Processo nº 0102384-21.2019.8.20.0106
ID: 298399918
Tribunal: TJRN
Órgão: 4ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0102384-21.2019.8.20.0106
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARLUS CESAR ROCHA XAVIER
OAB/RN XXXXXX
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ALDO ARAUJO DA SILVA
OAB/RN XXXXXX
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FRANCISCO DE ASSIS DA SILVA
OAB/RN XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 4ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró Alameda das Carnaubeiras, 355, Presidente Costa e Silva, MOSSORÓ - RN - CEP: 59625-410 Processo: 0102384-21.20…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 4ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró Alameda das Carnaubeiras, 355, Presidente Costa e Silva, MOSSORÓ - RN - CEP: 59625-410 Processo: 0102384-21.2019.8.20.0106 Ação: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) AUTOR: MPRN - 11ª PROMOTORIA MOSSORÓ RÉUS: LEONARDO SANTOS VIEIRA, GISELLE SANTOS BEZERRA, FRANCISCO RAIMUNDO TARGINO, JOSÉ AUGUSTO ARRUDA DE MOURA SENTENÇA 01. RELATÓRIO Trata-se de Ação Penal em face de LEONARDO SANTOS VIEIRA, JOSÉ AUGUSTO ARRUDA DE MOURA, FRANCISCO RAIMUNDO TARGINO, FRANCISCO JOSEMAR TRAGINO, GISELLE SANTOS BEZERRA e FRANCISCA LINDEKATIA DE LIMA, todos já qualificados. Denúncia, ID nº 75691402 - Pág. 3 a 17. Ao réu Francisco Josemar Tragino “Zimar” são imputadas as práticas dos seguintes delitos: 1) art.33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal; 2) art. 4º, “a”, da Lei nº 1.521/51, por vinte vezes (onze dessas vezes com a mesma capitulação, mas inserido o § 2º, IV, “b”, do mesmo tipo penal – vítima agricultor), na forma do artigo 71 do CP; 3) artigo 3º, caput, da Lei nº 5.553/68, por cinco vezes, na forma do artigo 71 do CP; 4) artigo 104 da Lei nº 10.741/03, por onze vezes, na forma do artigo 71; 5) artigo 288, caput, do CP; 6) artigo 244-B, do ECA; e 7) artigo 1º da Lei nº 9.613/98. A ré Francisca Lindekatia de Lima são imputadas as práticas dos seguintes delitos: 1) art. 4º, “a”, da Lei nº 1.521/51, por vinte vezes (onze dessas vezes com a mesma capitulação, mas inserido o § 2º, IV, “b”, do mesmo tipo penal – vítima agricultor), na forma do artigo 71 do CP; 2) artigo 3º, caput, da Lei nº 5.553/68, por cinco vezes, na forma do artigo 71 do CP; 3) artigo 104 da Lei nº 10.741/03, por onze vezes, na forma do artigo 71; 4) artigo 288, caput, do CP; 5) artigo 244-B, do ECA; e 6) artigo 1º da Lei nº 9.613/98. Ao réu Francisco Raimundo Targino (Doca) são imputadas as práticas dos seguintes delitos: 1) art.33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal; 2) art. 14 da Lei n 10.826/03. Ao réu José Augusto Arruda de Moura (Aleijado) é imputada a prática do seguinte delito: 1) art.33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal; Ao réu Leonardo Santos Vieira (Gaguinho) é imputada a prática do seguinte delito: 1) art. 33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal; Por fim, a ré Giselle Santos Bezerra é imputada a prática do seguinte delito: 1) art. 33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal; Narrou a denúncia, em síntese, que, no período compreendido entre 14 de agosto de 2018 e o dia 28 de maio de 2019, nos Municípios de Mossoró/RN e Serra do Mel/RN, os denunciados Leonardo Santos Vieira, José Augusto Arruda de Moura, Francisco Raimundo Targino, Francisco Josemar Tragino e Giselle Santos Bezerra associaram-se para a prática do tráfico ilícito de drogas e, efetivamente, realizaram atos de disseminação de entorpecentes sem autorização e em desacordo com determinação legal. Além disso, aduziu que, entre o segundo semestre do ano de 2015 e o primeiro semestre do ano de 2019, na cidade de Serra do Mel/RN, o denunciado Francisco Josemar Tragino, de forma habitual, associou-se à denunciada Francisca Lindekatia de Lima e ao adolescente Joabe Lima Tragino, em relação a quem facilitou a corrupção, para praticarem crime de usura, consistente na cobrança de juros sobre dívidas, em dinheiro, superiores ao dobro da taxa permitida por lei, que é de 1% (um por cento) ao mês, contra dezenas de vítimas. Mencionou, ainda, que, como forma de assegurar o pagamento das aludidas dívidas, o denunciado Francisco Josemar Tragino reteve documentos de identificação pessoal das vítimas, bem como, com o mesmo propósito, reteve cartões magnéticos de contas bancárias relativas a benefícios, proventos ou pensões, dentre outros documentos, das vítimas idosas. A denúncia aduziu que, entre o segundo semestre do ano de 2015 e o primeiro semestre do ano de 2019, na cidade de Serra do Mel, os denunciados Francisco Josemar Tragino e Francisca Lidenkatia de Lima dissimularam a origem criminosa dos valores pecuniários obtido com a infração penal anteriormente narradas – crime de usura -, por meio do estabelecimento comercial de ambos, um mercado de produtos alimentícios e de uso doméstico, denominado Mini Box JK. Narrou, ainda, que, em data incerta, entre os dias 14 de agosto de 2018 e 28 de maio de 2019, na cidade de Serra do Mel/RN, o denunciado Francisco Raimundo Targino forneceu e cedeu (vendeu) três cartelas de munições calibre .38 a Francisco Josemar Tragino, sem autorização e em desacordo com determinação legal. Mediante a decisão de ID nº 75691402 - Pág. 19 a 28, no dia 20 de junho de 2019, foi recebida a denúncia. Outrossim, naquele momento processual, fora mantida a prisão preventiva de Francisco Josemar Tragino, José Augusto Arruda de Moura, Francisco Raimundo Targino. Além disso, foi convertida a prisão temporária em prisão preventiva de Leonardo Santos Vieira. A ré Francisca Lindekatia de Lima foi devidamente citada, ID nº 75691403 - Pág. 56, tendo apresentado resposta à acusação, ID nº 75691404 - Pág. 40 a 43. A ré Giselle Santos Bezerra foi citada, ID nº 75691403 - Pág. 57. O réu Francisco Josemar Tragino apresentou resposta à acusação, ID nº 75691404 - Pág. 36 a 38. O Ministério Público manifestou-se pela instauração do incidente de insanidade mental em relação à Francisca Lidekátia de Lima, ID nº 75691404 - Pág. 50 a 52. Os réus Francisco Raimundo Targino, Francisco Josemar Tragino, Francisco Raimundo Targino e Leonardo Santos Vieira foram devidamente citados, ID nº 75691404 - Pág. 56. Mediante a decisão de ID nº 75691404 - Pág. 58 a 60 e ID nº 75691405 - Pág. 1 a 5, foi mantida a prisão do réu Francisco Josemar Tragino e Leonardo Santos Vieira. Outrossim, fora determinada a instauração do incidente de insanidade mental para dirimir dúvida quanto à integridade mental da ré Francisca Lindekatia de Lima, sendo determinada a suspenção do curso do feito em face da mencionada ré. No ID nº 75691405 - Pág. 6 a 11, consta resposta à acusação da ré Giselle Santos Bezerra. O réu José Augusto Arruda de Moura apresentou defesa prévia, ID nº 75691405 - Pág. 21 a 22. No ID nº 75691405 - Pág. 30 a 41, consta resposta à acusação do réu Francisco Raimundo Targino. O réu Leonardo Santos Vieira apresentou resposta à acusação, ID nº 75691405 - Pág. 48 a 51. Mediante a decisão de ID nº 75691405 - Pág. 53 a 61, foram rejeitadas as preliminares alegadas pela defesa de Leonardo Santos Vieira e Gisele Santos Bezerra. Outrossim, fora determinado o aprazamento de audiência de instrução. No dia 02 de outubro de 2019, fora realizada audiência de instrução e julgamento. Inicialmente, fora determinado o desmembramento do feito em relação a ré Francisca Lindekátia de Lima. Após, foram colhidos os depoimentos das testemunhas e dos declarantes, bem como os interrogatórios dos acusados. Outrossim, o MM. Juiz determinou a realização do exame de dependência química. Por fim, o Órgão Ministerial requereu que fosse solicitado os autos do processo de fls. 572 (autos de nº 0101342-34.2019.8.20.0106) do IP, sob o fundamento de que a presente ação penal é continente em relação àquela que tramita na 3ª Vara. As defesas anuíram com o requerimento ministerial. O MM. Juiz deferiu o pleito e determinou a expedição de ofício solicitando os autos ao juízo da 3ª Vara Criminal, ID nº 75691407 - Pág. 25 a 28. Mediante a decisão de ID nº 75691407 - Pág. 32 a 35, foi revogada a prisão preventiva de Francisco Josemar Tragino, Francisco