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Processo nº 1000358-31.2024.8.11.0096

ID: 278709560

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1000358-31.2024.8.11.0096

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

PEDRO VIEIRA DE MIRANDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

SAMUEL FERREIRA VASCONCELOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000358-31.2024.8.11.0096 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Crimes do Sistema Nacional de Armas] Relator: Des(a). J… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000358-31.2024.8.11.0096 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Crimes do Sistema Nacional de Armas] Relator: Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA] Parte(s): [PEDRO VIEIRA DE MIRANDA - CPF: 069.407.229-04 (APELANTE), SAMUEL FERREIRA VASCONCELOS - CPF: 019.947.911-95 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), RAQUEL DO PRADO - CPF: 003.814.129-97 (TERCEIRO INTERESSADO), CLAUDINEI ALVES DA SILVA - CPF: 025.403.771-22 (TERCEIRO INTERESSADO), SOCIEDADE (VÍTIMA), ALEX SANDRO VIEIRA DE MIRANDA (ASSISTENTE), Devair José de Araújo (ASSISTENTE), Ronaldo aparecido de Arruda (ASSISTENTE), MOACIR BORTOLINI - CPF: 022.458.061-23 (ASSISTENTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS. POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. ERRO DE TIPO. MULTA PENAL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação criminal interposta contra sentença que condenou o recorrente à pena de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 20 (vinte) dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos artigos 15 e 16 da Lei nº 10.826/2003, em razão da posse de arma de fogo de uso restrito e disparo de arma de fogo em local habitado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é possível a desclassificação da conduta tipificada no artigo 16 para o artigo 14 da Lei nº 10.826/2003 em razão de alegado erro de tipo; (ii) estabelecer se é cabível a isenção da pena de multa sob alegação de hipossuficiência econômica. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O crime do artigo 16 da Lei nº 10.826/2003 configura-se como delito de mera conduta e perigo abstrato, consumando-se com a simples posse da arma de uso restrito sem necessidade de conhecimento técnico acerca da natureza da arma, sendo suficiente o dolo genérico. 4. A alegação de erro de tipo não prospera, pois não há nos autos elementos que demonstrem a falsa percepção da realidade capaz de excluir o dolo, sendo irrelevante o desconhecimento técnico sobre o calibre ou classificação da arma. 5. A multa penal integra a condenação de forma obrigatória, não sendo afastada por mera alegação de hipossuficiência econômica, admitindo-se o parcelamento do valor ou a análise de suspensão da exigibilidade apenas na execução penal. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. O crime de posse de arma de fogo de uso restrito se consuma com a posse consciente do armamento sem autorização, independentemente do conhecimento técnico sobre sua classificação. 2. A pena de multa não pode ser afastada por simples alegação de hipossuficiência, admitindo-se o parcelamento ou a futura análise de suspensão da exigibilidade na execução penal. Dispositivos relevantes citados: Lei nº 10.826/2003, arts. 15 e 16; Código Penal, arts. 20 e 50; Lei nº 7.210/1984, art. 169. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, Apelação Criminal nº 1000648-91.2021.8.11.0018, Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho, j. 27.03.2024; TJ-DF, Apelação Criminal nº 20150110899446, Rel. Des. Waldir Leôncio Lopes Júnior, j. 19.10.2017; TJ-RJ, Apelação Criminal nº 0040557-02.2015.8.19.0001, Rel. Des. Joaquim Domingos de Almeida Neto, j. 14.07.2015; STJ, AREsp nº 2494624, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 29.10.2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Criminal interposto por Pedro Vieira Miranda contra a sentença proferida nos autos da Ação Penal nº 1000358-31.2024.8.11.0096, em trâmite perante a Vara Única da Comarca de Itaúba/MT, que o condenou pela prática dos crimes previstos nos artigos 15 e 16 da Lei nº 10.826/2003, impondo-lhe a pena de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, além de 20 (vinte) dias-multa. Em suas razões a defesa busca: a) a desclassificação da conduta tipificada no artigo 16 para o artigo 14 da Lei nº 10.826/2003, sob o argumento de que o recorrente não tinha conhecimento de que a arma de fogo que possuía era de uso restrito, sustentando, assim, a existência de erro de tipo. Alternativamente: b) a isenção da pena de multa, sob a alegação de hipossuficiência econômica. (pag. 489/492-PDF). Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso (pag. 500/502-PDF). A douta Procuradoria de Justiça, em parecer subscrito pela eminente Dra. Esther Louise Asvolinsque Peixoto, em parecer (pag. 504/508-PDF), opinou igualmente pelo desprovimento do apelo defensivo, consoante entendimento assim sumariado: “APELAÇÃO CRIMINAL – ARTIGO 16 DA LEI 10.826/2003 – SENTENÇA CONDENATÓRIA - INSURGÊNCIA DA DEFESA – RECONHECIMENTO DE ERRO DE TIPO – DESCONHECIMENTO DAS CARACTERISTICAS DA ARMA – HIPOSSUFICIÊNCIA – AFASTAMENTO DA PENA DE MULTA - IMPROCEDÊNCIA. Da autoria e materialidade do delito de posse irregular de arma de fogo de uso restrito: Autoria e materialidade devidamente comprovadas – subsunção da conduta ao descrito na norma penal incriminadora – desnecessidade de conhecimento da característica restrita do armamento para configuração do crime – ausência de erro de tipo na hipótese. Da pena de multa: Legitimidade na aplicação – preceito secundário do delito – não comprovação da hipossuficiência – possibilidade de parcelamento – aferição oportuna em momentos posterior. Parecer pelo desprovimento do Recurso.” É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Consta na denúncia em id. 263049785: FATO I Consta nos autos do incluso Inquérito Policial que, a partir de data incerta, até o dia 02 de março de 2024, por volta das 2h, em residência particular, localizada na Rua Guiomar Guimarães Ribeiro, Bairro Centro, município de Nova Santa Helena/MT, PEDRO VIEIRA DE MIRANDA, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, manteve em sua posse arma de fogo, de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. FATO II Consta, também, nos autos do incluso Inquérito Policial que, no dia 02 de março de 2024, por volta das 2h, em residência particular, localizada na Rua Guiomar Guimarães Ribeiro, Bairro Centro, município de Nova Santa Helena/MT, PEDRO VIEIRA DE MIRANDA, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, disparou arma de fogo em lugar habitado. Da dinâmica dos fatos: Segundo apurado, durante período de tempo cujo início ainda não foi bem apurado, mas que se findou no dia 02 de março de 2024, por volta das 2h, no interior de sua residência, situada no endereço acima descrito, PEDRO VIEIRA DE MIRANDA manteve em sua posse um revólver, marca TAURUS, calibre .357, número de série 15813, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. E, em 02 de março de 2024, por volta das 2h, no interior de sua residência e nas proximidades, PEDRO VIEIRA DE MIRANDA efetuou disparos com a arma de fogo acima descrita. Ressai dos autos que a senhora Raquel do Prado, vizinha de PEDRO VIEIRA DE MIRANDA, ouviu dois disparos de arma de fogo nas cercanias de sua residência. Em vista disso, Raquel acionou a Polícia Militar, que, ao realizar buscas na casa de PEDRO, encontrou um revólver calibre .357 Magnum na sala, contendo três munições intactas e dois cartuchos deflagrados (Termo de Exibição e Apreensão nº 2024.16.101877 – id. 148786404). Com isso, PEDRO foi detido e encaminhado à delegacia para as providências cabíveis. Por esses fatos, após o regular do feito, foi prolatada a r. sentença que julgou a ação procedente, oportunidade em que, condenou o apelante como incurso no artigo 15 e 16, ambos da Lei 10.826/2003, na forma do artigo 69 do Código Penal, à pena de 05 (cinco) anos de reclusão, além ao pagamento de 20 dias-multa, em regime inicial semiaberto. (Sentença – pag. 334/350-PDF). Passo à análise do mérito. DA DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DO ARTIGO 16 PARA O ARTIGO 14 DA LEI Nº 10.826/2003 Pretende o apelante a desclassificação da condenação do crime previsto no artigo 16 da Lei nº 10.826/2003 (posse ilegal de arma de fogo de uso restrito) para o artigo 14 do mesmo diploma legal (posse ilegal de arma de fogo de uso permitido), ao argumento de que desconhecia a natureza restrita do armamento apreendido, o que configuraria erro de tipo. Todavia, a pretensão defensiva não merece prosperar. Inicialmente, cumpre salientar que o crime tipificado no artigo 16 da Lei nº 10.826/2003 é delito de mera conduta e perigo abstrato, consumando-se com a simples prática dos verbos nucleares previstos no tipo — "possuir", "deter", "portar", "ter em depósito" arma de fogo de uso restrito — independentemente do efetivo perigo concreto ou da produção de resultado danoso. O bem jurídico protegido é a segurança pública e a paz social, sendo irrelevante para a subsunção típica a intenção específica do agente ou o seu conhecimento técnico acerca do armamento. O dolo exigido é o dolo genérico, consistente na vontade livre e consciente de manter sob sua guarda uma arma de fogo sem autorização ou em desacordo com a legislação vigente. Não se exige, portanto, o conhecimento da classificação da arma como de uso restrito ou permitido, bastando que o agente tenha ciência de que detém uma arma irregular, o que, no caso concreto, restou amplamente demonstrado. Conforme amplamente provado nos autos, o apelante possuía em sua residência um revólver calibre .357 Magnum, classificado como arma de uso restrito pelas normas regulamentares vigentes à época dos fatos, sem qualquer autorização legal. O próprio apelante, em interrogatório judicial, admitiu que detinha a arma há anos, evidenciando ciência e voluntariedade na conduta de posse ilícita do armamento. Quanto à alegação de erro de tipo, registra-se que o erro sobre elemento constitutivo do tipo penal, previsto no artigo 20, caput, do Código Penal, exige que o agente atue sob uma falsa percepção da realidade capaz de excluir o dolo. No presente caso, não há qualquer comprovação de que o apelante acreditava licitamente possuir o armamento, ou que desconhecia a ilicitude da posse. O fato de ter referido de maneira incorreta o calibre da arma (“537” em vez de “.357”) revela mero lapso de ordem numérica, incapaz de infirmar a consciência da ilicitude da conduta. A jurisprudência pátria é pacífica no sentido de que o conhecimento técnico específico sobre a natureza da arma não é exigido para configuração do tipo penal do artigo 16: “APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. RECURSO DA DEFESA . 1) PLEITO DE ABSOLVIÇÃO/ DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE CULPOSA. DELITO DE RECEPTAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. EXISTÊNCIA DO CRIME E AUTORIA DO DELITO INDISCUTÍVEIS . INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CONDUTA DELITIVA EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DE PROVA HÁBIL PARA DESCARACTERIZAR O ILÍCITO PENAL 2.1) ABSOLVIÇÃO . POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. AUSÊNCIA DE PROVA. IMPROCEDÊNCIA. ACERVO PROBATÓRIO HÍGIDO . DECLARAÇÃO INCRIMIDORA DAS TESTEMUNHAS. 2.2) ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA LESIVIDADE . INAPLICABILIDADE. NÍTIDA POTENCIALIDADE LESIVA DA CONDUTA. LAUDO DE EFICIÊNCIA DA ARMA. DELITO DE MERA CONDUTA . DESNECESSIDADE DA OCORRÊNCIA DE EFETIVO DANO. 2.3) DESCLASSIFICAÇÃO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART . 14 DA LEI N. 10.826/03). IMPOSSIBILIDADE . INEXISTÊNCIA DE SUBSUNÇÃO DA CONDUTA DO APELANTE E O TIPO PENAL PRETENDIDO. RECURSO DESPROVIDO EM SINTONIA COM O PARECER. 1) Em crime de receptação, a posse da res pelo réu, aliada às circunstâncias fáticas do caso concreto, faz presumir o dolo da conduta imputada e inverte o ônus da prova, cabendo a ele demonstrar o desconhecimento da origem ilícita do bem, sob pena de não o fazendo, desmerecer crédito a versão do fato ofertada pela defesa, descabendo, portanto, a desclassificação para a modalidade culposa. 2 .1) Impõe-se manter a condenação do apelante pelo delito de posse irregular de munições de uso restrito, se comprovadas de forma idônea, a materialidade dos delitos imputados e sua autoria, mediante robusto acervo probatório que contemple, verbi gratia, circunstâncias da prisão em flagrante; depoimentos de testemunhas, em ambas as fases da persecução penal e a apreensão com os réus e na residência dele, de munições e arma de fogo. 2.2) A posse e porte de arma/munição de uso restrito, são crimes de mera conduta e de perigo abstrato, sendo presumida a possibilidade de dano ao bem jurídico tutelado (incolumidade pública), sendo típica, a simples conduta de possuir ou portar arma e/ou munição sem autorização. 2 .3) Não se admite a desclassificação do crime do art. 16 da Lei n. 10.826/03 para o do art . 14 do mesmo diploma legal, considerando-se que o Apelante foi condenado por possuir, entre outras, munição de uso restrito, elemento essencial do núcleo do tipo penal” (TJMT - APELAÇÃO CRIMINAL: 1000648-91.2021.8.11 .0018, Relator.: RONDON BASSIL DOWER FILHO, Data de Julgamento: 27/03/2024, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: 10/04/2024) Nesse sentido, aliás, são os seguintes julgados dos tribunais das regiões do Brasil já vem decidindo: "APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO. POSSE OU PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO (ARTIGO 16, CAPUT, DA LEI 10.826/03). DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DO ARTIGO 14, CAPUT, DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO. DESPROVIMENTO. DOSIMETRIA DA PENA. FATO ANTERIOR. TRÂNSITO EM JULGADO POSTERIOR. MAUS ANTECEDENTES. QUANTUM. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PENA PECUNIÁRIA. PROPORCIONALIDADE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. RÉU REINCIDENTE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não há que falar em desclassificação do crime de porte de arma de fogo de uso restrito sob alegação de desconhecimento do caráter restrito da arma . 2. A condenação penal por fato anterior ao para o atendimento da dupla finalidade da sanção penal. 4. A pena pecuniária deve ser proporcional à pena privativa de liberdade. 5. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, nos termos do artigo 44, inciso II, do Código Penal, em se tratando de réu reincidente. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-DF 20150110899446 DF 0026954-89.2015.8.07.0001, Relator: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, Data de Julgamento: 19/10/2017, 3a TURMA CRIMINAL, Data de Publicação: Publicado no DJE: 25/10/2017 . Pág.: 112/126)." (Destaquei). "APELAÇÃO CRIMINAL. POSSE OU PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. ART. 16, CAPUT DA LEI Nº 10.826/03. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. ESTADO DE NECESSIDADE. EXCLUDENTE NÃO CONFIGURADA. ERRO DE TIPO. NÃO OCORRÊNCIA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DO ART. 14 DO MESMO DIPLOMA LEGAL. INVIABILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE INCONTROVERSAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. O ordenamento jurídico não comporta as excludentes de 'legítima defesa preventiva' ou 'estado de necessidade virtual', de forma que a simples alegação de que o acusado portava a arma para segurança pessoal não é motivo suficiente para excluir a ilicitude do porte ilegal de arma de fogo. A mera alegação de desconhecimento de ser a arma de uso restritivo não é capaz de determinar a desclassificação do delito do art. 16, da Lei 10.826/03 para o tipo previsto no art. 14, do mesmo dispositivo legal, mesmo porque cabe à parte o ônus de provar ter agido o réu sob o erro de tipo invocado, circunstância não verificada na espécie . Sendo inequivocamente demonstradas a autoria e a materialidade do delito de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, a condenação nos moldes do art. 16 da Lei 10.826/03 é medida que se impõe, não havendo que se falar em desclassificação do delito para a conduta tipificada no art. 14 do mesmo diploma legal, não tendo o apelante comprovado ter agido amparado por estado de necessidade ou erro de tipo. Portanto, o conjunto probatório é suficiente para embasar o decreto condenatório. Registre- se não merecer reparo a reprimenda estabelecida, até porque arbitrada de forma fundamentada em 3 anos de reclusão em regime aberto, mais pagamento de 10 dias multa, à razão mínima, substituída por duas penas restritivas de direitos. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (TJRJ - APL: 00405570220158190001 RJ 0040557-02.2015.8.19.0001, Relator: DES. JOAQUIM DOMINGOS DE ALMEIDA NETO, Data de Julgamento: 14/07/2015, SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 17/07/2015 09:28)." (Destaquei). Portanto, diante da configuração plena do tipo objetivo e subjetivo, inexiste base jurídica para acolhimento da tese defensiva. A desclassificação pleiteada se mostra manifestamente improcedente, devendo ser mantida a condenação pelo artigo 16 da Lei nº 10.826/2003. DA CONCESSÃO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA E DA ISENÇÃO DA PENA DE MULTA A pretensão do apelante de ver reconhecida sua hipossuficiência financeira para fins de concessão da gratuidade de justiça e consequente isenção da pena de multa não merece acolhimento. Consoante já reiteradamente afirmado pela jurisprudência pátria, a pena de multa constitui sanção penal prevista no preceito secundário do tipo incriminador, integrando o conteúdo da condenação criminal de forma cogente e obrigatória, não sendo passível de afastamento ou isenção com base apenas na alegação genérica de incapacidade financeira. Conforme destacado, a mera alegação de hipossuficiência, desacompanhada de robusta comprovação documental, é insuficiente para afastar a incidência da multa penal. No caso concreto, o apelante limitou-se a sustentar sua condição de vulnerabilidade econômica sem apresentar elementos idôneos que atestem a alegada incapacidade financeira absoluta. Ademais, conforme preconiza o artigo 50 do Código Penal, existe a possibilidade legal de o pagamento da multa ser realizado de forma parcelada, mediante provocação do condenado ao Juízo da Execução, o que afasta qualquer alegação de impossibilidade absoluta de adimplemento: “Art. 50. A multa deve ser paga dentro de dez dias depois de transitada em julgado a sentença. A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais.” Nesse mesmo sentido, colaciona o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça: "A multa é uma sanção de caráter penal cominada abstratamente para ser aplicada cumulativamente ou alternativamente com a pena privativa de liberdade, não havendo previsão legal para a isenção ou suspensão do seu pagamento ante a alegação de hipossuficiência de recursos financeiros." (STJ - AREsp: 2494624, Relator.: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Publicação: Data da Publicação DJ 29/10/2024) Outrossim, a suspensão da exigibilidade da pena de multa, por eventual ausência de condições financeiras no momento da execução, poderá ser analisada oportunamente pelo juízo da execução penal, nos termos do artigo 169 da Lei de Execuções Penais, que disciplina a suspensão da cobrança da multa diante da absoluta insolvência do condenado. Portanto, não se justifica, no presente momento processual, a concessão da gratuidade de justiça tampouco a isenção da multa imposta, devendo ser mantida a condenação integralmente, inclusive no que tange à sanção pecuniária. Diante do exposto, em consonância com o parecer ministerial, nego provimento ao recurso interposto por Pedro Vieira de Miranda, mantendo a sentença condenatória em sua integralidade. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 20/05/2025

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Carlos Alberto Schlatter e outros x Celso Carlos Roquetto

ID: 309568030

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000264-29.2024.8.11.0017

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

CARLOS ALBERTO SCHLATTER JONAS MULARI SCHLATTER SAMUEL SCHLATTER WALTER SCHLATTER

Polo Passivo:

CELSO CARLOS ROQUETTO

Intimação

Advogados:

JOAO BATISTA FERRAIRO HONORIO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

