Processo nº 1000717-04.2023.8.11.0035
ID: 330747222
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1000717-04.2023.8.11.0035
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LUCAS LAIRE FARIA ALMEIDA
OAB/MG XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000717-04.2023.8.11.0035 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000717-04.2023.8.11.0035 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES Turma Julgadora: [DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), VLADIMILLE PESSAMILIO DA SILVA - CPF: 048.812.316-00 (APELANTE), LUCAS LAIRE FARIA ALMEIDA - CPF: 052.359.766-57 (ADVOGADO), MARCIO FAGNER FERNANDES TORRES - CPF: 075.394.164-32 (TERCEIRO INTERESSADO), DANIELA RODRIGUES FERNANDES - CPF: 092.712.246-47 (TERCEIRO INTERESSADO), ISADORA SANTOS PASSOS - CPF: 065.544.354-17 (TERCEIRO INTERESSADO), COLETIVIDADE (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A Ementa. Direito penal. Apelação criminal. Tráfico de drogas interestadual. Princípio da identidade física do juiz. Preliminar rejeitada. Reconhecimento da atenuante inominada. Afastamento da interestadual idade. Aplicação da fração máxima do tráfico privilegiado. Detração. Substituição da pena por restritiva de direitos. Impossibilidade. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Apelação criminal interposta contra sentença proferida nos autos da Ação Penal n. 1000717-04.2023.8.11.0035, que condenou o réu pela prática do crime de tráfico de drogas interestadual, tipificado no art. 33, caput, c/c art. 40, V, da Lei n. 11.343/2006, à pena de 4 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 485 dias-multa. A defesa alegou, preliminarmente, nulidade da sentença por violação ao princípio da identidade física do juiz. No mérito, pleiteou: (i) o reconhecimento da atenuante genérica do art. 66 do Código Penal; (ii) o afastamento da causa de aumento do tráfico interestadual; (iii) a aplicação da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas em sua fração máxima; (iv) a realização de detração penal; e (v) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. II. Questões em discussão 2. Há cinco questões em discussão: (i) definir se a substituição do magistrado sentenciante viola o princípio da identidade física do juiz; (ii) verificar se a confissão do réu enseja o reconhecimento da atenuante genérica do art. 66 do Código Penal; (iii) estabelecer se é cabível o afastamento da causa de aumento de pena do art. 40, V, da Lei n. 11.343/2006; (iv) determinar se a fração de 1/6 aplicada à causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 é proporcional; e (v) examinar a possibilidade de aplicação da detração penal e de substituição da pena por restritiva de direitos. III. Razões de decidir 3. A substituição do magistrado que presidiu a instrução decorreu de remoção regularmente publicada, afasta a nulidade por violação ao princípio da identidade física do juiz, conforme jurisprudência do STJ. 4. A alegação de dependência química como motivação para o crime não foi confirmada pelos autos, tampouco pelo interrogatório do réu, não se configurando qualquer hipótese de aplicação da atenuante inominada do art. 66 do Código Penal. 5. A majorante do tráfico interestadual incide mesmo sem a efetiva transposição de fronteiras, sendo suficiente a demonstração da destinação interestadual da droga, como evidenciado pelas provas dos autos. 6. A aplicação da fração de 1/6 para a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas encontra amparo na expressiva quantidade de droga apreendida (5,343 kg de cocaína), sendo adequada e proporcional. 7. A detração penal deve ser realizada na fase de execução, conforme entendimento jurisprudencial e previsão normativa (LEP, art. 66, III, c), não cabendo sua análise na fase de conhecimento, ressalvados os casos em que a detração influencie diretamente no regime inicial de cumprimento de pena. 8. A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não é cabível diante do quantum fixado, conforme critérios legais. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “A substituição do juiz instrutor por remoção não acarreta nulidade da sentença. A atenuante genérica do art. 66 do Código Penal exige comprovação de circunstância relevante não inerente ao tipo penal. A causa de aumento do art. 40, V, da Lei de Drogas incide com a comprovação da destinação interestadual do entorpecente. A fração de 1/6 para a causa de diminuição do tráfico privilegiado é proporcional à quantidade de droga apreendida. A detração penal deve ser analisada pelo juízo da execução quando não implicar em alteração do regime inicial de cumprimento de pena. A substituição da pena por restritiva de direitos somente pode ocorrer quando preenchidos todos os requisitos do art. 44 do Código Penal.” _____________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LXXVIII; CP, arts. 66, 68; CPP, arts. 132 e 399, § 2º; LEP, art. 66, III, c; Lei n. 11.343/2006, arts. 33, caput e § 4º, e 40, V. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, AgRg no AREsp 1.920.189/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 20.02.2024; STJ, AgRg no REsp 1.780.918/RO, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, j. 12.03.2019; Súmula n. 231/STJ; Súmula n. 587/STJ. R E L A T Ó R I O Ilustres componentes da Terceira Câmara Criminal: Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por Vladimille Pessamilio da Silva contra a sentença condenatória prolatada nos autos da Ação Penal n. 1000717-04.2023.8.11.0035, que tramitou perante o Juízo da Vara Única da Comarca de Alto Garças/MT, condenando-o pela prática do crime de tráfico de drogas majorado pela prática entre Estados da Federação (art. 33, caput, c/c art. 40, V, da Lei n. 11.343/06), à pena de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, fixados na fração de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. O apelante, forte nas razões que vistas no ID 274508985, requer, preliminarmente, a declaração de nulidade da sentença em razão da violação ao princípio da identidade física do juiz. E, no mérito: (i) o reconhecimento da atenuante inominada do art. 66 do Código Penal; (ii) o afastamento da causa de aumento do tráfico interestadual; (iii) a aplicação do tráfico privilegiado em sua fração máxima de 2/3 (dois terços); (iv) a detração de 2 meses e 17 dias referentes a prisão processual; e, (v) a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. O Ministério Público, com base nas contrarrazões encontradiças no ID 274508988, pugnou pelo desprovimento do recurso. Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer que se encontra no ID 276807358, opina pelo desprovimento do recurso. É o relatório. À revisão. V O T O R E L A T O R PRELIMINAR Nulidade da sentença por violação ao princípio da identidade física do juiz O recorrente sustenta, nesta preliminar, a nulidade da sentença decorrente da violação ao princípio da identidade física do juiz, que deriva da regra principiológica constitucional do juiz natural, tendo em vista que a prolator do decreto fustigado não foi o mesmo que presidiu a instrução do feito. Como se sabe, o princípio da identidade física do juiz foi inserido no art. 399, § 2º, do Código de Processo Penal, pela Lei n. 11.719/2008. E, nas lições de Andrey Borges de Mendonça1, parafraseando Antônio Alberto Machado, se há um tipo de processo no qual se deve aplicá-lo “(...) é exatamente o processo penal, porque é no âmbito dele que são julgadas as questões de maior gravidade para a vida do indivíduo e da sociedade, questões que envolvem direitos e liberdades mais fundamentais (...)”. Entretanto, sem embargo da importância do princípio em tela, é preciso ponderar que a sua incidência não pode ser vista com exageros, porquanto seria impossível, em todas as situações, nas quais o mesmo juiz que colheu a prova também sentenciasse o processo, razão pela qual o Superior Tribunal de Justiça tem admitido exceções que devem ser analisadas caso a caso, conforme se infere dos arestos abaixo resumidos: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CRIMINAL. NÃO ENQUADRAMENTO NAS HIPÓTESES LEGAIS. DESCABIMENTO DA UTILIZAÇÃO DA AÇÃO REVISIONAL COMO NOVA APELAÇÃO. CRIME DE RECEPTAÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE. ART. 261 DO CPP. INSUFICIÊNCIA DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ NÃO CONFIGURADA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. DOSIMETRIA. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DA CAUSA DE AUMENTO DO § 6º DO ART. 180 DO CP. DESCABIMENTO. NÃO OCORRÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. REDISCUSSÃO. DESCABIMENTO. NECESSIDADE DE REEXAME DA MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. 