Ministério Público Do Estado Do Paraná x Renato Sanders
ID: 307152652
Tribunal: TJPR
Órgão: Vara Criminal de Pitanga
Classe: AçãO PENAL DE COMPETêNCIA DO JúRI
Nº Processo: 0000945-77.2022.8.16.0136
Data de Disponibilização:
25/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CLEVERSON DE LIMA
OAB/PR XXXXXX
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Poder Judiciário
Estado do Paraná - Comarca de Pitanga
Vara Criminal
Vistos e examinados os presentes autos de AÇÃO
PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA, registrada
sob o nº 0000945-77.2022.8.16.0136, …
Poder Judiciário
Estado do Paraná - Comarca de Pitanga
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Vistos e examinados os presentes autos de AÇÃO
PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA, registrada
sob o nº 0000945-77.2022.8.16.0136, proposta pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO em face de RENATO
SANDERS .
SENTENÇA
1. RELATÓRIO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, em 06 de
junho de 2022 ofereceu denúncia em face de RENATO SANDERS, brasileiro,
solteiro, agricultor, portador do RG n.º 6.878.563-4/PR, natural de Três Passos/
RS, nascido em 11/09/1954, com 67 anos de idade à época dos fatos, filho de
Erna Sanders e Ermindo Sanders, residente na Estrada do Maciel sem número,
área rural do município de Santa Maria do Oeste/PR, pela prática dos
seguintes fatos delituosos:
FATO 01
“No dia 29 de março de 2022, por volta das
13h30min, em uma fazenda situada na localidade Estrada
do Maciel, Zona Rural, no Município de Santa Maria do
Oeste/PR, nesta Comarca de Pitanga/PR, o denunciado
RENATO SANDERS, com consciência e vontade,
imbuído do propósito de matar, mediante motivo fútil
e mediante recurso que dificultou a defesa, tentou
ceifar a vida da vítima Euclides Paulini, desferindo
golpes de foice na região da cabeça, punho, mão
direita e esquerda, causando-lhe ferimento 1) corto
contuso em região do crânio lado direito, logo acima
da orelha esquerda; 2) ferimento corto contuso em
região do punho direito com deformidade do 4° dedo
da mão direita; 3) ferimentos corto contusos em
região da mão esquerda; 4) fratura do 2° e 3°
metacarpos associado a lesões dos tendões de
ambos os dedos. (cf. laudo pericial de lesões
corporais mov. 1.15), resultando em incapacidade para
as ocupações habituais por mais de trinta dias, não
consumando seu intento por motivos alheios a suaPoder Judiciário
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vontade , notadamente pelos movimentos de defesa da
vítima e pela intervenção e socorro prestados pela
testemunha Orlando Biancato Júnior
Segundo se apurou, o denunciado RENATO e
a vítima Euclides possuem propriedades rural contígua e,
na data dos fatos, Euclides estava trabalhando a terra,
ocasião em que constatou que RENATO havia alterado
os limites de sua propriedade. De imediato, RENATO e
Euclides passaram a conversar acerca dos limites da
propriedade de cada uma deles e, no momento em que
Euclides virou de costas para deixar o local, RENATO
golpeou Euclides na cabeça, vindo ele ao solo. Em
seguida, RENATO continuou a desferir golpes com a foice
em Euclides, que estava deitado e se defendia com as
mãos. O crime somente não se consumou pelos
movimentos de defesa da vítima e pela intervenção e
socorro prestados por Orlando Biancato Júnior, que
trabalhava no local.
O motivo da conduta do denunciado foi fútil,
pois RENATO tentou matou a vítima Euclides em razão
de desentendimento acerca dos limites territoriais de suas
propriedades rurais, que são contíguas.
O denunciado se utilizou de meio que
dificultou a defesa da vítima, pois desferiu um golpe
com uma foice na cabeça da vítima quando ela estava de
costas, sem que esperasse o ataque, o que dificultou sua
defesa.
FATO 02
Nas mesmas condições de tempo e espaço, o
denunciado RENATO SANDERS, com consciência e
vontade, com ânimo de assenhoramento definitivo,
subtraiu para si, coisa alheia móvel, consistente em 01
(uma) pistola, marca Taurus, calibre 9mm, nº de série
ACJ322371, nº de registro 1668031, com 10 (dez)
munições intactas do mesmo calibre (cf. auto de
exibição e apreensão mov. 1.3), pertencentes a vítima
Euclides Paulini.Poder Judiciário
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Segundo se apurou, após praticar o crime
narrado no fato 01, o denunciado RENATO se apoderou
da arma de fogo que a vítima Euclides portava na cintura,
e que caiu no chão com o ataque do denunciado, sendo
que, em seguida, evadiu-se do local na posse do bem.
Consta, ainda, que RENATO ocultou a arma de fogo em
sua propriedade rural, sendo ela recuperada pelos
policiais militares somente no dia seguinte aos fatos.
O Ministério Público do Estado Paraná capitulou a conduta do
acusado no artigo 121, § 2°, incisos II e IV, c/c o artigo 14, inciso II, (fato 01), e
artigo 155 caput (fato 02), ambos do Código Penal, em concurso material de
crimes (artigo 69 do Código Penal).
Laudo Pericial (mov. 25.1).
A denúncia foi recebida em 29/09/2022 (mov. 29.1), momento em
que foi determinada a citação do réu para apresentar resposta à acusação, por
escrito, no prazo de 10 (dez) dias, e dadas outras providências para o regular
processamento do feito.
Ao mov. 82 certificou-se a existência de arma de fogo cadastrada
nos autos. O Ministério Público, ao mov. 86, pugnou pela manutenção da
apreensão da arma de fogo, isto por interessar ao feito.
O acusado não foi encontrado para ser citado (mov. 93). O Ministério
Público, ao mov. 97, pugnou pela citação do acusado por meio de edital.
A vítima, ao mov. 99, pugnou pela restituição da arma de fogo
apreendida, sendo indeferida ante ao fato de envolver questões pertinentes ao
feito, que envolvem o bem em questão (mov. 105.1).
Após diversas diligências sem sucesso para citação do acusado
(movs. 39.1, 48.1, 76.1, 93.1), o Ministério Público requereu a citação por edital
(mov. 109.1).
Este Juízo determinou que fossem realizadas buscas nos sistemas
disponíveis ao Poder Judiciário, e após o esgotamento, fosse o réu citado por
edital (mov. 114.1).
Após buscas realizadas (movs. 116.1 a 122.1), o órgão ministerial
pugnou pela citação nos endereços encontrados (mov. 125.1).Poder Judiciário
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Regularmente citado (mov. 138.1), o acusado apresentou resposta à
acusação por meio de defensor dativo não alegando preliminares (mov.
144.1.).
Conseguinte, ausentes quaisquer das hipóteses do art. 397 do
Código de Processo Penal, este Juízo manteve o recebimento da denúncia,
designando data para realização da audiência de instrução, bem como
determinando as intimações necessárias (mov. 151.1).
Realizada audiência de instrução, e tendo em vista a conexão entre
os processos 0000945-77.2022.8.16.0136 e 0000721-42.2022.8.16.0136, foi
realizada audiência una, com oitiva da vítima Euclides Paulini (mov. 180.2) e
das testemunhas Luís Carlos de Campos (mov. 180.1), Orlando Biancato
Júnior (mov. 180.3) e Taize Costa Paulini (180.4), quanto ao réu, apesar de
devidamente intimado (mov. 178.1), não compareceu ao ato, sendo decretada
sua revelia (mov. 182.1). Ao final, o Juízo determinou a atualização dos
antecedentes criminais e, por fim, concedeu prazo às partes para
apresentarem alegações finais (mov 182.1).
O Ministério Público apresentou alegações finais requerendo a
pronúncia do acusado RENATO SANDERS nos termos da denúncia. Sustentou
que o acusado, em razão de desavença relativa à divisa de propriedades
rurais, desferiu golpes de foice contra a vítima Euclides Paulini, atingindo-a
pelas costas e, após deixá-la gravemente ferida, subtraiu sua arma de fogo.
Argumentou que as provas colhidas nos autos, como laudos periciais,
declarações da vítima e depoimentos testemunhais, demonstram de forma
suficiente a materialidade dos delitos e indicam a autoria. Afirmou que não há
hipótese de absolvição sumária, impronúncia ou desclassificação, bem como
que é necessário submeter o réu a julgamento pelo Tribunal do Júri, inclusive
quanto às qualificadoras constantes na denúncia e ao crime conexo de furto
(mov. 190.0).
A defesa, por sua vez, alegou em preliminar, inépcia da denúncia,
segundo a mesma, por não expor os fatos com clareza e por estar amparado
em inquérito deficiente, o que comprometeria o direito à ampla defesa. No
mérito, sustentou que o acusado agiu em legítima defesa após provocação e
invasão de sua propriedade pela vítima, não havendo intenção de matar,
conforme demonstrado pela ausência de animus necandi e pela fragilidade das
provas. Argumentou que os golpes foram lesivos, sem risco à vida, conforme
laudo pericial inconclusivo, e que não houve continuidade na agressão.
