresentando documentos que atestam vínculo laboral com este. Destaca-se também a prova oral colhida, segundo a qual a atual ocupação do imóvel se dá por terceiros, não havendo demonstração de posse contínua e exclusiva pelo apelante. Dessa forma, não se comprova o exercício de posse mansa, pacífica, contínua, com ânimo de dono e por prazo suficiente, conforme exigido pelas diversas modalidades de usucapião previstas na legislação vigente. Relevante registrar que a tentativa de ingresso nos autos do suposto possuidor indireto – Sr. Rafael de Pieri Sandrini – foi indeferida, e não houve insurgência recursal contra tal decisão. Assim, o que se tem é a mera detenção exercida por preposto, posse em nome de outrem, desprovida de qualquer traço de domínio ou autonomia possessória. Em outras palavras, os atos de permissão ou tolerância não ensejam a aquisição originária da propriedade, como reiteradamente reconhecido pela jurisprudência nacional. Não se trata aqui de negar a viabilidade da usucapião como forma de aquisição do domínio, mas sim de reafirmar que tal instituto exige a comprovação de todos os seus requisitos legais, o que inequivocamente não se verifica no caso dos autos. Diante desse contexto, e considerando a inexistência de posse qualificada para fins aquisitivos, não há como acolher a pretensão recursal de reconhecimento do domínio por usucapião. Ante o exposto, acompanho o Eminente Relator, para negar provimento ao recurso de apelação, mantendo a sentença que acolheu o pedido de imissão na posse dos apelados e julgou improcedente a ação de usucapião, por seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto. V O T O EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (2º VOGAL): Acompanho o voto do relator. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025.

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Luciano Costa Brasil x Banco Bmg S.A.

ID: 292771194

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1028779-90.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

LUCIANO COSTA BRASIL

Polo Passivo:

BANCO BMG S.A.

Sentença

Advogados:

