Processo nº 0812216-17.2024.8.14.0401
ID: 322282479
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara de Crimes Contra o Consumidor e a Ordem Tributária
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0812216-17.2024.8.14.0401
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VICTOR AUGUSTO DE OLIVEIRA MEIRA
OAB/PA XXXXXX
Desbloquear
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ FÓRUM CRIMINAL DE BELÉM VARA DE CRIMES CONTRA O CONSUMIDOR E A ORDEM TRIBUTÁRIA Endereço: Largo São João, n. 310, 2º Andar, Salas 211/213, Bairr…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ FÓRUM CRIMINAL DE BELÉM VARA DE CRIMES CONTRA O CONSUMIDOR E A ORDEM TRIBUTÁRIA Endereço: Largo São João, n. 310, 2º Andar, Salas 211/213, Bairro Cidade Velha, Belém-PA, CEP 66020-280 Contatos: (91) 3205-2274 / 98251-2033 (WhatsApp) Órgão Julgador: Vara de Crimes contra o Consumidor e a Ordem Tributária Classe processual: AÇÃO PENAL Processo n. 0812216-17.2024.8.14.0401 Polo ativo: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARÁ Polo passivo: JOSE BENEDITO SOUZA JUNIOR e outros SENTENÇA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, no exercício de suas atribuições legais, ofereceu denúncia, distribuída sob o nº 0812216-17.2024.8.14.0401, contra JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR E NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO, devidamente qualificada nos autos, por crime tipificado no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8137/90. A acusação relata que, com base na prova material do auto de infração de nº 09202351000043-3, os denunciados, então coadministradores e sócios da empresa contribuinte FLEISPAN DISTRIBUIDORA LTDA, no período entre maio e dezembro de 2018, se utilizaram de crédito indevido ou inexistente, sem demonstrar a respectiva origem, com o fim de reduzir tributo. Em 20/06/2024, foi recebida a denúncia, ID 118168306. Em 02/08/2024, foram certificadas as citações de JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR E NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO, porém permaneceram inertes e não responderam, no prazo legal, os termos da acusação (ID 120841020, ID 120588113 e ID 122095433). Em 02/08/2024, diante da revelia, os autos foram encaminhados ao Defensor Público (ID 123030779). Em 22/08/2024, decisão encaminhou o processo para instrução probatória (ID 123796868). Em 21/11/2024, NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO habilitou advogado (ID 131701000). Em 22/11/2024, foram ouvidas as testemunhas da acusação, bem como, foi deferido o pedido da Defesa de Nelson Monteiro Castro Neto para complementar à defesa anterior e apresentar o rol de suas testemunhas (ID 131741512). Em 04/12/2024, NELSON MONTEIRO CASTRO NETO, assim como apontado na defesa técnica, apontou denúncia genérica, vez que não foi demonstrado dolo ou considerou que o fato foi fruto de um erro contábil. Negou, ainda, a autoria, por exercer apenas a função logística e de compras e por não fazer parte da sociedade quando ocorreu a fiscalização. Pugnou, por fim, pela concessão de ANPP (ID 133032093). Em 08/02/2025, decisão refutou as teses para absolver NELSON MONTEIRO CASTRO NETO, e deu continuidade da produção de prova em audiência (ID 136506934). Em 21/05/2025, houve a finalização da instrução probatória, oportunidade em que foram ouvidas as testemunhas de defesa MARCELO FERREIRA PEREIRA e MAURO SÉRGIO FERREIRA DO CARMO, bem como, foram interrogados os acusados (ID 143571171). Em 26/05/2025, foram apresentadas alegações finais pelo Ministério Público, requerendo a procedência da ação penal, condenando-se JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR e NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO, às sanções cominadas no preceito secundário do tipo penal descrito no art. 1.º, inciso I, da Lei 8.137/1990, e com o art. 71 e 91, I, do CPB (ID 144810181). Em 02/06/2024, a defesa de NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO, em alegações finais, requereu a absolvição por inexistência de prova de dolo e de autoria, nos termos do art. 386, I e III, do Código de Processo Penal. Em 16/06/2025, JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR, por meio do Defensor Público, alegou a inépcia da denúncia por falta de individuação; imputação pela condição de sócio; ausência de autoria, materialidade e de dolo. Era o que havia a relatar. Decido: 1. Com supedâneo nas provas materiais contidas no auto de infração de nº 092023510000043-3, foram apuradas na empresa contribuinte FLEISPAN DISTRIBUIDORA LTDA, reduções do imposto de ICMS, nos meses fiscais de maio a dezembro de 2018, que gerou um prejuízo ao Fisco Estadual no valor de 83.457,75 UPF/PA, conforme lançamento efetivado em 26/12/2023 (ID 119079223). A ação fraudatória consistiu na declaração indevida de outros créditos em DIEFs, referente à compensação de créditos presumidos, sem, no entanto, a demonstração da origem da respectiva dedução, com o objetivo de recolher a menor o ICMS, de acordo com o descrito abaixo: “O contribuinte utilizou crédito indevido ou inexistente. O contribuinte apropriou-se de crédito indevido e inexistente na apuração mensal de suas Diefs, sem origem justificada ou comprovada, de acordo com que foi verificado em suas notas fiscais de entradas, com o objetivo de recolher a menor o ICMS normal, código de receita 1131, alcançado por meio de levantamento revisional fiscal de suas declarações mensais, conforme demonstrado em planilhas anexas, parte integrante deste AINF”. O delito foi constatado durante auditoria de rotina ou pontual, no ano de 2023, pelo Auditor JORGE TADEU FERREIRA DE LIMA, após serem analisadas as DIEfs declaradas pelo próprio contribuinte e as notas fiscais (ID 119079220 a ID 119079221). A empresa contribuinte possuía como administradores JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR e NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO, de acordo com previsão em ato constitutivo no ID 117732155 – pág.10, datado de 30/06/2015, operando produtos de panificação e confeitaria. Nos autos foram apresentadas as cópias integrais do procedimento de apuração tributário, tendo como peças constitutivas do auto de infração de nº 092023510000043-3, as planilhas com demonstrações da apuração da diferença do ICMS a recolher, relatório SIAT dos recolhimentos efetuados e cópia das DIEFs. Nos autos não advieram as documentações apresentadas pelo contribuinte, cuja intimação foi realizada pelo Sistema Eletrônico da SEFA, chamado DEC, assim como, não foram apresentadas as notas fiscais relacionadas no relatório do Auditor Fiscal. Nas Diefs constam os registros de outros créditos e créditos pelo recolhimento do ICMS especial, que o Auditor Fiscal JORGE TADEU FERREIRA DE LIMA, em juízo, por sua vez, arrolado como testemunha pela acusação, esclareceu sobre a respectiva autuação fiscal, confirmando que a empresa contribuinte se utilizou desses créditos sem comprovar, por meio de notas fiscais, a origem desses créditos. Vejamos: Às perguntas do Ministério Público: “O senhor foi chamado aqui para falar tecnicamente sobre um alto de infração que o senhor lavou contra o contribuinte chamado Flespan Distribuidora Limitada. O auto de infração é de 2023 e é de número 00920235100000043-3. Nós tivemos a informação de que o senhor já está aposentado. Eu lhe pergunto, estando aposentado, o senhor tem condições de depor sobre este auto de infração? -Doutora, muito embora seja coisa do passado, mas eu acredito que sim. Tá ótimo, eu vou, então, lhe fazer algumas perguntas a respeito, perguntas técnicas sobre a sua auditoria, certo? - Certo. Na época da auditoria, o senhor conheceu o senhor José Benedito Souza Júnior e o senhor Nelson Monteiro de Castro Neto? - Não, senhora. O senhor se lembra como notificou esse contribuinte? Se foi por correio, pessoal, edital, DEC? - Eu acho que foi por DEC. Certo. Ou edital, eu não tenho certeza. Certo. Então, o senhor pode explicar no que consistiu a infração? Eu vou ler o álbum de infração. O contribuinte utilizou crédito indevido ou inexistente apropriou de crédito indevido e inexistente na apura mensal de suas DIEFs sem origem justificada ou comprovada de acordo com o que foi verificado em suas notas fiscais de entrada com o objetivo de recolher a menor o ICMS normal, código de receita 1131, alcançado por meio de levantamento revisional fiscal de suas declarações mensais, conforme demonstrado em planilhas anexas parte integrante deste AINF. Então pode explicar que obrigações acessórias o senhor examinou para perceber que havia sido lançados os créditos e que eles não tinham origem? -Foram examinadas as declarações que o pai me salva E pelos lançamentos e pelos dados do sistema das notas fiscais de entrada e fronteira, e as que nós conseguimos alcançar, verificamos que não procedem os créditos. Os créditos foram lançados indevidamente, sem procedência legal. Por isso eles foram estornados e foram cobrados. Quando o contribuinte ele tem muito crédito, ele também declara dever menos ICMS? Ou seja, esses créditos servem para diminuir O ICMS devedor declarados em Diefs? - Quando é o caso, sim. Mas no caso específico dele, não. Não havia saldo de crédito que justificasse. Não, eu sei, mas eu digo quando o contribuinte consigna créditos, ele tem menos débito de ICMS? - O ICMS, doutora, é o conta corrente. Então, é o encontro do débito com crédito, que pode dar saldo de devido ou positivo. No caso dele, específico, foi feito mês a mês, verificado que os créditos eram procedentes, não tinham origem. Certo, mas eu só lhe pergunto o seguinte o fato desses créditos terem sido lançados indevidamente fizeram com que o ICMS declarado a recolher, fosse declarado a menor pelo contribuinte, daí o senhor lançou a diferença? - Exatamente. É exatamente o que diz o auto. Certo, então, o senhor lançou o ICMS na diferença referente àquilo que não havia crédito correspondente? Na prática, sim, doutora. Mas o auto, se a senhora verificar, os autos estão as planilhas todas que apuraram o imposto e que mostraram essa omissão de recolhimento. Certo. Além da omissão de recolhimento, conforme o senhor falou, estava consignado nas GFs créditos que depois o senhor verificou não terem origem. - Perfeitamente. E que influenciaram no recolhimento do imposto. Certo. Como é que se comprova a origem de crédito? Quais os documentos necessários para que esses créditos existissem? -Os documentos, dependendo do tipo de crédito, normalmente são as notas fiscais de entrada. no procedimento de apuração do imposto, o contribuinte registra as notas que dão crédito, assim com, as notas que dão débito. Então não havendo essas notas, mas simplesmente o lançamento do crédito ou como outros créditos ou antecipação de crédito inexistente, a gente procura verificar tudo isso durante a auditoria, e quando isso ocorre, aí nós nos cobramos o crédito, ou seja, estornamos e cobramos. Isso se ele não tiver crédito saldo do credor. Se não houver saldo credor a compensar, aí se cobra a diferença que provavelmente ele deixou de recolher. Certo. E nesse caso, o contribuinte não possuía a RTD e desse direito a crédito presumido também? - Eu diria, doutor, é o seguinte. A senhora quer verificar aí que é uma relação que foi cobrada mensalmente. Então, foi feito a apuração mensalmente. Pode ter ocorrido, conforme os documentos que devem estar no processo, que alguns meses eram créditos que não tinham procedência, apenas lançados. Outros eram créditos de antecipação. Então, como eu estou lhe dizendo, a natureza desse crédito, ela varia. Então, cada mês que foi feita a apuração, se identificou uma