Processo nº 0005447-62.2024.8.17.9480
ID: 292141479
Tribunal: TJPE
Órgão: Gabinete do Des. Evio Marques da Silva 2ª TCRC
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 0005447-62.2024.8.17.9480
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Segunda Turma da Câmara Regional de Caruaru Rua Frei Caneca, s/n, Maurício de Nassau, CARUARU - PE - CEP: 55012-330 - F:( ) Processo nº 0005447-62.2…
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Segunda Turma da Câmara Regional de Caruaru Rua Frei Caneca, s/n, Maurício de Nassau, CARUARU - PE - CEP: 55012-330 - F:( ) Processo nº 0005447-62.2024.8.17.9480 PACIENTE: ERLAN BEZERRA DE AZEVEDO AUTORIDADE COATORA: 4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE GARANHUNS, 4º PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL DE GARANHUNS, 2º PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL DE GARANHUNS, 5º PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL DE GARANHUNS, 3º PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL DE GARANHUNS INTEIRO TEOR Relator: EVANILDO COELHO DE ARAUJO FILHO Relatório: 1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA Habeas Corpus nº 0005447-62.2024.8.17.9480 Impetrante: Carlos Eduardo Barros Machado (OAB/PE nº 36.342) Paciente: Erlan Bezerra de Azevedo Autoridade impetrada: Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns Processo de origem: Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021 Relator em Substituição: Des. Evanildo Coelho de Araújo Filho RELATÓRIO Trata-se de Habeas Corpus impetrado por Carlos Eduardo Barros Machado (OAB/PE nº 36.342), em favor do paciente Erlan Bezerra de Azevedo, contra ato coator emanado do Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns, alegando a existência de constrangimento ilegal praticado no bojo do Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021. Relata o impetrante, em síntese, que a autoridade coatora instaurou procedimento de investigação criminal a partir de notícia de fato registrada junto ao Ministério Público Federal em 10/12/2019, autuada sob o nº NF - 1.26.005.000321/2019-11, na qual se noticiou a suposta prática de lavagem de dinheiro e fraude a credores pelo paciente. Aduz que, após declínio de atribuição pelo Ministério Público Federal em 14/2/2020, a Notícia de Fato foi recebida pela Central de Inquéritos da Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns em 13/3/2020, sendo autuada apenas em 18/5/2020. Sustenta que, não obstante o Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (GAECO) tenha elaborado relatório técnico afirmando inexistir fato que justificasse sua intervenção, somente em 30/4/2021 a autoridade coatora baixou portaria de instauração do Procedimento de Investigação Criminal (PIC), o qual perdura até o presente momento sem conclusão, mediante sucessivas prorrogações desprovidas de fundamentação idônea. Alega o impetrante que o procedimento investigatório se arrasta por aproximadamente 05 (cinco) anos desde a notícia de fato originária, em manifesta violação ao princípio constitucional da duração razoável do processo. Argumenta que a investigação não demandaria complexidade apta a justificar o prolongamento excessivo, porquanto bastaria a análise dos relatórios apresentados pelo administrador judicial da empresa Farmácia do Trabalhador do Brasil, confrontando-os com os dados da Farmácia Popular Brasileira. Sustenta, ademais, que a própria autoridade coatora não conseguiu precisar qual seria o tipo penal imputável ao paciente, mencionando os artigos 168, 171 ou 172, todos da Lei nº 11.101/2005, o que evidenciaria a inexistência de lastro probatório mínimo para subsidiar eventual denúncia. Invoca precedentes do Superior Tribunal de Justiça que reconhecem a impossibilidade de submissão indefinida de investigados a procedimentos inquisitivos, notadamente quando as diligências não resultam em elementos suficientes para justificativa da continuidade da persecução penal. Requer, no mérito, a concessão da ordem para que seja reconhecido o excesso de prazo na investigação, determinando-se o imediato trancamento do Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021. Foram anexados documentos, incluindo cópias da Notícia de Fato originária, da portaria de instauração do PIC e das sucessivas prorrogações procedidas pela autoridade coatora. Não houve pleito liminar