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Cristiane Silva Lima x Safra Credito, Financiamento E Investimento S.A.

ID: 263055135

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE PEIXOTO DE AZEVEDO Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1001350-17.2024.8.11.0023

Data de Disponibilização: 30/04/2025

Polo Ativo:

CRISTIANE SILVA LIMA

Polo Passivo:

SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

Sentença

Advogados:

FREDERICO DUNICE PEREIRA BRITO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

DIEGO GOMES DIAS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE PEIXOTO DE AZEVEDO SENTENÇA Processo: 1001350-17.2024.8.11.0023. REQUERENTE: CRISTIANE SILVA LIMA REQUERIDO: SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIME… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE PEIXOTO DE AZEVEDO SENTENÇA Processo: 1001350-17.2024.8.11.0023. REQUERENTE: CRISTIANE SILVA LIMA REQUERIDO: SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. Vistos. I- Relatório Trata-se de ação revisional de contrato bancário com pedido de tutela antecipada ajuizada por CRISTIANE SILVA LIMA em face de SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., todos qualificados nos autos. Alega, em síntese, que: i) em 07/07/2023 realizou com a parte ré um contrato de adesão - FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR, para obtenção de um carro da marca: JEEP, modelo: COMPASS; ii) o valor total financiado foi de R$ 73.429,01 (setenta e três mil, quatrocentos e vinte e nove reais e um centavos) a serem pagos em 48 parcelas de R$ 2.409,02. A parcela, como pactuado, possui por vencimento dia 06 de cada mês, de modo que, somente a partir de então, induz em mora do devedor; iii) após análise do contrato, verificou-se que a taxa de juros remuneratórios não condiz com a prevista no contrato, de modo diverso observamos uma aplicação maior do que o pactuado. Diante disso, requer, a concessão da tutela antecipada de urgência, a fim de: limitar a parcela paga a título de financiamento à taxa pactuada, cujo valor recai a R$ 2.364,74 conforme cálculos anexos, bem como proibir a inclusão da parte autora em órgãos de proteção ao crédito e manter o veículo em sua posse. No mérito, requer a conversão da tutela antecipada em definitiva, com o julgamento da total procedência da demanda. Com a inicial, juntou documentos. Foram concedidos os benefícios da justiça gratuita, bem como indeferido o pedido liminar (id. 162886480). Citado, o requerido apresentou contestação (id. 166483701). Houve réplica (id. 184215055). Intimados para especificarem provas, as partes requereram o julgamento antecipado da lide (id. 185923698 e id. 187940248). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. II- Fundamentação Tendo em vista que o feito versa sobre matéria unicamente de direito e não necessita de maior dilação probatória, declaro o julgamento antecipado da lide, com fulcro no art. 355, I do CPC. Passo a análise das preliminares suscitadas. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Quanto ao pedido de condenação do autor por litigância de má-fé, diante da ausência das hipóteses previstas no art. 80, do CPC, não há que se falar em sua condenação, restando rejeitado tal pedido. DA INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL- IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO EX OFÍCIO DAS SUPOSTAS CLÁUSULAS ABUSIVAS (SÚMULA 381 DO STJ) Deixo de apreciar a preliminar de impossibilidade de revisão ex ofício das cláusulas “ditas” abusivas Súmula n. 381 do STJ neste momento, uma vez que esta se confunde com o mérito, razão pela qual remeto seu julgamento para a sentença. INÉPCIA DA INICIAL – DA AUSÊNCIA DE DEPÓSITOS INCONTROVERSOS – CARÊNCIA DE AÇÃO - DA FALTA DE INTERESSE DE AGIR Todas as preliminares descritas acima (inépcia da inicial, carência da ação e falta de interesse de agir) baseiam-se na alegação de que não fora juntado aos autos depósito do valor incontroverso. Cumpre esclarecer que a comprovação do valor incontroverso não é condição para a propositura de ação de revisão contratual. No mais, não verifico a presença de pedido de consignação em pagamento – que diz respeito à faculdade do autor e não obsta a propositura de ação revisional – assim, havendo apontamento de forma específica quanto aos encargos contratuais que se pretende a revisão e quantificando o valor incontroverso, a petição inicial está em consonância com o art. 319 e seguintes c/c art. 330, §2°, todos do CPC. Ainda, convém anotar que eventuais depósitos dos valores incontroversos se baseiam na tentativa de elidir os efeitos da mora, que, inclusive, não foi concedida em sede de tutela (id. 162886480). Não obstante, vale ressaltar que quanto ao parágrafo 3º do art. 330 que dispõe que “Na hipótese do § 2º, o valor incontroverso deverá continuar a ser pago no tempo e modo contratados.” De mais a mais, não evidencio nos autos a notícia de que os pagamentos do contrato foram descumpridos. Sobre o tema, colaciono precedente: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE EXTINÇÃO. RECURSO DO AUTOR. MÉRITO. EXISTÊNCIA DO PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO ANTE A DISCRIMINAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS QUE PRETENDE CONTROVERTER E INDICAÇÃO DO VALOR INCONTROVERSO. EXEGESE DO ARTIGO. 330, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE DEPÓSITO DOS VALORES INCONTROVERSOS QUE GERA EFEITOS RELATIVO A MORA, NÃO ACARRETANDO EM NOVA CONDIÇÃO ESPECÍFICA DA AÇÃO REVISIONAL. EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO QUE OFENDE O PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA (ARTIGO 5º, INCISO XXXV, CF/88). DISPOSIÇÕES LEGAIS OBSERVADAS, NÃO HAVENDO QUE FALAR EM INDEFERIMENTO DA INICIAL EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE DEPÓSITO DO VALOR INCONTROVERSO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. "Em se tratando de ação de revisão contratual, o depósito do valor incontroverso não caracteriza condição específica da ação, tornando-se apenas necessário que estejam preenchidos os requisitos estipulados pelos §§ 2º e 3º do artigo 330 do CPC." (TJ-SC - AC: 03130494820188240038 Joinville 0313049-48.2018.8.24.0038,Relator: Guilherme Nunes Born, Data de Julgamento: 14/02/2019, Primeira Câmara