Ministério Público Do Estado Do Paraná x Felipe Wodzik Rodrigues
ID: 311090314
Tribunal: TJPR
Órgão: Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher e Vara de Crimes Contra Crianças, Adolescentes e Idosos de Foz do Iguaçu
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0028148-70.2024.8.16.0030
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARIAM AHMAD CHAMS
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER E VARA DE CRIMES CONTRA CRIANÇAS, ADOLESCENTES E IDOSOS DE FOZ DO IGUAÇU - PROJ…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER E VARA DE CRIMES CONTRA CRIANÇAS, ADOLESCENTES E IDOSOS DE FOZ DO IGUAÇU - PROJUDI Avenida Pedro Basso, 1001 - Térreo - Alto São Francisco - Foz do Iguaçu/PR - CEP: 85.863-915 - Fone: 45 3308-8062 - Celular: (45) 3308-8062 - E-mail: fi-8vj-s@tjpr.jus.br Autos nº. 0028148-70.2024.8.16.0030 Processo: 0028148-70.2024.8.16.0030 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Lesão Cometida em Razão da Condição de Mulher Data da Infração: 27/04/2024 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): JHENIFER TAMIRES DA SILVA FRUTOS Réu(s): FELIPE WODZIK RODRIGUES 1. Relatório O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia (mov. 19.1) contra o acusado mencionado em epígrafe, qualificado nos autos, como incurso nas sanções previstas no art. 129, §13 (fato 01) e art. 147 (fato 02), c.c. art. 61, II, f, ambos do CP, anteriores às disposições trazidas pela Lei n.° 14.994/2024, na forma do art. 69, do CP, no âmbito da Lei n.º 11.340/06, pelos fatos delituosos descritos na peça acusatória, nos seguintes termos: FATO 01 No dia 27 de abril de 2024, por volta das 19h00m, na residência situada na Rua Bom Jardim, nº 154, Três Lagoas, nesta Cidade e Comarca de Foz do iguaçu/PR, o denunciado FELIPE WODZIKRODRIGUES, agindo com consciência e vontade dirigidas à prática da conduta criminosa, ciente da ilicitude de sua conduta, prevalecendo-se das relações domésticas e em razão da condição de sexo feminino, ofendeu a integridade física da vítima JHENIFER TAMIRES DA SILVA FRUTOS, sua ex-convivente. Para tanto, o ora denunciado desferiu um chute na vítima na região do peito (“voadora”), a fazendo cair no sofá, oportunidade em que arremessou um ventilador contra a ofendida, bem como puxou a vítima pelos cabelos e desferiu diversos tapas. Verifica-se que em decorrência das agressões praticadas, a vítima apresentou lesões corporais consistentes em equimose esverdeada irregular situada em região de ombro direito; Imobilização ortopédica no terceiro dedo da mão esquerda, conforme Laudo de Lesões Corporais acostado ao mov.1.8, Fotos coligidas ao mov. 1.5, Boletim de Ocorrência nº. 2024/538745 de mov. 1.2 e Termo de Declaração mov. 1.3 e Termo de Depoimento mov. 1.9). FATO 02 Nas mesmas circunstâncias de tempo e local narrados no 1º fato, o denunciado FELIPE WODZIK RODRIGUES, dolosamente, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, mediante violência baseada em gênero e prevalecendo-se das relações domésticas e familiares, ameaçou a vítima JHENIFER TAMIRES DA SILVA FRUTOS, sua ex-convivente, com a promessa de causar-lhe mal injusto e grave, ao proferir que “vou matar vocês (referindo-se a vítima e sua genitora)” (termo de declaração mov. 1.3, Termo de Depoimento mov. 1.9 e Boletim de Ocorrência nº. 2024/538745 de mov. 1.2). A denúncia foi recebida em 02.12.2024 (mov. 28). Citado (mov. 43), o acusado apresentou resposta à acusação (mov. 56), por meio de Defensor Dativo (mov. 49). Não sendo hipótese de absolvição sumária, designou-se audiência de instrução e julgamento (mov. 62), na qual (movs. 90.2/90.4) foram ouvidas a vítima, uma informante e efetuado o interrogatório do denunciado. O Ministério Público, em alegações finais escritas, pugnou pela procedência da pretensão punitiva, com a condenação do réu pela prática do delito previsto no art. 129, §13 (fato 01) e art. 147 (fato 02), c.c. art. 61, II, f, ambos do CP, anteriores às disposições trazidas pela Lei n.° 14.994/2024, na forma do art. 69, do CP, sob a égide da Lei Maria da Penha, tendo ainda tecido considerações acerca da dosimetria da pena (mov. 95). A Defesa, por seu turno, nas derradeiras alegações, requereu a aplicação da pena no mínimo legal, com reconhecimento da atenuante da confissão, bem como o regime aberto de cumprimento de pena e gratuidade de justiça. Por fim, pugnou pela fixação de honorários advocatícios em razão da nomeação de defensora dativa (mov. 104.1). Vieram os autos conclusos para sentença. Relatei. Decido. 2. Fundamentação 2.1. Preliminares e Instrução Processual Inexistem quaisquer questões processuais, preliminares, ou prejudiciais de mérito, a serem analisadas nesse momento, de modo que, respeitado o formalismo procedimental (devido processo legal), passo ao enfrentamento da materialidade, autoria, tipicidade, ilicitude, culpabilidade e demais elementos relativos à conduta típica. Para que a presente sentença, no mais, fique o mais clara possível, entendo, de início, possível avaliar as provas que foram juntadas aos autos na fase de inquérito e durante a instrução processual. É certo que o art. 155 do CPP, introduzido pela Lei nº 11.690/2008, informa que o Juízo não poderá se valer de elementos de prova colhidos na fase de inquérito para imputar a responsabilidade penal a alguém, salvo aquelas irrepetíveis, cautelares e antecipadas. A norma que se extrai do texto legal deixa claro que esses elementos não podem ser exclusivos do inquérito, podendo ser sopesados conjuntamente com aquilo que colhido em contraditório, já quando em curso o processo penal. Aliás, sobre essa questão, houve alteração no art. 3º-C, §3º, do CPP, que foi objeto de enfrentamento e análise pelo STF nas ADIs n.º 6298, 6299, 6300 e 6305, as quais assim resolveram essa controvérsia: AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. ADI’S 6298, 6299, 6300 E 6305. LEI 13.964, DE 24 DE DEZEMBRO DE 2019. AMPLA ALTERAÇÃO DE NORMAS DE NATUREZA PENAL, PROCESSUAL PENAL E DE EXECUÇÃO PENAL. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE ARTIGOS PERTINENTES À ATUAÇÃO DO JUIZ E DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCEDIMENTO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. CRIAÇÃO DO “JUIZ DAS GARANTIAS”. (...) ARTIGOS 3º-A AO 3º-F, 28, 28-A, 157, § 5º E 310, § 4º. AÇÕES JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES. (...) III – ARTIGO 3º-C. MATÉRIAS SUBMETIDAS À NOVA SISTEMÁTICA DO JUÍZO DAS GARANTIAS. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO, PARA EXCLUSÃO DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS INCOMPATÍVEIS COM O MODELO. MARCO FINAL DA COMPETÊNCIA DO JUIZ DAS GARANTIAS: OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. AUTOS DO INQUÉRITO. PROIBIÇÃO DE REMESSA AO JUIZ DA INSTRUÇÃO. IRRAZOABILIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO DOS DISPOSITIVOS IMPUGNADOS. (a) O artigo 3º-C, caput, do Código de Processo Penal, incluído pela Lei 13.964/2019, delimitou a extensão da competência do juiz das garantias, nos seguintes termos: “A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código”. (b) As razões anteriormente expendidas revelam que o texto impugnado incorreu em erro legístico, do qual deriva a necessidade de restrição da competência para que cesse com o oferecimento da denúncia. (c) Ademais, além das infrações penais de menor potencial ofensivo, de competência dos juizados especiais, a nova sistemática do juiz das garantias não se compatibiliza com o procedimento especial previsto na Lei 8.038/1990, que trata dos processos de competência originária dos tribunais; com o rito do tribunal do júri; com os casos de violência doméstica e familiar. (d) Por tais motivos, deve ser atribuída interpretação conforme à primeira parte do caput do art. 3º-C do CPP, incluído pela Lei nº 13.964/2019, para esclarecer que as normas relativas ao juiz das garantias não se aplicam às seguintes situações: (1) processos de competência originária dos tribunais, os quais são regidos pela Lei nº 8.038/1990; (2) processos de competência do tribunal do júri; (3) casos de violência doméstica e familiar; e (4) infrações penais de menor potencial ofensivo. (e) Ao mesmo tempo, as referências à competência do juiz das garantias para receber a denúncia, constantes do caput e dos §§ 1º e 2º, do artigo 3º-C, revelam-se inconstitucionais, atribuindo-se interpretação conforme a Constituição no sentido de fixar que a competência do juiz das garantias cessa com o oferecimento da denúncia e, por conseguinte, oferecida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento. (f) A Lei 13.964/2019 estabeleceu, ainda, nos §§ 3º e 4º do artigo 3º-C, a vedação do conhecimento dos autos do inquérito pelo juiz da instrução e julgamento, impedindo sua remessa juntamente com a denúncia. (g) Os textos dos dispositivos impugnados têm o seguinte teor: “§ 3º Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado. § 4º Fica assegurado às partes o amplo acesso aos autos acautelados na secretaria do juízo das garantias.” (h) Constata-se a manifesta irrazoabilidade do acautelamento dos autos do inquérito na secretaria do juízo das garantias, porquanto o fundamento da norma reside tão-somente na pressuposição de que o juiz da ação penal, ao tomar conhecimento dos autos da investigação, perderia sua imparcialidade para o julgamento do mérito. Ocorre que, sem tomar conhecimento dos elementos configuradores da justa causa para a ação penal (indícios de autoria e de materialidade), inviabiliza-se a prolação de decisões fundamentadas. (i) Por conseguinte, declara-se a inconstitucionalidade, com redução de texto, dos §§ 3º e 4º do art. 3º-C do CPP, incluídos pela Lei nº 13.964/2019 e, mediante interpretação conforme, fixar que os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias serão remetidos ao juiz da instrução e julgamento. (...) Ações diretas de inconstitucionalidade julgadas parcialmente procedentes. (ADI 6298, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 24-08-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 18-12-2023 PUBLIC 19-12-2023) (grifos meus). No ponto, não houve alteração a respeito dessa previsão com o advento da Lei n.º 13.964/2019, que não mitigou ou infirmou o conteúdo dos arts. 155 e 156, do CPP. Disso deriva, portanto, que (a) é possível a análise do que foi produzido em inquérito pelo Juízo da instrução juntamente com o que foi fabricado em contraditório; (b) em regra, o Juízo deverá considerar a prova judicializada, produzida em contraditório e ampla defesa; e (c) é autorizada a análise exclusiva da prova produzida exclusivamente na fase inquisitorial caso ela seja irrepetível (p.ex., laudo de lesões corporais, laudo de constatação de local do crime, laudo de análise genética etc.) e antecipada (v.g., depoimentos especiais, reprodução simulada etc.). Na fase de inquérito e antes do oferecimento da denúncia, foram juntadas as seguintes provas mais relevantes para o enfrentamento do que é objeto desse caso penal: (1) Portaria de instauração de Inquérito Policial (mov. 1.1); (2) Boletim de Ocorrência (mov. 1.2); (3) Auto de Constatação Provisória de Lesões Corporais (mov. 1.5); (4) Laudo de Lesões Corporais (mov. 1.8); (5) Relatório da Autoridade Policial (mov. 6.1); e (6) Depoimentos extrajudiciais (movs. 1.3, 1.9 e 1.11). Com o oferecimento da denúncia (mov. 19), foram produzidos os seguintes documentos e provas: (7) Oitiva de informante e testemunha (movs. 90.2 e 90.3); e (8) Interrogatório do acusado (mov. 90.4). Relembro, nesse ponto, que a transcrição integral dos depoimentos prestados é dispensada, nos termos do art. 405, §2º, do CPP. Evitando, assim, transcrições desnecessárias, passarei a relatar os pontos mais relevantes daquilo que foi dito em sede extrajudicial e em audiência, para posteriormente enfrentar a questão sob a ótica da materialidade, autoridade, tipicidade, ilicitude e culpabilidade e, superadas elas, verificar a (in)existência de agravantes, atenuantes, causas de aumento, causas de diminuição de pena, e eventual concurso dos crimes. Adianto que não se trata de degravação ipsis litteris dos depoimentos colhidos, mas sim de transcrição indireta, que, evidentemente, se baseia nos relatos originais que foram gravados em mídias audiovisuais, as quais foram todas juntadas no processo e puderam ser acessadas pelas partes. A vítima J.T.S.F., ouvida em Juízo, disse que na data dos fatos saiu de casa e foi para a residência de sua mãe, mas como não tinha seus pertences, retornou à casa na qual convivia com o acusado. Lá, encontrou-o com dois rapazes, sendo que o réu estava escondido atrás da porta do quarto de seu filho. O ambiente estava escuro e os presentes faziam uso de bebida alcoólica e drogas. Ela e o acusado iniciaram uma discussão, momento em que ela pegou o ventilador e o acusado jogou-o. Nisso, a ofendida atirou um vidro de bebida em direção ao acusado. Ato contínuo, o réu foi para cima dela e arremessou o escorredor de louça em sua direção. Eles foram para a parte externa da casa, onde o réu puxou a vítima pelos cabelos. Além das agressões, ela confirmou que o acusado lhe ameaçou de morte. Atualmente, não mantem contato com o réu. A informante CICERA REGINA DA SILVA, ouvida em Juízo, contou que o réu estava fora de si e agrediu sua filha, tanto que presenciou ele puxando os cabelos de Jhenifer e desferindo socos e tapas nela. Afirmou ter visto que o acusado estava bebendo com outros dois rapazes e que réu disse que daria um tiro na sua cara, o que lhe amedrontou, tanto que ligou pela polícia. O acusado, ciente de suas garantias constitucionais e do teor da denúncia, de modo simples confirmou os fatos narrados na denúncia, e disse que não queria mais responder qualquer outro questionamento. Esse, assim, o quadro instrutório-probatório produzido que, de agora em diante, será analisado para aferir se há, ou não, elementos suficientes para condenar o acusado. Calha, aqui, também deixar claro que o Juízo analisará se foram preenchidos, para todos os delitos, a (a) materialidade, (b) autoria, (c) tipicidade, (d) ilicitude e (e) culpabilidade. A materialidade deve ser entendida como a ocorrência fenomenológica do comportamento humano, ainda despida da valoração a si atribuída pela teoria do crime. Desse modo, busca, ela, verificar se determinado fato ocorreu no mundo fenomênico. Por outro lado, a autoria é a vinculação subjetiva de determinados indivíduos com a materialidade anteriormente reconhecida, ainda sem a análise do conteúdo próprio da teoria do delito. A tipicidade, por seu turno, referente à adequação típica da conduta fenomenológica (materialidade) à previsão abstrata prevista em lei (tipicidade formal), deve ser averiguada em razão dos seus demais elementos, subjetivos, objetivos, e normativos, e também em razão do bem jurídico que a norma visa proteger (tipicidade material). Para que haja condenação, máxime criminal, é absolutamente necessário que não pairem dúvidas acerca de qualquer dos elementos configuradores dessa conduta típica. 