Processo nº 0812344-42.2025.8.14.0000
ID: 321251084
Tribunal: TJPA
Órgão: 1ª Turma de Direito Público - Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 0812344-42.2025.8.14.0000
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANDRE LUIZ MONTEIRO DE OLIVEIRA
OAB/PA XXXXXX
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PROCESSO Nº 0812344-42.2025.8.14.0000 1ª TURMA DE DIREITO PÚBICO AGRAVO DE INSTRUMENTO AGRAVANTE: DIAMANTINO & CIA LTDA AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ RELATORA: DESA. CÉLIA REGINA DE …
PROCESSO Nº 0812344-42.2025.8.14.0000 1ª TURMA DE DIREITO PÚBICO AGRAVO DE INSTRUMENTO AGRAVANTE: DIAMANTINO & CIA LTDA AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ RELATORA: DESA. CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por DIAMANTINO & CIA LTDA em face de decisão prolatada pelo Juízo da 3ª Vara de Infância e Juventude da Comarca de Belém que, nos autos da Ação Civil Pública nº 0824037-90.2025.8.14.0301, concede o pedido liminar e determina ao réu a obrigação de fazer. Em suas razões, a agravante suscita, em síntese, os seguintes pontos: a) a incompetência da Justiça Comum; b) a ilegitimidade do Ministério Público c) a ausência de interesse processual, pois o Ministério Público não apontou, na petição inicial, quais adolescentes teriam sido preteridos ou que estivessem aguardando vaga de aprendizagem junto à Agravante, nem sequer demonstrou a existência de solicitação formalizada pela FASEPA, FUNPAPA ou por entidade formadora que tenha sido recusada de cumprimento; c) a inexistência de obrigação legal específica de destinar vagas exclusivamente a socioeducandos; d) o cumprimento da cota geral de aprendizes pela agravante; e) o artigo 53 do Decreto nº 9.579/2018 elenca 8 (oito) opções diferentes relativas à priorização de contratação que se dá de acordo com o critério de conveniência e oportunidade do empregador; f) as obrigações impostas às empresas devem resultar de lei formal, em atenção ao princípio da livre iniciativa e da livre contratação dentro dos limites legais; g) a impossibilidade jurídico-legal de se impor obrigação de fazer nova sem amparo em lei formal e sem instrumento de cooperação válido; h) a ausência dos requisitos legais para concessão da tutela antecipada; i) a imposição de multa em valor excessivo em relação à obrigação imposta inviabiliza o cumprimento voluntário e gera insegurança jurídica, pois inverte a lógica de incentivo ao adimplemento espontâneo, transformando a sanção em um instrumento de intimidação ilegítima. Requer, liminarmente, a concessão de efeito suspensivo sustando a decisão até o julgamento do recurso; preliminarmente, seja reconhecida a incompetência absoluta com extinção do feito, ou remessa à Justiça do Trabalho; alternativamente, seja extinta a ação por ilegitimidade ativa ou falta de interesse processual. No mérito, o provimento do recurso para reformar a decisão agravada, reconhecendo que a Agravante já cumpre o percentual fixado pela legislação; seja afastado o percentual de 20% (vinte por cento) e a imposição de qualquer multa; subsidiariamente, seja reduzido o valor fixado à título de multa diária. Junta documentos. Coube-me a relatoria do feito. RELATADO. DECIDO. Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade. Cuida-se, na origem, de ação civil pública em que o Ministério Público anuncia a omissão da empresa em assegurar aos adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa vagas que lhes são destinadas por lei (CLT e nos Decretos Federal por força do disposto nos arts. 90; 112; 119; 120, §1º; 124, XI e 208, incisos VIII e X e § 1º, da Lei nº 8.069/90; Decreto Federal nº 9.579/2018, art. 53, § 2º, I). Requer a antecipação liminar dos efeitos da tutela para o fim de que: a) seja determinado à ré a obrigação de: a) apresentação, em Juízo, no prazo de 30 (trinta) dias, do Termo de Cooperação Técnica, assinado com a FASEPA e a FUNPAPA, para a oferta de vagas de aprendizagem profissional, consistente em 20% (vinte por cento) do total a que a empresa é obrigado a ofertar por lei; b) a apresentação, em 60 (sessenta) dias, a esse Juízo, da relação dos socioeducandos atendidos pelo programa e que já estejam trabalhando; c) que, até o quinto dia do mês subsequente, seja apresentada relação periódica dos socioeducandos atendidos. Deferido o pedido de tutela de urgência nos seguintes termos dispositivos: “II- DISPOSITIVO ANTE O EXPOSTO, CONCEDO PARCIALMENTE O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, EM SEDE DE LIMINAR, NOS TERMOS DO ART. 300 E SEGUINTES DO NCPC, PARA DETERMINAR À REQUERIDA DIAMANTINO & CIA LTDA A OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSISTENTE: A.1) A.1) NA APRESENTAÇÃO, EM JUÍZO, NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS, DO TERMO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA, ASSINADO COM A FASEPA E FUNPAPA, PARA A OFERTA DE VAGAS DE APRENDIZAGEM PROFISSIONAL, CONSISTENTE EM 20% (VINTE POR CENTO) DO TOTAL A QUE A EMPRESA É OBRIGADO A OFERTAR POR LEI; A.2) QUE A DIAMANTINO & CIA LTDA APRESENTE, EM 60 (SESSENTA) DIAS, A ESSE JUÍZO, A RELAÇÃO DOS SOCIOEDUCANDOS ATENDIDOS PELO PROGRAMA E QUE JÁ ESTEJAM TRABALHANDO; A.3) QUE ATÉ O QUINTO DIA DO MÊS SUBSEQUENTE SEJA APRESENTADA RELAÇÃO PERIÓDICA DOS SOCIOEDUCANDOS ATENDIDOS; ... NO CASO DE DESCUMPRIMENTO DA REFERIDA DETERMINAÇÃO, FIXO A MULTA DE R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS), POR DIAS DE ATRASO EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DO MANDAMENTO À REQUERIDA, NO LIMITE DE 30 (TRINTA) DIAS. DETERMINO QUE SEJAM OS AUTOS INCLUÍDOS NA PAUTA DE AUDIÊNCIA DESTA VARA, NOS TERMOS DETERMINADOS NO ART. 334 DO CPC, PARA A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO.” Inconformada, a empresa requerida interpôs o presente agravo de instrumento, arguindo, em síntese: a) a incompetência da Justiça Comum; b) a ilegitimidade do Ministério Público c) a ausência de interesse processual, pois o Ministério Público não apontou, na petição inicial, quais adolescentes teriam sido preteridos ou que estivessem aguardando vaga de aprendizagem junto à Agravante, nem sequer demonstrou a existência de solicitação formalizada pela FASEPA, FUNPAPA ou por entidade formadora que tenha sido recusada de cumprimento; c) a inexistência de obrigação legal específica de destinar vagas exclusivamente a socioeducandos; d) o cumprimento da cota geral de aprendizes pela agravante; e) o artigo 53 do Decreto nº 9.579/2018 elenca 8 (oito) opções diferentes relativas à priorização de contratação que se dá de acordo com o critério de conveniência e oportunidade do empregador; f) as obrigações impostas às empresas devem resultar de lei formal, em atenção ao princípio da livre iniciativa e da livre contratação dentro dos limites legais; g) a impossibilidade jurídico-legal de se impor obrigação de fazer nova sem amparo em lei formal e sem instrumento de cooperação válido; h) a ausência dos requisitos legais para concessão da tutela antecipada; i) a imposição de multa em valor excessivo em relação à obrigação imposta inviabiliza o cumprimento voluntário e gera insegurança jurídica, pois inverte a lógica de incentivo ao adimplemento espontâneo, transformando a sanção em um instrumento de intimidação ilegítima. Da competência da Justiça Estadual A agravante suscita preliminar de incompetência absoluta da Justiça Estadual Cível da Infância e Juventude, porquanto tratar-se de matéria de natureza trabalhista e afeta à competência da Justiça do Trabalho conforme imposição do art. 114, I e IX, da Constituição Federal. Verifica-se que a demanda de origem versa sobre a obrigatoriedade da contratação de socioeducandos dentre os aprendizes, como política destinada a garantir o direito fundamental à profissionalização. Sobre a matéria, o art. 429, caput, e § 2º, da CLT, assim dispõem: "Art. 429. Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. (Redação dada pela Lei nº 10.097, de 2000) (...) § 2º Os estabelecimentos de que trata o caput ofertarão vagas de aprendizes a adolescentes usuários do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) nas condições a serem dispostas em instrumentos de cooperação celebrados entre os estabelecimentos e os gestores dos Sistemas de Atendimento Socioeducativo locais. (Incluído pela Lei nº 12.594, de 2012)". O § 2º acima transcrito foi inserido na CLT pela Lei nº. 12.594/2012, que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) e regulamenta a execução das medidas destinadas a adolescente que pratique ato infracional. O objetivo dessa alteração legislativa consiste em promover a efetivação de direitos fundamentais de adolescentes em situação de risco, notadamente a qualificação para o trabalho e a profissionalização, expressamente previstas nos arts. 53 e 69 da Lei nº. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA): "Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: (...) Capítulo V Do Direito à Profissionalização e à Proteção no Trabalho (...) Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização e à proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros: I - respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento; II - capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho". No que se refere à competência para as ações que versam sobre a matéria em questão, os arts. 208 e 209 do ECA estabelecem o seguinte: "Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais, Difusos e Coletivos Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular: ... VIII - de escolarização e profissionalização dos adolescentes privados de liberdade. ... Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores". A partir da leitura das disposições acima, constata-se que o Juízo da Infância e Juventude possui competência absoluta para processar e julgar as ações destinadas a garantir a socioeducandos o direito fundamental à profissionalização, por meio de acesso a programas previstos em lei. Nesse comando, se enquadra a demanda de origem, pois não questiona o cumprimento da cota de aprendizes em geral, mas sim a ausência de socioeducandos dentre os aprendizes contratados, o que caracterizaria indevida discriminação e afronta aos direitos fundamentais de profissionalização e qualificação para o trabalho. Destaca-se, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado no sentido de que as causas que visem a resguardar o direito de inserção de adolescentes em contrato de aprendizagem têm conteúdo nitidamente civil, inexistindo debate sobre qualquer controvérsia decorrente de relação de trabalho, até porque a relação de trabalho somente será instaurada após a autorização judicial pretendida, de forma que, nesses casos, a competência é da Justiça Estadual Cível da Infância e Juventude. Nesse sentido: “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL E DO TRABALHO. ALVARÁ JUDICIAL. AUTORIZAÇÃO PARA TRABALHO DE MENOR DE IDADE. 1. O pedido de alvará para autorização de trabalho a menor de idade é de conteúdo nitidamente civil e se enquadra no procedimento de jurisdição voluntária, inexistindo debate sobre qualquer controvérsia decorrente de relação de trabalho, até porque a relação de trabalho somente será instaurada após a autorização judicial pretendida. 2. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito, suscitado. (CC 98.033/MG, Rel. Min. CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJ 24.11.2008)” Resta evidenciada, portanto, a competência do Juízo da Infância e Juventude para processar e a demanda que trata da obrigação legal de contratação de socioeducandos dentre os aprendizes. Da ilegitimidade ativa No caso dos autos, o Representante do Ministério Público Estadual ajuizou ação civil pública, objetivando o cumprimento de obrigações relacionadas à oferta de vagas de aprendizagem profissional a socioeducandos. É certa a legitimidade do Ministério Público para propor ação, medida judicial ou extrajudicial, que vise a assegurar o efetivo respeito aos direitos e garantias legais das crianças e adolescentes, nos termos do art.201, VIII do ECA, que estabelece: "Art. 201. Compete ao Ministério Público: ... VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis; " Nesse compasso, não sendo observada pela empresa a legislação que determina a contratação de menor aprendiz, dentre eles, aqueles que estão cumprindo medidas socioeducativas ou que sejam egressos de instituições de privação de liberdade, possui, o órgão ministerial, legitimidade para assegurar o devido cumprimento da norma. Destaco o entendimento desta Corte sobre a competência da Justiça Estadual e a legitimidade do MP, na espécie: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APRENDIZAGEM PROFISSIONAL. OBRIGATORIEDADE DE CONTRATAÇÃO DE SOCIOEDUCANDOS. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA ESTADUAL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão interlocutória que deferiu parcialmente a tutela de urgência, determinando à empresa PFM Comercial LTDA a apresentação de termo de cooperação técnica com a FASEPA e a FUNPAPA e a oferta de 20% das vagas de aprendizagem profissional a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) a competência da Justiça Estadual para processar e julgar a demanda, diante da alegação de que a matéria envolveria relação de trabalho, atraindo a competência da Justiça do Trabalho; (ii) a legitimidade ativa do Ministério Público para ajuizar ação civil pública com o objetivo de garantir a oferta de vagas a socioeducandos. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Justiça Estadual, por meio da Vara da Infância e Juventude, detém competência absoluta para processar e julgar ações relativas a direitos transindividuais de adolescentes, nos termos dos arts. 208 e 209 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedentes do STJ. 4. O Ministério Público possui legitimidade ativa para propor ação civil pública visando assegurar o respeito aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, conforme previsto no art. 201, VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 5. A decisão agravada encontra amparo no art. 429, § 2º, da CLT, que impõe a reserva de vagas para aprendizes oriundos do sistema socioeducativo, bem como nos Decretos nº 9.579/2018 (federal) e nº 314/2019 (estadual), que regulamentam a inclusão desses jovens no mercado de trabalho. 6. A imposição de percentual específico de 20% dentro da cota obrigatória de aprendizes atende aos limites da legislação vigente e às diretrizes de reintegração social dos adolescentes, não havendo ilegalidade na decisão recorrida. 7. Embargos de Declaração rejeitados, tendo em vista que a decisão interlocutória anteriormente proferida havia se manifestado de maneira clara quanto ao pedido de indicação de quantitativo. In verbis: “No que diz respeito ao pedido de que a obrigação de contratação de aprendizes indicada na liminar seja exigível somente quando o percentual resultar em um número inteiro sob a quantidade de aprendizes que a empresa é obrigada a dispor, entendo que tal pleito deve ser analisado pelo Juízo de origem, sob pena de supressão de instância.” 8. Ausência de demonstração de qualquer vício que justifique a revogação da tutela de urgência deferida. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Agravo de Instrumento conhecido e desprovido. (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0809139-39.2024.8.14.0000 – Relator(a): EZILDA PASTANA MUTRAN – 1ª Turma de Direito Público – Julgado em 17/03/2025 )” “EMENTA: AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA ESTADUAL DA INFÂNCIA E JUVENTUDE. COMPETÊNCIA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. COTA DE APRENDIZES PARA SOCIOEDUCANDOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.Agravo Interno interposto por JURUNENSE HOME CENTER LTDA contra decisão monocrática que negou provimento a Agravo de Instrumento manejado contra decisão interlocutória, a qual deferiu tutela provisória em favor do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA). 2.O agravante suscita, em preliminar, incompetência da Justiça Comum para julgar a demanda, sob o argumento de que a matéria envolve relação trabalhista, atraindo a competência da Justiça do Trabalho, conforme art. 114 da CF/88. Sustenta ainda a ilegitimidade ativa do MPPA, alegando que a ação deveria ter sido proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). 3.No mérito, alega que não há previsão legal que obrigue a destinação de percentual específico de aprendizes para socioeducandos, afirmando que o art. 429 da CLT apenas estabelece uma cota geral para aprendizes. Argumenta que a decisão recorrida inovou ao fixar percentual de 20%, contrariando o princípio da legalidade. 4.Requer o provimento do recurso para reformar a decisão monocrática e afastar a obrigação imposta. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 5.Há duas questões em discussão: (i) definir se a Justiça Estadual da Infância e Juventude detém competência para processar e julgar a demanda; (ii) estabelecer se o Ministério Público Estadual possui legitimidade ativa para propor a ação civil pública relativa à contratação de socioeducandos como aprendizes. III. RAZÕES DE DECIDIR 6.A Justiça Estadual da Infância e Juventude é competente para processar e julgar ações que buscam a efetivação do direito fundamental ao trabalho e profissionalização de adolescentes socioeducandos, pois a demanda não trata de relação de trabalho já constituída, mas da inclusão em programas de aprendizagem. 7.O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que ações que envolvem inserção de adolescentes em contrato de aprendizagem possuem natureza civil, sendo a competência da Justiça Estadual, e não da Justiça do Trabalho. 8.O Ministério Público Estadual tem legitimidade ativa para ajuizar ação visando a proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, nos termos do art. 201, VIII, do ECA. A tese de que a legitimidade seria exclusiva do Ministério Público do Trabalho não se sustenta. 9.O art. 429, § 2º, da CLT prevê expressamente a obrigatoriedade da destinação de vagas de aprendizes a adolescentes do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), sendo compatível com a determinação judicial de cumprimento dessa obrigação. 10.A fixação do percentual de 20% das vagas de aprendizagem para socioeducandos não viola o princípio da legalidade, pois a decisão judicial apenas especifica uma quota dentro do limite geral obrigatório de 5% a 15%, previsto na legislação trabalhista e regulamentado por normativas federais e estaduais. 11.A decisão agravada está em conformidade com precedentes do TJPA, que reconhecem a obrigação das empresas em garantir a inclusão de socioeducandos em programas de aprendizagem, bem como a competência da Justiça Estadual para o processamento dessas ações. 12.O agravante não apresenta fatos novos ou argumentos jurídicos que justifiquem a reforma da decisão recorrida. IV. DISPOSITIVO E TESE 13.Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1.A Justiça Estadual da Infância e Juventude detém competência para processar e julgar ações que visam à efetivação do direito fundamental ao trabalho e profissionalização de adolescentes socioeducandos, pois a controvérsia não envolve relação de trabalho já constituída. 2.O Ministério Público Estadual possui legitimidade ativa para propor ação civil pública que busca assegurar o cumprimento da cota de aprendizes prevista no art. 429, § 2º, da CLT, em favor de adolescentes socioeducandos. 3.A fixação de percentual específico dentro da cota geral obrigatória de aprendizes não viola o princípio da legalidade, desde que observados os limites estabelecidos na legislação trabalhista. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 114; ECA, art. 201, VIII; CLT, art. 429, § 2º; Decreto Federal nº 9.579/2018, arts. 51 e 66; Decreto Estadual nº 314/2019. Jurisprudência relevante citada: STJ, CC 98.033/MG, Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJ 24.11.2008. TJPA, AI nº 0805940-43.2023.8.14.0000, Rel. Des. Célia Regina de Lima Pinheiro, 1ª Turma de Direito Público, j. 20.11.2023. TJPA, AI nº 0803823-79.2023.8.14.0000, Rel. Des. Maria Elvina Gemaque Taveira, 1ª Turma de Direito Público, j. 22.04.2024. ACÓRDÃO (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0807645-42.2024.8.14.0000 – Relator(a): LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO – 2ª Turma de Direito Público – Julgado em 10/03/2025 ) Do interesse processual Sobre o interesse processual, o agravante alega que o Ministério Público não apontou, na petição inicial, quais adolescentes teriam sido preteridos ou que estivessem aguardando vaga de aprendizagem junto à Agravante, nem sequer demonstrou a existência de solicitação formalizada pela FASEPA, FUNPAPA ou por entidade formadora que tenha sido recusada de cumprimento. Conforme a teoria da asserção, consagrada pela doutrina processualista e adotada pelo CPC, o interesse de agir constitui condição para o exame de mérito, revelando-se na utilidade e necessidade do provimento judicial perseguido. No caso em análise, o binômio necessidade/utilidade do presente processo é notório, haja vista a pretensão do Autor ser legalmente viabilizada e, considerando a incontroversa realidade da empresa que não emprega aprendizes socioeducandos. Diante do exposto, não há fundamento para acolher as preliminares suscitadas pela Agravante. Mérito Ressalto que, no presente recurso, não cabe análise do mérito da ação, mas somente a respeito dos pressupostos da tutela de urgência, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, os quais, entendo favorecerem a parte agravada. Explico. O art. 429 da CLT disciplina a obrigação dos empregadores observarem a quota geral para contratação de aprendizes, entre 5% e 15% do “total dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional”, indicando que as condições para contratação de jovens egressos do sistema socioeducativo ou em cumprimento de medida socioeducativa devem estar dispostos em instrumentos de cooperação técnica, verbis: “Art. 429. Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. (...) § 2º Os estabelecimentos de que trata o caput ofertarão vagas de aprendizes a adolescentes usuários do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) nas condições a serem dispostas em instrumentos de cooperação celebrados entre os estabelecimentos e os gestores dos Sistemas de Atendimento Socioeducativo locais.” O Decreto Federal nº 9.579/2018, que regulamenta a matéria, assim dispõe: “Art. 51. Estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos oferecidos pelos serviços nacionais de aprendizagem o número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento cujas funções demandem formação profissional. Art. 66. (...) § 5º A seleção dos aprendizes será realizada a partir do cadastro público de emprego, disponível no sítio eletrônico Emprega Brasil, do Ministério do Trabalho, e deverá priorizar a inclusão de jovens e adolescentes em situação de vulnerabilidade ou risco social, tais como: I - adolescentes egressos do sistema socioeducativo ou em cumprimento de medidas socioeducativas; II - jovens em cumprimento de pena no sistema prisional; III - jovens e adolescentes cujas famílias sejam beneficiárias de programas de transferência de renda; IV - jovens e adolescentes em situação de acolhimento institucional; V - jovens e adolescentes egressos do trabalho infantil; VI - jovens e adolescentes com deficiência; VII - jovens e adolescentes matriculados em instituição de ensino da rede pública, em nível fundamental, médio regular ou médio técnico, incluída a modalidade de Educação de Jovens e Adultos; e VIII - jovens desempregados e com ensino fundamental ou médio concluído em instituição de ensino da rede pública. § 6º Os percentuais a serem cumpridos na forma alternativa e no sistema regular deverão constar do termo de compromisso firmado com o Ministério do Trabalho, com vistas ao adimplemento integral da cota de aprendizagem, observados, em todos as hipóteses, os limites previstos na Seção IV do Capítulo IV do Título III da CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943, e a contratação do percentual mínimo no sistema regular.” Por sua vez, o Decreto Estadual nº 314/2019, que Institui a Política “Primeiro Ofício”, destinada à formação social e profissional da juventude no Estado do Pará, estabelece: “Art. 1º Fica instituída a Política “Primeiro Ofício”, que tem como fim proporcionar aos jovens aprendizes de 14 a 24 anos, residentes no Estado do Pará, a oportunidade de experiência profissional no mercado de trabalho, preparando-os para o exercício da cidadania. A Política tem como público-alvo os jovens, de 14 a 24 anos de idade, em situação de risco social, atendendo prioritariamente aos que se enquadrem nas seguintes condições: I - que estejam em situação de risco social, especialmente os inscritos no cadastro único; II - moradores de regiões e bairros que apresentem maiores índices de violência; III - que estejam em cumprimento de medidas socioeducativas; IV - egressos das instituições de privação de liberdade; V - que estejam em situação de privação de liberdade, considerando se a especificidade de sua condição; VI - pertencentes a famílias de baixa renda; VII - pessoas com deficiência; VIII - matriculados regularmente na rede pública de ensino fundamental, médio ou superior, assim como jovens participantes de programas de bolsa de estudo financiados por recursos públicos vinculados e rede privada de ensino; IX - que concluíram o ensino médio e que não estejam cursando o nível superior; e X - que concluíram o ensino superior e que ainda estejam em idade de participar do Programa na condição de trainee.” A inicial da ação de origem reporta que o Ministério Público elaborou a Recomendação nº 053/2024– MP/8ª PJIJ, que foi encaminhada à empresa ora agravante, bem como realizada reunião com a empresa e a FUNPAPA, porém a agravante informou já cumprir a cota de aprendizagem e não possuir interesse em acatar a recomendação para ofertar novas vagas. Em que pese a informação da agravante de que sua cota de aprendizes está completamente preenchida, restou demonstrada a existência de socioeducandos dentre os seus contratados nessa condição, sendo que a exigência legal nesse sentido existe desde o ano de 2012, quando foi inserido o citado § 2º no art. 429 da CLT. Destaca-se que, antes de ajuizar a demanda, o Ministério Público emitiu recomendação expressa à agravante, com objetivo de promover o cumprimento do art. 429, § 2º, da CLT, porém, não atendida. A prática da empresa, entretanto, não alcança a destinação de vagas aos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, para o que é preciso acordo celebrado com órgãos públicos integrantes do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, conforme estabelecido no art. 429, §2º da CLT, em específico com a FASEPA e com a FUNPAPA. Assim, caracterizada a omissão da empresa quanto ao cumprimento da norma supramencionada com negativa de formalizar instrumento de cooperação, pelo que viável a imposição da obrigação de fazer nesse sentido; não havendo se falar em ausência de obrigatoriedade da observância dos ditames legais. Sobre a necessidade de implementação de medidas para concretização da norma que prevê a contratação de menores aprendizes nas circunstâncias dos autos, colaciono julgados deste Tribunal de Justiça: “EMENTA: AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA ESTADUAL DA INFÂNCIA E JUVENTUDE. COMPETÊNCIA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. COTA DE APRENDIZES PARA SOCIOEDUCANDOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.Agravo Interno interposto por JURUNENSE HOME CENTER LTDA contra decisão monocrática que negou provimento a Agravo de Instrumento manejado contra decisão interlocutória, a qual deferiu tutela provisória em favor do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA). 2.O agravante suscita, em preliminar, incompetência da Justiça Comum para julgar a demanda, sob o argumento de que a matéria envolve relação trabalhista, atraindo a competência da Justiça do Trabalho, conforme art. 114 da CF/88. Sustenta ainda a ilegitimidade ativa do MPPA, alegando que a ação deveria ter sido proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). 3.No mérito, alega que não há previsão legal que obrigue a destinação de percentual específico de aprendizes para socioeducandos, afirmando que o art. 429 da CLT apenas estabelece uma cota geral para aprendizes. Argumenta que a decisão recorrida inovou ao fixar percentual de 20%, contrariando o princípio da legalidade. 4.Requer o provimento do recurso para reformar a decisão monocrática e afastar a obrigação imposta. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 5.Há duas questões em discussão: (i) definir se a Justiça Estadual da Infância e Juventude detém competência para processar e julgar a demanda; (ii) estabelecer se o Ministério Público Estadual possui legitimidade ativa para propor a ação civil pública relativa à contratação de socioeducandos como aprendizes. III. RAZÕES DE DECIDIR 6.A Justiça Estadual da Infância e Juventude é competente para processar e julgar ações que buscam a efetivação do direito fundamental ao trabalho e profissionalização de adolescentes socioeducandos, pois a demanda não trata de relação de trabalho já constituída, mas da inclusão em programas de aprendizagem. 7.O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que ações que envolvem inserção de adolescentes em contrato de aprendizagem possuem natureza civil, sendo a competência da Justiça Estadual, e não da Justiça do Trabalho. 8.O Ministério Público Estadual tem legitimidade ativa para ajuizar ação visando a proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, nos termos do art. 201, VIII, do ECA. A tese de que a legitimidade seria exclusiva do Ministério Público do Trabalho não se sustenta. 9.O art. 429, § 2º, da CLT prevê expressamente a obrigatoriedade da destinação de vagas de aprendizes a adolescentes do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), sendo compatível com a determinação judicial de cumprimento dessa obrigação. 10.A fixação do percentual de 20% das vagas de aprendizagem para socioeducandos não viola o princípio da legalidade, pois a decisão judicial apenas especifica uma quota dentro do limite geral obrigatório de 5% a 15%, previsto na legislação trabalhista e regulamentado por normativas federais e estaduais. 11.A decisão agravada está em conformidade com precedentes do TJPA, que reconhecem a obrigação das empresas em garantir a inclusão de socioeducandos em programas de aprendizagem, bem como a competência da Justiça Estadual para o processamento dessas ações. 12.O agravante não apresenta fatos novos ou argumentos jurídicos que justifiquem a reforma da decisão recorrida. IV. DISPOSITIVO E TESE 13.Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1.A Justiça Estadual da Infância e Juventude detém competência para processar e julgar ações que visam à efetivação do direito fundamental ao trabalho e profissionalização de adolescentes socioeducandos, pois a controvérsia não envolve relação de trabalho já constituída. 2.O Ministério Público Estadual possui legitimidade ativa para propor ação civil pública que busca assegurar o cumprimento da cota de aprendizes prevista no art. 429, § 2º, da CLT, em favor de adolescentes socioeducandos. 3.A fixação de percentual específico dentro da cota geral obrigatória de aprendizes não viola o princípio da legalidade, desde que observados os limites estabelecidos na legislação trabalhista. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 114; ECA, art. 201, VIII; CLT, art. 429, § 2º; Decreto Federal nº 9.579/2018, arts. 51 e 66; Decreto Estadual nº 314/2019. Jurisprudência relevante citada: STJ, CC 98.033/MG, Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJ 24.11.2008. TJPA, AI nº 0805940-43.2023.8.14.0000, Rel. Des. Célia Regina de Lima Pinheiro, 1ª Turma de Direito Público, j. 20.11.2023. TJPA, AI nº 0803823-79.2023.8.14.0000, Rel. Des. Maria Elvina Gemaque Taveira, 1ª Turma de Direito Público, j. 22.04.2024. ACÓRDÃO (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0807645-42.2024.8.14.0000 – Relator(a): LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO – 2ª Turma de Direito Público – Julgado em 10/03/2025 ) AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APRENDIZAGEM PROFISSIONAL. OBRIGATORIEDADE DE CONTRATAÇÃO DE SOCIOEDUCANDOS. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA ESTADUAL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão interlocutória que deferiu parcialmente a tutela de urgência, determinando à empresa PFM Comercial LTDA a apresentação de termo de cooperação técnica com a FASEPA e a FUNPAPA e a oferta de 20% das vagas de aprendizagem profissional a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) a competência da Justiça Estadual para processar e julgar a demanda, diante da alegação de que a matéria envolveria relação de trabalho, atraindo a competência da Justiça do Trabalho; (ii) a legitimidade ativa do Ministério Público para ajuizar ação civil pública com o objetivo de garantir a oferta de vagas a socioeducandos. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Justiça Estadual, por meio da Vara da Infância e Juventude, detém competência absoluta para processar e julgar ações relativas a direitos transindividuais de adolescentes, nos termos dos arts. 208 e 209 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedentes do STJ. 4. O Ministério Público possui legitimidade ativa para propor ação civil pública visando assegurar o respeito aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, conforme previsto no art. 201, VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 5. A decisão agravada encontra amparo no art. 429, § 2º, da CLT, que impõe a reserva de vagas para aprendizes oriundos do sistema socioeducativo, bem como nos Decretos nº 9.579/2018 (federal) e nº 314/2019 (estadual), que regulamentam a inclusão desses jovens no mercado de trabalho. 6. A imposição de percentual específico de 20% dentro da cota obrigatória de aprendizes atende aos limites da legislação vigente e às diretrizes de reintegração social dos adolescentes, não havendo ilegalidade na decisão recorrida. 7. Embargos de Declaração rejeitados, tendo em vista que a decisão interlocutória anteriormente proferida havia se manifestado de maneira clara quanto ao pedido de indicação de quantitativo. In verbis: “No que diz respeito ao pedido de que a obrigação de contratação de aprendizes indicada na liminar seja exigível somente quando o percentual resultar em um número inteiro sob a quantidade de aprendizes que a empresa é obrigada a dispor, entendo que tal pleito deve ser analisado pelo Juízo de origem, sob pena de supressão de instância.” 8. Ausência de demonstração de qualquer vício que justifique a revogação da tutela de urgência deferida. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Agravo de Instrumento conhecido e desprovido. (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0809139-39.2024.8.14.0000 – Relator(a): EZILDA PASTANA MUTRAN – 1ª Turma de Direito Público – Julgado em 17/03/2025 )” “Ementa: DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLÍTICA DE APRENDIZAGEM PROFISSIONAL. SOCIOEDUCANDOS. TUTELA ANTECIPADA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONTRATAÇÃO DE APRENDIZES. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de Instrumento interposto por Stihl Ferramentas Motorizadas Ltda. contra decisão interlocutória da 3ª Vara da Infância e Juventude da Comarca da Capital, que, nos autos de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Pará, concedeu parcialmente pedido de tutela antecipada para obrigar a empresa a apresentar termo de cooperação técnica com FASEPA e FUNPAPA, a fim de reservar 20% de sua cota legal de aprendizagem profissional a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, além de prestar informações periódicas sobre a contratação e acompanhamento dos beneficiários. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se o Juízo da Infância e Juventude possui competência para julgar a ação; (ii) estabelecer se há obrigatoriedade legal da inclusão de socioeducandos entre os aprendizes contratados pela empresa; e (iii) determinar se estão presentes os requisitos legais para concessão da tutela antecipada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Justiça da Infância e Juventude é competente para processar e julgar ações coletivas que visem assegurar o cumprimento de direitos fundamentais de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, conforme o art. 209 do ECA. 4. A legislação vigente impõe aos estabelecimentos o dever de contratar aprendizes em percentual entre 5% e 15% dos empregados cujas funções demandem formação profissional, sendo obrigatória, nos termos do § 2º do art. 429 da CLT, a reserva de vagas a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, por meio de instrumentos de cooperação técnica. 5. A Lei nº 12.594/2012, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), reforça o direito à profissionalização como meio de reintegração social dos adolescentes em conflito com a lei. 6. O Decreto Federal nº 9.579/2018 e o Decreto Estadual nº 314/2019 estabelecem diretrizes claras para a priorização de jovens em situação de vulnerabilidade, incluindo os que cumprem medidas socioeducativas, nos programas de aprendizagem profissional. 7. Estão presentes os requisitos do art. 300 do CPC para concessão da tutela de urgência, uma vez que a empresa não comprovou o cumprimento da obrigação específica de contratar socioeducandos como aprendizes, ainda que afirme ter excedido a cota mínima legal. 8. A decisão agravada encontra-se em consonância com a jurisprudência consolidada do TJPA, que reconhece a legitimidade do Ministério Público para a propositura da ação, a competência do Juízo da Infância e Juventude e a obrigatoriedade de cumprimento das normas de aprendizagem profissional. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A Justiça da Infância e Juventude é competente para julgar ações que busquem assegurar a profissionalização de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. 2. A legislação impõe às empresas a obrigação de reservar parte de sua cota legal de aprendizagem a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, mediante instrumento de cooperação técnica. 3. A concessão de tutela antecipada em ações que envolvem direitos fundamentais de adolescentes é válida quando presentes os requisitos do art. 300 do CPC, especialmente diante do descumprimento de norma cogente pela parte requerida. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 227; CLT, art. 429, caput e § 2º; Lei nº 8.069/1990 (ECA), arts. 53, 69, 201, VIII e 209; Lei nº 12.594/2012; CPC/2015, art. 300; Decreto Federal nº 9.579/2018, arts. 51 e 66, § 5º; Decreto Estadual nº 314/2019, art. 1º. Jurisprudência relevante citada: TJPA, AgInt nº 0805940-43.2023.8.14.0000, Rel. Des. Célia Regina de Lima Pinheiro, j. 20.11.2023; TJPA, AI nº 0807273-93.2024.8.14.0000, Rel. Des. Ezilda Pastana Mutran, j. 25.11.2024; TJPA, AI nº 0810040-41.2023.8.14.0000, Rel. Des. Luiz Gonzaga da Costa Neto, j. 19.06.2024; TJPA, AI nº 0807645-42.2024.8.14.0000, Rel. Des. Luiz Gonzaga da Costa Neto, j. 23.05.2024. (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0815677-36.2024.8.14.0000 – Relator(a): ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA – 1ª Turma de Direito Público – Julgado em 28/04/2025 )” “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECISÃO QUE CONCEDEU PARCIALMENTE A TUTELA ANTECIPADA. DETERMINAÇÃO DE APRESENTAÇÃO, EM JUÍZO, DO TERMO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA, PARA A OFERTA DE VAGAS DE APRENDIZAGEM PROFISSIONAL. CRIANÇA E ADOLESCENTE. PRELIMINAR DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REJEITADA. PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. NÃO CONHECIDA ANTE A VEDAÇÃO DA SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. MÉRITO. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA TUTELA. NÃO ACOLHIDO. A LEGISLAÇÃO ASSEGURA, COM PRIORIDADE ABSOLUTA, PROFISSIONALIZAÇÃO DO ADOLESCENTE E DE SUA INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO. PRECEDENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A decisão agravada concedeu parcialmente o pedido de antecipação de tutela, determinando que o Estado do Pará apresentasse, em juízo, prazo de 30 dias, o Termo de Cooperação técnica, assinado com a FASEPA e a FUNPAPA, para a oferta de vagas de aprendizagem profissional, consistente em 20% do total a que são obrigados a ofertar por Lei, bem como, em 60 dias, a relação dos socioeducandos atendidos pelo programa e que já estejam trabalhando. 2. Preliminar de nulidade da decisão por ausência de fundamentação. O Magistrado de origem firmou posicionamento, de forma fundamentada, pelo deferimento parcial da tutela, citando inclusive os princípios constitucionais e as disposições legais pertinentes a demanda. Preliminar rejeitada. 3. Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido. Tese não apreciada pelo Magistrado de origem. Não conhecimento da preliminar ante a vedação da supressão de instância. 4. Mérito. Pedido de revogação da tutela. A legislação vigente (Lei nº 8.069/90 e Lei federal nº. 12.594/12) obriga o Ente Estadual, com absoluta prioridade, assegurar através de políticas públicas, a profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho. Diante da inércia Estatal, compete ao Judiciário dar efetividade à lei. Precedente. 5. Agravo de Instrumento conhecido e não provido. (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0803823-79.2023.8.14.0000 – Relator(a): MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA – 1ª Turma de Direito Público – Julgado em 22/04/2024 )” Nesse contexto, verifica-se que o juízo a quo, ao deferir a antecipação de tutela pleiteada pelo Parquet, concluiu corretamente pela existência dos requisitos da probabilidade do direito e do perigo de dano em relação aos direitos fundamentais de socioeducandos, em conformidade com o art. 300 do CPC. Não se vislumbra perigo de irreversibilidade que justifique a reforma da decisão atacada, pois o contrato de aprendizagem pode ser extinto nas hipóteses previstas no art. 433 da CLT. Oportunamente, registro que, nesse momento processual, a análise é estrita aos requisitos da tutela e não de toda a argumentação posta nas razões recursais, das quais o julgador não é obrigado a enfrentá-las uma a uma. Dessa forma, entendo que a probabilidade do direito e o perigo da demora militam em favor da parte agravada, devendo ser observada a decisão que impõe obrigação prevista em lei no sentido de concretização de medidas para contratação de jovens aprendizes em situação de vulnerabilidade, no caso, socioeducandos. Quanto à multa diária no valor de R$3.000,00 (três mil reais) com limite de 30 (trinta) dias, não há se falar em desproporcionalidade. Ao contrário, é medida plenamente cabível para garantia do cumprimento de obrigação imposta judicialmente. Diante do exposto, conheço e nego provimento ao agravo de instrumento, mantendo integralmente a decisão recorrida, nos termos da fundamentação. Cabimento do julgamento monocrático liminar, com fulcro no art. 133, inciso XI, alínea “d”, do Regimento Interno do TJE/PA. Belém, 08 de julho de 2025. Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO Relatora
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