Requereu a impronúncia por insuficiência de provas, e, subsidiariamente, a
desclassificação para o crime de lesão corporal, com afastamento dasPoder Judiciário
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qualificadoras de motivo fútil e recurso que dificultou a defesa da vítima. Por
fim, contestou a aplicação do princípio do in dubio pro societate, defendendo a
prevalência do in dubio pro reo. (mov. 202.0)
Sentença de absolvição do réu dos autos nº 0000721-
42.2022.8.16.0136.
Vieram os autos conclusos para sentença.
Em síntese, é o relatório. Decido.
2. PRELIMINARES
A defesa suscitou, em preliminar, a inépcia da denúncia,
argumentando que a peça acusatória não atende aos requisitos do artigo 41 do
CPP, por não descrever os fatos com clareza e por estar fundada em inquérito
deficiente.
Alegou que o laudo pericial não apontou debilidade permanente nem
risco à vida, e que o perito requisitou novo exame em 180 dias, o qual não foi
realizado nem juntado aos autos, o que comprometeria a comprovação da
materialidade e a justa causa da acusação de tentativa de homicídio.
Aduziu, ainda, que não há nos autos elementos que indiquem
animus necandi, pois os golpes não teriam sido dirigidos de forma letal, o
acusado cessou a agressão e não impediu o socorro da vítima, o que indicaria
ausência de dolo homicida. Requereu, por tais fundamentos, o indeferimento
da denúncia.
Todavia, tais alegações não merecem prosperar.
A inicial acusatória apresentada pelo Ministério Público observa os
requisitos legais do artigo 41 do CPP, vez que contém a exposição do fato
criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a
devida classificação dos crimes atribuídos, possibilitando a compreensão da
imputação e o exercício do contraditório e da ampla defesa.
Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato
criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do
acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo,
a classificação do crime e, quando necessário, o rol das
testemunhasPoder Judiciário
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Sobre o tema, no que tange o conteúdo da denúncia, Guilherme de
Souza Nucci leciona que:
“(...) a denúncia é a petição inicial, contendo a acusação
formulada pelo Ministério Público, contra o agente do fato
criminoso, nas ações penais públicas. Embora a peça
acusatória deva ser concisa (ver a nota 97 infra), todos os fatos
devem ser bem descritos, em detalhes, sob pena de
cerceamento de defesa. Nessa ótica: STF: “No art. 41, a lei
adjetiva penal indica um necessário conteúdo positivo para a
denúncia. É dizer: ela, denúncia, deve conter a exposição do
fato normativamente descrito como criminoso, com suas
circunstâncias, de par com a qualificação do acusado, a
classificação do crime e o rol de testemunhas (quando
necessário). Aporte factual, esse, que viabiliza a plena defesa
do acusado, incorporante da garantia processual do
contraditório (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de
Processo Penal Comentado. 13ª ed. Editora Forense. p. 206).
Ocorre que a peça acusatória apresenta de forma clara e objetiva a
conduta atribuída ao acusado, descrevendo o contexto dos fatos, a dinâmica
da agressão, o instrumento utilizado (foice), as regiões do corpo atingidas, a
motivação do delito, bem como as circunstâncias que ensejaram a tentativa de
homicídio, inclusive mencionando expressamente os elementos que
configuram as qualificadoras descritas no artigo 121, §2º, incisos II e IV, do
Código Penal.
Há a indicação precisa da data, local e pessoas envolvidas,
preenchendo, portanto, todos os requisitos legais exigidos para sua validade
formal.
No tocante ao argumento da defesa de que não teria sido juntado o
laudo complementar solicitado pelo perito, tal alegação não compromete a
regularidade da denúncia tampouco afasta a comprovação da materialidade
delitiva. Isso porque o laudo pericial constante nos autos já responde
afirmativamente ao quesito que trata da incapacidade da vítima para as
ocupações habituais por mais de trinta dias, elemento esse que caracteriza
lesão de natureza grave, sendo suficiente para demonstrar o indício de
materialidade do delito.Poder Judiciário
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Observe-se que a denúncia consignou expressamente a
incapacidade por mais de 30 dias e não permanente (denúncia, mov. 15.1, fl.
2):
(...) resultando em incapacidade para as ocupações habituais por
mais de trinta dias (...)
A pendência do quesito sobre debilidade permanente, que
dependeria de novo exame após o prazo de 180 dias, não descaracteriza
nem anula os efeitos da perícia já realizada, tampouco impede o
prosseguimento da ação penal.
Cumpre destacar que a tentativa de homicídio não exige como
condição a demonstração de resultado lesivo fatal ou permanente, mas sim a
comprovação do dolo de matar, ainda que a consumação do crime tenha sido
frustrada por circunstâncias alheias à vontade do agente, sendo que a análise
do animus necandi, igualmente contestada pela defesa, é matéria própria do
mérito e deverá ser apreciada pelo Conselho de Sentença, órgão competente
para julgar os crimes dolosos contra a vida.
A jurisprudência é pacífica no sentido de que a dúvida sobre a
existência de dolo homicida deve ser resolvida em favor da admissibilidade da
acusação, cabendo ao Tribunal do Júri o julgamento da existência ou não da
intenção de matar, e não ao juízo sumariante.
DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍDIO
QUALIFICADO – ARTIGO 121, § 2º, INCISO IV, DO CÓDIGO
PENAL – SENTENÇA DE PRONÚNCIA – RECURSO DA
DEFESA – PARECER DA PROCURADORIA GERAL DE
JUSTIÇA PELO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO EM
RAZÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE –
NÃO ACOLHIMENTO – DA LEITURA DAS RAZÕES É
POSSÍVEL SE EXTRAIR NO QUE SE FUNDA A
IRRESIGNAÇÃO E O PEDIDO DE REFORMA DA SENTENÇA
– PREVALÊNCIA DA AMPLA DEFESA –PLEITO DE
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA – IMPOSSIBILIDADE –
MATERIALIDADE E AUTORIA SUFICIENTEMENTE
PROVADAS NOS AUTOS – DESCLASSIFICAÇÃO PARA
LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE – AFASTADA –
DÚVIDA A RESPEITO DE NÃO TER O RÉU AGIDO COM
“ANIMUS NECANDI” – APRECIAÇÃO PROBATÓRIAPoder Judiciário
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APROFUNDADA QUE COMPETE AO CONSELHO DE
SENTENÇA – DECOTE DA QUALIFICADORA DO RECURSO
QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA – INDEVIDO –
QUALIFICADORA QUE NÃO RESTOU MANIFESTAMENTE
IMPROCEDENTE – QUESTÃO A SER DIRIMIDA PELO
TRIBUNAL DO JÚRI – RECONHECIMENTO DA ATENUANTE
DO PRIVILÉGIO – NÃO ACOLHIMENTO – ANÁLISE QUE
DEVE SER FEITA PELO CONSELHO DE SENTENÇA –
RECURSO – NEGA PROVIMENTO.I. CASO EM EXAME1.
Recurso em Sentido Estrito interposto contra sentença de
pronúncia que submeteu os réus ao julgamento pelo Tribunal
do Júri, em razão da prática de homicídio qualificado, com base
na morte de uma vítima após agressão com um pedaço de
madeira. A defesa requereu a absolvição sumária de um dos
réus, a desclassificação do crime para lesão corporal seguida
de morte em relação ao outro réu, o afastamento da
qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima e
o reconhecimento do homicídio privilegiado.II. QUESTÃO EM
DISCUSSÃO2. A questão em discussão consiste em saber se
estão presentes os requisitos para a absolvição sumária de um
dos réus, se é possível a desclassificação do crime de
homicídio qualificado para lesão corporal seguida de morte em
relação ao outro réu, se a qualificadora do recurso que
impossibilitou a defesa da vítima deve ser afastada e se o
homicídio privilegiado pode ser reconhecido nesta fase
processual.III. RAZÕES DE DECIDIR3. A pronúncia exige
apenas a comprovação da materialidade e a existência de
indícios suficientes de autoria ou participação, sendo
incabível a absolvição sumária ou a desclassificação do
crime para lesão corporal seguida de morte quando
presentes elementos que indicam dolo homicida. (...) (TJPR
- 1ª Câmara Criminal - 0005286-96.2024.8.16.0033 - Pinhais -
Rel.: SUBSTITUTO SERGIO LUIZ PATITUCCI - J.
08.05.2025) (grifei)
Para além, a alegação de inépcia da denúncia só pode ser acolhida
quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da
acusação, em flagrante prejuízo à defesa do acusado, o que não ocorreu no
caso concreto.
Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:Poder Judiciário
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“(...) 1. Eventual inépcia da denúncia só pode ser acolhida
quando demonstrada inequívoca deficiência, a impedir a
compreensão da acusação que se imputa, em flagrante
prejuízo à defesa, ou na ocorrência de qualquer das situações
apontadas no artigo 395 do CPP. Não é o caso dos autos,
onde a denúncia, embora sucinta, demonstrou com acuidade o
fato (...)indigitado.” (APn 825/DF, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/12/2015, DJe
02/02/2016)
“(...) 1. Não há como reconhecer a inépcia da denúncia se a
descrição da pretensa conduta delituosa foi feita de forma
suficiente ao exercício do direito de defesa, com a narrativa de
todas as circunstâncias relevantes, permitindo a leitura da peça
acusatória a compreensão da acusação, com (RHC 46.570/SP,
Rel.base no artigo 41 do Código de Processo Penal Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado
em 20/11/2014, DJe 12/12/2014) (...)
