Processo nº 0804482-20.2025.8.14.0000
ID: 306838386
Tribunal: TJPA
Órgão: Tribunal Pleno - Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR
Classe: INCIDENTE DE RESOLUçãO DE DEMANDAS REPETITIVAS
Nº Processo: 0804482-20.2025.8.14.0000
Data de Disponibilização:
25/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
OMAR ADAMIL COSTA SARE
OAB/PA XXXXXX
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (12085) - 0804482-20.2025.8.14.0000 IMPETRANTE: PAULO PAUMGARTTEN SABINO DE OLIVEIRA AUTORIDADE: ESTADO DO PARÁ RE…
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (12085) - 0804482-20.2025.8.14.0000 IMPETRANTE: PAULO PAUMGARTTEN SABINO DE OLIVEIRA AUTORIDADE: ESTADO DO PARÁ RELATOR(A): Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR EMENTA TRIBUNAL PLENO SECRETARIA JUDICIÁRIA INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS Nº 0804482-20.2025.8.14.0000 SUSCITANTE: PAULO PAUMGARTTEN SABINO DE OLIVEIRA ADVOGADO: OMAR ADAMIL COSTA SARE (OAB-PA 13.052) SUSCITADO: TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DO PARÁ RELATOR: DESEMBARGADOR JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR DIREITO PENAL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. CONTROVÉRSIA SOBRE A APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI Nº. 13.718/2018 E DO PROTOCOLO Nº 21 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA QUANTO AO CRIME DE VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE. REPETIÇÃO DE PROCESSOS VERSANDO SOBRE A MESMA QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO. NÃO COMPROVAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE RISCO DE OFENSA À ISONOMIA E À SEGURANÇA JURÍDICA. PRESSUPOSTOS DOS INCISOS I E II DO ART. 976 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL NÃO PREENCHIDOS. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS INADMITIDO, NOS TERMOS DO VOTO. UNÂNIME. 1. É cabível a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) quando houver, simultaneamente, efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica – a teor do art. 976 do Código de Processo Civil (CPC) –, o que não ocorre, no caso em apreço. 2. Tendo em vista a ausência de repetitividade e de risco de ofensa à segurança jurídica e isonomia exigidos pelo art. 976, I e II, do Código de Processo Civil, é imperiosa a inadmissibilidade do presente IRDR. 3. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas inadmitido, nos termos do voto. 4. Decisão unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes do Tribunal Pleno do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, em INADMITIR o presente Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), nos termos constantes do voto do Relator. Esta sessão foi presidida pelo Exmo. Sr. Desembargador Roberto Gonçalves de Moura. 22ªSessãoOrdinária do Plenário Virtual do Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, do dia 11 de junho ao dia 18 de junho de 2025. Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR Relator RELATÓRIO TRIBUNAL PLENO SECRETARIA JUDICIÁRIA INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS Nº 0804482-20.2025.8.14.0000 SUSCITANTE: PAULO PAUMGARTTEN SABINO DE OLIVEIRA ADVOGADO: OMAR ADAMIL COSTA SARE (OAB-PA 13.052) SUSCITADO: TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DO PARÁ RELATOR: DESEMBARGADOR JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR RELATÓRIO Trata-se de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) suscitado por Paulo Paumgartten Sabino de Oliveira, com fulcro nos art. 976 do Código de Processo Civil (CPC) cumulado com o art. 188 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Pará (RITJPA), a fim de uniformizar o entendimento do Poder Judiciário paraense sobre a questão de direito, qual seja, “se o Protocolo 21 do CNJ tem hierarquia sobre as normas gerais de direito a ponto de inobservar o princípio da irretroatividade da lei mais gravosa.” (ID 25377367). Em suas razões, o suscitante alegou que os fatos investigados em ações penais movidas em seu desfavor teriam supostamente ocorrido antes da modificação introduzida pela Lei nº 13.718/2018, a qual alterou o art. 225 do Código Penal (CP), tornando os crimes contra a dignidade sexual – antes objeto de ação penal pública condicionada à representação da vítima –, em delitos perseguíveis mediante ação penal pública incondicionada. Argumenta, ainda, que teria havido decadência do direito de representação, o que implicaria na extinção da punibilidade, conforme o art. 107, inciso IV, do Código