Processo nº 0001312-33.2001.8.20.0102
ID: 257016715
Tribunal: TJRN
Órgão: Gab. Des. Expedito Ferreira na Câmara Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0001312-33.2001.8.20.0102
Data de Disponibilização:
15/04/2025
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0001312-33.2001.8.20.0102 Polo ativo MUNICIPIO DE CEARA-MIRIM e outros Advogado(…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0001312-33.2001.8.20.0102 Polo ativo MUNICIPIO DE CEARA-MIRIM e outros Advogado(s): Polo passivo Roberto Pereira Varela e outros Advogado(s): DIOGO OLIVEIRA DE ALMEIDA EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO DE CONDENAÇÃO DO AGENTE PRETENSAMENTE RESPONSÁVEL PELA PRÁTICA DOS ATOS ÍMPROBOS E RESSARCIMENTO DO DANO CAUSADO. FALECIMENTO DO DEMANDADO NO CURSO DA LIDE. ALTERAÇÕES NA LEI N.º 8.429/92 OPERADAS PELA EDIÇÃO DA LEI N.º 14.230/2021. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. IRRETROATIVIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFERIDA AO TEMA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRETENSÃO INICIAL QUE BUSCA IGUALMENTE O RESSARCIMENTO DECORRENTE DOS ATOS IMPUTADOS NA INICIAL. POSSIBILIDADE DE PROCESSAMENTO MESMO ANTE A PRESCRIÇÃO DAS SANÇÕES. TEMA 1089 – STJ. NATUREZA IMPRESCRITÍVEL. ENTENDIMENTO FIRMADO EM REPERCUSSÃO GERAL POR OCASIÃO DO JULGAMENTO DO RE 852.475/SP. POSSIBILIDADE DE ANÁLISE DA MATÉRIA. TRANSMISSÃO AOS HERDEIROS DO REQUERIDO DAS POSSÍVEIS RESPONSABILIDADES PATRIMONIAIS, NO LIMITE DO ACERVO LEGADO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 8º DA LEI N.º 8.429/92. INTERPRETAÇÃO EM CONSONÂNCIA COM PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA EM SITUAÇÕES ANÁLOGAS. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO DIRETO DA MATÉRIA POR ESTA CORTE DE JUSTIÇA. NECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE FASE COGNITIVA NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Turma da Primeira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 7ª Procuradoria de Justiça, em conhecer e julgar provido o recurso, nos termos do voto do Relator. RELATÓRIO Trata-se de apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE em face de sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Ceará Mirim (ID 28399461), que julgou improcedente a pretensão articulada na inicial para condenação de Roberto Pereira Varela pela prática dolosa de atos de improbidade administrativa, declarando a prescrição intercorrente da pretensão de ressarcimento ao erário, com a consequente extinção do feito com resolução de mérito. Em suas razões (ID 28399464), discorre o órgão ministerial sobre a possibilidade de continuidade da ação, quanto ao pleito de ressarcimento, em relação aos herdeiros e no limite do valor da herança ou patrimônio transferido. Destaca que “as ações de Improbidade Administrativa fundamentadas no arts. 9º e 10 da Lei de Improbidade Administrativa são passíveis de legitimar os herdeiros para compor o polo passivo para, nos limites da herança, arcar com o ressarcimento e/ou valor decorrente do enriquecimento ilícito”. Reafirma que “os herdeiros ou sucessores respondem por dano ao erário ou enriquecimento ilícito no limite da herança. Apenas não é transmitida a multa civil e quando se trata de tipificação no art. 11 da LIA, o que não é o caso dos autos”. Pondera que o julgamento do feito se deu antes de realizada instrução processual oportunamente requerida, traduzindo-se em cercamento de acusação. Assegura que o dano ao erário resta devidamente comprovado nos autos, não havendo que se falar em prescrição da pretensão quanto ao ressarcimento. Termina por requerer o conhecimento e provimento do recurso, para que seja anulada a sentença, prosseguindo-se o feito no juízo de origem quanto ao pedido de ressarcimento do erário. Intimada, a parte recorrida apresentou suas contrarrazões (ID 28399465), discorrendo sobre a impossibilidade de condenação por ato doloso de improbidade administrativa em seu falecimento no curso da lide. Justifica que, da mesma forma, seria inviável o prosseguimento do feito em relação aos herdeiros do de cujos. Assegura ser possível o reconhecimento da prescrição na hipótese dos