(AgRg no REsp 1396259/RS, Rel. Ministro REYNALDO
SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em
17/03/2016, DJe 30/03/2016) “(...) 1. A inicial acusatória, ainda
que de forma sucinta, descreve as condutas delituosas com as
circunstâncias imputadas à recorrente(...), possibilitando o
exercício da ampla defesa. Acórdão em consonância com a
(...)” jurisprudência desta Casa. Súmula 83 do STJ. (AgRg no
AREsp 608.639/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA,
QUINTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 08/09/2015).
No mesmo sentido é a jurisprudência deste E. Tribunal:
PRONÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.HOMICÍDIO
QUALIFICADO (ART. 121, § 2.º, INC. IV, CP). DOLO
EVENTUAL. RECURSO DA DEFESA. 1) INÉPCIA DA
DENÚNCIA. DESACOLHIMENTO. INICIAL ACUSATÓRIA
QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.INEXISTÊNCIA DE
PREJUÍZO À AMPLA DEFESA. 2) ALEGAÇÃO DE NULIDADE
DO TESTE DE BAFÔMETRO A QUE O RÉU FOI
SUBMETIDO. IRREGULARIDADES DO EXAME, ARGUIDAS
PELA DEFESA, NÃO COMPROVADAS. EMBRIAGUEZ DO
ACUSADO QUE, DE QUALQUER MODO, ENCONTRA-SEPoder Judiciário
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COMPROVADA PELA PROVA TESTEMUNHAL (ART. 306, §
1.º, INC. II, E § 2.º, CTB). 3) MÉRITO. PLEITO DE
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA OU, SUBSIDIARIAMENTE, DE
DESPRONÚNCIA. DESACOLHIMENTO. MATERIALIDADE
COMPROVADA. INDICATIVOS DE QUE FOI O RÉU QUEM
DEU CAUSA AO EVENTO DANOSO DESCRITO NA
DENÚNCIA. 4) ALMEJADA DESCLASSIFICAÇÃO PARA A
MODALIDADE CULPOSA, SOB O ARGUMENTO DE
AUSÊNCIA DE PROVAS A DEMONSTRAR O DOLO
EVENTUAL. INVIABILIDADE. INDICATIVOS DE QUE O
ACUSADO, EMBRIAGADO E EM ALTA VELOCIDADE,
TRANSGREDIU SINAL VERMELHO, VINDO A COLIDIR COM
A MOTOCICLETA CONDUZIDA PELA VÍTIMA, CAUSANDO A
SUA MORTE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI PARA
JULGAR A CAUSA. 4) ALMEJADA EXCLUSÃO DA
QUALIFICADORA PREVISTA NO ART. 121, § 2.º, INC. IV, DO
CP. PROCEDÊNCIA.INCOMPATIBILIDADE COM O DOLO
EVENTUAL. 5) REQUERIMENTO DE CONCESSÃO DA
JUSTIÇA GRATUITA. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA DE
COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO, EM CASO DE
EVENTUAL CONDENAÇÃO DO ACUSADO. RECURSO
PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA,
PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 1ª Câmara Criminal -
RSE - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR MIGUEL KFOURI
NETO - Un�nime - J. 25.05.2017) (grifei)
Constatando-se que a denúncia preenche os requisitos legais,
descreve de forma suficiente os fatos imputados ao acusado e permite o pleno
exercício da defesa, rejeita-se a preliminar de inépcia arguida pela defesa.
FUNDAMENTAÇÃO
Das condições da ação e dos pressupostos processuais
Inicialmente, verifico estarem presentes as condições da ação e os
pressupostos processuais exigidos para o regular seguimento do feito,
conforme segue:
a) Legitimidade ativa – o Ministério Público, titular da ação penal
pública incondicionada, é parte legítima para oferecer a denúncia, nos termos
do artigo 129, inciso I, da Constituição Federal;Poder Judiciário
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b) Possibilidade jurídica do pedido – a pretensão punitiva estatal tem
por base fatos que, em tese, constituem infrações penais previstas no
ordenamento jurídico;
c) Interesse de agir – demonstrado pela necessidade de intervenção
jurisdicional para a apurar e responsabilização penal dos fatos narrados;
d) Pressupostos processuais subjetivos e objetivos – constata-se a
capacidade postulatória das partes, a citação válida do acusado, a regular
constituição da defesa técnica, bem como, inexistência de impedimentos,
suspeições ou nulidades relativas ou absolutas, bem como a competência do
juízo para apreciação da matéria.
Não há, até o momento, qualquer vício formal ou nulidade que
comprometa a relação processual, razão pela estão preenchidos os requisitos
legais de validade e continuidade da persecução penal.
Do tribunal do Júri e da decisão de pronúncia
O procedimento dos crimes dolosos contra a vida inicia-se com o
oferecimento da denúncia, e se encerra com uma das seguintes decisões
judiciais: pronúncia, impronúncia, absolvição sumária ou desclassificação do
crime. Trata-se, portanto, de uma fase de formação da culpa, cujo objetivo é
verificar a presença de justa causa para o prosseguimento da ação penal
perante o Tribunal do Júri (LIMA, 2022).
A decisão do sumário da culpa, demanda da análise dos indícios de
autoria do crime, e prova da materialidade delitiva, requisitos exigidos pelo
artigo 413 do Código de Processo Penal para que o acusado seja submetido a
júri popular.
Caso ausentes tais requisitos, ocorrerá uma das três hipóteses
previstas no CPP.
A impronúncia, prevista no artigo 414 do CPP, ocorre quando o
magistrado, ao final da primeira fase do procedimento do júri, reconhece a
ausência de prova da materialidade do fato ou de indícios suficientes de autoria
ou participação. Trata-se de decisão interlocutória mista, a qual impede o
prosseguimento da ação perante o Tribunal do Júri, porém não faz coisa
julgada material, podendo o caso ser reaberto caso surjam novas provas.
Já a absolvição sumária, nos termos do artigo 415 do CPP, dá-se
quando o juiz reconhece de forma evidente a presença de causas que excluamPoder Judiciário
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o crime, a ilicitude, a culpabilidade ou a própria autoria. Nessa hipótese, o réu é
absolvido sem ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, e a decisão
encerra o processo na fase de formação da culpa, possuindo natureza de
sentença com coisa julgada material.
A desclassificação, por sua vez, ocorre quando o magistrado
constata que o delito imputado não se trata de crime doloso contra a vida, mas
sim de infração penal de competência do juízo singular. Assim, com base no
artigo 419 do CPP, o juiz desclassifica a infração e remete os autos ao juízo
competente para julgamento. Por fim, caso presentes os indícios de autoria e a
prova da materialidade, ocorrerá a pronúncia, conforme o artigo 413 do CPP.
Trata-se de decisão que encerra a primeira fase do procedimento do
júri e constitui juízo de admissibilidade da acusação, não exigindo certeza, mas
apenas a existência de elementos mínimos que justifiquem o envio do réu a
julgamento pelo Conselho de Sentença.
Sua natureza jurídica é de decisão interlocutória mista com conteúdo
declaratório, pois, embora ponha fim à fase de formação da culpa, não encerra
o processo, tampouco decide o mérito da imputação, reservando essa
apreciação ao Tribunal do Júri, juízo natural dos crimes dolosos contra a vida
(OLIVEIRA, 2021).
A respeito dessa etapa processual, leciona Eugênio Pacelli de
Oliveira:
“O que se exige, na pronúncia, não é um juízo de certeza,
próprio do juízo condenatório, mas tão somente a constatação
da existência de um suporte probatório mínimo, apto a
autorizar a submissão do réu ao julgamento pelo Tribunal do
Júri. É, portanto, um juízo de admissibilidade da acusação, e
não de procedência.” (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de
Processo Penal. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2021, p. 640)
No mesmo caminho Renato Brasileiro de Lima:
“Na decisão de pronúncia, o juiz realiza um juízo de
probabilidade e não de certeza. Deve se limitar a verificar se
estão presentes os requisitos mínimos para o encaminhamento
do feito ao Tribunal do Júri.” (LIMA, Renato Brasileiro de. Curso
de Processo Penal. 9. ed. Salvador: Juspodivm, 2022, p. 1125)Poder Judiciário
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Destaca-se ainda que na fase de pronúncia, vigora o principio do in
dubio pro societate. Referido princípio garante que a sociedade decida sobre o
caso, valorizando o interesse da coletividade na persecução penal.
Tal entendimento encontra respaldo na doutrina majoritária, segundo
a qual, diante da dúvida razoável sobre a autoria ou materialidade delitiva,
deve-se permitir que o julgamento seja realizado pelo Tribunal Popular, órgão
constitucionalmente competente para decidir sobre os crimes dolosos contra a
vida, conforme o art. 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal.
XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização
que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra
a vida;
Nesse sentido, orientam nossas e. CORTES SUPERIORES:
Supremo Tribunal Federal:
“Nos termos do artigo 413 do Código de Processo Penal, a
decisão de pronúncia configura juízo de admissibilidade da
acusação, aplicável nas situações em que o julgador se mostra
convencido (a) da materialidade do delito e (b) da existência de
indícios – e não certeza – de autoria ou de participação. Além
de não ser necessária prova plena de autoria, bastando a
probabilidade de que o denunciado tenha sido o autor do crime
[...]. AgR no ARE nº 1.426.879/RS, 1ª Turma, Relator: Min.