fundamentado. Na sequência, os autos foram encaminhados à Procuradoria de Justiça que, em fundamentado Parecer, opinou pela denegação da ordem, sustentando que o caso apresenta elevado grau de complexidade, envolvendo possível prática de lavagem de capitais e movimentação patrimonial empresarial, com indícios de participação de múltiplos agentes, a demandar cooperação entre diferentes órgãos ministeriais. Destacou, ainda, que as sucessivas declarações de suspeição por parte de membros do Ministério Público que atuaram no feito, embora tenham contribuído para a dilação temporal, não evidenciam inércia institucional injustificada nem configuram constrangimento ilegal. É o que importa relatar. Não houve pedido expresso de sustentação oral. Caruaru, data da assinatura eletrônica. Evanildo Coelho de Araújo Filho Desembargador em substituição Voto vencedor: 1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA Habeas Corpus nº 0005447-62.2024.8.17.9480 Impetrante: Carlos Eduardo Barros Machado (OAB/PE nº 36.342) Paciente: Erlan Bezerra de Azevedo Autoridade impetrada: Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns Processo de origem: Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021 Relator em Substituição: Des. Evanildo Coelho de Araújo Filho VOTO DO RELATOR Eminentes Pares, Trata-se de Habeas Corpus impetrado por Carlos Eduardo Barros Machado, advogado inscrito na OAB/PE sob o nº 36.342, em favor de ERLAN BEZERRA DE AZEVEDO, contra ato coator do Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns, que mantém o paciente sob investigação no Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021. Inicialmente, examino a admissibilidade do writ. O habeas corpus constitui garantia constitucional fundamental, prevista no art. 5º, LXVIII, da Carta Magna, concedida sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de locomoção. Conforme consolidado na jurisprudência pátria, o remédio constitucional mostra-se adequado para impugnar procedimentos investigativos que perdurem por tempo excessivo, quando evidenciada flagrante ilegalidade. No caso sub examine, o impetrante sustenta a ocorrência de constrangimento ilegal decorrente de excesso de prazo na condução do Procedimento de Investigação Criminal, que tramita há aproximadamente 5 (cinco) anos sem conclusão, configurando violação ao princípio constitucional da duração razoável do processo, insculpido no art. 5º, LXXVIII, da Carta Magna. Passo, então, à análise do mérito. O cerne da controvérsia reside na aferição da existência, ou não, de constrangimento ilegal decorrente do alegado excesso de prazo na conclusão do procedimento investigatório. É consabido que a aferição do excesso de prazo exige observância da garantia constitucional da duração razoável do processo, insculpida no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal. Tal norma consagra o direito fundamental de toda pessoa a um processo sem dilações indevidas, evidenciando que o tempo não pode constituir fator de corrosão dos direitos fundamentais. Não obstante, a jurisprudência dos Tribunais Superiores, sedimentada inclusive na Súmula 84 deste Egrégio Tribunal de Justiça ("Os prazos processuais na instrução criminal não são peremptórios"), consolidou o entendimento de que os prazos procedimentais na seara criminal não são absolutos, admitindo flexibilização conforme as peculiaridades de cada caso concreto. Assim, para a adequada apreciação de eventuais excessos temporais, faz-se necessário perquirir elementos como a complexidade do feito, a pluralidade de investigados, a necessidade de diligências específicas, a natureza dos delitos apurados, a intervenção da defesa e, notadamente, a existência de justificativa idônea para eventual dilação. Compulsando detidamente os autos, verifico que o Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021 teve origem em notícia de fato criminal registrada perante o Ministério Público Federal em 10/12/2019, autuada sob o nº NF - 1.26.005.000321/2019-11, na qual se noticiou a suposta prática de lavagem de dinheiro e fraude a credores. Após declínio de atribuição pelo Parquet Federal, a notícia de fato foi recebida pela Central de Inquéritos da Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns em 13/03/2020, sendo autuada em 18/05/2020. Somente em 30/04/2021, foi baixada a portaria de instauração do respectivo Procedimento de Investigação Criminal. O impetrante argumenta que, desde então, a investigação se arrasta sem que haja sinalização de conclusão do PIC ou formação da opinio delicti, submetendo o paciente a constrangimento ilegal por tempo indeterminado. Sustenta, ainda, que a simplicidade da matéria investigada não justificaria tamanha delonga, bastando a análise dos relatórios apresentados pelo administrador judicial para a formação da convicção ministerial. Contudo, em análise aprofundada dos elementos constantes dos autos, depreendo que o caso concreto ostenta grau de complexidade significativamente superior àquele sugestionado pelo impetrante. Diversos fatores evidenciam tal complexidade, conforme passo a expor. Primeiramente, observo que a investigação tem origem no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), unidade especializada do Ministério Público voltada ao enfrentamento de estruturas delituosas organizadas, o que, por si só, evidencia que a apuração extrapola a singeleza dos delitos comuns. Em segundo lugar, verifica-se que o objeto investigado envolve possíveis práticas de lavagem de capitais e dissimulada movimentação patrimonial empresarial, com indícios de participação de múltiplos agentes e articulações de cunho transnacional ou interjurisdicional, exigindo diligências complexas e análises técnicas especializadas. Ademais, os documentos constantes nos autos demonstram que o Ministério Público do Estado de Pernambuco (MPE) não atua de maneira isolada, mas em conjunto com o Ministério Público Federal (MPF) e com o Ministério Público do Trabalho (MPT), em virtude de possíveis repercussões trabalhistas nas estruturas societárias sob investigação. Tal cooperação interinstitucional naturalmente demanda maior articulação e tempo, com tramitação de informações entre esferas distintas, cada qual com regramentos próprios e logística operacional específica. Outro fator relevante que justifica a dilação temporal é o elevado número de declarações de suspeição registradas no bojo do procedimento, notadamente por parte de membros do Ministério Público estadual, o que gerou necessidade de redistribuição sucessiva da condução do feito entre as Promotorias de Justiça Criminais de Garanhuns. As sucessivas declarações de suspeição apresentadas por diversos membros do Ministério Público Estadual que, em algum momento, foram designados para atuar no âmbito do procedimento investigatório, longe de constituírem causa de nulidade ou argumento favorável à tese de desídia institucional, representam salutar manifestação de zelo ético e compromisso funcional, fundadas no art. 43, inciso VII, da Lei nº 8.625/1993, combinado com o art. 254, I, do Código de Processo Penal. Outrossim, observo que o objeto da investigação recai sobre movimentações financeiras vinculadas à Farmácia do Trabalhador do Brasil, estabelecimento empresarial que, segundo os indícios colhidos, poderia servir de fachada para práticas delituosas, exigindo análise contábil minuciosa, rastreamento de ativos, confrontação de relatórios fiscais, apuração de possível sonegação tributária e requisição de dados bancários – diligências que demandam tempo, cooperação técnica e intercâmbio entre órgãos de controle externo e interno. Extrai-se, portanto, que a pluralidade de promotores atuantes, a alternância de condução ministerial, a amplitude do objeto investigado, a presença de múltiplas esferas ministeriais e a complexidade intrínseca dos fatos investigados afastam por completo a tese de constrangimento ilegal por morosidade. Nesse sentido, calha invocar a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, que, ao analisar situações semelhantes, tem reiteradamente reconhecido que o prazo para a conclusão de investigações envolvendo suspeito não submetido à custódia cautelar detém natureza imprópria, admitindo flexibilização conforme as peculiaridades do caso concreto (AgRg no AREsp n. 2.569.029/MG, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 19/2/2025, DJEN de 24/2/2025.). No caso em apreço, a complexidade do objeto investigado, as circunstâncias específicas da investigação e as intercorrências procedimentais justificam o tempo decorrido, não se vislumbrando, até o presente momento, dilação temporal desarrazoada ou desproporcional capaz de caracterizar constrangimento ilegal. Ademais, é imperioso registrar que o trancamento de inquérito policial ou procedimento investigatório criminal constitui medida excepcional, somente admitida quando manifesta a atipicidade da conduta, presente causa extintiva de punibilidade ou ausentes indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas. A propósito, no recente julgamento do RHC n. 184.104/SP, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou a natureza imprópria do prazo para conclusão de investigação envolvendo suspeito não submetido à custódia cautelar: "DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. DEMORA NA CONCLUSÃO DAS INVESTIGAÇÕES. COMPLEXIDADE DO FEITO. RÉU SOLTO. PRAZO LEGAL IMPRÓPRIO. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. RECURSO DESPROVIDO. [...] 5. O prazo para a conclusão do inquérito policial em casos de investigado solto é impróprio, podendo ser prorrogado, principalmente quando há justificativa pela complexidade das diligências. A jurisprudência desta Corte entende que, em tais casos, não há violação ao princípio da razoável duração do processo. [...] (RHC n. 184.104/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 12/2/2025, DJEN de 17/2/2025.)" Por conseguinte, no caso concreto, não vislumbro a excepcionalidade necessária à concessão da ordem de trancamento do procedimento investigatório, uma vez que não restou demonstrada, de plano, a atipicidade da conduta investigada, a presença de causa extintiva de punibilidade ou a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade. Ao contrário, os elementos constantes dos autos indicam a presença de indícios suficientes da materialidade dos delitos investigados e de sua autoria, bem como a regularidade formal do procedimento, que se desenvolve, ainda que de forma não célere, sem paralisações injustificáveis ou desídias procedimentais inexplicáveis. Outrossim, é preciso consignar que o paciente não se encontra submetido a qualquer medida cautelar restritiva de liberdade, figurando apenas na condição de investigado em procedimento investigatório criminal. Embora tal condição possa, em tese, acarretar certos desconfortos de ordem moral, tais circunstâncias não se equiparam à gravidade da restrição à liberdade de locomoção, objeto precípuo da tutela do habeas corpus. Destarte, considero que o impetrante não logrou êxito em demonstrar, de forma inequívoca, o constrangimento ilegal alegado, ônus que lhe incumbia, consoante pacífica jurisprudência desta Corte, cristalizada na Súmula 80/TJPE, segundo a qual "O habeas corpus é incompatível com o revolvimento fático-probatório". Ante o exposto, voto pela DENEGAÇÃO DA ORDEM, por não vislumbrar o constrangimento ilegal apontado pelo impetrante. É como voto. Caruaru, data da assinatura eletrônica. Evanildo Coelho de Araújo Filho Desembargador Relator Demais votos: CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA HABEAS CORPUS Nº 0005447-62.2024.8.17.9480 IMPETRANTE: Carlos Eduardo Barros Machado (OAB/PE nº 36.342) PACIENTE: Erlan Bezerra de Azevedo AUTORIDADE COATORA: Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns PROCESSO DE ORIGEM: Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021 RELATOR: Des. Evanildo Coelho de Araújo Filho VOTO VISTA Trata-se de Habeas Corpus impetrado por Carlos Eduardo Barros Machado (OAB/PE nº 36.342), em favor de Erlan Bezerra de Azevedo, apontando como autoridade coatora o Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns, que mantém o paciente sob investigação no âmbito do Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021, iniciado a partir de notícia de fato oriunda do Ministério Público Federal, envolvendo supostas práticas de lavagem de dinheiro e fraude a credores. Alega o impetrante, em suma, que a investigação tramita há quase cinco anos sem conclusão, sendo marcada por sucessivas prorrogações desprovidas de fundamentação concreta, configurando, segundo sustenta, ofensa ao princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), com consequente constrangimento ilegal à liberdade do paciente. Requer, assim, a concessão da ordem para reconhecimento do excesso de prazo e consequente trancamento do procedimento investigatório. O eminente relator, Desembargador Evanildo Coelho de Araújo Filho, votou pela denegação da ordem, fundamentando sua decisão na complexidade do caso, que envolve possíveis práticas de lavagem de capitais e dissimulada movimentação patrimonial empresarial, com atuação conjunta de diferentes ramos do Ministério Público (MPE, MPF e MPT). Destacou, ainda, o elevado número de declarações de suspeição por membros do Parquet estadual e a necessidade de análise contábil minuciosa, rastreamento de ativos e outras diligências técnicas específicas, circunstâncias que, no seu entender, justificariam a dilação temporal do procedimento investigatório. Ressaltou, igualmente, que o paciente não se encontra submetido a qualquer medida cautelar restritiva de liberdade e que o trancamento de procedimento investigatório constitui medida excepcional, somente admissível quando manifesta a atipicidade da conduta, presente causa extintiva de punibilidade ou ausentes indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas. Eis, em síntese, o relatório. Passo a tecer meu voto. Da competência para apreciação do presente Habeas Corpus Preliminarmente, reconheço a competência desta 2ª Turma da Câmara Regional de Caruaru para apreciação do presente Habeas Corpus, tendo em vista o disposto no Regimento Interno deste Tribunal de Justiça, especificamente no art. 77, alínea "b", combinado com o art. 79, que estabelecem a competência das Câmaras Criminais para julgamento de habeas corpus em causa de natureza penal quando a autoridade coatora for membro do Ministério Público Estadual com atuação no primeiro grau. In casu, figurando como autoridade coatora o Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns, inequívoca a competência desta Turma para processamento e julgamento do writ. Do mérito No mérito, após acurada análise dos argumentos expendidos pelo impetrante e das razões expostas pelo distinto Relator, manifesto minha convergência quanto à conclusão adotada, notadamente pela ausência de constrangimento ilegal a justificar o trancamento do procedimento investigatório. Com efeito, o exame dos elementos constantes dos autos evidencia a complexidade da investigação, que extrapola os contornos de uma apuração ordinária, com indicativos de fraude empresarial, movimentações financeiras atípicas e possível envolvimento de múltiplos agentes, exigindo diligências técnicas e cooperação institucional entre diferentes órgãos ministeriais. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, com acerto invocada pelo Relator, tem reiteradamente reconhecido que o prazo para conclusão de investigações envolvendo suspeito não submetido à custódia cautelar detém natureza imprópria, admitindo flexibilização conforme as peculiaridades do caso concreto. No presente caso, a complexidade do objeto investigado, as sucessivas declarações de suspeição por parte de membros do Ministério Público e a necessidade de diligências técnicas específicas constituem justificativa idônea para a dilação temporal verificada, afastando a caracterização do constrangimento ilegal alegado. Destarte, alinho-me ao entendimento manifestado pelo Desembargador Relator quanto à impossibilidade de acolhimento do pedido de trancamento do procedimento investigatório, medida que, como bem pontuado, possui caráter excepcional, somente admissível nas hipóteses de manifesta atipicidade da conduta, presença de causa extintiva de punibilidade ou ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas. Da instauração de Procedimento Investigatório pelo Ministério Público Não obstante a convergência quanto à conclusão adotada pelo eminente Relator, há um ponto que, embora não afronte diretamente o mérito do voto exposto, exige providência de ofício, diante de seu caráter cogente: a necessidade de observância dos requisitos para instauração e desenvolvimento de investigações criminais pelo Ministério Público, à luz da recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento conjunto das ADIs 2.943/DF, 3.309/DF e 3.318/MG. Em sessão plenária realizada em 02/05/2024, sob a relatoria do Ministro Edson Fachin (Info 1135), o Pretório Excelso, reafirmando a atribuição constitucional do Ministério Público para conduzir investigações criminais de forma autônoma, delimitou balizas essenciais para o exercício dessa atividade, com vistas à harmonização entre a atuação ministerial e as garantias fundamentais do investigado, sob a perspectiva do devido processo legal e da reserva de jurisdição. Ficou assentado, em especial, que: "O Ministério Público dispõe de atribuição concorrente para promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado. [...] A realização de investigações criminais pelo Ministério Público tem por exigência: (i) comunicação imediata ao juiz competente sobre a instauração e o encerramento de procedimento investigatório, com o devido registro e distribuição; (ii) observância dos mesmos prazos e regramentos previstos para conclusão de inquéritos policiais; (iii) necessidade de autorização judicial para eventuais prorrogações de prazo, sendo vedadas renovações desproporcionais ou imotivadas." (STF, ADIs 2.943, 3.309 e 3.318, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 02/05/2024) Como se vê, as diretrizes estabelecidas no julgado impõem ao Ministério Público, não obstante sua autonomia constitucional, requisitos objetivos de submissão ao controle jurisdicional quanto à legalidade, razoabilidade e temporalidade das investigações conduzidas diretamente por seus membros. Tais parâmetros, de observância obrigatória em âmbito nacional por força do efeito vinculante e eficácia erga omnes das decisões proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade, visam assegurar tanto a higidez da persecução penal quanto a proteção dos investigados contra eventuais excessos. Vale registrar que a matéria se encontra regulamentada pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP através de resoluções específicas que detalham os procedimentos para investigações criminais conduzidas diretamente pelos membros do Parquet. A Resolução CNMP nº 181/2017, posteriormente alterada pela Resolução CNMP nº 289/2024, dispõe sobre instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público, estabelecendo em seu art. 1º que "o procedimento investigatório criminal é instrumento sumário e desburocratizado de natureza administrativa e investigatória, instaurado e presidido pelo membro do Ministério Público com atribuição criminal". Relevante destacar que a Resolução CNMP nº 289/2024 adequou a normatização anterior à Lei Federal nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), considerando "a sistemática criada pela Lei nº 13.964, de 2019, que, em estrita obediência ao sistema acusatório, não mais prevê a participação do juiz no organograma da promoção de arquivamento do inquérito policial, termo circunstanciado, procedimento investigatório criminal ou peças de informação". No que concerne especificamente aos prazos investigativos, o art. 13 da Resolução CNMP nº 181/2017 estabelece que "o procedimento investigatório criminal deverá ser concluído no prazo de 90 (noventa) dias, permitidas, por igual período, prorrogações sucessivas, por decisão fundamentada do membro do Ministério Público responsável pela sua condução". Além disso, a Portaria nº 291/2017 da Corregedoria Nacional do Ministério Público, para fins de orientação da atividade executiva de Correição e Inspeção, adotou como parâmetro "o prazo de 3 (três) anos de duração dos procedimentos administrativos de natureza investigatória". Como se vê de sua própria redação, trata-se de parâmetros meramente orientativos, não constituindo prazo peremptório. A flexibilização temporal mostra-se justificada quando presentes circunstâncias excepcionais que demandem diligências específicas para adequada elucidação dos fatos, como no caso em exame. Por fim, corroborando a imperatividade do cumprimento das diretrizes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal, o então Procurador-Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, Dr. Marcos Antônio Matos de Carvalho, expediu o Aviso PGJ nº 047/2023, de 30 de novembro de 2023, comunicando "a todos os Membros do Ministério Público do Estado de Pernambuco acerca da necessidade do cumprimento integral da referida decisão da Suprema Corte, encaminhando 'todos os PICs e outros procedimentos de investigação criminal, mesmo que tenham outra denominação, ao respectivo juiz natural, para conhecimento, independentemente de o juiz das garantias ter sido implementado na respectiva jurisdição'". Tal comunicado, expedido pela mais alta autoridade ministerial estadual, reforça o caráter cogente das determinações do Pretório Excelso e a necessidade de imediata adequação dos procedimentos investigativos aos novos parâmetros constitucionais estabelecidos. Do caso concreto No caso sob exame, embora reconhecida a complexidade do objeto investigado, não se