2.2. Materialidade e Autoria Como se sabe, em infrações cometidas no âmbito doméstico, geralmente sem a presença de testemunhas presenciais, a palavra da vítima, quando coerente, apresenta relevante valor probatório, dá-se especial atenção aos relatos da ofendida, uma vez que tais crimes costumam ocorrer no interior dos lares, sem a presença de testemunhas. Não desconheço, portanto, que a Lei Maria da Penha inaugurou um verdadeiro sistema de proteção integral à mulher, evitando que delitos praticados no âmbito doméstico e familiar, usualmente sem a presença de testemunhas, permanecessem sem a devida apuração, restando impunes os autores de tão reprovável conduta. Um maior prestígio à palavra da vítima já era conferido pela jurisprudência às infrações penais praticadas na clandestinidade, entendimento este que também ganhou força com a vigência da Lei nº 11.340/2006. Com efeito, a condição especial de vulnerabilidade da mulher em situação de violência doméstica não passou despercebida por este Julgador, atento para as diretrizes do art. 4º, da Lei Maria da Penha. Nessa toada: PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. LESÃO CORPORAL EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. AUTORIA. RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA. MATERIALIDADE. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. EXAME DE CORPO DE DELITO. PRESCINDIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...) 3. O entendimento do Tribunal a quo está em consonância com a jurisprudência desta Corte que é firme no sentido de que a palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, possui relevante valor probatório, especialmente em crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher. 4. Esta Corte possui o entendimento de que, nos casos de lesão corporal em sede de violência doméstica, o exame de corpo de delito poderá ser dispensado quando subsistirem outras provas idôneas da materialidade delitiva, como ocorreu na hipótese dos autos. 5. "O Tribunal a quo destacou estar comprovado o crime de lesão corporal sofrido pela vítima. Desse modo, o pleito absolutório esbarra na Súmula 7/STJ" ( AgRg no AREsp n. 2.153.350/DF, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 4/10/2022). 6. Agravo regimental desprovido (STJ - AgRg no AREsp: 2285584 MG 2023/0022027-0, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 15/08/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/08/2023). AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DELITOS DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. 1. "A palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, possui relevante valor probatório, especialmente em crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher" ( HC n. 461.478/PE, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 12/12/2018). 2. Entenderam as instâncias ordinárias estar em comprovados os delitos de violação de domicílio e de descumprimento de medidas protetivas de urgência, considerando os depoimentos da vítima (em sede policial e judicial) e das testemunhas, salientando que, apesar de a vítima não ter se lembrado da data exata em que ocorreram os fatos, reiterou os mesmos detalhes dados em sede policial, no sentido de que "por diversas vezes, o acusado proferiu ameaças em seu desfavor e entrou clandestinamente em sua residência, oportunidades em que este pulava o muro do imóvel vizinho e adentrava no local". 3. Ainda, conforme consignado no acórdão proferido pelo Tribunal de origem, a vítima declarou em sede policial no dia 14/8/2018 que "há aproximadamente 15 (quinze) dias daquela data, o denunciado invadiu sua residência pulando a janela e, por não ter encontrado a ex-companheira no local, Jeferson dormiu em seu domicílio sem sua permissão". Por fim, consta do acórdão impugnado que as testemunhas ouvidas narraram a mesma dinâmica dos fatos. 4. Agravo regimental improvido (STJ - AgRg no HC: 788394 GO 2022/0382698-9, Relator: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 08/05/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/05/2023). APELAÇÃO CRIMINAL. AMEAÇA, VIAS DE FATO E LESÃO CORPORAL QUALIFICADA. ART. 129, § 9º, DO CP, NO ÂMBITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. LEI N.º 11.340/2006. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA RECURSAL DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. PALAVRA DA VÍTIMA, TESTEMUNHAS DOS POLICIAIS QUE ATENDERAM AO CHAMADO E LAUDO QUE COMPROVAM OS CRIMES DENUNCIADOS. PLEITO DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO DO RÉU AO PAGAMENTO INDENIZATÓRIO POR DANOS MORAIS À VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO EXPRESSO FORMULADO NA DENÚNCIA. DANO IN RE IPSA. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA ESPECÍFICA. AUSÊNCIA, ADEMAIS, DE COMPROVAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA PARA ARCAR COM O VALOR ARBITRADO. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS À DEFENSORA DATIVA. RECURSO NÃO PROVIDO (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0000069-50.2021.8.16.0139 - Prudentópolis - Rel.: SUBSTITUTA RENATA ESTORILHO BAGANHA - J. 03.02.2024). APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE AMEAÇA E CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO AMBAS NO CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA (NO ARTIGO 147, CP, E ARTIGO 21 DO DECRETO-LEI Nº 3688/41) INSURGÊNCIA DA DEFESA. PRETENSÃO DE FLEXIBILIZAÇÃO DAS CONDICIONANTES PARA O REGIME ABERTO. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DE EXECUÇÃO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS ESPECIAL RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DELITOS DE AMEAÇA E VIAS DE FATO. DOLO EVIDENCIADO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DA CONTRAVENÇÃO PENAL POR AUSENCIA DE PROVAS E DISCUSSÃO MÚTUA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO RESTOU COMPROVADO NOS AUTOS A MODERAÇÃO NO MEIO UTILIZADO PELO RÉU. IMPOSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA SUPOSTA EXCLUDENTE DE ILICITUDE. FIXAÇÃO HONORÁRIOS DEFENSOR DATIVO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0001087-31.2020.8.16.0143 - Reserva - Rel.: SUBSTITUTA RENATA ESTORILHO BAGANHA - J. 03.02.2024). APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO POR AMEAÇA E VIAS DE FATO AMBAS NO CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA (NO ARTIGO 147 caput DO CODIGO PENAL, ARTIGO 21 DA LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS E ART. 24-A DA LEI 11.340/2006. INSURGÊNCIA DA DEFESA. PEDIDO DE APLICAÇÃO DA DETRAÇÃO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO NESTA PARTE. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS ESPECIAL RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DELITOS DE AMEAÇA E VIAS DE FATO. DOLO EVIDENCIADO. RECURSO CONHECIDO EM PARTE, E NA PARTE CONHECIDA, NÃO PROVIDO (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0001295-57.2022.8.16.0171 - Tomazina - Rel.: SUBSTITUTA RENATA ESTORILHO BAGANHA - J. 03.02.2024). Obviamente que não se pretende revestir de sacralidade a palavra da mulher vítima de violência doméstica e familiar e, desta forma, suprimir os direitos do suposto autor do fato. Mas o intuito é, como escrevem Lavigne e Perlingeiro (in Lei Maria da Penha: comentada em uma perspectiva jurídico feminista. Lumen Juris, 2011): Ressignificar a palavra da mulher nesse contexto, expandindo-a na medida do devido processo legal, livre de representações muitas vezes trazidas aos autos por imaginário marcado por estereótipos e discriminações. De toda a sorte, a versão oferecida pelo ofendido não pode ser dotada de caráter absoluto, devendo ser valorada com temperamento quando apresentada contradições em seu teor e sempre em cotejo com todas as demais provas produzidas em Juízo. Como mencionado acima, a ocorrência dos fatos (=materialidade) é possível de ser extraída de alguns elementos produzidos nos autos que permitem concluir, com segurança, que no dia 27.04.2024, houve uma situação envolvendo a vítima, que causou nela escoriações abrasivas no dorso da mão esquerda com até 0,8 cm de diâmetro, além de nodulação subcutânea em região parietal do crânio com 2,0 cm. Além disso, a instrução processual foi bem sucedida em comprovar que, no mesmo contexto fático, a liberdade individual da vítima foi atacada, ao passo que foi ameaçada de morte pelo acusado. Quanto ao crime tipificado no art. 129, §13, do CP, destaco que efetivamente houve a juntada de Laudo de Lesões Corporais (mov. 1.8), que atestou a ocorrência de ofensa à integridade corporal ou à saúde da vítima, mediante instrumento contundente, resultando nos ferimentos acima descritos. Também foram juntadas fotografias (exame indireto) das lesões sofridas pela ofendida, que foram tiradas na Delegacia, na data dos fatos, conforme Auto de Constatação Provisória de Lesões Corporais (mov. 1.5). Já quanto ao crime do art. 147, do CP os depoimentos judiciais e extrajudiciais prestados pela ofendida e informante, sua genitora, são categóricos ao confirmar que as ameaças foram proferidas. Insta consignar, no ponto, que a “materialidade do delito” e “vestígios” não se confundem. A materialidade é inerente a todos os tipos penais, pois todos a possuem (por exemplo, a materialidade do crime de homicídio é o cadáver, da ameaça é justamente o proferir de ameaçar causar mal injusto e grave). Os vestígios nem sempre existem em toda e qualquer infração penal, tais como alguns crimes formais, como o delito de ameaça, injúria ou desacato, quando não expressos em algum lugar, apenas verbalizado. Deste modo, o “corpo de delito” consiste no apanhado de vestígios materiais ou sensíveis decorrentes do crime, assim, a palavra “corpo” não é exatamente o corpo de um indivíduo, mais sim o aporte de vestígios resultante da infração penal, restando seu conceito unido à materialidade do delito, tal como num crime de latrocínio em um apartamento, dentro desta conjectura o corpo de delito não se restringe somente ao cadáver, englobando todos os vestígios perceptíveis ao homem, a exemplo de marcas de sangue, a arma utilizada no crime e sinais de arrombamento. E, na espécie, o laudo pericial juntado demonstra de maneira satisfatória as lesões sofridas pela ofendida, indo ao encontro das fotografias e da prova oral colhida ao longo do feito. No mesmo sentido, os depoimentos colhidos durante a instrução e na fase pré-processual atestam que a ameaça foi articulada. Nesse cenário, registro que a análise das provas contidas nos autos, especialmente as declarações da vítima e as demais evidências apresentadas, demonstram de forma inequívoca a autoria e materialidade delitiva imputadas ao acusado. A vítima foi firme, em ambos os depoimentos (na Delegacia e em Juízo), ao afirmar que o réu, no dia dos fatos, a agrediu e ameaçou. Destaque-se que são aceitáveis pequenas divergências porventura apresentadas nos relatos da vítima na esfera policial e em Juízo, as quais em nada diminuem a credibilidade conferida a eles, notadamente quando tais declarações se harmonizam em pontos essenciais e divergem apenas em aspectos de somenos importância. Por óbvio, não se exige da ofendida memória sobre-humana, especialmente diante do contexto fático a que foi submetida, isto é, a intenso sofrimento psicológico, físico e momentos de tensão, nem tampouco que se recorde detalhadamente dos pormenores de cada agressão sofrida (física ou moral). Frisa-se que não há nos autos qualquer elemento que desqualifique a versão apresentada pela vítima, ou pela informante, não havendo motivos idôneos – nem sequer levantados nesse sentido – para imputarem falsamente pessoas inocentes, até porque à vítima, ofendida pela obra criminosa, não calha acusar inocentes. Ademais, o relato da informante que esteve presente na data dos fatos, ainda que breve, corrobora a versão inicialmente apresentada pela vítima, seja no que tange à existência de agressão física perpetrada pelo acusado, seja na ameaça por ele enunciada. O conteúdo desses depoimentos encontra ressonância nas evidências materiais, como as fotografias e o laudo pericial, que dão respaldo à narrativa de que houve agressão física ativa por parte do acusado, com resultado lesivo. Cumpre salientar que o laudo de lesão corporal descreve de maneira eficiente as lesões sofridas pela vítima, de modo que torna ainda mais robustas suas declarações. Calha pontuar, nesse ponto, que as lesões constantes na prova pericial guardam, sim, relação com a narrativa da ofendida. A extensão e local das lesões é condizente com o relato prestado pela vítima, especialmente no que diz respeito aos ferimentos na mão e no ombro. No que tange ao crime de ameaça, tal momento delitivo não foi registrado em arquivos de áudio e/ou vídeo, de modo que os depoimentos da vítima e informante, uníssonos, são suficientes para atestar a autoria e materialidade da infração penal. O denunciado, por sua vez, não trouxe nenhuma prova, seja documental, pericial ou testemunhal, que pudesse informar o contrário do que aqui comprovado. Pelo contrário, o próprio acusado limitou-se a confirmar seu envolvimento direto na situação, confirmando os fatos narrados na denúncia. A declaração do acusado admite a existência de lesões corporais e ameaça irrogada em desfavor da vítima, o que reafirma sua presença no cenário e o envolvimento direto no episódio violento, contribuindo, portanto, para a convicção segura acerca da autoria. Caberia ao denunciado demonstrar, minimamente (inclusive para suscitar razoável dúvida sobre o desenrolar dos fatos), que a narrativa da vítima (prestada na Delegacia e em Juízo) é inverídica. Contudo, não há, no conjunto probatório, circunstância capaz de desqualificar as versões apresentadas pela ofendida, que, inclusive, guardam relação com o laudo médico juntado e depoimento da informante. Importa lembrar que a manutenção da vida conjugal depende, evidentemente, da vontade de ambos os cônjuges. Não há como se obrigar alguém a permanecer em um relacionamento quando esse alguém não mais queira manter esse estado de coisas. Que fique claro desde logo: o ex-companheiro, o atual companheiro, o homem, ou qualquer outra pessoa (companheira ou não) não é dono da mulher; não pode mandar nela, e dizer o que ela pode, ou não, fazer, e muito menos agredi-la física ou verbalmente em razão de qualquer circunstância. O que impõe restrições à ação das pessoas é, tão somente, o governo das leis, que determinam aquilo que deve ser cumprido (respeitado o princípio da legalidade para o particular: fazer tudo aquilo que a lei não proíba). Não há, supostamente, lógica que razoavelmente permita, em uma relação que deve e deveria ser fulcrada sempre no afeto, especialmente diante da necessidade de resguardo das relações mútuas e recíprocas mantidas entre companheiros, permitir que eventuais desavenças, discussões e fins de relacionamento descabem para o desrespeito cuja manifestação mais oprobriosa se traduz naquela que fisicamente agride o outro, verbal ou fisicamente, e naquela que vise tornar a vontade do outro em elemento irrelevante, como se seus desejos - inclusive os de não mais se manter em convivência - embora dolorosos, não devessem ser respeitados e observados. Tudo isso, no ponto, permite concluir que o acusado foi, de fato, a pessoa que desferiu um chute na região do peitoral da ofendida, arremessou-lhe um ventilador, puxou-a pelos cabelos, desferiu-lhe tapas e a ameaçou de morte. Reconhecida a materialidade e a autoria, passo à análise das demais questões que dizem respeito à pretensão penal posta. 2.3. Tipicidade, Ilicitude e Culpabilidade O tipo da lesão corporal (art. 129, caput, do CP), exige que a integridade corporal ou a saúde de outrem sejam ofendidas pelo autor. A ofensa à integridade, física (corporal) ou de saúde, da vítima, ocorre quando o comportamento do agente causa, efetivamente, uma chaga, um dano, um machucado a esses elementos bio-corpóreo-psíquicos do ser humano. Trago à baila, aqui, os ensinamentos de Bento de Faria (in Código Penal brasileiro comentado: parte especial, v.3, pág. 85): O dano ao corpo ocorre quando a lesão determina qualquer prejuízo à integridade do conjunto orgânico da pessoa. Dano à saúde é a desordem causadas às atividades psíquicas ou ao funcionamento regular do organismo. No mesmo sentido, as lições de Paulo Cesar Busato (in Direito Penal Parte Especial 1, São Paulo: Atlas, 2014): Somente existe lesão corporal presentes tais ofensas [à integridade física ou à saúde], o que significa que, não demonstrada a aflição da integridade física ou da saúde, não é possível a condenação por lesão corporal. (...) A abrangência do termo integridade física é ampla, incluindo qualquer classe de dano, tanto anatômico quanto fisiológico. No que se refere à saúde, amplia-se ainda mais o conceito para incluir até mesmo danos psíquicos ou perturbações mentais que, sem dúvida, são representativos de uma redução na saúde da vítima. (...) Em suma, dentro da pretensão de relevância, inclui-se, além da ofensa à integridade ou à saúde corporais, também a ofensa à integridade e à saúde mentais. Muito embora a perícia realizada tenha constatado que as lesões causadas na ofendida foram de natureza grave, pois examinada a incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias, não há menção de tal fato na denúncia, bem como não foram formulados requerimentos a respeito dessa situação durante a instrução penal, seja pela defesa, seja pelo Parquet. No mais, o Juízo também não determinou a realização de diligências nesse sentido, em observância ao preceito da equidistância entre as partes/imparcialidade na condução do feito. Assim, finda a instrução penal, a natureza aparentemente grave do delito perpetrado pelo réu não poderá ser valorada para fins da condenação penal, inclusive sob pena de ofensa ao postulado da congruência (i.e., não é possível julgar fora ou além dos elementos fáticos descritos e discutidos nos autos). Não obstante, tal circunstância não retira a validade do laudo produzido como meio de prova, já que suficientemente comprova a ofensa à integridade física da vítima por ocasião da ação do acusado. O referido laudo, aliado ao Auto de Constatação Provisória de Lesões Corporais, no qual constam fotografias tiradas na data da comunicação da ocorrência, ou seja, na data dos fatos, comprovam o prejuízo à integridade fisiológica da vítima. Por outro lado, o elemento subjetivo do tipo penal de ameaça (art. 147, CP) consiste no dolo do agente de anunciar, por atos, gestos ou palavras, de praticar à vítima um mal injusto e grave, que pode ser um dano físico, econômico ou moral. Pouco importa a real intenção em fazer valer a ameaça, ou seja, é dispensável que o autor efetivamente cumpra a promessa de mal, sendo suficiente a finalidade e capacidade de infundir medo na vítima. Além disso, leciona Guilherme de Souza Nucci (in Código Penal Comentado. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 730): (...) É indispensável que o ofendido efetivamente se sinta ameaçado, acreditando que algo de mal lhe pode acontecer, por pior que seja a intimidação, se ela não for levada a sério pelo destinatário, de modo abalar-lhe a tranquilidade de espírito e a sensação de segurança e liberdade, não se pode ter por configurada a infração penal. Afinal, o bem jurídico protegido não foi abalado. O fato de o crime ser formal, necessitando somente de ameaça ser proferida, chegando ao conhecimento da vítima para se concretizar, não afasta a imprescindibilidade do destinatário sentir-se, realmente, temeroso. Extrai-se, portanto, que a configuração da figura típica exige que a vítima, ao ter conhecimento da ameaça, sinta efetivo temor de que esta venha a se concretizar, sob pena de atipicidade. Da instrução probatória, assim, reputo ser o caso de reconhecer a conduta típica prevista no art. 147, do CP, já que a vítima se sentiu ameaçada pelas palavras proferidas pelo acusado na mesma circunstância das lesões corporais por ele perpetradas. No mesmo sentido, a informante também consignou tal amedrontamento, asseverando que em razão disso ligou para a polícia. Assim, verifica-se que as condutas do acusado foram causas suficientes e eficientes para a produção dos resultados lesivos, evidenciando-se, com isso, a presença do nexo causal. Para mais, cabem alguns apontamentos sobre a Lei n.º 14.994/2024, que alterou a pena dos crimes previstos no art. 129, §13, e art. 147, ambos do CP (entre outras alterações relevantes no âmbito do combate à violência contra a mulher). A nova lei entrou em vigor no dia 09 de outubro de 2024, e a principal alteração, de fato, foi transformar o feminicídio em um crime autônomo no Código Penal, agora tipificado no art. 121-A, aumentando a pena mínima de 12 (doze) para 20 (vinte) anos, com um teto de até 40 (quarenta) anos. Além disso, o crime foi consolidado como hediondo, o que impede benefícios como liberdade condicional e exige que o condenado cumpra pelo menos 55% (cinquenta e cinco por cento) da pena antes de progressão de regime, inclusive para acusados primários. Outra inovação significativa foi a ampliação do conceito de violência de gênero, que agora inclui explicitamente motivações baseadas em "menosprezo ou discriminação à condição de mulher", abrangendo tanto agressões físicas quanto psicológicas e emocionais. Como mencionado, um dos pontos relevantes foi a modificação do art. 129, §13, e art. 147, ambos do CP, que tratam da lesão corporal e ameaça praticadas no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, respectivamente. Com a nova redação, houve um aumento significativo da pena para os casos de lesão corporal e ameaça qualificadas por razões de gênero. Agora, as condutas que envolvem violência doméstica, especialmente aquelas motivadas pela condição do sexo feminino, como já ocorre no feminicídio, passaram a ser punidas de maneira mais rigorosa, com previsão de agravamento das penas. Para melhor compreensão e diferenciação, veja-se a diferença entre as alterações promovidas pela Lei nº 14.188/2021 e Lei n.º 14.994/24: Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: § 13. Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código: (Incluído pela Lei nº 14.188, de 2021) Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro anos). (Incluído pela Lei nº 14.188, de 2021) (...) Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: § 13. Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código: (Incluído pela Lei nº 14.944, de 2024) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. (Incluído pela Lei nº 14.944, de 2024) Todavia, à luz do princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa, aos delitos praticados antes do dia 09 de outubro de 2024, não podem ser aplicadas as penas previstas na Lei n.º 14.994/24, uma vez que a previsão contida na Lei n.º 14.188/2021, é mais benéfica ao acusado. A irretroatividade da lei penal maléfica é um princípio que tem previsão na Constituição Federal, precisamente em seu art. 5, XL. No campo doutrinário, consoante o magistério dos autores Luiz Flávio Gomes e Valério de Oliveira Mazzuoli "qualquer que seja o aspecto disciplinado do Direito penal incriminador (que cuida do âmbito do proibido e do castigo), sendo a lei nova prejudicial ao agente, não pode haver retroatividade" (in Direito Penal: Comentários à Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. Org. por Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha. São Paulo: RT, 2008). No presente feito, os fatos foram praticados ainda no período de vigência da Lei nº 14.188/2021, de modo que deve ser afastada a incidência das alterações promovidas pela Lei n.º 14.994/2024. E, nos termos do art. 5º, da LMP, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Por sua vez, o art. 7º, da Lei nº 11.340⁄06, estabelece os vetores para a interpretação das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, dentre os quais se encontram a violência psicológica, consubstanciada quando a pessoa com a qual a mulher conviva lhe cause danos emocionais, diminua sua autoestima, prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento, degrade ou controle suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante uma séria de atos, lhe causem prejuízos à saúde psicológica e à autodeterminação; a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade física ou saúde corporal; bem como a violência patrimonial, referente à atos que busquem reter, subtrair, destruir objetos de propriedade da mulher, inclusive seus bens, valores e direitos ou recursos econômicos; e a violência moral, voltada ao acinte à honra objetiva e subjetiva da pessoa; bem como a violência sexual, referente à atos que constranjam a pessoa a presenciar, manter, ou participar de relação sexual não desejada, por qualquer meio de coação, uso de força ou forma que obrigue a mulher a fazer algo que não pretende. Assim, o que se exige para configuração da violência doméstica prevista no inciso I, do §2º-A, do art. 121, do CP, é a prática de alguma das condutas do art. 7º, da LMP, em uma das hipóteses do art. 5º, também da Lei n.º 11.340/06. No caso, verifica-se que houve menção expressa, na denúncia, ao fato de que a vítima era ex-convivente do acusado, o que possibilita o reconhecimento de que os crimes foram cometidos no âmbito doméstico e familiar contra a mulher. Insta destacar que a agressão física, voltada a ofensa à integridade ou saúde do corpo humano de outro indivíduo, e a agressão verbal, voltada a ofensa à integridade emocional, psicológica e moral de outrem, não se isentam diante de discussões ou desacertos havidos no ambiente familiar e, em razão disso, são punidas de forma mais rigorosa, tendo em conta não ser aceita pela sociedade nesse ambiente. Como dito pela vítima em audiência (corroborado por aquilo que por ela mencionado na fase inquisitorial), e analisando, ainda, o que consta no laudo pericial, nas fotografias e o depoimento da informante, houve, sim, ofensa à sua integridade física e psicológica, o que permite concluir ter havido, sim, a prática do crime de lesão corporal e ameaça. Lembro, aqui, que a conduta, por expressa previsão legal, somente será imputada penalmente a alguém quando haja dolo ou culpa, e, neste caso, somente quando a lei expressamente autorizar a punição pelo crime culposo (art. 18, e §ún, do CP). E, no caso, há provas seguradas e indubitáveis de que o acusado causou lesões corporais e proferiu a ameaça de modo doloso, com intenção de fazê-los. Existem elementos suficientes para demonstração do dolo, elemento constante na tipicidade para configuração de determinação ação (ainda despida da valoração jurídico-penal) como delitiva. Possível, desse modo, se reconhecer a tipicidade da conduta do acusado. Reconhecida a tipicidade que, para a teoria finalista, adotada pelo nosso ordenamento penal, atua como ratio cognoscendi da ilicitude (em contrário à teoria da ratio essendi, pela qual a tipicidade só se configura quando há, também, ilicitude – tipo total do injusto), só não estará ela presente quando existente alguma das causas que a excluem (art. 23, do CP). Nesse contexto, em que pese a vítima tenha afirmado que entrou em uma discussão com o acusado, o que resultou nas agressões físicas e verbais perpetradas pelo réu, em momento algum se evidenciou, de forma concreta e minimamente plausível, que a vítima tenha agido com violência física contra o acusado, capaz de justificar a reação dele, consistente em desferir um chute na vítima, jogar um ventilador em sua direção, puxa-la pelos cabelos, golpeá-la com tapas e a ameaçar de morte. Dessa forma, concluir que a mera discussão acalorada teria provocado uma reação emocional tão intensa não se presta a legitimar a conduta física subsequente, sob pena de naturalizar o escalonamento da violência, em uma lógica absolutamente incompatível com o ordenamento penal. Essa conclusão conduziria inevitavelmente à banalização da agressão física como forma aceitável de resolver conflitos interpessoais, abrindo espaço, por exemplo, para que um insulto verbal enseje uma agressão física, ou que um simples empurrão seja respondido com o uso de arma branca ou de fogo. Essa perspectiva, evidentemente, colide com os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e, sobretudo, com a vedação à autotutela pela força, pilares do Estado Democrático de Direito. Não há que se falar, portanto, em excludente de ilicitude, sendo certo que as condutas imputadas devem ser analisadas sob o prisma do dolo do agente e da proteção especial conferida à mulher no âmbito das relações domésticas. Assim, considerando a inexistência de qualquer das suas causas excludentes, resta demonstrada a presença da ilicitude no caso em comento. Para teoria finalista do crime, a culpabilidade é a soma da imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e inexigibilidade de conduta diversa. O acusado possuía mais de 18 (dezoito) anos de idade na época dos fatos e não há qualquer alegação de sofrer de causa que o tornasse inteiramente incapaz de entender, em tese, o caráter ilícito dos fatos. Não há causa de justificação a ser reconhecida capaz de excluir a ilicitude da conduta. Por outro lado, ao tempo do fato, o acusado era imputável, tinha consciência da ilicitude de sua conduta e dele era plenamente exigível uma conduta diversa. Nesse âmbito, registro que a embriaguez do acusado não exclui a imputabilidade penal, ainda que seja completa, nos termos do art. 28, II, do CP, posto que não foi comprovada ser proveniente de caso fortuito ou força maior, mas sim ação voluntária do réu. Sobre isso, ainda que se comprovasse a embriaguez voluntária completa do acusado, não seria inimputável, em razão da teoria actio libera in causa, como leciona Cezar Roberto Bitencourt (in Tratado de Direito Penal, parte especial, Rio de Janeiro: Saraiva, 2025): A problemática da actio libera in causa caracteriza-se naqueles casos em que o agente é inimputável no momento da realização da conduta típica, havendo agido dolosa ou culposamente em um momento anterior, em que ainda era um sujeito imputável. Em sentido semelhante, Muñoz Conde sustenta que a actio libera in causa abrange os casos em que o agente não era imputável no momento de cometer o fato, mas o era no momento em que planejou cometê-lo ou no momento em que deu início ao processo causal que resultou na ação típica20. Para que a valoração desses supostos não constitua uma arbitrária violação do princípio de culpabilidade, é necessário estabelecer uma relação entre os atos praticados antes do estado de inimputabilidade e o resultado típico finalmente produzido. Essa relação se estabelece quando o agente coloca-se voluntariamente em estado de inimputabilidade que representa um risco não permitido para o bem jurídico, que é, previsivelmente, adequado para a produção do resultado típico. (...) Dessa forma, é possível fundamentar a culpabilidade desse indivíduo — assim como nos demais casos de actio libera in causa — na medida em que aquele era imputável quando deu início ao processo causal que, de maneira previsível, poderia resultar nas lesões corporais. Mas definição da natureza da infração, dolosa ou culposa, decorre do estado de ânimo quando o agente colocou-se em estado de inimputabilidade, e não no momento em que pratica a infração penal, ao contrário do que prevê nosso Código Penal. Transportando a lição do doutrinador para o caso em tela, conclui-se que mesmo que o acusado estivesse completamente embriagado no momento que praticou os crimes de ameaça e lesão corporal, ainda permanece com sua condição de imputável, uma vez que o dolo é analisado no momento em que se colocou no estado de embriaguez, não no momento em que praticou a conduta. Necessária, portanto, a condenação do acusado pela prática dos crimes em apreço. 2.4. Atenuantes e Agravantes De início, imperioso mencionar que, por meio do que decidido no REsp n.º 1.972.098, o STJ firmou entendimento de que deve, sempre, haver redução de pena nas hipóteses em que o acusado confessar a autoria delitiva perante a autoridade judicial, independentemente de sua confissão ter sido utilizada como um dos fundamentos da condenação e malgrado a confissão seja parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada. Nesse sentido, reconhece-se que, mesmo no caso de confissão qualificada ou parcial, pode-se aplicar a atenuante da confissão espontânea. Contudo, tal entendimento deve ser cotejado com o recente posicionamento do Plenário do STF na Revisão Criminal n.º 5.548. Nessa decisão, o Supremo Tribunal Federal fixou o entendimento de que, para o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, prevista no art. 65, III, d, do CP, a confissão deve ser realizada de forma genuína, com o intuito de colaborar com a Justiça e elucidar a verdade dos fatos. Na espécie, verifica-se que o acusado, em Juízo, confessou a prática dos crimes, confirmando os fatos narrados na denúncia. Embora não tenha respondido perguntas do Juízo, da acusação ou da defesa, tal fato não deve sopesar em desfavor do acusado, na medida em que sua confissão, embora concisa, prestou-se a colaborar com a elucidação da verdade dos fatos; Dessa forma, tendo em vista que o acusado confirmou os fatos narrados na denúncia, é possível o reconhecimento da atenuante da confissão. Por outro lado, analisando a certidão de antecedentes, verifico que o acusado é primário e não possui anotações anteriores transitadas em julgado. Ainda, necessária a aplicação da agravante prevista no art. 61, II, f, do CP, pois embora a relação de cônjuges e a violência de gênero já integrem o próprio tipo penal previsto no art. 129, §13, do CP, tratando-se de violência praticada no âmbito doméstico e familiar, o crime foi praticado por força da coabitação. Cabível, aliás, mencionar que a adequada interpretação da tese fixada no Tema n.º 1197 dos Repetitivos do STJ permite, eventualmente, sua aplicação para a figura do art. 129, §13, do CP: A aplicação da agravante do art. 61, inc. II, f, do Código Penal (CP), em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006), não configura bis in idem. Isso porque como se verifica das razões de decidir e do voto do Min. Og Fernandes a lógica lançada foi uma que buscava cenário em que a conduta do agressor independia do gênero, enquanto que o art. 61, II, f, do CP, apontava agravante que dependia do gênero: Ao contrário daquilo que consta no acórdão recorrido, não há bis in idem, porque a agravante genérica prevista na alínea f do inc. II do art. 61 do Código Penal (CP), inserida pela alteração legal da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), objetiva uma sanção punitiva maior quando a conduta criminosa é praticada "com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica" (destaquei), enquanto as elementares do crime de lesão corporal tipificado no art. 129, § 9º, do Código Penal, traz a figura da lesão corporal praticada no espaço doméstico, de coabitação ou de hospitalidade, contra qualquer pessoa independente do gênero, bastando ser ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem o agente conviva ou tenha convivido, ou seja, as elementares do tipo penal não fazem referência ao gênero feminino da vítima, enquanto o que justifica a agravante é essa condição de caráter pessoal (gênero feminino - mulher). A cabeça do art. 61 do Código Penal estabelece que as circunstâncias agravantes genéricas sempre devem ser observadas na dosimetria da pena, desde que não constituem ou qualificam o crime. No presente caso a circunstância que agrava a pena é a prática do crime de violência doméstica contra a mulher, enquanto a circunstância elementar do tipo penal do art. 129, § 9º, do Código Penal, não faz nenhuma referência ao gênero feminino, ou seja, a melhor interpretação é aquela que atende a função social da Lei, e, por isso, deve-se punir mais a lesão corporal contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, se a vítima for mulher (gênero feminino), haja vista a necessária aplicação da agravante genérica (art. 61, inc. II, alínea f, do CP). Em essência, portanto, o que isso quer significar é que (a) se houver coabitação ou prevalência das relações domésticas, e (b) houver violência cometida com base no gênero será possível a aplicação conjunta da qualificadora (seja do §9º seja do §13 do art. 129 do CP) com a agravante do art. 61, II, f, do CP. Nessa linha: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO QUE NÃO ATACOU, ESPECIFICAMENTE, TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL NA ORIGEM. APLICABILIDADE DA SÚMULA N. 182/STJ. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DOSIMETRIA. AGRAVANTE DO ART. 61, INCISO II, ALÍNEA F, DO CÓDIGO PENAL. DISPOSIÇÕES DA LEI N. 11.340 /2006. APLICAÇÃO CONJUNTA. NÃO OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 3. Consoante orientação desta Corte Superior, a aplicação da agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea f, do Código Penal de modo conjunto com outras disposições da Lei n. 11.340/2006 não consubstancia bis in idem, pois a Lei Maria da Penha visou recrudescer o tratamento dado para a violência doméstica e familiar contra a mulher. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.711.272/MA, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 22/10/2024, DJe de 29/10/2024). Assim, dado que a vítima confirmou que ambos residiam juntos na época dos fatos, tendo ela deixado a residência poucos dias antes do ocorrido, tendo retornado justamente para retirar seus pertences, aplicável, sem configurar bis in idem, ambas as figuras. Fica claro, portanto, que deve ser reconhecida não só a atenuante da confissão espontânea, mas também a agravante do art. 61, II, f, do CP. Tratando-se de concurso entre a atenuante e agravante nominadas, é possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação entre elas. Nessa toada: DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL E CRIME DE DANO NO ÂMBITO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. INSURGÊNCIA DO RÉU. CONHECIMENTO PARCIAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. CÓPIA LITERAL DAS ALEGAÇÕES FINAIS. AUSÊNCIA DE EMBATE À DECISÃO RECORRIDA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE QUE NÃO COMPORTA REDUÇÃO. CRIME MOTIVADO POR CIÚMES. CIRCUNSTÂNCIA CORRETAMENTE VALORADA DE FORMA NEGATIVA. APLICAÇÃO DA AGRAVANTE DO ART. 61, II, “f”, CP E DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. NECESSIDADE DE COMPENSAÇÃO. RECÁLCULO DA PENA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS QUE COMPORTA MANUTENÇÃO. VALOR MINORADO. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame1. Apelação criminal interposta contra sentença condenatória de procedência da denúncia oferecida pelo Ministério Público, condenando o réu às sanções do art. 129, §13, e art. 163, parágrafo único, inciso I, c/c art. 61, inciso II, alínea “f”.II. Questão em discussão2. A questão em discussão consiste em saber se o recurso deve ser conhecido, se a dosimetria da pena merece alteração e se a indenização por danos morais deve ser mantida, bem como se o seu valor é adequado. III. Razões de decidir3. O recurso não deve ser conhecido em sua integralidade, porque é manifesta a ofensa ao princípio da dialeticidade, na medida em que as razões recursais não apresentam embate à sentença. A admissibilidade é positiva somente em relação à dosimetria da pena (1ª e 2ª fase) e indenização por danos morais. 4. A pena foi fixada corretamente pelo magistrado na primeira fase da dosimetria, ao valorar negativamente o motivo do crime, que ocorreu por ciúmes. 5.Na segunda fase, em relação ao crime de dano, foi aplicada a agravante do art. 61, inciso II, alínea “f”, bem como a atenuante da confissão, do art. 65, inciso III, alínea “d”, ambos do Código Penal. Assim, é necessária a compensação da agravante e atenuante, com o recálculo da pena. 6. A indenização por danos morais comporta manutenção e seu valor é passível minoração, tendo em vista as peculiaridades do caso e a capacidade econômica do condenado. IV. Dispositivo e teseApelação conhecida em parte e parcialmente provida.Tese de julgamento: “1. O recurso não deve ser conhecido em parte, tendo em vista a ofensa ao princípio da dialeticidade recursal, ante a não apresentação de embate à decisão recorrida. 