de Direito Comercial)- Grifo nosso. Além disso, necessário se faz o preenchimento de algum dos incisos do art. 330, §1°, do CPC para caracterização da inépcia da inicial: “§ 1º Considera-se inepta a petição inicial quando: I – lhe faltar pedido ou causa de pedir; II – o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV – contiver pedidos incompatíveis entre si. § 2º Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito. § 3º Na hipótese do § 2º, o valor incontroverso deverá continuar a ser pago no tempo e modo contratados.” A petição inicial está devidamente fundamentada, com pedidos compatíveis entre si e acompanhada dos documentos imprescindíveis ao pleito, portanto, ausentes vícios capazes de maculá-la. Portanto, AFASTO a preliminar arguida. DA IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA No que se refere a preliminar de indevida concessão da gratuidade da justiça, a parte requerida não apresentou elementos probatórios capazes de demonstrar a inexistência ou o desaparecimento dos elementos que motivaram o deferimento da gratuidade de justiça, limitando- se apenas a pugnar pelo indeferimento do benefício pleiteado. Portanto, rejeito a preliminar arguida. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA A relação jurídica firmada entre as partes é tipicamente de consumo, sendo regulada pela Lei nº 8078/1990 - Código de Defesa do Consumidor. Destaca-se que, a empresa ré, se enquadra com maestria no conceito de fornecedor, trazida pelo art. 3º do Código de Defesa do Consumidor. De igual modo, a parte autora, destinatária final do serviço prestado pela ré, enquadra-se na figura de consumidor, nos termos do artigo 2º do citado diploma normativo. Uma vez determinada a relação de consumo, resta corroborar o encargo probatório, diante do pleito de inversão do ônus da prova, postulado pela autora. O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 6º, inciso VIII, estabelece que: Art. 6 CDC: São direitos básicos do consumidor: (...) VIII, a facilitação da defesa dos seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando o critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.” A inversão do ônus da prova pressupõe a presença de alguns requisitos, a saber, alternativamente, a verossimilhança da alegação ou a hipossuficiência do consumidor. Não há, pois, obrigatoriedade de coexistência, segundo doutrina e jurisprudência praticamente uníssonas. Tais pressupostos, vinculam-se à averiguação, por parte do Magistrado, de acordo com os argumentos e elementos carreados aos autos, assim como as máximas de experiência. Analisando a hipótese vertente, encontra-se delineada a hipossuficiência do consumidor, diante da situação privilegiada de que desfruta o fornecedor, com relação à produção de provas. No que se refere à inversão, mister reconhecer que se aplica para facilitação da defesa em Juízo do consumidor, em face da hipossuficiência ou verossimilhança de sua alegação, o que restou evidenciado no caso em apreço. Feitas as considerações iniciais e definida a relação consumerista, passa-se à apreciação da pretensão autoral. DO MÉRITO A ação revisional de contrato tem o objetivo de anular disposições contratuais abusivas e decotar da dívida os encargos que porventura sejam ilegais, via de consequência, sua procedência (total ou parcial) tem o condão somente de ajustar o valor das parcelas contratuais ao que realmente é devido, e não o de afastar a própria dívida. A relativização do princípio da obrigatoriedade dos contratos com intervenção do Judiciário nas avenças firmadas entre particulares é permitida quando constatadas cláusulas ilegais e abusivas, exigindo-se para tanto, requerimento expresso da parte contratante (Súmula 381, STJ). Ademais, o tema em discussão refere-se à possibilidade da modificação ou revisão das cláusulas contratuais quando há prestações desproporcionais ou hajam fatos supervenientes que tornem excessivamente onerosas as prestações, consoante previsão do art. 6º, inc. III e art. 46, ambos do CDC, normas de ordem pública e interesse social, nos termos do art. 5º, inc. XXXII, e art. 170, inc. V, da CF/88, e art. 48 de suas Disposições Transitórias, sem que isso implique insegurança jurídica. Desse modo, descabe falar em força obrigatória do contrato ou em boa-fé contratual se há nele obrigações ilícitas e abusivas para a parte hipossuficiente da relação negocial, tornando-se possível a revisão das cláusulas do contrato objeto da lide, isto é, a teoria revisionista. Pois bem. No caso dos autos, verifica-se que a parte autora não nega a pactuação do contrato anexado pelo banco réu em sua contestação (id. 166483714), apenas se insurge em relação ao valor cobrado, o qual, no seu entender, fora onerado com a cobrança de encargos considerados abusivos ou ilegais. Verifico que pretensão se restringe ao contrato crédito bancário, tendo, no mesmo ato a autora alienado fiduciariamente ao credor um veículo da marca JEEP, modelo: COMPASS. No entanto, em análise dos instrumentos contratuais, conclui-se que o pedido revisional não encontra amparo. No tocante à viabilidade de limitação dos juros em 12% (doze por cento) ao ano, o tema, depois de acesa discussão, mormente a partir da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988, foi pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, por meio da Súmula nº 596 e da Súmula Vinculante nº 7, segundo as quais as instituições financeiras não estão sujeitas à limitação dos juros remuneratórios determinada pelo Decreto nº 22.626/33. Tal como o STF, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça prestigia também a tese de que as partes podem estipular livremente os juros remuneratórios, como se vê do teor da Súmula 382, a qual dispõe que: "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade". Desse modo, poder-se-ia entender que haveria liberdade legal na fixação da taxa de juros. Não é essa, porém, a interpretação que vem sendo adotada de modo geral. Isto porque os juros livres propiciariam arbitrariedades e excessos que não se compatibilizam com os princípios norteadores do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil de 2002. Essa conclusão pode ser deduzida da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que, ao deliberar sobre a limitação dos juros remuneratórios em contratos bancários, em sede de recurso repetitivo, pacificou o entendimento de que pode ser reconhecida a abusividade dos juros pactuados se a taxa estipulada for mais de uma vez e meia superior à média praticada pelo mercado (Recurso Especial nº 1.061.530/RS). Assim, o fato de a taxa de juros remuneratórios praticada pela instituição financeira exceder a taxa média do mercado não induz, por si só, a conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa em um mero referencial a ser considerado e não em um limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras. Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros. Aliás, a revisão do percentual de juros remuneratórios contratado é medida excepcionalíssima, admissível somente quando cabalmente demonstrada a sua abusividade em relação à taxa média do mercado, tendo a jurisprudência do STJ se fixado no sentido que são abusivas as taxas de juros remuneratórios superiores a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da média (REsp 1.061.530/RS do STJ). Senão, vejamos: AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DO CONTRATO. LIMITAÇÃO JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXA MÉDIA DE MERCADO. AUSÊNCIA DE FATO NOVO. DECISÃO MANTIDA.1. Manifesta a abusividade acerca da estipulação da taxa de juros remuneratórios, possível sua limitação à média do mercado à época da contratação. Inteligência do Recurso Repetitivo nº 1.061.530/RS. 2. A abusividade das taxas de juros remuneratórios contratadas exsurge quando o percentual avençado for superior a uma vez e meia, ou ao dobro ou ao triplo da taxa média de mercado.3. Ausente inconsistência na decisão vergastada e/ou inovação fático-jurídica, é o caso de negar provimento ao segundo agravo interno. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5088906-61.2023.8.09.0093, Rel. Des(a). RODRIGO DE SILVEIRA, 10ª Câmara Cível, julgado em 01/07/2024, DJe de 01/07/2024) (grifo nosso). Dito isso, no caso em comento, verifica-se que o contrato foi celebrado aos 07/07/2023, no qual há previsão de taxa de juros de 2,03% a.m. e 24,31% a.a., os quais não se mostram demasiadamente acima da taxa média de juros cobrados à época da contratação, conforme se extrai do histórico de taxa de juros retirado site do BACEN (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico?historicotaxajurosdiario_page=1&codigo Segmento=1&codigoModalidade=221101&tipoModalidade=D&InicioPeriodo=2021-05-27). Logo, denoto que a pactuação entre as partes não se mostra abusiva, pois próxima da taxa média divulgada pelo BACEN para essa espécie de operação financeira, no período de contratação. Dessarte, considerando que a taxa firmada no instrumento não está eivada de abusividade, a manutenção dos juros remuneratórios consoante pactuado no contrato discutido é medida que se impõe. Da tarifa de registro de contrato No que tange à cobrança de “registro do contrato”, o Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.578.553-SP, fixou a seguinte tese: “2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto.” (TEMA 958/STJ – Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO – DJe de 06/12/2018). No caso dos autos, o valor cobrado a título de tarifa de registro de cadastro R$ (316,00) mostra-se razoável e proporcional, não havendo que se falar em ilegalidade ou abusividade, uma vez que a recorrente teve prévio acesso ao valor que seria cobrado e mesmo assim firmou o compromisso. Ademais, a parte requerida acostou aos autos uma tela do Sistema Nacional de Gravames (id. 166483713) que mostra que o gravame foi emitido em 13/07/2023. Da tarifa de cadastro É válida a cláusula que estipula a cobrança da tarifa de cadastro nos contratos celebrados a partir da vigência da Resolução nº 3.518/2007 do Conselho Monetária Nacional, com a ressalva de que a tarifa somente pode ser cobrada no início de relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. A validade da cobrança, a priori decidida em sede de julgamento de recurso repetitivo (STJ, REsp nº 1.251.331/RS), restou consolidada na Súmula nº 566 do C. STJ: “Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira.” No caso, a referida tarifa foi expressamente prevista no contrato, e não bastasse a previsão contratual expressa e o atendimento do ato normativo, não há indícios de que a tarifa de cadastro de R$ 870,00 prevista no contrato de id. 166483714, propiciou vantagem exagerada à instituição financeira. Da tarifa de avaliação de bem Na forma do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.578.526/SP (Tema 958), é válida a cobrança da taxa de avaliação do bem, desde que efetivamente prestado o serviço correspondente, como ocorrera na hipótese. Assim, no que tange à tarifa de avaliação de bem, é perceptível na presente demanda a legalidade da taxa, posto que restou evidenciada a efetiva prestação do serviço pela instituição financeira, conforme termo de avaliação do veículo (id. 166483701, págs.70/71), notadamente por se tratar o veículo adquirido de bem usado. Assim, deve ser rejeitado o pedido de restituição do mencionado valor. Quanto a repetição de indébito, descabe qualquer discussão, uma vez que não houve pagamento indevido e ainda que tivesse a relação havida entre as partes não é consumerista, sendo indevida. É o quanto basta ao deslinde do feito. III- Dispositivo Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais e extingo o processo, com resolução de mérito, com fundamento no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil e da fundamentação supra. Considerando a sucumbência, condeno o autor ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º ou § 8º, do CPC, observando-se, contudo, a suspensão da exigibilidade, em razão da concessão da gratuidade de justiça em seu favor. Interposto recurso de apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo legal, e, não arguindo o(s) apelado(s) questão referida no §1º, art. 1.009, CPC, ou recorrendo adesivamente, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal de Justiça com as cautelas de praxe e homenagens deste juízo. Implementado o trânsito em julgado sem que as partes manifestem no prazo de 15 (quinze) dias subsequentes, arquivem-se. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário. Peixoto de Azevedo, data registrada no sistema. João Zibordi Lara Juiz Substituto