Raimundo Targino, José Augusto Arruda de Moura e Leonardo Santos Vieira. No ID nº 75691409 - Pág. 42 a 46, consta laudo médico-pericial de insanidade mental da ré Francisca Lindekátia de Lima. Mediante a decisão de ID nº 75691409 - Pág. 66 a 68, fora determinada a realização de novo exame de insanidade mental para a ré Francisca Lindekátia de Lima. No ID nº 75691851 - Pág. 1, fora certificada a juntada dos autos nº 0101992-81.2019.8.20.0106 (pedido de decretação da prisão preventiva de Francisco Josemar Tragino, José Augusto Arruda de Moura, Francisco Raimundo Targino, Leonardo Santos Vieira e Giselle Santos Bezerra; decretação de busca e apreensão domiciliar para o domicílio de José Augusto Arruda de Moura e Francisco Josemar Tragino). Mediante o despacho de ID nº 75750648 - Pág. 1, foi determinado o cumprimento do desmembramento em relação à Francisca Lindekátia. No ID nº 92021121 - Pág. 1, foi certificado o desmembramento em relação a ré Francisca Lindekátia de Lima, sob o nº 0823076-30.2022.8.20.5106. No ID nº 96224574 - Pág. 1, o ITEP informou que houve a realização de perícia em Francisco Josemar Tragino e Francisco Raimundo Targino. No ID nº 97789528, consta laudo médico pericial do réu Francisco Josemar Tragino. No ID nº 97790929, consta laudo médico pericial de Francisco Raimundo Targino. Mediante a decisão de ID nº 103892169, foi homologada a perícia realizada e determinado o prosseguimento do feito principal. Ademais, fora determinada a intimação das partes para apresentar alegações finais. Por fim, foi determinado o apensamento do processo de Francisca Lindekática de Lima. O Ministério Público apresentou alegações finais, na qual pugnou: 1) para Francisco Josemar Tragino condenação nos crimes: 1.1) artigos 33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal; 1.2) do artigo 4º,“a”, da Lei nº 1.521/51, por vinte vezes (onze dessas vezes com a mesma capitulação, mas inserido o § 2º, IV, “b”, do mesmo tipo penal – vítima agricultor), na forma do artigo 71 do Código Penal; 1.3) do artigo 3º, caput, da Lei 5.553/68, por cinco vezes, na forma do artigo 71 do CP; 1.4) artigo 104 da Lei 10.741/03, por onze vezes, na forma do artigo 71. Além disso, pugnou pela absolvição em relação aos delitos dos artigos artigo 244-B do ECA, do artigo 288, caput, do Código Penal, e do artigo 1º da Lei 9.613/98. Por fim, pugnou pela condenação dos réus Francisco Raimundo Targino (Doca), José Augusto Arruda de Moura (Aleijado), Leonardo Santos Vieira (Gaguinho) e Giselle Santos Bezerra, nos exatos termos da denúncia. A ré Giselle Santos Bezerra, mediante a petição de ID nº 107342503, requereu a designação de nova audiência, em decorrência dos fatos relacionados ao processo apenso nº 0107068-23.2018.8.20.0106 não terem sido objeto do crivo do contraditório e da ampla defesa. Acrescenta que o pedido de apensamento se deu pelo Órgão Ministerial em audiência de instrução, na qual não foi viabilizada às partes manifestar-se sobre a questão delineada no processo. Ao final, requer a designação de audiência em continuidade. Mediante a petição de ID nº 107355055, o réu Francisco Raimundo Targino requereu a conversão do julgamento em diligência, em virtude da conexão do processo identificado pelo número 0107068-23.2018.8.20.0106, pleiteando a retomada da instrução processual. O réu Francisco Josemar Tragino pugnou pela designação da audiência em continuidade, em decorrência do apensamento de processo em conexão, ID nº 107428018. No ID nº 115478984, fora anexada cópia da sentença e do inquérito policial dos autos nº 0101342-34.2019.8.20.0106, o qual foi extinto, em decorrência do reconhecimento de litispendência com a presente ação. O Ministério Público apresentou manifestação, ID nº 115718313. No ID nº 116888780, consta relação de bens apreendidos no depósito judicial. Mediante a decisão de ID nº 118633133, fora indeferido o pleito de reabertura da instrução processual. Outrossim, determinou-se a intimação dos réus para, no prazo legal, apresentarem suas alegações finais, bem como se manifestarem sobre a destinação dos bens apreendidos. O Ministério Público manifestou-se sobre a destinação dos bens, ID nº 121819863. O réu Francisco Raimundo Targino apresentou manifestação sobre a destinação dos bens, ID nº 121888363. O réu Francisco Raimundo Targino interpões recurso em sentido estrito, ID nº 121889403. No ID nº 123913319, constam as razões recursais do recurso em sentido estrito. No ID nº 124104448 - Pág. 1, foi anexada certidão de óbito de Francisco Josemar Tragino. O Ministério Público manifestou-se no sentido da declaração da extinção da punibilidade do réu Francisco Josemar Tragino, ID nº 125045939 - Pág. 1. Mediante a decisão de ID nº 125118462 - Pág. 1 a 7, foi extinta a punibilidade do réu FRANCISCO JOSEMAR TRAGINO. Outrossim, determinou-se que a Secretaria certificasse o decurso, ou não, do prazo para o Ministério Público apresentar contrarrazões ao recurso em sentido estrito apresentado pela defesa do réu Francisco Raimundo Targino. No ID nº 129484344 - Pág. 1, consta contrarrazões do Órgão Ministerial, pugnando pelo não conhecimento do recurso e, caso contrário, no mérito, seja improvido, com a manutenção da decisão. Mediante a decisão de ID nº 130776908, não foi recebido o recurso em sentido estrito interposto pela defesa do réu Francisco Raimundo Targino. Outrossim, foi determinada a extração do translado e remessa ao Tribunal de Justiça deste Estado. No ID nº 132795941 - Pág. 1, foi certificado o cadastro do Recurso Em Sentido Estrito, cujo processo foi distribuído com o número 0813982-79.2024.8.20.0000. No ID nº 138076869 - Pág. 1, fora anexada certidão de óbito de Leonardo Santos Vieira. No ID nº 140386750, consta acórdão do Tribunal de Justiça deste Estado, proferido no RESE nº 013982-79.2024.8.20.0000, no qual não foi conhecido o recurso, por inadequação da via eleita. No ID nº 142383120, a defesa de Giselle Santos Bezerra apresentou alegações finais por memoriais, na qual requereu a absolvição da acusada pela prática dos delitos tipificados nos art. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06. Subsidiariamente, em caso de condenação, pugnou pela aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06. O denunciado Francisco Raimundo Targino apresentou alegações finais, na qual pugnou pela absolvição do acusado para a ação delituosa prevista nos artigos 33 e 35 da Lei 11.343/06 nos termos do art. 386, incisos IV e V, do CPP. Subsidiariamente, requereu a desclassificação para o delito do art. 33, § 4 da Lei 11.343/2006, em razão de o acusado ter comprovação que não se dedica, a época dos fatos, à atividade criminosa. Além disso, requereu a absolvição do delito presente no art. 14 da Lei 10.826/03, conforme art. 368, VII, CPP. Em caso de condenação, pugnou pela fixação da pena no mínimo legal, ocorrendo à aplicação das atenuantes e minorantes cabíveis e a consequente aplicação dos benefícios penais adequados no caso em apreço. ID nº 145699427. O réu José Augusto Arruda de Moura, por meio da Defensoria Pública, apresentou alegações finais. Requereu a absolvição da conduta delituosa prevista nos artigos 33 c/c art. 40, VI, ambos da Lei 11.343/06. Subsidiariamente, caso não seja hipótese de absolvição, requer a desclassificação para o art. 28 da Lei 11.343/2006. Caso o pleito anterior não seja atendido, requereu o reconhecimento do tráfico privilegiado, conforme art. 33, § 4º da Lei nº 11.343/2006. Ademais, pugnou que o acusado seja absolvido do crime previsto no art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06, conforme art. 386, inciso II e IV do CPP. Por fim, na remota hipótese de condenação a fixação do apenamento do denunciado em seu mínimo legal, ocorrendo à aplicação das atenuantes e minorantes cabíveis e a consequente aplicação dos benefícios penais adequados no caso em apreço. É o relatório. 02. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 Regularidade Impende ressaltar, inicialmente, que o presente processo tramitou respeitando, plenamente, as normas legais processuais, não padecendo de qualquer nulidade processual. 2.2 Da Extinção da Punibilidade para o réu Leonardo Santos Vieira Inicialmente, nos presentes autos, fora acostada a informação do óbito do acusado LEONARDO SANTOS VIEIRA, regularmente comprovado pela certidão de óbito ID nº 138076869 - Pág. 1, inexistindo a possibilidade de dar prosseguimento na presente ação penal com relação ao mencionado réu, sendo o caso de se declarar a extinção da punibilidade, na forma do art. 107, I, do CP, em interpretação analógica do art. 62 do CPP. Registre-se que o óbito do agente seria uma das formas de extinção da ação penal. Ante o exposto, EXTINGO a punibilidade do réu LEONARDO SANTOS VIEIRA qualificado nos autos, em razão do seu óbito, nos termos do art. 107, inciso I, do Código Penal. 2.3. Da Imputação Após o caminhar processual, nesta ação penal restaram os réus José Augusto Arruda de Moura, Francisco Raimundo Targino e Giselle Bezerra, sendo lhe atribuída a suposta prática dos crimes tipificados nos art. 33 e 35 da Lei nº 11.345/06. Além disso, ao réu Francisco Raimundo Targino é atribuída, também, a suposta prática do crime tipificado no art. 14, caput, da Lei nº 10.826/06. A título de registro, tem-se que o réu Leonardo Santos Vieira foi extinta punibilidade, em decorrência do falecimento. Com relação ao réu Francisco Josemar Tragino, foi extinta a punibilidade no ID nº 125118462 - Pág. 1 a 7, em decorrência do seu óbito. Por fim, a ré Francisca Lindekátia de Lima teve o feito desmembrado, sendo autuado o processo nº 0823076-30.2022.8.20.5106. 2.4. Do Mérito 2.4.1 Do crime capitulado no art. 35 da Lei nº 11.343/06 Aos acusados José Augusto Arruda de Moura, Francisco Raimundo Targino e Giselle Bezerra fora imputada a prática do crime de associação para o tráfico de drogas, o qual possuí a seguinte adequação legal: Art.35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Parágrafo Único. Nas mesmas penas do caput deste artigo incorre quem se associa para a prática reiterada do crime definido no art. 36 desta Lei. Conforme o jurista Renato Brasileiro, "associar-se quer dizer reunir-se, aliar-se ou congregar-se de maneira estável ou permanente para a consecução de um fim comum". Afirma ainda o citado autor que "a característica da associação é a estabilidade do vínculo que une os agentes, mesmo que nenhum dos crimes por eles planejados venha a se concretizar". Nesse sentido, "por mais que o art. 35 da Lei de Drogas faça uso da expressão 'reiteradamente ou não', a tipificação desse crime depende da estabilidade ou permanência (societas sceleris), características que o diferenciam de um concurso eventual de agentes (CP, art. 29)"1. A par dessas considerações, crível dizer que a atividade delitiva em comento requer a convergência do desejo criminoso de duas ou mais pessoas, com o fim específico de, reiteradamente, praticarem o tráfico de entorpecentes nas modalidades definidas pelo art. 33, caput, e seu parágrafo único, e art. 34, todos da Lei 11.343/2006, não se fazendo necessário, todavia, que a finalidade de tráfico seja efetivada, ou seja, que o tráfico efetivamente seja consumado, importando apenas a convergência dos desígnios dos agentes para o tráfico. Assim sendo, também é crível se registrar que a consumação do delito de associação independe da realização efetiva do tráfico e seu associado. Evidentemente, como também se anunciou, faz-se necessário o caráter da estabilidade que indique o vínculo associativo entre os agentes. Considerações preliminares tecidas, aduziu o representante do Ministério Público que os réus estariam associados para, unidos, perpetrarem o tráfico. No entanto, inexistem nos autos elementos aptos a demonstrar a efetiva e duradoura participação dos acusados em uma eventual sociedade/associação constituída para fins da traficância. Após a instrução processual, tem-se que inexistem nos autos elementos aptos a demonstrar a efetiva e duradoura participação de José Augusto Arruda de Moura, Francisco Raimundo Targino e Giselle Bezerra no delito de associação para o tráfico, de modo que as suas absolvições quanto ao mencionado crime é medida que se impõe. Dessa maneira, estando os elementos de convencimento resumido aos diálogos, fruto das interceptações telefônicas, não se pode com base neles confirmar o juízo de certeza formulado. Repise-se que os diálogos extraídos não se mostram suficientes para comprovar a existência de uma efetiva e duradoura participação dos acusados em uma eventual sociedade/associação constituída para fins da traficância. Assim, existentes nos autos contra os citados réus somente indícios e presunções, que não bastam para ensejar uma condenação, se não corroborada por outras provas que demonstrem a certeza da perpetração da conduta delitiva, a sua absolvição é medida que se impõe, conforme o pacífico entendimento jurisprudencial: Uma condenação não pode estar alicerçada no solo movediço do possível ou do provável, mas apenas no terreno firme da certeza. Assim, em tema de comércio clandestino de entorpecentes, inadmissível é a prolação de decreto condenatório com lastro em simples presunção, máxime quando haja interesse policial na incriminação do réu (TACRIM-SP - AC - Rel. Silva Franco - JUTACRIM 53/373). Em matéria criminal tudo deve ser preciso e certo, sem que ocorra possibilidade de desencontro na apreciação da prova. Desde que o elemento probante não se apresenta com cunho de certeza, a absolvição do réu se impõe (TJSP - AC - Rel. Hoeppner Dutra - RJTJSP 10/545). APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO - INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO - ABSOLVIÇÃO NECESSÁRIA - RECURSO NÃO PROVIDO. - É necessária prova escorreita e segura da existência e da autoria do fato delituoso para que a presunção de inocência que milita em favor do acusado seja elidida; isso porque uma condenação baseada apenas em conjecturas e ilações feriria de morte a Dignidade do homem, princípio matriz de nossa Constituição. (TJ-MG - APR: 10040120061862001 MG , Relator: Cássio Salomé, Data de Julgamento: 12/09/2013, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 20/09/2013) Nesse desiderato, torno a dizer, o conjunto probatório se mostra insuficiente para embasar um eventual decreto condenatório, pois todas as provas trazidas aos autos contra os réus são frágeis, e para se condenar criminalmente, não basta mera suspeita, impõe-se que a prova proporcione a convicção de que o crime, realmente fora cometido pelos acusados, pois, na dúvida, impõe-se a aplicação do brocardo in dubio pro reo. Sob tais argumentos, não restando provada a participação dos referidos acusados no delito acima capitulado, não resta outra saída a não ser as suas absolvições. 2.4.2 Do Crime de Porte de Arma de Fogo – Art. 14, caput, da Lei nº 10.826/06 Primeiramente, cumpre trazer à baila o artigo 14 do Estatuto do Desarmamento, o qual traz o tipo penal do porte de arma de fogo de uso permitido: Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Transcrito o preceito acima, resta evidente que ele se caracteriza como um crime de mera conduta, ou seja, consuma-se independentemente da ocorrência de efetivo prejuízo para a sociedade, e a probabilidade de vir a ocorrer algum dano é presumida pelo tipo penal. Além disso, o objeto jurídico tutelado não é a incolumidade física, mas a segurança pública e a paz social, sendo irrelevante o fato de estar a arma de fogo municiada ou não. Feito esse esclarecimento, cumpre asseverar que, diante da prova testemunhal produzida no presente processo, restou demonstrada a materialidade do crime entabulado no art. 14 do Estatuto do Desarmamento para o réu Francisco Raimundo Targino. No tocante à autoria, necessário realizar alguns apontamentos. A testemunha José Vieira de Casto, delegado de polícia civil, em juízo, afirmou que presidiu as investigações que culminaram na presente ação penal. Com relação ao delito de porte ilegal de munição de uso permitido, atribuído ao réu Francisco Raimundo Targino (“Doca”), afirmou que com o mencionado réu não foi encontrada nenhuma arma. No entanto, em uma das interceptações telefônicas, constatou que Francisco Raimundo Targino (“Doca”) ofereceu três carteiras de munições para Francisco Josemar Tragino (“Zimar”), o qual adquiriu o mencionado material. Salientou que, em outro momento, foram encontradas munições com o réu Francisco Josemar Tragino (“Zimar”), sendo autuado o procedimento específico para apurar tal fato. Informou que Francisco Josemar Tragino e Francisco Raimundo Targino confirmaram essa condição em seus depoimentos em sede policial. Na mesma linha, o réu Francisco Raimundo Targino, conhecido como “Doca”, em seu interrogatório judicial, confessou que deu duas cartelas de munições, calibre .38, para Francisco Josemar Tragino, conhecido como “Zimar”, seu irmão. Portanto, in casu, não há qualquer elemento nos autos que coloque em dúvida a autoria delitiva. Pelo contrário, eis que, todas as provas produzidas fornecem a certeza necessária para que se considere o denunciado como autor do delito em questão. Ressalte-se que máxime é o valor da confissão espontânea e voluntária do acusado, mormente quando em consonância com as demais provas dos autos, como é o caso, especialmente da testemunha, não havendo nenhuma outra prova que ilida a veracidade e autenticidade das declarações do acusado. Na mesma vertente já decidiu o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO QUALIFICADO PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE PESSOAS. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVA DA AUTORIA. CONFISSÃO DO RECORRENTE EM CONSONÂNCIA COM OUTROS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DUPLAMENTE MAJORADO PARA O DE ROUBO SIMPLES. IMPOSSIBILIDADE. APREENSÃO DA ARMA DE FOGO E PROVA ORAL QUE REVELA A COMUNHÃO DE DESÍGNIOS PARA A PRÁTICA CRIMINOSA. DOSIMETRIA DA PENA. EXCLUSÃO DO DESVALOR ATRIBUÍDO À CULPABILIDADE E AOS MOTIVOS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PENA INALTERADA. SÚMULA 231 DO STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-RN - ACR: 50697 RN 2010.005069-7, Relator: Juiz Nilson Cavalcanti (Convocado), Data de Julgamento: 25/10/2011, Câmara Criminal, undefined). Portanto, no presente caso, igualmente a autoria restou suficientemente comprovada. Ante o exposto, as provas produzidas no transcorrer do processo apontam que o crime de porte ilegal de munições, na modalidade ceder, ocorreu e que o réu foi o autor do crime. As provas são suficientes para comprovar a materialidade e autoria do crime, de modo que restou provado que o acusado cedeu as munições de uso permitido. Igualmente, restou caracterizada a subsunção do fato descrito na denúncia ao tipo penal do art. 14 do Estatuto do Desarmamento, demonstrada, assim, a tipicidade. Ilicitude e Culpabilidade Com efeito, restou perfeitamente comprovado nos autos que a conduta praticada pelo acusado subsume-se ao artigo 14, caput, da Lei 10.826/2003. Por fim, ressalto que não militam em favor do réu excludentes de ilicitude ou dirimentes de culpabilidade. Assim, em razão disso tudo, forte nas provas dos autos, considerando que a prova produzida em juízo fortalece a prova coletada durante as investigações policias, sem qualquer contradição que mereça destaque, é forçoso reconhecer provada a materialidade e a autoria do acusado quanto ao crime tipificado no artigo 14, da Lei n° 10.826/2003. 2.4.3. Do crime de Tráfico Ilícito de Entorpecentes Autoria, Materialidade e Tipicidade Primeiramente, cumpre trazer à baila os preceitos da Lei nº 11.343/06 relacionados ao suposto fato criminoso descrito na denúncia: Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Transcritos os preceitos normativos penais acima, cumpre asseverar que o crime de tráfico de drogas se caracteriza como um delito de ação múltipla, ou seja, que resta caracterizado sempre que houver demonstração de que a conduta do agente se enquadra em um dos verbos nucleares do tipo penal descrito no artigo 33 da Lei de Drogas. Além disso, deve-se aduzir que se trata de uma norma penal em branco que, para a configuração do que venha a ser droga sem autorização legal ou regulamentar, depende de Portaria expedida pelo Ministério da Saúde que regulamenta as substâncias entorpecentes. Por sua vez, cumpre afirmar, ainda, que se trata de um delito de mera conduta, isto é, não há previsão de resultado naturalístico, restando configurado o crime desde que praticada qualquer uma das condutas descritas no artigo 33 da Lei de Drogas. Feitos esses esclarecimentos sobre o tipo penal e adentrando o plano fático, deve-se asseverar que a materialidade não ficou demonstrada pelas provas produzidas. O delito de tráfico ilícito de entorpecentes deixa vestígios e, por conseguinte, a demonstração de sua materialidade depende, em regra, da apreensão de alguma substância que possa ser levada à perícia técnica para aferição de sua proscrição em nosso ordenamento jurídico. O art. 158 do Código de Processo Penal dispõe ser indispensável o exame sobre o “corpo de delito” quando a infração deixar vestígios. Outrossim, o art. 167 do mesmo diploma legislativo afirma que não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecidos os vestígios, a prova testemunha poderá suprir-lhe a falta. Após a instrução probatória, restou demonstrada que não ocorreu nenhuma apreensão de droga com os réus Giselle Bezerra e José Augusto Arruda de Moura (“Aleijado”), nem que tenha sido submetida a exame toxicológico para confirmar que se tratava de substância ilícita, capaz de causar dependência físico e/ou psíquica. Registre-se que a testemunha José Vieira de Castro, delegado de polícia civil, em sede judicial, ao responder aos questionamentos das defesas, pontuou que com Giselle Bezerra não fora encontrado material entorpecentes. Com relação ao réu José Augusto Arruda de Moura, afirmou que na casa do mencionado denunciado não fora encontrado nada de ilícito. Ora, das provas produzidas, com relação aos réus José Augusto Arruda de Moura e Giselle Bezerra verifica-se a ausência de apreensão de qualquer substância supostamente entorpecente que a eles pudessem ser vinculadas, inexistindo, consequentemente, laudo de exame toxicológico, preliminar ou definitivo, a comprovar a materialidade do delito de tráfico de drogas. Os elementos constantes nos autos resumem-se a dados obtidos por meio da interceptação telefônica que, indiretamente, delineiam o envolvimento dos denunciados com a narcotraficância. É temerário afirmar que a materialidade do crime de tráfico de drogas não está regularmente demonstrada, ainda que existam indícios (diálogos entre os denunciados) capazes de vincular os acusados ao narcotráfico. A apreensão de drogas se revela imprescindível para a configuração do crime descrito no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, devendo ser efetivamente periciada, a fim de que se possa identificar, com grau de certeza, qual é o tipo de substâncias ou produto e se efetivamente encontra-se prevista na Portaria nº 344/1998 da Anvisa. E, inexistindo a materialidade delitiva com relação ao crime de tráfico ilícito de droga é medida que se impõe a absolvição dos réus José Augusto Arruda de Moura, conhecido por “Aleijado”, e Giselle Bezerra relativa à imputação da prática do crime tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/04, descrito na exordial acusatória. Nesse sentido, tem-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ABSOLVIÇÃO PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DE ENTORPECENTES E DE LAUDO DE EXAME TOXICOLÓGICO. VINCULAÇÃO COM ENTORPECENTES APREENDIDOS COM CORRÉU. MATERIALIDADE COMPROVADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A Terceira Seção desta Corte, no âmbito do HC n. 686.312/MS, Rel. p/o acórdão o Min. Rogerio Schietti Cruz, decidiu que, não obstante haja provas que evidenciem a ocorrência do tráfico de drogas, sem a apreensão dos entorpecentes o crime não se configura, por ausência de materialidade. 2. Ocorre que o acórdão impugnado vincula a apreensão de 8kg de maconha entregues por corréu da ação penal a que se refere este mandamus a integrante de outra célula criminosa da mesma organização, de modo que, neste caso, concretamente justificada a materialidade do crime de tráfico de drogas, sendo incabível a absolvição, à luz dos demais elementos constantes do acórdão impugnado, tais como as interceptações telefônicas e depoimentos de policiais. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 860.031/RJ, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 4/12/2023, DJe 11/12/2023). AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DE DROGAS. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE MATERIALIDADE DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO (ART. 386, VII, DO CPP). EXTENSÃO DOS EFEITOS EM FAVOR DOS CORRÉUS (ART. 580 DO CPP). DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp n. 2.334.939/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 21/11/2023, DJe 27/11/2023). PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. APREENSÃO DE ENTORPECENTE. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DA PROVA DA MATERIALIDADE DELITIVA. PRECEDENTE DO STJ. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. O recente posicionamento da Terceira Seção desta Corte Superior é no sentido da impossibilidade de condenação pelo crime do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 quando não há apreensão de droga, mesmo que sejam mencionadas outras provas robustas a indicar a dedicação do acusado à mercancia de entorpecentes. 2. Na hipótese, não obstante a prova testemunhal e documental tenham apontado para a suposta prática do crime de tráfico de drogas pelo agravado e demais corréus, restou incontroverso nos autos que, em nenhum momento, houve a apreensão de qualquer substância entorpecente, seja em poder dele, seja em poder dos corréus ou de terceiros não identificados. 3. O entendimento da Corte de origem de que "a ausência de apreensão de substância entorpecente em posse do paciente não descarta a autoria e a comprovação do delito" vai de encontro à atual orientação jurisprudencial desta Corte sobre o tema, no sentido de que, para a caracterização do delito de tráfico de drogas, é imprescindível que haja a apreensão de entorpecente com ao menos um dos acusados, e, nesse caso, demonstrado o liame subjetivo entre os agentes, o que não ocorreu na hipótese. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 832.382/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 2/10/2023, DJe 5/10/2023). HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS ACERCA DA MATERIALIDADE DO DELITO. EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS APTOS A COMPROVAR A PRÁTICA DO CRIME. IRRELEVÂNCIA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. IMPRESCINDIBILIDADE DE APREENSÃO DE DROGAS NA POSSE DIRETA DO AGENTE. ORDEM CONCEDIDA, COM EXTENSÃO, DE OFÍCIO AOS CORRÉUS. No julgamento do HC n. 350.996/RJ, de relatoria do Ministro Nefi Cordeiro, a Terceira Seção reconheceu, à unanimidade, que o laudo toxicológico definitivo é imprescindível para a comprovação da materialidade dos delitos envolvendo entorpecentes, sem o qual é forçosa a absolvição do acusado, admitindo-se, no entanto, em situações excepcionais, que a materialidade do crime de tráfico de drogas possa ser demonstrada por laudo de constatação provisório, desde que ele permita grau de certeza idêntico ao do laudo definitivo e haja sido elaborado por perito oficial, em procedimento e conclusões equivalentes. Por ocasião do julgamento dos EREsp n. 1.544.057/RJ, de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (DJe 9/11/2016), a Terceira Seção desta Corte uniformizou o entendimento de que a ausência do laudo toxicológico definitivo implica a absolvição do acusado, por ausência de provas acerca da materialidade do delito, e não a nulidade da sentença. Foi ressalvada, no entanto, a possibilidade de se manter o édito condenatório quando a prova da materialidade delitiva estiver amparada em laudo preliminar de constatação, dotada de certeza idêntica ao do definitivo, certificado por perito oficial e em procedimento equivalente, que possa identificar, com certo grau de certeza, a existência dos elementos físicos e químicos que qualifiquem a substância como droga, nos termos em que previsto na Portaria n. 344/1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. Pelo que decidido nos autos dos EREsp n. n. 1.544.057/RJ, é possível inferir que, em um ou outro caso, ou seja, com laudo toxicológico definitivo ou, de forma excepcionalíssima, com laudo de constatação provisório, é necessário que sejam apreendidas drogas.Em outros termos, para a condenação de alguém pela prática do crime de tráfico de drogas, é necessária a apreensão de drogas e a consequente elaboração ao menos de laudo preliminar, sob pena de se impor a absolvição do réu, por ausência de provas acerca da materialidade do delito. Pelo raciocínio desenvolvido no julgamento dos referidos EREsp n. 1.544.057/RJ, também é possível depreender que, nem mesmo em situação excepcional, a prova testemunhal ou a confissão do acusado, por exemplo, poderiam ser reputadas como elementos probatórios aptos a suprir a ausência do laudo toxicológico, seja ele definitivo, seja ele provisório assinado por perito e com o mesmo grau de certeza presente em um laudo definitivo. O art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 apresenta-se como norma penal em branco, porque define o crime de tráfico com base na prática de dezoito condutas relacionadas a drogas - importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer -, sem, no entanto, trazer a definição do elemento do tipo "drogas". Segundo o parágrafo único do art. 1º da Lei n. 11.343/2006, "consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União."Portanto, a definição do que sejam "drogas", capazes de caracterizar os delitos previstos na Lei n. 11.343/2006, advém da Portaria n. 344/1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (daí a classificação doutrinária, em relação ao art. 33 da Lei n. 11.343/2006, de que se está diante de uma norma penal em branco heterogênea). Vale dizer, por ser constituída de um conceito técnico-jurídico, só será considerado droga o que a lei (em sentido amplo) assim reconhecer como tal. Mesmo que determinada substância cause dependência física ou psíquica, se ela não estiver prevista no rol das substâncias legalmente proibidas, ela não será tratada como droga para fins de incidência da Lei n. 11.343/2006. No entanto, para a perfectibilização do tipo previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, é necessário mais do que isso: é necessário que a substância seja efetivamente apreendida e periciada, para que se possa identificar, com grau de certeza, qual é o tipo de substância ou produto e se ela (e) efetivamente encontra-se prevista (o) na Portaria n. 344/1998 da Anvisa. A caracterização do crime de tráfico de drogas prescinde de apreensão de droga em poder de cada um dos acusados; basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada, ao menos em tese, a prática do delito em questão. Assim, a mera ausência de apreensão de drogas na posse direta do agente "não afasta a materialidade do delito de tráfico quando estiver delineada a sua ligação com outros integrantes da mesma organização criminosa que mantinham a guarda dos estupefacientes destinados ao comércio proscrito", conforme decidido por ocasião do julgamento do HC n. 536.222/SC, de relatoria do Ministro Jorge Mussi (5ª T., DJe de 4/8/2020). Na hipótese dos autos, embora os depoimentos testemunhais e as provas oriundas das interceptações telefônicas judicialmente autorizadas tenham evidenciado que a paciente e os demais corréus supostamente adquiriam, vendiam e ofereciam "drogas" a terceiros - tais como maconha, cocaína e crack -, não há como subsistir a condenação pela prática do delito descrito no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, se, em nenhum momento, houve a apreensão de qualquer substância entorpecente, seja em poder dela, seja em poder dos corréus ou de terceiros não identificados. Apesar das diversas diligências empreendidas pela acusação, que envolveram o monitoramento dos acusados, a realização de interceptações telefônicas, a oitiva de testemunhas (depoimentos de policiais) etc., não houve a apreensão de droga, pressuposto da materialidade delitiva. Assim, mesmo sendo possível extrair dos autos diversas tratativas de comercialização de entorpecentes pelos acusados, essas provas podem caracterizar o crime de associação para o tráfico de drogas, mas não o delito de tráfico em si. Ao funcionar como regra que disciplina a atividade probatória, a presunção de não