1. A revisão criminal não deve ser adotada como um segundo recurso de apelação, de forma a propiciar reanálise da prova já existente dos autos. Para que o pleito revisional seja admitido, é preciso que a defesa demonstre que a condenação foi contrária ao texto expresso da lei penal ou aos elementos de convicção constantes dos autos, baseada em provas falsas, ou quando surgem novas evidências que provem a inocência do réu ou determinem ou autorizem a redução de sua pena, o que não ocorreu na hipótese dos autos. 2. Conforme o entendimento pacífico deste Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento de nulidade no curso do processo penal, seja absoluta ou relativa, reclama a efetiva demonstração de prejuízo à parte, sem a qual prevalecerá o princípio da instrumentalidade das formas positivado pelo art. 563 do CPP (pas de nullité sans grief) - AgRg no AREsp n. 2.354.888/DF, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 6/10/2023. 3. No âmbito dos Tribunais Superiores prevalece a orientação segundo a qual apenas a falta de defesa técnica constitui nulidade absoluta, sendo certo que eventual alegação de sua deficiência, para ser apta a macular a prestação jurisdicional, deve ser acompanhada da demonstração de efetivo prejuízo para o acusado, tratando-se, pois, de nulidade relativa (Enunciado n. 523 da Súmula do STF) 4. A hipótese dos autos, a toda evidência, não se enquadra no conceito de ausência de defesa técnica, pois, consoante o afirmado pelo Tribunal de origem, o revisionando foi representado por advogado de sua livre escolha, o qual foi diligente em exercer seu mister na defesa dos interesses do réu, atuando em todas as fases do processo e interpondo o recurso de apelação cabível dentro do prazo. Conforme se observa, as teses entendidas como cabíveis foram sustentadas, de modo que a discordância da DPU quanto às alegações do advogado constituído não configura insuficiência ou fragilidade da defesa técnica. 5. A discordância do atual Defensor com os pleitos, teses e estratégias adotados ou não pelo Causídico anterior não caracteriza ausência/deficiência de defesa capaz de gerar nulidade processual (AgRg no RHC n. 176.203/RN, Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 26/5/2023). Outrossim, a não interposição de recurso, voluntário por sua própria natureza, não implica, por si só, em ausência de defesa técnica, afastando, assim a alegação de nulidade (AgRg no HC n. 694.209/SC, Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe 26/11/2021). 6. O princípio da identidade física do juiz não pode ser interpretado de maneira absoluta e admite exceções que devem ser verificadas caso a caso, à vista, por exemplo, de férias, promoção, remoção, convocação ou outras hipóteses de afastamento justificado do magistrado que presidiu a instrução criminal, hipótese dos autos. 7. O art. 180, § 6º, do Código Penal prevê, expressamente, a incidência da majorante quando o crime for praticado contra bens e instalações do patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviços públicos, estando, dessa forma, os bens sob a responsabilidade da EBCT abrangida na sua tutela (AgRg no AREsp n. 1.647.676/SP, Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe 29/5/2020). 8. Afora isso, a alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ. 9. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp n. 1.920.189/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 20/2/2024, DJe de 26/2/2024.). Destacamos No caso em apreciação, consultando o lotacionograma disponível no sítio eletrônico deste Tribunal de Justiça, bem como ao Diário da Justiça Eletrônico, constata-se que o afastamento da magistrada Amanda Pereira Leite Dias, que presidiu a audiência de instrução e julgamento e relaxou a prisão do apelante, deve-se ao fato de ela ter sido removida para a 3ª Vara da Comarca de Barra do Bugres (ATO TJMT/PRES N. 159, DE 22 DE FEVEREIRO DE 2024), ocasião em que o juiz Luiz Antônio Muniz Rocha foi designado para assumir o gabinete da Vara Única da Comarca de Alto Garças e, nessas condições, em 10 de fevereiro de 2025, este último sentenciou o feito. Destarte, é forçoso concluir que tais tipos de afastamentos de juízes afastam a incidência do princípio da identidade física do juiz, isso significando dizer que a substituição da magistrada que instruiu o presente feito não provoca a alegada nulidade da sentença, porquanto, tal sistemática busca apenas assegurar a razoável duração do processo, destacada no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal. Desse modo, ressai clara a não ocorrência da eiva apontada pelo sentenciado, por violação ao art. 399, § 