SERGIO GONINI BENICIO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

HERBERT REZENDE DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo: 1028779-90.2022.8.11.0002. REQUERENTE: LUCIANO COSTA BRASIL REQUERIDO: BANCO BMG S.A.… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo: 1028779-90.2022.8.11.0002. REQUERENTE: LUCIANO COSTA BRASIL REQUERIDO: BANCO BMG S.A. Vistos. Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO c/c REPETIÇÃO DO INDÉBITO E RESSARCIMENTO DE DANOS MORAIS, pela qual a parte requerente afirma que o requerido efetuou descontos em seu benefício previdenciário, referente a um empréstimo decorrente de Reserva de Margem Consignável (RMC). Afirma que não teria realizado o aludido negócio jurídico na modalidade de saque. Sustenta ainda que houve vício de consentimento quanto à contratação de empréstimo advindo de reserva de margem consignável, pois acreditava estar contratando um empréstimo consignado, alega ainda a incidência de juros abusivo. Requer, assim, seja determinada a cessação dos descontos e que o requerido seja condenado a lhe restituir em dobro o montante pago, além do ressarcimento dos danos extrapatrimoniais (morais) decorrentes das cobranças indevidas. Devidamente citado, o requerido apresentou contestação, alegando preliminares. No mérito, aduziu que agiu no exercício regular do direito, pois os descontos são devidos, ante a celebração do contrato e o depósito do valor do empréstimo na conta bancária de titularidade da parte requerente. Sustenta a ausência de danos morais, pugnando pela improcedência dos pedidos. A parte requerente, devidamente intimada, apresentou impugnação à contestação. Intimadas as partes para requererem provas, deixaram de indicar. É o relatório do necessário. FUNDAMENTO E DECIDO: DO JULGAMENTO ANTECIPADO Analisando os autos, verifico que o feito comporta o julgamento antecipado, nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC, por se tratar de matéria exclusivamente de direito e por não haver necessidade de produção de outras provas além daquelas já constantes nos autos. A controvérsia instaurada não demanda dilação probatória, sendo possível ao Juízo formar convicção com base na prova documental acostada, assegurando-se, assim, o princípio da celeridade processual, sem prejuízo ao contraditório e à ampla defesa. Ressalta-se que o julgamento antecipado, longe de configurar cerceamento de defesa, constitui instrumento legítimo de efetividade jurisdicional, quando a instrução probatória revela-se prescindível para a solução da controvérsia posta. Nesse sentido: “JUSTIÇA GRATUITA. IMPUGNAÇÃO. AFASTAMENTO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO. INADMISSIBILIDADE. CASO EM QUE COMPROVADA A IMPOSSIBILIDADE ECONÔMICA DO DEMANDANTE. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA QUE DEVE SER RESERVADA ÀQUELES CASOS EM QUE A IMPOSSIBILIDADE SE REVELE. PRELIMINAR REJEITADA. CERCEAMENTO DE DEFESA . INOCORRÊNCIA. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. ALEGADA NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA ORAL. HIPÓTESE, CONTUDO, EM QUE ELA SE MOSTRA ABSOLUTAMENTE DESNECESSÁRIA PARA O DESLINDE DA CAUSA. MATÉRIA EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO. PRELIMINAR REJEITADA. CONDOMÍNIO . COISA COMUM INDIVISÍVEL. ADMISSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO JUDICIAL. AUTOR QUE NÃO É OBRIGADO A MANTER O CONDOMÍNIO ETERNAMENTE. EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO QUE CONFIGURA DIREITO POTESTATIVO DO COPROPRIETÁRIO . SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.” (TJ-SP - Apelação Cível: 1012665-16.2022 .8.26.0566 São Carlos, Data de Julgamento: 08/02/2024, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2024) (negrito nosso) PRELIMINARES CONEXÃO/CONTINÊNCIA A parte ré apresentou preliminar de conexão/continência, sob a tese de que a parte propôs ação idêntica a esta no juizado Especial. Em que pesem os fundamentos da parte requerida, observa-se que as duas demandas não são exatamente idênticas, visto que a presente possui pedidos mais abrangentes que a outra demanda, sendo caso, de continência. Ocorre que a ação citada pela parte já foi devidamente julgada, o que impede a reunião das ações contidas para julgamento conjunto, nos moldes do art. 56 e 57 do CPC. Logo, não há que se falar em litigância de má-fé. Assim, AFASTO A PRELIMINAR em voga. DA CONDUTA DO CAUSÍDICO Com relação ao pleito de expedição de ofício à OAB para apuração da conduta do causídico, não merece prosperar, visto que diligências relacionadas a expedição de ofício se tratam de atos que independem de determinação judicial, podendo a parte diligenciar perante o próprio órgão. Cito precedente: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E ENTREGA DE COISA CERTA – PEDIDO RECONVENCIONAL VINDICANDO O PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA INCIDENTAL – INCOMPATIBILIDADE DO PEDIDO INICIAL COM O PROVIMENTO FINAL DA LIDE – EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS PARA CARTÓRIO E OAB – DILIGÊNCIAS QUE INDEPENDEM DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A teor do art. 300 do Código de Processo Civil, a tutela antecipada deve corresponder àquela que será prestada na sentença de procedência, a qual, por seu turno, fica adstrita ao pedido principal. As diligências administrativas para a expedição de ofício se tratam de atos que independem de determinação judicial, podendo a parte efetuar a provocação no órgão ou instituição competente.” (TJ-MT – N.U 1010977-85.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/11/2022, Publicado no DJE 14/11/2022). Assim, AFASTO A PRELIMINAR em voga. MÉRITO DA APLICAÇÃO DO CDC O Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento de que é aplicável o CDC às relações envolvendo instituições financeiras. É, com efeito, o que se lê na redação da Súmula 297 do mencionado sodalício: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Resta, portanto, indubitável a aplicação da lei consumerista no caso em apreço. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA No entanto, o caso não é de inversão do ônus da prova, já que não se vê qualquer hipossuficiência da parte autora para a produção da prova. Afinal, se o requerente afirma que há abusividade, é porque avaliou o contrato em discussão e chegou a essa conclusão, de modo que INDEFIRO o pleito em questão. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO - CONTRATO BANCÁRIO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS - INDEFERIMENTO. - A inversão do ônus da prova deve ser deferida somente quando comprovada pelo consumidor a sua hipossuficiência técnica que o impeça de coletar provas dos fatos constitutivos do seu direito, bem como a verossimilhança dos fatos por ele alegados. (TJ-MG - AI: 10000200621159001 MG, Relator: Valdez Leite Machado, Data de Julgamento: 27/08/2020, Data de Publicação: 27/08/2020). PROCESSO CIVIL - APELAÇÃO - REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INDEFERIMENTO -CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - POSSIBILIDADE. EMENTA: PROCESSO CIVIL - APELAÇÃO - REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INDEFERIMENTO -CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - POSSIBILIDADE. EMENTA: PROCESSO CIVIL - APELAÇÃO - REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INDEFERIMENTO -CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - POSSIBILIDADE. EMENTA: PROCESSO CIVIL - APELAÇÃO - REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO -- INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INDEFERIMENTO -CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - POSSIBILIDADE. – (...) Não há qualquer dificuldade para o apelante realizar a prova constitutiva de seu direito, pois o que se pretende comprovar