Processo nº 1020062-90.2025.8.11.0000
ID: 316836279
Tribunal: TJMT
Órgão: Quarta Câmara Criminal
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 1020062-90.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
04/07/2025
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1020062-90.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Ameaça, Violência Doméstica Contra a Mulher] Relat…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1020062-90.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Ameaça, Violência Doméstica Contra a Mulher] Relator: Des(a). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO Turma Julgadora: [DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA] Parte(s): [CARLOS NAVES DE RESENDE - CPF: 482.404.271-20 (ADVOGADO), FABRICIO NOGUEIRA DA SILVA - CPF: 041.293.681-09 (PACIENTE), 1ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), CARLOS NAVES DE RESENDE - CPF: 482.404.271-20 (IMPETRANTE), JUÍZO DA 1ª VARA ESPECIALIZADA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO), LAYSA LORRAINE CORREA DIAS - CPF: 072.013.741-17 (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE DENEGOU A ORDEM, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. AMEAÇA NO ÂMBITO DA LEI MARIA DA PENHA. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. REITERAÇÃO DELITIVA. RISCO CONCRETO À INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DA VÍTIMA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MEDIDAS CAUTELARES INSUFICIENTES. ORDEM DENEGADA. I. Caso em exame: Habeas Corpus impetrado com pedido de liminar contra decisão prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Rondonópolis (MT), que converteu a prisão em flagrante do paciente em preventiva, diante da prática dos crimes de ameaça, cárcere privado e descumprimento de medidas protetivas, no contexto de violência doméstica. A defesa sustentou a ilegalidade da segregação, ausência dos requisitos legais, possibilidade de medidas cautelares diversas e violação ao princípio da homogeneidade. II. Questão em discussão: Há quatro questões em discussão: (i) avaliar se a decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva carece de fundamentação concreta; (ii) verificar se estão presentes os requisitos legais para a prisão preventiva; (iii) analisar a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão; e (iv) examinar se há violação ao princípio da homogeneidade. III. Razões de decidir: 1. A decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva está devidamente fundamentada na reiteração delitiva, gravidade concreta da conduta e risco real à integridade física e psíquica da vítima, atendendo aos requisitos dos arts. 312 e 313 do CPP. 2. A materialidade e os indícios de autoria estão demonstrados nos autos, caracterizando o fumus commissi delicti. O periculum libertatis decorre da reincidência do paciente, seu histórico de violência doméstica reiterada e a propensão à prática de novos crimes, justificando a segregação cautelar para garantia da ordem pública. 3. O Enunciado Orientativo n. 6, da TCCR/TJMT dispõe que o risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquérito policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência. 4. As medidas cautelares diversas se mostram inadequadas e ineficazes, dada a periculosidade do paciente e a gravidade concreta da conduta, sendo a prisão a única medida eficaz à preservação da ordem pública. 5. Não há falar em ausência de contemporaneidade, uma vez que a prisão preventiva foi decretada imediatamente após os fatos delituosos. 6. A prisão preventiva não viola o princípio da homogeneidade, por se tratar de medida cautelar fundada na proteção da vítima e na preservação da ordem pública, distinta da pena definitiva. 7. Não há violação ao princípio da homogeneidade, pois a prisão preventiva possui natureza cautelar, não se confundindo com pena definitiva. IV. Dispositivo e Tese: Ordem denegada. Tese de julgamento: “1. A presença de elementos concretos que evidenciem a gravidade do crime, a periculosidade do agente e o risco de reiteração delitiva justifica a prisão preventiva, sendo inadequadas medidas cautelares diversas. 2. A contemporaneidade da prisão preventiva relaciona-se aos requisitos da medida, e não à data do fato delituoso. 3. A prisão preventiva não viola o princípio da homogeneidade quando fundada na proteção da vítima e da ordem pública. Dispositivos relevantes citados: arts. 312, 313, 319 do CPP; art. 5º, LXI e LX, da CF/88; art. 147-B e art. 129, § 13, do CP; art. 24-A da Lei n. 11.340/2006; Resolução n. 492/2023 do CNJ; Lei n. 14.857/2024. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no RHC 130.571/MG, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, j. em 15/12/2020; STJ, RHC n. 92.825/MT, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. em 21/8/2018; STJ, RHC n. 41.826/BA, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, j. em 28/4/2015; TJMT, N.U 1009847-89.2024.8.11.0000, Rel. Des. Helio Nishiyama, Quarta Câmara Criminal, j. em 21/05/2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado pelo Dr. Carlos Naves de Resende em favor de FABRICIO NOGUEIRA DA SILVA, apontando como autoridade coatora o Juízo da 1ª Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Rondonópolis (MT) que, nos autos n. 1015762-76.2025.8.11.0003, decretou a prisão preventiva do paciente (Id. 294422899). Sustenta, o impetrante, em síntese, que a manutenção da prisão do paciente revela-se ilegal e desproporcional, porquanto desprovida dos requisitos legais autorizadores da medida extrema, bem como em razão da ausência de contemporaneidade dos fatos e da inexistência de descumprimento prévio de medidas protetivas, sendo inadequado o enquadramento da hipótese no art. 313, III, do Código de Processo Penal. Ressalta, ainda, que a denúncia ofertada pelo Ministério Público limita-se ao delito de ameaça, previsto no art. 147, § 1º, do Código Penal, o qual possui pena máxima inferior a quatro anos, inviabilizando também a prisão preventiva com base no inciso I do mesmo artigo. Destaca que o paciente é primário, possui residência fixa e trabalho lícito como zelador de piscina, bem como que não há indícios concretos de periculosidade, tampouco elementos objetivos que demonstrem risco à integridade da vítima, mormente porque já foram deferidas amplas medidas protetivas à ofendida nos autos próprios. Por fim, alega que as supostas ameaças imputadas não ultrapassam o temor subjetivo da vítima, não havendo comprovação da alegada vinculação do paciente com organização criminosa, sendo as menções à facção Comando Vermelho baseadas em meras suposições. Com tais argumentos requer a concessão da ordem liminar para que seja interrompido o constrangimento ilegal à liberdade do paciente, revogando-se de imediato a sua prisão preventiva e, subsidiariamente, sua substituição por medidas cautelares diversas, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal. Inicial acompanhada com documentos de Ids. 294422898, 294422899, 294432850, 294432852, 294432853, 294432854, 294432857 e 294432859. Liminar indeferida (Id. 294952358). As informações foram prestadas pelo Juízo de origem (Id. 295439876). Instada a se manifestar, a d. Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Procurador de Justiça Almir Tadeu de Arruda Guimarães, manifestou-se pela denegação da ordem (Id. 295985382). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos para sua constituição válida e regular e uma vez identificadas as condições da ação, o Habeas Corpus há de ser submetido a julgamento. No caso versando, infere-se dos autos que o paciente foi autuado em flagrante delito no dia 12 de junho de 2025, pela suposta prática dos delitos tipificados nos arts. 147-B e 148 do Código Penal, bem como no art. 24-A da Lei n. 11.340/2006, em desfavor de sua companheira L. L. C. D., sendo posteriormente convertida sua prisão em flagrante em prisão preventiva na audiência de custódia realizada em 13 de junho de 2025, com fundamento na necessidade de garantia da ordem pública, diante da gravidade concreta dos fatos, do contexto de violência doméstica e do risco à integridade física e psicológica da vítima, notadamente diante das reiteradas ameaças, da suposta vinculação do paciente a organização criminosa e do histórico conflituoso entre as partes. A magistrada de primeiro grau, ao converter a prisão em flagrante do paciente em preventiva, reconheceu a gravidade concreta dos fatos, diante da conduta reiterada e violenta do acusado, destacando que este já teria praticado outros episódios de violência física e psicológica ao longo dos anos de convivência conjugal com a vítima, conforme consta dos depoimentos colhidos e documentos acostados aos autos, os quais revelam um padrão de agressões verbais, ameaças de morte - inclusive com menções a suposto envolvimento com organização criminosa - e controle coercitivo da rotina da ofendida, tudo a evidenciar um quadro de violência doméstica persistente, que não se restringe ao episódio objeto da prisão em flagrante. A defesa sustenta, em síntese, que o decreto preventivo carece de fundamentação idônea, bem como que não estariam presentes os requisitos legais para a custódia cautelar, afirmando que medidas alternativas à prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, seriam suficientes e adequadas à tutela da ordem pública. Alega, ademais, a ausência de contemporaneidade das condutas pretéritas eventualmente imputadas ao paciente, bem como a suposta violação ao princípio da homogeneidade, porquanto a pena cominada ao delito denunciado (art. 147, §1º, do CP) seria de menor gravidade. Por fim, argumenta que inexistem elementos objetivos que justificam a adoção da medida extrema, especialmente diante de supostas