MATHEUS CARRIEL HONORIO

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MARCELO CARRIEL HONORIO

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MARIANA ALMEIDA DIAS OLIVEIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA SEGUNDA VARA Processo: 1000264-29.2024.8.11.0017. REQUERENTE: WALTER SCHLATTER, CARLOS ALBERTO SCHLATTER, JONAS MULARI SCHLATTE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA SEGUNDA VARA Processo: 1000264-29.2024.8.11.0017. REQUERENTE: WALTER SCHLATTER, CARLOS ALBERTO SCHLATTER, JONAS MULARI SCHLATTER, SAMUEL SCHLATTER REQUERIDO: CELSO CARLOS ROQUETTO SENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de Ação de Indenização por Dano Material, Perdas e Danos c.c. Danos Morais, Danos Emergentes e Lucros Cessantes, ajuizada por WALTER SCHLATTER, SAMUEL SCHLATTER, CARLOS ALBERTO SCHLATTER e JONAS MULARI SCHLATTER em desfavor de CELSO CARLOS ROQUETTO, todos devidamente qualificados nos autos. Os requerentes, na petição inicial (ID 142274250), narraram que são produtores rurais na Fazenda Acanjarana, localizada em São Félix do Araguaia/MT, onde cultivam milho em uma área de 1.019,80 hectares, subdividida em talhões (26, 27/28/29/30, 34/35/36). Afirmaram que sua propriedade faz divisa com a Fazenda Rio Fontoura, de titularidade do requerido, onde este cultiva algodão. Sustentaram que o requerido, ao aplicar defensivos agrícolas como Staple (Piritiobaque de sódio), Envoke (Trifloxissulfurom de sódio), Select (Cletodin) e Glifosato (Glyphosate) em sua lavoura de algodão, de forma irresponsável e utilizando métodos aéreo e terrestre, atingiu indevidamente a cultura de milho dos autores, causando a morte das plantas e um prejuízo estimado em R$ 8.720.693,14 (oito milhões, setecentos e vinte mil, seiscentos e noventa e três reais e quatorze centavos) em março de 2021. Mencionaram que alguns dos herbicidas aplicados via aérea possuem proibição para tal modalidade, por serem nocivos a plantas sensíveis como o milho. Diante da recusa do requerido em ressarcir os danos, os autores ajuizaram previamente a Ação de Produção Antecipada de Provas nº 1000358-79.2021.8.11.0017, que tramitou perante esta 2ª Vara Cível de São Félix do Araguaia/MT. Naquela demanda, foi deferida tutela de urgência para a realização de prova pericial, cujos laudos teriam comprovado os danos, a causa e a extensão do prejuízo. A sentença proferida na Ação de Produção Antecipada de Provas (ID 142276398), em 10/11/2023, julgou procedente o pedido inicial, homologando os laudos periciais, e os Embargos de Declaração opostos pelo requerido foram rejeitados (ID 142276397), em 09/01/2024. Com base nas provas produzidas, os autores pleitearam a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos materiais, emergentes e lucros cessantes no valor de R$ 8.720.693,14, além de danos morais em montante não inferior a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). A petição inicial foi recebida em 01/03/2024 (ID 143004374), sendo deferida a gratuidade judiciária aos autores e designada audiência de conciliação/mediação. O requerido foi devidamente citado por hora certa em 09/05/2024 (ID 155176223). A audiência de conciliação, realizada em 12/06/2024, restou infrutífera, sem que as partes chegassem a um acordo (ID 158854836). O requerido apresentou contestação (ID 160988480) em 02/07/2024, arguindo, em síntese, a ausência de comprovação do nexo causal, a inexistência de culpa de sua parte e a culpa exclusiva dos autores pelos danos alegados. Quanto ao nexo, sustentou que o laudo pericial produzido na ação de produção antecipada de provas continha inconsistências e falhas técnicas graves, sendo impossível imputar-lhe a responsabilidade. Alegou que sua própria plantação de milho, mais próxima da lavoura de algodão, não sofreu danos, e que a contaminação na lavoura dos autores se deu em faixas retilíneas, o que não seria típico de deriva aérea. Disse que a altura dos voos, o tipo de ponta ou atomizador (bico que produz as gotas), bem como a intensidade/direção dos ventos se tratam de questões essenciais para análise dos danos por deriva e não foram analisados pelo perito. Entretanto, o laudo elaborado pelo seu assistente técnico, perito Fernando Kassis Carvalho e seu assistente técnico Rodolfo Glauber Checheto, deixaram claro que, na ocasião havia presença de vento moderado e a direção do vento, na maioria dos horários era contrária a possibilidade de carregamento físico das gotas até a área com relato de efeito fitotóxico, descartando a hipótese de deriva. Ainda, concluíram que, mesmo no pior dos cenários de ventos e aplicação seria impossível a ocorrência de fitotoxidade por deriva. Também, concluíram que, a plantação foi afetada em áreas retilíneas e delimitadas, o que não ocorreria em deriva, em que a contaminação seria espalhada e gradual. Também referiu que foi solicitada a análise do caso por mais um expert, o perito Luis Henrique Barbosa Kasuya, engenheiro agrônomo, que concluiu que a velocidade dos ventos e a altura dos voos não possibilitaria a ocorrência de deriva na forma alegada, pois as condições meteorológicas (não houve vento suficiente) e a baixa altitude dos voos de aplicação, não se mostram suficientes a causar contaminação em faixa tão extensa. Ainda, concluiu que, neste caso, havia relação com contaminação terrestre. Atribuiu a causa dos danos a erros operacionais dos autores, como a mistura indevida de sementes de milho (transgênico com convencional), a falta de manutenção e a infestação por lagartas, a higienização incorreta de equipamentos e a aplicação de herbicidas não registrados ou em doses excessivas. Impugnou os valores pleiteados a título de danos materiais e lucros cessantes, por serem baseados em estimativas e não em provas concretas, e defendeu a inexistência de danos morais. Requereu a improcedência da demanda por culpa exclusiva dos requerentes e, subsidiariamente, o reconhecimento da culpa concorrente. Anexaram o laudo pericial técnico do profissional Luis Henrique Barbosa Kasuya (ID 160988482), fotografias (ID 160988483), relatório de preços de milho por saca (ID 160988485). Os autores apresentaram impugnação à contestação (ID 172453500) em 15/10/2024, refutando os argumentos do requerido. Reiteraram a responsabilidade objetiva do requerido, a clareza e robustez do laudo pericial homologado, que confirmou o nexo causal e a culpa do réu pela aplicação imprudente de defensivos. Afirmaram que a atividade de pulverização aérea é de risco e que o requerido agiu com negligência e imperícia. Rechaçaram a alegação de culpa exclusiva ou concorrente, afirmando que seguiram todas as boas práticas agrícolas. Impugnaram os documentos juntados pelo réu, por serem desprovidos de contemporaneidade e de anotação de responsabilidade técnica. Reafirmaram a comprovação dos danos materiais e lucros cessantes, bem como a ocorrência de danos morais. Em decisão de saneamento (ID 180895497), proferida em 16/01/2025, este Juízo intimou as partes para especificarem as provas que pretendiam produzir. Os autores, em manifestação de 10/02/2025 (ID 183355037), requereram o julgamento antecipado do mérito, por entenderem que a matéria fática já estava plenamente provada pelo laudo pericial homologado. Subsidiariamente, caso o Juízo entendesse pela necessidade de novas provas, pugnaram por provas documentais complementares, depoimento pessoal do requerido, oitiva de testemunhas e prova emprestada. O requerido, em manifestação de 11/02/2025 (ID 183611986), reiterou as inconsistências e a inconclusividade do laudo pericial, bem como a necessidade de nomeação de novo perito especializado em defensivos e deriva. Subsidiariamente, caso não fosse julgada a improcedência imediata, requereu a oitiva de dois especialistas como testemunhas: Luis Henrique Barbosa Kasuya e Fernando Kassis Carvalho. É o relatório. II – FUNDAMENTAÇÃO II.1. Da gratuidade judiciária: No tópico, em evidente erro material, fora deferida a gratuidade judiciária à parte requerente ao ID 143004374, sendo que sequer há pedido neste sentido, na peça inaugural e, quiçá as condições financeiras dos proponentes viabilizariam a concessão da benesse, já que se trata de demanda em que se pretende a indenização em altíssimo valor pecuniário, não cedendo lugar a isenção de custas conforme art. 98 do Código de Processo Civil e nos termos da Lei nº 1.060/1950. Portanto, torno sem efeito a decisão do ID 142894648, no tocante a gratuidade judiciária concedida. No mais, as custas já foram recolhidas (IDs 142881231 e 142894648), havendo, portanto, regularidade processual ao prosseguimento da demanda. II.2. Da prova pericial postulada: No tópico, pleiteou o requerido a realização de novo laudo pericial nos presentes autos. Entretanto, entendo que tal prova se mostra desnecessária no presente caso haja vista já ter sido realizado o laudo pericial na própria ação antecipada de provas nº 1000358-79.2021.8.11.0017, oportunidade em foi observada a efetiva a ampla defesa e o contraditório, não padecendo de qualquer vício formal. Inclusive, na produção antecipada e provas foram realizados o laudo pericial, bem como dois laudos complementares, a pedido das partes, não havendo necessidade de realização de uma NOVA prova pericial neste processo, que, inclusive, seria inócua em virtude do tempo transcorrido a partir do evento noticiado. Os esclarecimentos das partes, como dito, bem como as insurgências dos requeridos, foram exaustivamente respondidas e esclarecidas quando da confecção do 2º e 3º laudos complementares, não havendo razão para produção de nova prova nos presentes autos. Assim, indefiro o pedido de realização de novo laudo pericial nos presentes autos. II.3. Da prova testemunhal postulada: Pleiteou o requerido a realização de prova testemunhal nos presentes autos. Uma das testemunhas postuladas pela parte requerida foi o Sr. Luis Henrique Barbosa Kasuya, engenheiro agrônomo responsável pela confecção do laudo unilateral, apresentado na contestação da defesa (ID 160988482), do qual, como visto, já há parecer detalhado, com a exposição de suas convicções sobre o fato. A outra testemunha arrolada se trata do assistente técnico Fernando Kassis Carvalho, o qual, como visto, participou no feito, na forma do art. 466, § 2º , do CPC, o qual já teve a oportunidade de analisar a metodologia utilizada e as conclusões do expert indicado pelo juízo. O trabalho pericial, como visto, foi largamente debatido pelas partes, com auxílio de seus respectivos assistentes técnicos e sucedido de esclarecimentos periciais complementares, o que tornava dispensável a prova oral. A matéria fática, portanto, já está devidamente provada, e a insistência em novas provas apenas protelaria o andamento do feito, em desrespeito aos princípios da celeridade e da razoável duração do processo. II.4. Mérito: O cerne da presente demanda reside na apuração da responsabilidade civil do requerido pelos alegados danos causados à lavoura de milho dos autores, em decorrência da aplicação de defensivos agrícolas pelo demandado que, então, teriam atingido a propriedade dos requerentes. A controvérsia fática principal, portanto, gira em torno da existência do nexo de causalidade entre a conduta do requerido e os prejuízos sofridos pelos autores, bem como da caracterização de culpa ou da aplicação da responsabilidade objetiva. Inicialmente, cumpre analisar a prova pericial produzida na Ação de Produção Antecipada de Provas nº 1000358-79.2021.8.11.0017, que foi devidamente homologada por este Juízo (ID 142276398). Os laudos periciais (1º laudo pericial – 06/08/2021 - ID 142280921), (2º laudo – complementar – 27/04/2022 – ID 142283546), (3º laudo – complementar – 15/02/2023 – ID 142281849), elaborados por perito nomeado judicialmente, constituem a principal base probatória para a elucidação dos fatos. O perito, Engenheiro Agrônomo Avelino Egídio Taques Neto, realizou inspeções in loco, coletou amostras de folhas e solos, e analisou os registros de aplicação de defensivos de ambas as propriedades, produzindo prova minuciosa acerca dos fatos. Pois bem, inicialmente, a perícia técnica confirmou (ID 142280921, pg. 15), em resposta ao quesito 3 a existência de sintomas de fitotoxidade por herbicidas nas plantas de milho como “encarquilhamento das folhas, morte da gema apical seguida do perfilhamento dos colmos, planta baixa e emissão da espiga com enchimento dos grãos no ponteiro da planta”. E, em análise das amostras dos talhões afetados identificou apenas a presença do herbicida GLIFOSATO nas folhas das plantas de algodão (ID 142280921, pg. 11 e 16) referindo: “Em relação ao milho dos talhões afetados, o resultado das análises, ANEXO 2, identificou a presença do herbicida glifosato, em quantidade abaixo do limite necessário para a sua quantificação, apenas nas folhas das plantas de milho do Talhão 30”. Ainda, mencionou que embora não tenha sido detectada a presença dos herbicidas (Staple, Envoke e Cletodim), nas lavouras de algodão em razão do intervalo entre a data da aplicação destes e a data de início da análise pericial (ID 142280921, pg. 12), os talhões, mormente, os milhos (híbridos transgênicos – resistentes ao glifosato), também poderiam ter sido atingidos por herbicidas Staple, Envoque e Select 240EC (ID 142280921, pg. 16). (...) “Durante a vistoria foi observado a fitotoxidade e a morte das plantas de milho em duas situações. Nos talhões 26, 27, 28, 29, 30, 35 e 35-A identificamos que o milho mais afetado foi o híbrido P30F53VYHR que é transgênico, possuindo a tecnologia Leptra de proteção de insetos e o gene Roundup Ready, o que proporciona resistência aos herbicidas a base de Glifosato. Mesmo no Talhão 26 onde houve a plantio de dois híbridos, o P30F53VYHR e o híbrido convencional P3898, que é suscetível aos herbicidas a base de Glifosato, o milho mais afetado foi o transgênico (…) Portanto, estes talhões foram afetados por herbicidas que não possuem como princípio ativo o glifosato, podendo ser os herbicidas Staple, Envoque e Select 240 EC (...) Nesse contexto, referenciou, ainda, em resposta ao quesito nº 7, a similitude dos sintomas encontrados nas plantas de milho com aqueles causados pela utilização dos herbicidas Envoke, Staple e Cletodin. Vejamos (ID 142280921, pg. 24): Os sintomas provocados pelos herbicidas Envoke e Staple (ALS) e Cletodim (ACCase), são caracterizados pela morte da gema aplical, paralização do crescimento e deformação nas folhas, podendo as mesmas ficarem cloróticas. Durante a perícia, os sintomas encontrados nas plantas de milho dos talhões afetados coincidiram com os sintomas provocados pelos herbicidas Envoke, Staple e Cletodim” Também, em resposta ao quesito nº 8, destacou que os sintomas provocados pelo Glifosato e Envoke, Staple e Cletodim seriam semelhantes, relatando, pois, a impossibilidade de concluir, de forma, específica e minuciosa da extensão provocada pelos diferentes herbicidas, em razão de terem sido utilizadas sementes de híbridos diferentes que apresentam reações distintas de fitotoxidade (ID 142280921, pg. 27). Em prosseguimento, especificou que, embora o requerente e requerido tenham feito uso do herbicida GLIFOSATO nas suas plantações de algodão, referiu que o autor fez uso de mencionado herbicida apenas de forma terrestre nas datas de 12/02/2021 (Talhão 1) e 19/02/2021 (Talhão 03 e 08), data em que apenas os talhões de milho 26 (plantado em 13/02/2021) e 30 (plantado em 18/02/201), já haviam sido plantados. Entretanto, considerando a emergência do milho após o prazo de 04 a 05 dias da semeadura, concluiu que, com exceção dos talhões 26 e 30 (plantados em 13/02/2021 e 18/02/2021), nenhum dos demais talhões afetados estavam plantados quando da aplicação do herbicida de forma terrestre pelo autor (ID 142280921, pg. 14). Também descreveu que, como todas as aplicações realizadas pelo autor foram terrestres e que, mesmo ocorrendo a deriva do produto, este poderiam alcançar apenas as margens dos Talhões 26 e 27 por estarem mais próximas ao algodão (ID 142280921, pg. 14/15). Além disso, descartou a hipótese de que o manejo dos herbicidas utilizados na soja pelos requerentes pudessem ter deixado resíduos no solo que fossem capazes de causar a fitotoxidade visualizada na perícia (ID 142280921, pg. 15). De outro lado, entretanto, verificando o manejo dos produtos utilizados pelo requerido em sua lavoura de algodão o perito concluiu que foram usados os defensivos Staple (Piritiobaque de sódio), Envoke (Trifloxissulfurom de sódio), Select (Cletodin) e Glifosato (Glyphosate), de forma terrestre e aérea. Ainda, especificou que em 09/03/2021 e 06/03/2021, data das últimas aplicações aéreas dos herbicidas STAPLE e ENVOKE, já haviam plantas de milho emergidas nos talhões 26, 27, 28, 29 e 30, 34, 35 e 35-A, de propriedade dos requerentes. Vejamos o que relatou a perícia no tópico. 3. As plantas de milho objeto da perícia foram mortas pelos produtos utilizados pelo réu e descritos no item 1 deste quesito? (…) Verificando o manejo e os produtos utilizados pelo requerido na cultura do algodão, ID NÚMERO 58136051, PÁGINAS 1, 2 e 3, e ID NÚMERO 58136055, PÁGINA1, podemos afirmar que no TH01, houve a aplicação dos herbicidas STAPLE e ENVOKE, de forma terrestre, no dia 18/02/2021 e de forma aérea nos dias 17/02/2021 e 09/03/2021. NO TH 03, houve a aplicação dos hebicidas Select 240 nos dias 09/02/2021 de forma aérea, e 11/03/2021 de forma terrestre, já os herbicidas Staple e Envoke foram aplicados de forma terrestre no dia 11/02/2021 e de forma aérea nos dias 20/02/2021 e 06/03/2021, ainda houve uma aplicação aérea isolada do herbicida Staple no dia 22/02/2021. Analisando as datas destas aplicações juntamente com as datas de plantio do milho nos talhões afetados, ID NÚMERO 58094321, PÁGINAS 3, 5, 6 e 7, podemos afirmar que em 09/03/2021 e 06/03/2021, data das últimas aplicações aérea do Staple e Envoke nos TH 01e 03, já havia plantas de milho emergidas nos talhões 26, 27, 28, 29 e 30, 34, 35 e 35-A. E, partindo-se da apresentação dos primeiros sintomas de fototoxidade das plantas de milho em 13/03/2021, concluiu que “a aplicação aérea de Glifosato pulverizada em 11/03/2021 sobre o algodão no talhão TH 01 da propriedade do requerido poderia atingir as plantas de todos os talhões de milho afetados” (grifei (ID 142280921, pg. 16). E, prosseguiu destacando o modo pelo qual cada talhão foi atingido, referindo a existência de milho híbrido (transgênico) e milho híbrido (convencional) na lavoura do requerente e explicando que estes últimos seriam suscetíveis e o primeiro resistente ao herbicida GLIFOSATO e que os demais poderiam ter sido atingidos pelos herbicidas Staple e Envoke, todos através da aplicação de forma aérea, nos talhões de algodão na propriedade do requerido, por possuírem maiores probabilidades de deriva ou suspensão (ID 142280921, pg. 16). Considerando as datas de aplicações do herbicida Staple nos talhões de algodão do requerente e as datas de plantio dos talhões de milho afetados, podemos afirmar que a aplicação do herbicida Staple, pulverizada de forma terrestre, caso ocorresse a deriva, ocasionaria danos apenas em parte do Talhão 26. Já a aplicação de Staple e Envoque nos talhões de algodão do requerido aplicado de forma aérea, poderia sofrer a inversão térmica e prejudicar os talhões 26, 27, 28, 29, 30, 35 e 35-A” Já no talhão 34 o dano ocorreu de forma diferente, o milho mais afetado foi o híbrido P3898, que por ser convencional, o torna suscetível aos herbicidas a base do Glifosato, além dos herbicidas Staple, Envoke e Select240 EC. Considerando as datas de aplicações dos herbicidas a base do Glifosato nos talhões de algodão do requerente, por ter sido efetuado de forma terrestre, mesmo que ocorresse a deriva, devido a distância, (ANEXO 5 e Figura 12), não alcançaria o Talhão 34. Já a pulverização do requerido, aplicada no TH01, em 11/03/2021 de forma aérea, poderia sofrer a inversão térmica e afetar as plantas de milho deste talhão, Figura 13, 14, 15 e 16”. Como todas as pulverizações dos herbicidas nos talhões de milho, soja e algodão na propriedade dos autores foram feitas de forma terrestre, é improvável que tenha ocorrido a deriva ou a inversão térmica (suspensão) que possibilite o deslocamento dos produtos para os talhões de milho mais distantes. Já as pulverizações dos herbicidas aplicados de forma aérea, nos talhões de algodão na propriedade do requerido, possuem maiores probabilidades de terem sofridas deriva ou suspensão e translocadas para os talhões de milho na propriedade dos autores. Em reforço à tal conclusão, em resposta ao quesito complementar nº 3 o qual indagava se os efeitos observados na cultura do milho dos requerentes seriam oriundos da aplicação aérea do requerido referiu que: “as aplicações aéreas dos herbicidas Staple, Envoke e Glifosato podem indicar a origem da pulverização para os talhões de milho 26, 27, 28, 29 e 30, 34, 35-A e 36” (ID 142280921, pg. 33/34). E, em laudo complementar esclareceu, mais uma vez, que o problema teria ocorrido em virtude de pulverizações de forma aérea (ID 142283546, pg. 13): “A convicção subjetiva do perito, e que está relatada no Laudo Pericial, é que o problema teria advindo de pulverizações dos herbicidas tóxicos para a cultura do milho, aplicadas de forma aérea. Tal convicção está fundamentada em estudos científicos e por deduzir que para a mesma região e época, os fatores que condicionam a deriva, tem mais probabilidade de ocorrer nas aplicações aéreas do que nas aplicações terrestres (grifei) E, prosseguiu, em resposta ao quesito complementar nº 4, que indagava acerca da possibilidade da pulverização aérea na propriedade dos autores ter sido causa da fototoxidade das plantas de milho respondendo: “Como não houve aplicação aérea de herbicida por parte dos autores nas culturas de milho e algodão, ID NÚMERO 58094321, PÁGINA 2 a 10, e a última pulverização aérea de herbicida na soja ocorreu em 11/12/2020, ID NÚMERO 58094321, PÁGINAS 19 E 20, o que antecedeu em 60 dias o plantio do talhão 26 (primeiro talhão de milho afetado plantado), estas informações indica que a deriva que contaminou as plantas de milho é proveniente de aplicação de herbicidas via aérea, em lavouras localizadas no entorno da propriedade afetada” (grifei) (ID 142280921, pg. 34). Portanto, segundo a prova anexada foi possível constatar que os danos decorrentes do fenômeno fitotoxidez ocorreram através da pulverização aérea realizada pelos requeridos na lavoura da algodão vizinha. E, nesta medida, o perito judicial, em seus esclarecimentos, em resposta ao quesito nº 6, referiu que a aplicação aérea apenas seria recomendada para o herbicida SELECT 240 EC, destacando os riscos de deriva dos herbicidas Envoke, Staple e Cletodim, dependendo dos fatores envolvidos no momento da aplicação, podendo sofrer o fenômeno da deriva, inclusive através de inversão térmica com depósito fora da área objeto da aplicação, causando a fitotoxidade em culturas que não possuem seletividade para estes herbicidas (ID 142280921, pg. 23): Em sede de esclarecimento, no laudo complementar, em resposta ao “item c” afirmou, expressamente, que as bulas dos herbicidas Envoke e Staple não recomendam a aplicação aérea (ID 142283546, pg. 8). As próprias bulas desses produtos, anexadas aos autos (ID 142280925, págs. 24 (Staple) e pg. 38 (Envoke)), no campo “modo de aplicação”, indicam que o Staple e o Envoke não possuem recomendação para aplicação aérea, e que o Cletodin e o Glifosato (ID 142280926, pg. 23 (Cletodim-Select 240-EC) e ID 142280928 (Glifosato, pg 23), embora permitam aplicação aérea, exigem condições específicas de bicos, volume de calda, diâmetro de gotas, altura de voo, condições climáticas, como, velocidade do vento e ausência de inversão térmica para minimizar a deriva. E, nesse tópico, o próprio assistente técnico do requerido (ID 142284261, pág. 16) admitiu que a aeronave e o pulverizador terrestre do réu utilizavam pontas que geravam gotas finas a muito finas na medida em que referiu: No caso da aplicação aérea era usada a ponta de pulverização de jato plano do tipo defletor, chamada Bico Stol 03, ajustada para 30 L ha-1 e gerava gotas finas. Já para o pulverizador terrestre eram usadas pontas de jato cônico vazio, modelo TXA8004VS, para produzir gotas muito finas a finas, as quais possuem elevado potencial de deriva, conforme a literatura técnica. A análise das amostras de folhas de milho dos talhões afetados dos autores (ID 62544271, págs. 179-198), como visto, revelou a presença de glifosato em quantidade abaixo do limite de quantificação no talhão 30, e ausência dos demais herbicidas (cletodim, piritiobaque-sódico, trifloxisulfurom sódio). Contudo, a ausência de detecção, assim como a ausência de detecção em níveis quantificáveis não afasta, por si só, a ocorrência da deriva, especialmente considerando a volatilidade e a degradação dos produtos ao longo do tempo, bem como a sensibilidade dos métodos de análise. O perito judicial, em seus laudos, manteve a convicção de que os danos foram causados por pulverizações aéreas de herbicidas tóxicos para o milho, fundamentando-se na maior probabilidade de ocorrência de deriva em aplicações aéreas em comparação com as terrestres, e na complexidade dos fatores que influenciam a deriva (ID 142283561, pág. 17). As alegações do requerido de que sua própria lavoura de milho, mais próxima da área de aplicação de algodão, não foi afetada, e que os danos na lavoura dos autores se manifestaram em faixas retilíneas, não são suficientes para desconstituir a conclusão pericial. Quanto a distância entre as plantações o perito em laudo complementar referiu (ID 142281849, pg. 7): “Semelhante aos esclarecimentos anteriores, não há fundamento nos fatos periciados para admitir o atingimento dos talhões conforme alegado pelo REQUERIDO, quando se considera outros parâmetros que foram informados no LAUDO PERICIAL” Nestes termos, no que concerne ao modo uniforme com que foi atingida a plantação o perito esclareceu em resposta ao quesito complementar nº 4 (ID 142280921, pg. 36), que as condições climáticas influem no processo, referindo que se for resultante da ação do vento, haverá diminuição gradual dos sintomas e que, nos casos de inversão térmica, não se poderia afirmar o formato geométrico que se formaria na área afetada. Vejamos: “Se a deriva for resultante da ação do vento apenas no sentido horizontal, o que podemos chamar de exoderiva aerotransportada, ou seja, com arraste das moléculas do glifosato apenas para os lados do alvo, no momento da pulverização, haverá uma diminuição dos sintomas nas plantas afetadas, conforme aumenta a distância do local onde se pretendia aplicar o defensivo. Nos casos de inversão térmica, conhecida por exoderiva de vapor, onde as moléculas dos produtos químicos são suspensas ao ar, quando as gotas de solução se evaporam, não se pode assegurar que haverá um formato uniforme da concentração em forma de nuvens, nem tampouco assegurar qual será a figura geométrica que será formada na área afetata, quando houver a deposição dessas moléculas, sobre as plantas”. O perito judicial explicou, ainda, em laudo complementar que a deriva pode atingir áreas a quilômetros de distância e que os sintomas na área afetada são consequência da intensidade da precipitação no local, não apresentando necessariamente um comportamento regular de redução da intensidade à medida que se distancia da área alvo (ID 142283561, pág. 4). A ausência de danos na lavoura de milho do requerido pode ser explicada pela variabilidade das condições climáticas no momento da aplicação, como a direção do vento, que pode ter direcionado a deriva para a propriedade dos autores. Quanto às supostas falhas operacionais dos autores, o perito judicial reconheceu que a mistura de híbridos de milho (transgênico com convencional) foi uma falha e não uma prática comum (ID14283561, pág. 12/13 e ID 142283563, pg. 8/9 e ID 142283563, pg. 8). No entanto, no “esclarecimento 2” (ID 142283563, pg. 8), ele não a considerou como o fator gerador da perda da plantação, afirmando que a análise dos fatos não o conduziu a essa hipótese. Da mesma forma, a presença de lagartas foi verificada em algumas plantas danificadas, mas não em quantidade que justificasse a perda de produtividade da lavoura (ID 142283563, pág. 9/11 e ID 142281849, pg 6/7). A falta de vistoria nas máquinas dos autores e a ausência de apuração sobre a higienização dos equipamentos, embora levantadas pelo requerido, não foram consideradas determinantes pelo perito para a formação de sua convicção, que se baseou em um conjunto mais amplo de fatores (ID 14283563, pág. 12 e ID 142281849, pg. 7). Nestes termos, inclusive o perito referiu no laudo complementar (ID 142281849, pg. 7): “Conforme já esclarecido nos quesitos suplementares do REQUERIDO, a higienização incorreta, ou a falta de higienização dos equipamentos de aplicação poderia causar danos na plantação, desde que os produtos utilizados antes sejam tóxicos para as plantas. Na perícia não foram constatados fatos que fundamentasse essa suposição” (grifei). A alegação de que os autores teriam aplicado o herbicida "Zino" (Hexazinona) sem registro para a cultura do milho e em dose acima do recomendado em bula, embora grave, não foi o ponto central da conclusão pericial sobre a causa dos danos, que se focou na deriva dos produtos aplicados pelo requerido. Ademais, quanto ao ponto referido pelo requerido no sentido de ter o perito operado com subjetivismo no laudo, tais constatações foram refutadas quando da resposta aos esclarecimentos tecidos pelo perito (ID 142281849, pg. 9), que referiu que as conclusões se traduziram na certeza que ele, particularmente, adquiriu por fatos demonstrados na perícia (não se tratando, pois se subjetivismo). Quanto a responsabilidade civil no presente caso se enquadra na modalidade objetiva, conforme o disposto no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, que estabelece a obrigação de reparar o dano independentemente de culpa nos casos em que a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Neste sentido, colaciono o seguinte julgado: E M E N T A CÍVEL - RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – PRELIMINARES – ILEGITIMIDADE PASSIVA – SENTENÇA ULTRA PETITA – NULIDADE DA PERÍCIA – REJEITADAS – MÉRITO – PULVERIZAÇÃO DE HERBICIDA GLIFOSATO – DANOS EM LAVOURA VIZINHA - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA – PROVAS DOS AUTOS QUE CONCLUEM PELA EXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE – HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS – LEGALIDADE – RECURSOS DESPROVIDOS. Não havendo razões para desconstituição da perícia ou qualquer nulidade no julgamento, mantém-se a sentença. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Caracteriza-se a sentença como ultra petita quando o juiz concede à parte mais do que foi pedido na petição inicial, o que não se verifica no presente caso . Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. O uso inadequado de herbicida que atinge propriedade vizinha e destrói completamente a plantação caracteriza ato ilícito passível de reparação. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1000603-65.2019 .8.11.0048, Relator.: MARCIO VIDAL, Data de Julgamento: 11/06/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/06/2024) (grifei) A pulverização aérea de defensivos agrícolas, especialmente em áreas contíguas a outras culturas sensíveis, é uma atividade que, por sua própria natureza, envolve risco de deriva e, consequentemente, de causar danos a terceiros. Ao optar por essa modalidade de aplicação, o requerido assumiu o risco inerente à atividade, independentemente de ter agido com dolo ou culpa em sentido estrito. A imprudência e a imperícia na condução da aplicação, como a utilização de produtos não recomendados para aplicação aérea ou a não observância das condições climáticas ideais, apenas reforçam a responsabilidade do agente. A prova pericial, produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, com a participação de assistentes técnicos de ambas as partes e a possibilidade de formulação de quesitos e pedidos de esclarecimento, é robusta e conclusiva quanto ao nexo causal entre a aplicação dos defensivos pelo requerido e os danos à lavoura de milho dos autores. Os laudos detalham a fitotoxidade causada pelos produtos, a extensão da área afetada e o valor do prejuízo. A insistência do requerido em desqualificar a perícia, sem apresentar elementos técnicos concretos que a infirmem de forma cabal, não se sustenta diante da análise objetiva das provas. A decisão de homologação dos laudos na Ação de Produção Antecipada de Provas já reconheceu a regularidade e a eficácia da prova produzida. Quanto aos danos, o laudo pericial (ID 142280921, págs. 25-29, e ID 142281849, pág. 3) quantificou o valor total da perda suportada pelos autores em R$ 8.720.693,14 (oito milhões, setecentos e vinte mil, seiscentos e noventa e três reais e quatorze centavos), valor este que abrange tanto os danos emergentes (o que efetivamente perderam com os gastos de plantio) quanto os lucros cessantes (o que razoavelmente deixaram de lucrar com a colheita não realizada). O perito esclareceu que este valor foi obtido pela diferença entre a receita bruta que os requerentes faturariam com a venda do milho em condições normais (R$ 9.492.304,21) e a receita bruta efetivamente faturada (R$ 771.611,07). Portanto, a alegação do requerido de que os lucros cessantes seriam hipotéticos ou que haveria enriquecimento indevido pela cumulação de danos emergentes e lucros cessantes não se sustenta, uma vez que o cálculo pericial já considerou a perda líquida da safra. A ausência de notas fiscais ou recibos específicos para cada item de custo, embora ideal, não invalida a quantificação realizada pelo perito, que se baseou em dados técnicos e de mercado para a estimativa da produtividade e dos custos da lavoura. No que tange aos danos morais, a perda de uma lavoura de milho de tamanha extensão e valor, que representa o sustento e o investimento de produtores rurais, transcende o mero aborrecimento cotidiano. A situação de ver a produção de anos de trabalho ser devastada por uma conduta alheia, gerando dívidas e instabilidade financeira, é inegavelmente capaz de causar angústia, frustração e abalo psicológico. A indenização por danos morais, nesse contexto, visa não apenas a compensar o sofrimento dos ofendidos, mas também a cumprir um papel pedagógico e punitivo, desestimulando a reiteração de condutas negligentes por parte do ofensor. Considerando a gravidade do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida, o valor pleiteado pelos autores a título de danos morais mostra-se razoável. Neste sentido, colaciono o seguinte julgado: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – APLICAÇÃO DE HERBICIDA VIA AÉREA EM DETRIMENTO DA FORMA TRATORIZADA, CONFORME INDICADO NA BULA – “DERIVA DO PRODUTO” – DANIFICAÇÃO DA LAVOURA VIZINHA – PRESSUPOSTOS PARA A RESPONSABILIZAÇÃO PRESENTES – DANOS MATERIAIS, EMERGENTES E LUCROS CESSANTES COMPROVADOS – DANO MORAL CONFIGURADO – PRECEDENTES EM CASOS ANÁLOGOS – SENTENÇA REFORMADA PARA JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS DA INICIAL – RECURSO PROVIDO. O proprietário de lavoura responde pelos danos decorrentes de sua conduta que, ao aplicar herbicida e/ou agrotóxico, por meio de aeronave, que deveria ser realizada de forma tratorizada, atinge a lavoura lindeira causando a morte da plantação de melancias. Danos materiais e emergentes suficientemente comprovados, assim como os lucros cessantes, haja vista que o lucro esperado pelo autor se tornou inexistente. O dano moral está demonstrado, pois se presumem os sentimentos de impotência, abatimento e inconformismo de quem se depara com a repentina deterioração material de plantação, cujo cultivo exigiu esforço próprio e árduo trabalho . (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 0001252-28.2018.8.11 .0098, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 08/11/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/11/2023) (grifei) Assim, a procedência do pedido é medida que se impõe. III – DISPOSITIVO Ante ao exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial para: (a) CONDENAR o requerido CELSO CARLOS ROQUETTO ao pagamento de indenização por danos materiais e lucros cessantes no valor de R$ 8.720.693,14 (oito milhões, setecentos e vinte mil, seiscentos e noventa e três reais e quatorze centavos). Sobre este valor, deverá incidir correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir de março de 2021 (data do prejuízo efetivo, conforme laudo pericial) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação. (b) CONDENAR o requerido CELSO CARLOS ROQUETTO ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Sobre este valor, deverá incidir correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir da data desta sentença (Súmula 362, STJ) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação (22/04/2024). Em razão da sucumbência, condeno o requerido ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Havendo recurso: Na hipótese de interposição do recurso de apelação, certifique-se acerca da tempestividade e, em seguida, intime-se a parte recorrida para, no prazo 15 (quinze) dias, apresentar suas contrarrazões de apelação, na forma do artigo 1.010, §1º do CPC. Após, com ou sem contrarrazões recursais, voltem para análise do recurso. Preclusa a via recursal, certifique-se o trânsito em julgado. Com o trânsito em julgado, e não havendo requerimento(s), remetam-se os autos ao arquivo, na condição de findo, mediante adoção e anotações de praxe. Havendo pedido de cumprimento de sentença: a) Intime-se o devedor para pagamento no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa de 10% sobre o valor da condenação. No mandado deverá, ainda, constar a faculdade de, querendo, o executado impugnar o cumprimento de sentença, nos termos do art. 525, do CPC/15; b) Transcorrido o prazo para pagamento voluntário, intime-se a parte exequente para que apresente, no prazo de 05 (cinco) dias, memória atualizada e discriminada do débito, incluídas as sanções constantes do art. 523, §1º, do CPC; c) Apresentada impugnação, intime-se a parte contrária para manifestação em 15 dias; após, conclusos para decisão. e arquive-se com as baixas e cautelas de estilo. Não havendo pedido de cumprimento de sentença: a) arquive-se. Cumpra-se, providenciando e expedindo o necessário, servindo a presente decisão como mandado/ofício/requisição. São Félix do Araguaia-MT, data da assinatura eletrônica. LUIS OTÁVIO TONELLO DOS SANTOS Juiz de Direito Substituto

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Processo nº 1007447-68.2025.8.11.0000

ID: 305754066

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: AGRAVO REGIMENTAL CíVEL Nº Processo: 1007447-68.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