é a abusividade das cláusulas do contrato de financiamento celebrado, o que pode ser feito através de simples exame das cláusulas contratuais, motivo pelo qual não há que se falar em inversão do ônus da prova. (TJ-MG - AC: 10707150223832001 Varginha, Relator: Pedro Aleixo, Data de Julgamento: 05/07/2017, Câmaras Cíveis / 16ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 14/07/2017). LIMITES DA LIDE Valioso ressaltar a premissa de que, segundo a Súmula n. 381 do STJ: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.” Portanto, a cognição do Juízo se aterá apenas ao que fora apresentado especificadamente pela parte autora, sem que seja enfrentada qualquer questão genericamente abordada na exordial. Nesse sentido é a orientação jurisprudencial: “AÇÃO DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO DO AUTOR IMPROVIDA. CONTRATO BANCÁRIO . AÇÃO REVISIONAL. PETIÇÃO INICIAL GENÉRICA. IMPOSSIBILIDADE DO CONHECIMENTO DE OFÍCIO DE ABUSIVIDADE DAS CLÁUSULAS. ABUSIVIDADE NA COBRANÇA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO DE JUROS . AUSÊNCIA DE PROVA DE ILEGALIDADE. Ação revisional veiculada por petição inicial genérica. Alegação de abusividade na cobrança dos juros remuneratórios e capitalização de juros. Ausência de indicação precisa das operações e cláusulas impugnadas . O autor narrou ser titular de conta corrente junto ao banco réu com o ajuste de diversos produtos e serviços, inclusive cheque especial. Cabia à parte instruir o processo com as provas que ela própria poderia produzir, até porque pela narrativa contida no na inicial e no recurso, o autor teve acesso a documentos e contratos. Além de uma fundamentação completamente condicional e genérica, o autor não produziu prova mínima de suas alegações. Petição inicial que tangenciou a inépcia . Ação julgada improcedente. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.” (TJ-SP - Apelação Cível: 1014836-86 .2022.8.26.0002 São Paulo, Relator.: Alexandre David Malfatti, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/01/2024) Assim, a análise judicial se atrelará ao que fora especificadamente abordado na peça inicial: juros. DOS JUROS O verbete 382 do STJ já petrificou essa discussão: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.” Em conjugação com essa Súmula, é importante lembrar a seguinte orientação do Colendo STJ: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. COBRANÇA ABUSIVA . LIMITAÇÃO. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E REEXAME PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE . SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a cobrança abusiva (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art . 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento concreto. 2. No caso dos autos, a Corte de origem concluiu pelo caráter abusivo da taxa de juros remuneratórios porque fixada em valor exorbitante em relação à média de mercado, em contratos assemelhados. A modificação de tal entendimento é inviável em sede de recurso especial, nos termos das Súmulas 5 e 7 do STJ . 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ - AgInt no AREsp: 2067627 MT 2022/0032902-6, Data de Julgamento: 13/06/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/06/2022) (negrito nosso) Assim, muito embora a média de mercado seja um excelente padrão de comparação, é bom repisar que a “abusividade dos juros remuneratórios só pode ser declarada à vista de taxa que comprovadamente discrepe, de modo substancial, da média do mercado”. (STJ - AgRg no AREsp 382.628/MS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2013, DJe 21/10/2013) (negrito nosso) A parte insiste em alegar que os juros devidos são de 1% a.m., alegando que era a taxa média aplicada pelo banco central na época da contratação, não merece prosperar, visto que se utilizou de índices diversos, que se referem a “crédito pessoal consignado”, entretanto o caso em comento envolve contratação de “cartão de crédito rotativo”. No vertente caso, a taxa média de mercado é fornecida pelo Banco Central do Brasil (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores), sendo certo que a parte autora sequer juntou extrato da consulta. Portanto, não se pode dizer que seja substancial a ponto de considerá-la abusiva. Depois, a discussão travada nos autos resume-se, ainda, à taxa de juros efetiva. Não custa ressaltar que não se deve confundir o custo efetivo total com a taxa de juros, uma vez que aquele inclui todos os encargos cobrados, inclusive, diluídos nas parcelas, de modo que, por lógica, supera o valor dos juros pactuados. Em que pese a impugnação dos juros pela parte autora, o que ocorre é que há diferença entre juros moratório e juros remuneratório, podendo incidir ambos ao mesmo tempo, visto que um se trata dos juros cobrados mensalmente e outro se trata dos juros que incidem em virtude da inadimplência. A confusão conceitual entre juros moratórios e remuneratórios evidencia falha técnica do autor, uma vez que possuem finalidades distintas: os primeiros compensam o atraso no cumprimento da obrigação, enquanto os segundos remuneram o uso do capital emprestado, vejamos precedente: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA EM EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO DE CÁLCULO PERICIAL. ALEGAÇÃO DE ERROS TÉCNICOS. NECESSIDADE DE NOVA PERÍCIA. RECURSO PROVIDO. (...) A confusão conceitual entre juros moratórios e remuneratórios evidencia falha técnica, uma vez que possuem finalidades distintas: os primeiros compensam o atraso no cumprimento da obrigação, enquanto os segundos remuneram o uso do capital emprestado.(...) Tese de julgamento: A existência de inconsistências metodológicas e contradições no laudo pericial homologado justifica a realização de nova perícia técnica, nos termos do art. 480 do CPC/2015. Juros moratórios e remuneratórios possuem naturezas jurídicas distintas, não podendo ser tratados de forma equiparada nos cálculos periciais. (...) (TJ-MT - N.U 1023160-20.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/11/2024, Publicado no DJE 26/11/2024).” Logo, juros moratórios e remuneratórios possuem naturezas jurídicas distintas, não podendo ser tratados de forma equiparada no contrato em comento. Assim, resta inviável a aplicação da taxa de juros pretendida pela autora de 1 % a.m., visto que em total desconformidade com a contratação e a taxa média de juros divulgado pelo Bacen, afastando-se, por consequência, todas as demais teses da parte autora que giram unicamente em torno da referida taxa de juros pretendida, como capitalização de juros sobre juros, visto que a taxa que vem sendo aplicada obedece a média do Banco Central, não evidenciando qualquer prática de capitalização de juros. Logo, não restou provado, então, que a taxa aplicada destoa significativamente da taxa média de mercado e, por isso, diante desse cenário, não há ilegalidade a ser expurgada. Com tais considerações, extrai-se que a parte autora contratou livremente e não há qualquer conduta ilícita do requerido, sendo, portanto, improcedentes os pedidos de revisão contratual, repetição de indébito, ou indenização por danos extrapatrimoniais. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial e, por consequência, JULGO EXTINTO O PROCESSO com resolução do mérito, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Condeno a parte requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa. No entanto, considerando a concessão dos benefícios da Justiça gratuita à parte autora, a exigibilidade de tais verbas fica suspensa, nos termos do art. 98 e ss. do CPC. Transitada em julgado, arquivem-se os autos, promovendo-se as baixas e anotações necessárias. Intimem-se. Cumpra-se. Várzea Grande-MT, data e horário registrados no sistema. ANGELO JUDAI JUNIOR Juiz de Direito