situação. As planilhas, elas demonstram isso. Certo. Então, esses meses que o senhor lançou aqui, de maio a dezembro de 2018, foram os meses cujos créditos lançados em DIEFs não possuíam comprovação de origem? – Perfeito. Com relação à Defesa, respondeu ao advogado do réu NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO: “O senhor se recorda o perigo da fiscalização que deu origem a esse auto de infração? - Doutor, deve estar nos autos. Eu, de cabeça, não recordo não. O senhor se recorda se houve algum pedido de prorrogação? Ou então, quanto tempo durou essa fiscalização? -No momento eu não recordo, porque eu não estou com os autos, mas aí nos autos está todo o processo, dá para verificar. Certo, o senhor não se recorda muito bem do fato em si, só sabe que tem um auto de infração, correto? O que tiver no auto, o senhor o senhor valida, é isso? - Não, eu estou dizendo ao senhor que o processo dos autos é completo. Neles, eu encontro um questionamento. Eu aqui, como não estou com ele, não posso responder. E também não tenho memória para isso. Dada a palavra ao Defensor Público, representando o réu José Benedito, assim respondeu: “Senhor Jorge, doutor, pelo que eu entendi, nós temos, então, nessa fiscalização, duas situações. Uma que se refere ao lançamento de crédito, na verdade, mas são dois casos, seria crédito efetivo e o outro seria antecipação do crédito. O senhor já explicou que em relação a um desses casos, precisaria encontrar, nos dois casos, o senhor precisaria encontrar uma origem desse crédito para poder considera-lo válido, uma vez ele declarado pelo contribuinte. No primeiro caso, que seria o crédito, o senhor precisaria ter encontrado uma nota registrada que confirmasse esse crédito, é isso? - Bom, quando eu falei, eu dei dois exemplos. Nesse exemplo que o senhor está mencionando agora, no primeiro caso, sim, seria que tenha uma nota que justificasse a entrada desse crédito, o lançamento desse crédito. Certo. E no segundo caso, que seria uma antecipação de crédito, qual o documento que o senhor precisaria ter encontrado? - No caso da antecipação, eu não estou afirmando que foi o caso da antecipação, porque eu não minuciei os autos, mas como exemplo, a antecipação, ela ocorre quando o contribuinte lança no Conta Corrente como se ele tivesse antecipado um imposto de fronteira, que é um imposto que é cobrado antecipado na entrada do Estado. Depois, posteriormente, quando for o caso, ele descredita. Isso nós chamamos, na nossa linguagem fiscal, como sendo antecipação especial do ICMS, no código 1173. Esse código impõe ao contribuinte que quando ele compra mercadoria que estão relacionadas, sujeito à substituição, ele tem que fazer antecipação do imposto correspondente ao do Estado. Então, esse código 1173 recolhe antecipado e, posteriormente, ele se credita do imposto. E na auditoria, nós fazemos essa conferência. Se o que ele recolheu exatamente o que ele deveria ter recolhido ou se ele recolheu ou menor. Entendi. Mas nesse caso concreto, pelo que eu entendi, então nesse caso concreto o senhor não consegue dizer, porque não está com os autos para examinar profundamente, o senhor não consegue dizer se nesse caso específico dessa auditoria aconteceram as duas situações ou só uma delas, o senhor não sabe precisar disso. - Pelo fato de ser vários meses que foram cobrados, é possível que tenham ocorrido fatos diferentes, que motivaram a cobrança da diferença de imposto. Então eu não tenho como dizer na hora. Eu teria que fazer a procuração de novo, mas nas planilhas que estão nos autos que eu anexei isso está especificado.” Diante desse cenário, as reduções indevidas, segundo acusação, configuraram crime tributário do art. 1º, incisos I, II e IV, da Lei nº 8.137/90, c/c art. 71, do Código Penal, pelo uso, sem lastro legal, de crédito fiscal em DIEFs, durante a gestão administrativa e financeira do contribuinte FLEISPAN DISTRIBUIDORA LTDA. 2. O crime tributário, inserido na categoria dos delitos societários, configura-se a partir de conduta dolosa daquele que, por força de disposição legal ou contratual, possui o dever de cumprir obrigações tributárias decorrentes da prática de operações geradoras de ICMS, mas que, de forma deliberada, age em desacordo com a norma, omitindo-se ou agindo com o fim específico de suprimir ou reduzir o imposto devido. A constituição do crédito tributário é viabilizada por meio dos registros e declarações prestados à Secretaria da Fazenda (SEFA), os quais comunicam ao Fisco a movimentação de mercadorias e serviços, ainda que não incidam diretamente no fato gerador do imposto. A omissão desses deveres enseja a supressão total ou parcial do ICMS, configurando fato típico penal, cuja materialidade é evidenciada no procedimento administrativo fiscal e cujo dolo se extrai da conduta consciente e voluntária do agente, que visa frustrar a arrecadação tributária. À luz da Teoria do Domínio do Fato, não apenas o executor direto da infração, mas também aquele que detém o controle da atividade – com poder de decisão e comando – responde pelo delito, especialmente se tinha condições de evitar ou impedir a prática criminosa. O Direito Penal Tributário, assim, incide sobre a fraude praticada no curso do cumprimento de obrigações fiscais, responsabilizando quem exerce a direção efetiva da pessoa jurídica, comanda as suas atividades e possui ingerência sobre a geração dos fatos tributáveis. A responsabilização penal, nesse contexto, recai sobre os indivíduos com poderes legais para gerir, administrar ou representar a empresa, conforme previsão no art. 11 da Lei nº 8.137/90, o que inclui sócios, administradores, proprietários e, em certos casos, contadores – desde que estes exerçam, de forma efetiva, a escrituração contábil, financeira e administrativa da sociedade. É justamente do exercício de