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Resultados para "CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE INTELECTUAL" – Página 793 de 824
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Gloria A Maria Prado Sobrin…
OAB/RJ 158.966
GLORIA A MARIA PRADO SOBRINHO consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça como advogado.
ID: 324028136
Tribunal: TJPA
Órgão: Tribunal Pleno - Vice-presidência do TJPA
Classe: RECURSO ESPECIAL
Nº Processo: 0815044-88.2021.8.14.0401
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
YONE ROSELY FRANCES LOPES
OAB/PA XXXXXX
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PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO Nº 0815044-88.2021.8.14.0401 RECURSO ESPECIAL RECORRENTE: DOUGLAS VITÓRIO CARNEIRO REPRESENTANTE: YONE ROSELY FRANCÊS LOPES – OAB/PA 7.456 RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO D…
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Processo nº 0801524-75.2025.8.14.0060
ID: 308043221
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única de Tomé Açu
Classe: AUTO DE PRISãO EM FLAGRANTE
Nº Processo: 0801524-75.2025.8.14.0060
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JACIARA COSTA RODRIGUES
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE TOMÉ-AÇU Endereço: Av. 03 Poderes, nº 800, Centro, CEP 68.680-000, Tomé-açu/PA Contatos: Fone (91) 3727-1290 / 3727-105…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE TOMÉ-AÇU Endereço: Av. 03 Poderes, nº 800, Centro, CEP 68.680-000, Tomé-açu/PA Contatos: Fone (91) 3727-1290 / 3727-1059 / 9 8433-9031 – 1tomeacu@tjpa.jus.br AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE (280) PROCEDIMENTO: 0801524-75.2025.8.14.0060 REQUERENTE: DELEGACIA DE POLÍCIA CIVIL DE ACARÁ FLAGRANTEADO: KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS DEFESA: JACIARA COSTA RODRIGUES - OAB PA35838 INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ (MP/PA) DECISÃO EM REGIME DE PLANTÃO Comunica a autoridade policial a prisão em flagrante de KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS, pelo suposto cometimento delito do art. 157, § 2°, inciso II, e § 2°-A, inciso I, do Código Penal Brasileiro (roubo majorado pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma de fogo). Consta do boletim de ocorrência policial registrado pela vítima, in verbis: "A relatora, funcionária do posto de gasolina Premium, informa que no dia 23/06/2025, por volta das 14h00, ao chegar para iniciar seu turno de trabalho no referido posto, localizado em frente à Irriga Agro e próximo ao hospital, dirigiu-se ao escritório, situado na parte de trás do posto. QUE ao se aproximar do local, avistou uma mulher próxima ao posto, mas não deu importância, pois é comum haver pessoas diferentes nas imediações. A relatora não conhecia a referida mulher, mas descreve-a como sendo de pele branca, um pouco gorda, vestindo um macacão verde de cabelo de cor vermelha. QUE ao chegar à porta do escritório - que abre por reconhecimento facial - a relatora posicionou-se para ser reconhecida pelo sensor. Quando a porta foi aberta, foi surpreendida por um empurrão, vindo da mesma mulher que havia visto anteriormente. A relatora, sem entender o que estava acontecendo, questionou a mulher, que não respondeu, apenas sacou um celular e disse, em voz alta: "Tô aqui dentro". QUE nesse momento, a relatora compreendeu que se tratava de uma ação criminosa e correu para a área das bombas de gasolina, onde ficam os frentistas Luan Martins Gomes, Heverton Luna Maragalhães da Costa e Vitoria Freitas. Ao chegar, pediu para que ligassem imediatamente para Mateus, gerente do posto, solicitando com insistência que viesse o mais rápido possível. QUE poucos minutos depois, a mesma mulher que invadiu o escritório apareceu correndo até a relatora e tentou puxar o celular de sua mão. A relatora resistiu e conseguiu manter o aparelho. QUE logo em seguida, dois homens em uma motocicleta modelo POP 100, de cor vermelha (demais informações não foram identificadas), chegaram ao local. Ambos desceram da moto e renderam todos os presentes. Um dos criminosos abordou a relatora com uma arma de fogo, aparentemente um revólver, e exigiu dinheiro. QUE sob ameaça, a relatora indicou uma caixa próxima às bombas de gasolina, mas o criminoso respondeu: "Eu quero o que tá lá dentro", referindo-se ao escritorio. Ele a levou até o local sob a mira da arma. Ao entrarem no escritório, ordenou que ela abrisse o cofre. O meliante retirou três caixas contendo o dinheiro referente aos dias de sexta-feira, sábado e domingo (a relatora não soube informar o valor exato). QUE os demais funcionários mencionados também foram levados ao escritório pelo segundo criminoso. Após recolherem o dinheiro, os dois homens e a mulher fugiram do local. A relatora estava muito nervosa e não conseguiu identificar a direção da fuga, tampouco fornecer mais detalhes sobre os assaltantes. Informou ainda que, no mesmo dia (23/06/2025), estava previsto que o gerente Mateus recolhesse o dinheiro por volta das 12h00, o que não ocorreu. Após o ocorrido, a relatora comunicou imediatamente seu superior sobre o assalto. INFORMA, NO PRESENTE BOLETIM DE OCORRÊNCIA, QUE, EM RAZÃO DE UMA FALTA DE ENERGIA NA UNIDADE POLICIAL, NÃO FOI POSSÍVEL REGISTRAR A OCORRÊNCIA MAIS CEDO. Registra-se para as devidas providências" Ainda, consta do boletim de ocorrência registrado pelo Oficial condutor: "O Relator acima qualificado informa que, por volta das 14h30min do dia 23 de junho de 2025, a guarnição VTR 8772, da Polícia Rodoviária Estadual, composta pelo 2º Sargento Teixeira, 3º Sargento Nascimento e Cabo Waldeci, com apoio das viaturas VTR 3122 e VTR 030, ambas da 3ª Companhia - Acará, compostas pelo 2° Sargento Reis, 3º Sargento M. Assunção, Cabo Edgar e Soldado Freitas, bem como da VTR 3121 - Guarum, composta pelo 2º Sargento Silva Miranda e Cabo Almeida, foram acionadas em razão de ocorrência de roubo perpetrado no município de Tomé-Açu/PA, especificamente no estabelecimento comercial Posto Premium, situado na Rodovia PA-256, próximo à SESPA, Bairro Tucano, Distrito de Quatro Bocas, naquele município. Cumpre registrar que, até o presente momento, não foi possível a formalização do correspondente Boletim de Ocorrência Policial referente ao fato do roubo, tendo em vista a ausência de energia elétrica na Delegacia de Polícia do Distrito de Quatro Bocas - município de Tomé-Açu/PA, o que impossibilitou o registro imediato do referido procedimento. Segundo informações preliminares, os autores do delito teriam se evadido do local em um veículo Renault/Kwid, cor branca, placa QVB3A93, deslocando-se em direção ao município de Acará/PA, trafegando pelo ramal do KM 14. Diante das informações, as guarnições deslocaram-se para a região indicada com o objetivo de localizar e interceptar os suspeitos. Durante as diligências, ao transitarem pelo ramal do KM 14, nas proximidades da Fazenda Paraná, visualizaram o veículo com as características informadas. Procederam, então, à devida abordagem, determinando ordem legal de parada aos ocupantes do automóvel, a qual não foi obedecida. Na sequência, quatro indivíduos abandonaram o veículo e empreenderam fuga adentrando a área de mata. Já no interior da vegetação, mesmo após nova ordem de rendição verbalizada pelos policiais, os suspeitos passaram a efetuar disparos de arma de fogo em direção às guarnições, caracterizando injusta agressão e iminente risco à integridade física dos agentes públicos. Diante da situação, foi necessário o emprego proporcional e moderado da força letal: O 3º Sargento Nascimento efetuou 07 (sete) disparos com o fuzil PARAFAL calibre 7,62mm, número de série AJA06733, patrimônio PMPA 59.763, bem como 10 (dez) disparos com a pistola Beretta, modelo APX, número de série AA153306B, patrimônio PMPA; O Cabo Waldeci efetuou 10 (dez) disparos com a pistola Beretta, modelo APX, número de série AA153261B, patrimônio PMPA. Um dos agressores foi atingido. Imediatamente, a guarnição prestou socorro ao indivíduo alvejado, conduzindo-o ao Hospital Municipal de Acará/PA, onde foi atendido pela equipe médica de plantão, sendo constatado o óbito. Em ato contínuo, ao se aproximarem do veículo Renault/Kwid, os policiais localizaram uma nacional, posteriormente identificada como KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS, a qual informou que o nacional alvejado tratava-se de TAYLES CASSIANO MATOS DOS SANTOS. Posteriormente, foram repassadas às equipes policiais imagens de câmeras de segurança do Posto Premium, as quais evidenciam a participação de KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS na execução do roubo, confirmando sua vinculação direta à empreitada criminosa. Em razão dos fatos, a nacional KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS foi conduzida e apresentada nesta Unidade Policial, juntamente com os objetos apreendidos na ocasião, consistentes em: 01 (um) aparelho celular marca Samsung, cor branco metálico: 01 (um) aparelho celular marca Samsung, cor preta, com capa de proteção transparente, IMEI: 355824558877951 e IMEI: 357623898877954; 01 (um) aparelho celular marca Motorola, cor preta, com avarias na tela e capa de proteção na cor verde militar: 01 (um) aparelho celular marca Motorola, modelo Moto G04s, cor roxa, com capa de proteção com detalhes brilhantes; 01 (uma) máquina de cartão de crédito/débito da empresa "Mercado Pago": 01 (um) cartão de crédito do banco Next; 01 (um) cartão de crédito Credicard, em nome de Edilane ARV Mato; 01 (uma) Carteira Nacional de Habilitação (CNH) nº 04349140289, em nome de TAYLES CASSIANO MATOS DOS SANTOS: 01 (um) veículo Renault/Kwid, cor branca, placa QVB3A93. Durante as diligências de busca e apreensão realizadas no interior do referido veículo Renault/Kwid, foi constatado que não havia qualquer quantia em dinheiro no seu interior. Adicionalmente, foram realizadas buscas minuciosas nas imediações da área de mata com o objetivo de localizar a arma de fogo utilizada pelos criminosos durante a agressão, entretanto, até o presente momento, não foi possível sua localização. Ressalta-se que os policiais ouviram disparos oriundos da vegetação, porém, em razão da baixa visibilidade, não foi possível identificar com precisão qual dos indivíduos estaria fazendo uso da arma de fogo no momento da injusta agressão. Ressalta-se ainda que, após consulta realizada junto ao sistema INFOPEM, foi constatado que o nacional TAYLES CASSIANO MATOS DOS SANTOS já possuía registro anterior, sob o nº 106697. Registre-se para os devidos fins" Analisados os autos, entendo que o flagrante está revestido dos pressupostos previstos no art. 302, III, do Código de Processo Penal e das formalidades exigidas pelos arts. 304 e 306 do mesmo diploma legal. No mais, foram cumpridas as formalidades legais previstas no CPP e na lei nº 11.343/06, como oitiva do condutor, das testemunhas e do flagranteado, expedição de nota de culpa e de ciência das garantias constitucionais e comunicação à família do preso. Ainda, vejo que foi lavrado o devido Auto de exibição e apreensão de objeto e Termo toxicológico de constatação provisório. Consta dos autos, ainda, laudo de exame de corpo de delito realizado o flagranteado. Assim, HOMOLOGO O AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE. * * * A Autoridade Policial representa pela prisão preventiva da indiciada, bem como pela autorização para quebra de sigilo telefônico e extração de dados dos aparelhos celulares apreendidos. Em um primeiro momento, cumpre asseverar que são dois os requisitos necessários para a decretação de uma medida cautelar de natureza pessoal – gênero do qual é espécie a prisão preventiva – quais sejam: (i) Arcabouço probatório mínimo da ocorrência do delito e de sua autoria, cuja constatação se dá pela existência a prova da materialidade delitiva e de indícios mínimos de que o sujeito sobre o qual recairá a medida cautelar seja o autor do delito (fumus comissi delicti); e (ii) Periculum libertatis, constatado quando houver necessidade, vislumbrada no caso concreto, de que o agente deve ter sua liberdade restrita, a fim de garantir a ordem pública, a ordem econômica, a regular instrução processual e, por fim, a aplicação da lei penal. Os requisitos acima indicados estão previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal, sendo que, quando vislumbrada a ocorrência daqueles, torna-se legítima a segregação preventiva. No caso em tela, entendo que não se mostra cabível a aplicação da prisão preventiva, devendo ser indeferido o pedido da Autoridade Policial, uma vez que, ao meu sentir, não estão presentes os requisitos autorizadores da medida descritos no artigo 312 do CPP. Importa anotar, também, que a flgaranteado, jovem e mãe, não responde a outros procedimentos criminais ou ações penais, a indicar, em uma análise prima facie, que não se dedica a atividades criminosas. Importa destacar que a prisão preventiva deve ser utilizada apenas como ultima ratio do Direito Criminal atual. Desta maneira, com fundamento no art. 319 do CPP, determino a liberdade provisória de KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS, fixando, porém, em razão do fumus comissi delicti, as seguintes MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO: 1) Deve o flagranteado/afiançado comparecerem Juízo, todas as vezes que for intimado para atos do processo; 2) O flagranteado/afiançado não poderá mudar de residência ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem prévia autorização judicial; 3) O flagranteado deve comparecer em juízo mensalmente para justificar suas atividades, devendo apresentar comprovante de residência atualizado; 4) O flagranteado deve recolher-se em sua residência de 21h às 5h, diariamente, inclusive nos dias de folga. * * * Quanto ao pedido de QUEBRA DE SIGILO TELEFÔNICO E AUTORIZAÇÃO PARA ACESSO E EXTRAÇÃO DE DADOS, analisando os autos e os documentos/elementos apontados na inicial, entendo que estão preenchidos os requisitos necessários para o deferimento das medidas requeridas pela Autoridade Policial. Ao meu sentir, considerando a investigação desenvolvida pela polícia judiciária até o presente momento, há indícios suficientes de prática do crime de roubo majorado pelo concurso de pessoas e uso de arma de fogo, conforme descrito na peça de representação, sem ignorar o fato de que haviam aparentemente muitas outras pessoas na empreitada criminosa (que empreenderam fuga), que há notícias de que a flagranteada pode ser vinculada a organização criminosa e que os valores subtraídos não foram recuperados. A medida, por tanto, visa a obtenção de provas dos crimes investigados, forma de organização e, até mesmo, a ligação entre o investigado e terceiros, bem como informações acerca de outros delitos relacionados ao objeto da investigação. A medida pleiteada também se faz necessária como forma de resguardar a prova desses atos, ante o risco concreto de que possam ser mesmo destruídas, em prejuízo à persecução penal (especialmente quando se fala de dados eletrônicos, que podem ser facilmente eliminados/apagados, inclusive remotamente). É certo que possuem proteção constitucional os dados e comunicações telefônicas, nos termos do art. 5º, XII. O regramento, porém, possui previsão de excepcionalidade, a medida em que se permite o afastamento da regra do sigilo por determinação judicial (por se tratar de reserva da jurisdição) no interesse da persecução penal. Importante destacar que, conforme entendimento jurisprudencial[1], na pressuposição do comando de apreensão de aparelho celular ou smartphone está o acesso aos dados que neles estejam armazenados (sob pena de a busca e apreensão resultar em medida vazia, pois um aparelho desprovido de conteúdo simplesmente não ostenta virtualidade de ser utilizado como prova criminal). No caso em análise, cumpridos os requisitos legais previstos, em especial, pelo Código De Processo Penal, em seus artigos 240 e ss, entendo que a medida requerida é pertinente e merece acolhimento. CONCLUSÃO: Isto posto, acolho parcialmente a Representação da autoridade policial e INDEFIRO O PEDIDO DE PRISÃO PREVENTIVA DE KETLEN CAROLAYNE DA SILVA CAMPOS, aplicando-lhe as MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO: 1) Deve o flagranteado/afiançado comparecerem Juízo, todas as vezes que for intimado para atos do processo; 2) O flagranteado/afiançado não poderá mudar de residência ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem prévia autorização judicial; 3) O flagranteado deve comparecer em juízo mensalmente para justificar suas atividades, devendo apresentar comprovante de residência atualizado; e 4) O flagranteado deve recolher-se em sua residência de 21h às 5h, diariamente, inclusive nos dias de folga. Expeça-se o competente ALVARÁ DE SOLTURA para que o flagranteado seja posto em imediata liberdade, salvo se por outro motivo deva permanecer preso, bem como o termo de compromisso das medidas cautelares acima impostas. Expeça-se CARTA PRECATÓRIA à comarca de Belém/PA, ao juízo da vara de inquéritos policiais, para fins de acompanhamento e fiscalização da medida (3), pelo prazo de 1 ano. DEFIRO O PEDIDO DE IMEDIATO ACESSO E EXTRAÇÃO DE DADOS E CONTEÚDOS armazenados em dispositivos eletrônico-informáticos apreendidos durante a diligência do flagrante (um aparelho celular marca Samsung, cor branco metálico; um aparelho celular marca Samsung, cor preta, com capa de proteção transparente, IMEI: 355824558877951 e IMEI 357623898877954; um aparelho celular marca Motorola, cor preta, com avarias na tela e capa de proteção na cor verde militar; e um aparelho celular marca Motorola, modelo Moto G04s, cor roxa, com capa de proteção com detalhes brilhantes), bem como acesso das comunicações privadas neles ou por intermédio deles armazenadas, que englobam, primordialmente, aquelas constantes dos aplicativos “whatsapp”, “facebook”, “instagram” entre outros aplicativos de conversação e redes sociais, além do acesso aos arquivos, galeria de fotos, vídeos e agenda telefônica, conteúdos de mídia, mensagens instantâneas, áudios enviados e recebidos, bem como qualquer outro elementos de informação de interesse da investigação armazenados no dispositivos apreendidos ou por intermédio dele acessível na internet, nuvens (“cloud”), ou qualquer outra ferramenta de armazenamento remoto de dados, devendo o Investigado/usuário promover o desbloqueio dos aparelhos e fornecer as senhas dos referidos e aplicativos, conforme forem solicitados pela Autoridade Policial. A autoridade policial representante deverá apresentar nos presentes autos, sob sigilo, o competente relatório/laudo final de extração de dados e informações colhidas e/ou periciadas nos aparelhos apreendidos no prazo máximo de 30(trinta) dias após o cumprimento da diligência. A perícia/extração de dados poderá ser realizado pelo Centro de Perícias Cientificas Renato Chaves, pelos peritos da PC/PA lotados na unidade local, pela Diretoria Estadual de Combate a Crimes Cibernéticos ou pelo Núcleo de Inteligência Policial (NIP) da PC/PA. Oficie-se a Autoridade Policial Representante, encaminhando o(s) mandado(s) necessários, e dando-lhe ciência desta decisão. A autoridade policial deve apresentar nestes autos o IPL devidamente finalizado, dentro do prazo de lei. Cumpre salientar, por fim, que a audiência de custódia deixa de ser realizada no caso em análise uma vez que foi concedida liberdade provisória ao Investigado, pelo que vislumbro a perda do objeto do ato. Intime-se o Flagranteado sobre a presente decisão. Ciência/intime-se o MP/PA. Ciência/intime-se a defesa constituída ou, não havendo, à DPE/PA. Registrem-se os bens apreendidos e não restituídos no SNGB(id 146975168, pg. 04) Registre-se no BNMP, com a expedição das peças necessárias ao caso, se houver necessidade. Intime-se. Cumpra-se. Expeça-se o necessário. Tomé-Açu/PA, data registrada pelo sistema. IRAN FERREIRA SAMPAIO Juiz de Direito [1] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). QUINTA TURMA. RHC 75.800-PR, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 15/9/2016, DJe 26/9/2016.
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Processo nº 0800342-90.2022.8.14.0082
ID: 262409708
Tribunal: TJPA
Órgão: Termo Judiciário de Colares
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 0800342-90.2022.8.14.0082
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CAIO JOSE CAVALLEIRO DE MACEDO FERRAZ
OAB/PA XXXXXX
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ATILA CAVALCANTE PEREIRA
OAB/PA XXXXXX
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE VIGIA DE NAZARÉ Avenida Barão do Guajará, nº 1140, Castanheira, CEP 68780-000 Fones: (91) 3731-1444 [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Ind…
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE VIGIA DE NAZARÉ Avenida Barão do Guajará, nº 1140, Castanheira, CEP 68780-000 Fones: (91) 3731-1444 [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas] 0800342-90.2022.8.14.0082 AUTOR: DELEGACIA DE POLÍCIA CIVIL DE COLARES Nome: DELEGACIA DE POLÍCIA CIVIL DE COLARES Endereço: AV DR. JUSTO CHERMONT, SN, AO LADO DO FORUM, CENTRO, COLARES - PA - CEP: 68785-000 REU: MARCUS VINICIOS DA SILVA Nome: MARCUS VINICIOS DA SILVA Endereço: São Cristóvão, s/n, Próximo ao pet do Renan, Central, COLARES - PA - CEP: 68785-000 SENTENÇA Vistos, etc. 1. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Pará denunciou MARCUS VINICIOS DA SILVA, brasileiro, natural de Santo Antônio do Tauá/PA, nascido em 22/10/2003, filho de Waltiane Mendonça da Silva, RG 7441759, residente na rua São Cristóvão, próximo ao peto shop do Renam, Comunidade da Fazenda, Colares/PA, decorrente da suposta prática delitiva alinhavada no art. 33 da Lei 11.343/2006. A denúncia narra que “no dia 26/11/2022, na PA 238, entrada do município de Colares, MARCUS VINICIOS DA SILVA, com consciência e vontade, trazia consigo, sem autorização legal ou regulamentar, drogas ilícitas, consistentes em 1600g (um quilograma e seiscentos gramas de maconha e 40 gramas de pó de cocaína, conforme Auto de Constatação Provisório de Substância de Natureza”. Ao final, requereu a citação do denunciado e intimação para oferecer defesa preliminar e o prosseguimento do processo em seus ulteriores termos, até a condenação final, incorrendo nas penas do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. Arrolou testemunhas. Recebimento da denúncia em 17/06/2024. Audiência de Instrução e Julgamento realizada em 23/04/2025. No ato foram colhidos os depoimentos das testemunhas de acusação DÍLSON HENRIQUE GOMES CHAGAS e DONATO ALVES DOS SANTOS BESSA. Em seguida, o réu foi interrogado. Por fim, o Ministério Púbico apresentou alegações finais e requereu a procedência do pedido condenatório e a Defesa pugnou pela absolvição. Laudo Toxicológico acostado aos autos, com conclusão positiva para 45,318 g (quarenta e cinco gramas, trezentos e dezoito miligramas) de cocaína e 1,708 kg (um quilo, setecentos e oito gramas) de maconha. Vieram os conclusos. É O RELATO. DECIDO. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. DAS PROVAS PRODUZIDAS NA FASE PROCESSUAL 2.1.1. DA SÍNTESE DOS DEPOIMENTOS COLHIDOS EM JUÍZO DÍLSON HENRIQUE GOMES CHAGAS, testemunha de acusação, narrou que estava fazendo uma operação de rotina e que ao adentrar na van, percebeu o nervosismo do acusado e que ele, apesar de inicialmente nega, depois disse que determinada mochila era sua. Disse que dentro da mochila tinha drogas e que o réu não soube afirmar quem lhe entregou a mochila, para quem ela estava sendo transportada, mas que teria dito que receberia R$500,00 (quinhentos reais) por ela. Aduziu que dentro da mochila apreendida sob a posse do denunciado tinha maconha e cocaína. A testemunha de acusação DONATO ALVES DOS SANTOS BESSA, policial militar, asseverou que receberam denúncia de drogas estavam entrando na cidade, sendo transportadas através de vans. Fronte ao exposto, os policiais fizeram uma operação para abordagens de vans, quando pararam determinada van. Ao solicitar que as pessoas descessem da van, o réu teria descido com uma mochila que não era dele, de maneira que a proprietária acusou a situação. Neste momento, o réu devolveu a mochila em questão e pegou outra que estava dentro do veículo abordado, e dentro dela estava um tablete de maconha e uma porção de cocaína. 2.1.2. DA VERSÃO DO RÉU O réu asseverou que estava com a mochila que continha drogas, mas que ela não era sua, que pertencia a uma mulher que o abordou na parada das vans em Castanheira, e pediu que ele a transportasse para Colares/PA, em troca de R$500,00 (quinhentos reais). Afirmou que não sabia o que tinha dentro da mochila. Asseverou que iria entregar a mochila para uma pessoa que o estaria esperando em Colares/PA. Alegou que disse aos policiais que a mochila era sua e que a pessoa que lhe entregou era conhecida de vistas. 2.2. DA ANÁLISE DAS PROVAS 2.2.1. DA MATERIALIDADE Inexistindo preliminares arguidas ou nulidades a serem declaradas de ofício, passo ao exame do mérito. Ao réu é imputada a conduta prevista no art. 33 da Lei nº 11.343/2006, motivo pelo qual passo a analisar se estão presentes a materialidade e a autoria. Prevê o art. 33 da Lei nº 11.343/2006: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas; II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas; III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. IV - vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente”. Compulsando as provas, observa-se que no laudo acostado ao feito consta resultado positivo para maconha e cocaína. A substância Benzoilmetilecgonina, vulgarmente chamada de COCAÍNA, encontra-se relacionada na Lista de Substâncias Entorpecentes de Uso Proscrito no Brasil (Lista F1), assim como a substância Delta 9-Tetrahidrocanabinol (T.H.C.), conhecida por MACONHA, encontra-se relacionada na Lista de Plantas Proscritas que Podem Originar Substâncias Entorpecentes e/ou Psicotrópicas (Lista E), de modo que são consideradas capazes de causar dependência física e/ou psíquica, de acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 277, de 16 de abril 2019, que dispõe sobre a atualização do Anexo I (Listas de Substâncias Entorpecentes, Psicotrópicas, Precursoras e Outras sob Controle Especial) da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998. Portanto, é incontestável que o material apreendido se trata de entorpecente ilícito e que resta comprovada a materialidade. 2.2.2. DA AUTORIA Quanto à autoria, conforme afirmado pelas testemunhas de acusação, o material entorpecente fora apreendido em posse do réu, que alegou que transportava a mochila para a cidade de Colares/PA, mas que não sabia o que tinha dentro. É pacífico o entendimento de que aos depoimentos das testemunhas policiais deve ser dada devida credibilidade, logo que foram prestados em juízo sob o crivo do contraditório do denunciado, não tendo sido apresentada prova contrária ao termo de apreensão da droga apreendida. Neste sentido é jurisprudência do nosso Tribunal de Justiça do Pará: APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. INCIDÊNCIA DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. IMPOSSIBILIDADE. DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS. 1 – Verifica-se dos autos que policiais realizam diligência na Avenida Paralela quando viram uma moto na qual estava o acusado e outro sujeito não identificado. Ao perceberem a aproximação da viatura, os indivíduos fugiram para o bairro da Paz, iniciando-se a perseguição. Os agentes de segurança avistaram quando o acusado entrou numa residência e jogou para longe um saco plástico, tendo sido o réu preso logo em seguida. O saco foi revistado, encontrando-se as substâncias entorpecentes (crack e a cocaína). 2 – A MATERIALIDADE e AUTORIA do apelante na prática delitiva foram comprovadas pelo auto de prisão em flagrante de fls. 06/07; pelo auto de exibição e apreensão das drogas de fls. 15; pelos laudos periciais de fls. 36 e 102; além de toda a prova oral produzida, tanto na fase policial quanto em juízo. 3 – A rigor, é desnecessária a visualização da mercancia para consumação do delito do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 (crime de ação múltipla), de modo que a só realização de uma das condutas descritas no tipo já é suficiente para a condenação. 4 - No caso, é notória a ausência dos requisitos legais para aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006. Apesar de não ser reincidente, o réu responde a outros processos criminais, conforme aponta a lista de processos de fl. 60, a indicar a sua dedicação às atividades criminosas. Além disso, como bem destacou o Magistrado, um dos processos aos quais o acusado responde é por delito praticado por Organização Criminosa, reforçando ainda mais inviabilidade de aplicação do benefício. 5 – Recurso conhecido e improvido. (TJ-BA - APL: 05246922720198050001, Relator: CARLOS ROBERTO SANTOS ARAÚJO, SEGUNDA CAMARA CRIMINAL - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: 11/08/2020) (grifei) APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. INVIABILIDADE DO PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. Não há que se falar em absolvição ou desclassificação da conduta atribuída ao réu, quando o conjunto probatório formado pelo inquérito policial e pela prova jurisdicionalizada é idôneo, consistente e uniforme quanto à materialidade do fato e à autoria delitiva para o crime de tráfico ilícito de drogas, praticado pelo apelante. 2 - As palavras dos policiais que participaram da ação, colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa e estando coerentes e harmônicas entre si e em relação ao contexto probatório, se revestem de credibilidade e são aptas a dar suporte ao édito condenatório. 3 - O pleito desclassificatório, não pode ser justificado somente pela condição de usuário do réu, não sendo incomum a pratica do tráfico com a finalidade de manter o vício. DOSIMETRIA. PENA-BASE. Ainda que seja constatado eventual equívoco na análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, tendo sido a pena base fixada em seu mínimo legal, é de se manter a reprimenda de piso, conforme estipulada. 4 - Deve ser mantida a fração redutora de 1/5 (um quinto) estipulada na origem, pelo reconhecimento da causa de diminuição constante do § 4º do artigo 33 da Lei n. 11.343/2006, porquanto fixada com a devida fundamentação e sem descurar da quantidade da droga apreendida. Parecer ministerial acolhido. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - APR: 899256920178090168, Relator: DES. JOAO WALDECK FELIX DE SOUSA, Data de Julgamento: 22/11/2018, 2A CAMARA CRIMINAL, Data de Publicação: DJ 2663 de 10/01/2019) (grifei) APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06). ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. INCABÍVEL. DEPOIMENTOS DE POLICIAIS. VALIDADE PROBATÓRIA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1- A defesa inconformada com a decisão recorre, para que, com fundamento de insuficiência de provas, o Magistrado teria condenado o Apelante, não tendo indícios para tal, pois a sentença havia sido embasada somente pelos depoimentos das testemunhas, colhidos nos autos; 2- O argumento da defesa é inócuo, entendendo o juízo ad quem como suficiente as provas atestadas, quais sejam o Auto de Apresentação e Apreensão (fl.07), o Laudo de Toxicológico de Constatação (fl. 08) e Laudo Toxicológico Definitivo (fl. 54/55), bem como os depoimentos das testemunhas (fl.50/51), motivos pelos quais levam a concluir a autoria do Apelante na atividade delitiva; 3- Os depoimentos dos policiais que participam da prisão do acusado têm valor probatório como de qualquer outra testemunha, salvo quando restar comprovado seu interesse no deslinde da causa; 4- Ademais, a conduta da Apelante restou plenamente evidenciada nos autos, porquanto foram encontradas com o mesmo aproximadamente 118g (cento e dezoito) gramas da substância conhecida como maconha, sacos plásticos que serviriam de embalagem para a comercialização da droga, e a quantia de R$ 237,85 (duzentos e trinta e sete reais e oitenta e cinco centavos); 5- Mediante isso, não merece prosperar o argumento da defesa, posto que há um conjunto probatório corroborante e suficiente para ensejar a condenação do acusado; 6- Recurso conhecido e não provido.” (TJ-PA, Relator: NADJA NARA COBRA MEDA - JUIZA CONVOCADA, Data de Julgamento: 07/10/2014, 1ª CÂMARA CRIMINAL ISOLADA) (grifei) Sublinhe-se que não há nos autos qualquer indício de que os policiais militares possuíssem interesse em prejudicar o acusado, seja por inimizade ou qualquer outra razão. Ademais, saliente-se que eventuais divergências em relação aos detalhes da ação não têm o condão de desacreditar os depoimentos prestados em Juízo, quando a essência do fato principal for preservada. Fronte ao exposto, tendo os agentes de segurança pública afirmado em juízo que realizaram a apreensão do material com o denunciado, é inconteste que os itens expostos no termo de exibição e apreensão estavam sob a posse dele. Deve ser destacado que o crime de tráfico de entorpecentes é de ação múltipla ou de conteúdo variado, que se consuma com a realização de qualquer uma das condutas descritas no tipo penal, desde que a droga não seja destinada ao consumo próprio. A simples alegação de uso de drogas não descarta, por si só, o crime de tráfico, tendo em vista que o uso não exclui a possibilidade de venda. Importante frisar que para ser considerado traficante não é necessário efetivar pessoalmente a conduta de venda, podendo participar de qualquer etapa da cadeia de produção, armazenamento e da circulação de drogas, que fazem parte do crime de tráfico de entorpecentes. Assim, não é indispensável que o agente seja preso no ato da mercancia ou após vender a droga, uma vez que o delito se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos trazidos pelo tipo penal, não se exigindo efetivo ato de comercialização da droga. Extraem-se dos autos elementos probatórios que evidenciam prática do comércio de entorpecentes pelo acusado, fronte a quantidade e natureza da droga apreendida. Assim, diante do contexto probatório, está suficientemente comprovada a atividade de tráfico de drogas por parte do denunciado, devendo ele ser condenada pela prática do crime de tráfico de entorpecentes, previsto na Lei 11.343/2006, não sendo possível a desclassificação do crime em questão para aquele previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2006. Alhures, no que concerne a possibilidade de reconhecer a conduta da ré como tráfico privilegiado, que reduz a pena aplicada, nos termos do art. 33, §4º, da lei 11.343/06, é necessário fazer algumas considerações. O art. 33, §4º, da Lei 11.343/2006 prevê a redução da pena, desde que o agente seja primário, possua bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas ou integre organização criminosa, requisitos que devem ser preenchidos de forma cumulativa. Verifica-se que o réu é primário. Outrossim, não há nos autos informação de que o denunciado se dedique a atividades criminosas ou integrem organização criminosa, de maneira que a quantidade de droga apreendida e sua natureza não podem servir, isoladamente, como impeditivo para a concessão do benefício legal previsto no artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06. As jurisprudências a seguir sustentam o referido posicionamento: PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004677-71.2017.8.11. 