Penal. Nesse contexto, o suscitante questionou se a nova lei, sob o fundamento do Protocolo nº 21 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – o qual orienta julgamentos com perspectiva de gênero –, pode ser aplicada retroativamente para prejudicar o réu, uma vez que os fatos teriam ocorrido antes da alteração legislativa mencionada, o que violaria o princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa, conforme previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), bem como colocou em discussão se o citado Protocolo 21 do CNJ deve prevalecer sobre as normas gerais do direito pátrio. Após análise preliminar, a Presidência da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas (COGEPAC) proferiu despacho determinando que fosse demonstrada “fundamentadamente, a existência de multiplicidade da controvérsia – consoante a conjugação do art. 10 com o art. 485, inciso I, todos do Código de Processo Civil (CPC), com aplicação subsidiária à processualística penal, a teor do art. 3º do Código de Processo Penal (CPP)”, a fim de viabilizar o efetivo exercício do Juízo de Viabilidade (ID 25582850). Em manifestação referente à multiplicidade de processos, o suscitante asseverou que a lei não estabelece número específico de processos, salientando que, quando do ajuizamento do incidente, apontou o Processo nº 0805178-22.2022.8.14.0401 como paradigma e que, no caso em comento, há repetição de processos, ainda que no 1º grau. Ao final, afirmou que restavam preenchidos os requisitos de admissibilidade, nos termos do art. 976 do CPC (ID 25722125). Em conformidade com o fluxo procedimental previsto no art. 58-C, VI, do RITJPA, a COGEPAC apresentou Estudo pela inviabilidade do presente IRDR, eis que “não restou demonstrada a efetiva multiplicidade sobre mesma a questão de direito, tampouco o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica”, a teor do que estabelece os incisos I e II do art. 976 do CPC (ID 26141298). Regularmente distribuídos, coube-me a Relatoria do feito, retornando os autos conclusos para fins de admissibilidade. É o relatório. Inclua-se o feito na pauta de julgamento da próxima Sessão Ordinária do Plenário Virtual do Tribunal Pleno VOTO Instituído pelo Código de Processo Civil como resposta aos desafios enfrentados pelo sistema judiciário brasileiro, notadamente a elevada litigiosidade repetitiva, o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas configura-se como um instrumento processual destinado à resolução eficiente e uniforme de questões de direito que se repetem em inúmeros processos judiciais. Ao prevenir decisões conflitantes, o IRDR promove a igualdade de tratamento entre as partes e garante previsibilidade, estabilidade e coerência nas relações jurídicas. Com o rito processual diferenciado, delineado nos arts. 976 a 987 do CPC, o Incidente se distingue por seus níveis de cognição diversos, que se desdobram em três etapas: a análise de admissibilidade, onde se verifica a pertinência do IRDR e o atendimento aos requisitos legais; a instrução, na qual se aprofunda a análise da questão jurídica controvertida, com a participação dos diversos atores interessados no tema, os quais buscam uma solução consistente e uniforme; e, por fim, o julgamento de mérito e a fixação de tese pelo Tribunal. A decisão proferida no IRDR representa a uniformização do entendimento do Tribunal acerca da questão de direito controvertida, resultando na fixação de uma tese jurídica que, por possuir efeito vinculante, deve ser aplicada pelos magistrados a todos os processos individuais ou coletivos, presentes ou futuros, que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive nos Juizados Especiais, a teor do art. 985 do CPC. A uniformização e a estabilidade da jurisprudência proporcionada pelo IRDR atendem ao dever dos tribunais de garantir a coerência e a integridade das decisões judiciais, conforme o art. 926 do CPC. Embora não haja previsão expressa sobre o IRDR no Código de Processo Penal (CPP), considerando a aplicação subsidiária da legislação processual civil ao processo penal, autorizada pelo art. 3º do CPP, admite-se a utilização desse mecanismo para se buscar a uniformização da jurisprudência também na esfera penal. Sobre o ponto, Sofia Temer leciona que “[e]ntende-se também pela possibilidade de instauração de IRDR sobre matéria penal, o que estaria em consonância com o entendimento do STJ de que o CPC é aplicado subsidiariamente aos feitos criminais por força do art. 3º do CPP.” (in Incidente de resolução de demandas repetitivas. São Paulo: JusPodivm, 2023, p. 131). 