2. A dosimetria da pena deve ser mantida, quando devidamente justificada pelo magistrado julgador. 3. A agravante e a atenuante aplicadas precisam ser compensadas entre si no cálculo da pena. 4. A indenização por danos morais fica mantida, porque expressamente requerida. O seu valor comporta minoração para que passe a ser compatível com as particularidades do caso e porte econômico do condenado”.Dispositivos relevantes citados: art. 65, inciso III, alínea “d”, CP; art. 61, II, “f”, CP; art. 129, §13, CP; art. 163, parágrafo único, inciso I, CP. Jurisprudência relevante citada: STJ - AgRg no HC 581.240/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 09/06/2020, DJe 17/06/2020; TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0075098-30.2020.8.16.0014 - Londrina - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU MAURO BLEY PEREIRA JUNIOR - J. 15.03.2025; REsp 1643051/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/02/2018, DJe 08/03 /2018. (TJPR - 1ª Câmara Criminal - Núcleo de Atuação (Lei Maria da Penha) - 0000113-52.2024.8.16.0143 - Reserva - Rel.: JUÍZA DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUÍZAADOS ESPECIAIS MARIA FERNANDA SCHEIDEMANTEL NOGARA FERREIRA DA COSTA - J. 24.05.2025). Dessa forma, necessária a compensação entre a agravante do crime praticado com violência contra a mulher e a atenuante da confissão espontânea. 2.5. Causas de Aumento e/ou de Diminuição Inexistem causas de aumento e/ou de diminuição a serem sopesadas na terceira fase da aplicação da pena. 2.6. Concurso de Crimes Ressalto que, aqui, deve ser feita a distinção entre ação e ato da ação, condutas dentro de um mesmo contexto fático. Nesse sentido: Além do aspecto próprio de cada definição, é preciso salientar que a ação pode ser composta por um ou vários atos. Os atos são, portanto, os componentes de uma ação e dela fazem parte. Isso quer dizer que os atos que compõem uma ação não são ações em si mesmos, mas sim partes de um todo (in Rogério Greco, Curso de Direito Penal: Parte Geral, 15ªed., Impetus: Niterói, 2013, pág. 590). O conceito de conduta a ser levado em consideração, como dizia Jescheck, efetivamente diz respeito à unidade significativa composta por uma sucessão de atos (in Paulo Cesar Busato, Direito Penal Parte Geral, Atlas: São Paulo, 2013, pág. 921). Como se sabe, os delitos previstos nos arts. 129, §13 e 147, ambos do Código Penal, são autônomos, não sendo um o meio de consumação do outro. Nesse ponto, se faz necessária breve análise acerca da (im)possibilidade de reconhecimento do princípio da consunção entre os crimes em análise. Segundo o Superior Tribunal de Justiça: (...) de acordo com o princípio da consunção, haverá a relação de absorção quando uma das condutas típicas for meio necessário ou fase normal de preparação ou execução do delito de alcance mais amplo" (HC 156621/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 15/06/2010, DJe 02/08/2010). Para a aplicação do princípio da consunção, é necessário que a conduta de um dos crimes seja fase de preparação do outro, o que não é o caso dos autos. Por esse postulado (também chamado de "princípio da absorção"), aplica-se a pena do delito mais grave, que absorve o delito menos grave, ou seja, há o englobamento da conduta menos grave pela outra de maior relevância, por ser a primeira ato necessário para se consumar a segunda, ou seja, a primeira ação consiste em meio necessário, quer preparatório, quer de execução, para a prática de outra mais grave. Esse é o ensinamento de Cezar Roberto Bitencourt (in Tratado de direito penal: parte geral. 17ª ed. São Paulo): Pelo princípio da consunção, ou absorção, a norma definidora de um crime constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Em termos bem esquemáticos, há consunção quando o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais abrangente, aplicando-se somente esta. Na relação consuntiva, os fatos não se apresentam em relação de gênero e espécie, mas de minus e plus, de continente e conteúdo, de todo e parte, de inteiro e fração. (...) A norma consuntiva exclui a aplicação da norma consunta, por abranger o delito definido por esta. Há consunção, quando o crime-meio é realizado como uma fase ou etapa do crime-fim, onde vai esgotar seu potencial ofensivo, sendo, por isso, a punição somente da conduta criminosa final do agente. É cediço que, para aplicação do princípio da consunção, ou absorção, é necessário que a norma definidora de um crime constitua meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Consoante entendimento do e. STJ, com esteio no princípio da consunção, haverá a absorção de um delito pelo outro quando uma das condutas típicas for considerada como meio necessário ou fase normal de preparação ou execução do delito de alcance mais amplo (HC 97872/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJE 21.09.2009). Oportuna a lição de Flávio Augusto Monteiro de Barros (in Direito Penal. Parte geral v. 1, 7. ed. São Paulo: Saraiva): Dá-se consunção quando a norma incriminadora de fato que é meio necessário, fase normal de preparação ou execução, ou conduta anterior ou posterior de outro crime, é excluída pela norma deste. Quando as normas violadas têm o mesmo fim prático, qual seja, a proteção de um bem jurídico genérico, a norma protetiva do grau maior de violação desse bem jurídico absorve as outras. Tal ocorre porque a reação contra a ofensa do bem jurídico menos vasto se efetiva pela aplicação da sanção prevista para a defesa do bem jurídico mais extenso, que o agente também violou. Noutras palavras, a sanção cominada pela norma consuntiva serve também para a violação da norma consumida, evitando, destarte, o bis in idem. Há entre os delitos relação de magis para minus, isto é, de continente para conteúdo. Diante da sanção prevista para a violação do bem jurídico mais extenso, torna-se desnecessária a sanção cominada à violação do bem jurídico menos vasto. Dessa maneira, não há que se falar em consunção entre os delitos em questão. O crime-fim não absorve o crime-meio, pois ambos são crimes perfeitos. Não há dupla imputação do mesmo elemento subjetivo, porque, embora conexos, são, por definição, distintos. Assim, descabida a aplicação do princípio da consunção, pois os delitos de lesão corporal e ameaça tutelam bens jurídicos distintos: enquanto aquele protege a integridade física do indivíduo, este visa a liberdade individual. Os crimes em comento, além de consumarem-se em momentos distintos e tutelam bem jurídicos diferentes - enquanto no delito de lesão corporal o bem jurídico tutelado é a incolumidade física do indivíduo, no crime de ameaça o que se busca tutelar é a liberdade individual da pessoa. Outro não seria o entendimento do e. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE LESÃO CORPORAL E AMEAÇA NO ÂMBITO DOMÉSTICO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA DEFESA. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INVIABILIDADE. DESÍGNOS AUTÔNOMOS. PEDIDO DE AFASTAMENTO OU REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. RECRUSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.I. CASO EM EXAME1. O AGENTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DENUNCIOU O ACUSADO PELOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 129, § 9º, E 147, CAPUT, AMBOS DO CÓDIGO PENAL, COM FUNDAMENTO NA LEI MARIA DA PENHA.2. PROFERIDA SENTENÇA CONDENATÓRIA EM 30/04/2024, IMPONDO AO RÉU A CONDENAÇÃO PELOS CRIMES IMPUTADOS E FIXANDO INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EM FAVOR DA VÍTIMA.3. A DEFESA APELOU, PLEITEANDO A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO PARA ABSORVER O CRIME DE AMEAÇA PELO CRIME DE LESÃO CORPORAL, BEM COMO A REDUÇÃO OU AFASTAMENTO DO VALOR ARBITRADO A TÍTULO DE DANOS MORAIS.4. O MINISTÉRIO PÚBLICO MANIFESTOU-SE PELO CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.5. A PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA OPINOU PELO CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO DO APELO.II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO6. A QUESTÃO EM DISCUSSÃO CONSISTE EM SABER SE O CRIME DE AMEAÇA DEVE SER ABSORVIDO PELO CRIME DE LESÃO CORPORAL, NOS TERMOS DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO, E SE O VALOR ARBITRADO A TÍTULO DE DANOS MORAIS É PASSÍVEL DE REVISÃO OU AFASTAMENTO.III. RAZÕES DE DECIDIR7. O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO EXIGE RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ENTRE OS CRIMES PRATICADOS, O QUE NÃO SE VERIFICA NO CASO CONCRETO. AS CONDUTAS DO RÉU DEMONSTRAM DESÍGNIOS AUTÔNOMOS ENTRE AS AMEAÇAS E A LESÃO CORPORAL PERPETRADA, INVIABILIZANDO A ABSORÇÃO.8. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE INDICAM QUE, QUANDO HÁ PLURALIDADE DE INFRAÇÕES, COM ATOS DISTINTOS, NÃO SE JUSTIFICA A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO.9. QUANTO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, A JURISPRUDÊNCIA DO STJ RECONHECE QUE, EM CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, O DANO MORAL É PRESUMIDO, BASTANDO PEDIDO EXPRESSO DA PARTE INTERESSADA OU DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA SUA FIXAÇÃO, INDEPENDENTEMENTE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA.10. O VALOR ARBITRADO OBSERVA OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, NÃO HAVENDO RAZÃO PARA SUA REVISÃO OU AFASTAMENTO. IV. DISPOSITIVO E TESE11. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.12. TESE DE JULGAMENTO: "O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO É INAPLICÁVEL QUANDO OS CRIMES DE AMEAÇA E LESÃO CORPORAL, COMETIDOS NO ÂMBITO DOMÉSTICO, RESULTAM DE DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, É POSSÍVEL A FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS SEM NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA, DESDE QUE HAJA PEDIDO EXPRESSO." (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0005006-93.2022.8.16.0131 - Pato Branco - Rel.: SUBSTITUTO EVANDRO PORTUGAL - J. 22.03.2025) Portanto, não há que se falar em consunção entre os delitos previstos nos arts. 129, §13 e 147, ambos do CP. Como os crimes foram praticados cada um deles com vontades independentes entre si, cabível a incidência da norma do art. 69, do Código Penal. Aliás, mesmo reconhecendo que os delitos descritos no primeiro e segundo fato foram praticados dentro do mesmo contexto de tempo e lugar, ainda assim aplicar-se-ia a soma das penas por conta do reconhecimento dos desígnios autônomos na realização de cada uma das condutas. Nesse ponto, filio-me ao entendimento de que a produção de resultados autônomos implica na regra do concurso material, com a consequente cumulação das penas. 3. Dispositivo Ante o exposto, julgo procedente a pretensão punitiva exposta pelo ilustre representante do Ministério Público nesta denúncia, com fulcro no art. 387, do CPP, para os fins de condenar o acusado FELIPE WODZIK RODRIGUES pela prática dos delitos previstos no art. 129, §13, e art. 147, caput, ambos do CP (com redação dada pela Lei n.º 14.188/21), no âmbito da Lei Maria da Penha. Diante da adoção, pelo Código Penal, do critério trifásico de Hungria (art. 68, do CP), passo à dosimetria da pena, relembrando que a sua individualização é garantia constitucional (art. 5º, XLVI, CF/88), e que o acusado deve responder não pelo que é (direito penal do autor), mas pelo que fez (direito penal do fato), conforme preleciona Zaffaroni. 4. Dosimetria da Pena 4.1. Fato 01 – Art. 129, §13, do CP. Na primeira fase de dosimetria penal, analiso as circunstâncias judiciais do art. 59, do CP. Ressalte-se, por oportuno, que inexiste um critério puramente aritmético na primeira fase da dosimetria, cabendo ao Magistrado, a quem a lei confere certo grau de discricionariedade, sopesar cada circunstância judicial desfavorável à luz da proporcionalidade, consoante seu prudente arbítrio. A culpabilidade, vista como reprovabilidade da conduta do agente, não merece valoração negativa. No que diz respeito aos antecedentes, não há registro de condenação anterior. Não há elementos nos autos a respeito da conduta social no meio e comunidade em que vive e inexiste, também, laudo psicológico que ateste a personalidade do acusado (mesmo que exista jurisprudência do STJ no sentido de que o cometimento de atos infracionais seria elemento a demonstrar a personalidade afeta ao crime, reputo inviável o reconhecimento dessa vetorial, tendo em conta o desconhecimento técnico do Juízo no assunto, de modo que aplica-la seria permitir a analogia in malam partem, como, aliás, também já decidido pelo STJ, vide HC 175.280; HC 190.569; HC 117.497; e HC 86.866) e não havendo elementos nesse sentido e conhecimento técnico do Juízo para sua valoração, deixo de considera-las, inclusive por conta do conteúdo do Tema n.º 1.077 dos Repetitivos do STJ. Os motivos da prática do delito não pesam negativamente. As circunstâncias do crime são anormais à figura típica e merecem valoração negativa, já que o acusado estava embriagado no momento delitivo. Não há que se falar em comportamento da vítima. Partindo-se, assim, do mínimo legal cominado em abstrato para o crime em questão, previsto no art. 129, §13, do CP, com redação dada pela Lei n.º 14.188/21 (reclusão, de 1 a 4 anos), e da diferença entre o mínimo e o máximo (cf. já decidido pelo STJ, vide AgRg nos EDcl na PET no REsp n.º 1.852.897, no AgRg no REsp n.º 1.986.657, AgRg no REsp n.º 1.919.781, AgRg no AREsp n.º 1.865.291, AgRg no REsp n.º 1.898.916, AgRg no HC n.º 647.567, dentre vários outros) dessas condenações, havendo uma vetorial negativa (circunstâncias), recrudesço a pena em 1/8 (o que equivale a 4 meses e 15 dias) e fixo a pena-base em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Na segunda fase da dosimetria, há compensação integral entre a agravante prevista no art. 61, II, f, do CP, e a atenuante da confissão espontânea, disposta no art. 65, III, d, do CP. Sendo assim, fixo a pena intermediária em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. No mais, não incidem causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual fixo a pena definitiva em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. 