0042 APELANTE: LEONDAS ALMEIDA DE JESUS APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO EMENTA APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – CONDENAÇÃO – PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO ANTE A AUSÊNCIA DE PROVAS – IMPOSSIBILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO INDISCUTÍVEIS – CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO IDÔNEO – DEPOIMENTO FIRME E COESO DOS POLICIAIS MILITARES – EVIDENTE ENVOLVIMENTO COM A MERCANCIA DE ENTORPECENTE – RECURSO DESPROVIDO, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL – RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA MINORANTE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – ACUSADO QUE PREENCHE OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA BENESSE – READEQUAÇÃO DO QUANTUM DA PENA – REGIME INICIAL ALTERADO PARA O ABERTO. A inverossimilhança da versão apresentada pelo acusado sobre a origem e a propriedade da droga, aliado às inúmeras contradições apuradas no bojo dos autos, não podem ser consideradas para fins de absolvição, máxime quando a autoria do delito de tráfico de drogas está demonstrada de modo irrefutável pelos depoimentos coerentes e harmônicos dos policiais que efetuaram a prisão e a apreensão da substância entorpecente. “A negativa da minorante do tráfico privilegiado com fundamento em condenação por fato posterior ao apurado nos presentes autos constitui flagrante violação ao art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06” ( AgRg no AREsp 1899869/SP, Rel. Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), SEXTA TURMA, julgado em 23/11/2021, DJe 29/11/2021). Sendo o réu primário, de bons antecedentes e não havendo prova concreta de que se dedica à atividade criminosa nem integra organização criminosa, o reconhecimento do tráfico privilegiado é medida impositiva, nos termos do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006. (TJ-MT 00046777120178110042 MT, Relator: ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Data de Julgamento: 01/03/2022, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 04/03/2022) (grifei) APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. Art. 33, caput, da Lei 11.343/06. Sentença condenatória. Irresignação da defesa. Mérito. Autoria e materialidade devidamente evidenciadas nos autos, sendo incabível a absolvição ou a desclassificação para a conduta tipificada no art. 28 da mesma lei especial. Dosimetria. Afastada a agravante prevista no art. 61, II, j, do CP. Precedentes do STJ e deste Tribunal. Tráfico privilegiado. Cabimento. Preenchimento dos requisitos legais objetivos e subjetivos a justificar o enquadramento da conduta na figura do tráfico privilegiado, já que o réu é primário, não possui maus antecedentes, não se dedica à atividade criminosa e nem integra qualquer organização ou associação para o tráfico. Ato infracional que não pode ser usado como elemento caracterizador da dedicação do agente a atividades delituosas, até porque cometido pelo réu quase três anos antes dos fatos ora apurados. Precedentes do STJ e do STF. Regime inicial aberto e substituição por penas restritivas de direito. Possibilidade. Requisitos legais preenchidos. Ausência de hediondez no tráfico privilegiado, que, de qualquer forma, não impediria a fixação do regime aberto e nem a substituição por penas alternativas. Sentença reformada em parte. Recurso parcialmente provido. (TJ-SP - APR: 15004396020208260575 SP 1500439-60.2020.8.26.0575, Relator: Marcelo Semer, Data de Julgamento: 03/03/2022, 13ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 03/03/2022) (grifei) TRÁFICO DE ENTORPECENTES - RECURSO MINISTERIAL – PLEITO PELO AFASTAMENTO DA CAUSA de diminuição de pena PREVISTA NO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/06 – IMPOSSIBILIDADE – DEDICAÇÃO À ATIVIDADE E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NÃO COMPROVADOS – ATUAÇÃO DO APELADO COMO “MULA DO TRÁFICO” - TRANSPORTE DE GRANDE QUANTIDADE DE DROGA, POR SI SÓ, NÃO AFASTA O BENEFÍCIO CONCEDIDO – OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA DEVOLUTIVIDADE – MANUTENÇÃO DA FUNDAMENTAÇÃO NA PRIMEIRA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA QUANTO A QUANTIDADE DOS ENTORPECENTES e, na terceira fase, utilização da natureza e diversidade das drogas para PERMANECER o patamar de 1/6, AFASTANDO-SE O BIS IN IDEM - MANUTENÇÃO DA R. SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO A QUE SE nega PROVIMENTO. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0000364-64.2020.8.16.0061 - Capanema - Rel.: DESEMBARGADOR MARCUS VINICIUS DE LACERDA COSTA - J. 27.02.2022. TJ-PR - APL: 00003646420208160061 Capanema 0000364-64.2020.8.16.0061 (Acórdão), Relator: Marcus Vinicius de Lacerda Costa, Data de Julgamento: 27/02/2022, 5ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 02/03/2022) (grifei) Observe-se que o patamar da redução deve ser definido diante da conduta específica do acusado, da quantidade de droga apreendida, da nocividade do entorpecente e de outras circunstâncias que influenciem no caso. Nesse sentido é a jurisprudência: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO PRIVILEGIADO RECONHECIDO NA SENTENÇA. RÉU REINCIDENTE. AUSÊNCIA DE RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PATAMAR EM 1/5. QUANTIDADE NÃO RELEVANTE. ILEGALIDADE. REDUÇÃO AO PATAMAR MÁXIMO. PRECEDENTES DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Embora o Tribunal de origem tenha entendido pela não aplicabilidade do redutor contido no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 diante da reincidência do réu, manteve a sua aplicação diante da ausência de irresignação do Ministério Público quanto ao ponto, sob pena de incorrer em reformatio in pejus. 2. Entende esta Corte Superior que a quantidade não relevante e a ausência de circunstâncias adicionais (inserção em grupo criminoso de maior risco social, atuação armada, envolvendo menores ou com instrumentos de refino da droga, etc.) não autorizam a exasperação da pena-base, a vedação da minorante do tráfico no seu patamar máximo de 2/3, o agravamento do regime prisional ou a negativa à substituição das penas (AgRg no HC 529.431/SP, de minha relatoria, SEXTA TURMA, julgado em 03/12/2019, DJe 09/12/2019). 3. Diante da quantidade de droga apreendida - 7 porções de cocaína, em forma de pedras de crack, pesando aproximadamente 21 gramas -, manteve o percentual de 1/5, o que não se coaduna com jurisprudência pacífica desta Corte, cabendo a redução para 2/3. 4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 602706 SP 2020/0193761-7, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 02/02/2021, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/02/2021) (grifei) APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA NO PATAMAR MÁXIMO DE 2/3 EM RAZÃO DO RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. VIABILIDADE. RECURSO PROVIDO. - Reconhecida a causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Tóxicos, a quantidade e nocividade da droga apreendida deve ser analisada para fins de fixação do patamar de redução da pena, em atenção ao disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/2006 - Se houve a apreensão de pequena quantidade de maconha, mostra-se possível a redução da pena no patamar máximo (2/3). (TJ-MG - APR: 10000212323687001 MG, Relator: Doorgal Borges de Andrada, Data de Julgamento: 16/02/2022, Câmaras Criminais / 4ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 18/02/2022) (grifei) APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT DA LEI 11.343/06). RECURSO DA ACUSAÇÃO – PEDIDO DE AFASTAMENTO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI DE DROGAS (TRÁFICO PRIVILEGIADO) – NÃO ACOLHIDO. RECURSO DA DEFESA – PLEITO DE AUMENTO DA REDUÇÃO REFERENTE AO TRÁFICO PRIVILEGIADO EM SEU PATAMAR MÁXIMO (2/3) – NÃO ACOLHIDO – ADEQUADO PATAMAR DE REDUÇÃO UTILIZADO NA SENTENÇA. RECURSOS DESPROVIDOS. O simples fato de uma pessoa portar determinada quantidade de droga, sem apoio em outros elementos de prova, não basta para considerá-la integrante de organização criminosa ou mesmo para atestar sua dedicação a atividades ilícitas. Assim, deve ser mantida a causa de redução de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas. Mantida a redução no patamar de 1/6, considerada a quantidade de droga apreendida (119 "trouxinhas" da substância entorpecente comumente conhecida como "Maconha", pesando 750,0 g (setecentos e cinquenta gramas), e a observância, pelo juízo a quo, aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. (TJ-MS - APR: 00008137320178120017 MS 0000813-73.2017.8.12.0017, Relator: Des. José Ale Ahmad Netto, Data de Julgamento: 08/07/2020, 2ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 13/07/2020) (grifei) Por conseguinte, o reconhecimento do direito ao benefício conhecido por “tráfico privilegiado” pressupõe o preenchimento cumulativo de quatro requisitos legais, quais sejam, primariedade, bons antecedentes, não dedicação às atividades criminosas e não integração à organização criminosa, motivo pelo qual deve ser concedido tal privilégio na situação em testilha. Destarte, o denunciado deve ser condenado nos termos do art. 33 da Lei 11.343/06, logo que restou comprovado que portavam material entorpecente, com o objetivo de comercializá-lo, bem como deve ser reconhecida a causa minorante prevista no parágrafo 4º do art. 33 da aludida Lei. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido condenatório constante da denúncia, e CONDENO MARCUS VINICIOS DA SILVA como incurso nas penas do art. 33 da Lei 11.343/06. 4. DOSIMETRIA DA PENA Na hipótese do tráfico ilícito de entorpecentes, é indispensável atentar para o teor do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, segundo o qual, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. Passo à análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, em conjunto. Culpabilidade: o réu possuía, ao tempo dos fatos, a potencial consciência da ilicitude, sendo-lhe exigida conduta diversa da que teve, contudo, dolo é ínsito ao tipo em evidência. Neutra. Antecedentes: o réu é primário. Positiva. Conduta social: não há o que se auferir com o que consta nos autos. Neutra. Personalidade: presumidamente normal. Neutra. Motivos: auferir lucro fácil. Neutra. Circunstâncias: as normais para o caso de porte ilícito de substâncias entorpecentes. Neutra. Consequências: as de praxe. Neutra. Comportamento da vítima: não houve a participação. Neutra. Natureza e Quantidade da Substância apreendida – maconha e cocaína em quantidade elevada. Negativa. Feitas essas considerações, passo a fixação da pena: 1ª Fase: Tendo em vista que a maioria das circunstâncias foram neutras, que existe 1 (uma) circunstância positiva e 1 (uma) negativa, considerada a natureza e a quantidade da substância entorpecente apreendida, fixo a pena base no mínimo legal, ou seja, em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, ao valor de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizados. A correção monetária deve incidir a partir da data do fato. 2ª Fase: Inexistentes atenuantes e agravantes, mantenho a pena provisória em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, ao valor de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos. 3ª Fase: A incidência da minorante do tráfico privilegiado deve ser aplicada, conforme já justificado. Pode a reprimenda ser reduzida de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), a depender das circunstâncias do caso em concreto, não tendo o legislador definido critérios objetivos a serem adotados. Considerando a quantidade da droga, assim como a nocividade do entorpecente apreendido, maconha, reduzo a pena em 1/2 (metade), e a torno definitiva em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e o pagamento de 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa. Considero tal pena aplicada como necessária e suficiente para a prevenção e reprovação do delito. 5. DA DETRAÇÃO PENAL E A FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL DA PENA Reza o art. 1º, da Lei n.º 12.736, de 30 de novembro de 2012, dispõe que: “A detração deverá ser considerada pelo juiz que proferir a sentença condenatória, nos termos desta lei” com o objetivo de se fixar o regime inicial da pena, como previsto no § 2º do artigo 387 do CPP, acrescentado pela citada lei, com a seguinte redação: “O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Assim, tendo em conta tal determinação, passo, inicialmente, a computar o tempo em que o Acusado permaneceu preso cautelarmente até esta data: PRISÃO: 26/11/2022. SOLTURA: 28/11/2022. TOTAL DE DIAS PRESO: 2 DIAS. Procedo a detração de 2 (dois) dias cumpridos preventivamente em regime fechado, que devem ser diminuídos do total da pena, de forma que resta a cumprir 2 (dois) anos, 5 (cinco) meses e 28 (vinte e oito) dias de reclusão, e, portanto, o regime de cumprimento inicial da pena é o ABERTO, atendendo ao disposto no art. 33, § 2º, “c”, do Código Penal, considerando-se que o quantum restante da pena é inferior a 4 (quatro) anos. A detração foi realizada, haja vista que ante o quantum da pena arbitrado, este Juízo é o competente para a Execução Penal, ao qual cabe proceder com a respectiva detração penal, na forma prevista no art. 66, III, “c” da Lei nº 7.210/84 (LEP). 6. DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA Inviável se revela a concessão de sursis, tendo em vista a ausência do requisito estabelecido no art. 77, III, do estatuto repressivo. 7. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA Observando que a pena fora fixada em período superior a 1 (um) ano, em atenção à previsão do art. 44, §2º, do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por 1 (uma) pena restritiva de direitos e multa, nos seguintes termos: a) Interdição temporária de direitos, ficando o apenado proibido de frequentar bares, botecos e assemelhados, além de não ingerir bebidas alcóolicas, pelo período restante da condenação, ou seja, durante 2 (dois) anos, 5 (cinco) meses e 29 (vinte e oito) dias; e b) Fica o acusado OBRIGADO A PAGAR prestação pecuniária de 1 (um) salário-mínimo a entidade pública ou privada com destinação social (art. 45, §1º, do Código Penal). Saliente-se que, se o réu não cumprir, injustificadamente, com as penas restritivas de direito, elas serão convertidas em privativa de liberdade, nos termos do art. 44, §4º, do Código Penal. Fica o réu cientificado de que a pena restritiva de direitos se converte em privativa de liberdade, PASSÍVEL DE REVERSÃO DO REGIME ABERTO PARA O SEMIABERTO, quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. 8. DA DESTINAÇÃO DA DROGA APREENDIDA Caso ainda não tenha sido determinada a incineração de material entorpecente apreendido nestes autos, tendo em conta as recentes alterações introduzidas na Lei n.º 11.343/2006, pela Lei n.º 12.961, de 04 de abril de 2014, determino com fundamento no §3º do Art. 50 da Lei n.º 11.343/2006, que a Autoridade Policial incinere a droga apreendida, com prévia comunicação de 15 (quinze) dias, acerca do local e do horário em que a esta se dará, ao Ministério Público e à autoridade sanitária, lavrando-se o respectivo auto circunstanciado, no qual se certificará a destruição total das drogas, inclusive, se for o caso, da amostra necessária à realização do laudo definitivo, que também seguirá o mesmo destino, após o encerramento do processo penal, como previsto no art. 72 da Lei n.º 11.343/2006. 9. DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE E DA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA Inobstante o fato do acusado ter contra si decretada prisão preventiva, diante do quantum da pena fixada na sentença e do regime a ser estabelecido para cumprimento da pena, verifica-se a ausência dos requisitos autorizadores da prisão preventiva, razão pela qual REVOGO A PRISÃO PREVENTIVA dele e ele poderá apelar em liberdade. Expeça-se, com urgência, CONTRAMANDADO DE PRISÃO, junto ao BANCO NACIONAL DE MONITORAMENTO DE PRISÕES - BNMP, do Conselho Nacional de Justiça. 10. EM CASO DE APELAÇÃO Em caso de apelação, certifique-se a tempestividade e, em seguida, intime-se a parte contrária para contrarrazoar. Se o apelante informar que as razões recursais serão apresentadas no segundo grau, remetam-se os autos às Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, sem a necessidade de abertura de prazo para apresentação de contrarrazões. 11. DAS CUSTAS Em obediência ao comando contido no art. 804 do CPP, condeno o réu ao pagamento das custas processuais, sendo que eventual isenção de custas poderá ser requerida na execução da sentença. 12. DAS PROCEDÊNCIAS APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO Com o trânsito em julgado: a) Comunique-se ao TRE, para fins do disposto no art. 15, III, da Constituição Federal; b) Façam-se as comunicações necessárias, inclusive às de interesse estatístico; e c) Extraia-se a Carta de Guia de Execução definitiva com as peças complementares ao Juízo da Execução Penal competente, para a adoção das providencias cabíveis (aditamento / retificação). 13. INTIMAÇÕES Intime-se o réu, nos termos do artigo 392 do Código de Processo Penal, o Ministério Público e a Defesa, certificando-se nos autos o trânsito em julgado para cada um. Serve a presente decisão como mandado/ofício. Publique-se. Registre-se. Cumpra-se. Vigia/PA, data da assinatura eletrônica. Antônio Francisco Gil Barbosa Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Vigia de Nazaré e do Termo de Colares – Estado do Pará
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Processo nº 0800914-63.2025.8.14.0107
ID: 259851092
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Criminal da Comarca de Dom Eliseu
Classe: PETIçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0800914-63.2025.8.14.0107
Data de Disponibilização:
24/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCOS SANTOS NASCIMENTO
OAB/MA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Vara Criminal de Dom Eliseu _____________________________________________________________ PROCESSO Nº: 0800914-63.2025.8.14.0107 NOME: M. P. D. …
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Vara Criminal de Dom Eliseu _____________________________________________________________ PROCESSO Nº: 0800914-63.2025.8.14.0107 NOME: M. P. D. E. D. P. DECISÃO / MANDADO Autos nº. 0800914-63.2025.8.14.0107 Vistos. Trata-se de Pedido de Revogação de Prisão Preventiva formulado pela defesa de V. C. R., preso preventivamente em 24.03.2025 por ordem exarada nos autos nº 0800454-76.2025.8.14.0107, pela suposta prática do crime previsto no art. 24-A da Lei nº 11.340/2006 (descumprimento de medidas protetivas de urgência). A defesa alega, em suma, a existência de fato novo consubstanciado na manifestação de vontade da vítima, Sra. Antônia Xavier dos Santos, que teria requerido a revogação das medidas protetivas de urgência concedidas nos autos nº 0802104-95.2024.8.14.0107, juntando declaração assinada pela ofendida na qual afirma não mais subsistir situação de risco. Argumenta, assim, a ausência dos requisitos da prisão preventiva (art. 316 do CPP) e a desproporcionalidade da medida extrema. Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou pelo indeferimento do pedido, sustentando a permanência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar, em especial a garantia da ordem pública, ressaltando o histórico de descumprimentos do requerente e a necessidade de avaliação cautelosa da manifestação da vítima em contexto de violência doméstica. É o relatório. A prisão preventiva, como cediço, constitui medida de exceção no ordenamento jurídico pátrio, somente se justificando quando presentes os requisitos legais (prova da existência do crime e indício suficiente de autoria – fumus comissi delicti) e um dos fundamentos do art. 312 do Código de Processo Penal (garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal – periculum libertatis), além de uma das condições de admissibilidade do art. 313 do mesmo diploma legal. No presente caso, a prisão preventiva do requerente foi decretada em 27.02.2025, nos autos nº 0800454-76.2025.8.14.0107, com fundamento na garantia da ordem pública e para assegurar a execução das medidas protetivas de urgência (art. 312 c/c art. 313, III, ambos do CPP), vejamos: “... Logo, só se justifica em situações específicas e concretamente demonstradas, a fim de garantir as ordens pública e econômica ou preservar a instrução criminal e a fiel execução da pena. Passo a analisar os indícios de autoria. (...) Analisando os autos, percebo que a autoridade representante aponta como seguintes os indícios de autoria aptos a justificar a decretação da prisão preventiva: a) depoimentos colhidos em sede policial; b) áudios (id 136944744 e id 136944745); c) imagens (id 136944749); d) relatório de investigação (id 137614140). Tenho que os indícios por ora coligidos são suficientes para autorizar a decretação da medida extrema de prisão preventiva, conforme consta nos autos existem provas que apontem que o representado tenha praticado o delito de descumprimento de medidas protetivas de urgência. Neste ponto, faço observar a declaração prestada por FRANCISCO OLIVEIRA DOS SANTOS no id. 136944742 – pág. 13, da presente representação: “... que o declarante relata que teve um breve relacionamento com a Sra. Antônia Xavier dos Santos. O relacionamento não se estendeu por mais tempo devido ao Sr. V. C. R., ex-marido da Sra. Antônia, que ficava ameaçando-a e dizendo que, se ela se envolvesse com outra pessoa, ele a prejudicaria. Diante disso, o declarante decidiu não continuar com o namoro com ea; que, no dia 08/02/2025, por volta das 07h50min, ao chegar no seu local de trabalho, o declarante foi surpreendido pelo Sr. Valmir, que se aproximou dele e o ameaçou dizendo: “Eu sei que a Antônia tá contigo, eu vou matar ela, vou matar quem tiver com ela, vou matar os filhos dela e depois eu vou sumir, eu que tu pagou uma pessoa para me ligar me ameaçando” (textual), em seguida se retirou do local; que o declarante relata que terminou seu relacionamento em dezembro de 2024, mas continuam amigos, e que o declarante teme e se preocupa com o que Valmir possa fazer com Antônia, pois Valmir a persegue, vigia, ameaça, intimida. Além disso, há dias em que Antônia falta o trabalho por medo, pois, quando ela sai para trabalhar, Valmir fica esperando-a em pontos estratégicos. Inclusive o declarante já presenciou Valmir seguindo e falando coisas para Antônia...” Aliado ao depoimento, a autoridade policial juntou relatório de investigação no id. 137614140 – pág. 2/6, comparando as fotos retiradas pela vítima no id. 136944749 – pág. 1/2, a fim de identificar se de fato o representado foi até a sua residência, apontando o relatório que o investigado seria a pessoa fotografada pela vítima. Ressalte-se ainda, que as diligências apontaram que embora a motocicleta de Placa OTJ 7650, não esteja registrada sob o nome do representado, ela é utilizada por ele, conforme se vislumbra da imagem de id. 137614140 – pág. 3. Assim, há indicativos suficientes de autoria. No que se refere à materialidade, tanto do crime de descumprimento de medidas protetivas, quanto de violência psicológica, estes também restaram demonstrados. O representado foi intimado na data 18/09/2024 acerca das medidas protetivas fixadas nos autos 0802104-95.2024.8.14.0107, as quais foram mantidas na sentença de id 132634985 do processo acima citado enquanto perdurar o perigo, tendo sido o representado também intimado da sentença, na data 29/01/2025. Ocorre que, embora tenham havido a fixação das medidas protetivas, os elementos contidos nos autos apontam que estas não foram suficientes para resguardar a integridade física e psicológica da vítima, ante ao reiterado descumprimento perpetrado pelo representado, que não se contenta apenas em perseguir e ameaçar a vítima, mas também terceiros que com ela se relacionam. Note-se que, a vítima compareceu em delegacia para informar que foi perseguida na data 21/02/2025 pelo representado, se sentindo assim, coagida. Afirmou ainda, que na data 19/02/2025 o representado foi até a escola dos filhos dela, e ofereceu insistentemente dinheiro a um deles. Aliado ao comportamento supramencionado, o representado foi até a residência da vítima no dia 08 de fevereiro de 2025, conforme se vislumbra das imagens anexadas nos autos, e em seguida, compareceu o trabalho de FRANCISCO OLIVEIRA DOS SANTOS, ameaçando-o, além de proferir ameaças de morte, direcionadas a vítima, bem como seus filhos. Observa-se que o representado não satisfeito em ameaçar e perseguir a vítima, age ameaçando terceiros com quem ela tem ou manteve relacionamento, conduta nitidamente capaz de causar abalo psicológico, fazendo com que a vítima fica sozinha, impedindo de constituir novos relacionamentos afetivos. O fato de o representado descumprir as medidas protetivas, em curtos períodos de tempo, de modo a fazer com que a vítima tenha retornado a delegacia de polícia por diversas vezes, relatando situações de perseguição e ameaças, além de fazer com que ela perdesse novo relacionamento afetivo, evidenciam que as medidas de urgência não são suficientes para resguardar sua integridade física e psicológica da vítima, tornando necessária a decretação da prisão preventiva, na forma do art. 312 e 313, inciso III ambos do Código de Processo Penal. (...) A situação narrada nos autos evidencia não só uma reiteração delitiva, como a exposição da vítima a um ciclo de violência de gênero, e um descaso por parte do representado com as medidas fixadas por este juízo. Ressalto que o simples fato de estarem presentes os rígidos requisitos legais autorizadores da decretação da prisão preventiva já demonstram, por si só, a insuficiência de medidas cautelares diversas da prisão. A decisão que impôs a segregação cautelar baseou-se em elementos concretos que indicavam o reiterado descumprimento das medidas protetivas anteriormente impostas ao requerente em favor da vítima Antônia Xavier dos Santos nos autos nº 0802104-95.2024.8.14.0107. Consta da referida decisão, bem como da representação policial que a instruiu, que mesmo após cientificado das medidas, o requerente teria continuado a perseguir a vítima, inclusive comparecendo à sua residência e proferindo ameaças contra ela e seu então namorado, Sr. Francisco Oliveira dos Santos, gerando fundado temor e abalo psicológico à ofendida, além de uma limitação no próprio desenvolvimento da vítima, que diante do comportamento do acusado se viu impedida de ter outros relacionamentos. Com efeito, consta dos autos declaração assinada pela Sra. Antônia Xavier dos Santos, datada de 03.04.2025, com firma reconhecida em cartório, na qual afirma não desejar mais representar contra o requerente e que desiste de dar continuidade ao processo, solicitando a baixa da medida protetiva. Todavia, em que pese a manifestação da ofendida, entendo que, por ora, não se mostram alteradas as circunstâncias fáticas que ensejaram a decretação da prisão preventiva, persistindo a necessidade da medida para garantia da ordem pública. A princípio, devemos ressaltar que o crime previsto no art. 24-A da Lei Maria da Penha é processado mediante ação pública incondicionada a representação, desta forma, a ação penal prossegue independente da intenção da vítima em querer representar ou dar continuidade a eventual representação anteriormente apresentada. É fundamental ressaltar, ainda, a natureza jurídica e a finalidade das medidas protetivas de urgência no contexto da Lei Maria da Penha. Conforme entendimento jurisprudencial consolidado e a própria legislação, tais medidas possuem caráter protetivo e visam resguardar a integridade física, psicológica, sexual, patrimonial e moral da mulher em situação de violência doméstica, enquanto perdurar a situação de risco. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a matéria (Tema 1249), firmou entendimento sobre a impossibilidade de fixação de prazo predeterminado para a vigência das medidas protetivas, as quais devem perdurar enquanto subsistir o risco à ofendida, firmando as seguintes teses: I - As medidas protetivas de urgência (MPUs) têm natureza jurídica de tutela inibitória e sua vigência não se subordina à existência (atual ou vindoura) de boletim de ocorrência, inquérito policial, processo cível ou criminal. II - A duração das MPUs vincula-se à persistência da situação de risco à mulher, razão pela qual devem ser fixadas por prazo temporalmente indeterminado; III - Eventual reconhecimento de causa de extinção de punibilidade, arquivamento do inquérito policial ou absolvição do acusado não origina, necessariamente, a extinção da medida protetiva de urgência, máxime pela possibilidade de persistência da situação de risco ensejadora da concessão da medida. IV - Não se submetem a prazo obrigatório de revisão periódica, mas devem ser reavaliadas pelo magistrado, de ofício ou a pedido do interessado, quando constatado concretamente o esvaziamento da situação de risco. A revogação deve sempre ser precedida de contraditório, com as oitivas da vítima e do suposto agressor. Em caso de extinção da medida, a ofendida deve ser comunicada, nos termos do art. 21 da Lei n. 11.340/2006. De clareza impar é o RESP 2070717, um dos julgados que motivou a fixação das referidas teses, vejamos: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. TEMA N. 1249. MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. NATUREZA JURÍDICA. TUTELA INIBITÓRIA. CONTEÚDO SATISFATIVO. VIGÊNCIA DA MEDIDA NÃO SE SUBORDINA À EXISTÊNCIA DE BOLETIM DE OCORRÊNCIA, INQUÉRITO POLICIAL, PROCESSO CÍVEL OU CRIMINAL. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE PRAZO PREDETERMINADO. DURAÇÃO SUBORDINADA À PERSISTÊNCIA DA SITUAÇÃO DE RISCO. RECURSO PROVIDO. 1. A Lei Maria da Penha foi fruto de uma longa e custosa luta de setores da sociedade civil para que o Estado brasileiro oferecesse às mulheres um conjunto de mecanismos capaz de assegurar a elas, em situações de violência doméstica, efetiva proteção e assistência. 2. Em verdade - e isso deve ser tomado como uma necessária premissa a nortear qualquer avaliação e interpretação da Lei n. 11.343/2006 - o ingresso dessa lei no ordenamento jurídico resultou na criação de um microssistema dentro do sistema de justiça criminal, cujas características são únicas, em alguns pontos não coincidentes com as categorias e institutos usualmente presentes em outras áreas do Direito. 3. Daí por que se deve extrair o máximo possível de extensão semântica às medidas protetivas de urgência, como medida inovadora na legislação brasileira, idônea e necessária para maximizar a proteção estatal às mulheres vítimas de algum tipo de violência doméstica, mas que também ultrapassa a esfera do Direito Penal e avança no desejado equilíbrio nas relações de gênero em nossa sociedade. 4. Sob tal consideração inicial, cumpre registrar que as medidas protetivas previstas na Lei n. 11.340/2006, por visarem resguardar a integridade física e psíquica da ofendida, possuem conteúdo satisfativo, e não se vinculam, necessariamente, a um procedimento principal. Elas têm como objeto a proteção da vítima e devem permanecer enquanto durar a situação de perigo. 5. O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça, afirma que as medidas protetivas de urgência "são autônomas em relação ao processo principal, com dispensa da vítima quanto ao oferecimento de representação em ação penal pública condicionada". Em igual direção, o Enunciado n. 37 do FONAVID (Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher): "A concessão da medida protetiva de urgência não está condicionada à existência de fato que configure, em tese, ilícito penal." 6. Tal posição foi partilhada pelo legislador com a publicação da Lei n. 14.550/2023, que incluiu o parágrafo 5º no art. 19 da Lei Maria da Penha para afirmar que "As medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência". 7. Diante do exposto, não é possível vincular, a priori, a ausência de um processo penal ou inquérito policial à inexistência de um quadro de ameaça à integridade da mulher. É certo que há razões múltiplas, para além da inexistência de uma efetiva situação de risco, que podem justificar o não ajuizamento de uma ação penal. 8. A configuração das medidas protetivas, portanto, deve ser considerada como tutela inibitória, porquanto tem por escopo proteger a ofendida, independentemente da existência de inquérito policial ou ação penal, não sendo necessária a realização de um dano, tampouco a prática de uma conduta criminalizada. 9. Sobre o prazo de duração das medidas, a Carta da XVIII Jornada Lei Maria da Penha, documento produzido em evento organizado pelo Conselho Nacional de Justiça, recomenda que "na aplicação da Lei Maria da Penha, seja assegurada sua finalidade preventiva e protetiva, sem fixação de prazo de vigência das medidas protetivas de urgência, que devem persistir enquanto perdurar o risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida e seus dependentes, podendo ser reavaliada a qualquer tempo". 10. É desse mesmo jaez o entendimento retratado na Lei Maria da Penha com a inclusão do art. 19, § 6º, pela Lei n. 14.550/2023, que estabelece que "as medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes". 11. É dizer, apesar do caráter provisório inerente às medidas protetivas de urgência, não há como quantificar, de antemão, em dias, semanas, meses ou anos, o tempo necessário à cessação do risco, a fim de romper com o ciclo de violência instaurado. 12. Com efeito, a fim de se evitar a perenização das medidas, a pessoa interessada, quando entender não mais ser pertinente a tutela inibitória, poderá provocar o juízo de origem a se manifestar e este, ouvindo a vítima, decidirá acerca da manutenção ou extinção da medida protetiva. Em caso de extinção da medida, a ofendida deve ser comunicada, nos termos do art. 21 da Lei n. 11.340/2006. 13. O que não é adequado, e muito menos conforme ao desejo de proteção e acolhimento da mulher vítima de violência em razão do gênero, é dela exigir um reforço periódico de seu desejo de manter-se sob a proteção de uma MPU. A renovação de sua iniciativa - dirigir-se ao Fórum ou à Delegacia de Polícia para insistir, a cada 3 ou 6 meses, na manutenção da medida protetiva - implicaria uma revitimização e, consequentemente, uma violência institucional que precisa ser coibida. 14. A iniciativa para eventual revisão ou mesmo retirada da Medida Protetiva de Urgência deve partir de quem esteja sob o compromisso de abster-se de algum ato que possa turbar a tranquilidade ou segurança da ofendida, hipótese em que esta será ouvida antes de uma decisão judicial. 15. Na hipótese em exame, a instância ordinária deferiu as medidas protetivas em favor da vítima B. U. S. M. sem vinculação de prazo. Inconformada, A. N. S. interpôs agravo de instrumento perante o Tribunal de Justiça, que deu parcial provimento ao recurso para estipular prazo de vigência de 90 dias. Nesse cenário, conclui-se que assiste razão ao recorrente quando afirma que "não é possível fixar um prazo pré-determinado de duração das medidas protetivas". Isso porque as medidas protetivas devem perdurar o tempo necessário à cessação do risco, a fim de romper com o ciclo de violência instaurado. Não há, portanto, como quantificar, de antemão, em dias, semanas, meses ou anos (no caso, em 90 dias), o tempo necessário à cessação do risco. 