ALEXANDRE DE MORAES, DJe 11.5.2023.”
Superior Tribunal de Justiça:
“O juízo da acusação (judicium accusationis) funciona como um
importante filtro pelo qual devem passar somente as acusações
fundadas, viáveis, plausíveis e idôneas a serem objeto de
decisão pelo juízo da causa (judicium causae). A pronúncia
consubstancia, dessa forma, um juízo de admissibilidade daPoder Judiciário
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acusação, razão pela qual o Juiz precisa estar ‘convencido da
materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de
autoria ou de participação’ (art. 413, caput, do CPP). REsp nº
2.091.647/DF, 6ª Turma, Relator: Min. ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, DJe 3.10.2023.”
Não se pode perder de vista, contudo, que o juízo de pronúncia deve
observar com rigor os limites probatórios estabelecidos, de modo a evitar que
acusações frágeis ou infundadas avancem indevidamente à fase de
julgamento.
Nesse contexto, ainda que se admita um standard probatório
reduzido, deve-se exigir um mínimo de consistência nos elementos colhidos,
sob pena de afrontar o devido processo legal, especialmente quando ausentes
quaisquer indícios concretos da autoria ou materialidade.
O que não é o caso, como adiante segue.
Da Materialidade
No presente caso, a materialidade delitiva restou devidamente
comprovada por meio do conjunto probatório constante dos autos, pelos
elementos informativos que compõem o caderno investigativo, destacando-se,
dentre eles, a portaria inaugural (mov. 1.1), o boletim de ocorrência de n.º
2022/329766, (mov. 1.2), auto de exibição e apreensão (mov. 1.3), auto de
exame de local de crime (mov 1.5), documentos médicos atinentes ao quadro
clínico da vítima e prontuário médico hospitalar (movs. 1.13), laudo de lesões
corporais (mov. 1.15), auto de prisão em flagrante delito (mov. 1.16), imagens e
vídeo do local dos fatos (mov. 1.6 a 1.12 e 1.14) bem como pelo teor dos
depoimentos colhidos tanto na fase indiciária, como em Juízo.
Dos Indícios de Autoria
De acordo com os elementos informativos e provas dos autos,
verifica-se a existência de indícios suficientes acerca da autoria delitiva, com
base nos depoimentos colhidos em juízo e demais elementos constantes dos
autos, os quais fundamentam a decisão de pronúncia.
Do conjunto probatório
Primeiramente, consta do boletim de ocorrência que (mov. 1.2):Poder Judiciário
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POR VOLTA DE 15H00MIN DO DIA 29/03/2022, ESTA
EQUIPE RECEBEU A INFORMAÇÃO DO POSTO DE SAÚDE
DE ATENDIMENTO A UMA SITUAÇÃO DE LESÃO
CORPORAL, SENDO QUE UMA PESSOA HAVIA CHEGADO
COM UMA LESÃO NA CABEÇA, PROVENIENTE DE CORTE
COM FOICE. DESLOCADO AO LOCAL FOI CONVERSADO
COM A PESSOA DE TAIZE COSTA PAULINI RG: 9.972.244 A
QUAL DISSE QUE SEU PAI, POSTERIORMENTE
IDENTIFICADO COMO EUCLIDES PAULINI, RG: 2.090.931-5,
HAVIA SIDO AGREDIDO COM ALGUMAS FOIÇADAS PELO
SEU VIZINHO, POSTERIORMENTE IDENTIFICADO COMO
RENATO SANDERS, RG:6.878.563. RELATOU AINDA QUE O
MOTIVO DA BRIGA FOI UMA DIVISA DE TERRENO, QUE
RENATO TERIA GOLPEADO A VÍTIMA NA CABEÇA DADO
VÁRIOS OUTROS GOLPES COM VÍTIMA NO CHÃO,
MOMENTO FOI SOCORRIDO POR UM HOMEM QUE
TRABALHAVA NO LOCAL COM UMA MÁQUINA, QUE
APÓS O FATO RENATO TOMOU UMA PISTOLA DA MARCA
TAURUS, NO CALIBRE 9MM. NÚMERO DE SÉRIE
ACJ322371, SIGMA 1668031, DE PROPRIEDADE DE
EUCLIDES , FOI CONVERSADO COM O MÉDICO DE
PLANTÃO, ESTE INFORMOU QUE AS LESÕES FORAM
GRAVES, ROMPENDO DUAS ARTÉRIAS NA CABEÇA E
PESCOÇO E FERIMENTOS NOS BRAÇOS, SENDO
NECESSÁRIO A TRANSFERÊNCIA DO PACIENTE PARA
LOCAL COM MAIOR RECURSO E COM BREVIDADE, DESTA
FORMA FOI NECESSÁRIO APOIO PRÓXIMO A UNIDADE DA
UPA DE SANTA MARIA DO OESTE, PARA QUE A
AERONAVE DO RESGATE FIZESSE A ATERRISSAGEM E
DECOLAGEM EM SEGURANÇA. POSTERIORMENTE
INICIADO AS DILIGÊNCIAS DE BUSCAS AO AUTOR DO
FATO, NOS LOCAIS ONDE POSSIVELMENTE SE
ENCONTRARIA O AUTOR, NA LOCALIDADE DE MACIEL,
PINGAS E NA RESIDÊNCIA DE RENATO, PORÉM SEM
ÊXITO EM LOCALIZÁ-LO ATÉ O MOMENTO, SENDO QUE
ESTA EQUIPE AINDA PROSSEGUE COM AS BUSCAS.
(grifei)
Em sede policial, a vítima Euclides Paulini, declarou (mov. 1.30)
Que no dia 29 de março de 2022, uma terça-feira, foi
violentamente agredido por Renato Sanders em razão de umPoder Judiciário
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conflito referente à divisa de terras entre suas propriedades
rurais. Relatou que procurou Renato pacificamente,
inclusive acompanhado de um engenheiro, com o objetivo
de resolver a questão da demarcação, pois havia contratado
a medição formal do terreno e buscava apenas ajustar
corretamente a cerca, uma vez que Renato teria alterado
reiteradamente a posição dos marcos divisórios. Ressaltou que
sempre manteve boa convivência e jamais havia brigado com
Renato, e que inclusive permitia que este utilizasse parte de
sua terra para pastagem de gado leiteiro. Contudo, ao se
dirigir até o local da divisa, acompanhado de uma máquina
pantaneira para limpeza do terreno, foi surpreendido por
Renato, que o ameaçou dizendo que ele iria "para o
inferno" naquele dia. Euclides afirmou que, ao se virar para
conversar, foi atingido por um golpe de foice na cabeça e
no rosto, vindo a cair ao chão, ocasião em que sua arma
de fogo, que portava legalmente e estava na cintura, caiu
longe . Disse que, mesmo após caído, Renato continuou
desferindo golpes com a foice, atingindo inclusive seus
braços, os quais ele usava para se defender, até que um
funcionário de sua propriedade, operador de máquina
agrícola que presenciava os fatos, começou a gritar para
que Renato parasse. Conforme seu relato, após ver que
Euclides estava gravemente ferido e com grande perda de
sangue, Renato subtraiu sua pistola e fugiu do local. O
operador da máquina o socorreu, levando-o inicialmente até
sua casa, de onde foi encaminhado ao posto de saúde e
posteriormente transferido de helicóptero para Maringá, em
estado crítico, tendo sofrido rompimento de duas artérias e
outras lesões graves, conforme informado pelo médico.
Euclides ressaltou que, embora portasse a arma dentro de sua
propriedade por segurança, jamais a sacou ou ameaçou
Renato, negando veementemente qualquer provocação.
Acrescentou que, antes do crime, Renato já havia ameaçado
também outros vizinhos por causa de disputas de divisa e
demonstrava comportamento violento e intolerante, chegando a
alterar os marcos divisórios de forma arbitrária. Declarou, por
fim, que não compreende os motivos do ataque, pois sempre
agiu com boa-fé e amizade em relação a Renato, com quem
tinha convívio de mais de 25 anos, e reforçou que deseja ver a
questão da divisa resolvida judicialmente, temendo novas
ações violentas por parte do agressor.Poder Judiciário
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Em juízo, Euclides Paulini, declarou (mov. 180.2):
Que foi vítima de uma tentativa de homicídio e furto de arma de
fogo praticados por Renato Sanders, com quem mantinha
convivência de mais de 30 anos como vizinho, até então sem
desavenças graves. Segundo relatou, os fatos ocorreram
quando ele, após reiteradas alterações indevidas feitas por
Renato nos marcos divisórios de suas propriedades rurais,
contratou um engenheiro para medição técnica e regular da
divisa. Mesmo com o laudo técnico e mapas, Renato se
recusava a aceitar o posicionamento correto da cerca,
retirando os marcos com frequência. No dia dos fatos,
Euclides acompanhava uma máquina contratada para limpeza
da linha divisória, quando foi atacado de surpresa pelas
costas por Renato, que o golpeou com uma foice na
cabeça, quase lhe decepando a orelha, e continuou a
desferir diversos golpes mesmo após a vítima cair ao solo.