1. DA QUESTÃO CONTROVERSA. Na petição de suscitação (ID 25377367), é submetido à apreciação as seguintes questões: “1º) O Protocolo 21 (CNJ) tem hierarquia para rebaixar as Normas Gerais de Direito Pátrio? (extinção da punibilidade); 2º) Dessa forma: eliminando o princípio da irretroatividade; 3º) Não se trata de menores, ou seja, vulnerabilidade.” No estudo de viabilidade apresentado pela Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas (COGEPAC), consta que a discussão diz respeito à “aplicação retroativa da Lei nº 13.718/2018, a qual modificou o art. 225 do Código Penal” e que o suscitante questiona se essa alteração da lei “por ser mais gravosa, e sob o fundamento do Protocolo 21 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – que orienta os julgamentos com perspectiva de gênero – pode ser aplicada retroativamente para prejudicar o réu, considerando que os supostos fatos ocorreram por anos sucessivos, com início antes da alteração legislativa” (ID 26141298). Nesse contexto, observo que a controvérsia em questão gira em torno da possibilidade de o Protocolo nº 21 do Conselho Nacional de Justiça possuir hierarquia para se sobrepor às normas gerais do direito brasileiro, a ponto de flexibilizar o princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa. 2. DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. Nesta fase processual, compete ao Órgão Julgador verificar o cabimento do IRDR através da análise do preenchimento dos requisitos legais para sua admissão. Na dicção do art. 976 do Código de Processo Civil, é cabível a instauração do IRDR quando houver, simultaneamente: “efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito (I); risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica (II)”; mostrando-se, por outro lado, incabível, quando “um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão repetitiva”, nos termos do §4º do mesmo diploma legal. Oportuno ressaltar que esses requisitos são cumulativos. A ausência de qualquer um deles inviabiliza a instauração do IRDR. Não é sem razão, aliás, que o art. 976 do CPC utiliza a expressão “simultaneamente”, a exigir a confluência de todos esses requisitos. Inicialmente, reconheço a legitimidade do suscitante para a propositura do IRDR, eis que é parte demandada nos processos em que se discute a questão controvertida, os quais são apontados como repetitivos, na petição de suscitação, nos termos do art. 977, inciso II, do CPC. Dito isso, passo a abordar os pressupostos de admissibilidade, nos moldes abaixo delineados. 2.1. DA EFETIVA REPETIÇÃO DA CONTROVÉRSIA SOBRE QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO. A legislação processual civil não define um número específico de demandas que configuram a efetiva repetição de processos, necessária para a instauração do Incidente. O Enunciado nº 87 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) esclarece que “[a] instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas não pressupõe a existência de grande quantidade de processos versando sobre a mesma questão, mas preponderantemente o risco de quebra da isonomia e de ofensa à segurança jurídica”. Portanto, o fator preponderante para a instauração do IRDR não é a quantidade de processos com a mesma questão, mas sim o risco de quebra da isonomia e ofensa à segurança jurídica – próximo requisito –, em razão da possibilidade de prolação de decisões judiciais conflitantes decorrentes da multiplicidade de demandas. Na espécie, conforme se depreende dos autos, o suscitante juntou documentos referentes a 5 (cinco) processos indicados como representativos da questão de direito, entretanto não demonstrou a multiplicidade de casos que ensejaria a instauração de IRDR, uma vez que as ações penais apontadas possuem o mesmo contexto fático, isto é, persecuções criminais movidas em desfavor do ora suscitante pelo suposto cometimento do crime de violação sexual mediante fraude (art. 215 do CP) contra diversas mulheres, durante alguns anos. Nesse sentido, embora existam ações semelhantes movidas contra o mesmo réu, tratando de crimes praticados dentro do mesmo contexto fático contra diferentes vítimas — e cujas sentenças, inclusive, têm seguido um entendimento uniforme — tais processos não são suficientes para configurar a repetição da mesma questão jurídica necessária à instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas e que demande a uniformização por meio de tese jurídica