EDUARDO GALVAO MESSIAS

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

GUSTAVO CIPULLO NESTERUK MOREIRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Gabinete 3 - Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo CLASSE PROCESSUAL: AGRAVO REGIMENTAL … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Gabinete 3 - Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo CLASSE PROCESSUAL: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) NÚMERO DO PROCESSO: 1007447-68.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: EDUARDO GALVAO MESSIAS AGRAVADO: MUNICIPIO DE AGUA BOA, ESTADO DE MATO GROSSO DECISÃO MONOCRÁTICA Vistos, etc. Trata-se de recurso de “AGRAVO DE INSTRUMENTO”, interposto por EDUARDO GALVÃO MESSIAS, contra a decisão proferida pelo Excelentíssimo Juiz de Direito, Dr. Agamenon Alcântara Moreno Júnior, nos autos da “AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA DE URGÊNCIA” n.º 1000358-28.2025.8.11.0021, proposta pela parte agravante, em face do ESTADO DE MATO GROSSO e do MUNCIPIO DE ÁGUA BOA, MT, cujo trâmite ocorre no Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública, que indeferiu a tutela de urgência vindicada, nos seguintes termos (ID. 184799961 – processo n.º 1000358-28.2025.8.11.0021): “Vistos, etc. Trata-se de ação de obrigação de fazer ajuizada por EDUARDO GALVAO MESSIAS contra o ESTADO DE MATO GROSSO e do MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA, objetivando a concessão da tutela provisória de urgência para compelir os requeridos ao fornecimento do medicamento Nintedanibe 150mg. A parte autora registra, em síntese, que é portador de fibrose pulmonar idiopática (CID J84.1), doença crônica, progressiva e incurável, caracterizada pela perda da capacidade pulmonar devido à fibrose dos alvéolos, e que diante de seu quadro clinico necessita do medicamento pleiteado. Com a inicial vieram os documentos. Determinação de emenda a inicial, id. 182683439. Novos documentos juntados pela parte autora, id. 182882517 a 182882511. Parecer do Núcleo de Apoio Técnico – NAT ao Id. 184594478. É o relatório. Decido. No caso em análise, a parte autora recorre ao Judiciário com o objetivo de compelir o requerido a adotar todas as medidas necessárias para o fornecimento do medicamento Nintedanibe 150mg. Foi determinado que a parte autora emendasse a inicial para se adequar ao Tema 6 do STF. Os autos foram encaminhados ao Núcleo de Apoio Técnico, que apresentou parecer nos seguintes termos: “Tipo da Tecnologia: Medicamento Registro na ANVISA? Sim Situação do registro: Válido Princípio Ativo: ESILATO DE NINTEDANIBE (...) Previsto em Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Min. da Saúde para a situação clínica do demandante? Não O medicamento está inserido no SUS? Não Oncológico? Não (...) Conclusão Tecnologia: ESILATO DE NINTEDANIBE Conclusão Justificada: Não favorável Conclusão: Considerando o dignóstico como Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.1), de acordo com relatório médico (fl. 19) acostados nos autos. O medicamento Esilato de Nintedanibe não pertence à Relação Nacional de Medicamentos Essenciais– RENAME 2024 e não faz parte de nenhum Componente de Assistência Farmacêutica no SUS, portanto não está disponível no SUS. Considerando os estudos apresentados com o tempo de acompanhamento dos pacientes, por se tratarem de estudos de curto prazo, geram incertezas em relação a real eficácia do medicamento no retardo da progressão da doença, em especial com relação ao benefício trazido ao paciente em termos de resultados de sobrevida e melhora da qualidade de vida. O medicamentos ( nintedanibe) possui registro ativo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e consta em bula indicação é indicado para o tratamento e retardo da progressão da fibrose pulmonar idiopática (FPI). Ressalta-se que, no momento não foi publicado pelo Ministério da Saúde Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para o manejo da Fibrose Pulmonar Idiopática (FPI), portanto não há lista oficial e específica de medicamentos que possam ser implementados nestas circunstâncias. Considerando a recomendação da CONITEC pela não padronização do nintedanibe para fibrose pulmonar idiopática e que após consulta pública reafirmou sua decisão pela não incorporação no SUS o medicamento nintedanibe para o tratamento da fibrose pulmonar idiopática (FPI). Conclui NÃO FAVORÁVEL a demanda judicial.” [Id. 184594478] Pois bem. O Supremo Tribunal Federal, em precedente vinculante consagrado no Tema 06, decidiu que a “a ausência de inclusão de medicamento nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUME, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo”. Todavia, é possível excepcionalmente a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, sendo exigida a presença cumulativa dos seguintes requisitos: “[...] 2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação: (A) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item ‘4’ do Tema 1.234 da repercussão geral; (B) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011; (C) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas; (D) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise; (E) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e (F) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento. Ademais, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do artigo 489, § 1º, incisos V e VI, e artigo 927, inciso III, § 1º, ambos do Código de Processo Civil, o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente: 1. Analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo de não incorporação pela Conitec ou da negativa de fornecimento da via administrativa, à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, especialmente a política pública do SUS, não sendo possível a incursão no mérito do ato administrativo; 2. Aferir a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, previstos no item 2, a partir da prévia consulta ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível na respectiva jurisdição, ou a entes ou pessoas com expertise técnica na área, não podendo fundamentar a sua decisão unicamente em prescrição, relatório ou laudo médico juntado aos autos pelo autor da ação; e 3. No caso de deferimento judicial do fármaco, oficiar aos órgãos competentes para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS”. Por conseguinte, ocorreu a publicação da Súmula vinculante nº 61, que determina que “a concessão de medicamentos registrados na ANVISA, mas não incorporados ao Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471)”. Destaco que “se todos esses requisitos forem cumpridos e se houver a concessão judicial do medicamento, ficará garantido ao autor da ação o direito individual ao tratamento” (RE 566.471 (Tema 6)). Com efeito, é possível concluir que o ônus da prova recai sobre a parte autora, devendo demonstrar perante o juízo o preenchimento dos requisitos fixados pelo Supremo Tribunal, para que seja possível a concessão dos medicamentos pleiteados. Nessa toada, foi determinada a emenda a inicial para a juntada dos documentos necessários aos autos, ocasião que a parte autora informou o cumprimento dos requisitos. O Núcleo de Apoio Técnico – NAT atesta que o medicamento pleiteado não está inserido no Sistema Único de Saúde, conforme nota técnica ao Id 184594478. Assim, passa-se a analisar se o medicamento requerido na inicial preenche os requisitos do precedente supracitado. REQUISITO I (Item A) A parte autora juntou aos autos a negativa administrativa para o fornecimento do medicamento pleiteado. Constata-se ao id. 182548532, a declaração emitida pela Secretaria Municipal de Saúde de Água Boa/MT que “o medicamento supracitado, o qual pertence ao grupo de fármacos classificados como "antifibróticos", não faz parte do elenco disponibilizado pelo SUS, não estando inserido na RENAME (Relação Nacional de Medicamentos Essenciais) e tampouco é contemplado pelas Portarias de Consolidação nº 2 e n° 6 de 2017, não sendo, portanto, passível de compor processo junto ao Componente Especializado da Assistência Farmacêutica para aquisição e fornecimento pelo Estado da referida medicação, nem estando disponível para dispensação em nossa Farmácia Municipal”. Dessa forma, houve cumprimento do requisito nos termos do item ‘4’ do Tema 1.234 da repercussão geral. REQUISITO II (Item B) A parte autora promoveu a juntada do Relatório de Recomendação n. 102/2021 da CONITEC que avaliou o uso dos medicamentos “ESILATO DE NINTEDANIBE PARA O TRATAMENTO DE FIBROSE PULMONAR IDIOPÁTICA”. (Id. 182882517), no qual os membros do Plenário da CONITEC concluíram “pela não incorporação do nintedanibe para o tratamento da fibrose pulmonar idiopática (FPI), no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS”. Todavia, a parte autora não apresentou elementos suficientes para comprovar a ilegalidade da decisão de não incorporação do medicamento pela CONITEC. REQUISITO III (Item C) O relatório médico juntado ao id. 182548527 atesta a necessidade do uso do medicamento pleiteado, bem como a inexistência de medicação semelhante disponível no SUS. Dessa forma, restou evidenciada a impossibilidade de substituição do medicamento solicitado por outro incluído nas listas do SUS ou nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas. REQUISITO IV (Item D) Concernente ao Item D, inicialmente faz-se necessário conceituar o que são os ensaios clínicos randomizados e a revisão sistemática com meta-análise. De acordo com Alexandre Biasi Cavalcanti, editor responsável pelo artigo “os diferentes delineamentos de pesquisa e suas particularidades na terapia intensiva”, publicado na Revista Brasileira de Terapia Intensiva, edição de 28 de Setembro de 2016: Ensaio clínico randomizado (ECR) - Estudo intervencionista e prospectivo. Os participantes devem ter a mesma oportunidade de receber, ou não, a intervenção proposta e esses grupos devem ser os mais parecidos possíveis, de forma que a única diferença entre eles seja a intervenção em si, podendo-se, assim, avaliar o impacto na ocorrência do desfecho em um grupo sobre o outro. É o padrão de excelência em estudos que pretendem avaliar o efeito de uma intervenção no curso de uma situação clínica. Permite eliminar diversos vieses, pois os grupos intervenção e controle são alocados usando técnicas aleatórias, e as características são distribuídas de um modo semelhante entre os grupos ([1];[2]). Revisão sistemática com meta-análise: O objeto de análise deixa de ser os pacientes e passa a ser as pesquisas já realizadas anteriormente sobre determinado objeto de pesquisa. Os trabalhos originais publicados na literatura são revisados e selecionados de maneira sistemática, e os resultados deles podem ser sumarizados sob um único parâmetro de magnitude de efeito (a metanálise)(1,[3]).Idealmente, deve reunir toda a evidência existente referente a um assunto, e a busca de artigos deve ocorrer em mais de um banco de dados. (Disponível em https://www.scielo.br/j/rbti/a/c3hJkx3qbXPzG3g7QthBNKd/ , acesso em 18/11/2024, às 15h24min). No caso em tela, a parte autora juntou os seguintes artigos científicos: “Eficácia e Segurança do Nintedanib na Fibrose Pulmonar Idiopática,. (...) Conclusão: Em pacientes com fibrose pulmonar idiopática, o nintedanibe reduziu a diminuição da Capacidade Vital Forçada (CVF), o que é consistente com uma desaceleração da progressão da doença; o nintedanibe foi frequentemente associado à diarreia, que levou à descontinuação do medicamento em menos de 5% dos pacientes. (Financiado pela Boehringer Ingelheim; números dos ensaios clínicos INPULSIS-1 e INPULSIS-2, NCT01335464 e NCT01335477.)”[id. 182882514] “Nintedanibe em pacientes com fibrose pulmonar idiopática: Evidências combinadas dos ensaios TOMORROW e INPULSIS® (...) Conclusão A totalidade das evidências dos ensaios TOMORROW e INPULSIS® apoia a conclusão de que há um efeito benéfico do nintedanibe na desaceleração da progressão da doença em pacientes com fibrose pulmonar idiopática (FPI). As estimativas do efeito do tratamento com nintedanibe foram consistentes em todas as análises.” [id. 182882512] “Segurança e tolerabilidade de Nintedanibe em pacientes com fibrose pulmonar idiopática no Brasil (...) Conclusão No PEA brasileira, 11% e 23% dos pacientes tratados com Nintedanibe receberam tratamento concomitante com N-acetilcisteína e corticosteroides sistêmicos, respectivamente. Em uma pesquisa recente com 455 médicos da América Latina, 29% e 48% prescreveram N-acetilcisteína e corticosteroides, respectivamente, para o tratamento da FPI.(24) Esses achados sugerem que o uso dessas terapias de baixo custo permanece elevado na América Latina, apesar da falta de evidências que comprovem sua eficácia como tratamento para FPI.(11,25,26) Em conclusão, em um PEA para pacientes com FPI no Brasil, o uso de 150 mg de Nintedanibe, 2 vezes ao dia, apresentou um perfil aceitável de segurança e tolerabilidade, consistente com o observado em ensaios clínicos.” [id. 182882511] Dessa forma, ficou comprovada a exigência do Item “D” que respalda sobre a eficácia, efetividade e segurança do medicamento. REQUISITO V (Item E) O médico responsável pelo acompanhamento do paciente atesta, no relatório médico de id. 182548527, a imprescindibilidade do medicamento prescrito. Todavia, não especificou quais medicamentos foram previamente utilizados pelo paciente, de forma a fundamentar a necessidade do uso de um medicamento que não está previsto nas listas de dispensação do SUS. REQUISITO VI (Item F) Em relação à alegação de incapacidade financeira para arcar com os custos do medicamento pleiteado, a parte autora apresentou, nos autos, a declaração de hipossuficiência sob o Id. 182548522. Contudo, tal documento, por si só, não é suficiente para comprovar a impossibilidade de suportar as despesas necessárias à aquisição do referido medicamento uma vez que não foram juntados outros documentos demonstrem a renda e a situação financeira da parte requerente, a fim de se aferir a real condição de vulnerabilidade econômica. Diante das explicações realizadas e da fundamentação apresentada, conclui-se, em juízo de cognição sumária, que não foram cumpridas todas as exigências para o fornecimento da medicação não padronizada pelo SUS, em razão do não atendimento aos requisitos previstos nos itens “B”, “E” e “F” do Tema 6 do Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – ASSISTÊNCIA À SAÚDE – MEDICAMENTO RIVAROXABANA 20 MG – TROMBOSE VENOSE - PARECER DO NAT - DESFAVORÁVEL – MEDICAMENTO NÃO INTEGRA LISTA DO SUS - AUSÊNCIA DE PROVA MÉDICA QUANTO À INEFICÁCIA DO FÁRMACO FORNECIDO PELO SUS PARA TRATAMENTO DA ENFERMIDADE – REQUISITOS AUTORIZATIVOS NÃO DEMONSTRADOS - DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O direito à vida e à saúde, nos termos do artigo 196, da CRF, deve ser resguardado pelos entes públicos, mediante o custeio de consultas, realização de exames, medicamentos e cirurgias indispensáveis ao cidadão. Não há prova de que o medicamento disponibilizado pelo SUS para tratamento da enfermidade que acomete o paciente é ineficaz e o parecer do NAT é desfavorável ao fornecimento por não integrar o fármaco a relação do SUS. Logo, os requisitos necessários ao deferimento do pedido da tutela de urgência não foram preenchidos. (TJ-MT 10188520920228110000 MT, Relator: MARCIO VIDAL, Data de Julgamento: 30/01/2023, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 10/02/2023). À vista do exposto, INDEFIRO a tutela de urgência vindicada. Intime-se a parte autora para comprovar a condição de hipossuficiência, nos termos do artigo 99, §2º do CPC, sob pena de indeferimento do pedido. Citem-se os requeridos para apresentação de defesa no prazo de 30 dias úteis (art. 335 c/c 183 do CPC), ciente de que a ausência desta implicará na revelia e presunção de veracidade da matéria fática apresentada na petição inicial (art. 344 e 389, ambos do CPC). Diante das especificidades da causa e de modo a adequar o rito processual às necessidades do conflito, deixo para momento oportuno a análise da conveniência da audiência de conciliação (CPC, art. 139, V). Com a apresentação oportuna e tempestiva de contestação pelos requeridos, com preliminares ou defesa indireta (art. 337, 350 e 351 do CPC), dê-se vista à parte Autora para a réplica. Caso os requeridos silenciem, venham os autos conclusos para reconhecimento da revelia, se o caso (art. 344, com as exceções do art. 345, ambos do CPC). Após, conclusos para decisão interlocutória de saneamento (art. 357, CPC) ou julgamento do processo no estado em que se encontra (art. 355, CPC). À Secretaria para as providências necessárias. Várzea Grande/MT, data registrada no sistema. AGAMENON ALCÂNTARA MORENO JÚNIOR Juiz de Direito”. Distribuído o processo perante este Egrégio Tribunal de Justiça, os autos vieram conclusos, não sendo atribuído a ele o pedido de tutela antecipada (ID. 278400863). Contra a decisão monocrática que indeferiu o pedido de tutela antecipada, a parte agravante interpôs “AGRAVO INTERNO” (ID. 279526360). A parte agravada apresentou contrarrazões, nas quais requer o não provimento do recurso (ID. 282847362). É o relatório. Decido. Da análise dos autos, verifica-se que o vertente recurso não ultrapassa os pressupostos de admissibilidade necessários para o seu conhecimento. Em consulta ao sistema eletrônico pertinente, constata-se que no processo que originou este agravo que ora se analisa, foi julgado procedente o pedido (sentença de ID. 197405474 – processo n.º 1000358-28.2025.8.11.002), nos seguintes termos: “Vistos, etc. Trata-se de ação de obrigação de fazer ajuizada por EDUARDO GALVAO MESSIAS contra o ESTADO DE MATO GROSSO e do MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA, objetivando a concessão da tutela provisória de urgência para compelir os requeridos ao fornecimento do medicamento Nintedanibe 150mg. A parte autora registra, em síntese, que é portador de fibrose pulmonar idiopática (CID J84.1), doença crônica, progressiva e incurável, caracterizada pela perda da capacidade pulmonar devido à fibrose dos alvéolos, e que diante de seu quadro clinico necessita do medicamento pleiteado. Com a inicial vieram os documentos. Determinação de emenda a inicial, id. 182683439. Novos documentos juntados pela parte autora, id. 182882517 a 182882511. Parecer do Núcleo de Apoio Técnico – NAT ao Id. 184594478. Tutela de urgência foi indeferida no ID. 184799961. O MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA apresentou contestação (Id. 185551967), alegando a ausência de demonstração da imprescindibilidade do medicamento pela parte Autora, ainda, a competência do Estado no cumprimento da obrigação em fornecer medicamento de alto custo, nos termos das regras de repartição de competência, estabelecido pelo Tema 793 STF, ainda, que caso de eventual condenação sejam atribuídos obrigações menos acentuadas ao Município. Nesses termos, requereu o direcionamento da responsabilidade ao Estado de Mato Grosso e a improcedência dos pedidos autorais. Manifestações da parte autora aos IDS. 185685095 e 185880380. O ESTADO DE MATO GROSSO apresentou contestação (Id. 187194439), alegando preliminarmente: a)Ilegitimidade passiva – plano de saúde; b) Hipossuficiência não comprovada; c) Medicamento “Fora do SUS” - Competência Judicial em discussão. Necessidade de consulta constante da situação do Tema 1234 do STF; d) medicamento rejeitado pela CONITEC; e) incorreção do valor da causa; e) ausência de prévio requerimento administrativo – inépcia. No mérito, sustentou a responsabilidade primária da União, considerando tratar-se de medicamento não incorporado no SUS. Alega a ausência da comprovação da ineficácia dos medicamentos fornecidos pelo SUS, imprescindibilidade do medicamento e a incapacidade financeira de arcar com os custos do fármaco. Por fim, aponta a necessidade de renovação periódica da prescrição médica a cada 3 (três) meses bem assim, a liberação gradual dos valores eventualmente penhorados das contas publicas e a prestação de contas ao juízo, nos termos dos enunciados 2, 15, 32, 54 e 55 das Jornadas de Saúde do CNJ. Nesses termos, requereu direcionamento da responsabilidade à União e a improcedência dos pedidos e ainda a limitação do preço ao teto previsto pelo Tema 1.033 do Supremo Tribunal Federal (TABELA CMED). Impugnação a contestação apresentada ao ID. 188841622. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. No caso, estão preenchidos os pressupostos de constituição e inexiste pendência de questão processual, de modo que o feito se revela apto para julgamento, motivo pelo qual passo ao julgamento antecipado da lide, na forma do art. 355, I do CPC. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO – REQUERENTE BENEFICIÁRIO DE PLANO DE SAÚDE. Trata-se de preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Estado de Mato Grosso, sob o fundamento de que a parte autora possui plano de saúde privado (UNIMED – BARRA DO GARÇAS, ID 185685100), o que afastaria a responsabilidade do ente público pelo fornecimento do medicamento indicado. Contudo, a preliminar não merece acolhimento, pelos fundamentos que seguem: 1. Do Direito à Saúde e da Solidariedade dos Entes Federados (Art. 196 da CF/88) O direito à saúde é um direito fundamental social, garantido a todos os cidadãos pelo artigo 196 da Constituição Federal de 1988, que estabelece: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". A interpretação desse dispositivo constitucional leva à conclusão de que a responsabilidade pela prestação de serviços de saúde é solidária entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Essa solidariedade implica que qualquer um dos entes federados pode ser demandado para garantir o acesso às ações e serviços de saúde, não havendo que se falar em ilegitimidade passiva de um deles. A finalidade precípua dessa solidariedade é assegurar o direito fundamental à saúde, permitindo que o cidadão obtenha o tratamento necessário sem entraves burocráticos ou discussões acerca da competência de cada ente. 2. Da Irrelevância da Titularidade de Plano de Saúde Privado e da Comprovação da Hipossuficiência Financeira A alegação de que a parte autora possui plano de saúde privado e, por isso, o Estado seria parte ilegítima, não se sustenta. A titularidade de um plano de saúde não é, por si só, indicativo de capacidade financeira para arcar com medicamentos de alto custo, especialmente em casos de tratamentos contínuos e de valores elevados, como o medicamento Nintedanibe 150mg, cujo custo mensal varia entre R$ 12.000,00 e R$ 15.000,00. A análise da hipossuficiência financeira para fins de concessão de medicamentos pelo Poder Público deve ser feita de forma individualizada, considerando a real capacidade do indivíduo de suportar os custos do tratamento. O fato de possuir plano de saúde não exime o Estado de sua responsabilidade constitucional de prover o tratamento, principalmente quando o plano se recusa a cobrir o medicamento ou quando o custo é manifestamente exorbitante para o orçamento familiar, mesmo para aqueles que possuem alguma cobertura suplementar. Nesse sentido, a Declaração de Imposto de Renda referente ao ano de 2024 (ID 185685100), acostada aos autos, comprova que o rendimento mensal da parte autora é incompatível com o valor do tratamento vindicado. Tal documento demonstra, de forma inequívoca, a hipossuficiência financeira da parte para custear o medicamento, reforçando a necessidade da intervenção estatal para garantir o acesso ao tratamento essencial à sua saúde e vida. Os Temas 1234 e 6 do STF, embora não tratem diretamente da solidariedade, reforçam a necessidade de análise da capacidade financeira do indivíduo e a primazia do direito à saúde em face de questões orçamentárias, quando comprovada a hipossuficiência. Diante do exposto, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Estado de Mato Grosso. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL – AUSENCIA DE PREVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO No que tange à preliminar de falta de interesse de agir, cumpre salientar que a ausência de requerimento administrativo ou esgotamento da via administrativa não constitui óbice ao ajuizamento de demanda judicial, à luz do artigo 5º, XXXV da Constituição Federal. Neste sentido: “MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. TEMA 106/STJ.MODULAÇÃO DOS EFEITOS. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR NÃO CONFIGURADO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA.PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA E ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA VERIFICADAS. CARÊNCIA DO DIREITO DE AÇÃO NÃO CONFIGURADA. PRELIMINARES AFASTADAS. DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. FORNECIMENTO DEVIDO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. NECESSIDADE DE RENOVAÇÃO DA PRESCRIÇÃO MÉDICA E DEVOLUÇÃO DE MEDICAMENTO NÃO UTILIZADO. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA. INVIABILIDADE. BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. (...) 2. Não há falar-se em ausência de interesse de agir da Substituída, sob o argumento de que ela não esperou o recebimento administrativo do medicamento pleiteado, posto que, o fato de haver processo licitatório aberto, para a aquisição do medicamento, não impede que o Poder Público seja compelido a cumprir o seu dever constitucional de promoção da saúde. Ademais, o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição impede que o prévio requerimento, na via administrativa, seja exigido como condição de procedibilidade do mandamus. (..). SEGURANÇA CONCEDIDA”. (TJGO, Mandado de Segurança (CF, Lei12016/2009) 5151725 32.2017.8.09.0000, Rel. MAURICIO PORFIRIO ROSA, 5ª Câmara Cível, julgado em 12/04/2019, DJe de 12/04/2019). Desta forma, o esgotamento da via administrativa não pode servir de empecilho para que o interessado solicite a prestação jurisdicional, mormente porque esta é uma garantia constitucional. Portanto, REJEITO a preliminar suscitada. MEDICAMENTO “FORA DO SUS” - COMPETÊNCIA JUDICIAL EM DISCUSSÃO. NECESSIDADE DE CONSULTA CONSTANTE DA SITUAÇÃO DO TEMA 1234 DO STF O Estado de Mato Grosso aduz a incompetência absoluta da justiça estadual e a necessidade de inclusão da União no polo passivo sob o argumento de que os medicamentos não assegurados no SUS são de sua responsabilidade. Aponta que se trata de medicamento não padronizado pelo Sistema Único de Saúde, mas registrado na ANVISA requerendo a análise da situação nos moldes do Tema 1234 do Supremo Tribunal Federal. Pois bem. Conforme decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos embargos de declaração relativos ao Tema 1234 (RE 1.366.243/SC), em 16/12/2024, foi expressamente modulada a aplicação dos efeitos da tese fixada quanto à competência, para restringi-la às ações ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico ocorrida em 11/10/2024, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco. Vejamos: “[...] 2) rejeitou os embargos de declaração opostos pelo Estado de Santa Catarina, mas os acolheu a título de esclarecimentos e sem efeitos modificativos para constar do item 1, referente à Competência, a seguinte redação: 1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS e medicamentos oncológicos, ambos com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC; 3) acolheu parcialmente os embargos opostos pela União, tão somente quanto à modulação dos efeitos da decisão no que se refere à competência, para abarcar também os medicamentos incorporados, devendo ser suprimido do Capítulo 5 do voto condutor do acórdão embargado a remissão ao "item 1 do acordo firmado na Comissão Especial", por referir-se unicamente aos medicamentos não incorporados. Consequentemente, os efeitos do tema 1234, quanto à competência, somente se aplicam às ações que forem ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco, sem possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco jurídico. Tudo nos termos do voto do Relator. O Ministro Luiz Fux acompanhou o Relator com ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 6.12.2024 a 13.12.2024. [Grifo nosso]. No caso em análise, verifico que o custo anual do medicamento não excede 210 salários mínimos. Portanto, não há qualquer razão para o acolhimento da preliminar de inclusão obrigatória da União no polo passivo e de remessa do feito à Justiça Federal, razão pela qual rejeito a preliminar arguida. Passo a análise do mérito. Com relação ao mérito, o direito fundamental à saúde está inserido no conceito de dignidade humana, conforme delineado no inciso III do artigo 1º da Constituição Federal, pois a dignidade não pode ser plenamente assegurada na ausência de condições mínimas para a preservação da saúde do indivíduo. De igual modo, a proteção do direito à saúde encontra-se expresso no caput do artigo 5º da Constituição, o qual resguarda o direito à vida, como o mais primordial dos direitos fundamentais. Além disso, o artigo 196 da Carta Magna de 1988 afirma que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Ademais, a tutela desse direito indisponível também é amparada pela Lei n. 8.080/90, que delimita os princípios do sistema de saúde nacional, reconhecendo referido direito como fundamental do individuo e impondo ao Estado (em sentido genérico) a obrigação de assegurar a sua efetivação, nos termos precisos do art. 2º, conforme segue: Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. Assim, evidente que incumbe ao Poder Público zelar pela integridade deste direito público subjetivo garantido pela Constituição, providenciando os meios necessários para assegurar a plena realização dos propósitos delineados no artigo 196 da Constituição Federal de 1988. Nessa toada, conforme orientação jurisprudencial dominante sobre a disciplina do direito fundamental de saúde, insculpido pela Constituição Federal ao estabelecer no artigo 196 que esse é um dever do Estado, entendo que, se esse Estado foi constituído sobre a forma federativa (art. 60, § 4º, I, da CR/88), todos os entes (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) detêm a obrigação de promovê-lo à população de forma solidária. Esse é inclusive o exposto no artigo 23, II da Constituição Federal in verbis: “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;”. Seguindo esta linha de raciocínio, a competência para a promoção da saúde deve ser repartida pelos Entes, conforme o estabelecido nos artigos 16 a 19 da Lei nº 8.080/90, que estabelece normas gerais sobre o Sistema Único de Saúde (SUS). Destaco, ademais, que este assunto foi tratado no Recurso Extraordinário n. 855.178 RG, Rel. Min. Luiz Fux, j. 5-3-2015, P, DJE de 16-3-2015, Tema 793, com reafirmação de jurisprudência em 06/03/2015, sendo fixada a seguinte tese: “Tema 793/STF. Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. Não obstante a isso, é certo que na II Jornada de Direito da Saúde realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foram aprovados novos enunciados, dentre eles o Enunciado 60 que dispõe: ENUNCIADO N° 60 A responsabilidade solidária dos entes da Federação não impede que o Juízo, ao deferir medida liminar ou definitiva, direcione inicialmente o seu cumprimento a um determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento. Ademais, os enunciados n. 08 e 67 da III Jornada de Direito da Saúde realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ): ENUNCIADO Nº 08 Nas apreciações judiciais sobre ações e serviços de saúde devem ser observadas as regras administrativas de repartição de competência entre os entes federados. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde – 18.03.2019). ENUNCIADO Nº 87 Nas decisões que determinem o fornecimento de medicamento ou de serviço por mais de um ente da federação, deve-se buscar, em sendo possível, individualizar os atos que serão de responsabilidade de cada ente. Feitas tais considerações, é possível concluir que os entes da federação em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais de saúde, sendo possível ainda, o direcionamento do cumprimento da medida liminar ou definitiva a determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências. Destaco ainda que considerando a pretensão inicial (fornecimento de medicamento), bem assim a notícia de risco de vida do paciente o Enunciado n. 8 do Comitê Estadual de Saúde do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso[1] dispõe: ENUNCIADO N. 8 Define-se urgência, no âmbito da saúde, como a ocorrência imprevista de agravo a saúde com ou sem risco potencial a vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata [Anexo, item 2.2, da Portaria n. 354, de 10 de março de 2014, do Ministério da Saúde]. Ademais, o Enunciado n. 9 do Comitê Estadual de Saúde do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso define a emergência no âmbito da saúde “como a constatação médica de condições de agravo a saúde que impliquem sofrimento intenso ou risco iminente de morte, exigindo, portanto, tratamento médico imediato [Anexo, item 2.1, da Portaria n.354, de 10 de março de 2014, do Ministério da Saúde]”. Negritei. No caso dos autos, a pretensão posta na inicial consiste no fornecimento do medicamento NINTEDANIBE em razão do diagnóstico de Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.9). Com efeito, denota-se que o pedido está pautado em relatório médico acostado no ID. 185880381, na qual relata que “Paciente EDUARDO GALVÃO MESSIAS é portador de Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.9), com diagnóstico em 2019, com seguimento regular e uso prévio de medicamentos que não impediram a progressão da doença, como o corticosteroide. Desde então, tem apresentado sintomas como dispneia progressiva, tosse seca e fadiga. Os sintomas têm piorado gradualmente, impactando significativamente a qualidade de vida do paciente ”. Ainda, “1. Existe tratamento alternativo para o quadro atual disponibilizado pelo SUS? Não, não existe tratamento alternativo ao proposto disponibilizado pelo SUS. A compreensão da FPI como uma doença principalmente fibrótica com inflamação mínima ou inexistente inaugurou a era antifibrótica, com duas drogas atualmente aprovadas: pirfenidona e nintedanibe. Nenhuma das duas medicações estão disponíveis no SUS. 2) Qual a consequência caso o paciente não seja submetido ao tratamento? Inexoravelmente haverá a progressão da doença, com piora da insuficiência respiratória e necessidade de transplante pulmonar o que sabidamente apresenta altas taxas de mortalidade no pós-operatório [além de ser um evento extremamente mais oneroso para o sistema público de saúde]. 4) Há risco de vida ou de agravamento do quadro clínico atual? Justifique Sim, o paciente encontra-se sintomático, com dispneia aos moderados esforços, podendo progredir com piora da disfunção pulmonar/respiratória, caso não inicie imediatamente a medicação (nintendanibe 150mg 1 comprimido, via oral, de 12 em 12 horas). O uso desta medicação” Além disso, os autos foram encaminhados ao Núcleo de Apoio Técnico – NAT, que emitiu o seguinte parecer: “Conclusão Justificada: Não favorável Conclusão: Considerando o dignóstico como Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.1), de acordo com relatório médico (fl. 19) acostados nos autos. O medicamento Esilato de Nintedanibe não pertence à Relação Nacional de Medicamentos Essenciais– RENAME 2024 e não faz parte de nenhum Componente de Assistência Farmacêutica no SUS, portanto não está disponível no SUS. Considerando os estudos apresentados com o tempo de acompanhamento dos pacientes, por se tratarem de estudos de curto prazo, geram incertezas em relação a real eficácia do medicamento no retardo da progressão da doença, em especial com relação ao benefício trazido ao paciente em termos de resultados de sobrevida e melhora da qualidade de vida. O medicamentos ( nintedanibe) possui registro ativo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e consta em bula indicação é indicado para o tratamento e retardo da progressão da fibrose pulmonar idiopática (FPI). Ressalta-se que, no momento não foi publicado pelo Ministério da Saúde Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para o manejo da Fibrose Pulmonar Idiopática (FPI), portanto não há lista oficial e específica de medicamentos que possam ser implementados nestas circunstâncias. Considerando a recomendação da CONITEC pela não padronização do nintedanibe para fibrose pulmonar idiopática e que após consulta pública reafirmou sua decisão pela não incorporação no SUS o medicamento nintedanibe para o tratamento da fibrose pulmonar idiopática (FPI). Conclui NÃO FAVORÁVEL a demanda judicial” (Id. 184594478). Ocorre que o medicamento pleiteado NÃO está previsto na RENAME ou na RESME e não faz parte de nenhum componente da assistência farmacêutica do SUS para a patologia da paciente. Nessa toada, com relação aos medicamentos que não estão incorporados pelo Sistema Único de Saúde – SUS, em relação à obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, o Superior Tribunal Federal fixou a seguinte tese (Tema 6): Tese de julgamento: “1. A ausência de inclusão de medicamento nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUME, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo. 2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação: (a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item ‘4’ do Tema 1.234 da repercussão geral; (b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011; (c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas; (d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise; (e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e (f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento. Insta ressaltar que os requisitos do Tema 6 do Superior Tribunal Federal são cumulativos, sendo necessária a comprovação destes para que o requerente faça jus ao recebimento de medicamento não previsto pelo Sistema Único de Saúde. Em que pese a urgência e a necessidade constatada na utilização do fármaco para o tratamento da patologia do autor, o julgamento da questão exige a observância das balizas fixadas pelo Supremo Tribunal Federal. No caso concreto, verifica-se que a parte autora não demonstrou o cumprimento cumulativo dos requisitos exigidos para a concessão judicial de medicamentos não incorporados ao SUS, conforme consolidado no Tema 6 da Repercussão Geral. Especificamente, não restou comprovado: (b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011;e Conforme se extrai dos documentos acostados aos Ids 185880381 e 185685100, o laudo médico juntado aos autos atesta a inviabilidade de substituição do fármaco pleiteado por outro constante das listas do SUS ou dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDTs), tendo em vista que, segundo o relato técnico, não há alternativa terapêutica equivalente disponível na rede pública. Ademais, o referido documento destaca a imprescindibilidade do tratamento, advertindo que a ausência da medicação poderá acarretar progressão da doença, agravamento da insuficiência respiratória e consequente necessidade de transplante pulmonar — procedimento este que, sabidamente, apresenta elevadas taxas de mortalidade no pós-operatório. Adicionalmente, restou comprovada a hipossuficiência do autor por meio do documento acostado ao Id. 185685100, evidenciando sua incapacidade financeira para arcar com os custos do tratamento com o medicamento nintedanibe. Embora o laudo médico esteja adequadamente fundamentado quanto à indicação clínica, atendendo aos requisitos previstos nos itens 'E' e 'F', verifica-se que não foi observado o requisito constante do item 'B'. Isso porque não foi apresentada qualquer prova nos autos acerca da existência de ilegalidade ou mora no processo de incorporação do medicamento pela CONITEC, tampouco houve demonstração de pedido formal de incorporação ou negativa administrativa devidamente motivada. Dessa forma, em razão da ausência de comprovação de tais requisitos, conclui-se que a pretensão não encontra respaldo nos parâmetros estabelecidos pelo STF para o deferimento de medicamentos de alto custo fora da lista do SUS, sendo certo que a judicialização de demandas de saúde deve observar critérios técnicos e legais de modo a garantir a sustentabilidade do sistema e evitar a concessão de benefícios que não atendam aos requisitos mínimos de necessidade e viabilidade. Dessa forma, não há como acolher o pedido formulado, porquanto sua procedência implicaria afronta às diretrizes fixadas pelo Supremo Tribunal Federal e aos princípios que regem o Sistema Único de Saúde. Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO INICIAL. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, mas suspendo a exigibilidade dessas custas em razão da gratuidade de justiça concedida nos autos. Desde já, e havendo valores depositados em conta judicial vinculado ao presente feito, caso não seja utilizado para o cumprimento desta decisum, autorizo a expedição do necessário alvará de levantamento em favor do ente público, para tanto deve informar nos autos os dados bancários de sua titularidade (Banco, Agência, Conta Corrente e Titularidade). Preclusa a via recursal e nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo. Intime-se. Cumpra-se. AGAMENON ALCÂNTARA MORENO JÚNIOR Juiz de Direito” Assim, o caso em análise dispensa o julgamento do Colegiado, uma vez que presentes os elementos autorizadores para o julgamento do agravo monocraticamente, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código de Processo de Civil, in verbis: “Art. 932. Incumbe ao relator: (...) III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida;” O Regimento Interno deste Sodalício, também, disciplina a matéria, em seu art. 51, inciso XV: “Art. 51 - Compete ao Relator: (...) XV - Julgar pedido manifestamente incabível ou que haja perdido seu objeto, ou, ainda, declarar a incompetência do órgão julgador, quando evidente.” Nesse contexto, revela-se a superveniente perda de objeto deste agravo de instrumento, pois a decisão contra a qual foi interposto já está superada pela sentença no processo originário. Sobre o tema, preleciona o eminente processualista Nelson Nery Junior in Comentários ao Código de Processo Civil, 2015, p.1.851: “Recurso prejudicado. É aquele que perdeu seu objeto. Ocorrendo a perda do objeto, há falta superveniente de interesse recursal, impondo-se o não conhecimento do recurso por ausência de requisito de admissibilidade. Assim, ao relator cabe julgar inadmissível o recurso por falta de interesse, ou seja, julgá-lo prejudicado”. A propósito, colhe-se entendimento dos tribunais acerca do tema: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO SUPERVENIENTE. PERDA DO OBJETO. Sobrevindo, do juízo de origem, decisão de retratação da decisão agravada, resta prejudicado o exame do recurso, por perda do objeto. Prejudicado o exame do agravo de instrumento, por perda de objeto. (Agravo de Instrumento, Nº 70081309882, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Voltaire de Lima Moraes, Julgado em: 14.06.2019) (grifei). Diante do exposto, considerando a perda superveniente do interesse recursal, NÃO CONHEÇO o presente Agravo de Instrumento, posto que prejudicado, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código de Processo Civil, c/c art. 51, XV, do RITJ/MT. Consequentemente, é de se concluir que falece o interesse recursal, do Agravo Interno, motivo pelo qual o julgo PREJUDICADO. Transcorridos in albis o prazo recursal, arquivem-se, com as cautelas de estilo. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá, MT, data registrada no sistema. Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago Relatora

