Processo nº 0007492-60.2019.8.14.0083
ID: 326028846
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Única de Curralinho
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0007492-60.2019.8.14.0083
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
SEVERA ROMANA MAIA DE FREITAS
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91)…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE CURRALINHO Avenida Floriano Peixoto, S/N, Q 1, L 1, Centro, Curralinho/PA, CEP 68815-000 1curralinho@tjpa.jus.br / (91) 3633-1315 / Balcão Virtual Processo nº 0007492-60.2019.8.14.0083 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA Nome: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA Endereço: 'Rua Manoel Barata, - de 901/902 ao fim, Ponta Grossa (Icoaraci), BELéM - PA - CEP: 66812-020 REU: JOELCIO BARATINHA DE OLIVEIRA, MARIANA INGRID CARMENCITA NUNES Nome: JOELCIO BARATINHA DE OLIVEIRA Endereço: JARBAS PASSARINHO, 00, NÃO INFORMADO, CENTRO, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Nome: MARIANA INGRID CARMENCITA NUNES Endereço: RUA SANTA ROSA, PRÓX. A JARBAS PASSARINHO, AO LADO DA IGREJA QUADRANGULAR, CENTRO, CURRALINHO - PA - CEP: 68815-000 Sentença O Ministério Público Estadual oferece denúncia em desfavor de Joelcio Baratinha de Oliveira, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput e art. 298, ambos do Código Penal, e contra Mariana Ingrid Carmecita Nunes, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput, do Código Penal. A denúncia foi recebida em 18 de dezembro de 2020, ID 74710560, pág. 01. Joelcio Baratinha de Oliveira foi citado, ID 74710561, pág. 07 e apresentou Resposta à Acusação, por meio de defensor constituído, ID 74710561, pág. 01. Mariana Ingrid Carmecita Nunes foi citada, ID 74710561, pág. 09 e apresentou Resposta à Acusação, por meio de defensor constituído, ID 74710561, pág. 02. Audiência de instrução e julgamento ID 96678860, prejudicada, em razão da falta de emissão dos expedientes de intimação. Em audiência de instrução e julgamento ID 112424206, procedeu-se a oitiva das testemunhas Daiane Nunes Nogueira, Odaiza Pereira de Moraes, Odila Pereira de Moraes. O parquet insiste na oitiva da testemunha Iracema Rodrigues dos Santos, ID 114578783. Em audiência de instrução e julgamento ID 145183237, procedeu-se a oitiva de Iracema Rodrigues dos Santos e o interrogatório dos réus. Em alegações finais lançadas sob o ID 146365706, o Ministério Público requereu a procedência integral da denúncia, com a consequente condenação de Joelcio Baratinha de Oliveira pela prática dos delitos previstos nos arts. 171 e 298, combinados com os arts. 69 e 71, todos do Código Penal. Requereu, ainda, a condenação de Mariana Ingrid Carmecita Nunes, como incursa nas sanções do art. 171, em concurso material e crime continuado, nos termos dos arts. 69 e 71 do mesmo diploma legal. Em alegações finais ID 146453993, a defesa pugnou pela absolvição dos réus por falta de provas. Subsidiariamente, em caso de condenação, a fixação da pena no mínimo legal, aplicação de regime inicial aberto, substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e o direito de recorrer em liberdade. É o relato. fundamento. Trata-se de ação penal pública incondicionada oferecida pelo Ministério Público em desfavor de Joelcio Baratinha de Oliveira, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput e art. 298, ambos do Código Penal, e contra Mariana Ingrid Carmecita Nunes, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 171, caput, do Código Penal: Estelionato Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis. Falsificação de documento particular Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. I – Mérito. Em audiência de instrução e julgamento foram produzidas as provas a seguir. A vítima Daiane Nunes Nogueira afirmou que, desde o início da matrícula no curso, foi direcionada a tratar diretamente com Joelcio Baratinha. Esclareceu que a matrícula foi realizada em um polo localizado próximo à residência dele, que, apesar de existir fisicamente com materiais de estudo, só puderam acessá-los posteriormente, sendo que depois o polo foi desfeito e os instrumentos de estudo foram desmontados. Contou que passou a tratar tudo com Joelcio, sem qualquer contato com a professora Ingrid, com quem nunca tratou nada. Explicou que só citou Ingrid porque realizou um ou dois depósitos em sua conta bancária a pedido de Joelcio, mas não teve contato direto com ela. Destacou que não está processando Ingrid, pois tudo referente à faculdade era tratado exclusivamente com Joelcio, incluindo pagamentos em espécie, realizados pessoalmente ou deixados em sua residência. Afirmou que os quatro anos de curso foram tratados diretamente com Joelcio, acreditando na veracidade da instituição e que apenas ele não era o representante legal. Informou que, ao comparecer à formatura, verificou que no sistema da faculdade constava apenas a matrícula, sem qualquer outro registro de atividades. Disse que, ao longo dos quatro anos, pagava mensalidades e, como trabalhava para a prefeitura, solicitava declarações a ele, que as fornecia assinadas. Acrescentou que, ao registrar boletim de ocorrência, não pôde juntar todos os documentos, pois confiava nele por conhecê-lo há muito tempo, inclusive tendo sido aluna da professora Ingrid. Relatou que Joelcio recolhia os valores, emitia algumas declarações de pagamento e, em outros casos, não entregava nada, mas ela confiava que os pagamentos estavam sendo feitos. Afirmou que entregava os valores diretamente a Joelcio, em mãos, porque o conhecia por terem estudado juntos, e ele havia dito que era o responsável pela faculdade. Narrou que havia um polo perto da casa de Joelcio, onde pessoas estudavam utilizando notebook, o que lhe conferia credibilidade. Reiterou que tudo era tratado com ele, inclusive a emissão de declarações. Confirmou que a matrícula foi realizada em 2015 e que o curso era a distância, o que dificultava sua participação presencial, pois residia no interior e só vinha à cidade nos finais de semana. Disse que Joelcio oferecia ajuda para realizar atividades, algumas das quais pagou para que ele as fizesse. Informou que o curso era de pedagogia, que não assistiu aulas presenciais e que tudo era