vinculante. Ademais, o suscitante não comprovou a existência de múltiplos casos em que a questão envolvendo a aplicação do Protocolo nº 21 do CNJ – que instituiu o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero – tenha sido debatida, em confronto com a legislação penal, em feitos distintos daqueles em que ele próprio figura como réu. Tampouco indicou a existência de outros processos semelhantes nos quais tenham sido prolatadas decisões divergentes, com argumentos distintos sobre a mesma controvérsia. Oportuno salientar que a questão de direito reside na aplicação retroativa da Lei nº 13.718/2018, que alterou o artigo 225 do CP. Antes dessa alteração normativa, os crimes contra a dignidade sexual eram perseguíveis por ação penal pública condicionada à representação da vítima, com um prazo decadencial de 6 (seis) meses. Após a modificação legislativa em comento, esses crimes passaram a ser de ação penal pública incondicionada, motivo pelo qual o suscitante questiona se a nova lei – que, na sua ótica, seria mais gravosa e sob o fundamento do Protocolo nº 21 do CNJ – pode ser aplicada retroativamente em detrimento do réu, uma vez que alguns dos fatos discutidos teriam ocorrido antes da alteração legislativa, o que consubstanciaria violação ao princípio da irretroatividade da lei penal mais severa (art. 5º, XL, da CF/88), bem com se o referido Protocolo do CNJ teria prevalência sobre as normas gerais do direito pátrio. Como bem ressaltou o estudo de viabilidade da Presidência da COGEPAC, “o ministro Francisco Falcão, em sede de julgamento do Agravo em Recurso Especial nº. 1.470.017-SP, destacou que o IRDR está inserido no microssistema de formação concentrada de precedentes obrigatórios e, longe de ser destinado apenas à decisão de um conflito singular, nele se buscam a pluralização do debate e a análise de argumentos contrários e favoráveis à tese jurídica, inclusive com a possibilidade da realização de audiências públicas e da indicação de amicus curiae” (Superior Tribunal de Justiça: Agravo em Recurso Especial nº 1.470.017/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Francisco Falcão, julgado em 21/8/2020, publicado em 26/8/2020). A título ilustrativo, colaciono algumas decisões em igual sentido: INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - ART. 976, I E II DO CPC - AUSÊNCIA DE EFETIVA REPETIÇÃO DE DEMANDAS SOBRE O TEMA - NÃO CABIMENTO DO INCIDENTE - INADMISSIBILIDADE DO IRDR. I - O artigo 976 do CPC/2015 dispõe que o incidente de resolução de demandas repetitivas será instaurado quando houver, simultaneamente, efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica; II - No caso, a ausência de efetiva repetição de processos sobre o mesmo tema e de questão unicamente de direito a ser resolvida inviabiliza a aferição do preenchimento dos requisitos do art. 976 do CPC/2015, devendo, portanto, ser inadmitido o incidente. (Tribunal de Justiça de Minas Gerais: IRDR nº 3427192-12.202.4813.0000, 2ª Seção Cível, Relator Desembargador João Cancio, julgado em 27/1/2025, publicado em 28/1/2025 – destaquei) INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - ART. 976, I E II DO NCPC - RELAÇÃO DE ACESSORIEDADE ENTRE OS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA E DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE MULTIPLICIDADE DE DEMANDAS QUE TENHAM ESTE TEMA COMO OBJETO - NÃO CABIMENTO DO INCIDENTE - INADMISSIBILIDADE DO IRDR. I - O artigo 976 do CPC/2015 dispõe que o incidente de resolução de demandas repetitivas será instaurado quando houver, simultaneamente, efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. II - No caso, a total inexistência de dados sobre o quantitativo de demandas pendentes que versem sobre o mesmo tema inviabiliza a aferição do preenchimento dos requisitos do art . 976 do CPC/2015, devendo, portanto, ser inadmitido o incidente. (Tribunal de Justiça de Minas Gerais: IRDR nº 365995-88.2016.813.0000, 2ª Seção Cível, Relator Desembargador João Cancio, julgado em 23/1/2017, publicado em 10/2/2017- destaquei) Além disso, conforme se depreende do estudo jurimétrico realizado pela COGEPAC, não foram encontrados, nos repositórios de jurisprudência do TJPA, outros casos que discutam a aplicação do Protocolo nº 21 do CNJ em confronto às normas gerais de direito, especialmente no que se refere à extinção da punibilidade e à possível violação ao princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa. Assim, a singela indicação de apenas 5 (cinco) processos nos quais o requerente