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Bradesco Auto/Re Companhia De Seguros x Energisa Mato Grosso - Distribuidora De Energia S.A.

ID: 336902864

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1001350-35.2024.8.11.0017

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS

Polo Passivo:

ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A.

Intimação

Advogados:

JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA SENTENÇA Processo: 1001350-35.2024.8.11.0017. AUTOR(A): BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS REU: ENERGISA MATO GROSSO - DISTR… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA SENTENÇA Processo: 1001350-35.2024.8.11.0017. AUTOR(A): BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS REU: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. Vistos etc. I. RELATÓRIO Trata-se de Ação Regressiva de Ressarcimento de Danos proposta por BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS em face de ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., por meio da qual a parte autora, na qualidade de seguradora sub-rogada, busca o ressarcimento do valor de R$ 4.450,00 (quatro mil quatrocentos e cinquenta reais), desembolsado para indenizar sua segurada, ISABEL ALVES CRUZ, por danos elétricos em uma geladeira. Narra a petição inicial (ID 161802854) que a autora, empresa seguradora, celebrou contrato de seguro com a Sra. Isabel Alves Cruz, apólice nº 846071649, cobrindo, entre outros, danos elétricos na unidade consumidora localizada na Estrada Rural, Zona Rural, Luciára/MT. Informa que, em 20 de fevereiro de 2024, o local do risco foi acometido por oscilações na rede de energia elétrica fornecida pela requerida, evento que teria danificado uma geladeira Consul. Após a abertura do sinistro nº 114202402222063, a segurada contatou empresa especializada, cujo laudo técnico teria constatado que a causa dos danos se deu devido a oscilações de energia oriundas de descargas elétricas. A segurada foi indenizada em 06 de março de 2024 no valor de R$ 4.450,00, já deduzida a franquia de R$ 650,00, de um total apurado de R$ 5.100,00. Aduz a parte autora que os danos decorreram da má qualidade da energia elétrica fornecida pela requerida, com tensão fora dos padrões estabelecidos pela ANEEL, configurando responsabilidade objetiva da concessionária de serviço público, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, da Lei nº 8.987/1995, da Lei nº 9.427/96 e das normas da ANEEL (PRODIST Módulo 8 e 9). Sustenta que o laudo de oficina, previsto e regulamentado pela ANEEL (PRODIST Módulo 9, artigo 18), demonstra o nexo causal entre os danos e a má qualidade do produto fornecido pela ré, gerando a obrigação de ressarcir, salvo contraprova específica da concessionária, conforme o artigo 21 do mesmo Módulo. Argumenta que, para afastar sua responsabilidade, a ré deveria comprovar a qualidade da energia entregue mediante a apresentação de relatórios específicos, conforme o artigo 26 do PRODIST Módulo 9. Defende a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso, por sub-rogação nos direitos da segurada (CC 786, STF 188), o que impõe a inversão do ônus da prova (CDC 14, § 3º, e 6º, VIII) ou, subsidiariamente, a distribuição dinâmica do ônus da prova (CPC 373, § 1º), dada a hipossuficiência técnica da autora em relação aos dados da rede de distribuição da ré. Requer a procedência da ação para condenar a ré ao ressarcimento do valor pago (R$ 4.450,00), acrescido de correção monetária e juros, além das custas processuais e honorários advocatícios. Manifestou desinteresse na audiência de conciliação. A petição inicial veio instruída com documentos (ID 161802856 a ID 161802887), incluindo atos constitutivos da autora, procurações, substabelecimentos, cartão CNPJ da ré, documentos da segurada, laudo de regulação de sinistro, relatório fotográfico, autorização para pagamento de sinistro e pagamento em conta corrente da segurada. As custas iniciais foram recolhidas (ID 162235299). A inicial foi recebida (ID 162382551), tendo sido dispensada a audiência de conciliação e determinada a citação da parte requerida para apresentar contestação, bem como a intimação das partes para especificarem provas após a contestação ou réplica. A parte requerida, ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., apresentou contestação (ID 164633666), arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa ad causam da seguradora, sob o argumento de que não foi comprovado o vínculo contratual entre a segurada, Isabel Alves Cruz, e a concessionária. Alega que a busca em seu sistema não localizou unidades cadastradas em nome da segurada, sendo indispensável a comprovação da condição de titular do contrato de prestação de serviços para a sub-rogação. No mérito, sustenta a improcedência da demanda. Afirma que, embora seja responsável pelo fornecimento de energia em tensão adequada e pela segurança da rede, os danos podem ocorrer por descarga atmosférica que atinja a residência ou arredores, sem atingir diretamente a rede, caso em que a concessionária não teria responsabilidade. Menciona a possibilidade de danos serem evitados por aterramento na residência. Pediu a utilização da prova emprestada dos autos 0724861 73.2019.8.07.0001, em que realizado estudo pelo expert este constatou a ocorrência de descarga atmosférica no dia dos fatos, nas proximidades da residência do consumidor e não diretamente da rede de energia elétrica. Disse que a responsabilidade da concessionária não abrange todo e qualquer surto atmosférico que atinja a propriedade do consumidor, conforme a Resolução ANEEL 1000/2021 e o Módulo Prodist 9. Argumenta que o laudo apresentado pela autora (ID 161802885) é genérico, inconclusivo, unilateral, sem assinatura de profissional registrado no CREA, baseado em inspeção visual superficial e que, ainda