facilitado por Joelcio, inclusive com promessas de realização de provas. Disse que confiava nele por conta da amizade de longa data, inclusive com laços de amizade da sua mãe com a professora Ingrid. Relatou que, por confiar, aceitava que ele realizasse atividades e provas em seu lugar mediante pagamento, inclusive chegando a emprestar dinheiro para que ele cumprisse os compromissos. Mencionou que nunca acessou a plataforma da faculdade, acreditando nas informações prestadas por Joelcio, que lhe dizia que tudo estava certo. Somente no final do curso decidiu questionar a situação, quando viajou a Belém e tentou localizar o polo indicado por ele, sem sucesso, tendo sido informada posteriormente, ao comparecer à formatura, de que apenas constava sua matrícula na instituição. Ressaltou que não tratava nada com Mariana Ingrid, tendo apenas realizado depósitos em sua conta por orientação de Joelcio. Estima que não faz ideia do valor total do prejuízo, pois tudo era pago a ele, e nunca recebeu o diploma, sendo informada de que sequer era considerada aluna da instituição. Relatou que o polo da faculdade foi desativado em 2015, passando a funcionar uma batedeira de açaí e, depois, uma distribuidora de água no local. Disse que acreditava que Joelcio era representante da faculdade, especialmente por ter presenciado pessoas de Belém em sua casa na época da matrícula, quando foi cobrado valor pela inscrição. Narrou que tudo era tratado com ele, inclusive por outros alunos, como seu irmão, que também confiavam que Joelcio era o representante da universidade no município. A vítima Odaísa Pereira de Moraes declarou que, no início da faculdade, realizou um processo seletivo na casa de Joelcio, foi a Belém para fazer uma ou duas provas e, posteriormente, ele instalou um polo em sua residência com computadores e livros, que podiam ser levados para casa. Disse que, com o tempo, o polo foi encerrado, pois Joelcio alegou o roubo dos computadores, e passou a dizer que o curso deveria ser feito online, embora os alunos não tivessem como acessá-lo. Afirmou que, inicialmente, pagou boletos bancários, dos quais ainda possui três, mas, depois, como morava no interior e não tinha acesso à internet, passou a entregar o dinheiro diretamente a Joelcio, que dizia que realizaria os pagamentos. Explicou que, quando ele não estava, a professora Ingrid recebia os valores. Confirmou que todos os pagamentos foram feitos em espécie, pois não utilizava Pix. Contou que, já ao final do curso, começou a desconfiar da situação, quando Ingrid questionou se ainda não haviam finalizado a faculdade. Relatou que as atividades eram para ser feitas pelo celular, mas, diante da dificuldade, Joelcio dizia que Ingrid poderia fazê-las mediante pagamento de R$ 20,00, o que de fato ocorreu. Informou que ingressou no curso de pedagogia em 2015, fazendo a matrícula na casa de Joelcio, e que ele se identificava como representante da faculdade. Acrescentou que desconhece quando o polo foi encerrado, pois acreditava que ele ainda estava ativo. Disse que jamais entrou no aplicativo da faculdade para verificar a situação financeira do curso, estimando o prejuízo em cerca de R$ 13.000,00, pagos ao longo de três anos e meio. Afirmou que ingressou com ocorrência policial, recebeu apenas um atestado de conclusão sem validade e que sua amiga, ao comparecer a Belém para a suposta formatura, constatou que não havia nada agendado. Justificou sua confiança em Joelcio e Ingrid pelo fato de a mãe desta última ser professora muito conhecida no município. Esclareceu que Ingrid só recebia o dinheiro quando Joelcio estava ausente e que nunca tratou diretamente da faculdade com ela. Contou que realizou uma ou duas provas em Belém, levada por Joelcio, o qual sempre se apresentava como representante da instituição, inclusive ajudando no acesso ao AVA. Disse que, após os dois primeiros meses, as provas passaram a ser entregues aos alunos para realização em casa, com correção por Joelcio. Mencionou que acessava a plataforma eventualmente, mas sem identificar questões financeiras pendentes. Quando descobriram que haviam sido enganadas, sua amiga verificou no polo que constava apenas dois meses de vínculo com a instituição. Afirmou que nunca recebeu notificações de inadimplência, pois pagava adiantado para obter desconto. Confirmou que a faculdade declarou não reconhecer Joelcio como representante legal, embora, na época, ele os tivesse levado até o polo, onde apresentou pessoas como sendo da coordenação e exibiu panfletos da instituição em sua residência. A testemunha Odila Pereira de Moraes afirmou que possui diversas lembranças negativas sobre a situação, relatando que, no início, desejava ingressar em uma faculdade, tendo seus primos, já matriculados, apresentado Joelcio, conhecido como Japa, que parecia estar à frente da organização do curso. Por conta disso, confiou na proposta e também realizou sua matrícula. Informou que, inicialmente, realizava o pagamento por boleto, mas, devido às dificuldades de locomoção e por residir no interior, Joelcio se prontificou a efetuar os pagamentos mediante o repasse dos valores diretamente a ele. Acrescentou que, ao ser questionado sobre os comprovantes, Joelcio dizia que não conseguia imprimir devido a problemas na máquina, mas que guardava todos os documentos em seu computador e que tudo estaria certo. Disse que Joelcio se apresentava como coordenador ou representante da faculdade em Curralinho, fazendo a conexão entre os alunos locais e a instituição de ensino, localizada em Belém. Explicou que muitos alunos, inclusive ela, moravam em regiões distantes, como a comunidade Turec, e dependiam do auxílio dele para manter os estudos. Afirmou que Joelcio levava os alunos ao polo em Belém para realização de provas e auxiliava no acesso ao AVA, demonstrando familiaridade com a estrutura acadêmica, o que conferia confiança. Contou que, nos dois primeiros meses, acessava o aplicativo da faculdade, estudava com os livros recebidos e fazia provas presenciais em Belém, mas que, ao final do curso, as avaliações passaram a ocorrer na casa de Joelcio, sendo ele o responsável por remetê-las à instituição. Relatou que, nas visitas à casa de Joelcio, ele mostrava as notas no aplicativo, o