tais funções que emerge o dever legal de observar as normas fiscais e zelar pelo correto cumprimento das obrigações tributárias. Tal dever compreende atos como a escrituração regular, a entrega de declarações mensais, a manutenção de livros fiscais e o recolhimento dos tributos devidos, em nome próprio ou como substituto tributário, conforme estabelece o artigo 113, § 2º, do CTN. Aquele que, em vez disso, excede os limites de sua função, utilizando-se da estrutura da pessoa jurídica para obter vantagem ilícita em detrimento do Estado, responde pessoalmente pelos atos ilegais que praticar sob o manto da empresa. No entanto, não se presume a responsabilidade pelo simples exercício de cargo de direção: exige-se a demonstração concreta de que o agente participou da gestão da empresa de forma ativa, com poder de comando e decisão, inclusive sobre os procedimentos fiscais adotados, sendo responsável por permitir ou não a continuidade de práticas fraudulentas no âmbito da organização. Nesse sentido, a denúncia penal, portanto, se sustenta na materialidade comprovada pelo auto de infração lavrado pelo Fisco e na autoria evidenciada pelos documentos de atribuição de responsabilidade administrativa, constantes nos registros da empresa. Sendo assim, não se faz presente questões preliminares, razão pela qual, passa-se a questão meritória. 3. A Lei nº 8.137/90 tipifica como crime contra a ordem tributária a conduta de suprimir ou reduzir tributo, contribuição social ou qualquer acessório, com pena de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, além de multa. Dentre as formas previstas para a caracterização desse crime, destacam-se: a omissão de informação ou a prestação de declaração falsa à autoridade fazendária (I); que é uma hipótese de falsidade ideológica em que o agente, de forma deliberada, oculta o fato gerador, deixa de cumprir obrigações acessórias ou presta informações errôneas capazes de induzir o Fisco a erro no momento do lançamento. No caso concreto, os denunciados teriam se utilizado de créditos fiscais inexistentes, sob o argumento de que, em consulta ao Sistema de Informações da Administração Tributária (SIAT), não teriam sido localizadas notas fiscais que comprovassem a origem dos créditos informados nas Declarações de Informações Econômico-Fiscais (DIEFs). Segundo a acusação, tais créditos teriam sido indevidamente lançados para reduzir o montante de ICMS a recolher, o que configuraria, portanto, a conduta prevista no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90. A Defesa, em contraposição, apontou que se tratou de questão contábil, que era exercida por escritório contratado e que os denunciados não administravam o financeiro da empresa. Nessa direção foram os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência, nos termos abaixo. A testemunha MARCELO FERREIRA PEREIRA respondeu ao advogado do réu NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO: O senhor trabalhou nessa empresa Fleispan Distribuidora LTDA no ano de 2018 mais precisamente? - Trabalhei sim. Qual a sua função lá? O que o senhor fazia na empresa? - Eu era supervisor de vendas. O senhor trabalhava no setor comercial da empresa então? -Isso no setor comercial. O senhor conhece o senhor Nelson Monteiro de Castro Neto? - Conheço. Nessa ação, o Ministério Público fez algumas acusações, fez uma denúncia contra os sócios dessa empresa. O senhor Nelson, o senhor José Benedito, foi uma questão fiscal. Então a gente precisa esclarecer o que eles faziam na empresa. O senhor conhece o Nelson, o senhor já disse. E o senhor conhece o senhor José Benedito, que está aqui presente também? - Conheço também. O senhor sabe esclarecer o que eles faziam a essa época na empresa? Primeiramente o Nelson, mais precisamente. - Olha, o Nelson, eu sempre tratava com ele a questão de logística, cargas, entregas de mercadoria, e ele era tipo faturista, né. tratava ele sempre com essa parte, que era dividido em Setores lá, né. Estava sempre com logística e emissão de pedido. Certo. O senhor sabe se na empresa tinha um departamento alguém que cuidava da questão financeira contábil da empresa? - Tinha sim, era dividido. O Nelson era a parte mais logística, tinha o José Júnior que era a parte comercial, que a gente tratava muito com ele a questão de alguma ação de mercado, algum preço, alguma coisa extra, ele tratava mais com a gente e tinha outra pessoa, que era o Mauro, que era questão do financeiro. Certo. E havia escritórios de contabilidade terceirizados, o senhor sabe informar? Se tratavam com contador, se tinha essa questão? - Eu acredito que sim, porque a partir do meu desligamento eu tive que tratar com o contador. Eu fui direto com ele, mas eu também não lembro o nome assim de cabeça. Qual foi o ano que o senhor saiu de lá? Qual foi o ano que o senhor saiu de lá? -2021 se não me engano. Eu n recordo bem datas, mas eu saí de lá para ir para outra empres. Eu trabalhei lá por cinco anos. Saí de lá em 2019. Certo. Quando o filho saiu o Nelson ainda trabalhava lá ou ele já tinha saído da empresa? -Não quando eu saí de lá ele não trabalhava lá, mas logo depois a empresa, não sei o motivo, a empresa migrou para outro grupo. Certo. é o senhor tem assim algum conhecimento sobre irregularidade fiscal, a empresa foi, o senhor viu alguma autuação, alguma fiscalização da SEFA, alguma coisa durante o período que o senhor trabalhou nessa empresa? - Não, não, porque o meu tratamento lá era, inclusive até eu saí com todo o meu cliente certo, segurado, não tive problema nenhum com o recebimento, com nada, nunca tive problema nenhum com ele. Tá, só para o último esclarecimento, o senhor emitia nota fiscal, alguma coisa nesse sentido? - Não, eu não... Não, não. Eu só passava os pedidos via aplicativo e a emissão era feita pela empresa. Nos termos das perguntas