Processo nº 0007765-79.2010.8.11.0037
ID: 322767800
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0007765-79.2010.8.11.0037
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PEDRO ALEXANDRE MARINHO DE SOUZA
OAB/SP XXXXXX
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JOSE RAVANELLO
OAB/MT XXXXXX
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MIRIAN RIBEIRO RODRIGUES DE MELLO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0007765-79.2010.8.11.0037 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Improbidade Administrativa] Relator:…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0007765-79.2010.8.11.0037 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Improbidade Administrativa] Relator: Des(a). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO Turma Julgadora: [DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] Parte(s): [SESTILIO SEGUNDO FRIZON - CPF: 086.367.700-25 (APELANTE), MIRIAN RIBEIRO RODRIGUES DE MELLO - CPF: 607.959.801-91 (ADVOGADO), JOSE RAVANELLO - CPF: 177.983.700-30 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ESPOLIO DE ANGELIM DOS SANTOS BARALDI registrado(a) civilmente como ANGELIM DOS SANTOS BARALDI - CPF: 222.879.650-68 (TERCEIRO INTERESSADO), PEDRO ALEXANDRE MARINHO DE SOUZA - CPF: 424.191.548-51 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE PROVERAM O RECURSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO A EXCELENTÍSSIMA SRA. DESA. RELATORA MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR E 2º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA. EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FRACIONAMENTO IRREGULAR DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. PREJUÍZO AO ERÁRIO. ALTERAÇÃO PROMOVIDA PELA LEI N.° 14.230/21. RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA. EXIGÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO E COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO. VONTADE LIVRE E CONSCIENTE EM ALCANÇAR RESULTADO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADA. RECURSO PROVIDO. EXTENSÃO DOS EFEITOS AO LITISCONSORTE. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por Sestilio Segundo Frizon contra sentença proferida nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ajuizada em razão de suposta prática de fracionamento de licitações na Câmara Municipal de Primavera do Leste/MT. A sentença julgou parcialmente procedente a demanda para condenar o apelante ao ressarcimento de R$ 186.250,58, com fundamento no art. 10, inciso XI, da Lei n.° 8.429/92. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se está comprovado o elemento subjetivo do dolo e o dano efetivo ao erário, exigidos para a configuração de ato de improbidade administrativa nos moldes do art. 10, inciso XI, da Lei n.° 8.429/92, após a entrada em vigor da Lei n.° 14.230/21 III. Razões de decidir 3. A Lei n.º 14.230/21 modificou a Lei de Improbidade Administrativa, estabelecendo expressamente a necessidade de demonstração de dolo para a configuração dos atos previstos nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei n.º 8.429/92. 4. O princípio da retroatividade da norma mais benéfica, previsto no art. 5º, XL, da Constituição Federal, aplica-se ao direito administrativo sancionador, inclusive aos atos de improbidade administrativa, conferindo segurança jurídica aos agentes públicos e observando as garantias do devido processo legal. 5. A análise dos autos revela a inexistência de prova inequívoca da intenção deliberada do apelante em causar prejuízo ao patrimônio público, não bastando a mera irregularidade para configuração do ato ímprobo. 6. A reforma da sentença aproveita ao litisconsorte não recorrente, espólio de Angelim dos Santos Baraldi, nos termos do art. 1.005, do CPC, ante a identidade de fundamentos da absolvição. IV. Dispositivo e Tese 7. Recurso de apelação provido para julgar improcedentes os pedidos iniciais, estendendo-se os efeitos ao espólio de Angelim dos Santos Baraldi. Tese de julgamento: “1. A responsabilização por ato de improbidade administrativa exige a demonstração de dolo específico e de dano efetivo ao erário. 2. A ausência desses elementos implica a improcedência da ação, ainda que haja irregularidade formal na condução administrativa. 3. O recurso interposto por um litisconsorte ativo aproveita ao outro quando as defesas forem comuns e ausente conflito de interesses”. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, XL e XXXVI; Lei n.º 8.429/92, arts. 1°, § 4°, 10, e 11, § 1º; CPC, art. 1.005. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 18.08.2022; STJ, AgInt no RMS 65.486/RO, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 17.08.2021. RELATÓRIO: Egrégia Câmara: Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO interposto pelo SESTILIO SEGUNDO RIZON, contra a sentença proferida pelo Excelentíssimo Juiz de Direito, Dr. Fabrício Sávio da Veiga Carlota, nos autos de n.° 0007765-79.2010.811.0037, em trâmite perante a 4ª Vara da Comarca de Primavera do Leste, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (ID. 184949672): “Vistos. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ingressou com AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E RESSARCIMENTO DE DANO AO ERÁRIO em face de SESTILIO SEGUNDO FRIZON e ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, devidamente qualificados nos autos. Narra a inicial, em síntese, que foi instaurado procedimento preliminar com o intuito de investigar possíveis irregularidades praticadas pelo então presidente do legislativo municipal no biênio 2005/2006, ANGELIN DOS SANTOS BARALDI, consubstanciadas em: 1) prática de nepotismo, consistente na contratação de diversas pessoas sendo parentes dos respectivos vereadores; 2) fracionamento indevido das licitações pertinentes à construção da Câmara Municipal de Primavera do Leste/MT, totalizando no ano de 2005, o montante de R$ 532.970,52 (quinhentos e trinta e dois mil novecentos e setenta reais e cinquenta e dois centavos), quando seria devida a Tomada de Preço ou Concorrência Pública e não o Convite, vez que o valor teria ultrapassado o valor de R$ 150.000,00, sendo realizadas contratações com as empresas: Construtora Alfer Ltda. – R$ 85.190,00 (Convite 002/2005), Instalcon Gamo Ltda. – R$ 32.520,00 e R$ 55.319,90 (Convite 001/2005), Construtora Primavera Ltda. – R$ 144.393,27 (Convite 004/2005) e R$ 40.234,10 (Convite 017/2005), Madema Com. E Benef. De Madeira Ltda. – R$ 31.200,00 (Convite 013/2005), Elton Lar Riva – R$ 15.000,00 (Convite 005/2005), 3) despesas no montante de R$ 48.643,30 com gêneros alimentícios e materiais de limpeza, não pertinentes com as necessidades da administração da Câmara, tais como: sucos, sabonetes, leite, doces e outros; 4) contratação de serviços de assessoramento contábil, financeiro, advocatícios, técnicos e outros, sem procedimento licitatório e sem demonstração dos pagamentos; 5) patrocínio de eventos e apoios culturais e ajuda financeira para compra de materiais diversos cujas despesas seriam estranhas à finalidade da Câmara Municipal, por meio de notas de empenhos, ordens de pagamentos, recibos sem valor legal e sem qualquer timbre do emitente. Aduz que a denúncia referida também fora analisada pelos Auditores do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE/MT), os quais, em auditoria realizada entre os dias 25 e 29/10/2006, encontraram diversas irregularidades quanto à construção da Câmara Municipal na gestão dos requeridos. Informa que a construção da Câmara foi dividida em 8 etapas e que, ao analisar os processos licitatórios realizados até a data da inspeção, a equipe técnica constatou que foram realizadas 15 (quinze) licitações na modalidade Convite, entre as quais, 8 (oito) para contratação de mão de obra, 5 (cinco) para contratação de mão de obra e fornecimento de materiais e 2 (duas) para aquisição de materiais de construção. Ocorreram também, 4 (quatro) dispensas de licitações nos termos do art. 24, inciso I, da Lei nº 8.666/93, e para a 2ª etapa, foram realizadas 5 (cinco) licitações na modalidade Pregão para aquisição de materiais para construção. Assim, considerando que o valor da obra até a data da inspeção era de R$ 2.401.428,93 (dois milhões quatrocentos e um mil quatrocentos e vinte e oito reais e noventa e três centavos), aduz que a modalidade correta para execução da obra de construção do novo prédio da Câmara Municipal deveria ter sido de Concorrência, uma vez que, ainda que seja dividido em parcelas, deve ser levado em conta o valor total da obra para escolha da modalidade licitatória. Aponta, ainda, a existência de irregularidades na elaboração de orçamentos, excesso de prazo na execução dos serviços, medições realizadas de forma incorreta, ausência de contratos de execução de serviços, pagamento de contratos sem medições, ausência de termo de recebimento, pagamento de contratos sem a execução da obra, realização de termo de aditamento após o prazo de vigência do contrato, contratação de pessoa física não habilitada para a fiscalização e gerenciamento das obras e serviços. Relata que, conforme apurado pelo TCE, o valor total da obra até a data da inspeção (25/09 a 29/09/2006), não estando 100% construída, fora de R$ 2.401.428,93 (dois milhões quatrocentos e um mil quatrocentos e vinte e oito reais e noventa e três centavos), entretanto, fora feita uma estimativa do valor da mesma obra para o mês de setembro/2006, considerando o custo da PINI por metro quadrado, de padrão médio, a equipe encontrou o valor de R$ 2.123.865,90 (dois milhões cento e vinte e três mil oitocentos e sessenta e cinco reais e noventa centavos), constatando-se uma diferença a maior de R$ 277.613,03 (duzentos e setenta e sete mil seiscentos e treze reais e três centavos), o que, de acordo com os peritos, demonstra que o parcelamento da obra em etapas, com fracionamento de licitação, além de contrariar os dispositivos da Lei de Licitação, não demonstrou ser a opção mais adequada técnica e economicamente para a Administração, gerando prejuízos ao