16. Recurso especial provido para clarificar que a duração das medidas protetivas deve perdurar pelo tempo necessário à cessação do risco, sem fixação de prazo certo de validade, e sem vinculação com a existência ou permanência de inquérito policial ou ação penal. Fixação das seguintes teses: I - As medidas protetivas de urgência (MPUs) têm natureza jurídica de tutela inibitória e sua vigência não se subordina à existência (atual ou vindoura) de boletim de ocorrência, inquérito policial, processo cível ou criminal. II - A duração das MPUs vincula-se à persistência da situação de risco à mulher, razão pela qual devem ser fixadas por prazo temporalmente indeterminado; III - Eventual reconhecimento de causa de extinção de punibilidade, arquivamento do inquérito policial ou absolvição do acusado não origina, necessariamente, a extinção da medida protetiva de urgência, máxime pela possibilidade de persistência da situação de risco ensejadora da concessão da medida. IV - Não se submetem a prazo obrigatório de revisão periódica, mas devem ser reavaliadas pelo magistrado, de ofício ou a pedido do interessado, quando constatado concretamente o esvaziamento da situação de risco. A revogação deve sempre ser precedida de contraditório, com as oitivas da vítima e do suposto agressor. Em caso de extinção da medida, a ofendida deve ser comunicada, nos termos do art. 21 da Lei n. 11.340/2006. (REsp n. 2.070.717/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, relator para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 13/11/2024, DJEN de 25/3/2025.) (grifamos). Portanto, não há dúvidas que a premissa básica das medidas protetivas é que elas devem permanecer vigentes, enquanto o magistrado, representante do Estado, identificar a existência de uma situação de risco, sendo mantidas, independentemente de ter havido o ajuizamento de uma ação penal, e mesmo que o autor de violência doméstica, seja absolvido de eventual processo criminal, isto porque, uma condenação exige outros elementos, não exigidos no momento da fixação das medidas protetivas, instituto voltado par resguardar a integridade física e psicológica da mulher em situação de violência. Neste cenário, a fundamentação ora utilizada pela defesa merece ponderação, pois ignora a dinâmica própria da violência doméstica e a autonomia do Poder Judiciário na avaliação do risco. Conforme lição de CAVALCANTE, Márcio André Lopes: "As medidas protetivas impostas têm validade enquanto perdurar a situação de perigo. Logo, não faz sentido fixar um prazo de vigência (um prazo de duração), considerando que é impossível saber, a priori, quando haverá a cessação daquele cenário de insegurança. A decisão judicial que impõe as medidas protetivas de urgência submete-se à cláusula rebus sic stantibus, ou seja, para sua eventual revogação ou modificação, é indispensável que o Juízo se certifique de que houve a alteração do contexto fático e jurídico. No mesmo sentido, a Lei nº 14.550/2023 inseriu o § 6º no art. 19 da Lei nº 11.340/2006 prevendo o seguinte: Art. 19 (...) § 6º As medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes." Destarte, a manifestação da vítima no sentido da revogação das medidas, embora relevante e deva ser considerada, não vincula automaticamente a decisão judicial, tampouco elide, por si só, a necessidade da prisão preventiva decretada em razão do descumprimento anterior e do risco concreto de reiteração. Cabe ao magistrado, com a devida cautela, avaliar a persistência da situação de risco, independentemente da vontade expressa pela ofendida, notadamente em casos que envolvem o ciclo da violência doméstica, onde a retratação ou o pedido de revogação podem decorrer de coação, dependência emocional ou econômica, ou mesmo da falsa percepção de cessação do perigo. A “Teoria do Ciclo de Violência Doméstica” criada pela psicóloga norte-americana Lenore Walker, em sua obra “The battered woman” (1979), aponta a presença de três fases recorrentes nos casos de violência doméstica, quais sejam: a fase de tensão, acompanhada de uma sensação de perigo; a fase do ato de violência; e a fase da “lua de mel”. A primeira fase é marcada pelo momento de tensão, quando o agressor se mostra agressivo e irritado, ocorrendo ameaças, humilhações e xingamentos. Nesse estágio a mulher não consegue identificar que tais comportamentos configuram formas de violência, e tenta acalmar o autor da violência, fazendo de tudo para agradá-lo como uma forma de solucionar a tensão: Durante a primeira fase, há um escalada gradual de tensão exibido por atos discretos que causam maior fricção, como xingamentos, outros comportamentos intencionais maldosos e/ou abuso físico. O agressor expressa insatisfação e hostilidade, mas não de forma extrema ou explosiva. A mulher tenta apaziguar o agressor, fazendo o que ela pensa pode agradá-lo, acalmá-lo, ou pelo menos, o que não irá agravá-lo ainda mais (Walker, 2009, p. 91). Pode-se dizer que nessa fase ocorrem os xingamentos e as ameaças, isto é, violência moral. Ademais, a violência psicológica, tipificada no art. 147-B do Código Penal, também está presente nessa fase, em que o agressor manipula a vítima, fazendo com que ela se sinta culpada pela violência sofrida. Nessa fase também são identificados tipos penais dos Crimes Contra Honra (tipos de calúnia, injúria e difamação) e ameaça, além do crime específico, de violência psicológica. Nesta fase, a vítima tende a negar que isso está acontecendo com ela, esconde os fatos das demais pessoas e, muitas vezes, acha que fez algo de errado para justificar o comportamento violento do agressor ou que “ele teve um dia ruim no trabalho”. A segunda fase é marcada pela agressão física, ocorrendo a explosão do agressor. Após os momentos de tensão, a vítima passa a viver com medo e na iminência de sofrer a agressão. É nesta fase que são realizados os boletins de ocorrência relatando a violência e o requerimento das Medidas Protetivas de Urgência. Cumpre ressaltar que na grande parte dos casos as mulheres sentem vergonha de fazer o boletim de ocorrência pois são ameaçadas pelo companheiro, não são apoiadas pela família ou acreditam que a justiça não punirá seu agressor. Importa observar ainda, que apenas uma pequena quantidade de mulheres chega a denunciar os agressores nesta fase, porque a grande maioria sente medo, pois ainda convive com o agressor, que muitas das vezes é quem mantém a família. A vulnerabilidade econômica é um dos principais fatores que fazem mulheres se submetem a uma situação de violência, sobretudo em uma sociedade patriarcal e machista. Dentre as formas de violência ocorridas nesta etapa, a violência física é a mais característica, podendo muitas vezes chegar em seu estágio final, com o feminicídio. Os tipos penais identificados podem ser vias de fato (artigo 21 do Decreto Lei n. 3.688/41); lesão corporal em contexto de violência doméstica (129, § 13, do Código Penal) e feminicídio (artigo 121-A do Código Penal). A terceira fase, conhecida como “lua de mel” é marcada pelo arrependimento do agressor. Nessa fase o companheiro se arrepende e torna-se amável para conseguir a reconciliação. Para Walker é nessa fase que a mulher passa a reviver todas as sensações que sentiu quando se apaixonou pelo companheiro, tendo a falsa ilusão de que está em um bom relacionamento: Na fase três que se segue, o agressor pode se desculpar profusamente, tentar ajudar sua vítima, mostrar bondade e remorso, e enchê-la de presentes e/ou promessas, o autor da violência pode acreditar neste ponto que ele nunca permitirá se tornar violento novamente. A mulher quer acreditar no agressor e, pelo menos no início do relacionamento, pode renovar sua esperança em sua capacidade de mudar. Esta terceira fase fornece o reforço positivo por permanecer no relacionamento, para a mulher. Muitos dos atos que ele fez quando ela se apaixonou por ele durante o período de namoro ocorrem novamente aqui. (Walker, 2009, p. 94 - 95). Note-se, que não necessariamente o agressor finge arrependimento como forma de manter a mulher presa no ciclo, ou impedir uma punição estatal, isto porque muitas das vezes, por ele mesmo ter sido criado em um contexto de violência doméstica, não conhece outro comportamento a não ser reproduzi-lo. Assim, a mulher, presa na ilusão de que seu companheiro mudou, e sucumbindo a pressão do núcleo familiar, retira a medida protetiva de urgência; arrepende-se de ter feito o boletim de ocorrência; muda a narrativa apresentada na delegacia. Ocorre que, na verdade, a vítima não consegue perceber que está sendo manipulada e controlada pelo agressor, e que tanto ela, quanto seus filhos estão submetidos a um ciclo de violência, que infelizmente, na grande maioria dos casos, vai não só se repetir, como evoluir para novas formas de agressão, ainda mais violentas. E a medida que a violência se repete, a vítima é cada vez mais imersa no ciclo, eis que no caso de reiteração, sentira o peso de ter reatado o relacionamento, bem como o julgamento dos familiares e amigos, que como pessoas externas ao ciclo, não conseguem compreende-lo, e passam a culpa-la por ter reatado. Sentirá, ainda, o peso do aparato estatal despreparado, que não presta o devido tratamento a vítima, não sendo raros os casos em que representantes do Estado falam coisas como “daqui a pouco ela vem retirar a queixa ou perdoar o agressor novamente.” Portanto, deve o Estado adotar instrumentos destinados ao rompimento do ciclo da violência, por meio da capacitação e educação de seus servidores e agentes de segurança, capacitando e explicando sobre ideologia e violência de gênero, bem como promovendo campanhas e redes de acolhimentos capazes de identificar que a mulher se encontra inserida neste ciclo. Em contrapartida, devem os aplicadores do direito, e o judiciário, promover um julgamento sob a perspectiva de gênero, se despindo de percepções machistas e misóginas, compatibilização as peculiaridades que envolvem a violência doméstica e familiar com as demais garantias e direitos que regem o processo penal, em especial, o contraditório, a ampla defesa e o ônus da acusação de reunir lastro probatório suficiente para conferir plausibilidade jurídica à narrativa da denúncia, afinal, a dúvida deve prevalecer em favor do réu. Neste cenário, eventual retratação ou pedido de revogação das medidas protetivas, principalmente quando feito por escrito, devem ser analisadas com cautela, não podendo o julgador perpetuar um estado de violência, deixando a vítima desguarnecida, frente as inúmeras pressões que pode ser submetida. No caso concreto, o histórico do requerente demonstra comportamento de recalcitrância e desrespeito às ordens judiciais. As medidas protetivas foram fixadas em setembro de 2024. Pouco tempo depois, a vítima já comparecia à delegacia para relatar descumprimentos. Os fatos que ensejaram a representação pela prisão preventiva ocorreram em fevereiro de 2025, evidenciando novas violações às medidas. A certidão de antecedentes criminais aponta a existência de, ao menos, dois inquéritos policiais instaurados para apurar o crime de descumprimento de medida protetiva em desfavor do requerente, envolvendo a mesma vítima, além do processo original das medidas e do incidente que resultou na prisão. Essa sucessão de violações em curto espaço de tempo, aliada à gravidade dos atos relatados (perseguição, ameaças inclusive a terceiros), demonstra a periculosidade concreta do agente e o elevado risco de reiteração delitiva, justificando a manutenção da prisão preventiva para garantia da ordem pública, a fim de cessar o ciclo de violência e assegurar a integridade da vítima. Ademais, para melhor subsidiar a análise sobre a voluntariedade e as reais circunstâncias do pedido de revogação das medidas formulado pela vítima, foi determinada a realização de avaliação pela equipe multidisciplinar deste juízo nos autos nº. 0802104-95.2024.8.14.0107, a fim de verificar os motivos que a levaram a tal manifestação e aquilatar a efetiva cessação da situação de risco ou a possível influência de fatores externos, como pressão por parte do agressor ou de terceiros, fenômeno comum em casos de violência doméstica e familiar. Por fim, diante da gravidade concreta dos fatos, da reiteração delitiva específica e do descaso demonstrado pelo requerente para com as decisões judiciais, conclui-se que as medidas cautelares diversas da prisão (art. 319 do CPP) revelam-se, neste momento, insuficientes e inadequadas para acautelar a ordem pública e proteger a integridade da vítima. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, e com fundamento nos artigos 312 e 316 do Código de Processo Penal, e já realizando a revisão da prisão estabelecida no parágrafo único do art. 316, INDEFIRO O PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA formulado pela defesa de V. C. R., mantendo a sua segregação cautelar para garantia da ordem pública. Determino à Secretaria que: 1. Junte cópia desta decisão aos autos principais (nº 0800454-76.2025.8.14.0107, bem como nos autos referentes a medida protetiva (0802104-95.2024.8.14.0107). 2. Cumpra a decisão de id. 141592513, dos autos nº. 0802104-95.2024.8.14.0107, encaminhando os autos à equipe multidisciplinar para avaliação psicossocial da vítima Antônia Xavier dos Santos, com foco na análise das circunstâncias de seu pedido de revogação das medidas protetivas e na avaliação de risco atual, com prazo de 30 (trinta) dias para apresentação de relatório. 3. Intimem-se o Ministério Público por sistema. 4. Intime-se a Defesa por DJEN. Em havendo a preclusão/trânsito da presente decisão, dê-se baixa e arquive-se, independente da tramitação do procedimento principal. Cumpra-se. Dom Eliseu/PA, 22 de abril de 2025. Cristiano Lopes Seglia Juiz de Direito _____________________________________________________________ Fórum Juiz Clodomiro Dutra de Moraes Rua Jequié, nº 312, Bairro Esplanada, Dom Eliseu/PA, CEP: 68.633-000 – Fone (094) 3335-1479
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Processo nº 0800914-63.2025.8.14.0107
ID: 259549324
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Criminal da Comarca de Dom Eliseu
Classe: PETIçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0800914-63.2025.8.14.0107
Data de Disponibilização:
24/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCOS SANTOS NASCIMENTO
OAB/MA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Vara Criminal de Dom Eliseu _____________________________________________________________ PROCESSO Nº: 0800914-63.2025.8.14.0107 NOME: M. P. D. …
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Vara Criminal de Dom Eliseu _____________________________________________________________ PROCESSO Nº: 0800914-63.2025.8.14.0107 NOME: M. P. D. E. D. P. DECISÃO / MANDADO Autos nº. 0800914-63.2025.8.14.0107 Vistos. Trata-se de Pedido de Revogação de Prisão Preventiva formulado pela defesa de V. C. R., preso preventivamente em 24.03.2025 por ordem exarada nos autos nº 0800454-76.2025.8.14.0107, pela suposta prática do crime previsto no art. 24-A da Lei nº 11.340/2006 (descumprimento de medidas protetivas de urgência). A defesa alega, em suma, a existência de fato novo consubstanciado na manifestação de vontade da vítima, Sra. Antônia Xavier dos Santos, que teria requerido a revogação das medidas protetivas de urgência concedidas nos autos nº 0802104-95.2024.8.14.0107, juntando declaração assinada pela ofendida na qual afirma não mais subsistir situação de risco. Argumenta, assim, a ausência dos requisitos da prisão preventiva (art. 316 do CPP) e a desproporcionalidade da medida extrema. Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou pelo indeferimento do pedido, sustentando a permanência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar, em especial a garantia da ordem pública, ressaltando o histórico de descumprimentos do requerente e a necessidade de avaliação cautelosa da manifestação da vítima em contexto de violência doméstica. É o relatório. A prisão preventiva, como cediço, constitui medida de exceção no ordenamento jurídico pátrio, somente se justificando quando presentes os requisitos legais (prova da existência do crime e indício suficiente de autoria – fumus comissi delicti) e um dos fundamentos do art. 312 do Código de Processo Penal (garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal – periculum libertatis), além de uma das condições de admissibilidade do art. 313 do mesmo diploma legal. No presente caso, a prisão preventiva do requerente foi decretada em 27.02.2025, nos autos nº 0800454-76.2025.8.14.0107, com fundamento na garantia da ordem pública e para assegurar a execução das medidas protetivas de urgência (art. 312 c/c art. 313, III, ambos do CPP), vejamos: “... Logo, só se justifica em situações específicas e concretamente demonstradas, a fim de garantir as ordens pública e econômica ou preservar a instrução criminal e a fiel execução da pena. Passo a analisar os indícios de autoria. (...) Analisando os autos, percebo que a autoridade representante aponta como seguintes os indícios de autoria aptos a justificar a decretação da prisão preventiva: a) depoimentos colhidos em sede policial; b) áudios (id 136944744 e id 136944745); c) imagens (id 136944749); d) relatório de investigação (id 137614140). Tenho que os indícios por ora coligidos são suficientes para autorizar a decretação da medida extrema de prisão preventiva, conforme consta nos autos existem provas que apontem que o representado tenha praticado o delito de descumprimento de medidas protetivas de urgência. Neste ponto, faço observar a declaração prestada por FRANCISCO OLIVEIRA DOS SANTOS no id. 136944742 – pág. 13, da presente representação: “... que o declarante relata que teve um breve relacionamento com a Sra. Antônia Xavier dos Santos. O relacionamento não se estendeu por mais tempo devido ao Sr. V. C. R., ex-marido da Sra. Antônia, que ficava ameaçando-a e dizendo que, se ela se envolvesse com outra pessoa, ele a prejudicaria. Diante disso, o declarante decidiu não continuar com o namoro com ea; que, no dia 08/02/2025, por volta das 07h50min, ao chegar no seu local de trabalho, o declarante foi surpreendido pelo Sr. Valmir, que se aproximou dele e o ameaçou dizendo: “Eu sei que a Antônia tá contigo, eu vou matar ela, vou matar quem tiver com ela, vou matar os filhos dela e depois eu vou sumir, eu que tu pagou uma pessoa para me ligar me ameaçando” (textual), em seguida se retirou do local; que o declarante relata que terminou seu relacionamento em dezembro de 2024, mas continuam amigos, e que o declarante teme e se preocupa com o que Valmir possa fazer com Antônia, pois Valmir a persegue, vigia, ameaça, intimida. Além disso, há dias em que Antônia falta o trabalho por medo, pois, quando ela sai para trabalhar, Valmir fica esperando-a em pontos estratégicos. Inclusive o declarante já presenciou Valmir seguindo e falando coisas para Antônia...” Aliado ao depoimento, a autoridade policial juntou relatório de investigação no id. 137614140 – pág. 2/6, comparando as fotos retiradas pela vítima no id. 136944749 – pág. 1/2, a fim de identificar se de fato o representado foi até a sua residência, apontando o relatório que o investigado seria a pessoa fotografada pela vítima. Ressalte-se ainda, que as diligências apontaram que embora a motocicleta de Placa OTJ 7650, não esteja registrada sob o nome do representado, ela é utilizada por ele, conforme se vislumbra da imagem de id. 137614140 – pág. 3. Assim, há indicativos suficientes de autoria. No que se refere à materialidade, tanto do crime de descumprimento de medidas protetivas, quanto de violência psicológica, estes também restaram demonstrados. O representado foi intimado na data 18/09/2024 acerca das medidas protetivas fixadas nos autos 0802104-95.2024.8.14.0107, as quais foram mantidas na sentença de id 132634985 do processo acima citado enquanto perdurar o perigo, tendo sido o representado também intimado da sentença, na data 29/01/2025. Ocorre que, embora tenham havido a fixação das medidas protetivas, os elementos contidos nos autos apontam que estas não foram suficientes para resguardar a integridade física e psicológica da vítima, ante ao reiterado descumprimento perpetrado pelo representado, que não se contenta apenas em perseguir e ameaçar a vítima, mas também terceiros que com ela se relacionam. Note-se que, a vítima compareceu em delegacia para informar que foi perseguida na data 21/02/2025 pelo representado, se sentindo assim, coagida. Afirmou ainda, que na data 19/02/2025 o representado foi até a escola dos filhos dela, e ofereceu insistentemente dinheiro a um deles. Aliado ao comportamento supramencionado, o representado foi até a residência da vítima no dia 08 de fevereiro de 2025, conforme se vislumbra das imagens anexadas nos autos, e em seguida, compareceu o trabalho de FRANCISCO OLIVEIRA DOS SANTOS, ameaçando-o, além de proferir ameaças de morte, direcionadas a vítima, bem como seus filhos. Observa-se que o representado não satisfeito em ameaçar e perseguir a vítima, age ameaçando terceiros com quem ela tem ou manteve relacionamento, conduta nitidamente capaz de causar abalo psicológico, fazendo com que a vítima fica sozinha, impedindo de constituir novos relacionamentos afetivos. O fato de o representado descumprir as medidas protetivas, em curtos períodos de tempo, de modo a fazer com que a vítima tenha retornado a delegacia de polícia por diversas vezes, relatando situações de perseguição e ameaças, além de fazer com que ela perdesse novo relacionamento afetivo, evidenciam que as medidas de urgência não são suficientes para resguardar sua integridade física e psicológica da vítima, tornando necessária a decretação da prisão preventiva, na forma do art. 312 e 313, inciso III ambos do Código de Processo Penal. (...) A situação narrada nos autos evidencia não só uma reiteração delitiva, como a exposição da vítima a um ciclo de violência de gênero, e um descaso por parte do representado com as medidas fixadas por este juízo. Ressalto que o simples fato de estarem presentes os rígidos requisitos legais autorizadores da decretação da prisão preventiva já demonstram, por si só, a insuficiência de medidas cautelares diversas da prisão. A decisão que impôs a segregação cautelar baseou-se em elementos concretos que indicavam o reiterado descumprimento das medidas protetivas anteriormente impostas ao requerente em favor da vítima Antônia Xavier dos Santos nos autos nº 0802104-95.2024.8.14.0107. Consta da referida decisão, bem como da representação policial que a instruiu, que mesmo após cientificado das medidas, o requerente teria continuado a perseguir a vítima, inclusive comparecendo à sua residência e proferindo ameaças contra ela e seu então namorado, Sr. Francisco Oliveira dos Santos, gerando fundado temor e abalo psicológico à ofendida, além de uma limitação no próprio desenvolvimento da vítima, que diante do comportamento do acusado se viu impedida de ter outros relacionamentos. Com efeito, consta dos autos declaração assinada pela Sra. Antônia Xavier dos Santos, datada de 03.04.2025, com firma reconhecida em cartório, na qual afirma não desejar mais representar contra o requerente e que desiste de dar continuidade ao processo, solicitando a baixa da medida protetiva. Todavia, em que pese a manifestação da ofendida, entendo que, por ora, não se mostram alteradas as circunstâncias fáticas que ensejaram a decretação da prisão preventiva, persistindo a necessidade da medida para garantia da ordem pública. A princípio, devemos ressaltar que o crime previsto no art. 24-A da Lei Maria da Penha é processado mediante ação pública incondicionada a representação, desta forma, a ação penal prossegue independente da intenção da vítima em querer representar ou dar continuidade a eventual representação anteriormente apresentada. É fundamental ressaltar, ainda, a natureza jurídica e a finalidade das medidas protetivas de urgência no contexto da Lei Maria da Penha. Conforme entendimento jurisprudencial consolidado e a própria legislação, tais medidas possuem caráter protetivo e visam resguardar a integridade física, psicológica, sexual, patrimonial e moral da mulher em situação de violência doméstica, enquanto perdurar a situação de risco. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a matéria (Tema 1249), firmou entendimento sobre a impossibilidade de fixação de prazo predeterminado para a vigência das medidas protetivas, as quais devem perdurar enquanto subsistir o risco à ofendida, firmando as seguintes teses: I - As medidas protetivas de urgência (MPUs) têm natureza jurídica de tutela inibitória e sua vigência não se subordina à existência (atual ou vindoura) de boletim de ocorrência, inquérito policial, processo cível ou criminal. II - A duração das MPUs vincula-se à persistência da situação de risco à mulher, razão pela qual devem ser fixadas por prazo temporalmente indeterminado; III - Eventual reconhecimento de causa de extinção de punibilidade, arquivamento do inquérito policial ou absolvição do acusado não origina, necessariamente, a extinção da medida protetiva de urgência, máxime pela possibilidade de persistência da situação de risco ensejadora da concessão da medida. IV - Não se submetem a prazo obrigatório de revisão periódica, mas devem ser reavaliadas pelo magistrado, de ofício ou a pedido do interessado, quando constatado concretamente o esvaziamento da situação de risco. A revogação deve sempre ser precedida de contraditório, com as oitivas da vítima e do suposto agressor. Em caso de extinção da medida, a ofendida deve ser comunicada, nos termos do art. 21 da Lei n. 11.340/2006. De clareza impar é o RESP 2070717, um dos julgados que motivou a fixação das referidas teses, vejamos: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. TEMA N. 1249. MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. NATUREZA JURÍDICA. TUTELA INIBITÓRIA. CONTEÚDO SATISFATIVO. VIGÊNCIA DA MEDIDA NÃO SE SUBORDINA À EXISTÊNCIA DE BOLETIM DE OCORRÊNCIA, INQUÉRITO POLICIAL, PROCESSO CÍVEL OU CRIMINAL. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE PRAZO PREDETERMINADO. DURAÇÃO SUBORDINADA À PERSISTÊNCIA DA SITUAÇÃO DE RISCO. RECURSO PROVIDO. 1. A Lei Maria da Penha foi fruto de uma longa e custosa luta de setores da sociedade civil para que o Estado brasileiro oferecesse às mulheres um conjunto de mecanismos capaz de assegurar a elas, em situações de violência doméstica, efetiva proteção e assistência. 2. Em verdade - e isso deve ser tomado como uma necessária premissa a nortear qualquer avaliação e interpretação da Lei n. 11.343/2006 - o ingresso dessa lei no ordenamento jurídico resultou na criação de um microssistema dentro do sistema de justiça criminal, cujas características são únicas, em alguns pontos não coincidentes com as categorias e institutos usualmente presentes em outras áreas do Direito. 3. Daí por que se deve extrair o máximo possível de extensão semântica às medidas protetivas de urgência, como medida inovadora na legislação brasileira, idônea e necessária para maximizar a proteção estatal às mulheres vítimas de algum tipo de violência doméstica, mas que também ultrapassa a esfera do Direito Penal e avança no desejado equilíbrio nas relações de gênero em nossa sociedade. 4. Sob tal consideração inicial, cumpre registrar que as medidas protetivas previstas na Lei n. 11.340/2006, por visarem resguardar a integridade física e psíquica da ofendida, possuem conteúdo satisfativo, e não se vinculam, necessariamente, a um procedimento principal. Elas têm como objeto a proteção da vítima e devem permanecer enquanto durar a situação de perigo. 5. O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça, afirma que as medidas protetivas de urgência "são autônomas em relação ao processo principal, com dispensa da vítima quanto ao oferecimento de representação em ação penal pública condicionada". Em igual direção, o Enunciado n. 37 do FONAVID (Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher): "A concessão da medida protetiva de urgência não está condicionada à existência de fato que configure, em tese, ilícito penal." 6. Tal posição foi partilhada pelo legislador com a publicação da Lei n. 14.550/2023, que incluiu o parágrafo 5º no art. 19 da Lei Maria da Penha para afirmar que "As medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência". 7. Diante do exposto, não é possível vincular, a priori, a ausência de um processo penal ou inquérito policial à inexistência de um quadro de ameaça à integridade da mulher. É certo que há razões múltiplas, para além da inexistência de uma efetiva situação de risco, que podem justificar o não ajuizamento de uma ação penal. 8. A configuração das medidas protetivas, portanto, deve ser considerada como tutela inibitória, porquanto tem por escopo proteger a ofendida, independentemente da existência de inquérito policial ou ação penal, não sendo necessária a realização de um dano, tampouco a prática de uma conduta criminalizada. 9. Sobre o prazo de duração das medidas, a Carta da XVIII Jornada Lei Maria da Penha, documento produzido em evento organizado pelo Conselho Nacional de Justiça, recomenda que "na aplicação da Lei Maria da Penha, seja assegurada sua finalidade preventiva e protetiva, sem fixação de prazo de vigência das medidas protetivas de urgência, que devem persistir enquanto perdurar o risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida e seus dependentes, podendo ser reavaliada a qualquer tempo". 10. É desse mesmo jaez o entendimento retratado na Lei Maria da Penha com a inclusão do art. 19, § 6º, pela Lei n. 14.550/2023, que estabelece que "as medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes". 11. É dizer, apesar do caráter provisório inerente às medidas protetivas de urgência, não há como quantificar, de antemão, em dias, semanas, meses ou anos, o tempo necessário à cessação do risco, a fim de romper com o ciclo de violência instaurado. 12. Com efeito, a fim de se evitar a perenização das medidas, a pessoa interessada, quando entender não mais ser pertinente a tutela inibitória, poderá provocar o juízo de origem a se manifestar e este, ouvindo a vítima, decidirá acerca da manutenção ou extinção da medida protetiva. Em caso de extinção da medida, a ofendida deve ser comunicada, nos termos do art. 21 da Lei n. 11.340/2006. 13. O que não é adequado, e muito menos conforme ao desejo de proteção e acolhimento da mulher vítima de violência em razão do gênero, é dela exigir um reforço periódico de seu desejo de manter-se sob a proteção de uma MPU. A renovação de sua iniciativa - dirigir-se ao Fórum ou à Delegacia de Polícia para insistir, a cada 3 ou 6 meses, na manutenção da medida protetiva - implicaria uma revitimização e, consequentemente, uma violência institucional que precisa ser coibida. 14. A iniciativa para eventual revisão ou mesmo retirada da Medida Protetiva de Urgência deve partir de quem esteja sob o compromisso de abster-se de algum ato que possa turbar a tranquilidade ou segurança da ofendida, hipótese em que esta será ouvida antes de uma decisão judicial. 15. Na hipótese em exame, a instância ordinária deferiu as medidas protetivas em favor da vítima B. U. S. M. sem vinculação de prazo. Inconformada, A. N. S. interpôs agravo de instrumento perante o Tribunal de Justiça, que deu parcial provimento ao recurso para estipular prazo de vigência de 90 dias. Nesse cenário, conclui-se que assiste razão ao recorrente quando afirma que "não é possível fixar um prazo pré-determinado de duração das medidas protetivas". Isso porque as medidas protetivas devem perdurar o tempo necessário à cessação do risco, a fim de romper com o ciclo de violência instaurado. Não há, portanto, como quantificar, de antemão, em dias, semanas, meses ou anos (no caso, em 90 dias), o tempo necessário à cessação do risco. 16. Recurso especial provido para clarificar que a duração das medidas protetivas deve perdurar pelo tempo necessário à cessação do risco, sem fixação de prazo certo de validade, e sem vinculação com a existência ou permanência de inquérito policial ou ação penal. Fixação das seguintes teses: I - As medidas protetivas de urgência (MPUs) têm natureza jurídica de tutela inibitória e sua vigência não se subordina à existência (atual ou vindoura) de boletim de ocorrência, inquérito policial, processo cível ou criminal. II - A duração das MPUs vincula-se à persistência da situação de risco à mulher, razão pela qual devem ser fixadas por prazo temporalmente indeterminado; III - Eventual reconhecimento de causa de extinção de punibilidade, arquivamento do inquérito policial ou absolvição do acusado não origina, necessariamente, a extinção da medida protetiva de urgência, máxime pela possibilidade de persistência da situação de risco ensejadora da concessão da medida. IV - Não se submetem a prazo obrigatório de revisão periódica, mas devem ser reavaliadas pelo magistrado, de ofício ou a pedido do interessado, quando constatado concretamente o esvaziamento da situação de risco. A revogação deve sempre ser precedida de contraditório, com as oitivas da vítima e do suposto agressor. Em caso de extinção da medida, a ofendida deve ser comunicada, nos termos do art. 21 da Lei n. 11.340/2006. (REsp n. 2.070.717/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, relator para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 13/11/2024, DJEN de 25/3/2025.) (grifamos). Portanto, não há dúvidas que a premissa básica das medidas protetivas é que elas devem permanecer vigentes, enquanto o magistrado, representante do Estado, identificar a existência de uma situação de risco, sendo mantidas, independentemente de ter havido o ajuizamento de uma ação penal, e mesmo que o autor de violência doméstica, seja absolvido de eventual processo criminal, isto porque, uma condenação exige outros elementos, não exigidos no momento da fixação das medidas protetivas, instituto voltado par resguardar a integridade física e psicológica da mulher em situação de violência. Neste cenário, a fundamentação ora utilizada pela defesa merece ponderação, pois ignora a dinâmica própria da violência doméstica e a autonomia do Poder Judiciário na avaliação do risco. Conforme lição de CAVALCANTE, Márcio André Lopes: "As medidas protetivas impostas têm validade enquanto perdurar a situação de perigo. Logo, não faz sentido fixar um prazo de vigência (um prazo de duração), considerando que é impossível saber, a priori, quando haverá a cessação daquele cenário de insegurança. A decisão judicial que impõe as medidas protetivas de urgência submete-se à cláusula rebus sic stantibus, ou seja, para sua eventual revogação ou modificação, é indispensável que o Juízo se certifique de que houve a alteração do contexto fático e jurídico. No mesmo sentido, a Lei nº 14.550/2023 inseriu o § 6º no art. 19 da Lei nº 11.340/2006 prevendo o seguinte: Art. 19 (...) § 6º As medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes." Destarte, a manifestação da vítima no sentido da revogação das medidas, embora relevante e deva ser considerada, não vincula automaticamente a decisão judicial, tampouco elide, por si só, a necessidade da prisão preventiva decretada em razão do descumprimento anterior e do risco concreto de reiteração. Cabe ao magistrado, com a devida cautela, avaliar a persistência da situação de risco, independentemente da vontade expressa pela ofendida, notadamente em casos que envolvem o ciclo da violência doméstica, onde a retratação ou o pedido de revogação podem decorrer de coação, dependência emocional ou econômica, ou mesmo da falsa percepção de cessação do perigo. A “Teoria do Ciclo de Violência Doméstica” criada pela psicóloga norte-americana Lenore Walker, em sua obra “The battered woman” (1979), aponta a presença de três fases recorrentes nos casos de violência doméstica, quais sejam: a fase de tensão, acompanhada de uma sensação de perigo; a fase do ato de violência; e a fase da “lua de mel”. A primeira fase é marcada pelo momento de tensão, quando o agressor se mostra agressivo e irritado, ocorrendo ameaças, humilhações e xingamentos. Nesse estágio a mulher não consegue identificar que tais comportamentos configuram formas de violência, e tenta acalmar o autor da violência, fazendo de tudo para agradá-lo como uma forma de solucionar a tensão: Durante a primeira fase, há um escalada gradual de tensão exibido por atos discretos que causam maior fricção, como xingamentos, outros comportamentos intencionais maldosos e/ou abuso físico. O agressor expressa insatisfação e hostilidade, mas não de forma extrema ou explosiva. A mulher tenta apaziguar o agressor, fazendo o que ela pensa pode agradá-lo, acalmá-lo, ou pelo menos, o que não irá agravá-lo ainda mais (Walker, 2009, p. 91). Pode-se dizer que nessa fase ocorrem os xingamentos e as ameaças, isto é, violência moral. Ademais, a violência psicológica, tipificada no art. 147-B do Código Penal, também está presente nessa fase, em que o agressor manipula a vítima, fazendo com que ela se sinta culpada pela violência sofrida. Nessa fase também são identificados tipos penais dos Crimes Contra Honra (tipos de calúnia, injúria e difamação) e ameaça, além do crime específico, de violência psicológica. Nesta fase, a vítima tende