da Defensoria Pública, representando JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR, respondeu: Senhor Marcelo, então, pelo que eu entendi, existia uma divisão aí de tarefas entre as pessoas que coordenavam os setores da empresa, é isso mesmo? - Isso, isso mesmo. Certo, isso era bem marcado. Então, os funcionários sabiam a quem se dirigir a depender do que deveria ser tratado? - Isso mesmo, isso mesmo. Pelo que o senhor mencionou, o senhor Nelson, o senhor tratava com ele sobre logística e pedidos. -E pedidos, isso mesmo. O senhor José Benedito era parte comercial? -Parte comercial. O que é essa parte comercial? Explique um pouco melhor para a gente: -Para mim, o que eu entendi era questão de ação de mercado, reunião com a equipe. Então, ele fazia essa parte até de contratação, de entrevistar futuros vendedores. Era essa a função do Junior... a parte dele era mais a parte comercial mesmo. De estar com a equipe na rua de vez em quando; de ação de mercado, cobrança da gente também; ele via a questão de cobrança da nossa venda dos nossos números; então ele era o gestor dessa área comercial. E o senhor mencionou que essa parte financeira, você se dirigiu a uma pessoa chamada Mauro, é isso? - Sim, Mauro. Aí o Mauro a gente ia com essa larga, era tudo com ele. O senhor sabe o sobrenome dele, do Mauro? - Não, não sei o sobrenome. Certo Mauro, então essa parte financeira, que o senhor se refere a salário, folha de pagamento? - Folha de pagamento, tudo era com o Mauro. E essa parte o senhor sabe mencionar sobre essa parte de tributos, era o Mauro que tratava com o escritório de contabilidade? -Eu acredito que sim, porque quando a gente precisava de alguma coisa, como a minha cédula C, tinha que conversar com ele para poder emitir a cédula C, para poder fazer a restituição do ponto de renda. Então, com certeza, ele é que tratava essa parte aí. Certo. E me diga uma coisa, o Mauro era dono da empresa também? Ele se apresentava como dono? - Ele se apresentava como dono da empresa. Por fim, respondeu MARCELO FERREIRA PEREIRA sobre as perguntas do Ministério Público: O senhor José Júnior e o senhor Nelson, eles eram donos da empresa? - Sim, eram donos. Nenhum deles era empregado? - Não, nenhum deles era empregado. Eram os sócios os dois. Certo. Então, sendo donos, o senhor sabe quem tomava mais decisões? Ou se eles dividiam as decisões da empresa entre eles? -Eu tinha essa divisão, como eu falei antes, né. Não estou perguntando sobre as atividades normais da empresa. Isso é normal que cada sócio assuma uma atividade, de acordo com suas habilidades. Mas já que eram donos, o senhor sabe se eles dividiam as decisões, ou que um comandava mais que o outro? – Não, não sei informar isso aí. Sempre foi dividido e sempre respeitei a hierarquia, de cada setor. E o Mauro, ele se apresentava como dono também? - Como dono também. A testemunha MAURO SERGIO FERREIRA DO CARMO também respondeu às Defesas: A gente vai esclarecer algumas circunstâncias aqui, alguns fatos. referente à empresa Fleispan Distribuidora LTDA, certo? Há uma denúncia do Ministério Público sobre a ocorrência de um crime fiscal, supostamente ocorrido no ano de 2018. Em 2018, o senhor trabalhou nessa empresa, Fleixpon? - Sim, inicialmente eu trabalhei como consultor na empresa, no início dela, e já no final eu entrei na sociedade. Não me lembro exatamente o mês que eu entrei na sociedade. Teria que pegar o documento. O senhor, então, conhece os réus aqui presentes, o senhor Nelson Monteiro de Castro e o senhor José Júnior? Trabalhou com eles na Fleispan também? -Exato. Certo. O senhor se recorda mais ou menos o que que cada um fazia na empresa a essa época? E também o senhor poderia esclarecer o que o senhor faz para a sua atribuição lá nesse período? - O Nelson era responsável pela logística e pelas compras dos materiais que eram vendidos, pela montagem de cargas essas coisas da logística; e o José Júnior ele era responsável pelo comercial da empresa, pela parte de vendas. Certo. E o senhor? Qual era a sua questão? - Inicialmente, como consultor, onde eu verificava a questão do lançamento nas contas a pagar, nas contas a receber, e verificava tudo que tinha que ser feito de pagamentos, tanto de fornecedores, como também dos outros compromissos que a empresa tinha, inclusive salários. Certo. O senhor trabalhava com a questão, por exemplo, de pagamento, né? Essa parte financeira da empresa, o senhor fazia o contato com o escritório de contabilidade, questão de tributo, essas coisas, o senhor ia com o escritório? - Eu ia para a empresa, eu verificava todos os e-mails que chegavam com as contas para pagar. E a gente publicava um sistema para que fosse verificado o pagamento no dia do vencimento. Entendi. E tinha escritório de contabilidade terceirizado? - Sim tinha escritório terceirizado, que era Isa contabilidade, que prestava esse serviço de apuração de tudo que era fiscal e contato. Tá, eles faziam, eles eram responsáveis por exemplo, por declaração de imposto da empresa, toda essa linha, aspecto tributário e fiscal, por exemplo, lançamento de crédito, recolhimento de imposto, sempre era você já passava? como é que funcionava? - Não, era tudo online. Eu acho. Que a gente pegava as informações, que eram lançadas no nosso sistema, e a partir daí eles geravam as guias. Como é que era? Vocês emitiam uma nota e mandavam para o computador? - Não, porque é tudo eletrônico. Então a gente pegava a guia do pagamento e lançava nas contas a pagar e providenciava o pagamento. Entendi. Mas era o escritório que era o responsável por organizar essas informações e fazer as declarações? -Exatamente. Só vinha a guia para a gente pagar. Tá certo. O senhor se recorda o ano que o Nelson saiu da empresa? -Eu acho que foi em 2019, se eu não estou enganado. Certo. O senhor ainda estava lá, prestando