contradições nos relatos da vítima, sustentando, inclusive, que ela teria declarado que os fatos narrados não corresponderiam à verdade, pleiteando, com isso, a revogação da prisão preventiva e a imediata soltura do paciente (Id. 294422897). Consta nos autos que a atuação da Polícia Judiciária Civil foi deflagrada após o acionamento pela vítima L. L. C. D., que relatou ter sido impedida de sair da residência pelo paciente, o qual teria tomado seu aparelho celular e feito ameaças, inclusive mencionando supostos vínculos com integrantes de organização criminosa. Tais fatos ensejaram a pronta intervenção policial e resultaram na lavratura do auto de prisão em flagrante, evidenciando a urgência e a gravidade da situação vivenciada, bem como a potencial ameaça à integridade da ofendida. Segundo consta dos autos, a vítima acionou a Polícia Militar relatando que havia sido ameaçada por seu companheiro após uma discussão motivada por sua intenção de se separar. Afirmou que o paciente não lhe permitiu sair da residência e subtraiu seu telefone celular, restituindo-lhe apenas quando os policiais chegaram ao local. Narrou, ainda, que o paciente teria mantido contato telefônico com pessoas supostamente pertencentes à facção criminosa Comando Vermelho e a ameaçou, dizendo que, se fosse preso, os integrantes da facção iriam procurá-la. No caso em apreço, a conversão da prisão em flagrante em preventiva do paciente foi fundamentada na reiteração delitiva, na gravidade concreta dos fatos e na necessidade de resguardar a integridade física e psicológica da vítima, nos seguintes termos: Nesse contexto, quando presentes os requisitos da prisão preventiva, não se pode deferir liberdade provisória. Entretanto, se ausentes, a liberdade é imperativa, havendo a possibilidade, ainda, de impor-se o cumprimento de medidas cautelares. No caso ora analisado, inobstante num primeiro momento haja indicativos de que não tenha ocorrido o delito de descumprimento de medidas protetivas de urgência, como destacou o Ministério Público, a questão será devidamente esclarecida em fase judicial, bem como há outros crimes imputados ao flagrado, conforme observa-se do auto de prisão em flagrante. Nesta fase inicial, há suficientemente provas da materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria em relação aos delitos imputados com as implicações da violência doméstica (Lei 11.340/2.006), notadamente, em razão do boletim de ocorrência, depoimentos das testemunhas e as declarações da vítima L. L. C. D. (...). Além disso, compulsando os autos verifica-se que imprescindível se faz a segregação cautelar do indiciado, vez que se solto, poderá voltar a atentar contra a integridade física, psicológica ou até mesmo contra a vida da vítima. Registro, ainda, que não se percebe, no primeiro momento, que o mesmo tenha condições de cumprir eventuais medidas cautelares previstas no ordenamento vigente. Os fatos narrados são graves, eis que o custodiado, conforme consta no caderno informativo, ameaça a vítima, dizendo que chamará membros de facção criminosa para matá-la e, na data de 11/06/20525, manteve a vítima em cárcere privado por não aceitar o fato de a mesma querer pôr um fim na relação. Ademais, os crimes ora imputados ao flagrado, juntos, possuem pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos, de modo que estão preenchidos os requisitos constantes no Artigo 313, I do Código de Processo Penal. Outrossim, a vítima solicitou medidas protetivas de urgência, motivo pelo qual presente também a hipótese autorizadora de prisão preventiva insculpida no inciso III do Artigo 313 do Código de Processo Penal. Assim, a decretação da prisão é totalmente pertinente para resguardar a integridade física e psicológica da ofendida, uma vez que ela não pode viver em constante temor. Discorrendo acerca do tema dispõe o Enunciado n. 29 do FONAVID (Fórum Nacional de Violência Doméstica): ENUNCIADO 29 – É possível a prisão cautelar do agressor independentemente de concessão ou descumprimento de medida protetiva, a fim de assegurar a integridade física e/ou psicológica da ofendida. (Aprovado no VI Fonavid-MS). O Artigo 20 da Lei n. 11.340/2006 prevê expressamente a legalidade da decretação da prisão preventiva quando se tratar de crime revestido com violência doméstica (...). Outrossim, dispõe Artigo 311 do Código de Processo Penal (por analogia), que em qualquer fase caberá a prisão preventiva (...). Assim, os fatos narrados no presente Auto de Prisão em Flagrante, exigem a imediata intervenção deste Juízo, com arrimo nas disposições constantes nos Artigos 312, § 1º, § 2º e 313, I, e III, do Código de Processo Penal (...). Assim sendo, não há outro caminho a ser seguido, senão o da decretação da custódia cautelar do flagrado, pelos motivos acima expostos, nos termos do judicioso parecer ministerial. ISTO POSTO, em consonância com o parecer