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Marta Barbosa De Oliveira Monteiro x Hapvida Assistencia Medica Ltda

ID: 281570405

Tribunal: TJPE Órgão: Seção A da 34ª Vara Cível da Capital Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0139430-90.2024.8.17.2001

Data de Disponibilização: 28/05/2025

Polo Ativo:

MARTA BARBOSA DE OLIVEIRA MONTEIRO

Polo Passivo:

HAPVIDA ASSISTENCIA MEDICA LTDA

Despacho_Intimação_Intimação (Outros)

Advogados:

MARIA DE FATIMA NUNES DE SOUZA MIGUEL

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

ANDRE MENESCAL GUEDES

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário DIRETORIA CÍVEL DO 1º GRAU Av. Des. Guerra Barreto, s/n - Ilha Joana Bezerra, Recife - PE, 50080-900 - Fórum Rodolfo Aureliano Seção A da 34ª Vara C… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário DIRETORIA CÍVEL DO 1º GRAU Av. Des. Guerra Barreto, s/n - Ilha Joana Bezerra, Recife - PE, 50080-900 - Fórum Rodolfo Aureliano Seção A da 34ª Vara Cível da Capital Processo nº 0139430-90.2024.8.17.2001 AUTOR(A): MARTA BARBOSA DE OLIVEIRA MONTEIRO RÉU: HAPVIDA ASSISTENCIA MEDICA LTDA INTIMAÇÃO DE ATO JUDICIAL Por ordem do(a) Exmo(a). Dr(a). Juiz(a) de Direito do Seção A da 34ª Vara Cível da Capital, fica(m) a(s) parte(s) intimada(s) do inteiro teor do Ato Judicial de ID 204442914, conforme segue transcrito abaixo: " SENTENÇA Vistos, etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ajuizada por MARTA BARBOSA DE OLIVEIRA MONTEIRO, através de advogada constituída (ID 190573480), em face da HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA, com pedido de tutela provisória de urgência para compelir a ré a fornecer os medicamentos necessários para tratamento do câncer, de que necessita a autora. À saída, a parte autora requereu: (1) prioridade no trâmite processual, com fundamento no art. 71 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) e no art. 1.048, I, do CPC/2015, por ser a autora pessoa idosa com mais de 60 anos e portadora de doença grave -- Neoplasia Maligna do Ovário (CID-10 C56); e (2) concessão do benefício da justiça gratuita, ao argumento de que não aufere renda, dependendo da ajuda de seus familiares para a sua manutenção, juntando declaração de hipossuficiência (ID 190573481). Consta na inicial que a autora é beneficiária de plano de saúde da ré, código nº3010J910057017, diagnosticada com Carcinoma Seroso de Alto Grau de Ovário Metastático para Peritôneo (CID-10 C56), o qual foi todo retirado, conforme Receituário Médico, emitido pela oncologista assistente, Ilka Rocha, CRM/PE 20.850, RQE 11818, em 08/10/2024 (ID 190576686). No entanto, conforme receituário atualizado, emitido pela oncologista assistente em 13/11/2024 (ID 190576687), nova ressonância no abdômen (ID 190576692 – realizada em 05/11/2024) constatou a presença do câncer no fígado e peritônio. Diante da agressividade da doença, a citada médica solicitou liberação com urgência dos seguintes medicamentos: Palosentrona 0,25MG, IV, no D1 a cada 21 dias; Topotecano 2,4MG, IV, no D1 a cada 21 dias; e Bevacizumab 930MG, IV a cada 21 dias. Contudo, a parte autora afirmou que ao solicitar à operadora de planos de saúde (OPS) o fornecimento dos medicamentos, mediante os protocolos nºs 36825320241029523678, 36825320241029524464, 36825320241029524699 (ID 190576688), advieram negativas, com a justificativa “exclusão de cobertura (Uso off-label)”, conforme Termos de Indeferimentos de IDs 190576691, 190576689 e 190576690. A autora ainda narrou que enfrentou sérias dificuldades com o plano de saúde, que comprometeram a agilidade e a qualidade do acompanhamento médico necessário para o diagnóstico e tratamento do câncer. Asseverou que, mesmo antes da negativa formal da OPS, já vinha enfrentando obstáculos para a marcação de exames e consultas com especialistas, que as datas oferecidas pela OPS para a realização dos exames estavam sempre distantes, com agendamentos marcados para, no mínimo, um mês depois, o que evidenciou a ineficiência do plano em fornecer um atendimento imediato e adequado. Diante disso, declarou a demandante que se viu obrigada a arcar com custos adicionais em clínicas particulares, desembolsando a quantia de R$ 3.657,00 (IDs 190576697 a 190576699), para fins de localizar e quantificar a gravidade de seu câncer. Ademais, afirmou que os exames realizados pelo plano apresentaram resultados imprecisos, o que levou a autora a refazê-los em clínicas particulares, gerando novos custos. Dado o narrado, ingressou com a presente ação, requerendo a concessão de tutela de urgência para compelir a ré a fornecer os medicamentos necessários para tratamento do câncer, de que necessita a autora, sob pena de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), ou subsidiariamente, estimados por esse respeitável Juízo – arts. 497, 536 e 537, do Código de Processo Civil (CPC), e 84, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). No mérito, além da confirmação da tutela, pugnou pela condenação da ré ao pagamento de indenizações por danos morais, no valor de R$ 15.000,00, e por danos materiais no montante de R$ 3.657,00, atribuindo à causa o valor de R$ 15.657,00. Decisão inaugural (ID 190684773): (1) concedeu o trâmite prioritário; (2) retificou o valor da causa para R$ 18.558,45 (art. 292, V e VI do CPC), e (3) determinou que a parte autora emendasse a inicial para: (a) comprovar situação econômica condizente com o benefício da gratuidade judiciária requerido; e (b) juntar aos autos instrumento de procuração devidamente assinado pela autora. A parte autora apresentou emenda à inicial sob ID 190925127. Reiterou o pedido pela concessão do benefício da justiça gratuita, informando que figura como dependente do esposo no plano de saúde, e repetiu que conta com suporte da família para as despesas em razão do tratamento e, para fins de comprovar a hipossuficiência, juntou: Declaração de Isenção do IRPF, referentes aos anos de 2019 a 2023 (ID 190925130); contas de fornecimento de energia (ID 190926083); páginas de faturas de cartão de crédito, referentes aos meses de outubro e novembro, para fins demonstrar despesas com transportes e exames (IDs 190926084 e 190926086) e imagem das páginas iniciais da carteira de trabalho (ID 190926087). Ademais, colacionou declaração de hipossuficiência e procuração assinadas pela autora (ID 190925129). Decisão de ID 191454610: (i) recebeu a emenda à inicial; (ii) indeferiu o benefício da gratuidade judiciária à autora; (iii) determinou o recolhimento das custas iniciais; (iv) concedeu a tutela antecipada para determinar que a ré forneça, no prazo de 03 (três) dias, a contar da ciência da presente decisão, os medicamentos Palosentrona 0,25MG, IV, no D1 a cada 21 dias; Topotecano 2,4MG, IV, no D1 a cada 21 dias; e Bevacizumab 930MG, IV a cada 21 dias, conforme prescrição médica de ID 190576687, devendo o tratamento ser mantido enquanto houver recomendação médica; (v) ordenou a citação da ré para ofertar, querendo, contestação e sua intimação pessoal acerca da tutela deferida, o que deveria ser feito apenas após o recolhimento das custas processuais. Custas recolhidas no ID 191540524. A parte autora atravessou petição para informar o descumprimento da tutela (ID 191875072), requerendo a majoração da multa diária e, a operadora de saúde, por seu turno, ingressou com pedido de reconsideração (ID192386447). A Hapvida Assistência Médica S/A, no pedido de reconsideração, aduziu, em síntese, o seguinte: (i) a operadora autorizou o fornecimento dos medicamentos, sob senha de autorização R48483522, comunicada à autora por contato telefônico, com gravação anexada aos autos, restando demonstrado o cumprimento da tutela; (ii) a medicação prescrita à autora é de uso experimental – off label, pois de conformidade com a bula do fármaco AVASTIN (Bevacizumabe), sua associação com Carboplatina e Paclitaxel é indicada para tratamento de primeira linha de câncer epitelial de ovário, tuba uterina e peritoneal primário em estádios avançados ou para pacientes com doença recorrente e sensível à platina, e a autora já recebeu tratamento prévio e apresenta doença resistente à platina, de modo que a solicitação não se enquadra nas indicações terapêuticas aprovadas pela Anvisa, com caracterização do uso off label, de modo que os medicamentos requeridos não possuem cobertura contratual, assim como estão excluídos da cobertura assistencial com esteio no art. 17, §1º da RN 465, da ANS e art. 10, I, da Lei 9.656/98. Pontuou que o caráter experimental é inconteste, não havendo eficácia comprovada de que a utilização implicará melhora no quadro clínico da paciente, somado ao fato de que o relatório médico, por si só, não pode subsidiar a indicação e a imprescindibilidade do medicamento, requerendo, assim que seja enviado os autos ao E-Nat Jus Nacional, a fim de que seja avaliado o pedido da medicação com base nas evidências científicas disponíveis, fornecendo respaldo técnico para atestar se a demanda é de fato urgente ou, alternativamente, pugnou pela realização de perícia simplificada, com arrimo no art. 464, §§ 2º, 3º, 4º do CPC, para subsidiar com mais certeza as decisões do processo, até porque não há situação emergencial configurada no caso em questão, já que não consta indicação de urgência/emergência nos relatórios médicos colacionados pela parte autora nos autos, pois não traz justificativa técnica e relatório médico circunstanciado para tanto. Requereu, ao final, a revogação da liminar, e caso assim não entenda, que faça remessa dos autos ao NAT JUS Nacional ou determine produção de perícia médica simplificada. Em sucessivo, a Hapvida informou a interposição do Agravo de Instrumento nº 0000738-32.2025.8.17.9000 (ID192842488 ), requerendo o juízo de retratação. Decisão de ID 193011960 analisou e indeferiu o pedido de reconsideração e o juízo de retratação apresentados pela operadora de saúde ré, mantendo a decisão concessiva da tutela, por seus próprios fundamentos. Assim como determinou a intimação da parte autora para se manifestar acerca da notícia de cumprimento da tutela informada pela parte ré, que teria sido disponibilizada a senha para medicação no dia 07/01/2025. A Hapvida Assistência Médica S/A ofertou contestação no ID 194919505, suscitando, de início, a impossibilidade de inversão do ônus da prova e impugnando o deferimento da justiça gratuita. No mérito, trilhou os mesmos argumentos do pedido de reconsideração, defendendo, em síntese, o seguinte: a) cumpriu a obrigação de fazer, tendo autorizado o fornecimento dos medicamentos sob senha R48483522; b) os medicamentos solicitados configuram uso off-label, pois a autora apresenta doença resistente à platina, divergindo das indicações de bula aprovadas pela ANVISA; c) o tratamento experimental está excluído de cobertura por lei; d) o relatório médico, por si só, não pode subsidiar a indicação e a imprescindibilidade do medicamento, requerendo o envio dos autos ao E-NATJUS Nacional ou a realização de perícia técnica simplificada; e) o deferimento do pleito causa desequilíbrio econômico-financeiro; f) a taxatividade do rol da ANS; g) o descabimento dos danos morais e materiais. A autora informa que só recebeu a ligação telefônica da ré no dia 22/01/2025, tendo ficado o período de 34 dias sem receber o medicamento crucial para o seu tratamento de câncer, com metástase, reiterando a aplicação da multa diária pelo período de 34 dias ID 195583804). Réplica apresentada no ID 201106567, informando a desnecessidade de perícia técnica e que não pretende produzir outras provas. A parte ré, em que pese intimada não informou interesse na produção de outras provas. Vieram os autos conclusos. É o que importa relatar. Passo a decidir. Verifico que o presente feito comporta julgamento antecipado da lide, pois não há necessidade de produção de prova, uma vez que sopesando os termos do contraditório e os elementos probatórios contidos no processo, entendo-o suficientemente instruído e, pois, maduro para ser julgado quanto a seu mérito, nos moldes do art.355, I, do CPC/2015. À saída, comporta registrar que a operadora de saúde demandada, por ocasião da contestação, requereu o envio dos autos ao Nat jus Nacional, a fim de que seja avaliado o pedido da medicação com base nas evidências científicas disponíveis ou, subsidiariamente, realização de perícia simplificada, com a mesma finalidade. Registre-se que não ratificou tais pretensões quando intimada para especificar as provas que pretendia produzir. Inicialmente, pontuo que, diferente do que afirma a ré, é prescindível a realização de perícia médica para fins de esclarecer quais as indicações são adequadas para o tratamento de câncer da autora, uma vez que este foi expressamente consignado pela médica assistente, Dra Ilka Rocha, CRM. 20850, nos receituários médicos (id. 190576686 e 190576687). Explico. A jurisprudência pátria já tem se posicionado que nos casos de expressa indicação médica, a produção de prova pericial só se mostra imprescindível quando haja indícios de prática de fraude ou tenham sido levantadas dúvidas consistentes acerca da credibilidade da prescrição. Em não sendo o caso dessas situações, a indicação do médico assistente deve prevalecer. Neste sentido seguem julgados dos Tribunais de Justiça do Distrito Federal (TJDF) e do estado de São Paulo (TJSP): APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO VERIFICADO. PROVA PERICIAL DESNECESSÁRIA. PRECLUSÃO LÓGICA. LEGITIMIDADE PASSIVA. UNIMED. CENTRAL NACIONAL E UNIDADE REGIONAL. CONFUSÃO ENTRE AS PESSOAS JURÍDICAS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. PRELIMINARES REJEITADAS. HOME CARE. INDICAÇÃO DO MÉDICO ASSISTENTE. ESTADO DE SAÚDE GRAVE. DEVER DE COBERTURA. ROL DA ANS. NATUREZA EXEMPLIFICATIVA. RESIDÊNCIA EM ABRIGO PARA IDOSOS. IRRELEVÂNCIA. DANO MORAL. AUSÊNCIA. MERO INADIMPLEMENTO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Aplica-se ao caso as normas protetivas do direito do consumidor, uma vez que a Autora e as Rés se adequam, respectivamente, aos conceitos estabelecidos nos artigos 2º e 3º do CDC. (...) 3. O médico assistente tem autoridade para descrever o melhor tratamento necessitado pelo paciente. Se os prontuários apresentados nos autos indicam com clareza o procedimento adequado à segurada, não havendo dúvidas sobre a veracidade de tais documentos, cabe estritamente ao julgador analisar a prescindibilidade da realização de perícia médica em Juízo. (...) Preliminares rejeitadas. (TJ-DF 07025417720208070006 DF 0702541-77.2020.8.07.0006, Relator: Robson Teixeira de Freitas, Data de Julgamento: 09/06/2021, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 14/06/2021 . Pág.: Sem Página Cadastrada.) APELAÇÃO – PLANO DE SAÚDE – Pretensão de custeio de cirurgia reparatória pós-bariátrica – Recusa da operadora ao argumento de que os procedimentos não constam do rol de cobertura da ANS e têm natureza eminentemente estética – Alegação de cerceamento de defesa em virtude do julgamento antecipado da lide – Presente a indicação médica, é dispensável a perícia – Ausentes indícios de prática de fraude ou dúvidas consistentes acerca da higidez da prescrição médica – Cerceamento de defesa não configurado – Abusividade da negativa – Doença com cobertura contratual – Inteligência das súmulas nº 96 e 102, deste E. TJSP – Cirurgia plástica complementar de tratamento de obesidade mórbida, com indicação médica, de caráter nitidamente reparador e não estético – Súmula nº 97, TJSP – Reconhecida a obrigação de custeio – Sentença de procedência mantida, com observação no tocante ao critério para fixação dos honorários advocatícios – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. (TJSP: Apelação 1135482-35.2016.8.26.0100; Relator (a): Alexandre Coelho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 38ª Vara Cível; Data do Julgamento: 18/04/2018; Data de Registro: 19/04/2018) SEGURO -SAÚDE – Home Care – Paciente portadora de quadro de hemiplegia esquerda por AVC isquêmico, insuficiência renal crônica, desnutrição, osteoporose, e hipertensão arterial, com prescrição médica para tratamento em "home care" - Cerceamento de defesa – Não ocorrência – Relatório médico demonstrando a necessidade de tratamento domiciliar à autora - Elementos suficientes para solução da demanda – Desnecessidade de realização de prova pericial - Juiz como destinatário final das provas. Pretensão ao custeio de tratamento domiciliar, pelo sistema home care – Prescrição Médica - Abusividade da cláusula contratual que exclui o fornecimento do "Home Care" – Inteligência das súmulas 90 e 96 do E. TJSP – Cláusula de exclusão que afronta o Código de Defesa do Consumidor – Seguro saúde que dá cobertura ao "home care", com a ressalva de que o custeio do tratamento deve ser feito pela própria segurada, com posterior reembolso pela apelante, observados os limites contratuais – Recurso parcialmente provido. (TJ-SP - AC: 10379863520188260100 SP 1037986-35.2018.8.26.0100, Relator: Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Data de Julgamento: 28/10/2021, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/10/2021) Neste contexto, indefiro o pedido de produção de prova pericial. Por outro lado, anote-se que as normas constantes no Provimento nº 84/2019 da Corregedoria Nacional de Justiça, que dispõe sobre o uso e funcionamento do Sistema Nacional de Pareceres e Notas Técnicas, apenas conferem a possibilidade aos magistrados de solicitar apoio técnico, não havendo obrigatoriedade de submissão à análise técnica do NAT-JUS, como se lê (com meus grifos): Art. 1º Os Magistrados Estaduais e os Magistrados Federais com competência para processar e julgar ações que tenham por objeto o direito à saúde, ainda que durante o plantão judicial, quando levados a decidirem sobre a concessão de determinado medicamento, procedimento ou produto, poderão solicitar apoio técnico ao Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário (NAT-JUS) do seu Estado ou ao NAT-JUS NACIONAL. Por derradeiro, o Nat JUS do TJPE e o Nacional não se destinam, até o presente momento, a atender demandas de varas cíveis. Assim, diante de tal contexto, indefiro a expedição de ofício ao NAT JUS, para os fins requeridos pela operadora de plano de saúde demandada. Quanto à impugnação à gratuidade da justiça, observo que tal matéria já foi apreciada na decisão de ID 191454610, que indeferiu o benefício à autora, determinando o recolhimento das custas processuais, o que foi devidamente cumprido conforme ID 191540524. Portanto, resta prejudicada a análise desta preliminar. Ultrapassadas tais questões, parte-se para apreciação do mérito. Por oportuno, cumpre destacar que os contratos de seguro, por definição legal, encerram relação de consumo, portanto devem ser interpretados sob a ótica da legislação que lhe é própria, ainda que definidos ou regulamentados em textos outros. Tal entendimento foi ratificado pelo STJ através do enunciado da Súmula 608: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão” (Súmula 608, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 11/04/2018, DJe 17/04/2018). Nas relações de consumo, notadamente aquelas que se firmam mediante simples adesão de uma parte ao contrato previamente estabelecido pela outra, devem preponderar, sobre a letra fria do texto, a boa-fé dos contratantes e o equilíbrio contratual, ressaltando-se que a finalidade precípua do contrato de assistência médica entabulado com a ré é a manutenção da saúde da contratante. O cerne da questão ora posta em pretório centra-se em apreciar a obrigatoriedade, ou não, da operadora de saúde fornecer à autora a medicação prescrita pela médica assistente para o tratamento da doença que a acomete, câncer de ovário, agora também atingindo o fígado e peritônio, bem como, em caso de negativa indevida, se há configuração de dano moral. Há também o pedido de restituição de valores despendidos com exames realizados em clínica particular, no importe de R$ 3.657,00, em decorrência de não ter conseguido disponibilidade de vaga e atendimento de forma célere, aliado ao fato de resultados imprecisos na rede credenciada. Assim, observa-se que consta dos documentos juntados aos autos pela parte demandante, laudo da oncologista Ilka Rocha, CRM/PE 20.850, RQE 11818, (ID 190576687), apontando a grave enfermidade que acomete a autora – diagnostico de Carcinoma Seroso de Alto Grau de Ovário Metastático para Peritôneo (CID-10 C56), todo macroscopicamente retirado, com “recidiva de doença neoplástica em fígado e peritônio” – e a solicitação, com urgência, “diante da agressividade da doença”, do tratamento com Palosentrona 0,25MG, IV, no D1 a cada 21 dias; Topotecano 2,4MG, IV, no D1 a cada 21 dias; e Bevacizumab 930MG, IV a cada 21 dias. A negativa de cobertura, por seu turno, está demonstrada nos Termos de Indeferimentos de IDs 190576691, 190576689 e 190576690, com a justificativa de “exclusão de cobertura (Uso off-label)”, apresentando o seguinte fundamento: “Conforme sua Bula profissional, disponível no site oficial da ANVISA, é indicado em associação a Carboplatina e Paclitaxel para o tratamento de Câncer epitelial de ovário, tuba uterina e peritoneal primário nos seguintes cenários: "Tratamento de primeira linha de pacientes com câncer epitelial de ovário, tuba uterina e peritoneal primário avançados (International Federation of Gynecology and Obstetrics ¿ FIGO ¿ III B, III C e IV)." "Tratamento de pacientes adultos com câncer epitelial primário de ovário, tuba uterina e peritônio, recorrente e sensível à platina." No caso em análise, conforme registros em prontuário eletrônico, trata-se da solicitação Bevacizumabe associado a Carboplatina e Paclitaxel para doença já tratada anteriormente e resistente à platina. Dessa forma, por não configurar solicitação em primeira linha terapêutica ou para doença sensível à platina, a demanda em questão diverge das indicações de bula, sendo considerada, portanto, como uso off-label.” (Destaquei). Note-se que por ocasião da contestação repete a tese de que os medicamentos solicitados configuram uso off-label, pois a autora apresenta doença resistente à platina, divergindo das indicações de bula aprovadas pela ANVISA. Na verdade, constata-se da própria negativa da ré, que a medicação requerida foi aprovada pela ANVISA e integra o rol de tratamentos eficazes para a doença oncológica da autora, sendo certo que a doença que acomete a demandante está listada na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas relacionados com a Saúde, da OMS, qual seja: CID-10 C56 – Carcinoma Seroso de Alto Grau de Ovário Metastático para Peritôneo – com recidiva em fígado e peritônio. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente decidido que, embora o plano de saúde possa limitar os procedimentos a serem cobertos, não pode restringir o tratamento prescrito pelo médico, principalmente em casos de doenças graves e situações emergenciais, como o presente, consistente em fornecimento de medicamento antineoplásico, mesmo que off label. No ponto, cabe reter que segundo a jurisprudência é abusiva a recusa da operadora do plano de saúde de custear medicamento com registro na Anvisa e prescrito pelo médico assistente do paciente, ainda que se trate de fármaco off label, pois as operadoras de plano de saúde têm o dever de cobrir fármacos para tratamento contra o câncer, sendo irrelevante analisar a natureza taxativa ou exemplificativa do rol da ANS. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANOS DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ANTINEOPLÁSICO. OBRIGAÇÃO. USO OFF LABEL. RECUSA. ABUSIVIDADE. TRATAMENTO DE CÂNCER. NATUREZA TAXATIVA OU EXEMPLIFICATIVA DO ROL DA ANS. IRRELEVÂNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. As operadoras de planos de saúde podem limitar as doenças a serem cobertas pelo contrato, mas não podem limitar os tipos de procedimentos a serem prescritos para o tratamento da enfermidade. 2. É abusiva a recusa da operadora do plano de saúde de custear medicamento com registro na Anvisa e prescrito pelo médico assistente do paciente, ainda que se trate de fármaco off label. 3. As operadoras de plano de saúde têm o dever de cobrir fármacos para tratamento contra o câncer, sendo irrelevante analisar a natureza taxativa ou exemplificativa do rol da ANS.4. Agravo interno desprovido.(STJ - AgInt no AREsp: 2195403 MG 2022/0259890-7, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 13/05/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024) Especificamente quanto ao medicamento Bevacizumabe (AVASTIN), associado à Carboplatina e Paclitaxe, segue recente julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP): APELAÇÃO. Plano de saúde. Ação de obrigação de fazer c.c danos morais. Sentença de procedência. Inconformismo de ambas as partes. Autora que padece de neoplasia de ovário, com metástases no reto, fígado e linfonodos axilares, daí porque a médica oncologista integrante de rede credenciada da agravante, prescreveu medicamentos quimioterápicos (Carboplatina, Paclitaxel e BEVACIZUMABE). Recusa da operadora que, por junta médica unilateral, desacompanhada de estudos clínicos, ofereceu outro medicamento em substituição, recusando a cobertura do tratamento prescrito. Demandante que exibiu provas acerca da eficácia do tratamento em casos clínicos análogos (notas técnicas do NAT-JUS e estudos internacionais). Cobertura devida, à luz de recentes decisões do STJ e da recente Lei 14.454/2022. Danos morais configurados e indenização arbitrada em R$ 10.000,00 que fica mantida, descabida a majoração pretendida pela autora. Base de cálculo dos honorários que comporta alteração. Recurso da ré a que se nega provimento e recurso da autora a que se dá parcial provimento. (TJ-SP - Apelação Cível: 1005043-32.2023.8.26.0506 Ribeirão Preto, Relator: José Rubens Queiroz Gomes, Data de Julgamento: 25/03/2024, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/03/2024) Para além disso, destaque-se que a medicação requerida destina-se a tratamento quimioterápico, cuja obrigação de fornecimento está expressa na Lei que regula os Planos de Saúde (art.12, da Lei 9.656/98). “Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas: (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) I - quando incluir atendimento ambulatorial: (…) c) cobertura de tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral, incluindo medicamentos para o controle de efeitos adversos relacionados ao tratamento e adjuvantes; (Incluído pela Lei nº 12.880, de 2013) (Vigência) (...) II - quando incluir internação hospitalar: (…) g) cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar; (Incluído pela Lei nº 12.880, de 2013) (Vigência)” Por derradeiro, do laudo da oncologista Ilka Rocha, CRM/PE 20.850, RQE 11818, (ID 190576687), apontando a grave enfermidade que acomete a autora – diagnostico de Carcinoma Seroso de Alto Grau de Ovário Metastático para Peritôneo (CID-10 C56), todo macroscopicamente retirado, com “recidiva de doença neoplástica em fígado e peritônio” – e a solicitação, com urgência, “diante da agressividade da doença”, do tratamento com a medicação prescrita, evidenciando-se que consta a caracterização da urgência em razão do quadro clínico da autora, estando, portanto, circunstanciada a situação. Diante do quadro retratado, resta demonstrado que merece acolhimento a obrigação de fazer, no sentido de a ré ser compelida a fornecer a medicação antineoplásica prescrita à autora. No que tange aos danos morais, é de se notar que a jurisprudência pacífica do STJ reconhece que a recusa indevida pela operadora de plano de saúde em autorizar a cobertura de tratamento gera dano moral, porquanto agrava a situação de aflição psicológica e de angústia do paciente, especialmente em casos graves como o presente, em que se trata de paciente oncológica com doença em estágio avançado. No caso dos autos, a situação se mostra ainda mais grave, pois a negativa refere-se a tratamento oncológico, prescrito com urgência diante da agressividade da doença, sendo certo que a demora na sua administração poderia causar sérios riscos à vida da autora. A angústia e o sofrimento experimentados pela autora diante da negativa indevida do plano extrapolam o mero aborrecimento, configurando verdadeiro dano moral indenizável. Quanto ao quantum indenizatório, considerando a gravidade da conduta, o porte econômico da ré, a situação de vulnerabilidade da autora, a jurisprudência em casos análogos e os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, entendo adequada a fixação em R$ 8.000,00 (oito mil reais). Quanto aos danos materiais, a autora comprovou através dos documentos de IDs 190576697 a 190576699 que desembolsou o valor de R$ 3.558,45 para a realização de exames e procedimentos em clínicas particulares, junto ao Santa Joana Diagnóstico e Cerpe, em razão da demora e dificuldades impostas pela ré, valendo destacar que não houve impugnação específica da operadora quanto a estes valores e nem quanto a alegação de dificuldade de agendamento dos exames de forma célere. Sendo assim, faz jus ao ressarcimento integral desta quantia, até porque, repise-se, não houve impugnação quanto a este fato na contestação. No que tange ao reconhecimento ou não do descumprimento da tutela antecipada anoto que será analisada na fase seguinte, do eventual cumprimento de sentença e cobrança da multa, já que deverá restar descortinado e evidenciado o efetivo descumprimento da obrigação de fazer. Diante do exposto, julgo procedentes os pedidos, nos termos do art. 487, I, do CPC, para: a) condenar a ré a ré fornecer à autora os medicamentos Palosentrona 0,25MG, IV, no D1 a cada 21 dias; Topotecano 2,4MG, IV, no D1 a cada 21 dias; e Bevacizumab 930MG, IV a cada 21 dias, conforme prescrição médica de ID 190576687, enquanto houver recomendação médica, confirmando a tutela de urgência anteriormente concedida no ID 191454610 ; b) condenar a ré a pagar à autora, a título de danos materiais, o valor de R$ 3.558,45 (três mil, quinhentos e cinquenta e oito reais e quarenta e cinco centavos), acrescido de correção monetária pelo IPCA desde a data do desembolso (R$ 2.200,00 – 05/11/2024; R$ 558,45—18/07/2024 e R$ 800,00 – 17/07/2024), bem como juros de mora de pela Taxa Selic, deduzido o IPCA, desde a citação; c) condenar a ré a pagar à autora, a título de danos morais, o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acrescido de correção monetária pelo IPCA a partir da data desta sentença, e taxa SELIC deduzida do IPCA a partir da citação, até o efetivo pagamento. Oficie-se ao Desembargador Relator do Agravo de Instrumento nº 0000738-32.2025.8.17.9000, a fim de dar conhecimento do conteúdo da presente sentença. Condeno a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação (dano moral e obrigação de fazer, este referente a um mês do tratamento, nos moldes da Súmula 199 do TJPE), nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Após o trânsito em julgado, se nada for requerido, arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Recife, 19 de maio de 2025. Virgínia Gondim Dantas Juíza de Direito" RECIFE, 27 de maio de 2025. PATRICIA VIEIRA DE LIRA ALBUQUERQUE NOVAES Diretoria Cível do 1º Grau

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Processo nº 0001352-46.2024.8.17.3350

ID: 298883924

Tribunal: TJPE Órgão: 3ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0001352-46.2024.8.17.3350

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

MARCO JOSE DA SILVA

Polo Passivo:

Sentença (Outras)

Advogados:

EMANUEL ULISSES DE SANTANA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 3ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata R OLÍVIO COSTA, 123, Anexo do Fórum - E-mail : vciv03.saolourenco@tjpe.jus.br - Tel (WhatsApp): 81 … Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 3ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata R OLÍVIO COSTA, 123, Anexo do Fórum - E-mail : vciv03.saolourenco@tjpe.jus.br - Tel (WhatsApp): 81 31819150/9155/9151, CENTRO, SÃO LOURENÇO DA MATA - PE - CEP: 54735-180 - F:(81) 31819150 Processo nº 0001352-46.2024.8.17.3350 AUTOR(A): MARCO JOSE DA SILVA RÉU: SERASA S/A SENTENÇA I - RELATÓRIO: Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, ajuizada por MARCO JOSE DA SILVA em face de SERASA S/A. O autor registra em sua inicial: 1. Que Houve um grande vazamento de dados nos anos de 2018, 2019 e o mais recente em janeiro de 2021, onde milhões de brasileiros tiveram seus dados expostos advindos do banco de dados do SERASA. 2. Que após o vazamento de dados, houve por parte do Instituto Brasileiro de Defesa da Proteção de Dados Pessoais, Compliance e Segurança da Informação, conhecido como “Sigilo”, o qual patrocinou uma Ação Civil Pública contra a empresa ré, abordando a questão conforme reportagem do publicada no site Migalhas. 3. Que após ter conhecimento nos noticiários dos vazamentos de dados, a parte demandante descobriu que os seus dados pessoais haviam sido vazados pela empresa demandada, estando em poder de estranhos, ou seja, dados pessoais esses, circulando livremente pela “Dark Web 2”; 4. Que através do aplicativo do SERASA, existe a confirmação do vazamento de informações, fornecendo detalhes sobre os dados afetados; 5. Que o Primeiro vazamento dos dados pessoais ocorreu no mês de junho de 2020; na ocasião, o seu CPF, Nome, País, Sobrenome foram expostos, em janeiro de 2021, do mesmo modo, seu, CPF, Nome, Sobrenome foram vazados e, posteriormente, em março de 2023, seu CPF, CEP, cidade, endereço, estado, sobrenome, nome, país e número de celular, conforme Telas do aplicativo do SERASA (doc. 03 e 04). 6. Que a parte autora, vem recebendo inúmeras ligações, mensagens de textos, “e-mails”, semanalmente, com várias tentativas de golpes e ofertas de serviços de empresas as quais desconhece ou sequer realizou compras e/ou contratação de serviços, de modo que, perante a esta invasão de privacidade, ao desrespeito aos direitos da personalidade e à violação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), torna-se indispensável a adoção desta ação judicial com o desígnio de alcançar reparação pelos danos morais experimentados, motivo pelo qual faz jus pagamento de reparação por danos morais em valor não inferior a R$ 20.000,00. Juntou documentos e requereu a gratuidade. Concessão de gratuidade no ID 168075938, sendo determinada a citação da Ré. Contestação no ID 92836824, onde a Demandada sustentou em suma: “claro oportunismo – Indústria do dano moral; Inépcia da inicial – Inexistência de provas das alegações; Ausência de vazamento ou danos morais indenizáveis; Descabimento da inversão do ônus da prova”. Por fim, pugnou pela improcedência total dos pedidos autorais. Em Réplica, o Autor juntou a petição de ID 172195515, rebatendo a contestação e fazendo remissão aos pedidos iniciais. Intimados para indicar os pontos controvertidos e as provas que intentam produzir, o Autor peticionou no ID 190015311, requerendo o julgamento antecipado. Por sua vez, o Réu se manifestou no ID 192680723, requerendo também o julgamento antecipado, ratificando a inexistência de prova do alegado pela parte Autora e reiterando os termos da contestação apresentada, especialmente no tocante à extensa jurisprudência consolidada a respeito do assunto, requerendo a improcedência da ação, ante a inexistência de falha, abusividade ou ilicitude nos serviços prestados, e a ausência de demonstração de dano sofrido pela parte Autora. Sem mais, o processo voltou concluso. Sendo tudo o que se tinha a relatar, passo a decidir. II- FUNDAMENTAÇÃO: II.I. Do Julgamento Antecipado: Ao compulsar o processo, constato se tratar de hipótese de julgamento antecipado, haja vista que as provas trazidas aos autos são suficientes para o julgamento do mérito, sendo desnecessária a produção de outras provas (art. 355, inciso I, do CPC). Vale registrar que o juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as diligências que considerar inúteis ou protelatórias (parágrafo único do art. 370 do CPC). Por isso, quando for o caso, o julgamento antecipado não é faculdade, mas dever que a lei impõe ao julgador, em homenagem ao princípio da duração razoável do processo. É o que me cabe no momento. Desta feita, não havendo questões antecedentes ou preliminares para serem analisadas, estando presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do mérito. II.II. Do Mérito: Enfrentando o mérito do processo, entendo que a controvérsia gira em torno da existência ou não de vazamento de dados pessoais do Autor pela Ré, em infração ao determinado pela LGPD vigente, e, por consequência, se há responsabilidade da Demandada em reparar eventual dano sofrido pela parte Autora. Com efeito, a parte autora alega a existência de um suposto vazamento de dados de 223 milhões de brasileiros, sendo esse evento violador dos direitos da personalidade, ensejando no dever de indenizar pelos eventuais danos morais suportados. Acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que o vazamento de dados pessoais, por si só, não enseja no dever de indenizar. Nesse sentido destaco o seguinte julgado: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VAZAMENTO DE DADOS PESSOAIS. DADOS COMUNS E SENSÍVEIS. DANO MORAL PRESUMIDO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO. I - Trata-se, na origem, de ação de indenização ajuizada por particular contra concessionária de energia elétrica pleiteando indenização por danos morais decorrentes do vazamento e acesso, por terceiros, de dados pessoais. II - A sentença julgou os pedidos improcedentes, tendo a Corte Estadual reformulada para condenar a concessionária ao pagamento da indenização, ao fundamento de que se trata de dados pessoais de pessoa idosa. III - A tese de culpa exclusiva de terceiro não foi, em nenhum momento, abordada pelo Tribunal Estadual, mesmo após a oposição de embargos de declaração apontando a suposta omissão. Nesse contexto, incide, na hipótese, a Súmula n. 211/STJ. In casu, não há falar em prequestionamento ficto, previsão do art. 1.025 do CPC/2015, isso porque, em conformidade com a jurisprudência do STJ, para sua incidência deve a parte ter alegado devidamente em suas razões recursais ofensa ao art. 1022 do CPC/2015, de modo a permitir sanar eventual omissão através de novo julgamento dos embargos de declaração, ou a análise da matéria tida por omissa diretamente por esta Corte. Tal não se verificou no presente feito. Precedente: AgInt no REsp 1737467/SC, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 8/6/2020, DJe 17/6/2020. IV - O art. 5º, II, da LGPD, dispõe de forma expressa quais dados podem ser considerados sensíveis e, devido a essa condição, exigir tratamento diferenciado, previsto em artigos específicos. Os dados de natureza comum, pessoais mas não íntimos, passíveis apenas de identificação da pessoa natural não podem ser classificados como sensíveis. V - O vazamento de dados pessoais, a despeito de se tratar de falha indesejável no tratamento de dados de pessoa natural por pessoa jurídica, não tem o condão, por si só, de gerar dano moral indenizável. Ou seja, o dano moral não é presumido, sendo necessário que o titular dos dados comprove eventual dano decorrente da exposição dessas informações. VI - Agravo conhecido e recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (AREsp n. 2.130.619/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 7/3/2023, DJe de 10/3/2023.) Em detida análise, percebo que a pretensão autoral é integralmente lastreada no vazamento de dados pessoais de, praticamente, toda população brasileira, sem mínima comprovação de que o vazamento se deu por responsabilidade da parte requerida e tampouco comprovação de qualquer violação aos direitos da personalidade da parte Autora. Neste sentido, é de se consignar que esta magistrada não desconhece o entendimento do STJ, no sentido de que o vazamento de dados sensíveis dá ensejo a dano moral presumido. No entanto, no presente caso, a Parte Autora não se desincumbiu do ônus de comprovar qual dado teria sido vazado pela Parte Ré, não se desobrigando, portanto, do ônus do art. 373, I, do CPC. Ressalte-se que a comprovação de quais dados teriam sido vazados não se trata de prova diabólica, considerando que, como detentora dos dados, a Parte Autora tem direito ao acesso a quais dados foram vazados. Todavia, nos presentes autos, a parte autora se limitou a fundamentar o seu pedido em notícias veiculadas pela imprensa, bem como em informação da SERASA S/A que informa, tão somente, o vazamento do número do CPF da autora. Dessa forma, patente a ausência do direito reclamado, ante ao fato de que a Parte Autora não se desincumbiu do ônus do art. 373, I, do CPC. Tal entendimento encontra sustentação em diversos julgados do TJPE, conforme pode se extrair a seguir: DIREITO CIVIL E DIREITO DIGITAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ALEGADO VAZAMENTO DE DADOS PESSOAIS. LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS (LGPD). AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. I. CASO EM EXAME: Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de indenização por danos morais formulados em face da Serasa S.A., sob a alegação de vazamento de dados pessoais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A controvérsia centra-se na existência de prova suficiente acerca do alegado vazamento de dados pessoais e na consequente caracterização de dano moral passível de reparação, com aplicação das normas da LGPD e do Código de Defesa do Consumidor. III. RAZÕES DE DECIDIR: A parte autora não apresentou elementos probatórios mínimos que indicassem a efetiva ocorrência de vazamento de dados pessoais por conduta atribuível à requerida. A alegação de dano moral in re ipsa não se sustenta na ausência de comprovação inicial mínima dos fatos narrados. A inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe indícios de verossimilhança, inexistentes no caso em análise. Relatórios técnicos apresentados pela requerida demonstram a ausência de falhas em seus sistemas de segurança e afastam a vinculação entre os dados alegadamente vazados e a Serasa S.A. O conjunto probatório foi considerado insuficiente para amparar a pretensão indenizatória, mantendo-se a sentença de improcedência. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: "1. A configuração de dano moral decorrente de suposto vazamento de dados pessoais exige prova mínima do fato e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados. 2. A inversão do ônus da prova no âmbito do Código de Defesa do Consumidor não é aplicável quando ausentes indícios mínimos de verossimilhança das alegações do consumidor." (TJPE, Apelação Cível nº 0000738-77.2024.8.17.2950, 5ª Câmara Cível, Rel. Subst. Des. Silvio Romero Beltrão, j. 11.02.2025) DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUPOSTO VAZAMENTO DE DADOS PESSOAIS. AUSÊNCIA DE PROVAS. DANO MORAL NÃO PRESUMIDO. RECURSO DESPROVIDO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. CASO EM EXAME: Recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos morais fundada em alegado vazamento de dados pessoais pelo Serasa S.A., por ausência de comprovação do fato, do dano e do nexo de causalidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A questão em discussão consiste em: (i) saber se a Serasa S.A. foi responsável por vazamento de dados pessoais do autor, caracterizando o dever de indenizar; (ii) saber se o dano moral decorreria automaticamente do simples vazamento; (iii) verificar se seria caso de inversão do ônus da prova; (iv) analisar eventual cerceamento de defesa por indeferimento de instrução probatória. III. RAZÕES DE DECIDIR: Inexistência de provas mínimas do fato alegado – autor não demonstrou que dados pessoais foram efetivamente vazados nem a vinculação dos supostos vazamentos com os sistemas da recorrida. Documentos apresentados pela recorrente (notícias e prints de sites) não possuem idoneidade técnica para comprovar os fatos narrados. Relatórios e parecer técnico da requerida atestam inexistência de vazamentos em seus sistemas. A inversão do ônus da prova não é automática e exige verossimilhança das alegações, o que não se configurou no caso. Inexistência de cerceamento de defesa – contradição entre pedido inicial de julgamento antecipado e posterior requerimento de produção de provas. Majoração dos honorários advocatícios de sucumbência para 15% sobre o valor da causa, com exigibilidade suspensa pela gratuidade de justiça. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. A configuração de dano moral decorrente de suposto vazamento de dados pessoais exige prova mínima do fato e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados. 2. A inversão do ônus da prova no âmbito do Código de Defesa do Consumidor não é aplicável quando ausentes indícios mínimos de verossimilhança das alegações do consumidor. 3. Não há cerceamento de defesa quando a parte, após requerer julgamento antecipado da lide, posteriormente pleiteia produção de provas, sem apresentar elementos concretos que justifiquem a instrução." (TJPE, Apelação Cível nº 0000405-70.2024.8.17.2160, 1ª Turma da Câmara Regional de Caruaru, Rel. Des. José Severino Barbosa , j. 07.05.2025) Com isso, a alegação de prática de ilícito civil perpetrada pela Ré, por suposta infração à LGPD não deve prosperar. II.II.II. Da Inexistência de Dano Moral: No que concerne aos danos morais, sabe-se que são aqueles que ferem o íntimo do ser humano, seu psicológico, bem como os direitos da personalidade, como o nome, a honra e a intimidade. Segundo afirma a doutrinadora Maria Helena Diniz, "o dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo". De certo, o dano moral não pode ser confundido com meros dissabores ou aborrecimentos vivenciados no dia-a-dia do ser humano, tampouco, pode ser fonte de enriquecimento sem causa, não podendo o juiz, sob pena de inviabilizar o tráfico das relações jurídicas, supor que fatos do cotidiano configurem o dano moral indenizável. Neste ponto, o entendimento da jurisprudência majoritária é no sentido de que “a configuração de dano moral decorrente de suposto vazamento de dados pessoais exige prova mínima do fato e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados”, conforme exposto acima. Logo, com a ausência nestes autos de prova mínima do vazamento de dados da parte Autora e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados, não vislumbro a ocorrência de ato lesivo apto a gerar responsabilização da Demandada à reparação dos danos morais pleiteados pelo(a) Demandante. Sendo assim, a declaração da improcedência do pedido de indenização formulado pelo na peça vestibular é medida que ora se impõe. III. DISPOSITIVO: Isto posto, como consequência dos fundamentos fáticos e jurídicos supracitados, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por MARCO JOSE DA SILVA - CPF: 032.389.404-65. Encerrada a prestação jurisdicional, EXTINGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Desta feita, diante do princípio da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento da taxa judiciária e das custas processuais relativas a este processo, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão do deferimento da gratuidade da justiça, conforme §3º, do art. 98, do CPC. No mesmo diapasão, nos termos do caput e do §1º, do art. 85, do CPC, condeno o(a) Requerente a pagar os honorários advocatícios sucumbenciais, fixados em 20% (vinte por cento) do valor atualizado da causa, cuja exigibilidade também ficará suspensa em razão do deferimento da gratuidade da justiça, conforme §3º, do art. 98, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Por sua vez, atentem as partes para o detalhe de que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais, e/ou com efeitos infringentes, e/ou meramente postulatórios, dará ensejo à imposição da multa prevista pelo artigo 1.026, § 2º, do CPC. Havendo interposição de apelação, intime-se a parte recorrida para contrarrazões e, em seguida, remetam-se os autos ao TJPE independentemente de novo despacho deste juízo. Do contrário, certifique-se o trânsito em julgado e, por fim, arquive-se definitivamente. Cumpra-se! SÃO LOURENÇO DA MATA, data da assinatura eletrônica. JUIZ(A) DE DIREITO dwrp 1106

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Processo nº 0001352-46.2024.8.17.3350

ID: 298883929

Tribunal: TJPE Órgão: 3ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0001352-46.2024.8.17.3350

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

SERASA S/A

Sentença (Outras)

Advogados:

MARIA DO PERPETUO SOCORRO MAIA GOMES

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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 3ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata R OLÍVIO COSTA, 123, Anexo do Fórum - E-mail : vciv03.saolourenco@tjpe.jus.br - Tel (WhatsApp): 81 … Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 3ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata R OLÍVIO COSTA, 123, Anexo do Fórum - E-mail : vciv03.saolourenco@tjpe.jus.br - Tel (WhatsApp): 81 31819150/9155/9151, CENTRO, SÃO LOURENÇO DA MATA - PE - CEP: 54735-180 - F:(81) 31819150 Processo nº 0001352-46.2024.8.17.3350 AUTOR(A): MARCO JOSE DA SILVA RÉU: SERASA S/A SENTENÇA I - RELATÓRIO: Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, ajuizada por MARCO JOSE DA SILVA em face de SERASA S/A. O autor registra em sua inicial: 1. Que Houve um grande vazamento de dados nos anos de 2018, 2019 e o mais recente em janeiro de 2021, onde milhões de brasileiros tiveram seus dados expostos advindos do banco de dados do SERASA. 2. Que após o vazamento de dados, houve por parte do Instituto Brasileiro de Defesa da Proteção de Dados Pessoais, Compliance e Segurança da Informação, conhecido como “Sigilo”, o qual patrocinou uma Ação Civil Pública contra a empresa ré, abordando a questão conforme reportagem do publicada no site Migalhas. 3. Que após ter conhecimento nos noticiários dos vazamentos de dados, a parte demandante descobriu que os seus dados pessoais haviam sido vazados pela empresa demandada, estando em poder de estranhos, ou seja, dados pessoais esses, circulando livremente pela “Dark Web 2”; 4. Que através do aplicativo do SERASA, existe a confirmação do vazamento de informações, fornecendo detalhes sobre os dados afetados; 5. Que o Primeiro vazamento dos dados pessoais ocorreu no mês de junho de 2020; na ocasião, o seu CPF, Nome, País, Sobrenome foram expostos, em janeiro de 2021, do mesmo modo, seu, CPF, Nome, Sobrenome foram vazados e, posteriormente, em março de 2023, seu CPF, CEP, cidade, endereço, estado, sobrenome, nome, país e número de celular, conforme Telas do aplicativo do SERASA (doc. 03 e 04). 6. Que a parte autora, vem recebendo inúmeras ligações, mensagens de textos, “e-mails”, semanalmente, com várias tentativas de golpes e ofertas de serviços de empresas as quais desconhece ou sequer realizou compras e/ou contratação de serviços, de modo que, perante a esta invasão de privacidade, ao desrespeito aos direitos da personalidade e à violação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), torna-se indispensável a adoção desta ação judicial com o desígnio de alcançar reparação pelos danos morais experimentados, motivo pelo qual faz jus pagamento de reparação por danos morais em valor não inferior a R$ 20.000,00. Juntou documentos e requereu a gratuidade. Concessão de gratuidade no ID 168075938, sendo determinada a citação da Ré. Contestação no ID 92836824, onde a Demandada sustentou em suma: “claro oportunismo – Indústria do dano moral; Inépcia da inicial – Inexistência de provas das alegações; Ausência de vazamento ou danos morais indenizáveis; Descabimento da inversão do ônus da prova”. Por fim, pugnou pela improcedência total dos pedidos autorais. Em Réplica, o Autor juntou a petição de ID 172195515, rebatendo a contestação e fazendo remissão aos pedidos iniciais. Intimados para indicar os pontos controvertidos e as provas que intentam produzir, o Autor peticionou no ID 190015311, requerendo o julgamento antecipado. Por sua vez, o Réu se manifestou no ID 192680723, requerendo também o julgamento antecipado, ratificando a inexistência de prova do alegado pela parte Autora e reiterando os termos da contestação apresentada, especialmente no tocante à extensa jurisprudência consolidada a respeito do assunto, requerendo a improcedência da ação, ante a inexistência de falha, abusividade ou ilicitude nos serviços prestados, e a ausência de demonstração de dano sofrido pela parte Autora. Sem mais, o processo voltou concluso. Sendo tudo o que se tinha a relatar, passo a decidir. II- FUNDAMENTAÇÃO: II.I. Do Julgamento Antecipado: Ao compulsar o processo, constato se tratar de hipótese de julgamento antecipado, haja vista que as provas trazidas aos autos são suficientes para o julgamento do mérito, sendo desnecessária a produção de outras provas (art. 355, inciso I, do CPC). Vale registrar que o juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as diligências que considerar inúteis ou protelatórias (parágrafo único do art. 370 do CPC). Por isso, quando for o caso, o julgamento antecipado não é faculdade, mas dever que a lei impõe ao julgador, em homenagem ao princípio da duração razoável do processo. É o que me cabe no momento. Desta feita, não havendo questões antecedentes ou preliminares para serem analisadas, estando presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do mérito. II.II. Do Mérito: Enfrentando o mérito do processo, entendo que a controvérsia gira em torno da existência ou não de vazamento de dados pessoais do Autor pela Ré, em infração ao determinado pela LGPD vigente, e, por consequência, se há responsabilidade da Demandada em reparar eventual dano sofrido pela parte Autora. Com efeito, a parte autora alega a existência de um suposto vazamento de dados de 223 milhões de brasileiros, sendo esse evento violador dos direitos da personalidade, ensejando no dever de indenizar pelos eventuais danos morais suportados. Acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que o vazamento de dados pessoais, por si só, não enseja no dever de indenizar. Nesse sentido destaco o seguinte julgado: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VAZAMENTO DE DADOS PESSOAIS. DADOS COMUNS E SENSÍVEIS. DANO MORAL PRESUMIDO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO. I - Trata-se, na origem, de ação de indenização ajuizada por particular contra concessionária de energia elétrica pleiteando indenização por danos morais decorrentes do vazamento e acesso, por terceiros, de dados pessoais. II - A sentença julgou os pedidos improcedentes, tendo a Corte Estadual reformulada para condenar a concessionária ao pagamento da indenização, ao fundamento de que se trata de dados pessoais de pessoa idosa. III - A tese de culpa exclusiva de terceiro não foi, em nenhum momento, abordada pelo Tribunal Estadual, mesmo após a oposição de embargos de declaração apontando a suposta omissão. Nesse contexto, incide, na hipótese, a Súmula n. 211/STJ. In casu, não há falar em prequestionamento ficto, previsão do art. 1.025 do CPC/2015, isso porque, em conformidade com a jurisprudência do STJ, para sua incidência deve a parte ter alegado devidamente em suas razões recursais ofensa ao art. 1022 do CPC/2015, de modo a permitir sanar eventual omissão através de novo julgamento dos embargos de declaração, ou a análise da matéria tida por omissa diretamente por esta Corte. Tal não se verificou no presente feito. Precedente: AgInt no REsp 1737467/SC, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 8/6/2020, DJe 17/6/2020. IV - O art. 5º, II, da LGPD, dispõe de forma expressa quais dados podem ser considerados sensíveis e, devido a essa condição, exigir tratamento diferenciado, previsto em artigos específicos. Os dados de natureza comum, pessoais mas não íntimos, passíveis apenas de identificação da pessoa natural não podem ser classificados como sensíveis. V - O vazamento de dados pessoais, a despeito de se tratar de falha indesejável no tratamento de dados de pessoa natural por pessoa jurídica, não tem o condão, por si só, de gerar dano moral indenizável. Ou seja, o dano moral não é presumido, sendo necessário que o titular dos dados comprove eventual dano decorrente da exposição dessas informações. VI - Agravo conhecido e recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (AREsp n. 2.130.619/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 7/3/2023, DJe de 10/3/2023.) Em detida análise, percebo que a pretensão autoral é integralmente lastreada no vazamento de dados pessoais de, praticamente, toda população brasileira, sem mínima comprovação de que o vazamento se deu por responsabilidade da parte requerida e tampouco comprovação de qualquer violação aos direitos da personalidade da parte Autora. Neste sentido, é de se consignar que esta magistrada não desconhece o entendimento do STJ, no sentido de que o vazamento de dados sensíveis dá ensejo a dano moral presumido. No entanto, no presente caso, a Parte Autora não se desincumbiu do ônus de comprovar qual dado teria sido vazado pela Parte Ré, não se desobrigando, portanto, do ônus do art. 373, I, do CPC. Ressalte-se que a comprovação de quais dados teriam sido vazados não se trata de prova diabólica, considerando que, como detentora dos dados, a Parte Autora tem direito ao acesso a quais dados foram vazados. Todavia, nos presentes autos, a parte autora se limitou a fundamentar o seu pedido em notícias veiculadas pela imprensa, bem como em informação da SERASA S/A que informa, tão somente, o vazamento do número do CPF da autora. Dessa forma, patente a ausência do direito reclamado, ante ao fato de que a Parte Autora não se desincumbiu do ônus do art. 373, I, do CPC. Tal entendimento encontra sustentação em diversos julgados do TJPE, conforme pode se extrair a seguir: DIREITO CIVIL E DIREITO DIGITAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ALEGADO VAZAMENTO DE DADOS PESSOAIS. LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS (LGPD). AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. I. CASO EM EXAME: Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de indenização por danos morais formulados em face da Serasa S.A., sob a alegação de vazamento de dados pessoais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A controvérsia centra-se na existência de prova suficiente acerca do alegado vazamento de dados pessoais e na consequente caracterização de dano moral passível de reparação, com aplicação das normas da LGPD e do Código de Defesa do Consumidor. III. RAZÕES DE DECIDIR: A parte autora não apresentou elementos probatórios mínimos que indicassem a efetiva ocorrência de vazamento de dados pessoais por conduta atribuível à requerida. A alegação de dano moral in re ipsa não se sustenta na ausência de comprovação inicial mínima dos fatos narrados. A inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe indícios de verossimilhança, inexistentes no caso em análise. Relatórios técnicos apresentados pela requerida demonstram a ausência de falhas em seus sistemas de segurança e afastam a vinculação entre os dados alegadamente vazados e a Serasa S.A. O conjunto probatório foi considerado insuficiente para amparar a pretensão indenizatória, mantendo-se a sentença de improcedência. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: "1. A configuração de dano moral decorrente de suposto vazamento de dados pessoais exige prova mínima do fato e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados. 2. A inversão do ônus da prova no âmbito do Código de Defesa do Consumidor não é aplicável quando ausentes indícios mínimos de verossimilhança das alegações do consumidor." (TJPE, Apelação Cível nº 0000738-77.2024.8.17.2950, 5ª Câmara Cível, Rel. Subst. Des. Silvio Romero Beltrão, j. 11.02.2025) DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUPOSTO VAZAMENTO DE DADOS PESSOAIS. AUSÊNCIA DE PROVAS. DANO MORAL NÃO PRESUMIDO. RECURSO DESPROVIDO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. CASO EM EXAME: Recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos morais fundada em alegado vazamento de dados pessoais pelo Serasa S.A., por ausência de comprovação do fato, do dano e do nexo de causalidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A questão em discussão consiste em: (i) saber se a Serasa S.A. foi responsável por vazamento de dados pessoais do autor, caracterizando o dever de indenizar; (ii) saber se o dano moral decorreria automaticamente do simples vazamento; (iii) verificar se seria caso de inversão do ônus da prova; (iv) analisar eventual cerceamento de defesa por indeferimento de instrução probatória. III. RAZÕES DE DECIDIR: Inexistência de provas mínimas do fato alegado – autor não demonstrou que dados pessoais foram efetivamente vazados nem a vinculação dos supostos vazamentos com os sistemas da recorrida. Documentos apresentados pela recorrente (notícias e prints de sites) não possuem idoneidade técnica para comprovar os fatos narrados. Relatórios e parecer técnico da requerida atestam inexistência de vazamentos em seus sistemas. A inversão do ônus da prova não é automática e exige verossimilhança das alegações, o que não se configurou no caso. Inexistência de cerceamento de defesa – contradição entre pedido inicial de julgamento antecipado e posterior requerimento de produção de provas. Majoração dos honorários advocatícios de sucumbência para 15% sobre o valor da causa, com exigibilidade suspensa pela gratuidade de justiça. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. A configuração de dano moral decorrente de suposto vazamento de dados pessoais exige prova mínima do fato e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados. 2. A inversão do ônus da prova no âmbito do Código de Defesa do Consumidor não é aplicável quando ausentes indícios mínimos de verossimilhança das alegações do consumidor. 3. Não há cerceamento de defesa quando a parte, após requerer julgamento antecipado da lide, posteriormente pleiteia produção de provas, sem apresentar elementos concretos que justifiquem a instrução." (TJPE, Apelação Cível nº 0000405-70.2024.8.17.2160, 1ª Turma da Câmara Regional de Caruaru, Rel. Des. José Severino Barbosa , j. 07.05.2025) Com isso, a alegação de prática de ilícito civil perpetrada pela Ré, por suposta infração à LGPD não deve prosperar. II.II.II. Da Inexistência de Dano Moral: No que concerne aos danos morais, sabe-se que são aqueles que ferem o íntimo do ser humano, seu psicológico, bem como os direitos da personalidade, como o nome, a honra e a intimidade. Segundo afirma a doutrinadora Maria Helena Diniz, "o dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo". De certo, o dano moral não pode ser confundido com meros dissabores ou aborrecimentos vivenciados no dia-a-dia do ser humano, tampouco, pode ser fonte de enriquecimento sem causa, não podendo o juiz, sob pena de inviabilizar o tráfico das relações jurídicas, supor que fatos do cotidiano configurem o dano moral indenizável. Neste ponto, o entendimento da jurisprudência majoritária é no sentido de que “a configuração de dano moral decorrente de suposto vazamento de dados pessoais exige prova mínima do fato e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados”, conforme exposto acima. Logo, com a ausência nestes autos de prova mínima do vazamento de dados da parte Autora e do nexo causal entre a conduta imputada e os danos alegados, não vislumbro a ocorrência de ato lesivo apto a gerar responsabilização da Demandada à reparação dos danos morais pleiteados pelo(a) Demandante. Sendo assim, a declaração da improcedência do pedido de indenização formulado pelo na peça vestibular é medida que ora se impõe. III. DISPOSITIVO: Isto posto, como consequência dos fundamentos fáticos e jurídicos supracitados, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por MARCO JOSE DA SILVA - CPF: 032.389.404-65. Encerrada a prestação jurisdicional, EXTINGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Desta feita, diante do princípio da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento da taxa judiciária e das custas processuais relativas a este processo, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão do deferimento da gratuidade da justiça, conforme §3º, do art. 98, do CPC. No mesmo diapasão, nos termos do caput e do §1º, do art. 85, do CPC, condeno o(a) Requerente a pagar os honorários advocatícios sucumbenciais, fixados em 20% (vinte por cento) do valor atualizado da causa, cuja exigibilidade também ficará suspensa em razão do deferimento da gratuidade da justiça, conforme §3º, do art. 98, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Por sua vez, atentem as partes para o detalhe de que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais, e/ou com efeitos infringentes, e/ou meramente postulatórios, dará ensejo à imposição da multa prevista pelo artigo 1.026, § 2º, do CPC. Havendo interposição de apelação, intime-se a parte recorrida para contrarrazões e, em seguida, remetam-se os autos ao TJPE independentemente de novo despacho deste juízo. Do contrário, certifique-se o trânsito em julgado e, por fim, arquive-se definitivamente. Cumpra-se! SÃO LOURENÇO DA MATA, data da assinatura eletrônica. JUIZ(A) DE DIREITO dwrp 1106

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Processo nº 0000088-68.2017.8.17.3340

ID: 336649490

Tribunal: TJPE Órgão: 1ª Vara da Comarca de São José do Egito Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Nº Processo: 0000088-68.2017.8.17.3340

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ERASMO SIQUEIRA NETO HERICA DE KASSIA NUNES DE BRITO ROMERIO AUGUSTO GUIMARAES

Despacho_Intimação_Intimação (Outros)

Advogados:

GILBERTO DE SOUZA COSTA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

GILBERTO DE SOUZA COSTA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Vara da Comarca de São José do Egito R 25 DE AGOSTO, S/N, Forum Des. Fausto Campos, Bela Vista, SÃO JOSÉ DO EGITO - PE - CEP: 56700-000 - F:(87) … Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Vara da Comarca de São José do Egito R 25 DE AGOSTO, S/N, Forum Des. Fausto Campos, Bela Vista, SÃO JOSÉ DO EGITO - PE - CEP: 56700-000 - F:(87) 38443438 Processo nº 0000088-68.2017.8.17.3340 AUTOR(A): MUNICIPIO DE SAO JOSE DO EGITO RÉU: ROMERIO AUGUSTO GUIMARAES, ERASMO SIQUEIRA NETO, HERICA DE KASSIA NUNES DE BRITO SENTENÇA I – DO RELATÓRIO. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DO EGITO em face do réu ROMERIO AUGUSTO GUIMARÃES, ERASMO SIQUEIRA NETO e HÉRICA DE KASSIA. Foi relatado na inicial, em resumo: a) No exercício financeiro de 2016, o então alcaide promoveu a “Festa de Reis”, edição de 2016. b) Com o suposto fim de cumprir parte do objeto pactuado, a municipalidade deflagrou, em 04/01/2016, o processo de inexigibilidade de licitação nº 003/2016 (processo administrativo nº 10004/2016), o qual culminou na contratação direta da Empresa LUCENA E AGUIAR LTDA-ME, para a apresentação do show da BANDA HARRY ESTIGADO, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).; c) Acontece que houve ilegalidade no procedimento de inexigibilidade da licitação; d) Requereu a condenação do réu em razão da ofensa ao art. 10, caput, inciso VIII, e art. 11, II da Lei 8.492/92. Em decisão de Id. 21942724 foi determinada a notificação da parte para contestar a ação. A ré Hérica de Kássia apresentou contestação no ID 42902244. Romério Augusto apresentou contestação no ID 42902538. Réplica no ID 60107966. Manifestação Ministerial no ID 63790867. Decisão rejeitando as preliminares e indeferimento o pedido Ministerial de litisconsórcio (ID 68018367). Decisão recebendo a inicial – ID 78459350. Sentença reconhecendo a prescrição da pretensão – ID 108440629. A parte autora interpôs recurso, sendo dado provimento pelo Tribunal e retornado os autos para seguimento do feito (ID 193949444). É o relatório. II –DA FUNDAMENTAÇÃO. B) Do Mérito. Em sua inicial o Município de São José do Egito alegou que os promovidos de que este havia praticado atos de improbidade administrativa consistente nas condutas previstas nos art. 10, caput, VIII e art. 11, caput e inciso II, da Lei 8.429/92. B.1) Da revogação dos incisos II do art. 11 da Lei 8.429/92. A parte autora requereu a condenação do réu por ofensa ao disposto no inciso II do art. 11 da Lei 8.429/92. Após as alterações decorrentes da Lei 14.230/2021, os incisos I e II do art. 11 foram revogados. Uma vez que, à Lei de Improbidade Administrativa devem ser aplicados os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, de acordo com o §4º do Art. 1º da Lei 8.429/92, deve ser aplicada a retroatividade da lei ao presente caso. De acordo com o tema 1199 do STF: “A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente”. Desta forma, uma vez que ainda não foi proferida condenação definitiva no presente feito, os efeitos da abolição dos incisos I e II do art. 11 da Lei 8.429/92, alcançam a presente ação. Considerando ainda que não restou demonstrado nos autos o dolo específico do réu, entendo que não ficou caracterizado o ato de improbidade em relação à ofensa do art. 11 da Lei 8.429/92. No mesmo sentido se manifestou o Tribunal de Justiça de Pernambuco, vejamos: EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CABIMENTO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA ANTERIOR À LEI FEDERAL Nº 14.230/21. CONDUTA DESCRITA NO ART. 11, INCISO I, DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REVOGAÇÃO EXPRESSA. EXTINÇÃO DO TIPO. INCIDÊNCIA IMEDIATA SOBRE AS AÇÕES EM CURSO. PRECEDENTES QUALIFICADOS DO STF. REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDA. 1. O juízo de origem julgou improcedente ação de improbidade administrativa em razão da ausência de prova do elemento subjetivo da conduta típica descrita no artigo 11, inciso I, da Lei Federal nº 8.249/92 - Lei de Improbidade Administrativa -, com a redação anterior à Lei Federal nº 14.230/21. 2. Sujeita-se à remessa necessária a sentença de improcedência da ação de improbidade administrativa proferida ante da entrada em vigor da Lei Federal nº 14.230/21, por aplicação analógica do artigo 19 da Lei da Ação Popular. 3. Os efeitos da abolição do tipo descrito no artigo 11, inciso I, da Lei de Improbidade Administrativa pelo artigo 4º, inciso VI, da Lei Federal nº 14.230/21 alcançam as ações em curso, em consonância com orientação jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal nos julgamentos do Recurso Extraordinário com Agravo nº 843.989/PR (Tema de Repercussão Geral nº 1199) e dos Embargos de Declaração nos Embargos de Divergência no Recurso Extraordinário com Agravo nº 803.568/SP. 4. Remessa necessária desprovida. Decisão unânime. (Remessa Necessária Cível 0018523-24.2014.8.17.0001, Rel. JORGE AMERICO PEREIRA DE LIRA, Gabinete do Des. Jorge Américo Pereira de Lira, julgado em 16/02/2024, DJe ). B.2) Da não comprovação do elemento subjetivo em relação ao prejuízo ao erário. A parte autora alegou que o réu ofendeu o disposto no art. 10, caput, VIII, da Lei 8.429/92. A parte ré, em resumo, alegou que não praticou ato de improbidade administrativa. O ato impugnando é o processo licitatório de inexigibilidade, o qual culminou na contratação direta da Empresa LUCENA E AGUIAR LTDA-ME, para a apresentação do show da BANDA HARRY ESTIGADO, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O ponto controvertido consiste em analisar se os fatos atribuídos ao réu ultrapassam a esfera da irregularidade e podem ser caracterizados como atos de improbidade administrativa. Assim, se faz necessário no presente caso analisar se as condutas praticadas pelo réu, além de irregulares, constituíram ato ímprobo. Destaco que para a configuração do ato de improbidade, se faz necessário, para qualquer das modalidades, a existência do elemento subjetivo, do dolo (Art. 1º, §1º da Lei 8.429/92). Registro que, com as alterações presente ocorridas na Lei de improbidade, não mais se admite o dolo genérico, conforme pode ser visto no §2º do Art. 1º da Lei 8.429/92: “Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente”. Desta forma, o ato de improbidade não consiste apenas em um ato irregular, que pode ser decorrente, entre outras coisas de uma falha profissional do agente público. Para a configuração do ato de improbidade, se faz necessário que o os atos práticos, além de irregulares estejam eivados de má-fé e desonestidade. Analisando os autos, entendo que, não obstante as alegações e documentos apresentados na inicial, a parte autora não logrou êxito em comprovar o dolo do réu, ao menos no que diz respeito ao dolo específico. Registro que, com as alterações provocadas pela Lei 14.230/2021, se faz necessária a comprovação do dolo do réu, de modo que o simples dolo genérico não é suficiente para embasar uma condenação, devendo ser provado o dolo específico, aquele segundo o qual o réu teria agido com o fim de obter um ganho ilícito com a conduta. Cabe frisar que o art. 10, inciso VIII, da Lei 8.429/92 exige a demonstração perda patrimonial, conforme o texto abaixo exposto: “frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva”. Muito embora tenha sido demonstrado a existência do processo licitatório e alegação de irregularidade da inexigibilidade licitação, a parte autora não indicou se houve prejuízo ao erário ou outros danos. Veja que se faz necessária a demonstração de que o agente atuou com a intenção de obter resultado ilícito com sua conduta, o que não restou demonstrado. Repita-se que não há nos autos se os requeridos agiram com a vontade livre e consciente de lesar os cofres públicos ou de obter enriquecimento ilícito. A contratação direta, embora irregular sob o ponto de vista da legalidade administrativa, não configura ato ímprobo quando ausentes provas da intenção deliberada de causar prejuízo ao erário ou de obter vantagem indevida. É o entendimento da jurisprudência: ADMINISTRATIVO – APELAÇÃO – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – ATO IMPUTADO AO ENTÃO PREFEITO DE PARNAMIRIM/PE – EXCESSO DE DESPESAS COM PESSOAL – DESCUMPRIMENTO DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL – DOLO ESPECÍFICO DE OBTER FIM ILÍCITO – NECESSIDADE – APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.230/21 – TEMA 1.199 DA REPERCUSSÃO GERAL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE CONDUTA DOLOSA. 1 – Cuida-se de recurso de apelação interposto contra a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados pelo Ministério Público e condenou o ora apelante por ato de improbidade administrativa supostamente praticado enquanto Prefeito de Parnamirim/PE. 2 – De acordo com a petição inicial, o apelante extrapolou o limite de despesas com pessoal previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal e não adotou as providências necessárias para reduzir o excesso de gastos. O magistrado de piso acolheu os argumentos do Ministério Público e considerou o apelante incurso na então vigente redação do art. 11, caput e inciso II, da Lei nº 8.429/92. 3 – No entanto, foi posteriormente aprovada a Lei nº 14.230/21, que promoveu profundas alterações no regime das improbidades. No que interessa ao presente feito, a referida lei deu nova redação ao art. 11 da Lei nº 8.429/92 e passou a exigir o elemento subjetivo dolo para a configuração do ato. 4 – A alteração do caput do art. 11 substituiu a expressão “qualquer ação ou omissão” por “ação ou omissão dolosa”. Além disso, houve a revogação do inciso II do citado artigo, que enquadrava como ato de improbidade “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”. Outra alteração promovida pela Lei nº 14.230/21 introduziu a figura da prescrição intercorrente. 5 – Pelo visto, as substanciais modificações introduzidas pela Lei nº 14.230/21 são mais benéficas aos agentes públicos, o que levou o apelante a requerer a sua aplicação retroativa tanto no que se refere à exigência de conduta dolosa como à prescrição intercorrente. 6 – O assunto foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral (Tema 1.199), tendo sido fixada tese jurídica segundo a qual as novas disposições legais acerca da prescrição são irretroativas e somente se aplicam a partir da publicação da Lei nº 14.230/21. 7 – Situação diversa ocorre no tocante à necessidade do elemento subjetivo dolo para a tipificação do ato de improbidade, uma vez que o STF fixou a tese de que a nova disciplina legal é aplicada aos processos em curso, ou seja, sem condenação transitada em julgado, “devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente” (ARE 843.989/PR). 8 – Na espécie, o juiz de 1º grau destacou que “a lei se satisfaz com a presença do dolo genérico – ou seja, ainda que o agente não esteja animado por uma finalidade específica de lesar o Erário ou de se enriquecer ilicitamente”. Acrescentou o magistrado, ao fixar as penalidades, que “não obstante o descumprimento da norma, não há comprovado dolo de desonestidade”. 9 – Acontece que a nova redação da Lei nº 8.429/92 é expressa ao dispor que somente as ações ou omissões praticadas com dolo específico podem ser enquadradas como atos de improbidade; melhor dizendo, faz-se necessária a demonstração de que o agente atuou com a intenção de obter resultado ilícito com sua conduta. 10 – Desse modo, o fato de o apelante exercer o cargo de prefeito e, em tese, conhecer os limites de gastos com pessoal, não é suficiente para que haja uma responsabilização por ato de improbidade, uma vez que nada há nos autos comprovando que ele tenha agido com a vontade livre e consciente de lesar os cofres públicos ou de obter enriquecimento ilícito, o que é reconhecido pela própria sentença recorrida. 11 – Consequentemente, não comprovado o dolo específico por parte do agente público, exigência esta trazida pela Lei nº 14.230/21, a improcedência da ação é medida que se impõe. Precedentes dos tribunais superiores e do TJPE.12 – Recurso de apelação a que se dá provimento para julgar improcedente a ação de improbidade administrativa. Decisão unânime. (APELAÇÃO CÍVEL 0000738-39.2015.8.17.1060, Rel. CARLOS FREDERICO GONCALVES DE MORAES, Gabinete do Des. Carlos Frederico Gonçalves de Moraes (3ª CDP), julgado em 26/03/2024, DJe ) (Destaquei). Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DIRETA SEM LICITAÇÃO. PERÍCIA JUDICIAL. SOLICITAÇÃO, PELO PERITO, DA JUNTADA DE DOCUMENTOS NECESSÁRIOS À REALIZAÇÃO DA PROVA TÉCNICA. NÃO APRESENTAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA DO DOLO ESPECÍFICO E DO DANO EFETIVO. ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra sentença que julgou improcedente o pedido em ação de improbidade administrativa contra ex-prefeito, por contratações diretas sem licitação, alegando ausência de comprovação de dolo e prejuízo ao erário. O Ministério Público alegou cerceamento de defesa pela não realização de prova pericial para apurar o prejuízo ao erário e sustentou a ocorrência de dolo específico e dano decorrente das contratações diretas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se houve cerceamento de defesa em razão da não realização da prova pericial requerida para aferição de eventual prejuízo ao erário; (ii) estabelecer se as contratações diretas realizadas sem licitação configuram ato de improbidade administrativa nos termos da Lei n. 8.429/92, considerando as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/21, com a exigência de dolo específico e dano efetivo. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Deferida a prova pericial, não realizada em virtude da inércia do Ministério Público em fornecer a documentação necessária para tanto, não há que se falar em cerceamento de defesa. (v.v.): O indeferimento da prova pericial essencial comprometeu a instrução do processo, impossibilitando a apuração dos fatos e do eventual superfaturamento. A Lei n. 14.230/2021 exige dolo específico para configuração de ato de improbidade, o que demanda adequada instrução probatória. 4. A configuração do ato de improbidade administrativa, após a vi gência da Lei n. 14.230/21, exige a presença cumulativa do dolo específico e do dano efetivo ao erário, afastando-se o entendimento anterior do dano presumido ("in re ipsa"). 5. A contratação direta, embora irregular sob o ponto de vista da legalidade administrativa, não configura ato ímprobo quando ausentes provas da intenção deliberada de causar prejuízo ao erário ou de obter vantagem indevida. 6. Não comprovado o superfaturamento, o conluio ou a vantagem pessoal indevida dos réus, bem como inexistindo demonstração de prejuízo patrimonial efetivo, não se verifica a prática de ato de improbidade administrativa nos termos do art. 10, VIII, da LIA. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Preliminar rejeitada. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. A não realização de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando a sua produção é inviabilizada pela própria parte requerente, que não fornece as informações necessárias à sua efetivação. 2. Para a configuração do ato de improbidade administrativa fundado no art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/92, é imprescindível a demonstração do dolo específico e do dano patrimonial efetivo ao erário, sendo insuficiente a mera contratação sem licitação. 3. A simples irregularidade administrativa, desacompanhada de prova do elemento subjetivo e do prejuízo ao erário, não autoriza a imposição das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XL; CF/1988, art. 37, caput e § 4º; Lei nº 8.429/1992, arts. 1º, §§ 2º e 4º; 3º; 10, VIII; 17-C, § 1º; Lei nº 14.230/2021. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989, Tema 1.199; TJMG, Ap Cível 1.0000.20.478723-8/002, Rel. Des. Luís Carlos Gambogi, j. 25.04.2024; TJMG, Ap Cível/Rem Nec 1.0172.13.001447-2/001, Rel. Des. Raimundo Messias Júnior, j. 22.04.2025. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.225831-9/001, Relator(a): Des.(a) Richardson Xavier Brant (JD 2G) , 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/07/2025, publicação da súmula em 11/07/2025) Não comprovado o superfaturamento, o conluio ou a vantagem pessoal indevida dos réus, bem como inexistindo demonstração de prejuízo patrimonial efetivo, não se verifica a prática de ato de improbidade administrativa nos termos do art. 10, caput, VIII, da LIA. Desta forma, entendo que a parte autora, apesar de todas as alegações e documentos carreados aos autos, não conseguiu se desincumbir do seu ônus probatório consistente na demonstração do dolo do réu. Por fim, cabe frisar se os fatos narrados pelo autor da ação civil pública não se enquadrarem formal e materialmente ao tipo legal apontado na petição inicial, deve ser prolatada sentença de improcedência do pedido condenatório, em qualquer fase do processo, nos termos do art. 17, §11º, da Lei 8.429/92. III – DO DISPOSITIVO. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I do CPC, Sem custas. INTIMEM-SE. Com o trânsito em julgado, ARQUIVEM-SE os autos. Caso seja apresentada apelação, INTIME-SE a parte apelada para, no prazo de 15 (quinze) dias apresentar contrarrazões e, em seguida, REMETAM-SE os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Pernambuco. Decorrido o prazo acima sem manifestação, em razão da analogia com o art. 19 da Lei 4.717/65, REMETAM-SE os autos para o Egrégio Tribunal de Justiça de Pernambuco para o reexame necessário. São José do Egito– PE, datado e assinado eletronicamente Tayná Lima Prado Juíza de Direito

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Processo nº 0000798-52.2023.8.17.5030

ID: 258781426

Tribunal: TJPE Órgão: Gabinete do Des. Eduardo Guilliod Maranhão 4ª CCRIM Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 0000798-52.2023.8.17.5030

Data de Disponibilização: 22/04/2025

Polo Ativo:

KAIO FELIPE RIBEIRO DA CRUZ

Polo Passivo:

Intimação (Outros)

Advogados:

JULIO CESAR PEREIRA CORREIA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

EVELLAINY KARINY RIBEIRO DE OLIVEIRA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 4ª Câmara Criminal - Recife - F:( ) Processo nº 0000798-52.2023.8.17.5030 APELANTE: KAIO FELIPE RIBEIRO DA CRUZ, JAMISON JOSE DA SILVA REPRESENTANTE… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 4ª Câmara Criminal - Recife - F:( ) Processo nº 0000798-52.2023.8.17.5030 APELANTE: KAIO FELIPE RIBEIRO DA CRUZ, JAMISON JOSE DA SILVA REPRESENTANTE: DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE PERNAMBUCO APELADO(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO INTEIRO TEOR Relator: EDUARDO GUILLIOD MARANHAO Relatório: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO Gabinete do Desembargador Eduardo Guilliod Maranhão 4ª CÂMARA CRIMINAL Apelação Criminal nº 0000798-52.2023.8.17.5030 Apelantes: Jamison José da Silva e Kaio Felipe Ribeiro da Cruz Apelado: Ministério Público do Estado de Pernambuco Relator: Des. Eduardo Guilliod Maranhão RELATÓRIO Cuidam-se de recursos de Apelação Criminal interpostos contra sentença proferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Água Preta, que os condenou os réus nos termos a seguir: (i) Jamison José da Silva à pena de 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa pelo crime do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 e 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão e 900 (novecentos) dias-multa pelo crime do artigo 35 da Lei de Drogas, totalizando 11 (onze) anos e 1 (um) mês de reclusão e 1.600 (um mil e seiscentos) dias-multa; e (ii) Kaio Felipe Ribeiro da Cruz à pena de 8 (oito) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 820 (oitocentos e vinte) dias-multa pelo delito de tráfico de drogas e 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 950 (novecentos e cinquenta) dias-multa pelo crime de associação para o tráfico, totalizando 12 (doze) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 1.770 (um mil, setecentos e setenta) dias-multa. Apelação do réu Jamison José da Silva (Id 32858594): A Defensoria requer, preliminarmente, (i) o direito de o acusado recorrer em liberdade e (ii) a absolvição por ausência de materialidade delitiva por entender pela nulidade da busca pessoal e domiciliar. No mérito, pleiteia: (i) a absolvição do crime de associação para o tráfico por inexistência de comprovação do animus associativo, permanência e habitualidade; (ii) o redimensionamento da pena-base para o mínimo legal; (iii) a aplicação da atenuante da confissão espontânea; (iv) o afastamento da causa de aumento de pena previsto no artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/2006; (v) a aplicação da causa de diminuição da pena do Tráfico Privilegiado em seu patamar máximo; (vi) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos; e, (vii) a isenção do pagamento das custas processuais ante a condição de hipossuficiência financeira do apelante. Apelação do réu Kaio Felipe Ribeiro da Cruz (Id 32858590): O Advogado requer, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa devido a não realização de exame toxicológico. No mérito, pleiteia: (i) a desclassificação do crime de tráfico de drogas para o de porte de drogas para consumo pessoal; (ii) a absolvição do crime de associação para o tráfico; (iii) o redimensionamento da pena-base por entender que a exasperação foi inidônea; (iv) o redimensionamento da pena intermediária para afastar a agravante da reincidência por evidenciar violação ao princípio do no bis in idem; (v) a alteração do regime inicial do cumprimento de pena do fechado para o aberto; (vi) a redução da quantidade de dias-multa; e, (vii) o direito de recorrer em liberdade. Contrarrazões devidamente ofertadas em relação a ambos os recursos, pugnando pelo improvimento dos apelos (Id 32858596). A Procuradoria de Justiça Criminal ofertou parecer pelo provimento parcial dos recursos, afastando-se apenas a valoração negativa da circunstância judicial referente aos motivos do crime para ambos os acusados, mantendo-se os demais termos da sentença (Id 36979494). É o relatório, no essencial. À revisão. Recife, data da certificação digital. Des. Eduardo Guilliod Maranhão Relator Voto vencedor: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO Gabinete do Desembargador Eduardo Guilliod Maranhão 4ª CÂMARA CRIMINAL Apelação Criminal nº 0000798-52.2023.8.17.5030 Apelantes: Jamison José da Silva e Kaio Felipe Ribeiro da Cruz Apelado: Ministério Público do Estado de Pernambuco Relator: Des. Eduardo Guilliod Maranhão VOTO De início, observo que o presente recurso preenche todas as condições de admissibilidade e pressupostos recursais necessários para o seu conhecimento, motivo pelo qual passo a examiná-lo. Narra a denúncia (Id 32858526): “No dia 14 de agosto de 2023, no período da tarde, no bairro Água Mineral no município de Água Preta/PE, KAIO FELIPE, ALEXANDRE MANOEL DA SILVA SANTOS e JAMISON JOSÉ DA SILVA, na companhia de M. E. D. N. B. (menor de idade), associados entre si, expunham à venda, traziam consigo drogas e guardavam sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. No dia dos fatos, policiais militares receberam denúncias que JAMISON v.’Jaminho’ e sua companheira MARIA EDUARDA realizavam comércio de entorpecentes ilícitos no bairro, momento em que se deslocaram ao local supracitado, ao chegarem ao local, encontraram JAMISON, sua companheira, MARIA e KAIO FELIPE, sendo apreendido com eles cerca de 601 big-bigs de maconha. Na oportunidade, a menor afirmou que ela e o JAMISON seriam responsáveis pela distribuição dos entorpecentes no bairro Água Mineral em Água Preta e KAIO e ALEXANDRE responsáveis pela venda do entorpecente na localidade. Empós, os envolvidos e os materiais apreendidos foram conduzidos a Delegacia de Polícia da cidade de Palmares. Em tempo informo que o denunciado KAIO é reincidente específico, estando em cumprimento de pena em regime aberto nos seguintes processos: autos n° 0000028-30.2021.8.17.5030 (art. 33 e art. 34, VI da Lei nº 11.343/2006) com execução de pena no SEEU sob o nº 1000025- 35.2023.8.17.4142 e autos nº 0000738-16.2022.8.17.5030 (relacionado ao art. 215-A, CP), razão pela qual pugna desde já pela comunicação ao juízo da execução para providências cabíveis. Por fim, informo que o procedimento relacionado a menor apreendida será objeto de ação separada. [...]” DO RECURSO DO RÉU JAMISON JOSÉ DA SILVA À partida, passo à análise do recurso interposto pela Defensoria Pública em favor do réu Jamison José da Silva. Em suas razões recursais, a Defensoria pleiteia, preliminarmente, pelo reconhecimento do direito de o acusado recorrer em liberdade. Todavia, observo que tal pleito já foi devidamente analisado pelo Magistrado de origem quando da prolação da sentença, nos termos a seguir: “No caso em concreto, tenho que há cautelaridade concreta a determinar a manutenção da prisão neste momento restando clara a empreitada criminosa e organizada, demonstrado a necessidade da manutenção da prisão, havendo risco à ordem pública, que justifica a manutenção da prisão provisória, subsistindo, assim, a cautelaridade concreta necessária para prisão, nos termos do art.312 do CPP” (Id 32858568). Ademais, esclareço que o recurso de apelação, mormente quando já na fase de julgamento, não é a via adequada para pleitear o direito de aguardar a apreciação do recurso em liberdade, uma vez que este deve ser feito por meio de habeas corpus, motivo pelo qual não conheço do pedido. Ainda em suas razões, a Defensoria Pública questiona a legalidade das provas colhidas nos autos ao argumento de que a apreensão das drogas se deu de maneira ilícita. Sustenta que a busca pessoal e domiciliar encontram-se eivadas de nulidade e que, por essa razão, deve ser reconhecida a absolvição do réu por falta de provas. Todavia, verifico que não assiste razão à defesa quanto ao tema. É que, na dicção do artigo 240 do Código de Processo Penal (CPP), a busca domiciliar será procedida quando houver fundadas razões que a autorizem para “apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso” (§ 1º, alínea “d”), enquanto que a busca pessoal será realizada quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos, entre outros (§ 2º). Sabe-se que, à luz da jurisprudência pátria, que a busca pessoal independerá de mandado quando houver prisão ou fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida, de objetos ou de papéis que constituam corpo de delito, ou, ainda, quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar (CPP, art. 244). É dizer, para que a busca pessoal desprovida de mandado judicial seja considerada lícita é necessário que a abordagem policial venha precedida de fundadas razões, objetivamente aferidas pelas circunstâncias do caso concreto. Essa justa causa deve ser devidamente justificada com base em um juízo de probabilidade de que o agente está de posse/porte de armas ou objetos que constituam corpo de delito. Na presente hipótese, ao contrário do que sustenta a nobre defesa, verificam-se configuradas as fundadas razões exigidas pela lei processual penal para a realização de busca pessoal do réu. Na hipótese, observa-se que a abordagem policial ocorreu devido à denúncias feitas por populares relatando sobre um intenso tráfico de drogas no bairro de Água Mineral, cidade de Água Preta, tendo como autores da prática ilícita Jamison (vulgo Jaminho) e sua namorada Maria Eduarda (menor com 15 anos de idade), razão pela qual foi montada uma operação, via da qual o efetivo policial se deslocou ao local informado, encontrando ambos na área juntamente com o acusado Kaio Felipe. Os depoimentos dos policiais que participaram da diligência (Thiago Felipe Costa Barbosa e João Paulo Leite da Silva), colhidos em sede inquisitorial e confirmados em Juízo, ratificam a ocorrência da prática delitiva, tendo o Magistrado de origem, consignou em sentença as declarações (Id 32858568): “[...] Em juízo foram colhidas as oitivas, iniciando-se pelo Sr. Thiago, afirmando que se lembra da ocorrência, recebendo denúncias de tráfico na região do bairro Água Mineral; montaram uma operação, onde encontraram Jamisson junto com caio, e uma namorada do primeiro; encontraram big bigs de maconha, com todos os que estavam na localidade, afirmando que seria de Jaminho; foram até Alexandre, que entregou mais droga; Jaminho disse que teria mais droga, tendo a menor apresentado mais droga, totalizando uns 360 big; a adolescente era os responsáveis pela distribuição da droga na localidade; Kaio e Alexandre fariam a venda; o local é conhecido pelo tráfico; já abordou Jaiminho, e Alexandre antes, sem encontrar nada com eles, sempre por denúncias com o tráfico; já tinha prendido Kaio, tendo a menor reconhecido relacionamento com Jaminho; depois disso chegou a ver Alexandre algumas vezes; Kaio já foi conduzido por posse de entorpecente, porém, já foi detido por importunação sexual; a abordagem aconteceu próximo a uma igreja assembleia; Kaio felipe foi abordado simultaneamente, estando chovendo no momento; Jaiminho e a namorada estava afastados, mas estavam próximos, uns 15, 20 metros; Kaio estava indo em direção à casa dele; com Kaio encontrou 28 big big de maconha; os 601 big bigs não foi atribuído a Kaio. Foi ouvido o Sr. João Paulo, disse que foram acionados para abordar três pessoas, um casal e um homem que estava próximo; com os três foram encontrados maconha, em quantidades distintas de big big; a adolescente e Jaminho seriam os responsáveis por receber e guardar a droga e distribuir o entorpecente; a adolescente informou que tinham guardado uma garrada térmica com drogas, indo ao local e encontraram; Jaminho disse que tinha repassado droga para outra pessoa, tendo a pessoa confirmado que tinha pego a droga; e continuamente a jovem disse que teria mais droga enterrada em garrafas pet; a jovem disse que teria mais droga em sua casa, indo lá junto da mãe dela, onde encontraram mais droga; as pessoas disseram que eram envolvidos com drogas, inclusive o pai de Kaio; ouviram pessoas que confirmaram que vendiam drogas; haveria uma distribuição de tarefas mencionadas pelo policial; não sabe como funciona o armazenamento de informações da polícia; não conhece nenhum dos envolvidos; haviam uma distância entre o casal e Kaio; todos andavam no mesmo sentido; a menor disse que distribuía droga para diversos locais em Água Preta; a maior parte da droga o casal assumiu ser de sua propriedade, e não de Kaio; não foi encontrada balança. [...]” Com efeito, segundo os elementos de convicção expressamente consignados na sentença impugnada, estavam presentes as fundadas suspeitas da posse de objeto constitutivo de corpo de delito, para abordagem e revista do acusado, motivada por informações detalhadas que foram fornecidas por populares acerca do tráfico de drogas na localidade em que ocorreu a abordagem policial. Sendo assim, uma vez que o contexto fático demonstrava a situação de flagrância pela prática do crime de tráfico, tendo em vista a existência de informações anteriores nesse sentido que, como visto, foram corroboradas pelas investigações in loco dos agentes policiais, não há que se falar em ilegalidade das provas obtidas por ocasião do flagrante. Desse modo, a informação fornecida foi minimamente confirmada, sendo certo que as referidas diligências traduziram em exercício regular da atividade investigativa promovida pela autoridade policial, o que justificou a abordagem. Em caso semelhante, confira-se o recente precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ): AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. BUSCA PESSOAL. FLAGRANTE EM VIA PÚBLICA. DENÚNCIA ANÔNIMA ESPECIFICADA. EXERCÍCIO REGULAR DA ATIVIDADE INVESTIGATIVA. JUSTA CAUSA CONFIGURADA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 28 DA LEI DE DROGAS. INVIABILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE DA PRÁTICA DE TRÁFICO DE DROGAS. ALTERAÇÃO DA CONCLUSÃO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE DEMANDARIA O REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Como é de conhecimento, para a realização de busca pessoal, que é regida pelo art. 244 do Código de Processo Penal, exige-se a presença de fundada suspeita de que a pessoa abordada esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou, ainda, quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar. 2. Na hipótese, segundo os elementos de convicção expressamente consignados pelas instâncias ordinárias, estava presente a fundada suspeita da posse de objeto constitutivo de corpo de delito para abordagem e revista do paciente e de sua companheira, pois motivada por denúncia anônima especificada, segundo a qual um casal estava comercializando drogas na Praça Rui Barbosa e, no local, os policiais militares identificaram os indivíduos portadores das características descritas na notícia, especialmente as fisionomias físicas e as vestimentas dos acusados, os quais portavam entorpecentes. Nesse viés, a informação anônima foi minimamente confirmada, sendo que as referidas diligências traduziram em exercício regular da atividade investigativa promovida pela autoridade policial, o que justificou a abordagem, após a confirmação das características pessoais relatadas na denúncia apócrifa. Portanto, tem-se que a diligência não foi desencadeada por suspeita vaga, tampouco baseada em meras conjecturas ou impressões subjetivas. 3. Omissis. 4. Omissis. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no HC nº 847.667/SP, 5ª T., rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 12/9/2023, DJe de 18/9/2023) Nesse viés, ao contrário do que sustenta a nobre defesa, verificam-se configuradas as fundadas razões exigidas pela lei processual penal para a realização de busca pessoal do réu. No tocante à busca domiciliar, há de se consignar que a jurisprudência da Corte Superior admite a realização da busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial em caso de tráfico ilícito de entorpecentes por se tratar de crime de natureza permanente, logo, sua consumação se protrai no tempo, persistindo a situação de flagrante enquanto não cessada a permanência. Desse modo, o delito em questão possibilita a prisão em flagrante a qualquer tempo enquanto não cessar a ocorrência do crime, nos termos do art. 303 do CPP. Consoante depoimentos testemunhais, no decorrer da abordagem policial, ao serem indagados se havia mais entorpecentes, a adolescente Maria Eduarda e o acusado Jamison disseram que sim, indicando um local onde funcionava um criadouro de animais, lá sendo encontrados enterrados em garrafas “pets” o restante da droga apreendida. Assim, não há que se falar em irregularidade do flagrante, uma vez que a nossa Constituição Federal permite o ingresso no domicílio alheio sem autorização quando se tratar de casos de flagrante delito, ainda que não se tenha ordem judicial permitindo a execução da medida, conforme se pode observar da leitura do artigo 5º, inciso XI, da nossa Carta Magna. Nesse contexto, não há como se dizer que as buscas pessoal e domiciliar foram realizadas ao arrepio da lei, de forma injustificada e arbitrária, vez que o contexto fático, corretamente verificado pelos policiais militares, constituiu fundadas razões para que a polícia realizasse as buscas. Por conseguinte, compreendo que não há motivos para ensejar a declaração da ilicitude das provas produzidas. Diante desse cenário, inexiste qualquer ilegalidade na abordagem policial efetuada no acusado, o que afasta a nulidade suscitada pela defesa. No tocante ao pedido de absolvição do crime de associação para o tráfico por inexistência de comprovação do animus associativo, permanência a habitualidade, também não vislumbro razão. A materialidade delitiva restou amplamente comprovada nos autos pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito (Id 32858445, páginas 3 a 7), bem como do Auto de Apresentação e Apreensão (Id 32858447, página 7), Auto de Constatação da Natureza e Quantidade da Droga (Id 32858447, página 8), Boletim de Ocorrência (Id 32858447, página 9 e Id 32858448, páginas 1 a 3), Laudo Pericial (Id 32858566), constatando-se que o material apreendido apresentou resultado positivo para Cannabis Sativa L. (“maconha”), com massa total de 646g (seiscentos e quarenta e seis gramas), fracionados em 601 (seiscentos e um) invólucros (“big-bigs”), além das provas orais colhidas no decorrer da persecução penal. Em que pese o apelante ter negado a prática delitiva, sustentando apenas que as drogas seriam para consumo próprio, vê-se que as circunstâncias da prisão em flagrante denotam um contexto de traficância, seja pela quantidade dos entorpecentes apreendidos e a forma pelas quais estavam acondicionados, seja por informações de populares dando conta da prática do tráfico de drogas na região. Ademais, o conjunto probatório coligido aos autos também evidenciam o vínculo associativo entre o réu Jamison e os corréus Alexandre Manoel, Kaio e Maria Eduarda para o tráfico de drogas, visto que, desde a fase inquisitorial, se depreende a concatenação de condutas interligadas entre si e distribuição de tarefas entre os réus, substrato necessário para demonstração do animus associativo, havendo evidências da associação para o tráfico, vez que restou comprovado que a distribuição dos entorpecentes cabia ao acusado Jamison e à adolescente Maria Eduarda, enquanto que a venda cabia ao acusado Kaio. Assim, demonstrada a estabilidade da associação criminosa e o papel dos acusados em sua estrutura, entendo que deve ser mantida a condenação dos réus também pelo crime de associação para o tráfico. Enfrento, neste momento, os pedidos relacionados à revisão da dosimetria da pena imposta ao réu Jamison. Observa-se da sentença que na primeira fase dosimétrica, a pena-base do apelante foi exasperada 1 (um) ano para o crime de tráfico e em 6 (seis) meses para o de associação para o tráfico em razão da valoração negativa da circunstância judicial motivos do crime, considerando, ainda, o critério autônomo de fixação da pena para fins de tráfico, consistente na quantidade da droga apreendida (artigo 42 da Lei de Drogas). Todavia, observo que a fundamentação utilizada pelo Juiz sentenciante para valorar negativamente os motivos do crime são genéricas e inerentes ao próprio tipo penal, limitando-se a dizer que a motivação se baseia na “obtenção de lucro fácil mediante a prática da traficância”. Ou seja, não houve a utilização de argumento válido para justificar o aumento da pena base do delito. Desse modo, entendo que referida circunstância judicial não pode ser considerada desfavorável ao réu, razão pela qual afasto a valoração negativa da circunstância judicial motivos do crime. Por outro lado, entendo correta a valorização negativa pelo Magistrado sentenciante no tocante à circunstância preponderante da quantidade de drogas apreendidas, visto que, como destacado anteriormente, foram apreendidas 601 (seiscentos e um) invólucros (“big-bigs”) de maconha, devendo, nesse ponto, ser mantida a exasperação da pena-base. Desse modo, afastada a circunstância judicial motivos do crime anteriormente tida por desfavorável, deve a pena-base do réu redimensionada proporcionalmente, nos termos a seguir. Para o crime do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, fixo a pena-base do apelante em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, enquanto que para o crime do artigo 35 da referida lei, fixo a pena-base em 3 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão e 750 (setecentos e cinquenta) dias-multa. No tocante ao pedido da defesa que alude à aplicação da atenuante da confissão na segunda fase da dosimetria da pena, não vejo como prosperar, isso porque, da análise dos autos, constata-se que o apelante não confessou a prática do delito de tráfico de entorpecente, tampouco o de associação para tráfico. Ao contrário, na verdade o acusado limitou-se tão somente a alegar que estava na posse da droga para usá-la em proveito próprio, ou seja, deixando a falsa percepção de que estaria na posse da droga para consumo próprio. O entendimento consolidado no enunciado da Súmula nº 630 do STJ reza que “A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico de drogas exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio.” Dessa forma, agiu com acerto o Magistrado sentenciante ao deixar de aplicar a atenuante da confissão espontânea, motivo pelo qual devem ser mantidas a fixação da pena-base do apelante em ambos os crimes. Já na terceira fase do processo dosimétrico, agiu com acerto o Juiz sentenciante ao aplicar a causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/2006, visto que restou demasiadamente comprovado nos autos o envolvimento da adolescente Maria Eduarda (namorada do apelante) na traficância, tendo, inclusive, havido a individualização de sua função na associação criminosa, sendo relevante, ainda, destacar que a menor, que contava à época com 15 (quinze) anos de idade, foi apreendida na companhia dos réus Jamison e Kaio na data dos fatos (Id 32858446, páginas 1 a 3). Noutro giro, ainda na terceira fase da dosimetria, falece também o pedido defensivo que versa sobre a aplicação da causa de diminuição da pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 (tráfico privilegiado), isso porque, para se beneficiar com a redução prevista no parágrafo citado, é necessária a presença simultânea de quatro fatores: a primariedade, os bons antecedentes, a não dedicação a atividades criminosas e a não integração em organizações criminosas. Como se vê, o acusado não preenche todos os requisitos necessários à concessão da aludida benesse, tal como acertadamente reconhecido pelo prolator do édito condenatório, posto que o réu também foi condenado nestes autos pelo crime de associação para o tráfico, sendo certo que a referida condenação é um indicativo da sua dedicação à prática de atividades criminosas, incompatível, portanto, com a figura do tráfico privilegiado. Assim, considerando o redimensionamento do quantum das penas impostas ao apelante, aplico a fração de 1/6 (um sexto) às penas ante a presença da majorante prevista no artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/2006, tornando a pena definitiva para o crime de tráfico de drogas (artigo 33 da Lei de Drogas) em 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, além de 642 (seiscentos e quarenta e dois) dias-multa, e para o delito de associação para o tráfico (artigo 35 da Lei nº 11.343/2006) em 3 (três) anos, 9 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, além de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa. Consequentemente, utilizando-se da regra do concurso material, deve-se aplicar cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido (artigo 69 do Código Penal), cujas penas se consolidam no patamar de 10 (dez) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, além de 1.517 (um mil, quinhentos e dezessete) dias-multa. Considerando o quantum das penas aplicadas ao réu, não se faz possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, consoante previsão do artigo 44 do Código Penal, devendo permanecer o regime fechado para o início do cumprimento das respectivas sanções. Por fim, no presente momento, não há que se falar, em isenção do pagamento das custas processuais, porquanto, conforme entendimento pacífico do STJ, “O momento de se aferir a miserabilidade do condenado para eventual suspensão da exigibilidade do pagamento das custas processuais é a fase de execução e, por tal razão, ‘nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, o vencido deverá ser condenado nas custas processuais’ (AgRg no AREsp n. 394.701/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI, SEXTA TURMA, DJe 4/9/2014)” (STJ, AgRg no AREsp nº 2.365.825/SP, 5ª T., rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 22/8/2023, DJe de 28/8/2023). Demais institutos referentes à execução penal, deixo ao encargo do Juízo da Execução Penal que, com maior acuidade, tratará dos temas. Do exposto, dou parcial provimento do apelo interposto pelo réu Jamison José da Silva apenas para redimensionar as penas impostas ao apelante em ambos os crimes pelas razões aqui expostas, mantendo a sentença nos demais termos. DO RECURSO DO RÉU KAIO FELIPE RIBEIRO DA CRUZ Inicialmente, a defesa do apelante Kaio Felipe Ribeiro da Cruz busca a nulidade da sentença por cerceamento de defesa por não ter havido a realização de exame toxicológico para comprovar a condição de dependente químico do acusado. Todavia, razão não lhe assiste. Explico. O artigo 400, § 1º, do CPP confere ao juiz do processo, destinatário final das provas, avaliar a necessidade e a conveniência da realização das diligências requeridas pelas partes, indeferindo aquelas que se revelem protelatórias ou impertinentes, ou seja, que no seu entender se mostrem irrelevantes para o deslinde da controvérsia. O STJ, por sua vez, entende que a alegação de dependência química de substâncias entorpecentes não implica na obrigatoriedade de realização do exame toxicológico, cuja análise ficará a cargo do magistrado, que deverá averiguar a existência de dúvida quanto à sanidade mental do acusado. No caso dos autos, o Magistrado entendeu que já havia nos autos elementos suficientes para formar sua convicção quanto à prática delituosa, sendo desnecessária a realização do referido exame, visto que o Magistrado sentenciante, de maneira precisa e irretocável, subsidiou de maneira satisfatória, com base nos elementos de prova contido nos autos e à luz da lei e jurisprudências pertinentes, a condenação do acusado. Ademais, é cediço que o crime de tráfico de drogas é de ação múltipla ou de conteúdo variado, visto que apresenta diversas maneiras de violação da mesma proibição, bastando, para a consumação do crime, a prática de uma das ações descritas no tipo penal, dentre elas a de “adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. Nesse viés, independentemente do resultado da perícia técnica do laudo da perícia que se persegue, não há o condão de, por si, alterar o substrato fático do núcleo do tipo penal de modo a afastar o enquadramento da prática delitiva. Sobre a temática, destaco, por relevante, o posicionamento da douta Procuradoria de Justiça em seu brilhante parecer (Id 36979494): “Ocorre que, como já explicitado na irretocável sentença, o crime previsto no art. 33 da Lei de Drogas possui como requisitos para seu enquadramento apenas a demonstração de que o réu estava ‘transportando, trazendo consigo ou guardando substâncias ilícitas em desacordo com determinação legal e regulamentar’, bem como ‘portando, detendo, transportando, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar’. Ex positis, o laudo da perícia técnica, independente de seu resultado, não possui o condão de alterar o substrato fático núcleo do tipo penal, de modo algum afastando o enquadramento da prática infracional no já referido artigo. Assim, a situação não representa cerceamento de defesa. Por conseguinte, tenho que não merece prosperar a tese de nulidade da sentença, com fulcro na total ausência de situação que gere quaisquer nulidades dessa estirpe, haja vista que o pressuposto para configuração da prática delitiva em comento encontra-se plenamente comprovado na própria conduta do acusado ‘trazer consigo’ e ‘guardar’, considerando-se a exegese do art. 33 da Lei de Drogas e a total ausência de qualquer elemento presente nos autos que pudesse fazer crer numa suposta dependência química que afastasse a ilicitude dos atos do apelante.” Sendo assim, rejeito a prefacial arguida em sede preliminar. No mérito, a defesa requer, a princípio, a desclassificação do crime de tráfico de drogas (artigo 33 da Lei nº 11.343/2006) para o de porte de drogas para consumo pessoal (artigo 28 da Lei nº 11.343/2006). Sobre essa temática, é cediço que o artigo 28, § 2º, da Lei nº 11.343/2006 estabelece que “Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente”. No presente caso, a alegada fragilidade probatória não é a realidade dos autos. Verifica-se que as circunstâncias do caso concreto, em especial a natureza e as condições em que se desenvolveu a ação, bem como a conduta do apelante, apontam para a efetiva prática do tráfico ilícito de entorpecentes. É que, conforme já consignado neste decisum, a materialidade do delito de tráfico restou devidamente comprovada neste caderno processual pelos seguintes elementos de prova: Auto de Prisão em Flagrante Delito (Id 32858445, páginas 3 a 7), bem como do Auto de Apresentação e Apreensão (Id 32858447, página 7), Auto de Constatação da Natureza e Quantidade da Droga (Id 32858447, página 8), Boletim de Ocorrência (Id 32858447, página 9 e Id 32858448, páginas 1 a 3), Laudo Pericial (Id 32858566). Em relação à autoria, esta restou demonstrada, especialmente, diante das provas subjetivas produzidas nos autos, notadamente dos depoimentos colhidos. Ademais, o entendimento firmado pelo STJ é no sentido de que é válido os depoimentos de policiais que participaram da ocorrência constituem meios de prova idôneos a fundamentar a condenação, mormente quando corroborados em Juízo no âmbito do devido processo legal (AgRg no HC nº 838.442/PE, 5ª T., rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 18.12.2023, DJe de 20.12.2023). Tal entendimento, inclusive, se encontra sumulado no âmbito desta Corte Estadual de Justiça que assim dispõe: “Súmula nº 75. É válido o depoimento de policial como meio de prova”. De fato, a prova testemunhal obtida por depoimento de agente policial não deve ser desclassificada tão somente pela sua condição profissional, na suposição de que tende a demonstrar a validade do trabalho realizado; é necessário evidenciar que ele tenha interesse particular na investigação ou, tal como ocorre com as demais testemunhas, que suas declarações não se harmonizem com outras provas idôneas, não sendo esse, todavia, o caso dos autos. No caso em apreço, a natureza e quantidade da droga apreendida, aliada às condições de acondicionamento, depõem contra a tese de usuário defendida pelo apelante, conduzindo-se à conclusão de que se tratava de droga destinada ao comércio. Constata-se, portanto, que, a despeito da tese defensiva, a sentença condenatória está fundada em provas lícitas, robustas e sólidas, aptas a fundamentar a condenação do ora apelante nas penas do crime de tráfico ilícito de droga, não sendo cabível a absolvição ou desclassificação, na hipótese. De igual modo não prospera o pedido de absolvição do apelante pelo delito de associação para o tráfico pelos argumentos amplamente expendidos quando da apreciação da apelação do corréu Jamison José da Silva acima epigrafado. Sobre o tema, transcrevo a manifestação da Procuradoria de Justiça em seu parecer (Id 36979494); “Acerca do TERCEIRO PONTO do apelo – absolvição pelo crime de associação para o tráfico – entende esta Procuradoria que igualmente não merecer ser acolhido. É consenso jurisprudencial e doutrinário de que, para que haja a tipicidade material do crime tipificado no art. 35 da Lei nº 11.343/06, deve haver, na relação entre os agentes delituosos, estabilidade e permanência com o objetivo de fomentar especificamente o tráfico de drogas, por meio de estrutura organizada e divisão de tarefas para a aquisição e venda de entorpecentes, além da divisão de seus lucros. Compulsando os autos, percebe-se que tais requisitos estão preenchidos. Extrai-se do feito que os acusados, previamente ajustados, estavam associados, com estabilidade e permanência, para a prática do crime de tráfico de drogas, considerando-se que Jamison José e a adolescente Maria Eduarda tinham como função a distribuição dos entorpecentes e Kaio Felipe os vendia. Desta feita, resta amplamente demonstrada a relação de permanência e estabilidade, constituindo o crime tipificado no art. 35 da Lei nº 11.343/06.” Passando à análise do redimensionamento da pena-base imposta ao réu Kaio, percebo que razão assiste à defesa. Explico. Em exame da sentença condenatória (Id 32858568), na primeira fase da dosimetria, percebe-se que a pena-base do apelante foi exasperada 1 (um) ano para o crime de tráfico e em 6 (seis) meses para o de associação para o tráfico em razão da valoração negativa da circunstância judicial motivos do crime e antecedentes. Todavia, conforme consignado outrora, observo que a fundamentação utilizada pelo Juiz sentenciante para valorar negativamente os motivos do crime são genéricas e inerentes ao próprio tipo penal, limitando-se a dizer que a motivação se baseia na “obtenção de lucro fácil mediante a prática da traficância”. É dizer, não houve a utilização de argumento válido para justificar o aumento da pena base do delito. Desse modo, entendo que referida circunstância judicial não pode ser considerada desfavorável ao réu, razão pela qual afasto a valoração negativa da circunstância judicial motivos do crime. Por outro lado, entendo correta a valorização negativa pelo Magistrado sentenciante no tocante à circunstância judicial dos antecedentes, visto que o acusado já teve contra si sentença condenatória proferida em 16/02/2023 nos autos do processo nº 0000738-16..2022.8.175030 perante a 2ª Vara da Comarca de Água Preta, consoante documentos de Id 32858456 e Id 32858542. Desse modo, afastada a circunstância judicial motivos do crime anteriormente tida por desfavorável, deve a pena-base do réu redimensionada proporcionalmente, nos termos a seguir. Para o crime do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, fixo a pena-base do apelante em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, enquanto que para o crime do artigo 35 da referida lei, fixo a pena-base em 3 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão e 750 (setecentos e cinquenta) dias-multa. Já na segunda fase da dosimetria da pena, o Magistrado sentenciante agiu com acerto ao aumentar a pena em razão da reincidência, não havendo que falar em bis in idem. Isso porque o Juiz considerou a condenação do processo nº 0000028-30.2021.8.17.5030 para agravar a pena, ou seja, condenação penal diversa daquela utilizada para fins de maus antecedentes na primeira fase do processo dosimétrico. Sobre o tema, é pacífica a jurisprudência do STJ de que "condenações pretéritas podem ser utilizadas tanto para valorar os maus antecedentes na primeira fase, bem como para agravar a pena na segunda fase, a título de reincidência, sem ocorrência de bis in idem, desde que as condenações sejam de fatos diversos" (AgRg no HC nº 906.825/SP, 5ª T., rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 19/8/2024, DJe de 22/8/2024, grifos acrescidos). Nesse ser assim, tendo em vista o redimensionamento da pena-base do réu neste decisum, a pena intermediária para o crime de tráfico deve ser majorada para 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses, além de 642 (seiscentos e quarenta e dois) dias-multa, enquanto que a pena intermediária do crime de associação para o tráfico resta majorada para 3 (três) anos, 9 (nove) meses e 15 (quinze) dias, além de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa. Já na derradeira fase do processo dosimétrico, como dito anteriormente, agiu com acerto o Juiz sentenciante ao aplicar a causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/2006, visto que restou demasiadamente comprovado nos autos o envolvimento da adolescente Maria Eduarda (namorada do apelante) na traficância, razão pela qual mantenho o entendimento do Magistrado de origem. Sendo assim, considerando o redimensionamento do quantum das penas impostas ao apelante, aplico a fração de 1/6 (um sexto) às penas ante a presença da majorante prevista no artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/2006, tornando a pena definitiva para o crime de tráfico de drogas (artigo 33 da Lei de Drogas) em 7 (sete) anos, 5 (cinco) meses e 25 (vinte e cinco) de reclusão, além de 749 (setecentos e quarenta e nove) dias-multa, e para o delito de associação para o tráfico (artigo 35 da Lei nº 11.343/2006) em 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 2 (dois) dias de reclusão, além de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa. Consequentemente, utilizando-se da regra do concurso material, deve-se aplicar cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido (artigo 69 do Código Penal), cujas penas se consolidam no patamar de 11 (onze) anos, 10 (dez) meses e 27 (vinte e sete) dias de reclusão, além de 1.624 (um mil, seiscentos e vinte e quatro) dias-multa. Considerando o quantum das penas aplicadas ao réu e pela reincidência do acusado, mantenha os termos da sentença quanto ao regime inicial fechado para o início do cumprimento das respectivas sanções. Por fim, no tocante à pena de multa, sabe-se que a quantidade de dias-multa deve ser fixada de acordo com o sistema trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade, utilizando a mesma proporção de exasperação ou minoração da pena em cada fase, de modo que o número de dias-multa deve guardar proporcionalidade com a sanção corporal imposta, tal como realizado neste decisum. No tocante ao pleito de recorrer em liberdade, tenho por descabido pelas mesmas razões postas na apreciação do apelo do corréu Jamison e, portanto, a decisão do Magistrado sentenciante permanece irretocável. Nesse sentido, dou parcial provimento do apelo interposto pelo réu Kaio Felipe Ribeiro da Cruz apenas para redimensionar as penas impostas ao apelante em ambos os crimes pelas razões aqui expostas, mantendo a sentença nos demais termos. Ante todo o exposto, acompanhando o parecer ministerial, voto no sentido de dar parcial provimento a ambos os apelos para tão somente redimensionar as penas impostas aos réus, nos termos aqui delineados, mantendo-se incólume os demais termos da sentença guerreada. É como voto. Recife, data da assinatura digital. Des. Eduardo Guilliod Maranhão Relator Demais votos: Órgão Julgador: 4ª Câmara Criminal APELAÇÃO Nº 0000798-52.2023.8.17.5030 Apelante: JAMISON JOSE DA SILVA e KAIO FELIPE RIBEIRO DA CRUZ Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DE PERNAMBUCO Relator: Des. Eduardo Guilliod Maranhão Revisor: Des. Alexandre Guedes Alcoforado Assunção VOTO DE REVISÃO EM CONCORDÂNCIA COM A RELATORIA Trata-se de Apelação Criminal interposta por JAMISON JOSÉ DA SILVA E KAIO FELIPE RIBEIRO DA CRUZ contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Água Preta que os condenou pela prática dos delitos tipificados nos artigos 33 e 35 da Lei nº 11.343/2006, à pena definitiva de 11 (onze) anos, 6 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, além de 1.825 (um mil, oitocentos e vinte e cinco) dias-multa, em regime fechado, para o réu Jamison José da Silva, e 13 (treze) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, além de 2.000 (dois mil) dias-multa, em regime fechado, para o réu Kaio Felipe Ribeiro da Cruz. Adoto o relatório de ID nº 44798282. Analisando o recurso, valho-me da argumentação lançada no voto de relatoria e adoto as razões expostas pelo Des. Eduardo Guilliod Maranhão em dar parcial provimento aos apelos para redimensionar as penas impostas aos réus, sendo a pena do réu Jamison José da Silva redimensionada de 11 (onze) anos, 6 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, além de 1.825 (um mil, oitocentos e vinte e cinco) dias-multa para 10 (dez) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, além de 1.517 (um mil, quinhentos e dezessete) dias-multa, e a pena do réu Kaio Felipe Ribeiro da Cruz redimensionada de 13 (treze) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, além de 2.000 (dois mil) dias-multa para 11 (onze) anos, 10 (dez) meses e 27 (vinte e sete) dias de reclusão, além de 1.624 (um mil, seiscentos e vinte e quatro) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que, no âmbito processual penal, é válida a técnica de fundamentação per relationem, pela qual o magistrado incorpora à sua decisão argumentos previamente apresentados pelas partes ou contidos em decisão anterior, sem que tal prática configure ausência de fundamentação. (no mesmo sentido: EREsp 1.021.851/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 04/10/2012; HC 220.562/SP, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira -- Desa. Convocada do TJPE, Sexta Turma, DJe 25/02/2013; e HC 189.229/SP, Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 17/12/2012). É como voto. Recife/PE, data e assinatura registradas no sistema. Des. Alexandre Guedes Alcoforado Assunção Revisor Ementa: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO Gabinete do Desembargador Eduardo Guilliod Maranhão 4ª CÂMARA CRIMINAL Apelação Criminal nº 0000798-52.2023.8.17.5030 Apelantes: Jamison José da Silva e Kaio Felipe Ribeiro da Cruz Apelado: Ministério Público do Estado de Pernambuco Relator: Des. Eduardo Guilliod Maranhão EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. APELAÇÕES CRIMINAIS DA DEFESA. PRELIMINAR. RECORRER EM LIBERDADE. VIA INADEQUADA. PRELIMINAR. NULIDADE DE SENTENÇA ANTE ILICITUDE DE PROVAS. IMPROCEDÊNCIA. PROVAS CARREADAS AOS AUTOS LICITAMENTE. PRELIMINAR. NULIDADE DE SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA. EXAME TOXICOLÓGICO DESNECESSÁRIO. MÉRITO DOS APELOS. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DESCABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO PARA O DE USO PESSOAL. IMPOSSIBILIDADE. CONJUNTO DE PROVAS ROBUSTO A CARACTERIZAR A TRAFICÂNCIA E A ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. REVISÃO DA DOSIMETRIA DA PENA EM AMBOS OS APELOS. DECOTE NA PRIMEIRA FASE. PENAS REDIMENSIONADAS. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS. DECISÃO UNÂNIME. 1. O recurso de apelação, mormente quando já na fase de julgamento, não é a via adequada para pleitear o direito de aguardar o recurso em liberdade. 2. Não há como se dizer que as buscas pessoal e domiciliar foram realizadas ao arrepio da lei, de forma injustificada e arbitrária, vez que o contexto fático, corretamente verificado pelos policiais militares, constituiu fundadas razões para que a polícia realizasse as buscas. 3. O STJ entende que a alegação de dependência química de substâncias entorpecentes não implica na obrigatoriedade de realização do exame toxicológico, cuja análise ficará a cargo do magistrado, que deverá averiguar a existência de dúvida quanto à sanidade mental do acusado. 4. Em que pese a negativa da prática delitiva ao argumento de que as drogas seriam para consumo próprio, vê-se que as circunstâncias da prisão em flagrante denotam um contexto de traficância, seja pela quantidade dos entorpecentes apreendidos e a forma pelas quais estavam acondicionados. 5. Na espécie, a natureza e quantidade da droga apreendida, aliada às condições de acondicionamento, depõem contra a tese de usuário defendida pelo apelante de porte de droga para consumo próprio, conduzindo-se à conclusão de que se tratava de droga destinada ao comércio. 6. Revisão do processo dosimétrico procedente de modo a decotar a circunstância judicial dos motivos do crime com o consequente redimensionamento das penas fixadas em sentença aos apelantes. 7. Recursos parcialmente providos para, tão somente, reduzir as penas impostas aos réus. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do presente recurso, sendo partes as acima indicadas, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que compõem a Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, por unanimidade dos votos, em dar parcial provimento aos apelos, na conformidade do relatório e voto que, devidamente revistos e rubricados, passam a integrar este aresto. Recife, data da certificação digital. Des. Eduardo Guilliod Maranhão Relator Proclamação da decisão: À UNANIMIDADE DE VOTOS, DEU-SE PROVIMENTO PARCIAL AO APELO, NOS TERMOS DO VOTO DO DES. RELATOR. Magistrados: [ALEXANDRE GUEDES ALCOFORADO ASSUNCAO, DEMOCRITO RAMOS REINALDO FILHO, EDUARDO GUILLIOD MARANHAO] , 20 de abril de 2025 Magistrado

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Processo nº 0000856-72.2023.8.17.2470

ID: 317902827

Tribunal: TJPE Órgão: Gabinete do Des. Carlos Frederico Gonçalves de Moraes (Processos Vinculados - 3ª CDP) Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000856-72.2023.8.17.2470

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

RENATO DUARTE GOMES

Polo Passivo:

Intimação (Outros)

Advogados:

PAOLLA BARBOSA XAVIER

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des. Carlos Frederico Gonçalves de Moraes (Processos Vinculados - 3ª CDP) 3ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Apelação Cível nº 0000856-72.2023… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des. Carlos Frederico Gonçalves de Moraes (Processos Vinculados - 3ª CDP) 3ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Apelação Cível nº 0000856-72.2023.8.17.2470 Apelante: RENATO DUARTE GOMES Apelado: MUNICÍPIO DE CARPINA Relator: Des. Carlos Moraes DECISÃO Consta no PJE, na aba de documentos, o relatório, voto e ementa relativos ao julgamento deste recurso de apelação, assinados eletronicamente em 22/10/2024, precisamente às 14:45:25. Com efeito, a certidão de ID 42941388 informa que o feito foi julgado na sessão virtual do dia 21/10/2024. Veja-se o teor: 3ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Apelação Cível nº 0000856-72.2023.8.17.2470 Apelante: RENATO DUARTE GOMES Apelado: MUNICÍPIO DE CARPINA Relator: Des. Carlos Moraes RELATÓRIO Trata-se recurso de apelação interposto por RENATO DUARTE GOMES contra a sentença do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Carpina proferida na Ação Anulatória de Ato Administrativo com pedido de Obrigação de Pagar , ajuizada pelo apelante contra o MUNICÍPIO DE CARPINA . Na inicial da referida ação o demandante, que é servidor efetivo do Município de Carpina, no qual ingressou no cargo efetivo de Professor de 1ª a 4ª séries em março de 2011, sob o regime de 150 horas/aula, alegou que em maio de 2012 passou a receber a gratificação de carga horária equivalente a 200 horas/aula, com efeitos retroativos a março de 2012, e que, em junho de 2020, teve a sua carga horária reduzida em 50 horas/aula, o que caracterizou violação ao princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos. Por tal motivo, requereu a condenação do Município de Carpina no restabelecimento da carga horária de 200 horas/aula, bem como no pagamento de danos morais e materiais e no ônus sucumbencial. O Juiz a quo julgou improcedentes os pedidos autorais e extinguiu o processo com resolução do mérito (art. 487, inciso I, do CPC). Insatisfeito, o autor apelou. Disse que a sentença merece reforma porque: 1) o Chefe do Executivo Municipal feriu a regra da irredutibilidade salarial quando revogou a Portaria que havia atribuído ao apelante a gratificação de carga horária equivalente a 200 horas/aula, violando o disposto no art. 37, inciso XV, da CRFB/88; 2) o Município apelado violou o caráter comutativo do salário base do recorrente, isto é, a equivalência entre o serviço prestado e o valor pago, já que o apelante efetivamente presta serviços referentes às 200 horas/aula, conforme se observa nos livros de ponto e na declaração de frequência que instruem a petição inicial; 3) a redução ilegal de 50 horas/aula traz reflexos financeiros negativos inestimáveis, já que reflete diretamente nas verbas calculadas a partir do vencimento-base, tais como a gratificação “Pó de Giz”, décimo terceiro salário, férias etc.; 4) embora a Súmula 473 do STF autorize a Administração Pública a revogar os seus atos, devem ser observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, sob pena de violação ao artigo 5º, incisos LIV e LV, da Carta de Outubro; 5) a revogação da carga horária de 200 horas/aula lhe causou danos morais e materiais, os quais devem ser reparados nos termos dos arts. 37, § 6º, da CRFB/88, e 43, do Código Civil brasileiro. Requereu “o conhecimento e provimento do presente Recurso de Apelação, a fim de reformar a sentença, julgando procedente os pedidos deduzidos na exordial, a fim de que seja restabelecida a carga horária de trabalho de 200 horas/aula do demandante em seu vencimento-base, devido a inconstitucionalidade da redução dos seus vencimentos, bem como pagos os danos morais e materiais decorrentes”. Contrarrazões do Município apelado pelo não conhecimento do recurso, sob o fundamento de que a Portaria 306/2012 (Id 30073146) comprova que o autor/apelante passou a acumular mais 50 horas/aula em virtude do exercício do cargo/função de confiança por parte da Administração Pública. O Ministério Público deixou de se manifestar por inexistência de interesse público primário que justifique a sua intervenção. É o relatório. Inclua-se em pauta para julgamento. Recife, data registrada no sistema Des. Carlos Moraes Relator 3ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Apelação Cível nº 0000856-72.2023.8.17.2470 Apelante: RENATO DUARTE GOMES Apelado: MUNICÍPIO DE CARPINA Relator: Des. Carlos Moraes VOTO Da sentença apelada, destaco os seguintes trechos: [...]. Quanto ao mérito, entendo que merecem acolhimento as alegações do réu. É fato claro que o art. 37, inciso XV, da Constituição Federal, garante a irredutibilidade de vencimentos, assegurada aos ocupantes de cargos e empregos públicos, e veda a redução remuneratória pela Administração Pública. Assim, não se pode reduzir parcela dos vencimentos de servidor público, sem que se observe medida compensatória capaz de garantir o preconizado no dispositivo constitucional. Ocorre que, tal garantia versa sobre casos em que eventuais mudanças legislativas, como, por exemplo, revogação de lei que estipulava uma determinada gratificação, venha a suprimir o vencimento do servidor sem qualquer compensação. Essa garantia não se enquadra nos casos que a Administração Pública verifica um pagamento errôneo que vem sendo realizado em favor de seu funcionário, afrontando dispositivos legais, e causando um enriquecimento sem causa por parte do servidor público ao receber um vencimento que não corresponde ao cargo em que foi devidamente empossado ou em casos em que momentaneamente lhe fora concedido um aumento de sua carga horária pelo exercício de cargo comissionado, mas que pode haver sua exoneração da aludida função a qualquer tempo por se tratar de cargo de confiança. Ademais, com as modificações da Lei Municipal nº 1.503/2013, já é entendimento pacífico neste TJ-PE acerca da necessidade do pagamento do complemento do valor a título de gratificação de pó de giz por meio de parcela autônoma. No próprio doc. de ID nº 126546825 se vê que o cargo em que a parte autora fora empossada, “Professor de 1ª a 4ª séries”, possui como carga horária a quantia de 150 horas-aula. Em sede de réplica a autora não apresentou qualquer fato/prova nova a fim de desconstituir o argumento do réu em sua contestação, novamente se limitando apenas à questão de impossibilidade da irredutibilidade salarial do servidor, o que já fora analisado na presente sentença. Posto isso, por tudo que aqui analisei, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, ao tempo em que EXTINGO o processo Com Resolução Do Mérito, nos termos do artigo 487, inc. I, do CPC. CONDENO a autora, ora sucumbente, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios no valor de 15% sobre o valor da causa, ficando sua exigibilidade ante a gratuidade de justiça que por ora lhe concedo, na forma do art. 98 e segs. do CPC. [...]. A controvérsia diz respeito à legalidade ou não do exercício de poder de autotutela levada a efeito pela Administração Municipal que suprimiu 50 horas/aula do salário do servidor/apelante, sem qualquer notificação prévia. Considerando que o autor foi empossado no cargo de “Professor de 1ª a 4ª séries” em 2011, com carga horária equivalente a 150 horas/aula, e como lhe foi atribuída a carga horária de 200 horas/aula por meio da Portaria nº 306/2012-GP, de 10/05/2012, expedida pelo Prefeito do Município de Carpina (Id 30073146), a redução das suas horas/aula deveria ter sido feita por meio de ato administrativo motivado e, no mínimo, equivalente à mencionada portaria, com prévia ciência do servidor interessado. No entanto, inexiste nos autos qualquer ato administrativo que tenha sido expedido para alterar a carga horária da parte autora que, em junho de 2020 foi reduzida, pura e simplesmente, de forma direta na folha de pagamento. Ou seja, o demandante teve a sua remuneração diminuída sem qualquer ato administrativo motivado nesse sentido. Ainda que tivesse sido expedido um ato administrativo reduzindo a carga horária do demandante, fato que, repito, não ocorreu no presente caso, deveria ele ser dotado da motivação suficiente para justificar a redução, em obediência aos princípios da Administração Pública da motivação dos atos administrativos e da irredutibilidade de vencimentos. Nesse sentido, já decidiu a 3ª Câmara de Direito Público: EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDORAS PÚBLICAS MUNICIPAIS. CLASSE "PROFESSOR II". PORTARIA MUNICIPAL DIMINUINDO SUAS HORAS AULAS DE 200 PARA 150. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO. DECESSO REMUNERATÓRIO. ILEGALIDADE ANTE A OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA MOTIVAÇÃO E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. NEGADO PROVIMENTO AO REEXAME NECESSÁRIO. PREJUDICADO APELO VOLUNTÁRIO. À UNANIMIDADE. 1. As autoras são servidoras públicas efetivas, graduadas no cargo de "Professor II", e sofreram uma redução de suas cargas horárias mensais de trabalho de 200 horas aulas para 150 horas aulas, formalizada por meio da Portaria 061/2008, às fls. 17/18, expedida pela Prefeito municipal de Riacho das Almas, quando da ocasião do fato; 2. Compulsando com atenção os autos, entretanto, tenho que a sentença vergastada não merece nenhuma reprimenda. Vejo, inclusive, que trata-se de matéria de fácil deslinde; 3. A princípio, vale ressaltar que a discussão aqui não gira em torno da diminuição da carga horária das autoras, simplesmente, mas sim sobre a legalidade do ato que ensejou essa redução; 4. Ora, entende-se que a carga horária das servidoras em análise é fixada através de ato discricionário, contudo, embora a redução seja uma faculdade da Administração Pública, não havendo direito adquirido a regime jurídico por partes dos servidores públicos, o ato respectivo terá que ser motivado, sob pena de ser considerado nulo, em especial quando acarretar uma redução dos salários dos servidores; 5. Tenho, pois, que resta mais do que evidenciado, ao longo de todo o percurso processual, que o Prefeito municipal, à época dos fatos, alterou a carga horária das autoras da ação, não apresentando, no entanto, nenhuma motivação convincente, que comprovasse a necessidade pública do feito. Vejo que, só através desse ato, a Autoridade Pública já estaria em descompasso com o que prega um dos princípios basilares da Administração Pública, qual seja, o da Motivação dos atos administrativos; 6. A própria Portaria nº 061/2008, expedida pelo município, às fls. 17, é muito sucinta e rasteira ao modificar as horas aulas das apeladas, não dando nenhuma justificativa plausível para tamanha mudança; 7. O Ministério Público de 1º Grau, em parecer positivo acerca da concessão da segurança quando, da análise do mandado de segurança, às fls. 136/141, foi direto ao afirmar que a Portaria supramencionada não poderia prevalecer, sendo a causa de sua nulidade, justamente, a ausência de motivação, visto que a carga horária das autoras foi reduzida e a Administração não apresentou nenhuma razão ou justificativa para tal atitude. Da mesma forma, o Parquet, na 2º Instância, através da 4ª Procuradoria de Justiça Cível, opinou pelo não provimento do Reexame Necessário, vislumbrando que houve vício de forma quanto a esse ato de redução da carga horária das autoras da ação, por meio da Portaria 061/2008, consistente na ausência de motivação; 8. Mesmo a autoridade coatora se reportando ao Plano de Cargos e Carreiras do Município para justificar a possibilidade de redução da carga horário dos professores de 200 para 150 horas, não trouxe, aos autos, do ponto de vista formal, a necessidade pública dessa adequação, nem apresentou dados numerários referentes às turmas e aos professores que atuam no município; 9. Além do já exposto, também fica bastante claro que a alteração no número de horas trabalhadas pelas profissionais acaba acarretando uma diminuição de seus vencimentos, o que gera uma flagrante ilegalidade diante da ofensa a outro importante princípio constitucional, o da Irredutibilidade de Vencimentos; 10. Por fim, vale mais uma vez ratificar, que a Administração Pública municipal poderia sim, de forma discricionária, reduzir a carga horária das professoras, ora apeladas, de 200 para 150 horas aula, visto que já é pacificado o entendimento, nos Tribunais Superiores, que os servidores públicos não possuem direito adquirido ao regime jurídico ou fórmula de composição dos seus vencimentos, apenas sendo necessário para isso que a Administração apresente a devida motivação do ato que deu causa a essa redução; 11. Nego provimento ao Reexame Necessário, prejudicado o Apelo voluntário. À Unanimidade. (Apelação/Remessa Necessária nº 298295-2. Relator: Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo. Data de Julgamento: 21/03/2017. Data da Publicação: 06/04/2017) Por certo, não se desconhece que, com esteio no princípio da autotutela, a Administração Pública tem o poder-dever de anular seus próprios atos, quando observada a hipótese de ilegalidade. Tal entendimento encontra-se consagrado na Súmula nº 473 do STF, cujo enunciado dispõe: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.” No entanto, quando a anulação de atos implicar na invasão da esfera jurídica de interesses individuais de particular, torna-se obrigatória a instauração de prévio processo administrativo, com fiel observância ao devido processo legal e seus corolários do contraditório e da ampla defesa. No caso em análise, o Município limitou-se a alegar que a Portaria que atribuiu ao autor/apelante a carga horária de 200 horas/aula comprova que se tratou de nomeação para cargo comissionado. Contudo, da leitura do mencionado documento conclui-se que nele não há qualquer menção a esse respeito. Logo, o réu/apelado não se desincumbiu do ônus de comprovar que a redução da verba remuneratória da parte autora foi precedida da instauração de processo administrativo, com as garantias do contraditório e da ampla defesa, como deveria ter feito, conforme entendimento do STJ. Veja-se: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO INATIVO. SUPRESSÃO DE VANTAGEM. SÚMULA 473/STF. NECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. 1. O STJ perfilha entendimento de que a Administração, à luz do princípio da autotutela, tem o poder de rever e anular seus próprios atos, quando detectada a sua ilegalidade, consoante reza a Súmula 473/STF. Todavia, quando os referidos atos implicam invasão da esfera jurídica dos interesses individuais de seus administrados, é obrigatória a instauração de prévio processo administrativo, no qual seja observado o devido processo legal e os corolários da ampla defesa e do contraditório. Precedentes do STJ: AgInt no REsp n. 2.028.774/MG, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, DJe de 28/4/2023; AgInt no AgRg no AREsp 760.681/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 6/6/2019; RMS 58.008/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 19/11/2018. 2. No caso dos autos, o acórdão recorrido afastou a necessidade de instauração de processo administrativo, impondo-se a reforma do julgado para adequação à jurisprudência firmada no STJ. 3. Agravo Interno não provido. (AgInt no REsp n. 2.119.570/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 20/8/2024) ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. SUPRESSÃO DE VANTAGEM. NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. AGRAVO INTERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O STJ perfilha entendimento de que a Administração, à luz do princípio da autotutela, tem o poder de rever e anular seus próprios atos, quando detectada a sua ilegalidade, consoante reza a Súmula 473/STF. Todavia, quando os referidos atos implicam invasão da esfera jurídica dos interesses individuais de seus administrados, é obrigatória a instauração de prévio processo administrativo, no qual seja observado o devido processo legal e os corolários da ampla defesa e do contraditório (AgRg no REsp. 1.432.069/SE, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 2.4.2014). 2. Agravo Interno do ESTADO DE SANTA CATARINA a que se nega provimento. (AgInt no AgRg no AREsp n. 760.681/SC, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 3/6/2019, DJe de 6/6/2019) Nessa mesma linha de entendimento, o Tribunal Pleno do STF, por ocasião do julgamento do RE 594296 (julgado em 21/09/2011, publicado em 13/02/2012), relatado pelo Ministro Dias Toffoli, que tratou sobre a anulação de ato administrativo pela Administração com reflexo em interesses individuais sem a instauração de procedimento administrativo (Tema 138), fixou a seguinte Tese: “Ao Estado é facultada a revogação de atos que repute ilegalmente praticados; porém, se de tais atos já tiverem decorrido efeitos concretos, seu desfazimento deve ser precedido de regular processo administrativo” Então, tratando-se de redução remuneratória do vencimento do servidor/apelante sem a observância prévia de processo administrativo que lhe assegurasse o contraditório e a ampla defesa, impõe-se a aplicação dos entendimentos firmados pelo STF e pelo STJ, em face da ilegalidade da redução da carga horária para 150 horas/aula com a consequente diminuição remuneratória ocorrida sem prévio processo administrativo. Em sintonia com a jurisprudência do STJ, as demais Câmaras de Direito Público deste tribunal já pacificaram o entendimento de que, baseada no princípio da autotutela, a Administração Pública tem o poder-dever de anular seus próprios atos (Súmula nº 473 do STF), sendo que, quando tal anulação implicar a invasão na esfera jurídica de interesses individuais de particular(es), é obrigatória a instauração de prévio processo administrativo, no qual devem observados o devido processo legal e os consectários do contraditório e da ampla defesa, (Tema 138 do STF), cuja inobservância implica no reconhecimento da ilegalidade da redução remuneratória. Observe-se: 2ª Câmara de Direito Público: EMENTA CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO. RECURSO ADESIVO. PROFESSOR. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA DE 200 PARA 150 HORAS/AULA. SUPRESSÃO REMUNERATÓRIA. PODER-DEVER DE AUTOTUTELA. ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. ILEGALIDADE. NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. CONSECTÁRIOS DA CONDENAÇÃO. APLICAÇÃO CORRETA SEGUNDO ENUNCIADOS ADMINISTRATIVOS DA SDP TJPE. HONORARIOS ADVOCATICIOS. ARBITRAMENTO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. CABIMENTO. SENTENÇA ILIQUIDA. REEXAME NECESSÁRIO NÃO PROVIDO, APELAÇÃO PREJUDICADA. RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de Reexame Necessário e Recurso de Apelação interposto pelo Município e Recurso adesivo interposto pela autora, cujo objetivo consiste na reforma da sentença que julgou procedente o pedido de restabelecimento à carga horária de trabalho de 200 (duzentas) horas/aula da demandante. 2. Narra a parte autora, em síntese, que originariamente ingressou no serviço público no cargo de professora e que sempre cumpriu carga horária de 200 (duzentas) horas/aula. Entretanto, pontua que a Prefeitura Municipal reduziu a sua carga horária em 50 (cinquenta) horas/aula, sem qualquer ato administrativo motivado. 3. A Fazenda Pública não se desincumbiu de seu ônus de comprovar que a revisão da verba remuneratória da parte autora foi precedida da instauração de processo administrativo, com as garantias do contraditório e da ampla defesa. 4. De acordo com o enunciado n. 473 da Súmula do STF, com esteio no princípio da autotutela, a Administração Pública tem o poder-dever de anular seus próprios atos, quando observada hipótese de ilegalidade. 5. A despeito disso, quando a anulação de atos – supostamente eivados de nulidade – implicar a invasão da esfera jurídica de interesses individuais de particular, obrigatória se mostra a instauração de prévio processo administrativo, no qual restem observados o devido processo legal e os corolários do contraditório e da ampla defesa. Precedentes do STJ. 6. Não há que se falar em anulação de ato administrativo, com a consequente supressão de aumento remuneratório concedido à servidora, sem que tenha sido previamente oportunizado o contraditório e assegurada a ampla defesa da interessada. 7. Nessa senda, não se afigura cabível considerar legítimo o ato de redução da carga horária, sem qualquer ato administrativo motivado, sem que tenha sido previamente oportunizado o contraditório e assegurada a ampla defesa da interessada. Não houve sequer uma portaria, a parte autora foi surpreendida com a redução e supressão de vencimentos, efetuada diretamente em seu contracheque. Por outro lado, o Município não impugna a afirmação da parte autora no sentido de que esta sempre exerceu a carga horária de 200 horas. Limitou-se a afirmar que, no seu entender, seria a devida a referida redução, sem comprovar nem mesmo que, de fato, a redução dos vencimentos havia sido acompanhada da redução de carga horária, levando a crer que a parte autora continuou a exercer as mesmas funções. 8. A configuração do dano moral demanda, nos dizeres do c. STJ, “que a pessoa seja atingida em sua honra, na sua reputação, sua personalidade, bem como no seu sentimento de dignidade.” (STJ - REsp 1202238/SC, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 14/08/2012, DJe 18/09/2012). Não obstante a ocorrência da redução da carga horária e consequente redução de vencimentos, condutas que, por certo, geraram aborrecimentos e dissabores, não se infere dos autos a ocorrência de prejuízo de ordem moral, razão pela qual não há que se falar em indenização compensatória. 9. Ainda, vejo o acerto da sentença quanto aos consectários da condenação uma vez que cuidou em aplicar os Enunciados Administrativos da SDP deste Tribunal; assim como também, acertadamente aplica o arbitramento dos honorários de sucumbência à fase de liquidação de sentença em razão a iliquidez da condenação imposta. 10. Reexame Necessário não provido, restando prejudicada a Apelação do Município. Recurso adesivo não provido. Manutenção da sentença. (Apelação Cível nº 0000266-93.2019.8.17.2710. Relator Des. Waldemir Tavares de Albuquerque Filho. Data de Julgamento 24/04/2024) 1ª Câmara de Direito Público: EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO. RECURSO ADESIVO. PROFESSOR. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA DE 200 PARA 150 HORAS/AULA. SUPRESSÃO REMUNERATÓRIA. PODER-DEVER DE AUTOTUTELA. ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. ILEGALIDADE. NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO NÃO PROVIDO, APELAÇÃO PREJUDICADA. RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de Reexame Necessário e Recurso de Apelação interposto pelo Município e Recurso adesivo interposto pela autora, cujo objetivo consiste na reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de restabelecimento à carga horária de trabalho de 200 (duzentas) horas/aula da demandante, bem como de condenação ao pagamento de valor referente a danos morais e materiais. 2. Narra a parte autora, em síntese, que originariamente ingressou no serviço público no cargo de professora e que sempre cumpriu carga horária de 200 (duzentas) horas/aula. Entretanto, pontua que a Prefeitura Municipal reduziu a sua carga horária em 50 (cinquenta) horas/aula, sem qualquer ato administrativo motivado. 3. A Fazenda Pública não se desincumbiu de seu ônus de comprovar que a revisão da verba remuneratória da parte autora foi precedida da instauração de processo administrativo, com as garantias do contraditório e da ampla defesa. 4. De acordo com o enunciado n. 473 da Súmula do STF, com esteio no princípio da autotutela, a Administração Pública tem o poder-dever de anular seus próprios atos, quando observada hipótese de ilegalidade. 5. A despeito disso, quando a anulação de atos – supostamente eivados de nulidade – implicar a invasão da esfera jurídica de interesses individuais de particular, obrigatória se mostra a instauração de prévio processo administrativo, no qual restem observados o devido processo legal e os corolários do contraditório e da ampla defesa. Precedentes do STJ. 6. Não há que se falar em anulação de ato administrativo, com a consequente supressão de aumento remuneratório concedido à servidora, sem que tenha sido previamente oportunizado o contraditório e assegurada a ampla defesa da interessada. 7. Nessa senda, não se afigura cabível considerar legítimo o ato de redução da carga horária, sem qualquer ato administrativo motivado, sem que tenha sido previamente oportunizado o contraditório e assegurada a ampla defesa da interessada. Não houver sequer uma portaria, a parte autora foi surpreendida com a redução e supressão de vencimentos, efetuada diretamente em seu contracheque. Por outro lado, o Município não impugna a afirmação da parte autora no sentido de que esta sempre exerceu a carga horária de 200 horas. Limitou-se a afirmar que, no seu entender, seria a devida a referida redução, sem comprovar nem mesmo que, de fato, a redução dos vencimentos havia sido acompanhada da redução de carga horária, levando a crer que a parte autora continuou a exercer as mesmas funções. 8. A configuração do dano moral demanda, nos dizeres do c. STJ, “que a pessoa seja atingida em sua honra, na sua reputação, sua personalidade, bem como no seu sentimento de dignidade.” (STJ - REsp 1202238/SC, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 14/08/2012, DJe 18/09/2012). Não obstante a ocorrência da redução da carga horária e consequente redução de vencimentos, condutas que, por certo, geraram aborrecimentos e dissabores, não se infere dos autos a ocorrência de prejuízo de ordem moral, razão pela qual não há que se falar em indenização compensatória. 9. Reexame Necessário não provido, restando prejudicada a Apelação do Município. Recurso adesivo não provido. Manutenção da sentença. (Apelação/Remessa Necessária nº 0000738-26.2021.8.17.2710. Relator: Des. Jorge Américo Pereira de Lira. Data de Julgamento 31/07/2023) 4ª Câmara de Direito Público: EMENTA. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA DE 200 HS/AULA PARA 150 HS/AULA. REDUÇÃO DA REMUNERAÇÃO. EXERCÍCIO DO PODER DE AUTOTUTELA PELA MUNICIPALIDADE SEM OBSERVÂNCIA DE PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. CONDUTA OFENSIVA À TESE FIRMADA PELO STF. MATÉRIA DECIDIDA EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. APLICAÇÃO DO TEMA 138 DO STF (RE Nº 594296). O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL FIRMOU A SEGUINTE TESE: “AO ESTADO É FACULTADA A REVOGAÇÃO DE ATOS QUE REPUTE ILEGALMENTE PRATICADOS; PORÉM, SE TAIS ATOS JÁ TIVEREM DECORRIDO EFEITOS CONCRETOS, SEU DESFAZIMENTO DEVE SER PRECEDIDO DE REGULAR PROCESSO ADMINISTRATIVO.” RESTABELECIMENTO AO STATUS QUO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO DE APELAÇÃO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. À UNANIMIDADE DE VOTOS. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. (Apelação Cível nº 0001082-48.2021.8.17.2470. Relator: Des. André Oliveira da Silva Guimarães. Data de Julgamento 21/06/2023) Sendo assim, uma vez reconhecida a ilegalidade do decesso remuneratório operado sem a observância prévia do contraditório e da ampla defesa, é imperiosa a condenação do Município no restabelecimento do quadro jurídico anterior do autor, devendo ser restaurada a carga horária de 200 horas/aula, com a sua respectiva remuneração. Por outro lado, não merece prosperar o pedido de condenação do Município no pagamento de indenização por danos morais e materiais. Quanto aos danos morais, é sabido que o pagamento a menor da remuneração, por si só, não enseja a condenação na indenização por danos extrapatrimoniais, sendo necessária a comprovação de situação vexatória capaz de causar profundo sofrimento ou de algum transtorno moral, o que não restou provado nos autos. A configuração do dano moral, nos dizeres do STJ, resulta do fato de “que a pessoa seja atingida em sua honra, na sua reputação, sua personalidade, bem como no seu sentimento de dignidade” (REsp 1202238/SC, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 14/08/2012, DJe 18/09/2012). Logo, não obstante a ocorrência da redução da carga horária, conduta que pode gerar eventuais aborrecimentos e dissabores, não se infere dos autos a ocorrência de prejuízo de ordem moral, razão pela qual não há que se falar em indenização compensatória. No que se refere ao pedido indenizatório por danos materiais, melhor sorte não assiste ao recorrente, que se limitou a formular pedido genérico a esse respeito, sem qualquer menção ao montante da indenização pleiteada. Sobre o tema, recentemente, a Sexta Turma do STJ, no julgamento do AgRg no REsp nº 2.092.161/RS, da relatoria do Ministro Antonio Saldanha Palheiro (julgado em 02/09/2024, DJe de 05/09/2024), ratificou a jurisprudência daquela Corte de Justiça, e decidiu que o pedido de indenização por danos materiais deverá conter a indicação expressa do valor pretendido, a fim de que a parte demandada possa exercer o seu direito de defesa comprovando a inexistência de prejuízo a ser reparado ou indicando quantum diverso do pleiteado: [...]. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que "a fixação de valor mínimo para reparação dos danos materiais causados pela infração exige, além de pedido expresso na inicial, a indicação de valor e instrução probatória específica, de modo a possibilitar ao réu o direito de defesa com a comprovação de inexistência de prejuízo a ser reparado ou a indicação de quantum diverso" (AgRg no REsp 1.724.625/RS, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 21/06/2018, DJe de 28/06/2018.)". (AgRg no REsp 1785526/MT, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 2/8/2019) [...]. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO PARCIAL ao recurso de apelação interposto, a fim de reformar a sentença para restabelecer a carga horária de trabalho do servidor apelante para 200 horas/aula, mantendo, entretanto, a improcedência do pedido autoral em relação às indenizações por danos morais e materiais. Em consequência, em razão da equivalência nas ordens de grandeza das sucumbências suportadas por cada uma das partes, reconheço a ocorrência de sucumbência recíproca (art. 86, do CPC), e determino que o ônus sucumbencial seja distribuído de acordo com o entendimento do STJ, que adota “como critério norteador para a distribuição das verbas de sucumbência, o número de pedidos formulados e atendidos" (STJ - AgInt no AREsp 1716192/SC, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 30/11/2020, DJe 18/12/2020). Assim sendo, considerando que no presente caso foram três os pedidos autorais (restabelecimento da carga horária, danos morais e danos materiais), o ônus da sucumbência deve ser distribuído do seguinte modo: a) 2/3 do valor das custas, e honorários sucumbenciais de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, deverão ser suportados pelo autor/apelante, que sucumbiu em relação aos pedidos de danos morais e danos materiais, com a ressalva de que a exigibilidade dessas obrigações fica suspensa por ser o recorrente beneficiário da gratuidade da justiça (art. 98, § 3ª, CPC); e b) 1/3 do valor das custas, e honorários sucumbenciais de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, deverão ser suportados pelo réu/apelado, que sucumbiu em relação ao pedido de restabelecimento da carga horária para 200 horas/aulas. É como voto. Des. Carlos Moraes Relator 3ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Apelação Cível nº 0000856-72.2023.8.17.2470 Apelante: RENATO DUARTE GOMES Apelado: MUNICÍPIO DE CARPINA Relator: Des. Carlos Moraes EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR EFETIVO DO MUNICÍPIO DE CARPINA. PROFESSOR DE 1ª A 4ª SÉRIES. REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA DE 200 PARA 150 HORAS/AULA. DECESSO REMUNERATÓRIO. PEDIDO AUTORAL JULGADO IMPROCEDENTE NO 1º GRAU. APELAÇÃO DO AUTOR. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. ILEGALIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. PRECEDENTES DO STJ E DO TJPE. DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA. DANOS MATERIAIS. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO EXPRESSA DO VALOR PRETENDIDO. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO PARCIALMENTE. DECISÃO UNÂNIME. 1. O autor/apelante foi empossado no cargo de “Professor de 1ª a 4ª séries” com 150 horas/aula, em março de 2011. Posteriormente, em maio de 2012, teve a sua carga horária aumentada para 200 horas/aula, a contar de março de 2012, por meio de Portaria do Prefeito do Município de Carpina. Em junho de 2020, a carga horária foi reduzida para 150 horas/aula de forma direta na folha de pagamento, sem qualquer processo administrativo prévio. 2. Apesar de a Administração Pública poder anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmula 473 do STF), é sabido que quando a anulação de atos implicar na invasão da esfera jurídica de interesses individuais de particular(es), caso dos autos, torna-se obrigatória a instauração de prévio processo administrativo, com fiel observância ao devido processo legal e seus corolários do contraditório e da ampla defesa, cuja inobservância implica no reconhecimento da ilegalidade da redução remuneratória. Precedentes do STJ e do TJPE. 3. No caso em análise, o Município limitou-se a alegar que a Portaria que atribuiu ao autor/apelante a carga horária de 200 horas/aula comprova que se tratou de nomeação para cargo comissionado. Contudo, da leitura do mencionado documento conclui-se que nele não há qualquer menção a esse respeito. Logo, o réu/apelado não se desincumbiu do ônus de comprovar que a redução da verba remuneratória da parte autora foi precedida da instauração de processo administrativo, com as garantias do contraditório e da ampla defesa. 4. Ademais, o Tribunal Pleno do STF, por ocasião do julgamento do RE 594296 (Tema 138), fixou a seguinte Tese: “Ao Estado é facultada a revogação de atos que repute ilegalmente praticados; porém, se de tais atos já tiverem decorrido efeitos concretos, seu desfazimento deve ser precedido de regular processo administrativo”. 5. Uma vez reconhecida a ilegalidade do decesso remuneratório operado sem a observância prévia do contraditório e da ampla defesa, é imperiosa a condenação do Município no restabelecimento do quadro jurídico anterior do autor, devendo ser restaurada a carga horária de 200 horas/aula, com a sua respectiva remuneração. 6. Por outro lado, não merece prosperar o pedido de condenação do Município no pagamento de indenização por danos morais, pois, apesar da redução da carga horária, conduta que pode gerar eventuais aborrecimentos e dissabores, não se infere dos autos a ocorrência de prejuízo de ordem moral, razão pela qual não há que se falar em indenização compensatória.. No que se refere ao pedido indenizatório por danos materiais, melhor sorte não assiste ao recorrente, que se limitou a formular pedido genérico a esse respeito, sem qualquer menção ao montante da indenização pleiteada. 7. Recurso de apelação provido parcialmente, a fim de reformar a sentença para restabelecer a carga horária de trabalho do servidor apelante para 200 horas/aula, mantendo, entretanto, a improcedência do pedido autoral em relação às indenizações por danos morais e materiais. 8. Em consequência, em razão da sucumbência recíproca, o ônus sucumbencial fica distribuído do seguinte modo: a) 2/3 do valor das custas, e honorários sucumbenciais de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, deverão ser suportados pelo autor/apelante, que sucumbiu em relação aos pedidos de danos morais e danos materiais, com a ressalva de que a exigibilidade dessas obrigações fica suspensa por ser o recorrente beneficiário da gratuidade da justiça (art. 98, § 3ª, CPC); e b) 1/3 do valor das custas, e honorários sucumbenciais de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, deverão ser suportados pelo réu/apelado, que sucumbiu em relação ao pedido de restabelecimento da carga horária para 200 horas/aulas. Decisão unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº 0000856-72.2023.8.17.2470, acordam os Excelentíssimos Desembargadores que compõem a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Pernambuco, por unanimidade de votos, em DAR PROVIMENTO PARCIAL ao apelo interposto, nos termos do voto do Relator, que passa a integrar este julgado. Recife, data registrada no sistema. Des. Carlos Moraes Relator Proclamação da decisão: À unanimidade de votos, deu-se parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatoria Magistrados: [ANTENOR CARDOSO SOARES JUNIOR, LUIZ CARLOS DE BARROS FIGUEIREDO, CARLOS FREDERICO GONCALVES DE MORAES] Recife, 22 de outubro de 2024 Diante dessas considerações, DETERMINO à Diretoria Cível que publique o resultado do referido julgamento, dando ciência às partes para os devidos fins. Decorridos os prazos processuais sem interposição recursal, certifique o trânsito em julgado, com remessa dos autos ao juízo de origem, dando-se baixa no meu acervo. Cumpra-se. Intime-se. Recife, data registrada no sistema. Des. Carlos Moraes 10

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Processo nº 0002857-39.2024.8.17.2100

ID: 314689193

Tribunal: TJPE Órgão: Gabinete do Des. Mauro Alencar de Barros Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº Processo: 0002857-39.2024.8.17.2100

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO EDMILSON SILVA DE LIMA GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA JORGE LOPES DE FREITAS PAULO DITACIO DE OLIVEIRA PERICLES NUNES PEREIRA ROBSON QUINTINO DOS SANTOS ROSTAND CAVALCANTI BELEM ROSTAND CAVALCANTI BELEM JUNIOR

Intimação (Outros)

Advogados:

GLEICE KELLY MARIA DE SANTANA

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GERVASIO XAVIER DE LIMA LACERDA

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MARIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL

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THULIO MENDES DE SOUZA

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DIOGO DE ALMEIDA ESPINDOLA

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IZABELLA KARLA DE ASSUNCAO

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ULISSES NARCIZO DORNELAS DE SOUZA JUNIOR

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GERVASIO XAVIER DE LIMA LACERDA

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MARIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL

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FLAVIO MAURICIO SANTANA DE MELLO

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GABRIEL MOREIRA SANTANA DE MELLO

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CEZAR JORGE DE SOUZA CABRAL

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GILBERTO MENDONCA DA SILVA

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WANDERSON DOS SANTOS ALBUQUERQUE

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CLAUDIO CESAR PEREIRA DA SILVA

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JANICE DE SOUSA BASILIO

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AUDENIZE NUNES DE MELO

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ERMIRIO RIBEIRO DA SILVA FILHO

