Processo nº 1028055-24.2024.8.11.0000
ID: 316987372
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Privado
Classe: AçãO RESCISóRIA
Nº Processo: 1028055-24.2024.8.11.0000
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RAPHAEL FACCHIN ROCHA
OAB/MT XXXXXX
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DILERMANDO JOAO THIESEN FILHO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028055-24.2024.8.11.0000 Classe: AÇÃO RESCISÓRIA (47) Assunto: [Acessão] Relator: Des…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028055-24.2024.8.11.0000 Classe: AÇÃO RESCISÓRIA (47) Assunto: [Acessão] Relator: Des(a). SERLY MARCONDES ALVES Turma Julgadora: [DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [DILERMANDO JOAO THIESEN FILHO - CPF: 542.590.889-04 (ADVOGADO), ANTONIO SILVESTRE DA SILVA - CPF: 411.503.921-34 (AUTOR), AGRO PECUARIA CENTRO SUL LTDA - CNPJ: 54.511.001/0001-20 (REU), LUPERCIO CREVELARO - CPF: 704.857.048-20 (REU), SILVIA TANIA RIBEIRO MORAES CREVELARO - CPF: 272.050.218-98 (REU), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), RAPHAEL FACCHIN ROCHA - CPF: 037.729.291-50 (ADVOGADO), FLAVIO DE PINHO MASIERO - CPF: 010.284.951-02 (ADVOGADO), OTAVIO DE MELO ANNIBAL - CPF: 751.800.578-68 (ADVOGADO), VALDECI ZEFFIRO - CPF: 093.952.468-63 (ADVOGADO), GILBERTO DA SILVA RAMOS - CPF: 009.904.741-19 (ADVOGADO), EDUARDO DE SOUZA STEFANONE - CPF: 066.275.408-51 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: AÇÃO RESCISÓRIA PROCEDENTE, UNÂNIME. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. HOMOLOGAÇÃO DE LAUDO PERICIAL EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMISSÃO NA POSSE. ERRO DE FATO. PROVA NOVA. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. PEDIDO PROCEDENTE. I. CASO EM EXAME Ação Rescisória ajuizada por ANTONIO SILVESTRE DA SILVA, com fundamento nos incisos VII e VIII do art. 966 do CPC, objetivando desconstituir decisão interlocutória transitada em julgado no Cumprimento de Sentença nº 0000546-12.2015.8.11.0046, que homologou laudo pericial e determinou a imissão na posse de imóvel em favor da Agropecuária Centro Sul Ltda. Alega-se que houve erro na localização geográfica do imóvel objeto da adjudicação, resultando na indevida imissão na posse da Fazenda Vitória, de propriedade do autor. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) verificar se a decisão homologatória da perícia no cumprimento de sentença está sujeita à ação rescisória; (ii) identificar se houve erro de fato verificável do exame dos autos e prova nova, nos termos dos incisos VII e VIII do art. 966 do CPC; (iii) determinar se a decisão impugnada violou a coisa julgada formada na ação originária de adjudicação compulsória. III. RAZÕES DE DECIDIR A decisão homologatória de laudo pericial, embora interlocutória, é rescindível quando possui conteúdo de mérito ou efeitos patrimoniais definitivos, nos termos da jurisprudência do STJ e do Enunciado 336 do FPPC. O laudo pericial homologado no cumprimento de sentença incorre em erro de fato ao indicar equivocadamente como objeto da imissão na posse o imóvel Fazenda Vitória, distinto da área da matrícula 1.901, conforme demonstrado por laudo anterior já acobertado pela coisa julgada. O erro é verificável pelo simples confronto entre os laudos técnicos produzidos nos processos de conhecimento e de execução, sem necessidade de nova instrução probatória, sendo evidente a contradição lógica entre as conclusões periciais. A prova nova apresentada pelo autor – Laudo Técnico de Constatação e decisão judicial em caso análogo – preenche os requisitos legais: era desconhecida, não pôde ser utilizada anteriormente por ausência de participação do autor na ação originária, e é capaz de assegurar decisão favorável. O cumprimento de sentença, ao modificar a localização do imóvel definida na fase de conhecimento, ofende os limites objetivos da coisa julgada, configurando violação nos termos do art. 966, IV, do CPC. A divergência entre os réus, sendo que dois deles corroboram a tese do autor e reconhecem o erro técnico, reforça a verossimilhança do pedido. IV. DISPOSITIVO E TESE Pedido procedente. Tese de julgamento: A decisão interlocutória que, no cumprimento de sentença, homologa laudo pericial com efeitos patrimoniais definitivos é passível de rescisão nos termos do art. 966 do CPC. Configura erro de fato rescindível a homologação de laudo pericial que, em contradição com prova anterior acobertada pela coisa julgada, localiza erroneamente o imóvel objeto da adjudicação compulsória. Constitui prova nova, para fins do art. 966, VII, do CPC, laudo técnico e decisão judicial obtidos após o trânsito em julgado, quando o autor, por não ter participado da ação originária, não pôde utilizá-los antes. A homologação de novo laudo pericial em execução que altera elementos decididos na sentença exequenda viola a coisa julgada, ensejando rescisão da decisão. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; CPC, arts. 966, incisos IV, VII e VIII, §§ 1º e 2º; arts. 968, II; 502; 507; 85, § 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.712.475/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 15.08.2019, DJe 20.08.2019; STJ, REsp nº 1.745.513/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, DJe 15.03.2024; Enunciado 336 do FPPC. R E L A T Ó R I O AÇÃO RESCISÓRIA Nº 1028055-24.2024.8.11.0000 REQUERENTE: ANTONIO SILVESTRE DA SILVA REQUERIDOS: AGRO PECUARIA CENTRO SUL LTDA E OUTROS RELATÓRIO Eminentes Pares, Trata-se de Ação Rescisória com Pedido de Tutela de Urgência ajuizada por ANTONIO SILVESTRE DA SILVA em face de AGROPECUÁRIA CENTRO SUL LTDA, LUPÉRCIO CREVELARO e SILVIA TANIA RIBEIRO MORAES CREVELARO, objetivando a desconstituição de decisão interlocutória transitada em julgado, proferida nos autos do Cumprimento de Sentença nº 0000546-12.2015.8.11.0046, em trâmite perante a 2ª Vara da Comarca de Comodoro/MT, que homologou laudo pericial e determinou a expedição de mandado de imissão na posse em favor