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Janaina De Sousa E Silva
OAB/MG 97.928
JANAINA DE SOUSA E SILVA consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça como advogado.
ID: 330922205
Tribunal: TJPB
Órgão: Vara Única de Conde
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0816098-07.2024.8.15.2002
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ADAILTON RAULINO VICENTE DA SILVA
OAB/PB XXXXXX
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PEDRO DA COSTA FERREIRA
OAB/PB XXXXXX
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AMERICO GOMES DE ALMEIDA
OAB/PB XXXXXX
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NIVALDO GABRIEL RIBEIRO JUNIOR
OAB/PB XXXXXX
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Poder Judiciário da Paraíba Vara Única de Conde AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) 0816098-07.2024.8.15.2002 [Roubo Majorado] AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAIBA, DELEGACIA DE COMAR…
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Processo nº 0816098-07.2024.8.15.2002
ID: 330922216
Tribunal: TJPB
Órgão: Vara Única de Conde
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0816098-07.2024.8.15.2002
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ADAILTON RAULINO VICENTE DA SILVA
OAB/PB XXXXXX
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PEDRO DA COSTA FERREIRA
OAB/PB XXXXXX
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AMERICO GOMES DE ALMEIDA
OAB/PB XXXXXX
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NIVALDO GABRIEL RIBEIRO JUNIOR
OAB/PB XXXXXX
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Poder Judiciário da Paraíba Vara Única de Conde AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) 0816098-07.2024.8.15.2002 [Roubo Majorado] AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAIBA, DELEGACIA DE COMAR…
Poder Judiciário da Paraíba Vara Única de Conde AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) 0816098-07.2024.8.15.2002 [Roubo Majorado] AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAIBA, DELEGACIA DE COMARCA DE CONDE REU: RUAN RIBEIRO LUNA, FLADSON MENDONCA ROSENDO DA SILVA, MIGUEL SOARES DE ARAUJO SENTENÇA RÉU PRESO I. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAÍBA, no uso de suas atribuições (art. 24 CPP; art. 100, p. 1º, CP e art. 129, inc. I, CF) e com base no inquérito policial em anexo, deflagrou ação penal contra RUAN RIBEIRO LUNA, FLADSON MENDONÇA ROSENDO DA SILVA e MIGUEL SOARES DE ARAÚJO, pela prática dos seguintes crimes: art. 157 §2º, inc. II e §2º-A, inc. I (assalto à mão armada e em co-autoria), art. 148 (sequestro relâmpago), art. 163 (dano), todos do Código Penal, observando-se o disposto no art. 69 do mesmo codex, bem como pelo art. 28 da Lei Antidrogas. Segundo narra a exordial, na manhã de 30 de novembro de 2024, munidos com uma arma de fogo, os acusados sequestraram o motorista de transporte alternativo Cristiano Pereira e em seguida tomaram mediante violência o veículo Corsa Classic a ele pertencente, fato ocorrido nos limítrofes desta cidade. Ato contínuo, saíram em fuga, porém mais adiante perderam o controle da direção e capotaram o carro antes roubado, causando-lhe danos e provocando a prisão em flagrante. Os réus foram presos em flagrante no dia 30/11/2024 (Id. 107447404 - Pág. 1), tendo sido convertida em prisão preventiva durante a audiência de custódia. Preenchidos os requisitos do art. 41 do CPP, bem como ausentes as hipóteses do art. 395, CPP, a denúncia foi recebida em 11/03/2025 (Id. 108936525). Após a citação regular, foi apresentada resposta à acusação (art. 396-A, CPP). Inocorrentes as hipóteses do art. 397, CPP, foi designada audiência (art. 399,CPP). A audiência foi regularmente realizada, na ordem prevista no artigo 400 do CPP. Foram ouvidas a vítima, as testemunhas de acusação e as testemunhas arroladas pela defesa, além da realização dos interrogatórios dos réus. Sem mais diligências (art. 402, CPP), foram apresentadas as alegações finais orais. O Ministério Público requereu a procedência parcial da denúncia, condenando os três réus pela prática dos crimes do art. 157, § 2º, II, e §2º-A, I, art. 163, ambos do CP, e art. 28 da Lei 11.343/03, absolvendo-os pela prática do crime tipificado no art. 148 do CP. A defesa dos acusados pleiteou, de modo geral, pela absolvição em decorrência de ausência de provas. Não havendo nulidades a serem sanadas, tampouco diligências a serem realizadas, vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO Cuida-se de ação penal intentada com a finalidade de apurar a responsabilidade criminal pela possível prática do crime tipificado no art. 157 §2º, inc. II e §2º-A, inc. I (assalto à mão armada e em co-autoria), art. 148 (sequestro relâmpago), art. 163 (dano), todos do Código Penal, observando-se o disposto no art. 69 do mesmo codex, bem como pelo art. 28 da Lei Antidrogas. Vejamos: Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade: [...] II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; [...] § 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo; Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado: (Vide Lei nº 10.446, de 2002) Pena - reclusão, de um a três anos. Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. Da análise dos autos, verifico que a materialidade e autoria delitivas restaram amplamente comprovadas por meio do forte e expressivo conjunto probatório no que tange ao delito de roubo, sobretudo pelo Auto de Prisão em Flagrante (Id. 105076596 - Pág. 1), pelo boletim de ocorrência (id. 105076596 - Págs. 12/13), pelo Auto de Prisão e Apreensão (Id. 105076596 - Pág. 14), bem como pelos depoimentos prestados durante o inquérito policial e na audiência de instrução e julgamento. Nesse sentido, passo a expor, de forma concisa, os principais elementos extraídos das provas produzidas em juízo, com destaque para os trechos mais relevantes para formação do decisum. A vítima, CRISTIANO PEREIRA, relatou em juízo que, exercendo sua profissão de motorista de transporte alternativo, apanhou os três acusados na entrada da cidade de Conde/PB. O depoente detalhou que, após um trajeto inicial com conversas triviais, ao passar pelo centro da cidade e seguir em direção a Jacumã, o réu RUAN, que estava no banco do passageiro, anunciou o assalto, afirmando que queria o veículo para “dar uns ataques nos okaida”. Declarou que, inicialmente, duvidou da veracidade da ação, momento em que o réu que estava de muletas (Miguel) exibiu um revólver, apontando-o em direção à sua cabeça e proferindo ameaça de morte caso reagisse. Ato contínuo, foi coagido a dirigir o veículo para o interior de um canavial, onde foi ordenado que descesse e fugisse do local. Afirmou que o réu RUAN assumiu a direção do automóvel, evadindo-se com os comparsas. A vítima informou que, com a ajuda de um colega, localizou posteriormente seu veículo capotado, resultando em perda total do bem, cujo prejuízo financeiro, decorrente do financiamento, estima em R$48.000,00 (quarenta e oito mil reais). Por fim, a vítima reconheceu categoricamente os três réus presentes na audiência como os autores do roubo. Esclareceu que apenas o indivíduo de cavanhaque e muletas (Miguel) portava a arma de fogo ostensivamente e que a iniciativa de anunciar o assalto partiu do réu Ruan. Mencionou, ainda, que o réu Fladson instigou Ruan a exibir uma arma para intimidá-lo, mas Ruan recusou, afirmando que não fariam mal ao depoente. O policial militar MATHEUS MENESES MUNIZ relatou em Juízo que sua guarnição estava em patrulhamento de rotina quando foi informada por populares sobre o roubo de um veículo Classic branco. Em coordenação com a Guarda Municipal, dirigiu-se à provável rota de fuga, a PB-018, onde encontrou o referido veículo acidentado. No local, os três acusados foram identificados como os autores do crime. Um deles estava gravemente ferido e preso às ferragens. Informou que, após o socorro, a Guarda Municipal realizou uma busca no veículo, encontrando e entregando à sua guarnição um revólver calibre .38, uma pequena porção de entorpecente e de quatro a cinco aparelhos celulares. A testemunha acrescentou que, segundo informações das guarnições locais, os acusados já eram conhecidos na região por envolvimento em atividades criminosas e ligação com organização criminosa. Durante o interrogatório, os acusados negaram a autoria delitiva, apresentando versões semelhantes, conforme segue. O réu FLADSON MENDONÇA ROSENDO DA SILVA, em seu interrogatório, narrou que, no dia dos fatos, após sair de uma festa e ir para casa, dirigiu-se a um ponto de ônibus para pegar um transporte alternativo. Alega que, já dentro do veículo, o motorista, sem motivo aparente, parou e saiu do carro, momento em que um dos outros acusados assumiu a direção. Segundo o réu, este indivíduo colidiu o veículo, o que lhe causou uma forte pancada na cabeça. Afirma que, em desespero, saiu correndo para pedir ajuda, sendo então abordado por guardas que o questionaram sobre uma arma, a qual negou possuir. O réu MIGUEL SOARES DE ARAÚJO afirmou que, no dia do ocorrido, estava se deslocando para Jacumã com o intuito de vender picolés, uma vez que se encontrava afastado de seu trabalho habitual na fazenda devido a um acidente que o deixou com pinos nos calcanhares. Relatou que embarcou no transporte alternativo onde os outros dois réus já se encontravam, mas sentados separadamente. Sustenta que foi surpreendido quando o motorista parou e abandonou o veículo. Após a subsequente colisão, alega que uma arma foi encontrada no chão e que, embora tenham mencionado drogas, ele não portava nenhum entorpecente. Finaliza afirmando ter sido espancado pelos policiais, apesar de negar qualquer envolvimento no crime. O réu RUAN RIBEIRO LUNA confirmou que estava no veículo no momento do crime, sentado no banco ao lado do motorista. A sua versão dos fatos é de que, ao avistar uma arma de fogo, sua reação foi gritar "um assalto, motorista" com a intenção de alertar a vítima, e não de anunciar o crime. Ele confirma conhecer a vítima, pois são vizinhos, e relata que no dia anterior havia consumido bebida alcoólica em uma festa. Justifica sua presença no veículo pela necessidade de chegar em casa para descansar e realizar a entrega de uma encomenda de cocos. Passo a fundamentar. 1. Do crime de roubo majorado pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma de fogo A materialidade do delito de roubo, em sua modalidade majorada, é inquestionável e encontra-se robustamente comprovada nos autos. A subtração do veículo Chevrolet Classic LS., cor branca, placa OFY5D45 é confirmada pelo auto de apresentação e apreensão (Id. 105076596 - Pág. 14) e pelo boletim de ocorrência (id. 105076596 - Págs. 12/13). A grave ameaça exercida, elemento essencial do tipo penal de roubo, é evidente e corroborada pelas declarações da vítima, tendo afirmado que o réu foi colocada uma arma de fogo em sua cabeça, a fim de que obedecesse às ordens dos agentes, bem como pelo depoimento do próprio réu RUAN, que embora tenha distorcido os fatos, afirma que havia uma arma no ambiente e que alguém teria anunciado o assalto. No mesmo sentido, a autoria delitiva recai de forma incontestável sobre os réus RUAN RIBEIRO LUNA, FLADSON MENDONÇA ROSENDO DA SILVA e MIGUEL SOARES DE ARAÚJO. A vítima afirmou de forma coerente e segura, tanto em sede policial quanto em juízo, que foi abordado pelos três réus, tendo sido ameaçado com revólver apontado à sua cabeça por MIGUEL, enquanto RUAN anunciava o assalto e assumia a direção do veículo, e FLADSON instigava a ação criminosa. Além disso, todos foram presos em flagrante e reconhecidos pela vítima em Juízo, assim como pela testemunha de acusação, o policial militar MATHEUS MENESES MUNIZ. Os reconhecimentos pessoais realizados em audiência, de maneira segura e direta, reforçam a convicção sobre a participação dos acusados. A dinâmica dos fatos, com a abordagem conjunta e a posterior fuga com o veículo subtraído, demonstra a unidade de desígnios e a colaboração mútua para o sucesso da empreitada criminosa. Da causa de aumento prevista no § 2º, inciso II, do art. 157 do Código Penal. O concurso de agentes demonstra a maior reprovabilidade da conduta, uma vez que a ação conjunta dos réus visou não apenas intimidar a vítima e dificultar qualquer possibilidade de resistência, como também facilitar a consumação do delito. O concurso de pessoas encontra respaldo nas declarações firmes e coerentes da vítima, assim como decorrente da apreensão dos agentes em flagrante. Em seu depoimento, a vítima relatou que o réu RUAN foi quem anunciou o assalto, enquanto o agente de moletas e cavanhaque, isto é, o réu MIGUEL, sacou a arma de fogo para intimidá-lo e forçá-lo a abandonar o veículo no matagal, ocasião em que RUAN assumiu a direção. FLADSON, por sua vez, teria instigado a realização do crime. A presença de três agentes operando em sinergia aumentou exponencialmente o poder de intimidação e a capacidade de superação da resistência da vítima, caracterizando a majorante. Da causa de aumento prevista no § 2º-A, inciso I, do art. 157 do Código Penal. A presente majorante restou confirmada não apenas pelo depoimento da vítima, que relatou de forma detalhada a utilização da arma para ameaçá-la e impedir qualquer reação, como também pelo Auto de Prisão e Apreensão (Id. 105076596 - Pág. 14), que registrou a apreensão do referido armamento, corroborando a narrativa dos fatos. O réu RUAN, inclusive, informou que visualizou uma arma de fogo no veículo e que teria apenas alertado a vítima de que um dos outros dois indivíduos teria anunciado o assalto. A utilização da arma de fogo potencializa a ameaça, conferindo ao agente um poderio intimidador que vai além da simples superioridade numérica, justificando a aplicação da majorante em sua integralidade. Da alegada participação de menor importância pelo réu MIGUEL. No que tange ao pedido formulado pela defesa técnica do réu MIGUEL, para reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no §1º do art. 29 do Código Penal, sob o argumento de que sua participação teria sido de menor importância, não há como acolhê-lo. Pelo contrário, os elementos constantes nos autos demonstram que o referido réu teve atuação ativa e determinante na empreitada criminosa, sendo o responsável por por sacar o revólver e ameaçar a vítima de morte, encostando o cano junto à cabeça. Sua presença e atuação foram cruciais para a grave ameaça, elemento fundamental do tipo penal. Dessa forma, não há respaldo probatório que justifique a aplicação da minorante prevista no §1º do art. 29 do Código Penal ao réu MIGUEL, afastando-se, portanto, a tese defensiva. 2. Do crime de sequestro e cárcere privado Para a caracterização do delito exige-se a restrição à liberdade de locomoção da vítima por período de tempo juridicamente relevante, de forma injusta e sem previsão legal, com finalidade própria e autônoma, ainda que temporária. Não se confunde, portanto, com a restrição momentânea de liberdade inerente à dinâmica do crime de roubo, especialmente quando esta ocorre apenas pelo tempo necessário à consumação da subtração. No caso em apreço, conforme relato da própria vítima CRISTIANO PEREIRA, após o anúncio do assalto, foi-lhe determinado que entrasse uma área de canavial e que deixasse o veículo, tendo em seguida sido liberado pelos assaltantes para fugir do local, sem qualquer forma de retenção física ou ameaça adicional. Toda a contenção de sua liberdade foi instrumental à execução do roubo, visando apenas facilitar a tomada do bem e a evasão dos agentes. Assim, não restou caracterizada a elementar do tipo penal de sequestro ou cárcere privado, uma vez que a restrição de liberdade foi episódica, não resultou em confinamento ou detenção prolongada, e foi exclusivamente dirigida à execução do roubo. Por tais razões, impõe-se a absolvição dos acusados quanto ao delito descrito no art. 148 do Código Penal, nos termos do art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal, diante da ausência de prova da existência do fato típico autônomo. 3. Do crime de dano No que tange ao delito de dano, exige-se dolo específico de destruir, inutilizar ou deteriorar bem alheio, não sendo suficiente a ocorrência de mero resultado danoso. Ou seja, é imprescindível que o agente tenha atuado com intenção dirigida à danificação do objeto, o que não se vislumbra no caso concreto. Conforme relatado pela vítima e pelos próprios acusados, após o anúncio do roubo, os réus tomaram o veículo com a finalidade de utilizá-lo para a prática de outros crimes, inclusive mencionando que “queriam dar uns ataques nos Okaidas”. O capotamento do automóvel ocorreu no contexto da fuga, após tentativa de manobra e colisão acidental, não havendo qualquer prova de que os réus tenham deliberadamente causado o dano com vontade dirigida a esse fim. Trata-se, portanto, de resultado derivado de imprudência ou de circunstância fortuita, o que descaracteriza o dolo específico exigido pelo tipo penal. Ademais, o nexo de funcionalidade entre o crime de roubo e o dano ao bem subtraído é evidente: os danos decorreram da própria dinâmica de consumação e tentativa de evasão, sem qualquer autonomia ou finalidade destrutiva. Assim, ausente o elemento subjetivo do tipo, e diante da manifesta consunção entre os delitos, impõe-se a absolvição dos réus quanto ao crime previsto no art. 163 do Código Penal, com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal, por não constituir o fato infração penal autônoma. 4. Do crime de posse de drogas para consumo Por fim, a denúncia atribui aos réus, de forma indistinta, a prática do crime previsto no art. 28 da Lei de Drogas, em razão da apreensão de entorpecentes no interior do veículo utilizado na prática do roubo. No entanto, a análise do conjunto probatório revela ausência de elementos mínimos que permitam imputar a posse do material entorpecente a qualquer dos acusados, de forma individualizada e segura. Com efeito, a substância entorpecente – identificada como 0,10g de cocaína e 4,30g de maconha, conforme o laudo pericial (Ids. 105076596 - Pág. 29, e 105078625) – foi encontrada solta dentro do veículo, no momento em que os policiais chegaram ao local do acidente de trânsito ocorrido durante a fuga dos réus. Não há qualquer prova de que a droga estivesse com algum dos acusados, em suas vestes ou em compartimento de uso pessoal, tampouco foi registrada qualquer tentativa de ocultação ou confissão quanto à propriedade do material. Os próprios policiais militares que atenderam à ocorrência relataram que os objetos (arma, celulares e drogas) foram recolhidos após a remoção dos acusados do interior do automóvel capotado, não havendo diligência prévia que estabeleça vínculo direto entre a substância e qualquer um dos ocupantes do veículo. Além disso, todos os acusados negaram a posse da droga em seus interrogatórios, e não foram colhidos elementos adicionais, como perícia em digitais ou imagens, que pudessem superar essa negativa e individualizar a conduta. Além disso, a pluralidade de ocupantes e o caráter coletivo do ambiente onde o entorpecente foi localizado fragilizam ainda mais qualquer pretensão acusatória de imputação objetiva. O princípio do in dubio pro reo se impõe com ainda mais força quando se trata de infração penal de natureza pessoalíssima, como é o caso da posse de drogas para uso próprio. Portanto, ausente prova da posse consciente e voluntária dos entorpecentes por parte dos acusados, impõe-se a absolvição de todos os réus quanto ao crime do art. 28 da Lei nº 11.343/2006, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, por não existir prova suficiente para a condenação. III. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal veiculada na denúncia, com fulcro no artigo 387 do Código de Processo Penal, para CONDENAR os réus RUAN RIBEIRO LUNA, FLADSON MENDONÇA ROSENDO DA SILVA e MIGUEL SOARES DE ARAÚJO como incursos no art. 157, §2º, II c/c §2º-A, I do Código Penal, e ABSOLVER quanto aos delitos do art. 148 e art. 163 (dano), ambos do Código Penal, e art. 28 da Lei Antidrogas. Passo, pois, à dosimetria da pena a ser imposta aos condenados (art. 68, do CP), analisando as circunstâncias judiciais do art. 59 do referido diploma, a existência de circunstâncias agravantes e atenuantes, de causas de aumento e diminuição de pena, bem como, ao final, a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade aplicada por pena(s) restritiva(s) de direito ou de suspensão condicional da pena (sursis). IV. DOSIMETRIA A) RUAN RIBEIRO LUNA 1ª FASE: impõe-se, inicialmente, a análise das circunstâncias judiciais contempladas no art. 59 do Código Penal: Culpabilidade: Negativa. O réu agiu com alto grau de reprovabilidade, aproveitando-se da profissão da vítima — motorista de transporte alternativo —, sabidamente mais suscetível a abordagens criminosas por transportar passageiros desconhecidos em seu próprio veículo. Tal circunstância demonstra dolo dirigido e maior censurabilidade da conduta, pois facilitou o acesso ao interior do automóvel sem gerar suspeitas; Antecedentes: não consta da certidão de antecedentes criminais que o acusado possui condenação, sendo, portanto, primário; Conduta social: nada a valorar; Personalidade: não há dados conclusivos acerca da personalidade do réu a serem valorados; Motivo: Negativo. A subtração do veículo não se destinava apenas à obtenção de vantagem patrimonial, mas à instrumentalização para a prática de crimes subsequentes — conforme dito pela vítima em audiência, os acusados teriam justificado a prática delitiva para perpetrar ataques armados contra membros de facção rival (“matar uns okaida”). Trata-se de motivação especialmente grave, voltada à intensificação de conflito criminoso; Circunstâncias: Negativas. O delito foi perpetrado com elevado grau de audácia e periculosidade, tendo os réus abordado a vítima em plena luz do dia, e em via pública movimentada. A grave ameaça foi exercida mediante arma de fogo apontada diretamente contra a cabeça da vítima, que ainda se encontrava ao volante do automóvel em movimento, situação que não apenas elevou exponencialmente o risco à integridade física do ofendido, como também colocou em perigo a segurança do trânsito e de terceiros. Ressalte-se que a valoração negativa desta circunstância não configura bis in idem com a causa de aumento do emprego de arma de fogo (art. 157, §2º-A, I, do CP), uma vez que aqui se analisa a particularidade da conduta — o fato de a vítima ter sido obrigada a dirigir sob ameaça iminente, com o cano da arma encostado em sua cabeça, situação extremamente opressiva e potencialmente letal, que excede os elementos ordinários da majorante e justifica a exasperação da pena na primeira fase da dosimetria; Consequências: Negativas. A vítima teve perda total do bem subtraído — veículo financiado —, sofrendo expressivo prejuízo econômico. Além disso, as circunstâncias da abordagem e da ameaça armada ensejaram perturbação emocional significativa, abalando psicologicamente o ofendido sempre que passa pelo local do ocorrido, conforme narrado nos autos; Comportamento da vítima: Neutro, inexistindo qualquer contribuição para o evento delituoso. Diante disso, na presença de circunstâncias judiciais negativas, fixo a pena-base privativa de liberdade em 6 anos e 8 meses de reclusão. 2ª FASE: Ausentes agravantes e atenuantes, fica a pena intermediária no mesmo patamar da primeira fase. 3ª FASE: Quanto à aplicação das duas causas de aumento de pena nesta terceira fase da dosimetria, nos termos de orientação do Superior Tribunal de Justiça, presentes duas causas de aumento, é possível a aplicação das majorantes de forma cumulada na terceira etapa do cálculo da reprimenda, pois o art. 68, parágrafo único, do Código Penal não obriga que o julgador aplique apenas uma causa de aumento quando estiver diante de concurso de majorantes, desde que a cumulação seja concretamente fundamentada (STJ - AgRg no HC: 858244 SP 2023/0356175-4, Relator.: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 22/04/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/04/2024). Assim, considero que a atuação conjunta dos agentes, portando arma de fogo, facilitou a abordagem, garantiu a celeridade da ação e possibilitou a subtração do veículo. O concurso de pessoas (três indivíduos) aumentou o poder de intimidação e a capacidade de superação da resistência da vítima. A união de esforços dos réus, demonstrou uma sinergia criminosa que elevou a gravidade da conduta. Por essa razão, entendo ser necessária a fixação da fração no patamar de 1/3, nos termos do art. 157, §2º, II do Código Penal. Além disso, comprovado o emprego de arma de fogo pelos depoimentos contundentes da vítima e das testemunhas ministeriais, que relataram o uso da arma de fogo, aumentando desmedidamente o sofrimento imposto à vítima para além daquele usualmente relacionado ao delito, bem como elevou a exposição de risco da vítima. O Auto de Prisão e Apreensão (Id. 105076596 - Pág. 14) corrobora a utilização do revólver calibre .38, demonstrando o efetivo poder ofensivo do artefato. Dessa forma, majoro em mais 2/3, conforme autoriza o §2º-A, I do art. 157 do mesmo diploma legal. Por tais razões e observada a análise qualitativa de que trata a Súmula 443 do STJ, aplicando-se sucessivamente ambas as majorante, torno a pena definitiva em 14 (CATORZE) ANOS E 8 (OITO) MESES DE RECLUSÃO. FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA: Com base nos fundamentos já mencionados acima, considerando que “a pena de multa deve guardar proporcionalidade à pena privativa de liberdade” (STJ - AREsp: 674202/RN, DJ 24/06/2015), fixo a pena de multa em 57 (cinquenta e sete) dias-multa. Na ausência de elementos que permitam aferir