a negar que isso está acontecendo com ela, esconde os fatos das demais pessoas e, muitas vezes, acha que fez algo de errado para justificar o comportamento violento do agressor ou que “ele teve um dia ruim no trabalho”. A segunda fase é marcada pela agressão física, ocorrendo a explosão do agressor. Após os momentos de tensão, a vítima passa a viver com medo e na iminência de sofrer a agressão. É nesta fase que são realizados os boletins de ocorrência relatando a violência e o requerimento das Medidas Protetivas de Urgência. Cumpre ressaltar que na grande parte dos casos as mulheres sentem vergonha de fazer o boletim de ocorrência pois são ameaçadas pelo companheiro, não são apoiadas pela família ou acreditam que a justiça não punirá seu agressor. Importa observar ainda, que apenas uma pequena quantidade de mulheres chega a denunciar os agressores nesta fase, porque a grande maioria sente medo, pois ainda convive com o agressor, que muitas das vezes é quem mantém a família. A vulnerabilidade econômica é um dos principais fatores que fazem mulheres se submetem a uma situação de violência, sobretudo em uma sociedade patriarcal e machista. Dentre as formas de violência ocorridas nesta etapa, a violência física é a mais característica, podendo muitas vezes chegar em seu estágio final, com o feminicídio. Os tipos penais identificados podem ser vias de fato (artigo 21 do Decreto Lei n. 3.688/41); lesão corporal em contexto de violência doméstica (129, § 13, do Código Penal) e feminicídio (artigo 121-A do Código Penal). A terceira fase, conhecida como “lua de mel” é marcada pelo arrependimento do agressor. Nessa fase o companheiro se arrepende e torna-se amável para conseguir a reconciliação. Para Walker é nessa fase que a mulher passa a reviver todas as sensações que sentiu quando se apaixonou pelo companheiro, tendo a falsa ilusão de que está em um bom relacionamento: Na fase três que se segue, o agressor pode se desculpar profusamente, tentar ajudar sua vítima, mostrar bondade e remorso, e enchê-la de presentes e/ou promessas, o autor da violência pode acreditar neste ponto que ele nunca permitirá se tornar violento novamente. A mulher quer acreditar no agressor e, pelo menos no início do relacionamento, pode renovar sua esperança em sua capacidade de mudar. Esta terceira fase fornece o reforço positivo por permanecer no relacionamento, para a mulher. Muitos dos atos que ele fez quando ela se apaixonou por ele durante o período de namoro ocorrem novamente aqui. (Walker, 2009, p. 94 - 95). Note-se, que não necessariamente o agressor finge arrependimento como forma de manter a mulher presa no ciclo, ou impedir uma punição estatal, isto porque muitas das vezes, por ele mesmo ter sido criado em um contexto de violência doméstica, não conhece outro comportamento a não ser reproduzi-lo. Assim, a mulher, presa na ilusão de que seu companheiro mudou, e sucumbindo a pressão do núcleo familiar, retira a medida protetiva de urgência; arrepende-se de ter feito o boletim de ocorrência; muda a narrativa apresentada na delegacia. Ocorre que, na verdade, a vítima não consegue perceber que está sendo manipulada e controlada pelo agressor, e que tanto ela, quanto seus filhos estão submetidos a um ciclo de violência, que infelizmente, na grande maioria dos casos, vai não só se repetir, como evoluir para novas formas de agressão, ainda mais violentas. E a medida que a violência se repete, a vítima é cada vez mais imersa no ciclo, eis que no caso de reiteração, sentira o peso de ter reatado o relacionamento, bem como o julgamento dos familiares e amigos, que como pessoas externas ao ciclo, não conseguem compreende-lo, e passam a culpa-la por ter reatado. Sentirá, ainda, o peso do aparato estatal despreparado, que não presta o devido tratamento a vítima, não sendo raros os casos em que representantes do Estado falam coisas como “daqui a pouco ela vem retirar a queixa ou perdoar o agressor novamente.” Portanto, deve o Estado adotar instrumentos destinados ao rompimento do ciclo da violência, por meio da capacitação e educação de seus servidores e agentes de segurança, capacitando e explicando sobre ideologia e violência de gênero, bem como promovendo campanhas e redes de acolhimentos capazes de identificar que a mulher se encontra inserida neste ciclo. Em contrapartida, devem os aplicadores do direito, e o judiciário, promover um julgamento sob a perspectiva de gênero, se despindo de percepções machistas e misóginas, compatibilização as peculiaridades que envolvem a violência doméstica e familiar com as demais garantias e direitos que regem o processo penal, em especial, o contraditório, a ampla defesa e o ônus da acusação de reunir lastro probatório suficiente para conferir plausibilidade jurídica à narrativa da denúncia, afinal, a dúvida deve prevalecer em favor do réu. Neste cenário, eventual retratação ou pedido de revogação das medidas protetivas, principalmente quando feito por escrito, devem ser analisadas com cautela, não podendo o julgador perpetuar um estado de violência, deixando a vítima desguarnecida, frente as inúmeras pressões que pode ser submetida. No caso concreto, o histórico do requerente demonstra comportamento de recalcitrância e desrespeito às ordens judiciais. As medidas protetivas foram fixadas em setembro de 2024. Pouco tempo depois, a vítima já comparecia à delegacia para relatar descumprimentos. Os fatos que ensejaram a representação pela prisão preventiva ocorreram em fevereiro de 2025, evidenciando novas violações às medidas. A certidão de antecedentes criminais aponta a existência de, ao menos, dois inquéritos policiais instaurados para apurar o crime de descumprimento de medida protetiva em desfavor do requerente, envolvendo a mesma vítima, além do processo original das medidas e do incidente que resultou na prisão. Essa sucessão de violações em curto espaço de tempo, aliada à gravidade dos atos relatados (perseguição, ameaças inclusive a terceiros), demonstra a periculosidade concreta do agente e o elevado risco de reiteração delitiva, justificando a manutenção da prisão preventiva para garantia da ordem pública, a fim de cessar o ciclo de violência e assegurar a integridade da vítima. Ademais, para melhor subsidiar a análise sobre a voluntariedade e as reais circunstâncias do pedido de revogação das medidas formulado pela vítima, foi determinada a realização de avaliação pela equipe multidisciplinar deste juízo nos autos nº. 0802104-95.2024.8.14.0107, a fim de verificar os motivos que a levaram a tal manifestação e aquilatar a efetiva cessação da situação de risco ou a possível influência de fatores externos, como pressão por parte do agressor ou de terceiros, fenômeno comum em casos de violência doméstica e familiar. Por fim, diante da gravidade concreta dos fatos, da reiteração delitiva específica e do descaso demonstrado pelo requerente para com as decisões judiciais, conclui-se que as medidas cautelares diversas da prisão (art. 319 do CPP) revelam-se, neste momento, insuficientes e inadequadas para acautelar a ordem pública e proteger a integridade da vítima. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, e com fundamento nos artigos 312 e 316 do Código de Processo Penal, e já realizando a revisão da prisão estabelecida no parágrafo único do art. 316, INDEFIRO O PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA formulado pela defesa de V. C. R., mantendo a sua segregação cautelar para garantia da ordem pública. Determino à Secretaria que: 1. Junte cópia desta decisão aos autos principais (nº 0800454-76.2025.8.14.0107, bem como nos autos referentes a medida protetiva (0802104-95.2024.8.14.0107). 2. Cumpra a decisão de id. 141592513, dos autos nº. 0802104-95.2024.8.14.0107, encaminhando os autos à equipe multidisciplinar para avaliação psicossocial da vítima Antônia Xavier dos Santos, com foco na análise das circunstâncias de seu pedido de revogação das medidas protetivas e na avaliação de risco atual, com prazo de 30 (trinta) dias para apresentação de relatório. 3. Intimem-se o Ministério Público por sistema. 4. Intime-se a Defesa por DJEN. Em havendo a preclusão/trânsito da presente decisão, dê-se baixa e arquive-se, independente da tramitação do procedimento principal. Cumpra-se. Dom Eliseu/PA, 22 de abril de 2025. Cristiano Lopes Seglia Juiz de Direito _____________________________________________________________ Fórum Juiz Clodomiro Dutra de Moraes Rua Jequié, nº 312, Bairro Esplanada, Dom Eliseu/PA, CEP: 68.633-000 – Fone (094) 3335-1479
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Processo nº 0005532-09.2019.8.14.0200
ID: 320344562
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única da Justiça Militar
Classe: AçãO PENAL MILITAR - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0005532-09.2019.8.14.0200
Data de Disponibilização:
09/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PAULO RONALDO MONTE DE MENDONCA ALBUQUERQUE
OAB/PA XXXXXX
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ARLINDO DE JESUS SILVA COSTA
OAB/PA XXXXXX
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JOAO PAULO DE CASTRO DUTRA
OAB/PA XXXXXX
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NELSON FERNANDO DAMASCENO E SILVA
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA JUSTIÇA MILITAR Avenida 16 de Novembro, 486. Bairro: Cidade Velha. CEP 66.023-220– Belém/PA. Telefone: (91)9 9339-0307. e-mail: au…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA JUSTIÇA MILITAR Avenida 16 de Novembro, 486. Bairro: Cidade Velha. CEP 66.023-220– Belém/PA. Telefone: (91)9 9339-0307. e-mail: auditoria.militar@tjpa.jus.br; site: www.tjpa.jus.br. Processo número 0005532-09.2019.814.0200 SENTENÇA Relatório O representante do Ministério Público Militar ofereceu denúncia em desfavor de MAURÍCIO MAIA MATOS e MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO, qualificados nos autos, pela prática do crime de extorsão mediante sequestro, tipificado no artigo 244, do Código Penal Militar. Alegou o Ministério Público Militar, na denúncia (ID 54238472), de relevante para compreensão do caso, em síntese: 1. O presente Inquérito Policial Militar (IPM), instaurado por meio da Portaria nº 068/2019 - IPM/CorCPC 1 (fl. 01), visou a apurar a denúncia formulada pela Sra. RAQUEL MONTEIRO BELÉM, perante a Divisão de Crimes Funcionais da Polícia Civil do Estado do Pará - DCRIF, que relatou que, na data de 23/04/2019, nesta cidade de Belém/PA, teria sido abordada por 2 (dois) policiais militares fardados e 1 (um) cidadão que se identificou como policial civil, que teriam lhe extorquido e, ao fim, levado a quantia de aproximadamente R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais); 2. De acordo com os relatos da denunciante, devidamente ratificados perante o órgão correcional da PM/PA (fls. 09/10), na data acima mencionada, por volta de 7h, a Sra. RAQUEL MONTEIRO BELÉM, quando havia se dirigido à Agência da Caixa Econômica Federal localizada na Avenida Tavares Bastos (Belém/PA), onde realizava o saque de valores referentes ao Bolsa Família de pessoas do município do Acará/PA, com a devida autorização das mesmas, veio a ser abordada por um policial militar, que se apresentou como sendo TEN FÁBIO e um outro cidadão que se apresentou como policiai civil; 3. Na abordagem, no interior da Agência, a denunciante teria sido questionada acerca dos cartões que portava, sendo ainda afirmado pelo policial militar e pelo outro à paisana que aquela conduta (realizar saques com cartões de terceiros) não era permitida; 4. Assim, a Sra. RAQUEL foi levada para uma VTR da PM/PA, na qual se encontrava também um outro policial militar, devidamente fardado e lá passou a ser pressionada, afirmando os policiais militares e o policial civil que a mesma iria ser levada para a Delegacia e iria ser presa; 5. A Sra. RAQUEL, sabedora de que não tinha cometido nenhum ilícito, veio a concordar em ser levada para a Delegacia, tendo deixado claro para os policiais que aquela conduta era constante, pois, a fim de ajudar os beneficiários, dirigia-se a Belém, efetuava os saques dos valores e, posteriormente, retornava ao município de Acará/PA, onde realizava os repasses; 6. Ocorre que, antes que a mesma fosse conduzida para a DEPOL, os policiais vieram a propor um acordo para a Sra. RAQUEL, no sentido de que iriam liberá-la, porém, em troca, a mesma tinha que entregar todo valor sacado na agência bancária; 7. O acordo não foi aceito pela denunciante, pelo que os policiais militares passaram a circular por várias ruas com a mesma no interior da VTR, até que, em determinado momento, um dos policiais militares pegou a bolsa onde estavam os valores e devolveu à Sra. RAQUEL apenas parte da quantia sacada, apoderando-se de aproximadamente R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais); 8. Os policiais vieram a deixar a ofendida às proximidades de uma loja de material de construção, localizada na Avenida Almirante Barroso ("Di Casa"), tendo a mesma, ao descer da VTR, conseguido identificar o número do veículo da PM/PA, 2709, o que permitiu que pudesse ir à DCRIF para a formulação da denúncia; 9. Às fis. 14/31 constam os extratos referentes aos cartões do Bolsa Família, que eram portados pela denunciante, dos quais se infere, de forma clara, que no dia mencionado, de fato, houve os saques de valores em Agência da Caixa Econômica Federal; 10. Às fls. 32/37, consta, em Relatório de Inteligência elaborado pela Corregedoria da PM/PA, o "rastro" da VTR 2709 relativo dia dos fatos, que corrobora, de forma clara, com o depoimento da denunciante, já que se verifica que a viatura esteve, por volta de 07h00, parada na Avenida Tavares Bastos, em frente à Agência da Caixa Econômica Federal, que corresponde ao mesmo local em a Sra. RAQUEL afirma ter sido abordada e conduzida; 11. Verifica-se também, conforme relatado pela vítima, que a VTR ficou em movimentação por diversas ruas, por cerca de 30 (trinta) minutos, registrando nova parada justamente no local em que a Sra. RAQUEL afirma ter sido deixada pelos policiais militares denunciados; 12. Porém, os documentos que servem como base principal para a formulação da denúncia são as imagens juntadas aos autos à fl. 55 (dois arquivos de mídia), que afastam qualquer dúvida quanto ao cometimento de crime por parte dos denunciados; 13. Em um primeiro arquivo de mídia constam imagens do interior da agência bancária, nas quais, conforme narrado pela denunciante, a mesma se encontra em um caixa eletrônico efetuando alguma operação bancária, sendo abordada, nesse momento, por um policial militar fardado e uma outra pessoa não identificada, à paisana, e, após uma breve conversa, a mesma é conduzida para fora da agência; 14. Poderia ainda restar dúvida acerca do que houvera após a abordagem e a condução da ofendida para o exterior da agência, sendo tal dúvida fica sanada a partir da análise do segundo arquivo de mídia, no qual constam imagens de câmera do CIOP, localizada em frente à Caixa Econômica da Tavares Bastos, nas quais se percebe, claramente, a Sra. RAQUEL sendo conduzida para o interior da VTR pelos mesmos homens, um policial militar e um cidadão à paisana; 15. Após certo tempo a VTR sai do local e, a partir da análise dos rastros, verifica-se, como dito alhures, que a mesma ficou rondando por diversas ruas; 16. Porém, ainda restava ao órgão correcional a identificação dos policiais militares responsáveis pelo ato perpetrado, mas isto foi possível a partir da análise das escalas (fl. 08), sendo identificados os policiais militares denunciados: CB PM/PA MAURÍCIO MAIA MATOS e 2° SGT PM/PA MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO; 17. Os dois acusados foram inquiridas, conforme termos que constam, respectivamente, às fls. 68/70 e 71/72, e apresentam versão diferente da denunciante; 18. Alegaram os denunciados que teriam sido acionados por um cidadão, que teria informado para a GU que a denunciante, munida de vários cartões, estaria realizando saques em agência bancária da Caixa Econômica Federal; 19. Assim, segundo os acusados, com o cidadão denunciante, teriam se dirigido até a agência, procedendo a abordagem da Sra. RAQUEL e que, tendo sido verificado o não cometimento de qualquer ilícito, liberaram a mesma; 20. Com a devida vênia, a versão apresentada pelos policiais militares denunciados não guarda qualquer relação lógica com a realidade; 21. Inicialmente, verifica-se que não foram juntado pelos mesmos qualquer documento que comprove que a mencionada abordagem deu-se em razão de uma denúncia; 22. Em situações como esta, no mínimo, deveria haver a comunicação ao CIOP e, ainda, o registro em BAPN, que, segundo os investigados, aconteceu, porém sem os dados do denunciante, o que se mostra desconectado da realidade dos fatos; 23. Outro ponto que chama a atenção na versão apresentada pelos policiais militares é que a pessoa que aparece à paisana no vídeo, abordando a denunciante, seria o cidadão responsável pela denúncia inicial mas tal informação afasta-se em muito da realidade, em que uma GU da PM/PA venha a proceder a abordagem de uma pessoa suspeita com apenas 01 (um) policial militar (já que o outro ficou na VTR) e, ainda, juntamente com o suposto denunciante; 24. No mais, pelas imagens de dentro da agência bancária, o que se percebe é que a abordagem foi feita, praticamente, pelo suposto "denunciante", apontando, mais uma vez, para a versão não verdadeira trazida pelos militares; 25. Por fim, frise-se que a verificação da existência de crime ou não por parte da Sra. RAQUEL, deveria ter sido feita ali, no momento da abordagem, ou em Delegacia de Polícia, pela autoridade competente; 26. Tal verificação não se faz no interior de uma VTR, ainda mais rodando durante 30 (trinta) minutos, aproximadamente, como se pode perceber pelo relatório do rastro juntado 27. Várias são as incongruências no depoimento dos policiais militares, que servem para corroborar com as alegações da denunciante, apontando para o cometimento do delito penal militar apontado. Arrolou o Ministério Público somente a vítima RAQUEL MONTEIRO BELÉM. Em apenso consta o Inquérito Policial Militar, bem como os autos de número 0002410-85.2019.814.0200, que versa sobre pedido de quebra de sigilo de dados e/ou telefônico. Consta, ainda, o auto aircunstanciado nº 022/2019/MPPA/GSI, referente ao monitoramento realizado no período de 04 a 19/12/2019, contendo a conclusão de que não houve aúdio relacionado com o objeto de investigação desta ação penal (IDs 54239150 a 54239155). A denúncia foi recebida no dia 05 de março de 2020 (ID 54238474). Os acusados foram citados (ID 54238475, págs. 9 e 10) e apresentaram resposta à acusação (ID 54238476). Em 05/04/2023, foi ouvida a testemunha (vítima) RAQUEL MONTEIRO BELÉM e os acusados foram interrogados. As partes não requereram diligências na fase do artigo 427, do Código de Processo Penal Militar (ID 90718112). O Ministério Público Militar apresentou alegações finais escritas (ID 90839792), pugnou pela condenação dos acusados pela prática do crime de extorsão mediante sequestro previsto no artigo 244 do CPM. A defesa de MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO, em alegações finais escritas, requereu a absolvição do acusado com fundamento no artigo 439, alíneas “a” e “e” do CPPM (ID 96656395). A defesa de MAURÍCIO MAIA MATOS apresentou alegações finais e requereu a sua absolvição por insuficiência de provas para condenação, com fundamento no artigo 439, “e”, do CPPM (ID 97700947). Foi juntado aos autos certidão de óbito de MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO (ID 147953317). O Ministério Público manifestou-se pela decretação da extinção da punibilidade quanto ao crime imputado ao acusado MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO em virtude do seu falecimento, conforme dispõe o artigo 123, I, do Código Penal Militar (147959225). Relatado, passo a decidir. Fundamentação Preliminarmente, deve ser reconhecida a extinção da punibilidade pela morte quanto ao acusado VALDOMIRO MARTINS CARDOSO, comprovada pela certidão de ID 147953317, conforme dispõe o artigo 123, I, do Código Penal Militar. Aos acusados foi imputada a prática do crime de extorsão mediante sequestro, tipificado no artigo 244 do Código Penal Militar, que dispõem, in verbis: “Extorsão mediante sequestro Art. 244. Extorquir ou tentar extorquir para si ou para outrem, mediante sequestro de pessoa, indevida vantagem econômica: Pena - reclusão, de seis a quinze anos. É preciso aferir, portanto, se há provas da materialidade e autoria quanto ao crime imputado ao acusado MAURÍCIO MAIA MATOS na denúncia. Dos depoimentos da ofendida e interrogatório dos acusados, registrados por meio audiovisual, de relevante, colhem-se as seguintes informações: Depoimento de RAQUEL MONTEIRO BELÉM (ofendida): “Veio de Acará para fazer saques para algumas pessoas e foi para a Caixa da Tavares Bastos. Quando estava fazendo o saque, um cidadão baixinho, moreno, com uma mochila nas costas, lhe abordou. Esse cidadão disse que aquilo era crime. Foi abordada e entrou na viatura. Foi conduzida rumo a Pedro Alves Cabral e passaram a rodar com a declarante e começaram a lhe fazer perguntas. Esclareceu que pessoas tinham pedido para fazer o saque. Em determinado momento pararam a viatura e disseram que queriam dinheiro. Eles disseram que a declarante iria para a Delegacia, seria presa e iria apanhar. A declarante disse que trabalhava como servente em uma escola de Acará. A declarante disse que preferia ir para a Delegacia. Eles ficaram com o dinheiro. Mandaram a declarante descer e que fosse embora. A declarante foi embora, atravessando a Almirante Barroso. Ligou para um primo, dizendo que tinha acontecido. Ele lhe deu o telefone de um amigo. Tinha três mil e poucos reais. Eram valores de bolsa família. O Carona disse que era o Tenente Fábio. O outro disse que era policial civil. Entrou na caixa umas seis e meia, onde ficou uns trinta ou quarenta minutos, saindo umas sete horas. Ficou em poder dos policiais até umas sete e meia. Foi até a Corregedoria da Polícia Militar fazer registro de ocorrência do fato. Não foi feito reconhecimento dos policiais. Foi mostrado o cadastro, contendo fotos. Foi conduzido para dentro da viatura da Polícia Militar e viu que o número era 2709. Havia três pessoas dentro da viatura, sendo dois policiais militares fardados, e um que se disse que era policial civil, não fardado. Essa pessoa que se identificava como tenente Fábio é que ficou com o dinheiro. Acredita que foi subtraído cerca de um mil, quinhentos reais da declarante. Foi colocada em liberdade numa travessa, que fica entre Pedro Alves Cabral e Almirante Barroso, de onde era possível ver a loja Di Casa. Ficou cerca de trinta minutas dentro da viatura. O primeiro da declarante é segundo. Não deu tempo de ver se havia nomes identificado os policiais, em suas fardas. Mora em Acará há cerca de vinte e três anos. A declarante é servidora pública há dezessete anos, trabalhando como servente em escola”. (grifo nosso). Interrogatório de MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO: “Receberam uma denúncia de que tinha uma senhora fazendo saques em uma agência bancária, supostamente indevidos. Foram averiguar a situação. Chegou à agência e seu motorista ficou dentro da viatura e o declarante desceu. O declarante abordou a ofendida e ela disse que estava fazendo saques. Disse a ela que aquilo era errado, pois não poderia fazer saques para terceiros. Convidou a senhora para ir até a viatura. A senhora foi colocada dentro da viatura e seguiram para irem para a Marambaia. Ela alegou que era de Acará e que realmente estava fazendo saques e que tinha pretensões políticas. Estavam saindo de serviço e resolveram liberar a senhora. Ela disse que tinha parente militar e que não tinha gostado da abordagem e que iria procurar os direitos dela. A abordagem aconteceu na agência da caixa da Tavares Bastos e acredita que ocorreu umas sete horas da manhã e a liberaram na rua da Coton Maias, que fica em uma Travessa entre a Pedro Alvares Cabral e Almirante Barroso. Ela foi liberada entre 7h25 e 7h30 da manhã. Não viu valor em dinheiro em poder da senhora. A intenção era levar a ofendida para a Delegacia da Marambaia. Estavam de serviço o declarante e Maurício. Havia um civil, que fez a denúncia. Foi feito registro no BAPM em papel. Não foi informado o CIOP. Estavam de serviço na VTR 2709. Não sabe o nome do cidadão que fez a denúncia”. (grifo nosso). Interrogatório de MAURÍCIO MAIA MATOS: “Estava de serviço, no dia mencionado, e foram abordados por um nacional informando que a ofendida estava fazendo saques com vários cartões. A senhora foi convidada a entrar na viatura para ser conduzida a Delegacia da Marambaia. Foram até as proximidades da viatura. A partir de declarações da senhora, resolveram liberá-la. O serviço já estava terminando. Já eram cerca de sete e meia ou sete e quarenta. O Comandante da viatura era o outro réu. A abordagem ocorreu por volta de sete horas, na agência da Caixa da Tavares Bastos, e a ofendida foi liberada próximo próximo a Pedro Alvares Cabral. Não sabe quanto tempo a senhora ficou dentro da viatura. Não ficaram com dinheiro da ofendida. Acredita que estavam na viatura 2709. Não sabe o nome do civil que fez a denúncia quanto aos saques suspeitos. Foi feito BAPM, mas não se recorda se foi informado o CIOP. Tem quarenta e dois anos e quatorze anos de policial. Foi punido com quinze dias de prisão em razão deste fato”. (grifo nosso). Passo ao exame dos elementos de prova quanto à materialidade e autoria do crime de extorsão mediante sequestro, tipificado no artigo 244, do Código Penal Militar, imputado aos acusados. Há elementos de prova que indicam a ocorrência do fato delituoso narrado na denúncia e à autoria, imputada ao acusado MAURÍCIO MAIA MATOS. Constam nos autos o depoimento da vítima, mídias com as imagens capturadas por câmeras de segurança da agência bancária (Caixa Econômica Federal) e do Centro Integrado de Operações (CIOP) em frente à agência, escala de serviço identificando o acusado MAURÍCIO MAIA MATOS como sendo um dos policiais que abordaram a vítima e o dos militares acusados, confirmando que realizaram a abordagem, motivados por uma denúncia recebida de um civil não identificado por eles. Alegaram os acusados que foi feito o registro do BAPM, porém não apresentaram a pessoa abordada à autoridade policial e a liberaram porque se encontrava próximo do horário do término do serviço (ID 54239011). A vítima relatou que teve a sua liberdade cerceada e foi conduzida pelos policiais militares denunciados e lhe exigiram dinheiro para colocá-la em liberdade. Declinou a vítima que somente foi liberada após ter sido retirada pelos policiais diretamente de sua bolsa uma quantia aproximada de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) (ID 54238991). Além do depoimento da vítima, outros elementos de prova corroboram com a versão dada aos fatos pela mesma. Constam nos autos imagens das câmeras de segurança da agência bancária que capturam a abordagem à vítima feita pelos policiais e imagens fornecidas pelo CIOP, que mostram a vítima sendo conduzida e adentrando na viatura, em frente à agência da Caixa Econômica Federal. Essas foram visualizadas pelos acusados e os mesmos confirmaram que houve a abordagem mencionada na denúncia (ID 54239011). Consta, ainda, o relatório técnico referente ao rastro da VTR 2709 relativo ao dia e horário dos fatos, no qual se observa que os deslocamentos, as paradas e as respectivas durações são coincidentes com as declarações da vítima e com a narrativa constante na exordial acusatória (IDs 54238994, págs. 10 e 11, e 54239000, págs. 1 a 4). Os acusados, embora admitam que fizeram a abordagem à vítima, contam uma versão diversa da apresentada na denúncia, negando a exigência de valores. A versão dos acusados não foi corroborada por nenhum elemento de prova. Ao contrário disso, o que se observou é a comprovação dos termos da denúncia, especialmente pelos depoimentos da vítima, na fase do procedimento policial e em juízo, além das imagens captadas pelas câmeras de segurança da agência da Caixa Econômica Federal e do Centro Integrado de Operações (CIOP) e o relatório de rastreamento da viatura. O que se nota é que os depoimentos da vítima foram firmes, coerentes e corroborados por outros elementos de prova. Não haveria qualquer motivo para que a vítima, sendo submetida a uma abordagem regular, viesse a inventar que teve a sua liberdade cerceada por policiais e que estes teriam exigido dinheiro para colocá-la em liberdade. E não há qualquer elemento de prova que corrobore com a versão dos miliares acusados, de que não houve a exigência e a subtração dos valores. Veja-se que nem mesmo o protocolo básico de segurança teria sido observado, pois, segundo a versão de MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO, a guanição teria sido procurada por um civil, que não conheciam, para informar sobre uma conduta suspeita (saques sendo feitos pela vítima), e ele (Manoel) teria ido acompanhado deste cidadão fazer a averiguação, deixando o corréu MAURÍCIO MAIA MATOS a sós na viatura. Ademais, os acusados, conforme a versão de MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO, apesar de terem restringido a liberdade da ofendida por cerca de 30 (trinta) minutos, não comunicaram o atendimento da ocorrência ao CIOP. Não foi registrado pelos militares acusados, ainda, o nome do cidadão civil que teria levado ao conhecimento da guarnição que havia uma pessoa fazendo saques suspeitos. A conduta dos militares acusados, consistente em “extorquir ou tentar extorquir para si ou para outrem, mediante sequestro de pessoa, indevida vantagem econômica”, configura o crime tipificado no artigo 244, do Código Penal Militar, como sustentado pelo Ministério Público. Conclusão Ante o exposto, decreto extinta a punibilidade quanto ao acusado MANOEL VALDOMIRO MARTINS CARDOSO, por ter sido comprovado o seu óbito (ID 147953317), com fundamento no artigo 123, I, do Código Penal Militar, e julgo procedente a denúncia quanto ao acusado MAURÍCIO MAIA MATOS para CONDENÁ-LO pela prática do crime de extorsão mediante sequestro, tipificado no artigo 244, do Código Penal Militar. Passo a dosimetria da pena, considerando as circunstâncias judiciais: 1ª. A gravidade do crime praticado: o crime praticado pelo acusado, em si, é bastante grave, pois o mesmo, no exercício da função, em companhia de outro militar, com apoio de outra pessoa não identificada, utilizando toda a estrutura do Estado, privou a vítima de liberdade, mantendo-a nessa condição por cerca de 30 (trinta) minutos, sendo da mesma exigida certa quantia em dinheiro, e somente foi posta em liberdade após a apropriação valor em dinheiro, em total descompasso com o ordenamento jurídico e as normas e princípios que regem a atividade policial militar; 2ª. A personalidade do réu: Não há elementos técnicos seguros que possam revelar personalidade alterada do acusado, de modo a justificar a exasperação da pena; 3ª. A intensidade do dolo: Normal para o tipo; 4ª. A extensão dos danos causados: Houve dano material e, potencialmente, psicológico para a vítima, e para a imagem de toda a instituição Polícia Militar, eis que o acusado, servidor público que é pago para cumprir e fazer cumprir a lei, servir e proteger o cidadão, prevenindo a prática de crimes, agiu em sentido totalmente contrário; 5ª. O meio empregado: Foi utilizada a estrutura do Estado posta à disposição para a atividade policial para a prática do delito; 6ª. O modo de execução: A restrição da liberdade como forma de coação para o auferimento da vantagem econômica pretendida; 7ª. Os motivos determinantes: Foi a obtenção da vantagem econômica indevida; 8ª. As circunstâncias de tempo e lugar: Os fatos ocorreram por volta de 7h da manhã, do dia 23 de abril de 2019, com início em uma Agência da Caixa Federal, situada na Avenida Tavares Bastos, Belém, PA, cessando na Avenida Almirante Barroso, Belém, PA, próximo ao estabelecimento comercial “Di Casa”; 9ª. Os antecedentes do réu: Não há registro de sentença penal condenatória em desfavor do acusado; 10ª O acusado não demonstrou arrependimento pelo fato praticado, tendo negado a prática do delito. Atento às circunstâncias judiciais, fixo a pena base em 6 (seis) anos de reclusão, que torno definitiva por ser possível aplicar circunstâncias atenuantes e não haver agravantes ou causas de aumento ou diminuição de pena, a ser cumprida, inicialmente, em regime semiaberto, conforme dispõe o artigo 61, do Código Penal Militar, combinado com o artigo 33, § 2º, “b”, do Código Penal. Considerando a gravidade do crime, praticado por policial militar, contra civil, com privação da liberdade como forma de coação moral, como narrado acima, forçoso é reconhecer que houve ofensa grave aos princípios e normas que regem a atividade policial militar, atingindo a honra pessoal, o pudonor policial militar e o decoro da classe, pelo que aplico ao acusado MAURÍCIO MAIA MATOS a pena acessória de exclusão da corporação, como dispõem os artigos 98, IV, e 102, do Código Penal Militar, em conformidade com a decisão proferida no Recurso Extraordinário 447.859, do Egrégio Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Eminente Ministro Marco Aurélio Melo. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cientifique-se o Ministério Público Militar. Após o trânsito em julgado, adotem-se as providências cabíveis. Expeça-se o necessário. Cumpra-se. Belém, PA. LUCAS DO CARMO DE JESUS Juiz de Direito Titular da Vara Única da Justiça Militar do Estado do Pará
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Processo nº 0007248-08.2018.8.14.0200
ID: 281723443
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única da Justiça Militar
Classe: AçãO PENAL MILITAR - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0007248-08.2018.8.14.0200
Data de Disponibilização:
28/05/2025
Polo Ativo:
Advogados:
MARCELINO FROTA VIEIRA
OAB/PA XXXXXX
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RAFAELA PONTES SCOTTA DE MIRANDA
OAB/PA XXXXXX
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DEBORA NUNES DE MIRANDA
OAB/PA XXXXXX
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OCEANIRA FARIAS DE MIRANDA
OAB/PA XXXXXX
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CRISTIANE DO SOCORRO CUNHA DE OLIVEIRA