ministerial retro, com fundamento nos Artigos 310, II, 312, § 1º, § 2º e 313, I, II e III, todos do Código de Processo Penal, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA de FABRÍCIO NOGUEIRA DA SILVA, (...). (Id. 294422899). É da jurisprudência pátria a possibilidade de se recolher alguém ao cárcere quando presentes os pressupostos autorizadores da medida extrema, previstos na legislação processual penal. No ordenamento jurídico vigente, a liberdade é a regra. A prisão antes do trânsito em julgado, cabível excepcionalmente e apenas quando concretamente comprovada a existência do periculum libertatis, deve vir sempre baseada em fundamentação concreta, não em meras conjecturas. Note-se que a prisão preventiva se trata propriamente de uma prisão provisória e dela se exige venha sempre fundamentada, uma vez que ninguém será preso senão por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente (CF, art. 5º, inciso LXI). Mormente porque a fundamentação das decisões do Poder Judiciário é condição absoluta de sua validade (CF, art. 93, inciso IX). Após detida análise dos autos, entendo que a decisão que converteu a prisão em flagrante do paciente em prisão preventiva foi devidamente fundamentada, amparada nos elementos concretos coligidos ao longo da investigação e em estrita conformidade com os requisitos previstos nos arts. 312 e 313, inciso III, do CPP. A autoridade judiciária singular expôs, de forma clara e objetiva, as razões pelas quais a liberdade do paciente representa risco concreto à integridade física e psicológica da vítima L. L. C. D., diante da gravidade dos fatos, do histórico de violência doméstica e do temor evidenciado nas declarações prestadas. Os indícios de autoria e de materialidade delitiva encontram-se suficientemente demonstrados pelos elementos informativos constantes nos autos, especialmente o Auto de Prisão em Flagrante, o Boletim de Ocorrência, o Termo de Representação Criminal, a Requisição de Perícia, as imagens anexadas e os depoimentos prestados pela vítima L. L. C. D. e pelos policiais militares que atenderam a ocorrência, revelando, assim, o fumus commissi delicti. No que toca ao periculum libertatis, há robusta e concreta demonstração da periculosidade do paciente. Embora tecnicamente não conste condenação penal transitada em julgado que configure reincidência nos termos estritos do art. 63 do Código Penal, o histórico de envolvimento anterior com a mesma vítima - L. L. C. D. - em episódios similares de violência doméstica, conforme revelado nos autos n. 1039906-85.2023.8.11.0003, n. 1035520-12.2023.8.11.0003 (medida protetiva) e n. 1015449-18.2025.8.11.0003 (medida protetiva), demonstra um padrão reiterado de conduta agressiva e ameaçadora. Esse modus operandi de reincidência fática em comportamentos coercitivos e violentos projeta um risco concreto e continuado à ordem pública, justificando a manutenção da custódia cautelar como forma de contenção e prevenção de novos episódios. A periculosidade social do paciente se infere não apenas da gravidade dos fatos narrados, mas da escalada de agressões verbais, ameaças e condutas intimidatórias no contexto de violência doméstica, especialmente porque a vítima demonstra temor fundado pela própria vida e integridade. Tais circunstâncias demonstram risco concreto de reiteração delitiva e de intimidação da vítima. Aliado a isso, tem-se o registro constante nas declarações prestadas por L. L. C. D. em sede policial, nas quais afirmou que mantinha uma relação conjugal extremamente conturbada com o paciente, marcada por sucessivos episódios de violência de natureza psicológica, ameaças reiteradas e controle coercitivo de sua liberdade. Segundo seu relato, era comum que as discussões se acirrassem em razão de ciúmes e comportamentos agressivos do companheiro, sendo habitual que ele proferisse ameaças de morte, inclusive mencionando o envolvimento com membros da facção Comando Vermelho, como forma de intimidá-la. A vítima mencionou, ainda, que em data pretérita havia solicitado medidas protetivas de urgência - posteriormente revogadas -, mas que a convivência foi retomada no final do mesmo ano, voltando a experimentar o ciclo de violência. Em uma das ocasiões narradas, disse ter sido impedida de sair da residência, além de ter seu telefone celular retido pelo paciente, tudo em meio a um ambiente de tensão e medo, que culminou na intervenção policial. Embora não tenha mencionado agressões físicas recentes, o teor de seu depoimento indica um contexto contínuo de violência psicológica e ameaça à sua integridade e liberdade, potencializado pela presença de filhos menores no lar. Tais circunstâncias evidenciam não apenas a materialidade da infração narrada, mas também a gravidade do padrão de violência instaurado no ambiente doméstico, caracterizado pela reiteração de condutas intimidatórias, ameaçadoras e controladoras por parte do paciente, em detrimento da integridade psíquica e da liberdade pessoal da vítima. A prisão preventiva do paciente revela-se devidamente fundamentada, estando alicerçada em elementos concretos extraídos dos autos que evidenciam, de forma clara e objetiva, o risco real de reiteração delitiva. O histórico de violência doméstica e familiar, reiteradamente praticado ao longo da convivência com a vítima, denota padrão de conduta agressiva e controlador, que justifica, com robustez, a necessidade da custódia cautelar para a salvaguarda da integridade física e psicológica da ofendida e de seus filhos. Importante frisar que, embora o impetrante sustente a inexistência de elementos nos autos que comprovem risco à ordem pública ou à segurança da vítima, os elementos coligidos no procedimento demonstram que o delito de ameaça imputado ao paciente foi praticado em contexto de violência doméstica reiterada, inserido em um histórico de conflitos conjugais marcados por intimidação psicológica, controle coercitivo e ameaças de morte, denotando um ciclo de violência contínua e grave risco à integridade física e psíquica da companheira e dos filhos menores, o que justifica plenamente a medida extrema imposta pelo juízo de origem. Nesse contexto, fica evidente a possível reiteração delitiva, tornando-se necessária a aplicação do Enunciado Orientativo n. 6, da TCCR/TJMT: O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquérito policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência. Nessa esteira de pensar, este Tribunal entendeu: Tese de julgamento: “A presença de elementos concretos que evidenciem a gravidade do crime, a periculosidade do agente e o risco de reiteração delitiva justifica a prisão preventiva, sendo inadequadas medidas cautelares diversas, ainda que o acusado possua condições pessoais favoráveis”. (...) (N.U 1007274-44.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 03/04/2025). Tese de julgamento: “É legítima a decretação da prisão preventiva de paciente acusado dos crimes de lesão corporal e ameaça ambos perpetrados contra a mulher em razão da condição do sexo feminino, em contexto de violência doméstica e/ou familiar, quando considerada a gravidade concreta da conduta perpetrada e o fundado receio de reiteração delitiva, com vistas ao resguardo da ordem pública, na qual se inclui a salvaguarda da integridade física e psicológica da ofendida”. (...) (N.U 1000814-41.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 10/03/2025). Importante frisar que, embora o impetrante alegue a inexistência de elementos nos autos que comprovem o risco a ordem pública ou a segurança da vítima, é necessário ressaltar que, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a palavra da vítima constitui fundamento idôneo para a imposição das medidas, conforme demonstrado: O risco à integridade física da vítima e o temor apresentado nas declarações, constituem fundamentos idôneos para imposição de medida protetiva, as quais possuem natureza cautelar, ou seja, destinada aos casos de urgência, de forma preventiva e provisória (STJ, RHC n. 41.826/BA;STJ RHC n. 92.825/MT). Nesta senda, entendo pela necessidade da manutenção da prisão preventiva não apenas em razão do cumprimento dos requisitos do art. 312, mas também do inciso III, do art. 313, ambos do Código de Processo Penal, haja vista a relação conjugal entre a vítima e o paciente. Conforme disposto no art. 313, III, do CPP: Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: (...). III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (grifos meus). A propósito: Não há constrangimento ilegal na decisão que decretou a prisão preventiva do paciente. A medida foi fundamentada em elementos concretos dos autos e respaldada pelo artigo 313, inciso III, do CPP. A segregação cautelar foi determinada visando resguardar principalmente a integridade física e psicológica da vítima. 03. O regime de pena a ser aplicado no caso de condenação transitada em julgado, por si só, não desautoriza o decreto preventivo, na medida em que a prisão pena e a prisão cautelar possuem objetividades distintas, valendo destacar que a segregação imposta ao paciente é de natureza cautelar e visa garantir a ordem pública. 04. Fundamentada a necessidade da prisão preventiva para garantir a ordem pública, revela-se incabível sua substituição por medidas mais brandas. 05. Ordem denegada. (N.U 1009847-89.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, HELIO NISHIYAMA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 21/05/2024, publicado no DJE 24/05/2024). Ademais, registre-se que as condições pessoais favoráveis alegadas não são suficientes para afastar a prisão cautelar, quando presentes os requisitos legais para a decretação da prisão preventiva, conforme previsto no art. 313, inciso III, do Código de Processo Penal. Destaca-se, ainda, o disposto no Enunciado Orientativo n. 43, da Turma de Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, segundo o qual as condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis. A alegação defensiva de ausência de contemporaneidade dos fatos não encontra respaldo nos autos. Os eventos que ensejaram a prisão preventiva ocorreram nos dias 11 e 12 de junho de 2025, sendo, portanto, recentes e plenamente contemporâneos à medida cautelar imposta. O relato da vítima L. L. C. D., corroborado por outros elementos probatórios, demonstra um episódio atual de grave ameaça, com destaque para a retenção de seu aparelho celular, impedimento de locomoção e menções a represálias por parte de membros de facção criminosa, fatos estes que justificaram a intervenção imediata do Estado. No que concerne ao princípio da homogeneidade trazido pelo impetrante, tem-se o entendimento de que a desproporcionalidade da prisão em cotejo à futura pena a ser aplicada ao paciente é um prognóstico que somente será confirmado após a conclusão do julgamento da ação penal, não sendo possível inferir, neste momento processual e na estreita via ora adotada, o eventual regime prisional a ser fixado em caso de condenação (e consequente violação do princípio da homogeneidade) (STJ, AgRg no RHC 130.571/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2020, DJe 17/12/2020). Dessa forma, inexistente ofensa ao princípio da homogeneidade, uma vez que a prisão preventiva é de natureza cautelar e não se confunde com eventual cumprimento de pena definitiva. O caráter provisório e cautelar da medida resguarda a aplicação da lei penal e a preservação da ordem pública, independentemente do regime a ser fixado em eventual condenação. No tocante à alegada inexistência de descumprimento prévio de medidas protetivas, cumpre esclarecer que, embora tenha havido anteriormente deferimento de tais medidas em favor da vítima, estas foram posteriormente revogadas diante da reconciliação do casal. No entanto, isso não inviabiliza a decretação da prisão preventiva, pois o art. 313, inciso III, do CPP não condiciona a medida extrema à prévia violação da cautelar. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, havendo risco atual à integridade da vítima e indícios suficientes de que a liberdade do agente representa ameaça concreta, a prisão preventiva pode ser decretada como instrumento de proteção eficaz. De outro giro, a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas também não se mostra conveniente na hipótese dos autos (art. 282, I e II e § 6º do CPP), já que o fundamento adotado pelo Juízo singular foi justamente a garantia da ordem pública e assegurar a integridade física da vítima, sendo a manutenção da segregação cautelar do paciente, por ora, justificada pela decisão hostilizada, em especial quando evidenciado nos autos o risco à integridade física e psicológica da vítima, acaso concedida sua liberdade neste momento processual. Ressalta-se, ainda, que alicerçado no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero conforme Portaria CNJ n. 27, de 2 de fevereiro de 2021, em que se firmou posicionamento de aumentar o espectro de proteção da mulher vítima em situação de violência doméstica e familiar, esta relatoria tem por praxe verificar, em cada caso concreto, eventuais necessidades específicas a serem adotadas em favor das vítimas vulneráveis, sendo tal diretriz jurisprudencial reforçada pela Resolução n. 492/2023 do CNJ, no sentido de se adotar a Perspectiva de Gênero nos julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário com o objetivo de se prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher. Vejamos: Faz parte do julgamento com perspectiva de gênero a alta valoração das declarações da mulher vítima de violência de gênero, não se cogitando de desequilíbrio processual. O peso probatório diferenciado se legitima pela vulnerabilidade e hipossuficiência da ofendida na relação jurídica processual, qualificando-se a atividade jurisdicional, desenvolvida nesses moldes, como imparcial e de acordo com o aspecto material do princípio da igualdade (art. 5º, inciso I, da Constituição Federal) (...) (Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. CNJ - Conselho Nacional de Justiça. 02.02.2021. Brasília-DF. Disponível em: ). Ressalto, ainda, que o nome da vítima foi abreviado para constar apenas as iniciais de seu nome, como forma de proteção à sua privacidade e intimidade, nos termos da Lei n. 14.857, de 21 de mai. de 2024. Com efeito, fiel à jurisprudência deste Sodalício, concluo pela manutenção da segregação cautelar do paciente. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, DENEGO A ORDEM impetrada em favor de Fabricio Nogueira da Silva, mantendo a decisão de primeiro grau por estes e seus próprios fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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