da requerida Agropecuária Centro Sul Ltda. O autor, na condição de terceiro juridicamente interessado, sustenta que fora atingido pelos efeitos da decisão rescindenda, fundamenta seu pedido rescisório nos incisos VII e VIII do artigo 966 do CPC (prova nova e erro de fato) ao argumento de que o mandado de imissão na posse foi cumprido em área distinta daquela discutida na ação original, recaindo sobre imóvel rural de sua propriedade (Fazenda Vitória). Alega que o erro se consubstanciou no fato de que, no curso do processo de conhecimento da Ação de Adjudicação Compulsória nº 73/2007, foi realizada uma perícia técnica pelo engenheiro florestal Sr. Antônio Carlos Campos Silva, que estabeleceu corretamente a localização dos imóveis discutidos no litígio, cujo laudo foi homologado e acobertado pela coisa julgada. Contudo, no cumprimento de sentença, foi realizada uma segunda perícia pelo engenheiro agrônomo Sr. Celso de Almeida, que contém erros graves quanto à localização do imóvel, indicando área diversa daquela definida na perícia original. Quanto ao erro de fato, aduz que o segundo laudo pericial, homologado pelo juízo e que serviu de base para a decisão de imissão na posse, continha contradições evidentes que poderiam ter sido percebidas pelo magistrado. Sustenta que a área retratada no segundo laudo não correspondia ao objeto do litígio original, porque as matrículas discutidas na ação de adjudicação compulsória (520, 1901 e 65422) referiam-se a áreas não contíguas e localizadas em regiões distintas, enquanto o mapa constante do segundo laudo representava áreas contíguas, correspondentes à Fazenda Santa Sílvia VI. No tocante à prova nova, apresenta laudo técnico de constatação elaborado pelo engenheiro florestal e técnico em topografia Sr. Igor Bruno Muller, que demonstra que seu imóvel (Fazenda Vitória) está situado a aproximadamente 35 km de distância da matrícula 1.901, objeto da adjudicação compulsória. Com base nesses fundamentos, requer a desconstituição da decisão que homologou o laudo pericial e determinou a imissão na posse, para que seja definitivamente reintegrado na posse da Fazenda Vitória, localizada em Rondolândia-MT, dando-se prosseguimento ao cumprimento de sentença com a imissão da Agropecuária Centro Sul Ltda no local onde está efetivamente situada a matrícula 1.901, nos exatos termos da sentença proferida nos autos da Ação de Adjudicação Compulsória (Autos nº 73/2007). Efetuou o depósito prévio exigido pelo art. 968, II, do CPC, no valor de R$ 41.000,00 (quarenta e um mil reais), correspondente a 5% sobre o valor atribuído à causa. Citada, a ré AGROPECUÁRIA CENTRO SUL LTDA apresentou contestação (ID 253918183), arguindo preliminarmente a incorreção do valor da causa, ao argumento de que o autor deduz pretensão de proteção de um imóvel rural com área total de 2.524,9687 hectares, o valor da causa deveria ser o importe de R$ 52.148.364,00, ou, pelo menos, o valor de R$ 11.590.894,06, conforme parâmetros do INCRA para a região. Requer a complementação do depósito prévio de 5% desse valor atualizado. Ainda em sede preliminar, a Agropecuária Centro Sul alega inadequação da via eleita, porque a decisão rescindenda não solucionou o mérito da ação de adjudicação compulsória, tratando-se de decisão interlocutória homologatória de laudo pericial, que não está sujeita à ação rescisória, mas sim à ação anulatória, conforme previsto no art. 966, § 4º, do CPC. Aduz também que o autor se utiliza da ação rescisória como sucedâneo recursal, porque já interpôs três recursos perante este Tribunal de Justiça discutindo a mesma matéria. No mérito, sustenta a ausência dos pressupostos necessários à configuração do erro de fato, bem como que a alegada prova nova não atende aos requisitos do art. 966, VII, do CPC, por ter sido produzida após o trânsito em julgado da decisão rescindenda. Os réus LUPÉRCIO CREVELARO e SILVIA TANIA RIBEIRO MORAES CREVELARO apresentaram contestação (ID 266818770), manifestando-se pela procedência da ação rescisória. Aduzem que a área rural em que foi cumprido o mandado de imissão de posse não é a mesma área transacionada entre as partes originárias, conforme demonstrado no primeiro laudo pericial realizado na ação de adjudicação compulsória. Sustentam que o laudo produzido em sede de cumprimento de sentença é "material espúrio", contendo informações incorretas quanto à localidade do imóvel. Defendem que houve violação à coisa julgada formada na ação de conhecimento, não sendo possível a reapreciação da matéria de mérito em sede de cumprimento de sentença. Além disso, apresentam como prova nova superveniente a decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 1019754-88.2024.8.11.0000, que reconheceu a divergência entre os laudos periciais e concedeu liminar em caso análogo. A d. Procuradoria-Geral de Justiça declinou de atribuição para intervir no feito, por entender inexistirem interesses indisponíveis a justificar a atuação obrigatória do Parquet (id 276687889). É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO DAS PRELIMINARES Eminentes Pares, Trata-se de Ação Rescisória ajuizada por ANTONIO SILVESTRE DA SILVA em face de AGROPECUÁRIA CENTRO SUL LTDA, LUPÉRCIO CREVELARO e SILVIA TANIA RIBEIRO MORAES CREVELARO, com fundamento nos incisos VII e VIII do art. 966 do Código de Processo Civil, objetivando a desconstituição de decisão interlocutória transitada em julgado proferida nos autos do Cumprimento de Sentença nº 0000546-12.2015.8.11.0046, em trâmite perante a 2ª Vara da Comarca de Comodoro/MT. A referida decisão homologou laudo pericial e determinou a expedição de mandado de imissão na posse do imóvel rural objeto da matrícula 1.901 do 3º Registro de Imóveis de Cuiabá-MT em favor da Agropecuária Centro Sul Ltda, com base em laudo pericial que teria indicado localização equivocada do imóvel, resultando no cumprimento do mandado sobre área diversa, qual seja, a Fazenda Vitória, de propriedade do autor. Antes de adentrar ao exame do