erário. Declara que, consoante o Relatório Técnico do TCE, o valor total da obra executada na gestão do requerido SESTÍLIO SEGUNDO FRIZON, em 2003/2004, foi de R$ 1.611.229,22 (um milhão seiscentos e onze mil duzentos e vinte e nove reais e vinte e dois centavos), sendo que as irregularidades nos procedimentos licitatórios resultaram no valor executado acima do valor estimado, com base no custo da construção da PINI por metro quadrado, de R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos). Já na gestão de ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, em 2005/2006, fora executado o montante de R$ 790.249,71 (setecentos e noventa mil duzentos e quarenta e nove reais e setenta e um centavos), resultando as irregularidades nos procedimentos licitatórios em um montante de R$ 91.362,45 (noventa e um mil trezentos e sessenta e dois reais e quarenta e cinco centavos) acima do estimado com base no custo da construção da PINI. Alega, ainda, as contrações irregulares pelo requerido ANGELIM de assessoria jurídica, que totalizaram a quantia de R$ 107.660,00 (cento e sete mil seiscentos e sessenta reais); assessoria técnica contábil sem necessidade, por haver no quadro funcional da Câmara Municipal os cargos de Técnico em Contabilidade, Assessor Financeiro e Assessor Técnico Legislativo; e de funcionária para o Posto da Policia Rodoviária Federal, pelo período de março a julho de 2006, totalizando um valor de R$ 2.579,12 (dois mil quinhentos e setenta e nove reais e doze centavos). Ademais, aduz que o requerido ANGELIM efetuou despesas com gêneros alimentícios excessivos ou que não condizem com a manutenção das atividades da Câmara Municipal, como por exemplo aquisição de carnes nobres variadas. Outrossim, expôs a ocorrência de patrocínio de eventos com recursos públicos e ajuda financeira para compra de materiais diversos. Assim, quanto ao requerido SESTÍLIO SEGUNDO FRIZON, pugnou pelo reconhecimento da irregularidade dos procedimentos licitatórios e contratos enunciados, determinando o ressarcimento aos cofres públicos municipais pelo requerido do valor correspondente a R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos), com juros e correção monetária. Concernente ao requerido ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, requer o ressarcimento aos cofres públicos no valor de R$ 269.644,30 (duzentos e sessenta e nove mil seiscentos e quarenta e quatro reais e trinta centavos), bem como sua condenação nas sanções previstas na Lei nº 8.429/92, pela prática de atos de improbidade administrativa consubstanciados nos fatos narrados, previstas no art. 12, incisos II e III da Lei nº 8.429/92, nas modalidades e gradações cabíveis. Com a inicial vieram os documentos. A parte requerida foi devidamente notificada, sendo que o requerido ANGELIM DOS SANTOS BARALDI apresentou defesa preliminar nos ids n. 40635192 - Pág. 68/82, e o requerido SESTILIO SEGUNDO FRIZON apresentou no id n. 184949163 - Pág. 51/74. A petição inicial foi recebida no id n. 184949163 - Pág. 94/102. O requerido SESTILIO SEGUNDO FRIZON, devidamente citado, apresentou contestação no id n. 184949172 - Pág. 27/41, alegando, preliminarmente, ausência de fundamento jurídico do pedido. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido inicial. No id n. 184949172 - Pág. 49, foi deferido o bloqueio de ativos financeiros da parte requerida, todavia a pesquisa restou negativa. Impugnação à contestação no id n. 184949172 - Pág. 121/184949175 - Pág. 15. No id n. 184949175 - Pág. 27 foi decretada a revelia do requerido ANGELIM DOS SANTOS BARALDI. Intimadas sobre a produção de provas, a parte requerente pugnou pelo julgamento antecipado da lide (id n. 48280780). O requerido SESTILIO pugnou pela juntada de prova documental e produção de prova testemunhal (id n. 42429017). Decisão saneadora no id n. 67727179, afastando a preliminar arguida pelo requerido SESTILIO, bem como designando audiência de instrução. Em audiência de instrução, foram ouvidas 3 (três) testemunhas. Nos ids n. 79950866 e 81951538, os requeridos ANGELIM e SESTILIO, respectivamente, apresentaram razões finais pugnando pela improcedência da ação. O Ministério Público apresentou razões finais no id n. 84570981, pugnando pela procedência integral dos pedidos. É o relatório. Fundamento e decido. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E RESSARCIMENTO DE DANO AO ERÁRIO ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em face de SESTILIO SEGUNDO FRIZON e ANGELIM DOS SANTOS BARALDI. O processo está em ordem, não havendo nulidades a serem sanadas ou a serem reconhecidas de ofício. Todos os pressupostos processuais de desenvolvimento válido e regular do processo se fazem presentes, assim como as condições da ação, estando o feito apto a receber um julgamento com resolução de mérito. Inicialmente, convém destacar que a presente ação tem dupla pretensão, sendo a primeira de reconhecimento de que o requerido SESTILIO causou danos ao erário, lhe condenando ao ressarcimento. A segunda pretensão é a condenação do requerido ANGELIM pelo cometimento de atos de improbidade administrativa, aplicando-lhe as penas cabíveis e o condenando ao ressarcimento do erário. Algumas peculiaridades da demanda em questão devem ser evidenciadas. Odete Medauar, em sua obra Direito Administrativo Moderno, 12ª edição, editora RT, 2008, p. 408, dando a noção da Ação Civil Pública, dispõe: É o instrumento processual destinado a evitar ou reprimir danos aos interesses difusos ou transindividuais da sociedade, dentre os quais: meio ambiente, patrimônio cultural, patrimônio público e social, criança e adolescente, investidores no mercado de capitais, consumidores, portadores de deficiência física, infração da ordem econômica e da economia popular, infração da ordem urbanística. Naturalmente, o Ministério Público é legitimado para propor a Ação Civil Pública, competindo-lhe instaurar o inquérito civil, a fim de apurar as informações necessárias à propositura da ação, não excluindo, contudo, os legitimados concorrentes. Em se tratando de Ação Civil de Improbidade Administrativa fundada na Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, cuja legitimidade ativa do Ministério Público decorre do art. 129, III, da Constituição Federal, o qual também reserva como uma de suas funções institucionais a promoção de inquérito civil, tem-se que este constitui peça importante para respaldar pedidos de condenação por ato de improbidade administrativa, bem como para indicar a ocorrência desta e subsidiar o convencimento do julgador. Na defesa do patrimônio público e social, pode o Ministério Público promover qualquer tipo de ação ou procedimento administrativo que lhe preceda, não apenas o pedido de reparação de danos e de aplicação das sanções previstas na Lei nº 8.429/92. A propósito, segue a orientação do Superior Tribunal de Justiça sobre a possibilidade de o inquérito civil promovido pelo Ministério Público ser utilizado para informar pedidos de ação civil por ato de improbidade administrativa, bem como sobre o valor probatório daquela peça informativa: PROCESSO CIVIL AÇÃO CIVIL DE REPARAÇÃO DE DANOS - INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. NATUREZA INQUISITIVA. VALOR PROBATÓRIO. 1. O inquérito civil público é procedimento informativo, destinado a formar a opinio actio do Ministério Público. Constitui meio destinado a colher provas e outros elementos de convicção, tendo natureza inquisitiva. 2. “As provas colhidas no inquérito têm valor probatório relativo, porque colhidas sem a observância do contraditório, mas só devem ser afastadas quando há contraprova de hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do contraditório" (Recurso Especial n. 476.660-MG, relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 4.8.2003). 3. As provas colhidas no inquérito civil, uma vez que instruem a peça vestibular, incorporam-se ao processo, devendo ser analisadas e devidamente valoradas pelo julgador. 4. Recurso especial conhecido e provido. (REsp nº 644.994/MG, relator o Ministro João Otávio de Noronha, DJ de 21.03.2005, p. 336). O Ministério Público Estadual promoveu esta ação civil com o objetivo de que a parte requerida fosse condenada nas sanções previstas na Lei nº 8429/92, pela prática de atos de improbidade administrativa que, no caso dos autos, consistem na prática de ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência. Destarte, pratica improbidade administrativa o agente público que, por ação ou omissão dolosa, descumpre um dos comportamentos pretendidos pelos diversos princípios constitucionais da Administração Pública, os quais estão esparsos em todo o texto da Constituição, concentrados em seu art. 37 e reproduzidos na Lei nº 8.429/92. Nesse sentido, a supramencionada Lei divide as práticas de improbidade em atos que resultem em enriquecimento ilícito, atos que causem lesão ao erário ou atos que atentem contra os contra os princípios da administração pública. Vejamos: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (...). Com efeito, consoante as alterações promovidas pela Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, na Lei nº 8.429/92, considera-se indispensável para a caracterização de improbidade que a conduta do agente seja dolosa, na medida em que a citada norma dispõe que “Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais”, “Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente”, bem como que “O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa”. Portanto, nota-se que apenas a irregularidade não induz a improbidade, haja vista que a conduta ímproba se caracteriza como conduta lesiva mediante vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito e pressupõe elementos mais rígidos para sua caracterização. Dessarte, com o advento da Lei nº 14.230/2021, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1199, firmou a tese de que “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei”. No caso sub judice, verifica-se que, quanto à construção da sede da Câmara Municipal de Primavera do Leste/MT, a auditoria do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE/MT) apurou as seguintes irregularidades: “Na fase de licitação da obra, ausência do projeto básico e das planilhas orçamentárias, contendo a descrição detalhada, os quantitativos, custos unitários e totais de todos os serviços, que definissem com clareza o objeto de contratação e seu valor total, viciando deste modo todo o processo licitatório, ao ser adotada a modalidade Convite, quando o valor do objeto indicava Concorrência Pública”; “Alguns serviços fazem parte de mais de uma etapa”; “A Administração não realiza formalização adequada dos processos (desde a fase de licitação até o pagamento) como a protocolização dos processos e numeração/rubrica das folhas, garantindo a fidedignidade dos documentos”; “Ausência nos autos de documento indicando a pessoa responsável pela elaboração do orçamento e quantificações de materiais para os processos das licitações”; “Determinação de modalidade de licitação, contrário a que preceitua o Art. 23, II, alínea b, da Lei do 8.666/93”; “Não consta dos autos Resolução que criou a nova Comissão Pró-Construção presidida pelo Sr. José Gonzava Tonon e a Portaria N.