Processo nº 0800309-72.2022.8.14.0059
ID: 317631434
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única de Soure
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0800309-72.2022.8.14.0059
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCOS HENRIQUE MACHADO BISPO
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE SOURE _________________________________________________________________________________________________________________…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE SOURE _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ DADOS DO PROCESSO: PROCESSO Nº: 0800309-72.2022.8.14.0059 ASSUNTO: [Fabricação de Objeto Destinado a Produção de Drogas e Condutas Afins ] RÉU: ISABEL CRISTINA SANTOS MACIEL Endereço: TV 8, SM, ENTRE 9 E 10 RUAS, MATINHA, SOURE - PA - CEP: 68870-000 _______________________________________________________________________________________________________________________________________________ SENTENÇA Vistos os autos. 1. RELATÓRIO: O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ ofereceu denúncia em face de ISABEL CRISTINA SANTOS MACIEL como incursa nas penas dos artigos. 33, caput, da Lei de Drogas e 50 da Lei de Contravenções Penais. Narra a denúncia que: “Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, no dia 23/03/2022, por volta das 16hrs31min, em via pública, neste município, a nacional, acima qualificado, foi presa em flagrante delito por ter em depósito 14 (quatorze) trouxinhas de substância entorpecente, semelhante a “OXI”, bem como R$ 3,15, produto da comercialização de droga, bem como pela exploração de jogos de azar, conforme Termo de Exibição e Apreensão de ID Num. 61804255 - Pág. 7. Em depoimento, as testemunhas CLAUDIO RAMOS DA SILVA e JONNY OLIVEIRA LIMA, Policiais Militares, relataram que, no dia, hora e local supracitados, estavam em rondas pela cidade de Soure/PA, quando vislumbraram a denunciada promovendo jogo do bicho em sua residência. Realizaram a abordagem e, após permissão da denunciada, revista no imóvel, onde encontram em sua posse 14 (quatorze) trouxinhas de substância entorpecente, semelhante a “OXI”, bem como 01 (uma) máquina de jogo do bicho. Diante disso, conduziram e apresentaram o denunciado, assim como a droga apreendida e objetos, a autoridade policial para os procedimentos legais.” Oferecida a denúncia, determinou-se a notificação do réu, em 25/03/2024. Notificada, em 30/07/2024, apresentou defesa prévia, em 18/08/2024, por intermédio de defensor constituído. Recebida a denúncia, em 03/09/2024, determinou-se a citação da ré para apresentação em audiência de instrução e julgamento, aprazada para 02/12/2024. Contudo, tendo em vista a ausência de uma das testemunhas arroladas pela acusação, o ato processual se resumiu a oitiva apenas da testemunha CLAUDIO RAMOS DA SILVA, sendo, portanto, redesignado o feito em continuação para oitiva das demais testemunhas e interrogatório da ré, conforme ID 132788024. Laudo constatação definitivo atestando que o material apreendido se tratava de fato de droga derivada de Cocaína (7,7g) (ID 141039700). Realizada audiência de instrução e julgamento na data e hora aprazada, foram ouvidas as testemunhas arroladas pela acusação e defesa. Na mesma oportunidade, foi realizado o interrogatório da ré (ID 141058880). Em alegações finais, o Ministério Público pugnou pela condenação da acusada pela prática do crime de tráfico de drogas e da contravenção penal de jogo de azar, com incidência da atenuante da confissão em relação ao último delito. A defesa da acusada, em memoriais escritos, pugnou pela improcedência da denúncia e, por consequência, pela absolvição da ré, por insuficiência de provas. Antecedentes criminais atualizados. Vieram-me os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO: Ao exame dos autos, verifico estarem presentes os pressupostos processuais e as condições da ação penal. A materialidade do delito de tráfico de drogas, restou demonstrada por meio do inquérito policial, termo de exibição e apreensão da droga e laudo toxicológico