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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 2ª Câmara Criminal - Recife Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Processo nº 0002857-39.2024.8.17.2100 RECOR… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 2ª Câmara Criminal - Recife Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Processo nº 0002857-39.2024.8.17.2100 RECORRENTE: 1º PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL DE ABREU E LIMA RECORRIDO(A): JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROSTAND CAVALCANTI BELEM, ROSTAND CAVALCANTI BELEM JUNIOR, EDMILSON SILVA DE LIMA, PERICLES NUNES PEREIRA, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, PAULO DITACIO DE OLIVEIRA INTEIRO TEOR Relator: MAURO ALENCAR DE BARROS Relatório: Recurso em Sentido Estrito: 0002857-39.2024.8.17.2100 Comarca de Origem: Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima/PE Recorrente: Ministério Público do Estado de Pernambuco Recorridos: Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira, Robson Quintino dos Santos Relator: Des. Mauro Alencar de Barros Procurador de Justiça: Fernando Barros de Lima Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal RELATÓRIO Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco contra decisão do Juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima que indeferiu o pedido de decretação da prisão preventiva dos denunciados Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira e Robson Quintino dos Santos, no bojo da Ação Penal nº 0001779-10.2024.8.17.2100. O Juízo de origem, embora tenha inicialmente decretado a prisão temporária dos investigados, entendeu, ao final do prazo legal, por não converter tal prisão em preventiva, entendendo ausentes os pressupostos e fundamentos concretos que autorizassem a medida extrema, optando pela imposição de medidas cautelares diversas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal. Essa decisão ensejou a irresignação ministerial. Nas razões recursais, o Parquet sustenta que os elementos de convicção extraídos do robusto conjunto probatório colhido durante a investigação – especialmente os relatórios do GOE, a denúncia oferecida e o relatório final do inquérito policial – são suficientes para demonstrar a periculosidade concreta dos réus e a persistência das atividades da organização criminosa mesmo após a deflagração da operação e a prisão temporária de seus principais membros. Argumenta que a atuação de milícia privada representa grave ameaça à ordem pública, especialmente por sua estrutura hierárquica, capacidade bélica e atuação sistemática de intimidação e retaliação, inclusive mediante ameaças à integridade física de comerciantes que se recusam a pagar a “taxa de segurança”. Ressalta ainda que os acusados, por sua condição funcional de agentes da segurança pública, teriam acesso facilitado a armas e informações estratégicas, colocando em risco a instrução criminal e a aplicação da lei penal. O Parquet afirma que a substituição da prisão por medidas alternativas mostrou-se ineficaz para cessar as atividades da milícia, uma vez que o núcleo da organização manteve-se ativo e operante. Nas contrarrazões, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO (Id. 177768006), GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA (Id. 177797980), PERICLES NUNES PEREIRA (Id. 177829253), EDMILSON SILVA DE LIMA (Id. 177855185), PAULO DITACIO DE OLIVEIRA (Id. 177920153), ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR (Id. 178417995) ROBSON QUINTINO DOS SANTOS (Id. 178594795) e JORGE LOPES DE FREITAS (Id. 40832409) sustemtam a legalidade da decisão impugnada, destacando que a prisão preventiva deve ser medida de última ratio, justificada por elementos concretos e atuais, o que, em seu entender, não estaria presente no caso dos autos. Alegam que suas liberdades não compromete a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ressaltando que vêm cumprindo com rigor as cautelares impostas, sem registro de qualquer novo fato delituoso. Argumentam, ademais, que a decisão judicial está de acordo com o princípio da presunção de inocência e os parâmetros estabelecidos pela jurisprudência dos Tribunais Superiores quanto à excepcionalidade da prisão processual. Nos termos do art. 589 do Código de Processo Penal, o juízo a quo manteve o decisum ora combatido (Id. 179647687 p. 2). Instado a se pronunciar, o Procurador de Justiça Criminal, Dr. Fernando Barros de Lima manifestou-se favoravelmente ao provimento do recurso (Id. 41562437), defendendo a decretação da prisão preventiva dos recorridos como medida indispensável à proteção da ordem pública, à garantia da instrução e à credibilidade do sistema de justiça penal, afirmando que a manutenção dos acusados em liberdade representa risco evidente à coletividade e compromete a efetividade da persecução penal, diante da gravidade das imputações e da atuação delituosa ainda em curso. É o relatório. Inclua-se em pauta. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Mauro Alencar de Barros Relator Voto vencedor: Recurso em Sentido Estrito: 0002857-39.2024.8.17.2100 Comarca de Origem: Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima/PE Recorrente: Ministério Público do Estado de Pernambuco Recorridos: Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira, Robson Quintino dos Santos Relator: Des. Mauro Alencar de Barros Procurador de Justiça: Fernando Barros de Lima Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal VOTO DO RELATOR Conforme relatado, trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco contra decisão do Juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima, que indeferiu o pedido de decretação da prisão preventiva de Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira e Robson Quintino dos Santos, todos investigados e já denunciados no bojo da Ação Penal nº 0001779-10.2024.8.17.2100 pela prática de crimes ligados à formação de milícia privada, extorsão e outros correlatos. Antes de ingressar na análise do mérito do recurso, impõe-se traçar o contexto fático e processual que permeia a presente controvérsia. As investigações foram instauradas formalmente por meio do Inquérito Policial nº 2023.0267.000051-32, conduzido pelo Grupo de Operações Especiais (GOE) da Polícia Civil de Pernambuco, com a finalidade de apurar a atuação de um grupo organizado de natureza paramilitar, formado por ex-agentes públicos, policiais militares e indivíduos com significativa influência política local, notadamente no bairro de Caetés I, município de Abreu e Lima/PE. A partir de diligências investigativas, colheita de depoimentos, análise de dados telemáticos e cumprimento de mandados de busca e apreensão, foram reunidos elementos que indicam a existência de uma milícia privada destinada à cobrança de valores extorsivos sob a justificativa de prestação de “proteção” aos comerciantes da região, mediante o uso de coação, intimidação e, em alguns casos, violência direta. A estrutura da organização apontava para uma divisão hierárquica de funções, destacando-se, como líderes do núcleo, os investigados ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, com papel de comando e arrecadação, contando com apoio operacional de diversos policiais e ex-agentes. Diante dos indícios colhidos, a autoridade policial, com o ratificação do Ministério Público, representou pelo decreto da prisão temporária dos investigados. O juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima deferiu a medida, tendo sido cumpridas as ordens de prisão em 12 de julho de 2024, com o recolhimento dos acusados por prazo inicial de dez dias. Durante a custódia temporária, novas provas foram agregadas ao inquérito, culminando com a extração de dados relevantes dos aparelhos apreendidos e novos depoimentos que corroboraram a narrativa acusatória. Encerrada a fase policial, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor dos investigados, imputando-lhes o crime previsto no art. 288-A do Código Penal (constituição de milícia privada), além de outros delitos correlatos. O juízo de origem recebeu a denúncia e, ato contínuo, indeferiu o pleito de conversão da prisão temporária em preventiva, optando por aplicação de medidas cautelares diversas. Colaciono abaixo parte da decisão: A prisão preventiva, em observância aos postulados constitucionais da liberdade e da não culpabilidade, somente é cabível em situações excepcionalíssimas, consoante disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal, nas seguintes hipóteses: a) para garantia da ordem pública, b) da ordem econômica, c) por conveniência da instrução criminal, d) ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que não se revelarem adequadas ou suficientes as outras medidas cautelares de índole pessoal, prevista no artigo 319 do mesmo Códex. No caso vertente, requeridos foram denunciados pela prática de milícia privada, razão por que há possibilidade abstrata para decretação da medida, conforme intelecção do artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 12.403/11. Na oportunidade, teor do art. 288-A do CP: Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código:(Incluído dada pela Lei nº 12.720, de 2012) Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos. Ao exame dos presentes autos, porém não entendo demonstrados elementos suficientes para decretação da prisão preventiva. Prevalece na doutrina e jurisprudência pátria que a prisão preventiva, de natureza indubitavelmente cautelar, é medida excepcional, podendo ser decretada pelo magistrado em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, desde que haja real necessidade, a qual é aferida pela presença dos pressupostos previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, bem como do fummus comissi delicti e periculum libertatis, estes últimos fundamentais para a aplicação de qualquer medida cautelar penal. Do parecer ministerial (item 1 da denúncia) e do requerimento da autoridade policial (ID 176068419), percebe-se que o principal motivo para a decretação desse prisão seria a suposta intimidação dos investigados quanto à testemunhas dos fatos, ou seja, por conveniência da instrução criminal Todavia, apesar de reconhecer a gravidade do delito apurados nos autos, tem-se que o feito ainda se encontra no estágio inicial, com 9 (nove) réus, o que demandará tempo razoável para finalização da instrução criminal. Assim, não se mostra razoável deixar os investigados custodiados até o término da aludida instrução, pois há outras medidas cautelares menos gravosas aptas a esse fim. Ressalte-se que havendo a notícia de fato contemporâneo de eventual descumprimento dessas cautelares, o MP ou a autoridade policial poderão requerer a prisão preventiva dos denunciados, o que será analisado por este Juízo, com base no descumprimento concreto pelos réus. Assim, tendo em vista a não comprovação de fato contemporâneo de eventual conduta dos denunciados no sentido de obstaculizar a instrução criminal, tenho que a prisão preventiva é medida que foge à razoabilidade ao presente caso. Lembre-se, ainda, que prisão preventiva é a ultima ratio, isto é, deve ser utilizada, quando ineficiente as outras medidas . Ademais, não há comprovação de que o denunciado possa vir a ameaçar a ordem pública ou econômica e, ainda, não há sequer indícios de que ele esteja embaraçando a apuração dos fatos ou que pretenda se esquivar da aplicação da lei penal, razão pela qual não vislumbro a existência dos requisitos autorizadores da sua custódia preventiva. Pelo o exposto, INDEFIRO o requerimento de prisão preventiva. Inconformado com tal decisão, o Parquet interpôs o presente recurso em sentido estrito, sustentando que os requisitos legais para decretação da prisão preventiva encontram-se plenamente satisfeitos, tendo em vista a gravidade concreta da conduta, o risco à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal. O recurso merece ser provido. Isto porque, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderá ser decretada para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que presentes prova da existência do crime, indícios suficientes de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. A materialidade e indícios das autorias encontram-se evidenciados por diversos meios de prova reunidos no curso do inquérito policial 2023.0267.000051-32, especialmente as declarações das testemunhas, nos autos de busca e apreensão expedidos nos autos de n° 0000738-42.2023.8.17.2100, nos registros de chamadas e mensagens extraídas de aparelhos celulares apreendidos, bem como os documentos e objetos encontrados durante as buscas domiciliares realizadas no âmbito da "Operação Derrama". Dentre os elementos colhidos, destacam-se os depoimentos de comerciantes que confirmaram a atuação sistemática do grupo, relatando, sob temor manifesto, a cobrança de valores mensais como “taxa de segurança”, a presença de indivíduos armados vinculados aos denunciados e os episódios de represálias em casos de inadimplemento. Em uma das declarações, um comerciante Tarciano Rodrigues Alvares afirmou: TARCIANO RODRIGUES ALVARES mencionou que é responsável legal pela Auto Escola “Direção Certa”, estabelecimento que funciona em Caetés I desde o ano de 2012. Disse que após o estabelecimento ter sido assaltado em 2016, sua falecida irmã teria decidido pagar pela segurança privada de ROSTAND. Declarou que a segurança contava com ao menos dois homens, acreditando que estes faziam uso de arma de fogo. Alegou já ter escutado comentários de que ROSTAND pacificou a região e que o mesmo ordenava o desaparecimento de indivíduos que promoviam assaltos na região. Disse que também havia comentários a evidenciar que aqueles que pagavam pela “taxa de proteção” não sofriam qualquer investida criminosa. A corroborar, os mandados de busca e apreensão cumpridos nas residências dos principais recorrido ROSTAND CAVALCANTI BELÉM resultaram na apreensão de armas de fogo e munições de variados calibres, cofre, R$20.300,00 (vinte mil e trezentos reais) em espécie, talonário de recibos, 06 (seis) currículos, 14 (quatorze) cartões bancários de titularidade de terceiros e 06 (seis) vales alimentação também emitidos em nome de ex-assessores de ROSTAND. Os indícios de autorias se reforçam pela vinculação direta dos acusados com os objetos apreendidos, pelas mensagens interceptadas que revelam comunicação entre os membros do grupo e planejamento das ações extorsivas, bem como pelas funções estratégicas que cada um desempenhava na organização. ROSTAND e ROSTAND JÚNIOR exerciam comando direto das atividades criminosas, inclusive sendo mencionados como responsáveis pela “arrecadação” e definição de alvos, enquanto os demais integravam a logística armada e operacional, garantindo o domínio territorial da atuação ilícita. Os demais recorridos eram executores das ordem e participavam da arrecadação dos valores. Constata-se assim, o fumus comissi delicti diante dos elementos concretos e objetivos, apresentados pela Autoridade Policial que permitem uma avaliação positiva quanto a prova da materialidade e indícios de autoria. Ressalte-se que, neste momento, não há necessidade de certeza da autoria, contentando-se a lei apenas a existência de "indícios suficientes" (CPP. art. 312), o que dispensa, por ora, a existência de prova inequívoca quanto à autoria do delito. Seguindo, periculum libertatis os recorridos encontram-se consubstanciado no modus operandi, na periculosidade dos agentes, na estruturação da organização, na reiteração de condutas criminosas e na necessidade de resguardar a instrução e lei penal. Explico. A decretação da prisão preventiva mostra-se, no presente caso, imprescindível à garantia da ordem pública, frente à gravidade concreta dos fatos apurados e à periculosidade manifesta dos recorridos. As condutas atribuídas aos investigados revelam a existência de uma organização criminosa que se vale do aparato armado e do terror psicológico para impor domínio territorial em uma região densamente povoada do município de Abreu e Lima. O depoimento prestado pela Testemunha Sigilosa 03 é absolutamente revelador da periculosidade real e concreta que os investigados representam à sociedade e da imperiosa necessidade de segregação cautelar para proteção da ordem pública. Relatando o contexto de atuação de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM na localidade de Caetés I, a testemunha confirmou que o mesmo atua com o auxílio de homens armados, responsáveis por patrulhamento ostensivo e intimidador na região, utilizando-se, inclusive, do mesmo veículo já citado por outras fontes — um Voyage prata —, o que comprova a convergência de informações e a consistência dos dados colhidos. A testemunha reforça que, mesmo após a prisão de ROSTAND, a cobrança da “taxa de proteção” não cessou, sendo assumida por seu filho, ROSTAND JÚNIOR, o que comprova a resiliência e continuidade da organização criminosa, independente da presença física de seus líderes. Mais alarmante, entretanto, é a descrição feita da figura de ROSTAND como uma pessoa temida na região, cuja atuação envolve desaparecimentos e mortes não esclarecidas de pessoas que, segundo a testemunha, seriam autores de delitos na comunidade. A testemunha afirma de maneira categórica: “os responsáveis por promoverem assaltos na região são encontrados mortos ou simplesmente desaparecem”. Tal informação, ainda que careça de investigação conclusiva, já se revela suficiente para demonstrar o clima de pavor instaurado na comunidade, onde o controle da criminalidade é exercido de forma privada e à margem do Estado, mediante métodos de execução sumária e justiça paralela. Ademais, a testemunha relatou com clareza que ROSTAND exerce forte influência política, inclusive sobre setores da Prefeitura de Abreu e Lima, sendo conhecido por práticas de compra de votos e doações simuladas como forma de angariar apoio popular e consolidar seu poder. A citada testemunhas mencionou também uma suposta aliança com o tráfico de drogas local, especialmente com o traficante conhecido como “VITOR BOX”, que seria servidor da própria Prefeitura. Os relatos de Antonio Rodrigues Vieira Neto, também escancaram a coerção velada, mas contínua, imposta aos comerciantes locais para que paguem valores semanais sob o pretexto de uma “segurança” que não é solicitada, mas que, quando recusada, pode acarretar represálias. Ponderou que ROSTAND age como um miliciano, como ocorre no Rio de Janeiro e que, embora não conheça YURI, já ouviu comentários dando conta de que o mesmo havia sido assaltado em decorrência de retaliação após ter se recusado a pagar a taxa de proteção. Adeildo Bezerra Vidal relatou que o recibo encontrado na residência de Rostand Cavalcanti, durante o cumprimento de mandado de busca domiciliar, refere-se ao pagamento de uma “taxa de proteção” no valor de R$ 50,00, feito em 18/03/2017. Afirmou que tal taxa é cobrada semanalmente de comerciantes locais, sendo o recolhimento realizado por Rostand Júnior, filho de Rostand Cavalcanti, acompanhado por quatro seguranças. Sugeriu que esses indivíduos estariam armados, dada a natureza de suas funções. Embora tenha declarado não se sentir constrangido ao pagar, ressaltou que a forma de cobrança da taxa não oferece alternativas aos comerciantes, tornando o pagamento uma imposição tácita. Informou ainda que o valor da taxa sofreu sucessivos aumentos ao longo de mais de cinco anos, com reajuste superior a 100%. Por sua vez, a testemunha Joaquim Estevão De Araújo disse ser representante legal da JS Bombons desde 2011, estabelecimento este situado no Bairro Caetés I em Abreu e Lima/PE, confirmou o esquema de milicia privada instaurado pelo recorrido ROSTAND, bem como nomeou as pessoas responsáveis pelo patrulhamento da região, sendo eles: LOPES; GEORGE; ROBSON; NETO; EDMILSON; DITÁCIO e PÉRICLES. A testemunha SIGILOSA nº 01, outrossim, listou os nomes de dos “soldados” de ROSTAND. Alegou haver uma listagem nominal dos “soldados” de ROSTAND com o nome dos integrantes de cada equipe e os respectivos telefones, sendo eles: LOPES; GEORGE; ROBSON; NETO; EDMILSON; DITÁCIO; PÉRICLES. Assim, além de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e seu filho, os demais recorridos — JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA e PÉRICLES NUNES PEREIRA — em sua maioria policiais militares, também atuavam armados como executores das ordens de ROSTAND, participando diretamente do patrulhamento ostensivo e da cobrança coercitiva de taxas de proteção de comerciantes em Caetés I. Além disso, as investigações dão conta de que não se trata de delitos isolados ou praticados de forma esporádica. Há indícios veementes de que os investigados fazem da prática ilícita um verdadeiro modo de vida, com divisão de tarefas, hierarquia e infiltração em espaços de poder político e institucional, vez que ROSTAND CAVALCANTI BELÉM foi vereador de Abreu e Lima no período de 01/01/2013 a 31/12/2020. Essa circunstância agrava sobremaneira o risco à ordem pública, pois o poder de intimidação do grupo transcende o uso de armas: ele está enraizado na impunidade percebida por quem o teme. Outra dimensão essencial que justifica a decretação das prisões preventivas dos recorridos diz respeito à conveniência da instrução criminal. Trata-se de fundamento cautelar destinado a preservar a higidez da colheita probatória, protegendo testemunhas, vítimas e a própria estrutura processual contra pressões, retaliações ou interferências indevidas por parte dos acusados. No contexto desta investigação, os elementos colhidos demonstram de forma clara e objetiva que os investigados, especialmente ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e seus colaboradores diretos, possuem capacidade concreta de interferir na produção da prova, não apenas por sua posição de comando na organização criminosa, mas também pela influência social, política e institucional que exercem localmente, inclusive no meio policial. A esse respeito, o depoimento da testemunha SIGILOSA 02 é particularmente revelador. Essa testemunha relatou que ROSTAND comanda o serviço de "segurança" privada em Abreu e Lima, contando com cerca de quatro homens no patrulhamento ostensivo da região, inclusive identificando o veículo usado nas rondas: um Voyage prata. Mencionou, ainda, que os patrulhamentos são realizados por pessoas armadas, muitas das quais são policiais militares da ativa, como GEORGE AMILTON, JORGE LOPES, PÉRICLES NUNES e APRIGIO NETO — todos também investigados no presente feito. Essa mesma testemunha alertou sobre a atmosfera de medo generalizado entre os moradores e comerciantes, ressaltando que, mesmo sem presenciar retaliações diretas, “as pessoas pagam por medo”. Informou também que ROSTAND JUNIOR participa ativamente do recolhimento das taxas extorsivas. Mas o dado mais grave, sob a ótica da instrução, é a menção à influência de ROSTAND no meio policial e sua suposta prática de outros crimes, como agiotagem e homicídio, os quais não teriam sido devidamente apurados ou punidos, reforçando a percepção de que o grupo goza de impunidade institucionalizada e atua com respaldo de vínculos que vão além do campo da criminalidade comum. Essa percepção de impunidade, aliada à estrutura militarizada da organização, confere risco real à eficácia da persecução penal. O medo relatado por testemunhas, o silêncio de alguns depoentes, e a atuação armada dos envolvidos criam um ambiente hostil à livre manifestação da prova, especialmente em um cenário em que os agentes do Estado (policiais militares) são parte do esquema criminoso. Nesse contexto, a liberdade dos recorridos representa uma ameaça direta à colheita da prova oral, ao regular cumprimento de diligências e à integridade dos testemunhos que ainda serão colhidos. Os decretos de prisões preventivas, portanto, não apenas são recomendáveis, mas imprescindível para evitar o perecimento da instrução criminal, já fragilizada pelo temor instalado nas vítimas e pela força de intimidação da organização. A prisão preventiva também se justifica, de modo contundente, para assegurar a aplicação da lei penal, diante da clara demonstração de que os investigados, notadamente ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, possuem poder de articulação suficiente para frustrar eventual aplicação da sanção penal, inclusive após a deflagração da operação policial e mesmo após já terem sido temporariamente custodiados. Essa constatação decorre, com clareza, dos depoimentos prestados por Antonio Rodrigues Vieira Neto e pela Testemunha Sigilosa 01, os quais atestam que, mesmo após a prisão de ROSTAND, a organização criminosa permaneceu ativa e em pleno funcionamento, com o recolhimento da “taxa de segurança” sendo assumido por seu filho, ROSTAND JÚNIOR. As testemunhas declararam que inclusive houve incremento na taxa depois da prisão de ROSTAND. Essa substituição direta, longe de representar uma simples continuidade pontual, revela a existência de uma estrutura hierarquizada, funcional e estável, cuja lógica de comando opera de forma autônoma e resistente às medidas repressivas do Estado. A manutenção do esquema extorsivo mesmo após a prisão de seu principal líder demonstra que a liberdade dos demais integrantes permite o prosseguimento das atividades criminosas e, mais grave, assegura que, mesmo em caso de eventual condenação, a pena possa ser esvaziada em sua eficácia prática, seja por fugas organizadas, seja por coações e manipulações que comprometam a execução penal. É notório, também, que o grupo possui forte base territorial, domínio de logística, capacidade de evasão e até supostos vínculos com agentes públicos, o que reforça o risco de frustração futura do cumprimento da lei penal, inclusive no tocante à própria localização dos investigados, à ocultação de bens, ou à manipulação de dados e testemunhas. Nessa perspectiva, a prisão preventiva não é antecipação de pena, mas instrumento indispensável à garantia de que a jurisdição penal poderá produzir seus efeitos concretos no tempo certo e com segurança, sem que o aparato estatal seja continuamente burlado ou neutralizado por estruturas criminosas que operam de forma resiliente e deliberadamente organizada. De mais a mais, em consulta ao PJe, verifiquei que grande parte dos recorridos já foram condenados ou respondem ações penais, ratificando a periculosidade. ROSTAND CAVALCANTI BELÉM responde ação penal nº 0002645-18.2024.8.17.2100, pela prática dos crimes previstos nos arts. 147 e 150, §1º, ambos do Código Penal, além de ter sido condenado nos autos nº 0002724-98.2023.8.17.5990, referente ao art. 16, caput, da Lei 10.826/03, à pena de 3 anos e 4 meses de reclusão, pendente de julgamento de apelação. Há ainda registro de absolvição em ação penal anterior por homicídio (processo nº 0001088-12.2006.8.17.0100), o que não afasta o indicativo de envolvimento com práticas delituosas de alta gravidade. No mesmo sentido, EDMILSON DA SILVA DE LIMA é réu na ação penal nº 0051817-66.2023.8.17.2001, por infração ao art. 22, §1º, I, da Lei nº 13.869/2019, combinada com o art. 53 do Código Penal Militar, evidenciando conduta incompatível com a função pública e voltada ao abuso de poder. Adicionalmente, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO foi pronunciado nos autos da ação penal nº 0000036-47.2020.8.17.0760 pela prática de tentativa de homicídio qualificado (art. 121, §2º, I c/c art. 14, II, ambos do Código Penal), o que corrobora seu perfil agressivo e potencial ofensivo à segurança pública. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a existência de maus antecedentes, reincidência, atos infracionais pretéritos, inquéritos ou mesmo ações penais em curso denotam o risco de reiteração delitiva e constituem também fundamentação idônea a justificar a segregação cautelar (AgRg no HC n. 992.459/CE, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/5/2025, DJEN de 30/5/2025.) Cabe destacar também, que nos autos da ação penal n.º 738-42.2023.8.17.2100 foi expedido mandado de busca e apreensão para a residência de GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA gerando o auto de nº 0005722-42.2023.8.17.3370, o qual resultou na apreensão diversas armas de fogo, incluindo pistola, rifle, espingardas, centenas de munições de diferentes calibres, balaclavas, luvas, equipamentos táticos e uma jaqueta da guarda municipal, além de material explosivo e dispositivo óptico (luneta), compondo um arsenal bélico altamente suspeito e desproporcional, evidenciando o preparo para ações criminosas organizadas. Relaciono abaixo: 01 (uma) Pistola Taurus, modelo PT92, calibre 9mm, n° da arma: ABE632133, numero Sioa2,Calz0e az G99UAF N° 2145007): 01 (um) Rifle CBC, modelo 2020/903202069-08 (NIAF Nº 2145008); 01 (uma) espingarda CBC, modelo 651, calibre 9.1 longo, numero da arma: 174307 (NIAF Nº 2145018); 01 (um) cano da espingarda CBC, cal. 28, numero: 30582 (NIAF N° 2145010); 01 (um) cano da espingarda CBC, calibre não aparente, mas compatível com o cal. 36, numero: 54523 (NIAF Nº 2145011); 50 (cinquenta) munições calibre 9mm, sendo 49 munições da marca CBC e uma munição de marca não identificada, todas intactas; 02 (duas) cartelas intactas, com dez munições em cada uma, da marca CBC, calibre 9mm; 128 (cento e vinte e oito) munições CBC, calibre 22 LR, todas intactas; 30 (trinta) cartuchos metálicos, da marca CBC, calibre 9.1, sendo onze carregados e dezenove descarregados; 29 (vinte e nove) cartuchos da marca CBC, calibre 28, sendo vinte e sete cartuchos metálicos, dos quais treze são carregados e quatorze descarregados, e dois cartuchos de plásticos (cartuchos da praça), ambos intactos; 36 (trinta e seis) cartuchos da marca CBC, calibre 36, dos quais são trinta e dois cartuchos metálicos carregados e quatro cartuchos plásticos (cartuchos da praça), intactos; 03 (três) carregadores para o calibre 9mm, compatíveis para os modelos: PT92/99/917/917C; 03 (três) carregadores calibre não aparente, mas compatível para o calibre 9.1 - Rifle; 01 (uma) luneta HERO 6-24X50AOEG; 02 (duas) balaclavas, da cor preta; 01 (um) par de luvas; 01 (uma) jaqueta da guarda municipal de Recife/PE; 01 (uma) placa de veículo, com as seguintes letras e números: PFU9687; 03 (três) recipientes plásticos contendo pólvora; 02 (dois) recipientes plásticos contendo balinhas de chumbo: 01 (um) recipiente metálico contendo espoletas; 01 (um) aparelho celular IPHONE, da cor verde claro, IMEls: 352916111193646, 352916111113800 e 35291611119364. Tais elementos, considerados em seu conjunto, somam-se de forma eloquente à demonstração da periculosidade dos agentes individualmente e da organização criminosa como um todo. A existência de condenações, ações penais em curso, apreensão de armamento em poder dos denunciados e o modo sistemático de atuação delitiva revelam não apenas o risco concreto à ordem pública, mas a manutenção de uma estrutura miliciana organizada, violenta e intimidatória. Trata-se de um grupo que atua com divisão de tarefas, poder bélico e domínio territorial, impondo-se à comunidade por meio da coerção. A segregação cautelar, portanto, não se justifica apenas pelos delitos imputados, mas pela necessidade de desarticulação de um aparato criminoso que representa verdadeiro poder paralelo ao Estado. Por fim, com relação às alegações trazidas nas contrarrazoes dos recursos de ausência de contemporaneidade dos fundamentos do pedido preventiva o pleito, tais arrazoados não merecem acolhimento. A contemporaneidade da cautelar deve ser aferida não tomando por base apenas a data dos fatos investigados, mas, igualmente, levando em conta a permanência de elementos que indicam que os riscos aos bens que se buscam resguardar com sua aplicação ainda existem. Nessa senda, a gravidade da conduta aliada à periculosidade dos recorridos, integrantes de milícia privada, como destacado alhures, bem como o processamento da ação penal evidenciam a contemporaneidade da prisão. Neste sentido: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO QUALIFICADA, CÁRCERE PRIVADO E SEQUESTRO QUALIFICADO, ROUBO MAJORADO, DANO QUALIFICADO, CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA, INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, TORTURA E OBSTRUÇÃO DA JUSTIÇA. NEGATIVA DE AUTORIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. NECESSIDADE DE INTERRUPÇÃO DAS ATIVIDADES PELA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONTEMPORANEIDADE DA MEDIDA. NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - Para a decretação da custódia cautelar exigem-se indícios suficientes de autoria e não a sua prova cabal, o que somente poderá ser verificado em eventual decisum condenatório, após a devida instrução dos autos. II - As premissas fáticas firmadas nas instâncias ordinárias não podem ser modificadas na via estreita do mandamus. Dessarte, na hipótese, entender de modo contrário ao estabelecido pelo Tribunal a quo, quanto à existência de indícios de autoria para a preventiva, como pretende o agravante, demandaria o revolvimento, no presente mandamus, do material fático-probatório dos autos, o que é de todo inviável na via eleita. III - A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal. IV - No caso, observa-se que a segregação cautelar do ora agravante está devidamente fundamentada em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam de maneira inconteste a necessidade da prisão para garantia da ordem pública, notadamente em razão de, na condição de "Policial Militar lotado na segurança pessoal da família do então Presidente da ALE/RR, o investigado Jalser Renier, e membro do SISO" - Seção de Inteligência e Segurança Orgânica da Assembleia Legislativa, ter sido apontado como integrante de estruturada organização criminosa no âmbito da Assembleia Legislativa de Roraima, formada por policiais militares da ativa e aposentados. V - Segundo o decreto prisional, o agravante teria atuado de forma a embaraçar a investigação acerca dos crimes de sequestro e tortura praticados contra jornalista, cuja atuação profissional crítica desagradava o Deputado Jalser Renier. Conforme consignado no decisum, "quando a esposa do jornalista sequestrado foi à Polícia registrar o Boletim de Ocorrência, NADSON ficou todo tempo atrás dela, acompanhando o depoimento e digitando em seu celular, numa clara atitude intimidatória e se comunicando com os demais investigados sobre o que a vítima falava e se os implicaria, como já descrito acima; no dia em que NADSON teria recebido a intimação para depor sobre os fatos, foi até a casa da vítima, tirou uma foto e lhe enviou, numa clara ameaça velada, como assim foi interpretado pelo jornalista. Posteriormente se justificou dizendo que era amigo das vítimas e queria visitá-las, o que foi negado pelos ofendidos", circunstâncias que revelam a periculosidade concreta do agente e a imperiosidade da imposição da medida extrema ante a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa, no intuito de impedir a reiteração delitiva, bem como para conveniência da instrução criminal. VI - Consoante r. decisum objurgado, "trata-se de organização criminosa composta por policiais militares altamente treinados e perigosos que já tentaram embaraçar as investigações e estavam comandados por Deputado Estadual, que à época era Presidente do Poder Legislativo de Roraima", evidenciando a necessidade da medida constritiva para a conveniência da instrução criminal. VII - Ressalta-se que a presença de circunstâncias pessoais favoráveis não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese. Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. VIII - No que concerne à alegada ausência de contemporaneidade do decreto prisional, verifica-se que, embora os fatos tenham ocorrido em 26/10/2020 e a prisão temporária tenha sido decretada mais recentemente, em 16/9/2021, e convertida em preventiva em 3/10/2021, tenho que, na hipótese, não há que se falar em extemporaneidade do decreto, já que os indícios de autoria surgiram no decorrer da investigação e a prisão cautelar foi decretada tão logo reunidos elementos suficientes a demonstrar a necessidade da imposição da medida extrema. Feito o juízo de ponderação entre a medida imposta - restrição da liberdade de ir e vir - e os resultados que se buscam resguardar - garantia da ordem pública -, verifica-se que a determinação encontra-se em conformidade com a regra de proporcionalidade estrita. IX - Pontualmente, evidencia-se a contemporaneidade da medida, destinada à salvaguarda, por um lado, da ordem pública, ante a periculosidade do agente e, por outro e em reforço, à conveniência da instrução processual que, de outra maneira, estaria em risco pelas circunstâncias supramencionadas quanto à condição de policial militar, integrante da guarda pessoal do Deputado Estadual, de membro da SISO e pelas atitudes concretas de intimidação das vítimas. X - De mais a mais, a contemporaneidade da cautelar deve ser aferida não tomando por base apenas a data dos fatos investigados, mas, igualmente, levando em conta a permanência de elementos que indicam que os riscos aos bens que se buscam resguardar com sua aplicação ainda existem. Nesse sentido, a gravidade da conduta aliada à periculosidade do agravante, integrante de organização criminosa estruturada na sede do Parlamento estadual, como destacado alhures, bem como o processamento da ação penal (na fase instrutória) evidenciam a contemporaneidade da prisão. XI - É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 698.356/RR, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 23/11/2021, DJe de 26/11/2021.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E CORRUPÇÃO DE POLICIAIS. PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. TRANSPORTE DE TONELADAS DE ENTORPECENTE COM A CONIVÊNCIA DE POLICIAIS CIVIS. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA QUE REVELA ELEVADO GRAU DE PERICULOSIDADE DO PACIENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "O exame de contemporaneidade da custódia é feito não apenas com base no tempo entre os fatos e o decreto prisional, como também pela permanência da cautelaridade ensejadora da medida" (HC n. 938.032/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/12/2024, DJEN de 23/12/2024). 2. A prisão foi decretada em decorrência do modus operandi empregado na conduta delitiva, revelador da periculosidade do paciente, consistente na prática, em tese, de tráfico interestadual de vultosa quantidade de droga (16t de maconha), realizado em concurso de agentes que, inclusive, integram o quadro policial civil do Estado do Rio de Janeiro, tendo estes apreendido caminhão na Via Dutra contendo drogas, deixando, contudo, de lavrar o respectivo APF e viabilizando, dias depois, a entrega de tal material ilícito a traficantes. 3. "A gravidade concreta da conduta, reveladora do potencial elevado grau de periculosidade do agente e consubstanciada na alta reprovabilidade do modus operandi empregado na empreitada delitiva, é fundamento idôneo a lastrear a prisão preventiva, com o intuito de preservar a ordem pública" (AgRg no HC n. 687.840/MS, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022). 4. "A necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva" (STF, Primeira Turma, HC n. 95.024/SP, relatora Ministra Cármen Lúcia, DJe de 20/2/2009). 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 951.323/RJ, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 28/5/2025, DJEN de 3/6/2025.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA DEFESA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. GRAVIDADE CONCRETA DOS FATOS. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE DROGAS. NECESSIDADE DE RESGUARDAR A ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. CONTEMPORANEIDADE DA MEDIDA. 1. Em relação à alegação de ausência de intimação da defesa para impugnação do requerimento de prisão preventiva pelo Ministério Público, observa-se que a matéria não foi objeto de análise pelo Tribunal de origem, o que impede o exame inaugural nesta Corte Superior, sob pena de indevida supressão de instância. 2. A prisão preventiva foi devidamente fundamentada mediante análise particularizada da situação fática dos autos, amparando-se na especial gravidade do delito, evidenciada pelas circunstâncias da prisão em flagrante - transporte de 25 kg de cocaína, de forma organizada -, o que justifica a custódia cautelar como medida necessária à preservação da ordem pública. 3. Consoante a orientação desta Corte Superior, não há falar em ausência de contemporaneidade da prisão preventiva, quando o que se investiga é a atuação de integrantes em uma organização criminosa. Precedente. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 898.757/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/5/2025, DJEN de 30/5/2025.) Em igual sentido, “[a] contemporaneidade da prisão preventiva refere-se aos motivos que a fundamentam, e não ao momento da prática delitiva. Portanto, o decurso do tempo é irrelevante se os motivos que justificam a custódia cautelar ainda” (AgRg no RHC n. 207.690/RS, relator Ministro persistem, como no caso em análise Og Fernandes, Sexta Turma, julgado DJEN de 19/2/2025). Aplicando-se tais fundamentos ao caso concreto, resta evidente que a contemporaneidade da prisão preventiva dos recorridos não se encontra prejudicada. Os fatos investigados decorrem de atuação miliciana organizada e sistemática, na qual os réus — incluindo agentes públicos armados — impunham, mediante intimidação, a cobrança de “taxas de proteção” a comerciantes locais, conforme fartamente demonstrado por documentos, depoimentos e apreensões constantes nos autos. A atuação da organização criminosa não se limita a um episódio pretérito e isolado, mas revela padrão de comportamento reiterado e estruturado ao longo do tempo, com divisão de tarefas, uso de armas de fogo e domínio territorial. O caso em tela revela, portanto, não apenas crimes de natureza grave, mas a persistência de uma dinâmica criminosa que continua a ameaçar diretamente a ordem pública. Além disso, os recorridos, conforme consulta ao PJe, respondem a outras ações penais ou já foram condenados por crimes igualmente graves, como porte ilegal de arma de fogo, tentativa de homicídio, abuso de autoridade e infrações militares, corroborando o grau de periculosidade do grupo e a probabilidade concreta de reiteração delitiva. A apreensão recente de arsenal bélico em poder de um dos denunciados, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, demonstra, de maneira objetiva, que a organização criminosa ainda mantém estrutura material voltada à prática de crimes e à intimidação da população local. Esses elementos confirmam que os riscos à ordem pública permanecem presentes, justificando a necessidade da segregação cautelar. Diante do exposto, evidenciada a gravidade concreta dos fatos imputados, a periculosidade dos recorridos e a permanência de riscos reais e atuais à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM, ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JUNIOR, JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA e PÉRICLES NUNES PEREIRA, com fundamento nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal. Expeçam-se os competentes mandados de prisão preventiva em desfavor dos referidos recorridos, com cumprimento prioritário pelas autoridades policiais, devendo ser promovidas, se necessário, diligências para localização e captura imediata dos acusados. Comunique-se às autoridades de segurança pública, inclusive à Polícia e à Corregedoria das corporações eventualmente envolvidas, para fins de ciência e apoio à execução da ordem judicial. Publique-se. Cumpra-se. Intimem-se. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Mauro Alencar de Barros Relator Demais votos: Ementa: Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des. Mauro Alencar de Barros Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Recurso em Sentido Estrito: 0002857-39.2024.8.17.2100 Comarca de Origem: Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima/PE Recorrente: Ministério Público do Estado de Pernambuco Recorridos: Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira, Robson Quintino dos Santos Relator: Des. Mauro Alencar de Barros Procurador de Justiça: Fernando Barros de Lima Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal EMENTA: DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PEDIDO DE PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS DOS ARTS. 312 E 313 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRESENÇA DE FUMUS COMISSI DELICTI E PERICULUM LIBERTATIS. ORGANIZAÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA. RISCO À ORDEM PÚBLICA, À INSTRUÇÃO CRIMINAL E À APLICAÇÃO DA LEI PENAL. DECRETAÇÃO DAS PRISÕES PREVENTIVAS. DECISÃO UNÂNIME. 1. O artigo 312 do Código de Processo Penal autoriza a prisão preventiva quando presentes indícios suficientes de autoria e materialidade, aliados à necessidade de garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. 2. A existência de milícia privada estruturada, com divisão hierárquica de funções, domínio territorial armado, atuação por meio de coação e violência, e prática reiterada de crimes como extorsão, constitui fundamento idôneo para justificar a prisão preventiva, dada a sua gravidade concreta. 3. A permanência da atividade delitiva mesmo após a prisão temporária de líderes do grupo e a atuação contínua por demais membros revela risco atual e concreto à ordem pública, além de indicar a insuficiência das medidas cautelares alternativas. 4. A colheita de provas robustas, como depoimentos de vítimas sob temor, apreensão de arsenal bélico, interceptações telemáticas e registros documentais, reforça os indícios de autoria e a necessidade de segregação cautelar. 5. A prisão preventiva mostra-se imprescindível para garantir a higidez da instrução processual, diante da possibilidade concreta de intimidação de testemunhas e manipulação de provas por parte de agentes com influência política e institucional. 6. A reiteração delitiva e antecedentes criminais relevantes dos recorridos, especialmente por crimes armados e graves, agravam a necessidade de segregação para resguardar a efetividade da aplicação penal. 7. A contemporaneidade da medida cautelar não se mede apenas pela data dos fatos, mas pela permanência dos riscos que a prisão visa mitigar, conforme jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores. 8. Recurso conhecido e provido. Decretação das prisões preventivas dos recorridos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Recurso em Sentido Estrito nº 0002857-39.2024.8.17.2100; Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO; Apelados: Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira, Robson Quintino dos Santos. ACORDAM os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Pernambuco, à unanimidade, em conhecer e DAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Ministério Público, a fim de DECRETAR A PRISÃO PREVENTIVA dos recorridos, com fulcro nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal, conforme os fundamentos constantes do voto do Relator. Recife, data da assinatura digital. Des. Mauro Alencar de Barros Relator Proclamação da decisão: À unanimidade de votos, deu-se provimento ao recurso, e decreto a prisão preventiva de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM, ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, JORGE LOPES DE FREITAS , GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA E PÉRICLES NUNES PEREIRA, com fundamento nos artigos 312 e 313 do código de processo penal,Expeçam-se os competentes mandados de prisão preventiva em desfavor dos referidos recorridos, com cumprimento prioritário pelas autoridades policiais, devendo ser promovidas, se necessário, diligências para localização e captura imediata dos acusados. Tudo nos termos do voto da Relatoria. Magistrados: [MAURO ALENCAR DE BARROS, ISAIAS ANDRADE LINS NETO, EVANDRO SERGIO NETTO DE MAGALHAES MELO] RECIFE, 19 de junho de 2025 Magistrado