Euclides sofreu lesões gravíssimas, com três dedos
inutilizados, cortes nos braços, abdômen e cabeça, além de
quase perder a visão de um dos olhos. Disse que, à época,
portava uma pistola devidamente registrada na cintura por
precaução contra furtos de gado, a qual caiu ao chão com o
impacto da agressão, sendo subtraída por Renato, que fugiu
acreditando tê-lo matado. Um operador de máquina que
trabalhava nas proximidades o socorreu, levando-o primeiro
para casa e depois ao hospital, de onde foi transferido de
aeronave para Maringá em estado crítico, com grande perda de
sangue, permanecendo internado por vários dias. Atualmente,
sofre sequelas permanentes, não consegue mais fechar a mão
nem exercer atividades laborais. Reiterou que jamais sacou a
arma ou ameaçou Renato, e que o ataque ocorreu sem
qualquer provocação, sendo motivado exclusivamente pela
resistência de Renato em aceitar os limites legais da
propriedade. Finalizou afirmando que teme por sua vida, pois o
acusado e seus familiares já o ameaçaram anteriormente, e
lamentou profundamente o ocorrido, destacando que sempre
manteve boa-fé e relação amistosa com Renato, a quem
inclusive já havia ajudado no passado.
O soldado da Polícia Militar Luiz Carlos de Campos, relatou, em
sede policial (mov. 1.19),Poder Judiciário
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Vara Criminal
Que na data de 29/03/2022, por volta do meio-dia, atendeu
uma ocorrência de lesão corporal gravíssima seguida de
subtração de arma de fogo, envolvendo desavença por
divisa de terras entre Renato Sanders e Euclides, ocorrida
na região rural entre Goioxim e Santa Maria do Oeste, próximo
ao Rio Piquiri. A situação se prolongou até o período da tarde,
ocasião em que, após o socorro à vítima, levantaram-se
informações junto a familiares de Euclides, indicando Renato
como autor da agressão. Foram realizadas diversas diligências
naquele dia em busca do autor e da arma roubada, sem êxito
inicial. Contudo, na madrugada seguinte, a equipe logrou êxito
em localizar Renato em sua residência, ocasião em que ele se
entregou sem resistência e confessou o desentendimento com
Euclides, motivado por uma briga antiga relativa à cerca
divisória das propriedades. Segundo Luiz Carlos, Renato
afirmou que o conflito se deu na divisa e que teria agido
em legítima defesa, uma vez que Euclides teria histórico de
ameaçá-lo com arma de fogo. Indagado inicialmente sobre o
paradeiro da arma, Renato negou qualquer conhecimento,
mas, após ser advertido quanto às consequências,
confessou que a havia escondido num barracão próximo à
sua casa, sobre os caibros, onde foi localizada uma pistola
Taurus 9mm, com dez munições intactas (nove no
carregador e uma na câmara). Também foi apreendida uma
foice, supostamente usada na agressão. Renato foi preso,
algemado e conduzido no banco traseiro da viatura, sem
necessidade de uso do camburão. Luiz Carlos informou que
a lesão corporal provocou ferimentos gravíssimos na
vítima, especialmente na região do pescoço e rosto, com
cortes que atingiram artérias, conforme relatório médico
obtido na UPA de Santa Maria, além de ferimentos nos
braços, interpretados como movimentos de defesa. A
vítima foi transferida em estado crítico. Renato, segundo o
depoente, já é conhecido da polícia por antecedentes, mas não
é tido como indivíduo de convivência difícil na comunidade. A
arma estava registrada em nome da vítima, com validade até
2031. Não havia terceira pessoa no momento da agressão,
embora um funcionário de Euclides, que operava uma máquina
agrícola nas proximidades e teria prestado socorro à vítima,
fosse citado, mas não localizado até aquele momento.
Em juízo Luiz Carlos de Campos, declarou (mov. 180.1):Poder Judiciário
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Vara Criminal
Que, na data de 30/03/2022, abordou Renato Sanders em
frente à sua residência, na localidade rural de Maciel, após
diligências relacionadas a uma ocorrência registrada no dia
anterior, que envolvia lesão corporal grave e subtração de
arma de fogo. Relatou que, no momento da abordagem,
Renato negou possuir qualquer arma, mas, após ser informado
de que a equipe tinha conhecimento da existência e do registro
da pistola que pertencia à vítima Euclides e fora confirmada por
sua filha, Thaís acabou conduzindo os policiais até um galpão
atrás de sua residência, onde indicou o local onde havia
escondido a pistola Taurus calibre 9 mm, que foi apreendida
com nove munições no carregador e uma na câmara. Após a
apreensão, Renato foi conduzido algemado à Delegacia de
Pitanga. Luiz Carlos explicou que essa apreensão decorreu da
ocorrência de tentativa de homicídio registrada na tarde
anterior, quando foram acionados por volta das 15h, após
Euclides dar entrada no posto de saúde de Santa Maria do
Oeste com ferimentos na cabeça, pescoço e braços, estes
últimos compatíveis com tentativas de defesa, segundo o
médico. No local dos fatos, a filha da vítima relatou
desavenças antigas entre seu pai e Renato, relativas à
divisa de terras, e informou que Euclides estava armado no
momento da briga. A equipe policial verificou no terreno
marcas de luta corporal e ferramentas, como uma cavadeira,
mas não encontrou a arma. No dia seguinte, com base nas
diligências e relatos colhidos, realizaram a abordagem que
resultou na recuperação do armamento. Luiz Carlos
acrescentou que a vítima não foi ouvida em razão da gravidade
de seu estado de saúde, tendo sido transferida de helicóptero
para unidade especializada. Esclareceu, ainda, que Renato, no
momento de sua prisão, relatou ter sido humilhado por Euclides
dias antes e que teria agido em defesa própria, alegando que a
vítima se aproximou com a pistola em punho. Segundo o
depoente, o funcionário de Euclides, que operava um
maquinário nas proximidades, teria presenciado a
agressão e prestado socorro imediato, mas não foi
localizado para ser ouvido. Luiz Carlos afirmou que, conforme
apurado, após golpear a vítima, Renato subtraiu a arma caída
ao lado do corpo e deixou o local rapidamente, supostamente
para evitar o flagrante.Poder Judiciário
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Vara Criminal
A testemunha, Polícia Militar Marcos Kappes da Silva declarou,
perante a autoridade policial (mov. 1.20):
Que, no dia 30/03/2022, por volta das 5h da manhã, a equipe
policial localizou Renato Sanders saindo de sua residência com
destino à mata, em cumprimento de diligências relativas a uma
ocorrência registrada no dia anterior, envolvendo lesão corporal
grave e roubo de arma de fogo, em desfavor de Euclides
Paulini. No primeiro momento da abordagem, Renato negou ter
conhecimento do paradeiro da pistola subtraída, mas, após ser
advertido quanto aos procedimentos legais, confessou a posse
da arma e indicou o local onde a havia escondido: um anexo
externo à sua residência, onde foi apreendida uma pistola
Taurus 9 mm, municiada com 10 munições (nove no
carregador e uma na câmara). Questionado ainda sobre o
objeto utilizado na agressão à vítima, Renato apresentou
uma foice, que também foi apreendida. Em razão dos fatos,
foi dada voz de prisão em flagrante ao autor. Ao ser
indagado sobre o conflito, Renato relatou que mantém
divisa de terras com a vítima e que ambos são vizinhos
antigos. Disse que, na data anterior, por volta das 15h, após
nova discussão acalorada sobre a localização da cerca
divisória, houve agressões mútuas, ocasião em que Euclides
estaria com a pistola na cintura, em um coldre, e, durante o
embate físico, Renato teria subtraído a arma da vítima e a
levado até sua residência. Ainda conforme seu relato, havia um
terceiro presente no momento dos fatos, um funcionário
contratado por Euclides que operava uma máquina agrícola e
teria presenciado o conflito. Marcos Kappes informou que,
segundo o depoente, a desavença entre os dois já era antiga,
motivada por questões fundiárias. Indagado sobre
antecedentes de Renato, afirmou que não possui
conhecimento se este tem outras passagens policiais.
Esclareceu, ainda, que a pistola apreendida está registrada em
nome de Euclides Paulini, e que não teve contato direto com a
vítima, mas foi informado pelo médico de plantão que o ferido
sofreu rompimento de duas artérias na região da cabeça, além
de lesões cortantes nos braços, compatíveis com tentativa de
defesa. Após prestar seu depoimento, o policial teve sua oitiva
encerrada pela autoridade policial.Poder Judiciário
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Em sede policial por Orlando Biancato Junior, testemunha ocular,
o qual relatou (mov. 13.1)
“Que estava fazendo serviço com uma escavadeira rural para a
vítima Euclides, em sua fazenda situada no município de Santa
Maria do Oeste, ocasião em que por volta de 13h30min, o
senhor Euclides estava no local acompanhando o serviço e
chegou a pessoa de Renato, o qual era vizinho de terreno de
Euclides, com uma foice na mão. Que o depoente estava
dentro da máquina e não conseguia ouvir o que eles
falavam, porém deu para perceber que eles estavam
discutindo. Que em determinado momento viu Renato
dando golpes de foice em Euclides, o qual já estava caído
no chão. Que o depoente desceu da máquina escavadeira
e foi próximo a eles pedindo para o Renato parar pois ele ia
matar o Euclides, ocasião em que ele se acalmou, pegou uma
pistola de Euclides que tinha caído no chão e foi embora
dizendo que se continuassem chamaria o filho dele que morava
em Curitiba. Que Euclides estava com ferimentos na cabeça e
braços e o depoente o socorreu, levando para sua casa e
depois para o posto de saúde. Que antes do ocorrido Euclides
havia relatado para o depoente que tinha um desentendimento
com Renato por causa de uma divisa de terra, e que já tinha
até registrado um boletim de ocorrência devido a isso” (mov.