mérito, necessário analisar as questões preliminares suscitadas pela ré Agropecuária Centro Sul Ltda. 1.1. DA ALEGADA INCORREÇÃO DO VALOR DA CAUSA Eminentes Pares, A ré Agropecuária Centro Sul sustenta que o valor atribuído à causa pelo autor (R$ 41.000,00) está incorreto deve corresponder ao valor de mercado do imóvel rural com área de 2.524,9687 hectares, que seria de R$ 52.148.364,00, ou, subsidiariamente, ao valor por hectare definido na tabela de preços de terra rural do INCRA (R$ 4.590,51), resultante no valor de R$ 11.590.894,06. Na inicial da presente ação, afirmou o autor que “em atendimento ao comando do artigo 968, inciso II do CPC, o Autor comprova, no ato do protocolo da petição inicial, o recolhimento da quantia de R$ 41.000,00 (quarenta e um mil reais), equivalente a 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa na ação rescindenda” e, para tanto, efetuou pagamento da guia respectiva (id 243704188). Com efeito, em se tratando de ação rescisória, o valor da causa deve corresponder, em regra, ao valor da causa na ação originária, atualizado monetariamente. Essa é a orientação firmada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica dos seguintes precedentes: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. AÇÃO RESCISÓRIA. VALOR DA CAUSA. REGRA GERAL. IDENTIDADE COM O VALOR DA CAUSA RESCINDENDA. EXCEÇÃO. DISCREPÂNCIA COM O PROVEITO ECONÔMICO BUSCADO. CONFIGURAÇÃO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assenta que o valor da causa a ser atribuído na ação rescisória deve guardar identidade com o valor dado à demanda original rescindenda, salvo a hipótese de discrepância fundada no proveito econômico buscado, que prevalecerá. 2. Recurso especial provido." (REsp n. 1.712.475/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 15/8/2019, DJe de 20/8/2019.) Ao examinar detidamente os autos, constato que houve, de fato, uma imprecisão técnica na petição inicial, pois o autor atribuiu à causa o valor de R$ 41.000,00, que corresponde ao depósito prévio de 5% efetuado, quando o valor da causa propriamente dito na ação originária foi de R$ 820.000,00. Entretanto, tal impropriedade técnica não acarreta consequências processuais significativas, uma vez que o depósito prévio foi corretamente calculado e recolhido no montante de 5% sobre o valor da causa originária (R$ 820.000,00), conforme exigido pela norma processual vigente. Essa questão, em verdade, configura mero erro material na nomenclatura utilizada na petição inicial, não comprometendo a regularidade processual da demanda, especialmente porque o depósito prévio, cuja finalidade é servir como garantia contra demandas rescisórias temerárias, foi adequadamente efetuado no percentual legalmente previsto sobre o valor correto da causa originária. É necessário compreender que o autor não pretende, com a presente demanda, a aquisição de qualquer benefício financeiro direto, mas tão somente o reconhecimento de erro na identificação da localização do imóvel objeto da lide originária, que resultou na indevida imissão de posse sobre seu imóvel. Em outras palavras, busca-se a correção de um equívoco técnico-processual que redundou em violação ao seu direito de propriedade, sem que isso implique, necessariamente, na atribuição de valor econômico mensurável além daquele já definido na ação originária. Ademais, o conceito de "proveito econômico", para fins de fixação do valor da causa, relaciona-se com o benefício financeiro concreto e imediato que a parte pretende obter com o provimento jurisdicional. Na espécie, não se visualiza tal situação, pois o autor almeja apenas preservar situação jurídica que já lhe pertencia antes da indevida interferência judicial, ou seja, a manutenção da posse sobre imóvel que já era seu, não havendo, portanto, acréscimo patrimonial que justifique a fixação de valor superior. Assim, é caso apenas de retificar o valor para R$ 820.000,00, mantendo-se inalterado, contudo, o depósito prévio já efetuado de R$ 41.000,00, por corresponder ao percentual legalmente exigido (5% sobre 820.000,00). É como voto. DA ALEGADA UTILIZAÇÃO DA AÇÃO RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL Eminentes Pares, A ré Agropecuária Centro Sul alega que o autor estaria utilizando a ação rescisória como sucedâneo recursal, porquanto já foram interpostos três recursos perante este Tribunal de Justiça discutindo a mesma matéria. A preliminar não merece acolhimento. Ocorre que o autor não figurou como parte no processo de adjudicação compulsória e no respectivo cumprimento de sentença, somente vindo a tomar conhecimento da ação em 01/06/2023, quando foi surpreendido com a intimação via aplicativo whatsapp sobre a imissão da ré na posse de seu imóvel, ocasião em que passou a ingressar no feito como terceiro interessado. Os recursos mencionados pela ré (Agravo de Instrumento nº 1012660-26.2023.8.11.0000, Embargos de Terceiro nº 1002646-39.2023.8.11.0046 e Ação de Manutenção de Posse nº 1000373-53.2024.8.11.0046) não discutiram o mérito da questão ora trazida na ação rescisória, qual seja, o erro de fato na identificação da localização do imóvel e a divergência entre os laudos periciais elaborados no processo de conhecimento e no cumprimento de sentença. O Agravo de Instrumento nº 1012660-26.2023.8.11.0000 não foi interposto pelo autor, mas por Ricardo de Moraes Crevelaro. Os Embargos de Terceiro nº 1002646-39.2023.8.11.0046, em que pese opostos pelo aqui autor, foram extintos sem resolução do mérito por intempestividade, não havendo apreciação da questão de fundo. Já a Ação de Manutenção de Posse nº 1000373-53.2024.8.11.0046 foi extinta sem julgamento do mérito por falta de interesse de agir, em razão da inadequação da via eleita. Assim, não houve análise prévia, em nenhum desses processos, do erro de fato na localização das áreas físicas e da incompatibilidade com o laudo pericial anterior apresentado nos autos da Ação de Adjudicação Compulsória, matéria que vem a ser suscitada somente na