culpabilidade preserva a liberdade e a inocência do acusado contra juízos baseados em mera probabilidade, determinando que somente a certeza pode lastrear uma condenação. A presunção de inocência, sob tal perspectiva, impõe ao titular da ação penal todo o ônus de provar a acusação, quer a parte objecti, quer a parte subjecti. Não basta, portanto, atribuir a alguém conduta cuja compreensão e subsunção jurídico-normativa, em sua dinâmica subjetiva - o ânimo a mover a conduta -, decorre de avaliação pessoal de agentes do Estado, e não dos fatos e das circunstâncias objetivamente demonstradas. Uma vez que houve clara violação da regra probatória inerente ao princípio da presunção de inocência, não há como subsistir a condenação da acusada no tocante ao referido delito, por ausência de provas acerca da materialidade. Permanece hígida a condenação da ré no tocante ao crime de associação para o tráfico de drogas (art. 35 da Lei n. 11.343/2006), haja vista que esta Corte Superior de Justiça entende que, para a configuração do referido delito, é irrelevante a apreensão de drogas na posse direta do agente. Precedentes. Embora remanescente apenas a condenação pelo crime de associação para o tráfico de drogas, deve ser mantida inalterada a imposição do regime inicial fechado. Isso porque, embora a acusada haja sido condenada a reprimenda superior a 4 e inferior a 8 anos de reclusão, teve a pena-base desse delito fixada acima do mínimo legal, circunstância que, evidentemente, autoriza a fixação de regime prisional mais gravoso do que o permitido em razão da pena aplicada. Ordem de habeas corpus concedida, a fim de absolver a paciente em relação à prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, objeto do Processo n. 0001004-55.2016.8.12.0017, por ausência de provas acerca da materialidade do delito. Extensão, de ofício, dos efeitos da decisão a todos os corréus, para também absolvê-los no tocante ao delito de tráfico de drogas. (STJ - HC: 686312 MS 2021/0255481-2, Relator: SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 12/04/2023, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 19/04/2023). HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. NATUREZA E QUANTIDADE DE DROGAS. VALORAÇÃO NEGATIVA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES. CULPABILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MODUS OPERANDI DO DELITO. QUANTUM DE AUMENTO DA PENA-BASE. PROPORCIONALIDADE. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. No julgamento do HC n. 686.312/MS (Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Rel. p/ o acórdão Ministro Rogerio Schietti, 3ª S., DJe 19/4/2023), a Terceira Seção desta Corte uniformizou a compreensão de que não é possível a condenação pelo crime de tráfico de drogas quando nenhuma substância entorpecente é apreendida, por falta de prova da materialidade delitiva. 2. No mesmo julgado, ratificou-se o entendimento de que a ausência de apreensão de drogas, embora obste a condenação por tráfico (art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006), não impede a condenação pelo crime de associação para o tráfico (art. 35, caput, da Lei n. 11.343/2006), "na medida em que, por ser de natureza formal, ele se caracteriza ainda que os agentes não cometam o(s) crime(s) a que se dispuseram ao se associar, com estabilidade e permanência". 3. De todo modo, por decorrência lógica, se o fundamento para não ser cabível a condenação por tráfico sem apreensão de drogas é a impossibilidade de "identificar, com grau de certeza, qual é o tipo de substância ou produto e se ela(e) efetivamente encontra-se prevista(o) na Portaria n. 344/1998 da Anvisa", ainda que possa subsistir a condenação pelo crime de associação, não há como valorar negativamente, nesse delito, a circunstância "natureza/quantidade de drogas" quando nenhuma substância entorpecente foi efetivamente apreendida. Com efeito, na linha do raciocínio desenvolvido no referido precedente, sem a apreensão de nenhuma substância, não é possível analisar pericialmente a natureza do produto para atestar se se tratava efetivamente de drogas, tampouco se pode aferir a sua exata quantidade. Assim, deve ser afastado o aumento da pena-base do paciente referente a essa circunstância. [...] 7. Ordem parcialmente concedida para afastar a valoração negativa da circunstância "natureza/quantidade de drogas" na primeira fase da dosimetria e reduzir a pena do paciente pelo crime de associação para o tráfico a 4 anos, 11 meses e 6 dias de reclusão e 1.000 dias-multa, em regime inicial fechado. (HC n. 676.685/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 26/9/2023, DJe 3/10/2023). No mesmo sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO DE DROGAS. MATERIALIDADE DELITIVA. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DE DROGAS. CONDENAÇÃO DOS PACIENTES ANCORADA EM PROVAS DIVERSAS TAIS COMO DEPOIMENTOS E INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. INSUFICIÊNCIA. ABSOLVIÇÃO DOS PACIENTES POR AUSÊNCIA DE PROVA DA MATERIALIDADE. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. - (omissis) Desse modo, não foi apreendido nenhum tipo de entorpecente, sendo toda a prova do tráfico de drogas baseada em depoimentos e interceptações telefônicas. Todavia, nos termos da jurisprudência pacificada desta Corte Superior, é imprescindível a apreensão da droga para que a materialidade delitiva possa ser aferida, ao menos, por laudo preliminar, para que se possa comprovar sua aptidão para causar dependência física ou psíquica. Precedentes. - Nesse contexto, resulta imperativa a manutenção da absolvição dos pacientes quanto à imputação do delito de tráfico de drogas, por ausência de prova da materialidade delitiva. - Agravo regimental não provido. (AgRg no AgRg no HC 492.906/MS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 12/09/2019.) HABEAS CORPUS. CONDENAÇÕES POR TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A CONDENAÇÃO POR TRÁFICO. AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE. APREENSÃO DE DROGAS INEXISTENTE. IMPRESCINDIBILIDADE PARA O TRÁFICO. ORDEM CONCEDIDA. 1. É imprescindível para a demonstração da materialidade do crime de tráfico a apreensão de drogas. Precedentes. 2. Ausente a comprovação da materialidade do delito de tráfico, correta a absolvição quanto ao crime de tráfico de entorpecentes. 3. Habeas corpus concedido para para absolver a paciente da condenação com base no art. 33 da Lei 11.343/06. (HC 497.242/CE, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/08/2019, DJe 12/08/2019.) Portanto, ausente a apreensão de droga e sua submissão ao exame toxicológico, para justificar a imputação do crime de tráfico de drogas, só resta ao juízo a absolvição dos acusados José Augusto Arruda e Giselle Bezerra. Com relação ao réu Francisco Raimundo Targino, vulgarmente conhecido como “Doca”, é necessário tecer alguns outros apontamentos, considerando que, no 1º de maio de 2019, por volta das 10h, na Rua Sebastião Marcelino de Almeida, 243, Santo Antônio, Mossoró/RN, o mencionado réu foi preso em flagrante na posse de 05 (cinco) papelotes da droga popularmente conhecida como “cocaína”, com peso total de 20g (vinte gramas), conforme auto de exibição e apreensão de ID nº 75691392 - Pág. 8. No caso dos autos, vê-se que a acusação não logrou êxito em juntar o Laudo Químico Toxicológico que comprove, de maneira técnico-científica, que a substância encontrada com o réu seja, de fato, a droga conhecida popularmente como “cocaína” ou qualquer outra integrante do Anexo I da Portaria nº 344/98 – Anvisa, que regulamenta as substâncias de uso proscrito no Brasil. Assim, com esteio no art. 156 do CPP, no caso sob análise, o Laudo em comento deveria ter sido colacionado aos autos pelo Órgão Acusador que, utilizando-se do seu poder requisitório, tem a capacidade de o requerer junto às entidades técnicas responsáveis. Registre-se que o Laudo Químico Toxicológico é prova imprescindível para análise do crime. Desse modo, verifica-se que a ação penal carece da materialidade, visto que, não havendo provas de que a substância química encontrada em propriedade do réu se trata de droga, não se tem concretude para afirmar que há materialidade, o que inviabiliza a análise da autoria do réu. Nesse sentido, tem-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ, conforme apontado no julgado abaixo: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DA DROGA E DE LAUDO TOXICOLÓGICO DEFINITIVO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. ABSOLVIÇÃO DO RÉU. MANIFESTA ILEGALIDADE VERIFICADA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. No julgamento do EREsp n. 1.544.057/RJ, em 26/10/2016, a Terceira Seção uniformizou o entendimento de que a ausência do laudo definitivo toxicológico implica na absolvição do acusado, em razão da falta de comprovação da materialidade delitiva, e não na nulidade do processo. Foi ressalvada, ainda, a possibilidade de se manter o édito condenatório quando a prova da materialidade delitiva está amparada em laudo preliminar, dotado de certeza idêntica ao do definitivo, certificado por perito oficial e em procedimento equivalente. 