assim, aponta a origem do dano como descarga atmosférica, o que afastaria o nexo causal. Cita a Súmula nº 80 do TJGO sobre a insuficiência de laudo unilateral. Alega cerceamento de defesa, pois não foi comunicada do problema à época para apurar os fatos e avaliar os danos, e que a cultura das seguradoras de juntar laudos genéricos prejudica a ampla defesa. Sustenta que a responsabilidade objetiva não é integral e é excluída na ausência de nexo causal. Argumenta que o uso incorreto pelo usuário, responsável pelas instalações internas, pode causar danos. Defende a necessidade de perícia técnica nos aparelhos avariados para elucidação da causa e extensão dos danos, sob pena de cerceamento de defesa, requerendo que a autora informe se possui as peças danificadas para a perícia. Impugna a inversão do ônus da prova, alegando que não é automática e depende de verossimilhança e hipossuficiência, requisitos que não estariam presentes, pois a autora é empresa especializada com aparato para produzir provas, e que seria prova diabólica para a ré. Subsidiariamente, caso haja condenação, requer que a correção monetária e os juros incidam a partir da citação. Requer o acolhimento da preliminar de ilegitimidade ativa ou a improcedência dos pedidos. A parte autora apresentou réplica (ID 179142326), refutando a preliminar de ilegitimidade ativa, reiterando que a segurada realizou reclamação administrativa (protocolo nº 178586892) e que a ré foi inerte, perdendo a oportunidade de vistoriar. Reafirma a sub-rogação nos direitos da segurada com o pagamento da indenização (CC 349, 786, STF 188) e que não é necessário que a unidade consumidora esteja em nome da segurada, pois o dano deve ser ressarcido a quem o sofreu, mesmo como consumidor por equiparação. Impugna a prova emprestada apresentada pela ré, por não guardar ligação com os fatos dos autos. No mérito, reitera a responsabilidade objetiva da ré (CF 37 §6º, CDC). Defende a validade do laudo de oficina com base nas normas da ANEEL (PRODIST Módulo 09, item 18, RN 1.000/21 art. 616 par. único), que não exigem profissional com CREA ou credenciamento pela concessionária, e que o laudo é imparcial por ser produzido por terceiros. Afirma que a simulação computacional da ré é vedada pela Súmula 15 da ANEEL (sem ementa). Sustenta que a ocorrência de descargas atmosféricas é risco interno e previsível da atividade da ré, não configurando caso fortuito ou força maior excludente de responsabilidade. Refuta a alegação de culpa concorrente ou exclusiva da segurada, pois os fatores que causaram os danos são de exclusiva responsabilidade da ré. Argumenta que a necessidade de dispositivos de proteção nas residências (NBR 5419, NBR 5410) não é obrigatória para o caso e não afasta a responsabilidade da ré. Impugna a necessidade de perícia técnica, alegando que o lapso temporal prejudicaria a análise e que os laudos já comprovam o nexo causal. Sustenta que a preservação dos equipamentos danificados seria obrigação iníqua e abusiva (CDC 51, IV). Reitera a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova, pois a ré tem melhores condições de provar a ausência de oscilações, devendo apresentar os relatórios do PRODIST Módulo 09, item 26 e 29. Requer que os juros moratórios incidam a partir do desembolso, por se tratar de responsabilidade extracontratual (CC 389, 395, 398, 406, CTN 161 §1º, STJ Súmulas 43 e 54). Em manifestação (ID 179910057), a parte requerida reiterou a preliminar de ilegitimidade ativa pela ausência de comprovação do direito à sub-rogação, ante a não localização da unidade consumidora no sistema da concessionária com os dados fornecidos (ID 164644492), o que configuraria cerceamento de defesa pela impossibilidade de elaborar o relatório do Módulo PRODIST 9. Reafirmou que os laudos da autora são lacônicos, sem respaldo técnico e indicam Descarga Elétrica Atmosférica (DEA), afastando o nexo causal. Reiterou a necessidade de perícia técnica nos aparelhos danificados e nos dados do sistema da ré, citando julgados do TJDFT e a Súmula 80 do TJGO (sem ementas). Requereu a intimação da autora para juntar o número da UC e informar sobre a disponibilidade das peças danificadas para perícia, sob pena de extinção. Certidão de conclusão dos autos para deliberação (ID 182745481). É o relatório. Decido II - FUNDAMENTAÇÃO O presente feito comporta julgamento no estado em que se encontra, uma vez que a matéria controvertida é eminentemente de direito e os fatos relevantes encontram-se suficientemente demonstrados pela prova documental já produzida, sendo desnecessária a produção de outras provas, inclusive a pericial requerida subsidiariamente pela parte ré. Das Preliminares Da ilegitimidade ativa: A parte requerida arguiu preliminar de ilegitimidade ativa da parte autora, sob o fundamento de que não restou comprovado o vínculo contratual entre a segurada, Sra. Isabel Alves Cruz, e a concessionária de energia elétrica. Alega que a busca em seu sistema com os dados fornecidos pela autora não permitiu a localização de uma unidade consumidora em nome da segurada, o que impediria a sub-rogação e a elaboração do relatório do Módulo PRODIST 9, configurando cerceamento de defesa. A parte autora, por sua vez, defende sua legitimidade ativa com base na sub-rogação legal decorrente do pagamento da indenização securitária, nos termos do artigo 786 do Código Civil e da Súmula 188 do Supremo Tribunal Federal. Argumenta que a sub-rogação transfere todos os direitos e ações da segurada para a seguradora, e que a responsabilidade da concessionária abrange não apenas os titulares diretos das unidades consumidoras, mas também os consumidores por equiparação que utilizam o serviço e sofrem danos. Sustenta que a segurada realizou reclamação administrativa junto à ré, que se manteve inerte, e que a não localização da unidade consumidora pela ré