vislumbra o cumprimento das exigências fundamentais estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal. A portaria de instauração do Procedimento de Investigação Criminal não foi submetida à comunicação ao juízo competente, tampouco as sucessivas prorrogações foram objeto de autorização judicial, em manifesta dissonância com os parâmetros recentemente estabelecidos pelo Pretório Excelso. Essa omissão, embora não caracterize, per se, constrangimento ilegal apto a determinar o trancamento do procedimento investigatório - especialmente considerando que o julgamento das ADIs é posterior à instauração do PIC em questão -, demanda correção ex officio para regularização da atividade persecutória. Impõe-se, portanto, a determinação de comunicação imediata ao juízo competente, com o devido registro e distribuição, bem como a submissão de eventuais prorrogações à apreciação judicial. Tal providência, além de harmonizar o procedimento investigatório com os parâmetros estabelecidos pela Suprema Corte, viabilizará o efetivo controle da razoabilidade temporal da investigação, evitando perpetuação indevida do procedimento e possibilitando, se for o caso, a adoção de providências judiciais que assegurem seu regular desenvolvimento e tempestiva conclusão, equilibrando, assim, o poder investigatório do Parquet com as garantias fundamentais do investigado. Da conclusão Ante o exposto, acompanho o voto do eminente Relator para DENEGAR A ORDEM pleiteada, por não vislumbrar o constrangimento ilegal apontado pelo impetrante. Todavia, nos termos do art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, que autoriza a concessão de habeas corpus de ofício quando o tribunal ou o juiz verificar que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal, DETERMINO, EX OFFICIO, que a autoridade coatora adote as seguintes providências: a) promova a imediata comunicação ao juízo competente sobre o procedimento investigatório em curso, com o devido registro e distribuição; b) a partir de então, observe os mesmos prazos e regramentos previstos no Código de Processo Penal para a conclusão dos inquéritos policiais; c) solicite autorização judicial para eventual prorrogação de prazo investigatório, de modo a evitar renovações indefinidas, desproporcionais ou imotivadas. Determino, ainda, a expedição de ofício ao Procurador-Geral de Justiça do Estado de Pernambuco para: a) ciência formal do conteúdo da presente decisão e do trâmite do Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021; b) adoção das providências cabíveis no âmbito de suas atribuições, visando à adequação do procedimento investigatório em questão aos parâmetros estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal; e c) considerando o elevado número de declarações de suspeição por membros do Ministério Público que têm retardado o regular desenvolvimento das investigações, avalie a designação, com a brevidade que o caso requer, de Promotor de Justiça com a devida atribuição para atuar especificamente no procedimento investigatório sob análise, garantindo-se assim a continuidade e celeridade das apurações em curso, sem prejuízo do devido processo legal e das garantias fundamentais do investigado. É como voto. Caruaru, data da assinatura eletrônica. Paulo Augusto de Freitas Oliveira Desembargador Relator P09 Ementa: Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des. Evio Marques da Silva 2ª TCRC Rua Frei Caneca, s/n, Maurício de Nassau, CARUARU - PE - CEP: 55012-330 - F:( ) CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA HABEAS CORPUS Nº 0005447-62.2024.8.17.9480 Juízo de origem: Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021 Paciente: Erlan Bezerra de Azevedo Autoridade Coatora: Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns Relator: Des. Evanildo Coelho de Araújo Filho EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO E FRAUDE A CREDORES. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PEDIDO DE TRANCAMENTO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL POR EXCESSO DE PRAZO. PROCEDIMENTO EM TRAMITAÇÃO HÁ APROXIMADAMENTE 5 ANOS. PACIENTE EM LIBERDADE. PRAZO IMPRÓPRIO PARA CONCLUSÃO DA INVESTIGAÇÃO. COMPLEXIDADE DO CASO. JUSTIFICATIVA PARA A DILAÇÃO TEMPORAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA COM DETERMINAÇÕES EX OFFICIO. I. Caso em exame 1. Trata-se de Habeas Corpus impetrado contra ato do Representante do Ministério Público da 4ª Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns que mantém o paciente sob investigação no Procedimento de Investigação Criminal nº 02084.000.003/2021, iniciado há aproximadamente 5 anos, para apuração dos crimes de lavagem de dinheiro e fraude a credores. II. Questão em discussão 2. A questão central consiste em verificar a existência de constrangimento ilegal por excesso de prazo na conclusão do procedimento investigatório criminal. III. Razões de decidir 3. O procedimento investigatório teve origem em notícia de fato criminal registrada perante o Ministério Público Federal em 10/12/2019, após declínio de atribuição recebida pela Promotoria de Justiça Criminal de Garanhuns em 13/03/2020, com portaria de instauração do PIC em 30/04/2021. 4. A investigação apresenta complexidade evidenciada pela origem no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) e pelo objeto que envolve possíveis práticas de lavagem de capitais com indícios de participação de múltiplos agentes. 5. Há atuação conjunta do Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal e Ministério Público do Trabalho, demandando maior articulação institucional. 6. Ocorreram sucessivas declarações de suspeição por membros do Ministério Público Estadual, gerando redistribuição da condução do feito entre as Promotorias Criminais de Garanhuns. 7. O objeto da investigação exige análise contábil minuciosa, rastreamento de ativos, confrontação de relatórios fiscais e requisição de dados bancários. Todas essas particularidades justificam a dilação temporal do procedimento. 8. O trancamento de procedimento investigatório criminal constitui medida excepcional, somente admitida quando manifesta a atipicidade da conduta, presente causa extintiva de punibilidade ou ausentes indícios mínimos de autoria e materialidade. 9. O paciente não se encontra submetido a qualquer medida cautelar restritiva de liberdade. 10. O prazo para conclusão de investigação de suspeito não submetido à custódia cautelar possui natureza imprópria, admitindo flexibilização conforme as peculiaridades do caso concreto. 11. Por outro lado, cumpre destacar a decisão do Supremo Tribunal Federal nas ADIs 2.943/DF, 3.309/DF e 3.318/MG, estabelecendo requisitos para investigações conduzidas pelo Ministério Público. In casu, constatou-se que o procedimento investigatório não observou a comunicação imediata ao juízo competente nem a submissão de prorrogações à autorização judicial. Apesar de tal omissão não caracterizar, per si, constrangimento ilegal apto a determinar o trancamento do procedimento investigatório, até porque a investigação foi instaurada antes da mencionada decisão da Suprema Corte, demanda correção ex officio para regularização da atividade persecutória, impondo-se, dessa forma, a adoção de algumas providências por parte da autoridade coatora. IV. Dispositivo e tese Ordem denegada. Determinações ex officio, nos termos do voto vista, para adequação do procedimento aos parâmetros estabelecidos pela Suprema Corte. "1. O Ministério Público deve comunicar imediatamente ao juízo competente sobre procedimentos investigatórios com devido registro e distribuição. 2. As prorrogações de prazo investigatório devem ser submetidas à autorização judicial." V. Dispositivos relevantes citados CF, art. 5º, LXXVIII; CPP, art. 654, § 2º; Resolução CNMP nº 181/2017; Resolução CNMP nº 289/2024 VI. Jurisprudência relevante citada STF, ADIs 2.943, 3.309 e 3.318, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 02/05/2024 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Habeas Corpus, ACORDAM os Desembargadores que integram a 2ª Turma da Primeira Câmara Regional de Caruaru do Tribunal de Justiça de Pernambuco, à unanimidade, em conhecer e DENEGAR A ORDEM, porém com determinações ex officio, nos termos do voto vista, à Autoridade Coatora, na conformidade do relatório e dos votos proferidos neste julgamento. Caruaru, data da assinatura eletrônica. Evanildo Coelho de Araújo Filho Desembargador Relator Proclamação da decisão: À unanimidade de votos, foi o processo julgado nos termos do voto da relatoria. Magistrados: [EVIO MARQUES DA SILVA, PAULO AUGUSTO DE FREITAS OLIVEIRA, PAULO VICTOR VASCONCELOS DE ALMEIDA] CARUARU, 5 de junho de 2025 Magistrado
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