º 016/2005 de 01/04/2005, que designou o pregoeiro e a equipe de apoio para as licitações na modalidade pregão para 2005”; “A Comissão deixou de cumprir o que preceitua os Art. 22, § 30, § 6º e § 7º da Lei 8.666/93 adiando o presente certame, com repetição dos convites em data a ser mareada após parecer da autoridade superior, ou seja, o ordenador da despesa”; “Não consta nos autos da 1º, 2º e 3º Etapas documento, por parte da Contratante, indicando um técnico-gerente/fiscal que seria o interlocutor de todos os contratos com a Contratada, bem como o agente fiscalizador do desenvolvimento dos trabalhos, conforme preceituam os Art. 58, inc. III e Art. 67 da Lei 8.666/93”; “Contrato foram executado após o término da vigência”; “As medições foram elaboradas pela Contratada, contrariando o Art. 67 da Lei 8.666/93 e a Cláusula 5.01 do Contrato, que preceitua que fica a cargo do Fiscal após a aferição dos trabalhos realizados emitir o correspondente Certificado de Aferição — Medições”; “Medições foram atestados por Fiscal não designadas pela Contratante”; “Não constam dos autos Termo de Recebimento provisório e nem o Definitivo, documentos previstos na Cláusula 10 do Contrato e exigidos no Art. 73, inc. I da Lei Nº 8.666/93— Não constam dos autos Termo de Recebimento provisório e nem o Definitivo, documentos previstos na Cláusula 10 do Contrato e exigidos no Art. 73, inc. I da Lei Nº 8.666/93”; “Medições não informam o período em que foram executadas, o que dificulta averiguar se os serviços foram executados nos prazos estabelecidos no cronograma físico-financeiro e na vigência”; “Termo Aditivo ao Contrato sendo celebrado após o término da vigência do contrato”; “Pagamentos sendo efetuados sem as medições elaboradas pelo agente fiscalizador”; “Contratação do Sr. Geraldo Tadeu Freitas Schorn — Bacharel em Direito, para prestação de serviço de fiscalização, supervisão, gerenciamento de obras e serviços da nova sede da Câmara Municipal de Primavera do Leste contrariando o que preceitua o Art. 70, alínea !, da Lei 5194/1966 e Art. 15 da Lei 5.194/1966, que este tipo de prestação de serviço deve ser exercida por pessoa física habilitada”; “Último Pagamento sendo efetuados antes da conclusão da obra”; “Pagamento sendo efetuado em desacordo com a Cláusula do Contrato que diz sobre a forma de pagamento”; “1º Medição foi realizada 05 (cinco) dias após a ordem de fornecimento, com alguns serviços executados até 80% do quantidade total”; “O Serviço não executado e pago”; “Pagamento Antecipado de Despesa”; “Obra foi executado no período compreendido entre 03/03/2006 a 11/04/2006, totalizando 40 (quarenta) dias, e conforme Cláusula 6.1 e 14.1 o período de execução seria de 90 (noventa) dias, podemos assim questionar a qualidade do serviço executando”; “Foi pago ao Sr. Sergio Denardi o valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais) sem instrumento contratual”; “O parcelamento de uma obra em diversas etapas visa ampliar a competitividade na licitação e consequentemente permitir que a Administração Pública obtenha menor preço, entretanto não foi o que observamos no presente caso, quando dos 07 (sete) processos licitatórios, sagrou-se vencedora em 06 (seis) deles a mesma empresa Construtora Primavera Ltda.”. Da análise dos autos, observa-se que o processo licitatório de construção da sede da Câmara Municipal ocorreu de forma irregular, não tendo sido observada a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na medida em que essa dispõe em seu art. 23, § 5º, que “É vedada a utilização da modalidade "convite" ou "tomada de preços", conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de "tomada de preços" ou "concorrência", respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas de natureza específica que possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade diversa daquela do executor da obra ou serviço”. Destarte, o valor total da contratação, R$ 2.401.428,93 (dois milhões quatrocentos e um mil quatrocentos e vinte e oito reais e noventa e três centavos), supera os limites das modalidades convite e tomada de preços, restando evidente que houve o fracionamento dos serviços contratados, os quais constituíam partes de uma só obra e deveriam ter sido licitados por meio de concorrência, pois, segundo o § 2º do art. 23 da Lei de Licitações, “Na execução de obras e serviços e nas compras de bens, parceladas nos termos do parágrafo anterior, a cada etapa ou conjunto de etapas da obra, serviço ou compra, há de corresponder licitação distinta, preservada a modalidade pertinente para a execução do objeto em licitação” (sem grifos no original). Assim, ainda que se dividisse a licitação, a modalidade concorrência deveria ter sido adotada. À vista disso, percebe-se que os gestores do Poder Legislativo Municipal, ao utilizarem a modalidade de licitação indevida, além de infringirem as disposições da Lei nº 8.666/93, limitaram a competição entre as empresas convidadas, sendo que, se tivessem aplicado a modalidade de licitação corretamente, teriam ampliado a competição entre as empresas situadas em outros municípios, viabilizando o alcance de melhores preços. O prejuízo ao erário causado pelo fracionamento foi comprovado pela perícia técnica do TCE que contabilizou que o custo da obra foi superior em R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos) durante a gestão do requerido SESTILIO – 2003/2004 – e em R$ 91.362,45 (noventa e um mil trezentos e sessenta e dois reais e quarenta e cinco centavos) durante a gestão do requerido ANGELIM – 2005/2006. Ademais, não foi observada a determinação do art. 67 da Lei de Licitações, segundo o qual “A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição”. Outrossim, não houve o recebimento dos objetos contratados, em desacordo com o art. 73, I, da Lei nº 8.666/93, que estabelece que “Executado o contrato, o seu objeto será recebido: I - em se tratando de obras e serviços: a) provisoriamente, pelo responsável por seu acompanhamento e fiscalização, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes em até 15 (quinze) dias da comunicação escrita do contratado; b) definitivamente, por servidor ou comissão designada pela autoridade competente, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes, após o decurso do prazo de observação, ou vistoria que comprove a adequação do objeto aos termos contratuais, observado o disposto no art. 69 desta Lei”. Cumpre consignar que, não obstante a contratação de Geraldo Tadeu Freitas Schorn, Bacharel em Direito, para fiscalização, supervisão e gerenciamento de obras e serviços da nova sede da Câmara em junho de 2005, o representante da Administração especialmente designado para fiscalizar e acompanhar a obra deve ser pessoa legalmente habilitada a praticar a atividade relativa ao objeto, já que a Lei nº 5.194, de 24 de dezembro de 1966, estatui em seu art. 15 que “São nulos de pleno direito os contratos referentes a qualquer ramo da engenharia, arquitetura ou da agronomia, inclusive a elaboração de projeto, direção ou execução de obras, quando firmados por entidade pública ou particular com pessoa física ou jurídica não legalmente habilitada a praticar a atividade nos têrmos desta lei”, assim como que “As atividades e atribuições profissionais do engenheiro, do arquiteto e do engenheiro-agrônomo consistem em: (...) fiscalização de obras e serviços técnicos” (art. 7º). Assim, resta demonstrado que houve ação dolosa do gestor SESTILIO com o objetivo de liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular, uma vez que efetuou o fracionamento indevido da contratação dos serviços de construção da sede da Câmara Municipal, no valor de R$ 1.611.229,22 (um milhão seiscentos e onze mil duzentos e vinte e nove reais e vinte e dois centavos). Ademais, consoante comprovado pela perícia técnica do Tribunal de Contas, o fracionamento indevido causou ao erário o prejuízo de R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos). Portanto, ante a prescrição da pretensão sancionatória dos atos de improbidade, o requerido supracitado deve ser condenado apenas ao ressarcimento do prejuízo causado aos cofres públicos, esse que é imprescritível, nos termos do decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 897. Do mesmo modo, quanto ao requerido ANGELIM, o conjunto fático-probatório dos autos comprova que houve ação dolosa do gestor com o objetivo de liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular, tendo em vista que efetuou o fracionamento indevido da contratação dos serviços de construção da sede da Câmara Municipal, no valor de R$ 790.249,71 (setecentos e noventa mil duzentos e quarenta e nove reais e setenta e um centavos), sendo que, conforme comprovado pela perícia técnica do Tribunal de Contas, o fracionamento indevido causou ao erário o prejuízo de R$ 91.362,45 (noventa e um mil trezentos e sessenta e dois reais e quarenta e cinco centavos). O entendimento jurisprudencial: APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MUNICÍPIO DE LAJEADO DO BUGRE. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE PERFURAÇÃO E MANUTENÇÃO DE POÇOS ARTESIANOS. CARTAS CONVITE Nº 22/2005, 03/2006, 19/2006, 04/2007 E 005/2008. PREFEITO MUNICIPAL, SECRETÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO E TÉCNICA CONTÁBIL. DIRECIONAMENTO COMPROVADO DE LICITAÇÕES. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MODALIDADE LICITATÓRIA ATRAVÉS DE INDEVIDO FRACIONAMENTO. AUSÊNCIA DE CONTROLE DE ENTRADA E SAÍDA DE MATERIAIS E SERVIÇOS. DANO AO ERÁRIO. RESSARCIMENTO DE VALORES. ART. ART. 10, CAPUT E INCISOS I E VIII DA LEI Nº 8.429/1992. DOLO EVIDENCIADO. CONDENAÇÃO IMPOSITIVA, EM RELAÇÃO A ALGUNS DOS RÉUS. PROPORCIONALIDADE DAS SANÇÕES. MULTA CIVIL. JUROS LEGAIS E CORREÇÃO MONETÁRIA1. Hipótese em que restaram comprovadas as imputações consistentes em causar lesão ao erário por meio de ação dolosa, que ensejou perda patrimonial ao erário municipal, através da frustração da licitude e da competitividade de processos licitatórios indevidamente fracionados, celebrados com evidente direcionamento para uma única empresa, sendo os serviços pagos sem qualquer controle da entrada dos materiais e serviços contratados, encontrando previsão legal no art. 10 da Lei nº 8.429/92 .2. Prova suficientemente categórica, examinada em seu conjunto, a evidenciar que licitações realizadas pelo Município de Lajeado do Bugre para perfuração e para manutenção de poços artesianos, por meio de cartas-convites, nos anos de 2006, 2007 e 2008, foram inafastavelmente fraudulentas, verdadeiros simulacros de licitações, totalmente dirigidas para a contratação de uma mesma e única empresa, a Sul Poços Artesianos Ltda., e seu respectivo preposto Luiz Mozart de Ávila Costa, com a participação pessoal e dolosa do então Prefeito Otaviano e do servidor Claudimar, então Secretário Municipal de Administração, causando inequívoco prejuízo patrimonial ao erário .3. As propostas de preços das demais concorrentes eram carreadas aos expedientes apenas para lhes dar ares de licitude, sem que os seus signatários possam ser responsabilizados, na medida em que não há evidência de que aderiram ao esquema ilícito, nem prova alguma há de que tiveram qualquer vantagem patrimonial com tal participação. Impositiva absolvição dos demais réus da ação civil, incluindo também a servidora que atuava no setor contábil, em função de confiança, cumprindo ordens dos seus superiores, e que colaborou decisivamente na posterior apuração dos fatos e responsabilização dos culpados .4. Ação julgada improcedente na origem. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (TJ-RS - AC: 70081758120 RS, Relator: Eduardo Uhlein, Data de Julgamento: 12/02/2021, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: 12/07/2021). DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5 º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. A prescrição é instituto que milita em favor da estabilização das relações sociais. 2. Há, no entanto, uma série de exceções explícitas no texto constitucional, como a prática dos crimes de racismo (art. 5º, XLII, CRFB) e da ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV, CRFB). 3. O texto constitucional é expresso (art. 37, § 5º, CRFB) ao prever que a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos na esfera cível ou penal, aqui entendidas em sentido amplo, que gerem prejuízo ao erário e sejam praticados por qualquer agente. 4. A Constituição, no mesmo dispositivo (art. 37, § 5º, CRFB) decota de tal comando para o Legislador as ações cíveis de ressarcimento ao erário, tornando-as, assim, imprescritíveis. 5. São, portanto, imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. 6. Parcial provimento do recurso extraordinário para (i) afastar a prescrição da sanção de ressarcimento e (ii) determinar que o tribunal recorrido, superada a preliminar de mérito pela imprescritibilidade das ações de ressarcimento por improbidade administrativa, aprecie o mérito apenas quanto à pretensão de ressarcimento."(STF - RE 852475/SP. Rel. Min. Alexandre de Moraes. Data de julgamento: 08/08/2018. Data da publicação: 25/03/2019). Por fim, passo à análise das demais infrações atribuídas ao requerido ANGELIM, quais sejam, contrações de assessoria jurídica, assessoria técnica contábil, funcionária para o Posto da Policia Rodoviária Federal, despesas com gêneros alimentícios excessivos ou que não condizem com a manutenção das atividades da Câmara Municipal, patrocínio de eventos com recursos públicos e ajuda financeira para compra de materiais diversos. Concernente às contrações de assessoria jurídica e assessoria técnica contábil (excetuada a contratação do escritório Mayr Godoy, em razão de existir ação específica para tal), em que pese a existência de cargos de Procurador Jurídico, Técnico em Contabilidade, Assessor Financeiro e Assessor Técnico Legislativo no quadro de pessoal da Câmara, não se verifica a irregularidade nas contratações, tendo em vista a ausência de comprovação de sobrepreço ou de que apenas os profissionais do ente seriam suficientes para todas as demandas do Poder Legislativo, não havendo que se enquadrar quaisquer das contratações jurídicas ou contábeis como atos dolosos com o fim de ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, tampouco de liberação de verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influição de qualquer forma para a sua aplicação irregular. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – RECEBIMENTO DA AÇÃO - CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO - SINGULARIDADE DO SERVIÇO E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO - ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E PREJUÍZO AO ERÁRIO NÃO EVIDECIADOS – FALTA DE JUSTA CAUSA PARA O RECEBIMENTO DA AÇÃO – DECISÃO CASSADA – AGRAVO PROVIDO. 1 – Em que pese a regra da obrigatoriedade da licitação para a contratação serviços, pelo ente público, a própria lei prevê as exceções, que inclui a hipótese de inexigibilidade. 2 - A presença dos requisitos de notória especialização e confiança, ao lado do relevo do trabalho contratado, permite concluir, a depender do caso, pela inexigibilidade da licitação para a contratação dos serviços de advocacia. 3 - A contratação de advogado e/ou escritório de advocacia, pelo Município, mediante inexigibilidade de licitação, por si só, não é considerada ato de improbidade, na medida em que se comprovam a necessidade/utilidade para a Administração e o interesse público, mormente ausente demonstração de prejuízo. (TJ-MT 10030411920168110000 MT, Relator: GILBERTO LOPES BUSSIKI, Data de Julgamento: 21/06/2021, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 07/07/2021). No que tange à contratação de Débora Fernandes Borges como Assessora Parlamentar de Gabinete, com remuneração de R$ 850,00 (oitocentos e cinquenta reais) mensais para a prestação de serviços no posto da Policia Rodoviária Federal (PRF), totalizando R$ 2.579,12 (dois mil quinhentos e setenta e nove reais e doze centavos), verifica-se a comprovação de ato doloso consubstanciado no fato de ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, haja vista que a referida funcionária foi falsamente contratada como Assessora Parlamentar de Gabinete, sendo que sua real função era a de trabalhar para a PRF, quando não é competência do Legislativo Municipal o provimento de cargos federais. No que se refere às despesas com aquisições de gêneros alimentícios e materiais de limpeza, inobstante a singularidade de alguns produtos adquiridos, entendo que as compras assinaladas não se encaixam no campo da improbidade administrativa, já que não ficou demonstrado sobrepreço ou ação dolosa com intuito de ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, tampouco de liberação de verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influição de qualquer forma para a sua aplicação irregular, tratando-se de mera irregularidade administrativa. Do mesmo modo, as condutas do requerido de fornecer patrocínio de eventos com recursos públicos e ajuda financeira para compra de materiais diversos não se reveste de grau de ofensividade suficiente para se atribuir a tais atos as sanções aplicáveis aos atos de improbidade administrativa, ante ausência de comprovação de sobrepreço ou ação dolosa com intuito de ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, tampouco de liberação de verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influição de qualquer forma para a sua aplicação irregular, tratando-se de mera irregularidade administrativa. Veja-se: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – AUSÊNCIA DE DOLO – MERA IRREGULARIDADE - VIOLAÇÃO NÃO CONFIGURADA – RECURSO NÃO PROVIDO A Lei 8.429/1992 é instrumento salutar na defesa da moralidade administrativa, porém sua aplicação deve ser feita com cautela, evitando-se a imposição de sanções em face de erros toleráveis e meras irregularidades. Nessa linha de pensamento, se não estiver evidenciado o dolo do administrador público, o que configura mera irregularidade administrativa, deve o magistrado aplicar a Lei de Improbidade Administrativa com a devida cautela, na medida em que não se pode determinar suas penalidades em face de erros toleráveis ou, ainda, de meras irregularidades administrativas. A conduta não se reveste de grau de ofensividade suficiente para ser alcançada pela Lei de Improbidade Administrativa, primeiro pela ausência de precedentes e segundo pela ausência de conduta dolosa. Nem toda ilegalidade pode ser erigida em ato de improbidade administrativa. Há a necessidade de incidir em dolo e má-fé. (TJ-MT 00013862720118110025 MT, Relator: MARCIO APARECIDO GUEDES, Data de Julgamento: 10/03/2021, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 17/03/2021). A única exceção à fundamentação do parágrafo anterior, é a despesa juntada no id 40627172 - Pág. 3/10, pagamento de anuidade profissional ao Conselho Regional de Contabilidade de Mato Grosso (CRC/MT) no montante de R$ 500,00 (quinhentos reais), tendo em vista a ausência de justificativa e autorização legal para a Câmara pagar as anuidades de seu contador junto ao CRC, eis que tal obrigação é de caráter pessoal do profissional junto ao supramencionado órgão de classe. Portanto, demonstrou-se a atuação inequivocamente dolosa do requerido em ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, quando efetuou o pagamento das anuidades do CRC de seu contador. Desse modo, entendo presentes os requisitos exigidos para a condenação do requerido ANGELIM DOS SANTOS BARALDI pela prática dolosa de atos de improbidade administrativa, consubstanciados no fato de que efetuou o fracionamento indevido da contratação dos serviços de construção da sede da Câmara Municipal, no valor de R$ 790.249,71 (setecentos e noventa mil duzentos e quarenta e nove reais e setenta e um centavos), causando ao erário o prejuízo de R$ 91.362,45 (noventa e um mil trezentos e sessenta e dois reais e quarenta e cinco centavos); contratou Assessora Parlamentar de Gabinete para trabalhar como secretaria no posto da PRF causando dano ao erário total de R$ 2.579,12 (dois mil quinhentos e setenta e nove reais e doze centavos); bem como realizou o pagamento de anuidade profissional de contador do quadro de pessoal da Câmara ao Conselho Regional de Contabilidade de Mato Grosso (CRC/MT), no montante de R$ 500,00 (quinhentos reais). Portanto, comprovado que os atos apontados foram efetuados dolosamente com o objetivo de liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular, nos termos do art. 10, XI, da Lei nº 8.429/92, ou com o fim de ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, consoante disposto no art. 10, IX, da Lei nº 8.429/92, bem como tendo essas ações causado o dano de R$ 94.441,57 (noventa e quatro mil quatrocentos e quarenta e um reais e cinquenta e sete centavos), de rigor sua condenação. Assim, restando patentes os atos de improbidade administrativa praticados pelo requerido ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, a responsabilização é ilação da qual não se pode fugir. As sanções aplicadas serão a perda da função pública, caso ainda esteja exercendo qualquer função pública, já que os requerido não demonstra comportamento adequado a continuar integrando o quadro da administração, no exercício de cargo, emprego ou função, conforme disposição do art. 12, II, da Lei nº 8.429/92; suspensão dos direitos políticos, considerando que os atos cometidos pelo requerido atentaram contra a administração pública, conforme o disposto no art. 12, II, da Lei nº 8.429/92; pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano causado ao erário, considerando o prejuízo acarretado aos cofres públicos, consoante art. 12, II, da Lei nº 8.429/92. Quanto ao requerido SESTILIO SEGUNDO FRIZON, restou demonstrado que houve ação dolosa com o objetivo de liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular, nos termos do art. 10, XI, da Lei nº 8.429/92, uma vez que efetuou o fracionamento indevido da contratação dos serviços de construção da sede da Câmara Municipal, no valor de R$ 1.611.229,22 (um milhão seiscentos e onze mil duzentos e vinte e nove reais e vinte e dois centavos), causando ao erário o prejuízo de R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos). Assim, ante a prescrição da pretensão sancionatória dos atos de improbidade, o requerido supracitado deve ser condenado apenas ao ressarcimento do prejuízo causado aos cofres públicos, esse que é imprescritível, conforme entendimento firmado pelo STF. Ante o exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO INICIAL, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR os requeridos às seguintes sanções individualizadas: 1. SESTILIO SEGUNDO FRIZON: a. Ressarcir ao erário a quantia de R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos), com correção monetária e juros moratórios a partir do evento danoso. 2. ANGELIM DOS SANTOS BARALDI: a. Pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano no montante de R$ 94.441,57 (noventa e quatro mil quatrocentos e quarenta e um reais e cinquenta e sete centavos), nos termos do art. 12, II, da Lei nº 8.429/92, com correção monetária e juros moratórios a partir do evento danoso; b. Perda da função pública, nos termos do art. 12, II, da Lei nº 8.429/92, limitado ao vínculo de mesma qualidade e natureza que o agente público ou político detinha com o poder público na época do cometimento da infração, conforme § 1º do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa; c. Suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 3 (três) anos, nos termos do art. 12, II, da Lei nº 8.429/92. Deixo de condenar a parte requerida em honorários advocatícios, embora o faça com relação as custas e despesas processuais. Após o trânsito em julgado, comunique-se ao Cadastro Nacional de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade Administrativa e Inelegibilidade e ao Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS), bem como certifique-se e remetam-se os autos ao arquivo definitivo com as baixas necessárias. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário, com as cautelas de estilo. Primavera do Leste/MT, data da assinatura eletrônica. Fabrício Sávio da Veiga Carlota Juiz de Direito”. Em suas razões recursais, a parte apelante aduz a ausência de prejuízo ao erário, diante da comprovada necessidade de parcelamento da obra e a inexistência de má-fé da parte apelante, que agiu em respeito às normas e orçamento disponível, além de ter efetivamente entregue toda a obra. Argumenta, nesse contexto, que o artigo 23, § 1°, da Lei n.° 8.666/93, vigente à época, autoriza o parcelamento desde que o objeto seja divisível e não haja prejuízo para a totalidade da licitação, situação na qual deve ser verificada a viabilidade técnica do projeto e se representa vantagem para a administração. Sustenta, ademais, houve um equívoco de interpretação pelo Ministério Público ao considerar irregulares os procedimentos licitatórios, pois o teto para obras e serviços de engenharia é de R$ 150.000,00 para a utilização da modalidade convite. Por essas razões, requer (ID. 184949675): “B.1- O recebimento do presente recurso nos seus efeitos devolutivo e no efeito suspensivo, nos termos do Art. 1.012 do CPC; B.2- A concessão da tramitação da demanda de forma prioritária, considerando se tratar de idoso; B.3- A concessão do benefício da justiça gratuita, ante a demonstrada incapacidade financeira do apelante; B.4- No mérito o provimento do presente recurso para que reforme a sentença guerreada a fim de dar integral desprovimento a inicial da presente Ação Civil Pública no que tange o apelante, ante a clara ausência de prejuízo, dolo, bem como ofensa legal acima demonstrados; B.5- Utiliza-se da presente apelação para fins de prequestionamento dos artigos de lei apontados na presente peça; B.6- A condenação do recorrido ao pagamento das despesas processuais e sucumbência”. Nas contrarrazões, a parte apelada defende que as irregularidades foram constatadas por auditoria realizada pelo Tribunal de Contas, com valor executado acima do estimado, motivo pelo qual pugna pelo não provimento do recurso (ID. 184949679). Regularizada a representação dos sucessores de Angelim dos Santos Baraldi (ID. 282867388), não foi interposto recurso. A Procuradoria-Geral de Justiça se manifesta pelo provimento do recurso para desconstituir a condenação de SESTILIO SEGUNDO FRISON (ID. 190895159) e opina, no que se refere ao espólio de ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, que eventual apuração de sua conduta deve observar a regra do artigo 8°, da Lei n.° 8.429/92 (ID. 284030895). É o relatório. VOTO DA RELATORA EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO Egrégia Câmara: Como relatado, trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO, interposto pelo SESTILIO SEGUNDO FRIZON, contra a sentença proferida pelo Excelentíssimo Juiz de Direito, Dr. Fabrício Sávio da Veiga Carlota, nos autos de n.° 0007765-79.2010.811.0037, em trâmite perante a 4ª Vara da Comarca de Primavera do Leste, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos. Extrai-se do processado que o SESTILIO SEGUNDO FRIZON ajuizou “AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E RESSARCIMENTO DE DANO AO ERÁRIO, COM PEDIDO LIMINAR”, em desfavor de SESTÍLIO SEGUNDO FRISON e ANGELIN DOS SANTOS BARALDI, pela prática de nepotismo, além do fracionamento indevido das licitações pertinentes à construção da Câmara Municipal de Primavera do Leste/MT, despesas com materiais não pertinentes com as necessidades da administração e patrocínio de eventos, apoios culturais e ajuda financeira para compra de materiais diversos, estranhos à finalidade da Câmara de Vereadores. Notificados, nos termos do artigo 17, § 7°, da Lei n.