serviço na empresa? -Sim. Não, nesse 2019 eu já tinha entrado na sociedade também. O senhor recorda de alguma fiscalização da SEFA, alguma irregularidade fiscal nesse período, algum apontamento, algum problema com a entidade fiscal a essa época? - Não. Não tivemos nenhum problema no período que eu estive lá nenhum tipo de problema com a SEFA. E nenhum tipo de órgão. Trabalhávamos corretos para não ter nenhum tipo de problema. Perfeito. Só para fim de esclarecimento, o senhor já disse que o Nelson trabalhava no setor de logística, pedidos, essas coisas. Então ele não tinha nenhuma ingerência, ele não tinha nenhum conhecimento sobre essa questão de aspecto tributário – financeiro? Você só pode afirmar isso? Ou não? - Eu afirmo isso, tanto ele como o Júnior, e eu também, porque a gente, no meu caso, era só para fazer o pagamento. Eu não gerava aqui, a linha chegava na nossa mão. Para entender o fluxo interno lá. Tinha um serviço de contabilidade que era contratado, externo, que prestavam serviço de contabilidade a vocês? – Exato. Como era feito, vocês municiavam este escritório com as informações todo mês, do que acontecia na empresa? – Hoje em dia tudo é praticamente eletrônico e quando precisavam de qualquer coisa, eles entravam no nosso sistema e buscavam tudo online, eles tinham acesso, tanto para ir presencial como para ir lá, e pela internet, com esses aplicativos que tem, que acessa remotamente. Entendi. Então, na verdade, o senhor é que fica responsável mesmo por coletar as informações que ele deveria fazer? -Exatamente. A gente recebia a guia para providenciar pagamento do imposto devido. Entendi. Então o escritório que acessava as informações e ele mesmo que tratava esses dados, fazendo a técnica contábil como ele entendesse adequado mês a mês e gerava o que vocês deveriam pagar. A empresa recebia a guia e efetuava o pagamento? Era esse o fluxo? - Exato. Era esse e a gente pagava os honorários contábeis todos os meses. O depoimento de MAURO SERGIO FERREIRA DO CARMO seguiu com as perguntas realizadas pelo Ministério Público: Em 2018 o senhor já era sócio? – Olha, eu confesso que não me relembro da data, mas acho que fui sócio no final de 2018.Se não estou enganado, para o final de 2019. Quando o senhor se tornou sócio foi formalmente, com entrada no contrato social? Exato. Então o senhor não foi sócio de fato antes? – Eu era consultor, entrei praticamente no início. Acredito que os sócios eram muitos corretos, por isso resolvi aproveitar a oportunidade de entrar numa empresa. Pergunto isso, porque pelos documentos constantes dos autos, em 2018, sócios só eram José Benedito e Nelson Monteiro. Por isso lhe pergunto se o senhor era sócio de fato ou passou a ser formalmente com inclusão no contrato social? Pois é, a data exata, é como lhe falei, eu não sei precisar. Não é essa a pergunta, mas é outra pergunta. Então, por favor. O contrato só consta como sócios em 2018, o senhor Nelson Monteiro de Castro e o senhor José Benedito Souza Júnior. O senhor disse que não sabe quando passou a ser sócio. A pergunta é, o senhor passou a ser sócio no contrato social, ou o senhor era sócio somente de fato, sem estar nos documentos? O senhor poderia ser sócio nessa época também? - Não, sócio no contrato social. Então pode-se afirmar que em 2018 o senhor ainda não era sócio? porque no contrato não está em 2018: - Sim, mas eu acredito que ela não foi no final de 2018 que eu entrei na sociedade. Temos uma alteração contratual tratada de 11 de março de 2019 onde consta o seu ingresso na sociedade seria isso? -Exatamente, é que eu não tenho esse contrato em mãos no momento. (...) Enquanto o senhor não era sócio, era o senhor que determinava algo na parte fiscal da empresa? -Como eu falei, a gente recebia as guias e pagava. Não existia essa questão porque também não é a minha especialidade essa parte. Eu só recebia a guia do escritório, providenciava o lançamento das contas a pagar e efetuava o pagamento, conforme a viabilidade financeira que a gente tinha. Então o senhor não tratava com contador, questões fiscais? Não discutia isso com ele porque a gente confiava nas informações. A quem esses contadores prestavam contas? Eles mandavam aqui para a gente, não existia uma prestação de contas, porque a gente confiava nas informações que vinham deles. Quem contratou o escritório de contabilidade? Aí... isso se complicou, porque eu não lembro de cabeça. Eu não sei não. Eu não lembro. Quer dizer, o senhor não sabe quem contratou e eles não prestavam contas a ninguém. E era um escritório completamente independente de uma empresa e ninguém da empresa sabia nada do que eles faziam, simplesmente acatavam as informações deles, e ninguém se importava em saber se aquilo estava certo ou errado? -A gente confiava nas informações que vinham do escritório. Se eles são especialistas e estão informando que a gente tinha que pagar X ou Y, a gente providenciava o pagamento. as outras guias também foram todas pagas a empresa chegou a um período que era do simples também pagou normalmente. Era a confiança. Tinha antes do senhor ser sócio, esses dois sócios - o senhor José e o senhor Nelson, o senhor sabe se eles dividiam as decisões a respeito dessa empresa ou se um decidia mais que o outro? - As decisões eram tomadas em conjunto, sempre. Mas como eu falei, em relação à questão de pagamentos, era informado na lista o que tinha que pagar durante a semana, e os pagamentos eram providenciados. A pergunta foi a respeito das decisões empresariais, e o senhor já respondeu sobre as decisões de pagar ou paga ou não paga não, não é de pagar que eu estou lhe perguntando, é sobre as decisões em geral, até de pagar, mas as decisões em geral sobre os rumos do negócio (...): -As decisões eram tomadas por eles. O senhor ficou então na empresa de que ano a que ano? -Eu acho que foi de 2016... 