definitivo das drogas apreendidas, dando conta que o material apreendido se tratava de entorpecente derivado de cocaína. A autoria da conduta e o dolo da denunciada restaram provadas pelas declarações das testemunhas ouvidas em juízo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Em 02/12/2024, CLAUDIO RAMOS DA SILVA, na condição de testemunha, disse: De fato, foi realizada a abordagem. Não me recordo exatamente o local onde encontramos o material ilícito, mas houve o pedido de autorização para adentrar na residência, o que foi concedido pela moradora. No interior do imóvel, foi localizada uma porção de droga em um dos cômodos, fato esse que me recordo parcialmente. Também foi localizado material na área conhecida como “Colômbia”, situada na Matinha, nas proximidades de uma alameda onde se encontra situada a casa da investigada. Sim, foi localizada uma máquina de jogo de azar, acompanhada de vários rolos de papel para impressão. Não me recordo exatamente. Não sei afirmar se era maconha, óxido ou cocaína. Não tenho essa informação com precisão. Sim, me recordo disso. Após a abordagem, passamos a realizar buscas mais detalhadas e foi nesse contexto que localizamos as substâncias entorpecentes no interior da residência. Embora eu não lembre exatamente o tipo de droga, houve o relato da moradora sobre o envolvimento com o jogo do bicho. Ela autorizou a entrada na casa, e, ao realizarmos novas buscas, encontramos, em um dos cômodos — creio que um quarto onde ela mantinha uma máquina de costura — a substância entorpecente. Ela afirmou que a droga seria dela. Posteriormente, já na delegacia, o filho dela disse que o material lhe pertencia. No entanto, os procedimentos já haviam sido realizados com base na confissão inicial dela. Desconheço a veracidade quanto à responsabilidade entre ela e o filho, mas inicialmente ela afirmou que o material era de sua posse. Sim, havia uma filha dela. Ela permaneceu no interior de um quarto durante a abordagem. Creio que era sua filha. Não me recordo se havia mais alguém, mas confirmo a presença de pelo menos essa pessoa na casa. Não. Não havia movimentação de pessoas nos arredores. Acredito que minha equipe era formada por três policiais, além de outra viatura com dois agentes. Não tenho certeza absoluta, mas estimo que essa era a composição. Sim. Havia uma máquina de costura e outros materiais relacionados à costura na casa. Na parte dos fundos, onde ela indicou que realizava seu trabalho, foram vistas peças de roupa e objetos compatíveis com a atividade de costureira. Não tenho uma estimativa exata do tempo. Foi o tempo necessário para realizarmos as buscas e localizarmos o material ilícito. Lembro que, quando um dos policiais adentrou o cômodo onde estavam os materiais, a moradora demonstrou bastante nervosismo, tentando ocultar algo. Foi essa atitude que levou à descoberta do entorpecente. Não. Foi a primeira vez que participei de uma operação envolvendo ela. No entanto, alguns colegas mencionaram que ela já era conhecida por envolvimentos anteriores, embora eu nunca tenha participado dessas diligências. A máquina de jogos de azar, sim, foi apreendida. As drogas eu confirmo que foram apreendidas, mas não me recordo da quantidade exata. Acredito que estavam embaladas em pequenas porções, do tipo que costumamos chamar de “cabeças de droga”. Não, não me recordo da quantia em dinheiro apreendida. Em 11/04/2025, JONNY OLIVEIRA LIMA, na condição de testemunha, disse: Fomos acionados para averiguar uma situação de possível tráfico de drogas. Ao chegarmos no local, não me recordo com precisão quem nos atendeu — se foi a acusada ou sua filha —, mas houve um diálogo inicial, no qual o sargento mencionou a suspeita de jogos de azar, como o jogo do bicho. Foi-nos franqueada a entrada na residência. Dentro do imóvel, localizamos certa quantidade de droga. Não me recordo exatamente o tipo da substância, tampouco o local específico em que estava escondida. Era uma parte mais ao fundo da casa. Também não lembro a quantidade exata ou a natureza da droga. No que