° 8.429/92, consoante redação vigente à época, ANGELIM DOS SANTOS BARALDI e SESTILIO SEGUNDO FRIZON apresentaram defesa preliminar (ID. 184949161 – pág. 68/82 e ID. 184949163 – pág. 51/74), sendo a petição inicial recebida (ID. 184949163 – 94/102), com a posterior citação dos requeridos. SESTÍLIO SEGUNDO FRIZON contestou a ação ID. 184949172 – 27/41), impugnada sob o ID. 184949172 – pág. 121 e ID. 184949175 – pág. 15), e ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, por deixar decorrer o prazo legal, teve a sua revelia decretada (ID. 184949175 – pág. 27). Durante a instrução, foram ouvidas as testemunhas Sergio Denardi, Henrique Alexandre Gatto e Valmor Exequiel Di Domênico (ID. 184949666). Apresentadas alegações finais (ID. 184949668, 184949670 e 184949671), sobreveio a sentença, já transcrita no relatório, contra a qual se insurge SESTÍLIO SEGUNDO FRIZON. Com essas considerações, passo à análise das insurgências recursais. DO PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA De proêmio, aponta-se que SESTILIO SEGUNDO FRIZON solicitou a concessão dos benefícios da justiça gratuita, uma vez que o pagamento do preparo constitui requisito de admissibilidade do recurso. À vista disso, a concessão ou não da assistência judiciária gratuita deve ser ponderada em cada caso específico, em conformidade com os elementos existentes no processo e com amparo no Código de Processo Civil e na Constituição Federal, que objetivam a facilitação do acesso à justiça. Os artigos 98 e 99, do Código de Processo Civil assim dispõem: “Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. § 1º A gratuidade da justiça compreende: I - as taxas ou as custas judiciais; II - os selos postais; III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios; IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse; V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais; VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira; VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução; VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório; IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido. § 2º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência. § 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. § 4º A concessão de gratuidade não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas. § 5º A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 6º Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 7º Aplica-se o disposto no art. 95, §§ 3º a 5º , ao custeio dos emolumentos previstos no § 1º, inciso IX, do presente artigo, observada a tabela e as condições da lei estadual ou distrital respectiva. § 8º Na hipótese do § 1º, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o § 6º deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento. Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. § 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso. § 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos. § 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. § 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça. § 5º Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade. § 6º O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos. § 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento”. Na mesma vertente, o inciso LXXIV, do artigo 5.º, da Constituição Federal, disciplina em seu texto legal que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Sob esse aspecto, cabe ao julgador formular o seu entendimento a respeito da questão, para que a aplicação indiscriminada da norma benéfica não desvirtue sua finalidade, que é garantir o acesso à justiça àqueles que, de fato, necessitam do benefício. In casu, de acordo com o despacho lançado no ID. 283062374, a parte apelante foi intimada para comprovar a alegada incapacidade financeira e, na manifestação de ID. 287124398, instruída com documentos, cumpriu a exigência legal. Sendo assim, presentes os requisitos, DEFIRO, ao apelante SESTILIO SEGUNDO FRIZON, os benefícios da justiça gratuita na seara recursal. DO MÉRITO RECURSAL Da análise da questão posta, verifica-se que o juízo a quo, condenou o apelante SESTILIO SEGUNDO FRIZON, pela prática de ato típico do artigo 10, inciso XI, da Lei n.° 8.429/92, ao ressarcimento ao erário da quantia de R$ 186.250,58 (cento e oitenta e seis mil e duzentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos), deixando de aplicar as penalidades descritas no artigo 12, inciso II, da referida Lei, em razão da prescrição da pretensão sancionatória dos atos de improbidade. Com efeito, salienta-se que os pedidos de ressarcimento, fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado, conforme definido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Leading Case n.° 852475 (Tema n.° 897), no qual fixou a tese no sentido de que: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”. A partir do tema supratranscrito, vê-se que o ressarcimento ao erário, conquanto imprescritível, subordina-se à prévia análise da ocorrência, ou não, do ato de improbidade administrativa e o elemento subjetivo doloso, ainda que inaplicáveis, por efeitos temporais, as demais sanções previstas na Lei n.° 8.429/92. Nesse aspecto, sabe-se que a Lei n.° 14.230/21 modificou diversos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa, incluindo, expressamente, os princípios do Direito Administrativo Sancionador, no artigo 1°, § 4°, da Lei n.° 8.429/92, in verbis: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (...) § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador”. Por se tratar de desmembramento do direito sancionador penal, os mesmos princípios e garantias a ele assegurados, tais como os princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da segurança jurídica, da retroatividade da lei benéfica, individualização da pena, além da razoabilidade e proporcionalidade, devem ser observados na esfera administrativa. Dentre os princípios mencionados, sobreleva-se o da retroatividade da norma mais benéfica, previsto no artigo 5°, inciso XL, da Constituição da República. Veja-se: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Nesse encadeamento, a retroatividade da lei mais benéfica incide ao campo administrativo e judicial sancionador, cenário no qual estão inseridos os atos ímprobos, justamente porque, assim como a norma penal, a Lei n.° 8.429/92 prevê, em seu corpo estrutural, um coletivo de sanções e penalidades aos agentes públicos. Ademais, a regra do art. 6°, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que prevê o tempus regit actum, não prevalece quanto ao aspecto material, porquanto a natureza jurídica da norma que disciplina o ato de improbidade e suas consequências é sancionatória, o que atrai a incidência do artigo 5°, inciso XL, da Constituição Federal, já transcrito nesse voto. Nessa toada, a retroatividade da lei benigna insere-se em princípio constitucional com aplicabilidade para todo o exercício do jus puniendi estatal, nele inserido a improbidade administrativa. Igualmente, convém relembrar que o artigo 9°, do Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil com status supralegal, ao replicar o princípio da retroatividade da lei mais benéfica, não o cingiu à norma penal, sendo, portanto, aplicável ao direito sancionador como um todo. Transcrevo: “Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito. Se depois da perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinqüente será por isso beneficiado”. A propósito, acerca da aplicação da retroatividade da lei mais benéfica aos processos administrativos sancionadores, assim reconheceu o Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. (...) 2. O processo administrativo disciplinar é uma espécie de direito sancionador. Por essa razão, a Primeira Turma do STJ declarou que o princípio da retroatividade mais benéfica deve ser aplicado também no âmbito dos processos administrativos disciplinares. (...)”. ( AgInt no RMS 65.486/RO, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/08/2021, DJe 26/08/2021). “DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA AO ACUSADO. APLICABILIDADE. EFEITOS PATRIMONIAIS. PERÍODO ANTERIOR À IMPETRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 269 E 271 DO STF. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. (...) III – Tratando-se de diploma legal mais favorável ao acusado, de rigor a aplicação da Lei Municipal n° 13.530/03, porquanto o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, insculpido no artigo 5°, XL, da Constituição da República, alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador. Precedente. IV – Dessarte, cumpre à Administração Pública do Município de São Paulo rever a dosimetria da Sanção, observando a legislação mais benéfica ao Recorrente, mantendo-se indenes os demais atos processuais (...) VI – Recurso em Mandado de Segurança Parcialmente provido”. (STJ, RMS 37.031/SP, Rel. Min. Helena Costa, 1ª Turma, DJ de 20/02/2018). “ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PODER DE POLÍCIA. SUNAB. MULTA ADMINISTRATIVA. RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA. POSSIBILIDADE. ART. 5º, XL, DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA. PRINCÍPIO DO DIREITO SANCIONATÓRIO. AFASTADA A APLICAÇÃO DA MULTA DO ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. I. O art. 5º, XL, da Constituição da Republica prevê a possibilidade de retroatividade da lei penal, sendo cabível extrair-se do dispositivo constitucional princípio implícito do Direito Sancionatório, segundo o qual a lei mais benéfica retroage. Precedente. (...)”. (REsp 1153083/MT, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, Rel. p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/11/2014, DJe 19/11/2014). As mudanças mais benéficas da nova lei, de natureza material, portanto, retroagem em benefício de agentes públicos ou terceiros, cujas demandas tenham sido distribuídas com base na redação anterior da Lei de Improbidade Administrativa. A propósito, a celeuma quanto à aplicação do princípio da retroatividade, alcançando fatos e atos praticados sob a vigência do texto que precede a reforma, chegou ao colendo Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do ARE 843.989, reconheceu a Repercussão Geral (Tema n.° 1.199), fixou a seguinte tese: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. IRRETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA (LEI 14.230/2021) PARA A RESPONSABILIDADE POR ATOS ILÍCITOS CIVIS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 8.429/92). NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DE REGRAS RÍGIDAS DE REGÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS CORRUPTOS PREVISTAS NO ARTIGO 37 DA CF. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 5º, XL DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL AO DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR POR AUSÊNCIA DE EXPRESSA PREVISÃO NORMATIVA. APLICAÇÃO DOS NOVOS DISPOSITIVOS LEGAIS SOMENTE A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA LEI, OBSERVADO O RESPEITO AO ATO JURÍDICO PERFEITO E A COISA JULGADA (CF, ART. 5º, XXXVI). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO COM A FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL PARA O TEMA 1199. 