17, 18... e em 19 eu ingressei na empresa. O senhor nunca ficou sabendo de nenhum problema com o Fisco? O senhor em 2023 continuava sócio? - Não. Eu tenho uma empresa de representações. (...)Tá, o senhor saiu de lá quando? -Olha, eu acredito que foi em 2019 mesmo. O senhor entrou e saiu? - Se não estou enganado, eu entrei, mas infelizmente a empresa desandou e parou. Eles venderam a empresa. Foi vendida, nós vendemos. O que eu sei foi isso. Alguém comprou porque tinha interesse nas marcas que eram vendidas. Cumpre salientar que a responsabilidade pelo pagamento do ICMS incidente sobre operações de circulação são atribuídas, normalmente, aos destinatários das mercadorias, podendo, no entanto, segundo inteligência do art. 11, caput, da Lei nº 8137/90 e art. 29, caput, do Código Penal, abranger a todo aquele que contribuir para a fraude ou omissão tributária. Em regra, a responsabilidade é do representante legal de empresa contribuinte, pois, em geral, é quem possui todo o controle sobre a atividade ou operação geradora de ICMS, inclusive obtém dela, o lucro - proveito. Faz parte da obrigação, realizar todo registro e, consequentemente, toda declaração fiscal, quer diretamente ou indiretamente, cuja finalidade é constituir o crédito tributário e dá conhecimento ao Fisco de toda movimentação de mercadorias e serviços, sujeitas ou não à incidência de impostos. Dentro deste escopo, não basta para se eximir da responsabilidade, atribuir que foi delegada à função financeira ao escritório de contabilidade contratado, a não ser que resulte provado que as origens dos créditos lançados sem comprovação realmente tivessem sido realizadas com o equívoco pelo serviço contábil. Os réus, em seus interrogatórios, negaram as acusações, respondendo que não fizeram nada ilícito, que não houve qualquer intensão, não tinham conhecimento contábil, e que desconheciam a questão fiscal, somente souberam por ocasião do processo penal. Nestes termos, assim, declararam, respectivamente JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR e NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO: (...) Eu não tinha nenhuma gerência sobre a decisão em relação a questão de pagamento, porque a gente tinha uma pessoa que era responsável por isso. Então, a área comercial, como sempre, (...) é o coração, a gente se se preocupava muito mais aos problemas do mercado do meu dia. (...) Eu não tinha conhecimento dessa parte do pagamento. (...) Eu queria deixar claro, assim, bem claro que eu vou fazer minha autodefesa, né? Eu jamais teria, assim, se tivesse alguma situação dessa natureza, eu não teria concordado a fazer qualquer coisa de forma inútil, até porque a gente representava uma marca que era muito forte no Brasil, então a gente tem que estar tudo com certinho. A Flashman. É a Bem Brasil, é uma multinacional. (...) Por isso é me estranho, até porque, como eu falei, a gente tinha muito medo de trabalhar fora das normas de tributação, porque a própria AB Brasil, se soubesse que a gente estava fazendo alguma coisa, eles não continuavam vendendo para a gente. (...) Não tem conhecimento nessa fraude, se fosse uma coisa, porque jamais ele ia fazer isso. Aliás, não tem necessidade, pelo menos eu posso falar de mim, você não precisa de um crime. E para mim isso foi uma surpresa muito desagradável. (...) A gente tinha um consenso porque assim, cada um trabalhava na sua especificidade da função. (...) Que o Mauro tomava conta dessa situação da parte de pagamento. (...) A gente dividia se fosse autorizado cada um tomava a sua decisão. (...) Como eu falei para o senhor, excelência, eu não concordo com as acusações. Foi imputado um dolo, como o meu advogado, Vitor, me explicou, como se nós tivéssemos tido a intenção de fazer qualquer tipo de sonegação de imposto. Isso não procede, não houve qualquer tipo de intenção. Nós nem sabíamos que havia tido algum problema fiscal. Eu não tive nem oportunidade de me defender, como o senhor deve ter visto no histórico do processo. Eu fiquei sabendo de tudo quando já havia uma acusação pronta. Eu não fui informado por parte da SEFA, que uma auditoria estaria sendo feita no período de 2018. (...) Então, foi muito complicado, porque nós não tivemos tempo, mas poderíamos ter tido algum tempo de defesa, apresentar algum tipo de prova, mostrando que nós não tínhamos conhecimento dessa questão de imposto, até porque não era do nosso conhecimento. Eu sou de uma outra área, eu sou formado em publicidade e propaganda da área de comunicação social, então nunca foi minha expertise essa parte fiscal e até por isso nós fomos pego de surpresa. (...) Eu não tive benefício nenhum com essa questão que a gente está sendo acusado muito pelo contrário. Eu tenho muito orgulho da gente ter pago todos os funcionários, mas também eu saí com uma mão na frente e outra atrás. Então não existiu nenhum tipo de benefício. (...) A gente está sendo acusado de forma injusta. (...) E me dói a gente estar sendo acusado por aquele valor de uma causa tão grande. e eu ver a dificuldade que é a nossa vida hoje, como se a gente tivesse feito alguma coisa para ter qualquer tipo de benefício, muito pelo contrário, a gente nem sabia disso, desses problemas que estavam acontecendo, esses problemas fiscais. (...) A gente não tinha conhecimento. A gente confiava muito no setor de contabilidade. (...) eles passavam para a gente e a gente seguia, enfim, excelência, eu acho que é isso. (...) Se eu não me engano, esse escritório foi uma indicação do Mauro, que já havia trabalhado com eles em algum momento. Eu fui uma vez lá, quando nós estávamos contratando, para conhecer a estrutura do escritório. Querendo ou não, quando a gente vê uma empresa bem estruturada, nós relacionamos isso à profissionalismo, a sucesso. (..) uma estrutura boa parece a profissionais confiáveis (...) eu acredito que pode ter sido algum erro também do escritório, não sei. Eu não estou aqui para julgar caráter também das pessoas. (...) O Mauro entrou como consultor na empresa. O Mauro, se eu não me engano, já havia trabalhado com o Júnior em outra empresa antes (...). E surgiu essa possibilidade do Mauro fazer uma consultoria administrativa financeira para a empresa, já que era algo que eu e o Júnior não tínhamos muito conhecimento (...). 