que fazia com que acreditassem que os lançamentos estavam corretos. Disse que chegou a acessar a plataforma uma ou duas vezes, mas que, ao final do curso, sua colega foi ao polo e constatou que constavam apenas dois meses de matrícula, inexistindo qualquer outro registro acadêmico. Informou que nunca recebeu notificação de inadimplência, pois pagava adiantado para obter desconto. Relatou que foi levada a acreditar que Joelcio repassava os valores à faculdade, mas posteriormente descobriu que o curso havia sido encerrado na plataforma. Mencionou que não compareceu à sede da instituição em Belém por abalo emocional, tendo sua colega ido até lá e recebido a informação de que Joelcio não era reconhecido como coordenador. Disse que viu a professora Ingrid poucas vezes, sendo sempre bem tratada por ela, e que somente mencionava seu nome por ela residir com Joelcio, sem que, do seu ponto de vista, tivesse envolvimento com a situação. Estimou que seu prejuízo financeiro ultrapassou R$ 10.000,00, valor referente às parcelas pagas ao longo do curso, investimento que tinha como finalidade sua efetivação no cargo de professora contratada. Ressaltou que, além da perda financeira, sofreu abalo psicológico, ficando paralisada por um tempo devido ao medo de ser novamente enganada por outra instituição. Destacou que, no início, Joelcio parecia confiável, tendo inclusive levado os alunos ao polo em Belém, onde apresentou supostos representantes da faculdade, os quais os auxiliaram no acesso ao sistema AVA. Narrou que, durante essa visita, fizeram provas em locais diferentes, o que achou estranho, mas não levou em consideração na época. Informou ainda que havia panfletos da faculdade na casa de Joelcio e que ele anunciava a presença de representantes para visitação dos alunos, embora ela não tenha presenciado, por residir no interior. Concluiu afirmando que sempre o reconheceu como representante da faculdade, acreditando em sua boa-fé até a descoberta da fraude. A testemunha Iracema Rodrigues dos Santos afirmou que, em 2015, procurou Joelcio com o intuito de iniciar uma faculdade, tendo sido atendida em um suposto escritório localizado na residência dele, onde realizou sua matrícula. Disse que, desde então, iniciou o curso e recebia atividades por escrito, pois morava na zona rural e só podia vir a Curralinho aos sábados, em razão do trabalho. Informou que nunca conseguiu realizar as atividades online, pois Joelcio alegava constantemente a ausência de computador ou problemas no local, chegando a dizer que os equipamentos haviam sido roubados e que, por isso, o escritório fora desmontado. Acrescentou que Joelcio sempre apresentava desculpas para que as atividades não fossem feitas presencialmente ou online, afirmando que ele próprio realizaria as tarefas e que ela apenas precisava devolver os materiais, entregues via balsa ou lancha. Confirmou que o curso seria de pedagogia e que as aulas deveriam ocorrer de forma online, mas que nunca chegou a assisti-las. Disse que Joelcio mantinha um ambiente com identificação visual da Faculdade Unicesumar, inclusive com livros e folhetos, o que aumentava a credibilidade. Afirmou que não se recorda de ter tratado ou visto Mariana Ingrid envolvida nas questões da faculdade, embora soubesse que ela era companheira de Joelcio. Estimou seu prejuízo em R$ 9.800,00, pagos ao longo de quatro anos, sempre em espécie, sem nunca ter recebido qualquer recibo, sob a justificativa de que os comprovantes estavam no computador da sogra de Joelcio e seriam posteriormente organizados em uma pasta. Explicou que, devido ao trabalho na zona rural, entregava mensalmente os valores a ele, que prometia efetuar os pagamentos nos dias úteis. Relatou que Joelcio conseguiu mantê-la enganada por todo o período do curso. Afirmou que nunca desconfiou da situação, tampouco procurou a faculdade para confirmar a legitimidade da representação, pois confiava plenamente em Joelcio, embora não o conhecesse anteriormente. Contou que tomou conhecimento da matrícula por meio de indicação e realizou o procedimento na casa da sogra de Joelcio, fazendo uma redação, a qual seria encaminhada por ele para a instituição, que avaliaria e retornaria com a nota. Disse que nunca viu Joelcio acessar computador e que ele sempre afirmava que cuidaria de tudo. Somente após quatro anos, decidiu ir pessoalmente à sede da faculdade em Belém, onde descobriu que sua matrícula não constava no sistema. Foi informada de que havia uma turma de Curralinho com alguns alunos devidamente matriculados, mas que muitos, como ela, constavam como desistentes. A funcionária da instituição explicou essa situação. Por fim, reafirmou que confiava em Joelcio, acreditando ser ele representante legítimo da instituição, e que, ao comparecer ao local, constatou que não havia qualquer vínculo oficial dele com a faculdade. O acusado Joelcio Baratinha de Oliveira afirmou que, em 2014, matriculou-se na universidade e, em 2015, foi procurado por representantes da instituição, por ser o único aluno de Curralinho, sendo designado como chefe de turma, função pela qual recebia descontos a cada matrícula realizada. Negou ser representante da universidade, afirmando que apenas exercia a função de chefe de turma e que os valores que recebeu estavam relacionados a declarações emitidas. Disse que reconhece sua responsabilidade quanto a essas declarações, mas negou tê-las vendido. Relatou que Iracema, ao retornar de Belém em busca de emprego, procurou-o junto com seu irmão para realizar matrícula, tendo a universidade fornecido acesso com login e senha, o que permitiu à aluna imprimir sua própria declaração. Explicou que, ao tentar ser contratada pela prefeitura, foi informado que seriam necessários quatro módulos cursados, motivo pelo qual alterou a declaração, constando o quarto módulo em vez do primeiro. Justificou que fez isso para ajudá-la, por ser parente de segundo grau, sem acordo prévio de pagamento. Afirmou que a modificação visava permitir a contratação dela e, posteriormente, de outras alunas, sendo que, após a obtenção das declarações, várias alunas deixaram de frequentar a universidade. Disse que organizava turmas para realização de provas em Belém, mas sempre como chefe de turma, e que, para emitir