pode decorrer de falha em seu próprio sistema. A preliminar de ilegitimidade ativa não merece prosperar. A sub-rogação legal da seguradora nos direitos do segurado, até o limite do valor indenizado, é matéria pacífica e encontra amparo no ordenamento jurídico pátrio, conforme o disposto no artigo 786 do Código Civil. Uma vez efetuado o pagamento da indenização securitária, a seguradora assume a posição jurídica do segurado em relação ao causador do dano, podendo buscar o ressarcimento dos valores despendidos. Ademais, a relação jurídica estabelecida entre a concessionária de serviço público de energia elétrica e os usuários do serviço é regida pelas normas do Código de Defesa do Consumidor. O conceito de consumidor, para fins de aplicação da legislação consumerista, abrange não apenas o destinatário final direto do produto ou serviço, mas também aqueles que, embora não sejam parte direta na relação contratual, são equiparados a consumidores por terem sido vítimas de evento danoso decorrente do serviço, conforme o artigo 17 do CDC. No contexto do fornecimento de energia elétrica, os danos causados a equipamentos instalados em uma unidade consumidora por falha na prestação do serviço atingem o usuário que se beneficia da energia, independentemente de ser o titular da conta de energia. A responsabilidade da concessionária, sendo objetiva, decorre do risco da atividade e do dever de fornecer serviço adequado e seguro. Neste sentido, colaciono o seguinte julgado: DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO. AÇÃO REGRESSIVA. RESSARCIMENTO DE VALORES PAGOS A SEGURADO . DANOS ORIUNDOS DA OSCILAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. SUB-ROGAÇÃO DA SEGURADORA. FATO CONSTITUTIVO DA PRETENSÃO AUTORAL COMPROVADO. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA . FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. CAUSAS DE EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE NÃO DEMONSTRADAS. ÔNUS DA PARTE REQUERIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO . SENTENÇA MANTIDA. 1) A preliminar de ilegitimidade ativa não merece acolhimento, pois a seguradora é parte legítima para cobrar do causador do dano o valor da indenização securitária, ainda que o segurado não seja o titular da unidade consumidora. Precedentes desta Corte. (...) . 6) Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. (TJ-AM - AC: 06199606720218040001 Manaus, Relator.: Paulo César Caminha e Lima, Data de Julgamento: 07/11/2023, Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: 07/11/2023) (grifei) Assim, a alegação da requerida de que não localizou a unidade consumidora em nome da segurada não é suficiente para afastar a legitimidade ativa da seguradora sub-rogada. A autora apresentou documentos que indicam a segurada, seu CPF, endereço e a ocorrência do sinistro na referida localidade. Caberia à concessionária, com base nesses dados e em seus registros internos, verificar a existência de fornecimento de energia no endereço indicado e a ocorrência de eventos na rede que pudessem ter causado os danos. A dificuldade ou impossibilidade da ré em localizar a unidade consumidora com os dados fornecidos não invalida a sub-rogação nem a possibilidade de a segurada ser usuária do serviço, ainda que não titular da conta. A preliminar, portanto, é rejeitada. Do Mérito A controvérsia principal reside na apuração da responsabilidade da concessionária requerida pelos danos elétricos alegadamente sofridos na unidade consumidora da segurada da parte autora. A parte autora imputa à ré a responsabilidade objetiva por falha na prestação do serviço, decorrente da má qualidade da energia fornecida, enquanto a ré nega o nexo causal, aponta a possibilidade de causas externas à rede de distribuição (como descargas atmosféricas diretas na residência) e questiona a validade e conclusividade do laudo apresentado pela autora. II.1 - Da Responsabilidade Civil da Concessionária de Serviço Público A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos é objetiva, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. Tal dispositivo estabelece que essas entidades responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. A Lei nº 8.987/1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, corrobora essa responsabilidade, impondo à concessionária a execução do serviço concedido e a responsabilidade por todos os prejuízos causados aos usuários ou a terceiros (art. 25). No caso específico do fornecimento de energia elétrica, a responsabilidade da concessionária abrange não apenas a continuidade do serviço (qualidade de serviço), mas também a qualidade da energia fornecida (qualidade de produto), ou seja, a manutenção da tensão dentro dos padrões estabelecidos pela ANEEL. Danos causados a equipamentos elétricos em decorrência de oscilações ou descargas na rede de distribuição configuram falha na prestação do serviço, atraindo a responsabilidade objetiva da concessionária. II.2 - Da Sub-rogação da Seguradora A parte autora, na qualidade de seguradora, ao indenizar sua segurada pelos danos sofridos, sub-rogou-se nos direitos e ações que a esta competiam contra a causadora do dano, nos limites do valor indenizado. Este direito de sub-rogação encontra amparo no artigo 786 do Código Civil e é reconhecido pela Súmula 188 do Supremo Tribunal Federal, que estabelece: “O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro”. Assim, a seguradora, ao buscar o ressarcimento junto à concessionária de energia elétrica, age no exercício de um direito que lhe foi transferido por força de lei e do contrato de seguro, assumindo a posição jurídica do consumidor lesado. II.3 - Da Aplicação do Código de Defesa do Consumidor e do Ônus da Prova A relação jurídica estabelecida entre o consumidor e a concessionária de energia elétrica é de consumo, sujeitando-se às normas do