diz respeito à localização da acusada, recordo que, já no momento em que estávamos dentro da casa, ela estava presente juntamente com a filha, mas não consigo precisar quem nos recebeu na entrada. Não me recordo se havia outras pessoas no imóvel além delas. Quanto ao horário da diligência, acredito que foi pela manhã, mas não posso afirmar com certeza. A guarnição estava composta por uma única viatura, com três policiais militares. Não sei se havia um quarto integrante naquela ocasião, mas três com certeza havia. Não me lembro se foi realizada revista pessoal na acusada. A droga foi encontrada dentro da residência. Sobre quem foi conduzido à delegacia, acredito que a acusada foi levada, mas não lembro se mais alguém a acompanhou. Tento me lembrar se havia algum rapaz presente ou se ele apareceu depois, já no momento em que a substância havia sido localizada, mas não tenho certeza. Na ocasião, a rua estava tranquila, com pouco movimento. Não havia aglomeração de pessoas nas proximidades da casa. Não, não a conhecia e acredita que ninguém da guarnição a conhecesse. Não, não houve nenhuma observação prévia. Na contramão das alegações das testemunhas, a filha da ré, IZANIELY CRISTINA SANTOS MACIEL, na condição de informante do juízo, declarou: Sim, eu estava presente no momento do ocorrido. Havia acabado de deixar minha filha na escola e, quando retornei, estava em meu quarto; minha mãe encontrava-se no quarto dela. Foi então que os policiais entraram na residência e se dirigiram diretamente ao meu quarto, por ele ser o mais próximo da porta de entrada. Eles perguntaram onde estava minha mãe, e prontamente informei que ela se encontrava no quarto dela. Em seguida, dirigiram-se até ela e, logo depois, dois policiais vieram até mim, informando que fariam uma revista na casa. Dois policiais permaneceram comigo e outros dois com ela. Após a revista inicial, fomos colocados juntas em um mesmo quarto. Posteriormente, um dos policiais informou que voltaria ao quarto da minha mãe para realizar uma revista completa. Dessa vez, ele foi sozinho. Quando retornou, já veio afirmando que havia encontrado drogas no local. É importante destacar que, durante esse tempo, tanto eu quanto minha mãe permanecemos no outro quarto, o que me faz ter certeza de que essa droga não pertencia a ela. Minha mãe, àquela altura, não tinha nenhum recurso financeiro. Naquele dia, sequer tínhamos o que comer em casa. Ela já havia sido presa anteriormente por envolvimento com entorpecentes e, após cumprir pena, nós, filhos, nos reunimos e conversamos com ela, pedindo que abandonasse esse caminho. Ela havia decidido mudar de vida. Inclusive, eu havia passado recentemente na faculdade, tentando uma vida melhor para mim e para minha filha, que à época tinha cerca de três anos. Precisava muito do apoio da minha mãe, e ela estava disposta a mudar por nós, pelos netos e pela família. Residíamos eu, minha mãe, minha filha e meu irmão. Sim. Como mencionei, ela realizava apostas do jogo do bicho, tendo inclusive mais de 500 jogos sob sua responsabilidade. Além disso, eu contribuía com minha renda oriunda do Bolsa Família, e minha mãe também era beneficiária do mesmo programa. Esse era o sustento da nossa família naquele momento. O único objeto encontrado na residência, relacionado a alguma prática ilícita, foi uma maquininha de jogo do bicho. Não. Eu me referia ao jogo do bicho. Ela já havia sido presa anteriormente por tráfico de drogas, tendo cumprido seis anos de pena. Depois disso, nós, filhos, nos reunimos e conversamos com ela, buscando encontrar uma alternativa para que ela abandonasse de vez essa vida. Ela havia aceitado mudar. Talvez, em razão da condenação anterior, ela tenha passado a ser alvo constante de abordagens e suspeitas, mesmo após tentar recomeçar. Na verdade, minha irmã trabalhava com jogo do bicho, e minha mãe, em busca de uma renda complementar, passou a utilizar a máquina para isso. Foi esse o item apreendido na ocasião. A ré, ISABEL CRISTINA SANTOS MACIEL, em interrogatório, disse: Não, a droga não era sua. Sim. Eu