a renda do acusado, fixo cada dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devendo a pena pecuniária ser devidamente atualizada, consoante previsão legal. Para o pagamento da pena de multa, deverão ser observados os critérios expostos no § 2° do art. 49, bem como o prazo previsto no art. 50, ambos do Código Penal. B) FLADSON MENDONÇA ROSENDO DA SILVA 1ª FASE: impõe-se, inicialmente, a análise das circunstâncias judiciais contempladas no art. 59 do Código Penal: Culpabilidade: Negativa. O réu agiu com alto grau de reprovabilidade, aproveitando-se da profissão da vítima — motorista de transporte alternativo —, sabidamente mais suscetível a abordagens criminosas por transportar passageiros desconhecidos em seu próprio veículo. Tal circunstância demonstra dolo dirigido e maior censurabilidade da conduta, pois facilitou o acesso ao interior do automóvel sem gerar suspeitas; Antecedentes: não consta da certidão de antecedentes criminais que o acusado possui condenação, sendo, portanto, primário; Conduta social: nada a valorar; Personalidade: não há dados conclusivos acerca da personalidade do réu a serem valorados; Motivo: Negativo. A subtração do veículo não se destinava apenas à obtenção de vantagem patrimonial, mas à instrumentalização para a prática de crimes subsequentes — conforme dito pela vítima em audiência, os acusados teriam justificado a prática delitiva para perpetrar ataques armados contra membros de facção rival (“matar uns okaida”). Trata-se de motivação especialmente grave, voltada à intensificação de conflito criminoso; Circunstâncias: Negativas. O delito foi perpetrado com elevado grau de audácia e periculosidade, tendo os réus abordado a vítima em pleno exercício de sua atividade profissional, no interior de veículo de transporte alternativo, em plena luz do dia, e em via pública movimentada. A grave ameaça foi exercida mediante arma de fogo apontada diretamente contra a cabeça da vítima, que ainda se encontrava ao volante do automóvel em movimento, situação que não apenas elevou exponencialmente o risco à integridade física do ofendido, como também colocou em perigo a segurança do trânsito e de terceiros. Ressalte-se que a valoração negativa desta circunstância não configura bis in idem com a causa de aumento do emprego de arma de fogo (art. 157, §2º-A, I, do CP), uma vez que aqui se analisa a particularidade da conduta — o fato de a vítima ter sido obrigada a dirigir sob ameaça iminente, com o cano da arma encostado em sua cabeça, situação extremamente opressiva e potencialmente letal, que excede os elementos ordinários da majorante e justifica a exasperação da pena na primeira fase da dosimetria; Consequências: Negativas. A vítima teve perda total do bem subtraído — veículo financiado —, sofrendo expressivo prejuízo econômico. Além disso, as circunstâncias da abordagem e da ameaça armada ensejaram perturbação emocional significativa, abalando psicologicamente o ofendido sempre que passa pelo local do ocorrido, conforme narrado nos autos; Comportamento da vítima: Neutro, inexistindo qualquer contribuição para o evento delituoso. Diante disso, na presença de circunstâncias judiciais negativas, fixo a pena-base privativa de liberdade em 6 anos e 8 meses de reclusão. 2ª FASE: Ausentes agravantes, presente a atenuante da menoridade (art. 65, I, CP), considerando que possuía menos de 21 anos à época do crime, fica a pena intermediária no montante de 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 21 (vinte e um) dias de reclusão. 3ª FASE: Quanto à aplicação das duas causas de aumento de pena nesta terceira fase da dosimetria, nos termos de orientação do Superior Tribunal de Justiça, presentes duas causas de aumento, é possível a aplicação das majorantes de forma cumulada na terceira etapa do cálculo da reprimenda, pois o art. 68, parágrafo único, do Código Penal não obriga que o julgador aplique apenas uma causa de aumento quando estiver diante de concurso de majorantes, desde que a cumulação seja concretamente fundamentada (STJ - AgRg no HC: 858244 SP 2023/0356175-4, Relator.: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 22/04/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/04/2024). Assim, considero que a atuação conjunta dos agentes, portando arma de fogo, facilitou a abordagem, garantiu a celeridade da ação e possibilitou a subtração do veículo. O concurso de pessoas (três indivíduos) aumentou o poder de intimidação e a capacidade de superação da resistência da vítima. A união de esforços dos réus, demonstrou uma sinergia criminosa que elevou a gravidade da conduta. Por essa razão, entendo ser necessária a fixação da fração no patamar de 1/3, nos termos do art. 157, §2º, II do Código Penal. Além disso, comprovado o emprego de arma de fogo pelos depoimentos contundentes da vítima e das testemunhas ministeriais, que relataram o uso da arma de fogo, aumentando desmedidamente o sofrimento imposto à vítima para além daquele usualmente relacionado ao delito, bem como elevou a exposição de risco da vítima. O Auto de Prisão e Apreensão (Id. 105076596 - Pág. 14) corrobora a utilização do revólver calibre .38, demonstrando o efetivo poder ofensivo do artefato. Dessa forma, majoro em mais 2/3, conforme autoriza o §2º-A, I do art. 157 do mesmo diploma legal. Por tais razões e observada a análise qualitativa de que trata a Súmula 443 do STJ, aplicando-se sucessivamente ambas as majorante, torno a pena definitiva em 12 (DOZE) ANOS E 3 (TRÊS) MESES DE RECLUSÃO. FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA: Com base nos fundamentos já mencionados acima, considerando que “a pena de multa deve guardar proporcionalidade à pena privativa de liberdade” (STJ - AREsp: 674202/RN, DJ 24/06/2015), fixo a pena de multa em 45 (quarenta e cinco) dias-multa. Na ausência de elementos que permitam aferir a renda do acusado, fixo cada dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devendo a pena pecuniária ser devidamente atualizada, consoante previsão legal. Para o pagamento da pena de multa, deverão ser observados os critérios expostos no § 2° do art. 49, bem como o prazo previsto no art. 50, ambos do Código Penal. C) MIGUEL SOARES DE ARAÚJO 1ª FASE: impõe-se, inicialmente, a análise das circunstâncias judiciais contempladas no art. 59 do Código Penal: Culpabilidade: Negativa. O réu agiu com alto grau de reprovabilidade, aproveitando-se da profissão da vítima — motorista de transporte alternativo —, sabidamente mais suscetível a abordagens criminosas por transportar passageiros desconhecidos em seu próprio veículo. Tal circunstância demonstra dolo dirigido e maior censurabilidade da conduta, pois facilitou o acesso ao interior do automóvel sem gerar suspeitas; Antecedentes: não consta da certidão de antecedentes criminais que o acusado possui condenação, sendo, portanto, primário; Conduta social: nada a valorar; Personalidade: não há dados conclusivos acerca da personalidade do réu a serem valorados; Motivo: Negativo. A subtração do veículo não se destinava apenas à obtenção de vantagem patrimonial, mas à instrumentalização para a prática de crimes subsequentes — conforme dito pela vítima em audiência, os acusados teriam justificado a prática delitiva para perpetrar ataques armados contra membros de facção rival (“matar uns okaida”). Trata-se de motivação especialmente grave, voltada à intensificação de conflito criminoso; Circunstâncias: Negativas. O delito foi perpetrado com elevado grau de audácia e periculosidade, tendo os réus abordado a vítima em pleno exercício de sua atividade profissional, no interior de veículo de transporte alternativo, em plena luz do dia, e em via pública movimentada. A grave ameaça foi exercida mediante arma de fogo apontada diretamente contra a cabeça da vítima, que ainda se encontrava ao volante do automóvel em movimento, situação que não apenas elevou exponencialmente o risco à integridade física do ofendido, como também colocou em perigo a segurança do trânsito e de terceiros. Ressalte-se que a valoração negativa desta circunstância não configura bis in idem com a causa de aumento do emprego de arma de fogo (art. 157, §2º-A, I, do CP), uma vez que aqui se analisa a particularidade da conduta — o fato de a vítima ter sido obrigada a dirigir sob ameaça iminente, com o cano da arma encostado em sua cabeça, situação extremamente opressiva e potencialmente letal, que excede os elementos ordinários da majorante e justifica a exasperação da pena na primeira fase da dosimetria; Consequências: Negativas. A vítima teve perda total do bem subtraído — veículo financiado —, sofrendo expressivo prejuízo econômico. Além disso, as circunstâncias da abordagem e da ameaça armada ensejaram perturbação emocional significativa, abalando psicologicamente o ofendido sempre que passa pelo local do ocorrido, conforme narrado nos autos; Comportamento da vítima: Neutro, inexistindo qualquer contribuição para o evento delituoso. Diante disso, na presença de circunstâncias judiciais negativas, fixo a pena-base privativa de liberdade em 6 anos e 8 meses de reclusão. 2ª FASE: Ausentes agravantes e atenuantes, fica a pena intermediária no mesmo patamar da primeira fase. 3ª FASE: Quanto à aplicação das duas causas de aumento de pena nesta terceira fase da dosimetria, nos termos de orientação do Superior Tribunal de Justiça, presentes duas causas de aumento, é possível a aplicação das majorantes de forma cumulada na terceira etapa do cálculo da reprimenda, pois o art. 68, parágrafo único, do Código Penal não obriga que o julgador aplique apenas uma causa de aumento quando estiver diante de concurso de majorantes, desde que a cumulação seja concretamente fundamentada (STJ - AgRg no HC: 858244 SP 2023/0356175-4, Relator.: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 22/04/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/04/2024). Assim, considero que a atuação conjunta dos agentes, portando arma de fogo, facilitou a abordagem, garantiu a celeridade da ação e possibilitou a subtração do veículo. O concurso de pessoas (três indivíduos) aumentou o poder de intimidação e a capacidade de superação da resistência da vítima. A união de esforços dos réus, demonstrou uma sinergia criminosa que elevou a gravidade da conduta. Por essa razão, entendo ser necessária a fixação da fração no patamar de 1/3, nos termos do art. 157, §2º, II do Código Penal. Além disso, comprovado o emprego de arma de fogo pelos depoimentos contundentes da vítima e das testemunhas ministeriais, que relataram o uso da arma de fogo, aumentando desmedidamente o sofrimento imposto à vítima para além daquele usualmente relacionado ao delito, bem como elevou a exposição de risco da vítima. O Auto de Prisão e Apreensão (Id. 105076596 - Pág. 14) corrobora a utilização do revólver calibre .38, demonstrando o efetivo poder ofensivo do artefato. Dessa forma, majoro em mais 2/3, conforme autoriza o §2º-A, I do art. 157 do mesmo diploma legal. Por tais razões e observada a análise qualitativa de que trata a Súmula 443 do STJ, aplicando-se sucessivamente ambas as majorante, torno a pena definitiva em 14 (CATORZE) ANOS E 8 (OITO) MESES DE RECLUSÃO. FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA: Com base nos fundamentos já mencionados acima, considerando que “a pena de multa deve guardar proporcionalidade à pena privativa de liberdade” (STJ - AREsp: 674202/RN, DJ 24/06/2015), fixo a pena de multa em 57 (cinquenta e sete) dias-multa. Na ausência de elementos que permitam aferir a renda do acusado, fixo cada dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devendo a pena pecuniária ser devidamente atualizada, consoante previsão legal. Para o pagamento da pena de multa, deverão ser observados os critérios expostos no § 2° do art. 49, bem como o prazo previsto no art. 50, ambos do Código Penal. V. DISPOSIÇÕES FINAIS PARA OS TRÊS RÉUS: REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA E DETRAÇÃO: De acordo com o novel §2º, do art. 387, do CPP, o juiz deve efetuar a detração do período de custódia cautelar já cumprido, para efeito de fixação do regime inicial de cumprimento de pena. Infere-se dos autos que os acusados se encontram presos provisoriamente desde o dia 30/11/2024 até a data desta sentença, perfazendo o montante de 8 meses, tempo que não altera a fixação de regime inicial. Assim, tendo em vista o quantum de pena privativa de liberdade fixado, o período de custódia cautelar já cumprido e as circunstâncias judiciais, deve ser fixado o REGIME INICIAL FECHADO, com fulcro no art. 33, §2°, “a”, e §3°, c/c art. 34, ambos do CP e art. 387, §2º do CPP. Do tempo de pena a cumprir deverá ser abatido o período em que os acusados ficaram presos preventivamente. SUBSTITUIÇÃO DA PENA/SUSPENSÃO DA PENA: Incabível ao caso a substituição da pena privativa de liberdade aplicada por restritiva de direito ou multa, tendo em vista que a pena aplicada