Código de Defesa do Consumidor. A parte autora, sub-rogada nos direitos do consumidor, também se beneficia das disposições consumeristas, incluindo a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços por defeitos relativos à sua prestação (art. 14, CDC) e a facilitação da defesa de seus direitos. Contudo, no presente caso, não se mostra cabível a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC. Isso porque a parte autora, na condição de seguradora, possui estrutura e expertise para produzir as provas necessárias à demonstração de seu direito, não se encontrando em situação de vulnerabilidade ou hipossuficiência técnica em relação à concessionária ré. Não obstante, poderá ser aplicada a distribuição dinâmica do ônus da prova, nos termos do artigo 373, § 1º, do CPC, caso se verifique, no caso concreto, a excessiva dificuldade ou impossibilidade de uma das partes em produzir determinada prova, ou a maior facilidade da outra em fazê-lo. II.4 - Da Análise do Nexo Causal e das Excludentes de Responsabilidade A parte autora apresentou laudo de oficina (ID 161802885, pg. 1) que, embora sucinto, conclui que a causa dos danos se deu devido a oscilações de energia oriundas de descargas elétricas. A autora interpreta essa conclusão como decorrente de distúrbios na rede de distribuição da ré. A ré, por sua vez, interpreta "descargas elétricas" como descargas atmosféricas (raios) que poderiam ter atingido a residência diretamente, sem relação com a rede, e questiona a validade técnica do laudo por ser unilateral e sem assinatura de profissional com CREA. As normas da ANEEL, em especial o PRODIST Módulo 9, estabelecem procedimentos para a apuração de danos elétricos e o ressarcimento aos consumidores. O artigo 18 do Módulo 9 define o laudo de oficina como documento que detalha o dano e tem o intuito de confirmar se o dano tem origem elétrica. O artigo 21 do mesmo Módulo prevê que, caso o laudo de oficina confirme a origem elétrica do dano, há obrigação de ressarcir o equipamento reclamado. Embora a ré conteste a validade do laudo apresentado pela autora, as normas regulamentares não impõem a necessidade de o laudo ser elaborado por profissional com registro no CREA ou por oficina credenciada pela concessionária para ter validade probatória, permitindo ao consumidor apresentar laudos de oficina não credenciada (RN 1.000/21, art. 616, parágrafo único). Mais relevante, contudo, é a disciplina do ônus da prova e da apuração do nexo causal estabelecida pela ANEEL. O PRODIST Módulo 9, nos artigos 25 e seguintes, detalha o exame de nexo causal e estabelece que a concessionária deve investigar a existência do nexo, considerando registros de ocorrências em sua rede. O artigo 26 lista os relatórios que, na ausência de registro, levam à conclusão de que não houve perturbação na rede que pudesse ter afetado a unidade consumidora. O artigo 29 é categórico ao dispor que todos os relatórios listados no item 26 devem constar no processo individualizado e que, caso contrário, considera-se que efetivamente houve perturbação. Diante dessa regulamentação específica, que distribui o ônus da prova de forma dinâmica e impõe à concessionária o dever de comprovar a ausência de perturbação na rede mediante a apresentação de relatórios detalhados, a alegação da ré de que o laudo da autora é insuficiente ou inconclusivo perde força. A ré, em sua contestação e manifestação posterior, não apresentou os relatórios exigidos pelo artigo 26 do PRODIST Módulo 9 para demonstrar que, na data e hora aproximada do sinistro, não houve perturbação em sua rede que pudesse ter afetado a unidade consumidora da segurada. A simples alegação de que não localizou a unidade consumidora com os dados fornecidos não a exime do ônus de comprovar a qualidade do serviço prestado no local e período indicados, especialmente considerando a possibilidade de a segurada ser usuária do serviço sem ser a titular da conta. A ausência dos relatórios obrigatórios, conforme o próprio regulamento da ANEEL (PRODIST Módulo 9, art. 29), leva à presunção de que houve perturbação na rede elétrica. Essa presunção, aliada ao laudo de oficina apresentado pela autora que aponta a origem elétrica dos danos, estabelece o nexo de causalidade entre a conduta da ré (fornecimento de energia com perturbação) e os danos sofridos pela segurada. Quanto à alegação da ré de que os danos poderiam ter sido causados por descarga atmosférica direta na residência, sem relação com a rede, ou por problemas nas instalações internas da segurada, tais fatos configurariam causas excludentes do nexo causal (fato de terceiro ou culpa exclusiva do consumidor). No entanto, o ônus de provar a ocorrência de tais excludentes recai sobre a ré, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil, e do próprio artigo 621 da RN 1.000/2021 da ANEEL, que lista as hipóteses em que a distribuidora pode se eximir do dever de ressarcir, incluindo a comprovação da inexistência de nexo causal ou de que o dano foi ocasionado pelo uso incorreto do equipamento ou defeitos gerados a partir da unidade consumidora. A ré não produziu prova robusta de que a descarga atmosférica atingiu diretamente a residência sem passar pela rede ou de que as instalações internas da segurada eram inadequadas e causaram os danos. A alegação de que a descarga atmosférica seria caso fortuito ou força maior excludente de responsabilidade, no contexto da atividade de distribuição de energia elétrica, não se sustenta, pois tais eventos são considerados previsíveis e inerentes ao risco da atividade, cabendo à concessionária adotar medidas de proteção para minimizá-los. A necessidade de perícia técnica nos equipamentos danificados, requerida pela ré, mostra-se desnecessária e inviável no presente caso. Desnecessária porque o conjunto probatório, especialmente a presunção de perturbação na rede