2. Segundo se infere dos autos, a sentença pelo delito do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 tem como fundamento apenas depoimentos testemunhais e informações extraídas de interceptações telefônicas judicialmente autorizadas. Não houve a apreensão da droga e, obviamente, inexiste o laudo de exame toxicológico, único elemento hábil a comprovar a materialidade do delito de tráfico de drogas. Assim, de rigor a absolvição do ora agravado do delito de tráfico de drogas, porquanto ausente prova da materialidade. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 646.511/RJ, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 20/4/2021, DJe de 26/4/2021.) (Grifo nosso!). Ressalte-se, ainda, que a existência do Auto de Constatação Preliminar no ID nº 75691392 - Pág. 10 não é suficiente para configurar a materialidade do delito, considerando que não foi elaborado por quem possui conhecimento específico, sendo confeccionado por agente policial, baseado em suas impressões subjetivas. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no mesmo sentido. Vejamos: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. 39KG DE MATERIAL APREENDIDO. AUSÊNCIA DE LAUDO TOXICOLÓGICO DEFINITIVO. LAUDO TOXICOLÓGICO PRELIMINAR SEM NENHUM RIGOR TÉCNICO. MERAS IMPRESSÕES SUBJETIVAS DOS AGENTES POLICIAIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. ABSOLVIÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. 1. A Corte estadual verificou que inexiste laudo toxicológico definitivo acerca das substâncias apreendidas, pois o laudo definitivo presente nos autos é referente a outro processo. Todavia, considerou demonstrada a materialidade do delito de tráfico de drogas com amparo em Laudo de Exame de Constatação Prévia elaborado por agentes policiais. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite, excepcionalmente, a comprovação da natureza da substância por meio de teste toxicológico preliminar, desde que ele seja: a) realizado por perito oficial; b) empregue procedimentos e alcance conclusões equivalentes ao exame definitivo; e c) permita grau de certeza idêntico ao exame definitivo. 3. No caso, o Laudo de Exame de Constatação Prévia da substância apreendida não foi elaborado por peritos oficiais e não empregou nenhum tipo de exame científico ou teste pré-fabricado, fundamentando-se apenas na avaliação subjetiva dos próprios agentes policiais acerca do cheiro, coloração e consistência do material. Desse modo, o referido exame foi desprovido de qualquer rigor técnico, sendo insuficiente para atestar a natureza da substância apreendida e a materialidade do delito de tráfico de drogas. 4. Ordem de habeas corpus concedida para cassar a sentença e o acórdão condenatórios, absolvendo os Pacientes com fundamento no art. 386, inciso II, do Código de Processo Penal. (HC n. 532.794/MS, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe de 19/10/2020.) Desta forma, com relação ao réu Francisco Raimundo Targino “Doca”, tem-se que a materialidade não foi confirmada pela falta de laudo toxicológico e não pode ser presumida, não existindo provas suficientes para emissão de um decreto condenatório. 03.DISPOSITIVO Ante todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR o réu FRANCISCO RAIMUNDO TARGINO (“Doca”) pela prática do crime entabulado no art. 14, caput, da Lei nº 10.826/03, razão pela qual passo à dosimetria das penas a serem cominadas para o réu condenado, na estrita forma prevista no artigo 68 do Código Penal. Outrossim, ABSOLVO o denunciado FRANCISCO RAIMUNDO TARGINO (“Doca) , já qualificado, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal, da prática do delito tipificado no art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06. Por outro lado, na forma do art. 386, incisos II e VII, do Código Penal, ABSOLVO JOSÉ AUGUSTO ARRUDA DE MOURA (“Aleijado”) e GISELLE BEZERRA, da prática dos delitos tipificados no art. 33, caput, e no art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06. Ademais, EXTINGO a punibilidade do réu LEONARDO SANTOS VIEIRA qualificado nos autos, em razão do seu óbito, nos termos do art. 107, inciso I, do Código Penal. Com esteio no art. 387 do Código de Processo Penal passo à dosimetria da pena do réu Francisco Raimundo Targino, pela prática do delito tipificado no art. 14, caput, da Lei nº 10.826/03. Dosimetria para o réu Francisco Raimundo Targino – Art. 14, caput, da Lei nº 10.826/03. 1ª Fase: Das Circunstâncias Judiciais (art. 59) a) Culpabilidade: normal a do tipo, não devendo ser valorada negativamente; b) Antecedentes Criminais: o réu é primário, já que não consta na certidão de antecedentes criminais juntada aos autos qualquer informação que possa ser levada em consideração como maus antecedentes; c) Conduta Social: não há dados para aferi-la, motivo pelo qual deve ser a circunstância judicial valorada positivamente; d) Personalidade: não há dados técnicos nos autos para aferi-la, devendo ser valorada positivamente; e) Motivos do crime: são os comuns ao tipo, não merecendo valoração negativa; f) Circunstâncias do crime: são comuns ao tipo, sendo valorada positivamente; g) Consequências: não houve consequência que ultrapassassem às próprias do tipo; h) Comportamento da vítima: não há vítima certa e determinada para o crime em espécie. Logo, fixo a pena-base em 02 (dois) anos de reclusão e 10 dias-multa. 2ª Fase: Atenuantes e Agravantes (arts. 61 ao 67) Observa-se a inexistência, nos autos, de circunstâncias agravantes. Na espécie, percebe-se a existência da circunstância atenuante disposta no art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, pelo fato de ter o réu confessado espontaneamente a prática do crime, contribuindo para a elucidação dos fatos. No entanto, como a pena já foi fixada no mínimo legal, deixo de aplicar qualquer redução nessa fase (Súmula 231 do STJ). 3ª Fase: Causas Especiais de Aumento e/ou Diminuição da Penal Inexistem causas de aumento ou de diminuição da pena. Pena Definitiva Não existem outras causas gerais ou específicas de aumento ou de diminuição da pena, de sorte que fixo como definitiva a pena de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, dia-multa este cujo valor, consideradas a condição financeira do apenado, que parece não ser das mais afortunadas, e, principalmente, a sua finalidade punitiva enquanto sanção penal, arbitro em 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato. Regime Atento ao artigo 33, § 1º, “c”, § 2º, “c” e § 3º, fixo o regime inicial aberto para cumprimento da pena (CP, artigo 33, §2º, c). Substituição da Pena Privativa de Liberdade O artigo 44, incisos I, II e III, do Código Penal, preceitua que as penas restritivas de direito são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando aplicada pena não superior a 04 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa. No caso, o delito perpetrado é daqueles que admitem o benefício, portanto, substituo a pena aplicada por restritiva de direito, visto o preenchimento dos requisitos, precipuamente face ao atendimento das condicionantes previstas no artigo 44, I, do Código Penal. Assim, almejando aplicar medida socialmente recomendável e suficiente para a reprovação do ilícito perpetrado, substituo a pena privativa de liberdade imposta ao réu por uma pena restritiva de direito, na modalidade de: a) PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE, em entidade a ser designada pelo Juízo da execução penal, pelo período de 02 (dois) anos, totalizando 720 (setecentos e vinte) horas de atividades (art. 46, §4º, do Código Penal), a serem cumpridas durante uma hora de tarefa por dia útil da semana ou, de forma a não prejudicar a jornada normal de trabalho do acusado, em sábados, domingos e/ou feriados, facultado ao acusado cumpri-la em menor tempo, desde que não inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada. b) PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA, consistente no pagamento do valor equivalente a 01 (um) salário mínimo a entidade pública ou privada com destinação social, a ser definida pelo Juiz da Execução Penal. Suspensão Condicional da Pena Com a substituição da privativa de liberdade resta incabível a suspensão condicional da pena, nos moldes do art. 77, inciso III, do Código Penal. Detração para Fins de Fixação de Regime Por força do § 2º do art. 387 do CPP, com a nova redação dada pela Lei nº 12.736/12 - “O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade” – deverá o juiz da esfera de conhecimento, após fixar a pena definitiva e o regime inaugural de cumprimento da expiação, dedicar um novo capítulo na sentença condenatória para a análise de eventual progressão de regime. Entrementes, o desconto imposto pela novel legislação deve ser ponderado à luz das regras insculpidas na Lei de Execução Penal, e não como mero cálculo aritmético isolado, sob pena de permitir ao condenado uma progressão de regime imprópria, ou seja, com lapsos temporais reduzidos e desconhecimento completo de seu mérito pessoal, em total arrepio às regras existentes, as quais, diga-se de passagem, não foram revogadas. Em outras palavras, o período de detração para fins de progressão de regime prisional já na fase de conhecimento, além de corresponder aos percentuais estabelecidos na LEP, não tem o condão de desautorizar o juiz na aferição do mérito do sentenciado, o que será verificado pelo atestado de comportamento carcerário e, em alguns casos, de parecer criminológico, notadamente quando houver necessidade de um exame mais acurado sobre o progresso de ressocialização. Cumpre registrar que a inovação legislativa instituiu uma interação entre as jurisdições penais de conhecimento e executiva, propiciando ao magistrado da primeira etapa de cognição o reconhecimento de eventual progressão de regime prisional, desde que presentes os requisitos objetivos e subjetivos previstos na lei de regência. Pensar de forma diversa é fornecer um tratamento não isonômico a pessoas em situação jurídica semelhante, vaticinando, inclusive, a sua inconstitucionalidade. No caso, não há como aplicar o art. 387, § 2º, do CPP, notadamente pela ausência de requisitos objetivo e subjetivos. Direito de Recorrer em Liberdade Verifica-se que o réu Francisco Raimundo Targino foi condenado a uma pena privativa de liberdade em regime inicialmente aberto, a qual foi substituída por duas penas restritivas de direito, de modo que não teria sentido lhe negar o direito de recorrer em liberdade. Concedo-lhe, pois, o direito de recorrer em liberdade, se por outro édito judicial não estiver com a sua liberdade privada. Reparação do Dano Não há dano passível de reparação. Providência Finais Após o trânsito em julgado da presente decisão, tomem-se as seguintes providências: (I) lance o nome do condenado no Livro de Rol dos Culpados desta Comarca; (II) extraia guias de recolhimento, observando-se o disposto nos artigos 105 à 107 da Lei n. 7.210/84, para o acompanhamento da execução das penas impostas, computando-se como cumprimento de pena o período de prisão provisória, encaminhando-as, com as cópias das peças necessárias, ao juízo da execução penal desta Comarca; (III) oficie ao Tribunal Regional Eleitoral deste Estado, comunicando a condenação do réu, com sua identificação, acompanhada de fotocópia da presente decisão, para cumprimento do disposto pelo artigo 15, III, da Constituição Federal e pelo artigo 71, §2º, do Código Eleitoral; (IV) providencie o envio de ofício(s) para a(s) autoridade(s) que atualmente está(ão) custodiando a droga apreendida, determinando que seja imediatamente incinerada ou mesmo providenciem-se a incineração, com as cautelas legais, se a droga estiver em depósito judicial. Com relação aos bens apreendidos nos autos de nº 0101342-34.2019.8.20.0106, apreendidos com os réus Francisco Raimundo Targino e Leonardo Santos Vieira, a seguir listados, DECRETO O PERDIMENTO, considerando que já se passaram mais 05 (cinco) anos desde a sua apreensão sem que tenha sido reclamada a sua propriedade e respectiva restituição, bem como considerando o estado em que se encontra, o que inviabiliza inclusive qualquer doação, determino que seja ele descartados em local apropriado, certificando-se nos autos. Com relação a quantia de R$ 1.272,00 (mil e duzentos e setenta e dois reais), a qual estava na posse do acusado Francisco Raimundo Targino, conforme noticiado no ID nº 75691392 - Pág. 8, diante da sua absolvição, DETERMINO que a mencionada quantia e seus acréscimos legais sejam restituídos. Intime-o para, no prazo de 60 (dez) dias, indicar conta bancária, a fim de que a mencionada quantia seja transferida. Indicada a conta, providencie a Secretaria a transferência via SISCONDJ ou mediante ofício dirigido ao Banco do Brasil. Com relação a quantia de R$ 70,00 (setenta reais), apreendida com o réu Leonardo Santos Vieira, conforme consta no ID nº 75691392 - Pág. 9, diante do seu falecimento, intime-se o advogado do então réu, ora falecido, para que ele, no prazo de 60 dias, informe a existência de herdeiros e a existência de inventário aberto ou eventual alvará judicial para eventual transferência do referido valor ao respectivo processo. Caso não tenha aberto nenhum destes procedimentos, como se trata de pouca monta, deverá informar como será rateado o referido valor entre os herdeiros, informando, desde logo, as respectivas contas para eventual transferência. Caso o valor não seja levantado no prazo assinalado, conforme artigo 10 do Provimento 245/2023 – CGJ/RN, determino o perdimento em favor do Fundo Penitenciário Estadual, devendo tal valor ser transferido para o referido fundo. Outrossim, com relação aos bens apreendidos vinculados ao presente processo, listados no ID nº 116888780 - Pág. 2 a 8, DECRETO O PERDIMENTO, considerando que já se passaram mais 05 (cinco) anos desde a sua apreensão sem que tenha sido reclamada a sua propriedade e respectiva restituição, bem como considerando o estado em que se encontra, o que inviabiliza inclusive qualquer doação, determino que seja ele descartados em local apropriado, certificando-se nos autos. Por fim, com relação a quantia de R$ 3.698,05 (três mil seiscentos e noventa e oito reais e cinco centavos), apreendida na residência do acusado Francisco Josemar Tragino ("Zimar"), conforme ID nº 75688475 - Pág. 23, diante do seu falecimento, intime-se o advogado do então réu, ora falecido, para que ele, no prazo de 60 dias, informe a existência de herdeiros e a existência de inventário aberto ou eventual alvará judicial para eventual transferência do referido valor ao respectivo processo. Caso não tenha aberto nenhum destes procedimentos, como se trata de pouca monta, deverá informar como será rateado o referido valor entre os herdeiros, informando, desde logo, as respectivas contas para eventual transferência. Oficie-se ao Depósito Judicial para cumprimento, servindo cópia desta decisão de ofício. Anotações necessárias e pertinentes nos sistemas de controle de bens disponíveis a este juízo (SNGB), se for o caso. CÓPIA DESTA SENTENÇA ASSINADA DIGITALMENTE SERVIRÁ COMO OFÍCIO DIRIGIDO AO DEPÓSITO JUDICIAL. Condeno o réu Francisco Raimundo Targino ao pagamento das custas processuais. Após o trânsito em julgamento, arquivem-se os autos com baixa na distribuição. Publique-se, registre-se e intimem-se. MOSSORÓ/RN, data do sistema. ANDRÉ MELO GOMES PEREIRA Juiz(a) de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)
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