4. Entretanto, no que tange à suposta fraude relacionada à ausência de comprovação da origem dos créditos lançados nas Declarações de Informações Econômico-Fiscais (DIEFs) pela empresa contribuinte, é importante destacar que a simples alegação pela fiscalização da inexistência de documentos comprobatórios acerca das origens, por si só, não configura, de forma automática, a prática de ilícito penal ou mesmo de fraude fiscal, exigindo-se a demonstração de dolo específico ou de manobra intencional voltada à supressão do tributo. Nos crimes contra a ordem tributária, é indubitável que o Auto de Infração e Notificação Fiscal (AINF) constitui um dos principais elementos de prova indiciária de materialidade da conduta delituosa, sendo imprescindível a atuação administrativa no levantamento de eventual crédito tributário devido – e na apuração de dos meios pelos quais não foi previamente informado ao Fisco –, oportunidade em que se verifica o acesso a toda documentação fiscal obtida pelo Sistema SIAT(RHC 119.048/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 04/02/2020, DJe 07/02/2020). Conquanto as notas fiscais foram enumeradas em relatório do Auditor Fiscal, porém não foram apresentadas por ocasião da requisição da cópia integral do procedimento administrativo tributário, especificando os tipos de mercadorias envolvidas, se os créditos lançados de fato eram indevidos ou se estavam amparados por regimes especiais de tributação previstos na legislação. Importante destacar que a empresa contribuinte atuava, pelo CNAE, no ramo de comercialização de mercadorias, entre as especificadas, havia trigos, farinhas e produtos de panificação, produtos estes que, conforme a legislação vigente, estão sujeitas a tratamento tributário diferenciado, como substituição tributária, antecipação do imposto, isenções ou crédito presumido, nos termos do Convênio ICMS nº 100/1997, do art. 9º da Lei Complementar nº 87/1996 e da legislação estadual aplicável. Nesse tipo de fraude, em que a constatação foi por confronto entre notas fiscais eletrônicas e DIEFs, é indispensável que constem nos autos, pois, por meio delas, dessas provas documentais, se pode defrontar qual a forma como a fraude ocorreu, demonstrando que realmente o que foi firmado pela Fiscalização e pelo Auditor Fiscal. Ademais, sem a devida comprovação documental da fraude tributária, pode caracterizar infração de natureza administrativa, mas não necessariamente constitui crime contra a ordem tributária, na forma do art. 1º da Lei nº 8.137/90, na medida, que para a responsabilidade penal, se exige a observância de extrema legalidade e certeza probatória. Assim, por lidar com o direito de liberdade e dignidade da pessoa humana, em consonância com o Direito Penal Constitucional, as provas carreadas aos autos deve provar realmente que o débito fiscal foi originado do descumprimento propositado e articulado das obrigações acessórias pelo réu. Não basta mera alegação ou presunção, pois em caso de dúvida, o princípio de que a favor do réu deve ser decido a questão. O in dubio pro reo não é, portanto, uma simples regra de apreciação das provas. Na verdade, deve ser utilizado no momento da valoração das provas: na dúvida, a decisão tem de favorecer o imputado, pois não tem ele a obrigação de provar que não praticou o delito. Enfim, não se justifica, sem base probatória idônea, a formulação possível de qualquer juízo condenatório, que deve sempre assentar-se – para que se qualifique como ato revestido de validade ético-jurídica – em elementos de certeza, os quais, ao dissiparem ambiguidades, ao esclarecerem situações equívocas e ao desfazerem dados eivados de obscuridade, revelam-se capazes de informar, com objetividade, o órgão judiciário competente, afastando, desse modo, dúvidas razoáveis, sérias e fundadas que poderiam conduzir qualquer magistrado ou Tribunal a pronunciar o non liquet. (Legislação criminal especial comentada: volume único. Renato Brasileiro de Lima. 9ª ed. rev., atual. e ampl. Salvador: JusPodvum, 2021, p. 47) 5. Isso posto, considerando que as provas produzidas ao longo da instrução processual foram capazes de afastar a materialidade delitiva em relação a conduta individualizada na denúncia, julgo improcedente a ação penal e, por consectário lógico, absolvo contra JOSÉ BENEDITO SOUZA JÚNIOR E NELSON MONTEIRO DE CASTRO NETO por falta de provas suficientes, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal e por tudo mais o que consta nos autos. Dispenso as custas e despesas processuais, na forma do art. 34, da Lei nº 8.328/2015. Intimem-se as partes acerca da presente sentença, expedindo-se as demais comunicações eventualmente necessárias. Na hipótese de interposto o recurso de Apelação, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões. Decorrido o prazo legal, certifique-se e encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, para os devidos fins. Na hipótese de trânsito em julgado, certifique-se e deem-se as respectivas baixas, com o arquivamento dos autos. P. R. I. C. SERVIRÁ A PRESENTE, POR CÓPIA DIGITALIZADA, COMO MANDADO, CARTA E OFÍCIO, NA FORMA DO PROVIMENTO Nº 003/2009-CJRM. Belém-PA, data registrada no sistema. VINÍCIUS DE AMORIM PEDRASSOLI Juiz de Direito Titular da Vara de Crimes contra o Consumidor e a Ordem Tributária
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear