M.P.D.E.D.P. x L.G.M.
ID: 301106927
Tribunal: TJPR
Órgão: Vara Criminal de Jandaia do Sul
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0004248-10.2022.8.16.0101
Data de Disponibilização:
17/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GABRIELA VIZEL GOMES
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fo…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE JANDAIA DO SUL VARA CRIMINAL DE JANDAIA DO SUL - PROJUDI Rua Dr. Clementino Schiavon Puppi, Nº 1266 - Centro - Jandaia do Sul/PR - CEP: 86.900-000 - Fone: 43-3572-9860 - E-mail: js-2vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0004248-10.2022.8.16.0101 Processo: 0004248-10.2022.8.16.0101 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Furto Qualificado Data da Infração: 10/09/2022 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): OSNILDO ANTONIO DE SOUZA Réu(s): LUIZ GUSTAVO MONTANHER SENTENÇA 1. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia em face de LUIZ GUSTAVO MONTANHER, qualificado no seq. 10.2 dos autos, como incurso nas sanções do artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal, por pretensa prática do seguinte fato delituoso: “No dia 10 de setembro de 2022, por volta das 04h50min, na Rua Professor Roberto Resende Chaves, Centro, na Oficina Pingo de Ouro, neste Município e Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado LUIZ GUSTAVO MONTANHER, com consciência e vontade, ciente da ilicitude de sua conduta, com ânimo de assenhoreamento definitivo, subtraiu, para si, mediante escalada, coisa alheia móvel consistente em 01 (uma) bateria velha de trator, sem marca, avaliada em R$700,00 (setecentos reais), de propriedade da vítima Osnildo Antonio de Souza (cf. boletim de ocorrência de mov. 1.2, auto de avaliação de mov. 1.7, auto de exame de local de crime de mov. 1.9 e vídeos de movs. 1.11 até 1.13). Segundo consta, o denunciado pulou o muro para adentrar na oficina e subtrair o bem acima narrado, cf. vídeos de movs. 1.11 até 1.13.”. A denúncia foi recebida em 01.03.2024 (seq. 29.1). O réu foi citado por edital (seq. 51.1 e 52.1), posteriormente, foi comunicado endereço atualizado (seq. 59.1), oportunidade em que o réu foi citado pessoalmente (seq. 63.1). Em seguida, foi apresentada resposta à acusação pela Defensoria Pública (seq. 73.1). Decisão saneadora proferida no seq. 75.1, oportunidade em que foi designada audiência de instrução e julgamento. A instrução criminal ocorreu regularmente (seq. 94.1), oportunidade em que a vítima prestou suas declarações, foi inquirida a testemunha arrolada em comum, ao final, o acusado foi interrogado (seq. 95.1 a 95.3). O Ministério Público, em suas alegações finais de seq. 99.1, pugnou a procedência total da pretensão punitiva para o fim de condenar o réu pela prática da infração penal descrita na inicial acusatória por entender comprovadas a autoria e materialidade delitiva. Na dosimetria da pena postulou pela fixação da pena-base acima do mínimo legal, diante da existência de circunstância judicial desfavorável. Na segunda etapa, indicou a ausência de circunstâncias agravantes, por outro lado, requereu a aplicação da atenuante da confissão. Chegado na terceira etapa, apontou a inexistência de causas de aumento e/ou diminuição da pena a serem consideradas. Enfim, postulou a fixação do regime inicial semiaberto e explicitou a inviabilidade de aplicação dos institutos capitulados nos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. A defesa do acusado, por sua vez, quando da apresentação dos memoriais finais (seq. 103.1), pugnou pela absolvição em razão da aplicação da escusa absolutória, prevista no art. 181, inciso I do CP, decorrente de filiação socioafetiva. No caso de reconhecimento da tipicidade da conduta, o afastamento da qualificadora. Na situação de ser reconhecida a condenação, requereu a aplicação da pena mínima, além do reconhecimento da atenuante da confissão, com fixação do regime aberto e substituição por pena restritiva de direitos. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Os autos estão em ordem. Não há nulidade ou preliminar a ser considerada, eis que se encontram presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Passo a analisar a materialidade e autoria dos fatos narrados na denúncia, bem como os elementos analíticos do delito. A prova oral existente nos autos é suficiente à constatação da autoria do delito pelo réu, haja vista a robustez da prova testemunhal produzida em ambas as etapas. O réu LUIZ GUSTAVO MONTANHER foi interrogado na fase judicial e afirmou (seq. 95.3): “Magistrado: O senhor praticou esse furto lá do dia 10 de setembro de 2022? Consta aqui que o senhor teria furtado uma bateria de trator do Osnildo Antônio de Souza. O senhor praticou esse furto ou não? Réu: Sim. Magistrado: Lembra como o senhor fez para entrar lá na oficina? Réu: Ela é de casa, doutor. Magistrado: Mas o senhor precisou pular o muro ou não? Réu: No dia eu pulei porque o negócio estava fechado o portão de casa e o portão de casa era grande. Eu entrei pelo portão do vizinho do lado. Pelo muro do vizinho do lado que o muro é baixo. Magistrado: E qual que é a altura desse muro aproximadamente? Réu: Dá um metro e pouco, nem isso. Magistrado: E essa bateria era pequena? Dava para transportar ali? Nessa altura de muro? Réu: Sim. Magistrado: Certo. E o que o senhor fez com esse objeto? O senhor vendeu? Réu: Não, eu coloquei no carro. Tinha colocado no carro. Magistrado: E o Osnildo é parente do senhor ou o que ele é do senhor? Réu: É tio. Magistrado: Tio. Antes da prisão aí, Luz Gustavo, o senhor estava cumprindo pena ou não? Réu: Não. Magistrado: Estava assinando o fórum? Réu: Não, não, senhor. Até chegou para eu começar a assinar aí, mas como eu estava preso em outro B.O. Aí vai ser quando eu sair. Ministério Público: De quem que era a bateria que o senhor pegou? Réu: Do meu tio. Magistrado: O senhor sabia que era dele? Réu: Sim. Ministério Público: O senhor sabia que não era do Zenildo? Réu: Sim.”. A vítima Osnildo Antonio de Souza prestou suas declarações em fase judicial (seq. 95.1): “Ministério Público: É, consta aqui que esse bem do senhor estava na oficina do seu irmão Zenildo, correto? Vítima: É. Ministério Público: O senhor chegou a ver essas imagens das câmeras também, da pessoa furtando? Vítima: Ah, o dia que eu fui lá pegar a bateria, meu irmão falou, você não levou? Falei, não. Daí ele foi puxar nas câmeras e ficou olhando. Ele pegou a bateria, foi no muro, pulou o muro e se mandou. Ministério Público: Quem te pegou? Vítima: O Luiz Gustavo. Ministério Público: O Luiz Gustavo, o senhor sabe quem é também? Vítima: Sim, meu irmão é criador do Tieto, eu sou eu que sou a novinha. Aham. Daí o que que deu? Eu fui naquele lugar onde tem compra e venda de bateria aqui na avenida. Daí os caras falaram, não, a gente compra bateria dele direto, tem até o cadastro dele aqui. O cara da compra e venda de bateria lá na avenida falou. Ministério Público: Que lugar que é esse? Vítima: Bom, agora o cara que ele falou isso aí pra mim, ele saiu daquela oficina lá. Agora ele tá com a outra lá embaixo, perto do... Como se fala? Perto da casa dos retalhos ali. Uma oficina que vende bateria. Naquele tempo ele trabalhava aqui em cima. Ele falou, ó, tem um cara aqui que vende bateria. Ele não falou roubado, porque ele também não sabia o que era a oficina. Ele falava que era aquela de ciclagem. E ia lá e entregava, vendia as baterias pro cara lá com bateria velha, mas a minha bateria era boa, só porque tava lá pra carregar. Ministério Público: Essa época aqui consta que foi dia 10 de setembro de 2022. A gente ouviu o Zenildo aqui antes, disse que o... o Luiz Gustavo deixou, abandonou a residência, né? Deixou de morar com ele na época da pandemia, correto? Vítima: Ah, faz tempo, hein. Ministério Público: Essa época, então, dos fatos, ele já não morava faz tempo com o Zenildo, correto? Vítima: Não, não. Ele aparecia de vez em quando fora de ordem só pra catar as coisas e vazar fora. Defensoria Pública: O Luiz era filho, né, de criação do seu pai? Vítima: É, ele adotou de uma mulher que trabalha... A mulher, a avó dele trabalha no regional com a minha cunhada. E o pai dele, o Luiz Gustavo, já é conhecido pela polícia, né, que chama de Zóinho. Defensoria Pública: Criou desde pequeno, então? Vítima: É, desde um mês, quase que tinha, de pequenininho. Depois que pegou a idade aí começou a trabalhar e daí virou o que virou. Defensoria Pública: Tá bem. E essa bateria, na verdade, estava lá na oficina do seu irmão? Vítima: É, pra dar uma carga pra mim e levar embora colocar no trator. Cheguei lá, perguntei, ué, você não levou a bateria, assim, não levou, veio não. Daí puxou na câmera e e o Luís Gustavo pulando no muro com a bateria aí em cima do muro.”. A testemunha Zenildo da Silveira e Souza afirmou em juízo (seq. 95.2): “Ministério Público: Sr. Zenildo, consta que o seu irmão teria deixado uma bateria de trator na sua oficina, para fazer alguma manutenção, não sei? Testemunha: Para carregar. Ministério Público: E em algum momento alguém subtraiu, né? Testemunha: Eu nem achei falta da bateria, porque como era normal, a gente entra, pega, vai embora e tal. Aí ele inaudível] semana e falou pra mim, cadê minha bateria, eu vou levar ela. Eu falei, cadê ela? Você não levou a bateria? Não. Eu nem dei essa bateria, procurei pra tudo lado, não achei e foi nas câmeras. Aí fui voltando nas câmeras e consegui ver a pessoa pegando. Ministério Público: Essa parte que é importante pra gente. Conta melhor. O que vocês viram nas câmeras? Testemunha: Nas câmeras eu vi ele chegar pelo muro do vizinho, colocar o pescoço por cima, [inaudível]. Aí ele voltou, pulou o muro para dentro do meu terreno. Ministério Público: E o muro mede quanto, mais ou menos quantos metros? Testemunha: Mais ou menos um metro e meio, um metro e oitenta, por aí. Aí ele veio devagarzinho, como o meu cachorro é conhecido dele, na realidade até o cachorro é dele. Aí ele pulou o muro, o cachorro ficou ali em volta dele, ele foi lá, passou a mão na bateria e saiu devagarzinho, pulou em cima do muro, pulou o muro de novo. Ministério Público: E o senhor se recorda, isso foi durante a noite? Testemunha: Sim. 2h30... 3h da manhã. Eu vi por causa que eu vi na gravação. Ministério Público: Certo... e o cachorro era dele... ele deu esse cachorro para o senhor? Testemunha: Ele deu... ele pegou esse cachorro de mim... e passou para o meu filho. E aí ele ficou por ali... e aí eu conheci ele nas câmeras... e aí eu vi ele [inaudível], esse aqui é o Luiz. Aí... o meu irmão viu... eu mostrei para ele... eu falavam eu vou fazer o B.O... eu falei... faz. Ministério Público: Entendi... e esse... essa pessoa que o senhor viu e que... e que furtou essa bateria e que deu o cachorro pro senhor, quem que é essa pessoa? Testemunha: É o Luiz Gustavo Montanher. Ministério Público: Entendi. O senhor conhecia ele faz tempo? Testemunha: Conheço, desde menininho. Desde de um ano de idade. Defensoria Pública: Seu Zenildo, o que o Luiz Gustavo é do senhor? Testemunha: Na realidade, eu criei esse moleque. Defensoria Pública: Ele é filho do senhor? Testemunha: É, filho porque mora comigo, porque foi o seguinte. A avó dele trabalha com a minha esposa no hospital aqui. Aí ela chegou e falou para a minha esposa, olha, eu queria que você batizasse o meu neto, porque eu não queria que o pessoal que o pai dele tem, batizasse, porque o pai dele já sabe mais ou menos quem é. Não saia da cadeia por nada na vida. Aí eu peguei e falei: vamos batizar? Bem, vamos batizar, o que custa batizar? Aí batizei ele, um ano de idade. Aí eu peguei e batizamos, não lembro se foi sábado ou domingo, e eu fui para os parentes meus passear em Guarapuava, os meus parentes moram lá. Aí minha mulher ligou para mim, ó, acabei de ganhar um filho, você está de brincadeira? A mãe dele levou esse menino de um ano de idade, lá em casa nunca mais voltou. Aí, o que que eu fiz, eu era padrinho dele, eu criei ele. Meu pai falou, filho, você vai entrar numa fria, olha o pai dele, tio dele, é muito tranqueira. Eu falei, pai, mas eu acho que não. Eu vou criar igual aos meus. Eu tenho três. Graças a Deus, eu vou criar igualzinho e não vai ter problema. Ele falou, olha, fruto não cai longe de pé. Eu falei, não, vamos criar. E criei. Igualzinho aos meus.[inaudível] Esse trem está no sangue. Não adianta mentir. Aí quando ele estava com 18... 18, 19 anos. Foi na época da pandemia. Tinha um parque de festa aqui em Jandaia. Ele falou, vou trabalhar no parque para ajudar a montar, falei, não se envolve com esse povo. Esse povo é perigoso, não se envolve. Ah, não, estou ganhando dinheiro. Então, vai. Tá bom, foi. Aí passou, aí veio a pandemia. Eles tinham ido embora parece que para [inaudível]. Aí ele não voltou mais pra casa. Defensoria Pública: Entendi, mas ele morava com o senhor? Testemunha: Morava comigo até a pandemia. Aí ele foi embora e não voltou mais. Aí vem notícia, de vez em quando eu ligava a mãe dele. Aí até esse tempo atrás eu ligava pra ele nem respondia. Aí meu sobrinho é advogado e falou pra mim, tio, se tu quiser eu vou tirar ele, vamos ver o que eu posso fazer. Ele foi preso de bobeira, levando fio elétrico, alguma coisa assim.”. A materialidade do delito restou comprovada por meio do auto de prisão em flagrante (seq. 1.1), boletim de ocorrência (seq. 1.2), auto de avaliação (seq. 1.7), auto de exame do local do crime (seq. 1.9), imagens (seq. 1.11 a 1.14) e prova oral. Infere-se da narrativa fática que em 10 de setembro de 2022, na Rua Professor Roberto Resende Chaves, Centro, na Oficina Pingo de Ouro, neste Município e Comarca de Jandaia do Sul/PR, o denunciado com consciência e vontade, ciente da ilicitude de sua conduta, com ânimo de assenhoreamento definitivo, subtraiu 01 bateria, pertencentes à vítima Osnildo. A prova colhida durante a instrução processual e acima transcrita, evidencia, de forma inconteste, que o réu praticou o crime de furto, com a subtração de bem da vítima. A vítima afirmou em juízo que o proprietário da bateria, Zenildo questionou sobre o serviço que havia solicitado à vítima, sendo que ao ir até o local onde a bateria estava, perceberam que havia sido subtraída, assim, ao verificar nas câmeras de segurança, perceberam que havia sido subtraída pelo réu, Luiz Gustavo. Cumpre destacar que as declarações da vítima foram corroboradas pela testemunha Zenildo, além disso, o réu confessou a autoria delitiva. Em juízo, o réu afirmou que subtraiu a bateria do veículo da propriedade da vítima Osnildo e tinha conhecimento de que o objeto era da propriedade do referido ofendido. A tese de aplicação da escusa absolutória prevista no art. 181, inciso II, do Código Penal não se enquadra ao caso. Diante da prova oral produzida em juízo, é possível verificar a existência de uma relação socioafetiva entre a testemunha Zenildo e o réu, porém, o declarante afirmou que criou o acusado em razão de ser o seu padrinho, além disso, destacou que desde a época da pandemia, o réu não mantém mais relação com o declarante. Neste aspecto, cumpre destacar que o art. 226 da CF reconhece a proteção à família socioafetiva, entretanto, no caso em apreço, o bem furtado apesar de ser de propriedade de Zenildo, estava na posse de Osnildo, sendo que o réu afirmou em juízo disse que tinha conhecimento de que a propriedade da bateria era da vítima Osnildo. Ademais, a conduta delitiva ocorreu na residência de Osnildo e inexiste elemento que demonstre que o agente tenha agido mediante erro. Ainda, mesmo que se reconhecesse a possibilidade de aplicação da escusa em razão da filiação socioafetiva, o interessado Zenildo possuía mais de 60 anos à época do fato(seq. 1.4), logo, não se aplica a escusa absolutória, nos termos do art. 183, inciso III, do Código Penal. No tocante à vítima Osnildo, a figura de possível tio paterno socioafetivo do réu, não justifica a aplicação da escusa, pois, ofendido possuía 60 anos na data dos fatos (seq. 1.5), assim como ausente causa de imunidade relativa, vez que as partes não coabitavam (art. 182, inciso II, do CP). Assim, diante do conjunto probatório, não há como acolher a tese defensiva. Por outro lado, a tese defensiva de exclusão da qualificadora de escalada merece acolhimento. Para configurar esta qualificadora exige-se a utilização de via anormal para adentrar no local onde o furto será realizado[1]. No caso em apreço, das declarações do réu e das imagens (seq. 1.11 e 1.13) é possível constatar que o muro possui estatura menor do que a do acusado e que não foi verificada situação anormal para superar o obstáculo. Dessa forma, a exclusão da qualificadora com a desclassificação da conduta é medida que se impõe. No mesmo sentido: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO. ART. 155, § 4º, II, CP. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA RECEPTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA. DEPOIMENTOS CONTRADITÓRIOS DO ACUSADO. APREENSÃO DA RES FURTIVA HORAS DEPOIS DO FATO. EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DA ESCALADA. POSSIBILIDADE. MURO BAIXO. AUSÊNCIA DE EMPREGO DE ESFORÇO INCOMUM. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. FURTO PRIVILEGIADO. AFASTAMENTO. VALOR DO BEM SUPERIOR A UM SALÁRIO-MÍNIMO. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A palavra da vítima, no crime de furto, quando convergente com o restante do conjunto probatório, constitui elemento apto a formar o convencimento do magistrado, especialmente quando não descaracterizado pela tese defensiva. 2. Para a aplicação da qualificadora de escalada, imprescindível é que o acusado exerça esforço físico incomum. 3. Para a caracterização do furto privilegiado, além da primariedade do réu, o valor do bem subtraído não deve ultrapassar a quantia correspondente ao salário-mínimo vigente à época do acontecimento. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.4. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0001759-05.2021.8.16.0046 - Arapoti - Rel.: SUBSTITUTO OSVALDO CANELA JUNIOR - J. 09.11.2024). Por conseguinte, a conduta perpetrada pelo acusado se subsome perfeitamente à norma abstratamente prevista nos artigos 155, caput, do Código Penal. O réu agiu, portanto, com dolo, com plena consciência de que sua conduta era ilícita. Não há causas nos autos capazes de excluir a ilicitude da conduta ou mesmo a culpabilidade desta. Ao tempo dos fatos, o réu era maior de idade e dele era esperada conduta totalmente diversa da praticada. A conduta praticada pelo réu, portanto, manifesta-se típica, antijurídica e culpável, sendo merecedora de reprimenda estatal. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado para CONDENAR o réu LUIZ GUSTAVO MONTANHER como incurso nas sanções do artigo 155, caput, do Código Penal. Condeno o réu ao pagamento das custas processuais, com fulcro no artigo 804 do Código de Processo Penal. 4. DOSIMETRIA DA PENA 4.1.1. Circunstâncias judiciais A culpabilidade – aqui entendida como grau de reprovabilidade da conduta, analisada tendo por base as condições pessoais da pessoa acusada e a situação delituosa em seus elementos materiais (STF, HC 105674, DJe, 20.02.2014) – revelou-se normal à espécie delitiva pela qual foi denunciado. O sentenciado, nos moldes de Súmula nº. 444 do STJ[2], registra antecedentes criminais, apesar das condenações nos autos n. 0000008-65.2024.8.16.0017 e 0001261-91.2024.8.16.0113, os fatos foram praticados em 01.01.2024 e 27.04.2024, respectivamente, ou seja, posterior aos fatos denunciados neste feito (seq. 96.1). Não há elementos nos autos para prejudicar sua personalidade e sua conduta social[3]. O motivo do crime foi a intenção de subtrair para si objetos de valor para a obtenção de vantagem patrimonial, inerente à espécie penal em voga. As circunstâncias e consequências do crime foram comuns. O comportamento da vítima não contribuiu com os fatos, filiando-se ao entendimento de que esta circunstância somente pode ser valorada para amenizar a situação do sentenciado (STJ, AgRg no REsp 1245072, DJe 28/05/2013). Assim, tenho por desinfluente ao caso. 4.1.2. Pena-Base Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fixo a pena-base em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. 4.1.3. Circunstâncias legais Incide a circunstância agravante da senilidade (CP., art. 61, inc. II, “h”), em razão do delito ter sido praticado contra vítima idosa (seq. 1.5), nos termos do art. 385 do Código de Processo Penal. Cumpre destacar que a agravante é de natureza objetiva, decorre do critério cronológico, ou seja, tendo a vítima a partir de 60 (sessenta) anos de idade, incide a agravante, sendo desnecessário perquirir se tal circunstância, de fato, facilitou ou concorreu para a prática delitiva, pois a maior vulnerabilidade do idoso é presumida, bem como se o autor do delito tinha conhecimento acerca da real idade do ofendido (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003098-68.2020.8.16.0196 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR CELSO JAIR MAINARDI - J. 28.11.2022). Por outro lado, incide a circunstância atenuante da confissão (CP., art. 65, inc. III, “d”), em razão do acusado ter reconhecido a autoria delitiva, dessa forma, compenso as duas circunstâncias, por serem igualmente preponderantes[4]. 4.1.4. Causas de aumento e diminuição da pena Inexistem causas de aumento e de diminuição da pena, previstas na parte geral ou especial do Código Penal, a serem consideradas. 4.1.5. Pena definitiva Obedecidos aos parâmetros dispostos no artigo 68, do Código Penal, o réu fica definitivamente condenado à pena de 01 ANO DE RECLUSÃO E 10 DIAS-MULTA, na proporção de 1/30 do salário mínimo vigente na época dos fatos em virtude de sua condição financeira. 4.1.6. Regime de cumprimento da pena Considerando a quantidade da pena aplicada, das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal e do disposto no artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, fixo o REGIME ABERTO[5] para início de cumprimento da reprimenda, com fundamento no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o qual deverá ser cumprido na forma do artigo 36 do mesmo diploma legal c/c. artigos 112, inciso I e 115, ambos da Lei nº. 7.210/1984, observadas as seguintes condições: a) Comprovar trabalho lícito no prazo de 30 (trinta) dias; b) Permanecer em sua residência durante domingos e feriados; c) Recolher-se diariamente, nos dias de semana, até às 21h na sua residência, dela podendo sair no dia seguinte às 06h00min e se recolher até às 21h dos sábados e nas vésperas de feriados, permanecendo recolhido (a) até às 06h00min da segunda-feira seguinte ou do próximo dia útil; d) Não se ausentar da Comarca onde reside sem autorização judicial; e) Comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades, observadas as deliberações constantes da Portaria nº. 20/2024 desta Vara Judicial e Anexos. 4.1.6. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e suspensão condicional da pena Verifico que a sentenciado atende ao disposto no artigo 44 do Código Penal, eis que é tecnicamente primária, de forma que o crime em tela não foi cometido mediante o emprego de violência ou grave ameaça, fazendo jus à substituição da pena privativa de liberdade, a qual desde já é feita por uma pena restritiva de direitos, tudo na forma do § 2º do referido dispositivo, sendo esta medida que se impõe, por ser direito subjetivo da pessoa condenada. É de salientar que a aplicação da pena restritiva de direitos em crimes destas modalidades prestigia com maior intensidade o caráter de reeducação da pena, dando a pessoa condenada a possibilidade de assistência à entidade que se volta para trabalho social e, via de consequência, maior responsabilidade e comprometimento com a modalidade local. Destarte, substituo a pena privativa de liberdade por UMA pena restritiva de direito, qual seja, UMA prestação pecuniária no valor de R$ 1.518,00 (mil, quinhentos e dezoito reais), em conformidade com o parâmetro fixado no artigo 45, § 2º, do Código Penal, que deverá ser revertida em proveito da vítima do crime (CP, art. 45, § 1º). As penas restritivas de direitos ora impostas converter-se-ão em privativa de liberdade pelo tempo da pena aplicada caso sobrevenha à sentenciada condenação por crime a pena privativa de liberdade, desde que não suspensa, ou caso ocorra descumprimento injustificado das penas restritivas de direitos aqui aplicadas, nos exatos termos do artigo 45 do Código Penal. A audiência de advertência será designada oportunamente, na qual deverá comparecer a sentenciada para manifestar-se sobre a concordância com as condições ora impostas. Incabível a suspensão da pena (CP., art. 77, inc. III). 5. DELIBERAÇÕES FINAIS 5.1. Da prisão preventiva e das medidas cautelares diversas da prisão Não se encontram presentes os requisitos para a decretação das prisões preventivas (CPP., arts. 312 e 387, § 1º). Ademais, o sentenciado respondeu a todo o processo em liberdade e a ela foi imposto o regime aberto para o início de cumprimento da reprimenda. Do mesmo modo, desnecessária a imposição de medidas cautelares diversas da prisão previstas no artigo 319 da Lei Penal Adjetiva, por assim justificarem a gravidade do delito, as circunstâncias do crime e as circunstâncias judiciais do sentenciado. 5.2. Destinação de bens apreendidos e fiança Não há bens apreendidos. Não há fiança recolhida nos autos. 5.3. Reparação de danos Quanto à reparação de danos (CPP., art. 387, inc. IV), observo que há pedido deduzido na inicial acusatória (seq. 10.2), razão pela qual passo a análise do cabimento dos danos morais e materiais no caso sub judice. Como o sentenciado se defendeu do pedido, deve haver a fixação do valor mínimo de reparação dos danos causados pela infração, em atenção ao que prevê o artigo 387, inciso IV, do Código Processo Penal. Neste sentido a condenação gera a obrigação de o sentenciado de reparar os danos (CP., art. 91, inc. I). A lei processual penal impõe a fixação de valor mínimo reparatório, considerando os prejuízos sofridos pela pessoa ofendida (CPP., art. 387, inc. IV) A prática da infração realizada pelo sentenciado é suficiente, por si só, para configurar os danos materiais devidos à vítima, ainda mais considerando que ele não recuperou o valor do bem subtraído. Portanto, analisando a extensão dos danos, corroborado pelo auto de avaliação (seq. 1.7), FIXO como valor mínimo para a reparação do dano material a quantia de R$700,00 (setecentos reais) para Osnildo Antonio de Souza, proprietário da bateria. Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial: APELAÇÃO CRIME - CONDENAÇÃO POR FURTO SIMPLES NA MODALIDADE TENTADA (ART. 155, C/C ART. 14, II, DO CP) - INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - PLEITO DE CONDENAÇÃO DO RECORRIDO COMO INCURSO NO DELITO DE ROUBO, SOB O ARGUMENTO DE CONFIGURAÇÃO DE VIOLÊNCIA NA PRÁTICA DELITIVA - ARREBATAMENTO DE CORRENTES PRESAS AO PESCOÇO DA VÍTIMA - IMPOSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO, DE SE SEPARAR A VIOLÊNCIA EXERCIDA CONTRA A COISA DA VIOLÊNCIA EMPREGADA CONTRA A PESSOA - CONFIGURADO O DELITO MAIS GRAVOSO - PRECEDENTES - CONDENAÇÃO PELO CRIME DE ROUBO QUE SE IMPÕE - AFASTAMENTO DA FIGURA DA TENTATIVA - IMPOSSIBILIDADE - EXISTÊNCIA DE DÚVIDA RAZOÁVEL ACERCA DA INVERSÃO DA POSSE DA RES FURTIVA NA ESPÉCIE - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO - PENA READEQUADA, COM A MANUTENÇÃO DO REGIME ABERTO E O ACRÉSCIMO DE UMA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS - FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO A TÍTULO DE REPARAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS E MORAIS CAUSADOS PELA INFRAÇÃO - EXISTÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO NA DENÚNCIA, RESTANDO ASSEGURADOS O