novas declarações, exigia-se o pagamento de mensalidades em aberto. Relatou que os próprios alunos baixavam as declarações em PDF e as entregavam a ele, que apenas alterava o número do módulo no documento original, mantendo a assinatura digital da universidade. Informou que a maior parte dos alunos era professora contratada e que, para manter o vínculo empregatício, solicitavam tais alterações. Ressaltou que em apenas um ano, 2018, teria pedido dinheiro em troca da emissão da declaração. Explicou que os documentos vinham assinados digitalmente e que ele apenas fazia ajustes nos módulos para viabilizar a continuidade da contratação dos alunos pela prefeitura. Disse que, ao longo do tempo, era procurado reiteradamente por mensagens e ligações, sendo pressionado para alterar documentos, e que, embora alguns valores tenham sido oferecidos, não estipulava quantias fixas. Afirmou que nunca recebeu dinheiro diretamente pelas mensalidades e que os únicos valores recebidos estavam vinculados às declarações alteradas. Sustentou que as vítimas tinham conhecimento das alterações e que utilizavam os documentos com essa finalidade. Reiterou que não possuía autorização da universidade para fazer modificações, que essas eram de sua própria iniciativa, e que apenas mudava o número do módulo no documento original. Admitiu a responsabilidade por essas alterações. Em relação à coacusada Mariana, sua ex-esposa, afirmou que ela era alheia aos fatos, tendo apenas recebido, em uma única ocasião, valores em sua conta bancária a pedido dele, sem saber do conteúdo da transação. Disse que Mariana apenas guardava os valores eventualmente entregues em casa quando ele não estava presente, e que nunca participou das tratativas. Por fim, declarou que agiu acreditando estar ajudando os alunos e reconheceu que se arrepende, tendo tomado tais atitudes sem organização formal ou sistema definido. A acusada Mariana Ingrid Carme desconhecer totalmente a acusação de falsificação de documentos e estelionato, tendo tomado conhecimento apenas após receber intimação da delegacia. Afirmou que, à época dos fatos, era casada com Joelcio, com quem tem três filhos, e que ficou surpresa com a acusação. Disse lembrar-se de que, no depoimento prestado à autoridade policial, negou ter feito provas para terceiros e afirmou nunca ter sido procurada para esse fim. Negou veementemente envolvimento com qualquer tipo de fraude, reiterando que não tinha tempo nem sequer para realizar suas próprias provas. Afirmou que Joelcio era estudante da Universidade do Mar, mas não sabia ao certo o curso que ele cursava, podendo ser pedagogia ou letras. Disse não lembrar se ele exercia qualquer função como representante da faculdade. Quanto ao uso de seu cartão bancário, afirmou que, como moravam juntos e ele administrava as finanças da casa, ele possuía livre acesso ao cartão e realizava pagamentos e saques, pois ela trabalhava 200 horas mensais e não tinha tempo para isso. Relatou que, após tomar ciência da acusação, conversou com Joelcio, que não entrou em detalhes, limitando-se a afirmar que apenas estudava. Acrescentou que, à época, tinham também uma batedeira de açaí. Disse que na casa onde viviam havia apenas livros enviados pela faculdade, pois Joelcio cursava ensino superior na modalidade a distância. Informou que ele trabalhava como professor contratado mesmo sem possuir diploma de nível superior, prática que, segundo ela, era comum em contratações municipais. Afirmou que era a provedora da casa, embora Joelcio também contribuísse. Negou conhecer qualquer das vítimas, Dayane Nunes Nogueira, Odasia Pereira de Moraes, Odila Pereira ou Iracema, e afirmou que nunca teve contato com elas. Disse ainda que Joelcio nunca comentou com ela sobre atuar como representante da faculdade e que jamais teve conhecimento das fraudes que lhe são imputadas. Ressaltou que confiava no então marido e que, por isso, permitia que ele administrasse o cartão. Confirmou que sua rotina consistia em sair de casa às 7h e retornar às 19h, razão pela qual Joelcio permanecia mais tempo em casa. Concluiu reafirmando que não participou dos fatos narrados na denúncia, que desconhecia a atuação de Joelcio como suposto intermediador acadêmico e que ficou profundamente abalada ao ver seu nome envolvido em essas acusações. a) Análise do delito do art. 171, caput, do Código Penal: Mariana Ingrid Carmecita Nunes. Importante mencionar que a doutrina do ônus da prova fixa incumbir àquele que proferiu a afirmação e a quem aproveita o fato alegado o encargo de exibir provas que denotam a veracidade das assertivas que aduziu em juízo. Sobre o ônus da prova no processo penal o professor Renato Brasileiro nos ensina: Transportando-se o conceito de ônus para o âmbito da prova, pode-se dizer que ônus da prova é o encargo que as partes têm de provar, pelos meios legal e moralmente admissíveis, a veracidade das afirmações por elas formuladas ao longo do processo, resultando de sua inação uma situação de desvantagem perante o direito (....) “Ao Ministério Público e o querelante têm o ônus de provar os fatos delituosos além de qualquer dúvida razoável, produzindo no magistrado um juízo de certeza em relação ao fato delituoso imputado ao acusado (...)” (Manual de Processo Penal, 3º edição, 2015, p. 593 e 597). Essa regra procedimental está prevista no art. 156 do Código de Processo Penal o qual declara que a “prova da alegação incumbirá a quem a fizer”. Depreende-se de tais conceitos que, em juízo, não basta simplesmente alegar os fatos. Para que a relação de direito litigiosa fique definitivamente garantida pela regra de direito correspondente, preciso é, antes de tudo, que o juiz se certifique da verdade dos fatos alegados, o que se dá através dos elementos probatórios ínsitos nos autos. Cada assertiva terá que ser demonstrada e, somente depois de reconhecida e aceita judicialmente, pode ser considerada enquanto fato constitutivo do direito. Portanto, o conjunto probatório deve se mostrar apto ao convencimento do julgador e se tal não ocorrer, mesmo diante da mais tênue dúvida, deve-se dar lugar ao decreto absolutório, pois certamente será menos gravoso deixar um crime sem reprimenda do que lançar às agruras do cárcere cidadão inocente. Essa dúvida é traduzida na máxima latina “in dubio pro reo”. Passo à análise do caso concreto. O crime de estelionato, tipificado no artigo 171, caput, do Código Penal, exige, para sua configuração, a presença concomitante de três elementos essenciais: (a) a obtenção de vantagem ilícita, (b) o emprego de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, e (c) o induzimento ou manutenção da vítima em erro. Neste sentido, o teor do referido dispositivo legal: “Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.” A doutrina ressalta que a fraude antecede e possibilita o erro da vítima, sendo este o fundamento da lesão patrimonial. Como bem esclarece Damásio de Jesus: “No estelionato, a fraude visa a permitir que a vítima incida em erro. Por isso, voluntariamente se despoja de seus bens, tendo consciência de que eles estão saindo de seu patrimônio e ingressando na esfera de disponibilidade do autor.” (Damásio de Jesus. Código Penal Anotado, 19ª Edição, Editora Saraiva, p. 571⁄572). No presente caso, a análise crítica dos autos revela que, no tocante a todas as vítimas apontadas, os elementos fáticos não preenchem o tipo penal em sua integralidade, especialmente diante da ausência de indícios mínimos de participação consciente da acusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes na empreitada criminosa descrita na denúncia. Todas as vítimas ouvidas em juízo foram uníssonas em afirmar que trataram exclusivamente com Joelcio Baratinha de Oliveira ao longo de todo o curso, inclusive para realização de matrícula, entrega de valores, obtenção de declarações e resolução de atividades. A vítima Daiane Nunes Nogueira foi categórica ao declarar que jamais tratou diretamente com Mariana Ingrid, mencionando seu nome apenas em razão de ter realizado um ou dois depósitos bancários em sua conta, sempre a pedido de Joelcio. Odaísa Pereira de Moraes, por sua vez, afirmou que, em regra, entregava os valores a Joelcio, e que apenas em situações excepcionais, quando ele não se encontrava, a professora Ingrid os recebia. No entanto, deixou claro que nunca tratou de questões da faculdade com Mariana, que não participava das decisões ou da rotina do curso. Odila Pereira de Moraes foi ainda mais enfática ao esclarecer que só mencionou o nome de Ingrid por ela residir com Joelcio, ressaltando que nunca percebeu envolvimento direto dela com as práticas fraudulentas, tampouco a viu participando da organização do curso. Iracema Rodrigues dos Santos igualmente negou ter tido qualquer contato com Mariana Ingrid no contexto da suposta atividade acadêmica, limitando-se a reconhecer que ela era companheira de Joelcio, sem qualquer atuação aparente na dinâmica do polo ou nos recebimentos. Dessa forma, observa-se que a coacusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes não era identificada pelas vítimas como interlocutora, organizadora ou beneficiária das fraudes praticadas, sendo mencionada apenas de forma lateral, por residir com o acusado ou ter, eventualmente, recebido valores em sua conta, a pedido de Joelcio, sem qualquer evidência de que tivesse ciência da origem ou finalidade dos valores ou de que tivesse participado ativamente da empreitada delitiva. Conforme o princípio in dubio pro reo, deve-se afastar a condenação de Mariana Ingrid Carmecita Nunes, que, até o momento, não tive sua participação suficientemente comprovada. No Direito Penal a culpa é impresumível, devendo ser suficientemente provada para um decreto penal condenatório. Deste modo, inexistem provas contundentes e robustas contra a denunciada Mariana Ingrid Carmecita Nunes, para efeito de uma condenação penal pelo delito previsto no art. 171, caput, do Código Penal. b) Análise do delito do art. 171, caput, do Código Penal: Joelcio Baratinha de Oliveira. A materialidade do crime está comprovada diante dos depoimentos das testemunhas, colhidos durante a audiência de instrução e julgamento, somados ao boletim de ocorrência policial (Id. Num. 74710129 - Pág. 4-5), aos termos de depoimentos (Id. Num. 74710129 - Pág. 6, Num. 74710136 - Pág. 1-2, Num. 74710136 - Pág. 4-7), declarações e atestados (Id. Num. 74710338 - Pág. 5-7, Num. 74710343 - Pág. 2, Num. 74710343 - Pág. 6-8, Num. 74710557 - Pág. 1 e Num. 74710557 - Pág. 3), e boletos de mensalidades (Id. Num. 74710343 - Pág. 3-5 Num. 74710557 - Pág. 2), constantes no inquérito policial. Indiscutível a ocorrência do crime de estelionato em sua forma consumada, uma vez que a consumação deste delito se dá com a obtenção da vantagem ilícita em decorrência do erro provocado na vítima mediante fraude, sendo prescindível o emprego de meio sofisticado ou a resistência da vítima ao repasse dos valores. Nesse sentindo é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “Importante destacar, por oportuno, que a consumação do crime de estelionato se dá com a efetiva obtenção de vantagem ilícita, em detrimento de outrem, através de sua indução ou manutenção em erro, utilização de artifício, ardil ou fraude” (STJ - AREsp: 2215342, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Publicação: Data da Publicação DJ 02/06/2023). Quanto à autoria, os elementos probatórios colhidos nos autos são suficientemente robustos para demonstrar que o acusado foi o responsável pelo deito. A vítima Daiane Nunes Nogueira relatou que tratava exclusivamente com o acusado Joelcio Baratinha de Oliveira desde o momento da matrícula, realizada em um suposto polo instalado próximo à residência dele, e que, ao longo de quatro anos, repassava mensalmente valores em espécie diretamente a Joelcio, acreditando estar regularmente matriculada em curso superior de pedagogia. Afirmou que, apesar de não ter acessado a plataforma institucional, confiava nas informações repassadas pelo acusado e apenas ao final do curso descobriu que constava apenas sua matrícula, sem registro de qualquer atividade. A vítima Odaísa Pereira de Moraes declarou que iniciou o curso no suposto polo do acusado, tendo inclusive sido levada por ele a Belém para realização de provas, o que reforçou a aparência de regularidade. Informou que, após o encerramento do polo, passou a entregar os valores diretamente a Joelcio e que, mediante pagamento adicional, permitia que as atividades fossem realizadas por terceiros. Apesar dessas facilidades, a vítima acreditava estar regularmente vinculada à instituição de ensino e somente tomou conhecimento da fraude ao final do curso, ao ser informada por sua amiga que não havia nenhuma formatura programada. A vítima Odila Pereira de Moraes afirmou que confiava no acusado por indicação de familiares, acreditando que ele representava a instituição de ensino no município. Declarou que repassava os valores mensalmente e que o acusado se apresentava como responsável pela intermediação entre os alunos e a universidade. Disse que chegou a ver notas em aplicativo acessado por Joelcio, o que reforçava a impressão de regularidade. Informou, ainda, que não exigia recibos, confiando nas informações prestadas, e que descobriu a fraude apenas após o encerramento do curso. A vítima Iracema Rodrigues dos Santos relatou que também realizou matrícula diretamente com Joelcio, em sua residência, onde este montara um suposto escritório com livros e folhetos da instituição. Informou que recebia as atividades por via fluvial e que o acusado se responsabilizava por sua resolução e envio. A vítima pagava mensalmente valores ao acusado, sem exigir recibos, e jamais teve acesso à plataforma da faculdade. Acreditava estar cursando pedagogia de forma regular e, somente ao final, foi pessoalmente a Belém, onde descobriu que sequer constava como aluna da instituição. A coacusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes negou qualquer envolvimento nos fatos, alegando que apenas morava com o acusado, seu então marido, e que ele administrava as finanças da casa, inclusive com acesso à sua conta bancária. Declarou que não conhecia as vítimas, não participou de tratativas acadêmicas e não sabia a origem dos valores eventualmente deixados por terceiros em sua residência, tendo alegado desconhecimento das fraudes até ser intimada na fase policial. O próprio acusado Joelcio Baratinha de Oliveira confessou que alterava declarações emitidas pela instituição de ensino, inserindo módulos não cursados pelas alunas, e que recebia valores em razão dessas alterações. Admitiu que, na condição de “chefe de turma”, organizou turmas, intermediou matrículas, distribuiu materiais e conduziu alunas a Belém, o que revela atuação central na simulação de um curso regular. Esclarece-se que as provas colhidas no inquérito foram corroboradas com o depoimento testemunhal em juízo, sendo válida a utilização dessas provas, nos termos do artigo 155 do Código de Processo Penal: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Em alegações finais Id Num. 146453993, a defesa pugnou pela absolvição dos réus por falta de provas. No entanto, essa pretensão não encontra amparo no conjunto probatório dos autos. As provas colhidas em juízo, especialmente os depoimentos das vítimas e documentos constantes do inquérito policial, aliados à confissão parcial do acusado, são suficientes para demonstrar, de forma segura, a materialidade, autoria e dolo na prática do crime de estelionato. A versão apresentada pelo réu, no sentido de que exercia apenas a função de “chefe de turma”, não se sustenta diante da farta comprovação de que ele recebia valores diretamente das vítimas, simulava vínculo institucional e emitia declarações com conteúdo falso, mantendo as vítimas em erro durante todo o período em que acreditaram cursar ensino superior válido. Assim, inexiste dúvida razoável que autorize a absolvição pretendida. Desse modo, a materialidade e autoria delitiva é inconteste. Passo a análise do nexo causal. Está plenamente comprovado nos autos que a conduta do acusado, Joelcio Baratinha de Oliveira, ao apresentar-se como representante da instituição de ensino, induzir as vítimas a acreditarem na regularidade do curso ofertado, simular a existência de polo educacional no município, fornecer declarações ideologicamente falsas e receber valores a título de mensalidades ou serviços acadêmicos, foi diretamente responsável pelos prejuízos suportados pelas vítimas, foram as únicas causas determinantes para a consumação do crime. Desse modo, diante da produção probatória em juízo, vê-se a conduta perpetrada amolda-se ao tipo previsto no art. 171, caput, do Código Penal por 04 (quatro) vezes. c) Antijuridicidade e Culpabilidade. A ilicitude ou antijuridicidade, é a contrariedade de uma conduta com o direito, causando efetiva lesão a um bem jurídico protegido. Praticado um fato típico, presume-se a antijuricidade, a qual pode ser excluída desde que presentes causas excludentes de ilicitude, como a legítima defesa, estado de necessidade e o exercício regular de um direito. No caso presente, a defesa não apresentou teses justificantes. A culpabilidade, trata-se de um juízo de reprovação social, incidente sobre o fato e seu autor, devendo o agente ser imputável, atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como ter a possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo, seguindo as regras impostas pelo Direito (teoria normativa pura, proveniente do finalismo). Também não há ocorrências de causas de exclusão da imputabilidade do réu. d) Análise do delito do art. 298 do Código Penal: Joelcio Baratinha de Oliveira. O ordenamento jurídico penal brasileiro adota o princípio da consunção como critério de interpretação sistemática para evitar a punição múltipla por condutas que integram, preparam, executam ou exaurem outra infração penal mais ampla e grave. Trata-se de princípio implícito, reconhecido pela doutrina e jurisprudência, fundado na proibição do bis in idem e na necessidade de intervenção mínima do Direito Penal. Sobre o tema, Cleber Masson explica: “de acordo com o princípio da consunção, ou da absorção, o fato mais amplo e grave consome, absorve os demais fatos menos amplos e graves, os quais atuam como meio normal da preparação ou execução daquele, ou ainda com seu mero exaurimento. Razão pela qual, aplica-se somente a lei que o tipifica: lex consumens legi consumptae. A lei consuntiva prefere a lei consumada”. No mesmo sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consagrou, por meio da Súmula 17, que: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido” (Súmula 17, Terceira Seção, julgado em 20/11/1990, DJ 28/11/1990, p. 13963). No presente