é superior a 4 (quatro) anos, conforme expressa vedação legal (art. 44, inciso I, do CP). Ademais, considerando que a pena privativa de liberdade é superior a 2 anos, é, também, vedada a suspensão condicional da pena (art. 77 do CP). MANUTENÇÃO DA PREVENTIVA: nego aos condenados o benefício de apelar em liberdade, em razão dos mesmos terem respondido ao processo submetidos à segregação cautelar e por entender que ainda estão presentes os pressupostos e fundamentos autorizadores da prisão preventiva, em especial, a garantia da ordem pública. Inclusive, conforme reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal, o direito de recorrer em liberdade não se aplica ao réu preso em flagrante delito ou preventivamente, que é condenado posteriormente no respectivo processo, através de sentença judicial, visto que o escopo principal do benefício referido é o de abrandar a necessidade de se custodiar o réu que, já estando em liberdade por ocasião do julgamento, pretende apelar da condenação imposta. DO VALOR DA INDENIZAÇÃO: Defiro o pedido formulado pelo Ministério Público quanto à fixação de indenização para a vítima (id. 108922050 - Pág. 3). Assim, fixo, com arrimo no art. 387, inciso IV, do CPP, o valor de R$48.000,00 (quarenta e oito mil reais), fixando o valor de R$16.000,00 (dezesseis mil reais) para cada réu, em favor do ofendido. VI. PROVIDÊNCIAS FINAIS: Sentença registrada e publicada eletronicamente. INTIMO, desde já, o Ministério Público e a Defesa acerca da presente sentença. EXPEÇA-SE INTIMAÇÃO PESSOAL E A GUIA PROVISÓRIA, POR SE TRATAREM DE RÉUS PRESOS. ENCAMINHE-SE as possíveis armas de fogo, munições e acessórios correlatos ao Comando do Exército; DESTRUA-SE eventuais aparelhos celulares, salvo considerável valor econômico; Com o trânsito em julgado, CERTIFIQUE-SE e: a) remeta-se Boletim Individual à Secretaria de Segurança Pública do Estado, caso existente nos autos. Dispenso desde já caso não tenha sido remetido pela Delegacia de Polícia; b) lance-se o nome do réu no rol dos culpados; c) expeça-se Guia de Execução definitiva, acompanhada dos documentos de praxe e remeta-se ao Juízo das Execuções Penais; d) comunique-se à Justiça Eleitoral para que fiquem suspensos os direitos políticos do réu, na forma do art. 15, III, da Constituição Federal, ressaltando-se que, nos casos de condenados pelos crimes indicados nos itens da alínea "e", do inciso I, do art. 1º da LC 64/90, deve ser feita diretamente por meio do site https://siscontaeleitoral.mpf.mp.br/formulario.php. Por fim, ARQUIVE-SE. Conde/PB, data e assinatura digitais. Lessandra Nara Torres Silva Juíza de Direito
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Processo nº 0810318-86.2024.8.15.2002
ID: 318955262
Tribunal: TJPB
Órgão: 4ª Vara Criminal da Capital
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0810318-86.2024.8.15.2002
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
AECIO FLAVIO FARIAS DE BARROS FILHO
OAB/PB XXXXXX
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IGOR DE LUCENA MASCARENHAS
OAB/PB XXXXXX
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LUCAS MENDES FERREIRA
OAB/PB XXXXXX
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA COMARCA DE JOÃO PESSOA Juízo do(a) 4ª Vara Criminal da Capital Av. João Machado, 394, Centro, JOÃO PESSOA - PB - CEP: 58013-520 Tel.: ( ) ; e-mail: Telefone do Telejudi…
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA COMARCA DE JOÃO PESSOA Juízo do(a) 4ª Vara Criminal da Capital Av. João Machado, 394, Centro, JOÃO PESSOA - PB - CEP: 58013-520 Tel.: ( ) ; e-mail: Telefone do Telejudiciário: (83) 3216-1440 ou (83) 3216-1581 v.1.00 Nº do Processo: 0810318-86.2024.8.15.2002 Classe Processual: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Assuntos: [Crime / Contravenção contra Criança / Adolescente, Estupro de vulnerável] AUTOR: DELEGACIA ESPECIALIZADA DE REPRESSÃO AOS CRIMES CONTRA INFÂNCIA E A JUVENTUDE DA CAPITAL, M. P. D. E. D. P. REU: F. P. C. L. SENTENÇA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. MÉDICO PEDIATRA. ABUSO DE CONFIANÇA PROFISSIONAL. MÚLTIPLAS VÍTIMAS. PROCEDÊNCIA PARCIAL. PRELIMINARES PROCESSUAIS. Indeferimento de oitiva de assistente técnico e limitação do rol de testemunhas de defesa. Ausência de cerceamento de defesa. Faculdade judicial fundamentada na discricionariedade do juiz e nos princípios da economia processual. Inteligência dos arts. 159, §3º, 184, 398 e 400, §1º, do CPP. Preliminares rejeitadas. VALORAÇÃO PROBATÓRIA. Crimes contra dignidade sexual. Palavra da vítima dotada de especial valor probatório quando corroborada por outros elementos de prova. Depoimentos coerentes e harmônicos entre as fases inquisitorial e judicial. Existência de testemunhas presenciais em alguns casos. Convergência probatória evidenciando modus operandi sistemático. Materialidade e autoria comprovadas em relação a duas vítimas. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. Ausência de depoimento direto de algumas vítimas. Prova testemunhal baseada exclusivamente em relatos de terceiros. Lapso temporal significativo. Ônus probatório não atendido pelo órgão ministerial. Aplicação do princípio in dubio pro reo. Absolvição fundamentada no art. 386, VII, do CPP. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. Dano moral presumido (in re ipsa) em crimes sexuais contra vulneráveis. Prescindibilidade de prova específica do abalo psicológico. Dupla função: compensatória e punitivo-pedagógica. Observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Fixação em montante adequado considerando gravidade dos fatos, intensidade do dolo e condição das partes. Art. 387, IV, do CPP. Vistos, etc. O Ministério Público do Estado da Paraíba ofereceu denúncia em 18/08/2024, recebida por este juízo em 23/08/2024 (ID 99014812), em desfavor de F. P. C. L., qualificado nos autos, imputando-lhe, em tese, a prática de quatro crimes de estupro de vulnerável (art. 217-A, c/c art. 61, II, "g", e art. 69 do Código Penal). Posteriormente, foi apresentado aditamento à denúncia, incluindo um quinto fato criminoso supostamente praticado contra a vítima Lívia Araújo Nunes, à época com quatro anos de idade, em data estimada entre 2013 e 2014. O aditamento foi juntado sob ID 99003695. O acusado foi pessoalmente citado em 12/09/2024 (ID 100202341), apresentando resposta à acusação com arguição de preliminar de inépcia da denúncia (ID 100834080), a qual foi rejeitada por decisão judicial em 30/09/2024 (ID 100938863). Na mesma decisão, foi designada audiência de instrução e julgamento para o dia 29/10/2024, com previsão de continuidade no dia 30/10/2024, caso necessário. A audiência de instrução e julgamento foi realizada nos dias 29 e 30 de outubro de 2024, ocasião em que foram ouvidas as testemunhas arroladas pela acusação e defesa, bem como as vítimas, sob a forma de escuta protegida. O interrogatório do réu foi colhido ao final. Durante a fase instrutória, a pedido do Ministério Público, foi decretada a prisão preventiva do réu por decisão da 2ª Câmara Criminal do TJPB, após provimento de recurso em sentido estrito, conforme registrado no ID 103854624, tendo sido o mandado cumprido em 10/03/2025 no Estado de Pernambuco. A defesa impetrou habeas corpus e, ainda, requereu a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, o que foi indeferido por este juízo em decisão fundamentada, estando o réu preso atualmente. Encerrada a instrução e realizadas as diligências finais, as partes apresentaram alegações finais por memoriais. O Ministério Público pugnou pela condenação do acusado nos termos da denúncia, destacando a consistência, firmeza e coerência dos relatos das vítimas, a posição de confiança ocupada pelo réu e a convergência dos elementos probatórios. A assistente de acusação reforçou a tese ministerial, sublinhando o impacto psicológico dos crimes nas vítimas e a reincidência do comportamento abusivo do acusado ao longo dos anos, sustentando a necessidade de aplicação de pena privativa de liberdade em regime fechado. A defesa técnica, por sua vez, requereu a absolvição, sob o fundamento de ausência de provas seguras quanto à materialidade e autoria, alegando contradições nos depoimentos, inexistência de prova técnica conclusiva e apontando para motivações pessoais e interesses patrimoniais por parte de familiares das vítimas. Antecedentes criminais (ID 115354499). Autos conclusos para sentença. É o relatório. Passo a decidir: Ao réu F. P. C. L. é atribuída a prática de estupro de vulnerável, por haver cometido atos libidinosos contra as vítimas Maria Luíza Lins Queiroga Pontes, Maria Júlia Werlang Veríssimo Leite, Alice Raquely Oliveira de Rocha Santiago e Lívia Araújo Nunes, com a agravante prevista no art. 61, II, "g" do Código Penal. Dispositivos legais aplicáveis: Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: II - ter o agente cometido o crime: g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão; Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. O processo tramitou regularmente seguindo os trâmites legais e obedecendo os princípios da ampla defesa e do contraditório, inexistindo irregularidades a sanar. Entretanto, antes de adentrar no mérito, considerando as alegações da defesa, passo a analisar as preliminares arguidas: 1) Indeferimento da oitiva do perito técnico: O mencionado profissional ao qual se refere a defesa é o que assina o parecer técnico contido no ID100834080 onde faz uma análise detalhada de toda a movimentação processual até a denúncia, discorrendo sobre os laudos periciais, falsas memórias e outras questões de ordem psicológica, além de explicar o que é vulvovaginite, alterações cognitivas e comportamentais no idoso e finalmente conclui não haver prova do suposto abuso. A inquirição do assistente técnico não é obrigatória, mas sim uma faculdade das partes e do juiz, dependendo das circunstâncias do caso. Observe-se que a indicação de assistente técnico é uma faculdade da parte e seu parecer é considerado uma prova unilateral. Portanto, a decisão sobre o indeferimento da inquirição do assistente técnico foi fundamentada pelo juiz que presidiu a audiência o qual não considerou necessários esclarecimentos adicionais. Trago à colação, casos semelhantes na jurisprudência para ilustrar: HABEAS CORPUS CRIMINAL. HOMICÍDIO CONSUMADO, POR DUAS VEZES. TRIBUNAL DO JÚRI. CERCEAMENTO DE DEFESA . LAUDO PERICIAL DE CONFRONTO FACIAL ACOSTADO ÀS VÉSPERAS DA SESSÃO DE JULGAMENTO. PEDIDO DE SUSPENSÃO. NÃO CONHECIMENTO. PERDA DE OBJETO . SESSÃO DE JULGAMENTO CANCELADA E JÁ REDESIGNADA. MÉRITO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE HABILITAÇÃO DE ASSISTENTE TÉCNICO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E PLENITUDE DE DEFESA E A PARIDADE DE ARMAS . NÃO ACOLHIMENTO. MAGISTRADO QUE AGIU AMPARADO NA PREVISÃO DO ART. 400, § 1º, DO CPP. ÂMBITO DE DISCRICIONARIEDADE . RELEVÂNCIA DA PRODUÇÃO DA PROVA NÃO DEMONSTRADA. LAUDO PERICIAL INCONCLUSIVO. BAIXA DEFINIÇÃO DAS MÍDIAS DISPONIBILIZADAS PARA O CONFRONTO FACIAL. PERÍCIA QUE NÃO SE REVELOU DESFAVORÁVEL AO PACIENTE. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 523 DO STJ. INDEFERIMENTO MANTIDO . CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO.ORDEM DENEGADA. (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0038634-78 .2022.8.16.0000 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR NILSON MIZUTA - J. 20.08.2022) (TJ-PR - HC: 00386347820228160000 Londrina 0038634-78 .2022.8.16.0000 (Acórdão), Relator.: Nilson Mizuta, Data de Julgamento: 20/08/2022, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 22/08/2022) EMENTA: PROCESSUAL PENAL . CORREIÇÃO PARCIAL. HABILITAÇÃO DE ASSISTENTE TÉCNICO E SUA OITIVA JUDICIAL. QUESITAÇÃO A SER RESPONDIDA. PLEITOS FORMULADOS HORAS ANTES DA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO . INDEFERIMENTO. PRODUÇÃO DE PROVAS REPUTADA IRRELEVANTE E IMPERTINENTE. DECISÃO FUNDAMENTADA. LEGALIDADE . ART. 400, § 1º, CPP. VÍTIMA NÃO ARROLADA NA PEÇA ACUSATÓRIA. OITIVA ANTES DAS TESTEMUNHAS . IMPOSSIBILIDADE. ART. 411, CPP. VIOLAÇÃO NÃO CONFIGURADA . DESPROVIMENTO. 1. O art. 159, § 3º do CPP faculta às partes a indicação de assistente técnico e a formulação de quesitos a seres respondidos pelos peritos oficiais quando da realização de perícia na fase judicial . 2. A oitiva de peritos para esclarecer perícias já realizadas ou para responder a eventuais quesitos formulados nos autos, encontra previsão legal, facultada a indicação de assistente técnico para oferta de parecer ou para inquirição durante a instrução criminal. 3. Incumbe ao requerente demonstrar a relevância da prova a ser produzida, para o deslinde da causa, cabendo ao juiz analisar a pertinência da prova requerida, podendo indeferi-la, por meio de decisão fundamentada, se reputá-la desnecessária ( CPP, art. 184) 4. O pedido de habilitação de assistente técnico e de oferta de quesitos a serem respondidos pelos peritos oficiais foi formulado, sem qualquer justificativa, horas antes da audiência de instrução e julgamento aprazada, às vésperas do término da coleta de provas. 