presente ação rescisória. Portanto, rejeito a preliminar de utilização da ação rescisória como sucedâneo recursal. É como voto. DO MÉRITO Eminentes Pares, Antes de adentrar o exame das causas rescindentes propriamente ditas, importa enfrentar a alegação da ré, veiculada como preliminar, de que a presente ação rescisória não seria cabível, por se voltar contra decisão interlocutória proferida no cumprimento de sentença, sem natureza de mérito, o que violaria o disposto no art. 966, caput e § 4º, do CPC. Com o devido respeito, essa alegação não prospera e, ademais, se confunde com o próprio mérito, razão pela qual será analisada de forma conjugada com os fundamentos do pedido rescisório. É certo que o caput do art. 966 do CPC restringe, em princípio, a ação rescisória às decisões de mérito transitadas em julgado. Todavia, o § 2º do mesmo dispositivo amplia o cabimento da ação para hipóteses em que, mesmo sem julgamento de mérito formal, a decisão impeça a nova propositura da ação ou a interposição de recurso. Além disso, tanto a doutrina quanto a jurisprudência pátria têm reconhecido, de forma pacífica, que decisões interlocutórias com conteúdo de mérito ou que produzam efeitos materiais definitivos são passíveis de desconstituição pela via rescisória. Destaco, a esse respeito, o Enunciado 336 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC): "Cabe ação rescisória contra decisão interlocutória de mérito." Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que é rescindível a decisão interlocutória que resolve definitivamente questão de direito material da causa. Cito o seguinte precedente, cuja ratio decidendi aplica-se diretamente ao caso concreto: " PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRECATÓRIO. CORREÇÃO. ALTERAÇÃO DO BENEFICIÁRIO DA VERBA HONORÁRIA. RELAÇÃO JURÍDICA DE DIREITO MATERIAL ADVINDA DO JULGAMENTO DA CAUSA PRINCIPAL. CONTEÚDO MERITÓRIO. RESCINDIBILIDADE. PROVIMENTO. O objeto da ação rescisória encontra-se estritamente vinculado à desconstituição da coisa julgada, a qual só se forma de decisões com conteúdo meritório. Sendo assim, esta Corte Superior de Justiça firmou entendimento no sentido de considerar admissível a ação rescisória para impugnação de decisões, ainda que interlocutórias, que tenham enfrentado o mérito da controvérsia. 2. A relação jurídica de direito material submetida à presente análise surgiu após o julgamento do mérito da causa principal, o que não se caracteriza como mero consectário do tema central da causa, mas, na verdade, uma nova relação jurídica que sobreveio após a determinação das verbas sucumbenciais. ... 4. Quando o provimento jurisdicional exerce juízo acerca da legitimidade para o recebimento do bem da vida pretendido na demanda principal, adentra no mérito da controvérsia, possibilitando a impugnação na via da ação rescisória. 5. Recurso especial a que se dá provimento. " (REsp n. 1.745.513/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, DJe 15/3/2024) No caso concreto, a decisão impugnada homologou laudo pericial que determinou a localização do imóvel adjudicado, fixando as coordenadas geográficas para fins de imissão na posse em favor da ré. Revela-se incontroverso que tal deliberação não se limitou a aspectos procedimentais, mas delimitou materialmente o objeto da adjudicação compulsória, produzindo efeitos patrimoniais concretos e, sobretudo, atingindo bem imóvel de titularidade do autor da presente ação rescisória. Dessa forma, ainda que formalmente interlocutória, a decisão atacada resolveu questão de direito material atinente à titularidade possessória e localização geográfica do bem, com repercussão direta na esfera jurídica do autor, sendo, portanto, passível de rescisão nos termos do art. 966 do CPC. Logo, a alegação de inadequação da via eleita não se sustenta, devendo ser afastada. Prosseguindo quanto ao mérito propriamente dito, a questão controvertida nos presentes autos cinge-se a verificar se estão presentes os requisitos autorizadores da rescisão da decisão interlocutória que homologou o laudo pericial e determinou a expedição de mandado de imissão na posse em favor da ré Agropecuária Centro Sul, com base nas hipóteses previstas nos incisos VII e VIII do art. 966 do CPC. O autor fundamenta seu pedido rescisório em dois argumentos principais (incisos VII e VIII do artigo 966 do Código de Processo Civil): (i) erro de fato verificável do exame dos autos, consistente na homologação de laudo pericial que indica localização equivocada do imóvel objeto da lide originária, em contradição com laudo anterior produzido no processo de conhecimento e já acobertado pela coisa julgada; e (ii) prova nova obtida após o trânsito em julgado da decisão rescindenda, consubstanciada em laudo técnico que demonstra que seu imóvel (Fazenda Vitória) está situado a aproximadamente 35 km de distância do imóvel discutido na ação originária (matrícula 1.901). Sabe-se que o erro de fato, como hipótese de cabimento da ação rescisória, constitui vício intrínseco da decisão judicial, que se configura quando o julgador, por equívoco na percepção ou na análise do material probatório constante dos autos, admite um fato inexistente ou considera inexistente um fato efetivamente ocorrido. Trata-se, portanto, de uma falha cognitiva que compromete a própria base fática sobre a qual se assentou o raciocínio judicial. É imperioso ressaltar que o erro de fato, para fins de ação rescisória, não se confunde com o simples reexame da prova ou com a mera divergência de interpretação dos elementos probatórios. O erro de fato caracteriza-se como um equívoco manifesto e perceptível, que poderia ter sido constatado pelo julgador mediante a simples observação das provas constantes dos autos, sem necessidade de produção de novas provas ou de análises valorativas complexas. Para a configuração do erro de fato apto a ensejar a rescisão do julgado, exige-se a presença conjunta dos seguintes requisitos: (i) que o julgamento rescindendo tenha