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Waleria Da Silva Lima x Reserva Administradora De Consórcio Ltda - Epp

ID: 319700726

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1019564-90.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

WALERIA DA SILVA LIMA

Polo Passivo:

RESERVA ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA - EPP

Sentença

Advogados:

DANIELLY LUCAS TAUGINO

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UGO LEONARDO SUBTIL E SILVA

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Processo nº 1019564-90.2022.8.11.0002 VISTOS. Trata-se de ação de rescisão de contrato com restituição de crédito e indenização por danos morais, ajuizada por Waleria da Silva Lima em face de Reserva… Processo nº 1019564-90.2022.8.11.0002 VISTOS. Trata-se de ação de rescisão de contrato com restituição de crédito e indenização por danos morais, ajuizada por Waleria da Silva Lima em face de Reserva Administradora de Consórcio Ltda., partes qualificadas nos autos. A autora alega, em síntese, que em 09/09/2020 fez adesão a um Grupo de Consórcio junto à requerida, com objetivo de ser contemplada em uma carta de crédito no valor de 50 mil reais. Aduz que, em 17/09/2020, realizou em nome da requerida um pagamento no valor de R$ 3.456,38 a título de entrada. Após efetivar o pagamento de 7 (sete) prestações mensais, no valor de R$ 756,38, de setembro/2020 à março/2021, a requerente tentou dar um lance na oitava prestação, mas foi surpreendida com a informação via e-mail do SAC da empresa requerida que o seu contrato havia sido “suspenso” por débitos de várias parcelas, isto é, a requerida alegou que a autora somente pagou a entrada no valor de R$ 3.456,38 e que estava em débito com relação a todas as parcelas vencidas. Sustenta, no entanto, que foi vítima de um ilícito por parte da empresa. Por isso, requer a concessão do benefício da gratuidade da justiça; a inversão do ônus da prova; a rescisão contratual e o ressarcimento dos valores pagos, acrescidos de juros legais e correção monetária no valor de R$ 3.456,38; e a condenação da requerida à indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. Junta documentos. Deferida a gratuidade da justiça, bem como a inversão do ônus da prova (ID 88463464). Citada, a requerida ofereceu contestação (ID 93919032), defendendo, em suma, a observância legal na contratação de consórcio; a cobrança da taxa de administração; quanto ao pagamento das parcelas, aduz que a autora foi orientada a fazer os pagamentos na conta da administradora do consórcio reserva, conforme previsto no contrato, e, ainda, no pós venda que os pagamentos deveriam ser realizados na conta da administradora, no entanto, fez os depósitos na conta da representação, forma totalmente diversa da orientação, motivo pelo qual, a administradora não acusou o recebimento dos valores em tempo hábil para regularizar o pagamento e, no momento, a autora encontra-se com 2 parcelas atrasadas (março e abril); a inexistência de danos morais; e a improcedência dos pedidos. Também juntou documentos. Impugnação à contestação (ID 93983989). É o relatório. Fundamento e decido. Prefacialmente, friso que o julgador não está obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos da parte. Para a resolução da controvérsia, basta a manifestação a respeito das questões relevantes e imprescindíveis para esse fim, de acordo com a exegese do Superior Tribunal de Justiça[1]. No que respeita à distribuição do ônus da prova, de regra, o ônus da prova incumbe à parte requerente, quanto ao fato constitutivo de seu direito, e ao requerido, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, consoante o art. 373, I e II, do CPC. Nesse diapasão, contudo, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso ministra que: [...] Nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, a inversão do ônus da prova não é automática e apenas será deferida quando o juiz reconhecer verossimilhança a alegação do consumidor ou quando for ele hipossuficiente para a produção da prova. Se a parte não demonstra a hipossuficiência técnica, é de rigor o indeferimento da inversão do ônus da prova[2]. De modo igual, a hermenêutica do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a aplicação do art. 6º, VIII, do CDC não é automática e depende da análise, pelas instâncias ordinárias, da verossimilhança da alegação e da demonstração de hipossuficiência do consumidor. A saber: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. 1. OFENSA AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015 NÃO CONFIGURADA. 2. OMISSÃO ACERCA DA VIOLAÇÃO DO ART. 6º, VIII, DO CDC. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 1.025 DO CPC/2015. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA QUE NÃO SE DÁ DE FORMA AUTOMÁTICA. VERIFICAÇÃO DA PRESENÇA DOS REQUISITOS E REVISÃO DAS CONCLUSÕES DO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À COMPROVAÇÃO DO VÍNCULO CONTRATUAL E INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 3. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. 4. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO[3]. Nesse passo, ainda, o Superior Tribunal de Justiça entende que: [...] 1. É assente nesta Corte Superior o entendimento de que a inversão do ônus da prova é regra de instrução e não de julgamento. 2. "A jurisprudência desta Corte Superior se posiciona no sentido de que a inversão do ônus da prova não dispensa a comprovação mínima, pela parte autora, dos fatos constitutivos do seu direito" [...][4]. Assim sendo, considerando a relação consumerista do caso em apreço, ratifico a inversão do ônus da prova outrora deferida, impondo a parte requerida comprovar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do(a) autor(a). Ressalto, todavia, que a inversão do ônus da prova em benefício do(a) consumidor(a) não o(a) isenta de comprovar minimamente os fatos constitutivos do seu direito. Destarte, fixo o seguinte ponto controvertido: a (i)licitude da conduta da requerida a ensejar a rescisão de contrato com restituição de crédito e indenização por danos morais. Saneado o feito, portanto. Superado tal prolegômenos, tratando-se de demanda cujas questões fáticas estão bem delineadas, resta evidente a inexistência de controvérsia sobre a matéria de fato e a desnecessidade de dilatação da instrução probatória, quando já há elementos suficientes, impondo-se ao julgador, como corolário lógico do princípio da duração razoável do processo, o dever de decidir diretamente a lide, nos termos dos arts. 4º, 6º e 355, I, do CPC. Passo, portanto, à análise da causa. Quanto ao consórcio, o art. 2º da Lei nº 11.795/2008 dispõe que: Art. 2º Consórcio é a reunião de pessoas naturais e jurídicas em grupo, com prazo de duração e número de cotas previamente determinados, promovida por administradora de consórcio, com a finalidade de propiciar a seus integrantes, de forma isonômica, a aquisição de bens ou serviços, por meio de autofinanciamento. No que tange à contemplação, por sua vez, os arts. 22 e 24 da referida lei asseguram que: Art. 22. A contemplação é a atribuição ao consorciado do crédito para a aquisição de bem ou serviço, bem como para a restituição das parcelas pagas, no caso dos consorciados excluídos, nos termos do art. 30. § 1º A contemplação ocorre por meio de sorteio ou de lance, na forma prevista no contrato de participação em grupo de consórcio, por adesão. § 2º Somente concorrerá à contemplação o consorciado ativo, de que trata o art. 21, e os excluídos, para efeito de restituição dos valores pagos, na forma do art. 30. Art. 24. O crédito a que faz jus o consorciado contemplado será o valor equivalente ao do bem ou serviço indicado no contrato, vigente na data da assembleia geral ordinária de contemplação. Ademais, é consabido que para se configurar o dever de indenizar, devem ser observados os pressupostos legais, quais sejam: a ação do agente (conduta), o resultado lesivo (dano) e o nexo causal entre o ato danoso e o resultado. Caso contrário, não haverá ato ilícito. Nesse contexto, a jurisprudência firmou entendimento no sentido de que haverá falha na prestação de serviço se contemplado o consórcio, mas não liberado o valor previsto na carta de crédito. A saber: APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE CONSÓRCIO DE AUTOMÓVEL - RECUSA INJUSTIFICADA NA LIBERAÇÃO DA CARTA DE CRÉDITO - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - DANOS MORAIS -. Nos casos de contemplação da apólice do consórcio, com o cumprimento dos requisitos pactuados é devida a concessão da carta de crédito. A negativa injustificada na liberação da carta de crédito caracteriza falha na prestação do serviço. A administradora do consórcio deve indenizar os danos morais decorrentes de conduta abusiva[5]. Por outro ângulo, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso ministra que: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE C/C REINTEGRAÇÃO DE COTA DE CONSÓRCIO E DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO APELO, POR AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE. REJEIÇÃO. CANCELAMENTO DE CONTRATO POR INADIMPLÊNCIA. NECESSIDADE DE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CANCELAMENTO AUTOMÁTICO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame: 1. Trata-se de apelação interposta por Rodobens Administradora de Consórcios Ltda. contra sentença que reintegrou a autora ao grupo de consórcio, condenando a empresa à restituição da carta de crédito e ao pagamento de indenização por danos morais, em razão do cancelamento unilateral do contrato de consórcio por inadimplência sem prévia notificação . II. Questão em discussão: 2. A controvérsia reside na necessidade de prévia notificação da consorciada inadimplente para constituição em mora e no cancelamento automático do contrato de consórcio em razão da inadimplência. III . Razões de decidir: 3. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que o simples inadimplemento não justifica o cancelamento automático do contrato, sendo imprescindível a prévia notificação do consorciado. A ausência de tal notificação configura prática abusiva. IV. Dispositivo e tese: 4. Recurso desprovido. Sentença mantida integralmente. Tese de julgamento: "É imprescindível a notificação prévia do consorciado para a constituição em mora, sendo vedado o cancelamento automático do contrato de consórcio por inadimplência." Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 85, § 11; STJ, AgInt no REsp n. 1.701 .213/MS[6]. Nessa hermenêutica, ainda: APELAÇÃO CÍVEL – CONTRATO DE CONSÓRCIO - SEGURO PRESTAMISTA - RELAÇÃO DE CONSUMO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS RÉS - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INADIMPLEMENTO DE PRESTAÇÕES - AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO - NÃO CONFIGURAÇÃO DA MORA - CLÁUSULAS LIMITADORAS EM EVIDÊNCIA - INDENIZAÇÃO DEVIDA DENTRO DOS LIMITES ESTIPULADOS - NEGATIVA DO PAGAMENTO INDENIZATÓRIO - DANO MORAL CONFIGURADO - RECURSOS DE APELAÇÃO DAS PARTES RÉS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. Consideram-se responsáveis solidárias as rés, notadamente quando participam da cadeia negocial existente para a captar o cliente, confeccionar e pactuar o contrato com o consumidor, bem como efetivar a cobrança para pagamento de eventual débito. 