1. A Lei de Improbidade Administrativa, de 2 de junho de 1992, representou uma das maiores conquistas do povo brasileiro no combate à corrupção e à má gestão dos recursos públicos. 2. O aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público foi uma grande preocupação do legislador constituinte, ao estabelecer, no art. 37 da Constituição Federal, verdadeiros códigos de conduta à Administração Pública e aos seus agentes, prevendo, inclusive, pela primeira vez no texto constitucional, a possibilidade de responsabilização e aplicação de graves sanções pela prática de atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF). 3. A Constituição de 1988 privilegiou o combate à improbidade administrativa, para evitar que os agentes públicos atuem em detrimento do Estado, pois, como já salientava Platão, na clássica obra REPÚBLICA, a punição e o afastamento da vida pública dos agentes corruptos pretendem fixar uma regra proibitiva para que os servidores públicos não se deixem "induzir por preço nenhum a agir em detrimento dos interesses do Estado”. 4. O combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no seio do Poder Público, com graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados. 5. A corrupção é a negativa do Estado Constitucional, que tem por missão a manutenção da retidão e da honestidade na conduta dos negócios públicos, pois não só desvia os recursos necessários para a efetiva e eficiente prestação dos serviços públicos, mas também corrói os pilares do Estado de Direito e contamina a necessária legitimidade dos detentores de cargos públicos, vital para a preservação da Democracia representativa. 6. A Lei 14.230/2021 não excluiu a natureza civil dos atos de improbidade administrativa e suas sanções, pois essa “natureza civil” retira seu substrato normativo diretamente do texto constitucional, conforme reconhecido pacificamente por essa SUPREMA CORTE (TEMA 576 de Repercussão Geral, de minha relatoria, RE n° 976.566/PA). 7. O ato de improbidade administrativa é um ato ilícito civil qualificado – “ilegalidade qualificada pela prática de corrupção” – e exige, para a sua consumação, um desvio de conduta do agente público, devidamente tipificado em lei, e que, no exercício indevido de suas funções, afaste-se dos padrões éticos e morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas (artigo 9º da LIA) ou gerar prejuízos ao patrimônio público (artigo 10 da LIA), mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções, apesar de ferir os princípios e preceitos básicos da administração pública (artigo 11 da LIA). 8. A Lei 14.230/2021 reiterou, expressamente, a regra geral de necessidade de comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação do ato de improbidade administrativa, exigindo – em todas as hipóteses – a presença do elemento subjetivo do tipo – DOLO, conforme se verifica nas novas redações dos artigos 1º, §§ 1º e 2º; 9º, 10, 11; bem como na revogação do artigo 5º. 9. Não se admite responsabilidade objetiva no âmbito de aplicação da lei de improbidade administrativa desde a edição da Lei 8.429/92 e, a partir da Lei 14.230/2021, foi revogada a modalidade culposa prevista no artigo 10 da LIA. 10. A opção do legislador em alterar a lei de improbidade administrativa com a supressão da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa foi clara e plenamente válida, uma vez que é a própria Constituição Federal que delega à legislação ordinária a forma e tipificação dos atos de improbidade administrativa e a gradação das sanções constitucionalmente estabelecidas (CF, art. 37, §4º). 11. O princípio da retroatividade da lei penal, consagrado no inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal (“a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”) não tem aplicação automática para a responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de expressa previsão legal e sob pena de desrespeito à constitucionalização das regras rígidas de regência da Administração Pública e responsabilização dos agentes públicos corruptos com flagrante desrespeito e enfraquecimento do Direito Administrativo Sancionador. 12. Ao revogar a modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, entretanto, a Lei 14.230/2021, não trouxe qualquer previsão de “anistia” geral para todos aqueles que, nesses mais de 30 anos de aplicação da LIA, foram condenados pela forma culposa de artigo 10; nem tampouco determinou, expressamente, sua retroatividade ou mesmo estabeleceu uma regra de transição que pudesse auxiliar o intérprete na aplicação dessa norma – revogação do ato de improbidade administrativa culposo – em situações diversas como ações em andamento, condenações não transitadas em julgado e condenações transitadas em julgado. 13. A norma mais benéfica prevista pela Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa –, portanto, não é retroativa e, consequentemente, não tem incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes. Observância do artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal. 14. Os prazos prescricionais previstos em lei garantem a segurança jurídica, a estabilidade e a previsibilidade do ordenamento jurídico; fixando termos exatos para que o Poder Público possa aplicar as sanções derivadas de condenação por ato de improbidade administrativa. 15. A prescrição é o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela INÉRCIA do próprio Estado. A prescrição prende-se à noção de perda do direito de punir do Estado por sua negligência, ineficiência ou incompetência em determinado lapso de tempo. 16. Sem INÉRCIA não há PRESCRIÇÃO. Sem INÉRCIA não há sancionamento ao titular da pretensão. Sem INÉRCIA não há possibilidade de se afastar a proteção à probidade e ao patrimônio público. 17. Na aplicação do novo regime prescricional – novos prazos e prescrição intercorrente – , há necessidade de observância dos princípios da segurança jurídica, do acesso à Justiça e da proteção da confiança, com a IRRETROATIVIDADE da Lei 14.230/2021, garantindo-se a plena eficácia dos atos praticados validamente antes da alteração legislativa. 18. Inaplicabilidade dos prazos prescricionais da nova lei às ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa, que permanecem imprescritíveis, conforme decidido pelo Plenário da CORTE, no TEMA 897, Repercussão Geral no RE 852.475, Red. p/Acórdão: Min. EDSON FACHIN. 19. Recurso Extraordinário PROVIDO. Fixação de tese de repercussão geral para o Tema 1199: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). (Grifo nosso). À vista disso, a despeito do entendimento quanto à irretroatividade da nova lei quanto à prescrição e às demandas já transitadas em julgado, o STF ressalvou a sua retroação benéfica em relação à revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, enfatizando a necessidade de comprovação da responsabilidade subjetiva – dolo – a todos os atos tipificados nos artigos 9°, 10 e 11, da Lei 8.429/92, nas ações pendentes de julgamento. Avançando sobre os atos imputados ao apelante, o dispositivo indicado na sentença, qual seja o artigo 10, incisos XI, da Lei n.° 8.429/92, possuía a seguinte redação vigente à época da propositura da ação: “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: [...] XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; [...]”. Entretanto, a partir das alterações promovidas pela Lei n.° 14.230/21, no que se refere ao artigo 10, inciso XI, a condenação pela prática de ato de improbidade, assim tipificado, passa pela fundamental demonstração de prejuízo ao erário em decorrência de ato doloso, com base na seguinte redação legal: “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: [...]”. Como pode ser observado, o dispositivo atualmente vigente revogou a possibilidade de responsabilização por ato culposo e, além disso, a responsabilização por dano presumido ficou expressamente afastada, devendo ser comprovada a efetiva perda patrimonial. Sobre o tema, Rafael de Oliveira Costa e Renato Kim Barbosa doutrinam: “O inciso VIII do artigo 10 da Lei n. 8.429/1992 teve a sua redação alterada pela Lei n. 14.230/2021. Antes da mudança, considerava-se improbidade administrativa frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente. E, agora, para a configuração dessa subespécie de improbidade administrativa, é necessário que tal conduta acarrete "perda patrimonial efetiva", conforme a exigência expressa incluída pela referida lei ao final do dispositivo em questão. Anteriormente à referida alteração legislativa era predominante na jurisprudência o entendimento de que o dano ao erário era presumido nessa situação ( REsp n. 1.771.593/SE): "O STJ entende que, para a caracterização de improbidade administrativa por frustração da licitude do processo de licitação [...], o dano apresenta-se presumido, ou seja, trata--se de dano in re ipsa." Porém, a nova redação do dispositivo em apreço afastou expressamente esse entendimento, exigindo uma efetiva perda patrimonial para o erário, aferível conforme o valor médio praticado no mercado. Assim, incide em tal norma quem de qualquer forma frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para a celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos." Frustrar "significa impedir, atravancar, fazer falhar, não corresponder à expectativa. Também pratica essa específica subespécie de improbidade administrativa quem dispensa indevidamente tais procedimentos. E, reitera-se, faz-se necessária uma lesão concreta ao erário para ambas as figuras, em razão da contratação, v.g., de um serviço comprovadamente mais caro”. (Costa, Rafael de Oliveira Nova Lei de improbidade administrativa : atualizada de acordo com a Lei n. 14.230/2021 / Rafael de Oliveira Costa, Renato Kim Barbosa. - São Paulo: Almedina, 2022 .fls. 100/101). Dessa maneira, a análise quanto à prática do ato de improbidade que causa prejuízo ao erário perpassa pelo exame da questão relacionada ao elemento material, o dano, de caráter objetivo, bem como ao elemento volitivo, de natureza subjetiva. Essa perspectiva, a propósito, impõe um overrinding dos precedentes jurisprudenciais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, que compreendiam o dano erário in re ipsa (presumido) para a configuração do ato de improbidade decorrente da frustração da licitude de processo licitatório. A interpretação até então vigente, era no sentido de que a dispensa ou a irregularidade na licitação, mesmo que os serviços contratados tenham sido prestados à administração, ainda assim presumia-se a referida conduta como lesiva ao patrimônio. Todavia, à luz da atual redação do artigo 10, inciso XI, da Lei n.