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Processo nº 0002857-39.2024.8.17.2100

ID: 323466615

Tribunal: TJPE Órgão: Gabinete do Des. Mauro Alencar de Barros Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº Processo: 0002857-39.2024.8.17.2100

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO EDMILSON SILVA DE LIMA GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA JORGE LOPES DE FREITAS PAULO DITACIO DE OLIVEIRA PERICLES NUNES PEREIRA ROBSON QUINTINO DOS SANTOS ROSTAND CAVALCANTI BELEM ROSTAND CAVALCANTI BELEM JUNIOR

Intimação (Outros)

Advogados:

DIOGO DE ALMEIDA ESPINDOLA

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THULIO MENDES DE SOUZA

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CEZAR JORGE DE SOUZA CABRAL

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CLAUDIO CESAR PEREIRA DA SILVA

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GILBERTO MENDONCA DA SILVA

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WANDERSON DOS SANTOS ALBUQUERQUE

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JANICE DE SOUSA BASILIO

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AUDENIZE NUNES DE MELO

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ERMIRIO RIBEIRO DA SILVA FILHO

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MARIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL

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GERVASIO XAVIER DE LIMA LACERDA

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ITALO MATEUS DE SOUZA LOPES

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ULISSES NARCIZO DORNELAS DE SOUZA JUNIOR

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IZABELLA KARLA DE ASSUNCAO

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GLEICE KELLY MARIA DE SANTANA

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GABRIEL MOREIRA SANTANA DE MELLO

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FLAVIO MAURICIO SANTANA DE MELLO

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GERVASIO XAVIER DE LIMA LACERDA

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MARIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL

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ITALO MATEUS DE SOUZA LOPES

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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 2ª Câmara Criminal - Recife Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Processo nº 0002857-39.2024.8.17.2100 RECOR… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 2ª Câmara Criminal - Recife Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Processo nº 0002857-39.2024.8.17.2100 RECORRENTE: 1º PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL DE ABREU E LIMA RECORRIDO(A): JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROSTAND CAVALCANTI BELEM, ROSTAND CAVALCANTI BELEM JUNIOR, EDMILSON SILVA DE LIMA, PERICLES NUNES PEREIRA, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, PAULO DITACIO DE OLIVEIRA INTEIRO TEOR Relator: MAURO ALENCAR DE BARROS Relatório: Recurso em Sentido Estrito: 0002857-39.2024.8.17.2100 Comarca de Origem: Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima/PE Recorrente: Ministério Público do Estado de Pernambuco Recorridos: Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira, Robson Quintino dos Santos Relator: Des. Mauro Alencar de Barros Procurador de Justiça: Fernando Barros de Lima Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal RELATÓRIO Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco contra decisão do Juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima que indeferiu o pedido de decretação da prisão preventiva dos denunciados Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Rostand Cavalcanti Belém, Rostand Cavalcanti Belém Júnior, Edmilson Silva de Lima, Péricles Nunes Pereira, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira e Robson Quintino dos Santos, no bojo da Ação Penal nº 0001779-10.2024.8.17.2100. O Juízo de origem, embora tenha inicialmente decretado a prisão temporária dos investigados, entendeu, ao final do prazo legal, por não converter tal prisão em preventiva, entendendo ausentes os pressupostos e fundamentos concretos que autorizassem a medida extrema, optando pela imposição de medidas cautelares diversas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal. Essa decisão ensejou a irresignação ministerial. Nas razões recursais, o Parquet sustenta que os elementos de convicção extraídos do robusto conjunto probatório colhido durante a investigação – especialmente os relatórios do GOE, a denúncia oferecida e o relatório final do inquérito policial – são suficientes para demonstrar a periculosidade concreta dos réus e a persistência das atividades da organização criminosa mesmo após a deflagração da operação e a prisão temporária de seus principais membros. Argumenta que a atuação de milícia privada representa grave ameaça à ordem pública, especialmente por sua estrutura hierárquica, capacidade bélica e atuação sistemática de intimidação e retaliação, inclusive mediante ameaças à integridade física de comerciantes que se recusam a pagar a “taxa de segurança”. Ressalta ainda que os acusados, por sua condição funcional de agentes da segurança pública, teriam acesso facilitado a armas e informações estratégicas, colocando em risco a instrução criminal e a aplicação da lei penal. O Parquet afirma que a substituição da prisão por medidas alternativas mostrou-se ineficaz para cessar as atividades da milícia, uma vez que o núcleo da organização manteve-se ativo e operante. Nas contrarrazões, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO (Id. 177768006), GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA (Id. 177797980), PERICLES NUNES PEREIRA (Id. 177829253), EDMILSON SILVA DE LIMA (Id. 177855185), PAULO DITACIO DE OLIVEIRA (Id. 177920153), ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR (Id. 178417995) ROBSON QUINTINO DOS SANTOS (Id. 178594795) e JORGE LOPES DE FREITAS (Id. 40832409) sustemtam a legalidade da decisão impugnada, destacando que a prisão preventiva deve ser medida de última ratio, justificada por elementos concretos e atuais, o que, em seu entender, não estaria presente no caso dos autos. Alegam que suas liberdades não compromete a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ressaltando que vêm cumprindo com rigor as cautelares impostas, sem registro de qualquer novo fato delituoso. Argumentam, ademais, que a decisão judicial está de acordo com o princípio da presunção de inocência e os parâmetros estabelecidos pela jurisprudência dos Tribunais Superiores quanto à excepcionalidade da prisão processual. Nos termos do art. 589 do Código de Processo Penal, o juízo a quo manteve o decisum ora combatido (Id. 179647687 p. 2). Instado a se pronunciar, o Procurador de Justiça Criminal, Dr. Fernando Barros de Lima manifestou-se favoravelmente ao provimento do recurso (Id. 41562437), defendendo a decretação da prisão preventiva dos recorridos como medida indispensável à proteção da ordem pública, à garantia da instrução e à credibilidade do sistema de justiça penal, afirmando que a manutenção dos acusados em liberdade representa risco evidente à coletividade e compromete a efetividade da persecução penal, diante da gravidade das imputações e da atuação delituosa ainda em curso. O Recurso em Sentido Estrito foi julgado na sessão de 18 de junho de 2025, ocasião em que, por unanimidade de votos, foi dado provimento ao recurso ministerial, com a consequente decretação das prisões preventivas de todos os recorridos, diante da gravidade concreta dos fatos e da periculosidade atribuída aos investigados. Contudo, no dia seguinte, 19 de junho, os recorridos GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA, APRÍGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, JORGE LOPES DE FREITAS E ROBSON QUINTINO DOS SANTOS opuseram Embargos de Declaração. Nas razões, de todos os embargantes basearam-se: i) na ausência de publicação da pauta com menção aos patronos, o que impediu a inscrição para sustentação oral; ii) na violação aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, resultando em cerceamento de defesa, vício considerado de natureza absoluta. Em análise dos aclaratórios, observei que, no Diário de Justiça Eletrônico, edição n.º 160/2025, publicado em 16 de junho de 2025, foram intimados apenas os advogados GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA – OAB/PE 21.074-A, e THULIO MENDES DE SOUZA – OAB/PE 37.699-A. ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR foram assistidos por GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA – OAB/PE 21.074 e ÍTALO MATEUS DE SOUZA LOPES – OAB/PE 58.967, enquanto PÉRICLES NUNES PEREIRA foi assistido por THULIO MENDES DE SOUZA – OAB/PE 37.699-A. Estes, de fato, foram regularmente intimados, tendo inclusive o patrono ÍTALO MATEUS DE SOUZA LOPES realizado sustentação oral em favor de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR. Por outro lado, os causídicos dos recorridos GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA, APRÍGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, JORGE LOPES DE FREITAS E ROBSON QUINTINO DOS SANTOS de fato não foram intimados para a sessão de julgamento do recurso em sentido estrito. Diante da flagrante ilegalidade, acolhi monocraticamente os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para declarar a nulidade do julgamento ocorrido em 18 de junho de 2025, apenas quanto aos recorridos GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA, APRÍGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, JORGE LOPES DE FREITAS, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS E EDMILSON SILVA DE LIMA cujos patronos não foram devidamente intimados, determinando a designação de nova sessão de julgamento, a ser realizada no próximo dia 09 de julho, com a devida e regular intimação de todos os advogados constituídos nos autos, em atenção ao disposto no art. 370, §1º, do Código de Processo Penal. É o relatório. Inclua-se em pauta. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Mauro Alencar de Barros Relator Voto vencedor: Recurso em Sentido Estrito: 0002857-39.2024.8.17.2100 Comarca de Origem: Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima/PE Recorrente: Ministério Público do Estado de Pernambuco, Rostand Cavalcanti Belém Júnior e Péricles Nunes Pereira Recorridos: Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Edmilson Silva de Lima, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira, Robson Quintino dos Santos Relator: Des. Mauro Alencar de Barros Procurador de Justiça: Fernando Barros de Lima Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal VOTO DO RELATOR Conforme dito no relatório, cumpre esclarecer que, após a reabertura da fase recursal em virtude da acolhida dos embargos de declaração, com fundamento em nulidade absoluta por ausência de intimação regular de alguns advogados constituídos para a sessão de julgamento anteriormente realizada, foi designada nova data para apreciação colegiada do presente Recurso em Sentido Estrito, qual seja, o dia 09 de julho de 2025. Entretanto, após o lançamento do novo relatório e inclusão do feito em pauta, sobrevieram pedidos de reconsideração das decisões que determinaram a prisão preventiva dos recorridos Rostand Cavalcanti Belém Júnior e Péricles Nunes Pereira, bem como oposição de Embargos de Declaração por ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR. Quanto aos embargos de declaração, reservo-me para apreciá-los em momento oportuno. Já os pedidos de reconsideração, por sua vez, serão enfrentados no presente voto, em observância aos princípios da celeridade processual, da ampla defesa e da efetividade da tutela jurisdicional Ambos os requerentes Rostand Cavalcanti Belém Júnior e Péricles Nunes Pereira alegam, em síntese, o cumprimento regular das medidas cautelares anteriormente impostas, a ausência de fatos contemporâneos que indiquem risco processual atual, possuírem filho menor de 12 anos de idade, além da existência de condições pessoais favoráveis. Sustentam, ainda, que a manutenção da segregação cautelar se mostra desproporcional e contrária ao princípio da presunção de inocência. A defesa de Rostand Cavalcanti Belém Júnior, especificamente, informa, ainda, sua aprovação em concurso público para a Polícia Militar de Pernambuco, destacando que se encontra convocado para o curso de formação profissional. Alega que tal circunstância evidenciaria sua intenção de reinserção social e distanciamento das práticas ilícitas ora apuradas, funcionando como indicativo de não contemporaneidade dos riscos processuais. Contudo, não lhes assiste razão. A decretação da prisão preventiva, no presente caso, não decorreu apenas da gravidade abstrata dos delitos imputados, mas sim da gravidade concreta das condutas, do modus operandi estruturalizado da organização criminosa e, especialmente, da capacidade de rearticulação delitiva dos agentes mesmo após o desencadeamento da operação policial, conforme exaustivamente demonstrado no voto ora lançado. A atuação dos recorrentes insere-se em contexto miliciano estruturado e persistente, com divisão hierárquica de tarefas, emprego sistemático de coação e intimidação, inclusive com relatos de desaparecimento e execução de pessoas apontadas como obstáculos ao domínio territorial exercido pelo grupo. Ressalte-se que os elementos constantes nos autos, especialmente os depoimentos sigilosos, os documentos apreendidos, os registros de comunicação telemática, bem como os indícios de continuidade da cobrança extorsiva da “taxa de segurança” mesmo após as prisões temporárias, evidenciam que os investigados integram um núcleo delitivo resiliente, que continua a operar independentemente da presença física de seus líderes. No tocante à alegação dos peticionários de que são genitores de criança menores de 12 anos, visando, com isso, amparar o pedido de substituição das prisões preventivas por prisões domiciliares com fundamento no art. 318, IV, do CPP, os argumentos também não prosperam. Como é cediço, é entendimento iterativo e consolidado do Superior Tribunal de Justiça que a previsão legal não possui caráter automático: "a prisão domiciliar no caso do homem com filho de até 12 anos incompletos, não possui caráter absoluto ou automático, podendo o Magistrado conceder ou não o benefício, após a análise, no caso concreto, da sua adequação. No caso dos autos, conforme já explicitado, a prisão preventiva foi decretada de forma adequada e baseada em fatos concretos aptos a justificar a medida mais gravosa, para resguardar a ordem pública, não tendo, ainda, ficado demonstrado que o paciente seria o único responsável pelos cuidados das crianças, não havendo falar em prisão domiciliar no caso" (HC n. 485.740/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 16/04/2019) No caso sob exame, não restou demonstrado que os requerentes são os únicos responsáveis pelos cuidados das crianças, nem que suas ausências comprometem a assistência básica dos menores. Ademais, conforme já amplamente delineado neste voto, os motivos que fundamentaram a prisão preventiva são de alta densidade constitucional: proteção da ordem pública, gravidade concreta dos fatos, risco real de reiteração delitiva e estrutura organizada da milícia que continua atuante mesmo após ações repressivas. Ressalte-se, ainda, que a defesa de Rostand Cavalcanti Belém Júnior impetrou Habeas Corpus nº 1013702/PE, que tramita perante o Superior Tribunal de Justiça, sob o registro nº 2025/0228180-3. No referido writ, postula-se a revogação da prisão preventiva decretada nos autos do presente Recurso em Sentido Estrito. Todavia, em decisão monocrática proferida pelo Ministro Ribeiro Dantas, foi indeferida a liminar requerida, permanecendo íntegra a decisão colegiada proferida por esta Câmara. Tal indeferimento confirma, ainda que em sede de cognição sumária, a adequação e a legalidade da medida constritiva imposta, reforçando o juízo de cautelaridade que sustenta a segregação do investigado. Esse pronunciamento, oriundo de instância superior e proferido por relator natural da matéria criminal, confere maior segurança jurídica e respaldo à manutenção da prisão preventiva, pois demonstra que os fundamentos invocados por esta relatoria resistiram ao crivo de controle jurisdicional externo, ainda que em sede de liminar. Esse reforço institucional ao juízo cautelar torna ainda mais evidente a impropriedade da tese defensiva que sustenta, como causa de reconsideração, a mera aprovação do investigado em concurso público para a carreira policial. Tal alegação não se sobrepõe à necessidade da medida extrema, já reconhecida com base em elementos objetivos de alta gravidade. Ao revés, a pretensão de ingresso no serviço público militar, quando associada aos fortes indícios de liderança de organização miliciana armada, acende alerta institucional grave, pois permitir que o investigado, sob acusação formal de comandar grupo com atuação armada, extorsiva e estruturada, venha a compor as fileiras da segurança pública representaria verdadeiro risco à credibilidade do sistema de justiça criminal e à higidez da própria corporação policial. Diante de todo o exposto, considerados os fundamentos jurídicos aqui delineados, os elementos probatórios constantes dos autos, a gravidade concreta dos fatos imputados e a confirmação da legalidade da custódia cautelar por instância superior, nego provimento aos pedidos de reconsideração formulados por Rostand Cavalcanti Belém Júnior e Péricles Nunes Pereira, mantendo hígidas as decisões anteriormente proferidas por esta relatoria que determinaram suas prisões preventivas, as quais permanecem adequadas, necessárias e proporcionais à luz do ordenamento jurídico pátrio e da jurisprudência dominante. Ressalto, por oportuno, que embora tenha sido expedido mandado de prisão em desfavor de Rostand Cavalcanti Belém Júnior desde o dia 19 de junho de 2025, até a presente data, não consta nos autos o efetivo cumprimento da ordem judicial, permanecendo o referido recorrido em situação de não localizado, o que, longe de abrandar o juízo de cautelaridade, apenas reforça a necessidade de manutenção da medida extrema, diante do risco concreto de frustração da aplicação da lei penal. Encerrada, portanto, a análise dos pedidos de reconsideração formulados por Rostand Cavalcanti Belém Júnior e Péricles Nunes Pereira, com a devida fundamentação e indeferimento, passo agora ao rejulgamento dos Recursos em Sentido Estrito interpostos pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco, em relação aos demais recorridos cujas defesas técnicas não foram devidamente intimadas para a sessão anteriormente realizada em 18 de junho de 2025, fato este que motivou o acolhimento parcial dos embargos de declaração e a consequente reabertura do julgamento, em respeito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. Conforme relatado, trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco contra decisão do Juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima, que indeferiu o pedido de decretação da prisão preventiva de Jorge Lopes de Freitas, George Amilton Pereira Lima, Edmilson Silva de Lima, Aprígio Juvenal de Arruda Neto, Paulo Ditácio de Oliveira e Robson Quintino dos Santos, todos investigados e já denunciados no bojo da Ação Penal nº 0001779-10.2024.8.17.2100 pela prática de crimes ligados à formação de milícia privada. Antes de ingressar na análise do mérito do recurso, impõe-se traçar o contexto fático e processual que permeia a presente controvérsia. As investigações foram instauradas formalmente por meio do Inquérito Policial nº 2023.0267.000051-32, conduzido pelo Grupo de Operações Especiais (GOE) da Polícia Civil de Pernambuco, com a finalidade de apurar a atuação de um grupo organizado de natureza paramilitar, formado por ex-agentes públicos, policiais militares e indivíduos com significativa influência política local, notadamente no bairro de Caetés I, município de Abreu e Lima/PE. A partir de diligências investigativas, colheita de depoimentos, análise de dados telemáticos e cumprimento de mandados de busca e apreensão, foram reunidos elementos que indicam a existência de uma milícia privada destinada à cobrança de valores extorsivos sob a justificativa de prestação de “proteção” aos comerciantes da região, mediante o uso de coação, intimidação e, em alguns casos, violência direta. A estrutura da organização apontava para uma divisão hierárquica de funções, destacando-se, como líderes do núcleo, os investigados ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, com papel de comando e arrecadação, contando com apoio operacional de diversos policiais e ex-agentes. Diante dos indícios colhidos, a autoridade policial, com o ratificação do Ministério Público, representou pelo decreto da prisão temporária dos investigados. O juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima deferiu a medida, tendo sido cumpridas as ordens de prisão em 12 de julho de 2024, com o recolhimento dos acusados por prazo inicial de dez dias. Durante a custódia temporária, novas provas foram agregadas ao inquérito, culminando com a extração de dados relevantes dos aparelhos apreendidos e novos depoimentos que corroboraram a narrativa acusatória. Encerrada a fase policial, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor dos investigados, imputando-lhes o crime previsto no art. 288-A do Código Penal (constituição de milícia privada), além de outros delitos correlatos. O juízo de origem recebeu a denúncia e, ato contínuo, indeferiu o pleito de conversão da prisão temporária em preventiva, optando por aplicação de medidas cautelares diversas. Colaciono abaixo parte da decisão: A prisão preventiva, em observância aos postulados constitucionais da liberdade e da não culpabilidade, somente é cabível em situações excepcionalíssimas, consoante disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal, nas seguintes hipóteses: a) para garantia da ordem pública, b) da ordem econômica, c) por conveniência da instrução criminal, d) ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que não se revelarem adequadas ou suficientes as outras medidas cautelares de índole pessoal, prevista no artigo 319 do mesmo Códex. No caso vertente, requeridos foram denunciados pela prática de milícia privada, razão por que há possibilidade abstrata para decretação da medida, conforme intelecção do artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 12.403/11. Na oportunidade, teor do art. 288-A do CP: Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código:(Incluído dada pela Lei nº 12.720, de 2012) Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos. Ao exame dos presentes autos, porém não entendo demonstrados elementos suficientes para decretação da prisão preventiva. Prevalece na doutrina e jurisprudência pátria que a prisão preventiva, de natureza indubitavelmente cautelar, é medida excepcional, podendo ser decretada pelo magistrado em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, desde que haja real necessidade, a qual é aferida pela presença dos pressupostos previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, bem como do fummus comissi delicti e periculum libertatis, estes últimos fundamentais para a aplicação de qualquer medida cautelar penal. Do parecer ministerial (item 1 da denúncia) e do requerimento da autoridade policial (ID 176068419), percebe-se que o principal motivo para a decretação desse prisão seria a suposta intimidação dos investigados quanto à testemunhas dos fatos, ou seja, por conveniência da instrução criminal Todavia, apesar de reconhecer a gravidade do delito apurados nos autos, tem-se que o feito ainda se encontra no estágio inicial, com 9 (nove) réus, o que demandará tempo razoável para finalização da instrução criminal. Assim, não se mostra razoável deixar os investigados custodiados até o término da aludida instrução, pois há outras medidas cautelares menos gravosas aptas a esse fim. Ressalte-se que havendo a notícia de fato contemporâneo de eventual descumprimento dessas cautelares, o MP ou a autoridade policial poderão requerer a prisão preventiva dos denunciados, o que será analisado por este Juízo, com base no descumprimento concreto pelos réus. Assim, tendo em vista a não comprovação de fato contemporâneo de eventual conduta dos denunciados no sentido de obstaculizar a instrução criminal, tenho que a prisão preventiva é medida que foge à razoabilidade ao presente caso. Lembre-se, ainda, que prisão preventiva é a ultima ratio, isto é, deve ser utilizada, quando ineficiente as outras medidas . Ademais, não há comprovação de que o denunciado possa vir a ameaçar a ordem pública ou econômica e, ainda, não há sequer indícios de que ele esteja embaraçando a apuração dos fatos ou que pretenda se esquivar da aplicação da lei penal, razão pela qual não vislumbro a existência dos requisitos autorizadores da sua custódia preventiva. Pelo o exposto, INDEFIRO o requerimento de prisão preventiva. Inconformado com tal decisão, o Parquet interpôs o presente recurso em sentido estrito, sustentando que os requisitos legais para decretação da prisão preventiva encontram-se plenamente satisfeitos, tendo em vista a gravidade concreta da conduta, o risco à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal. O recurso merece ser provido. Isto porque, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderá ser decretada para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que presentes prova da existência do crime, indícios suficientes de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. A materialidade e indícios das autorias encontram-se evidenciados por diversos meios de prova reunidos no curso do inquérito policial 2023.0267.000051-32, especialmente as declarações das testemunhas, nos autos de busca e apreensão expedidos nos autos de n° 0000738-42.2023.8.17.2100, nos registros de chamadas e mensagens extraídas de aparelhos celulares apreendidos, bem como os documentos e objetos encontrados durante as buscas domiciliares realizadas no âmbito da "Operação Derrama". Dentre os elementos colhidos, destacam-se os depoimentos de comerciantes que confirmaram a atuação sistemática do grupo, relatando, sob temor manifesto, a cobrança de valores mensais como “taxa de segurança”, a presença de indivíduos armados vinculados aos denunciados e os episódios de represálias em casos de inadimplemento. Em uma das declarações, um comerciante Tarciano Rodrigues Alvares afirmou: TARCIANO RODRIGUES ALVARES mencionou que é responsável legal pela Auto Escola “Direção Certa”, estabelecimento que funciona em Caetés I desde o ano de 2012. Disse que após o estabelecimento ter sido assaltado em 2016, sua falecida irmã teria decidido pagar pela segurança privada de ROSTAND. Declarou que a segurança contava com ao menos dois homens, acreditando que estes faziam uso de arma de fogo. Alegou já ter escutado comentários de que ROSTAND pacificou a região e que o mesmo ordenava o desaparecimento de indivíduos que promoviam assaltos na região. Disse que também havia comentários a evidenciar que aqueles que pagavam pela “taxa de proteção” não sofriam qualquer investida criminosa. A corroborar, os mandados de busca e apreensão cumpridos nas residências dos principais recorrido ROSTAND CAVALCANTI BELÉM resultaram na apreensão de armas de fogo e munições de variados calibres, cofre, R$20.300,00 (vinte mil e trezentos reais) em espécie, talonário de recibos, 06 (seis) currículos, 14 (quatorze) cartões bancários de titularidade de terceiros e 06 (seis) vales alimentação também emitidos em nome de ex-assessores de ROSTAND. Os indícios de autorias se reforçam pela vinculação direta dos acusados com os objetos apreendidos, pelas mensagens interceptadas que revelam comunicação entre os membros do grupo e planejamento das ações extorsivas, bem como pelas funções estratégicas que cada um desempenhava na organização. ROSTAND e ROSTAND JÚNIOR exerciam comando direto das atividades criminosas, inclusive sendo mencionados como responsáveis pela “arrecadação” e definição de alvos, enquanto os demais integravam a logística armada e operacional, garantindo o domínio territorial da atuação ilícita. Os demais recorridos eram executores das ordens e participavam da arrecadação dos valores. Constata-se assim, o fumus comissi delicti diante dos elementos concretos e objetivos, apresentados pela Autoridade Policial que permitem uma avaliação positiva quanto a prova da materialidade e indícios de autoria. Ressalte-se que, neste momento, não há necessidade de certeza da autoria, contentando-se a lei apenas a existência de "indícios suficientes" (CPP. art. 312), o que dispensa, por ora, a existência de prova inequívoca quanto à autoria do delito. Seguindo, periculum libertatis os recorridos encontram-se consubstanciado no modus operandi, na periculosidade dos agentes, na estruturação da organização, na reiteração de condutas criminosas e na necessidade de resguardar a instrução e lei penal. Explico. A decretação da prisão preventiva mostra-se, no presente caso, imprescindível à garantia da ordem pública, frente à gravidade concreta dos fatos apurados e à periculosidade manifesta dos recorridos. As condutas atribuídas aos investigados revelam a existência de uma organização criminosa que se vale do aparato armado e do terror psicológico para impor domínio territorial em uma região densamente povoada do município de Abreu e Lima. O depoimento prestado pela Testemunha Sigilosa 03 é absolutamente revelador da periculosidade real e concreta que os investigados representam à sociedade e da imperiosa necessidade de segregação cautelar para proteção da ordem pública. Relatando o contexto de atuação de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM na localidade de Caetés I, a testemunha confirmou que o mesmo atua com o auxílio de homens armados, responsáveis por patrulhamento ostensivo e intimidador na região, utilizando-se, inclusive, do mesmo veículo já citado por outras fontes — um Voyage prata —, o que comprova a convergência de informações e a consistência dos dados colhidos. A testemunha reforça que, mesmo após a prisão de ROSTAND, a cobrança da “taxa de proteção” não cessou, sendo assumida por seu filho, ROSTAND JÚNIOR, o que comprova a resiliência e continuidade da organização criminosa, independente da presença física de seus líderes. Mais alarmante, entretanto, é a descrição feita da figura de ROSTAND como uma pessoa temida na região, cuja atuação envolve desaparecimentos e mortes não esclarecidas de pessoas que, segundo a testemunha, seriam autores de delitos na comunidade. A testemunha afirma de maneira categórica: “os responsáveis por promoverem assaltos na região são encontrados mortos ou simplesmente desaparecem”. Tal informação, ainda que careça de investigação conclusiva, já se revela suficiente para demonstrar o clima de pavor instaurado na comunidade, onde o controle da criminalidade é exercido de forma privada e à margem do Estado, mediante métodos de execução sumária e justiça paralela. Ademais, a testemunha relatou com clareza que ROSTAND exerce forte influência política, inclusive sobre setores da Prefeitura de Abreu e Lima, sendo conhecido por práticas de compra de votos e doações simuladas como forma de angariar apoio popular e consolidar seu poder. A citada testemunha mencionou também uma suposta aliança com o tráfico de drogas local, especialmente com o traficante conhecido como “VITOR BOX”, que seria servidor da própria Prefeitura. Os relatos de Antonio Rodrigues Vieira Neto, também escancaram a coerção velada, mas contínua, imposta aos comerciantes locais para que paguem valores semanais sob o pretexto de uma “segurança” que não é solicitada, mas que, quando recusada, pode acarretar represálias. Ponderou que ROSTAND age como um miliciano, como ocorre no Rio de Janeiro e que, embora não conheça YURI, já ouviu comentários dando conta de que o mesmo havia sido assaltado em decorrência de retaliação após ter se recusado a pagar a taxa de proteção. Adeildo Bezerra Vidal relatou que o recibo encontrado na residência de Rostand Cavalcanti, durante o cumprimento de mandado de busca domiciliar, refere-se ao pagamento de uma “taxa de proteção” no valor de R$ 50,00, feito em 18/03/2017. Afirmou que tal taxa é cobrada semanalmente de comerciantes locais, sendo o recolhimento realizado por Rostand Júnior, filho de Rostand Cavalcanti, acompanhado por quatro seguranças. Sugeriu que esses indivíduos estariam armados, dada a natureza de suas funções. Embora tenha declarado não se sentir constrangido ao pagar, ressaltou que a forma de cobrança da taxa não oferece alternativas aos comerciantes, tornando o pagamento uma imposição tácita. Informou ainda que o valor da taxa sofreu sucessivos aumentos ao longo de mais de cinco anos, com reajuste superior a 100%. Por sua vez, a testemunha Joaquim Estevão De Araújo disse ser representante legal da JS Bombons desde 2011, estabelecimento este situado no Bairro Caetés I em Abreu e Lima/PE, confirmou o esquema de milicia privada instaurado pelo recorrido ROSTAND, bem como nomeou as pessoas responsáveis pelo patrulhamento da região, sendo eles: LOPES; GEORGE; ROBSON; NETO; EDMILSON; DITÁCIO e PÉRICLES. A testemunha SIGILOSA nº 01, outrossim, listou os nomes de dos “soldados” de ROSTAND. Alegou haver uma listagem nominal dos “soldados” de ROSTAND com o nome dos integrantes de cada equipe e os respectivos telefones, sendo eles: LOPES; GEORGE; ROBSON; NETO; EDMILSON; DITÁCIO; PÉRICLES. Assim, além de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e seu filho, os demais recorridos — JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA e PÉRICLES NUNES PEREIRA — em sua maioria policiais militares, também atuavam armados como executores das ordens de ROSTAND, participando diretamente do patrulhamento ostensivo e da cobrança coercitiva de taxas de proteção de comerciantes em Caetés I. A Testemunha Sigilosa nº 1 ainda declarou que Rostand Cavalcanti Belém não participava diretamente das ações de patrulhamento nas áreas dominadas pela organização, exercendo, na verdade, função de coordenação e comando estratégico. O depoente afirmou que realizava pagamento semanal no valor de R$ 30,00 (trinta reais) ao próprio Rostand, a título de "taxa de segurança", mas que, após a prisão deste, foi comunicado um aumento da cobrança imposto por Rostand Júnior, que passou a efetuar pessoalmente o recolhimento dos valores extorsivos. Embora tenha declarado desconhecer o número exato de comerciantes sujeitos ao pagamento compulsório, o depoente enfatizou que a região é densamente ocupada por estabelecimentos comerciais, o que sugere um esquema de arrecadação de larga escala. Dentre os nomes repassados à autoridade policial como integrantes da rede de segurança armada da organização, a testemunha afirmou já ter presenciado pessoalmente JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA E PÉRICLES NUNES PEREIRA realizando patrulhamentos ostensivos em nome do ex-parlamentar, atuando como braço operacional armado para manutenção do domínio territorial do grupo. Além disso, as investigações dão conta de que não se trata de delitos isolados ou praticados de forma esporádica. Há indícios veementes de que os investigados fazem da prática ilícita um verdadeiro modo de vida, com divisão de tarefas, hierarquia e infiltração em espaços de poder político e institucional, vez que ROSTAND CAVALCANTI BELÉM foi vereador de Abreu e Lima no período de 01/01/2013 a 31/12/2020. Essa circunstância agrava sobremaneira o risco à ordem pública, pois o poder de intimidação do grupo transcende o uso de armas: ele está enraizado na impunidade percebida por quem o teme. Outra dimensão essencial que justifica a decretação das prisões preventivas dos recorridos diz respeito à conveniência da instrução criminal. Trata-se de fundamento cautelar destinado a preservar a higidez da colheita probatória, protegendo testemunhas, vítimas e a própria estrutura processual contra pressões, retaliações ou interferências indevidas por parte dos acusados. No contexto desta investigação, os elementos colhidos demonstram de forma clara e objetiva que os investigados, especialmente ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e seus colaboradores diretos, possuem capacidade concreta de interferir na produção da prova, não apenas por sua posição de comando na organização criminosa, mas também pela influência social, política e institucional que exercem localmente, inclusive no meio policial. A esse respeito, o depoimento da testemunha SIGILOSA 02 é particularmente revelador. Essa testemunha relatou que ROSTAND comanda o serviço de "segurança" privada em Abreu e Lima, contando com cerca de quatro homens no patrulhamento ostensivo da região, inclusive identificando o veículo usado nas rondas: um Voyage prata. Mencionou, ainda, que os patrulhamentos são realizados por pessoas armadas, muitas das quais são policiais militares da ativa, como GEORGE AMILTON, JORGE LOPES, PÉRICLES NUNES e APRIGIO NETO. Essa mesma testemunha alertou sobre a atmosfera de medo generalizado entre os moradores e comerciantes, ressaltando que, mesmo sem presenciar retaliações diretas, “as pessoas pagam por medo”. Informou também que ROSTAND JUNIOR participa ativamente do recolhimento das taxas extorsivas. Mas o dado mais grave, sob a ótica da instrução, é a menção à influência de ROSTAND no meio policial e sua suposta prática de outros crimes, como agiotagem e homicídio, os quais não teriam sido devidamente apurados ou punidos, reforçando a percepção de que o grupo goza de impunidade institucionalizada e atua com respaldo de vínculos que vão além do campo da criminalidade comum. Essa percepção de impunidade, aliada à estrutura militarizada da organização, confere risco real à eficácia da persecução penal. O medo relatado por testemunhas, o silêncio de alguns depoentes, e a atuação armada dos envolvidos criam um ambiente hostil à livre manifestação da prova, especialmente em um cenário em que os agentes do Estado (policiais militares) são parte do esquema criminoso. Nesse contexto, a liberdade dos recorridos representa uma ameaça direta à colheita da prova oral, ao regular cumprimento de diligências e à integridade dos testemunhos que ainda serão colhidos. Os decretos de prisões preventivas, portanto, não apenas são recomendáveis, mas imprescindível para evitar o perecimento da instrução criminal, já fragilizada pelo temor instalado nas vítimas e pela força de intimidação da organização. A prisão preventiva também se justifica, de modo contundente, para assegurar a aplicação da lei penal, diante da clara demonstração de que os investigados, notadamente ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, possuem poder de articulação suficiente para frustrar eventual aplicação da sanção penal, inclusive após a deflagração da operação policial e mesmo após já terem sido temporariamente custodiados. Essa constatação decorre, com clareza, dos depoimentos prestados por Antonio Rodrigues Vieira Neto e pela Testemunha Sigilosa 01, os quais atestam que, mesmo após a prisão de ROSTAND, a organização criminosa permaneceu ativa e em pleno funcionamento, com o recolhimento da “taxa de segurança” sendo assumido por seu filho, ROSTAND JÚNIOR. As testemunhas declararam que inclusive houve incremento na taxa depois da prisão de ROSTAND. Tais declarações, que coincidem com os dados colhidos em diligências e interceptações, demonstram que os recorridos, entre eles JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, EDMILSON SILVA DE LIMA, APRÍGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA E ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, mantiveram atuação ativa no esquema, exercendo patrulhamento ostensivo e promovendo o ambiente de coação necessário para assegurar o pagamento das taxas extorsivas. Conforme afirmou a Testemunha Sigilosa nº 01, esses recorridos atuavam visivelmente como agentes armados de intimidação em favor do ex-parlamentar, reforçando o domínio territorial da organização. Esse cenário de continuidade operacional após a prisão de um dos líderes, com redistribuição de funções e fortalecimento da coação sobre a população local, corrobora a imprescindibilidade da prisão preventiva como medida de proteção à ordem pública e de efetiva contenção da engrenagem criminosa em funcionamento. Essa substituição direta, longe de representar uma simples continuidade pontual, revela a existência de uma estrutura hierarquizada, funcional e estável, cuja lógica de comando opera de forma autônoma e resistente às medidas repressivas do Estado. A manutenção do esquema extorsivo mesmo após a prisão de seu principal líder demonstra que a liberdade dos demais integrantes permite o prosseguimento das atividades criminosas e, mais grave, assegura que, mesmo em caso de eventual condenação, a pena possa ser esvaziada em sua eficácia prática, seja por fugas organizadas, seja por coações e manipulações que comprometam a execução penal. É notório, também, que o grupo possui forte base territorial, domínio de logística, capacidade de evasão e até supostos vínculos com agentes públicos, o que reforça o risco de frustração futura do cumprimento da lei penal, inclusive no tocante à própria localização dos investigados, à ocultação de bens, ou à manipulação de dados e testemunhas. Nessa perspectiva, a prisão preventiva não é antecipação de pena, mas instrumento indispensável à garantia de que a jurisdição penal poderá produzir seus efeitos concretos no tempo certo e com segurança, sem que o aparato estatal seja continuamente burlado ou neutralizado por estruturas criminosas que operam de forma resiliente e deliberadamente organizada. A título ilustrativo, em diálogo interceptado em 28/07/2020 entre GEORGE e ROSTAND, evidencia-se o papel de liderança deste último no núcleo extorsivo estruturado no âmbito comunitário, sendo instado por seu interlocutor a reafirmar sua autoridade frente aos “vigilantes”, em razão das crescentes reclamações dos moradores quanto à ausência da segurança prometida. George o exorta a "impor sua moral", relembrando que "quem fundou foi você", e destaca a necessidade de reorganizar os subordinados, sob pena de perder o domínio do esquema que lhe é atribuído como idealizador. O conteúdo do diálogo expõe, com crueza, a lógica interna de funcionamento da organização, pautada em coerção, controle de território e manipulação da base social beneficiada – ou vitimada – pelas atividades do grupo. Essa dinâmica fática corrobora a tese de que a manutenção da liberdade dos demais integrantes – ainda que o suposto líder tenha sido preso – representa grave risco à ordem pública, à eficácia da persecução penal e, mais ainda, à própria aplicação da lei penal. O teor da conversa demonstra não só a resiliência da engrenagem criminosa, mas também seu alto grau de capilaridade, influência territorial e capacidade de reestruturação, mesmo diante de reveses pontuais. Soma-se a isso a existência de indicativos de conexões com agentes públicos, logística própria e forte capacidade de evasão, o que amplia o receio fundado de frustração do cumprimento da pena, seja por fugas organizadas, seja pela manipulação de provas, dados ou testemunhas. De mais a mais, em consulta ao PJe, verifiquei que alguns dos recorridos já foram condenados ou respondem ações penais, ratificando a periculosidade. EDMILSON DA SILVA DE LIMA é réu na ação penal nº 0051817-66.2023.8.17.2001, por infração ao art. 22, §1º, I, da Lei nº 13.869/2019, combinada com o art. 53 do Código Penal Militar, evidenciando conduta incompatível com a função pública e voltada ao abuso de poder. Adicionalmente, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO foi pronunciado nos autos da ação penal nº 0000036-47.2020.8.17.0760 pela prática de tentativa de homicídio qualificado (art. 121, §2º, I c/c art. 14, II, ambos do Código Penal), o que corrobora seu perfil agressivo e potencial ofensivo à segurança pública. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a existência de maus antecedentes, reincidência, atos infracionais pretéritos, inquéritos ou mesmo ações penais em curso denotam o risco de reiteração delitiva e constituem também fundamentação idônea a justificar a segregação cautelar (AgRg no HC n. 992.459/CE, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/5/2025, DJEN de 30/5/2025.) Cabe destacar também, que nos autos da ação penal n.º 738-42.2023.8.17.2100 foi expedido mandado de busca e apreensão para a residência de GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA gerando o auto de nº 0005722-42.2023.8.17.3370, o qual resultou na apreensão diversas armas de fogo, incluindo pistola, rifle, espingardas, centenas de munições de diferentes calibres, balaclavas, luvas, equipamentos táticos e uma jaqueta da guarda municipal, além de material explosivo e dispositivo óptico (luneta), compondo um arsenal bélico altamente suspeito e desproporcional, evidenciando o preparo para ações criminosas organizadas. Relaciono abaixo: 01 (uma) Pistola Taurus, modelo PT92, calibre 9mm, n° da arma: ABE632133, numero Sioa2,Calz0e az G99UAF N° 2145007): 01 (um) Rifle CBC, modelo 2020/903202069-08 (NIAF Nº 2145008); 01 (uma) espingarda CBC, modelo 651, calibre 9.1 longo, numero da arma: 174307 (NIAF Nº 2145018); 01 (um) cano da espingarda CBC, cal. 28, numero: 30582 (NIAF N° 2145010); 01 (um) cano da espingarda CBC, calibre não aparente, mas compatível com o cal. 36, numero: 54523 (NIAF Nº 2145011); 50 (cinquenta) munições calibre 9mm, sendo 49 munições da marca CBC e uma munição de marca não identificada, todas intactas; 02 (duas) cartelas intactas, com dez munições em cada uma, da marca CBC, calibre 9mm; 128 (cento e vinte e oito) munições CBC, calibre 22 LR, todas intactas; 30 (trinta) cartuchos metálicos, da marca CBC, calibre 9.1, sendo onze carregados e dezenove descarregados; 29 (vinte e nove) cartuchos da marca CBC, calibre 28, sendo vinte e sete cartuchos metálicos, dos quais treze são carregados e quatorze descarregados, e dois cartuchos de plásticos (cartuchos da praça), ambos intactos; 36 (trinta e seis) cartuchos da marca CBC, calibre 36, dos quais são trinta e dois cartuchos metálicos carregados e quatro cartuchos plásticos (cartuchos da praça), intactos; 03 (três) carregadores para o calibre 9mm, compatíveis para os modelos: PT92/99/917/917C; 03 (três) carregadores calibre não aparente, mas compatível para o calibre 9.1 - Rifle; 01 (uma) luneta HERO 6-24X50AOEG; 02 (duas) balaclavas, da cor preta; 01 (um) par de luvas; 01 (uma) jaqueta da guarda municipal de Recife/PE; 01 (uma) placa de veículo, com as seguintes letras e números: PFU9687; 03 (três) recipientes plásticos contendo pólvora; 02 (dois) recipientes plásticos contendo balinhas de chumbo: 01 (um) recipiente metálico contendo espoletas; 01 (um) aparelho celular IPHONE, da cor verde claro, IMEls: 352916111193646, 352916111113800 e 35291611119364. Tais elementos, considerados em seu conjunto, somam-se de forma eloquente à demonstração da periculosidade dos agentes individualmente e da organização criminosa como um todo. A existência de condenações, ações penais em curso, apreensão de armamento em poder dos denunciados e o modo sistemático de atuação delitiva revelam não apenas o risco concreto à ordem pública, mas a manutenção de uma estrutura miliciana organizada, violenta e intimidatória. Trata-se de um grupo que atua com divisão de tarefas, poder bélico e domínio territorial, impondo-se à comunidade por meio da coerção. A segregação cautelar, portanto, não se justifica apenas pelos delitos imputados, mas pela necessidade de desarticulação de um aparato criminoso que representa verdadeiro poder paralelo ao Estado. Por fim, com relação às alegações trazidas nas contrarrazoes dos recursos de ausência de contemporaneidade dos fundamentos do pedido preventiva o pleito, tais arrazoados não merecem acolhimento. A contemporaneidade da cautelar deve ser aferida não tomando por base apenas a data dos fatos investigados, mas, igualmente, levando em conta a permanência de elementos que indicam que os riscos aos bens que se buscam resguardar com sua aplicação ainda existem. Nessa senda, a gravidade da conduta aliada à periculosidade dos recorridos, integrantes de milícia privada, como destacado alhures, bem como o processamento da ação penal evidenciam a contemporaneidade da prisão. Neste sentido: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO QUALIFICADA, CÁRCERE PRIVADO E SEQUESTRO QUALIFICADO, ROUBO MAJORADO, DANO QUALIFICADO, CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA, INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, TORTURA E OBSTRUÇÃO DA JUSTIÇA. NEGATIVA DE AUTORIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. NECESSIDADE DE INTERRUPÇÃO DAS ATIVIDADES PELA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONTEMPORANEIDADE DA MEDIDA. NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - Para a decretação da custódia cautelar exigem-se indícios suficientes de autoria e não a sua prova cabal, o que somente poderá ser verificado em eventual decisum condenatório, após a devida instrução dos autos. II - As premissas fáticas firmadas nas instâncias ordinárias não podem ser modificadas na via estreita do mandamus. Dessarte, na hipótese, entender de modo contrário ao estabelecido pelo Tribunal a quo, quanto à existência de indícios de autoria para a preventiva, como pretende o agravante, demandaria o revolvimento, no presente mandamus, do material fático-probatório dos autos, o que é de todo inviável na via eleita. III - A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal. IV - No caso, observa-se que a segregação cautelar do ora agravante está devidamente fundamentada em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam de maneira inconteste a necessidade da prisão para garantia da ordem pública, notadamente em razão de, na condição de "Policial Militar lotado na segurança pessoal da família do então Presidente da ALE/RR, o investigado Jalser Renier, e membro do SISO" - Seção de Inteligência e Segurança Orgânica da Assembleia Legislativa, ter sido apontado como integrante de estruturada organização criminosa no âmbito da Assembleia Legislativa de Roraima, formada por policiais militares da ativa e aposentados. V - Segundo o decreto prisional, o agravante teria atuado de forma a embaraçar a investigação acerca dos crimes de sequestro e tortura praticados contra jornalista, cuja atuação profissional crítica desagradava o Deputado Jalser Renier. Conforme consignado no decisum, "quando a esposa do jornalista sequestrado foi à Polícia registrar o Boletim de Ocorrência, NADSON ficou todo tempo atrás dela, acompanhando o depoimento e digitando em seu celular, numa clara atitude intimidatória e se comunicando com os demais investigados sobre o que a vítima falava e se os implicaria, como já descrito acima; no dia em que NADSON teria recebido a intimação para depor sobre os fatos, foi até a casa da vítima, tirou uma foto e lhe enviou, numa clara ameaça velada, como assim foi interpretado pelo jornalista. Posteriormente se justificou dizendo que era amigo das vítimas e queria visitá-las, o que foi negado pelos ofendidos", circunstâncias que revelam a periculosidade concreta do agente e a imperiosidade da imposição da medida extrema ante a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa, no intuito de impedir a reiteração delitiva, bem como para conveniência da instrução criminal. VI - Consoante r. decisum objurgado, "trata-se de organização criminosa composta por policiais militares altamente treinados e perigosos que já tentaram embaraçar as investigações e estavam comandados por Deputado Estadual, que à época era Presidente do Poder Legislativo de Roraima", evidenciando a necessidade da medida constritiva para a conveniência da instrução criminal. VII - Ressalta-se que a presença de circunstâncias pessoais favoráveis não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese. Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. VIII - No que concerne à alegada ausência de contemporaneidade do decreto prisional, verifica-se que, embora os fatos tenham ocorrido em 26/10/2020 e a prisão temporária tenha sido decretada mais recentemente, em 16/9/2021, e convertida em preventiva em 3/10/2021, tenho que, na hipótese, não há que se falar em extemporaneidade do decreto, já que os indícios de autoria surgiram no decorrer da investigação e a prisão cautelar foi decretada tão logo reunidos elementos suficientes a demonstrar a necessidade da imposição da medida extrema. Feito o juízo de ponderação entre a medida imposta - restrição da liberdade de ir e vir - e os resultados que se buscam resguardar - garantia da ordem pública -, verifica-se que a determinação encontra-se em conformidade com a regra de proporcionalidade estrita. IX - Pontualmente, evidencia-se a contemporaneidade da medida, destinada à salvaguarda, por um lado, da ordem pública, ante a periculosidade do agente e, por outro e em reforço, à conveniência da instrução processual que, de outra maneira, estaria em risco pelas circunstâncias supramencionadas quanto à condição de policial militar, integrante da guarda pessoal do Deputado Estadual, de membro da SISO e pelas atitudes concretas de intimidação das vítimas. X - De mais a mais, a contemporaneidade da cautelar deve ser aferida não tomando por base apenas a data dos fatos investigados, mas, igualmente, levando em conta a permanência de elementos que indicam que os riscos aos bens que se buscam resguardar com sua aplicação ainda existem. Nesse sentido, a gravidade da conduta aliada à periculosidade do agravante, integrante de organização criminosa estruturada na sede do Parlamento estadual, como destacado alhures, bem como o processamento da ação penal (na fase instrutória) evidenciam a contemporaneidade da prisão. XI - É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 698.356/RR, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 23/11/2021, DJe de 26/11/2021.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E CORRUPÇÃO DE POLICIAIS. PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. TRANSPORTE DE TONELADAS DE ENTORPECENTE COM A CONIVÊNCIA DE POLICIAIS CIVIS. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA QUE REVELA ELEVADO GRAU DE PERICULOSIDADE DO PACIENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "O exame de contemporaneidade da custódia é feito não apenas com base no tempo entre os fatos e o decreto prisional, como também pela permanência da cautelaridade ensejadora da medida" (HC n. 938.032/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/12/2024, DJEN de 23/12/2024). 2. A prisão foi decretada em decorrência do modus operandi empregado na conduta delitiva, revelador da periculosidade do paciente, consistente na prática, em tese, de tráfico interestadual de vultosa quantidade de droga (16t de maconha), realizado em concurso de agentes que, inclusive, integram o quadro policial civil do Estado do Rio de Janeiro, tendo estes apreendido caminhão na Via Dutra contendo drogas, deixando, contudo, de lavrar o respectivo APF e viabilizando, dias depois, a entrega de tal material ilícito a traficantes. 3. "A gravidade concreta da conduta, reveladora do potencial elevado grau de periculosidade do agente e consubstanciada na alta reprovabilidade do modus operandi empregado na empreitada delitiva, é fundamento idôneo a lastrear a prisão preventiva, com o intuito de preservar a ordem pública" (AgRg no HC n. 687.840/MS, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022). 4. "A necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva" (STF, Primeira Turma, HC n. 95.024/SP, relatora Ministra Cármen Lúcia, DJe de 20/2/2009). 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 951.323/RJ, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 28/5/2025, DJEN de 3/6/2025.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA DEFESA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. GRAVIDADE CONCRETA DOS FATOS. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE DROGAS. NECESSIDADE DE RESGUARDAR A ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. CONTEMPORANEIDADE DA MEDIDA. 1. Em relação à alegação de ausência de intimação da defesa para impugnação do requerimento de prisão preventiva pelo Ministério Público, observa-se que a matéria não foi objeto de análise pelo Tribunal de origem, o que impede o exame inaugural nesta Corte Superior, sob pena de indevida supressão de instância. 2. A prisão preventiva foi devidamente fundamentada mediante análise particularizada da situação fática dos autos, amparando-se na especial gravidade do delito, evidenciada pelas circunstâncias da prisão em flagrante - transporte de 25 kg de cocaína, de forma organizada -, o que justifica a custódia cautelar como medida necessária à preservação da ordem pública. 3. Consoante a orientação desta Corte Superior, não há falar em ausência de contemporaneidade da prisão preventiva, quando o que se investiga é a atuação de integrantes em uma organização criminosa. Precedente. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 898.757/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/5/2025, DJEN de 30/5/2025.) Em igual sentido, “[a] contemporaneidade da prisão preventiva refere-se aos motivos que a fundamentam, e não ao momento da prática delitiva. Portanto, o decurso do tempo é irrelevante se os motivos que justificam a custódia cautelar ainda” (AgRg no RHC n. 207.690/RS, relator Ministro persistem, como no caso em análise Og Fernandes, Sexta Turma, julgado DJEN de 19/2/2025). Aplicando-se tais fundamentos ao caso concreto, resta evidente que a contemporaneidade da prisão preventiva dos recorridos não se encontra prejudicada. Os fatos investigados decorrem de atuação miliciana organizada e sistemática, na qual os réus — incluindo agentes públicos armados — impunham, mediante intimidação, a cobrança de “taxas de proteção” a comerciantes locais, conforme fartamente demonstrado por documentos, depoimentos e apreensões constantes nos autos. A atuação da organização criminosa não se limita a um episódio pretérito e isolado, mas revela padrão de comportamento reiterado e estruturado ao longo do tempo, com divisão de tarefas, uso de armas de fogo e domínio territorial. O caso em tela revela, portanto, não apenas crimes de natureza grave, mas a persistência de uma dinâmica criminosa que continua a ameaçar diretamente a ordem pública. Além disso, os recorridos, conforme consulta ao PJe, respondem a outras ações penais ou já foram condenados por crimes igualmente graves, como porte ilegal de arma de fogo, tentativa de homicídio, abuso de autoridade e infrações militares, corroborando o grau de periculosidade do grupo e a probabilidade concreta de reiteração delitiva. A apreensão recente de arsenal bélico em poder de um dos denunciados, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, demonstra, de maneira objetiva, que a organização criminosa ainda mantém estrutura material voltada à prática de crimes e à intimidação da população local. Esses elementos confirmam que os riscos à ordem pública permanecem presentes, justificando a necessidade da segregação cautelar. Diante do exposto, evidenciada a gravidade concreta dos fatos imputados, a periculosidade dos recorridos e a permanência de riscos reais e atuais à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA de JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA com fundamento nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal. Expeçam-se os competentes mandados de prisão preventiva em desfavor dos referidos recorridos, com cumprimento prioritário pelas autoridades policiais, devendo ser promovidas, se necessário, diligências para localização e captura imediata dos acusados. Comunique-se às autoridades de segurança pública, inclusive à Polícia e à Corregedoria das corporações eventualmente envolvidas, para fins de ciência e apoio à execução da ordem judicial. Determino, ainda, a imediata comunicação deste julgamento ao Juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima/PE, a fim de que tome ciência do teor desta decisão e adote as providências cabíveis no âmbito de sua competência. Por fim, registro que, conforme consta dos autos, o juízo processante designou, em 03 de julho de 2025, a realização de audiência de instrução para os dias 11 e 18 de setembro do corrente ano, oportunidade na qual poderão surgir novos elementos de prova que venham a reforçar, complementar ou, a qualquer tempo, reavaliar a necessidade da manutenção das prisões preventivas ora analisadas, nos termos do artigo 316 do Código de Processo Penal. Publique-se. Cumpra-se. Intimem-se. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Mauro Alencar de Barros Relator Demais votos: Ementa: Proclamação da decisão: À unanimidade de votos, deu-se provimento ao recurso sentido estrito, diante do exposto, evidenciada a gravidade concreta dos fatos imputados, a periculosidade dos recorridos e a permanência de riscos reais e atuais à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA de JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA com fundamento nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal. Expeçam-se os competentes mandados de prisão preventiva em desfavor dos referidos recorridos, com cumprimento prioritário pelas autoridades policiais, devendo ser promovidas, se necessário, diligências para localização e captura imediata dos acusados. Tudo nos termos do voto da Relatoria. Magistrados: [MAURO ALENCAR DE BARROS, ISAIAS ANDRADE LINS NETO, EVANDRO SERGIO NETTO DE MAGALHAES MELO] RECIFE, 10 de julho de 2025 Magistrado

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