2 . Mostra-se abusiva a cláusula contratual que prevê a possibilidade de cancelamento automático do contrato de consórcio e, consequentemente, do seguro a ele vinculado, pela falta de pagamento, por ofensa ao disposto nos incisos IV e XI do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor. 3. O simples atraso no pagamento da prestação mensal, sem prévia constituição em mora do segurado, não produz o cancelamento automático ou a imediata suspensão do contrato de seguro firmado entre as partes, sendo necessária a prévia constituição do consorciado em mora, mediante interpelação. 4 . Em contrato de seguro, típico de adesão, as cláusulas limitadoras de direito devem ter o necessário destaque, de modo a permitir, de imediato, fácil compreensão. 5. Configura-se dano moral quando existente o ato ilícito, que corresponde à conduta abusiva das rés em não liberar o pagamento devido à esposa e herdeiros do de cujos, à época consorciado. 6 . A fixação do quantum indenizatório a título de danos morais deve sopesar os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, atentando-se ao grau de culpa do ofensor, extensão dos danos e capacidade econômica das partes, o caráter compensatório e punitivo da indenização[7] No que tange à rescisão e à desistência, o Superior Tribunal de Justiça consigna que: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA. CONSORCIADO. PARCELAS PAGAS. DEVOLUÇÃO. GRUPO. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, no caso de desistência do consórcio, a restituição dos valores pagos deve ocorrer em até 30 (trinta) dias após o encerramento do grupo do consórcio. Precedentes. 3. Agravo interno não provido[8]. Igualmente, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLAUSULA CONTRATUAL E RESSARCIMENTO DE CRÉDITO. CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA DO CONSORCIADO . DEVOLUÇÃO QUANTIAS PAGAS. ENCERRAMENTO DO GRUPO. RECURSO REPETITIVO STJ. TEMA 312 . AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. “[ .] 1. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLAUSULA CONTRATUAL E RESSARCIMENTO DE CRÉDITO. CONSÓRCIO . DESISTÊNCIA DO CONSORCIADO. DEVOLUÇÃO QUANTIAS PAGAS. ENCERRAMENTO DO GRUPO. RECURSO REPETITIVO STJ . TEMA 312. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO . “[.] 1. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLAUSULA CONTRATUAL E RESSARCIMENTO DE CRÉDITO . CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA DO CONSORCIADO. DEVOLUÇÃO QUANTIAS PAGAS. ENCERRAMENTO DO GRUPO . RECURSO REPETITIVO STJ. TEMA 312. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. SENTENÇA MANTIDA . RECURSO DESPROVIDO. “[.] 1. APELAÇÃO CÍVEL . AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLAUSULA CONTRATUAL E RESSARCIMENTO DE CRÉDITO. CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA DO CONSORCIADO. DEVOLUÇÃO QUANTIAS PAGAS . ENCERRAMENTO DO GRUPO. RECURSO REPETITIVO STJ. TEMA 312. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE . SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. “[...] 1. Para efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil: é devida a restituição de valores vertidos por consorciado desistente ao grupo de consórcio, mas não de imediato, e sim em até trinta dias a contar do prazo previsto contratualmente para o encerramento do plano. 2 . Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp n. 1.119 .300/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 14/4/2010, DJe de 27/8/2010.)[...]”[9]. No caso em apreço, a parte autora logrou demonstrar a existência da relação contratual com a requerida, bem como o pagamento do valor inicial e de prestações subsequentes, cuja ausência de reconhecimento por parte da administradora inviabilizou a participação em lance e a continuidade da relação contratual, o que, diante da controvérsia instaurada e da manifesta quebra da boa-fé objetiva, justifica a rescisão do contrato e a restituição dos valores pagos, observadas, no entanto, as cláusulas pactuadas e os limites contratuais aplicáveis, inclusive quanto à forma e momento da devolução, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acima colacionada. Nesse jaez: RECURSO INOMINADO – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – INOCORRÊNCIA - CONSÓRCIO – DESISTÊNCIA – DEVOLUÇÃO DE VALORES – DEDUÇÃO APENAS DA TAXA DE ADMINISTRAÇÃO – AFASTAMENTO NA ESPÉCIE DA REDUÇÃO DO FUNDO DE RESERVA E MULTA – SENTENÇA MANTIDA. Violação ao princípio da dialeticidade recursal inexistente na espécie, pois não houve reprodução da contestação, mas sim das matérias nelas contidas que justificariam, segundo a ótica da recorrente, o provimento do recurso interposto. O consorciado desistente do grupo, nos contratos celebrados após 06.02 .2009, não precisa esperar o encerramento deste para reaver as prestações pagas à administradora do consórcio, mas terá de aguardar a sua contemplação nos sorteios pelas assembleias mensais, conforme art. 30 c/c art. 24 da Lei 11.795/2008 . (Precedente TJMT TRU 120090231778/2011, VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Turma Recursal Única, Data do Julgamento 25/02/2011, Data da publicação no DJE 25/02/2011). Se o fundo de reserva foi realizado para garantia do grupo, não consigo vislumbrar aqui a demonstração do prejuízo do recorrente, a fim de que se possa imputar ao recorrido o pagamento em desconto desta parcela. Esse raciocínio deve ser também aplicado à multa de que se queixa o recorrente, uma vez que essa penalidade fica condicionada à comprovação de que a desistência trouxe efetivo prejuízo. No tocante a aplicação de correção monetária e juros de mora sobre dos valores pagos, deve incidir a partir do trigésimo primeiro dia após encerramento do grupo consorcial[10]. Por outro lado, quanto ao pleito de indenização por danos morais, a narrativa dos autos não evidencia situação excepcional apta a ultrapassar o mero dissabor ou aborrecimento decorrente do inadimplemento contratual. Em relação ao dano moral, a jurisprudência: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE QUANTIA PAGA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CONSÓRCIO – DESISTÊNCIA DO CONSUMIDOR – INSURGÊNCIA QUANTO AO DANO MORAL – NÃO COMPROVAÇÃO – MERO DISSABOR – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Nos termos da jurisprudência do STJ, “o simples descumprimento contratual, por si, não é capaz de gerar danos morais, sendo necessária a existência de uma consequência fática capaz de acarretar dor e sofrimento indenizável pela sua gravidade” (STJ - AREsp: 2459234, Relator.: MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Publicação: 13/03/2024)[11]. Assim sendo, ausente prova de abalo à esfera anímica da autora ou de conduta gravosa da requerida, incabível a reparação por dano moral. Dessa forma, a autora faz jus tão somente à rescisão contratual e ao ressarcimento dos valores pagos, nos termos contratuais. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido da autora Waleria da Silva Lima, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para determinar a rescisão contratual e, por conseguinte, o ressarcimento dos valores pagos, corrigidos monetariamente pelo índice previsto no contrato ou, se não houver, pelo IGP-M/FGV - Índice Geral de Preços para o Mercado da Fundação Getúlio Vargas[12], a partir de cada parcela (desembolso)[13], nos termos da Súmula nº 35 do STJ[14], acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação (art. 405 do CC), nos moldes dos pedidos da exordial (ID 87382753). Condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais e da taxa judiciária (art. 84 do CPC), bem como dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC). Certificado o trânsito em julgado, arquive-se. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Raíza Vitória de Castro Rego Bastos Gonzaga Juíza de Direito Designada para o NAE [1] STJ - AgInt no REsp: 1945645 RS 2021/0195910-5, Relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 29/11/2021, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/12/2021. [2] TJ-MT 10163413820228110000 MT, Relator: CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Data de Julgamento: 28/09/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/10/2022. [3] STJ - AREsp: 2233056, Relator: MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Publicação: 10/03/2023. [4] STJ - AgInt no AREsp: 1951076 ES 2021/0242034-2, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 21/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/02/2022. [5] TJ-MG - AC: 10000210476099001 MG, Relator.: Marco Aurélio Ferrara Marcolino (JD Convocado), Data de Julgamento: 01/07/2021, Câmaras Cíveis / 15ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/07/2021. [6] TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10194125120248110041, Relator.: MARCIO VIDAL, Data de Julgamento: 22/10/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/10/2024. [7] TJ-MT 10028842020198110007 MT, Relator.: SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Data de Julgamento: 23/02/2021, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/02/2021. [8] STJ - AgInt no REsp: 1967853 DF 2021/0327675-6, Data de Julgamento: 29/08/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/08/2022. [9] TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1008963-27.2019.8 .11.0003, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 05/12/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/12/2023. [10] TJ-MT - RI: 10029908620228110003, Relator.: ANTONIO HORACIO DA SILVA NETO, Data de Julgamento: 21/09/2023, Segunda Turma Recursal, Data de Publicação: 22/09/2023. [11] TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1038556-50.2020 .8.11.0041, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 05/06/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/06/2024. [12] [...] "A jurisprudência desta Corte possui entendimento no sentido que a atualização monetária das parcelas a serem restituídas deve ser realizada com base em índice que melhor reflita a desvalorização da moeda, o que não corresponde à variação do valor do bem objeto do consórcio" ( AgInt no AREsp 1.069.111/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 30/03/2020, DJe de 1º/04/2020). [...] (STJ - AgInt no AREsp: 2091407 PE 2022/0078979-4, Data de Julgamento: 23/08/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/09/2022) [13] Apelação – Ação revisional de contrato com restituição de valores - Consórcio – Desistência do consorciado – Procedência parcial – Insurgência do autor em relação à correção monetária e juros de mora - Correção monetária que deve ser aplicada a partir de cada desembolso, de acordo com a Súmula 35 do C. STJ – Juros de mora exigíveis somente a partir do término do prazo previsto no contrato, após o encerramento do grupo, para restituição das parcelas pagas – Recurso provido do autor. (TJ-SP - Apelação Cível: 10110584020248260196 Franca, Relator.: Thiago de Siqueira, Data de Julgamento: 27/09/2024, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/09/2024). [14] SÚMUIA nº 35 Incide correção monetária sobre as prestações pagas, quando de sua restituição, em virtude da retirada ou exclusão do participante de plano de consórcio.