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Processo nº 1000358-28.2024.8.11.0000

ID: 260072911

Tribunal: TJMT Órgão: Turma de Câmaras Criminais Reunidas Classe: REVISãO CRIMINAL Nº Processo: 1000358-28.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

RODRIGO DA SILVA JESUS REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO RODRIGO DA SILVA JESUS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

PITAGORAS PINTO DE ARRUDA

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NEYMAN AUGUSTO MONTEIRO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS Número Único: 1000358-28.2024.8.11.0000 Classe: REVISÃO CRIMINAL (12394) Assunto: [Associação para a Produção e Tráfico e Co… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS Número Único: 1000358-28.2024.8.11.0000 Classe: REVISÃO CRIMINAL (12394) Assunto: [Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins] Relator: Des(a). FRANCISCO ALEXANDRE FERREIRA MENDES NETO Turma Julgadora: [DES(A). FRANCISCO ALEXANDRE FERREIRA MENDES NETO, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [PITAGORAS PINTO DE ARRUDA - CPF: 012.105.911-11 (ADVOGADO), RODRIGO DA SILVA JESUS registrado(a) civilmente como RODRIGO DA SILVA JESUS - CPF: 058.639.791-43 (REQUERENTE), NEYMAN AUGUSTO MONTEIRO - CPF: 027.780.399-37 (ADVOGADO), JUIZO DA NONA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CUIABÁ (REQUERIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REQUERIDO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, JULGOU IMPROCEDENTE A AÇÃO REVISIONAL, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A EMENTA: DIREITO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. AFASTAMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. AÇÕES PENAIS EM CURSO. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. APLICAÇÃO INVIÁVEL. SEGURANÇA JURÍDICA. REGIME SEMIABERTO. FIXAÇÃO ESCORREITA. REVISIONAL IMPROCEDENTE. I. Caso em exame 1. Revisão Criminal proposta para revisar sentença condenatória por tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006), com pena de 5 anos de reclusão em regime semiaberto e 500 dias-multa, afastando a aplicação do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006) em razão de ações penais em curso e suposta dedicação a atividades criminosas. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar a possibilidade de revisão da sentença definitiva, dada a mudança de entendimento jurisprudencial posterior ao trânsito em julgado, que vedou o uso de inquéritos e ações penais em curso para afastar o tráfico privilegiado. III. Razões de decidir 3. A jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça (Tema 1.139) veda a utilização de inquéritos e ações penais em curso para impedir a aplicação do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006. No entanto, à época da sentença condenatória,, ainda não estava consolidado o entendimento mais favorável ao réu. 4. A alteração jurisprudencial posterior ao trânsito em julgado não autoriza revisão criminal com efeito retroativo, sob pena de violação dos princípios da coisa julgada e da segurança jurídica. 5. Constatado que o revisionando possui condenação posterior por crimes de tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo de uso proibido e receptação dolosa, reforçando a dedicação a atividades criminosas, afigura-se escorreito o afastamento do tráfico privilegiado. 6. Por força de expresso comando legal (art. 33, § 2º, alínea b, do CP), a pena fixada em patamar superior a quatro anos (no caso, 5 anos de reclusão) deve ser cumprida em regime semiaberto. IV. Dispositivo e tese 7. Revisão criminal improcedente. Tese de julgamento: “A mudança de entendimento jurisprudencial após o trânsito em julgado da condenação, ainda que mais favorável ao réu, não autoriza a propositura de revisão criminal”. “A existência de ações penais e condenações posteriores confirma a dedicação a atividades criminosas, justificando o afastamento do tráfico privilegiado”. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput e § 4º; CP, art. 121, § 2º, I, III e IV; Lei nº 12.850/2013, art. 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema 1.139; AgRg no HC n. 750.423/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 08/08/2022; AgRg no HC n. 895.960/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJE 06/09/2024; AgRg no HC n. 913.360/BA, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJE 30/08/2024; RAC 0000901-44.2018, Rel. Des. Juvenal Pereira da Silva, 3ª Câmara Criminal, DJE 31/01/2023. R E L A T Ó R I O Egrégia Turma de Câmaras, Rodrigo da Silva Jesus foi condenado pelo MM. Juiz da 9ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá-MT, nos autos da ação penal nº. 0035133-33.2019, à pena de 5 anos de reclusão em regime semiaberto, bem como ao pagamento de 500 dias-multa, por praticar o crime de Tráfico de Entorpecentes (art. 33, caput, da Lei nº. 11.343/2006). Por meio de advogado constituído, propôs esta Revisão Criminal com lastro no art. 621, inc. II, do CPP, para que seja aplicada em seu favor a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº. 11.343/2006 e fixado o regime aberto para resgate da pena, alegando que a existência de inquéritos policiais e ações penais em curso não constitui fundamento idôneo para afastar a incidência da figura privilegiada do crime (ID 197758168). Instruiu a inicial com documentos (ID 197758169 a 197758181). Por sua vez, a douta Procuradoria-Geral de Justiça lançou parecer opinando pelo não conhecimento da revisional ou, se conhecida, pela sua improcedência (ID 199358172), conforme respectivo sumário que segue transcrito: “Revisão Criminal – Tráfico de drogas – Alega preenchimento dos requisitos da causa de diminuição do tráfico privilegiado – Pedido de aplicação do tráfico privilegiado e fixação de regime inicial aberto – Eventual mudança de orientação jurisprudencial superveniente ao trânsito em julgado da condenação não se enquadra como fundamento de revisão criminal, cuja pretensão deve ser submetida ao crivo do Juízo da execução penal – Julgados do c. STJ – Tribunal que pode lastrear-se em fundamentos diversos dos adotados em primeira instância, ainda que em recurso exclusivo da defesa, sem configurar ofensa ao princípio do ne reformatio in pejus – Entendimento aplicado em RC – Aresto desta c. Turma – Familiaridade e dedicação à prática criminosa – Inviabilidade da benesse – Regime: pena fixada que justifica a manutenção do regime inicial semiaberto – Parecer pelo não conhecimento da revisional. Se conhecida, pela improcedência da ação”. É o relatório. À douta revisão. Cuiabá, data da assinatura digital. Francisco Alexandre Ferreira Mendes Neto Relator Convocado V O T O R E L A T O R Egrégia Turma de Câmaras, Infere-se dos autos que na madrugada de 31.8.2019, durante patrulhamento de rotina, policiais militares lotados na capital surpreenderam o revisionando e Gilmar Pablo Gonçalves Leão em poder de 48,16g de pasta base de cocaína distribuídos em 18 porções, R$ 865,00 em espécie e apetrechos comumente utilizados para embalar drogas. Diante desse cenário, os dois foram denunciados e, mais tarde, condenados nas sanções do crime de Tráfico de Entorpecentes (art. 33, caput, da Lei nº. 11.343/2006) (ID 197758179), tendo o revisionando sido apenado com 5 anos de reclusão em regime semiaberto e pagamento de 500 dias-multa (ID 197758178). A condenação, mantida em segunda instância (ID197758177), transitou em julgado em 29.6.2021 (ID 197758176). Estabelecidas essas premissas, observa-se que o magistrado sentenciante se valeu da seguinte fundamentação para afastar a forma privilegiada do crime: “No presente caso, considerando que o condenado possui em seu desfavor uma ação penal em trâmite e ainda, uma condenação provisória por crime análogo ao presente, verifico que sobejam elementos que demonstram que o condenado é contumaz na prática do tráfico de drogas e na dedicação a atividade criminosa, motivos que ensejam na negativa de aplicação da causa especial de diminuição de pena descrita no § 4º do artigo 33 da Lei de Drogas” (ID 197758178). Não se ignora que após muita oscilação da jurisprudência sobre a matéria, consolidou-se no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que “é vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em curso para impedir a aplicação do art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/06” (Tema 1.139). É certo, porém, que ao tempo da prolação da sentença condenatória nestes autos, em 24.1.2020, referido posicionamento ainda não estava firmado, que só passou a orientar os julgamentos das instâncias inferiores em 10.8.2022, isto é, mais de dois anos depois do advento da sentença impugnada. Apesar disso, a mudança de orientação jurisprudencial após o trânsito em julgado da condenação, ainda que mais favorável ao réu, não autoriza a propositura de revisão criminal e tampouco justifica a reforma de sentença condenatória definitiva, sob pena de se eternizar a discussão tratada na origem e gerar, consequentemente, indiscutível insegurança jurídica. Endossando essa linha de raciocínio, vale conferir ementa de recentíssimos julgados da Corte Cidadã: “No caso dos autos, dos elementos probatórios que instruem o feito, verifica-se que a autoria delitiva do crime de roubo não tem como único elemento de prova o reconhecimento fotográfico, o que gera distinguishing em relação ao acórdão paradigma da alteração jurisprudencial, sendo que as instâncias ordinárias contam com as declarações das testemunhas e provas indiciárias do roubo para robustecer o arcabouço probatório. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, ‘a alteração de entendimento jurisprudencial verificada posteriormente ao trânsito em julgado da condenação não autoriza o ajuizamento de revisão criminal, visando a sua aplicação retroativa, assim como pretendido pela defesa no presente writ, sob pena de serem violados os princípios da coisa julgada e da segurança jurídica’ (AgRg no HC n. 750.423/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/8/2022, DJe de 8/8/2022). 3. Agravo regimental desprovido” (AgRg no HC n. 895.960/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, DJE 6.9.2024). Destaquei. “É firme o entendimento desta Corte Superior de que a mudança no entendimento jurisprudencial após o trânsito em julgado da condenação, ainda que mais benéfico ao réu, não autoriza o ajuizamento revisão criminal. 2. Hipótese em que o Tribunal de origem não conheceu do pedido revisional, por entender que a alteração jurisprudencial acerca validade de ações penais em curso para afastar o redutor do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, após o trânsito em julgado, ainda que mais benéfica ao réu, não permite à parte ajuizar revisão criminal com o propósito de anular ou modificar a coisa julgada, em atenção ao princípio da segurança jurídica. 3. Agravo regimental não provido” (AgRg no HC n. 913.360/BA, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, DJE 30.8.2024). Destaquei. Nesse quadro, como o entendimento adotado pelo Juízo a quo oficiante, afastando a causa redutora do privilégio com base na existência de inquéritos policiais e ações penais em curso, encontrava amplo lastro na jurisprudência de inúmeros tribunais do país, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, é defeso reformá-lo. Aliás, é interessante anotar que uma das ações penais que já tramitava contra o revisionando ao tempo da sentença combatida nestes autos resultou na condenação à pena definitiva de 11 anos de reclusão em regime fechado e ao pagamento de 748 dias-multa, fruto da prática dos delitos de Tráfico de Drogas (art. 33, caput, da Lei nº. 11.343/2006), Porte Ilegal de Arma de Fogo de Uso Proibido (art. 14 da Lei nº. 10.826/2003) e Receptação Dolosa (art. 180, caput, do CP). Tal informação e as circunstâncias da apreensão da substância proscrita, somadas ao modus operandi do delito, consistente no ajuste com comparsa que foi igualmente condenado, denotam a natureza forte e duradoura da ligação do revisionando com o narcotráfico, constituindo fundamento mais do que legítimo para evidenciar sua dedicação a atividades criminosas e justificar a negativa do privilégio. A propósito, vale conferir como esta Corte de Justiça decidiu em casos análogos: “Independentemente da controvérsia instalada no âmbito jurisprudencial quanto à possibilidade de afastamento da causa de diminuição de pena referente ao tráfico de drogas ‘privilegiado’ em razão da existência de inquéritos policiais e ações penais em curso ou não transitadas em julgado, não há que se cogitar da incidência da benesse quando, a exemplo do presente caso, a dedicação do acusado a atividades criminosas é extraída dos registros criminais que indicam condenação com trânsito em julgado do réu, com data posterior ao atual fato, [pois] ainda que não preste para considerá-lo reincidente, inviabiliza a aplicação do tráfico privilegiado, por denotar dedicação a atividade criminosa” (RAC 0000901-44.2018, Rel. Des. Juvenal Pereira da Silva, 3ª Câmara Criminal, DJE 31.1.2023). Destaquei. “O tráfico privilegiado “é destinado apenas ao traficante ocasional, e não àquele que faz da mercancia de drogas o seu meio de vida” (TJMT, Ap nº 121338/2017). O c. STJ firmou entendimento no sentido de que cabe ao Juízo, na dosimetria, considerar a quantidade e diversidade da droga “no momento que melhor lhe aprouver, podendo valorá-las na [...] terceira fase, para afastar o redutor do tráfico privilegiado ou modular a sua fração” (AgRg no HC 716.715/SP). O envolvimento reiterado em delitos, notadamente por crime idêntico [tráfico de drogas], revela dedicação a atividades ilícitas em razão do ato comissivo praticado em período posterior, consoante posição majoritária do c. STF e STJ, os quais reafirmaram o entendimento segundo o qual a existência de ações penais em andamento, ou mesmo de condenações não transitadas em julgado, constitui premissa idônea e válida a evidenciar a dedicação às atividades criminosas e justificar o afastamento do privilégio (...)” (RAC 0026607-48.2017, Rel. Des. Marcos Machado, 1ª Câmara Criminal, DJE 20.5.2022). Destaquei. Em tempo, se a intenção do legislador, ao prever a figura do tráfico privilegiado, é justamente distinguir o “marinheiro de primeira viagem” do sujeito vezeiro em crimes, soaria ilógico conceder o benefício previsto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas a quem, a exemplo do revisionando, reitera na prática delitiva. Portanto, como o contexto fático delineado nos autos revela a dedicação do revisionando a atividades criminosas, circunstância que nem de longe condiz com o traficante ocasional a que alude o legislador no art. 33, § 4º, afigura-se escorreita a negativa da causa redutora de pena em foco. Finalmente, imposta a reprimenda em escala superior a quatro anos (no caso, 5 anos de reclusão), ela deve ser cumprida, por força de expresso comando legal, em regime semiaberto (art. 33, § 2º, alínea b, do CP), independentemente da existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Seguindo esse raciocínio, eis o que Colenda Primeira Câmara Criminal decidiu em caso semelhante “Fixada a reprimenda corpórea em patamar superior a 4 (quatro) anos, somada à condição de reincidente de Diego, ainda que as circunstâncias judiciais lhe sejam favoráveis, inviável a modificação do regime fechado para outro mais brando” (RAC 0022807-46.2016, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, DJE 29.5.2023). Para além disso, é certo que na hipótese, o regime intermediário se mostra o único suficientemente hábil a promover os fins da pena (reprovação e prevenção do delito e ressocialização do apenado). Deste modo, preservo o regime semiaberto para resgate da pena. Enfim, diante da inexistência de error in judicando ou error in procedendo, deve ser mantida a condenação nos moldes postos no título judicial impugnado. Com essas considerações e em sintonia com o parecer, julgo improcedente a revisional. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/04/2025

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Processo nº 1000358-43.2021.8.11.0029

ID: 321486844

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE CANARANA Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1000358-43.2021.8.11.0029

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO

Polo Passivo:

Sentença

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE CANARANA SENTENÇA Processo: 1000358-43.2021.8.11.0029. REPRESENTANTE: POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: VITOR HENRIQUE SOUSA Vis… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE CANARANA SENTENÇA Processo: 1000358-43.2021.8.11.0029. REPRESENTANTE: POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: VITOR HENRIQUE SOUSA Vistos, etc... Trata-se de ação penal movida pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso em face de VITOR HENRIQUE SOUSA, devidamente qualificado nos autos, pela suposta prática dos crimes previstos nos arts. 129, caput (por três vezes), c/c art. 70 do Código Penal; art. 163, parágrafo único, incisos I e III, e art. 329, todos do Código Penal. Narra a denúncia que, em 09 de novembro de 2020, por volta da 01h10min, no Hospital Municipal Lorena Parode, situado em Canarana/MT, o acusado, após chegar ao local com sua filha pequena, em emergência, proferiu agressões físicas contra a enfermeira Ivani Maria Robaert Hauschil, lesionando-a na cabeça ao empurrá-la contra a parede e golpeá-la com um soco. Na sequência, segundo a peça acusatória, Vitor teria desferido chutes contra a porta da emergência do hospital, causando dano ao patrimônio público municipal. Acionada a Polícia Militar, durante a tentativa de abordagem e contenção do réu, este teria oferecido resistência ativa, envolvendo-se em luta corporal com os policiais militares João Alexandre Machado de Almeida e Gian Rauber, os quais também sofreram lesões em razão do embate físico. Recebida a denúncia em 15/06/2023, seguiu-se a instrução com a oitiva da vítima, testemunhas e interrogatório do réu. Encerrada a fase instrutória, as partes apresentaram alegações finais por memoriais, conforme previsto no artigo 403, § 3º, do CPP É o relatório. DECIDO. O conjunto probatório constante nos autos oferece um quadro fático suficientemente detalhado e coerente. Extrai-se que o réu, diante de um quadro emergencial de saúde envolvendo sua filha menor — segundo ele próprio relatou, apresentando sinais de convulsão e estado letárgico — dirigiu-se ao hospital local e, ao não perceber de imediato a presença de atendentes, forçou a entrada pela porta principal, adentrando em desespero no recinto. Instantes depois, ao ser abordado pela técnica de enfermagem Ivani Hauschil, passou a agredi-la física e verbalmente, empurrando-a contra a parede e desferindo-lhe um golpe na cabeça, conforme comprovam os relatos das testemunhas oculares e o laudo pericial (Id. 51763963). Após o episódio, desferiu chutes contra a porta da emergência, danificando-a (Id. 51763955). Na sequência, a Polícia Militar foi acionada e, ao tentar conter o réu, os policiais João Alexandre e Gian Rauber foram igualmente agredidos durante a contenção física, restando lesionados, conforme relatórios e exames de corpo de delito constantes nos autos (Ids. 51763963 e 51763973). A materialidade do delito de dano qualificado ao patrimônio público encontra respaldo no relatório técnico de danos (Id. 51763955), no boletim de ocorrência (Id. 51763954), bem como nos depoimentos harmônicos prestados em juízo. A vítima Ivani Hauschil, técnica de enfermagem, narrou em juízo que o réu, ao chegar alterado no hospital, proferiu xingamentos, empurrou-a contra a parede e, após o episódio, desferiu chutes contra a porta da unidade, danificando-a. Ato contínuo, foi prestar atendimento à filha do réu, sendo posteriormente chamada para reconhecê-lo. O policial militar João Alexandre corroborou integralmente o depoimento da vítima, acrescentando que, após as agressões, o réu resistiu à abordagem, entrando em luta corporal com a guarnição. Relatou ainda que o acusado, mesmo algemado, conseguiu correr e teve de ser contido com uso moderado da força, causando lesões em dois policiais. O próprio réu, em interrogatório (Id.165254779), confessou ter forçado a porta, justificando-se pelo desespero, já que sua filha estava passando mal. Contudo, tal circunstância, embora emocionalmente compreensível, não descaracteriza o dolo na conduta de dano ao patrimônio público, tampouco a responsabilidade penal pela violação do bem jurídico tutelado pelo art. 163, parágrafo único, III, do CP. A conduta de danificar porta de acesso a hospital público, por meio de violência física (chutes), configura claramente o crime de dano qualificado contra o patrimônio público, nos termos do art. 163, § único, inciso III, do Código Penal. Lado outro, impõe-se a exclusão do tipo penal qualificado pelo inciso I do parágrafo único do art. 163 do Código Penal, por ausência dos requisitos típicos exigidos pelo dispositivo. O referido inciso prevê o dano qualificado “com emprego de violência à pessoa ou grave ameaça”. No entanto, a correta subsunção da conduta exige, à luz da doutrina e da jurisprudência majoritária, que a violência seja meio executório do dano, e não mero fato conexo ou circunstância autônoma que, por si só, não concorre diretamente para a concretização da destruição ou deterioração do bem jurídico tutelado. A doutrina penal clássica é pacífica ao reconhecer que o tipo do art. 163, parágrafo único, I, requer que a violência à pessoa seja meio necessário ou funcional para a realização do dano. Isto é, exige-se uma relação de causalidade e finalidade: a violência deve estar instrumentalmente conectada ao ato de destruição do bem. Assim, se o dano ocorre de forma autônoma, desvinculado da prática de violência à pessoa, não há que se falar na incidência da qualificadora prevista no inciso I, devendo incidir, se for o caso, outra forma de qualificação ou até mesmo o tipo simples. No presente caso, a prova judicializada revela, com clareza, que o acusado danificou a porta do hospital antes de qualquer contato com a ofendida Ivani Maria Robaert Hauschil. Conforme declarou a própria vítima em juízo: “Ouvi um barulho vindo da frente do hospital e, ao sair, já me deparei com a porta arrebentada e o acusado entrando alterado, logo depois me empurrou.” (Id. 140785178) A narrativa do réu é convergente com a da vítima, corroborando a ordem dos acontecimentos: “Eu estava desesperado porque minha filha estava tendo convulsão. Ninguém veio atender e a porta estava trancada. Aí forcei e entrei.” (Id. 165254779). Ambos os relatos indicam que o dano material ocorreu antes do encontro entre o acusado e a vítima, e, portanto, não há relação de instrumentalidade entre a violência física praticada contra a pessoa e a consumação do dano ao patrimônio público. A violência, no caso concreto, não serviu como meio de execução do dano. Foi um episódio autônomo, posterior, que gerou outra imputação penal (lesão corporal), cuja punibilidade, aliás, está extinta por prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato. Por tais premissas, está demonstrada, de forma indene de dúvidas, a materialidade e autoria somente do delito de dano qualificado contra o patrimônio municipal (art. 163, parágrafo único, I, do CP). Da inaplicabilidade da excludente de ilicitude por estado de necessidade (art. 24 do CP) A despeito do contexto emocional enfrentado pelo réu, cuja filha se encontrava em situação de saúde delicada no momento dos fatos, não se mostra juridicamente viável o reconhecimento da excludente de ilicitude prevista no art. 24 do Código Penal, atinente ao estado de necessidade. Segundo o referido dispositivo, está amparado por tal excludente aquele que pratica o fato "para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício não era razoável exigir-se". Trata-se de uma norma de conteúdo estritamente objetivo, que exige para sua incidência os seguintes requisitos cumulativos: (i) situação de perigo atual e inevitável, (ii) não provocação voluntária do agente, (iii) inexistência de outro meio menos gravoso, e (iv) a ponderação de interesses, com sacrifício razoável. No caso dos autos, embora haja clara angústia emocional do réu, tal circunstância não configura situação típica de "estado de necessidade" nos moldes legais. Explica-se: A urgência no atendimento médico, por mais tensa que tenha sido, não se configurou em ameaça imediata à vida da filha do acusado, tampouco foi provado que a única forma possível de acesso aos serviços de saúde fosse mediante o arrombamento de patrimônio público. A defesa não demonstrou que o hospital se recusava a atender a menor ou que inexistissem protocolos adequados para receber pacientes. Ao contrário: o que se extrai dos depoimentos é que o réu se exaltou antes mesmo de solicitar ajuda, presumindo omissão no serviço público sem sequer aguardar os trâmites mínimos. Ainda que o acusado estivesse tomado por legítimo desespero paterno, a destruição deliberada do patrimônio público — no caso, uma porta de acesso ao hospital municipal — não se mostrou necessária nem proporcional à salvaguarda da saúde de sua filha. A Constituição e as leis asseguram o direito à saúde, mas não autorizam, por conseguinte, a autotutela destrutiva e a imposição violenta ao bem coletivo. Da prescrição dos delitos previstos nos artigos 329 e 129, caput, do CP. Todavia, no tocante às imputações de resistência (art. 329 do CP) e lesão corporal leve (art. 129, caput, do CP), observa-se que os fatos ocorreram em 09/11/2020 e a denúncia foi recebida apenas em 15/06/2023. Considerando a menoridade penal relativa do réu à época dos fatos (nascido em 15/10/2001), nos termos do art. 115 do Código Penal, a prescrição deve ser calculada pela metade. Para o crime de resistência (pena máxima de 2 anos): prescrição em 2 anos. Para o crime de lesão corporal leve (pena máxima de 1 ano): prescrição em 1 ano e 6 meses. Decorrido o prazo superior a 2 anos e 7 meses entre o fato ( 09/11/2020) e o recebimento da denúncia ( 15/06/2023), impõe-se, de ofício, o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva em relação aos referidos delitos, nos moldes dos arts. 107, IV; 109, V e VI, c/c art. 115, todos do Código Penal. À vista dos fundamentos delineados, tem-se por suficientemente demonstrada a responsabilidade penal do acusado Vitor Henrique Sousa pela prática do crime previsto no artigo 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal, haja vista a comprovação da materialidade por meio de documentação idônea e irrefutável (relatório técnico de danos, laudos periciais, boletim de ocorrência) e a autoria confirmada por testemunhos coerentes, convergentes e depurados de máculas. Quanto aos delitos de resistência e lesões corporais leves, impõe-se, com serenidade e compromisso com os ditames constitucionais e legais, o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal, pela fluência de lapso temporal superior ao legalmente estabelecido, em consonância com a doutrina penal clássica e com a jurisprudência pacífica dos tribunais superiores. A presente decisão busca equilibrar o rigor da lei penal com a prudência exigida da jurisdição criminal, preservando os princípios da legalidade, culpabilidade, individualização da pena e dignidade da pessoa humana. Nessa linha, não se pode ignorar que o acusado se encontrava em situação de tensão emocional legítima, diante da gravidade do estado de saúde de sua filha. Contudo, tal circunstância não é apta a afastar por completo sua responsabilidade penal pela deterioração indevida de patrimônio público, razão pela qual impõe-se a reprovação formal e material de sua conduta, mediante sanção proporcional e razoável. A presente decisão busca equilibrar o rigor da lei penal com a prudência exigida da jurisdição criminal, preservando os princípios da legalidade, culpabilidade, individualização da pena e dignidade da pessoa humana. Nessa linha, não se pode ignorar que o acusado se encontrava em situação de tensão emocional legítima, diante da gravidade do estado de saúde de sua filha. Ainda que não se configure causa legal de exclusão da culpabilidade — como o estado de necessidade exculpante ou a inexigibilidade de conduta diversa — é possível reconhecer que sua reação se deu num contexto de intensa comoção afetiva e fragilidade emocional. Contudo, tal circunstância não é apta a afastar por completo sua responsabilidade penal pela deterioração indevida de patrimônio público, razão pela qual impõe-se a reprovação formal e material de sua conduta, mediante sanção proporcional e razoável. O Direito Penal, como última ratio, deve incidir com moderação, sem perder de vista sua função normativa e pedagógica. A reprimenda que ora se impõe ao réu não visa à vingança pública, tampouco à exacerbação simbólica da punição, mas à restauração do equilíbrio jurídico violado, com respeito à dignidade da pessoa humana — inclusive a do réu. O contexto dos autos não revela um delinquente contumaz, mas sim um cidadão jovem, até então sem antecedentes, que, impelido por emoção intensa e desesperança, ultrapassou os limites do aceitável. A sanção que ora se aplica é suficiente para promover sua responsabilização, sem lançá-lo às engrenagens desumanizantes do cárcere. Por fim, deve-se registrar que a atuação jurisdicional, ao tempo em que coíbe a violação de bens jurídicos, também deve transmitir uma mensagem de racionalidade punitiva, reafirmando o compromisso do Estado com a aplicação de penas justas, necessárias e compatíveis com os valores constitucionais. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva deduzida na inicial acusatória, para condenar o acusado VITOR HENRIQUE SOUSA, como incurso nas sanções do artigo 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal, à pena que será fixada adiante, nos termos da fundamentação, pela prática do delito de dano qualificado contra o patrimônio público municipal, e, por outro lado, RECONHECER a ocorrência da PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA em relação aos crimes previstos no artigo 129, caput (por três vezes) e artigo 329, caput, todos do Código Penal, declarando extinta a punibilidade do réu, com base nos artigos 107, inciso IV; 109, incisos V e VI; c/c art. 115, todos do Código Penal. DOSIMETRIA DA PENA (ART. 68 DO CP) 1ª Fase – Pena-Base: O crime de dano qualificado (art. 163, § único, III, do Código Penal) comina pena de 6 (seis) meses a 3 (três) anos de detenção, e multa. Culpabilidade: é normal à espécie. O réu agiu de forma voluntária e consciente, utilizando-se de força física para danificar bem público, demonstrando descontrole emocional frente à negativa momentânea de atendimento, o que, no entanto, não desnatura a ilicitude de sua conduta. Antecedentes: nenhum registro negativo. Conduta social: não avaliada negativamente. Personalidade: não afloram traços de periculosidade nem índole violenta. Motivos: pautados por desespero paterno, sem fins de vandalismo gratuito. Circunstâncias: o fato se deu em local sensível (hospital público), durante a madrugada, exigindo conduta ainda mais comedida. Consequências: dano efetivo à estrutura do hospital (porta danificada, conforme relatório técnico – ID 51763955). Diante da ausência de vetores negativos, fixo a pena-base em 6 (seis) meses de detenção e 10 (dez) dias-multa, à razão mínima de 1/30 do salário mínimo. 2ª Fase – Atenuantes e Agravantes: Reconheço a atenuante da menoridade penal relativa (art. 65, I, do Código Penal), pois o acusado contava com 19 anos de idade à época dos fatos. No entanto, em razão da pena base ter ficado no mínimo legal, deixo de aplicar a referida atenuante, em observância a súmula 231 do STJ Assim, a pena intermediária fica em 6 (seis) meses de detenção e 10 (dez) dias-multa, à razão mínima de 1/30 do salário-mínimo. 3ª Fase – Causas de Aumento e Diminuição: Inexistem. PENA DEFINITIVA: 6 (seis) meses de detenção e 10 (dez) dias-multa, à razão mínima de 1/30 do salário-mínimo, em regime aberto. Nos termos do art. 44, § 2º, do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por 1 (uma) pena restritiva de direitos, consistente em: Prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena privativa substituída (5 meses), a ser executada sob fiscalização do Juízo da Execução Penal competente. A substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, no caso concreto, além de juridicamente cabível, mostra-se socialmente recomendável, pois evita a inserção prematura do réu no sistema penitenciário, cuja realidade, infelizmente, ainda carece de condições adequadas à finalidade ressocializadora. A pena aplicada, ainda que branda sob um olhar meramente retributivo, cumpre, em sua medida, o papel de advertência institucional e de reafirmação da autoridade da lei. Ao mesmo tempo, respeita a dignidade do réu e considera o contexto emocional excepcional em que os fatos ocorreram, sem, contudo, legitimar a transgressão. P.I.C. Após o trânsito em julgado, oficie-se ao juízo da execução penal para o cumprimento da pena substitutiva, com as comunicações de praxe. Juiz Cooperador OTAVIO PEIXOTO Designado pela portaria TJMT/PRES N. 866/2025

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Processo nº 1000358-68.2024.8.11.0019

ID: 339807238

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1000358-68.2024.8.11.0019

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

IORI & NEVES ADVOGADOS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

BRUNO RICARDO BARELA IORI

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TONI FERNANDES SANCHES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Anulação] Relator: D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Anulação] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (EMBARGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (EMBARGANTE), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (EMBARGANTE), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (EMBARGANTE), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (EMBARGADO), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (EMBARGADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, ACOLHEU PARCIALMENTE OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. MÁRCIO VIDAL. Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA SIMETRIA. EFEITOS INFRINGENTES NÃO CONFERIDOS. EMBARGOS ACOLHIDOS EM PARTE. I. Caso em exame 1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que negou provimento ao recurso de apelação em ação civil pública que discutia a legalidade da contratação direta de serviços advocatícios pelo Município de Novo Horizonte do Norte, com fundamento em inexigibilidade de licitação. O embargante alegou omissões e contradições na decisão, especialmente quanto à análise da perda superveniente do objeto, da condenação em custas e honorários e da suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) saber se há omissão na análise da preliminar de perda superveniente do objeto à luz do distrato entre as partes; (ii) saber se é devida a condenação em honorários advocatícios à luz da ausência de má-fé e da aplicação do princípio da simetria; e (iii) saber se houve contradição interna na apreciação dos efeitos do estatuto suspenso da associação autora no tocante à sua legitimidade processual. III. Razões de decidir 3. Não se constata contradição interna no acórdão embargado, porquanto os fundamentos adotados mantêm coerência lógica e harmonia interna, nos termos da jurisprudência do STJ sobre o art. 1.022 do CPC. 4. Constatada omissão quanto à fundamentação específica da condenação em honorários advocatícios, justifica-se a integração do julgado. Entretanto, a tese sustentada não prospera, pois o distrato coincidiu com o deferimento da liminar que suspendeu os efeitos do contrato, revelando cumprimento forçado e não espontâneo, o que atrai a aplicação do princípio da causalidade. 5. Inaplicável o princípio da simetria previsto no art. 18 da L. 7.347/1985 quando a ação civil pública é promovida por associação de direito privado, conforme pacífica jurisprudência do STJ. IV. Dispositivo e tese 6. Embargos de declaração acolhidos em parte, para suprir omissão quanto à motivação da condenação em honorários advocatícios, sem efeitos infringentes. Tese de julgamento: "1. Não há contradição interna quando os fundamentos do acórdão embargado são logicamente compatíveis e autossuficientes. 2. A condenação em honorários advocatícios pode ser mantida quando a extinção do vínculo contratual decorre de medida liminar já em vigor, em atenção ao princípio da causalidade. 3. O princípio da simetria previsto no art. 18 da L. 7.347/1985 não se aplica às ações civis públicas propostas por associações civis privadas." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, LIV e LV, e 37, caput; CPC, arts. 10, 85, § 2º, 313, V, "a", 485, VI, 926, 927 e 1.022; L. 7.347/1985, art. 18. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1346812/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 07.02.2017; STJ, AgInt no REsp 2.105.632/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, j. 29.04.2024; TJMT, ApC n. 1001610-39.2024.8.11.0009, Rel. Des. Luiz Octávio Saboia Ribeiro, j. 21.03.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL Egrégia Câmara, Trata-se de Embargos de Declaração opostos por Iori & Neves Advogados Associados, em face do acórdão proferido por esta Câmara julgadora, que, à unanimidade, negou provimento ao Recurso de Apelação interposto. O Embargante alega, em síntese, que o acórdão incorreu em omissão quanto à análise da preliminar de perda superveniente do objeto, à luz do Termo de Distrato celebrado entre as partes. Aduz, ainda, a existência de omissão quanto à ausência de fundamentação específica que justificasse a condenação ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, notadamente diante da inexistência de demonstração de má-fé, em afronta ao princípio da simetria aplicável às ações civis públicas. O embargante aponta, ainda, contradição na fundamentação que indeferiu o pedido de suspensão do processo com base em prejudicialidade externa, decorrente da existência de ação anulatória do estatuto social da parte embargada. Afiança que a decisão que suspendeu os efeitos do estatuto social da APM-MT, proferida nos autos da ação anulatória em trâmite perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, constitui fato processual superveniente relevante, com potencial de interferir no deslinde da controvérsia, por afetar a regularidade da representação processual da parte autora da ação civil pública. Sustenta, ainda, que o acórdão incorre em contradição lógica interna, ao reconhecer a existência da liminar que suspende os efeitos do estatuto da parte embargada e, ao mesmo tempo, desconsiderar os efeitos práticos desse fato superveniente no presente processo. Requer, ao final, o prequestionamento dos dispositivos legais tidos como violados ou sobre os quais se operaram as omissões e contradições, notadamente os arts. 10, 85, 313, V, "a", 485, VI, 926 e 927 do CPC; arts. 5º, LIV e LV, da Constituição Federal; e art. 18 da Lei 7.347/1985, a fim de viabilizar o exame da matéria pelos Tribunais Superiores, nos termos do art. 1.025 do CPC. Sem contrarrazões. É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara, Como explicitado no relatório, trata-se de Embargos de Declaração opostos por Iori & Neves Advogados Associados, em face do acórdão proferido por esta Câmara julgadora, que, à unanimidade, negou provimento ao Recurso de Apelação interposto, cuja ementa abaixo se reproduz: Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. ILEGALIDADE DO CONTRATO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO SEM COMPROVAÇÃO DE SINGULARIDADE E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO. ATIVIDADES JURÍDICAS TÍPICAS DA PROCURADORIA-GERAL DO MUNICÍPIO. LEGITIMIDADE ATIVA DE ASSOCIAÇÃO CIVIL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação interposto por sociedade de advogados contra sentença que reconheceu a legalidade da atuação da Associação autora e julgou procedente a obrigação imposta ao Município de Novo Horizonte do Norte de não contratar serviços advocatícios externos para o desempenho de atribuições típicas da Procuradoria-Geral Municipal, salvo em hipóteses excepcionais e justificadas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso (APM-MT) possui legitimidade ativa para propor a ação civil pública; e (ii) examinar a legalidade do contrato administrativo celebrado entre o Município e o escritório recorrente, com fundamento em inexigibilidade de licitação. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Associações civis regularmente constituídas há mais de um ano e com finalidade estatutária voltada à defesa da probidade administrativa têm legitimidade ativa para ajuizar ações civis públicas, independentemente de autorização expressa dos associados ou de relação nominal dos diretamente afetados. 4. Alegações de vícios formais na eleição da diretoria da associação constituem inovação recursal e, ainda que consideradas, não têm o condão de afastar sua legitimidade processual. 5. A inexigibilidade de licitação prevista na revogada Lei n. 8.666/1993 (vigente à época) exige a presença cumulativa de singularidade do serviço e notória especialização do contratado, não sendo suficiente a alegação genérica de confiança ou experiência. 6. Os serviços contratados, assessoramento jurídico e representação judicial, são típicos da Procuradoria-Geral do Município, cuja estrutura funcional encontra-se devidamente instituída e em funcionamento. 7. A ausência de demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do escritório contratado inviabiliza a contratação direta, afrontando os princípios da legalidade, moralidade e eficiência administrativa. 8. A Lei n. 14.039/2020, ao reconhecer a natureza singular dos serviços advocatícios, não afasta a exigência de comprovação da notória especialização, nos termos da legislação de regência. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. Associações civis que tenham entre seus objetivos institucionais a defesa da probidade administrativa possuem legitimidade para ajuizar ações civis públicas, mesmo sem autorização expressa dos associados diretamente afetados. 2. A contratação direta de serviços advocatícios pelo Poder Público exige demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do contratado, não se presumindo essas condições pela mera natureza da atividade. 3. É vedada a contratação de assessoria jurídica externa para o desempenho de funções típicas da Procuradoria-Geral do Município, quando esta estiver regularmente instituída e estruturada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, II; CPC, arts. 85, § 2º e § 11, 485, VI, e 487, I; Lei n. 8.666/1993, arts. 13, V, e 25, II; Lei n. 7.347/1985, art. 5º, V; Lei n. 14.039/2020, art. 3º-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1487060/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 29.04.2024; STJ, AREsp 1.543.113/SP, rel. Min. Francisco Falcão, j. 10.03.2020; STJ, AgInt no REsp 1.961.478/MG, rel. Min. Gurgel de Faria, j. 27.11.2023. Inicialmente, é importante considerar que cada recurso, previsto no ordenamento jurídico pátrio, possui objetivo específico, e os embargos de declaração se prestam a integrar, ou aclarar, as decisões judiciais, em sua totalidade, quando nelas existirem pontos omissos, obscuros ou contraditórios, e, ainda, para a correção de eventual erro material. Caso não existam, na decisão judicial embargada, tais defeitos de forma, não há interpor embargos de declaração, pois estes não devem ser utilizados para o reexame e novo julgamento do que já foi decidido, dado que, para tanto, há o recurso próprio previsto na legislação. Entrementes, a doutrina e a jurisprudência admitem, em situações excepcionalíssimas, a modificação da decisão recorrida por intermédio da oposição dos Declaratórios, quando conferidos ao recurso efeitos modificativos ou infringentes. Destaca-se, ainda, que tal admissibilidade é restrita aos casos de correção de patente erro material ou quando, suprida uma omissão ou uma contradição, a modificação for consequência lógica e inevitável do saneamento dos referidos vícios. Em síntese, o recurso de embargos de declaração, previsto no artigo 1.022, do CPC, é cabível contra qualquer decisão judicial (caput); para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição (inciso I); para suprir omissão (inciso II) e para corrigir erro material (inciso III). No que se refere à alegada contradição, cumpre esclarecer que a contradição apta a ensejar o manejo dos embargos de declaração é aquela verificada internamente no acórdão embargado, ou seja, entre premissas ou fundamentos logicamente inconciliáveis no corpo da própria decisão, que comprometam a coerência do raciocínio jurídico ou dificultem a compreensão da conclusão adotada. Trata-se, portanto, de vício intrínseco ao julgado, que deve ser aferido exclusivamente com base na compatibilidade interna de seus próprios fundamentos, e não em cotejo com decisões anteriores ou distintas, proferidas no mesmo ou em outros processos. Nesse sentido, perfilho o seguinte aresto: AGRAVO INTERNO – RECURSO ESPECIAL – OMISSÃO – CONTRADIÇÃO – ARTIGO 535 DO CPC/1973 – NÃO OCORRÊNCIAS – CONTRATO DE CONSTRUÇÃO – RESCISÃO – NOTIFICAÇÃO – ABANDONO DA OBRA – VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM –INADMISSIBILIDADE – COMPENSAÇÃO – OBRIGAÇÕES ILÍQUIDAS – LIQUIDAÇÃO PRÉVIA – DETERMINAÇÃO PELO ACÓRDÃO RECORRIDO – SÚMULA N. 284 DA SÚMULA DO STF – NÃO PROVIMENTO. 1. (...). 2. A contradição que rende ensejo à oposição de embargos de declaração é aquela interna do julgado, somente se verificando, pois, quando no contexto do próprio acórdão embargado estejam contidas proposições inconciliáveis entre si, dificultando-lhe a compreensão, o que não ocorre no presente caso. 3. (...). (AgInt no REsp 1346812/MG, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 07/02/2017, DJe 20/02/2017). (Negritei). No caso em apreço, todavia, não se constata qualquer contradição interna no acórdão embargado, porquanto a fundamentação apresentada revela-se coerente e harmônica com a conclusão adotada, inexistindo proposições inconciliáveis que comprometam a clareza ou a lógica do julgamento. Por outro lado, assiste razão ao Embargante no que se refere à omissão quanto à análise específica da questão atinente à condenação em honorários advocatícios, tema que foi expressamente suscitada nas razões recursais, mas não enfrentada de forma direta no corpo do acórdão. Com efeito, o embargante sustenta que, tendo havido a rescisão contratual antes mesmo da citação das partes e da efetivação da liminar concedida nos autos originários, não haveria fundamento para a condenação solidária ao pagamento de custas e honorários advocatícios, especialmente diante da ausência de má-fé, invocando, para tanto, o princípio da simetria insculpido no art. 18 da Lei n. 7.347/1985. Contudo, a irresignação não merece prosperar. Isso porque, embora o Termo de Distrato tenha sido firmado entre as partes, é certo que, à época da rescisão contratual, já se encontrava vigente decisão liminar que determinava, de forma expressa, a suspensão dos efeitos do Contrato Administrativo n. 036/2022 e de seus aditivos, bem como a abstenção de repasses financeiros ao escritório contratado, sob pena de multa cominatória. Aliás, o próprio Termo de Distrato indica como data de desobrigação contratual o dia 10/07/2024, que coincide precisamente com o deferimento da tutela de urgência. Tal circunstância evidencia que a extinção do vínculo contratual não decorreu de ato espontâneo e voluntário das partes, mas sim do cumprimento forçado da medida liminar concedida no bojo da ação civil pública. Dessa forma, revela-se legítima a imputação das despesas processuais e dos honorários sucumbenciais à parte que deu causa à instauração do processo, em observância ao princípio da causalidade. No tocante à invocação do princípio da simetria, igualmente não assiste razão ao Embargante. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que tal princípio, que veda a condenação em honorários advocatícios e custas processuais às partes vencidas em ações civis públicas, salvo em caso de má-fé, não se aplica às ações propostas por associações e fundações privadas. No caso concreto, a Ação Civil Pública foi ajuizada pela Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT, pessoa jurídica de direito privado, cuja atuação processual não se equipara, para fins de isenção recíproca de ônus sucumbenciais, àquela exercida pelo Ministério Público ou demais legitimados institucionais. A propósito: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA POR ASSOCIAÇÃO DE DIREITO PRIVADO. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. REGRA INAPLICÁVEL A ASSOCIAÇÕES E FUNDAÇÕES PRIVADAS. [...] 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, por respeito ao princípio da simetria, se o autor da ação civil pública, qualquer legitimado ativo que seja, não está obrigado ao pagamento de verbas sucumbenciais, tampouco a parte requerida, em caso de procedência da ação e desde que ausente a má-fé, estará obrigada ao pagamento de honorários sucumbenciais. 3. Contudo, essa orientação não se aplica às associações e fundações de direito privado, pois, do contrário, barrado estaria, de fato, um dos objetivos mais nobres e festejados da Lei 7.347/1985, qual seja viabilizar e ampliar o acesso à justiça para a sociedade civil organizada. [...]. 4. Agravo interno provido. (STJ, AgInt no REsp n. 2.105.632/SC, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 29/4/2024, DJe de 6/5/2024). DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PROCURADORES MUNICIPAIS. DESTINAÇÃO EXCLUSIVA AOS PROCURADORES EFETIVOS. OBSERVÂNCIA DO TETO REMUNERATÓRIO. VALOR DA CAUSA. RETIFICAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...]. 3. É cabível a condenação em honorários advocatícios em ação civil pública proposta por associação privada, não se aplicando o princípio da simetria extraído do art. 18 da Lei nº 7.347/85, sob pena de violação ao princípio constitucional do acesso à justiça." [...]. (N.U 1001610-39.2024.8.11.0009, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 21/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025). Portanto, mostra-se adequada a fixação de honorários sucumbenciais em favor do patrono da parte autora, tal como determinado na sentença e mantido pelo acórdão recorrido. Diante do exposto, impõe-se o acolhimento parcial dos aclaratórios, tão somente para suprir a omissão quanto ao ponto acima delineado, sem, contudo, conferir ao recurso efeitos infringentes. Feitas essas considerações, ACOLHO, EM PARTE, os Embargos de Declaração, apenas para colmatar a omissão havida no acórdão, sem atribuir ao recurso efeitos infringentes. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 29/07/2025

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Processo nº 1000358-68.2024.8.11.0019

ID: 339807239

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1000358-68.2024.8.11.0019

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT

Acórdão

Advogados:

WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA

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YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Anulação] Relator: D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Anulação] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (EMBARGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (EMBARGANTE), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (EMBARGANTE), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (EMBARGANTE), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (EMBARGADO), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (EMBARGADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, ACOLHEU PARCIALMENTE OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. MÁRCIO VIDAL. Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA SIMETRIA. EFEITOS INFRINGENTES NÃO CONFERIDOS. EMBARGOS ACOLHIDOS EM PARTE. I. Caso em exame 1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que negou provimento ao recurso de apelação em ação civil pública que discutia a legalidade da contratação direta de serviços advocatícios pelo Município de Novo Horizonte do Norte, com fundamento em inexigibilidade de licitação. O embargante alegou omissões e contradições na decisão, especialmente quanto à análise da perda superveniente do objeto, da condenação em custas e honorários e da suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) saber se há omissão na análise da preliminar de perda superveniente do objeto à luz do distrato entre as partes; (ii) saber se é devida a condenação em honorários advocatícios à luz da ausência de má-fé e da aplicação do princípio da simetria; e (iii) saber se houve contradição interna na apreciação dos efeitos do estatuto suspenso da associação autora no tocante à sua legitimidade processual. III. Razões de decidir 3. Não se constata contradição interna no acórdão embargado, porquanto os fundamentos adotados mantêm coerência lógica e harmonia interna, nos termos da jurisprudência do STJ sobre o art. 1.022 do CPC. 4. Constatada omissão quanto à fundamentação específica da condenação em honorários advocatícios, justifica-se a integração do julgado. Entretanto, a tese sustentada não prospera, pois o distrato coincidiu com o deferimento da liminar que suspendeu os efeitos do contrato, revelando cumprimento forçado e não espontâneo, o que atrai a aplicação do princípio da causalidade. 5. Inaplicável o princípio da simetria previsto no art. 18 da L. 7.347/1985 quando a ação civil pública é promovida por associação de direito privado, conforme pacífica jurisprudência do STJ. IV. Dispositivo e tese 6. Embargos de declaração acolhidos em parte, para suprir omissão quanto à motivação da condenação em honorários advocatícios, sem efeitos infringentes. Tese de julgamento: "1. Não há contradição interna quando os fundamentos do acórdão embargado são logicamente compatíveis e autossuficientes. 2. A condenação em honorários advocatícios pode ser mantida quando a extinção do vínculo contratual decorre de medida liminar já em vigor, em atenção ao princípio da causalidade. 3. O princípio da simetria previsto no art. 18 da L. 7.347/1985 não se aplica às ações civis públicas propostas por associações civis privadas." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, LIV e LV, e 37, caput; CPC, arts. 10, 85, § 2º, 313, V, "a", 485, VI, 926, 927 e 1.022; L. 7.347/1985, art. 18. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1346812/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 07.02.2017; STJ, AgInt no REsp 2.105.632/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, j. 29.04.2024; TJMT, ApC n. 1001610-39.2024.8.11.0009, Rel. Des. Luiz Octávio Saboia Ribeiro, j. 21.03.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL Egrégia Câmara, Trata-se de Embargos de Declaração opostos por Iori & Neves Advogados Associados, em face do acórdão proferido por esta Câmara julgadora, que, à unanimidade, negou provimento ao Recurso de Apelação interposto. O Embargante alega, em síntese, que o acórdão incorreu em omissão quanto à análise da preliminar de perda superveniente do objeto, à luz do Termo de Distrato celebrado entre as partes. Aduz, ainda, a existência de omissão quanto à ausência de fundamentação específica que justificasse a condenação ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, notadamente diante da inexistência de demonstração de má-fé, em afronta ao princípio da simetria aplicável às ações civis públicas. O embargante aponta, ainda, contradição na fundamentação que indeferiu o pedido de suspensão do processo com base em prejudicialidade externa, decorrente da existência de ação anulatória do estatuto social da parte embargada. Afiança que a decisão que suspendeu os efeitos do estatuto social da APM-MT, proferida nos autos da ação anulatória em trâmite perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, constitui fato processual superveniente relevante, com potencial de interferir no deslinde da controvérsia, por afetar a regularidade da representação processual da parte autora da ação civil pública. Sustenta, ainda, que o acórdão incorre em contradição lógica interna, ao reconhecer a existência da liminar que suspende os efeitos do estatuto da parte embargada e, ao mesmo tempo, desconsiderar os efeitos práticos desse fato superveniente no presente processo. Requer, ao final, o prequestionamento dos dispositivos legais tidos como violados ou sobre os quais se operaram as omissões e contradições, notadamente os arts. 10, 85, 313, V, "a", 485, VI, 926 e 927 do CPC; arts. 5º, LIV e LV, da Constituição Federal; e art. 18 da Lei 7.347/1985, a fim de viabilizar o exame da matéria pelos Tribunais Superiores, nos termos do art. 1.025 do CPC. Sem contrarrazões. É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara, Como explicitado no relatório, trata-se de Embargos de Declaração opostos por Iori & Neves Advogados Associados, em face do acórdão proferido por esta Câmara julgadora, que, à unanimidade, negou provimento ao Recurso de Apelação interposto, cuja ementa abaixo se reproduz: Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. ILEGALIDADE DO CONTRATO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO SEM COMPROVAÇÃO DE SINGULARIDADE E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO. ATIVIDADES JURÍDICAS TÍPICAS DA PROCURADORIA-GERAL DO MUNICÍPIO. LEGITIMIDADE ATIVA DE ASSOCIAÇÃO CIVIL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação interposto por sociedade de advogados contra sentença que reconheceu a legalidade da atuação da Associação autora e julgou procedente a obrigação imposta ao Município de Novo Horizonte do Norte de não contratar serviços advocatícios externos para o desempenho de atribuições típicas da Procuradoria-Geral Municipal, salvo em hipóteses excepcionais e justificadas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso (APM-MT) possui legitimidade ativa para propor a ação civil pública; e (ii) examinar a legalidade do contrato administrativo celebrado entre o Município e o escritório recorrente, com fundamento em inexigibilidade de licitação. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Associações civis regularmente constituídas há mais de um ano e com finalidade estatutária voltada à defesa da probidade administrativa têm legitimidade ativa para ajuizar ações civis públicas, independentemente de autorização expressa dos associados ou de relação nominal dos diretamente afetados. 4. Alegações de vícios formais na eleição da diretoria da associação constituem inovação recursal e, ainda que consideradas, não têm o condão de afastar sua legitimidade processual. 5. A inexigibilidade de licitação prevista na revogada Lei n. 8.666/1993 (vigente à época) exige a presença cumulativa de singularidade do serviço e notória especialização do contratado, não sendo suficiente a alegação genérica de confiança ou experiência. 6. Os serviços contratados, assessoramento jurídico e representação judicial, são típicos da Procuradoria-Geral do Município, cuja estrutura funcional encontra-se devidamente instituída e em funcionamento. 7. A ausência de demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do escritório contratado inviabiliza a contratação direta, afrontando os princípios da legalidade, moralidade e eficiência administrativa. 8. A Lei n. 14.039/2020, ao reconhecer a natureza singular dos serviços advocatícios, não afasta a exigência de comprovação da notória especialização, nos termos da legislação de regência. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. Associações civis que tenham entre seus objetivos institucionais a defesa da probidade administrativa possuem legitimidade para ajuizar ações civis públicas, mesmo sem autorização expressa dos associados diretamente afetados. 2. A contratação direta de serviços advocatícios pelo Poder Público exige demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do contratado, não se presumindo essas condições pela mera natureza da atividade. 3. É vedada a contratação de assessoria jurídica externa para o desempenho de funções típicas da Procuradoria-Geral do Município, quando esta estiver regularmente instituída e estruturada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, II; CPC, arts. 85, § 2º e § 11, 485, VI, e 487, I; Lei n. 8.666/1993, arts. 13, V, e 25, II; Lei n. 7.347/1985, art. 5º, V; Lei n. 14.039/2020, art. 3º-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1487060/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 29.04.2024; STJ, AREsp 1.543.113/SP, rel. Min. Francisco Falcão, j. 10.03.2020; STJ, AgInt no REsp 1.961.478/MG, rel. Min. Gurgel de Faria, j. 27.11.2023. Inicialmente, é importante considerar que cada recurso, previsto no ordenamento jurídico pátrio, possui objetivo específico, e os embargos de declaração se prestam a integrar, ou aclarar, as decisões judiciais, em sua totalidade, quando nelas existirem pontos omissos, obscuros ou contraditórios, e, ainda, para a correção de eventual erro material. Caso não existam, na decisão judicial embargada, tais defeitos de forma, não há interpor embargos de declaração, pois estes não devem ser utilizados para o reexame e novo julgamento do que já foi decidido, dado que, para tanto, há o recurso próprio previsto na legislação. Entrementes, a doutrina e a jurisprudência admitem, em situações excepcionalíssimas, a modificação da decisão recorrida por intermédio da oposição dos Declaratórios, quando conferidos ao recurso efeitos modificativos ou infringentes. Destaca-se, ainda, que tal admissibilidade é restrita aos casos de correção de patente erro material ou quando, suprida uma omissão ou uma contradição, a modificação for consequência lógica e inevitável do saneamento dos referidos vícios. Em síntese, o recurso de embargos de declaração, previsto no artigo 1.022, do CPC, é cabível contra qualquer decisão judicial (caput); para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição (inciso I); para suprir omissão (inciso II) e para corrigir erro material (inciso III). No que se refere à alegada contradição, cumpre esclarecer que a contradição apta a ensejar o manejo dos embargos de declaração é aquela verificada internamente no acórdão embargado, ou seja, entre premissas ou fundamentos logicamente inconciliáveis no corpo da própria decisão, que comprometam a coerência do raciocínio jurídico ou dificultem a compreensão da conclusão adotada. Trata-se, portanto, de vício intrínseco ao julgado, que deve ser aferido exclusivamente com base na compatibilidade interna de seus próprios fundamentos, e não em cotejo com decisões anteriores ou distintas, proferidas no mesmo ou em outros processos. Nesse sentido, perfilho o seguinte aresto: AGRAVO INTERNO – RECURSO ESPECIAL – OMISSÃO – CONTRADIÇÃO – ARTIGO 535 DO CPC/1973 – NÃO OCORRÊNCIAS – CONTRATO DE CONSTRUÇÃO – RESCISÃO – NOTIFICAÇÃO – ABANDONO DA OBRA – VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM –INADMISSIBILIDADE – COMPENSAÇÃO – OBRIGAÇÕES ILÍQUIDAS – LIQUIDAÇÃO PRÉVIA – DETERMINAÇÃO PELO ACÓRDÃO RECORRIDO – SÚMULA N. 284 DA SÚMULA DO STF – NÃO PROVIMENTO. 1. (...). 2. A contradição que rende ensejo à oposição de embargos de declaração é aquela interna do julgado, somente se verificando, pois, quando no contexto do próprio acórdão embargado estejam contidas proposições inconciliáveis entre si, dificultando-lhe a compreensão, o que não ocorre no presente caso. 3. (...). (AgInt no REsp 1346812/MG, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 07/02/2017, DJe 20/02/2017). (Negritei). No caso em apreço, todavia, não se constata qualquer contradição interna no acórdão embargado, porquanto a fundamentação apresentada revela-se coerente e harmônica com a conclusão adotada, inexistindo proposições inconciliáveis que comprometam a clareza ou a lógica do julgamento. Por outro lado, assiste razão ao Embargante no que se refere à omissão quanto à análise específica da questão atinente à condenação em honorários advocatícios, tema que foi expressamente suscitada nas razões recursais, mas não enfrentada de forma direta no corpo do acórdão. Com efeito, o embargante sustenta que, tendo havido a rescisão contratual antes mesmo da citação das partes e da efetivação da liminar concedida nos autos originários, não haveria fundamento para a condenação solidária ao pagamento de custas e honorários advocatícios, especialmente diante da ausência de má-fé, invocando, para tanto, o princípio da simetria insculpido no art. 18 da Lei n. 7.347/1985. Contudo, a irresignação não merece prosperar. Isso porque, embora o Termo de Distrato tenha sido firmado entre as partes, é certo que, à época da rescisão contratual, já se encontrava vigente decisão liminar que determinava, de forma expressa, a suspensão dos efeitos do Contrato Administrativo n. 036/2022 e de seus aditivos, bem como a abstenção de repasses financeiros ao escritório contratado, sob pena de multa cominatória. Aliás, o próprio Termo de Distrato indica como data de desobrigação contratual o dia 10/07/2024, que coincide precisamente com o deferimento da tutela de urgência. Tal circunstância evidencia que a extinção do vínculo contratual não decorreu de ato espontâneo e voluntário das partes, mas sim do cumprimento forçado da medida liminar concedida no bojo da ação civil pública. Dessa forma, revela-se legítima a imputação das despesas processuais e dos honorários sucumbenciais à parte que deu causa à instauração do processo, em observância ao princípio da causalidade. No tocante à invocação do princípio da simetria, igualmente não assiste razão ao Embargante. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que tal princípio, que veda a condenação em honorários advocatícios e custas processuais às partes vencidas em ações civis públicas, salvo em caso de má-fé, não se aplica às ações propostas por associações e fundações privadas. No caso concreto, a Ação Civil Pública foi ajuizada pela Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT, pessoa jurídica de direito privado, cuja atuação processual não se equipara, para fins de isenção recíproca de ônus sucumbenciais, àquela exercida pelo Ministério Público ou demais legitimados institucionais. A propósito: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA POR ASSOCIAÇÃO DE DIREITO PRIVADO. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. REGRA INAPLICÁVEL A ASSOCIAÇÕES E FUNDAÇÕES PRIVADAS. [...] 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, por respeito ao princípio da simetria, se o autor da ação civil pública, qualquer legitimado ativo que seja, não está obrigado ao pagamento de verbas sucumbenciais, tampouco a parte requerida, em caso de procedência da ação e desde que ausente a má-fé, estará obrigada ao pagamento de honorários sucumbenciais. 3. Contudo, essa orientação não se aplica às associações e fundações de direito privado, pois, do contrário, barrado estaria, de fato, um dos objetivos mais nobres e festejados da Lei 7.347/1985, qual seja viabilizar e ampliar o acesso à justiça para a sociedade civil organizada. [...]. 4. Agravo interno provido. (STJ, AgInt no REsp n. 2.105.632/SC, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 29/4/2024, DJe de 6/5/2024). DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PROCURADORES MUNICIPAIS. DESTINAÇÃO EXCLUSIVA AOS PROCURADORES EFETIVOS. OBSERVÂNCIA DO TETO REMUNERATÓRIO. VALOR DA CAUSA. RETIFICAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...]. 3. É cabível a condenação em honorários advocatícios em ação civil pública proposta por associação privada, não se aplicando o princípio da simetria extraído do art. 18 da Lei nº 7.347/85, sob pena de violação ao princípio constitucional do acesso à justiça." [...]. (N.U 1001610-39.2024.8.11.0009, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 21/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025). Portanto, mostra-se adequada a fixação de honorários sucumbenciais em favor do patrono da parte autora, tal como determinado na sentença e mantido pelo acórdão recorrido. Diante do exposto, impõe-se o acolhimento parcial dos aclaratórios, tão somente para suprir a omissão quanto ao ponto acima delineado, sem, contudo, conferir ao recurso efeitos infringentes. Feitas essas considerações, ACOLHO, EM PARTE, os Embargos de Declaração, apenas para colmatar a omissão havida no acórdão, sem atribuir ao recurso efeitos infringentes. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 29/07/2025

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Processo nº 1000358-28.2025.8.11.0021

ID: 299221274

Tribunal: TJMT Órgão: NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA Classe: TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE Nº Processo: 1000358-28.2025.8.11.0021

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

EDUARDO GALVAO MESSIAS

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

GUSTAVO CIPULLO NESTERUK MOREIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA SENTENÇA PROCESSO N.: 1000358-28.2025.8.11.0021 REQUERENTE: EDUARDO GALVAO MESSIAS REQUERIDO: MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA, … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA SENTENÇA PROCESSO N.: 1000358-28.2025.8.11.0021 REQUERENTE: EDUARDO GALVAO MESSIAS REQUERIDO: MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA, ESTADO DE MATO GROSSO Vistos, etc. Trata-se de ação de obrigação de fazer ajuizada por EDUARDO GALVAO MESSIAS contra o ESTADO DE MATO GROSSO e do MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA, objetivando a concessão da tutela provisória de urgência para compelir os requeridos ao fornecimento do medicamento Nintedanibe 150mg. A parte autora registra, em síntese, que é portador de fibrose pulmonar idiopática (CID J84.1), doença crônica, progressiva e incurável, caracterizada pela perda da capacidade pulmonar devido à fibrose dos alvéolos, e que diante de seu quadro clinico necessita do medicamento pleiteado. Com a inicial vieram os documentos. Determinação de emenda a inicial, id. 182683439. Novos documentos juntados pela parte autora, id. 182882517 a 182882511. Parecer do Núcleo de Apoio Técnico – NAT ao Id. 184594478. Tutela de urgência foi indeferida no ID. 184799961. O MUNICÍPIO DE ÁGUA BOA apresentou contestação (Id. 185551967), alegando a ausência de demonstração da imprescindibilidade do medicamento pela parte Autora, ainda, a competência do Estado no cumprimento da obrigação em fornecer medicamento de alto custo, nos termos das regras de repartição de competência, estabelecido pelo Tema 793 STF, ainda, que caso de eventual condenação sejam atribuídos obrigações menos acentuadas ao Município. Nesses termos, requereu o direcionamento da responsabilidade ao Estado de Mato Grosso e a improcedência dos pedidos autorais. Manifestações da parte autora aos IDS. 185685095 e 185880380. O ESTADO DE MATO GROSSO apresentou contestação (Id. 187194439), alegando preliminarmente: a)Ilegitimidade passiva – plano de saúde; b) Hipossuficiência não comprovada; c) Medicamento “Fora do SUS” - Competência Judicial em discussão. Necessidade de consulta constante da situação do Tema 1234 do STF; d) medicamento rejeitado pela CONITEC; e) incorreção do valor da causa; e) ausência de prévio requerimento administrativo – inépcia. No mérito, sustentou a responsabilidade primária da União, considerando tratar-se de medicamento não incorporado no SUS. Alega a ausência da comprovação da ineficácia dos medicamentos fornecidos pelo SUS, imprescindibilidade do medicamento e a incapacidade financeira de arcar com os custos do fármaco. Por fim, aponta a necessidade de renovação periódica da prescrição médica a cada 3 (três) meses bem assim, a liberação gradual dos valores eventualmente penhorados das contas publicas e a prestação de contas ao juízo, nos termos dos enunciados 2, 15, 32, 54 e 55 das Jornadas de Saúde do CNJ. Nesses termos, requereu direcionamento da responsabilidade à União e a improcedência dos pedidos e ainda a limitação do preço ao teto previsto pelo Tema 1.033 do Supremo Tribunal Federal (TABELA CMED). Impugnação a contestação apresentada ao ID. 188841622. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. No caso, estão preenchidos os pressupostos de constituição e inexiste pendência de questão processual, de modo que o feito se revela apto para julgamento, motivo pelo qual passo ao julgamento antecipado da lide, na forma do art. 355, I do CPC. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO – REQUERENTE BENEFICIÁRIO DE PLANO DE SAÚDE. Trata-se de preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Estado de Mato Grosso, sob o fundamento de que a parte autora possui plano de saúde privado (UNIMED – BARRA DO GARÇAS, ID 185685100), o que afastaria a responsabilidade do ente público pelo fornecimento do medicamento indicado. Contudo, a preliminar não merece acolhimento, pelos fundamentos que seguem: 1. Do Direito à Saúde e da Solidariedade dos Entes Federados (Art. 196 da CF/88) O direito à saúde é um direito fundamental social, garantido a todos os cidadãos pelo artigo 196 da Constituição Federal de 1988, que estabelece: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". A interpretação desse dispositivo constitucional leva à conclusão de que a responsabilidade pela prestação de serviços de saúde é solidária entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Essa solidariedade implica que qualquer um dos entes federados pode ser demandado para garantir o acesso às ações e serviços de saúde, não havendo que se falar em ilegitimidade passiva de um deles. A finalidade precípua dessa solidariedade é assegurar o direito fundamental à saúde, permitindo que o cidadão obtenha o tratamento necessário sem entraves burocráticos ou discussões acerca da competência de cada ente. 2. Da Irrelevância da Titularidade de Plano de Saúde Privado e da Comprovação da Hipossuficiência Financeira A alegação de que a parte autora possui plano de saúde privado e, por isso, o Estado seria parte ilegítima, não se sustenta. A titularidade de um plano de saúde não é, por si só, indicativo de capacidade financeira para arcar com medicamentos de alto custo, especialmente em casos de tratamentos contínuos e de valores elevados, como o medicamento Nintedanibe 150mg, cujo custo mensal varia entre R$ 12.000,00 e R$ 15.000,00. A análise da hipossuficiência financeira para fins de concessão de medicamentos pelo Poder Público deve ser feita de forma individualizada, considerando a real capacidade do indivíduo de suportar os custos do tratamento. O fato de possuir plano de saúde não exime o Estado de sua responsabilidade constitucional de prover o tratamento, principalmente quando o plano se recusa a cobrir o medicamento ou quando o custo é manifestamente exorbitante para o orçamento familiar, mesmo para aqueles que possuem alguma cobertura suplementar. Nesse sentido, a Declaração de Imposto de Renda referente ao ano de 2024 (ID 185685100), acostada aos autos, comprova que o rendimento mensal da parte autora é incompatível com o valor do tratamento vindicado. Tal documento demonstra, de forma inequívoca, a hipossuficiência financeira da parte para custear o medicamento, reforçando a necessidade da intervenção estatal para garantir o acesso ao tratamento essencial à sua saúde e vida. Os Temas 1234 e 6 do STF, embora não tratem diretamente da solidariedade, reforçam a necessidade de análise da capacidade financeira do indivíduo e a primazia do direito à saúde em face de questões orçamentárias, quando comprovada a hipossuficiência. Diante do exposto, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Estado de Mato Grosso. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL – AUSENCIA DE PREVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO No que tange à preliminar de falta de interesse de agir, cumpre salientar que a ausência de requerimento administrativo ou esgotamento da via administrativa não constitui óbice ao ajuizamento de demanda judicial, à luz do artigo 5º, XXXV da Constituição Federal. Neste sentido: “MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. TEMA 106/STJ.MODULAÇÃO DOS EFEITOS. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR NÃO CONFIGURADO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA.PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA E ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA VERIFICADAS. CARÊNCIA DO DIREITO DE AÇÃO NÃO CONFIGURADA. PRELIMINARES AFASTADAS. DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. FORNECIMENTO DEVIDO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. NECESSIDADE DE RENOVAÇÃO DA PRESCRIÇÃO MÉDICA E DEVOLUÇÃO DE MEDICAMENTO NÃO UTILIZADO. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA. INVIABILIDADE. BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. (...) 2. Não há falar-se em ausência de interesse de agir da Substituída, sob o argumento de que ela não esperou o recebimento administrativo do medicamento pleiteado, posto que, o fato de haver processo licitatório aberto, para a aquisição do medicamento, não impede que o Poder Público seja compelido a cumprir o seu dever constitucional de promoção da saúde. Ademais, o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição impede que o prévio requerimento, na via administrativa, seja exigido como condição de procedibilidade do mandamus. (..). SEGURANÇA CONCEDIDA”. (TJGO, Mandado de Segurança (CF, Lei12016/2009) 5151725 32.2017.8.09.0000, Rel. MAURICIO PORFIRIO ROSA, 5ª Câmara Cível, julgado em 12/04/2019, DJe de 12/04/2019). Desta forma, o esgotamento da via administrativa não pode servir de empecilho para que o interessado solicite a prestação jurisdicional, mormente porque esta é uma garantia constitucional. Portanto, REJEITO a preliminar suscitada. MEDICAMENTO “FORA DO SUS” - COMPETÊNCIA JUDICIAL EM DISCUSSÃO. NECESSIDADE DE CONSULTA CONSTANTE DA SITUAÇÃO DO TEMA 1234 DO STF O Estado de Mato Grosso aduz a incompetência absoluta da justiça estadual e a necessidade de inclusão da União no polo passivo sob o argumento de que os medicamentos não assegurados no SUS são de sua responsabilidade. Aponta que se trata de medicamento não padronizado pelo Sistema Único de Saúde, mas registrado na ANVISA requerendo a análise da situação nos moldes do Tema 1234 do Supremo Tribunal Federal. Pois bem. Conforme decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos embargos de declaração relativos ao Tema 1234 (RE 1.366.243/SC), em 16/12/2024, foi expressamente modulada a aplicação dos efeitos da tese fixada quanto à competência, para restringi-la às ações ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico ocorrida em 11/10/2024, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco. Vejamos: “[...] 2) rejeitou os embargos de declaração opostos pelo Estado de Santa Catarina, mas os acolheu a título de esclarecimentos e sem efeitos modificativos para constar do item 1, referente à Competência, a seguinte redação: 1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS e medicamentos oncológicos, ambos com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC; 3) acolheu parcialmente os embargos opostos pela União, tão somente quanto à modulação dos efeitos da decisão no que se refere à competência, para abarcar também os medicamentos incorporados, devendo ser suprimido do Capítulo 5 do voto condutor do acórdão embargado a remissão ao "item 1 do acordo firmado na Comissão Especial", por referir-se unicamente aos medicamentos não incorporados. Consequentemente, os efeitos do tema 1234, quanto à competência, somente se aplicam às ações que forem ajuizadas após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco, sem possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco jurídico. Tudo nos termos do voto do Relator. O Ministro Luiz Fux acompanhou o Relator com ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 6.12.2024 a 13.12.2024. [Grifo nosso]. No caso em análise, verifico que o custo anual do medicamento não excede 210 salários mínimos. Portanto, não há qualquer razão para o acolhimento da preliminar de inclusão obrigatória da União no polo passivo e de remessa do feito à Justiça Federal, razão pela qual rejeito a preliminar arguida. Passo a análise do mérito. Com relação ao mérito, o direito fundamental à saúde está inserido no conceito de dignidade humana, conforme delineado no inciso III do artigo 1º da Constituição Federal, pois a dignidade não pode ser plenamente assegurada na ausência de condições mínimas para a preservação da saúde do indivíduo. De igual modo, a proteção do direito à saúde encontra-se expresso no caput do artigo 5º da Constituição, o qual resguarda o direito à vida, como o mais primordial dos direitos fundamentais. Além disso, o artigo 196 da Carta Magna de 1988 afirma que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Ademais, a tutela desse direito indisponível também é amparada pela Lei n. 8.080/90, que delimita os princípios do sistema de saúde nacional, reconhecendo referido direito como fundamental do individuo e impondo ao Estado (em sentido genérico) a obrigação de assegurar a sua efetivação, nos termos precisos do art. 2º, conforme segue: Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. Assim, evidente que incumbe ao Poder Público zelar pela integridade deste direito público subjetivo garantido pela Constituição, providenciando os meios necessários para assegurar a plena realização dos propósitos delineados no artigo 196 da Constituição Federal de 1988. Nessa toada, conforme orientação jurisprudencial dominante sobre a disciplina do direito fundamental de saúde, insculpido pela Constituição Federal ao estabelecer no artigo 196 que esse é um dever do Estado, entendo que, se esse Estado foi constituído sobre a forma federativa (art. 60, § 4º, I, da CR/88), todos os entes (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) detêm a obrigação de promovê-lo à população de forma solidária. Esse é inclusive o exposto no artigo 23, II da Constituição Federal in verbis: “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;”. Seguindo esta linha de raciocínio, a competência para a promoção da saúde deve ser repartida pelos Entes, conforme o estabelecido nos artigos 16 a 19 da Lei nº 8.080/90, que estabelece normas gerais sobre o Sistema Único de Saúde (SUS). Destaco, ademais, que este assunto foi tratado no Recurso Extraordinário n. 855.178 RG, Rel. Min. Luiz Fux, j. 5-3-2015, P, DJE de 16-3-2015, Tema 793, com reafirmação de jurisprudência em 06/03/2015, sendo fixada a seguinte tese: “Tema 793/STF. Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. Não obstante a isso, é certo que na II Jornada de Direito da Saúde realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foram aprovados novos enunciados, dentre eles o Enunciado 60 que dispõe: ENUNCIADO N° 60 A responsabilidade solidária dos entes da Federação não impede que o Juízo, ao deferir medida liminar ou definitiva, direcione inicialmente o seu cumprimento a um determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento. Ademais, os enunciados n. 08 e 67 da III Jornada de Direito da Saúde realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ): ENUNCIADO Nº 08 Nas apreciações judiciais sobre ações e serviços de saúde devem ser observadas as regras administrativas de repartição de competência entre os entes federados. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde – 18.03.2019). ENUNCIADO Nº 87 Nas decisões que determinem o fornecimento de medicamento ou de serviço por mais de um ente da federação, deve-se buscar, em sendo possível, individualizar os atos que serão de responsabilidade de cada ente. Feitas tais considerações, é possível concluir que os entes da federação em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais de saúde, sendo possível ainda, o direcionamento do cumprimento da medida liminar ou definitiva a determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências. Destaco ainda que considerando a pretensão inicial (fornecimento de medicamento), bem assim a notícia de risco de vida do paciente o Enunciado n. 8 do Comitê Estadual de Saúde do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso[1] dispõe: ENUNCIADO N. 8 Define-se urgência, no âmbito da saúde, como a ocorrência imprevista de agravo a saúde com ou sem risco potencial a vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata [Anexo, item 2.2, da Portaria n. 354, de 10 de março de 2014, do Ministério da Saúde]. Ademais, o Enunciado n. 9 do Comitê Estadual de Saúde do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso define a emergência no âmbito da saúde “como a constatação médica de condições de agravo a saúde que impliquem sofrimento intenso ou risco iminente de morte, exigindo, portanto, tratamento médico imediato [Anexo, item 2.1, da Portaria n.354, de 10 de março de 2014, do Ministério da Saúde]”. Negritei. No caso dos autos, a pretensão posta na inicial consiste no fornecimento do medicamento NINTEDANIBE em razão do diagnóstico de Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.9). Com efeito, denota-se que o pedido está pautado em relatório médico acostado no ID. 185880381, na qual relata que “Paciente EDUARDO GALVÃO MESSIAS é portador de Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.9), com diagnóstico em 2019, com seguimento regular e uso prévio de medicamentos que não impediram a progressão da doença, como o corticosteroide. Desde então, tem apresentado sintomas como dispneia progressiva, tosse seca e fadiga. Os sintomas têm piorado gradualmente, impactando significativamente a qualidade de vida do paciente ”. Ainda, “1. Existe tratamento alternativo para o quadro atual disponibilizado pelo SUS? Não, não existe tratamento alternativo ao proposto disponibilizado pelo SUS. A compreensão da FPI como uma doença principalmente fibrótica com inflamação mínima ou inexistente inaugurou a era antifibrótica, com duas drogas atualmente aprovadas: pirfenidona e nintedanibe. Nenhuma das duas medicações estão disponíveis no SUS. 2) Qual a consequência caso o paciente não seja submetido ao tratamento? Inexoravelmente haverá a progressão da doença, com piora da insuficiência respiratória e necessidade de transplante pulmonar o que sabidamente apresenta altas taxas de mortalidade no pós-operatório [além de ser um evento extremamente mais oneroso para o sistema público de saúde]. 4) Há risco de vida ou de agravamento do quadro clínico atual? Justifique Sim, o paciente encontra-se sintomático, com dispneia aos moderados esforços, podendo progredir com piora da disfunção pulmonar/respiratória, caso não inicie imediatamente a medicação (nintendanibe 150mg 1 comprimido, via oral, de 12 em 12 horas). O uso desta medicação” Além disso, os autos foram encaminhados ao Núcleo de Apoio Técnico – NAT, que emitiu o seguinte parecer: “Conclusão Justificada: Não favorável Conclusão: Considerando o dignóstico como Fibrose Pulmonar Idiopática (CID J84.1), de acordo com relatório médico (fl. 19) acostados nos autos. O medicamento Esilato de Nintedanibe não pertence à Relação Nacional de Medicamentos Essenciais– RENAME 2024 e não faz parte de nenhum Componente de Assistência Farmacêutica no SUS, portanto não está disponível no SUS. Considerando os estudos apresentados com o tempo de acompanhamento dos pacientes, por se tratarem de estudos de curto prazo, geram incertezas em relação a real eficácia do medicamento no retardo da progressão da doença, em especial com relação ao benefício trazido ao paciente em termos de resultados de sobrevida e melhora da qualidade de vida. O medicamentos ( nintedanibe) possui registro ativo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e consta em bula indicação é indicado para o tratamento e retardo da progressão da fibrose pulmonar idiopática (FPI). Ressalta-se que, no momento não foi publicado pelo Ministério da Saúde Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para o manejo da Fibrose Pulmonar Idiopática (FPI), portanto não há lista oficial e específica de medicamentos que possam ser implementados nestas circunstâncias. Considerando a recomendação da CONITEC pela não padronização do nintedanibe para fibrose pulmonar idiopática e que após consulta pública reafirmou sua decisão pela não incorporação no SUS o medicamento nintedanibe para o tratamento da fibrose pulmonar idiopática (FPI). Conclui NÃO FAVORÁVEL a demanda judicial” (Id. 184594478). Ocorre que o medicamento pleiteado NÃO está previsto na RENAME ou na RESME e não faz parte de nenhum componente da assistência farmacêutica do SUS para a patologia da paciente. Nessa toada, com relação aos medicamentos que não estão incorporados pelo Sistema Único de Saúde – SUS, em relação à obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, o Superior Tribunal Federal fixou a seguinte tese (Tema 6): Tese de julgamento: “1. A ausência de inclusão de medicamento nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUME, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo. 2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação: (a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item ‘4’ do Tema 1.234 da repercussão geral; (b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011; (c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas; (d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise; (e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e (f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento. Insta ressaltar que os requisitos do Tema 6 do Superior Tribunal Federal são cumulativos, sendo necessária a comprovação destes para que o requerente faça jus ao recebimento de medicamento não previsto pelo Sistema Único de Saúde. Em que pese a urgência e a necessidade constatada na utilização do fármaco para o tratamento da patologia do autor, o julgamento da questão exige a observância das balizas fixadas pelo Supremo Tribunal Federal. No caso concreto, verifica-se que a parte autora não demonstrou o cumprimento cumulativo dos requisitos exigidos para a concessão judicial de medicamentos não incorporados ao SUS, conforme consolidado no Tema 6 da Repercussão Geral. Especificamente, não restou comprovado: (b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011;e Conforme se extrai dos documentos acostados aos Ids 185880381 e 185685100, o laudo médico juntado aos autos atesta a inviabilidade de substituição do fármaco pleiteado por outro constante das listas do SUS ou dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDTs), tendo em vista que, segundo o relato técnico, não há alternativa terapêutica equivalente disponível na rede pública. Ademais, o referido documento destaca a imprescindibilidade do tratamento, advertindo que a ausência da medicação poderá acarretar progressão da doença, agravamento da insuficiência respiratória e consequente necessidade de transplante pulmonar — procedimento este que, sabidamente, apresenta elevadas taxas de mortalidade no pós-operatório. Adicionalmente, restou comprovada a hipossuficiência do autor por meio do documento acostado ao Id. 185685100, evidenciando sua incapacidade financeira para arcar com os custos do tratamento com o medicamento nintedanibe. Embora o laudo médico esteja adequadamente fundamentado quanto à indicação clínica, atendendo aos requisitos previstos nos itens 'E' e 'F', verifica-se que não foi observado o requisito constante do item 'B'. Isso porque não foi apresentada qualquer prova nos autos acerca da existência de ilegalidade ou mora no processo de incorporação do medicamento pela CONITEC, tampouco houve demonstração de pedido formal de incorporação ou negativa administrativa devidamente motivada. Dessa forma, em razão da ausência de comprovação de tais requisitos, conclui-se que a pretensão não encontra respaldo nos parâmetros estabelecidos pelo STF para o deferimento de medicamentos de alto custo fora da lista do SUS, sendo certo que a judicialização de demandas de saúde deve observar critérios técnicos e legais de modo a garantir a sustentabilidade do sistema e evitar a concessão de benefícios que não atendam aos requisitos mínimos de necessidade e viabilidade. Dessa forma, não há como acolher o pedido formulado, porquanto sua procedência implicaria afronta às diretrizes fixadas pelo Supremo Tribunal Federal e aos princípios que regem o Sistema Único de Saúde. Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO INICIAL. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, mas suspendo a exigibilidade dessas custas em razão da gratuidade de justiça concedida nos autos. Desde já, e havendo valores depositados em conta judicial vinculado ao presente feito, caso não seja utilizado para o cumprimento desta decisum, autorizo a expedição do necessário alvará de levantamento em favor do ente público, para tanto deve informar nos autos os dados bancários de sua titularidade (Banco, Agência, Conta Corrente e Titularidade). Preclusa a via recursal e nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo. Intime-se. Cumpra-se. AGAMENON ALCÂNTARA MORENO JÚNIOR Juiz de Direito [1] Disponível em: https://comitedesaude.tjmt.jus.br/pagina/16 - acesso 27/05/2024.