2º, do Código de Processo Penal, motivo pelo qual se rejeita esta preliminar. MÉRITO A denúncia, constante no ID 274508873, narra os fatos desta forma: [...] No dia 09 de junho de 2023, por volta das 22h39min, na BR 364, KM 47, nesta cidade de Alto Garças/MT, o denunciando VLADIMILLE PESSAMILIO DA SILVA, com consciência e vontade, transportou e trouxe consigo, 05 (cinco) tabletes de substância análoga à pasta base de cocaína, entre diferentes Estados da Federação, para fins de comercialização, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, conforme Auto de Prisão em Flagrante (ID 121891669), Boletins de Ocorrências (ID 121893541 e 121893349), Termo de Apreensão (ID 121893345), Laudo de Constatação n. 513.3.10.9005.2023.120225- A01 (ID 121891679 - Pág. 1). A equipe de policiais rodoviários federais realizavam fiscalização de rotina quando abordaram o ônibus da empresa Útil, linha Cuiabá/MT x Goiânia/GO, placa RVW2D55. Durante os procedimentos, os policiais abordaram o passageiro VLADIMILLE PESSAMILIO DA SILVA que se fazia acompanhado de sua namorada DANIELA RODRIGUES FERNANDES. VLADIMILLE apresentou nervosismo exacerbado, respostas desconexas sobre origem, destino e motivo da viagem, com as informações apontadas pela namorada. Em buscas nas bagagens do denunciando, foram encontrados 05 (cinco) tabletes de substância análoga à pasta base de cocaína. Num primeiro momento, VLADIMILLE negou que aquela bolsa lhe pertencia, depois assumiu a propriedade e que receberia o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) pelo transporte de Cuiabá/MT até Governador Valadares/MG. A substância entorpecente foi submetida a periciada, sendo constatado resultado positivo para COCAÍNA, conforme laudo preliminar n.° Laudo de Constatação n. 531.3.10.9047.2023.92022-A01 (ID 108693288). [...] Destaques no original. Com efeito, da análise dos autos infere-se que a autoria e a materialidade delitiva restaram devidamente comprovadas e não foram objeto de irresignação. Consoante relatado, o apelante postula o redimensionamento da dosimetria da pena, nos seguintes pontos: (i) o reconhecimento da atenuante inominada do art. 66 do Código Penal; (ii) o afastamento da causa de aumento do tráfico interestadual; (iii) a aplicação do tráfico privilegiado em sua fração máxima de 2/3 (dois terços); (iv) a detração de 2 meses e 17 dias referentes a prisão processual; e, (v) a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Com efeito, faz-se necessária a transcrição da parte da sentença condenatória que faz alusão à dosimetria, constante no ID 274508973, vazada nos seguintes termos: [...] Tendo em vista a prolação do édito condenatório, em observância ao princípio da individualização da pena, previsto no artigo 5°, inciso XLVI, da Constituição Federal e as diretrizes dos artigos 59 e 68 do Código Penal, passo à individualização da pena. No ponto, destaco que, para elevação da pena-base, segundo o STJ, podem ser utilizadas as frações de 1/6 (um sexto) sobre a pena mínima ou de 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima, exigindo-se fundamentação concreta e objetiva para o uso de percentual de aumento diverso de um desses (AgRg no AREsp n. 1.799.289/DF, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, DJe de 6/8/2021). Desse modo, na linha a Jurisprudência do STJ, adotarei 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima. A pena prevista para o crime previsto no artigo 33 da Lei 11.343/2006 é de reclusão, de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Em relação ao crime de tráfico de drogas (artigo 33, da Lei n.º 11.343/2006), o artigo 42 da Lei nº 11.313/06 estabelece que "o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente". Do art. 59 do Código Penal c/c art. 42 da Lei antidrogas – Reza o artigo em questão que a natureza e quantidade da droga servirão de critério de recrudescimento da pena base e de modo diferenciado, já que preponderam sobre os demais elementos. No entanto, no caso dos autos, apesar da quantidade de droga apreendida, qual seja, 5,343 kg de cocaína, com a cautela de não promover dupla valoração da matéria, evitando-se o bis in idem, tal critério (a quantidade de droga) não será valorado nesta fase, uma vez que será utilizado como fundamento para aplicar o tráfico privilegiado em seu mínimo legal (§4º do art. 33 da Lei de Drogas). Analisadas as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade foi normal para o tipo legal infringido. O