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Matheus Fernando Pilatti e outros x Banco Bradesco S.A.

ID: 309969982

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE Classe: EMBARGOS à EXECUçãO Nº Processo: 1018088-80.2023.8.11.0002

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

MATHEUS FERNANDO PILATTI RODOMIG COMERCIO E RECUPERADORA DE CARRETAS EIRELI

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S.A.

Sentença

Advogados:

FREDERICO DUNICE PEREIRA BRITO

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KLEBER ROUGLAS DE MELLO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo n.º 1018088-80.2023.8.11.0002. Trata-se de Embargos à Execução formulados por Rodomig … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo n.º 1018088-80.2023.8.11.0002. Trata-se de Embargos à Execução formulados por Rodomig Comércio e Recuperadora de Carretas EIRELI, incidentalmente à demanda executiva proposta por Banco Bradesco S/A, em que defendeu a aplicabilidade das regras previstas no Código de Defesa do Consumidor. Asseverou que, de fato, celebrou contrato bancário com a companhia embargada e que o negócio jurídico preconiza a incidência ilegal e abusiva da capitalização diária de juros remuneratórios e a utilização do sistema Price de contagem de juros. Defendeu a ilegalidade da cobrança da taxa de abertura e emissão de contrato, da multa contratual e dos juros de mora. Asseverou que a cobrança de encargos ilegais rechaça a mora contratual. Requereu, por fim, a procedência do pedido, para a finalidade de declarar a nulidade e a abusividade das cláusulas contratuais que preveem: a) a capitalização diária de juros remuneratórios; b) a utilização da tabela Price; c) a cobrança da taxa de abertura e emissão de contrato; d) a incidência da multa contratual; e) a forma de cobrança dos juros moratórios. Postulou, também, a condenação da embargada no pagamento de indenização, por repetição do indébito. Foi proferida decisão judicial, que recebeu os embargos à execução e ordenou a intimação da embargada para apresentar impugnação. A companhia embargada apresentou defesa, momento em que asseverou que subsiste entre as partes contrato válido e regularmente celebrado e que a cobrança é regular. Defendeu a regularidade da cobrança dos encargos do contrato. Pugnou, ao final, pela improcedência do pedido. Houve réplica, oportunidade em que a embargante, reprisando os argumentos tecidos por ocasião da petição inicial, rechaçou as proposições apresentadas pela defesa. Vieram os autos conclusos para deliberação. É o relatório. Passo a decidir. Primeiramente, impende acentuar, desde logo, que se afigura absolutamente desnecessária a realização de perícia técnica na situação hipotética ‘sub judice’, porquanto que não se revela imprescindível, para efeito de equacionamento/resolução do litígio, haja vista que a dissolução das matérias/pontos controvertidos (a existência de cobrança de encargos ilegais e abusivos) não depende de conhecimento especial técnico [art. 420, parágrafo único, inciso I do Código de Processo Civil] e envolve, neste tópico específico, em caráter de exclusividade e de maneira cumulativa, o exame de cláusulas contratuais e a abordagem de questões de direito — com a consequência de que a prova pericial não ganha qualquer relevância prática e representa inútil e desnecessária tentativa de coleta de prova. Logo, à luz de tais balizamentos, procedo ao julgamento antecipado da lide, na forma do que preconiza o comando previsto no art. 355, inciso I do Código de Processo Civil. Não subsistem questões preliminares pendentes que exijam exame e, conforme se depreende da análise do processo, os ditames processuais foram observados, não existindo quaisquer nulidades/vícios processuais a serem decretadas. Destarte, enfrentados estes temas e superada a etapa de realização do exame dos requisitos de admissibilidade da lide (condições da ação e pressupostos processuais), passo a análise da questão de fundo da demanda. 1. Da Possibilidade de Revisão do Contrato Bancário. Com efeito, a sujeição ao efeito vinculante/obrigatório dos contratos (princípio ‘pacta sunt servanda’ — ideia-valor que rege/dirige as relações de direito privado e que prevê a obrigatoriedade de dar-se cumprimento às disposições do contrato) condiciona-se à manutenção e o respeito a função social do contrato e a reverência à normas de ordem/interesse público [art. 421 ‘caput’ e parágrafo único e art. 2.035, parágrafo único, ambos do Código Civil]. A revisão do contrato, portanto, caracteriza regra/fórmula de exceção [art. 421, parágrafo único, e art. 421-A, inciso III, ambos do Código Civil] e apenas se justifica diante da incidência de cláusulas abusivas ou ilegais, representativas da ocorrência de excessiva margem de lucro (dinamizadora de enriquecimento ilícito e que coloca o consumidor em desvantagem exagerada), da configuração de desequilíbrio contratual, da não-observância da boa-fé objetiva ou devido a ocorrência de circunstância superveniente que acarrete onerosidade excessiva — de acordo com os preceitos da teoria da onerosidade excessiva e quebra da base objetiva do negócio jurídico, previstas no art. 6.º, inciso V e no art. 51, inciso IV e § 1.º, ambos da Lei n.º 8.078/1990 e no art. 479 e no art. 480, ambos do Código Civil. Com base nessas considerações, como forma de dar concretude à aplicação dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, conclui-se, conclui-se, por inferência racional, que, diante das circunstâncias da hipótese/caso concreto, é possível mitigar-se e relativizar o efeito obrigatório dos contratos, a ponto de permitir a revisão contratual. Impende enfatizar, por oportuno, que esse entendimento tem prevalecido em sucessivos julgamentos proferidos pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ATO JURÍDICO PERFEITO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. MITIGAÇÃO. TABELA PRICE. LEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A matéria do art. 6º, caput e § 1º, da LICC, possui índole constitucional, motivo pelo qual é vedada sua análise em sede de recurso especial. Precedentes. 2. É permitida a revisão das cláusulas contratuais pactuadas, diante do fato de que o princípio do pacta sunt servanda vem sofrendo mitigações, mormente ante os princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual. 3. Já tendo sido reconhecida pelo Tribunal de origem a legalidade da utilização do sistema Price, não há que se falar em interesse de agir quanto a este ponto. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ, AgRg no AREsp n.º 649.895/MS, 4.ª Turma, Rel.: Ministro Raul Araújo, julgado em 05/05/2015) — com destaques não inseridos no texto original. “CONTRATOS E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. CDC. POSSIBILIDADE MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. LEASING. DEVOLUÇÃO DO BEM ARRENDADO. RESTITUIÇÃO DO VRG PAGO ANTECIPADAMENTE. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÕES RECURSAIS DESASSOCIADAS DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 284/STF. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência do STJ se posiciona firme no sentido que a revisão das cláusulas contratuais pelo Poder Judiciário é permitida, mormente diante dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, devendo ser mitigada a força exorbitante que se atribuía ao princípio do pacta sunt servanda. Precedentes. 2. Com a resolução do contrato de arrendamento mercantil por inadimplemento do arrendatário e a consequente reintegração do bem na posse da arrendadora, faz-se devido o cumprimento das parcelas vencidas e em aberto até a retomada do bem pelo arrendatário, ressalvando seu direito quanto à devolução ou compensação em seu favor dos valores pagos antecipadamente a título de VRG. A diluição do valor residual ao longo do prazo contratual, cuja cobrança é feita juntamente com as parcelas das contraprestações, não impede que o arrendatário, por sua livre opção e interesse, desista da compra do bem objeto do contrato de leasing. Retomada a posse direta do bem pela arrendadora, extingue-se a possibilidade de o arrendatário exercer a opção da compra; por conseguinte, o valor residual, que antecipadamente vinha sendo pago para essa finalidade, deve ser devolvido. Precedentes. 3. A alegação de que o acórdão recorrido procedera à alteração no indexador pactuado no contrato de arrendamento mercantil mostra-se completamente desassociada das questões tratadas e decididas pelo acórdão, caracterizando fundamentação deficiente e, por conseguinte, óbice à exata compreensão da controvérsia, o que atrai, de forma inexorável, a dicção da Súmula 284/STF. 5. É pacífico no STJ o entendimento segundo o qual a verificação do grau de sucumbência de cada parte, para fins de aplicação da norma contida no parágrafo único do art. 21 do CPC, enseja incursão à seara fático-probatória dos autos, vedada pela Súmula 7 desta Corte. 6. Agravo regimental não provido” (STJ, AgRg no Ag n.º 1.383.974/SC, 4.ª Turma, Rel.: Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 13/12/2011) — com destaques não inseridos no texto original. 2. Da Capitalização dos Juros Remuneratórios. Deveras, a cobrança de juros remuneratórios, capitalizados em periodicidade mensal, em contrato bancário, é permitida, desde que, expressa e claramente, pactuada/ajustada no contrato [Súmula n.º 539 do Superior Tribunal de Justiça]. A previsão, no contrato, de taxa anual de juros que excede o duodécuplo da taxa mensal configura elemento/fator suficiente, para o efeito de permitir a cobrança da taxa efetiva anual [Súmula n.