5. Alegando nítido viés procrastinatório, o juiz primevo indeferiu os pleitos por reputá-los dispensáveis, ante a ausência de perícia na fase judicial ou oitiva de peritos oficiais, a justificar a habilitação de assistente técnico, tampouco a inquirição de assistente técnico. 6. Ante a motivação expendida e a discricionariedade atribuída ao juiz na análise de requerimentos de produção de provas (art. 400, § 1º, CPP), não se vislumbra inversão tumultuária de ato processuais. 7 . Por não integrar o rol da denúncia, a oitiva da vítima sobrevivente não poderia observar a ordem prevista no art. 411 do CPP. 8. Correição Parcial desprovida, Decisão unânime . A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Correição Parcial em que figuram como partes as acima referidas. ACORDAM os Desembargadores componentes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Pernambuco, em sessão realizada nesta data, por unanimidade, pelo desprovimento do recurso, nos termos do relatório, votos e demais peças que juntas integram o aresto. Recife, data da assinatura eletrônica. Des . Fausto Campos Relator. (TJ-PE - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 0018208-81.2022.8.17 .9000, Relator: FAUSTO DE CASTRO CAMPOS, Data de Julgamento: 30/11/2023, Gabinete do Des. Fausto de Castro Campos) Assim, não há que se falar em nulidade ou cerceamento de defesa em razão do indeferimento da oitiva do assistente técnico. 2) Indeferimento de oitiva das testemunhas – redução do rol: O Juízo, ao designar data para audiência de instrução e julgamento, determinou a limitação do número de testemunhas de defesa a oito, fundamentando tal decisão no disposto no artigo 398 do Código de Processo Penal. Durante a audiência de instrução foram efetivamente ouvidas oito testemunhas arroladas pela defesa, além de Fernanda Cunha Lima, filha do réu. O fundamento para o indeferimento das demais testemunhas baseou-se no entendimento de que, embora existam quatro vítimas, a conduta delitiva e o tipo penal são unitários - estupro de vulnerável -, não justificando a oitiva de número excessivo de testemunhas que pudessem tornar o ato processual protelatório ou desnecessário. A alegação de cerceamento de defesa não prospera pelos seguintes fundamentos: primeiro, porque a limitação do rol testemunhal foi determinada na decisão de saneamento do processo, em momento anterior à audiência de instrução, observando-se o contraditório e a ampla defesa; segundo, porque a defesa teve plena ciência de tal decisão e manteve-se inerte, não interpondo o recurso cabível para questioná-la; terceiro, porque o número de testemunhas deferidas (oito) mostra-se razoável e suficiente para a comprovação dos fatos alegados pela defesa; e, por fim, porque o artigo 398 do Código de Processo Penal expressamente autoriza o juiz a limitar o número de testemunhas quando entender que a prova oral poderá ser produzida em menor número, sem prejuízo para as partes. Ademais, o princípio da economia processual e a busca pela celeridade na prestação jurisdicional autorizam tal limitação, desde que não comprometa o direito ao contraditório e à ampla defesa, o que não se verifica no presente caso, tendo em vista que foi assegurado à defesa número suficiente de testemunhas para demonstrar suas alegações. Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. O réu nega a autoria delitiva em relação a todas as vítimas, inicialmente diz não saber a quem atribuir a acusação, que tem mais de 50 anos de exercício de pediatria e nunca recebeu acusação nesse sentido. Alega que os fatos criados pelas sobrinhas não são verdadeiros e não sabe o motivo da acusação. Que quando vai examinar as crianças faz o exame por baixo da roupa para não ferir o pudor da criança, para não tirar a roupa dela. Negou que tenha pegado no seio da adolescente por trás quando ela estava na balança. Negou peremptoriamente todas as acusações. Diz que em todas as consultas, a mãe ou o pai estão presentes. Que já atendeu mais de 150.000 crianças. Examina as crianças normalmente. Que no atendimento de Maria Luiza apalpou a região da bexiga anterior ao púbis mas não tocou sua vagina. Explicou o que é vulvovaginite. Fez cirurgia radical de próstata há 22 anos. Após a retirada da próstata, em outras palavras disse que não tem vontade de fazer sexo, "nem mesmo com o azulzinho". Ao final falou que tudo isso deve ser uma armação. No âmbito dos crimes contra a dignidade sexual envolvendo vítimas vulneráveis, a jurisprudência pátria tem consolidado o entendimento de que o depoimento da vítima assume relevância probatória especial, considerando-se a natureza intrinsecamente clandestina desses delitos, que comumente ocorrem sem a presença de testemunhas presenciais. O Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente reconhecido que a palavra da vítima em delitos sexuais, particularmente nos casos de estupro de vulnerável tipificado no artigo 217-A do Código Penal, detém força probatória qualificada, devendo ser valorada com especial deferência pelo julgador. Tal posicionamento fundamenta-se na compreensão de que a ausência de testemunhas diretas não pode constituir óbice à persecução penal, sob pena de se conferir impunidade a condutas de extrema gravidade. Contudo, impende ressaltar que a valoração do depoimento da vítima deve observar o princípio da persuasão racional, sendo imperativo que tal elemento de convicção seja cotejado com o conjunto fático-jurídico produzido nos autos. A análise judicial deve abranger não apenas a declaração da vítima, mas também os depoimentos testemunhais, os laudos periciais, os exames de corpo de delito e demais meios de prova que possam corroborar ou infirmar a versão acusatória. Especial atenção deve ser dispensada à avaliação da credibilidade e coerência do relato da vítima, mormente quando se tratar de menor de idade, hipótese em que se recomenda a realização de escuta especializada por profissionais habilitados, em conformidade com as diretrizes estabelecidas pela Lei nº 13.431/2017, com vistas a preservar a integridade psicológica da criança ou adolescente e a evitar a ocorrência de revitimização ou a formação de falsas memórias que possam comprometer a fidedignidade do depoimento. CASO MARIA LUÍZA LINS QUEIROGA PONTES Depoimento da vítima em juízo: Maria Luiza discorreu sobre o atendimento médico extraindo-se o seguinte: "que estava precisando ver um negócio no pé ou no seu corpo, como estava se desenvolvendo... foi deitar na maca, ele examinou, fez tudo e no final, quando minha mãe saiu de perto, em todo o tempo minha mãe estava perto de mim... só que quando acabou a sessão, ela pensou que tinha acabado foi sentar na cadeira... aí ele começou: 'Deita Malu'... aí começou pegando nas minhas partes íntimas... perguntou se tava doendo... aí minha mãe levantou da cadeira porque estranhou a demora. Quando minha mãe se aproximou ele estava com um braço para minha mãe não vê. Ele tentou fingir que estava fazendo cócegas em mim... ele falou o que tinha para falar sobre remédio e fomos embora sem falar com ele." Voltando a falar sobre a consulta: "chegou lá eu dei um abraço nele e ele entrou para o consultório. Não faz sentido, eu estava com ele desde os meus nove meses de vida e agora estava com nove anos, muito tempo." Essa foi a primeira vez que aconteceu e foi só uma vez. "...que quando acabou a sessão permaneceu na maca, ele pediu para ela deitar na maca, foi nessa parte que começou. Ele começou a mexer nas minhas partes íntimas com a mão. Estava com um short e uma blusa." A criança pega um ursinho que havia na sala de depoimento e coloca o dedo no meio das pernas do brinquedo, pressionando para mostrar como o pediatra fez com ela. "Que chama partes íntimas de pipiu. Que ele perguntou se ela queria por cima ou por baixo da roupa. Que estava doendo. Ele passava o cotovelo e passava a mão. Que depois disso não vai para médico homem de jeito nenhum." Depoimento da vítima na delegacia: Perguntando à declarante o que a fez comparecer nesta especializada no dia de hoje (25/07/2024), relatou a autoridade policial, durante escuta especial (art. 7º da Lei 13.431/2017), que "ontem foi fazer um exame no pediatra, ele já me acompanha desde que eu sou pequena, desde os meus 09 meses; aí ele fez o exame e quando já tinha acabado o exame e ele pediu pra eu me deitar, aí eu me deitei, eu confiava nele; ele pediu pra eu abrir as pernas e tava apertando com muita força, aí ele perguntou qual o melhor por baixo ou por cima e eu disse por cima, aí ele foi por cima e depois por baixo; tava doendo muito mas eu tava com vergonha, aí não tive coragem de falar; tava doendo muito, nunca doeu tanto na minha vida; ele ficava apertando com muita força, lá no fundo; aí teve uma hora que ele ficou esfregando pra um lado e pro outro." Depoimento da mãe W. C. L. Q. na delegacia: Narra a declarante que é mãe de Maria Luiza (9 anos), que a sua filha é acompanhada desde bebê pelo pediatra F. P. C. L., que atualmente está fazendo um acompanhamento semanal com o pediatra Fernando; que essa semana a sua filha apresentou um episódio de amigdalite e precisou antecipar a consulta, que levou a sua filha hoje para ser consultada com o pediatra Fernando na clínica sem nome localizada na Rua Deputado José Mariz, 503, Tambauzinho; que a consulta aconteceu normalmente, que a todo momento ficou ao lado da sua filha enquanto o pediatra a examinava, que ao final do exame, enquanto o médico dava orientações, por estar cansada decidiu sentar-se em uma cadeira que fica posicionada de costas para a maca que a sua filha estava, que enquanto ele dava orientações, ele se posicionou em frente à maca e de uma forma que "tampava" a sua visão em relação à sua filha, que percebeu que ele interagia com ela enquanto explicava, mas que ela permanecia deitada, que em determinado momento sentiu algo estranho e decidiu levantar-se e ver o motivo da sua filha não levantar da maca, por qual motivo ela estava demorando tanto a descer e ir para perto dela, que ao levantar presenciou a mão do pediatra Fernando nas partes íntimas da sua filha (que ela estava completamente vestida na hora), que presenciou o pediatra fazendo movimentos de masturbação nas partes íntimas da sua filha, que não foi apenas uma passagem de mão, que presenciou os movimentos, que sua filha estava com a feição assustada, que ficou sem reação e apenas retirou-se da sala, que após ser flagrado, o médico ficou desnorteado. Que ao chegar em casa perguntou para a sua filha sobre o acontecido, que ela disse que o médico colocou a mão por dentro do seu short, que ele tinha feito isso com bastante força, que estava sentindo dor, que não falou antes, pois estava com vergonha e medo, mas decidiu confidenciar o acontecido para a sua mãe, pois estava sentindo dores na região íntima. Depoimento da mãe em juízo:Wanessa confirma as palavras da filha, inclusive que se afastou quando a consulta terminou, mas o pediatra pediu que a menina se deitasse novamente, como percebeu que ela estava demorando a levantar, a depoente se aproximou e "presenciou ele fazendo movimentos de masturbação por cima do short de sua filha." Diz que o réu não percebeu sua aproximação mas quando viu que ela viu a cena pediu para a outra filha, irmã de Maria Luiza fazer cócegas nela, como forma de disfarçar. Jainara Lins Queiroga Formiga confirmou que Wanessa ainda no consultório ligou para a depoente e quando saiu de lá foi até sua casa, totalmente transtornada em pânico, sem saber o que fazer. Ela e o esposo Danilo conversaram com Wanessa. Que Wanessa indicava o médico a várias pessoas e tinha grande confiança nele. O marido Danilo também foi ouvido e presenciou o estado de nervos como chegou Wanessa após sair do consultório e por considerar um caso grave aconselhou a mãe e o pai da vítima a procurarem a delegacia. Verifica-se absoluta harmonia entre as declarações prestadas na fase inquisitorial e em sede judicial. Observa-se que o relato da vítima encontra-se em perfeita consonância com o depoimento da genitora, configurando-se, no presente caso, a excepcional circunstância de haver testemunha presencial dos fatos delituosos, situação que, conforme já mencionado, raramente se verifica em crimes dessa natureza. A convergência desses elementos probatórios confere robustez ao conjunto probatório e conduz à convicção inequívoca acerca da materialidade e autoria do crime de abuso sexual perpetrado contra a vítima Maria Luíza Lins Queiroga Pontes. Quanto ao Laudo de exame sexológico juntado às fls. 11 do ID 9822996, que concluiu que “Apresenta sinais de processo irritativo inflamatório genital (vulvovaginite da infância)”, não considero como documento indispensável à comprovação do estupro, uma vez que se mostrou que o crime se consumou pela prática de atos libidinosos, portanto explorar a “vulvovaginite” como sendo causada ou não pelo ato do réu em tocar as partes íntimas da vítima não modifica a conclusão de que efetivamente a materialidade e autoria estão comprovadas pelo depoimento da vítima e sua mãe. Saliento que as investigações se iniciaram quando Wanessa Castor, muito indignada compareceu à delegacia para registrar a ocorrência no dia 25 de julho de 2024. Consta que, após a sua iniciativa, outras mães/representantes de vítimas tomaram a iniciativa de também denunciar. CASO ALICE RAQUELY OLIVEIRA DA ROCHA SANTIAGO Depoimento da vítima em juízo: Alice Raquely Oliveira da Rocha Santiago, prestou depoimento especial, dizendo que: "sofreu o abuso antes, mas ficou em silêncio porque sua mãe lhe disse que ele era de uma família importante e não tinham dinheiro para pagar advogado... tinha 13 anos na época do fato... eu ia para o médico desde que nasci. Descreveu com riqueza de detalhes o que aconteceu durante a consulta. Ele esfregou o braço em sua vagina... quando foi examinar sua barriga o braço roçou na vagina. O médico elogiava seu corpo. 