réu não possui antecedentes. A conduta social do acusado é normal ao homem médio brasileiro. A personalidade não aferível por ausência de prova técnica. Os motivos são inerentes à tipificação. As circunstâncias e consequências foram normais para o tipo legal infringido. Por estes motivos, na primeira fase, com estribo no art. 59 do Código Penal, c/c art. 42 da Lei nº 11.343/2006, fixo a pena-base em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Na segunda fase, não verifico a existência de agravantes a serem analisadas. Todavia, verifico a existência da atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal. No entanto, deixo de aplicá-la por já ter fixado a pena no mínimo legal. Inteligência da Súmula 231, do STJ: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. Assim, mantenho a pena intermediaria em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Na terceira fase, verifico a causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso V, da Lei 11.343/06, razão pela qual promovo o aumento da pena em 1/6 (um sexto), tornando-a em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. Todavia, verifico a presença da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4°, da Lei 11.343/06, razão pela qual reduzo a pena em 1/6 (um sexto), justificando tal patamar em função da quantidade de droga (5,343 kg de cocaína), tornando-a DEFINITIVA EM 4 (QUATRO) ANOS, 10 (DEZ) MESES E 10 (DEZ) DIAS DE RECLUSÃO E 485 (QUATROCENTOS E OITENTA E CINCO) DIAS-MULTA, ante a ausência de quaisquer outras causas ou circunstâncias modificadoras a pena. Fixo o valor do dia multa, em 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente. Deixo para realizar a detração na fase da execução penal, na medida em que não haverá alteração do regime de cumprimento de pena fixado. [...] Destaques no original Registre-se, primeiramente, que a sanção penal imposta deve, mediante fundamentação válida, ser fixada em quantum compatível com as finalidades de reprovação e prevenção do crime (art. 93, IX, da Constituição Federal e art. 59 do Código Penal). Para tanto, o art. 68 deste diploma legal, em franca adoção ao sistema trifásico defendido pelo saudoso penalista Nélson Hungria, estabelece que, para a obtenção do quantitativo da pena privativa de liberdade, é imprescindível a observância de três fases distintas: a primeira, que tem por objetivo a fixação da pena-base, em cujo momento, o julgador sopesa as circunstâncias judiciais; a segunda, na qual faz incidir, se existentes, as atenuantes e agravantes; e, na terceira, em que se computa, quando necessário, as causas de diminuição e aumento de pena. O apelante pugna pela aplicação da atenuante genérica, prevista no art.66 do Código Penal, sustentando que sofre de dependência química e somente aceitou o serviço de “mula” para sustentar seu vício em entorpecentes. Entretanto, não assiste razão ao apelante. Como se sabe a atenuante inominada prevista no art. 66 do Código Penal, trata-se de circunstância extremamente aberta, sem qualquer apego à forma, permitindo ao juiz imenso arbítrio para analisá-la e aplicá-la. E, nesse ponto, diz a lei constituir-se atenuante qualquer circunstância relevante, ocorrida antes ou depois do crime, mesmo que não esteja expressamente prevista em lei (Código Penal Comentado. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 287). No entanto, em que pese a argumentação lançada pela defesa, o apelante, em seu interrogatório judicial, confessou que somente aceitou transportar os entorpecentes pois era uma oportunidade de lucro fácil, motivação inerente ao tipo penal. Em verdade, o apelante informou até mesmo qual seria a destinação dos valores que seriam por ele recebidos, eis que revelou durante o interrogatório que: “[...] estava desesperado, precisando de dinheiro para mim montar meu espetinho, que eu estou querendo abrir um espeto, aí veio esse dinheiro fácil e eu peguei [...]” (Interrogatório Judicial de Vladimille Pessamilio da Silva, ID 274508926), não havendo que se falar, por conseguinte, em crime motivado por dependência química. Se isso não bastasse, ainda que fosse acolhido o pedido do apelante, em nada alteraria sua situação, eis que a pena intermediária já foi fixada no mínimo legal, inclusive com o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, que não foi aplicada pelo magistrado de primeiro grau em observância da Súmula 231 do STJ, que veda a fixação da pena intermediária abaixo do mínimo legal em razão da incidência de circunstância atenuante. Sendo assim, não há como acolher o pleito defensivo buscando a aplicação da atuante genérica, eis que o próprio apelante demonstrou que o crime não foi motivado pela dependência em químicos, não sendo aplicável, na espécie, a atenuante inominada descrita no art. 66 do Código Penal. Noutro prisma, não merece acolhimento o pleito visando o afastamento da causa de aumento do tráfico interestadual, prevista no art. 40, V, da Lei de Drogas, pois restou sobejamente demonstrado ao longo da instrução penal que a intenção do apelante era de levar o entorpecente até outro Estado. Em verdade, o apelante admitiu, em seu interrogatório na fase judicial (ID 274508926), que foi abordado por um indivíduo na rodoviária de Cuiabá lhe oferecendo o valor de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) para que transportasse a droga até Governador Valadares/MG. E para o reconhecimento da majorante, não é necessária a efetiva transposição da fronteira estadual, sendo suficiente que haja a comprovação de que a substância tinha como destino outro estado da federação, de acordo com o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, exteriorizado no julgado, a seguir resumido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. CONDENAÇÃO ANTERIOR E DEFINITIVA. MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE. CAUSA DE AUMENTO DE PENA REFERENTE À INTERESTADUALIDADE (ART. 40, INCISO V, DA LEI N. 11.343/2006) PRESCINDIBILIDADE DE EFETIVA TRANSPOSIÇÃO DE FRONTEIRAS. I - As condenações alcançadas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, mas não impedem a configuração de maus antecedentes, permitindo a exasperação da pena-base (precedentes). II - Na linha da jurisprudência desta eg. Corte Superior, irrelevante a efetiva transposição das fronteiras estaduais, bastando a comprovação de que a droga tinha, como destino, outra unidade da federação, o que restou evidenciado no caso. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no REsp: 1780918 RO 2018/0308366-0, Relator: Ministro FELIX FISCHER, data de julgamento: 12.03.2019, T5 - QUINTA TURMA, data de publicação: DJe 19.03.2019) Destacamos Aliás, tal entendimento se encontra amparado na Súmula n. 587, aprovada pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça em 13 de setembro de 2017, segundo a qual: “Para a incidência da majorante prevista no artigo 40, V, da Lei 11.343/06, é desnecessária a efetiva transposição de fronteiras entre estados da federação, sendo suficiente a demonstração inequívoca da intenção de realizar o tráfico interestadual”. Logo, evidenciado pelos depoimentos policiais rodoviários federais (IDs 274508922 e 274508921), pelas passagens de ônibus do apelante com destino a Goiânia/GO (ID 274508858 p. 7) e, sobretudo, pela confissão do próprio apelante a finalidade de transpor os limites estaduais, impõe-se a mantença da causa de aumento sob exame. O apelante postula, também, a majoração da fração aplicada para a causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06. Extrai-se da dosimetria da pena que o magistrado aplicou a fração de 1/6 (um sexto) para a citada causa redutora de pena em razão da expressiva quantidade de entorpecentes encontrados em posse do apelante (5,343 kg de cocaína), elemento que pode ser considerado na terceira fase da dosimetria da pena prevista para o crime de tráfico, nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/11, assim redigido: Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. Destacamos O certo é que, sobre o assunto, sabe-se que na ausência de indicação pelo legislador de balizas para escolha do percentual de redução previsto no art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/06, a natureza e a quantidade de droga apreendida, assim como as demais circunstâncias do art. 42 da Lei de Drogas e do art. 59 do Código Penal, podem ser utilizadas na definição de tal índice ou, até mesmo, no impedimento da incidência da referida minorante, quando evidenciarem a dedicação do agente a atividades criminosas, sendo vedada tão somente a utilização concomitante de tais vetores na primeira e na terceira fases da dosimetria penal. No caso destes autos, verifica-se que o sentenciante estabeleceu a pena inicial do apelante no mínimo legal – qual seja, 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa – e consignou expressamente que reservaria para a terceira etapa do cálculo penal o juízo de valor acerca