º 541 do Superior Tribunal de Justiça]. A legalidade/validade da capitalização de juros remuneratórios, em periodicidade inferior à anual, compreende, também, a possibilidade de capitalização diária de juros. Mas, para além disso, cumpre sublinhar, neste tópico, que para evitar/coibir o desequilíbrio contratual, concretizar a aplicação do princípio da transparência e da boa-fé [art. 4.º ‘caput’ e inciso IV da Lei n.º 8.078/1990 e do art. 422 do Código Civil] e do dever de informação [art. 6.º, inciso III e art. 46, todos da Lei n.º 8.078/1990], e, observada a hipossuficiência do consumidor, configura direito subjetivo do consumidor/mutuário ter acesso à informação, de forma clara e detalhada, acerca do efetivo percentual da taxa de juros cobrada (na periodicidade anual, mensal e diária), visto que se trata de encargo que produz incremento substancial na evolução da dívida. Cumpre relembrar, por oportuno, que o Colendo Superior Tribunal de Justiça reafirmou essa diretriz jurisprudencial, em sucessivos e diversos julgamentos, valendo referir, por ser expressiva dessa orientação, a decisão consubstanciada em acórdãos, assim ementados: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS. TAXA DIÁRIA. DEVER DE INFORMAÇÃO. PRECEDENTE DA SEGUNDA SEÇÃO DO STJ. 1. De acordo com entendimento firmado na Segunda Seção do STJ, a capitalização diária dos juros somente pode ser cobrada quando, além de estar prevista expressamente em cláusula contratual, o contrato contenha indicação da taxa diária de juros. 2. ‘Insuficiência da informação acerca das taxas efetivas mensal e anual, na hipótese em que pactuada capitalização diária, sendo imprescindível, também, informação acerca da taxa diária de juros, a fim de se garantir ao consumidor a possibilidade de controle 'a priori' do alcance dos encargos do contrato. Julgado específico da Terceira Turma’. ‘Na espécie, abusividade parcial da cláusula contratual na parte em que, apesar de pactuar as taxas efetivas anual e mensal, que ficam mantidas, conforme decidido pelo acórdão recorrido, não dispôs acerca da taxa diária.’ (REsp 1826463/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/10/2020, DJe 29/10/2020). 3. De acordo com firme posicionamento desta Corte, abuso nos encargos da normalidade descaracteriza a mora. 4. Agravo interno não provido” (STJ, AgInt no REsp n.º 1.914.532/RS, 4.ª Turma, Rel.: Min. Luis Felipe Salomão, j. em 14/12/2021) — com destaques não inseridos no texto original. “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. (EN. 3/STJ). CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXA DIÁRIA NÃO INFORMADA. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. ABUSIVIDADE. 1. Controvérsia acerca do cumprimento de dever de informação na hipótese em que pactuada capitalização diária de juros em contrato bancário. 2. Necessidade de fornecimento, pela instituição financeira, de informações claras ao consumidor acerca da periodicidade da capitalização dos juros adotada no contrato, e das respectivas taxas. 3. Insuficiência da informação acerca das taxas efetivas mensal e anual, na hipótese em que pactuada capitalização diária, sendo imprescindível, também, informação acerca da taxa diária de juros, a fim de se garantir ao consumidor a possibilidade de controle 'a priori' do alcance dos encargos do contrato. Julgado específico da Terceira Turma. 4. Na espécie, abusividade parcial da cláusula contratual na parte em que, apesar de pactuar as taxas efetivas anual e mensal, que ficam mantidas, conforme decidido pelo acórdão recorrido, não dispôs acerca da taxa diária. 5. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO, COM MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS” (STJ, REsp n.º 1.826.463/SC, 2.ª Seção, Rel.: Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 14/10/2020) — com destaques não inseridos no texto original. Ou seja: não basta, para legitimar/validar a capitalização diária dos juros, que, no contrato de financiamento, conste a possibilidade de incidência da capitalização diária, há a necessidade de indicação da taxa cobrada. Pois bem. Do confronto/cotejo analítico do contingente probatório produzido no processo, principalmente do teor dos documentos arquivados nos eventos n.º 120315626 e 120318248, depreende-se que as partes litigantes celebraram dois contratos bancários (cédula de crédito bancário n.º 15.188.033, na data de 18/10/2021, e a cédula de crédito bancário n.º 15.326.732, no dia 17/12/2021), em que se definiu taxa de juros remuneratórios no patamar de 1,53% ao mês e 20,08% ao ano e 1,70% ao mês e 22,41% ao ano, respectivamente para cada uma, e, também, para os dois contratos bancários, a ultimação de capitalização diária de juros compensatórios (item II-5 e cláusula 2.1 de ambos os contratos), sem que, todavia, também se registrasse o percentual de incidência da taxa diária de juros. O contrato bancário, celebrado entre as partes, embora tenha registrado a incidência de juros diários, capitalizados mensalmente, deixou de indicar a taxa efetiva diária e/ou mensal de juros — o que se desvela como prática ilegal e abusiva, pois vulnera o dever de informação. Portanto, diante desta moldura, a capitalização dos juros remuneratórios deve se efetivar de forma mensal. 3. Da Utilização do Sistema Price de Amortização de Juros. A metodologia de amortização de juros, consolidado no sistema Price (sistema francês de amortização), caracteriza-se por meio da utilização de regime de juros compostos, para a finalidade de calcular o valor individualizado de cada parcela, diferida no tempo, de um contrato de empréstimo/mútuo, que se constitui, como regra geral, na formação dos juros, que integram as prestações, em uma progressão geométrica decrescente, na exata medida em que, enquanto a proporção de juros, embutida em cada uma das prestações, reduz-se, a parcela de amortização do valor principal cresce exponencialmente, mantendo-se as prestações, durante a normalidade contratual, em idêntico valor. O emprego da Tabela Price, no âmbito do contrato de empréstimo/mútuo, por via de consequência, exatamente porque limita-se a utilizar regime de juros compostos, não traduz situação de ilegalidade — exceto se, de maneira comprovada, ocorrer amortização negativa do débito. Com o intuito de corroborar com tais assertivas, a título de ilustração, lanço mão do seguinte acórdão paradigma, colhido do acervo de jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que versa sobre questão que guarda relação de similitude com a que se encontra sob enfoque: “(…) 2. A mera utilização da Tabela Price não basta para se comprovar a existência de capitalização ilegal de juros. (…)” (STJ, AgRg no Ag n.º 1.425.074/DF, 4.ª Turma, Relator: Ministra Maria Isabel Gallotti, julgado em 04/10/2012). Consequentemente, diante deste cenário, tomando-se em consideração que não subsiste evidência, baseada em informação concreta e objetiva, que demonstre a ocorrência de amortização negativa do débito, penso que a adoção do sistema Price de amortização de juros não se mostra ilegal. 4. Da Cobrança de Taxas e Tarifas Bancárias. Com efeito, fruto da competência/atribuição outorgada ao Conselho Monetário Nacional, para efeito de disciplinar as operações de concessão do crédito, limitar as taxas de juros, descontos, comissões e quaisquer outras formas de remuneração de operações e serviços bancários e financeiros [art. 4.º, incisos VI e IX e art. 9.º, ambos da Lei n.º 4.595/1964], deflui-se que a cobrança de taxas e tarifas, derivada da prestação, por parte de instituições financeiras, de serviços, revela-se, como regra/fórmula geral, legal — desde que a cobrança encontre lastro em norma regulamentar, editada pela autoridade monetária, que permita/autorize a realização da exigência do encargo e, ao mesmo tempo, decorra da pré-existência de previsão expressa no âmbito do contrato —, com a consequência de que a decretação de abusividade/invalidade da cobrança somente tem lugar diante de demonstração, de maneira objetiva e não-questionável, de ocorrência de vantagem exagerada e que acarrete excessiva margem de lucro e desequilíbrio contratual [cf.: STJ, AgRg no REsp n.º 1.302.236/RS, 3.ª Turma, Rel.: Min. Sidnei Beneti, j. em 27/03/2012; STJ, AgRg no REsp n.º 1.003.911/RS, 4.ª Turma, Rel.: Min. João Otávio de Noronha, j. em 04/02/2010; STJ, AgRg no REsp n.º 1.295.860/RS, 4.ª Turma, Rel.: Min. Luis Felipe Salomão, j. em 15/05/2012]. A tarifa de confecção/elaboração de cadastro e de abertura de crédito (ou outra denominação utilizada para fins de remunerar o mesmo fato gerador) caracteriza-se como um valor cobrado em contrato de mútuo/financiamento, que objetiva cobrir custos administrativos relativos à análise de crédito e à formalização do contrato. Conforme expressivo/significativo entendimento consolidado acerca do tema no âmbito da jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, tem-se que, com o advento da vigência da Resolução n.º 3.518/2007 CMN, a cobrança por serviços bancários está limitada às hipóteses previstas, de maneira taxativa, em norma regulamentadora editada pela autoridade monetária, exclusivamente, não subsistindo, a partir de então, lastro legal-normativo, que justifique a cobrança da tarifa de abertura de crédito (TAC) ou qualquer outra com outra denominação e que contenha o mesmo “fato gerador”. O conteúdo da tese firmada no enunciado da Súmula n.