4.2. Fato 02 – Art. 147, caput, do CP Na primeira fase de dosimetria penal, analiso as circunstâncias judiciais do art. 59, do CP. Destaco, novamente, que inexiste um critério puramente aritmético na primeira fase da dosimetria, cabendo ao Magistrado, a quem a lei confere certo grau de discricionariedade, sopesar cada circunstância judicial desfavorável à luz da proporcionalidade, consoante seu prudente arbítrio. A culpabilidade, vista como reprovabilidade da conduta do agente, não merece valoração negativa. No que diz respeito aos antecedentes, não há registro de condenação anterior. Não há elementos nos autos a respeito da conduta social no meio e comunidade em que vive e inexiste, também, laudo psicológico que ateste a personalidade do acusado (mesmo que exista jurisprudência do STJ no sentido de que o cometimento de atos infracionais seria elemento a demonstrar a personalidade afeta ao crime, reputo inviável o reconhecimento dessa vetorial, tendo em conta o desconhecimento técnico do Juízo no assunto, de modo que aplica-la seria permitir a analogia in malam partem, como, aliás, também já decidido pelo STJ, vide HC 175.280; HC 190.569; HC 117.497; e HC 86.866) e não havendo elementos nesse sentido e conhecimento técnico do Juízo para sua valoração, deixo de considera-las, inclusive por conta do conteúdo do Tema n.º 1.077 dos Repetitivos do STJ. Os motivos da prática do delito não pesam negativamente. As circunstâncias do crime são anormais à figura típica e merecem valoração negativa, já que o acusado estava embriagado no momento delitivo. Não há nada a ser valorado no que toca às consequências do delito. Não há que se falar em comportamento da vítima. Partindo-se, assim, do mínimo legal cominado em abstrato para a pena do crime de ameaça, prevista no art. 147, do CP (detenção de 01 a 06 meses), e da diferença entre o mínimo e o máximo (cf. já decidido pelo STJ, vide AgRg nos EDcl na PET no REsp n.º 1.852.897, no AgRg no REsp n.º 1.986.657, AgRg no REsp n.º 1.919.781, AgRg no AREsp n.º 1.865.291, AgRg no REsp n.º 1.898.916, AgRg no HC n.º 647.567, dentre vários outros) dessas condenações (o que gera 5 meses), havendo uma vetorial negativa (circunstâncias) recrudesço a pena em 1/8 (o que equivale a 19 dias), fixo a pena-base em 1 (um) mês e 19 (dezenove) dias de detenção. Na segunda fase da dosimetria, há compensação integral entre a agravante prevista no art. 61, II, f, do CP, e a atenuante da confissão espontânea, disposta np art. 65, III, d, do CP. Sendo assim, fixo a pena intermediária em 1 (um) mês e 19 (dezenove) dias de detenção. Considerando a inexistência de qualquer causa de aumento ou de diminuição, fixo, por conseguinte, a pena definitiva do crime de ameaça, em 1 (um) mês e 19 (dezenove) dias de detenção. 4.3. Concurso Material de Crimes Haja vista o reconhecimento, na fundamentação do concurso de crimes nos termos previstos no art. 69, do Código Penal, as penas aplicadas devem ser somadas. Considerando que os crimes foram praticados em concurso material (art. 69, do Código Penal), havendo desígnios autônomos em relação a cada um deles, as penas deverão ser somadas, resultando na condenação em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 1 (um) mês e 19 (dezenove) dias de detenção. 4.4. Regime Inicial de Cumprimento de Pena Considerando a quantidade de pena imposta ao acusado, bem como a presença de circunstâncias judiciais negativas, é caso de fixação do regime semiaberto para cumprimento da reprimenda. Outro não seria o entendimento jurisprudencial: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. ART. 168, § 1.º, INCISO III, DO CÓDIGO PENAL. DOSIMETRIA. PENA-BASE. QUANTUM DE EXASPERAÇÃO PROPORCIONAL. EMPREGO DA FRAÇÃO PRUDENCIALMENTE RECOMENDADA DE 1/6 SOBRE A PENA MÍNIMA PARA CADA VETOR DESFAVORECIDO. REGIME PRISIONAL INICIAL. MODALIDADE INTERMEDIÁRIA ADEQUADA. NEGATIVA DE SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO POR PENAS ALTERNATIVAS. RÉU PRIMÁRIO. TEMPO DE PRISÃO QUE NÃO ULTRAPASSA 4 ANOS DE RECLUSÃO. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. - O entendimento desta Corte firmou-se no sentido de que, na falta de razão especial para afastar esse parâmetro prudencial, a exasperação da pena-base, pela existência de circunstâncias judiciais negativas, deve obedecer à fração de 1/6 sobre o mínimo legal, para cada circunstância judicial negativa. O aumento de pena superior a esse quantum, para cada vetorial desfavorecida, deve apresentar fundamentação adequada e específica, a qual indique as razões concretas pelas quais a conduta do agente extrapolaria a gravidade inerente ao teor da circunstância judicial - Na hipótese, a fração de incremento punitivo para cada vetor desfavorecido corresponde à recomendada pela jurisprudência - A presença de circunstância judicial desfavorável autoriza, nos termos do art. 33, §§ 2.º e 3.º, do Código Penal, a manutenção do regime prisional inicial semiaberto, mesmo sendo o agravante primário e considerando que a reprimenda final não ultrapassou 4 anos de reclusão - Reconhecido vetor negativado, não foi cumprido o requisito subjetivo da substituição da prisão por penas alternativas, previsto no art. 44, inciso III, do Código Penal - Agravo regimental desprovido (STJ - AgRg no HC: 730704 SP 2022/0080394-6, Data de Julgamento: 19/04/2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/04/2022). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO INFIRMADOS. SÚMULA N. 182 DO STJ. RECURSO ESPECIAL INADMISSÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO (...) 4. A fixação do regime semiaberto e a negativa da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos pode ser justificada pela existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, conforme ocorrido na hipótese dos autos. A pretensão é inadmissível pela orientação da Súmula n. 83 do STJ. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1.749.660/PR, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 24/8/2021, DJe 30/8/2021). APELAÇÃO CRIME – PORTAR arma De fogo DE USO PERMITIDO (art. 14, lei 10.826/2003)– procedência.apelo do réu – 1. PLEITO DE REDUÇÃO DA PENA – IMPOSSIBILIDADE – RECONHECIMENTO DE CIRCUNSTÂNCIAS NEGATIVAS QUE IMPEDEM A PENA SER FIXADA NO MÍNIMO LEGAL – 2. número de dias-multa que não guarda a devida proporcionalidade com o aumento da pena corporal – adequação DE OFÍCIO – 3. REGIME INICIAL DE SEMIABERTO DE CUMPRIMENTO DE PENA – ALTERAÇÃO PARA O REGIME ABERTO – NÃO CABIMENTO – 4. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO LEGAL - ART. 44, I, DO CP - INADMISSIBILIDADE - recurso desprovido. 1. No caso correta a fixação da pena acima do mínimo legal, tendo em vista que o reconhecimento de circunstâncias negativas do crime. 2. Tendo em vista que o aumento da pena de multa, não observou a mesma proporção que o da pena corporal, deve ser adequada de ofício, reduzindo o número de dias multa fixados na sentença. 3. Apesar de ter sido definida a pena inferior a 04 (quatro) anos, admite-se a fixação de regime prisional semiaberto em razão da valoração três circunstâncias judiciais. 4. In casu, dado o não preenchimento pelo apelante dos requisitos exigidos pelo artigo 44, inciso I, do Código Penal, impossível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0007782-95.2012.8.16.0170 - Toledo - Rel.: Desembargador Luís Carlos Xavier - J. 12.09.2019). Nesse ponto, inclusive, ressalto que a detração referida no §2º, do art. 387, do CPP, serve tão somente para determinação do regime prisional. O tempo de duração da pena imposta permanece intangível. Assim, considero que não há vulneração aos princípios da isonomia e da individualização da pena na seara da execução criminal. No mesmo sentido, colaciono o magistério de Guilherme De Souza Nucci (in Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência. 5ª edição, Editora Atlas, 2013, p. 802): De plano, se pode visualizar uma modalidade diferente de detração a ser reconhecida na própria sentença condenatória. Impende destacar de início que não se trata de detração do tempo de privação de liberdade na pena e sim de sua consideração para a fixação do regime penitenciário para o início de seu cumprimento. Significa que o magistrado não poderá modificar a pena definitiva fixada. O total da pena imposta, sem a detração, deverá ser considerado para todos os demais efeitos penais e incidentes na execução. (...) No entanto, como referido, pensamos que o princípio encampado pela alteração (de extrema valia, diga-se) é para exclusivamente decotar o tempo de prisão da sentença condenatória na fixação do regime de pena imposta no respectivo processo criminal. Igual, no ponto, a interpretação de Guilherme Madeira Dezem (in Curso de Processo Penal [livro eletrônico], 8ª ed., São Paulo: Thomson Reuters, 2022): Em segundo lugar, temos a questão da detração prevista no art. 387, § 2º, do CPP. A detração é prevista idealmente no art. 42 do CP e consiste no desconto do tempo de prisão provisória quando da execução penal. Antes da existência deste § 2º a detração somente era calculada no momento da execução da pena. E como deve ser aplicado este § 2º do art. 387 pelo próprio juiz do processo de conhecimento? É importante compreender a letra do § 2º: O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. Após fixar a pena o juiz passa à fixação do regime de pena. Neste momento o juiz levará em conta, para os fins dos parâmetros do art. 33, § 2º, do CP. Pensemos em um exemplo concreto. Imaginemos que o acusado tenha sido condenado à pena e 8 anos de reclusão e tenha ficado preso durante todo o processo, que durou 2 anos. Antes dessa reforma da lei, o juiz utilizaria 8 anos como critério para a fixação do regime e isso iria gerar regime inicial fechado. Agora, para fins de fixação do regime inicial fechado, o juiz irá retirar estes 2 anos do total da pena, o que resultará em pena de 6 anos, somente podendo fixar o regime de pena então a partir do semiaberto (art. 33, § 1º, b, do CP). Compete esta providência ao juízo do conhecimento e não ao juízo da execução penal conforme inclusive já determinado pelo STJ: “5. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou que a detração prevista no art. 387, § 2º, do CPP, é, sim, de competência do Juiz sentenciante, cabendo a ele, no momento da prolação do édito condenatório, considerar o tempo de prisão provisória do réu, naquele mesmo processo, para a definição do regime prisional” (STJ, AgRg no AREsp 1869444/SP, 5ª Turma, rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 23.08.2021). De se notar, como já afirmávamos anteriormente, que não se trata de progressão de regime na sentença, mas sim de forma de fixação do regime inicial. Nesse sentido também já se manifestou o STJ: “2. A detração penal, prevista no art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal, não versa sobre progressão de regime prisional, instituto próprio da execução penal, mas sim acerca da possibilidade de se estabelecer regime inicial menos severo, descontando-se da pena aplicada o tempo de prisão cautelar do acusado” (STJ, AgRg no HC 479279/SP, Rel. Min. Nefi cordeiro, DJe 03.06.19). Essa interpretação, inclusive, é a que vem sendo aplicada pelo STJ, conforme se verifica nas decisões proferidas no AgRg no REsp n.º 2.104.637, no AgRg no AREsp n.º 2.320.685, no AgRg no HC n.º 853.277, no AgRg no HC n.º 853.662, no AgRg no REsp n.º 2.064.100, dentre vários outros todos no mesmo sentido. Assim pontuado, verifico que eventual quantum a ser detraído não repercute sobre a fixação do regime prisional no caso concreto, uma vez que a pena definitiva já foi fixada abaixo de quatro anos. Haja vista a pena definitiva fixada (abaixo de quatro anos), considerando o reconhecimento de circunstâncias judiciais negativas, e de olho no contido no art. 33, caput e §3º, e art. 36, ambos do Código Penal, fixo o regime semiaberto para início de cumprimento da pena privativa de liberdade. 4.5. Substituição por Restritiva de Direitos e Suspensão Condicional da Pena É preciso lembrar que a pena tem essência retributiva (Fragoso), mas que sua finalidade é preventiva (Soller). Assim, existindo motivos suficientes, a substituição da pena se impõe. Analisando os requisitos para a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, previstos nos arts. 43 e 44, do CP, concluo que a aplicação de pena restritiva de direitos, no presente caso, não se mostra como a medida mais socialmente recomendável. Isso porque, o crime foi praticado mediante violência ou grave ameaça à pessoa. No mais, incide, aqui, o que consta no enunciado nº 588 da súmula da jurisprudência dominante do STJ, que veda a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos em crimes ou contravenções praticadas contra mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico. Ainda, a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, havendo circunstância judicial desfavorável, não é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por multa ou por restritiva de direitos, nos termos do art. 44, III, do CP, por não se mostrar suficiente para a prevenção e repressão do delito praticado. Dessa forma, incabível a substituição por penas restritivas de direitos. No mesmo sentido, incabível a suspensão condicional da pena, vez que não preenchidos os requisitos do art. 77, II, do CP. Além disso, o e. TJPR recentemente adotou entendimento no sentido de que eventual concessão do benefício da suspensão condicional da pena é matéria afeta ao Juízo da Execução Penal. A aceitação da benesse deve ser feita pelo sentenciado por ocasião da audiência admonitória (em caso, evidentemente, de confirmação da condenação). Confira-se: APELAÇÃO CRIME. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. LESÃO CORPORAL E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA. PLEITO BUSCANDO A ABSOLVIÇÃO PELA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS E ATIPICIDADE DA CONDUTA. INVIABILIDADE. PALAVRA DA VÍTIMA EM CONSONÂNCIA COM O ACERVO PROCESSUAL. ANIMUS LAEDENDI COMPROVADO. DELITOS CONFIGURADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENA DEVIDAMENTE SOPESADA. PEDIDO DE FIXAÇÃO DE REGIME ABERTO. NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS EM DELITOS QUE ENVOLVEM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. SÚMULA 588 DO STJ. PEDIDO DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA. OPÇÃO QUE PODERÁ SER FEITA POR OCASIÃO DA AUDIÊNCIA ADMONITÓRIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PORÇÃO, DESPROVIDO. (TJPR - 1ª C.Criminal - 0000022-48.2020.8.16.0192 - Nova Aurora - Rel.: DESEMBARGADOR PAULO EDISON DE MACEDO PACHECO - J. 12.02.2022) – grifei. APELAÇÃO CRIMINAL – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA E LESÃO CORPORAL (ART. 129, §9º, DO CP E ART. 24-A, CAPUT, DA LEI Nº 11.340/06) – CONDENAÇÃO – PENA DE 06 MESES DE DETENÇÃO - MANIFESTAÇÃO DA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA PARA AFASTAR, DE OFÍCIO, A SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (SURSIS) – IMPOSSIBILIDADE - COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO - BENEFÍCIO A SER OPTADO PELO RÉU EM AUDIÊNCIA ADMONITÓRIA - PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS – IMPROCEDÊNCIA – PALAVRA DA VÍTIMA QUE MERECE ESPECIAL RELEVÂNCIA QUANDO COERENTE COM AS PROVAS E REFORÇADA PELO DEPOIMENTO DOS POLICIAIS QUE ATENDERAM A VÍTIMA LOGO APÓS OS FATOS - LAUDO PERICIAL QUE CONFIRMA A VERSÃO APRESENTADA PELA OFENDIDA – RECORRENTE QUE MESMO CIENTE DA EXISTÊNCIA DE MEDIDAS PROTETIVAS EM SEU DESFAVOR OPTOU POR DESCUMPRIR DETERMINAÇÃO JUDICIAL E AGREDIR A VÍTIMA - VERSÃO DA DEFESA INCONSISTENTE E ISOLADA NOS AUTOS – SENTENÇA ADEQUADA E QUE NÃO MERECE REFORMA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (TJPR - 1ª C.Criminal - 0000630-82.2020.8.16.0083 - Francisco Beltrão - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU BENJAMIM ACÁCIO DE MOURA E COSTA - J. 27.11.2021) – grifei. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA E AMEAÇA – SENTENÇA CONDENATÓRIA.I. ABSOLVIÇÃO – INVIABILIDADE – CONJUNTO PROBATÓRIO INFORMATIVO DA PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA – CONDENAÇÃO MANTIDA.II. RESPOSTA PENAL:A) CRIME DE AMEAÇA – ERRO MATERIAL NA APLICAÇÃO DA PENA – RETIFICAÇÃO.B) REGIME PRISIONAL SEMIABERTO – ABRANDAMENTO – INADMISSIBILIDADE – ACUSADO REINCIDENTE (CP, ART. 33-§2º-“C”).C) SUBSTITUIÇÃO DA SANÇÃO PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 588 DO E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.D) SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO – NÃO CONHECIMENTO.RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO EM PARTE (TJPR - 1ª C.Criminal - 0000003-44.2021.8.16.0180 - Santa Fé - Rel.: DESEMBARGADOR TELMO CHEREM - J. 03.10.2021) – grifei. Portanto, não há que se falar, neste momento, na concessão do benefício em questão. 4.6. Valor Mínimo da Condenação Como se sabe, o art. 387, do CPP, que o Juiz, ao proferir sentença, fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. Para Andrey Borges de Mendonça (in Nova Reforma do Código de Processo Penal. São Paulo: Método, 2008), em situações excepcionais, devidamente justificadas, poderá ocorrer de o Magistrado não ter elementos suficientes para fixar o valor da indenização, sequer em seu mínimo legal. Como destacado, é imperioso que a vítima sofreu danos passíveis de quantificação pelo presente Juízo. E, como pontuado pelo Parquet em suas alegações finais, na forma do que decidido pelo STJ no Tema nº 983 (REsp nº 1.643.051; REsp nº 1.683.324; e REsp nº 1.675.874), é possível a condenação do acusado ao pagamento de condenação mínima (repito: mínima) pelos danos morais causados à vítima oriundos da prática de fato criminoso que se reputa enquadrado como violência doméstica ou familiar cometido contra a mulher. Eis o teor da tese firmada: Nos casos de violência doméstica contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória. Trechos do voto condutor da tese elucidam, bem, a controvérsia posta: A evolução legislativa ocorrida na última década em nosso sistema jurídico evidencia uma tendência, também verificada em âmbito internacional, a uma maior valorização e fortalecimento da vítima, particularmente a mulher, no processo criminal. (...). Ainda que uma ou outra voz doutrinária considere de menor amplitude tal previsão normativa, que alcançaria apenas os danos materiais (Pacelli, Eugênio; Fischer, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e Sua Jurisprudência. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 822; Pollastri Lima, Marcellus. Curso de Processo Penal. 9. Ed., Brasília: Gazeta Jurídica, 2016, p. 1.182), melhor compreensão, a meu aviso, teve a doutrina liderada, inter alia, por autores como Gustavo Badaró (Processo Penal – 4. ed. rev. atual e ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 538) e Paulo Rangel (Direito Processual Penal. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 601), até porque se alinha à já pacífica jurisprudência desta Corte Superior, de que a indenização da qual trata o citado dispositivo legal contempla as duas espécies de dano: o material e o moral. (...). Mais robusta ainda há de ser tal compreensão, a meu sentir, quando se cuida de danos experimentados pela mulher vítima de violência doméstica – quase sempre, mas nem sempre, como na espécie em exame, perpetrada pelo (ex) marido ou (ex) companheiro) –, situação em que é natural (pela diferente constituição física) e cultural (pela formação sexista e patriarcal da sociedade brasileira) a vulnerabilidade da mulher. Malgrado não caiba, neste âmbito, questionar as raias da experimentação e da sensibilização fundadas na perspectiva de cada um, urge, todavia, sem mais, manter os olhos volvidos ao já não mais inadiável processo de verdadeira humanização das vítimas de uma violência que, de maneira infeliz, decorre, predominantemente, da sua simples inserção no gênero feminino. As dores sofridas historicamente pela mulher vítima de violência doméstica são incalculáveis e certamente são apropriadas em grau e amplitude diferentes. Sem embargo, é impositivo, posto que insuficiente, reconhecer a existência dessas dores, suas causas e consequências. É preciso compreender que defender a liberdade humana, sobretudo em um Estado Democrático de Direito, também consiste em refutar, com veemência, a violência contra as mulheres, defender sua liberdade (para amar, pensar, trabalhar, se expressar), criar mecanismos para seu fortalecimento, ampliar o raio de sua proteção jurídica e otimizar todos os instrumentos normativos que de algum modo compensem ou minimizem o sofrimento e os malefícios causados pela violência sofrida na condição de mulher. (...). Por outro viés, o Brasil – e seus agentes públicos, por óbvio – não pode se eximir dos compromissos assumidos por haver aderido a tratados internacionais que envolvem direitos humanos e, em especial, direitos das mulheres, notadamente a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção Belém do Pará), de modo a robustecer a compreensão acerca da relevância do tema no próprio ambiente jurídico e a direcionar suas ações para a necessária mudança social e o aperfeiçoamento de mecanismos nacionais de prevenção e repressão à violência contra as mulheres. (...). Feita essa digressão, importante para demonstrar o caminhar das cortes superiores na direção de uma crescente e mais efetiva proteção à mulher vítima de violência doméstica, cumpre assinalar que ambas as Turmas desta Corte Superior já firmaram o seu entendimento de que a imposição, na sentença condenatória, de indenização, a título de danos morais, para a vítima de violência doméstica, requer a dedução de um pedido específico, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa. (...). A Quinta Turma possui julgados no sentido de que "a reparação do dano sofrido, previsto no inciso IV do art. 387 do Código de Processo Penal, exige pedido expresso e indicação do valor pretendido" (AgRg no AREsp n. 1.062.989/MS, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 18/8/2017). A Sexta Turma desta Corte, por sua vez, considera que "o juízo penal deve apenas arbitrar um valor mínimo, o que pode ser feito, com certa segurança, mediante a prudente ponderação das circunstâncias do caso concreto – gravidade do ilícito, intensidade do sofrimento, condição sócioeconômica do ofendido e do ofensor, grau de culpa, etc. – e a utilização dos parâmetros monetários estabelecidos pela jurisprudência para casos similares. Sendo insuficiente o valor arbitrado poderá o ofendido, de qualquer modo, propor liquidação perante o juízo cível para a apuração do dano efetivo (art. 63, parágrafo único, do CPP)" (AgRg no REsp n. 1.626.962/MS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ª T., DJe 16/12/2016). Nesse ponto, entendo, pois, que o pedido expresso por parte do Ministério Público ou da ofendida, na exordial acusatória, é, de fato, suficiente, ainda que desprovido de indicação do seu quantum, de sorte a permitir ao juízo sentenciante fixar o valor mínimo a título de reparação pelos danos morais, sem prejuízo, evidentemente, de que a pessoa interessada promova, no juízo cível, pedido complementar, onde, então, será necessário produzir prova para a demonstração do valor dos danos sofridos. (...). No âmbito da reparação dos danos morais – visto que, por óbvio, os danos materiais dependem de comprovação do prejuízo, como sói ocorrer em ações de similar natureza –, a Lei Maria da Penha, complementada pela reforma do Código de Processo Penal já mencionada, passou a permitir que o juízo único – o criminal – possa decidir sobre uma importância que, relacionada à dor, ao sofrimento e à humilhação da vítima, incalculáveis sob o ponto de vista matemático e contábil, deriva da própria prática criminosa experimentada, esta, sim, carente de comprovação mediante o devido processo legal. (...). Diante desse quadro, entendo que a simples relevância de haver pedido expresso na denúncia, a fim de garantir o exercício do contraditório e da ampla defesa, ao meu ver, é bastante para que o Juiz sentenciante, a partir dos elementos de prova que o levaram à condenação, fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos morais causados pela infração perpetrada, não sendo exigível produção de prova específica para aferição da profundidade e/ou extensão do dano. O merecimento à indenização é ínsito à própria condição de vítima de violência doméstica e familiar. O dano, pois, é in re ipsa. De fato, portanto, é possível que haja condenação de valor mínimo de indenização à mulher vítima de violência doméstica; contudo, na linha do voto do Min. Relator esse pedido deve ser formulado antes do encerramento da instrução processual, não podendo ser trazido à conhecimento e enfrentamento tão somente por ocasião das alegações finais; a pretensão deve ser deduzida ou por ocasião da denúncia, na cota ministerial, ou, mesmo que posteriormente a ela, mas antes da apresentação de alegações finais, seja pelo Ministério Público seja pela própria ofendida. Essa pretensão, como se vê, se encontra posta na denúncia (mov. 19.1), e foi, agora, novamente mencionado por ocasião das alegações finais. Assim, possível, e necessária, a condenação do sentenciado à pagamento de valor mínimo de indenização pelos danos morais causados por sua conduta. A discussão, agora, passa a ser em relação ao quinhão mínimo que deve ser devido à vítima da violência doméstica. E, no ponto, considerando as condições pessoais da ofendida, o contexto de violência doméstica, e a extensão das lesões sofridas, entendo por bem fixar o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a título de indenização. Desse modo, na forma do art. 387, IV, do CPP, condeno o sentenciado ao pagamento de valor mínimo de indenização pelo dano moral em R$ 2.000,00 (dois mil reais), em favor da vítima, quinhão que deverá ser acrescido de juros de mora contados em 1% ao mês até 28.08.2024 e na forma da Taxa Legal contada consoante a Res.-CMN 5171/2024 (que pode ser acessada por meio do link disponível no sitio eletrônico do BCB) de 29.08.2024 até o pagamento contados do evento danoso, i.e., desde 27.04.2024, cf. arts. 398 e 406, caput e §§, do Código Civil e enunciado n.º 54 da súmula da jurisprudência dominante do STJ, e correção monetária, calculada IPCA, a partir da presente data, cf. enunciado nº 362 da súmula da jurisprudência dominante do STJ e art. 389, caput e §ún., do Código Civil. Ausentes, contudo, quaisquer elementos que indiquem abalos de índole material, notadamente porque nada sobre isso foi dito durante a instrução probatória, deixo de condenar o acusado a qualquer reparação mínima por danos materiais eventualmente sofridos pela vítima, o que não impossibilita, evidentemente, que busque ela essa estirpe de indenização pelos meios próprios e adequados. Lembro, novamente, que o valor ora fixado é o mínimo, o que não obsta que promova, a vítima, discussões em outras demandas para fins de aumentar o valor da reparação devida pelo acusado. 4.7. Direito de Recorrer em Liberdade Considerando, assim, que ao sentenciado foi imposto o regime inicialmente semiaberto, não existem razões para decretação da prisão preventiva. Além disso, ainda que tivesse sido imposto regime mais gravoso (como o fechado), tendo o denunciado respondido ao processo em liberdade, eventualmente decidir, aqui, pela preventiva sem que qualquer outra circunstância fática e/ou jurídica senão a sentença ora proferida tenha sido trazida à baila, poderia configurar execução provisória de pena sem atendimento às premissas fincadas pelo STF nas ADC’s n.