sido fundado no erro de fato; (ii) que o erro possa ser apurado com base nos documentos que instruem os autos do processo originário; (iii) que ausente controvérsia sobre o fato; e (iv) que inexista pronunciamento judicial a respeito do fato. No caso sob exame, após minuciosa análise dos elementos probatórios constantes dos autos, verifico que estão presentes todos os requisitos para a configuração do erro de fato. Ocorre que a decisão rescindenda fundamentou-se em laudo pericial elaborado no cumprimento de sentença que incorreu em evidente equívoco quanto à localização do imóvel objeto da adjudicação compulsória, em contradição com laudo anterior produzido no processo de conhecimento e já acobertado pela coisa julgada. Constata-se que foram realizadas duas perícias técnicas no curso do processo: a primeira na ação de adjudicação compulsória (Autos nº 73/2007), elaborada pelo engenheiro florestal Sr. Antônio Carlos Campos Silva (CREA 6426/D-MT), e a segunda no cumprimento de sentença (Autos nº 0000546-12.2015.8.11.0046), elaborada pelo engenheiro agrônomo Sr. Celso de Almeida (CREA 170122341-4). A análise detalhada dos documentos que instruem os autos revela que, na instrução da Ação de Adjudicação Compulsória nº 73/2007, foi realizada perícia técnica pelo engenheiro florestal Sr. Antônio Carlos Campos Silva (CREA 6426/D-MT), que identificou corretamente a localização dos imóveis discutidos no litígio, com base nas informações constantes do Instituto de Terras do Estado de Mato Grosso – INTERMAT. Nesse primeiro laudo (ID 243528186 - Pág. 58 e seguintes), o perito concluiu, de forma inequívoca e fundamentada, que os imóveis objeto da lide (matrículas 65.422, 520 e 1.901) eram distintos, não contíguos e estavam localizados em locais diversos, o que diferia totalmente do imóvel pretendido pela Agropecuária Centro Sul, denominado Fazenda Santa Silvia VI, cujas áreas eram contíguas e com perímetro único. Em resposta ao1ª quesito (ID 243528186 - Pág. 66), o perito afirmou expressamente: "a) O perímetro ocupado (fisicamente) elos Requeridos coincide com os perímetrod das matrículas dos títulos primitivos? Não. O perímetro ocupado fisicamente pelos Requeridos apresentado em planta georreferenciada (fls. 222) DIFERE com os perímetros das matrículas dos título primitivos. Este apresenta um perímetro único e, os perímetros dos títulos primitivos discutidos na lide são DISTINTOS, não contíguos e em locais diversos”. O perito destacou, portanto, de forma enfática e cristalina, que os títulos de domínio correspondentes às Escrituras de Venda e Compra não incidiam sobre a área de posse ocupada pelos Requeridos, estando em locais diversos, cuja conclusão se fundamentou em extensa análise técnica, amparada por documentos oficiais do INTERMAT, que demonstravam a real localização das áreas descritas nas matrículas objeto da lide. Em seu parecer conclusivo, o perito deixou claro que os títulos de domínio correspondentes às Escrituras de Venda e Compra não incidiam sobre a área de posse ocupada pelos Requeridos, estando situados em locais diversos Esse laudo foi devidamente homologado pelo juízo e serviu de base para a sentença que julgou procedente o pedido de adjudicação compulsória em favor da ré Agropecuária Centro Sul, determinando a adjudicação do imóvel objeto da matrícula 1.901, conforme descrito nessa matrícula e no título respectivo. A sentença transitou em julgado, formando-se, assim, coisa julgada material sobre a questão, inclusive quanto à localização física dos imóveis objeto da lide, conforme definido no laudo pericial. Posteriormente, no cumprimento de sentença, foi realizada nova perícia pelo engenheiro agrônomo Sr. Celso de Almeida (CREA 170122341-4), que incorreu em manifesto equívoco ao indicar a localização do imóvel sob matrícula 1.901 como sendo a área do imóvel pertencente ao autor, em contradição flagrante com o laudo anterior e com a própria coisa julgada formada no processo de conhecimento. Este segundo laudo pericial (ID 243528198), elaborado em sede de cumprimento de sentença, embora tenha chegado à mesma conclusão quanto à não contiguidade das áreas das matrículas, contraditoriamente, ao elaborar o mapa da área em litígio (ID 243528199, pág. 28), retratou-as como sendo áreas contíguas, induzindo o Juízo a erro quanto à localização física do imóvel em que o mandado de imissão na posse deveria ser cumprido. O erro material é perceptível pela simples análise comparativa dos laudos periciais, dispensando a produção de novas provas ou a realização de análises técnicas complexas. No segundo laudo (ID 243528198 - Pág.37/44/45), o próprio perito reconhece expressamente que as três matrículas objeto da adjudicação (matrículas 65.422, 520 e 1.901) não formavam uma área contígua, mas áreas de terras em locais distantes e em regiões diversas: "Os mapas constantes do anexo nº 03 das páginas 63-68 deste Laudo mostram as localizações solicitadas. As terras descritas nas matrículas 520 e 1901 do RGI do 6º Ofício de Cuiabá-MT, ficam em média 18km distantes da fazenda Santa Silvia. ... Todas as 3 matrículas localizam-se no lado esquerdo do igarapé Azul, em locais diversos dos imóveis físicos objetos das transações entre as partes nessa lide (faenda Santa Silvia) e não abrigam fisicamente nenhuma das áreas negociadas. ... O imóvel negociado, seria uma área contígua de 5.369,50ha, conforme é a soma das áreas das três Escrituras Públicas de Compromisso de Venda e Compra, conforme discriminado e mostrado no quadro apresentado na introdução deste Laudo e na resposta ao quesito nº 1. Mas isto não corresponde à realidade, pois as 3 matrículas citadas nos compromissos de venda e compra, não representam áreas contíguas e sim vestem áreas de terras em locais diversos, bem diversos, conforme mostrado nos mapas anexos a este laudo”. No entanto, paradoxalmente e em manifesta contradição lógica, ao elaborar o mapa da área em litígio (ID 243528199 - Pág. 28), o mesmo perito representou as três matrículas