º 565 do STJ traduz essa orientação, e registra que: “a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, é válida apenas nos contratos bancários anteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008”. Por via de consequência, diante desta moldura, tomando-se em consideração que o contrato de financiamento, firmado entre as partes, se consumou em momento posterior à vigência da Resolução n.º 3.518/2007 CMN, conclui-se, por força de proposição lógica, que a incidência da taxa exprime situação de abusividade/ilegalidade. 5. Da Multa Contratual. A multa moratória caracteriza-se como penalidade, pelo não-cumprimento da obrigação. É, efetivamente, uma cláusula penal que incide quando subsiste a mora contratual, que objetiva desestimular o inadimplemento do contrato [art. 408 do Código Civil] e, quando decorre não-cumprimento de contrato que abrange relação de consumo, deve, necessariamente, encontrar-se limitada ao percentual de 2% do valor da prestação devida [art. 52, § 1.º da Lei n.º 8.078/1990]. A interpretação da cláusula de impontualidade deve ser concretizar no sentido de que a multa moratória deve incidir sobre o valor da prestação inadimplida e, portanto, sobre o montante-total devido histórico, pois “a multa de mora é admitida no percentual de 2% sobre o valor da quantia inadimplida, nos termos do artigo 52, § 1º, do CDC” [STJ, AgRg no Ag n.º 1.028.568/RS, 4.ª Turma, Rel.: Min. João Otávio de Noronha, j. em 27/4/2010]. Compulsando o contingente probatório produzido no processo, principalmente do conteúdo dos documentos arquivados nos eventos n.º 120315626 e 120318248, verifica-se que, no âmbito dos dois contratos de financiamento, firmados entre as partes litigantes, a multa moratória foi fixada no patamar de 2% incidente sobre o total devido (cláusula 5.1, item a.3 dos dois contratos). Por via de consequência, nesse influxo de ideias, considerando-se que o percentual de incidência e a base de cálculo da multa contratual, na situação concreta, está em convergência e conformidade com o texto legal, conclui-se que não há nulidade da cobrança. 6. Dos Juros de Mora. Os juros moratórios se configuram como fator de compensação/ressarcimento, imputado ao devedor, derivado do descumprimento da obrigação, e podem ser convencionados nos contratos bancários, não abrangidos/regulados por norma específica, até o limite de 1% ao mês, desde que devidamente pactuados no contrato. Interpretação que resulta da exegese do art. 406 do Código Civil e do art. 161, § 1.º da Lei n.º 5.172/1966. Cabe registrar, por ser expressiva desse entendimento, a compreensão do tema consubstanciada através do enunciado da Súmula n.º 379 do Superior Tribunal de Justiça, que registra, de forma taxativa, que: “Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês”. Pois bem. Do confronto/cotejo analítico do contingente probatório produzido no processo, principalmente do teor dos documentos arquivados nos eventos n.º 120315626 e 120318248, depreende-se que os contratos bancários celebrados entre as partes litigantes não registram previsão da cobrança de juros de mora em percentual acima do limite de 1% ao mês. Inviável, por conseguinte, a procedência da pretensão declaratória de nulidade da cobrança, neste tópico. 7. Da Mora Contratual. Com efeito, levando-se por linha de estima que o inadimplemento do contrato pressupõe a incidência de fato ou omissão imputável ao devedor [art. 396 do Código Civil de 2002], deflui-se, por força de proposição lógica, que a cobrança de encargos abusivos, durante o período de normalidade do contrato, se interpõe como fator/elemento que descaracteriza a mora contratual do devedor [cf.: STJ, REsp n.º 1.061.530/RS, 2.ª Seção, Rel.: Min. Nancy Andrihi, j. 22/10/2008]. Nesta toada, de acordo com este panorama, dado o reconhecimento da ilegalidade/abusividade da forma de cobrança dos juros remuneratórios (tipo de obrigação que revela a natureza de encargo que incide durante o período de normalidade do contrato), depreende-se que a descaracterização da mora contratual do devedor, desponta como medida inquestionável. 8. Da Repetição do Indébito. Dado à vedação ao enriquecimento ilícito, àquele indivíduo, que foi submetido à cobrança indevida de valores, exceto na situação de engano justificável, desperta o direito de auferir o ressarcimento do valor correspondente ao dobro da quantia que efetivamente quitou, de maneira indevida, independentemente da prova do erro [art. 42, parágrafo único da Lei n.º 8.078/1990; art. 876 do Código Civil; Súmula n.º 322 do STJ]. Por via de consequência, nesse influxo de ideias, partindo do pressuposto de que a cobrança da tarifa bancária e da capitalização diária dos juros remuneratórios se consolida como postura indevida e que caracterizou a realização de pagamento indevido, executado pela embargante, e principalmente porque o tema configura-se como matéria/assunto consolidada no âmbito da jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (o quê desvela a má-fé da instituição financeira requerida, que efetivou a cobrança do encargo de maneira ilegal), penso que a repetição do indébito em dobro em prol do autor, é medida que se impõe. Todavia, afigura-se necessário assinalar, neste ponto, por conveniente, que, não obstante a repetição do indébito desponte como consequência lógica da revisão do contrato bancário e imponha, àquele que recebeu, de maneira indevida, valores, o dever de restituir, não se pode olvidar que, logo em seguida à apuração contábil dos débitos e créditos, como forma de dar-se vazão ao comando normativo do art. 368 e art. 369, ambos do Código Civil e prestar-se reverência ao princípio da efetividade da prestação jurisdicional [art. 4.º do Código de Processo Civil], dado à homogeneidade/fungibilidade das obrigações jurídicas e à reciprocidade das dívidas, deve-se concretizar a compensação dos valores identificados [cf.: STJ, AgRg no EDcl no EDcl no REsp n.º 706.127/RS, 4.ª Turma, Rel.: Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 24/05/2011; STJ, AgRg no Agravo de Instrumento n.º 1.028.568/RS, 4.ª Turma, Rel.: Ministro João Otávio de Noronha, j. em 27/004/2010]. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado, na petição inicial dos embargos à execução, por Rodomig Comércio e Recuperadora de Carretas EIRELI, incidentalmente à demanda executiva proposta por Banco Bradesco S/A, para a finalidade de: a) Decretar a nulidade das cláusulas contratuais, previstas nos contratos bancários n.º 15.188.033 e 15.326.732, e que preconizam: a.1) a capitalização dos juros remuneratórios em periodicidade inferior a um mês; a.2) a cobrança da tarifa/taxa de abertura de crédito; b) Determinar que a capitalização dos juros, no âmbito do contrato bancário, firmado entre as partes, se operacionalize mês a mês; c) Reconhecer a descaracterização da mora do devedor e Determinar que os encargos inerentes à inadimplência contratual somente incidam até a determinação exata da quantificação correta da totalidade da dívida, em conformidade com os parâmetros definidos nesta sentença, e a comprovação da mora posterior; d) Condenar a companhia embargada, no pagamento de indenização, por repetição do indébito, no valor equivalente ao dobro da quantia que a embargante efetivamente quitou, fruto da cobrança indevida da taxa de abertura de crédito e da capitalização diária dos juros remuneratórios, no âmbito dos contratos de mútuo n.º 15.188.033 e 15.326.732, ressalvado o direito à compensação, e, como corolário natural, Determinar a realização de cálculo contábil da dívida, a ser devidamente quantificado em sede de liquidação de sentença, por arbitramento [art. 509, inciso I do Código de Processo Civil], consoante as diretrizes anteriormente difundidas e as demais condições contratuais que restaram incólumes; e) Indeferir os demais requerimentos; f) Declarar encerrada a atividade cognitiva, resolvendo-se o mérito do feito, com supedâneo no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil. Pelo princípio da sucumbência, dado à sucumbência parcial [art. 86 do Código de Processo Civil], deverá arcar, a embargante, com 30% das custas processuais e a empresa embargada com os demais 70% remanescentes. Com espeque no conteúdo do art. 85, § 2.º do Código de Processo Civil, Condeno a embargante, no pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, fixados no percentual de 10% do valor atualizado atribuído à causa e, também, a empresa embargada no pagamento de honorários de advogado, arbitrados na proporção de 15% do valor atualizado atribuído à causa, considerando-se a natureza da demanda, o trabalho desenvolvido por parte dos advogados e o lapso de tempo em que o processo tramitou, vedada a possibilidade de compensação [art. 85, § 14.º do Código de Processo Civil]. Preclusa a presente decisão, Determino que seja trasladada cópia integral do presente veredicto à ação executiva n.º 1034793-90.2022.8.11.0002. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Sinop/MT, em 26 de junho de 2025. Cristiano dos Santos Fialho, Juiz de Direito em cooperação, designado pela Portaria TJMT/PRES n.º 866/2025.

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Resultados para "1036733-90.2022.8.11.0002" – Página 3 de 3

Antonio De Oliveira Costa x Municipio De Varzea Grande

Processo nº 1007852-49.2023.8.11.0041

Processo nº 1007852-49.2023.8.11.0041

Processo nº 1001863-62.2023.8.11.0041

Processo nº 1001863-62.2023.8.11.0041

Processo nº 1000940-90.2022.8.11.0002

Processo nº 1000940-90.2022.8.11.0002

Luciano Costa Brasil x Banco Bmg S.A.

Waleria Da Silva Lima x Reserva Administradora De Consórcio Ltda - Epp

Matheus Fernando Pilatti e outros x Banco Bradesco S.A.