13.1)
Em juízo, a testemunha Orlando Biancato Junior corroborou as
declarações prestadas em sede policial, e declarou (mov. 180.3):
Que foi contratado para prestar um serviço de limpeza de
divisa na propriedade de Euclides Paulini, ocasião em que
testemunhou a agressão praticada por Renato Sanders contra
a vítima. Informou que, embora não conhecesse pessoalmente
nenhum dos envolvidos antes do trabalho, sabia que conflitos
envolvendo divisas de terra podiam gerar problemas, motivo
pelo qual inicialmente hesitou em aceitar o serviço. Segundo
seu relato, ao operar a máquina, percebeu que Renato e
Euclides iniciaram uma discussão acalorada, na qual um
mandava parar e o outro seguir com o trabalho. Ao descer da
escavadeira, viu Renato desferindo vários golpes de foice
em Euclides, que já estava caído no chão, de barriga para
cima, utilizando os braços para tentar proteger a cabeça.Poder Judiciário
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Disse que, mesmo com os ferimentos já causados, Renato
continuou golpeando a vítima enquanto proferia frases
como: “agora o senhor vai me respeitar”, demonstrando
clara intenção de castigo e retaliação. Acrescentou que
somente após sua intervenção verbal, tentando acalmar o
agressor e questionar o que ele faria da vida, Renato
interrompeu a ação. Afirmou que, ao cessar a agressão,
Renato se apossou de uma arma de fogo que estava no
chão ao lado da vítima a qual Orlando já havia visto com
Euclides, apontada para baixo e sem qualquer indício de
ameaça prévia e deixou o local andando tranquilamente.
Orlando afirmou ter ficado em choque, mas conseguiu auxiliar
Euclides, removendo a máquina por segurança, embarcando-o
em uma caminhonete e conduzindo-o até sua residência e,
posteriormente, ao posto de saúde, dado o estado grave das
lesões. Observou ferimentos profundos na cabeça, nas mãos e
grande perda de sangue, acreditando que a vítima poderia não
sobreviver. Disse ainda que Euclides estava consciente,
embora debilitado, e expressou preocupação com o fato de o
agressor ter levado a arma. Por fim, Orlando esclareceu que
em nenhum momento viu Euclides sacar ou apontar a arma
contra Renato, tampouco fazer menção de ameaça, reiterando
que a violência partiu exclusivamente do agressor, em contexto
de desavença por limites de propriedade. Quando questionado
em juízo pelo Ministério Público sobre a questão, relatou que a
vítima caiu e o acusado começou o atingir. Que o mesmo
estava deitado quando os golpes ocorreram.
No caso em análise, ressalta-se que a referida testemunha
presenciou os fatos no local, apontando de forma coerente o acusado como
autor da agressão com uma foice, descrevendo perfeitamente a dinâmica dos
fatos, tendo inclusive, corroborado em juízo, as declarações prestadas em sede
policial.
No mesmo sentido, a declaração prestada pela informante Taize
Costa Paulini, filha da vítima, a qual declarou (mov.186.4):
Que não presenciou os fatos, apenas descobriu quando a
vítima foi levada a casa, era, mais ou menos, hora do almoço;
que o rapaz que estava com a vítima na máquina, estavam
sozinhos no local, trouxe a vítima para casa e, então, levaram a
vítima ao hospital; que quando viu a vítima, a mesma estavaPoder Judiciário
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toda ensanguentada e fraca, e pedia para ser levada ao
hospital; que levaram a vítima ao pronto atendimento de Santa
Maria (do Oeste), e todos os procedimentos foram realizados
bem rápido; que no momento não chegou a conversar com
Orlando sobre o que havia acontecido, apenas levou seu pai
para o hospital; que seu pai lhe contou como os fatos se
desenrolaram; que, segundo a vítima, mesmo antes dos fatos,
vítima e réu estavam em uma disputa de divisa, situações
que já presenciou; que seu pai sempre insistia em uma
cerca para dividir as propriedades, para realizar a
marcação correta, pois a vítima tinha a intenção de vender
sua propriedade; que o réu alterava os marcos das
propriedades constantemente; que a vítima chamou um
agrimensor, a fim de que a divisão das propriedades fosse
feita de forma correta; que seu pai chamou a máquina para
realizar a marcação da divisa das propriedades, pois, uma
vez que o réu retirava o marco entre as propriedades, a
máquina deixaria uma marcação permanente no local; que
enquanto observava a máquina marcar a divisa das
propriedades, de costas para o réu, foi atingido; que seu
pai não teve reação; que o réu está sempre com uma foice/
facão em mãos; que o réu sempre ameaçava a vítima de
longe; que o primeiro corte da vítima foi o da cabeça,
momento em que a vítima caiu, e apenas começou a se
proteger, levando muitas ‘facãozada’ na mão; que a vítima
quebrou dois dedos de cada mão, sendo necessário
utilizar pinos; que atualmente seu pai é aposentado, mas
se fosse necessário que utilizasse suas mão para
trabalhar, não seria capaz; que mesmo para fazer algumas
coisas a vítima tem dificuldades, pois seus dedos ficaram
‘duros’; que seu pai tinha porte de arma e a mantinha
consigo para segurança da propriedade, somente dentro
de sua propriedade; que toda situação foi um choque para
a família, tudo foi muito rápido; que não esperavam tal
situação, mesmo que tenham desavenças com vizinhos,
não esperam isso das pessoas; que vinham
constantemente tentando um acordo com acusado, pois
sempre o ajudaram, e estavam tentando legalizar as
propriedades, uma vez que tinham terra para vender (…);
que mesmo que seu pai tenha perdido parte da mobilidade das
mão, ainda tem a vida”.Poder Judiciário
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Em sede policial o réu RENATO SANDERS optou por exercer seu
direito constitucional ao silencio (mov. 22.2).
Quando da audiência de instrução, ainda que devidamente intimado
(mov. 178.1), deixou de comparecer à solenidade.
No entanto, RENATO SANDERS, em vídeo gravado pelos policiais
no local dos fatos, declarou que o conflito teve origem em uma divergência
sobre a divisa da propriedade rural que mantém contígua à de Euclides Paulini.
Apontou que, ao chegar ao local, encontrou uma máquina trabalhando, a qual,
segundo ele, estaria ultrapassando os limites de sua propriedade, o que o
incomodou, pois afirma ter pago pela área em questão. Alegou que tentou
conversar com Euclides, mas este teria reagido de forma hostil e, em seguida,
sacado uma arma de fogo. Renato então teria dito para Euclides que ele "não
era capaz" e que "não atiraria", mas, conforme relata, no momento em que a
vítima teria empunhado a arma, ele decidiu agir rapidamente, partindo para
cima de Euclides e dando uma “forçada” na arma para desarmá-lo,
conseguindo subtrair a pistola. Ainda segundo sua narrativa, após isso a vítima
teria corrido e caído, momento em que Renato pegou a foice e também se
retirou do local, indo diretamente para sua casa. O réu procurou justificar sua
conduta dizendo que não deu chance à vítima e que apenas reagiu para
impedir um possível disparo, sustentando ter agido por impulso diante do risco
percebido.
Pois bem.
Dispõe o art. 413 do Código de Processo Penal:
O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se
convencido da materialidade do fato e da existência de indícios
suficientes de autoria ou de participação.
Acerca da pronúncia, apresenta Eugenio Pacelli de Oliveira:
Na decisão de pronúncia, o que o juiz afirma, com efeito, é a
existência de provas no sentido da materialidade e da autoria.
Em relação à materialidade, a prova há de ser segura quanto
ao fato. Já em relação à autoria, bastará a presença de
elementos indicativos, devendo o juiz, tanto quanto possível,
abster-se de revelar um convencimento absoluto quanto a ela.
É preciso considerar que a decisão de pronúncia somente deve
revelar um juízo de probabilidade e não de certeza (OLIVEIRA,Poder Judiciário
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Eugenio Pacelli de. Curso de processo penal. São Paulo: Atlas,
2015, p. 731).
Como visto, a pronúncia exige, para sua prolação, a comprovação
da materialidade do delito e a presença de elementos indicativos da autoria ou
participação do acusado. Nessa fase do procedimento, não se demanda um
juízo de certeza, bastando que existam indícios consistentes que, em grau de
probabilidade, apontem o réu como responsável pelo fato delituoso em
apuração.
O art. 239 do CPP aduz que:
Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que,
tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a
existência de outra ou outras circunstâncias
Em uma acepção de “indícios de prova”, representando “indicativos”
ou “sinais”, diversamente da noção prevista no art. 239 do CPP, os indícios
referentes à pronúncia significam um “começo ou princípio de prova,
entendendo-se prova aqui como resultado, isto é, um começo de convicção da
entidade julgadora quanto ao delito.”
Assim, nesta etapa procedimental, cabe ao magistrado apenas uma
avaliação preliminar quanto à presença de indícios de autoria ou participação,
sendo essa constatação suficiente para autorizar o envio do réu ao julgamento
pelo Tribunal do Júri – órgão constitucionalmente competente para apreciar os
crimes dolosos contra a vida, nos termos do artigo 5º, inciso XXXVIII, da
Constituição Federal.
Sobre o tema este E. Tribunal tem entendimento:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - PRONÚNCIA -
HOMICÍDIO QUALIFICADO - MATERIALIDADE
COMPROVADA - INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA -
IMPRONÚNCIA - ELEMENTOS INDICIÁRIOS COLHIDOS
SUFICIENTES À MANUTENÇÃO DA SENTENÇA -
EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA - IMPOSSIBILIDADE -
DELITO SUPOSTAMENTE COMETIDO MEDIANTE
RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA E COM
ARMA BRANCA - INDÍCIOS QUE AUTORIZAM A
SUBMISSÃO A JULGAMENTO POPULAR - RECURSO
DESPROVIDO. 1. Para a pronúncia não se exige a certeza da
autoria, porém a existência de indícios, cabendo ao JúriPoder Judiciário
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Vara Criminal
resolver conflitos probatórios. 2. A exclusão da qualificadora,
na decisão de pronúncia, somente será possível quando
emergir, na prova dos autos, que elas não resultaram
evidenciadas, estreme de dúvida, sob pena de se invadir a
competência do Conselho de Sentença. (TJPR - 1ª C. Criminal
- RSE - 1553004-6 - Ponta Grossa - Rel.: Antonio Loyola Vieira
- Unânime - - J. 17.11.2016).
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA.
HOMICÍDIO. PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR
AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO À AUTORIA DO
CRIME.TESE NÃO COMPROVADA DE FORMA INDENE DE
DÚVIDAS. PLEITO DE DESPRONÚNCIA. NÃO
ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE COMPROVADA E
INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E DO DOLO.
DECISÃO DE PRONÚNCIA QUE ENCERRA MERO JUÍZO DE
ADMISSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 1ª C.
Criminal - RSE - 1542022-7 - Guaíra - Rel.: Macedo Pacheco -
Unânime - - J. 24.11.2016).
Ainda, consolidou-se na jurisprudência do STJ o entendimento de
que a ausência de certeza quanto à autoria não impede a pronúncia, sendo
desnecessária prova cabal ou incontroversa.
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA.
DESCLASSIFICAÇÃO. DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA. NÃO
RECONHECIMENTO. PROVA DE MATERIALIDADE E
INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. COMPETÊNCIA DO
TRIBUNAL DO JURI. I - O processamento e julgamento dos
crimes dolosos contra a vida tem, como a garantia
constitucional, a competência do Tribunal do Júri. Essa
peculiaridade não autoriza que o juiz, ao decidir pela
submissão ou não do réu a julgamento pela Corte popular,
exceda os limites que lhe são impostos pelo art. 413, § 1º, do
Código de Processo Penal. A única exigência para que se
passe do judicium accusationis para a fase do judicium causae
é o reconhecimento da presença de indícios suficientes de
autoria e a indicação da materialidade delitiva. II - In casu, não
há, na dinâmica dos fatos descritos pelo eg. Tribunal de
origem, elemento que autorize, de plano, o acolhimento da tese
defensiva, amparada no art. 15 do Código Penal. Desse modo,Poder Judiciário
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a tese deve ser submetida à apreciação do juiz natural da
causa, qual seja, o Tribunal do Júri. Agravo regimental
desprovido. (AgRg no AREsp 802.477/MG, Rel. Ministro FELIX
FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 08/11/2016, DJe
14/11/2016).
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. PENAL. PROCESSO PENAL. PRONÚNCIA
FUNDAMENTADA EM ELEMENTOS INFORMATIVOS
COLHIDOS NA FASE PRÉPROCESSUAL E EM JUÍZO.
PROVAS SUFICIENTES DE MATERIALIDADE E DE
INDÍCIOS DE AUTORIA. NECESSIDADE DE
REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA
SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO
PROVIDO. 1. A decisão de pronúncia é um mero juízo de
admissibilidade da acusação, não sendo exigido, nesse
momento processual, prova incontroversa da autoria do delito -
bastam indícios suficientes de que o réu seja seu autor e a
certeza quanto à materialidade do crime. 2. No caso concreto,
a pronúncia foi lastreada não apenas nos depoimentos colhidos
na fase inquisitorial, mas também em depoimentos
judicializados, colhidos sob o manto do contraditório e da
ampla defesa. 3. Para se concluir pela impronúncia, como
pretendido pelo agravante, seria necessário o revolvimento
fático-probatório dos autos, providência vedada pela Súmula n.
7 do STJ. 4. Agravo não provido. (AgRg no AREsp
365.085/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA
TURMA, julgado em 07/04/2016, DJe 20/04/2016).
Compulsando os autos, verifica-se que a dinâmica fática encontra
respaldo no conjunto probatório, havendo elementos que, em juízo de cognição
sumária, apontam para a versão apresentada pela vítima Euclides Paulini, a
qual foi corroborada por testemunha presencial (Orlando Biancato Junior) e
pelos depoimentos dos policiais militares que atenderam a ocorrência e
atuaram na prisão do acusado. Tais elementos convergem, de modo
harmônico, para a indicação de RENATO SANDERS como suposto autor da
agressão perpetrada com instrumento cortante, bem como da subtração da
arma de fogo registrada em nome da vítima.
A narrativa de Euclides Paulini, apresentada de forma detalhada
tanto na fase policial (mov. 1.30) quanto sob o crivo do contraditório (mov.
180.2), descreve um cenário em que teria sido surpreendido por agressõesPoder Judiciário
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físicas enquanto acompanhava serviço de limpeza na divisa de sua
propriedade. A coerência entre os relatos e os documentos médicos acostados
aos autos (movs. 1.13 e 1.15), que atestam múltiplas lesões, inclusive em
membros superiores, revela compatibilidade com a hipótese de ação defensiva
diante de ataque repentino.
No mesmo sentido, a testemunha Orlando Biancato Junior (movs.
13.1 e 180.3), operador de máquina agrícola, afirma ter presenciado o
momento em que o acusado desferia diversos golpes de foice contra a vítima,
que se encontrava ao solo. Ressalta-se que sua versão foi reiterada em juízo,
sem evidência de vínculos que comprometam sua imparcialidade,
emprestando, assim, força indicativa ao seu depoimento.
Por sua vez, os policiais Luiz Carlos de Campos (mov. 180.1) e
Marcos Kappes da Silva (mov. 1.20) relataram o cumprimento da diligência
que resultou na prisão do investigado, bem como a recuperação da arma de
fogo, que teria sido escondida em anexo de sua residência. Segundo os
depoentes, o acusado inicialmente negou a posse do armamento, mas, após
esclarecimentos, indicou espontaneamente o local em que a arma estaria
oculta. Esses dados, se confirmados, afastam, ao menos em sede indiciária, a
hipótese de desarme meramente defensivo.
Embora o réu tenha exercido o direito constitucional ao silêncio
durante a fase inquisitorial (mov. 22.2) e tenha deixado de comparecer à
audiência de instrução (mov. 178.1), constam dos autos registros de
declarações prestadas durante abordagem policial, em que sustenta ter agido
para se defender de uma ameaça armada. Tal versão, no entanto, encontra
resistência nos demais elementos informativos constantes dos autos, cuja
apreciação caberá ao juízo natural da causa.
Importa destacar ainda o depoimento de Taize Costa Paulini, filha
da vítima (mov. 186.4), que, embora não tenha presenciado os fatos, apontou
antecedentes da desavença territorial e descreveu as limitações funcionais
permanentes decorrentes das lesões, bem como episódios anteriores de
supostas ameaças, os quais conferem contexto aos acontecimentos e reforçam
a plausibilidade da narrativa acusatória.
A sequência dos eventos, conforme descrita nos relatos colhidos em
sede judicial e extrajudicial, alinha-se aos dados periciais e aos registros
médicos que indicam lesões compatíveis com agressões de natureza grave,
notadamente cortes profundos na região da cabeça e membros superiores.Poder Judiciário
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Diante de tais elementos, é possível concluir, para fins de
admissibilidade da acusação, que há comprovação da materialidade delitiva,
bem como indícios suficientes de autoria e dolo, tanto na tentativa de
homicídio quanto na subtração do armamento, sendo cabível o
prosseguimento da persecução penal mediante submissão do acusado a
julgamento pelo Tribunal do Júri, conforme os artigos 413 e 414 do Código
de Processo Penal.
Ressalta-se que, nesta fase processual, vigora o princípio do in
dubio pro societate, segundo o qual, havendo dúvida razoável quanto à autoria
ou à incidência de qualificadoras, estas devem ser submetidas à apreciação do
Tribunal do Júri, juízo natural para o julgamento dos crimes dolosos contra a
vida.
Ainda, não merece prosperar em sede de cognição sumária a
desclassificação para lesão corporal, eis que há elementos indicativos do
animus necandi, como visto acima.
Do mesmo modo, há indicativos de que a ação teria sido
interrompida não pela vontade do réu, mas sim pela intervenção da pessoa de
Orlando, de modo que não caracterizada a desistência voluntária em juízo de
cognição sumária.
De qualquer modo, tais questões se confundem com o mérito e
deverão ser dirimidas pelos jurados.