como áreas contíguas, representadas pela cor amarela, incluindo o imóvel do autor (indicado como número 1) e de outros dois proprietários (indicados como números 2 e 3). Essa contradição insanável, verificável pelo simples cotejo visual entre as afirmações textuais do perito e o mapa por ele elaborado, evidencia o erro material que deveria ter sido percebido pelo juízo no momento da homologação do laudo. Afinal, se as três matrículas objeto da adjudicação não eram contíguas e estavam localizadas em regiões diversas, conforme afirmado pelo próprio perito em seu texto, não poderiam, por evidente inconsistência lógica, ser representadas no mapa como áreas contíguas. O erro se torna ainda mais evidente quando o perito reproduz as medições do laudo anterior (3.912,5185 ha), que se referiam à área da Fazenda Santa Sílvia VI, e as apresenta como sendo a área do litígio (ID 243528198, pág. 21), induzindo o Juízo a concluir que essa seria a área onde o mandado de imissão na posse deveria ser cumprido, o que acabou por atingir equivocadamente o imóvel do autor. Sucede que ao reproduzir as medições do primeiro laudo (3.912,5185 ha) - que se referiam à área da Fazenda Santa Sílvia VI - e citá-lo como sendo a área do litígio, o perito (do segundo laudo) acabou por induzir o Juízo a erro de que essa seria a área em litígio, ou seja, a área onde o mandado de imissão na posse deveria ser cumprido, o que acabou por atingir equivocadamente o imóvel do Autor. Ora, a medição de 3.912,5188 hectares se refere à área da posse da Fazenda Santa Silvia VI e não à área do litígio, como equivocadamente retratado no laudo pericial elaborado em sede de cumprimento de sentença. As matrículas em litígio (520, 1.901 e 65.422) somam área superior (2.497 + 2.496 + 1.565,50 = 6.558,50 hectares), o que já evidencia a impossibilidade de se referirem à mesma área. Vale ressaltar, ainda, que o segundo perito anexou diversas imagens que demonstram que a área supostamente vendida à Agropecuária Centro Sul já se encontrava ocupada desde o ano de 2010 pelo autor, com diversas benfeitorias, como casas, cercas e áreas de pastagem, o que já indicava, de forma clara e inequívoca, que não poderia se referir à área negociada entre as partes litigantes originárias. Ademais, o segundo laudo pericial, ao modificar a localização do imóvel objeto da lide, em desacordo com o que havia sido definido no processo de conhecimento e já acobertado pela coisa julgada, violou frontalmente o princípio da segurança jurídica e o próprio escopo do cumprimento de sentença, que se destina a efetivar o comando sentencial transitado em julgado, e não a modificá-lo. O cumprimento de sentença, como fase complementar do processo sincrético, deve ater-se aos limites objetivos e subjetivos da coisa julgada, sendo-lhe vedado alterar ou ampliar o que foi decidido na sentença exequenda. No caso em análise, a sentença que julgou procedente o pedido de adjudicação compulsória, com base no primeiro laudo pericial, determinou a adjudicação do imóvel descrito na matrícula 1.901, conforme sua localização definida naquele laudo. Ao modificar essa localização no cumprimento de sentença, o segundo laudo pericial extrapolou os limites da coisa julgada, incorrendo em error in procedendo que contamina a decisão homologatória. Assim, o erro de fato está caracterizado pela admissão, na decisão rescindenda, da existência de fato inexistente, qual seja, a identidade entre o imóvel do autor (Fazenda Vitória) e o imóvel objeto da matrícula 1.901, quando, na realidade, tratava-se de áreas distintas e geograficamente distantes, conforme demonstrado no primeiro laudo pericial e na própria matrícula do imóvel. Esse erro é verificável pelo simples exame dos autos, mediante a confrontação dos laudos periciais e das matrículas dos imóveis, não tendo havido controvérsia específica sobre esse ponto nem pronunciamento judicial a respeito, uma vez que o juízo se limitou a homologar o segundo laudo sem adentrar na questão da divergência entre os laudos e potencial violação à coisa julgada. Há, portanto, erro de fato apto a ensejar a rescisão da decisão que homologou o laudo pericial elaborado no cumprimento de sentença e determinou a expedição de mandado de imissão na posse, nos termos do art. 966, inciso VIII e § 1º, do CPC. Além disso, o autor também fundamenta seu pedido rescisório na hipótese prevista no inciso VII do art. 966 do CPC, que autoriza a rescisão da decisão quando o autor obtiver, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável. O instituto da prova nova, como causa de rescindibilidade da coisa julgada, representa uma das hipóteses excepcionais em que o ordenamento jurídico admite a relativização da imutabilidade da decisão transitada em julgado, em nome de valores igualmente relevantes, como a justiça da decisão e a vedação ao enriquecimento sem causa. Trata-se de mecanismo destinado a corrigir graves distorções decorrentes da impossibilidade de utilização, no processo originário, de prova relevante para o deslinde da controvérsia. Para caracterização da prova nova, exige-se que: (i) trate-se de prova preexistente à decisão rescindenda, mas que não pôde ser utilizada no processo por motivo alheio à vontade da parte; (ii) a parte não tivesse conhecimento da existência da prova ou, tendo conhecimento, não pudesse utilizá-la no processo; e (iii) a prova seja, por si só, capaz de alterar o resultado do julgamento, assegurando pronunciamento favorável à parte. No caso em exame, o autor apresenta como prova nova o Laudo Técnico de Constatação de Localização das matrículas 65.422, 1.901 e 520 (ID 243531682), elaborado pelo engenheiro florestal e técnico em topografia Sr. Igor Bruno Muller (CREA/MT 019936), bem como decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 1019754-88.2024.8.11.0000 (ID 274342360, págs. 54-57), que teria reconhecido a divergência entre os laudos periciais produzidos na ação de conhecimento e no cumprimento de sentença. Quanto ao