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Processo nº 1000358-68.2024.8.11.0019

ID: 305011792

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000358-68.2024.8.11.0019

Data de Disponibilização: 23/06/2025

Polo Ativo:

IORI & NEVES ADVOGADOS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

BRUNO RICARDO BARELA IORI

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TONI FERNANDES SANCHES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Anulação] Relator: Des(a). MARCIO V… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Anulação] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (APELADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (APELANTE), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (APELANTE), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (APELANTE), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (APELADO), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (APELADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. MÁRCIO VIDAL. Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. ILEGALIDADE DO CONTRATO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO SEM COMPROVAÇÃO DE SINGULARIDADE E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO. ATIVIDADES JURÍDICAS TÍPICAS DA PROCURADORIA-GERAL DO MUNICÍPIO. LEGITIMIDADE ATIVA DE ASSOCIAÇÃO CIVIL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação interposto por sociedade de advogados contra sentença que reconheceu a legalidade da atuação da Associação autora e julgou procedente a obrigação imposta ao Município de Novo Horizonte do Norte de não contratar serviços advocatícios externos para o desempenho de atribuições típicas da Procuradoria-Geral Municipal, salvo em hipóteses excepcionais e justificadas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso (APM-MT) possui legitimidade ativa para propor a ação civil pública; e (ii) examinar a legalidade do contrato administrativo celebrado entre o Município e o escritório recorrente, com fundamento em inexigibilidade de licitação. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Associações civis regularmente constituídas há mais de um ano e com finalidade estatutária voltada à defesa da probidade administrativa têm legitimidade ativa para ajuizar ações civis públicas, independentemente de autorização expressa dos associados ou de relação nominal dos diretamente afetados. 4. Alegações de vícios formais na eleição da diretoria da associação constituem inovação recursal e, ainda que consideradas, não têm o condão de afastar sua legitimidade processual. 5. A inexigibilidade de licitação prevista na revogada Lei n. 8.666/1993 (vigente à época) exige a presença cumulativa de singularidade do serviço e notória especialização do contratado, não sendo suficiente a alegação genérica de confiança ou experiência. 6. Os serviços contratados, assessoramento jurídico e representação judicial, são típicos da Procuradoria-Geral do Município, cuja estrutura funcional encontra-se devidamente instituída e em funcionamento. 7. A ausência de demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do escritório contratado inviabiliza a contratação direta, afrontando os princípios da legalidade, moralidade e eficiência administrativa. 8. A Lei n. 14.039/2020, ao reconhecer a natureza singular dos serviços advocatícios, não afasta a exigência de comprovação da notória especialização, nos termos da legislação de regência. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. Associações civis que tenham entre seus objetivos institucionais a defesa da probidade administrativa possuem legitimidade para ajuizar ações civis públicas, mesmo sem autorização expressa dos associados diretamente afetados. 2. A contratação direta de serviços advocatícios pelo Poder Público exige demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do contratado, não se presumindo essas condições pela mera natureza da atividade. 3. É vedada a contratação de assessoria jurídica externa para o desempenho de funções típicas da Procuradoria-Geral do Município, quando esta estiver regularmente instituída e estruturada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, II; CPC, arts. 85, § 2º e § 11, 485, VI, e 487, I; Lei n. 8.666/1993, arts. 13, V, e 25, II; Lei n. 7.347/1985, art. 5º, V; Lei n. 14.039/2020, art. 3º-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1487060/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 29.04.2024; STJ, AREsp 1.543.113/SP, rel. Min. Francisco Falcão, j. 10.03.2020; STJ, AgInt no REsp 1.961.478/MG, rel. Min. Gurgel de Faria, j. 27.11.2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL Egrégia Câmara, Trata-se de Recurso de Apelação Cível, interposto pela pessoa jurídica de direito privado, Iori & Neves Advogados Associados, contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Porto dos Gaúchos, que, nos autos da Ação Civil Pública, proposta pela Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT, extinguiu o feito, sem resolução de mérito, quanto ao pedido de declaração de nulidade do Contrato Administrativo n. 036/2022, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, diante da rescisão contratual firmada entre as partes, e julgou procedente o pleito referente à obrigação imposta ao Município de Novo Horizonte do Norte de se abster de celebrar ou prorrogar contratos de assessoria jurídica que versem sobre atribuições típicas da Procuradoria-Geral do Município. Em suas razões recursais, a Apelante suscita a preliminar de ilegitimidade ativa da parte autora, ora Recorrida, sob múltiplas alegações. Primeiramente, defende que a Associação não possui pertinência temática, nos termos do artigo 5º, inciso V, da Lei n. 7.347/1985, pois seus objetivos estatutários visariam à defesa de interesses privados de seus associados, e não à tutela do patrimônio público ou social. Além disso, argumenta que a atuação da APM-MT está viciada por irregularidades insanáveis na eleição de sua diretoria, com afronta aos dispositivos estatutários quanto à data, forma e quórum da assembleia de posse, ressaltando que tais vícios acarretam a nulidade dos atos de representação e, por consequência, a ilegitimidade da Associação. Aduz, ademais, a ausência de autorização específica e expressa dos associados para o ajuizamento da presente demanda, nos termos do artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal e que, em processos de mesma natureza, a Recorrida tem apresentado a Ata da Segunda Assembleia Geral Extraordinária da associação, da qual consta a autorização de quinze associados para a propositura de ações judiciais. Contudo, ressalta que referido documento é datado de 30 de setembro de 2024, ao passo que a presente ação foi proposta em 4 de junho de 2024, o que, a seu ver, evidencia a inexistência de autorização prévia dos associados. Enfatiza, outrossim, que o referido ato de autorização para a propositura de ações judiciais, o qual sequer foi juntado aos presentes autos, teria sido subscrito por quinze associados, dentre os quais Procuradores de diversos Municípios e Câmaras Municipais do Estado de Mato Grosso, de modo que, seria inviável aferir se os Procuradores do Município de Novo Horizonte do Norte, que seriam, em tese, os diretamente representados na presente demanda, integram o quadro de associados da APM/MT, o que, a seu ver, reforça a ilegitimidade ativa da Associação. No mérito, pontua que o Contrato Administrativo n. 036/2022 foi celebrado em conformidade com a legislação então vigente, notadamente a revogada Lei n. 8.666/1993, não havendo, portanto, qualquer afronta aos dispositivos legais invocados na presente ação civil pública. Assevera que a contratação se deu por inexigibilidade de licitação, nos termos dos artigos 25, inciso II, e 13, inciso III, do referido diploma legal, em razão da singularidade dos serviços e da notória especialização da sociedade contratada. Acentua que o juízo de conveniência para a contratação foi exercido pelo gestor municipal competente e que a singularidade e confiança são elementos que justificam a inviabilidade de competição para a prestação de serviços advocatícios. Invoca a Lei n. 14.039/2020 e a nova Lei de Licitações (Lei n. 14.133/2021) como instrumentos normativos que reconhecem a natureza técnica e singular da advocacia. Destaca que a legalidade do contrato foi chancelada por órgãos de controle externo, como o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado, que, após rigorosa inspeção, não identificaram irregularidades na contratação. Por fim, insurge-se contra a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, argumentando que, por aplicação do princípio da simetria, não se admite a imposição dessa verba à parte demandada em ação civil pública, salvo em caso de comprovada má-fé, o que, segundo alega, não se verifica no presente caso. Com essas razões, pugna pelo provimento do recurso para: i) reconhecer a ilegitimidade ativa da APM-MT e extinguir o feito sem resolução de mérito; ou, subsidiariamente, ii) reconhecer a perda superveniente de objeto e ausência de interesse processual, com a exclusão da condenação em custas e honorários; ou, ainda, iii) reconhecer a regularidade do contrato administrativo celebrado e julgar improcedente a ação originária; e, em qualquer hipótese, iv) afastar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios. As contrarrazões foram apresentadas (id. 284531989). A Procuradoria-Geral de Justiça, por meio de parecer subscrito pelo Doutor Edmilson da Costa Pereira, manifestou-se pelo não provimento do recurso de apelação (id. 286515387). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Eminentes Pares, Como explicitado no relatório, trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto pela pessoa jurídica de direito privado, Iori & Neves Advogados Associados, contra a sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública ajuizada pela Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT. Extrai-se da inicial que a APM/MT ajuizou Ação Civil Pública em face do Município de Novo Horizonte do Norte e do escritório Iori & Neves Advogados Associados, postulando a declaração de nulidade do Contrato Administrativo n. 036/2022, celebrado entre as partes, bem como a imposição de obrigação de não fazer, consistente na abstenção de celebração de novos contratos de assessoria jurídica voltados ao desempenho de funções típicas da Procuradoria Municipal. Informou que o objeto do referido contrato, acrescido de três termos aditivos, alcançou o montante de R$ 370.710,00 (trezentos e setenta mil setecentos e dez reais), prevendo pagamento mensal de R$ 8.100,00 (oito mil e cem reais) e vigência até 31/12/2024, consistia na prestação de serviços de consultoria e assessoria jurídica ao Poder Executivo e às Secretarias Municipais, incluindo o acompanhamento de demandas judiciais. Relatou que o Município de Novo Horizonte do Norte possui Procuradoria-Geral devidamente instituída e estruturada, com cargos efetivos e comissionados preenchidos, conforme demonstrado em documentos anexados e em autos de produção antecipada de provas. Asseverou que as atividades contratadas são típicas da Procuradoria, conforme prevê expressamente a Lei Municipal n. 1.481/2024, que atribui à PGM a representação judicial e extrajudicial do Município e as funções de consultoria e assessoramento jurídico. Pontuou que a contratação em questão carece de excepcionalidade, de natureza singular do serviço e de demonstração da notória especialização do contratado, requisitos indispensáveis para a contratação direta por inexigibilidade de licitação, nos termos da jurisprudência dos Tribunais Superiores. Ressaltou tratar-se de contratação reiterada, direcionada à execução de atividades corriqueiras e permanentes da Administração Pública, circunstância que evidencia a ausência dos requisitos legais para a contratação direta e reforça a ilegalidade do ajuste celebrado. Destacou que a contratação impugnada viola os princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e proporcionalidade, ao instituir despesa desnecessária aos cofres públicos municipais, em afronta ao disposto no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Com estas razões, formulou os seguintes pedidos: “[...] a) A concessão da tutela de urgência para suspender o Contrato Administrativo nº 036/2022, evitando o repasse de valores, sob pena de aplicação de multa diária; [...] d) No mérito, após a confirmação da liminar, seja julgado procedente a ação para declarar a nulidade do Contrato Administrativo nº 036/2022, afastando a possibilidade de devolução de valores recebidos a título de serviço efetivamente realizado, bem como condenar a Municipalidade nas obrigações de não fazer de: i) não celebrar novos contratos de assessoria jurídica para a realização de atividades típicas da Administração Pública, observados os contornos estabelecidos na fundamentação, com a requerida ou quaisquer outras pessoas físicas ou jurídicas; e ii) não prorrogar o Contrato Administrativo nº 036/2022 e outros com objeto análogo ou idêntico por ventura celebrados no curso da demanda, sob pena de multa diária. [...]”. Após regular trâmite do feito, o Magistrado singular prolatou sentença, ficando a parte dispositiva assim redigida: “[...] Assim, julgo o processo parcialmente extinto sem resolução de mérito, no que tange ao pedido de declarar a nulidade do Contrato Administrativo nº 036/2022, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC, em virtude da informação superveniente da rescisão do contrato administrativo em discussão. [...] Ante o exposto, julgo procedente o pedido inicial para condenar o Município de Novo Horizonte do Norte à obrigação de não celebrar ou prorrogar contratos de assessoria jurídica que envolvam atividades típicas da Procuradoria-Geral do Município, tais como representação judicial e consultoria jurídica, salvo em situações excepcionais, devidamente fundamentadas e observando os requisitos previstos na legislação e jurisprudência pertinentes, em especial o Tema 309, do STF. Outrossim, julgo extinto o presente feito, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Custas processuais pelo requerido Iori & Sanches Advogados Associados, em decorrência do princípio da causalidade, sendo isento de custas o Município de Novo Horizonte do Norte. Condeno a parte requerida em honorários advocatícios em favor do Patrono do Requerente, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC (REsp 1.986.814). Deixo de submeter o feito ao reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, do CPC. [...]”. Contra a sentença, foram opostos embargos de declaração, cuja decisão, é a seguinte: “[...] No caso dos autos, observo que a parte autora objetivou a anulação de contrato administrativo, pedido do qual é possível verificar proveito econômico, cumulada com obrigação de não fazer, consistente em não celebrar novos contratos de assessoria jurídica para a realização de atividades típicas da Administração Pública. Ocorre que a obrigação de não fazer não possui conteúdo patrimonial imediatamente mensurável. Sobre o tema: APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. VALOR DA CAUSA. DEMANDA SEM CONTEÚDO PATRIMONIAL OU BENEFÍCIO ECONÔMICO IMEDIATAMENTE MENSURÁVEL. REFIXAÇÃO NA SENTENÇA. CONSTRUÇÃO DE EDIFICAÇÃO EM CONDOMÍNIO. DIREITO DE PROPRIEDADE E DE CONSTRUIR REGRAS DE PADRÃO E METRAGEM ESTABELECIDAS EM AGE. IMPOSIÇÃO DE LIMITAÇÃO NÃO PRESENTE NA CONVENÇÃO. DECISÃO ASSEMBLEAR QUE NÃO PODE ALTERAR A CONVENÇÃO. 1. Somente cabe correção do valor da causa por arbitramento nos casos em que a demanda tenha valor certo ou proveito econômico imediatamente quantificável, sendo que, no caso dos autos, não há conteúdo econômico, por se tratar de ação que visa obrigação de não fazer, faltando balizas a orientar a identificação do conteúdo patrimonial em discussão, o que impede o juiz de promover a correção do valor da causa atribuído pelo autor. 2. Se a decisão exarada regularmente na AGE promove limitação na construção, estabelecendo metragem mínima e padrão de alvenaria, vedando a utilização de determinado tipo de construção, mas essa limitação não se acha estabelecida na convenção condominial, não poderia uma decisão assemblear criar limitação ao direito de propriedade e de construir. 3. Se a obra que se busca embargar, está de acordo com as normas municipais e devidamente licenciada, e ainda, não agride o padrão estético das demais construções, não pode o condomínio embargar a obra por decisão assemblear que não encontra previsão na convenção . 4. Honorários de sucumbência fixados em R$ 2.000,00 nos termos do art. 85, § 8º do CPC . RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-RJ - APL: 00150375920198190014, Relator.: Des(a). JDS JOÃO BATISTA DAMASCENO, Data de Julgamento: 13/05/2021, VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/05/2021)(destaquei) Dessa forma, observo que a sentença vergastada considerou, em suas razões, o segundo pedido como obrigação de fazer, incorrendo em contradição. Diante do exposto, conheço do presente recurso e o acolho, para sanar a contradição, acolhendo a preliminar de incorreção do valor da causa para que passe a constar o valor correto da causa, relativo ao pedido de anulação do contrato administrativo, qual seja, R$ 370.710,00 (trezentos e setenta mil setecentos e dez reais), mantido o decisum em todos os seus demais termos. [...]”. Inconformado com os contornos da sentença, Iori & Neves Advogados Associados, interpôs recurso de apelação. Inicialmente, passa-se ao exame da preliminar de ilegitimidade ativa ad causam suscitada pelo Recorrente. Da ilegitimidade passiva A preliminar de ilegitimidade ativa suscitada pelo Recorrente não merece prosperar. Nos termos do artigo 5º, inciso V, da Lei n. 7.347/1985, é conferida legitimidade às associações civis para a propositura de ação civil pública, desde que estejam constituídas há pelo menos um ano e que, entre seus objetivos institucionais, figure a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. No presente caso, a Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM-MT encontra-se regularmente constituída há mais de um ano, conforme demonstra seu estatuto social, devidamente registrado em 17/03/2021, no 2º Serviço Notarial e Registral da Comarca de Água Boa/MT. Constata-se, ainda, que o artigo 2º do referido estatuto dispõe expressamente que um dos objetivos da associação é zelar pela probidade administrativa, finalidade que guarda plena pertinência com o objeto da presente demanda, a qual visa à anulação de contrato administrativo supostamente celebrado em desconformidade com os preceitos constitucionais e legais que regem a Administração Pública, notadamente os princípios da legalidade, moralidade e eficiência. Assim, está evidenciada a necessária pertinência temática entre os fins institucionais da entidade e o direito cuja tutela se pretende, o que atrai a incidência do permissivo legal da Lei da Ação Civil Pública e confere legitimidade à APM-MT para ajuizar a presente ação. No que tange à alegada necessidade de autorização expressa dos associados, cumpre esclarecer que a associação atua na qualidade de substituta processual, exercendo, em nome próprio, a defesa dos interesses de seus associados, nos termos do ordenamento jurídico vigente. Nessa condição, dispensa-se autorização nominal ou deliberação assemblear específica para cada ação ajuizada, sendo suficiente que tal atribuição conste dos objetivos institucionais definidos em seu estatuto. Ademais, não há exigência legal de que os associados diretamente afetados pela contratação objeto da demanda integrem nominadamente o quadro da entidade autora, sendo certo que a associação representa a categoria dos procuradores municipais de todo o Estado de Mato Grosso, cuja atuação institucional é abrangente e voltada à defesa de interesses difusos e coletivos que transcendem situações individuais. A propósito: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. LEGITIMIDADE. DISPENSA DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA E RELAÇÃO NOMINAL DOS ASSOCIADOS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência do STJ, os sindicatos e as associações, na qualidade de substitutos processuais, têm legitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representam, e não apenas os filiados, sendo desnecessária a exigência de autorização para a atuação em juízo nessa condição. Incidência da Súmula n. 83 do STJ . 2. É inviável a insurgência recursal que importa no revolvimento de fatos e das provas dos autos. Incidência das Súmulas n. 5 e 7 do STJ . 3. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1487060 RS 2014/0080549-1, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 29/04/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/05/2024). Quanto à suposta irregularidade no processo eleitoral da diretoria da associação, observa-se que tal alegação não foi objeto de impugnação na instância de origem, configurando, portanto, inovação recursal, insuscetível de conhecimento nesta instância revisora, sob pena de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Ainda que assim não fosse, eventuais vícios de natureza meramente formal, mesmo que existentes, não têm o condão de infirmar a legitimidade da associação, tampouco de anular os atos por ela regularmente praticados no exercício de sua representação. Ora, irregularidades que não comprometem a finalidade do ato ou a higidez da constituição da pessoa jurídica devem ser tratadas como sanáveis, não se prestando à extinção do feito. Cumpre destacar que o interesse tutelado na presente ação, voltado à defesa da moralidade e da legalidade administrativas e à preservação do erário, possui natureza pública relevante, não podendo ser sacrificado por alegações de vícios formais que não comprometem, de modo substancial, a atuação processual da entidade autora. Diante de tais premissas, resta evidenciada a legitimidade ativa da Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso para a propositura da presente Ação Civil Pública, razão pela qual REJEITO a preliminar suscitada. Do Mérito No que tange ao mérito, depreende-se dos autos, a controvérsia recursal reside na análise da legalidade do Contrato Administrativo n. 036/2022, celebrado entre o Município de Novo Horizonte do Norte e o escritório Iori & Neves Advogados Associados, cujo objeto consistiu na prestação de serviços de consultoria e assessoria jurídica ao Poder Executivo Municipal e às Secretarias Municipais, inclusive com acompanhamento de processos judiciais, em regime de prestação continuada. Observa-se que o referido contrato foi formalizado com fulcro no instituto da inexigibilidade de licitação, nos termos da revogada Lei n. 8.666/1993, especialmente em seus artigos 13, inciso V, e 25, inciso II, os quais previam a possibilidade de contratação direta de serviços técnicos especializados, de natureza singular, prestados por profissionais ou empresas de notória especialização. Contudo, a aplicação dessa hipótese de inexigibilidade de licitação não pode se dar de forma genérica e indiscriminada. A contratação direta, por se tratar de exceção à regra da licitação, deve ser precedida de criteriosa análise da Administração quanto à presença dos requisitos legais exigidos: a natureza singular do serviço e a notória especialização do contratado. No caso em apreço, não há nos autos elementos concretos que evidenciem a natureza singular dos serviços contratados ou a notória especialização da sociedade contratada, de modo a justificar a dispensa do procedimento licitatório. Ao contrário, as atribuições contratadas, elaboração de pareceres jurídicos, orientação aos gestores municipais e acompanhamento de ações judiciais, são inerentes às atividades cotidianas da Procuradoria-Geral do Município, órgão esse regularmente instituído e estruturado, com quadro funcional composto por servidores efetivos e comissionados. Tais atividades, portanto, não ostentam a excepcionalidade necessária para atrair a incidência da inexigibilidade de licitação. De igual modo, não restou demonstrado que a contratada ostente qualificação técnica diferenciada, acima da média do mercado, apta a caracterizar notória especialização. A mera afirmação genérica de experiência ou a confiança subjetiva da Administração não bastam para suplantar o dever constitucional de licitar, tampouco autorizam a celebração direta de ajustes administrativos que envolvam a destinação de recursos públicos. Cumpre destacar que a singularidade de um serviço jurídico não decorre exclusivamente de seu caráter intelectual, mas da especificidade e complexidade da demanda apresentada, o que não se vislumbra na hipótese dos autos. Os serviços contratados revelam-se corriqueiros e compatíveis com a estrutura jurídica já existente no âmbito municipal, o que afasta a justificativa para a contratação externa. A propósito: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022, I E II, DO CPC/2015. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO E DE OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. ALEGAÇÃO DE DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. DISSÍDIO CONFIGURADO. CORREÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS QUE EXIGE A PROVA DA SINGULARIDADE E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO. AGRAVO CONHECIDO PARA CONHECER DO RECURSO ESPECIAL E NEGAR-LHE PROVIMENTO. I - Trata-se, na origem, de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Sustenta-se, em síntese, que os réus contrataram serviços profissionais com dispensa indevida de licitação e sob o compromisso de defesa dos interesses pessoais do contratado, então, Presidente da Câmara Municipal. Os pedidos formulados na inicial foram julgados parcialmente procedentes. II - Os recursos de apelação interpostos pelos réus foram providos pelo Tribunal de origem. Inconformado, o Parquet estadual opôs embargos infringentes, os quais foram providos para restabelecer a sentença. Um dos réus interpôs, então, recurso especial, alegando violação de dispositivos de lei federal e divergência jurisprudencial. III - Ausência de contradição. A contradição referente ao art. 1.022, I, do CPC/2015 deve ocorrer no interior de uma única decisão, e não de decisões distintas. Ausência de omissão. Desnecessidade de análise de argumentos não importantes para a solução do litígio. Precedentes: REsp 1.719.219/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 19/4/2018, DJe 23/5/2018. IV - É remansoso o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que a contratação de serviço de advocacia apenas autoriza a inexigibilidade de licitação se gozar de características tais que a competição se revele inviável. Precedentes: REsp 1.431.610/GO, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 13/12/2018, DJe 26/2/2019; AgInt no AREsp 1.026.225/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 5/6/2018, DJe 8/6/2018. V - A inexigibilidade de licitação prevista no art. 25, II, da Lei n. 8.666/93 não se contenta com a natureza técnica do serviço contratado. Exige a conjugação da natureza técnica (art. 13) com a natureza singular e a notória especialização dos profissionais ou empresas (art. 25, II). Assim, deve prevalecer o entendimento exposto no decisum recorrido, e não aquele que pretende, ao arrepio da lei, generalizar a inexigibilidade de licitação para todas as contratações de serviços advocatícios. VI - Agravo conhecido para conhecer do recurso especial e negar-lhe provimento. (STJ, AREsp n. 1.543.113/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 10/3/2020, DJe de 17/3/2020). ADMINISTRATIVO. IRREGULARIDADE NA CONTRATAÇÃO DIRETA. REVISÃO FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A contratação direta de profissional ou escritório para serviços advocatícios por inexigibilidade de licitação deve ocorrer de forma excepcional, exigindo a singularidade do serviço e a inviabilidade de competição, diante da notória especialização a ser concretamente demonstrada. 2. Infirmar o entendimento da Corte de origem, de que não haveria, na hipótese, nada a tornar inviável a competição, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, o que encontra óbice na Súmula 7 do STJ. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.961.478/MG, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/11/2023, DJe de 5/12/2023). Importa registrar, ainda, que a edição da Lei Federal n. 14.039/2020, que introduziu o artigo 3º-A no Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/1994), não modificou o regime jurídico das contratações públicas de serviços advocatícios. Embora tal norma reconheça a natureza técnica e singular desses serviços, condiciona expressamente sua contratação por inexigibilidade à comprovação da notória especialização do profissional ou sociedade. Veja-se: Art. 3º-A. Os serviços profissionais de advogado são, por sua natureza, técnicos e singulares, quando comprovada sua notória especialização, nos termos da lei. Parágrafo único. Considera-se notória especialização o profissional ou a sociedade de advogados cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato. Assim, a legislação não afasta, mas reforça a necessidade de justificação concreta e individualizada da excepcionalidade da contratação, o que não se verifica no caso concreto. Diante do exposto, impõe-se a manutenção da sentença de origem, que reconheceu a irregularidade da contratação e impôs ao Município a obrigação de não mais celebrar contratos de assessoria jurídica voltados ao desempenho de funções típicas da Procuradoria-Geral, preservando-se, com isso, a integridade do ordenamento jurídico e o interesse público primário. Por fim, no que se refere à petição protocolada pelo Recorrente em 09/06/2025, por meio da qual requer o sobrestamento do presente feito até o julgamento do mérito da ação anulatória de estatuto social (processo n. 1045780-63.2025.8.11.0041), que tramita perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, cumpre consignar que a decisão proferida naquele feito, a despeito de haver deferido tutela de urgência para suspender os efeitos do estatuto social da Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT, não possui o condão de interferir no deslinde da presente controvérsia. Isso porque, conforme amplamente analisado neste voto, a legitimidade da APM/MT para a propositura da ação civil pública foi reconhecida à luz da legislação de regência e de seu estatuto regularmente registrado, tendo a sua atuação processual ocorrido muito antes da propositura da referida ação anulatória, de modo que eventual decisão liminar proferida em Juízo diverso e em momento posterior não alcança eficácia retroativa apta a comprometer a validade da atuação pretérita da entidade autora nos autos originários. Ademais, a tutela de urgência concedida naquele feito tem natureza cautelar e efeitos provisórios, sem impacto direto e imediato sobre o presente julgamento, cuja matéria já se encontra exaurida em sede de cognição exauriente. Logo, inexiste óbice à continuidade e ao julgamento do presente recurso de apelação. Forte nessas razões, NEGO PROVIMENTO ao Recurso de Apelação interposto pela pessoa jurídica de direito privado, Iori & Neves Advogados Associados, mantendo incólume a sentença recorrida. Outrossim, atento ao disposto no artigo 85, § § 1º, 2º e 11, do CPC, majoro o percentual dos honorários advocatícios para 12% (doze por cento). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Processo nº 1000358-68.2024.8.11.0019