CONTRADITÓRIO E A AMPLA DEFESA - VERTICALIDADE DO EFEITO DEVOLUTIVO DA APELAÇÃO - FIXAÇÃO, PORÉM, EM VALOR INFERIOR AO PRETENDIDO, POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS - PRECEDENTE DO STJ - RECURSO PROVIDO EM PARTE (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0000585-93.2021.8.16.0196 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR RENATO NAVES BARCELLOS - J. 03.10.2022). (g.n.) Diante do exposto, CONDENO a sentenciada LUIZ GUSTAVO MONTANHER ao pagamento de R$ 700.00 (dois mil reais) em favor Osnildo Antonio de Souza, relativos ao dano material sofrido em razão da consumação do delito descrito na vestibular acusatória, pelo qual foi condenado, a ser atualizado monetariamente pela média do INPC/IGP-DI, em virtude do Decreto nº 1.544/1995, desde a data dos fatos, e acrescida de juros de mora pela Taxa SELIC, deduzida a correção, em virtude da atual redação do art. 406, §1º c/c art. 389, parágrafo único, ambos do Código Civil, também desde a data dos fatos. Consigno, de saída, que deixo de condená-la ao pagamento de danos morais por entender que o delito não foi praticado com emprego de violência ou grave ameaça, não tendo havido ofensa a nenhum direito personalíssimo da vítima. 5.4. Intimação da vítima A Secretaria deverá observar o artigo 809, caput e parágrafo único, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça, in verbis: “Publicada a sentença, a vítima, se houver, será comunicada da parte dispositiva e informada sobre o código de acesso ao processo, por mandado ou no balcão da secretaria. Parágrafo único. A comunicação da vítima poderá ser feita por meio eletrônico, com encaminhamento do arquivo integral da sentença e da chave de acesso ao processo”. 5.5. Após o trânsito em julgado Deverão ser observadas as seguintes determinações: 1) procedam-se às anotações e comunicações devidas, nos moldes do que estabelece o artigo 824, inciso VIII, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça; 2) expeçam-se e remetam-se as guias de recolhimento definitivas do condenado, com os encaminhamentos previstos no Código de Normas, formando-se autos de execução de pena, caso o sentenciado não cumpra pena em outro processo nesta vara ou em outra vara do Estado do Paraná; na hipótese de ser constatada a existência de execução penal em andamento em outra vara do Estado do Paraná, não se formarão autos de execução, encaminhando apenas os documentos obrigatórios às varas que estiverem procedendo às execuções (Resolução nº. 93/2013 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, art. 23, §§ 1º e 2º); 3) remetam-se os autos ao Sr. Contador para cálculo das custas e das penas de multa; 4) intime-se o sentenciado para o recolhimento dos valores das custas processuais e da pena de multa devida, no prazo de 10 (dez) dias, acompanhados os mandados das respectivas guias (Instrução Normativa nº 65/2021, arts. 1º e 2º, observadas as alterações promovidas pela IN nº. 77/2021); 5) comunique-se a Justiça Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. João Gustavo Rodrigues Stolsis JUIZ DE DIREITO [1] Estefam, André. Direito Penal: Parte Especial – Arts. 121 a 234-C V.2. 10a ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 477. [2] Súmula nº. 444 do STJ: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. [3] Informativo 702 – Tema Repetitivo nº. 1077: “Condenações criminais transitadas em julgado, não utilizadas para caracterizar a reincidência, somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente” (STJ. REsp 1.794.854-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021). [4] TJSP; Apelação Criminal 1501281-75.2023.8.26.0400; Relator (a): Freire Teotônio; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Criminal; Foro de Olímpia - Vara Criminal; Data do Julgamento: 12/05/2025; Data de Registro: 12/05/2025. [5] Súmula nº. 440 do STJ: “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”.
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