da quantidade de droga apreendida, indicando que a sua valoração incidiria sobre a fração de redução do tráfico privilegiado. É evidente que, na hipótese, a quantidade de entorpecente não pode ser ignorada, de modo que os elementos indicados pelo sentenciante constituem fatores idôneos para justificar a escolha de fração de redução diversa da máxima na terceira etapa do cálculo dosimétrico, mostrando-se, portanto, proporcional e justa ao caso concreto a fração de 1/6 (um sexto) adotada na sentença condenatória. No que diz respeito à realização da detração penal, se trata de matéria cujo exame é reservado à competência do Juízo das Execuções Penais, no momento de cumprimento da pena. Como se sabe, a alteração introduzida pela Lei n. 12.736/2012 – que acrescentou o parágrafo 2º ao art. 387 do Código de Processo Penal – se, por um lado, confere ao juiz da fase de conhecimento a possibilidade de computar o tempo de prisão provisória, com o escopo exclusivo de fixação do regime inicial de cumprimento da pena; por outro, não autoriza o magistrado a fazer o cômputo da detração penal (Código Penal, art. 42), tal como se infere da leitura do referido dispositivo assim redigido: Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: [...] § 2º O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012). Destacamos Isso quer dizer que o juízo da fase de conhecimento não recebeu do legislador a faculdade de aplicação da detração – até porque isso significaria revogação da disposição contida no art. 66, III, c, da Lei das Execuções Penais – mas tão somente a possibilidade de adequar o regime inicial de cumprimento da pena considerando o tempo de prisão provisória suportado pelo condenado, no interesse da preservação do resultado útil do processo penal. Em outras palavras, o juízo de conhecimento somente está obrigado a detrair a pena do condenado se tal conduta, de fato, for surtir efeito na alteração do regime de cumprimento de pena a ser suportado por ele. Todavia, no caso em tela, essa conduta não necessariamente implicaria em abrandamento do regime prisional imposto ao apelante, pois o período de prisão do apelante se deu entre 9 de junho de 2023 e 23 de agosto do mesmo ano, totalizando 2 (dois) meses e 17 (dezessete) dias de custódia, de modo que eventual detração do período de prisão provisória não afetaria o regime prisional inicial estabelecido. Por derradeiro, o apelante requer a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, pleito este que igualmente não merece acolhimento. O artigo 44 do Código Penal admite a substituição da pena de reclusão por penas restritivas de direitos quando preenchidos, de forma cumulativa, os seguintes requisitos: que a pena aplicada seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos; que o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; e que o réu não seja reincidente em crime doloso. Ademais, exige-se que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias do crime, autorizem a concessão do benefício. No caso em tela, a reprimenda foi fixada em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, não se enquadrando, portanto, no patamar máximo de 4 (quatro) anos de reclusão, autorizador da concessão do benefício. Desse modo, embora o crime cometido não tenha sido praticado com violência ou grave ameaça e o réu não seja reincidente em crime doloso, certo é que a análise do primeiro requisito do art. 44 do Código Penal [relativo à quantidade de pena aplicada] impede a concessão do benefício pleiteado no caso em análise. Com efeito, o magistrado de primeira instância destacou, quando da prolação da sentença, que não restavam preenchidos os requisitos autorizadores do artigo 44, razão pela qual não se verifica irregularidade sanável por esta instância revisora nesse tocante, mormente porque, repita-se, o não preenchimento, por parte do apelante, de qualquer dos incisos do art. 44 do Código Penal obsta, por si só, à concessão da medida substitutiva, eis que os requisitos do referido artigo são cumulativos. Diante disso, ausente um dos requisitos legais indispensáveis à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, impõe-se o indeferimento do pedido. Posto isso, em consonância com a Procuradoria-Geral de Justiça, nego provimento ao recurso de Vladimille Pessamilio da Silva, mantendo inalterada a sentença condenatória. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025
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