decorrente da ausência dos relatórios da ré e o laudo de oficina, já permite a formação do convencimento sobre o nexo causal. Inviável porque, como bem argumentado pela autora, o lapso temporal decorrido desde o sinistro (fevereiro de 2024) e a provável destinação dos equipamentos danificados (reparo ou descarte) tornam a perícia judicial impraticável. A exigência de que o consumidor ou a seguradora preservem os bens danificados por longo período, aguardando eventual perícia judicial, seria desproporcional e onerosa. Portanto, restou demonstrado o nexo de causalidade entre a falha na prestação do serviço pela requerida e os danos sofridos pela segurada, da qual a autora se sub-rogou nos direitos. A requerida não se desincumbiu do ônus de comprovar a ausência de perturbação em sua rede ou a ocorrência de causa excludente de sua responsabilidade. O valor da indenização pleiteada corresponde ao valor efetivamente pago pela seguradora à segurada, deduzida a franquia, conforme comprovado nos autos (R$ 4.450,00). Este valor deve ser ressarcido pela ré. II.5 - Dos Juros de Mora e da Correção Monetária Quanto aos consectários legais, tratando-se de responsabilidade civil extracontratual, os juros de mora devem incidir a partir do evento danoso. No caso da ação regressiva movida pela seguradora, o evento danoso que gera o direito ao ressarcimento é o desembolso da indenização ao segurado (06/03/2024 – ID 161802887), nos termos da Súmula 54 do STJ. A correção monetária, por sua vez, deve incidir a partir da data do efetivo prejuízo, que para a seguradora sub-rogada é a data do desembolso da indenização (06/03/2024 – ID 161802887), conforme Súmula 43 do STJ. Neste sentido, colaciono o seguinte julgado aplicável ao caso: E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – PEDIDO DE RESSARCIMENTO DA SEGURADORA CONTRA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA – EQUIPAMENTOS DANIFICADOS – OSCILAÇÃO DE ENERGIA – QUEIMA DE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS – NEXO CAUSAL DEMONSTRADO – DEVER DE INDENIZAR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA – JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA – INCIDÊNCIA A PARTIR DO EVENTO DANOSO – SÚMULAS 43 E 54 DO STJ – REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA – SENTENÇA REFORMADA PARA JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL – RECURSO PROVIDO. Demonstrado o nexo de causalidade entre a atividade da concessionária de energia elétrica e os danos ocorridos nos equipamentos dos segurados, em razão de defeito no fornecimento de energia elétrica (oscilação de energia), surge o dever de ressarcimento da seguradora pelos valores desembolsados aos segurados, por isso, merece reforma da sentença, para julgar procedentes os pedidos formulados na inicial. Nos termos das súmulas 43 e 54, do Superior Tribunal de Justiça, os juros de mora e a correção monetária devem incidir a partir do evento danoso, sendo que na hipótese de ação regressiva, deve ser computado a partir do desembolso. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1025534-56 .2019.8.11.0041, Relator.: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 06/03/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/03/2024) (grifei) III. DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial para condenar a requerida, ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., a ressarcir à parte autora, BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS, o valor de R$ 4.450,00 (quatro mil quatrocentos e cinquenta reais). O valor da condenação deverá ser corrigido monetariamente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir da data do efetivo desembolso pela seguradora (06/03/2024) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data do desembolso (06/03/2024). Condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Anote-se no sistema PJe o nome do advogado DENNER B. MASCARENHAS BARBOSA (OAB/MT 13245-A) para fins de publicações e intimações, conforme postulado pela parte requerida (ID 179910057). Anote-se igualmente o nome do advogado JOSÉ CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS (OAB-SP 273.843) para fins de publicações e intimações, conforme requerido pela parte autora. Havendo recurso: Na hipótese de interposição do recurso de apelação, certifique-se acerca da tempestividade e, em seguida, intime-se a parte recorrida para, no prazo 15 (quinze) dias, apresentar suas contrarrazões de apelação, na forma do artigo 1.010, §1º do CPC. Após, com ou sem contrarrazões recursais, voltem para análise do recurso. Preclusa a via recursal, certifique-se o trânsito em julgado. Com o trânsito em julgado, e não havendo requerimento(s), remetam-se os autos ao arquivo, na condição de findo, mediante adoção e anotações de praxe. Havendo pedido de cumprimento de sentença: a) Intime-se o devedor para pagamento no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa de 10% sobre o valor da condenação. No mandado deverá, ainda, constar a faculdade de, querendo, o executado impugnar o cumprimento de sentença, nos termos do art. 525, do CPC/15; b) Transcorrido o prazo para pagamento voluntário, intime-se a parte exequente para que apresente, no prazo de 05 (cinco) dias, memória atualizada e discriminada do débito, incluídas as sanções constantes do art. 523, §1º, do CPC; c) Apresentada impugnação, intime-se a parte contrária para manifestação em 15 dias; após, conclusos para decisão. e arquive-se com as baixas e cautelas de estilo. Não havendo pedido de cumprimento de sentença: a) arquive-se. Cumpra-se, providenciando e expedindo o necessário, servindo a presente decisão como mandado/ofício/requisição. São Félix do Araguaia-MT, data da assinatura eletrônica. LUIS OTÁVIO TONELLO DOS SANTOS Juiz de Direito Substituto

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