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA JUSTIÇA MILITAR Avenida 16 de Novembro, 486. Bairro: Cidade Velha. CEP 66.023-220– Belém/PA. Telefone: (91)9 9339-0307. e-mail: au…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA JUSTIÇA MILITAR Avenida 16 de Novembro, 486. Bairro: Cidade Velha. CEP 66.023-220– Belém/PA. Telefone: (91)9 9339-0307. e-mail: auditoria.militar@tjpa.jus.br; site: www.tjpa.jus.br. Processo: 0007248-08.2018.8.14.0200 AÇÃO PENAL MILITAR - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (11037) AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARA DENUNCIADO: MARCELO JANAU VIEIRA, DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO, MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS, TIAGO QUITANIAS DA SILVA SENTENÇA Relatório O representante do Ministério Público Militar ofereceu denúncia em desfavor de DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO, MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS, TIAGO QUITANIAS DA SILVA e MARCELO JANAÚ VIEIRA, qualificados nos autos, pela prática dos crimes de lesão corporal grave e de violação de domicílio na sua forma triplamente qualificada, tipificados nos artigos 209, § 1º, e 226, § 1º, ambos do Código Penal Militar. Alegou o Ministério Público Militar, na denúncia (ID 32701111), de relevante para compreensão do caso, em síntese: Narram os autos presentes que, no dia 31 de março de 2017, por volta de 11h, na Loja Brasil Cell, localizada na Travessa Frutuoso Guimarães, n° 366, bairro do Comércio, no município de Belém/PA, o nacional Edson Alan Gonçalves Souza foi agredido fisicamente pelo denunciado CAP PM CARLOS, o qual adentrou na referida loja com o intuito de obter informações acerca de um aparelho celular possivelmente furtado; Desta feita, o CAP PM CARLOS, juntamente a outros policias militares, acabou por realizar uma revista em todos os clientes da loja, impedindo a saída dos mesmos, assim como, ainda, tentou adentrar a uma parte restrita da loja sem a devida autorização; Neste cenário, apurou-se que, o CAP PM CARLOS e o CB PM JANAÚ, deslocaram-se até a loja Brasil Cell, vez que, procuravam um telefone celular que havia sido furtado da sobrinha do Capitão, de modo que o GPS rastreador do aparelho indicava a loja como possível destino do objeto. Assim, ao chegarem ao recinto, solicitaram apoio a outros militares, via CIOP, e adentraram no estabelecimento, revistando todos os clientes e impedindo-os de saírem; Ocorre que, o CAP PM CARLOS ao tentar ultrapassar uma parte restrita aos funcionários e não aberta ao público da loja foi impedido pelo nacional Edson Alan Gonçalves de Souza, ao passo que este expressou o fato do militar não possuir mandado para tal ação. Logo, o Capitão denunciado passou a ofender o nacional com palavras de baixo calão, agredindo-o com um tapa no rosto, recebendo como resposta um soco do Sr. Edson; Ato contínuo, de maneira extremamente desproporcional, após o CB PM JANAÚ e CB PM THIAGO imobilizarem o nacional, o CAP PM CARLOS sacou sua pistola.40 e efetuou um disparo contra o pé do Sr. Edson, sendo este algemado e levado para o HSM da 14; Nota-se que, os demais policiais militares presentes no momento dos fatos, quais sejam, CB PM THIAGO, CB PM JANAU e SGT PM FREITAS, acabaram por dar cobertura à ação agressiva e desproporcional de seu comparsa militar, aderindo à vontade do mesmo de lesionar a vítima, até por se omitirem no dever de impedir tal conduta; Por fim, foi realizado exame de corpo de delito, fl. 126 dos autos, o qual atestou que EDSON ALAN GONÇALVES DE SOUZA realmente foi vítima de disparo de arma de fogo, ficando incapacitado para suas ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias. O RMPM requereu o recebimento da denúncia e a notificação do ofendido e mais 4 (quatro) testemunhas arroladas. A denúncia foi recebida no dia 27 de janeiro de 2020 (ID 32701113). Constam, em apenso, o Inquérito Policial e o Processo nº 0029601-55.2017.814.0401 (IDs 32701140 a 32702184). Foram juntados o Boletim de Ocorrência Policial referente aos fatos ocorridos no dia 31/03/2017, por volta das 11h00 (ID 32701140, pág. 6) e os termos dos depoimentos prestados pelo ofendido EDSON ALAN GONÇALVES SOUZA e pelas testemunha EDVANDA BORGES E BORGES, JEFFERSON DE SOUZA SANTANA e JOSUE JACKSON PENHA FERREIRA no IP (ID 32701140, pág. 8, 18, 21 e 24). Os acusados foram citados (IDs 32701119, pág. 7/9; 32701123). Em sede de resposta à acusação, a defesa de MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS e TIAGO QUITANIAS DA SILVA requereu a absolvição sumária dos denunciados, nos termos do art. 439, alínea “c”, do CPPM, por inexistir prova de terem concorrido para a infração penal (ID 32701121). A defesa de MARCELO JANAU VIEIRA requereu absolvição por insuficiência probatória e atipicidade de conduta em relação ao crime de violação de domicílio; arrolou testemunhas (ID 32701125). A defesa de DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO alegou legítima defesa em relação ao crime de lesão corporal grave e atipicidade de conduta quanto ao crime de violação de domicílio. Requereu a absolvição sumária do acusado pela presença da excludente de ilicitude da legítima defesa, com fundamento no art. 439, alínea “d”, do CPPM; arrolou testemunhas (ID 32701127). Dentre os documentos juntados pela defesa, consta o Laudo nº 2017.01.004342-TRA referente ao exame de corpo de delito realizado no denunciado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO (ID 32701130). Em audiência no dia 09/07/2024, foram ouvidas as testemunhas de acusação EDSON ALAN GONÇALVES SOUZA (ofendido), JEFFERSON DE SOUZA SANTANA, EDVANDA BORGES E BORGES e JOSUÉ JACKSON PENHA FERREIRA. O RMPM desistiu da oitiva da testemunha RAQUEL MELO DA COSTA. Foi ouvida a testemunha de defesa LEONARDO EULLER MELO DA CUNHA. A defesa desistiu da testemunha ENÉAS DIAS DE ASSUNÇÃO NETO. Os acusados foram interrogados (ID 119902565). As partes não requereram diligências na fase do artigo 427 do CPPM. Determinada vista às partes para apresentar alegações finais escritas, nos termos do artigo 428 do CPPM (ID 119902565). O Ministério Público Militar apresentou alegações finais escritas pugnando pela parcial procedência da denúncia, a fim de: CONDENAR o acusado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO nas sanções do art. 209, § 1º do CPM; ABSOLVER os acusados MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS e TIAGO QUINTANIAS DA SILVA face à inexistência de provas de que concorreram à infração penal, nos termos do art. 439, alínea “c” do CPPM; ABSOLVER o acusado MARCELO JANAÚ VIEIRA pela insuficiência de provas, com fundamento no art. 439, alínea “e” do CPPM. Por fim, que seja extinta a punibilidade em relação ao delito de violação de domicílio qualificada em razão da prescrição da pretensão acusatória, nos termos do art. 123, IV do CPM. (ID 121766324). A defesa dos acusados MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS e TIAGO QUINTANIAS DA SILVA apresentou alegações finais escritas, requerendo a absolvição de MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS e TIAGO QUINTANIAS DA SILVA, nos termos do artigo 386, IV, do CPP (ID 121908621). A defesa dos acusados DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO e MARCELO JANAÚ VIEIRA requereu a absolvição de DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO do crime de lesão corporal por legítima defesa, com fundamento no art. 439, alínea “d”, do CPPM c/c art. 42, II, do CPM; a absolvição de MARCELO JANAÚ VIEIRA, por não existir prova de ter concorrido para a infração penal e/ou insuficiência de provas, nos termos do art. 439, alíneas “c” e “e”, do CPPM (ID 125970563). Relatado, passo a decidir. Fundamentação Aos acusados foi imputada a prática do crime de lesão corporal grave, tipificado no artigo 209, §1º, do Código Penal Militar, que dispõe, in verbis: Art. 209. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano. Lesão grave § 1° Se se produz, dolosamente, perigo de vida, debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias: Pena - reclusão, até cinco anos. (…) Art. 226. Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena - detenção, até três meses. Forma qualificada § 1º Se o crime é cometido durante o repouso noturno, ou com emprego de violência ou de arma, ou mediante arrombamento, ou por duas ou mais pessoas: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência. Como se vê, a pena prevista para o crime de violação de domicílio em sua forma qualificada é de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. Quanto ao prazo prescricional, dispõe o artigo 125, VI, do Código Penal Militar, in verbis: Art. 125. A prescrição da ação penal, salvo o disposto no § 1º deste artigo, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (...) VI - em quatro anos, se o máximo da pena é igual há um ano ou, sendo superior, não excede a dois”; (grifo nosso). A denúncia foi recebida em 27 de janeiro de 2020 (ID 32701113), quando ocorreu o último ato interruptivo, conforme dispõe o artigo 125, VI, do CPM, portanto, há mais de 4 (quatro) anos. Assim, forçoso é reconhecer, dadas a pena máxima privativa de liberdade cominada para o crime de violação de domicílio imputado aos acusados, encontra-se extinta a punibilidade pela prescrição, conforme dispõem os artigos 123, IV, e 125, V, e seu § 5º, I, do Código Penal Militar, pois desde o recebimento da denúncia, quando ocorreu o último ato interruptivo, já se passaram mais de 4 (quatro) anos. Ante o exposto, declaro extinta a punibilidade quanto ao crime de violação de domicílio (artigo 226, §1º, do CPM), imputado aos acusados, qualificados nos autos, pela prescrição, em conformidade com as disposições contidas nos artigos 123, IV, e 125, VI, e seu § 5º, I, do Código Penal Militar. Quanto ao crime de lesão corporal grave É preciso aferir, portanto, se há provas da materialidade e autoria quanto ao crime de lesão grave, tipificado no artigo 209, §1º, do Código Penal Militar, imputado aos acusados na denúncia. Dos depoimentos do ofendido, das testemunhas e do interrogatório dos acusados, registrados por meio audiovisual, de relevante, colhem-se as seguintes informações: Depoimento de EDSON ALAN GONÇALVES SOUZA (ofendido): Trabalhava na Loja Brasil Cell na época dos fatos. Chegaram dois policiais à paisana falando que havia sido furtado um celular de um parente e o GPS indicava que o aparelho estava naquele local. Começaram a fazer revista. O declarante questionou e policial deu uma tapa no rosto do declarante. O declarante deu um soco nele e ai ele lhe deu um tiro. Disseram que eram policiais, mas não mostraram a identidade funcional. O Capitão queria apresentar o declarante na Delegacia. Foi o Capitão que atirou no declarante. Depois que o declarante foi atingido pelo disparo, Janaú levou o declarante e colocou no xadrez da viatura, de onde foi levado para o hospital. O declarante disse que tinha plano de saúde, mas foi levado para o pronto socorro. Demorou muito o atendimento e começou a sair muito sangue e aí foi encaminhado para o hospital Porto Dias. Ficou mais de 30 (trinta) dias sem pode trabalhar. Não teve qualquer assistência da parte deles. Não foi procurado e nem ameaçado. Até hoje não encontraram o celular que procuravam. Os policiais que estavam fardados não lhe agrediram. Os policiais chegaram na hora da discussão. Não se recorda muito bem, mas acredita que os fardados chegaram na hora da confusão. Havia mais pessoas trabalhando na loja (Jefferson, Jackson e Edvanda). Edvanda Borges era a proprietária. Chegaram primeiro o Capitão Carlos e Janaú. O declarante estava na parte interna. Quem os recebeu foi a proprietária. Presenciou a conversa entre eles e a proprietária da loja. Na época trabalhava na manutenção. Ele adentrou na parte interna da loja e o declarante disse que ele não tinha mandado para ingressar e ele lhe deu um tapa no rosto do Capitão e o declarante lhe deu um soco no rosto dele. E então o Capitão efetuou o disparo. A proprietária não permitiu a entrada do Capitão na parte interna. Esteve em audiência no juizado especial criminal para tratar da lesão corporal praticada contra o Capitão. Não foi coagido para fazer o acordo no JECRIM. Os presentes na loja não tinham envolvidos no crime. Foi conduzido pelo Cabo Janaú e pelos policiais fardados para o hospital. Foi conduzido para o hospital na viatura. Não foi mal tratado pelos policiais que estavam fardados. Ficou no xadrez da viatura e não teve visão de nada. Veio um maqueiro e conduziu o declarante para ser atendido. A rua da loja deve ter uns três a quatro metros de largura. A viatura estava a uns cinquenta metros. Depois chegaram outros policiais fardados. Lembra de ter chegado um Tenente, na hora da situação. Na parte interna da loja não tinha câmera e não sabe se havia na parte externa. Os dois que estão presentes (na sala de audiência – Marcos Venicio e o Quintanias) chegaram quando acontecia a situação, sendo que um ficou na viatura e um desceu. Janaú, que estava à paisana, colocou o declarante dentro do xadrez. E aí o levaram para o hospital. Depoimento EDVANDA BORGES E BORGES: Chegaram dois policiais à paisana. Depois chamaram o apoio, e aí chegaram em uma viatura. Disseram que estavam a procura de um celular que havia sido furtado de um parente e que o GPS indicava que estava dando no local. O Edson questionou a ação e aí começaram a discutir. Carlos de um tapa no Edson e o Edson revistou, deferindo-lhe outro. E aí o Carlos efetuou um tiro. Os policiais fardados chegaram ao local somente depois que Edson já estava ferido. Algemaram Edson e colocaram dentro da viatura e o levaram. Não encontraram celular roubado na loja. Revistaram os clientes que estavam na loja. Além da declarante e Edson, estavam na loja, como funcionário, Jefferson e Jackson. Não conhecia Carlos e Marcelo. Conheceu os mesmos nesse dia. Eles não pediram autorização para ingressar no local. Na loja só fazia assistência técnica, consertando celular. Não havia câmera interna e nem externa. Depois do ocorrido não foi mais ninguém. Edson perguntou se eles tinham mandado e disse que eles não tinham o direito de fazer aquilo e aí começou a discussão. E as ofensas foi por parte do senhor Carlos. Não tem parentes ou funcionários da loja preso ou processado por receptação. Depoimento de JEFFERSON DE SOUZA SANTANA: Lembra pouco, mas ainda lembra. Chegaram e ficaram sentados. O declarante atendia no balcão. Não falaram nada. Ficaram sentados. Acredita que estavam observando alguma coisa. Esperaram um cliente sair e foram logo entrando para trás do balcão e depois falaram que estavam atrás de um celular que estava dando “sinal” lá. Procuraram e não encontraram. Depois falaram que eram polícia. Não se identificaram antes. Não acharam nenhum celular. Ele perguntou sobre as coisas ao Edson. Edson disse que ele não tinha o direito de ir entrando e que precisava de um mandado. Ele agrediu o Edson com palavrões e depois desferiu um tapa no rosto de Edson e depois atirou no pé do Edson. Os policiais fardados chegaram depois, quando eles estava procurando o celular dentro da loja. Acredita que eles pediram reforço. Os policiais fardados não chegaram juntos com os policiais que estavam à paisana. Quando eles entraram e estavam revistando tudo, todos começaram a se manifestar. Não se recorda se a câmera de monitoramento estava funcionando. Não se recorda se a polícia civil foi ao local para fazer diligência em relação ao objeto “roubado” (celular). Chegaram dois policiais fardados para o reforço, quando a situação estava acontecendo. Edson foi algemado e o levaram para a viatura. Os fardados que levaram o Edson para a viatura. Em momento algum Edson tentou tomar a arma do Capitão Carlos. Quem caiu foi o Edson, depois que foi atirado no pé dele. Não sabe se parente ou funcionário da loja foi preso ou processado por receptação. Os policiais fardados chegaram na hora que os dois que estavam à paisana estavam revirando as coisas na loja, para o outro. Os policiais fardados levaram Edson algemado, que foi pulando, e de lá foi deixado no hospital. Faz muito tempo e não tem certeza se quem agrediu Edson estava à paisana ou fardado. Depoimento de JOSUÉ JACKSON PENHA FERREIRA: Estava de serviço no dia em que os policiais ingressaram na loja. Não se identificaram. Disseram que estavam rastreando um aparelho que tinha sido furtado de uma senhora de idade. Começaram a revisar clientes da loja. Quando um deles quis ingressar na parte interna da loja, Edson disse que não poderia entrar porque não tinha mandado. Nessa discussão, o policial de um tapa no Edson. Edson desferiu um soco nesse policial. Um policial segurou Edson e jogou no chão. E então o policial efetuou um disparo. O declarante estava atrás do balcão, onde também estava Edson. Trabalhava como técnico da loja. Na loja só fazia manutenção de celular. A polícia não foi ao local para fazer buscas de aparelho roubado. Cerca de 30 (trinta) minutos depois do baleamento chegou uma viatura da Polícia Militar. A discussão começou porque Edson não aceitou que ingressassem na parte interna da loja. Um ingressou na parte interna jogando equipamentos no chão. Nesse momento, um dos militares desferiu uma tapa no Edson e e Edson deu um soco, revidando. Em seguida esse mesmo militar efetuou o disparo. O outro militar segurou Edson pelo pescoço e o jogou no chão. Foi o capitão Carlos que efetuou o disparo em Edson e outro militar segurou o Edson pelo pescoço e o jogou no chão. Depoimento de LEONARDO EULLER MELO DA CUNHA: Era Capitão à época. Lembra que o Capitão Carlos manteve contato com o declarante, que era Coordenador, informando que precisava de apoio. A viatura foi até o local. Depois ficou sabendo do desenrolar da situação. Pelo que lembra, o Capitão Carlos entrou no estabelecimento depois que foi acionado o pedido de apoio. Lembra que ele estava à paisana e teria ido a um estabelecimento para verificar a situação de um celular. Não lembra se outra viatura foi ao local. Lembra que foi solicitado que uma outra viatura da área fosse ao local. O tempo para chegada de uma viatura acionada depende de certos fatores, especialmente da demanda. O Capitão Carlos solicitou o apoio. Recorda que ele estava no local e que, antes de adentrar no local, ele pediu. Não sabe precisar o momento em que a viatura chegou ao local, pois estava dentro do CIOP. Interrogatório de DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO: A história não foi assim. Foi contada uma história com “e”. Morava em Marituba e estava se deslocando para levar seus filhos para a escola e viu trinta e dois ligações de sua mãe, irmã do Sargento Janú, dizendo que tinham entrado na casa dela, onde estava sua vó, sua prima (filha de Janaú) e levaram tudo, enquanto os moradores ficaram trancado em um compartimento. Foi levado um Iphone. Ai começaram a monitorar o Iphone da prima do declarante, filha de Janaú. Viu que o Iphone estava se deslocando. Entraram no carro e nesse momento não pediram apoio. Deslocaram-se pela perimetral, passaram pela Mauriti, próximo de onde estavam, e ai foram seguindo o signal. Pegou a Pedro Alvares Cabral e ai viu que parou próximo da Manoel Barata. E viu que era uma loja de celular. Estava o declarante e Janaú à paisana. Ligou para o CIOP e falou com o Coordenador do CIOP, então Capitão Euller. Disse que estava com receio de ir ao local porque estava à paisana. Euller mandou a viatura do 2º Batalhão para o local. Não tinha como estacionar no local. Entraram na loja e ficaram aguardando a viatura chegar. Havia muitas pessoas com celular. Havia uma pessoa de uma perna só e antava com moletas. Quando a viatura chegou, referiu-se aos clientes. Identificou-se como Capitão da Polícia. Usou da melhor técnica de verbalização para conversar com as pessoas. Não queria assustar os cidadãos. Explicou a situação e disse que estavam em busca do celular Iphone (que tinha sido subtraído da casa de sua mãe). Fizeram buscas para as pessoas que autorizaram. O declarante tem diversos cursos. Havia diversas câmeras, do lado de dentro e do lado de fora. Todos os policiais foram técnicos. Depois que fizeram as buscas nos clientes, ingressaram na loja. Perguntou quem era o proprietário e uma senhora disse que era esposa dele e respondia pela loja (Edvanda). O Delegado, após a ocorrência, informou que o marido de Edvanda estaria preso por celulares roubados e ouro. Perguntou a ela se havia chegado algum celular Iphone e ela mostrou uns vinte Iphones. Conversou com ela. A conversa foi filmada pelas câmeras da loja. Pediu para olhar os Iphones. Ela disse que poderia ficar à vontade. Apenas Edson contrariou a autorização de Edvanda. Ele impediu que o declarante se aproximasse dos Iphones. Houve uma discussão. Ele disse que ninguém iria mexer em celular nenhum. Edson lhe deu um soco. O declarante não conseguiu ter acesso ao telefone. Ele estaria preso. O declarante caiu e ele montou no declarante. Em momento algum o declarante deu tapa no rosto de Edson. As imagens sumiram. Só começou a fazer a revista depois que os policiais fardados chegaram. Quando caiu, a arma apareceu. Efetuou o disparo deitado. Quando ele montou no seu corpo, efetuou o disparo. Depois do disparo, chegaram mais de cem pessoal ao local. Os policiais tiveram que fazer a contenção. Teria sido feito o boletim de ocorrência do roubo. Não conseguiram recuperar o aparelho Iphone que foi roubado. No momento do soco, a arma estava na cintura do declarante. O declarante é canhoto. Dentro da loja estava o Sargento Janaú. O declarante era o mais baixinho e mais franzino. Janaú estava a uns dois metros de distância. O Sargento (Marcos Venício) e o Cabo Tiago foram totalmente profissionais. Edson ligou chorando para resolver a situação em que ele foi acusado no Juizado Criminal. Ele disse que tinha passado em um concurso no DETRAN. No procedimento, ele disse que o Capitão só fez o disparo para revidar a sua agressão. Interrogatório de MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS: A guarnição do declarante foi acionada pelo adjunto do 2º Batalhão para dar o apoio ao Capitão nessa loja Brasil Cell. Chegaram ao local e a rua era estreita e não tinha como estacionar. Passou à frente da loja uns dez doze metros e seu motorista ficou na viatura e mandou ele aguardar. O trânsito estava intenso e as pessoas buzinavam. Mandou ele ficar na viatura. Chegaram ao local, às proximidades, na frente da loja e viu a situação na entrada da loja. Atrás do declarante chegou o Tenente Eneas, que era Oficial de Dia. O Tenente Eneas determinou que retornassem para pegar a viatura para que a vítima fosse levada para o Hospital da Quatorze. Quando chegou, a vítima já estava baleada. Levaram o cidadão para o Hospital. Ele já estava algemado. Estavam o Major Carlos e Janaú, quando chegaram ao local. Soube que se tratava de um roubo de celular. Chegou e o Tenente Eneas chegou atrás do declarante. Quintanias ficou o tempo todo dentro da viatura, pois ele era o motorista. Ele sequer saiu da viatura. Não chegou a algemar pessoa no local. Prestou socorro a pessoa ferida. Não chegou a conversar com o Capitão Carlos. Estacionou a viatura a cerca de dez a doze metros e foi até a loja. Quando chegou, já tinha acontecido a situação. Quando chegou, o Oficial de Dia chegou junto com o declarante. Soube depois que o Capitão Carlos tinha sido agredido pelo cidadão. Não se lembra de ter visto câmera de segurança no local. O socorro foi prestado pelo declarante e seu motorista. Foi dado total apoio ao cidadão. Aguardaram ele entrar em uma sala para fazer o procedimento. Interrogatório de TIAGO QUITANIAS DA SILVA: O declarante, praticamente não viu nada. Era motorista da viatura e não desceu. Não sabe se o cidadão já estava baleado. A rua era estreita e estacionou um pouco à frente da loja. Não presenciou os fatos. Não entrou na loja e não teve qualquer contato com o cidadão. Houve um chamado para dar poio pelo CIOP para dar apoio ao Capitão Carlos. Não ouviu disparo de arma de fogo. A viatura estava com as portas e vidros fechadas e um pouco distante do local. Viu o Tenente Enéas depois. Viu o Capitão Carlos porque ele se identificou quando pararam a viatura. Não viu ele sangrando. Afastou a viatura e não teve mais contato com ele. O Capitão demonstrava estar normal. Era Cabo e motorista da VTR. Ficou na viatura, seguindo os procedimentos operacionais, conforme o padrão. Tenente Eneas chegou ao local da ocorrência. Seu comandante foi orientado para retornar a viatura para prestar socorro à vítima (pessoa baleada). Estava tentando estacionar a viatura quando foi chamado para prestar socorro à vítima. Não tem conhecimento se seu companheiro entrou no estabelecimento. Interrogatório de MARCELO JANAÚ VIEIRA: Houve um assalto na casa de sua mão, onde foi levado o celular de sua filha (Iphone) e outros pertences. Houve o rastreamento do Iphone. O então Capitão Carlos solicitou apoio de viaturas da área. Pediu a sua mãe e filha para que fossem até a Delegacia para registrar a ocorrência. Foram para o local indicando onde o Iphone furtado estaria. Chegando ao estabelecimento, foi esclarecido que o celular estaria no local. Tirou vários prints. A dona disse que poderia verificar o que quisesse. O declarante ficou mais afastado, conversando com a dona da loja. O cidadão ficou exaltado e agrediu o cidadão. O cidadão foi ao solo e o cidadão montou no capitão. Viu o Capitão sangrando. Houve o disparo de arma de fogo que atingiu o cidadão. O cidadão foi socorrido e Capitão foi para o hospital. Conversou com o Delegado Rosário e tomou conhecimento de que aquela loja estava sendo investigada e que o dono estava preso por receptação. Pegou os prints e repassou para o Delegado. Apenas ajudou a levantar o cidadão. Não houve a situação de o Capitão dar o tapa no rosto do cidadão, antes de ele dar o soco no Capitão. O cidadão impediu o Capitão de entrar na parte interna. A dona autorizou o Capitão a entrar nessa parte interna, depois do balcão. Viu vários aparelhos e havia parecidos com Iphone. Pelo acompanhamento dava que o Iphone estava dentro. Depois que houve o disparo no comércio, houve uma aglomeração muito grande e não teve como continuar as buscas para procurar pelo Iphone, para evitar um dano. As viaturas de Marco Venício e Quitanias chegaram antes do disparo de arma de fogo, mas não tiveram participação nos autos. Foi prestado socorro. O declarante ajudou a levar o cidadão na viatura e foi orientado para levá-lo ao hospital. O declarante algemou o cidadão, por segurança. Viu o Tenente Eneas quando estavam colocando o cidadão na viatura. Ele orientou para que fosse feito o socorro. O Tenente chegou a conversar com o Capitão Carlos. Havia câmera de monitoramento. Solicitou ao Delgado para pegar as imagens. O Delegado não conseguiu as imagens porque foram extraviadas. O Delegado disse que estava investigado essa quadrilha e foram presas algumas pessoas. Sua filha voltou à Delegacia para prestar declarações. Passo ao exame dos elementos de prova quanto à materialidade e autoria do crime de lesão corporal grave, tipificado no artigo 209, §1º, do Código Penal Militar, imputado aos acusados. Há elementos de prova que indicam a ocorrência do fato narrado na denúncia, como se observa nas transcrições acima. Conforme se verifica nos depoimentos acima transcritos, o ofendido EDSON ALAN GONÇALVES SOUZA confirmou os fatos narrados na denúncia, bem como todas as testemunhas que estavam presentes no local dos fatos. Ressalto que esses depoimentos foram firmes e coerentes, encontram-se corroborado pelas provas carreadas aos autos. Observa-se que somente os acusados MARCELO JANAÚ VIEIRA e DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO apresentaram outra versão, negando os fatos narrados na denúncia. Constam o depoimento do acusado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO prestado no IP e o Boletim de Ocorrência Policial cujo relato acerca dos fatos apresenta versão diversa daquela apresentada pelo ofendido e testemunhas (ID 32701140, pág. 31/34). Verifica-se pelo depoimento no IP do acusado TIAGO QUITANIAS DA SILVA que chegou ao local posteriormente e ficou sabendo através do SGT PM M. VINICIUS acerca dos fatos. Cabe ressaltar que a versão apresentada se assemelha àquela prestada pelo ofendido, bem diferente da versão apresentada por DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO (ID 32701144). Consta o depoimento no IP de ENEAS DIAS DE ASSUNÇÃO NETO que ouviu pelo rádio pedido de apoio da viatura em que estava o CB PM QUITANIAS, pois havia ocorrido disparo de arma de fogo. Não presenciou os fatos e ao chegar ao local, deparou-se com o CAP PM CARLOS saindo da loja que lhe disse para prender EDSON ALAN GONÇALVES SOUZA (ID 32701144, pág. 11). Observa-se que MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS, quando ouvido no IP, apresentou sua versão conforme àquela apresentada pelo ofendido e testemunhas (ID 32701144, pág. 24). O expediente subscrito pela autoridade policial evidencia a prática do fato delituoso cometido por DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO (ID 32701144, pág. 27/28). Foi juntado o Laudo Médico que atesta a lesão sofrida pelo ofendido (CID S 92), bem como a necessidade de tratamento fisioterápico e somente após o período de 6 (seis) semanas para alta médica com retirada de fios de ferro do pé direito (ID 32701140, pág. 11/12). Consta o Laudo pericial nº 2017.01.005960-TRA em que restou demonstrada a existência de ofensa à integridade física do ofendido, provocada por ação contundente e perfurante, resultando na incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias (ID 32701140, pág. 15/16). Os depoimentos da vítima e das testemunhas, sejam os que foram colhidos no IP, sejam os depoimentos prestados durante a instrução processual, somados aos laudos juntados aos autos, coadunam com toda a narrativa descrita na exordial acusatória, evidenciando a prática delituosa. Esse conjunto de fatos e informações, por certo, permite concluir, com segurança, que o acusado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO dolosamente efetuou o disparo contra a vítima, causando-lhe lesão corporal grave, conforme se verifica no laudo pericial juntado aos autos. Assim, patente está que a conduta do acusado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO, configura o crime de lesão corporal grave, como narrado na denúncia. Porém, em relação aos demais acusados, forçoso é reconhecer que não há prova segura para sustentar que MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS e TIAGO QUITANIAS DA SILVA, face à inexistência de provas de que concorreram à infração penal, nos termos do art. 439, alínea “c” do CPPM, bem como de que MARCELO JANAÚ VIEIRA tenha concorrido para o crime de lesão corporal grave praticado contra o ofendido, sendo a absolvição do acusado é medida que se impõe, por insuficiência de provas, conforme dispõe o artigo 439, “e”, do CPPM. Assim, penso, que não havendo a comprovação de que os acusados MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS, TIAGO QUITANIAS DA SILVA e MARCELO JANAÚ VIEIRA incorreram em qualquer descrição do tipo penal que lhes foi imposto, a absolvição é medida que se impõe, conforme dispõe o artigo 439, alínea “c” em relação aos dois primeiros, e pela alínea “e” ao último, do Código de Processo Penal Militar. Conclusão Ante o exposto, acolho as alegações finais formuladas pelo RMPM e julgo a denúncia parcialmente procedente para CONDENAR o acusado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO pela prática do crime de lesão corporal grave (art. 209, § 1º do CPM) e para ABSOLVER os acusados MARCOS VENICIO DE LIMA FREITAS e TIAGO QUITANIAS DA SILVA face à inexistência de provas de que concorreram à infração penal, nos termos do art. 439, alínea “c” do CPPM; bem como ABSOLVER o acusado MARCELO JANAÚ VIEIRA pela insuficiência de provas, com fundamento no art. 439, alínea “e” do CPPM. Por fim, declaro extinta a punibilidade em relação ao delito de violação de domicílio (artigo 226, §1º, do CPM) imputado aos acusados, em razão da prescrição da pretensão acusatória, nos termos nos artigos 123, IV, e 125, VI, e seu § 5º, I, do Código Penal Militar. Passo a análise das circunstâncias judiciais e fixação da pena de DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO. Nos termos do artigo 69 do Código Penal Militar, analiso as circunstâncias judiciais para a fixação da pena: 1ª. Gravidade do Crime: Desfavorável, pois o crime é grave, cometido por policial militar no exercício da função, com arma de fogo do Estado, resultando em incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias. 2ª. Personalidade do Réu: Favorável, tendo em vista não constar nos autos elementos que desabonem a personalidade do denunciado. 3ª. Intensidade do Dolo: Desfavorável. O acusado agiu com dolo de intimidação, porém a extensão dos danos resultou em crime de lesão grave. 4ª. Extensão dos Danos Causados: Desfavorável, pois a incapacidade por mais de 30 dias extrapola o tipo penal. 5ª. Meio Empregado: Desfavorável, pelo uso de arma de fogo da Polícia Militar em abordagem desproporcional. 6ª. Modo de Execução: Favorável, por ser ato isolado, inerente ao tipo penal. 7ª. Motivos Determinantes: Favorável, sem motivos torpes, sendo a conduta ligada à tentativa de intimidação. 8ª. Circunstâncias de Tempo e Lugar: Favorável, ocorrido às 11:00 horas em bairro comercial central, sem circunstâncias especiais. 9ª. Antecedentes do Réu: Desfavorável, pois consta nos autos certidão judicial criminal positiva (Id nº 32701144 – Pág 32), a qual evidencia que o denunciado já esteve envolvido em outras situações que ensejaram processos criminais. 10ª. Insensibilidade, Indiferença ou Arrependimento: Favorável, pois o acusado confirmou ter atirado na vítima, porém justificou sob o argumento de que somente o fez pois estava deitado após investida da vítima sobre si, demonstrando entender o caráter prejudicial da conduta e ser sensível ao ocorrido com a vítima. Passo a deliberar quanto a fixação da pena, regime para cumprimento, sobre a sua substituição por multa e/ou restritiva de direito: O crime (art. 209, § 1º, CPM) prevê reclusão até 5 anos. Atento às circunstâncias judiciais, a pena-base será fixada em 2 anos e 6 (seis) meses de reclusão. Não há circunstâncias agravantes genéricas previstas no art. 70 do Código Penal Militar (CPM) aplicáveis ao caso, por outro lado o autor confessou o crime, o que se enquadra no art. 72 do CPM, pois por se tratar de um militar em serviço, a conduta de assumir a autoria pode ser considerada atenuante, assim, a pena fica em 2 (dois) anos de reclusão. A pena deverá ser cumprida inicialmente em regime aberto, conforme dispõe o artigo 61 do CPM, combinado com o artigo 33, § 2º, “c”, do Código Penal. Fica assegurada a detração prevista no artigo 66 da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal) a ser apreciada no Juízo da execução, porém, o tempo de prisão cautelar não terá influência no regime inicial da pena, não cabendo a detração do artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal. Não há requisitos legais para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, tendo em vista a ocorrência de violência, porém é possível a suspensão condicional da pena (sursis), a qual deverá ser analisada pelo juízo das execuções penais. Deixo de fixar o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração penal, como dispõe artigo 387, IV, do Código de Processo Penal comum, que poderia ser aplicado no caso por força do disposto no artigo 3º, “a”, do Código de Processo Penal Militar, tendo em vista que não houve pleito nesse sentido na denúncia, inviabilizando o exercício do contraditório e ampla defesa nesse ponto. Asseguro ao acusado DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO o direito de recorrer em liberdade, uma vez que não há registro de prisão preventiva em vigor nos autos e que a manutenção da liberdade durante o recurso está em conformidade com o princípio do in dubio pro reo. Considerando as circunstâncias do crime praticado por DENISON CARLOS VIEIRA RIBEIRO, policial militar, e embora a conduta tenha resultado em lesão corporal grave contra um civil, foi situação isolada, não se verificado o comprometimento irremediável da honra pessoal, do pundonor policial militar ou o decoro da classe. Assim, afasto a aplicação da pena acessória de exclusão da corporação, prevista nos artigos 98, inciso IV, e 102 do Código Penal Militar, considerando que a manutenção do acusado na Polícia Militar não contraria os valores institucionais, em consonância com a proporcionalidade e a individualização da pena. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cientifique-se o Ministério Público Militar. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Expeça-se o necessário. Cumpra-se. Belém, PA. SERVE O PRESENTE DESPACHO / DECISÃO / SENTENÇA COMO MANDADO / CARTA DE CITAÇÃO E INTIMAÇÃO / OFÍCIO / ALVARÁ / CONTRA-MANDADO, nos termos do Provimento nº 003/2009 -CJRMB, podendo sua autenticidade ser comprovada no site, em consulta de 1º grau. VINÍCIUS DE AMORIM PEDRASSOLI Juiz de Direito em exercício na Vara Única da Justiça Militar do Estado do Pará (PORTARIA nº2165/2025-GP)
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Processo nº 0800301-18.2025.8.14.0083
ID: 333520560
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única de Curralinho
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0800301-18.2025.8.14.0083
Data de Disponibilização:
24/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ZAQUEU RODRIGUES DE FARIAS
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91)…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91) 3633-1315 / Balcão Virtual Processo nº 0800301-18.2025.8.14.0083 AUTOR: DELEGACIA DE POLÍCIA CIVIL DE CURRALINHO Nome: DELEGACIA DE POLÍCIA CIVIL DE CURRALINHO Endereço: AV JARBAS PASSARINHO, MARAMBAIA, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 REU: MATEUS DOS SANTOS DA COSTA Nome: MATEUS DOS SANTOS DA COSTA Endereço: ALCIDES MOURA, ENTRE MARAMBAIA E ESMERALDA FONSECA, CAFEZAL, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Sentença O Ministério Público Estadual oferece denúncia em desfavor de Mateus dos Santos da Costa, vulgo “Terror”, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 155, § 4°, incisos I e II, do Código Penal. Narra a denúncia que, no dia 05 de abril de 2025, por volta das 22h00min, nas proximidades da Rua Durval Ribeiro, no município de Curralinho/PA, o denunciado Mateus dos Santos da Costa, vulgo “Terror”, agindo de forma livre e consciente, subtraiu coisa alheia móvel, com rompimento de obstáculo à subtração da coisa e mediante escalada. Rol de testemunhas: Márcio Humberto Marques Barbosa Junior; Marcos Eneas da Luz Barroso; e Leandro Vizinho da Vítima (Id. Num. 141599907 - Pág. 1-3). A denúncia foi recebida no dia 25.04.2025 (Id. Num. 141855661 - Pág. 1-2). O acusado foi citado (Id. Num. 141971890 - Pág. 1), tendo apresentado resposta à acusação com o mesmo rol de testemunha da acusação (Id. Num. 143451716 - Pág. 1-2). Despacho proferido, determinando a intimação do Ministério Público para, no prazo de 05 (cinco) dias, promover a completa qualificação da testemunha “Leandro vizinho da vítima”, com nome completo, endereço atualizado e demais dados necessários à expedição do mandado de intimação (Id. Num. 145294973 - Pág. 1-2). O Ministério Público requereu a dispensa da oitiva de “Leandro vizinho da vítima”, pois não se logrou êxito em obter outro endereço atualizado dessa testemunha, tendo sido realizadas todas as diligências, por meios de pesquisas bem como em contato com a vítima Rafael (Id. Num. 146882305 - Pág. 1). Em audiência de instrução e julgamento ID 148372245, procedeu-se a oitiva das testemunhas Marcio Humberto Marques Barbosa Júnior, Leandro Melo de Sousa, Marcos Eneas da Luz Barroso e realizado o interrogatório do réu Mateus dos Santos da Costa. Em alegações finais, o representante do Ministério Público pugnou pela procedência da ação penal, postulando a condenação do acusado nos termos do art. 155, § 4º, incisos I e II, do Código Penal, em relação ao primeiro furto, bem como nos termos do art. 155, caput, c/c o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, no que se refere à tentativa de prática do segundo furto. Em alegações finais ID 148893932, a defesa pugnou a absolvição por insuficiência de provas quanto a acusação do furto qualificado e o reconhecimento de crime impossível quanto a tentativa de furto. Os autos vieram conclusos. É o relato. fundamento. Trata-se de ação penal pública incondicionada oferecida pelo Ministério Público em desfavor de Mateus dos Santos da Costa, vulgo “Terror, como incurso nas penas do art. 155, § 4°, incisos I e II, do Código Penal: Furto Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. Furto qualificado § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III - com emprego de chave falsa; IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas. § 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. I – Mérito. Em audiência de instrução e julgamento foram produzidas as provas a seguir. Marcio Humberto Marques Barbosa Júnior, relatou que foi vítima de dois furtos ocorridos no mês de abril de 2025. Informou que estava em processo de mudança para uma residência própria, que ainda estava em construção, localizada na entrada do campo residencial. Como ainda morava de aluguel, havia começado a transferir seus pertences para essa nova casa. Entretanto, na noite do primeiro furto, adoeceu e, por estar sozinho, não conseguiu se deslocar até o imóvel. Segundo o depoente, o primeiro furto ocorreu justamente nessa noite em que ele não foi ao local, uma quinta-feira. No dia seguinte, sexta-feira pela manhã, ao chegar à residência, deparou-se com sinais de arrombamento e danos. Disse que não tinha como comprovar os danos imediatamente, mas notou que havia sido vítima de furto. Na noite de sexta-feira, resolveu pernoitar no imóvel, ficando acordado até altas horas, mas não houve qualquer movimentação suspeita. Já na noite de sábado, por volta das 22h30, enquanto estava deitado, escutou um barulho. Márcio explicou que havia deixado todas as luzes internas apagadas e, ao perceber o som, notou que tentavam arrombar o forro de sua casa. Disse que, apesar do susto e do trauma por nunca ter vivenciado algo semelhante, conseguiu manter a calma. Esperou que o invasor adentrasse o forro da casa e, ao perceber que o indivíduo estava dentro do imóvel, anunciou em voz alta sua presença. Em seguida, trancou a porta da casa e correu pela lateral. A movimentação atraiu a atenção de vizinhos, que prestaram ajuda e acionaram a polícia, que chegou poucos minutos depois. O acusado foi encontrado escondido no forro da casa. Questionado, Márcio afirmou que o autor era Mateus, também conhecido como “Terror”, embora fosse a primeira vez que o visse. Quanto aos objetos subtraídos no primeiro furto, mencionou que foram levados três frascos de perfume, uma bomba de água recém-adquirida e uma botija de gás, além da danificação de uma porta. Esclareceu que no primeiro momento, ao prestar depoimento na delegacia, não percebeu a ausência de todos os objetos, e só posteriormente constatou o total dos bens furtados. Relatou que no segundo episódio não houve subtração de bens, pois a intervenção dele e da vizinhança frustrou a ação criminosa. Confirmou que o réu de fato chegou a invadir a residência e causou danos ao forro do imóvel. Indagado se alguém havia presenciado o primeiro furto, afirmou que um vizinho, de nome Leandro, relatou-lhe, na sexta-feira de manhã, que escutara um barulho na madrugada, mas, como chovia no momento, não saiu para verificar. Com base nesses elementos e na sequência dos fatos, Márcio concluiu que o autor do primeiro furto também fora Mateus, embora ninguém o tenha visto naquela ocasião. Durante os esclarecimentos, afirmou que, no segundo furto, foi ele mesmo quem ouviu o barulho, e não fora avisado por nenhum vizinho. Confirmou que, ao ser flagrado, Mateus alegou estar fugindo da polícia, o que não correspondia à realidade, já que não havia policiamento na área naquele momento. A Polícia Militar só chegou cerca de dez a quinze minutos após o acionamento. Ao final do depoimento, o magistrado mostrou uma imagem de uma porta arrombada, e Márcio confirmou que se tratava da porta danificada no primeiro furto. Também informou que nenhum dos bens furtados foi recuperado. Sem mais, a gravação foi encerrada. Leandro Melo de Sousa, testemunha compromissada. Após ser qualificado, Leandro confirmou ser vizinho de Márcio, afirmando residir próximo há mais tempo, enquanto o referido vizinho passou a morar no local há cerca de um ano, quando iniciou a construção da casa. Indagado sobre os acontecimentos do dia 5 de abril de 2025, por volta de uma hora da madrugada, Leandro relatou que escutou um barulho vindo da residência de Márcio. Esclareceu, contudo, que apenas ouviu o som, não se levantou nem foi verificar o que havia acontecido. Segundo ele, o barulho foi rápido, semelhante ao som de algo sendo quebrado, mas não soube precisar se se tratava de uma janela, porta ou telhado, uma vez que não presenciou nada, apenas ouviu. Disse que não tomou nenhuma providência na ocasião e permaneceu onde estava. Questionado se chegou a conversar com Márcio no dia seguinte sobre o ocorrido, respondeu negativamente, informando que só veio a saber do furto posteriormente, no terceiro dia. Quando soube, comentou com o vizinho que havia escutado um barulho naquela noite, mas reiterou que não viu nada. Perguntado se conhecia o réu, Mateus, também conhecido como "Terror", Leandro respondeu que o conhecia apenas de vista, sem saber que era conhecido por tal apelido. Ao final do depoimento, o defensor questionou Leandro se ele presenciou o momento em que, segundo a vítima, Mateus teria sido visto no forro da casa tentando fugir. Leandro respondeu que não presenciou tal fato. Nada mais sendo perguntado, a gravação foi encerrada. Marcos Eneas da Luz Barroso, policial militar, foi ouvido como testemunha compromissada. Indagado se se recordava da ocorrência envolvendo o acusado Mateus, conhecido como “Terror”, informou que o fato ocorreu no dia 5 de abril de 2025. Segundo relatou, a guarnição da Polícia Militar foi acionada por populares, que informaram que o indivíduo conhecido como “Terror” se encontrava escondido no forro de uma residência, cercado pela população. De acordo com os informes recebidos no local, tratava-se de uma tentativa de furto na mesma casa em que o suspeito já havia subtraído bens anteriormente. O proprietário da residência informou aos policiais que o acusado já teria cometido um furto dias antes e que, naquela noite, retornara com o mesmo intuito, razão pela qual os vizinhos já o aguardavam em vigilância. O policial relatou que, no momento da chegada da guarnição, o acusado já havia sido retirado do forro pela população, encontrando-se no chão, lesionado, pois havia caído. Acrescentou que os populares o agrediram e estavam prestes a linchá-lo, sendo necessária a intervenção da polícia para impedir a violência e realizar a condução do acusado à delegacia. Perguntado se, naquela ocasião, houve menção a objetos subtraídos no furto anterior, respondeu afirmativamente, citando, entre os bens mencionados, uma bomba d’água e outros objetos. Contudo, afirmou que tais itens não foram localizados nem no dia do flagrante nem posteriormente. Esclareceu ainda que, ao chegar ao local, o acusado já estava imobilizado pela população, deitado no chão. Destacou que, se a guarnição tivesse demorado mais, o acusado provavelmente teria sido linchado pelos presentes. Nada mais sendo perguntado, o depoimento foi encerrado. Em interrogatório o réu Mateus dos Santos da Costa, devidamente qualificado questionado sobre os fatos, afirmou que, no dia da ocorrência, trafegava de bicicleta por uma rua quando, repentinamente, algumas pessoas começaram a persegui-lo. Assustado, abandonou a bicicleta e subiu, por meio de uma escada, até o forro de uma residência, onde permaneceu. Disse que, em momento algum, entrou na casa, tampouco teve a intenção de furtar. Declarou que apenas pedia ajuda, pois a população o perseguia com paus e pedras, e que permaneceu no telhado da casa, numa área aberta do forro, clamando por socorro. Segundo o réu, as pessoas que o perseguiam alegavam que ele tentava roubar a casa, inclusive o morador do imóvel teria proferido tal acusação, mas insiste que não ingressou na residência. Afirmou que se dirigia à casa de seu pai quando foi surpreendido por indivíduos com quem teria uma rixa antiga, motivada por discussões e brigas de rua, o que justificaria a perseguição. Relatou ainda que, ao ser localizado em cima do forro, a população começou a jogar objetos contra ele, e que algumas pessoas chegaram a ameaçá-lo com armas. Disse que houve gritaria e que o morador da casa chegou a tirar fotos dele, dizendo que ele tentava praticar um roubo. Confirmou, ao ser mostrado um registro fotográfico constante no auto de prisão em flagrante, que era ele mesmo a pessoa fotografada sobre o forro da residência. O réu reafirmou diversas vezes que, embora estivesse sobre o forro da casa, jamais entrou no interior do imóvel ou arrombou qualquer parte da residência, reiterando que sua única intenção era escapar da população que o perseguia. Também mencionou que a área onde subiu era de barro, e que por isso abandonou a bicicleta e escalou a escada para se proteger. Nada mais sendo perguntado, o interrogatório foi encerrado. a) Análise do art. 155, § 4º, incisos I e II, do Código Penal, em relação ao primeiro furto. Importante mencionar que a doutrina do ônus da prova fixa incumbir àquele que proferiu a afirmação e a quem aproveita o fato alegado o encargo de exibir provas que denotam a veracidade das assertivas que aduziu em juízo. Sobre o ônus da prova no processo penal o professor Renato Brasileiro nos ensina: Transportando-se o conceito de ônus para o âmbito da prova, pode-se dizer que ônus da prova é o encargo que as partes têm de provar, pelos meios legal e moralmente admissíveis, a veracidade das afirmações por elas formuladas ao longo do processo, resultando de sua inação uma situação de desvantagem perante o direito (....) “Ao Ministério Público e o querelante têm o ônus de provar os fatos delituosos além de qualquer dúvida razoável, produzindo no magistrado um juízo de certeza em relação ao fato delituoso imputado ao acusado (...)” (Manual de Processo Penal, 3º edição, 2015, p. 593 e 597). Essa regra procedimental está prevista no art. 156 do Código de Processo Penal o qual declara que a “prova da alegação incumbirá a quem a fizer”. Depreende-se de tais conceitos que, em juízo, não basta simplesmente alegar os fatos. Para que a relação de direito litigiosa fique definitivamente garantida pela regra de direito correspondente, preciso é, antes de tudo, que o juiz se certifique da verdade dos fatos alegados, o que se dá através dos elementos probatórios ínsitos nos autos. Cada assertiva terá que ser demonstrada e, somente depois de reconhecida e aceita judicialmente, pode ser considerada enquanto fato constitutivo do direito. Portanto, o conjunto probatório deve se mostrar apto ao convencimento do julgador e se tal não ocorrer, mesmo diante da mais tênue dúvida, deve-se dar lugar ao decreto absolutório, pois certamente será menos gravoso deixar um crime sem reprimenda do que lançar às agruras do cárcere cidadão inocente. Essa dúvida é traduzida na máxima latina “in dubio pro reo”. Passo à análise do caso concreto. Não há nos autos provas seguras quanto à autoria do primeiro furto imputado ao acusado. Nenhuma das testemunhas ouvidas em juízo afirmou, de forma direta ou circunstancialmente consistente, que o réu tenha sido o autor da subtração anterior. A única razão pela qual se atribuiu a ele tal conduta foi o fato de ter sido flagrado, dias depois, escondido no forro da residência da vítima, o que gerou a suposição de reiteração delitiva. Contudo, tal ilação, por si só, não se revela suficiente para embasar um juízo condenatório. O Direito Penal brasileiro adota o princípio da culpabilidade, sendo inadmissível a responsabilização com base em presunções. A culpa é sempre pessoal e deve ser demonstrada por provas concretas, individualizadas e inequívocas. Assim, ausente prova cabal da autoria no tocante ao primeiro furto, impõe-se o reconhecimento da insuficiência probatória, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. b) Análise do art. 155, caput, c/c o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, em relação ao segundo furto. A materialidade dos dois crimes está comprovada diante dos depoimentos das testemunhas, colhidos durante a audiência de instrução e julgamento e documentos e fotos, constante no Inquérito Policial. É indiscutível a ocorrência do crime de furto em sua forma tentada, tendo em vista que o acusado foi surpreendido no interior da residência da vítima, escondido no forro, após adentrar o imóvel com o intuito de subtrair bens, não logrando êxito em completar a subtração de objetos, pois interrompido por circunstâncias alheias à sua vontade. Quanto à autoria dolosa, o réu foi surpreendido no interior da residência da vítima, mais precisamente escondido no forro da casa. O réu também confessa que estava no forro da residência, apesar de negar a autoria delitiva. Tais circunstâncias evidenciam, de forma inequívoca, que o réu foi o autor da tentativa de subtração, inexistindo nos autos qualquer elemento que aponte para hipótese diversa ou que suscite dúvida razoável quanto à sua responsabilidade penal, motivo pelo qual a autoria deve ser considerada plenamente demonstrada. Esclarece-se que as provas colhidas no inquérito foram corroboradas com o depoimento testemunhal em juízo, sendo válida a utilização dessas provas, nos termos do artigo 155 do Código de Processo Penal: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Nas alegações finais, a defesa sustentou a tese de absolvição do acusado por insuficiência de provas, argumentando que não seria possível a consumação do delito diante da ineficácia dos meios empregados pelo réu. Sustentou que, embora existisse a vontade do acusado de praticar o crime, faltava o elemento objetivo necessário para a consumação, pois os meios utilizados eram absolutamente inadequados para atingir o resultado pretendido, em conformidade com o artigo 17 do Código Penal. Ademais, a defesa ressaltou que o acusado adentrou apenas o forro da residência da vítima com o intuito exclusivo de resguardar sua integridade física, diante da ameaça da população que pretendia linchá-lo, afastando, assim, a intenção de consumar o furto. O crime impossível, previsto no artigo 17 do Código Penal, ocorre quando, por ineficácia absoluta do meio empregado ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível a consumação do crime, mesmo que o agente queira praticá-lo. Aqui, embora o réu não tenha consumado o furto, ele ingressou na residência da vítima com a intenção de subtrair bens, sendo que os meios empregados não eram ineficazes ou impróprios para a prática do crime, mas ele foi impedido por circunstâncias externas, quais sejam, a reação da população e a pronta intervenção policial. Outrossim, ainda que o acusado tenha alegado que entrou no forro apenas para resguardar sua integridade física, tal não encontra respaldo no conjunto probatório. Desse modo, os argumentos defensivos não resistem à análise global do conjunto probatório, tratando-se, portanto, de alegações isoladas da defesa, não provando suas alegações, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. Desse modo, a materialidade e autoria delitiva é inconteste. Passo a análise do nexo causal. Está plenamente comprovado nos autos que a conduta do acusado foi diretamente responsável pela prática de tentativa de furto na residência da vítima, sendo a única causa determinante para a consumação do crime. Desse modo, diante da produção probatória em juízo, verifica-se que a conduta perpetrada se amolda ao tipo previsto no art. 155 c/c art. 14, II, ambos Código Penal. c) Antijuridicidade e Culpabilidade. A ilicitude ou antijuridicidade, é a contrariedade de uma conduta com o direito, causando efetiva lesão a um bem jurídico protegido. Praticado um fato típico, presume-se a antijuricidade, a qual pode ser excluída desde que presentes causas excludentes de ilicitude, como a legítima defesa, estado de necessidade e o exercício regular de um direito. No caso presente, a defesa não apresentou teses justificantes. A culpabilidade, trata-se de um juízo de reprovação social, incidente sobre o fato e seu autor, devendo o agente ser imputável, atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como ter a possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo, seguindo as regras impostas pelo Direito (teoria normativa pura, proveniente do finalismo). Também não há ocorrências de causas de exclusão da imputabilidade do réu. II - Dispositivo Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal para condenar Mateus dos Santos Costa, como incurso nas penas do art. 155 c/c art. 14, II, ambos Código Penal e absolve-lo do delito constante no art. 155, § 4º, incisos I e II, do Código Penal, nos termos do art. 386, VII do Código de Processo Penal. Passo à dosimetria da pena, nos termos do art. 68 do Código Penal e Súmula 23 TJPA (a aplicação dos vetores do art. 59 do CPB obedece a critérios quantitativos e qualitativos, de modo que, existindo a aferição negativa de qualquer deles, fundamenta-se a elevação da pena base acima do mínimo legal). Dosimetria da pena. 1ª Fase. Inicialmente, analiso as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. 1. A culpabilidade refere-se ao grau de censurabilidade do crime (intensa, média ou reduzida), ou seja, a reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. De acordo com o enunciado contido na Súmula nº 19 deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará: “Na dosimetria basilar, a culpabilidade do agente diz respeito à maior ou menor reprovabilidade da conduta, não se confundindo com a culpabilidade como elemento do crime, que é composta pela imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude do fato e exigibilidade de conduta diversa”. Sem elementos para valorar. 2. Os antecedentes criminais tratam da vida pregressa e do envolvimento do agente com fatos criminosos pretéritos. Não existem elementos a serem valorados. 3. Quanto à conduta social dos acusados, que se refere ao comportamento do réu perante a sociedade (no trabalho, na família, no bairro onde reside), não existem elementos a serem valorados. 4. A personalidade do agente, não existem elementos a serem valorados. 5. Os motivos do crime referem-se às influências internas e externas que levaram o agente a cometer no delito, sendo essas inerentes ao tipo penal. 6. As circunstâncias do crime analisam o seu “modus operandi”, ou seja, são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo (como, por exemplo, em local ermo, quando do repouso noturno, com extrema violência etc. Deve ser valorada negativamente, pois o crime foi cometido no interior da residência da vítima, local que deve ser assegurado como espaço de segurança e tranquilidade, pois tal conduta viola frontalmente o direito constitucional à inviolabilidade do domicílio, intensificando a gravidade e a reprovabilidade da ação delituosa. Aumento a pena em 1/8 entre o intervalo da pena mínima e máxima cominada ao delito. 7. As consequências do crime, que se referem à extensão dos danos ocasionados pelo delito. Não há elementos para avaliar. 8. O comportamento da vítima não contribuiu para o cometimento do crime. Acerca do tema, digno de transcrição o teor da Súmula nº 18 deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará: “O comportamento da vítima é circunstância judicial que nunca será avaliada desfavoravelmente, ou seja, ou será positiva, quando a vítima contribuiu para a prática do delito, ou será neutra, quando não há contribuição”. Com base nas circunstâncias judiciais acima, fixo a PENA-BASE em 01 ano, 04 meses e 15 dias de reclusão e 53 dias-multa. 2ª Fase. Reconheço a existência da agravante da reincidência, nos termos do art. 61, I, do Código Penal, uma vez que o réu foi condenado definitivamente no processo nº 0000181-81.2020.8.14.0083, por crime contra o patrimônio (art. 157, caput, do CP) anterior ao presente fato. Majorada a pena em 1/6. Contudo, também reconheço a atenuante da confissão espontânea, nos termos do art. 65, III, “d”, do Código Penal e da Súmula 545 do STJ, que autoriza a redução da pena na mesma fração de 1/6. Compenso essa agravante e essa atenuante. Diante da compensação entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão, mantenho a PENA PROVISÓRIA em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 53 (cinquenta e três) dias-multa. 3ª Fase. Não há causa de aumento de pena Há causa de redução de pena, referente a tentativa do delito, nos termos do art. 14, II do Código Penal. Reduzo a pena em 1/3, considerando a proximidade entre os atos executórios e a consumação do delito, uma vez que o réu já se encontrava no interior da residência da vítima quando foi surpreendido. Fixo, portanto, a PENA DEFINITIVA em 11 (onze) meses de reclusão e 36 (trinta e seis) dias-multa, à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente ao tempo do fato (art. 49, § 1º, do CP). Detração Penal (art. 387, §2º, do CPP). Deixo de realizar a detração penal, pois não haverá alteração no regime inicial de cumprimento de pena, cabendo ao Juízo da Execução Penal competente a análise de futuros eventuais benefícios. Regime Inicial. Embora a pena privativa de liberdade aplicada seja inferior a 04 (quatro) anos, o réu é reincidente e possui circunstâncias judiciais desfavoráveis. Diante disso, e com fundamento no art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal e da Súmula 269 do Superior Tribunal de Justiça, que admite a adoção do regime mais gravoso aos reincidentes quando desfavoráveis as circunstâncias judiciais, fixo o regime inicial fechado para o cumprimento da pena privativa de liberdade, considerando a reprovabilidade acentuada da conduta e o histórico criminal do sentenciado. Substituição por pena restritiva de direito e suspensão condicional da pena. Nos termos do artigo 44 do CP, as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: a) aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos; b) crime não cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; c) qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; d) réu não reincidente em crime doloso; e) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado; f) os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Verifica-se que o acusado não preenche os requisitos para a concessão do benefício. Prejudicada a suspensão condicional da pena. Direito de Apelar em Liberdade. Tendo em vista que o réu Mateus dos Santos Costa foi condenado a pena de 11 (onze) meses de reclusão em regime inicial de cumprimento fechado, é necessária a reanálise de sua preventiva. Na decisão, de Id. Num. 140748100, este Juízo, com base no art. 310 do CPP, analisou o auto de prisão em flagrante e entendeu estarem presentes os requisitos para a conversão em prisão preventiva, nos termos do art. 312 do CPP. Constatou-se a materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria, com base no depoimento do custodiado, que admitiu ter entrado na casa da vítima, e em registro fotográfico no forro da residência (Id. 140579513 - pág. 25), além do depoimento da vítima (pág. 07). Destacou-se ainda a periculosidade do agente, que possui antecedentes criminais (Id. 140595423 - pág. 1-2) e responde a diversos processos por fatos semelhantes. Considerando a gravidade do crime, sua repercussão social e o risco de reiteração delitiva, entendeu-se inexistirem medidas cautelares diversas capazes de garantir a ordem pública. Por fim, foi acolhido o pedido do Ministério Público e decretada a prisão preventiva de Mateus dos Santos da Costa. No caso concreto, observa-se que o réu Mateus dos Santos da Costa foi preso em flagrante no interior da residência da vítima, após ter adentrado o imóvel durante a noite, ocasião em que a vítima, que dormia no local, percebeu o barulho e o surpreendeu escondido no forro da casa. A prisão ocorreu com auxílio da vizinhança, que acionou a Polícia Militar. Ressalte-se que, conforme o relato do policial militar Marcos Eneas, o réu foi encontrado imobilizado pela população, já lesionado, em situação que indica forte reação social à sua conduta. Além disso, como ressaltado na decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva (Id. Num. 140748100), o réu é reincidente e responde a outros processos por crimes patrimoniais, inclusive já foi condenado por roubo (processo nº 0000181-81.2020.8.14.0083). Na presente ação penal, o réu compareceu na residência da vítima para, durante a madrugada, tentar subtrair novos bens, demonstrando reiteração delitiva e ousadia criminosa, inclusive com invasão do domicílio da vítima, em afronta ao direito fundamental à inviolabilidade da casa (art. 5º, XI, da Constituição Federal). No mais, o conjunto probatório demonstra, de forma segura, que Mateus agiu com dolo de subtrair bens, tendo sido frustrado apenas pela intervenção da vítima e de vizinhos. Evidencia-se, assim, o periculum libertatis, ante os riscos que advirão se concedida a liberdade provisória, considerando a reiteração delitiva, a ousadia na conduta, o histórico criminal e a vulneração da esfera de segurança domiciliar da vítima. Não há, por ora, medida cautelar substitutiva que se mostre eficaz para resguardar as vítimas e a sociedade, ante a gravidade concreta dos fatos e o risco de reiteração, conforme autoriza o art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal. Desse modo, permanece inalterado o quadro fático jurídico que impôs a decretação de sua prisão preventiva. Pelo exposto, rejeito ao réu o direito de recorrer em liberdade e mantenho sua prisão preventiva, com fundamento no artigo 312 do CPP. Indenização à vítima. Afasta-se a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, tendo em vista a insuficiência de elementos concretos nos autos que demonstrem a extensão e a efetiva quantificação dos prejuízos sofridos pela vítima, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, e em consonância com o princípio da necessidade de prova específica para a configuração do dever de indenizar. Custas. Custas ao condenado, nos termos do artigo 804 do CPP. Disposições comuns: Determino à Secretaria Judicial que, independentemente do trânsito em julgado desta decisão: 1. Intime-se o Ministério Público. 2. Intime-se o defensor do acusado, através de publicação oficial; 3. Intime-se o réu da sentença, conferindo-lhe o direito de apelar no prazo legal. 4. Comunique-se a vítima. 5. Expeça-se Guia de Recolhimento Provisória. Certificado o trânsito em julgado: a) lance-se o nome do réu no rol dos culpados; b) expeça-se Guia de Recolhimento Definitiva, conforme Resolução do Conselho Nacional de Justiça; c) expeça-se Mandado de Prisão, por sentença condenatória, lançando no banco nacional de mandados de prisão (BNMP) do Conselho Nacional de Justiça. d) Intime o réu para pagar a pena de multa no prazo de 10 (dez) dias. e) comunique-se à Justiça Eleitoral (art. 15, III, CF); f) comunicações e anotações de estilo, inclusive para fins estatísticos; g) dê-se baixa nos apensos (se houver); Publique. Registre. Intime. Curralinho/PA, datado e assinado digitalmente. André Souza dos Anjos Juiz Titular da Vara Única da Comarca de Curralinho
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Processo nº 0007492-60.2019.8.14.0083
ID: 326028846
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única de Curralinho
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0007492-60.2019.8.14.0083
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
SEVERA ROMANA MAIA DE FREITAS
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91)…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91) 3633-1315 / Balcão Virtual Processo nº 0007492-60.2019.8.14.0083 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA Nome: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA Endereço: 'Rua Manoel Barata, - de 901/902 ao fim, Ponta Grossa (Icoaraci), BELéM - PA - CEP: 66812-020 REU: JOELCIO BARATINHA DE OLIVEIRA, MARIANA INGRID CARMENCITA NUNES Nome: JOELCIO BARATINHA DE OLIVEIRA Endereço: JARBAS PASSARINHO, 00, NÃO INFORMADO, CENTRO, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Nome: MARIANA INGRID CARMENCITA NUNES Endereço: RUA SANTA ROSA, PRÓX. A JARBAS PASSARINHO, AO LADO DA IGREJA QUADRANGULAR, CENTRO, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Sentença O Ministério Público Estadual oferece denúncia em desfavor de Joelcio Baratinha de Oliveira, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput e art. 298, ambos do Código Penal, e contra Mariana Ingrid Carmecita Nunes, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput, do Código Penal. A denúncia foi recebida em 18 de dezembro de 2020, ID 74710560, pág. 01. Joelcio Baratinha de Oliveira foi citado, ID 74710561, pág. 07 e apresentou Resposta à Acusação, por meio de defensor constituído, ID 74710561, pág. 01. Mariana Ingrid Carmecita Nunes foi citada, ID 74710561, pág. 09 e apresentou Resposta à Acusação, por meio de defensor constituído, ID 74710561, pág. 02. Audiência de instrução e julgamento ID 96678860, prejudicada, em razão da falta de emissão dos expedientes de intimação. Em audiência de instrução e julgamento ID 112424206, procedeu-se a oitiva das testemunhas Daiane Nunes Nogueira, Odaiza Pereira de Moraes, Odila Pereira de Moraes. O parquet insiste na oitiva da testemunha Iracema Rodrigues dos Santos, ID 114578783. Em audiência de instrução e julgamento ID 145183237, procedeu-se a oitiva de Iracema Rodrigues dos Santos e o interrogatório dos réus. Em alegações finais lançadas sob o ID 146365706, o Ministério Público requereu a procedência integral da denúncia, com a consequente condenação de Joelcio Baratinha de Oliveira pela prática dos delitos previstos nos arts. 171 e 298, combinados com os arts. 69 e 71, todos do Código Penal. Requereu, ainda, a condenação de Mariana Ingrid Carmecita Nunes, como incursa nas sanções do art. 171, em concurso material e crime continuado, nos termos dos arts. 69 e 71 do mesmo diploma legal. Em alegações finais ID 146453993, a defesa pugnou pela absolvição dos réus por falta de provas. Subsidiariamente, em caso de condenação, a fixação da pena no mínimo legal, aplicação de regime inicial aberto, substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e o direito de recorrer em liberdade. É o relato. fundamento. Trata-se de ação penal pública incondicionada oferecida pelo Ministério Público em desfavor de Joelcio Baratinha de Oliveira, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput e art. 298, ambos do Código Penal, e contra Mariana Ingrid Carmecita Nunes, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput, do Código Penal: Estelionato Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis. Falsificação de documento particular Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. I – Mérito. Em audiência de instrução e julgamento foram produzidas as provas a seguir. A vítima Daiane Nunes Nogueira afirmou que, desde o início da matrícula no curso, foi direcionada a tratar diretamente com Joelcio Baratinha. Esclareceu que a matrícula foi realizada em um polo localizado próximo à residência dele, que, apesar de existir fisicamente com materiais de estudo, só puderam acessá-los posteriormente, sendo que depois o polo foi desfeito e os instrumentos de estudo foram desmontados. Contou que passou a tratar tudo com Joelcio, sem qualquer contato com a professora Ingrid, com quem nunca tratou nada. Explicou que só citou Ingrid porque realizou um ou dois depósitos em sua conta bancária a pedido de Joelcio, mas não teve contato direto com ela. Destacou que não está processando Ingrid, pois tudo referente à faculdade era tratado exclusivamente com Joelcio, incluindo pagamentos em espécie, realizados pessoalmente ou deixados em sua residência. Afirmou que os quatro anos de curso foram tratados diretamente com Joelcio, acreditando na veracidade da instituição e que apenas ele não era o representante legal. Informou que, ao comparecer à formatura, verificou que no sistema da faculdade constava apenas a matrícula, sem qualquer outro registro de atividades. Disse que, ao longo dos quatro anos, pagava mensalidades e, como trabalhava para a prefeitura, solicitava declarações a ele, que as fornecia assinadas. Acrescentou que, ao registrar boletim de ocorrência, não pôde juntar todos os documentos, pois confiava nele por conhecê-lo há muito tempo, inclusive tendo sido aluna da professora Ingrid. Relatou que Joelcio recolhia os valores, emitia algumas declarações de pagamento e, em outros casos, não entregava nada, mas ela confiava que os pagamentos estavam sendo feitos. Afirmou que entregava os valores diretamente a Joelcio, em mãos, porque o conhecia por terem estudado juntos, e ele havia dito que era o responsável pela faculdade. Narrou que havia um polo perto da casa de Joelcio, onde pessoas estudavam utilizando notebook, o que lhe conferia credibilidade. Reiterou que tudo era tratado com ele, inclusive a emissão de declarações. Confirmou que a matrícula foi realizada em 2015 e que o curso era a distância, o que dificultava sua participação presencial, pois residia no interior e só vinha à cidade nos finais de semana. Disse que Joelcio oferecia ajuda para realizar atividades, algumas das quais pagou para que ele as fizesse. Informou que o curso era de pedagogia, que não assistiu aulas presenciais e que tudo era facilitado por Joelcio, inclusive com promessas de realização de provas. Disse que confiava nele por conta da amizade de longa data, inclusive com laços de amizade da sua mãe com a professora Ingrid. Relatou que, por confiar, aceitava que ele realizasse atividades e provas em seu lugar mediante pagamento, inclusive chegando a emprestar dinheiro para que ele cumprisse os compromissos. Mencionou que nunca acessou a plataforma da faculdade, acreditando nas informações prestadas por Joelcio, que lhe dizia que tudo estava certo. Somente no final do curso decidiu questionar a situação, quando viajou a Belém e tentou localizar o polo indicado por ele, sem sucesso, tendo sido informada posteriormente, ao comparecer à formatura, de que apenas constava sua matrícula na instituição. Ressaltou que não tratava nada com Mariana Ingrid, tendo apenas realizado depósitos em sua conta por orientação de Joelcio. Estima que não faz ideia do valor total do prejuízo, pois tudo era pago a ele, e nunca recebeu o diploma, sendo informada de que sequer era considerada aluna da instituição. Relatou que o polo da faculdade foi desativado em 2015, passando a funcionar uma batedeira de açaí e, depois, uma distribuidora de água no local. Disse que acreditava que Joelcio era representante da faculdade, especialmente por ter presenciado pessoas de Belém em sua casa na época da matrícula, quando foi cobrado valor pela inscrição. Narrou que tudo era tratado com ele, inclusive por outros alunos, como seu irmão, que também confiavam que Joelcio era o representante da universidade no município. A vítima Odaísa Pereira de Moraes declarou que, no início da faculdade, realizou um processo seletivo na casa de Joelcio, foi a Belém para fazer uma ou duas provas e, posteriormente, ele instalou um polo em sua residência com computadores e livros, que podiam ser levados para casa. Disse que, com o tempo, o polo foi encerrado, pois Joelcio alegou o roubo dos computadores, e passou a dizer que o curso deveria ser feito online, embora os alunos não tivessem como acessá-lo. Afirmou que, inicialmente, pagou boletos bancários, dos quais ainda possui três, mas, depois, como morava no interior e não tinha acesso à internet, passou a entregar o dinheiro diretamente a Joelcio, que dizia que realizaria os pagamentos. Explicou que, quando ele não estava, a professora Ingrid recebia os valores. Confirmou que todos os pagamentos foram feitos em espécie, pois não utilizava Pix. Contou que, já ao final do curso, começou a desconfiar da situação, quando Ingrid questionou se ainda não haviam finalizado a faculdade. Relatou que as atividades eram para ser feitas pelo celular, mas, diante da dificuldade, Joelcio dizia que Ingrid poderia fazê-las mediante pagamento de R$ 20,00, o que de fato ocorreu. Informou que ingressou no curso de pedagogia em 2015, fazendo a matrícula na casa de Joelcio, e que ele se identificava como representante da faculdade. Acrescentou que desconhece quando o polo foi encerrado, pois acreditava que ele ainda estava ativo. Disse que jamais entrou no aplicativo da faculdade para verificar a situação financeira do curso, estimando o prejuízo em cerca de R$ 13.000,00, pagos ao longo de três anos e meio. Afirmou que ingressou com ocorrência policial, recebeu apenas um atestado de conclusão sem validade e que sua amiga, ao comparecer a Belém para a suposta formatura, constatou que não havia nada agendado. Justificou sua confiança em Joelcio e Ingrid pelo fato de a mãe desta última ser professora muito conhecida no município. Esclareceu que Ingrid só recebia o dinheiro quando Joelcio estava ausente e que nunca tratou diretamente da faculdade com ela. Contou que realizou uma ou duas provas em Belém, levada por Joelcio, o qual sempre se apresentava como representante da instituição, inclusive ajudando no acesso ao AVA. Disse que, após os dois primeiros meses, as provas passaram a ser entregues aos alunos para realização em casa, com correção por Joelcio. Mencionou que acessava a plataforma eventualmente, mas sem identificar questões financeiras pendentes. Quando descobriram que haviam sido enganadas, sua amiga verificou no polo que constava apenas dois meses de vínculo com a instituição. Afirmou que nunca recebeu notificações de inadimplência, pois pagava adiantado para obter desconto. Confirmou que a faculdade declarou não reconhecer Joelcio como representante legal, embora, na época, ele os tivesse levado até o polo, onde apresentou pessoas como sendo da coordenação e exibiu panfletos da instituição em sua residência. A testemunha Odila Pereira de Moraes afirmou que possui diversas lembranças negativas sobre a situação, relatando que, no início, desejava ingressar em uma faculdade, tendo seus primos, já matriculados, apresentado Joelcio, conhecido como Japa, que parecia estar à frente da organização do curso. Por conta disso, confiou na proposta e também realizou sua matrícula. Informou que, inicialmente, realizava o pagamento por boleto, mas, devido às dificuldades de locomoção e por residir no interior, Joelcio se prontificou a efetuar os pagamentos mediante o repasse dos valores diretamente a ele. Acrescentou que, ao ser questionado sobre os comprovantes, Joelcio dizia que não conseguia imprimir devido a problemas na máquina, mas que guardava todos os documentos em seu computador e que tudo estaria certo. Disse que Joelcio se apresentava como coordenador ou representante da faculdade em Curralinho, fazendo a conexão entre os alunos locais e a instituição de ensino, localizada em Belém. Explicou que muitos alunos, inclusive ela, moravam em regiões distantes, como a comunidade Turec, e dependiam do auxílio dele para manter os estudos. Afirmou que Joelcio levava os alunos ao polo em Belém para realização de provas e auxiliava no acesso ao AVA, demonstrando familiaridade com a estrutura acadêmica, o que conferia confiança. Contou que, nos dois primeiros meses, acessava o aplicativo da faculdade, estudava com os livros recebidos e fazia provas presenciais em Belém, mas que, ao final do curso, as avaliações passaram a ocorrer na casa de Joelcio, sendo ele o responsável por remetê-las à instituição. Relatou que, nas visitas à casa de Joelcio, ele mostrava as notas no aplicativo, o que fazia com que acreditassem que os lançamentos estavam corretos. Disse que chegou a acessar a plataforma uma ou duas vezes, mas que, ao final do curso, sua colega foi ao polo e constatou que constavam apenas dois meses de matrícula, inexistindo qualquer outro registro acadêmico. Informou que nunca recebeu notificação de inadimplência, pois pagava adiantado para obter desconto. Relatou que foi levada a acreditar que Joelcio repassava os valores à faculdade, mas posteriormente descobriu que o curso havia sido encerrado na plataforma. Mencionou que não compareceu à sede da instituição em Belém por abalo emocional, tendo sua colega ido até lá e recebido a informação de que Joelcio não era reconhecido como coordenador. Disse que viu a professora Ingrid poucas vezes, sendo sempre bem tratada por ela, e que somente mencionava seu nome por ela residir com Joelcio, sem que, do seu ponto de vista, tivesse envolvimento com a situação. Estimou que seu prejuízo financeiro ultrapassou R$ 10.000,00, valor referente às parcelas pagas ao longo do curso, investimento que tinha como finalidade sua efetivação no cargo de professora contratada. Ressaltou que, além da perda financeira, sofreu abalo psicológico, ficando paralisada por um tempo devido ao medo de ser novamente enganada por outra instituição. Destacou que, no início, Joelcio parecia confiável, tendo inclusive levado os alunos ao polo em Belém, onde apresentou supostos representantes da faculdade, os quais os auxiliaram no acesso ao sistema AVA. Narrou que, durante essa visita, fizeram provas em locais diferentes, o que achou estranho, mas não levou em consideração na época. Informou ainda que havia panfletos da faculdade na casa de Joelcio e que ele anunciava a presença de representantes para visitação dos alunos, embora ela não tenha presenciado, por residir no interior. Concluiu afirmando que sempre o reconheceu como representante da faculdade, acreditando em sua boa-fé até a descoberta da fraude. A testemunha Iracema Rodrigues dos Santos afirmou que, em 2015, procurou Joelcio com o intuito de iniciar uma faculdade, tendo sido atendida em um suposto escritório localizado na residência dele, onde realizou sua matrícula. Disse que, desde então, iniciou o curso e recebia atividades por escrito, pois morava na zona rural e só podia vir a Curralinho aos sábados, em razão do trabalho. Informou que nunca conseguiu realizar as atividades online, pois Joelcio alegava constantemente a ausência de computador ou problemas no local, chegando a dizer que os equipamentos haviam sido roubados e que, por isso, o escritório fora desmontado. Acrescentou que Joelcio sempre apresentava desculpas para que as atividades não fossem feitas presencialmente ou online, afirmando que ele próprio realizaria as tarefas e que ela apenas precisava devolver os materiais, entregues via balsa ou lancha. Confirmou que o curso seria de pedagogia e que as aulas deveriam ocorrer de forma online, mas que nunca chegou a assisti-las. Disse que Joelcio mantinha um ambiente com identificação visual da Faculdade Unicesumar, inclusive com livros e folhetos, o que aumentava a credibilidade. Afirmou que não se recorda de ter tratado ou visto Mariana Ingrid envolvida nas questões da faculdade, embora soubesse que ela era companheira de Joelcio. Estimou seu prejuízo em R$ 9.800,00, pagos ao longo de quatro anos, sempre em espécie, sem nunca ter recebido qualquer recibo, sob a justificativa de que os comprovantes estavam no computador da sogra de Joelcio e seriam posteriormente organizados em uma pasta. Explicou que, devido ao trabalho na zona rural, entregava mensalmente os valores a ele, que prometia efetuar os pagamentos nos dias úteis. Relatou que Joelcio conseguiu mantê-la enganada por todo o período do curso. Afirmou que nunca desconfiou da situação, tampouco procurou a faculdade para confirmar a legitimidade da representação, pois confiava plenamente em Joelcio, embora não o conhecesse anteriormente. Contou que tomou conhecimento da matrícula por meio de indicação e realizou o procedimento na casa da sogra de Joelcio, fazendo uma redação, a qual seria encaminhada por ele para a instituição, que avaliaria e retornaria com a nota. Disse que nunca viu Joelcio acessar computador e que ele sempre afirmava que cuidaria de tudo. Somente após quatro anos, decidiu ir pessoalmente à sede da faculdade em Belém, onde descobriu que sua matrícula não constava no sistema. Foi informada de que havia uma turma de Curralinho com alguns alunos devidamente matriculados, mas que muitos, como ela, constavam como desistentes. A funcionária da instituição explicou essa situação. Por fim, reafirmou que confiava em Joelcio, acreditando ser ele representante legítimo da instituição, e que, ao comparecer ao local, constatou que não havia qualquer vínculo oficial dele com a faculdade. O acusado Joelcio Baratinha de Oliveira afirmou que, em 2014, matriculou-se na universidade e, em 2015, foi procurado por representantes da instituição, por ser o único aluno de Curralinho, sendo designado como chefe de turma, função pela qual recebia descontos a cada matrícula realizada. Negou ser representante da universidade, afirmando que apenas exercia a função de chefe de turma e que os valores que recebeu estavam relacionados a declarações emitidas. Disse que reconhece sua responsabilidade quanto a essas declarações, mas negou tê-las vendido. Relatou que Iracema, ao retornar de Belém em busca de emprego, procurou-o junto com seu irmão para realizar matrícula, tendo a universidade fornecido acesso com login e senha, o que permitiu à aluna imprimir sua própria declaração. Explicou que, ao tentar ser contratada pela prefeitura, foi informado que seriam necessários quatro módulos cursados, motivo pelo qual alterou a declaração, constando o quarto módulo em vez do primeiro. Justificou que fez isso para ajudá-la, por ser parente de segundo grau, sem acordo prévio de pagamento. Afirmou que a modificação visava permitir a contratação dela e, posteriormente, de outras alunas, sendo que, após a obtenção das declarações, várias alunas deixaram de frequentar a universidade. Disse que organizava turmas para realização de provas em Belém, mas sempre como chefe de turma, e que, para emitir novas declarações, exigia-se o pagamento de mensalidades em aberto. Relatou que os próprios alunos baixavam as declarações em PDF e as entregavam a ele, que apenas alterava o número do módulo no documento original, mantendo a assinatura digital da universidade. Informou que a maior parte dos alunos era professora contratada e que, para manter o vínculo empregatício, solicitavam tais alterações. Ressaltou que em apenas um ano, 2018, teria pedido dinheiro em troca da emissão da declaração. Explicou que os documentos vinham assinados digitalmente e que ele apenas fazia ajustes nos módulos para viabilizar a continuidade da contratação dos alunos pela prefeitura. Disse que, ao longo do tempo, era procurado reiteradamente por mensagens e ligações, sendo pressionado para alterar documentos, e que, embora alguns valores tenham sido oferecidos, não estipulava quantias fixas. Afirmou que nunca recebeu dinheiro diretamente pelas mensalidades e que os únicos valores recebidos estavam vinculados às declarações alteradas. Sustentou que as vítimas tinham conhecimento das alterações e que utilizavam os documentos com essa finalidade. Reiterou que não possuía autorização da universidade para fazer modificações, que essas eram de sua própria iniciativa, e que apenas mudava o número do módulo no documento original. Admitiu a responsabilidade por essas alterações. Em relação à coacusada Mariana, sua ex-esposa, afirmou que ela era alheia aos fatos, tendo apenas recebido, em uma única ocasião, valores em sua conta bancária a pedido dele, sem saber do conteúdo da transação. Disse que Mariana apenas guardava os valores eventualmente entregues em casa quando ele não estava presente, e que nunca participou das tratativas. Por fim, declarou que agiu acreditando estar ajudando os alunos e reconheceu que se arrepende, tendo tomado tais atitudes sem organização formal ou sistema definido. A acusada Mariana Ingrid Carme desconhecer totalmente a acusação de falsificação de documentos e estelionato, tendo tomado conhecimento apenas após receber intimação da delegacia. Afirmou que, à época dos fatos, era casada com Joelcio, com quem tem três filhos, e que ficou surpresa com a acusação. Disse lembrar-se de que, no depoimento prestado à autoridade policial, negou ter feito provas para terceiros e afirmou nunca ter sido procurada para esse fim. Negou veementemente envolvimento com qualquer tipo de fraude, reiterando que não tinha tempo nem sequer para realizar suas próprias provas. Afirmou que Joelcio era estudante da Universidade do Mar, mas não sabia ao certo o curso que ele cursava, podendo ser pedagogia ou letras. Disse não lembrar se ele exercia qualquer função como representante da faculdade. Quanto ao uso de seu cartão bancário, afirmou que, como moravam juntos e ele administrava as finanças da casa, ele possuía livre acesso ao cartão e realizava pagamentos e saques, pois ela trabalhava 200 horas mensais e não tinha tempo para isso. Relatou que, após tomar ciência da acusação, conversou com Joelcio, que não entrou em detalhes, limitando-se a afirmar que apenas estudava. Acrescentou que, à época, tinham também uma batedeira de açaí. Disse que na casa onde viviam havia apenas livros enviados pela faculdade, pois Joelcio cursava ensino superior na modalidade a distância. Informou que ele trabalhava como professor contratado mesmo sem possuir diploma de nível superior, prática que, segundo ela, era comum em contratações municipais. Afirmou que era a provedora da casa, embora Joelcio também contribuísse. Negou conhecer qualquer das vítimas, Dayane Nunes Nogueira, Odasia Pereira de Moraes, Odila Pereira ou Iracema, e afirmou que nunca teve contato com elas. Disse ainda que Joelcio nunca comentou com ela sobre atuar como representante da faculdade e que jamais teve conhecimento das fraudes que lhe são imputadas. Ressaltou que confiava no então marido e que, por isso, permitia que ele administrasse o cartão. Confirmou que sua rotina consistia em sair de casa às 7h e retornar às 19h, razão pela qual Joelcio permanecia mais tempo em casa. Concluiu reafirmando que não participou dos fatos narrados na denúncia, que desconhecia a atuação de Joelcio como suposto intermediador acadêmico e que ficou profundamente abalada ao ver seu nome envolvido em essas acusações. a) Análise do delito do art. 171, caput, do Código Penal: Mariana Ingrid Carmecita Nunes. Importante mencionar que a doutrina do ônus da prova fixa incumbir àquele que proferiu a afirmação e a quem aproveita o fato alegado o encargo de exibir provas que denotam a veracidade das assertivas que aduziu em juízo. Sobre o ônus da prova no processo penal o professor Renato Brasileiro nos ensina: Transportando-se o conceito de ônus para o âmbito da prova, pode-se dizer que ônus da prova é o encargo que as partes têm de provar, pelos meios legal e moralmente admissíveis, a veracidade das afirmações por elas formuladas ao longo do processo, resultando de sua inação uma situação de desvantagem perante o direito (....) “Ao Ministério Público e o querelante têm o ônus de provar os fatos delituosos além de qualquer dúvida razoável, produzindo no magistrado um juízo de certeza em relação ao fato delituoso imputado ao acusado (...)” (Manual de Processo Penal, 3º edição, 2015, p. 593 e 597). Essa regra procedimental está prevista no art. 156 do Código de Processo Penal o qual declara que a “prova da alegação incumbirá a quem a fizer”. Depreende-se de tais conceitos que, em juízo, não basta simplesmente alegar os fatos. Para que a relação de direito litigiosa fique definitivamente garantida pela regra de direito correspondente, preciso é, antes de tudo, que o juiz se certifique da verdade dos fatos alegados, o que se dá através dos elementos probatórios ínsitos nos autos. Cada assertiva terá que ser demonstrada e, somente depois de reconhecida e aceita judicialmente, pode ser considerada enquanto fato constitutivo do direito. Portanto, o conjunto probatório deve se mostrar apto ao convencimento do julgador e se tal não ocorrer, mesmo diante da mais tênue dúvida, deve-se dar lugar ao decreto absolutório, pois certamente será menos gravoso deixar um crime sem reprimenda do que lançar às agruras do cárcere cidadão inocente. Essa dúvida é traduzida na máxima latina “in dubio pro reo”. Passo à análise do caso concreto. O crime de estelionato, tipificado no artigo 171, caput, do Código Penal, exige, para sua configuração, a presença concomitante de três elementos essenciais: (a) a obtenção de vantagem ilícita, (b) o emprego de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, e (c) o induzimento ou manutenção da vítima em erro. Neste sentido, o teor do referido dispositivo legal: “Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.” A doutrina ressalta que a fraude antecede e possibilita o erro da vítima, sendo este o fundamento da lesão patrimonial. Como bem esclarece Damásio de Jesus: “No estelionato, a fraude visa a permitir que a vítima incida em erro. Por isso, voluntariamente se despoja de seus bens, tendo consciência de que eles estão saindo de seu patrimônio e ingressando na esfera de disponibilidade do autor.” (Damásio de Jesus. Código Penal Anotado, 19ª Edição, Editora Saraiva, p. 571⁄572). No presente caso, a análise crítica dos autos revela que, no tocante a todas as vítimas apontadas, os elementos fáticos não preenchem o tipo penal em sua integralidade, especialmente diante da ausência de indícios mínimos de participação consciente da acusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes na empreitada criminosa descrita na denúncia. Todas as vítimas ouvidas em juízo foram uníssonas em afirmar que trataram exclusivamente com Joelcio Baratinha de Oliveira ao longo de todo o curso, inclusive para realização de matrícula, entrega de valores, obtenção de declarações e resolução de atividades. A vítima Daiane Nunes Nogueira foi categórica ao declarar que jamais tratou diretamente com Mariana Ingrid, mencionando seu nome apenas em razão de ter realizado um ou dois depósitos bancários em sua conta, sempre a pedido de Joelcio. Odaísa Pereira de Moraes, por sua vez, afirmou que, em regra, entregava os valores a Joelcio, e que apenas em situações excepcionais, quando ele não se encontrava, a professora Ingrid os recebia. No entanto, deixou claro que nunca tratou de questões da faculdade com Mariana, que não participava das decisões ou da rotina do curso. Odila Pereira de Moraes foi ainda mais enfática ao esclarecer que só mencionou o nome de Ingrid por ela residir com Joelcio, ressaltando que nunca percebeu envolvimento direto dela com as práticas fraudulentas, tampouco a viu participando da organização do curso. Iracema Rodrigues dos Santos igualmente negou ter tido qualquer contato com Mariana Ingrid no contexto da suposta atividade acadêmica, limitando-se a reconhecer que ela era companheira de Joelcio, sem qualquer atuação aparente na dinâmica do polo ou nos recebimentos. Dessa forma, observa-se que a coacusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes não era identificada pelas vítimas como interlocutora, organizadora ou beneficiária das fraudes praticadas, sendo mencionada apenas de forma lateral, por residir com o acusado ou ter, eventualmente, recebido valores em sua conta, a pedido de Joelcio, sem qualquer evidência de que tivesse ciência da origem ou finalidade dos valores ou de que tivesse participado ativamente da empreitada delitiva. Conforme o princípio in dubio pro reo, deve-se afastar a condenação de Mariana Ingrid Carmecita Nunes, que, até o momento, não tive sua participação suficientemente comprovada. No Direito Penal a culpa é impresumível, devendo ser suficientemente provada para um decreto penal condenatório. Deste modo, inexistem provas contundentes e robustas contra a denunciada Mariana Ingrid Carmecita Nunes, para efeito de uma condenação penal pelo delito previsto no art. 171, caput, do Código Penal. b) Análise do delito do art. 171, caput, do Código Penal: Joelcio Baratinha de Oliveira. A materialidade do crime está comprovada diante dos depoimentos das testemunhas, colhidos durante a audiência de instrução e julgamento, somados ao boletim de ocorrência policial (Id. Num. 74710129 - Pág. 4-5), aos termos de depoimentos (Id. Num. 74710129 - Pág. 6, Num. 74710136 - Pág. 1-2, Num. 74710136 - Pág. 4-7), declarações e atestados (Id. Num. 74710338 - Pág. 5-7, Num. 74710343 - Pág. 2, Num. 74710343 - Pág. 6-8, Num. 74710557 - Pág. 1 e Num. 74710557 - Pág. 3), e boletos de mensalidades (Id. Num. 74710343 - Pág. 3-5 Num. 74710557 - Pág. 2), constantes no inquérito policial. Indiscutível a ocorrência do crime de estelionato em sua forma consumada, uma vez que a consumação deste delito se dá com a obtenção da vantagem ilícita em decorrência do erro provocado na vítima mediante fraude, sendo prescindível o emprego de meio sofisticado ou a resistência da vítima ao repasse dos valores. Nesse sentindo é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “Importante destacar, por oportuno, que a consumação do crime de estelionato se dá com a efetiva obtenção de vantagem ilícita, em detrimento de outrem, através de sua indução ou manutenção em erro, utilização de artifício, ardil ou fraude” (STJ - AREsp: 2215342, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Publicação: Data da Publicação DJ 02/06/2023). Quanto à autoria, os elementos probatórios colhidos nos autos são suficientemente robustos para demonstrar que o acusado foi o responsável pelo deito. A vítima Daiane Nunes Nogueira relatou que tratava exclusivamente com o acusado Joelcio Baratinha de Oliveira desde o momento da matrícula, realizada em um suposto polo instalado próximo à residência dele, e que, ao longo de quatro anos, repassava mensalmente valores em espécie diretamente a Joelcio, acreditando estar regularmente matriculada em curso superior de pedagogia. Afirmou que, apesar de não ter acessado a plataforma institucional, confiava nas informações repassadas pelo acusado e apenas ao final do curso descobriu que constava apenas sua matrícula, sem registro de qualquer atividade. A vítima Odaísa Pereira de Moraes declarou que iniciou o curso no suposto polo do acusado, tendo inclusive sido levada por ele a Belém para realização de provas, o que reforçou a aparência de regularidade. Informou que, após o encerramento do polo, passou a entregar os valores diretamente a Joelcio e que, mediante pagamento adicional, permitia que as atividades fossem realizadas por terceiros. Apesar dessas facilidades, a vítima acreditava estar regularmente vinculada à instituição de ensino e somente tomou conhecimento da fraude ao final do curso, ao ser informada por sua amiga que não havia nenhuma formatura programada. A vítima Odila Pereira de Moraes afirmou que confiava no acusado por indicação de familiares, acreditando que ele representava a instituição de ensino no município. Declarou que repassava os valores mensalmente e que o acusado se apresentava como responsável pela intermediação entre os alunos e a universidade. Disse que chegou a ver notas em aplicativo acessado por Joelcio, o que reforçava a impressão de regularidade. Informou, ainda, que não exigia recibos, confiando nas informações prestadas, e que descobriu a fraude apenas após o encerramento do curso. A vítima Iracema Rodrigues dos Santos relatou que também realizou matrícula diretamente com Joelcio, em sua residência, onde este montara um suposto escritório com livros e folhetos da instituição. Informou que recebia as atividades por via fluvial e que o acusado se responsabilizava por sua resolução e envio. A vítima pagava mensalmente valores ao acusado, sem exigir recibos, e jamais teve acesso à plataforma da faculdade. Acreditava estar cursando pedagogia de forma regular e, somente ao final, foi pessoalmente a Belém, onde descobriu que sequer constava como aluna da instituição. A coacusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes negou qualquer envolvimento nos fatos, alegando que apenas morava com o acusado, seu então marido, e que ele administrava as finanças da casa, inclusive com acesso à sua conta bancária. Declarou que não conhecia as vítimas, não participou de tratativas acadêmicas e não sabia a origem dos valores eventualmente deixados por terceiros em sua residência, tendo alegado desconhecimento das fraudes até ser intimada na fase policial. O próprio acusado Joelcio Baratinha de Oliveira confessou que alterava declarações emitidas pela instituição de ensino, inserindo módulos não cursados pelas alunas, e que recebia valores em razão dessas alterações. Admitiu que, na condição de “chefe de turma”, organizou turmas, intermediou matrículas, distribuiu materiais e conduziu alunas a Belém, o que revela atuação central na simulação de um curso regular. Esclarece-se que as provas colhidas no inquérito foram corroboradas com o depoimento testemunhal em juízo, sendo válida a utilização dessas provas, nos termos do artigo 155 do Código de Processo Penal: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Em alegações finais Id Num. 146453993, a defesa pugnou pela absolvição dos réus por falta de provas. No entanto, essa pretensão não encontra amparo no conjunto probatório dos autos. As provas colhidas em juízo, especialmente os depoimentos das vítimas e documentos constantes do inquérito policial, aliados à confissão parcial do acusado, são suficientes para demonstrar, de forma segura, a materialidade, autoria e dolo na prática do crime de estelionato. A versão apresentada pelo réu, no sentido de que exercia apenas a função de “chefe de turma”, não se sustenta diante da farta comprovação de que ele recebia valores diretamente das vítimas, simulava vínculo institucional e emitia declarações com conteúdo falso, mantendo as vítimas em erro durante todo o período em que acreditaram cursar ensino superior válido. Assim, inexiste dúvida razoável que autorize a absolvição pretendida. Desse modo, a materialidade e autoria delitiva é inconteste. Passo a análise do nexo causal. Está plenamente comprovado nos autos que a conduta do acusado, Joelcio Baratinha de Oliveira, ao apresentar-se como representante da instituição de ensino, induzir as vítimas a acreditarem na regularidade do curso ofertado, simular a existência de polo educacional no município, fornecer declarações ideologicamente falsas e receber valores a título de mensalidades ou serviços acadêmicos, foi diretamente responsável pelos prejuízos suportados pelas vítimas, foram as únicas causas determinantes para a consumação do crime. Desse modo, diante da produção probatória em juízo, vê-se a conduta perpetrada amolda-se ao tipo previsto no art. 171, caput, do Código Penal por 04 (quatro) vezes. c) Antijuridicidade e Culpabilidade. A ilicitude ou antijuridicidade, é a contrariedade de uma conduta com o direito, causando efetiva lesão a um bem jurídico protegido. Praticado um fato típico, presume-se a antijuricidade, a qual pode ser excluída desde que presentes causas excludentes de ilicitude, como a legítima defesa, estado de necessidade e o exercício regular de um direito. No caso presente, a defesa não apresentou teses justificantes. A culpabilidade, trata-se de um juízo de reprovação social, incidente sobre o fato e seu autor, devendo o agente ser imputável, atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como ter a possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo, seguindo as regras impostas pelo Direito (teoria normativa pura, proveniente do finalismo). Também não há ocorrências de causas de exclusão da imputabilidade do réu. d) Análise do delito do art. 298 do Código Penal: Joelcio Baratinha de Oliveira. O ordenamento jurídico penal brasileiro adota o princípio da consunção como critério de interpretação sistemática para evitar a punição múltipla por condutas que integram, preparam, executam ou exaurem outra infração penal mais ampla e grave. Trata-se de princípio implícito, reconhecido pela doutrina e jurisprudência, fundado na proibição do bis in idem e na necessidade de intervenção mínima do Direito Penal. Sobre o tema, Cleber Masson explica: “de acordo com o princípio da consunção, ou da absorção, o fato mais amplo e grave consome, absorve os demais fatos menos amplos e graves, os quais atuam como meio normal da preparação ou execução daquele, ou ainda com seu mero exaurimento. Razão pela qual, aplica-se somente a lei que o tipifica: lex consumens legi consumptae. A lei consuntiva prefere a lei consumada”. No mesmo sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consagrou, por meio da Súmula 17, que: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido” (Súmula 17, Terceira Seção, julgado em 20/11/1990, DJ 28/11/1990, p. 13963). No presente caso, as condutas atribuídas ao acusado Joelcio Baratinha de Oliveira, consistentes na suposta falsificação de declarações de vínculo acadêmico, teriam como finalidade viabilizar a obtenção de vantagens patrimoniais indevidas, mediante indução das vítimas em erro quanto à sua regularidade junto à instituição de ensino. Verifica-se que os documentos supostamente falsificados foram utilizados como meio necessário para a prática do crime de estelionato, não se revelando autônomos ou com potencialidade lesiva distinta. A falsidade, nesse contexto, não se projeta para além da obtenção da vantagem econômica que caracteriza o estelionato, razão pela qual, à luz do princípio da consunção, reconhecido tanto pela doutrina quanto pela Súmula 17 do STJ, deve ser absorvida pelo delito mais grave. Assim, revela-se inviável a responsabilização autônoma pelo crime de falsificação de documento, porquanto este se exaure no crime de estelionato, não subsistindo lesividade penal independente. II - Dispositivo Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal: a) Para absolver a acusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes, da imputação do crime previsto no art. 171, caput, do Código Penal, com fundamento no art. 386, inciso VII, do CPP, por ausência de provas de participação consciente e voluntária nos fatos. b) Para absolver o denunciado Joelcio Baratinha de Oliveira quanto ao crime de falsificação de documento público (art. 298 do Código Penal), com base no art. 386, III, do CPP, em razão da consunção (Súmula 17 do STJ), c) Para condenar o acusado Joelcio Baratinha de Oliveira como incurso no art. 171, caput, do Código Penal por 04 vezes. Passo à dosimetria da pena, nos termos do art. 68 do Código Penal e Súmula 23 TJPA (a aplicação dos vetores do art. 59 do CPB obedece a critérios quantitativos e qualitativos, de modo que, existindo a aferição negativa de qualquer deles, fundamenta-se a elevação da pena base acima do mínimo legal). Considerando que os delitos imputados apresentam circunstâncias fáticas e jurídicas semelhantes, procedo à análise e aplicação da pena de forma conjunta. Dosimetria da pena. 1ª Fase. Inicialmente, analiso as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. 1. A culpabilidade refere-se ao grau de censurabilidade do crime (intensa, média ou reduzida), ou seja, a reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. De acordo com o enunciado contido na Súmula nº 19 deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará: “Na dosimetria basilar, a culpabilidade do agente diz respeito à maior ou menor reprovabilidade da conduta, não se confundindo com a culpabilidade como elemento do crime, que é composta pela imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude do fato e exigibilidade de conduta diversa”. Inexistem elementos a valorar. 2. Os antecedentes criminais tratam da vida pregressa e do envolvimento do agente com fatos criminosos pretéritos. Não existem elementos a serem valorados. 3. Quanto à conduta social dos acusados, que se refere ao comportamento do réu perante a sociedade (no trabalho, na família, no bairro onde reside), não existem elementos a serem valorados. 4. A personalidade do agente, não existem elementos a serem valorados. 5. Os motivos do crime referem-se às influências internas e externas que levaram o agente a cometer no delito, sendo essas inerentes ao tipo penal. 6. As circunstâncias do crime analisam o seu “modus operandi”, ou seja, são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo (como, por exemplo, em local ermo, quando do repouso noturno, com extrema violência etc. Há elementos desfavoráveis a valorar, pois o réu operava no contexto educacional, ambiente que exige elevado grau de probidade e responsabilidade social, especialmente diante da confiança naturalmente depositada por alunos em busca de formação superior. Além disso, valeu-se de documentos falsificados para conferir aparência de legalidade à sua atuação, agravando o dolo e dificultando a percepção do engodo pelas vítimas. Trata-se, portanto, de duas circunstâncias distintas e autônomas que aumentam a reprovabilidade da conduta: (i) o local e contexto da infração (educação formal) e (ii) o uso de documentação fraudulenta como instrumento de execução, o que autoriza, o acréscimo de 1/4 (um quarto) do intervalo entre a pena mínima e máxima cominada para o tipo penal. 7. As consequências do crime, que se referem à extensão dos danos ocasionados pelo delito, verificam-se que o tiro disparado pelo réu causou à vítima internamento hospitalar de 15 dias e lesões permanentes, contexto em que valoro negativamente. não há elementos para avaliar. 8. O comportamento da vítima não contribuiu para o cometimento do crime. Acerca do tema, digno de transcrição o teor da Súmula nº 18 deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará: “O comportamento da vítima é circunstância judicial que nunca será avaliada desfavoravelmente, ou seja, ou será positiva, quando a vítima contribuiu para a prática do delito, ou será neutra, quando não há contribuição”. Com base nas circunstâncias judiciais acima, fixo o acusado Joelcio Baratinha de Oliveira a PENA-BASE de pena-base em 02 (dois) anos de reclusão e 57 (cinquenta e sete) dias-multa. 2ª Fase. Existente a circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do Código Penal e Súmula 545 do STJ), uma vez que o réu admitiu parcialmente os fatos, confessando os delitos. Portanto, reconheço essa atenuante e aplico a fração de 1/6 de redução da pena, desde que não ultrapasse o mínimo legal. Sem circunstâncias agravantes. Fixo a PENA PROVISÓRIA em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 47 (quarenta e sete) dias-multa. 3ª Fase. Não há causa de diminuição de pena aplicáveis. Reconheço a continuidade delitiva (art. 71, caput, do Código Penal), uma vez que o acusado praticou, mediante mais de uma ação, o mesmo crime de estelionato contra vítimas diferentes, em condições semelhantes de tempo, lugar e modo de execução. Diante do número de infrações (quatro), da identidade do modus operandi e da reiteração das condutas em contexto educacional, fixo o aumento da pena em 1/4 (um quarto), nos termos da jurisprudência consolidada sobre o tema: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. CRIME CONTINUADO. QUANTIDADE DE CONDUTAS . IMPRECISÃO. FRAÇÃO MÁXIMA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7 DO STJ . AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "O crime continuado é benefício penal, modalidade de concurso de crimes, que, por ficção legal, consagra unidade incindível entre os crimes parcelares que o formam, para fins específicos de aplicação da pena. Para a sua incidência, a norma extraída do art . 71, caput, do Código Penal exige, concomitantemente, três requisitos objetivos:I) pluralidade de condutas; II) pluralidade de crime da mesma espécie; III) condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes (conexão temporal, espacial, modal e ocasional); IV) e, por fim, adotando a teoria objetivo-subjetiva ou mista, a doutrina e jurisprudência inferiram implicitamente da norma um requisito da unidade de desígnios na prática dos crimes em continuidade delitiva" ( AgRg no HC n. 730.671/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 23/8/2022, DJe de 30/8/2022.2 . O aumento decorrente da continuidade delitiva será determinado pelo número de infrações penais cometidas dentro do intervalo legal de 1/6 a 2/3, sendo aplicável a fração de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações.Nesse sentido: AgRg no HC n. 585.416/MG, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 14/11/2022, DJe de 18/11/2022) . 3. Na hipótese, conforme registrado pelo acórdão, "diante das provas colhidas nos autos não foi possível quantificar, com precisão, quantas vezes a ré incorreu no tipo penal, não podendo a adoção da fração de aumento basear-se em critérios duvidosos". 4. Assim, para alterar a conclusão aposta pelo Tribunal de origem e restabelecer a fração máxima de aumento pela continuidade delitiva, como requer a parte recorrente, demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório delineado nos autos, providência incabível em recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ . 5. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no REsp: 2069071 MG 2023/0141648-4, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 22/08/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/08/2023) Fixo a PENA DEFINITIVA 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão e 58 (cinquenta e oito) dias-multa, à razão mínima legal de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Detração Penal (art. 387, §2º, do CPP). Deixo de realizar a detração penal, pois não haverá alteração no regime inicial de cumprimento de pena, cabendo ao Juízo da Execução Penal competente a análise de futuros eventuais benefícios. Regime Inicial. O acusado Joelcio Baratinha de Oliveira deverá cumprir sua pena, inicialmente, em regime aberto na forma do art. 33, § 2º, “c” do Código Penal. Substituição por pena restritiva de direito e suspensão condicional da pena. Nos termos do artigo 44 do CP, as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: a) aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos; b) crime não cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; c) qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; d) réu não reincidente em crime doloso; e) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado; f) os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Verifica-se que o acusado não preenche os requisitos para a concessão do benefício, uma vez que houve valoração negativa das circunstâncias do crime, indicando a insuficiência da medida. Nos termos do artigo 77 do CP, a execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que: a) o condenado não seja reincidente em crime doloso; b) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício; c) Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código. Nesse contexto, a suspensão condicional da pena também se mostra incabível, pois o réu não preenche os requisitos do artigo 77 do Código Penal. Houve valoração negativa das circunstâncias do crime, situação que não recomenda a aplicação da medida, tornando inviável a concessão do sursis penal. Diante disso, a pena privativa de liberdade deve ser cumprida nos termos fixados na sentença, sem possibilidade de substituição ou suspensão. Direito de Apelar em Liberdade. O acusado responde ao processo em liberdade, não havendo, neste momento processual, motivos ensejadores de prisão preventiva (arts. 312 e 313 do CPP). Adverte-se que o denunciado deve manter endereço atualizado e comunicar qualquer alteração de endereço e, em caso de trânsito em julgado da sentença condenatória, deve se apresentar em juízo para início da execução penal, sob pena, se for o caso, de regressão cautelar de regime e expedição de mandado de prisão. Indenização à vítima. Deixo de fixar indenização mínima para as vítimas, nos termos do art. 387, IV, do CPP, por não haver pedido do Ministério Público nesse sentido, nem observância do contraditório. Custas. Com base nos arts. 804 e 805 do CPP, deixo de condenar o sentenciadao nas custas processuais, em virtude de ser pobre (Id. Num. 89215650 - Pág. 21) e se enquadrar na isenção legal disposta nos arts. 34 e 35 da Lei de Custas do Estado do Pará (lei estadual nº 8.328/15). Disposições comuns: Determino à Secretaria Judicial que, independentemente do trânsito em julgado desta decisão: 1. Intime-se o Ministério Público. 2. Intime-se o defensor do acusado, através de publicação oficial; 3. Intime-se o réu da sentença, conferindo-lhe o direito de apelar no prazo legal. 4. Comunique-se as vítimas. Certificado o trânsito em julgado: a) lance-se o nome do réu no rol dos culpados; b) expeça-se a Guia de Recolhimento Definitiva, conforme Resolução do Conselho Nacional de Justiça; c) comunique-se à Justiça Eleitoral (art. 15, III, CF); e) proceda-se o cálculo da pena de multa e intime-se o réu para efetuar o pagamento, em 10 (dez) dias, nos termos do art. 50 do CP, sob pena de, não o fazendo, o débito ser inscrito em Dívida ativa; d) comunicações e anotações de estilo, inclusive para fins estatísticos; e) dê-se baixa nos apensos (se houver); Publique. Registre. Intime. Curralinho/PA, datado e assinado digitalmente. André Souza dos Anjos Juiz Titular da Vara Única da Comarca de Curralinho
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Processo nº 0008429-07.2018.8.14.0083
ID: 318401193
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única de Curralinho
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0008429-07.2018.8.14.0083
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DENIEL RUIZ DE MORAES
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91)…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91) 3633-1315 / Balcão Virtual Processo nº 0008429-07.2018.8.14.0083 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA Nome: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Endere�o: desconhecido Nome: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA Endereço: Rua Castilhos França, 617, Centro, BREVES - PA - CEP: 68800-000 REU: CLEITON DE PAULA DIAS, JORGE LUIZ MARTINS BARBOSA ADVOGADO DATIVO: MAURICIO SILVA TAVARES Nome: CLEITON DE PAULA DIAS Endereço: Cafezal, s/n, Kit net da Dona Lourdes, Santa Rosa, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Nome: JORGE LUIZ MARTINS BARBOSA Endereço: 1, CENTRO, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Nome: MAURICIO SILVA TAVARES Endereço: CONJ EDUARDO ANGELIN, 22, (Cj Eduardo Angelim II), PARQUE GUAJARA, BELéM - PA - CEP: 66821-590 Sentença Trata-se de ação penal ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Pará em desfavor de Cleiton de Paula Dias e Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota”, imputando-lhes a prática do crime previsto no artigo 157, §2º, II do Código Penal. Narra a denúncia que no dia 11 de novembro de 2018, neste município, por volta das 20h00min, os denunciados, surgiram em uma moto, enquanto a vítima Karolina Cavacante de Souza caminhava na companhia de sua mãe, quando o denunciado Cleiton colocou a faca no pescoço da vítima e proferiu os textuais “Passa a bolsa”. Os denunciados subtraíram para si, mediante grave ameaça exercida com o uso de faca, dois celulares, duas bíblias e alguns pertences pessoais da vítima (Id. Num. 72149483 - Pág. 1-3). Certidão Judicial Criminai do réu Cleiton de Paula Dias (Id. Num. 72150546 - Pág. 5). Certidão Judicial Criminai do réu Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota” (Id. Num. 72150546 - Pág. 8). A denúncia foi recebida em 25 de julho de 2019 (Id. Num. 72150548 - Pág. 6). O réu Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota” não foi citado (Id. Num. 72150548 - Pág. 12 e Num. 72150549 - Pág. 6). O réu Cleiton de Paula Dias foi citado (Id. Num. 72150549 - Pág. 8). O réu Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota” foi citado (Id. Num. 72150550 - Pág. 1). O réu Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota” apresentou resposta à acusação, por meio de advogado dativo (Id. Num. 72150550 - Pág. 6-8). O réu Cleiton de Paula Dias apresentou resposta à acusação, por meio de advogado dativo (Id. Num. 72150550 - Pág. 10-11). Em audiência foram ouvidas as testemunhas Karyson Cardoso Gomes e PM Mario de Oliveira Oeiras, bem como a defesa requereu a oitiva da testemunha referida no depoimento da testemunha Karyson Cardoso Gomes, identificada como “Maceta”. O juízo redesignou audiência para oitiva das testemunhas ausentes (Id. Num. 79990206 - Pág. 1-2). Juntada de procuração do patrono constituído do réu Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota” (Id. Num. 89024879 - Pág. 1). Audiência prejudicada em razão do estado delicado da testemunha Adriana Araújo Cavalcante (Id. Num. 89908742 - Pág. 1). Audiência prejudicada em razão da ausência dos réus, bem como constatou-se que o réu Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota” encontrava-se preso (Id. Num. 96255791 - Pág. 1). Redesignação de audiência (Id. Num. 101143689 - Pág. 1). Em audiência foram ouvidas as testemunhas de acusação Karolina Cavalcante de Souza, PM Odir da Silva Almeida e Jairo Araujo Cavalcante, assim como foi realizado o interrogatório do réu Cleiton de Paula Dias e Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota”. Ambos exerceram seu direito constitucional de permanecer em silêncio (Id. Num. 112420657 - Pág. 1-2). O Ministério Público apresentou alegações finais requerendo a condenação dos réus pela prática dos crimes previstos no art. 157, §2º, II e VII do CP (Id. Num. 115389280 - Pág. 1-4). A defesa do réu Cleiton de Paula Dias requereu sua absolvição por insuficiência para um decreto penal condenatório aduzindo que os fatos narrados na denúncia não foram corroborados por nenhuma testemunha idônea, não tendo a palavra da vítima, por si só, força probatória para sustentar uma imputação penal. E em caso de condenação requer a fixação da pena no mínimo legal, por não ter o crime extrapolado os elementos normais do tipo, devendo ser aplicado regime inicial de cumprimento compatível com a pena aplicada, eis que favoráveis às circunstâncias judiciais. Assim como o reconhecimento da atenuante de confissão e da menor idade do réu que à época apresentava 18 anos de idade (Id. Num. 116753025 - Pág. 1-4). Certidão informando que foi esgotado o prazo para apresentação de alegações finais pelas partes (Id. Num. 132608571 - Pág. 1). Despacho proferido, destacando que o acusado Jorge Luiz Martins Barbosa, assistido pelo advogado Dr. Deniel Ruiz de Moraes, foi intimado para apresentar alegações finais, mas permaneceu inerte. Determinou-se a intimação do advogado para que, no prazo de 5 dias, se manifeste ou justifique o abandono do processo, sob pena de comunicação à OAB/PA. Caso não haja manifestação, determinou-se a intimação desse réu, no prazo de 10 dias, para constituir novo advogado, sob pena de nomeação de defensor público ou dativo. Se necessário, nomeou-se a advogada dativa (Id. Num. 133716628 - Pág. 1-3). A Defesa de Jorge Luiz Martins Barbosa, apresenta alegações finais em forma de memoriais, justificando o atraso na entrega devido à falta de contato com o acusado, que se mudou para Belém. O defensor reconhece a falha e pede desculpas ao juiz, ao Ministério Público e a todos envolvidos, solicitando a aceitação dos memoriais. No mérito, a defesa argumenta que as provas não são suficientes para a condenação, destacando que as testemunhas não conseguiram identificar o acusado de forma clara. Além disso, aponta que o princípio in dubio pro reo deve ser aplicado, resultando na absolvição do réu por falta de provas suficientes. Em caso de condenação, solicita que a pena seja limitada à participação do acusado no crime. A defesa também pede a aceitação das alegações finais fora do prazo e aguarda deferimento (Id. Num. 137730381 - Pág. 1-5). Os autos vieram conclusos. É o relatório. Fundamento. Trata-se de ação penal oferecida pelo Ministério Público contra Marinaldo Castro Mendes, como incurso nas penas do art. 157, § 2°, inciso II, do Código Penal: Roubo Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. (...). § 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade: (...); II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; A ação penal transcorreu sem máculas processuais, estando o feito em termos para o seu julgamento. I - Mérito. Em audiência de instrução e julgamento foram produzidas as provas a seguir. A testemunha, Karyson Cardoso Gomes, afirmou que, em uma quarta-feira, as vítimas estavam indo para a igreja e que chegou mais cedo, por volta das sete e meia. Narrou que estava na frente da igreja, onde as pessoas ainda estavam chegando. Karyson relatou ter visto os dois acusados passarem de moto na frente da igreja e dobrarem na rua por onde haviam vindo. Eles olharam para ele, e ele pensou que fossem lhe assaltar, mas os reconheceu, e os acusados seguiram em frente. Em seguida, as vítimas chegaram à igreja e relataram que haviam sido assaltadas, sem explicar como o crime ocorreu ou mencionar o uso de armas ou faca, apenas afirmando que levaram a bolsa e o celular. Os fatos ocorreram à noite. Karyson disse que as vítimas não reconheceram os autores do crime, mas mencionaram que eram duas pessoas na motocicleta. Ela não viu o ocorrido, pois estava fora do seu campo de visão. Após o assalto, os acusados não passaram novamente na frente dele. Quando indagado sobre ter afirmado na delegacia que Cleiton passou na sua frente e deixou cair a bolsa da vítima, Karyson negou ter dito isso. Acredita que tenha sido o tio das vítimas, conhecido como Maceta, quem reconheceu os acusados. Karyson também mencionou que não viu os fatos sozinho, pois outro menino também viu, e esse menino contou a Maceta, dizendo que o assaltante era o Neto, que ele conhecia. Karyson não se lembra de todos os detalhes, mas acredita que os acusados foram presos um ou dois dias após o ocorrido. Ele afirmou que o fato aconteceu na quarta-feira e que, na quinta-feira, foi à escola, sendo chamado por Maceta para comparecer à delegacia para prestar depoimento. Maceta lhe deu R$40,00 (quarenta reais) para que ele fosse à delegacia, e disse que ele deveria confirmar que tinha visto o Neto. Esclareceu que dinheiro era exclusivamente para comparecer na delegacia, pois ele tinha visto o Neto, que lhe deu o dinheiro para falar que era ele. Karyson garantiu que está falando a verdade e não está mentindo. Na delegacia, só mandaram reconhecer e não falou nada. Quando perguntando se era aquele que havia roubado, e Karyson respondeu afirmativamente. Em seguida, entregou seus documentos. Karyson disse que não viu o assalto, mas respondeu afirmativamente ter deduzido que os acusados foram os responsáveis. Ele acredita que era “Jota” quem estava dirigindo a motocicleta, mas depois afirmou que não lembra quem estava dirigindo. Karyson explicou que o Maceta mora no interior e não é uma pessoa importante na cidade, mas que ele é da mesma igreja que a sua. Maceta lhe deu o dinheiro para confirmar que ele tinha visto os era o menino que teria visto, pois o depoimento da menina não teria valor. Karyson afirmou que Maceta pediu para ele ir à delegacia e dizer que o acusado foram os responsáveis pelo roubo. Ele garantiu que não falaria que era outra pessoa, pois conhece Cleiton, conhecido como “Neto”. Karyson ainda afirmou que Cleiton não é contumaz na prática de crimes, pois trabalha. Quanto ao “Jota”, Karyson não sabe o que ele faz, mas vê Cleiton, pois ele trabalha na frente da cidade. A testemunha PM Mario de Oliveira Oeiras declarou que não recorda dos fatos. Após leitura do seu depoimento em sede policial, asseverou que recordou da situação, que o Cleiton e outro rapaz, em uma moto, assaltaram a menor e mãe que a acompanhava. Que quando as vítimas lhe procuram já sabiam quem teria sido os autores do fato. A vítima, Karolina Cavalcante de Souza, relatou que os fatos ocorreram em um domingo, por volta das 19h ou 20h, quando ela e sua mãe iam para a igreja e foram abordadas por dois rapazes em uma motocicleta. O passageiro, armado com uma faca, parou Karolina e exigiu que ela entregasse sua bolsa, contendo seu celular, uma bíblia e o celular de sua mãe. O passageiro da motocicleta lhe exigiu que entregasse sua bolsa. Sua mãe gritou, pedindo para que ela entregasse a bolsa, enquanto o criminoso puxava a bolsa, que caiu no chão, mas os assaltantes foram mais rápidos e levaram os pertences. Em seguida, Karolina foi à delegacia registrar a ocorrência e mencionou que havia uma testemunha. Destacou que não recuperou seus pertences, e reconheceu exclusivamente o Cleiton. Quanto ao outro participante do crime, não sabe até hoje quem é, uma vez que não lhe deram qualquer informação na delegacia. Karolina também afirmou que, desde o ocorrido em 2018, só compareceu à audiência no juízo. Quando perguntada como reconheceu o Cleiton, ela relatou que os acusados passaram na frente da igreja, onde havia alguns amigos, que um deles serviu de testemunha na delegacia. Na delegacia, foi perguntado a ela se, caso trouxessem o acusado, ela conseguiria reconhecê-lo, ao que ela respondeu positivamente. Na época lhe falaram que se tratava do “Netinho”, mas desconhece a origem desse nome. Posteriormente, após ter sido chamada, ela reconheceu esse “Netinho” na delegacia como um dos autores do crime, juntamente com sua genitora. Karolina detalhou que os autores estavam sem capacete e com o rosto descoberto, sendo que deram a volta na rua e fizeram o assalto, que caso estivessem de capacete, poderia não realizar o reconhecimento. Reafirmou que reconheceu exclusivamente o Cleiton, que era o passageiro da motocicleta, mas não soube identificar quem estava dirigindo este veículo. Asseverou que o motorista da moto permaneceu com a motocicleta enquanto o comparsa desceu da motocicleta. Comunicou que os fatos se deram em 2018, sendo que recorda dos fatos com riqueza de detalhes. No momento do assalto, o local não estava iluminado, mas em uma parte em que pararam conseguiu reconhecer o passageiro da motocicleta, o qual desceu e colocou a faca próxima ao seu pescoço. Após o assalto, ela foi imediatamente à delegacia, mas relatou que foi maltratada por um guarda que minimizou o caso, dizendo que era como “encontrar uma agulha no palheiro”. Mesmo assim, ela insistiu diante do assalto recente e ele pegou a viatura solicitando que o levasse no local dos fatos. No dia seguinte, Karolina compareceu à delegacia para fazer o reconhecimento do rapaz, mas não conseguiu recuperar seus objetos. Destacou que somente depois foram buscar o suspeito, momento em que a chamaram para reconhecê-lo, mas Karolina acredita que ele não ficou preso ou, se foi, não teria permanecido detido. Ela também informou que, na época, um servidor da delegacia sugeriu que pegasse o número do chip do celular para rastreá-lo, mas, apesar de várias tentativas de contato, não obteve retorno. A testemunha PM Odir da Silva Almeida declarou que recorda de um dos acusados de outras situações, mas acredita que esse acusado teve participação nesses fatos apurados, uma vez que foi preso no dia. A testemunha Jairo Araujo Cavalcante asseverou que lhe foi enviada uma notificação sobre o assunto, mas que não se recorda de ter dado uma declaração como testemunha. Lembrou-se de que foi à delegacia e soube do assalto, mas afirmou que não presenciou o ocorrido e que não poderia afirmar algo que não viu. Relatou que lhe informaram que o autor seria Cleiton, o qual conhece bem, já que, por ser uma cidade pequena, sempre se esbarram. Jairo afirmou não lembrar de ter dado esse depoimento como testemunha, mas confirmou que foi chamado e compareceu ao juízo. Mencionou que havia outros envolvidos no caso e citou uma testemunha chamada Karysson, menor de idade (14 anos), que afirmou saber quem havia assaltado sua irmã. Jairo também disse que não se recorda e nem sabe quem é o outro rapaz conhecido como “Jota”, que estava na moto. Declarou saber quem é Cleiton, pois a cidade é pequena e ambos se encontram desde pequenos. Por fim, afirmou não recordar de ter conversado com Cleiton depois dos fatos, mas contou que sempre fala com sua sobrinha, que reconheceu Cleiton assim que o viu. Em seu interrogatório, o acusado Cleiton de Paula Dias afirmou que iria permanecer em silêncio. Por sua vez, o denunciado Jorge Luiz Martins Barbosa também declarou que iria permanecer em silêncio. a) Análise do delito previsto no art. 157, § 2°, inciso II, do Código Penal. Importante mencionar que a doutrina do ônus da prova fixa incumbir àquele que proferiu a afirmação e a quem aproveita o fato alegado o encargo de exibir provas que denotam a veracidade das assertivas que aduziu em juízo. Sobre o ônus da prova no processo penal o professor Renato Brasileiro nos ensina: Transportando-se o conceito de ônus para o âmbito da prova, pode-se dizer que ônus da prova é o encargo que as partes têm de provar, pelos meios legal e moralmente admissíveis, a veracidade das afirmações por elas formuladas ao longo do processo, resultando de sua inação uma situação de desvantagem perante o direito (....) “Ao Ministério Público e o querelante têm o ônus de provar os fatos delituosos além de qualquer dúvida razoável, produzindo no magistrado um juízo de certeza em relação ao fato delituoso imputado ao acusado (...)” (Manual de Processo Penal, 3º edição, 2015, p. 593 e 597). Essa regra procedimental está prevista no art. 156 do Código de Processo Penal o qual declara que a “prova da alegação incumbirá a quem a fizer”. Depreende-se de tais conceitos que, em juízo, não basta simplesmente alegar os fatos. Para que a relação de direito litigiosa fique definitivamente garantida pela regra de direito correspondente, preciso é, antes de tudo, que o juiz se certifique da verdade dos fatos alegados, o que se dá através dos elementos probatórios ínsitos nos autos. Cada assertiva terá que ser demonstrada e, somente depois de reconhecida e aceita judicialmente, pode ser considerada enquanto fato constitutivo do direito. Portanto, o conjunto probatório deve se mostrar apto ao convencimento do julgador e se tal não ocorrer, mesmo diante da mais tênue dúvida, deve-se dar lugar ao decreto absolutório, pois certamente será menos gravoso deixar um crime sem reprimenda do que lançar às agruras do cárcere cidadão inocente. Essa dúvida é traduzida na máxima latina “in dubio pro reo”. Passo à análise do caso concreto. O tipo penal do artigo 157, caput, do Código Penal exige, para a configuração do crime de roubo, que o agente subtraia coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de haver a vítima, por qualquer meio, reduzida à impossibilidade de resistência. Além disso, o tipo qualificador, contido no §2º, inciso II, se aplica quando o roubo é cometido por duas ou mais pessoas, o que caracteriza a maior gravidade do crime, ensejando um aumento de pena. Para que a tipificação seja completa, é necessário que a ação seja realizada em concurso com outras pessoas, e a violência ou ameaça envolva risco real à vítima, garantindo que a subtração seja efetuada de forma intimidadora e coercitiva. Em relação ao acusado Jorge Luiz Martins Barbosa, vulgo “Jota”, inexistem quaisquer elementos probatórios no tocante a autoria, pois as testemunhas ouvidas em juízo - Karolina Cavalcante de Souza, Jairo Araujo Cavalcante, Karyson Cardoso Gomes, PM Odir da Silva Almeida e PM Mario de Oliveira Oeiras, não o associaram diretamente à prática do crime. Diante da ausência de provas robustas e do princípio in dubio pro reo, não é possível atribuir ao réu a autoria do delito, razão pela qual a sua absolvição se impõe. Quanto ao acusado Cleiton de Paula Dias, embora a vítima Karolina Cavalcante de Souza tenha reconhecido pessoalmente o réu como um dos autores do roubo na delegacia, o reconhecimento não seguiu o rito legal previsto no artigo 226 do Código de Processo Penal, que estabelece as formalidades necessárias para garantir a integridade do reconhecimento. Vejamos: Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma: I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida; Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la; III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela; IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais. Parágrafo único. O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento. No caso em questão, o reconhecimento realizado pela vítima na delegacia não atendeu a essas exigências. A vítima não foi chamada a fazer uma descrição prévia do acusado antes de proceder ao reconhecimento. Além disso, o acusado não foi colocado ao lado de outras pessoas com características semelhantes para que a vítima pudesse fazer a escolha de forma isenta. A vítima, ainda, foi informada sobre a identidade do acusado antes de realizar o reconhecimento, o que pode ter influenciado sua decisão. Por fim, não foi lavrado um auto detalhado, subscrito pela autoridade policial e por duas testemunhas presenciais. Como o reconhecimento não seguiu os ritos formais, existe um risco substancial de que o ato tenha sido influenciado por fatores externos, como a sugestão sobre a identidade do acusado antes do reconhecimento, o que pode ter levado a vítima a afirmar, sem total isenção, que reconheceu o réu. Essas situações enfraquecem a validade do ato e, por conseguinte, reduzem a força da prova testemunhal da vítima. Neste sentido: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. ROUBO. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO E PESSOAL REALIZADOS EM SEDE POLICIAL. INOBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART . 226 DO CPP. INVALIDADE DA PROVA. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O TEMA. AUTORIA ESTABELECIDA UNICAMENTE COM BASE EM RECONHECIMENTO EFETUADO PELA VÍTIMA . ABSOLVIÇÃO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE OFÍCIO. 1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus . ( AgRg no HC 437.522/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe 15/06/2018) 2. A jurisprudência desta Corte vinha entendendo que "as disposições contidas no art . 226 do Código de Processo Penal configuram uma recomendação legal, e não uma exigência absoluta, não se cuidando, portanto, de nulidade quando praticado o ato processual (reconhecimento pessoal) de forma diversa da prevista em lei" ( AgRg no AREsp n. 1.054.280/PE, relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, DJe de 13/6/2017) . Reconhecia-se, também, que o reconhecimento do acusado por fotografia em sede policial, desde que ratificado em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, pode constituir meio idôneo de prova apto a fundamentar até mesmo uma condenação. 3. Recentemente, no entanto, a Sexta Turma desta Corte, no julgamento do HC 598.886 (Rel . Min. Rogério Schietti Cruz, DJe de 18/12/2020, revisitando o tema, propôs nova interpretação do art. 226 do CPP, para estabelecer que"O reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa" . 4. Uma reflexão aprofundada sobre o tema, com base em uma compreensão do processo penal de matiz garantista voltada para a busca da verdade real de forma mais segura e precisa, leva a concluir que, com efeito, o reconhecimento (fotográfico ou presencial) efetuado pela vítima, em sede inquisitorial, não constitui evidência segura da autoria do delito, dada a falibilidade da memória humana, que se sujeita aos efeitos tanto do esquecimento, quanto de emoções e de sugestões vindas de outras pessoas que podem gerar "falsas memórias", além da influência decorrente de fatores, como, por exemplo, o tempo em que a vítima esteve exposta ao delito e ao agressor; o trauma gerado pela gravidade do fato; o tempo decorrido entre o contato com o autor do delito e a realização do reconhecimento; as condições ambientais (tais como visibilidade do local no momento dos fatos); estereótipos culturais (como cor, classe social, sexo, etnia etc.). 5 . Diante da falibilidade da memória seja da vítima seja da testemunha de um delito, tanto o reconhecimento fotográfico quanto o reconhecimento presencial de pessoas efetuado em sede inquisitorial devem seguir os procedimentos descritos no art. 226 do CPP, de maneira a assegurar a melhor acuidade possível na identificação realizada. Tendo em conta a ressalva, contida no inciso II do art. 226 do CPP, a colocação de pessoas semelhantes ao lado do suspeito será feita sempre que possível, devendo a impossibilidade ser devidamente justificada, sob pena de invalidade do ato . 6. O reconhecimento fotográfico serve como prova apenas inicial e deve ser ratificado por reconhecimento presencial, assim que possível. E, no caso de uma ou ambas as formas de reconhecimento terem sido efetuadas, em sede inquisitorial, sem a observância (parcial ou total) dos preceitos do art. 226 do CPP e sem justificativa idônea para o descumprimento do rito processual, ainda que confirmado em juízo, o reconhecimento falho se revelará incapaz de permitir a condenação, como regra objetiva e de critério de prova, sem corroboração do restante do conjunto probatório, produzido na fase judicial. 7. Caso concreto: situação em que a autoria de crime de roubo foi imputada ao réu com base exclusivamente em reconhecimento fotográfico e pessoal efetuado pela vítima em sede policial, sem a observância dos preceitos do art. 226 do CPP, e muito embora tenha sido ratificado em juízo, não encontrou amparo em provas independentes. Configura induzimento a uma falsa memória, o fato de ter sido o marido da vítima, que é delegado, o responsável por chegar à primeira foto do suspeito, supostamente a partir de informações colhidas de pessoas que trabalhavam na rua em que se situava a loja assaltada, sem que tais pessoas jamais tenham sido identificadas ou mesmo chamadas a testemunhar . Revela-se impreciso o reconhecimento fotográfico com base em uma única foto apresentada à vítima de pessoa bem mais jovem e com traços fisionômicos diferentes dos do réu, tanto mais quando, no curso da instrução probatória, ficou provado que o réu havia se identificado com o nome de seu irmão. Tampouco o reconhecimento pessoal em sede policial pode ser reputado confiável se, além de ter sido efetuado um ano depois do evento com a apresentação apenas do réu, a descrição do delito demonstra que ele durou poucos minutos, que a vítima não reteve características marcantes da fisionomia ou da compleição física do réu e teve suas lembranças influenciadas tanto pelo decurso do tempo quanto pelo trauma que afirma ter sofrido com o assalto. 8. Tendo a autoria do delito sido estabelecida com base unicamente em questionável reconhecimento fotográfico e pessoal feito pela vítima, deve o réu ser absolvido . 9. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para absolver o paciente. (STJ - HC: 652284 SC 2021/0076934-3, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 27/04/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/05/2021). Ademais, as outras testemunhas ouvidas em juízo, como Karyson Cardoso Gomes, PM Mario de Oliveira Oeiras e Jairo Araujo Cavalcante, não conseguiram associar Cleiton de Paula Dias de forma direta à prática do crime, limitando-se a informações vagas ou a deduções que não corroboram de maneira efetiva a autoria do delito. Karyson, por exemplo, não presenciou os fatos e afirmou que o reconhecimento foi influenciado por ter visto o acusado passando antes do crime, o que enfraquece ainda mais a credibilidade da prova testemunhal. O PM Odir da Silva Almeida, não recordou dos fatos apurados. O PM Mario de Oliveira Oeiras também declarou que não se recordava dos fatos e só se lembrou da situação após a leitura do seu depoimento, o que compromete a precisão e a robustez de seu testemunho. Jairo, por sua vez, não presenciou os fatos e afirmou que foi Karyson quem reconheceu o acusado. Essas declarações, somadas à fragilidade do reconhecimento realizado pela vítima, reduzem a força probatória da acusação e geram dúvidas razoáveis quanto à autoria do crime. Portanto, embora a vítima tenha reconhecido Cleiton como um dos autores do roubo, a fragilidade do reconhecimento realizado na delegacia, somada à falta de outros elementos de prova que corroborem a versão da vítima, impede que se estabeleça de forma conclusiva a autoria do crime por parte do réu. A inexistência de provas diretas e a dúvida quanto à legitimidade do reconhecimento deixam margem para questionamentos, e, conforme o princípio in dubio pro reo, deve-se afastar a condenação de Cleiton de Paula Dias, que, até o momento, não teve sua participação suficientemente comprovada. No Direito Penal a culpa é impresumível, devendo ser suficientemente provada para um decreto penal condenatório. Deste modo, inexistem provas contundentes e robustas contra os denunciados Jorge Luiz Martins Barbosa e Cleiton de Paula Dias, para efeito de uma condenação penal pelo delito previsto no art. 157, § 2°, inciso II, do CP. II. Dispositivo. Ante o exposto, julgo procedente a pretensão punitiva deduzida pelo Ministério Público na denúncia para absolver os acusados, Jorge Luiz Martins Barbosa e Cleiton de Paula Dias, já qualificados nos autos, da imputação a eles atribuídas, em razão da insuficiência de provas, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Sem custas. Ciência ao Ministério Público. Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Dê-se baixa nos apensos (se houver). Publique. Registre. Intime. Curralinho/PA, datado e assinado digitalmente. André Souza dos Anjos Juiz Titular da Vara Única da Comarca de Curralinho
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