3. Das Qualificadoras
Conforme ensina Gustavo Badaró, “no que concerne às
qualificadoras, tem sido admitida a sua exclusão, no momento da pronúncia,
desde que sejam manifestamente improcedentes, isto é, que não haja prova de
sua ocorrência (BADARÓ, Gustavo. Processo penal. Rio de Janeiro: Campus:
Elsevier, 2012, p. 475).
Ou seja, nessa fase, o afastamento da qualificadora somente é
possível se manifestamente improcedente ou sem qualquer apoio na prova
colhida nos autos. Caso contrário, deve ser mantida para futura análise pelo
Tribunal de Júri.
Desta forma, o artigo 413, §1º do Código Penal, determina que ao
proferir decisão de pronúncia, além dos indícios de autoria e materialidade,
indique o enquadramento legal da conduta, circunstâncias qualificadoras ou
causas de aumento de pena que incidam sobre os fatos.Poder Judiciário
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Neste sentido também já decidiu a Colenda 1 a Câmara Criminal do
Egrégio Tribunal de Justiça do Paraná (grifos não constantes no original):
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - HOMICÍDIO SIMPLES
NA FORMA TENTADA (2X) E HOMICÍDIO QUALIFICADO
CONSUMADO E CORRUPÇÃO DE MENORES - SENTENÇA
DE PRONÚNCIA - PRETENSA IMPRONÚNCIA -
INVIABILIDADE – INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E
PROVA DA MATERIALIDADE - EXCLUSÃO DA
QUALIFICADORA DO RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A
DEFESA DA VÍTIMA - IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO AFETA
AO CONSELHO DE SENTENÇA - RECURSO DESPROVIDO.
1. A Decisão de Pronúncia, por sua natureza mesma, encerra
mero juízo de admissibilidade da denúncia, bastante que é a
demonstração da materialidade e indícios de autoria delitiva,
sendo defeso ao Juiz togado, neste momento procedimental,
proceder ao exame aprofundado dos elementos de convicção
carreados aos autos, pena de inaceitável invasão de
competência. 2. Na fase de pronúncia o afastamento de
qualificadora só é possível se manifestamente
improcedente, descabida e sem qualquer apoio na prova
colhida nos autos, caso contrário deve ser mantida para
futura análise pelo Tribunal do Júri. (TJPR - 1ª C. Criminal -
0001070-57.2011.8.16.0095 - Irati - Rel.: Antônio Loyola Vieira
- J. 08.03.2018). (grifei)
À vista disso, passo à análise a respeito das qualificadoras do delito
de homicídio descritas na narrativa exordial acusatória.
3.1. Motivo fútil (art. 121, §2º, inciso II, do CP)
Referida qualificadora, incide quando o crime é praticado por razão
desproporcional, insignificante ou desarrazoada diante da conduta ofensiva.
Nas palavras intocáveis de Ney Moura Teles:
“A futilidade nasce de prepotência e intolerância que
caracterizam certos indivíduos. Sâo os que se consideram
seres superiores, pela força do poder econômico, ou pela
superioridade dos planos físicos, inteectual e moral;
Contrariados em qualquer pretensão, encham-se de ira e e
voltam-se violetamente contra os mais fracos ou desavidados.
Não aceitam o NÃO. Não toleram a crítica, não convivem comPoder Judiciário
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nada que lhe incomode. Não sendo agredido, nem tão pouco
provocados, mas, simplesmente, não recebendo o que querem,
não ouvindo o que gostariam, ou não vendo o que desejam
matam” (MOURA TELES; Ney. Direito Penal – Vol 2. Parte
Especial (arts. 121 a 212). Ed. Atlas. 2004. P 67.)
Fernando Capez, assevera que: “matar alguém, sem nenhum motivo
é ainda pior que matar sem mesquinharia, estando, portanto, incluído, no
conceito de fútil” (CAPEZ; Fernando. Curso de Direito Penal – Vol. 2 - Parte
Especial. Ed. Saraiva. 2003. P. 48).
No caso em análise, tal circunstância revela-se presente, ao menos
em tese, uma vez que a agressão teria sido motivada por desentendimento
relacionado à demarcação ou disputa de limites entre propriedades rurais
contíguas.
Trata-se de conflito que, embora passível de resolução pelas vias
administrativas ou judiciais, foi desproporcionalmente transformado em
violência grave contra a vítima, evidenciando, assim, um impulso desmedido e
desarrazoado por parte do acusado, o que justifica o reconhecimento da
qualificadora nesta fase, para apreciação pelo Tribunal do Júri.
Consoante entendimento consolidado no âmbito do Tribunal de
Justiça do Paraná, o afastamento de qualificadora na decisão de pronúncia
somente é admissível quando manifestamente improcedente, sendo
atribuição do Tribunal do Júri a valoração definitiva das circunstâncias
qualificadoras:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO
QUALIFICADO TENTADO. PRONÚNCIA. RECURSO DA
DEFESA. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DAS
QUALIFICADORAS DO MOTIVO FÚTIL, MEIO QUE
DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA E FEMINICÍDIO.
IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE VERTENTE
PROBATÓRIA A AMPARAR A SUA INCLUSÃO NA
PRONÚNCIA. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO TRIBUNAL
DO JÚRI PARA DIRIMIR A QUESTÃO EM CARÁTER
DEFINITIVO. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJPR - 1ª C.
Criminal - 0001882-82.2016.8.16.0044 - Apucarana - Rel.: Juiz
Naor R. de Macedo Neto - J. 22.08.2019) (Grifei)
Dessa forma, não sendo a qualificadora manifestamente
descabida , impõe-se sua manutenção na decisão de pronúncia, conformePoder Judiciário
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autoriza o art. 413, §1º, do CPP, para apreciação soberana pelo Conselho de
Sentença.
3.2. Recurso que dificultou a defesa da vítima (art. 121, §2º,
inciso IV, do CP)
A qualificadora do recurso que dificultou a defesa da vítima tem por
finalidade punir com maior gravidade o agente que se vale de meios ou
circunstâncias que impeçam ou reduzam significativamente a capacidade de
reação da vítima.
Guilherme de Souza Nucci, assim leciona:
“(...) deixa a lei penal bem claro que o objetivo desta
qualificadora é punir mais severamente o agente que,
covardemente, mata o ofendido. Traindo-o, emboscando-o ou
ocultando suas verdadeiras intenções, está prejudicando ou
impedindo qualquer reação de sua parte, que se torna presa
fácil. ” (Código Penal Comentado”, São Paulo, RT, 2012, p. 643)
No caso em apreço, os elementos colhidos nos autos indicam, ao
menos em sede de indícios, que a vítima teria sido surpreendida pelas costas,
sem possibilidade de defesa eficaz, sendo atingida inicialmente na região da
cabeça com instrumento cortante (foice), vindo a cair ao solo, onde continuou a
ser golpeada.
Tal dinâmica foi descrita tanto pela vítima, quanto pela testemunha
ocular Orlando Biancato Junior, que afirmou ter presenciado os golpes
enquanto Euclides já se encontrava caído, em posição de defesa, utilizando os
braços para proteger a cabeça.
As declarações prestadas em juízo (mov. 180.3), nesse ponto, são
convergentes com os laudos periciais, que apontam lesões em membros
superiores compatíveis com tentativas de bloqueio.
Embora a Defesa alegue, em tese, que o acusado teria reagido a
uma suposta ameaça armada por parte da vítima, tal versão não encontra
amparo nos demais elementos probatórios, tampouco foi corroborada por
testemunhas presenciais, especialmente porque não há indicativo de que a
arma de fogo tenha sido sequer empunhada pela vítima, permanecendo com
todas as munições intactas quando recuperada (mov. 1.19 e 1.20).Poder Judiciário
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Trata-se, portanto, de argumento que deverá ser oportunamente
avaliado pelo Tribunal do Júri.
Assim sendo, não se vislumbra, nesta fase de juízo meramente
admissivo, qualquer elemento que afaste de plano a incidência da referida
qualificadora, razão pela qual deve ela ser mantida na decisão de pronúncia,
para apreciação soberana pelo Conselho de Sentença.
4. DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fundamento no artigo 413 do Código de
Processo Penal, PRONUNCIO o acusado RENATO SANDERS, como incurso
nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, c/c artigo 14, inciso II (tentativa
de homicídio qualificado), e do artigo 155, caput (furto), todos do Código Penal,
em concurso material de crimes (art. 69 do CP), para que seja submetido a
julgamento pelo Tribunal do Júri desta Comarca.
5. DISPOSIÇÕES FINAIS
Dê-se ciência ao acusado quanto ao teor da presente decisão de
pronúncia.
Transitada em julgado esta decisão nesta instância, proceda-se à
redistribuição dos autos à Vara do Tribunal do Júri desta Comarca.
Na sequência, intimem-se o Ministério Público e a defesa para que,
no prazo de 05 (cinco) dias, apresentem o rol de testemunhas a serem ouvidas
em plenário, limitado ao número máximo de 05 (cinco), bem como para que
possam juntar documentos ou formular requerimentos de diligências que
entenderem pertinentes, nos termos do artigo 422 do Código de Processo
Penal.
Decorrido o prazo, venham os autos conclusos para os fins do artigo
423 do mesmo diploma legal.
Cumpra-se. Intimem-se.
Pitanga, datado eletronicamente.
Lara Alves OliveiraPoder Judiciário
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Juíza de Direito
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