Processo nº 0800007-73.2021.8.20.5600
ID: 262919856
Tribunal: TJRN
Órgão: 6ª Vara Criminal da Comarca de Natal
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO
Nº Processo: 0800007-73.2021.8.20.5600
Data de Disponibilização:
30/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GENILSON DANTAS DA SILVA
OAB/RN XXXXXX
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COMARCA DE NATAL
6ª VARA CRIMINAL
PROCESSO Nº 0800007-73.2021.8.20.5600
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL
ACUSADO: JOÃO MARIA DE ASSIS
S E N T E N Ç A
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL –
CONCURSO D…
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COMARCA DE NATAL
6ª VARA CRIMINAL
PROCESSO Nº 0800007-73.2021.8.20.5600
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL
ACUSADO: JOÃO MARIA DE ASSIS
S E N T E N Ç A
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL –
CONCURSO DE CRIMES – EMBRIAGUEZ AO
VOLANTE E DIREÇÃO SEM HABILITAÇÃO
– APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA
CONSUNÇÃO – ABSORÇÃO DO CRIME MENOS
GRAVE PELO MAIS GRAVE, DESDE QUE
OFERECEM PROTEÇÃO AO MESMO BEM
JURÍDICO – SEGURANÇA VIÁRIA -
MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS
– TERMO DE CONSTATAÇÃO DO ESTADO DE
EMBRIAGUEZ – CONDENAÇÃO.
1 – Para a configuração do crime de
embriaguez ao volante, basta o mero
resultado positivo no exame de
bafômetro ou a comprovação, através
de sinais que indiquem alteração da
capacidade psicomotora, de que o
agente conduzia veículo automotor.
2 – o crime estampado no artigo 306
do Código Brasileiro de Trânsito
sob certa perspectiva constitui
hipótese de crime formal,
prescindindo de comprovação de
resultado naturalístico ou mesmo
efetivo perigo à segurança viária,
vez que sob outra classificação,
trata-se de crime de perigo
abstrato ou potencial.
3 – O agente, ao dirigir sem
habilitação e sob influência de
2
álcool, expondo a dano potencial a
incolumidade pública, nas mesmas
circunstâncias, o delito de direção
sem habilitação é absorvido pelo
crime de embriaguez ao volante, com
esteio no princípio da consunção.
4 – Procedência parcial.
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1. RELATÓRIO:
Vistos etc.
Aos 22 de fevereiro de 2022, o
Ministério Público Estadual, através de sua Promotoria de
Justiça, ofertou denúncia em desfavor de JOÃO MARIA DE ASSIS,
devidamente qualificado, pelo suposto cometimento das
condutas injurídicas descritas nos artigos 306 e 309 da Lei
nº 9.503/97.
Consoante a preambular, no dia 13 de
junho de 2021, por volta das 21h30min, na Avenida Lima e
Silva, bairro Lagoa Nova, nesta cidade, o denunciado foi
preso em flagrante por conduzir o veículo Citroën C4 Pallas,
placas NOC – 7735, com a capacidade psicomotora alterada em
razão da influência de álcool e sem possuir habilitação para
dirigir, gerando perigo de dano.
Recepcionada a denúncia em 04 de
março de 2022, determinou-se a citação do acusado para
comparecer a audiência admonitória, a fim de ser-lhe ofertado
o sursis processual.
Citado, o acusado apresentou sua
resposta à acusação, nos termos do que dispõe o artigo 396 do
Código de Processo Penal, o que fez por intermédio da
Defensoria Pública do Estado.
Não se vislumbrando quaisquer das
hipóteses autorizadoras da absolvição sumária, na forma do
artigo 397 do Código de Processo Penal, determinou-se a
realização da audiência de instrução e julgamento.
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Ao ensejo da audiência, foram
ouvidas as testemunhas arroladas na denúncia. Na
continuidade, deixou-se de oportunizar o interrogatório ao
acusado, tendo em vista que, intimado, não compareceu ao ato
processual aprazado por este juízo, tendo renunciado ao
exercício da autodefesa.
Superada a fase de diligências, as
partes procederam aos debates orais, na forma do artigo 403
do Código de Processo Penal.
Nas suas razões finais, o Ministério
Público requereu a procedência do pedido constante da
denúncia, com a condenação do acusado nos termos ali
delineados.
De outra parte, a Defesa Técnica
apresentou alegações finais postulando a improcedência do
pedido constante da denúncia, com a consequente absolvição do
acusado, na forma do artigo 386, incisos VI e VII, do Código
de Processo Penal.
É o relatório. Decido.
2. FUNDAMENTAÇÃO:
Preliminarmente, estimo seja o caso
de reconhecer a incidência do princípio da consunção entre os
delitos imputados na peça acusatória, de sorte que a conduta
tipificada no artigo 309 do Código de Trânsito não se
configurou como delito autônomo, mas restou absorvida pela
figura típica descrita no artigo 306 do mesmo diploma legal.
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Debruçando-se sobre a hipótese,
verifica-se haver três posições distintas sobre o tema.
A primeira delas, admite a
existência de concurso material entre os crimes imputados; a
segunda, entende pela possibilidade de concurso formal; a
última posição, a qual nos filiamos, é aquela que compreende
que o crime de condução de veículo automotor com capacidade
psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de
outra substância psicoativa que determine dependência absorve
a direção sem habilitação, quando praticadas no mesmo
contexto.
Isso porque, conforme leciona
Damásio de Jesus, “as duas infrações são de lesão e de mera
conduta, atingem o mesmo bem jurídico (incolumidade pública),
pertencente ao mesmo sujeito passivo (a coletividade)”.
Nessa perspectiva, observa-se que as
figuras típicas imputadas ao acusado tutelam o mesmo objeto
jurídico, qual seja a segurança viária, de modo que, ao serem
praticadas no mesmo contexto fático e considerando que a
infração penal descrita no artigo 309 da Lei nº 9.503/97 é
menos grave que aquela estampada no artigo 306 da mesma lei,
patente a consunção daquela figura por esta última. Nessa
linha de pensamento, os seguintes precedentes
jurisprudenciais:
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL -
EMBRIAGUEZ AO VOLANTE E DIREÇÃO
INABILITADA - MATERIALIDADE E
AUTORIA DEMONSTRADAS - ESTADO DE
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EMBRIAGUEZ E PERIGO DE DANO
COMPROVADOS - CONDENAÇÃO MANTIDA -
CRIMES DE PROTEÇÃO AO MESMO BEM
JURÍDICO - ABSORÇÃO DO SEGUNDO PELO
PRIMEIRO -RECONHECIMENTO DA
AGRAVANTE DO ART. 298, III, CTB -
NECESSIDADE. Estando demonstrado que
o autor encontrava-se em evidente
estado de embriaguez na condução de
veículo automotor e que não possuía
permissão para dirigir, necessária
se faz a sua condenação. As
infrações previstas nos artigos 306
e 309 da Lei 9.503/97 são de perigo
e visam à proteção do mesmo bem
jurídico, sendo necessário, pois, a
absorção da direção inabilitada pela
embriaguez ao volante e a aplicação
da agravante prevista no inciso III
do art. 298 da mesma lei (Apelação
Criminal nº 1.0290.16.000749-5/001
Relator(a): Des.(a) Edison Feital
Leite. Data de Julgamento:
01/12/2020. Data da publicação da
súmula: 09/12/2020) – grifamos;
EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES - ART.
306 E ART. 309 DO C.T.B. - APLICAÇÃO
DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO -
POSSIBILIDADE - REDUÇÃO DA PENA DE
SUSPENSÃO OU PROIBIÇÃO PARA DIRIGIR
VEÍCULO AUTOMOTOR - NECESSIDADE -
PROPORÇÃO ESTRITA COM A PENA
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PRIVATIVA DE LIBERDADE - SUSPENSÃO
DOS DIREITOS POLÍTICOS - EFEITO
AUTOMÁTICO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA
- MANUTENÇÃO - EMBARGOS ACOLHIDOS
PARCIALMENTE. - É cabível a absorção
do crime previsto no art. 309 pelo
delito do art. 306, incidindo a
agravante prevista no art. 298,
inciso III, todos do CTB, já que
este delito é mais grave do que
aquele e, além de protegerem o mesmo
bem jurídico, foram praticados em um
mesmo contexto fático. - Se a pena
de proibição para conduzir veículo
automotor ou suspensão da
habilitação não guardou a devida
proporção com a pena privativa de
liberdade imposta, merece ser
reduzida. - Transitada em julgado a
sentença ou o acórdão
condenatória(o), ficam
automaticamente suspensos os
direitos políticos do condenado, nos
termos do art. 15, III, da
Constituição Federal,
independentemente do regime
prisional imposto ou eventual
substituição da pena privativa de
liberdade por restritivas de
direitos ou, ainda, concessão da
suspensão condicional da pena.
(TJMG - Emb Infring e de Nulidade
1.0183.14.014761-6/003, Relator(a):
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Des.(a) Marcos Flávio Lucas Padula ,
5ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em
04/08/2020, publicação da súmula em
12/08/2020) – grifamos;
Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO
DEFENSIVO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE E
ARTIGO 309 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO
BRASILEIRO. ARGUIÇÃO DE NULIDADE DA
DECISÃO QUE REVOGOU A SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO, POR
AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA DEFESA E
IMPOSSIBILIDADE DE REVOGAÇÃO DE
OFÍCIO. ALEGAÇÃO DE ADIMPLEMENTO
SUBSTANCIAL DAS CONDIÇÕES. PEDIDO DE
DECLARAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE
DO ARTIGO 306 DO CTB, POR VIOLAÇÃO
AO PRINCÍPIO NEMO TENETUR SE
DETEGERE. PEDIDOS DE ABSOLVIÇÃO POR
AUSÊNCIA DE PROVA DA ALTERAÇÃO DA
CAPACIDADE PSICOMOTORA E DO PERIGO
CONCRETO NA CONDUTA DO ACUSADO.
PEDIDOS SUBSIDIÁRIOS DE REVOGAÇÃO DA
SANÇÃO DE SUSPENSÃO DO DIREITO DE
DIRIGIR, ISENÇÃO DA PENA DE MULTA E
CONCESSÃO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
GRATUITA. Réu que vem a ser
processado por fato cometido no
curso do prazo de prova. Causa
obrigatória de revogação da
suspensão condicional do processo.
Arguição rejeitada, por ausência de
prejuízo e por não trazer benefício
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a quem alega a nulidade. Condição
descumprida cerca de um ano após o
início do período de prova, não
havendo se falar em adimplemento
substancial das condições da
proposta. Inconstitucionalidade do
artigo 306 do CTB não reconhecida.
Inexistência de qualquer
determinação legal que obrigue o réu
a produzir provas contra si, a
submissão aos exames de etilômetro e
de sangue sendo facultativa. Acusado
que, inclusive, negou-se a realizar
teste do etilômetro, não havendo
indicativo de que tenha sido coagido
a prestar qualquer exame. A Lei nº
12.760/2012 alterou o disposto no
artigo 306 do CTB. O tipo já não se
realiza pelo simples fato de o
condutor estar com uma determinada
concentração de álcool no sangue e
sim, por ele ter a capacidade
psicomotora alterada em razão da
influência do álcool, seja ela qual
for. A concentração que antes
constituía elementar do tipo passou
a ser apenas um meio de prova dessa
alteração. O resultado do exame
constitui presunção relativa, em um
sentido ou noutro. A ausência de
exame de sangue ou de etilômetro,
portanto, não é indispensável para a
configuração do delito. Deve-se
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verificar se há evidência da
alteração da capacidade psicomotora,
sem o que não pode ser imposta
condenação. Réu que apresentava
sintomas de embriaguez e estado
alterado, negando-se a realizar
exame de etilômetro, clínico ou
coleta de sangue. Alteração da
capacidade psicomotora atestada pelo
"termo de prova testemunhal"
realizado por policial militar, e
pela palavra dos policiais autores
da prisão, cujos ditos são
consistentes e reiterados, não se
cogitando de motivos para falsa
imputação. Manutenção da pena-base
nos termos da sentença. Absorção da
conduta do artigo 309 da Lei n.
9.509/97 pelo delito mais grave, do
artigo 306, agravado pela
circunstância do artigo 298, III,
ambos do CTB. Não há bis in idem na
suspensão da habilitação pela esfera
criminal, independente das sanções
aplicadas em âmbito administrativo,
em se tratando de esferas
independentes. Pretendida isenção da
multa que não é possível, apesar da
pobreza do réu, em alinhamento à
jurisprudência dos Tribunais
Superiores sobre o tema. Réu
assistido pela Defensoria Pública,
sendo-lhe concedido o benefício da
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assistência judiciária gratuita.
RECURSO PROVIDO EM PARTE, POR
MAIORIA.(Apelação Crime, Nº
70070372859, Terceira Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: João Batista Marques Tovo,
Julgado em: 19-10-2016) – grifamos.
Todavia, o não reconhecimento dessa
última conduta como delito autônomo não impede o julgador de
proceder a devida ponderação de pena nas circunstâncias
judiciais, com esteio no artigo 59 do Código Penal, merecendo
o agente, em razão desse fato, maior reprimenda em sua pena
base, desde que mais censurável a conduta nessas
circunstâncias.
Portanto, não sendo o caso de se
acolher o pleito defensivo relacionado a absolvição do
acusado quanto a imputação do crime de conduzir veículo
automotor, em via pública, sem a devida permissão ou
habilitação, nem tampouco de considerá-lo crime autônomo,
verifica-se a hipótese de aplicação do princípio da
consunção, desde que se está diante de uma sucessão de fatos,
em que o fato mais amplo consome o outro menos amplo,
restando, ao final apenas uma norma a ser aplicada,
objetivando, com isso, evitar eventual excesso na aplicação
da pena.
Superado o ponto, verifica-se que a
hipótese quadrada nos presentes autos diz acerca do
cometimento de crime consistente na condução de veículo
automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da
influência de álcool ou de outra substância psicoativa que
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determine dependência, cuja definição jurídica afigura-se
positivada no artigo 306, caput, da Lei 9.503/97, imputada ao
acusado JOÃO MARIA DE ASSIS.
Em feitos dessa natureza onde a
prova coligida não espelha maior descompasso, basta aquilatar
os elementos pertinentes a autoria e materialidade delitiva,
no afã de encontrar a pena adequada como resposta e censura à
culpabilidade revelada pelo acusado no instante do
cometimento do crime.
Pertinente a materialidade,
sobressaem-se nos autos elementos bastantes, demonstrativos
do evento criminoso. Tanto que repousam ali provas colhidas
na fase preliminar e em juízo, tal qual auto de prisão em
flagrante delito; resultado do teste em aparelho de ar
alveolar (etilômetro), no qual se constata concentração
superior a 0,3 mg por litro de ar expelido dos pulmões; auto
de infração de trânsito lavrado pelos policiais; boletim de
ocorrência lavrado no dia do evento; dos termos de
depoimentos colhidos na esfera administrativa; bem como da
prova oral, produzida sob o pálio do contraditório.
Quanto a autoria, de igual modo
resta bem evidenciada nos fólios, mormente através da
confissão espontânea do acusado, ainda que prestada somente
na esfera extrajudicial, quando de sua autuação em flagrante
delito, momento em que assumiu sua responsabilidade no
evento, o se que se mostra em consonância com o acervo
probatório colacionado aos autos, onde se destaca a prova
oral produzida, dando conta do fato e suas circunstâncias.
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Máxime é o valor da confissão
espontânea e voluntária do acusado, embora prestada somente
na etapa administrativa, circunstância que milita em seu
favor, mormente quando em harmonia com as demais provas
carreadas aos autos, especialmente os depoimentos das
testemunhas, não havendo nenhuma outra prova que ilida a
veracidade e autenticidade das declarações do acusado.
Nesse sentido é a lição de Júlio
Fabbrini Mirabete: “De qualquer forma, a confissão, livre,
espontânea e não posta em dúvida por qualquer elemento dos
autos é suficiente para a condenação, máxime quando
corroborada por outros elementos” (In CÓDIGO DE PROCESSO
PENAL INTERPRETADO, 2ª ed., 1994, p. 250).
Na mesma vertente já decidiu o
Excelso Supremo: “As confissões judiciais ou extrajudiciais
valem pela sinceridade com que são feitas ou verdade nelas
contidas, desde que corroboradas por outros elementos de
prova inclusive circunstanciais” (RTJ 88/371).
As testemunhas arroladas no
processo, ouvidas ao ensejo da instrução processual,
ratificaram suas declarações prestadas na esfera
administrativa, confirmando os fatos narrados na denúncia.
Nesse sentido, as testemunhas ANDRÉ
MARTINS DA SILVA e SÍLVIO MARTINS FÉLIX, policiais militares
que participaram das diligências que culminaram com a prisão
em flagrante do acusado, relataram em juízo que, no dia do
fato, efetuavam patrulhamento na Avenida Prudente de Morais,
quando se visualizaram o acusado, que havia colidido na
mureta do viaduto, na altura da Avenida Lima e Silva. Em face
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dessa conjuntura, efetuaram a abordagem e verificaram que o
acusado apresentava sinais de embriaguez. Diante disso,
efetuaram a sua prisão em flagrante e a consequente condução
à delegacia, para adoção dos procedimentos legais.
Desse modo, estimo que não há
dúvidas acerca da possibilidade de fixação da autoria
delitiva da conduta imputada na pessoa do denunciado,
porquanto o acervo probatório colacionado, aliado a confissão
espontânea do acusado, demonstra a responsabilidade penal do
acusado no evento narrado na peça acusatória, motivo pelo
qual inviável o acolhimento do pleito absolutório, formulado
pela ilustre defesa, por ocasião de suas alegações finais.
Vencidas as questões pertinentes a
autoria e materialidade delitiva, verifica-se que o crime
restou consumado, porquanto dúvidas não há acerca da efetiva
condução de veículo automotor em estado de alteração
psicomotora, por parte do denunciado.
Atente-se para o fato de que o
entendimento jurisprudencial majoritário orienta-se no
sentido de que o crime de embriaguez ao volante configura-se
enquanto hipótese de crime de perigo abstrato puro,
prescindindo de resultado naturalístico da conduta.
Dispõe o art. 306 do Código de
Trânsito, com redação conferida pela Lei nº 12.760/2012,
verbis:
Lei nº 9.503/97.
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“Art. 306. Conduzir veículo
automotor com capacidade psicomotora
alterada, em razão da influência de
álcool ou de outra substância
psicoativa que determine
dependência: (Redação dada pela Lei
nº 12.760, de 2012)
Penas - detenção, de seis meses a
três anos, multa e suspensão ou
proibição de se obter a permissão ou
a habilitação para dirigir veículo
automotor.”
Dessa forma, a simples conduta de
conduzir veículo automotor com alteração da capacidade
psicomotora, em razão da concentração de álcool superior à
legalmente permitida, independentemente de se conduzir
veículo de forma perigosa, já configura o crime de embriaguez
ao volante, previsto no artigo 306 do Código de Trânsito.
Nesse sentido é a orientação de nossos Tribunais Superiores:
Trata-se de agravo cujo objeto é
decisão que inadmitiu recurso
extraordinário interposto contra
acórdão do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, assim do:
APELAÇÃO EMBRIAGUEZ AO VOLANTE
CONDENAÇÃO MANUTENÇÃO
Inquestionáveis a materialidade e
autoria delitivas Réu confesso
Firme depoimento da testemunha
Condenação mantida Pena mantida no
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piso legal Impossibilidade de
redução em virtude da atenuante da
confissão, tendo em vista a Súmula
231 do Superior Tribunal de Justiça
Pena de suspensão da habilitação
para dirigir veículo automotor,
devidamente estabelecida Pena
privativa de liberdade substituída
por pena pecuniária RECURSO DE
APELAÇÃO DESPROVIDO. O recurso
busca fundamento no art. 102, III,
a, da Constituição Federal. A parte
recorrente alega ofensa ao art. 5º,
XXXV, da Constituição. Aduz ser
inconstitucional o art. 306 da Lei
nº 9.503/1997. O recurso é
inadmissível, tendo em vista que o
acórdão recorrido está alinhado com
a jurisprudência de ambas as Turmas
do Supremo Tribunal Federal. Nessa
linha, vejam-se: Recurso ordinário
em habeas corpus. Embriaguez ao
volante (art. 306 da Lei nº
9.503/97). Alegada
inconstitucionalidade do tipo por
ser referir a crime de perigo
abstrato. Não ocorrência. Perigo
concreto. Desnecessidade. Ausência
de constrangimento ilegal. Recurso
não provido. 1. A jurisprudência é
pacífica no sentido de reconhecer a
aplicabilidade do art. 306 do Código
de Trânsito Brasileiro delito de
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embriaguez ao volante, não
prosperando a alegação de que o
mencionado dispositivo, por se
referir a crime de perigo abstrato,
não é aceito pelo ordenamento
jurídico brasileiro. 2. Esta Suprema
Corte entende que, com o advento da
Lei nº 11.705/08, inseriu-se a
quantidade mínima exigível de álcool
no sangue para se configurar o crime
de embriaguez ao volante e se
excluiu a necessidade de exposição
de dano potencial, sendo certo que a
comprovação da mencionada quantidade
de álcool no sangue pode ser feita
pela utilização do teste do
bafômetro ou pelo exame de sangue, o
que ocorreu na hipótese dos autos.
3. Recurso não provido. (RHC
110.258, Rel. Min. Dias Toffoli,
Primeira Turma). HABEAS CORPUS.
PENAL. DELITO DE EMBRIAGUEZ AO
VOLANTE. ART. 306 DO CÓDIGO DE
TRÂNSITO BRASILEIRO. ALEGAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE DO REFERIDO
TIPO PENAL POR TRATAR-SE DE CRIME DE
PERIGO ABSTRATO. IMPROCEDÊNCIA.
ORDEM DENEGADA. I - A objetividade
jurídica do delito tipificado na
mencionada norma transcende a mera
proteção da incolumidade pessoal,
para alcançar também a tutela da
proteção de todo corpo social,
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asseguradas ambas pelo incremento
dos níveis de segurança nas vias
públicas. II - Mostra-se
irrelevante, nesse contexto, indagar
se o comportamento do agente
atingiu, ou não, concretamente, o
bem jurídico tutelado pela norma,
porque a hipótese é de crime de
perigo abstrato, para o qual não
importa o resultado. Precedente. III
- No tipo penal sob análise, basta
que se comprove que o acusado
conduzia veículo automotor, na via
pública, apresentando concentração
de álcool no sangue igual ou
superior a 6 decigramas por litro
para que esteja caracterizado o
perigo ao bem jurídico tutelado e,
portanto, configurado o crime. IV -
Por opção legislativa, não se faz
necessária a prova do risco
potencial de dano causado pela
conduta do agente que dirige
embriagado, inexistindo qualquer
inconstitucionalidade em tal
previsão legal. V - Ordem denegada.
(HC 109.269, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, Segunda Turma). Ainda
nesse sentido, vejam-se o RE
664.081, Rel. Min. Joaquim Barbosa;
o ARE 845.099, Rel.ª Min.ª Cármen
Lúcia; e o RE 837.781, Rel. Teori
Zavascki. Diante do exposto, com
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base no art. 38 da Lei nº 8.038/1990
e no art. 21, § 1º, do RI/STF, nego
seguimento ao recurso. Publique-se.
Brasília, 02 de fevereiro de
2015.Ministro Luís Roberto Barroso
Relator STF - RE: 856930 SP ,
Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data
de Julgamento: 02/02/2015, Data de
Publicação: DJe-030 DIVULG
12/02/2015 PUBLIC 13/02/2015) -
grifamos;
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.
EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. TRANCAMENTO
DA AÇÃO PENAL. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO
DO PERIGO CONCRETO QUE TERIA
DECORRIDO DA CONDUTA DO ACUSADO.
DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE
DIREÇÃO ANORMAL OU PERIGOSA. CRIME
DE PERIGO ABSTRATO. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. 1. O crime
de embriaguez ao volante é de perigo
abstrato, dispensando-se a
demonstração da efetiva
potencialidade lesiva da conduta
daquele que conduz veículo em via
pública com capacidade psicomotora
alterada em razão da influência de
álcool ou de outra substância
psicoativa que determine
dependência. Precedentes. 2. Na
hipótese dos autos, a conduta
imputada ao recorrente se amolda,
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num primeiro momento, ao tipo do
artigo 306 do Código de Trânsito
Brasileiro, pelo que se mostra
incabível o pleito de trancamento da
ação penal. 3. Recurso improvido
(STJ - RHC: 58893 MG 2015/0095501-0,
Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data
de Julgamento: 21/05/2015, T5 -
QUINTA TURMA, Data de Publicação:
DJe 28/05/2015) – grifamos;
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS
1. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. 2. CRIME
DE PERIGO ABSTRATO. 3. TESTE DO
BAFÔMETRO. OCORRÊNCIA. 4. RECURSO
IMPROVIDO. 1. É prescindível à
consumação do delito de embriaguez
ao volante a prova da produção de
perigo concreto à segurança pública,
bastando a prova da embriaguez, por
se tratar de delito de perigo
abstrato. Precedentes. 2. A Terceira
Seção deste Tribunal Superior
assentou entendimento, quando do
julgamento do REsp n.º 1.111.566/DF,
realizado no dia 28 de março de
2012, no sentido de que "apenas o
teste do bafômetro ou o exame de
sangue podem atestar o grau de
embriaguez do motorista para
desencadear uma ação penal".
Hipótese ocorrente na espécie. 3.
Recurso a que se nega provimento
21
(STJ - RHC: 40316 SP 2013/0271345-6,
Relator: Ministro MARCO AURÉLIO
BELLIZZE, Data de Julgamento:
08/10/2013, T5 - QUINTA TURMA, Data
de Publicação: DJe 14/10/2013) –
grifamos;
HABEAS CORPUS. EMBRIAGUEZ AO
VOLANTE. CRIME DE PERIGO
ABSTRATO.DESNECESSIDADE DE SE
DESCREVER DIREÇÃO ANORMAL. ORDEM
DENEGADA. 1. O crime de embriaguez
ao volante é caracterizado como
delito de perigo abstrato, razão
pela qual não se faz necessária a
comprovação da efetiva capacidade
lesiva da conduta. Precedentes do
STJ e STF. 2. Para tipificação do
delito do art. 306 do Código Penal,
é prescindível a descrição de
direção anormal, como direção em
zigue-zague, na contramão e etc. 3.
Ordem denegada(STJ - HC: 206009 RJ
2011/0103098-9, Relator: MIN. VASCO
DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/RS), Data de
Julgamento: 06/03/2012, T6 - SEXTA
TURMA, Data de Publicação: DJe
19/03/2012) – grifamos.
Destarte, depreende-se do conjunto
probatório que repousa nos autos provas suficientes para a
22
condenação do acusado, não havendo, portanto, qualquer
discrepância no material probatório recolhido.
3. DISPOSITIVO:
Posto isso,
Julgo parcialmente procedente o
pedido constante da denúncia, para CONDENAR acusado JOÃO
MARIA DE ASSIS como incurso nas sanções previstas no artigo
306 da Lei nº 9.503/97, ABSOLVENDO-O da imputação do crime
definido no artigo 309 do Código de Trânsito Brasileiro, ante
a aplicação do princípio da consunção.
DOSO A PENA:
DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA
Considerando a culpabilidade, em face do maior grau de
censurabilidade da conduta do agente, porquanto o acusado
conduzia veículo automotor sem habilitação ou permissão para
tanto, o que torna mais reprovável a sua conduta;
Considerando que o acusado é primário e portador de bons
antecedentes, porquanto não há, em seu desfavor, condenação
anterior transitada em julgado;
Considerando que os autos não espelham a conduta do acusado
no ambiente social ou familiar, não sendo lícito concluir que
essa circunstância possa militar em seu desfavor;
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Considerando que o magistrado não dispondo de recursos
técnicos e habilitação específica para examinar elementos
pertinentes a personalidade do agente, não lhe é dado lançar
qualquer juízo valorativo a esse respeito, mormente porque
esse exame envolve conhecimentos específicos, tocantes à
antropologia, psiquiatria, psicologia e demais ciências
correlatas, o que efetivamente escapa do conhecimento deste
magistrado. Afora isso, ainda assim, é importante consignar
que no direito penal moderno ou direito penal da culpa, em
contraposição ao direito penal do autor, efetivamente, não se
julga o homem, mas seu comportamento penalmente relevante;
Considerando que os motivos que guiaram o acusado no momento
da ação delituosa foram os comuns da espécie, pois acreditava
que estava apto a dirigir veículo automotor mesmo após a
ingestão de bebida alcoólica;
Considerando as circunstâncias em que se desenvolveu a cena
criminosa, tendo em vista que o fato fora praticado em
horário e local de razoável circulação de pessoas, o que
denota destemor do agente para com as consequências de seus
atos, sendo tal circunstância igualmente desfavorável ao
agente;
Considerando as consequências da ação delituosa, as quais
consistiram no perigo abstrato para a coletividade;
Considerando que o comportamento da vítima, sendo esta o
Estado ou a sociedade, que em nada contribuiu para o
implemento da infração;
FIXO A PENA BASE em nove (09) meses de detenção e vinte (20)
dias-multa.
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Não há circunstâncias agravantes a
considerar.
Tendo em vista a circunstância
atenuante genérica da confissão espontânea, atenuo sua pena
em dois (02) meses de detenção e cinco (05) dias-multa,
fixando a pena provisória em sete (07) meses de detenção e
quinze (15) dias-multa, a qual torno concreta e definitiva, à
míngua de causas de aumento ou diminuição de pena que possam
alterar esse quantum.
Não há lapso temporal a detrair,
conforme determinação do artigo 387, parágrafo 2º, do Código
de Processo Penal, tendo em vista que o acusado não suportou
prisão preventiva em razão dos fatos apurados neste
procedimento, tendo sido posto em liberdade mediante
pagamento de fiança arbitrada pela autoridade policial.
Condeno o acusado, ainda, à pena de
suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, caso
já seja habilitado, ou suspensão de se obter a permissão para
dirigir veículo automotor, pelo prazo da pena privativa de
liberdade aplicada.
Atendendo ao conjunto das
circunstâncias judiciais, bem como ao disposto no artigo 33,
§ 2º, alínea “c”, c/c §3º, do Código Penal, a pena privativa
de liberdade será cumprida inicialmente no regime aberto.
Fixo o valor do dia-multa em 1/30
(um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época do fato,
devidamente atualizado quando do pagamento, devendo ser paga
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no prazo de 10 (dias), a contar do trânsito em julgado da
presente sentença (art. 164 e ss. da LEP).
Em atenção ao que prescreve o artigo
44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade
por uma (01) pena restritiva de direitos, na modalidade de
prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, na
forma como determinar o Juízo das Execuções Penais, o que
faço em obséquio ao permissivo no artigo 44 do Código Penal
brasileiro.
Deixo de conceder a suspensão
condicional da pena (sursis), em face do cabimento e da
efetivação da substituição de pena anteriormente realizada.
Enxergando ausentes os pressupostos
e fundamentos para a decretação da prisão cautelar do
acusado, considerando o regime inicialmente fixado na
condenação, que se baseia no senso de responsabilidade e
autodisciplina do agente, bem assim à substituição da pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos que fora
efetuada, à míngua do periculum libertatis, concedo-lhe o
direito de interposição de eventual recurso em liberdade, o
que faço com supedâneo no artigo 387, § 1º, do Código de
Processo Penal.
Condeno o acusado ao pagamento das
custas processuais.
Deixo de fixar o valor mínimo de
indenização decorrente do crime em razão da ausência de
elementos estimativos a este respeito e mesmo porque não
houve prejuízo patrimonial suportado pelo Estado, podendo
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eventuais ofendidos, querendo, ajuizarem ação de liquidação e
posterior execução no juízo cível, para ressarcimento.
4. PROVIMENTOS FINAIS:
Transitada em julgado a sentença
para a defesa:
a) Comunique-se ao Tribunal Regional Eleitoral para o fim de
suspensão dos direitos políticos;
b) Extraiam-se as peças necessárias à execução da pena,
encaminhando-as à Vara das Execuções Penais;
c) Comunique-se ao DETRAN, para cumprimento da pena acessória
de suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor
pelo tempo fixado na sentença;
d) Em seguida, devidamente certificado, arquive-se.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Natal/RN, 29 de abril de 2025.
IVANALDO BEZERRA FERREIRA DOS SANTOS
Juiz de Direito
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