caso, as condutas atribuídas ao acusado Joelcio Baratinha de Oliveira, consistentes na suposta falsificação de declarações de vínculo acadêmico, teriam como finalidade viabilizar a obtenção de vantagens patrimoniais indevidas, mediante indução das vítimas em erro quanto à sua regularidade junto à instituição de ensino. Verifica-se que os documentos supostamente falsificados foram utilizados como meio necessário para a prática do crime de estelionato, não se revelando autônomos ou com potencialidade lesiva distinta. A falsidade, nesse contexto, não se projeta para além da obtenção da vantagem econômica que caracteriza o estelionato, razão pela qual, à luz do princípio da consunção, reconhecido tanto pela doutrina quanto pela Súmula 17 do STJ, deve ser absorvida pelo delito mais grave. Assim, revela-se inviável a responsabilização autônoma pelo crime de falsificação de documento, porquanto este se exaure no crime de estelionato, não subsistindo lesividade penal independente. II - Dispositivo Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal: a) Para absolver a acusada Mariana Ingrid Carmecita Nunes, da imputação do crime previsto no art. 171, caput, do Código Penal, com fundamento no art. 386, inciso VII, do CPP, por ausência de provas de participação consciente e voluntária nos fatos. b) Para absolver o denunciado Joelcio Baratinha de Oliveira quanto ao crime de falsificação de documento público (art. 298 do Código Penal), com base no art. 386, III, do CPP, em razão da consunção (Súmula 17 do STJ), c) Para condenar o acusado Joelcio Baratinha de Oliveira como incurso no art. 171, caput, do Código Penal por 04 vezes. Passo à dosimetria da pena, nos termos do art. 68 do Código Penal e Súmula 23 TJPA (a aplicação dos vetores do art. 59 do CPB obedece a critérios quantitativos e qualitativos, de modo que, existindo a aferição negativa de qualquer deles, fundamenta-se a elevação da pena base acima do mínimo legal). Considerando que os delitos imputados apresentam circunstâncias fáticas e jurídicas semelhantes, procedo à análise e aplicação da pena de forma conjunta. Dosimetria da pena. 1ª Fase. Inicialmente, analiso as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. 1. A culpabilidade refere-se ao grau de censurabilidade do crime (intensa, média ou reduzida), ou seja, a reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. De acordo com o enunciado contido na Súmula nº 19 deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará: “Na dosimetria basilar, a culpabilidade do agente diz respeito à maior ou menor reprovabilidade da conduta, não se confundindo com a culpabilidade como elemento do crime, que é composta pela imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude do fato e exigibilidade de conduta diversa”. Inexistem elementos a valorar. 2. Os antecedentes criminais tratam da vida pregressa e do envolvimento do agente com fatos criminosos pretéritos. Não existem elementos a serem valorados. 3. Quanto à conduta social dos acusados, que se refere ao comportamento do réu perante a sociedade (no trabalho, na família, no bairro onde reside), não existem elementos a serem valorados. 4. A personalidade do agente, não existem elementos a serem valorados. 5. Os motivos do crime referem-se às influências internas e externas que levaram o agente a cometer no delito, sendo essas inerentes ao tipo penal. 6. As circunstâncias do crime analisam o seu “modus operandi”, ou seja, são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo (como, por exemplo, em local ermo, quando do repouso noturno, com extrema violência etc. Há elementos desfavoráveis a valorar, pois o réu operava no contexto educacional, ambiente que exige elevado grau de probidade e responsabilidade social, especialmente diante da confiança naturalmente depositada por alunos em busca de formação superior. Além disso, valeu-se de documentos falsificados para conferir aparência de legalidade à sua atuação, agravando o dolo e dificultando a percepção do engodo pelas vítimas. Trata-se, portanto, de duas circunstâncias distintas e autônomas que aumentam a reprovabilidade da conduta: (i) o local e contexto da infração (educação formal) e (ii) o uso de documentação fraudulenta como instrumento de execução, o que autoriza, o acréscimo de 1/4 (um quarto) do intervalo entre a pena mínima e máxima cominada para o tipo penal. 7. As consequências do crime, que se referem à extensão dos danos ocasionados pelo delito, verificam-se que o tiro disparado pelo réu causou à vítima internamento hospitalar de 15 dias e lesões permanentes, contexto em que valoro negativamente. não há elementos para avaliar. 8. O comportamento da vítima não contribuiu para o cometimento do crime. Acerca do tema, digno de transcrição o teor da Súmula nº 18 deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará: “O comportamento da vítima é circunstância judicial que nunca será avaliada desfavoravelmente, ou seja, ou será positiva, quando a vítima contribuiu para a prática do delito, ou será neutra, quando não há contribuição”. Com base nas circunstâncias judiciais acima, fixo o acusado Joelcio Baratinha de Oliveira a PENA-BASE de pena-base em 02 (dois) anos de reclusão e 57 (cinquenta e sete) dias-multa. 2ª Fase. Existente a circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do Código Penal e Súmula 545 do STJ), uma vez que o réu admitiu parcialmente os fatos, confessando os delitos. Portanto, reconheço essa atenuante e aplico a fração de 1/6 de redução da pena, desde que não ultrapasse o mínimo legal. Sem circunstâncias agravantes. Fixo a PENA PROVISÓRIA em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 47 (quarenta e sete) dias-multa. 3ª Fase. Não há causa de diminuição de pena aplicáveis. Reconheço a continuidade delitiva (art. 71, caput, do Código Penal), uma vez que o acusado praticou, mediante mais de uma ação, o mesmo crime de estelionato contra vítimas diferentes, em condições semelhantes de tempo, lugar e modo de execução. Diante do número de infrações (quatro), da identidade do modus operandi e da reiteração das condutas em contexto educacional, fixo o aumento da pena em 1/4 (um quarto), nos termos da jurisprudência consolidada sobre o tema: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. CRIME CONTINUADO. QUANTIDADE DE CONDUTAS . IMPRECISÃO. FRAÇÃO MÁXIMA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7 DO STJ . AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "O crime continuado é benefício penal, modalidade de concurso de crimes, que, por ficção legal, consagra unidade incindível entre os crimes parcelares que o formam, para fins específicos de aplicação da pena. Para a sua incidência, a norma extraída do art . 