figura como réu não é suficiente para caracterizar a repetição necessária, tampouco para verificar possíveis divergências que justifiquem a formação de um precedente qualificado para uniformizar o entendimento da Corte. Desta forma, revela-se inviável a utilização do presente incidente como instrumento de irresignação, por parte do suscitante, ou ainda como sucedâneo recursal, em razão de sua condenação. Pelo exposto, reputo desatendido o requisito previsto no art. 976, inciso I, do CPC. 2.2. DO RISCO DE OFENSA À ISONOMIA E À SEGURANÇA JURÍDICA. O art. 976, II, do CPC estabelece como pressuposto para a admissibilidade do IRDR a demonstração do risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, refletindo a concepção do dever imposto aos Tribunais, de manterem sua jurisprudência estável, íntegra e coerente. Esse risco decorre da existência de dispersão jurisprudencial entre os órgãos fracionários sobre a mesma questão de direito, resultando em tratamento desigual das partes, mesmo em situações fáticas similares, o que, por consequência, gera incerteza quanto ao desfecho das lides. No ponto, leciona Marcelo Ornellas Marchiori (in A atuação do Poder Judiciário na formação de precedentes definitivos – experiências e desafios. Salvador: Jus Podium, 2022, p. 103): Assim, aguardar toda e qualquer pacificação pelos tribunais superiores, permitindo a liberdade de interpretação sobre questões de direito por todas as instâncias, representa grave violação ao princípio da isonomia, com consequências danosas à atividade jurisdicional e à sociedade, devido à ausência de definitividade (...) deixando disfuncional a atuação de juízes e tribunais numa incrível e estranha atividade de repetir decisões que não se sabe, certamente, se é aquela mesma a decisão do Poder Judiciário. (destaquei) Conforme já exposto, o suscitante indicou como representativos 5 (cinco) ações penais movidas em face de Paulo Paumgartten Sabino de Oliveira, a fim de apurar o suposto cometimento do delito de violação sexual mediante fraude. Alegou que haveria divergência entre essas ações, uma vez que, em algumas, foi reconhecida a extinção da punibilidade pela prescrição, enquanto em outras tal pleito não foi acolhido. Entretanto, consoante delineado no estudo da COGEPAC, os delitos investigados envolvem o mesmo réu, contra vítimas distintas e ocorreram em datas e por períodos diferentes – alguns se estendendo por vários anos –, o que inevitavelmente, diante de algumas peculiaridades de cada prática criminosa, o que influenciou no desfecho de cada julgamento, a depender de cada contexto probatório correlato. Tal variação foi especialmente relevante na análise de aspectos como a configuração de crime continuado e a verificação de prescrição e/ou decadência para fins de extinção da punibilidade, considerando, que o réu – ora suscitante – possuía mais de 70 (setenta) anos. Nessa seara, destaco lição de Fredie Didier Junior e Leonardo Carneiro da Cunha (in Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originária de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originária de tribunal. 19ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Juspodivm, 2022, p. 799): É preciso, como visto, que haja efetiva repetição de processos. Não cabe IRDR preventivo. Mas se exige que haja risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica . Esse requisito reforça a vocação do IRDR para formação de precedentes, aliando-se ao disposto no art. 926 do CPC. Exatamente por isso, somente cabe o incidente quando já houver algumas sentenças antagônicas a respeito do assunto . Vale dizer que, para caber o incidente, deve haver, de um lado, sentenças admitindo determinada solução, havendo, por outro lado, sentenças rejeitando a mesma solução. É preciso, enfim, haver uma controvérsia já disseminada para que, então, seja cabível o IRDR. Exige-se, em outras palavras, como requisito para a instauração de tal incidente, a existência de prévia controvérsia sobre o assunto . Para que se possa fixar uma tese jurídica a ser aplicada a casos futuros, é preciso que sejam examinados todos os pontos de vista, com a possibilidade de análise do maior número possível de argumentos. É assim que se evita risco à isonomia e à segurança jurídica. A respeito do assunto, colaciono também trecho do estudo técnico da COGEPAC quanto ao requisito legal em análise: A segurança jurídica é afetada quando há instabilidade na aplicação do direito, o que pode comprometer a confiança da sociedade no sistema