'Uma menina bonita dessa querendo engordar, vai ficar igual a Jojo Todynho'. Quando estava na balança ele apalpou seus seios por trás." Depoimento da avó Genilza Oliveira da Rocha em juízo: A avó GENILZA OLIVEIRA DA ROCHA acompanhou Alice à consulta quando estava gripada e tossindo para se consultar com o réu, disse em Juízo que "ele ‘chamou ela’ para fazer o exame na maca. Quando ela se deitou na maca ele colocou o aparelho de escuta por debaixo da blusa dela e fez movimentos como estava acariciando os peitos dela. Ficou sem acreditar que estava acontecendo... além de colocar o aparelho para escutar ainda colocou o cotovelo na vagina dela fazendo uma flexão de movimento e pediu para ela respirar... sentada, não via o movimento da mão dele no seio dela mas via o movimento do cotovelo dele na vagina dela e pedindo para ela respirar mais rápido, a menina já ficando ofegante, foi aí que ela pediu para a neta parar pois já estava cansada... ouviu o médico dizendo, tá gostozinho... Em razão da confiança, ficou em dúvida de que aquilo realmente estivesse acontecendo... depois ele a levou para a balança que ficava na frente dela. O médico ficou de costas de novo para a depoente, confessa que não viu ele acariciando o seio dela, mas a neta lhe contou que ele alisou seus peitos... ficou com medo de denunciar por ser ele um médico famoso e conceituado... viu muitas vezes o réu elogiando o corpo de Alice e dizia que tinha um neto que queria levar para namorar com Alice... viu o médico debruçado com o cotovelo sobre sua neta." Depoimento da avó na delegacia: "que é avó materna de Alice de 14 anos de idade e não se recordando o mês, sabendo que foi no primeiro semestre de 2023 acompanhou sua neta em uma consulta com o pediatra Dr. Fernando Cunha Lima; que ficou presente o tempo todo e começou a estranhar quando o médico começou a alisar os peitos de sua neta; que a forma que ele apalpou os seios de Alice estava estranho; que como Alice estava gripada, o médico pegou o estetoscópio para fazer exame no pulmão; que a depoente o viu colocando o aparelho no meio dos seios e o braço entre a parte íntima de Alice; que Dr. Fernando a mandou respirar forte e a depoente achou estranhou novamente essa atitude, pois ele estava roçando o braço na parte íntima de Alice; que a depoente o mandou parar dizendo que Alice estava cansada; que em seguida, ele a mandou subir na balança e ele se posicionou por trás da adolescente e como ele é grande, a depoente não conseguiu ver, mas Alice disse que nessa hora ele pegou novamente nos seios dela; que ao sair da consulta, comentou com Alice que não havia gostado e ela disse que também não tinha gostado." Da análise minuciosa dos depoimentos de Alice e sua genitora emerge a certeza absoluta quanto à ocorrência do abuso sexual contra a menor, que demonstrou visível constrangimento e abalo emocional durante sua oitiva judicial. Não se submeteu a vítima a exame sexológico em virtude da data do fato e ainda porque a ação não foi revestida de violência real tendente a deixar vestígio, porém tanto a autoria e materialidade dos atos libidinosos encontram-se configuradas. Revela-se particularmente significativo o fato de que as narrativas das vítimas, que não mantinham qualquer relação de conhecimento entre si, apresentam detalhes substancialmente convergentes, tais como o emprego do cotovelo para contato com as partes íntimas, os elogios dirigidos aos corpos das ofendidas e o sentimento de desapontamento experimentado ao descobrirem que o profissional médico em quem depositavam confiança não se mostrava digno de tal credibilidade. Tal descoberta causava nas depoentes tamanha perplexidade que chegavam a questionar a veracidade do que presenciavam, demonstrando a quebra da relação de confiança estabelecida com o agente delitivo. A convergência desses elementos probatórios, especialmente nos casos de Maria Luíza e Alice, cujos depoimentos foram corroborados por testemunhas presenciais, permite identificar um padrão comportamental específico e reiterado por parte do acusado. A análise sistemática dos depoimentos válidos evidencia a existência de um modus operandi bem definido: durante as consultas médicas, o réu valia-se deliberadamente de seu cotovelo no momento da ausculta para estabelecer contato com as partes íntimas das meninas, indagava se o toque era prazeroso, provocava cócegas de forma inadequada e dirigia elogios impróprios ao corpo das crianças. Tal padronização de conduta reforça a credibilidade dos relatos e demonstra a premeditação dos atos libidinosos praticados pelo acusado. Além dos depoimentos anteriormente comentados, também constam os seguintes testemunhos: Depoimento de Leonardo França Lucena, tem filhos que são pacientes do pediatra há vários anos, tem total confiança nele e disse que nunca verificou nenhum comportamento estranho no réu. Maria de Fátima Fernandes também é mãe de paciente, seguindo a mesma linha de Leonardo, reforçou o grau de credibilidade que tem no réu e acrescenta que viu a mãe de Maria Júlia sair normalmente do consultório. Quanto a estes depoimentos, não há provas nos autos de que o réu abusava de todos os seus pacientes, segundo ele mais de 150.000, por isso é natural que apareçam testemunhas para relatar o que o Sr. Leonardo relata, porém ele não estava no dia e hora no local do fato, portanto não pode se considerar seu testemunho como meio hábil de prova para a inexistência do crime. Da mesma forma, Maria de Fátima não participou da consulta. Valdilene de Oliveira, secretária do médico, nunca presenciou nenhum crime, o que já era de se esperar. Não há como admitir que uma senhora de conduta ilibada, tenha trabalhado num consultório de pediatria por 40 anos, presenciando atos de abuso sexual e não tivesse denunciado. Ouviu-se depoimentos de colegas de profissão do réu que vieram atestar sua boa conduta social e profissional. Foi deferida a inquirição da filha do réu, a Sra. Fernanda Gomes Cunha Lima, a qual trouxe ao processo questões familiares desencadeadas, segundo ela, quando Gabriela Cunha Lima aos 09 anos de idade contou que foi abusada por seu tio. Segundo a depoente, as denúncias atuais são uma armação das primas em conjunto com a mãe no intuito de influenciar as famílias das vítimas neste processo. Ocorre que nem mesmo o réu se referiu a essa suposta armação de forma específica, falou em “armação” mas não detalhou em que consistiria. Esta versão é fantasiosa e não encontra respaldo nos depoimentos trazidos aos autos. QUESTÕES MÉDICAS E OUTRAS ALEGAÇÕES O réu alegou em seu interrogatório que há mais de vinte anos se submeteu a procedimento cirúrgico de prostatectomia radical, com remoção total da próstata em decorrência de neoplasia maligna naquele órgão. Em tom depreciativo, o acusado afirmou que "nem o azulzinho" surtiria efeito, referindo-se à impossibilidade de obter ereção após o procedimento cirúrgico mencionado. Contudo, mediante pesquisa em literatura médica especializada, verificou-se a existência de diversos estudos científicos que demonstram que a prostatectomia não constitui fator determinante para a perda da capacidade erétil. Não obstante a extirpação do órgão, o paciente não perde necessariamente a libido, que consiste na energia ou impulso sexual. A libido representa a energia vital que impulsiona o ser humano, não se limitando exclusivamente ao desejo sexual, ao passo que a lascívia constitui uma manifestação patológica desse impulso, caracterizada pelo desejo exacerbado e obsessivo que pode direcionar o indivíduo a buscar objetos sexuais inadequados ou socialmente reprováveis, como menores de idade. Em sua obra Tratado de Crimes Sexuais, Nucci assim discorre sobre o tema: "3.8.7 A impotência sexual e o estupro A atual figura do estupro contempla a possibilidade de realização do delito por meio da conjunção carnal (cópula entre pênis e vagina) e outros atos libidinosos (atos sexuais aptos a satisfazer a libido), não se exigindo orgasmo ou ejaculação. Por isso, é irrelevante que o pênis do agente não fique ereto, pois ele pode obrigar a vítima a qualquer ato libidinoso, como esfregar o pênis flácido no corpo nu da ofendida, sendo dispensável que ele tenha qualquer prazer sexual efetivo. Ademais, outros atos libidinosos podem ser praticados, independente da ereção do pênis, em razão de disfunção erétil, permitindo ao agente experimentar a sensação de satisfação da lascívia. Ressalte-se que o orgasmo pode ser obtido pelo estímulo cerebral, diante de situação excitante, independentemente até de contato físico. Por isso, é viável o estupro sem contato físico ou mesmo com o pênis flácido. Há casos de pacientes paraplégicos, com lesão na medula, que processam no cérebro experiências sexuais anteriores e conseguem atingir o orgasmo, sem ereção e sem ejaculação."(Editora Forense, Fls. 74) Esta explanação visa esclarecer que, ainda que se admita como verdadeira a alegação de disfunção erétil apresentada pelo réu, tal circunstância não constitui elemento impeditivo ou excludente da prática dos atos libidinosos imputados na denúncia. Outra alegação da defesa é que a forma de examinar as pacientes era normal e cita trecho de livro de Semiologia Médica, ocorre que no mesmo texto, aposto nas alegações existem uma orientação de como deve se proceder a consulta, que difere bastante do procedimento adotado pelo réu: "O paciente deverá estar sentado de costas para o examinador, com as mãos nos joelhos e tórax desnudo. Em mulheres, deve-se evitar a exposição das mamas, cobrindo-as com um lençol na parte da frente, que deverá ficar preso pelas axilas da paciente. Desse modo, o dorso fica livre para o exame, assim como as paredes laterais e a porção superior da parte anterior do tórax. Não é aceitável examinar o paciente sobre as vestes. Isso vale para todo exame físico, particularmente na ausculta, em que o estetoscópio sempre deverá estar em contato com a pele do paciente. Em pacientes impossibilitados de sentar, examinaremos o paciente deitado. Nesses casos, a parede posterior será examinada colocando o paciente de lado, por vezes com a ajuda de um auxiliar. Evidentemente, o exame do paciente deitado impõe diversas restrições." Não era essa a posição adotada pelo pediatra nos casos trazidos ao processo. Maria Luíza estava deitada de frente e foi auscultada tendo a mão do médico sido colocada por dentro da roupa, com ela de frente para ele. Donde se conclui, até pela fonte trazida pela defesa, que não era a posição apropriada, além do fato dessa paciente não ter ido ao médico naquela oportunidade com problemas urinários e sim por apresentar amidalite. Desclassificação: Alternativamente, a defesa pede a desclassificação do delito de estupro de vulnerável para importunação sexual o que é inviável. O STJ tem reiteradamente afirmado que a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos configura crime de estupro de vulnerável, independente da ligeireza ou superficialidade da conduta. A jurisprudência consolidada no Tema Repetitivo 1121 do STJ reforça que, presente o dolo específico de satisfazer à lascívia, a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos não pode ser desclassificada para o delito de importunação sexual. Ademais, o artigo 217-A do Código Penal estabelece uma presunção absoluta de violência ou grave ameaça o que não ocorre na importunação sexual. Trago à colação jurisprudência que consolida meu entendimento: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. IMPOSSIBILIDADE . CONSUMAÇÃO CONFIGURADA. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1 . Para a consumação do crime de estupro de vulnerável, basta a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, sendo suficiente a conduta de passar a mão no corpo da vítima, ou a prática de qualquer ato de libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima, o que se evidenciou na espécie. 2. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo 1121, fixou a tese de que, presente o dolo específico de satisfazer à lascívia, própria ou de terceiro, a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos configura o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), independentemente da ligeireza ou da superficialidade da conduta, não sendo possível a desclassificação para o delito de importunação sexual (art . 215-A do CP). 3. Lastreada a condenação em conjunto probatório contundente colhido nas fases inquisitorial e judicial, incabível a desclassificação da conduta. 4 . Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 745846 SP 2022/0164571-7, Relator.: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 06/03/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/03/2023) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PROVAS SUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO . PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA POR OUTRAS PROVAS. ALTERAÇÃO QUE DEMANDA REANÁLISE FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ . DESCLASSIFICAÇÃO PARA IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. TEMA N. 1121. IMPOSSIBILIDADE . DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONDUTA SOCIAL. VALORAÇÃO NEGATIVA COM BASE EM ELEMENTOS CONCRETOS E IDÔNEOS . REGIME FECHADO. ART. 33, §§ 2º E 3º, DO CÓDIGO PENAL - CP. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO . AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior posicionou-se no sentido de que, em crimes de natureza sexual, à palavra da vítima deve ser atribuído especial valor probatório, pois, geralmente, são cometidos de forma clandestina, sem testemunhas e sem deixar vestígios. Na hipótese, a condenação foi respaldada em provas suficientes, tendo em vista que a palavra da vítima não se encontra isolada nos autos, uma vez que corroborada pelos depoimentos testemunhais colhidos em juízo, possuindo peso preponderante sobre demais elementos de prova . 2. Nesse contexto, para se concluir de modo diverso, afastando a conclusão das instâncias ordinárias acerca da prática delitiva, seria necessário o revolvimento fático-probatório, vedado conforme Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça - STJ. 3 . Sobre o pleito desclassificatório, a questão foi pacificada nesta Corte em julgamento de recurso especial repetitivo, REsp n. 1.954.997/SC, no qual se firmou a tese (Tema n . 1121) de que "presente o dolo específico de satisfazer à lascívia, própria ou de terceiro, a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos configura o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), independentemente da ligeireza ou da superficialidade da conduta, não sendo possível a desclassificação para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP)". 4 . Arrolados elementos concretos e não inerentes ao tipo penal para elevação da pena-base, não há se falar em ilegalidade da dosimetria.O magistrado a quo considerou negativa a circunstância judicial da conduta social, pois de acordo com o testemunho de familiares teria cometido outros abusos sexuais com pessoas da família, fundamento que se revela idôneo para o aumento da pena na primeira fase do cálculo. 5. Diante do quantum de pena, o regime fechado é o correto nos termos do art . 33, §§ 2º e 3º, do CP. 6. Inviável o recurso especial pela alínea c do permissivo constitucional, pois, além da incidência das Súmulas n. 83 e n . 7 deste Pretório, não foi realizado o cotejo analítico e não comprovada a similitude fática entre o aresto recorrido e os trazidos à colação, nos termos dos arts. 1.029, § 1º, do Código de Processo Civil/2015 - NCPC e 255, § 1º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça - RISTJ. 7 . Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no AREsp: 2317583 SP 2023/0081591-8, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 11/03/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/03/2024) Passo agora a analisar os casos das vítimas que não prestaram depoimento mas suas genitoras compareceram à delegacia para fazer a queixa: CASO MARIA JÚLIA WERLANG VERÍSSIMO LEITE A criança não prestou depoimento, mas sua genitora Marcela Werlang dos Santos, ao tomar conhecimento de fatos envolvendo outras crianças, foi à delegacia e prestou queixa contra o réu alegando o seguinte: "QUE, afirma a depoente que é genitora de MARIA JULIA WERLANG VERISSIMO LEITE, que atualmente tem 08 anos de idade; QUE, afirma ainda a depoente que sua filha, após ter um problema de saúde e sua médica não ter condições de atendê-la, ela depoente procurou o Dr. F. P. C. L., médico pediatra nesta cidade de João Pessoa/PB, indicado por uma outra pessoa para que atendesse sua filha quando esta tinha dois anos de idade, o que perdurou por um bom tempo; QUE, afirma a depoente que levou sua filha para ser atendida por FERNANDO PAREDES e quando do atendimento, notou que o mesmo havia deitado sua filha em uma maca e quando auscultando a criança, aquele médico estava roçando seu cotovelo nas genitálias de sua filha; QUE, também informa a depoente que alguns dias depois, mais precisamente no dia 04/05/2023, ela depoente levou sua filha MARIA JULIA novamente para o Dr. FERNANDO PAREDES e novamente o médico deitou sua filha em uma maca e novamente passou a tomar a mesma atitude que a anterior, porém naquele momento em que passava seu cotovelo na genitália da criança, este chegava a perguntar à menor: TÁ GOSTOSO? ASSIM TÁ GOSTOSO?; QUE, informa a depoente que diante aquela situação, mesmo presenciando toda aquela situação, não teve qualquer reação, apenas chegou a gritar com sua filha perguntando se estava doendo, tendo sua filha respondido que não; QUE então, FERNANDO PAREDES parou e pediu para que sua filha caminhasse em sua direção para ver as perninhas dela; Que quando ela chegou perto FERNANDO PAREDES puxou ela pelo bumbum, apertando seu bumbum e abraçando-a novamente, e perguntando: O ABRAÇO ESTÁ GOSTOSO? QUE, informa a depoente que após aquela indagação por parte do médico, sua filha respondeu que estava, tendo o mesmo dito: Então vamos continuar. Abraçando a criança com mais força e ainda apalpando seu bumbum." Depoimento da mãe Marcela em juízo: MARCELA esclareceu que "passou a ser paciente do médico a partir dos 2 anos e 6 meses aproximadamente... estranhou porque durante uma consulta viu que ele passava o antebraço... que teve uma gratidão muito grande por ele porque sua filha estava correndo risco de vida porque quando foi para ele estava com problemas de apendicite e foi operada e ficou boa... que uma semana antes do dia 04 de maio do ano passado notou uma coisa diferente... ele apalpou a bunda da filha e a colocou para sentar no colo dele... comentou com o esposo e a cunhada mas continuou a levar a filha... no dia 04 de maio de 2023 foi o último dia que levou sua filha a ele... em todas as consultas ele auscultava e tocava nos gânglios por causa da cirurgia de apêndice... o médico mandava que ela respirasse bem fundo, com seu antebraço colado nela... em determinado momento ele disse, tá gostoso? Quando escutou isso, chegou a duvidar que estava escutando isso... ficou nervosa e gritou com sua filha dizendo Maria Julia tá doendo ou não está doendo... ele parou nesse momento e voltou para sua cadeira, mandou a criança ir até o final do corredor e voltar... até a cadeira dele e quando chegou na cadeira dele, ele a puxou apalpou sua bunda, e perguntou à menina se estava gostoso... que ele disse então continua no abraço... se sentiu impotente e depois disso não levou mais seus filhos a nenhum pediatra pois não conseguiu." Embora os depoimentos prestados pela Sra. Marcela apresentem coerência entre as declarações colhidas na fase inquisitorial e em sede judicial, tal elemento constitui testemunho indireto que, isoladamente considerado, não supre a necessidade de comprovação da materialidade e autoria delitivas, salvo quando substancialmente corroborado por outros meios de prova (laudos periciais contemporâneos aos fatos, relatos coesos, documentação pertinente, testemunhos de terceiros, confissão do agente, entre outros), circunstâncias que não se verificam na presente hipótese. Inobstante haja fortes dúvidas apontando para a existência do delito, este Juízo não dispõe de provas suficientes nos autos para condenar o réu. CASO LÍVIA ARAÚJO NUNES Depoimento da mãe Naiara Araújo na delegacia: "DISSE: QUE, afirma a depoente que é genitora da menor LÍVIA ARAÚJO NUNES, atualmente com 15 anos de idade; QUE, também afirma a depoente que seus filhos foram pacientes do Dr. F. P. C. L., médico Pediatra, desde seus nascimentos; QUE, informa a depoente que em uma certa consulta feita para sua filha LÍVIA, que na época tinha 04 anos de idade, pelo Dr. FERNANDO PAREDES, presenciou o mesmo colocá-la em uma maca, dentro de seu consultório, onde quando estava 'auscultando' a criança, Dr. FERNANDO chegou a colocar o seu cotovelo em cima de genitália da menor e ficar esfregando o mesmo naquele órgão da criança; QUE, afirma a depoente que ao perceber aquela situação, de imediato disse ao médico que a criança não estava confortável e retirou a menor daquele local e situação." Depoimento da mãe de Lívia em juízo: Em juízo a mãe disse: "que a filha era paciente do réu e a levava para consultas de rotina. ia para o pediatra rotineiramente… na consulta, ele deitou sua filha na maca, colocou o braço por cima do corpo dela... lembra que ele estava sufocando ela com o peso do braço, quando prestou atenção, viu que o cotovelo dele estava alcançando a parte íntima da filha... ele fazia gracinhas para distrair ela e a filha... disse a ele que ela estava incomodada... o que chamou sua atenção foi ver o médico com o cotovelo na parte íntima da filha... ficou esses anos todos com isso na cabeça… na época comentou com alguns familiares e os que levavam parentes deixaram de levar seus filhos ao médico... ouviu comentários de que outras pessoas se queixavam do mesmo procedimento do réu... a filha não estava gostando, estava incomodada com as atitudes do médico… quis muito denunciar, mas achou que não iam acreditar nela... Lívia tinha em média 04 anos ela não tem noção do que aconteceu... Que o trauma que carrega é de não confiar em médico do sexo masculino... faz acompanhamento psicológico após o fato... foi motivada a denunciar o réu quando soube dos fatos envolvendo a outra vítima e viu que se tratava de um pediatra que tinha abusado da paciente, ela teve a certeza que foi o mesmo que abusou de sua filha, foi aí que tomou coragem." Conquanto seja dotado de credibilidade o depoimento da genitora de Lívia, conforme anteriormente mencionado, para que se possa proferir condenação é imprescindível a existência de elementos probatórios mais robustos que proporcionem ao julgador o necessário embasamento para a imposição da sanção penal. No caso específico de Lívia, constata-se a ausência de depoimento direto da vítima, tendo sido ouvida exclusivamente sua genitora. Acresce-se a tal quadro a ausência de outras testemunhas, porquanto, além da mãe, não há outros depoimentos que corroborem os fatos narrados, constituindo-se a acusação em prova testemunhal fundamentada unicamente no relato materno. Relevante ainda é o lapso temporal transcorrido, considerando que os fatos teriam ocorrido há mais de uma década, quando a vítima contava apenas quatro anos de idade. Embora se reconheça que crimes desta natureza raramente deixam vestígios materiais ou contam com testemunhas presenciais, e que a palavra da vítima possui especial valor probatório, no caso de Lívia sequer há o depoimento da própria ofendida, mas apenas o relato de terceiro (genitora). Considerando que a condenação criminal demanda prova inequívoca, capaz de afastar qualquer dúvida razoável, e que o ônus probatório incumbe ao órgão ministerial, compreendo que, no caso específico de Maria Júlia Werlang Veríssimo Leite e Lívia Araújo Nunes, o acervo probatório produzido revela-se insuficiente para fundamentar um decreto condenatório, impondo-se a aplicação do princípio in dubio pro reo REPARAÇÃO DOS DANOS MORAIS (ART. 387, IV, DO CPP) O Ministério Público pleiteou a fixação de indenização por danos morais no valor de 400 salários mínimos para cada uma das vítimas. O pedido de danos materiais resta indeferido, porquanto não foram produzidas provas concretas dos prejuízos financeiros diretos. O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal estabelece que o juiz, ao proferir sentença condenatória, "fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido". Esta norma visa conferir maior efetividade ao direito da vítima e garantir tutela jurisdicional mais completa, evitando nova demanda na esfera cível para obtenção de reparação que decorre diretamente do ilícito penal. Em crimes contra a dignidade sexual, especialmente quando praticados contra vulneráveis, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é pacífica no sentido de que o dano moral é presumido (in re ipsa), decorrendo da própria gravidade do fato e da violação ao bem jurídico tutelado, sendo desnecessária prova específica do sofrimento ou abalo psicológico. A violência sexual atinge a esfera mais íntima da personalidade, causando feridas profundas na alma, honra e dignidade da vítima, cujos efeitos se prolongam no tempo. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento, conforme AREsp 2.194.270/MS, de que a fixação de valor mínimo para danos morais em casos de estupro de vulnerável prescinde de instrução probatória específica, bastando o pedido expresso na denúncia. PENAL. PROCESSO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. INDENIZAÇÃO MÍNIMA POR DANOS MORAIS . PEDIDO EXPRESSO NA DENÚNCIA. ART. 387, IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. POSSIBILIDADE . AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A fixação de valor mínimo para indenização à vítima por danos morais não exige instrução probatória específica acerca do dano psíquico, do grau de seu sofrimento, nos termos do art. 387, IV do CPP, bastando que conste o pedido expresso na inicial acusatória, garantido o exercício do contraditório e da ampla defesa . (AgRg no REsp n. 2.056.589/MG, Quinta Turma, Rel . Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 29/11/2023) 2. Na hipótese trata-se de crime de estupro de vulnerável com a condenação ao pagamento de valor mínimo para reparação de danos em favor da vítima, no montante de R$5.000,00 (cinco mil reais) . Desse modo, tratando-se de dano moral ipso facto, com pedido expresso na denúncia. Precedentes.3. Agravo não provido . (STJ - AREsp: 2194270 MS 2022/0263649-5, Relator.: Ministra DANIELA TEIXEIRA, Data de Julgamento: 05/03/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/04/2024) A quantificação do dano moral deve ser pautada pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo dupla finalidade: função compensatória, proporcionando às vítimas satisfação capaz de amenizar o sofrimento e as consequências do trauma, e função punitivo-pedagógica, servindo como sanção ao ofensor e demonstrando à sociedade a reprovação do ato. Devem ser sopesadas a gravidade da lesão, que representa uma das mais graves violações aos direitos da personalidade, a intensidade da culpa do agente, que agiu com dolo intenso e premeditação valendo-se da confiança depositada em sua profissão médica, e a condição socioeconômica das partes para que a indenização tenha efeito pedagógico sem gerar enriquecimento indevido. DIREITO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS . RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso especial interposto contra acórdão que reduziu o valor da indenização por danos morais fixado em sentença condenatória por estupro de vulnerável e estupro contra vítima menor de 18 e maior de 14 anos, praticados em continuidade delitiva . 2. O Juízo de primeiro grau fixou a indenização em R$ 20.000,00, a ser repartida entre as vítimas, enquanto o acórdão impugnado reduziu o valor para R$ 6.000,00, considerando a capacidade financeira do ora recorrido .II. Questão em discussão 3. A questão em discussão consiste em saber se o valor da indenização por danos morais fixado pelo juízo de primeiro grau deve ser restabelecido, considerando a jurisprudência do STJ sobre a razoabilidade dos valores arbitrados. III . Razões de decidir 4. O STJ entende que a revisão do valor da indenização por danos morais só é cabível quando o montante for irrisório ou exorbitante, fora dos padrões de razoabilidade.5. No caso, o valor arbitrado pela Corte estadual foi considerado irrisório, em desacordo com precedentes que fixam valores mais elevados para casos semelhantes .6. A decisão atacada destoa dos precedentes do STJ, que estabelecem parâmetros para a fixação de indenizações por danos morais em casos de violência sexual. IV. Dispositivo 7 . Recurso provido para restabelecer a sentença no tocante ao valor indenizatório de R$ 20.000,00, a ser repartido igualitariamente entre as vítimas. (STJ - REsp: 2099744 SC 2023/0350258-2, Relator.: Ministra DANIELA TEIXEIRA, Data de Julgamento: 17/12/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/12/2024) A conduta do réu foi de extrema gravidade, abusando da confiança depositada como médico para violar a dignidade de duas menores em momentos de extrema vulnerabilidade, causando trauma que carregarão por toda a vida. A pluralidade de vítimas e o modus operandi sistemático demonstram profundo desprezo pela dignidade humana. O valor pleiteado pelo Ministério Público, embora elevado, reflete a indignação que o caso suscita, contudo o arbitramento judicial deve buscar equilíbrio. Considerando a gravidade extrema dos fatos, a condição de vulnerabilidade das vítimas, a intensidade do dolo do agente e a capacidade financeira do réu, fixo a indenização por danos morais no valor de R$ 100.000,00 para cada uma das vítimas, totalizando R$ 200.000,00. Este valor é suficiente para cumprir o caráter compensatório sem gerar enriquecimento indevido e o caráter punitivo como medida pedagógica eficaz. Os valores deverão ser corrigidos monetariamente pelo INPC a partir desta sentença (Súmula 362/STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da data do fato (Súmula 54/STJ), podendo as vítimas promoverem a respectiva execução no juízo cível, após o trânsito em julgado desta sentença. Destarte, há que se julgar parcialmente procedente a pretensão punitiva do Estado para condenar F. P. C. L., qualificado nos autos, por dois crimes de estupro de vulnerável, com sanções previstas no art. 217-A c/c art. 61, II, "g", do Código Penal; bem como para absolver em relação aos crimes supostamente praticados contra Maria Júlia Werlang Veríssimo Leite e Lívia Araújo Nunes, com base no art. 386, VII, do CPP. Passo à dosimetria da pena: 1º CRIME – VÍTIMA MARIA LUÍZA Primeira Fase (Pena-base) Analisando as circunstâncias do art. 59 do Código Penal: Culpabilidade: Elevada. A premeditação e o planejamento da conduta extrapolam o dolo normal do tipo penal. Antecedentes: Primário. Conduta Social: Desfavorável. A prática reiterada de atos semelhantes contra outras vítimas, conforme apontado, revela um desajuste social e um desrespeito contínuo às normas de convivência. Personalidade: Neutra, por ausência de laudo técnico. Motivos: Reprováveis. A satisfação da lascívia valendo-se da nobre profissão de médico é fundamento idôneo para a exasperação. Circunstâncias: Graves. O crime foi cometido dentro de um consultório médico, local que inspira confiança, e na presença da mãe da vítima, que foi enganada. Consequências: Graves. O trauma psicológico em uma criança e o abalo na confiança da família são consequências que superam as ordinárias do tipo penal. Comportamento da Vítima: Neutro. Considerando as cinco circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 12 (doze) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Segunda Fase (Atenuantes e Agravantes) Os fundamentos para a agravante do abuso de confiança e condição de médico foram utilizados para negativar os motivos e as circunstâncias do crime na primeira fase. Para evitar bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato), afasto a incidência da referida agravante. Reconheço a atenuante da senilidade (art. 65, I, CP), por ser o réu maior de 70 anos. Aplico a fração de redução de 1/8 sobre a pena-base. A pena provisória fica estabelecida em 10 (dez) anos, 9 (nove) meses e 28 (vinte e oito) dias de reclusão. Terceira Fase (Causas de Aumento e Diminuição) Inexistem causas de aumento ou diminuição. Pena final para o 1º crime: 10 anos, 9 meses e 28 dias de reclusão. 2º CRIME – VÍTIMA ALICE Primeira Fase (Pena-base) O tipo penal do art. 217-A do Código Penal prevê pena de 8 a 15 anos de reclusão. A análise das circunstâncias do art. 59 do CP, neste caso, exige uma valoração mais severa, especialmente no que tange às circunstâncias do crime. Culpabilidade: Elevada. A premeditação e o planejamento da conduta extrapolam o dolo normal do tipo penal. Antecedentes: Primário. Conduta Social: Desfavorável. A prática reiterada de atos semelhantes contra outras vítimas, conforme apontado, revela um desajuste social e um desrespeito contínuo às normas de convivência. Personalidade: Neutra, por ausência de laudo técnico. Motivos: Reprováveis. A satisfação da lascívia valendo-se da nobre profissão de médico é fundamento idôneo para a exasperação. Circunstâncias do Crime: Extremamente graves. Neste ponto, a conduta do réu se revela ainda mais censurável do que no crime anterior. A prática de dois atos libidinosos distintos e em momentos diferentes durante a mesma consulta (um quando a vítima estava deitada e outro quando estava na balança) demonstra uma audácia criminosa superior e uma violação mais intensa e prolongada à dignidade sexual da adolescente. Essa pluralidade de ações em um mesmo contexto fático justifica uma exasperação mais acentuada da pena-base. Consequências: Graves. O trauma psicológico em uma adolescente, que possui maior compreensão da natureza sexual do ato, e o abalo na confiança da família são consequências que superam as ordinárias do tipo penal. Comportamento da Vítima: Neutro. Temos, novamente, cinco circunstâncias judiciais desfavoráveis. Contudo, a intensidade do vetor "circunstâncias do crime" é patentemente maior. A jurisprudência permite que o juiz, de forma fundamentada, atribua pesos diferentes às circunstâncias, conforme a gravidade concreta de cada uma. Dada a excepcional gravidade das circunstâncias do crime contra Alice, que sofreu uma dupla investida em sua intimidade, justifica-se uma elevação da pena-base em patamar superior ao do primeiro delito. Assim, considerando a maior reprovabilidade da conduta, exaspero a pena em 5 (cinco) anos e 3 (três) meses acima do mínimo legal. Fixo, portanto, a pena-base em 13 (treze) anos e 3 (três) meses de reclusão. Segunda Fase (Atenuantes e Agravantes) Conforme já fundamentado, para evitar bis in idem, afasto a incidência da agravante de violação de dever profissional (art. 61, II, "g", CP). Reconheço e aplico a atenuante da senilidade (art. 65, I, CP), por ser o réu maior de 70 anos, reduzindo a pena no patamar de 1/8, a pena provisória fica estabelecida em 11 (onze) anos, 7 (sete) meses e 4 (quatro) dias de reclusão. Terceira Fase (Causas de Aumento e Diminuição) Inexistem causas de aumento ou diminuição a serem consideradas. Pena final para o 2º crime: 11 anos, 7 meses e 4 dias de reclusão. CONCURSO DE CRIMES Tratando-se de concurso material (art. 69 do CP), as penas são somadas: Pena do 1º crime: 10 anos, 9 meses e 28 dias Pena do 2º crime: 11 anos, 7 meses e 4 dias PENA TOTAL DEFINITIVA: 22 (vinte e dois) anos, 5 (cinco) meses e 2 (dois) dias de reclusão. ANTE O EXPOSTO e o mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia para: I - CONDENAR o réu F. P. C. L., já qualificado nos autos, pela prática dos crimes descritos no artigo 217-A, caput, do Código Penal (estupro de vulnerável), por duas vezes, em relação às vítimas M.L.L.Q.P. e A.R.O.R.S., aplicando as penas na forma do artigo 69 do Código Penal (concurso material). Em consequência, torno definitiva a pena total de 22 (vinte e dois) anos, 5 (cinco) meses e 2 (dois) dias de reclusão. II - ABSOLVER o réu F. P. C. L., já qualificado, das imputações relativas às vítimas M.J.W.V.L. e L.A.N., com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (não existir prova suficiente para a condenação). Fixo o regime inicial FECHADO para o cumprimento da pena privativa de liberdade, com fundamento no artigo 33, § 2º, alínea "a", do Código Penal. Para tanto, considero a pena aplicada e a gravidade concreta dos delitos. Nego ao réu o direito de recorrer em liberdade, considerando o auto grau de reprovabilidade dos delitos, a pena aplicada e a garantia da aplicação da lei penal, uma vez que o réu empreendeu fuga durante a instrução, demonstrando risco concreto de evasão. Seguindo o mesmo entendimento, fica mantida a prisão preventiva. Expeça-se a guia provisória, caso necessário. Considerando o que consta no ID 113793427, comunique-se ao Relator a publicação e o teor desta sentença. Após o Trânsito em Julgado desta sentença: 1. Lance-se o nome do réu no rol dos culpados; 2. Comunique-se ao TRE a suspensão dos direitos políticos; 3. Expeça-se guia de execução definitiva e encaminhe-se à Vara de Execuções Penais; 4. Remeta-se o boletim individual, devidamente preenchido, ao setor competente; Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. João Pessoa,data e assinatura eletrônica Virgínia Gaudêncio de Novais Juíza de Direito
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