71, caput, do Código Penal exige, concomitantemente, três requisitos objetivos:I) pluralidade de condutas; II) pluralidade de crime da mesma espécie; III) condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes (conexão temporal, espacial, modal e ocasional); IV) e, por fim, adotando a teoria objetivo-subjetiva ou mista, a doutrina e jurisprudência inferiram implicitamente da norma um requisito da unidade de desígnios na prática dos crimes em continuidade delitiva" ( AgRg no HC n. 730.671/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 23/8/2022, DJe de 30/8/2022.2 . O aumento decorrente da continuidade delitiva será determinado pelo número de infrações penais cometidas dentro do intervalo legal de 1/6 a 2/3, sendo aplicável a fração de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações.Nesse sentido: AgRg no HC n. 585.416/MG, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 14/11/2022, DJe de 18/11/2022) . 3. Na hipótese, conforme registrado pelo acórdão, "diante das provas colhidas nos autos não foi possível quantificar, com precisão, quantas vezes a ré incorreu no tipo penal, não podendo a adoção da fração de aumento basear-se em critérios duvidosos". 4. Assim, para alterar a conclusão aposta pelo Tribunal de origem e restabelecer a fração máxima de aumento pela continuidade delitiva, como requer a parte recorrente, demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório delineado nos autos, providência incabível em recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ . 5. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no REsp: 2069071 MG 2023/0141648-4, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 22/08/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/08/2023) Fixo a PENA DEFINITIVA 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão e 58 (cinquenta e oito) dias-multa, à razão mínima legal de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Detração Penal (art. 387, §2º, do CPP). Deixo de realizar a detração penal, pois não haverá alteração no regime inicial de cumprimento de pena, cabendo ao Juízo da Execução Penal competente a análise de futuros eventuais benefícios. Regime Inicial. O acusado Joelcio Baratinha de Oliveira deverá cumprir sua pena, inicialmente, em regime aberto na forma do art. 33, § 2º, “c” do Código Penal. Substituição por pena restritiva de direito e suspensão condicional da pena. Nos termos do artigo 44 do CP, as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: a) aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos; b) crime não cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; c) qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; d) réu não reincidente em crime doloso; e) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado; f) os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Verifica-se que o acusado não preenche os requisitos para a concessão do benefício, uma vez que houve valoração negativa das circunstâncias do crime, indicando a insuficiência da medida. Nos termos do artigo 77 do CP, a execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que: a) o condenado não seja reincidente em crime doloso; b) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício; c) Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código. Nesse contexto, a suspensão condicional da pena também se mostra incabível, pois o réu não preenche os requisitos do artigo 77 do Código Penal. Houve valoração negativa das circunstâncias do crime, situação que não recomenda a aplicação da medida, tornando inviável a concessão do sursis penal. Diante disso, a pena privativa de liberdade deve ser cumprida nos termos fixados na sentença, sem possibilidade de substituição ou suspensão. Direito de Apelar em Liberdade. O acusado responde ao processo em liberdade, não havendo, neste momento processual, motivos ensejadores de prisão preventiva (arts. 312 e 313 do CPP). Adverte-se que o denunciado deve manter endereço atualizado e comunicar qualquer alteração de endereço e, em caso de trânsito em julgado da sentença condenatória, deve se apresentar em juízo para início da execução penal, sob pena, se for o caso, de regressão cautelar de regime e expedição de mandado de prisão. Indenização à vítima. Deixo de fixar indenização mínima para as vítimas, nos termos do art. 387, IV, do CPP, por não haver pedido do Ministério Público nesse sentido, nem observância do contraditório. Custas. Com base nos arts. 804 e 805 do CPP, deixo de condenar o sentenciadao nas custas processuais, em virtude de ser pobre (Id. Num. 89215650 - Pág. 21) e se enquadrar na isenção legal disposta nos arts. 34 e 35 da Lei de Custas do Estado do Pará (lei estadual nº 8.328/15). Disposições comuns: Determino à Secretaria Judicial que, independentemente do trânsito em julgado desta decisão: 1. Intime-se o Ministério Público. 2. Intime-se o defensor do acusado, através de publicação oficial; 3. Intime-se o réu da sentença, conferindo-lhe o direito de apelar no prazo legal. 4. Comunique-se as vítimas. Certificado o trânsito em julgado: a) lance-se o nome do réu no rol dos culpados; b) expeça-se a Guia de Recolhimento Definitiva, conforme Resolução do Conselho Nacional de Justiça; c) comunique-se à Justiça Eleitoral (art. 15, III, CF); e) proceda-se o cálculo da pena de multa e intime-se o réu para efetuar o pagamento, em 10 (dez) dias, nos termos do art. 50 do CP, sob pena de, não o fazendo, o débito ser inscrito em Dívida ativa; d) comunicações e anotações de estilo, inclusive para fins estatísticos; e) dê-se baixa nos apensos (se houver); Publique. Registre. Intime. Curralinho/PA, datado e assinado digitalmente. André Souza dos Anjos Juiz Titular da Vara Única da Comarca de Curralinho
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