judiciário. Entretando, como sobredito, a parte suscitante não se desincumbiu de demonstrar a dissonância jurisprudencial da matéria discutida. Já o risco de ofensa à isonomia ocorre quando há a possibilidade de que diferentes partes, em situações idênticas, recebam decisões judiciais distintas, comprometendo a coerência e previsibilidade do direito. Contudo, a mera existência de decisões desfavoráveis apenas ao suscitante não comprova esse risco. (destaquei) Em suma, diante da não comprovação da alegada divergência jurisprudencial ou ainda a possibilidade de tratamento desigual em situações idênticas – eis que, nos casos indicados nos autos, consoante a jurimetria contida na manifestação da COGEPAC –, as especificidades fáticas de cada caso foram seguidas de decisões de 1º grau que vocalizaram entendimento uniforme quanto à questão jurídica, seja para rejeitar o pedido de extinção da punibilidade; seja para declarar a prescrição ou decadência; seja para condenar o réu, considerando a análise continuidade delitiva, a idade do réu, causas de aumento de pena e a análise sob a perspectiva de gênero. Nesse passo, a inexistência de decisões conflitantes acerca do tema objeto de suscitação de IRDR desnatura o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, o que enseja a inadmissão do incidente, sendo tal posicionamento encampado pela jurisprudência, motivo pelo qual cito, por todas, a seguinte decisão emanada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais: INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE - SERVIDOR PÚBLICO EFETIVADO POR MEIO DA LEI COMPLEMENTAR Nº 100/2007 - DIREITO À INDENIZAÇÃO POR FÉRIAS-PRÊMIO NÃO GOZADAS - AUSÊNCIA DE DIVERGÊNCIAS - NÃO COMPROVAÇÃO DO RISCO DE OFENSA À ISONOMIA E À SEGURANÇA JURÍDICA - INCIDENTE NÃO ADMITIDO. 1- O rito do IRDR encontra-se regulado nos artigos 976 e seguintes do CPC/15, e possui como requisitos cumulativos de admissibilidade: (I) existência de efetiva repetição de processos; (II) controvérsia sobre questão exclusivamente de direito; e (III) risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica; 2- A ausência de decisões conflitantes acerca do tema que se pretende discutir em sede de IRDR afasta o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, o que enseja a inadmissão do incidente. (Tribunal de Justiça de Minas Gerais: IRDR nº 0781389-36.2017.813.0000, 1ª Seção Cível, Relator Desembargador Renato Dresh, julgado em 19/9/2018, publicado em 4/10/2018 – destaquei) Por oportuno, anoto que, mesmo após a nova oportunidade de comprovação dos requisitos concedida ao suscitante pela Presidência da COGEPAC (ID 25582850), este não carreou elementos objetivos que embasassem sua alegação da existência de risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, tampouco demonstrou a repetitividade exigida pela norma processual. O IRDR visa uniformizar o entendimento do Tribunal sobre questões jurídicas que se repetem em processos em curso, buscando a segurança jurídica e a isonomia, o que não ocorre, no vertente caso. Por derradeiro, destaco que a indicação de apenas 5 (cinco) ações penais movidas em desfavor do ora suscitante sugere a utilização do IRDR como sucedâneo recursal, com a finalidade de rediscutir a matéria julgada contrariamente à sua pretensão, denotando a tentativa de formação de precedente qualificado que o beneficie, mesmo à míngua dos requisitos legais que delineiam o sistema Brasileiro de Precedentes (SBP). No particular, a Recomendação CNJ nº 134/2022 veda expressamente esse tipo de conduta processual, haja vista que subverte a própria razão de ser do Sistema Brasileiro de Precedentes: Art. 36. Para que haja a admissibilidade e julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, a multiplicidade e risco à isonomia precisam ser atuais, nos termos do art. 976 do CPC/2015, com a pendência de causas em primeiro grau ou no próprio tribunal, quando suscitado o incidente, não podendo ser provocado o incidente como sucedâneo recursal. (destaquei) Também seguindo esse entendimento, a jurisprudência pátria já se manifestou sobre a impossibilidade de utilização do IRDR como sucedâneo recursal, sendo exemplificativos os seguintes julgados: PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - IRDR. REQUISITO. EXISTÊNCIA DE PROCESSO EM TRÂMITE. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE. INVIABILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. INEXISTÊNCIA. (omissis) V - O cerne da controvérsia consiste em decidir se seria admissível a instauração do IRDR pela escolha de um caso que já tenha sido objeto de julgamento, mas cujos embargos de declaração ainda não foram julgados. Ocorre que, após o julgamento do mérito do recurso do qual se extrairia a tese jurídica, não há que se falar em pendência do caso para fins de instauração do IRDR, diante do obstáculo à formação concentrada do precedente obrigatório. (omissis) IX - Verifica-se que, de qualquer forma, o pedido de instauração do IRDR parece ter sido utilizado como via substitutiva - em uma causa multimilionária - para fins de reexame do mérito, quando já esgotadas todas as possibilidades recursais. Contudo, o IRDR não pode ser utilizado como sucedâneo recursal. X - Agravo conhecido para conhecer parcialmente do recurso e, nessa parte, negar-lhe provimento. (Superior Tribunal de Justiça: Agravo em Recurso Especial nº 1.470.017/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Francisco Falcão, julgado em 15/10/2019, publicado em 18/10/2019 – destaquei) PROPOSTA DE INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR). PARÂMETRO PARA CONCESSÃO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. EFETIVA REPETIÇÃO DE PROCESSOS. NÃO DEMONSTRADA. DECISÕES DE TRIBUNAIS DIVERSOS. RECURSO JÁ JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Delimitação de parâmetro de renda mensal para concessão de assistência judiciária gratuita: se considerando a renda bruta, a renda bruta excluindo os descontos obrigatórios de previdência e de imposto de renda, ou a renda líquida. 2. O art. 976 do CPC exige, como requisito de admissibilidade do IRDR, que haja, simultaneamente, efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão, que essa discussão seja unicamente sobre matéria de direito, e que isso implique em risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. Há a exigência de que existam múltiplos processos em que a questão jurídica foi enfrentada e decidida. A repetição da controvérsia em processos há de ser concreta e efetiva. 3. As suscitantes não lograram êxito em demonstrar a existência de expressivo número de processos em que foi analisada a mesma querela e que resultaram em decisões em sentidos diversos (art. 977, parágrafo único, do CPC). 4. Necessidade de que haja decisões antagônicas quanto a questão de direito prolatadas por órgãos diferentes de um mesmo Tribunal. Impossibilidade de Corte local uniformizar a jurisprudência de órgãos jurisdicionais que não a compõem. 5. O descontentamento em relação ao resultado do julgamento não serve de supedâneo para a instauração de IRDR, o que deve ser objeto das vias recursais adequadas. 6. Pedido de instauração de incidente feito após o julgamento do recurso. Impossibilidade. Precedente do STJ. NÃO ADMITIRAM O INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. UNÂNIME. (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 0004393-89.2022.821.7000, Tribunal Pleno, Relator Desembargador Jorge Luís Dall'Agnol, julgado em 17/6/2022, publicado em 20/7/2022 – destaquei) Ante o exposto, corroborando o entendimento consignado por ocasião da emissão de juízo negativo de viabilidade pela Presidência da COGEPAC, constato que a presente suscitação não comprovou a alegada dispersão jurisprudencial que pudesse representar a controvérsia, inexistindo risco à isonomia e à segurança jurídica, motivo pelo qual considero desatendido, também, o pressuposto do art. 976, II, do CPC. 2.3. DA AFETAÇÃO DA MATÉRIA NOS TRIBUNAIS SUPERIORES. Conforme disposto no §4º do art. 976 do CPC, a afetação de tema que abranja a controvérsia a ser uniformizada, nos Tribunais Superiores, configura óbice à instauração do IRDR. Na presente hipótese, assinalo que a COGEPAC informou não ter identificado, nos Tribunais Superiores, temas ou teses que versem sobre a questão de direito ora debatida. Dessa forma, constata-se o atendimento ao requisito negativo previsto no § 4º do art. 976 do CPC. 3. DO DISPOSITIVO. Por todo o exposto, embora preenchido o requisito do art. 976, § 4º, do Código de Processo Civil, verifico que não foram atendidos os pressupostos dos incisos I e II do mencionado dispositivo legal, haja vista a inexistência de comprovação de repetitividade e de risco de ofensa à segurança jurídica e à isonomia, razão pela qual voto pela INADMISSÃO do presente Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. É como voto. Belém, 23 de junho de 2025. Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR Relator Belém, 23/06/2025
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