estava no meu quarto. Não. Quando chegaram, eu estava no meu quarto. Minha filha estava no quarto dela, que fica próximo à porta, e a porta estava aberta. Era no período da tarde. Os policiais foram diretamente ao quarto da minha filha, perguntaram por mim, e ela os levou até o meu quarto, onde eu estava deitada. Ao me abordarem, disseram que haviam recebido uma denúncia. Eu mesma disse que possuía uma maquininha de jogo do bicho e que ela estava em casa. Fui buscar o equipamento e o entreguei. Foi então que um dos policiais me informou que a denúncia não era sobre jogo do bicho, mas sim sobre drogas. Disse a ele que poderiam procurar à vontade, pois não havia drogas na casa. Dois policiais me acompanharam até meu quarto para fazer a busca, enquanto outros dois ficaram com minha filha em outro cômodo. No meu quarto, reviraram tudo durante cerca de 20 minutos e nada encontraram. Saímos do quarto e seguimos para outro ponto da casa. Quando chegamos à cozinha, um dos policiais disse: “Acho que estava lá”. Ele retornou sozinho ao quarto, enquanto eu permaneci com o outro policial. Minutos depois, ele gritou de lá e voltou dizendo que tinha encontrado a droga, já com o material em mãos. Eu já havia sido presa anteriormente, e desde que fui solta, passei a perceber certo comportamento de intimidação por parte da polícia. Eles passavam constantemente em frente à minha casa, muitas vezes apenas observando, como se esperassem alguma reação. Senti, desde então, uma perseguição direcionada a mim. Na ocasião da abordagem, o policial que me levou com minha filha até o quarto dela me questionou diretamente: “De quem é a droga?” Respondi imediatamente que não era minha, que em minha casa não havia drogas. Ele, então, afirmou: “Se você não assumir, eu vou levar você, sua filha e seus filhos que estão lá fora”. Diante dessa ameaça, eu disse: “Então é minha, vamos embora”. Assumi para proteger meus filhos, que estavam ao redor da casa, e minha filha. Não ia permitir que levassem todos eles. Quando estive reclusa por seis anos, participei de uma cooperativa dentro da unidade prisional. Uma artista plástica chamada Berna Reato, envolvida com iniciativas de ressocialização, criou um projeto voltado para mulheres egressas do sistema prisional. Ela me procurou quando saí da prisão, perguntando se eu queria integrar o projeto fora do cárcere, já que eu participava dele internamente. Aceitei. Ela reuniu cerca de 20 mulheres recém-egressas e fundamos um projeto voltado à costura e ao artesanato. Eu fiquei responsável por ensinar as outras participantes, pois já trabalhava com costura na prisão. Recebemos doações de materiais e, com o tempo, o projeto foi crescendo. Inclusive, recebi doações de duas máquinas de costura, que utilizo até hoje. Eventualmente, preciso ir ao local do projeto para entregar e buscar materiais e trabalhos. Sim, várias vezes. Mesmo sem estar fazendo nada de errado, sou abordada ou observada. Às vezes, os policiais apenas ficam parados me olhando, como se quisessem testar minha reação, ver se eu corro, por exemplo. Desde que saí do cárcere, esse tipo de perseguição tem sido constante. Partido dos relatos acima e das provas colacionadas nos atos, verifico também a materialidade e autoria, essa confessada em juízo, no que tange a contravenção penal disposta no artigo 50, da Lei de Contravenções Penais. Destaco por fim que, em que pese a aparente divergência de relatos entre as alegações postas em sede policial e judicial, nota-se da dinâmica da ação policial, que a abordagem foi plenamente justificada pela visualização da prática delitiva de jogo de azar, fato que motivou a pedido de busca domiciliar no imóvel a ré, que, inclusive, anuiu. Durante a diligência autorizada pela moradora foi descoberto o material entorpecente. Ocorre que coligindo os relatos colhidos em juízo com as demais provas acostadas aos autos, verifico, que não há como prosperar a tese defensiva, pois nesse caso não há como prevalecer o in dubio pro reo. Nessa mesma perspectiva, destaco o precedente: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. ABORDAGEM POLICIAL. TESE DE ILEGALIDADE. JUSTA CAUSA EVIDENCIADA. FUNDADAS SUSPEITAS DE OCORRÊNCIA DE CRIME PERMANENTE. AFASTAMENTO INVIÁVEL. PALAVRA DOS POLICIAIS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO. REVISÃO DO ENTENDIMENTO. REVOLVIMENTO PROBATÓRIO NECESSÁRIO. VIA INADEQUADA. 1. Para que a busca e apreensão sem mandado judicial seja legítima, é necessária a presença de justa causa, caracterizada por elementos concretos que indiquem fundadas suspeitas da situação de flagrante delito. 2. A existência de monitoramento prévio por seu setor de inteligência, bem como o fato de o agente ter fugido de abordagem no dia anterior, são circunstâncias aptas a evidenciar a presunção da ocorrência de crime permanente, legitimando a medida invasiva. 3. A palavra da autoridade policial, dotada de fé pública, só pode ser afastada mediante elementos concretos, devidamente demonstrados por prova pré-constituída. 4. A ausência de prova documental que confirme as alegações do agravante torna imprópria a discussão da matéria em habeas corpus, ação constitucional de rito célere e de cognição sumária. 5. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no RHC: 193642 SC 2024/0044385-8, Relator: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 10/06/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/06/2024) Em complemento, em que pese a quantidade de entorpecente apreendida não seja considerada substancial, a ré é reincidente específica, motivo pelo qual inaplicável o §4º do artigo 33, da Lei de Drogas. Como bem se sabe, o dispositivo legal ora invocado consubstancia a hipótese do denominado tráfico privilegiado, cuja finalidade é abrandar a pena do traficante que preencher os requisitos legais estabelecidos pelo legislador. Com efeito, a partir da redação legal acima disposta, pode-se concluir que para que o réu possa fazer jus ao benefício da diminuição, deverão estar presentes quatro requisitos cumulativos: (a) agente primário; (b) bons antecedentes; (c) não dedicação a atividades criminosas; (d) não integração de organização criminosa. Com relação aos dois primeiros requisitos estampados no dispositivo legal ora examinado (primariedade e bons antecedentes), estes se submetem a uma avaliação estritamente objetiva, pois basta verificar a certidão de antecedentes criminais do agente para chegar à conclusão se ele preenche ou não esses requisitos. No caso em questão, repito, entendo descabida a aplicação do art. 33, §4º da Lei n. 11.343/06, tendo em vista a reincidência da ré. Assim, não vislumbrando nos autos qualquer circunstância que exclua a ilicitude dos fatos ou que exclua ou diminua a culpabilidade da denunciada, pois era imputável, possuía plena consciência do ato delituoso que praticou e era exigível que se comportasse em conformidade com as regras do direito, a procedência da denúncia é medida de rigor. Por fim, considerando que o réu cometeu mais de uma conduta penalmente prescrita, com desígnios não convergentes, hei de reconhecer o concurso material de crimes, na forma do artigo 69, do Código Penal. 3 – DISPOSITIVO Diante do exposto e por tudo que consta dos autos, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na denúncia, ofertada pelo Ministério Público do Estado do Pará, para CONDENAR a ré ISABEL CRISTINA SANTOS MACIEL pelos crimes capitulados nos artigos 33, caput, da Lei 11.343/2006 e 50, da Lei de Contravenção Penal, na forma do artigo 69 do CP, com fundamento no artigo 387, do Código de Processo Penal. 4- DOSIMETRIA Passo à dosimetria da pena do crime de tráfico de drogas, atenta aos ditames do artigo 68 do Estatuto Repressivo e considerando as disposições do artigo 59 e seguintes do Código Penal, que elegeram o sistema trifásico para a quantificação das sanções aplicáveis ao condenado e a Súmula nº 23 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, publicada na Edição nº 6024/2016 - Quinta-Feira, 4 de agosto de 2016. "A aplicação dos vetores do art. 59 do CPB obedece a critérios quantitativos e qualitativos, de modo que, existindo a aferição negativa de qualquer deles, fundamenta-se a elevação da pena base acima do mínimo legal". Da culpabilidade: a culpabilidade da acusada não transborda os limites do delito em espécie; Dos antecedentes: a acusada ostenta duas sentenças transitadas em julgado (0000324-89.2013.8.14.0059 e 0004265-42.2016.8.14.0059) de modo que transporto uma delas para esta fase da dosimetria. Precedente: "evidenciada a presença de múltiplas reincidências, uma condenação pode ser usada para configurar a agravante e, as demais, como afirmação de maus antecedentes. Precedente." (HC n. 343.243/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 1º/12/2016, DJe de 14/12/2016). Da conduta social e da personalidade: não há informações nos autos que permitam a análise e valoração; Dos motivos: aparentemente comuns ao tipo penal; Circunstâncias do crime: neutras; Das circunstâncias do crime: são inerentes à espécie; Do comportamento da vítima: sendo a coletividade, não que lhe atribuir. A natureza e quantidade da substância entorpecente (art. 42 da Lei 11.343/2006) são fatores preponderantes no momento da dosimetria da pena, conforme previsto expressamente no artigo 42 da Lei n° 11.343/2006, e não militam em desfavor do acusado, face a pequena quantidade de droga encontrada. Assim, fixo a pena base para o delito do art. 33, caput, da Lei de Drogas em 06 (seis) anos e 03 (três) meses de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Não há circunstâncias atenuantes a relevar, entretanto, há a agravante da reincidência (artigo 61, I, do CP) a se aplicar, razão pela readéquo a pena para 07 (sete) anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa. Não há causa majorante e minorantes de pena, logo, torno-a definitiva. Passo agora a dosimetria da contravenção penal de jogo de azar. Sem maiores digressões acerca da metodologia de cálculo de pena e as circunstâncias judiciais que a permeiam, ratifico na integra os fundamentos de análise do artigo 59 e ss. do CP, já esposados, e assim fixo a pena-base do delito em comento em 04 (quatro) meses e 3 (três) dias de prisão simples e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa. A ré confessou a pratica delitiva avocado a incidência da atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal, porém, há que se considerar também a agravante do artigo 61, I, do CP. Desta feita, realizo a compensação entre a atenuante e a agravante, mantendo a pena no seu limite básico. Não há causas de aumento e de diminuição de pena, logo, a torno definitiva. Em razão do concurso de crimes, nos termos do artigo 69 do Código Penal e da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, procedo à soma das penas, totalizando a condenação da ré à pena de 07 (sete) anos, 06 (seis) meses e 17 (dezessete) dias de reclusão, e o pagamento e 565 (quinhentos e sessenta e cinco) dias-multa. Nesse aspecto, embora o quantum de pena definitivo tenha sido dosado em patamar inferior a 08 (oito) anos, considerando se tratar de réu reincidente, fixo o regime fechado para início de cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, § 2º, “b”, do Código Penal. Isso porque, o CP é claro ao afirmar que o acusado não reincidente condenado a pena inferior a 8 anos faz jus a iniciar o cumprimento no regime semiaberto. Logo, ao contrário senso, tratando-se de réu reincidente, o regime inicial de cumprimento deve ser o fechado. Ainda, não há como aplicar ao caso concreto o teor da Súmula 269 do STJ que dispõe ser admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais, pois desfavorável a circunstância judicial da culpabilidade (art. 59 do CP). Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PENAL. PENA INFERIOR A 4 ANOS. REGIME FECHADO. LEGALIDADE. RÉU REINCIDENTE E COM MAUS ANTECEDENTES. PRECEDENTES.1. Não obstante a pena do réu tenha sido fixada em 2 anos, 3 meses e 22 dias, de reclusão, pela prática do crime de contrabando, o Magistrado sentenciante reconheceu que, além de reincidente, possui o réu maus antecedentes. Sendo assim, escorreita a fixação do regime fechado, nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC 425.901/MS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 08/02/2018, DJe 19/02/2018) [...] REGIME INICIAL FECHADO. PENA INFERIOR A 4 ANOS. MAUS ANTECEDENTES. REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. SÚMULA 269/STJ. INAPLICABILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de ser possível a imposição do regime inicial mais gravoso para desconto da reprimenda penal ao réu reincidente e possuidor de maus antecedentes, ainda que a pena aplicada seja inferior a 4 anos. 2. Na hipótese, não há se falar em violação à Súmula 269/STJ, pois devidamente justificada a imposição do regime fechado. 3. Agravo a que se nega provimento (AgRg no AREsp 1183800/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe 15/12/2017) A teor dos arts. 44, II e III, do CP, incabível a substituição da pena por restritiva de direitos, em vista de reincidência delitiva e dos maus antecedentes da ré. De igual maneira, incabível a suspensão condicional da pena, conforme disposição expressa do art. 77, I, II e III, do CP. No caso em apreço, em que pese a ré ter sido presa preventivamente, deixo de aplicar a detração prevista no novel art. 387, § 2º o Código de Processo Penal (alterado pelo art. 2º da Lei n°. 12.736/2012), visto que o regime inicial não será modificado. E considerando que durante a instrução processual não foi apreciada nenhuma causa justificante para nova decretação da prisão preventiva, autorizo a ré a recorrer, caso queria, em liberdade. Deixo de aplicar o art. 387, IV do CPP em virtude de a matéria não ter sido debatida no curso do processo pelas partes, oportunizando a instauração de contraditório sobre o tema e garantindo a observância do princípio da ampla defesa e se trata de crime contra o Estado. Com base nos artigos 804 e 805 do Código de Processo Penal, deixo de condenar a sentenciada nas custas processuais, em virtude de se enquadrar na isenção legal, a teor dos artigos 34 e 35 da Lei de Custas do Estado do Pará (Lei Estadual nº 8.328, de 29/12/15). 5 - Em decorrência, cumpram-se as seguintes determinações: 5.1. Publique-se. Registre-se. Intimem-se; 5.2. Intime-se, pessoalmente, o representante do Ministério Público (art. 370, §4º, do CPP), a ré (art. 360 c/c. 370, ambos do CPP) e a defesa da acusada (CPP, art. 370, § 4º); 6 - Ocorrendo trânsito em julgado da sentença, adotar as seguintes providências: 6.1. Expeça-se mandado de prisão para início do cumprimento da pena e, comunicado o cumprimento, expeça-se a guia de recolhimento definitiva e encaminhe-se a VEP; 6.2. Determino à Autoridade Policial que efetue a destruição da droga apreendida, observando os artigos 50, § 3º e 72 da Lei nº11.343/2006. 6.3. Decreto o perdimento dos bens e valores apreendidos; 6.4. Ficam cassados os direitos políticos dos apenados enquanto durarem todos os efeitos desta sentença, como disposto no art. 15, III, da Constituição Federal, devendo ser comunicada esta sentença ao Tribunal Regional Eleitoral. 6.5. Comunique-se à Justiça Eleitoral e ao Instituto de Identificação de Belém/PA (CF/1988, art. 15, III e CPP, art. 809, § 3º); 6.6. Arquive-se, devendo a diligência ser certificada nos autos, aplicando-se o Provimento nº 012/2009-CJCI-TJPA. 6.7. Recolha a ré, no prazo de dez (10) dias, ao Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), através da guia correspondente, a multa que lhe foi aplicada, sob pena de converter-se em dívida de valor. CERTIFIQUE-SE nos autos e EXPEÇA-SE Certidão de Ausência de Pagamento e, na forma do artigo 51 do CP, REMETA-SE à Fazenda Pública cópia da Sentença Condenatória, da Certidão de Trânsito em Julgado e da Certidão de Ausência de Pagamento, para que a mesma seja convertida em dívida de valor e sejam aplicadas as normas relativas à dívida ativa da Fazenda Pública. Soure/PA, 01º de julho de 2025. RAFAELLA MOREIRA LIMA KURASHIMA JUÍZA DE DIREITO TITULAR DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE SOURE
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