Laudo Técnico de Constatação, verifica-se que foi elaborado especificamente para instruir a presente ação rescisória, o que, a princípio, afastaria sua caracterização como prova nova, no sentido estrito do termo. Contudo, o autor aduz que somente teve conhecimento do processo após o trânsito em julgado da decisão rescindenda, ocorrido em 11/04/2023, tendo sido cientificado da ação apenas em 01/06/2023, quando recebeu, via WhatsApp, mandado de imissão na posse. Essa peculiaridade do caso concreto, isto é, o fato de o autor não ter participado da ação originária, tendo ingressado no processo apenas após a expedição do mandado de imissão na posse, na qualidade de terceiro juridicamente interessado, confere ao Laudo Técnico de Constatação a natureza de prova nova, na acepção do artigo 966, inciso VII, do Código de Processo Civil. Com efeito, não tendo o autor participado do processo originário, não teve oportunidade de apresentar as provas que demonstrariam que seu imóvel, denominado Fazenda Vitória, não guarda qualquer relação com a propriedade litigiosa objeto da adjudicação compulsória. O Laudo Técnico de Constatação (ID 243531682) demonstra, de forma clara e objetiva, a distância significativa de 35 km entre a área em litígio (matrícula 1.901) e a Fazenda Vitória, conforme se verifica da figura constante à página 69 do referido laudo: "Comparando-se a localização do imóvel sob matrícula 1.901 com a da Fazenda Vitória, é possível constatar que elas se situam com distância de 35 km, o que deixa evidente que não são a mesma área." Ademais, o laudo evidencia que o Título de Lazaro Massipe José (onde incide o imóvel sob matrícula 1.901) e o Título de Antônio José de Oliveira e Enildes Venega (onde incide a Fazenda Vitória) estão separados por uma distância de 10 km, o que reforça a conclusão de que o imóvel do autor não guarda qualquer relação com a área em litígio (ID 243531682, pág. 70). O perito conclui, de forma categórica, que "a Fazenda Vitória não incide o perímetro de sua poligonal nos Títulos de Lazaro Massipi, Antônio Esteves Andreu e José Jander Carmagnani, logo, não consta no teor das Matrículas objeto deste laudo" (ID 243531682, pág. 79). É importante destacar que o autor não era parte no processo originário, figurando como terceiro juridicamente interessado, apenas após tomar conhecimento da decisão que afetou diretamente seu patrimônio. Nesse contexto, é evidente que não poderia ter apresentado a referida prova antes, por razões alheias à sua vontade, caracterizando-se, assim, a impossibilidade de utilização da prova no momento processual adequado. A comparação das coordenadas geográficas e dos pontos de referência dos dois imóveis evidencia, de forma cristalina, que se trata de áreas completamente distintas, situadas em locais diversos, com titulações primitivas diferentes e separadas por distância considerável (aproximadamente 35 km). Quanto à decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 1019754-88.2024.8.11.0000 (ID 274342360, págs. 54-57), trata-se de prova obtida posteriormente à propositura da ação rescisória, conforme destacado pelo autor em sua impugnação à contestação. Na referida decisão, a Terceira Câmara de Direito Privado deste Tribunal de Justiça reconheceu a divergência entre os laudos periciais produzidos na ação de conhecimento e no cumprimento de sentença, e a invalidade da imissão na posse com base no segundo laudo, em caso análogo ao presente, envolvendo outro proprietário de área contígua à Fazenda Vitória. Referido acórdão, embora não se refira diretamente ao imóvel do autor, tem relevância para o deslinde da controvérsia, na medida em que reconhece a existência de divergência entre os laudos periciais e a invalidade da imissão na posse com base no laudo elaborado em sede de cumprimento de sentença, o que reforça a tese do autor de que o mandado de imissão na posse foi cumprido em área diversa daquele objeto da adjudicação compulsória. Trata-se, portanto, de decisão judicial que reconheceu, em caso análogo, o mesmo erro técnico apontado pelo autor na presente ação rescisória, configurando prova nova apta a subsidiar a rescisão da decisão impugnada, uma vez que demonstra, de maneira inequívoca, a incorreção da localização do imóvel indicada no segundo laudo pericial e a consequente ilegalidade da imissão de posse determinada com base nesse laudo. Assim, tanto o Laudo Técnico de Constatação quanto a decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 1019754-88.2024.8.11.0000 configuram provas novas, na acepção do artigo 966, inciso VII, do Código de Processo Civil, sendo capazes, por si sós, de assegurar pronunciamento favorável ao autor. É imperioso destacar que ambas as provas novas apresentadas pelo autor (laudo técnico e decisão judicial) são, por si sós, capazes de assegurar-lhe pronunciamento favorável, uma vez que demonstram, de forma clara e inequívoca, que seu imóvel (Fazenda Vitória) não corresponde ao imóvel objeto da matrícula 1.901, não havendo, portanto, fundamento jurídico ou fático para a imissão de posse determinada pela decisão rescindenda. Ademais de todo o exposto, embora o autor não tenha fundamentado expressamente sua pretensão rescisória no artigo 966, inciso IV, do Código de Processo Civil (ofensa à coisa julgada), os requeridos Lupércio e Silvia, em sua contestação (ID 266818770), suscitaram tal fundamento, alegando que o laudo pericial elaborado na ação de conhecimento já estava acobertado pelo manto da coisa julgada quando da elaboração do segundo laudo pericial em sede de cumprimento de sentença. Ao acolher essa tese, o autor, em sua impugnação à contestação (ID 274342360), também invocou a violação à coisa julgada como fundamento para a procedência de sua pretensão rescisória. Considerando a relevância dessa questão para o deslinde da controvérsia e o fato de que a causa de pedir na ação rescisória é aberta, passo a analisar também esse fundamento. O artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal estabelece que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada", conferindo status constitucional ao instituto da coisa julgada, como manifestação do princípio da segurança jurídica. O Código de Processo Civil, por sua vez, conceitua a coisa julgada material como "a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso" (art. 502), estabelecendo, ainda, que "é vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão" (art. 507). No caso em apreço, verifica-se que o laudo pericial elaborado na ação de conhecimento, que identificou com precisão a localização dos imóveis objeto da lide, foi homologado e validado pela sentença proferida nos autos da adjudicação compulsória, que transitou em julgado. A elaboração de novo laudo pericial em sede de cumprimento de sentença, com conclusões divergentes quanto à localização física dos imóveis, configura evidente afronta à coisa julgada formada na ação de conhecimento, mormente quando se considera que o cumprimento de sentença é fase complementar do mesmo processo em que se formou o título executivo, estando vinculado à decisão proferida na fase de conhecimento. Ao determinar a imissão na posse com base no segundo laudo pericial, que apresentava conclusões divergentes quanto à localização física dos imóveis, o Juízo da execução extrapolou os limites da coisa julgada, permitindo que fosse rediscutida questão já decidida na fase de conhecimento. Importante destacar, por fim, a peculiar posição dos requeridos quanto ao mérito da presente ação rescisória. A requerida Agropecuária Centro Sul Ltda., em sua contestação (ID 248273671), sustenta a improcedência da ação, alegando, em síntese, que não estão presentes os requisitos autorizadores da rescisão da decisão transitada em julgado, seja por ausência de erro de fato verificável do exame dos autos, seja porque a "prova nova" apresentada pelo autor teria sido produzida após o trânsito em julgado da decisão rescindenda. Já os requeridos Lupércio e Silvia, em sua contestação (ID 266818770), manifestam-se pela procedência da ação, corroborando a tese do autor de que o laudo pericial elaborado em sede de cumprimento de sentença conteria erros graves acerca da localização do imóvel, resultando em indevida imissão na posse da Fazenda Vitória. Sustentam, ainda, a ocorrência de violação à coisa julgada, uma vez que o primeiro laudo pericial, elaborado na ação de adjudicação compulsória, já havia definido a localização dos imóveis, não podendo ser alterada em sede de cumprimento de sentença. Essa divergência de posições entre os próprios requeridos, que, em tese, deveriam defender a mesma tese, reforça a conclusão de que houve, de fato, erro na decisão rescindenda quanto à localização física do imóvel em que o mandado de imissão na posse deveria ser cumprido. Com efeito, os requeridos Lupércio e Silvia, que foram partes na ação originária e têm conhecimento preciso da localização dos imóveis objeto da lide, reconhecem expressamente que o imóvel do autor não guarda qualquer relação com a propriedade litigiosa objeto da adjudicação compulsória, o que confere maior credibilidade à tese defendida pelo autor. O reconhecimento, pelos corréus, da procedência do pedido rescisório, embora não vincule o julgamento da causa, constitui elemento adicional a corroborar a tese do autor quanto à existência do erro de fato e à pertinência da prova nova apresentada, fortalecendo a convicção quanto à necessidade de rescisão da decisão impugnada. O erro de fato verificável do exame dos autos (art. 966, VIII, do CPC) está configurado pela contradição evidenciada no laudo pericial elaborado em sede de cumprimento de sentença, que, embora tenha reconhecido que as matrículas em litígio se referiam a áreas não contíguas, distantes e em regiões diversas, retratou-as como sendo áreas contíguas, induzindo o Juízo a erro quanto à localização física do imóvel em que o mandado de imissão na posse deveria ser cumprido. A prova nova obtida posteriormente ao trânsito em julgado (art. 966, VII, do CPC) está configurada pelo Laudo Técnico de Constatação elaborado pelo engenheiro florestal e técnico em topografia Sr. Igor Bruno Muller e pela decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 1019754-88.2024.8.11.0000, que demonstram, de forma clara e objetiva, que o imóvel do autor não guarda qualquer relação com a propriedade litigiosa objeto da adjudicação compulsória. A violação à coisa julgada (art. 966, IV, do CPC) está configurada pela elaboração de novo laudo pericial em sede de cumprimento de sentença, com conclusões divergentes quanto à localização física dos imóveis, em evidente afronta à coisa julgada formada na ação de conhecimento. Diante disso, impõe-se a procedência da ação rescisória, com a consequente desconstituição da decisão transitada em julgado e a determinação de reintegração do autor na posse da Fazenda Vitória. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO NA PRESENTE AÇÃO RESCISÓRIA, para: a) DESCONSTITUIR a decisão interlocutória proferida nos autos do Cumprimento de Sentença nº 0000546-12.2015.8.11.0046, que homologou o laudo pericial elaborado pelo engenheiro agrônomo Sr. Celso de Almeida (CREA 170122341-4) e determinou a expedição de mandado de imissão na posse; b) REVOGAR a ordem de imissão na posse do imóvel do autor, denominado Fazenda Vitória, localizado em Rondolândia-MT; c) DETERMINAR a reintegração do autor na posse de seu imóvel, no prazo de 15 (quinze) dias; d) DETERMINAR o prosseguimento do cumprimento de sentença com a imissão da Agropecuária Centro Sul Ltda. no local onde está situada a matrícula 1.901, nos exatos termos da sentença proferida nos autos da Ação de Adjudicação Compulsória (Autos nº 73/2007), observando-se as conclusões do laudo pericial elaborado naqueles autos quanto à localização física do imóvel. Condeno a ré Agropecuária Centro Sul Ltda ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/07/2025
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