° 8.429/92, a falta de prejuízo efetivamente comprovado desconfigura a liberação de verba pública, sem a estrita observância das normas pertinentes, como ato de improbidade que importa em lesão ao erário. No cotejo fático, a despeito do prejuízo ao erário apontado pelo Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso, não se verifica, no caso em questão, a demonstração do elemento volitivo do agente público. Nesse aspecto, salienta-se que diferentemente do dolo genérico, anteriormente admitido pela jurisprudência, que se refere à simples vontade de cometer o ato, o dolo específico requer a intenção consciente de lesar o patrimônio público. É necessário comprovar, assim, que o agente público agiu de forma deliberada, com plena ciência dos efeitos danosos de sua conduta. Fernando Capez, ao tratar do dolo na improbidade administrativa, explica que “Não basta, todavia, o dolo genérico, consistente na consciência e vontade de praticar o ato e produzir o resultado. Agora, é necessário, além disso, a finalidade especial do agente de violar a lei. Em outras palavras, exige-se que tenha consciência e vontade de realizar a conduta para buscar um fim ilícito” (CAPEZ, Fernando. O dolo penal na improbidade administrativa. Disponível em: https://www.conjur.com. br/2021-dez-09/controversias-juridicas-dolo-penal-improbidade-administrativa). Assim, além da realização intencional de uma das condutas descritas nos tipos dos artigos 9°, 10 e 11, da Lei n. 8.429/92, deve agir de forma consciente e intencional de realizar todos os elementos da definição legal, com o objetivo inequívoco de buscar um resultado moralmente afrontoso à ordem jurídica. No mesmo sentido, Marçal Justen Filho, leciona que “apenas existe improbidade nos casos em que o agente estatal tiver consciência da natureza indevida da sua conduta e atuar de modo consciente para produzir esse resultado”. Em outros termos, o autor conceitua a demonstração do dolo como “a consciência do sujeito quanto à antijuridicidade de sua conduta e a vontade de praticar a ação ou omissão necessária à consumação da infração” (JUSTEN FILHO, Marçal. Reforma da Lei de Improbidade Administrativa comentada e comparada: Lei 14.230, de 25 de outubro de 2021. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. p. 36). E, do exame da questão posta, vislumbra-se que o dolo inequívoco e específico do apelante não foi comprovado no processado, na medida em que não se encontra demonstrada a intenção maliciosa dos agentes, porquanto, nos termos do § 1°, do artigo 11, da Lei n.° 8.429/92, aplicável a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa, somente haverá improbidade administrativa quando for comprovado na conduta do agente público o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade, elementos que também não foram evidenciados na hipótese. Frisa-se, ademais, que a inobservância aos requisitos da legalidade essenciais para a efetivação do processo licitatório, diferentemente da conclusão do julgador singular, por si só, não evidencia o elemento subjetivo para a configuração da improbidade, mormente pelo fato de que não se busca punir, por essa via, o gestor e agente público inábil, mas o desonesto. À vista disso, ausentes os elementos que indiquem a prática de ato com dolo específico de causar danos, bem como a comprovação do prejuízo efetivo ao erário, impõe-se reforma da sentença condenatória. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – UTILIZAÇÃO DE MAQUINÁRIO E SERVIDOR PÚBLICO EM PROPRIEDADE PARTICULAR – ABERTURA DE RUA – INTERESSE PÚBLICO - AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO E DO ELEMENTO SUBJETIVO PARA A CONFIGURAÇÃO DO ATO ÍMPROBO – ART. 10, INCISO VIII, E ART. 11, CAPUT, DA LIA – NÃO CARACTERIZADO – RECURSO PROVIDO. A Lei de Improbidade visa punir o agente desonesto, ou seja, aquele que não pauta a sua conduta de acordo com a moralidade administrativa (honestidade, lealdade, boa-fé), atuando, determinadamente, a obter uma vantagem ilícita que o exercício do cargo possa lhe assegurar. Inexistindo prova suficiente de que a utilização do maquinário e de servidor do Município se deu para fins de interesse particular, afasta-se não só as evidências de imoralidade administrativa por desvio de finalidade, como também o apontado prejuízo ao erário”. (TJ-MT - APL: 00007009720108110048 MT, Relator: JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA, Data de Julgamento: 22/10/2019, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Data de Publicação: 19/11/2019). “REEXAME NECESSÁRIO DE SENTENÇA COM RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – ART. 10, INCISO VIII, E ART. 11, CAPUT, DA LIA – AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO – MÁ-FÉ OU DESONESTIDADE NÃO DEMONSTRADOS – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADA – SENTENÇA RATIFICADA – RECURSO DESPROVIDO. 1. (...) Segundo o entendimento uníssono do Superior Tribunal de Justiça, "não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudência do STJ considera indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos eivada de culpa grave, nas do artigo 10"(AIA 30/AM, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Corte Especial, DJe 28/09/2011). 2. A utilização de maquinários e servidores públicos para retirada de cascalho em propriedade privada, sem a comprovação de vantagem indevida ao particular, com destinação do objeto à obra pública, atende ao interesse público, não restando comprovada a prática de ato ímprobo. 3. Recurso desprovido. Sentença ratificada”. (TJMT - Apelação / Remessa Necessária 59230/2017, DESA. MARIA EROTIDES KNEIP BARANJAK, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 02/04/2018, Publicado no DJE 25/04/2018) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE – INQUÉRITO CIVIL – CELEBRAÇÃO DE TERMO DE PARCERIA COM ESCOPO DE LEI MUNICIPAL Nº. 412/2009 – AUSÊNCIA DE DOLO E MÁ FÉ – DESPESAS REALIZADAS EM PROL DO MUNÍCIPIO – COMPROVAÇÃO – DANO AO ERÁRIO OU ENRIQUECIMENTO ILICITO DOS REQUERIDOS NÃO COMPROVADO – INEXISTÊNCIA DE PROVAS QUE IMPORTEM NO COMETIMENTO DE QUALQUER ATO ÍMPROBO - RECURSO DESPROVIDO. 1. A lei de improbidade visa punir o comportamento imoral do agente, havendo que se comprovar o exercício indevido de suas funções, afastando-se dos padrões éticos e morais da sociedade, pretendendo obter vantagens indevidas. 2. A acusação por atos de improbidade administrativa, além da legislação específica deve ser levado em conta os pressupostos e conceitos processuais do próprio processo, qual seja, compete ao acusador a obrigação de produzir todas as provas capazes de ultrapassar os limites da presunção de inocência do Requerido. 3. No caso, a ação baseou-se única e exclusivamente na declaração de que os requeridos estariam utilizando maquinários, combustível e servidor público, para fins particulares. Todavia, o Autor sequer buscou provas para a demonstração da existência de ato ímprobo e, sob este aspecto, não se desincumbiu do ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito, conforme determina o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil de 1973. 4. Assim, não se verifica a comprovação dos fatos articulados na inicial. Tudo ficou limitado ao discurso do suposto cometimento do ato pelos Requeridos, sem a devida demonstração. 5) Nesse contexto, não havendo a comprovação da ocorrência do ato necessário à configuração da improbidade administrativa, inexequível a condenação às penas da Lei nº 8.429/92”. (TJMT - Ap 73547/2016, DESA. MARIA APARECIDA RIBEIRO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 03/07/2017, Publicado no DJE 10/07/2017). De outra parte, registra-se que, nos termos do artigo 1.005, do Código de Processo Civil, o recurso interposto por um dos litisconsortes no processo, a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses, in verbis: “Art. 1.005. O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses. Parágrafo único. Havendo solidariedade passiva, o recurso interposto por um devedor aproveitará aos outros quando as defesas opostas ao credor lhes forem comuns”. Nesse contexto, do exame dos elementos e circunstâncias que envolvem a controvérsia, vislumbra-se que a situação jurídica do apelante e do espólio de ANGELIM DOS SANTOS BARALDI é a mesma, qual seja, não consta do processado elementos probatórios quanto à presença do elemento volitivo, consubstanciado no dolo específico de causar prejuízo ao erário, o que permite a extensão dos efeitos recursais ao litisconsorte, na mesma condição, que não tenha interposto recurso de apelação. A propósito, sobre o aproveitamento do recurso aos que figuram no mesmo polo da demanda, colacionam-se os ensinamentos de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (in Novo Código de Processo Civil Comentado. Revista dos Tribunais, 2015. p. 937): “Trata-se de caso particular em que há extensão subjetiva do recurso sem que exista litisconsórcio unitário. O art. 1.005, parágrafo único, CPC, deve ser lido conjuntamente com o art. 274, CC: havendo solidariedade em um dos polos do processo, afirmando um dos consortes questão favorável comum, o julgamento benéfico a todos aproveita”. Ante o exposto, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por SESTILIO SEGUNDO FRIZON, para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos iniciais, estendendo os efeitos absolutórios ao espólio de ANGELIM DOS SANTOS BARALDI, nos termos do artigo 1.005, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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