ID: 305011794

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000358-68.2024.8.11.0019

Data de Disponibilização: 23/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT

Acórdão

Advogados:

WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA

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YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Anulação] Relator: Des(a). MARCIO V… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000358-68.2024.8.11.0019 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Anulação] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (APELADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (APELANTE), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (APELANTE), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO - APM-MT - CNPJ: 42.404.275/0001-30 (APELANTE), WARLLANS WAGNER XAVIER SOUZA - CPF: 063.721.281-95 (ADVOGADO), YANN DIEGGO SOUZA TIMOTHEO DE ALMEIDA - CPF: 725.043.901-49 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (APELADO), SIMONI BERGAMASCHI DA FONSECA - CPF: 581.503.669-20 (ADVOGADO), IORI & NEVES ADVOGADOS - CNPJ: 23.636.866/0001-99 (APELADO), BRUNO RICARDO BARELA IORI - CPF: 017.258.031-51 (ADVOGADO), TONI FERNANDES SANCHES - CPF: 311.050.388-31 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE NOVO HORIZONTE DO NORTE - CNPJ: 03.238.888/0001-93 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. MÁRCIO VIDAL. Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. ILEGALIDADE DO CONTRATO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO SEM COMPROVAÇÃO DE SINGULARIDADE E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO. ATIVIDADES JURÍDICAS TÍPICAS DA PROCURADORIA-GERAL DO MUNICÍPIO. LEGITIMIDADE ATIVA DE ASSOCIAÇÃO CIVIL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação interposto por sociedade de advogados contra sentença que reconheceu a legalidade da atuação da Associação autora e julgou procedente a obrigação imposta ao Município de Novo Horizonte do Norte de não contratar serviços advocatícios externos para o desempenho de atribuições típicas da Procuradoria-Geral Municipal, salvo em hipóteses excepcionais e justificadas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso (APM-MT) possui legitimidade ativa para propor a ação civil pública; e (ii) examinar a legalidade do contrato administrativo celebrado entre o Município e o escritório recorrente, com fundamento em inexigibilidade de licitação. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Associações civis regularmente constituídas há mais de um ano e com finalidade estatutária voltada à defesa da probidade administrativa têm legitimidade ativa para ajuizar ações civis públicas, independentemente de autorização expressa dos associados ou de relação nominal dos diretamente afetados. 4. Alegações de vícios formais na eleição da diretoria da associação constituem inovação recursal e, ainda que consideradas, não têm o condão de afastar sua legitimidade processual. 5. A inexigibilidade de licitação prevista na revogada Lei n. 8.666/1993 (vigente à época) exige a presença cumulativa de singularidade do serviço e notória especialização do contratado, não sendo suficiente a alegação genérica de confiança ou experiência. 6. Os serviços contratados, assessoramento jurídico e representação judicial, são típicos da Procuradoria-Geral do Município, cuja estrutura funcional encontra-se devidamente instituída e em funcionamento. 7. A ausência de demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do escritório contratado inviabiliza a contratação direta, afrontando os princípios da legalidade, moralidade e eficiência administrativa. 8. A Lei n. 14.039/2020, ao reconhecer a natureza singular dos serviços advocatícios, não afasta a exigência de comprovação da notória especialização, nos termos da legislação de regência. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. Associações civis que tenham entre seus objetivos institucionais a defesa da probidade administrativa possuem legitimidade para ajuizar ações civis públicas, mesmo sem autorização expressa dos associados diretamente afetados. 2. A contratação direta de serviços advocatícios pelo Poder Público exige demonstração concreta de singularidade do objeto e notória especialização do contratado, não se presumindo essas condições pela mera natureza da atividade. 3. É vedada a contratação de assessoria jurídica externa para o desempenho de funções típicas da Procuradoria-Geral do Município, quando esta estiver regularmente instituída e estruturada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, II; CPC, arts. 85, § 2º e § 11, 485, VI, e 487, I; Lei n. 8.666/1993, arts. 13, V, e 25, II; Lei n. 7.347/1985, art. 5º, V; Lei n. 14.039/2020, art. 3º-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1487060/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 29.04.2024; STJ, AREsp 1.543.113/SP, rel. Min. Francisco Falcão, j. 10.03.2020; STJ, AgInt no REsp 1.961.478/MG, rel. Min. Gurgel de Faria, j. 27.11.2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL Egrégia Câmara, Trata-se de Recurso de Apelação Cível, interposto pela pessoa jurídica de direito privado, Iori & Neves Advogados Associados, contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Porto dos Gaúchos, que, nos autos da Ação Civil Pública, proposta pela Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT, extinguiu o feito, sem resolução de mérito, quanto ao pedido de declaração de nulidade do Contrato Administrativo n. 036/2022, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, diante da rescisão contratual firmada entre as partes, e julgou procedente o pleito referente à obrigação imposta ao Município de Novo Horizonte do Norte de se abster de celebrar ou prorrogar contratos de assessoria jurídica que versem sobre atribuições típicas da Procuradoria-Geral do Município. Em suas razões recursais, a Apelante suscita a preliminar de ilegitimidade ativa da parte autora, ora Recorrida, sob múltiplas alegações. Primeiramente, defende que a Associação não possui pertinência temática, nos termos do artigo 5º, inciso V, da Lei n. 7.347/1985, pois seus objetivos estatutários visariam à defesa de interesses privados de seus associados, e não à tutela do patrimônio público ou social. Além disso, argumenta que a atuação da APM-MT está viciada por irregularidades insanáveis na eleição de sua diretoria, com afronta aos dispositivos estatutários quanto à data, forma e quórum da assembleia de posse, ressaltando que tais vícios acarretam a nulidade dos atos de representação e, por consequência, a ilegitimidade da Associação. Aduz, ademais, a ausência de autorização específica e expressa dos associados para o ajuizamento da presente demanda, nos termos do artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal e que, em processos de mesma natureza, a Recorrida tem apresentado a Ata da Segunda Assembleia Geral Extraordinária da associação, da qual consta a autorização de quinze associados para a propositura de ações judiciais. Contudo, ressalta que referido documento é datado de 30 de setembro de 2024, ao passo que a presente ação foi proposta em 4 de junho de 2024, o que, a seu ver, evidencia a inexistência de autorização prévia dos associados. Enfatiza, outrossim, que o referido ato de autorização para a propositura de ações judiciais, o qual sequer foi juntado aos presentes autos, teria sido subscrito por quinze associados, dentre os quais Procuradores de diversos Municípios e Câmaras Municipais do Estado de Mato Grosso, de modo que, seria inviável aferir se os Procuradores do Município de Novo Horizonte do Norte, que seriam, em tese, os diretamente representados na presente demanda, integram o quadro de associados da APM/MT, o que, a seu ver, reforça a ilegitimidade ativa da Associação. No mérito, pontua que o Contrato Administrativo n. 036/2022 foi celebrado em conformidade com a legislação então vigente, notadamente a revogada Lei n. 8.666/1993, não havendo, portanto, qualquer afronta aos dispositivos legais invocados na presente ação civil pública. Assevera que a contratação se deu por inexigibilidade de licitação, nos termos dos artigos 25, inciso II, e 13, inciso III, do referido diploma legal, em razão da singularidade dos serviços e da notória especialização da sociedade contratada. Acentua que o juízo de conveniência para a contratação foi exercido pelo gestor municipal competente e que a singularidade e confiança são elementos que justificam a inviabilidade de competição para a prestação de serviços advocatícios. Invoca a Lei n. 14.039/2020 e a nova Lei de Licitações (Lei n. 14.133/2021) como instrumentos normativos que reconhecem a natureza técnica e singular da advocacia. Destaca que a legalidade do contrato foi chancelada por órgãos de controle externo, como o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado, que, após rigorosa inspeção, não identificaram irregularidades na contratação. Por fim, insurge-se contra a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, argumentando que, por aplicação do princípio da simetria, não se admite a imposição dessa verba à parte demandada em ação civil pública, salvo em caso de comprovada má-fé, o que, segundo alega, não se verifica no presente caso. Com essas razões, pugna pelo provimento do recurso para: i) reconhecer a ilegitimidade ativa da APM-MT e extinguir o feito sem resolução de mérito; ou, subsidiariamente, ii) reconhecer a perda superveniente de objeto e ausência de interesse processual, com a exclusão da condenação em custas e honorários; ou, ainda, iii) reconhecer a regularidade do contrato administrativo celebrado e julgar improcedente a ação originária; e, em qualquer hipótese, iv) afastar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios. As contrarrazões foram apresentadas (id. 284531989). A Procuradoria-Geral de Justiça, por meio de parecer subscrito pelo Doutor Edmilson da Costa Pereira, manifestou-se pelo não provimento do recurso de apelação (id. 286515387). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Eminentes Pares, Como explicitado no relatório, trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto pela pessoa jurídica de direito privado, Iori & Neves Advogados Associados, contra a sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública ajuizada pela Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT. Extrai-se da inicial que a APM/MT ajuizou Ação Civil Pública em face do Município de Novo Horizonte do Norte e do escritório Iori & Neves Advogados Associados, postulando a declaração de nulidade do Contrato Administrativo n. 036/2022, celebrado entre as partes, bem como a imposição de obrigação de não fazer, consistente na abstenção de celebração de novos contratos de assessoria jurídica voltados ao desempenho de funções típicas da Procuradoria Municipal. Informou que o objeto do referido contrato, acrescido de três termos aditivos, alcançou o montante de R$ 370.710,00 (trezentos e setenta mil setecentos e dez reais), prevendo pagamento mensal de R$ 8.100,00 (oito mil e cem reais) e vigência até 31/12/2024, consistia na prestação de serviços de consultoria e assessoria jurídica ao Poder Executivo e às Secretarias Municipais, incluindo o acompanhamento de demandas judiciais. Relatou que o Município de Novo Horizonte do Norte possui Procuradoria-Geral devidamente instituída e estruturada, com cargos efetivos e comissionados preenchidos, conforme demonstrado em documentos anexados e em autos de produção antecipada de provas. Asseverou que as atividades contratadas são típicas da Procuradoria, conforme prevê expressamente a Lei Municipal n. 1.481/2024, que atribui à PGM a representação judicial e extrajudicial do Município e as funções de consultoria e assessoramento jurídico. Pontuou que a contratação em questão carece de excepcionalidade, de natureza singular do serviço e de demonstração da notória especialização do contratado, requisitos indispensáveis para a contratação direta por inexigibilidade de licitação, nos termos da jurisprudência dos Tribunais Superiores. Ressaltou tratar-se de contratação reiterada, direcionada à execução de atividades corriqueiras e permanentes da Administração Pública, circunstância que evidencia a ausência dos requisitos legais para a contratação direta e reforça a ilegalidade do ajuste celebrado. Destacou que a contratação impugnada viola os princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e proporcionalidade, ao instituir despesa desnecessária aos cofres públicos municipais, em afronta ao disposto no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Com estas razões, formulou os seguintes pedidos: “[...] a) A concessão da tutela de urgência para suspender o Contrato Administrativo nº 036/2022, evitando o repasse de valores, sob pena de aplicação de multa diária; [...] d) No mérito, após a confirmação da liminar, seja julgado procedente a ação para declarar a nulidade do Contrato Administrativo nº 036/2022, afastando a possibilidade de devolução de valores recebidos a título de serviço efetivamente realizado, bem como condenar a Municipalidade nas obrigações de não fazer de: i) não celebrar novos contratos de assessoria jurídica para a realização de atividades típicas da Administração Pública, observados os contornos estabelecidos na fundamentação, com a requerida ou quaisquer outras pessoas físicas ou jurídicas; e ii) não prorrogar o Contrato Administrativo nº 036/2022 e outros com objeto análogo ou idêntico por ventura celebrados no curso da demanda, sob pena de multa diária. [...]”. Após regular trâmite do feito, o Magistrado singular prolatou sentença, ficando a parte dispositiva assim redigida: “[...] Assim, julgo o processo parcialmente extinto sem resolução de mérito, no que tange ao pedido de declarar a nulidade do Contrato Administrativo nº 036/2022, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC, em virtude da informação superveniente da rescisão do contrato administrativo em discussão. [...] Ante o exposto, julgo procedente o pedido inicial para condenar o Município de Novo Horizonte do Norte à obrigação de não celebrar ou prorrogar contratos de assessoria jurídica que envolvam atividades típicas da Procuradoria-Geral do Município, tais como representação judicial e consultoria jurídica, salvo em situações excepcionais, devidamente fundamentadas e observando os requisitos previstos na legislação e jurisprudência pertinentes, em especial o Tema 309, do STF. Outrossim, julgo extinto o presente feito, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Custas processuais pelo requerido Iori & Sanches Advogados Associados, em decorrência do princípio da causalidade, sendo isento de custas o Município de Novo Horizonte do Norte. Condeno a parte requerida em honorários advocatícios em favor do Patrono do Requerente, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC (REsp 1.986.814). Deixo de submeter o feito ao reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, do CPC. [...]”. Contra a sentença, foram opostos embargos de declaração, cuja decisão, é a seguinte: “[...] No caso dos autos, observo que a parte autora objetivou a anulação de contrato administrativo, pedido do qual é possível verificar proveito econômico, cumulada com obrigação de não fazer, consistente em não celebrar novos contratos de assessoria jurídica para a realização de atividades típicas da Administração Pública. Ocorre que a obrigação de não fazer não possui conteúdo patrimonial imediatamente mensurável. Sobre o tema: APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. VALOR DA CAUSA. DEMANDA SEM CONTEÚDO PATRIMONIAL OU BENEFÍCIO ECONÔMICO IMEDIATAMENTE MENSURÁVEL. REFIXAÇÃO NA SENTENÇA. CONSTRUÇÃO DE EDIFICAÇÃO EM CONDOMÍNIO. DIREITO DE PROPRIEDADE E DE CONSTRUIR REGRAS DE PADRÃO E METRAGEM ESTABELECIDAS EM AGE. IMPOSIÇÃO DE LIMITAÇÃO NÃO PRESENTE NA CONVENÇÃO. DECISÃO ASSEMBLEAR QUE NÃO PODE ALTERAR A CONVENÇÃO. 1. Somente cabe correção do valor da causa por arbitramento nos casos em que a demanda tenha valor certo ou proveito econômico imediatamente quantificável, sendo que, no caso dos autos, não há conteúdo econômico, por se tratar de ação que visa obrigação de não fazer, faltando balizas a orientar a identificação do conteúdo patrimonial em discussão, o que impede o juiz de promover a correção do valor da causa atribuído pelo autor. 2. Se a decisão exarada regularmente na AGE promove limitação na construção, estabelecendo metragem mínima e padrão de alvenaria, vedando a utilização de determinado tipo de construção, mas essa limitação não se acha estabelecida na convenção condominial, não poderia uma decisão assemblear criar limitação ao direito de propriedade e de construir. 3. Se a obra que se busca embargar, está de acordo com as normas municipais e devidamente licenciada, e ainda, não agride o padrão estético das demais construções, não pode o condomínio embargar a obra por decisão assemblear que não encontra previsão na convenção . 4. Honorários de sucumbência fixados em R$ 2.000,00 nos termos do art. 85, § 8º do CPC . RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-RJ - APL: 00150375920198190014, Relator.: Des(a). JDS JOÃO BATISTA DAMASCENO, Data de Julgamento: 13/05/2021, VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/05/2021)(destaquei) Dessa forma, observo que a sentença vergastada considerou, em suas razões, o segundo pedido como obrigação de fazer, incorrendo em contradição. Diante do exposto, conheço do presente recurso e o acolho, para sanar a contradição, acolhendo a preliminar de incorreção do valor da causa para que passe a constar o valor correto da causa, relativo ao pedido de anulação do contrato administrativo, qual seja, R$ 370.710,00 (trezentos e setenta mil setecentos e dez reais), mantido o decisum em todos os seus demais termos. [...]”. Inconformado com os contornos da sentença, Iori & Neves Advogados Associados, interpôs recurso de apelação. Inicialmente, passa-se ao exame da preliminar de ilegitimidade ativa ad causam suscitada pelo Recorrente. Da ilegitimidade passiva A preliminar de ilegitimidade ativa suscitada pelo Recorrente não merece prosperar. Nos termos do artigo 5º, inciso V, da Lei n. 7.347/1985, é conferida legitimidade às associações civis para a propositura de ação civil pública, desde que estejam constituídas há pelo menos um ano e que, entre seus objetivos institucionais, figure a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. No presente caso, a Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM-MT encontra-se regularmente constituída há mais de um ano, conforme demonstra seu estatuto social, devidamente registrado em 17/03/2021, no 2º Serviço Notarial e Registral da Comarca de Água Boa/MT. Constata-se, ainda, que o artigo 2º do referido estatuto dispõe expressamente que um dos objetivos da associação é zelar pela probidade administrativa, finalidade que guarda plena pertinência com o objeto da presente demanda, a qual visa à anulação de contrato administrativo supostamente celebrado em desconformidade com os preceitos constitucionais e legais que regem a Administração Pública, notadamente os princípios da legalidade, moralidade e eficiência. Assim, está evidenciada a necessária pertinência temática entre os fins institucionais da entidade e o direito cuja tutela se pretende, o que atrai a incidência do permissivo legal da Lei da Ação Civil Pública e confere legitimidade à APM-MT para ajuizar a presente ação. No que tange à alegada necessidade de autorização expressa dos associados, cumpre esclarecer que a associação atua na qualidade de substituta processual, exercendo, em nome próprio, a defesa dos interesses de seus associados, nos termos do ordenamento jurídico vigente. Nessa condição, dispensa-se autorização nominal ou deliberação assemblear específica para cada ação ajuizada, sendo suficiente que tal atribuição conste dos objetivos institucionais definidos em seu estatuto. Ademais, não há exigência legal de que os associados diretamente afetados pela contratação objeto da demanda integrem nominadamente o quadro da entidade autora, sendo certo que a associação representa a categoria dos procuradores municipais de todo o Estado de Mato Grosso, cuja atuação institucional é abrangente e voltada à defesa de interesses difusos e coletivos que transcendem situações individuais. A propósito: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. LEGITIMIDADE. DISPENSA DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA E RELAÇÃO NOMINAL DOS ASSOCIADOS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência do STJ, os sindicatos e as associações, na qualidade de substitutos processuais, têm legitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representam, e não apenas os filiados, sendo desnecessária a exigência de autorização para a atuação em juízo nessa condição. Incidência da Súmula n. 83 do STJ . 2. É inviável a insurgência recursal que importa no revolvimento de fatos e das provas dos autos. Incidência das Súmulas n. 5 e 7 do STJ . 3. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1487060 RS 2014/0080549-1, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 29/04/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/05/2024). Quanto à suposta irregularidade no processo eleitoral da diretoria da associação, observa-se que tal alegação não foi objeto de impugnação na instância de origem, configurando, portanto, inovação recursal, insuscetível de conhecimento nesta instância revisora, sob pena de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Ainda que assim não fosse, eventuais vícios de natureza meramente formal, mesmo que existentes, não têm o condão de infirmar a legitimidade da associação, tampouco de anular os atos por ela regularmente praticados no exercício de sua representação. Ora, irregularidades que não comprometem a finalidade do ato ou a higidez da constituição da pessoa jurídica devem ser tratadas como sanáveis, não se prestando à extinção do feito. Cumpre destacar que o interesse tutelado na presente ação, voltado à defesa da moralidade e da legalidade administrativas e à preservação do erário, possui natureza pública relevante, não podendo ser sacrificado por alegações de vícios formais que não comprometem, de modo substancial, a atuação processual da entidade autora. Diante de tais premissas, resta evidenciada a legitimidade ativa da Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso para a propositura da presente Ação Civil Pública, razão pela qual REJEITO a preliminar suscitada. Do Mérito No que tange ao mérito, depreende-se dos autos, a controvérsia recursal reside na análise da legalidade do Contrato Administrativo n. 036/2022, celebrado entre o Município de Novo Horizonte do Norte e o escritório Iori & Neves Advogados Associados, cujo objeto consistiu na prestação de serviços de consultoria e assessoria jurídica ao Poder Executivo Municipal e às Secretarias Municipais, inclusive com acompanhamento de processos judiciais, em regime de prestação continuada. Observa-se que o referido contrato foi formalizado com fulcro no instituto da inexigibilidade de licitação, nos termos da revogada Lei n. 8.666/1993, especialmente em seus artigos 13, inciso V, e 25, inciso II, os quais previam a possibilidade de contratação direta de serviços técnicos especializados, de natureza singular, prestados por profissionais ou empresas de notória especialização. Contudo, a aplicação dessa hipótese de inexigibilidade de licitação não pode se dar de forma genérica e indiscriminada. A contratação direta, por se tratar de exceção à regra da licitação, deve ser precedida de criteriosa análise da Administração quanto à presença dos requisitos legais exigidos: a natureza singular do serviço e a notória especialização do contratado. No caso em apreço, não há nos autos elementos concretos que evidenciem a natureza singular dos serviços contratados ou a notória especialização da sociedade contratada, de modo a justificar a dispensa do procedimento licitatório. Ao contrário, as atribuições contratadas, elaboração de pareceres jurídicos, orientação aos gestores municipais e acompanhamento de ações judiciais, são inerentes às atividades cotidianas da Procuradoria-Geral do Município, órgão esse regularmente instituído e estruturado, com quadro funcional composto por servidores efetivos e comissionados. Tais atividades, portanto, não ostentam a excepcionalidade necessária para atrair a incidência da inexigibilidade de licitação. De igual modo, não restou demonstrado que a contratada ostente qualificação técnica diferenciada, acima da média do mercado, apta a caracterizar notória especialização. A mera afirmação genérica de experiência ou a confiança subjetiva da Administração não bastam para suplantar o dever constitucional de licitar, tampouco autorizam a celebração direta de ajustes administrativos que envolvam a destinação de recursos públicos. Cumpre destacar que a singularidade de um serviço jurídico não decorre exclusivamente de seu caráter intelectual, mas da especificidade e complexidade da demanda apresentada, o que não se vislumbra na hipótese dos autos. Os serviços contratados revelam-se corriqueiros e compatíveis com a estrutura jurídica já existente no âmbito municipal, o que afasta a justificativa para a contratação externa. A propósito: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022, I E II, DO CPC/2015. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO E DE OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. ALEGAÇÃO DE DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. DISSÍDIO CONFIGURADO. CORREÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS QUE EXIGE A PROVA DA SINGULARIDADE E NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO. AGRAVO CONHECIDO PARA CONHECER DO RECURSO ESPECIAL E NEGAR-LHE PROVIMENTO. I - Trata-se, na origem, de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Sustenta-se, em síntese, que os réus contrataram serviços profissionais com dispensa indevida de licitação e sob o compromisso de defesa dos interesses pessoais do contratado, então, Presidente da Câmara Municipal. Os pedidos formulados na inicial foram julgados parcialmente procedentes. II - Os recursos de apelação interpostos pelos réus foram providos pelo Tribunal de origem. Inconformado, o Parquet estadual opôs embargos infringentes, os quais foram providos para restabelecer a sentença. Um dos réus interpôs, então, recurso especial, alegando violação de dispositivos de lei federal e divergência jurisprudencial. III - Ausência de contradição. A contradição referente ao art. 1.022, I, do CPC/2015 deve ocorrer no interior de uma única decisão, e não de decisões distintas. Ausência de omissão. Desnecessidade de análise de argumentos não importantes para a solução do litígio. Precedentes: REsp 1.719.219/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 19/4/2018, DJe 23/5/2018. IV - É remansoso o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que a contratação de serviço de advocacia apenas autoriza a inexigibilidade de licitação se gozar de características tais que a competição se revele inviável. Precedentes: REsp 1.431.610/GO, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 13/12/2018, DJe 26/2/2019; AgInt no AREsp 1.026.225/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 5/6/2018, DJe 8/6/2018. V - A inexigibilidade de licitação prevista no art. 25, II, da Lei n. 8.666/93 não se contenta com a natureza técnica do serviço contratado. Exige a conjugação da natureza técnica (art. 13) com a natureza singular e a notória especialização dos profissionais ou empresas (art. 25, II). Assim, deve prevalecer o entendimento exposto no decisum recorrido, e não aquele que pretende, ao arrepio da lei, generalizar a inexigibilidade de licitação para todas as contratações de serviços advocatícios. VI - Agravo conhecido para conhecer do recurso especial e negar-lhe provimento. (STJ, AREsp n. 1.543.113/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 10/3/2020, DJe de 17/3/2020). ADMINISTRATIVO. IRREGULARIDADE NA CONTRATAÇÃO DIRETA. REVISÃO FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A contratação direta de profissional ou escritório para serviços advocatícios por inexigibilidade de licitação deve ocorrer de forma excepcional, exigindo a singularidade do serviço e a inviabilidade de competição, diante da notória especialização a ser concretamente demonstrada. 2. Infirmar o entendimento da Corte de origem, de que não haveria, na hipótese, nada a tornar inviável a competição, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, o que encontra óbice na Súmula 7 do STJ. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.961.478/MG, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/11/2023, DJe de 5/12/2023). Importa registrar, ainda, que a edição da Lei Federal n. 14.039/2020, que introduziu o artigo 3º-A no Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/1994), não modificou o regime jurídico das contratações públicas de serviços advocatícios. Embora tal norma reconheça a natureza técnica e singular desses serviços, condiciona expressamente sua contratação por inexigibilidade à comprovação da notória especialização do profissional ou sociedade. Veja-se: Art. 3º-A. Os serviços profissionais de advogado são, por sua natureza, técnicos e singulares, quando comprovada sua notória especialização, nos termos da lei. Parágrafo único. Considera-se notória especialização o profissional ou a sociedade de advogados cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato. Assim, a legislação não afasta, mas reforça a necessidade de justificação concreta e individualizada da excepcionalidade da contratação, o que não se verifica no caso concreto. Diante do exposto, impõe-se a manutenção da sentença de origem, que reconheceu a irregularidade da contratação e impôs ao Município a obrigação de não mais celebrar contratos de assessoria jurídica voltados ao desempenho de funções típicas da Procuradoria-Geral, preservando-se, com isso, a integridade do ordenamento jurídico e o interesse público primário. Por fim, no que se refere à petição protocolada pelo Recorrente em 09/06/2025, por meio da qual requer o sobrestamento do presente feito até o julgamento do mérito da ação anulatória de estatuto social (processo n. 1045780-63.2025.8.11.0041), que tramita perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, cumpre consignar que a decisão proferida naquele feito, a despeito de haver deferido tutela de urgência para suspender os efeitos do estatuto social da Associação dos Procuradores Municipais do Estado de Mato Grosso – APM/MT, não possui o condão de interferir no deslinde da presente controvérsia. Isso porque, conforme amplamente analisado neste voto, a legitimidade da APM/MT para a propositura da ação civil pública foi reconhecida à luz da legislação de regência e de seu estatuto regularmente registrado, tendo a sua atuação processual ocorrido muito antes da propositura da referida ação anulatória, de modo que eventual decisão liminar proferida em Juízo diverso e em momento posterior não alcança eficácia retroativa apta a comprometer a validade da atuação pretérita da entidade autora nos autos originários. Ademais, a tutela de urgência concedida naquele feito tem natureza cautelar e efeitos provisórios, sem impacto direto e imediato sobre o presente julgamento, cuja matéria já se encontra exaurida em sede de cognição exauriente. Logo, inexiste óbice à continuidade e ao julgamento do presente recurso de apelação. Forte nessas razões, NEGO PROVIMENTO ao Recurso de Apelação interposto pela pessoa jurídica de direito privado, Iori & Neves Advogados Associados, mantendo incólume a sentença recorrida. Outrossim, atento ao disposto no artigo 85, § § 1º, 2º e 11, do CPC, majoro o percentual dos honorários advocatícios para 12% (doze por cento). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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