º 43 e 44, e no HC n.º 126.292, i.e., decisão condenatória em segunda instância. Anoto que não desconheço das discussões e clamores sociais que se fiam a ideia de uma sentença condenatória poderia (e deveria) ser, desde logo, executada, sem que tivesse que se aguardar o resultado de um ou mais recursos para que, somente aí pudesse haver início do cumprimento da reprimenda (notadamente por conta da prodigalidade com que nosso sistema processual trata a possibilidade de rediscussão quase que infinita dos temas, não sendo incomum se verificaram embargos de embargos de embargos de embargos de agravos de agravos de embargos de agravos de recursos de apelação – e assim em uma cadeia que, a rigor, cansa a fala e a interpretação). E, muito menos, não ignoro que há também vozes que bradam para que, notadamente em delitos cujas penas são aplicadas de modo mais rigoroso e com quantidades elevadas, seja, de plano, dado início ao cumprimento de pena, sob os auspícios da necessidade de não se fomentar a sensação de impunidade. Todavia, se somente a sentença é o “fato” novo que se vê posto à análise, não pode ele ser utilizado como argumento de necessidade de resguardo da ordem pública (com as vênias possíveis aos entendimentos em sentido contrário) para que, só com base nisso (e malgrado a quantidade de pena imposta) se possa decretar a prisão preventiva. Assim, na ausência dos requisitos necessários para decretação da prisão preventiva (art. 387, §ún., CPP), fica concedido ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade. 4.8. Gratuidade de Justiça Quanto ao pedido de justiça gratuita articulado pelo acusado, entendo que a análise da possibilidade de isenção das custas processuais é matéria afeta ao Juízo responsável pela execução penal. Eventuais alegações de incapacidade econômica para o pagamento das custas devem se submeter à devida análise do Juízo da execução, o qual tem competência para analisar a situação econômica do apenado. A exemplo disto, compete ao mencionado Juízo intimar o sentenciado para o pagamento, autorizar o parcelamento do débito em razão de sua situação econômica, suspender a cobrança no caso de superveniência de doença mental do executado, ou, ainda, proceder à execução de bens do sentenciado para o pagamento da referida pena pecuniária, tudo nos termos dos arts. 164, e seguintes da Lei de Execuções Penais. Apesar das orientações e normativas deste Tribunal de Justiça apontarem o Juízo da condenação como o competente para elaborar o cálculo e cobrar das custas, creio ser a fase de execução da pena o momento mais adequado para tanto. Isso porque, após a prolação da sentença/acórdão, o Juízo da condenação exaure a sua jurisdição. Desta forma, partindo da premissa de ser a obrigação de suportar as despesas uma consequência da própria reprovação, entendo que o pleito relativo à isenção de custas não merece ser apreciado, pois é o Juízo executivo o competente para sua análise. Nesse sentido: Em verdade, o recolhimento das custas na ação penal pública é exigido apenas a posteriori, na fase de execução, enquanto que na ação penal dependente de queixa esse recolhimento deve ser prévio. (Código de Processo Penal e sua Interpretação Jurisprudencial. Coordenação Alberto Silva Franco, Rui Stoco. 2ª ed. rev., atual., e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, vol. 5, p.986). Outro não seria o entendimento do e. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME PATRIMONIAL. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO PELA ESCALADA (ARTIGO 155, PARÁGRAFO 4º, INCISO II, C/C O ARTIGO 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. PRETENSÃO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA E ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. MATÉRIA A SER APRECIADA PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO, COMPETENTE PARA VERIFICAR A REAL CONDIÇÃO ECONÔMICA DO CONDENADO. PRECEDENTES. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO NESSA PARTE. MÉRITO. 1) PLEITO ABSOLUTÓRIO PELA INEXISTÊNCIA DO DOLO NA CONDUTA. ALEGADA A NÃO CONSUMAÇÃO DA CONDUTA, VISTO QUE A BICICLETA NÃO SAIU DA ESFERA DE VISÃO DA VÍTIMA, NEM MESMO FICOU NA POSSE DO RÉU. AUSÊNCIA DE POSSE MANSA E PACÍFICA DA RES FURTIVA. INVIABILIDADE. TEMA REPETITIVO 934 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRESCINDIBILIDADE DA POSSE MANSA E PACÍFICA. PROVA COLHIDA QUE CONFIRMA A EFETIVA INVERSÃO DA POSSE. CONFISSÃO DO RÉU, DEPOIMENTOS DA VÍTIMA E DE TESTEMUNHA QUE DEMONSTRAM A EXISTÊNCIA DE DOLO DO CONDENADO NA SUBTRAÇÃO DO BEM. 2) PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO PELA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. TESE REJEITADA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO EM DEMONSTRAR A TENTATIVA DO CRIME DE FURTO. DOSIMETRIA. ANÁLISE DE OFÍCIO. SENTENÇA INTEGRALMENTE MANTIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM SEDE RECURSAL. ARBITRAMENTO À DEFENSORA DATIVA EM CONSONÂNCIA COM TABELA PREVISTA NA RESOLUÇÃO CONJUNTA N. 015/2019-PGE/SEFA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, NÃO PROVIDO (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0000479-21.2022.8.16.0189 - Pontal do Paraná - Rel.: SUBSTITUTO PEDRO LUIS SANSON CORAT - J. 05.06.2023). RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – FURTOS QUALIFICADOS – ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO – NÃO CONHECIMENTO – CONDENAÇÃO AFASTADA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO – INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 453 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – SENTENÇA REFORMADA – APELO NÃO PROVIDO.A condenação ao pagamento das custas processuais é uma imposição legal, cabendo ao Juízo da Execução analisar a eventual insuficiência de recursos financeiros do sentenciado para decidir acerca da isenção. Matéria consolidada.A tipificação do crime com a incidência de circunstância qualificadora não descrita na denúncia caracteriza ofensa ao princípio da correlação. “Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa” (Súmula 453 da Corte Suprema).É de rigor absolver o agente quando evidenciada a falta de correspondência entre a imputação retratada na exordial acusatória e o tipo penal da condenação. Apelação parcialmente conhecida e não provida, com absolvição, de ofício (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0000133-93.2021.8.16.0128 - Paranacity - Rel.: DESEMBARGADOR JORGE WAGIH MASSAD - J. 03.06.2023). FURTO QUALIFICADO – JUSTIÇA GRATUITA – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO – NÃO CONHECIMENTO – DOSIMETRIA DA PENA – SANÇÃO INICIAL NO MÍNIMO LEGAL – INADMISSIBILIDADE – REPRIMENDA DE MULTA – AJUSTE NECESSÁRIO – FIXAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO PARA O CUMPRIMENTO DA CENSURA – INVIABILIDADE – SENTENÇA ALTERADA – APELO NÃO PROVIDO.Embora a condenação do vencido ao pagamento das custas processuais seja uma imposição legal, cabe ao Juízo da Execução analisar a suposta insuficiência de recursos financeiros do reprochado para, então, decidir acerca da isenção.Não caracteriza bis in idem a avaliação simultânea dos maus antecedentes e da reincidência do infrator o qual ostenta múltiplas reprovações definitivas pretéritas, desde que utilizadas ações penais distintas em cada uma das etapas do cálculo dosimétrico.Mostra-se essencial adequar a sanção de multa que não guardou proporcionalidade com a reprimenda privativa de liberdade. Apesar de a expiação ter sido fixada em quantum inferior a 04 (quatro) anos de reclusão, a reincidência do agente aliada à presença de elemento judicial negativo justifica a imposição da forma inicial fechada para o implemento da punição, tornando descabida a incidência da Súmula 269 do Superior Tribunal de Justiça.Apelação parcialmente conhecida e, nesta extensão, não provida, com providência de ofício.(TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0037578-50.2022.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR JORGE WAGIH MASSAD - J. 03.06.2023). RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – VIAS DE FATO – ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO – NÃO CONHECIMENTO – ABSOLVIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – DOSIMETRIA DA PENA – REGIME ABERTO – CONDIÇÃO INDEVIDA AFASTADA – SENTENÇA ALTERADA – RECURSO NÃO PROVIDO. A condenação ao pagamento das custas processuais é uma imposição legal, cabendo ao Juízo da Execução analisar a eventual insuficiência de recursos financeiros do sentenciado para decidir acerca da isenção. Matéria consolidada.Diante da comprovação da materialidade e da autoria da transgressão, deve permanecer a reprovação do agente pelo cometimento da contravenção penal de vias de fato. De acordo com a Súmula 493 da Corte Superior, “É inadmissível a fixação de pena substitutiva (art. 44 do CP) como condição especial ao regime aberto”.Apelação parcialmente conhecida e, nesta extensão, não provida, com providência, de ofício. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0001098-86.2020.8.16.0102 - Joaquim Távora - Rel.: DESEMBARGADOR JORGE WAGIH MASSAD - J. 03.06.2023). RECURSOS DE APELAÇÃO CRIMINAL – ROUBO MAJORADO – ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS – NÃO CONHECIMENTO – CONDENAÇÃO (APELO 01) – ABSOLVIÇÃO (APELO 02) – IMPOSSIBILIDADE – DOSIMETRIA DA SANÇÃO – TERCEIRO ESTÁGIO – CAUSAS DE AUMENTO – AFASTAMENTO INCABÍVEL – CUMULAÇÃO DESPROPORCIONAL AO CASO – RETIFICAÇÃO NECESSÁRIA – DESLOCAMENTO DO ASPECTO DO CONCURSO DE PESSOAS PARA A PENA-BASE – OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA NON REFORMATIO IN PEJUS – CONCURSO FORMAL – INCIDÊNCIA ACERTADA – SENTENÇA MODIFICADA – RECURSOS 01 E 02 NÃO PROVIDOS. A condenação ao pagamento das custas processuais é uma imposição legal, cabendo ao Juízo da Execução analisar a eventual insuficiência de recursos financeiros do sentenciado para decidir acerca da isenção. Matéria consolidada.A ausência de evidências a indicar a concorrência do denunciado na incursão criminosa faz cogente a manutenção da decisão absolutória em seu prol.Deve permanecer a reprovação nas sanções do art. 157, § 2º, inciso II, e § 2º-A, inciso I, do Código Penal, quando os elementos probatórios apontam que, mediante grave ameaça exercida pelo emprego de arma de fogo e concurso de pessoas, o agente subtraiu coisa alheia móvel. Comprovado que a subtração foi perpetrada por diversos assaltantes, com o uso de artefatos bélicos, mostra-se correta a incidência das respectivas causas de aumento.A opção pela concorrência das elevações relativas às majorantes é condicionada à específica e proporcional elucidação sobre a gravidade do ilícito. Na ausência de motivação adequada, a circunstância mais branda deve ser excluída da terceira fase dosimétrica (art. 68 do Estatuto Repressivo), cabendo sua ponderação na primeira, se o deslocamento não configurar reformatio in pejus.Deve ser aplicada a regra do concurso formal quando, mediante uma ação, o infrator atinge vários patrimônios distintos. Apelação 01 conhecida e não provida. Apelação 02 parcialmente conhecida e, nesta extensão, não provida, com providência, de ofício (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0025771-97.2022.8.16.0030 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR JORGE WAGIH MASSAD - J. 03.06.2023). Portanto, deixo de apreciar o requerimento formulado pelo denunciado. 5. Disposições Finais Condeno o acusado ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804, do CPP. Verifico que a Dra. Mariam Ahmad Chams, bem atuou neste processo-crime, sem ser integrante de Defensoria Pública, tendo o direito de ser remunerado(a) pelo seu trabalho (art. 22, §1º, da Lei nº 8.906/1994), remuneração tal que deve ser feita pelo Estado, pois é dever deste prestar assistência jurídica integral aos que dela necessitam, nos termos do art. 5º, LXXIV, da Constituição da República, bem como segundo precedentes, por exemplo, do Supremo Tribunal Federal (STF – RE-AgR 225651/SP – Rel. Min. Cezar Peluso – 1ª Turma – DJU 16.12.2004). Por conseguinte, diante da necessidade dessas nomeações e considerando o que consta na Lei Estadual nº 18.664/2015 e na Resolução Conjunta PGE/SEGA nº 06/2024, arbitro honorários advocatícios em favor do(a) Dr(a). Arley Mozel, OAB-PR nº 54.127, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), na forma da citada legislação estadual. A presente sentença terá eficácia de certidão para fins de cobrança de honorários. Após o trânsito em julgado: (a) expeça-se guia de recolhimento para execução das penas (art. 674, do CPP e art. 105, da Lei de Execução Penal), observando-se o disposto: nos arts. 106 e 107, ambos da Lei de Execução Penal; nos arts. 676 a 681, todos do CPP; (b) comunique-se ao distribuidor, instituto de identificação e à delegacia de origem, nos moldes dos arts. 824 e 825, do Código de Normas; (c) oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral para fins de aplicação das sanções políticas, nos moldes do art. 15, III, da CF/88; (d) intime-se a vítima para ciência da condenação em reparação de danos, inclusive para que, querendo, promova as medidas necessárias ao cumprimento da decisão, que possui força de título executivo judicial; e (e) observe-se, no que for cabível, as previsões contidas nos arts. 893-895 e 903-905, do novo Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça do TJPR. Publique-se. Registre-se. Intimem-se, atentando-se para as disposições do art. 392, do CPP. Foz do Iguaçu, datado digitalmente Alexandre Afonso Knakiewicz Juiz de Direito Substituto
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