autos. Termina por requerer o desprovimento do apelo. Instado a se manifestar, o Ministério Público, por sua 7ª Procuradoria de Justiça (ID 28675799), opinou pelo conhecimento e provimento do recurso. É o relatório. VOTO Atendidos os pressupostos de admissibilidade, voto pelo conhecimento do recurso. O cerne meritório repousa na análise da potencial prescrição da pretensão deduzida na peça vestibular. Narram os autos que o Ministério Público ajuizou a presente ação civil pública por pretensa prática de ato de improbidade pelo demandado, ensejador de suposto dano ao erário municipal. O Juízo singular, reconhecendo a impossibilidade de condenação da parte demandada por ato doloso de improbidade administrativa, ante seu falecimento no curso da lide, ultimou por reconhecer a intercorrência da prescrição, extinguindo o feito com resolução meritória. Considerando a natureza da lide e do elástico prazo de tramitação do feito, impera aferir a possibilidade de aplicação dos efeitos da Lei n.º 14.230/2021, especialmente no que se relaciona aos novos modelos sancionatórios e prazos de prescrição aplicáveis às ações de improbidade administrativa, notadamente quanto aos feitos em curso por ocasião de sua vigência. Necessário ponderar que referida matéria teve sua Repercussão Geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (TEMA 1199/STF), fixada a respectiva tese conforme ementa abaixo trazida em transcrição: Ementa: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. IRRETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA (LEI 14.230/2021) PARA A RESPONSABILIDADE POR ATOS ILÍCITOS CIVIS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 8.429/92). NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DE REGRAS RÍGIDAS DE REGÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS CORRUPTOS PREVISTAS NO ARTIGO 37 DA CF. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 5º, XL DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL AO DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR POR AUSÊNCIA DE EXPRESSA PREVISÃO NORMATIVA. APLICAÇÃO DOS NOVOS DISPOSITIVOS LEGAIS SOMENTE A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA LEI, OBSERVADO O RESPEITO AO ATO JURÍDICO PERFEITO E A COISA JULGADA (CF, ART. 5º, XXXVI). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO COM A FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL PARA O TEMA 1199. 1. A Lei de Improbidade Administrativa, de 2 de junho de 1992, representou uma das maiores conquistas do povo brasileiro no combate à corrupção e à má gestão dos recursos públicos. 2. O aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público foi uma grande preocupação do legislador constituinte, ao estabelecer, no art. 37 da Constituição Federal, verdadeiros códigos de conduta à Administração Pública e aos seus agentes, prevendo, inclusive, pela primeira vez no texto constitucional, a possibilidade de responsabilização e aplicação de graves sanções pela prática de atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF). 3. A Constituição de 1988 privilegiou o combate à improbidade administrativa, para evitar que os agentes públicos atuem em detrimento do Estado, pois, como já salientava Platão, na clássica obra REPÚBLICA, a punição e o afastamento da vida pública dos agentes corruptos pretendem fixar uma regra proibitiva para que os servidores públicos não se deixem "induzir por preço nenhum a agir em detrimento dos interesses do Estado”. 4. O combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no seio do Poder Público, com graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados. 5. A corrupção é a negativa do Estado Constitucional, que tem por missão a manutenção da retidão e da honestidade na conduta dos negócios públicos, pois não só desvia os recursos necessários para a efetiva e eficiente prestação dos serviços públicos, mas também corrói os pilares do Estado de Direito e contamina a necessária legitimidade dos detentores de cargos públicos, vital para a preservação da Democracia representativa. 6. A Lei 14.230/2021 não excluiu a natureza civil dos atos de improbidade administrativa e suas sanções, pois essa “natureza civil” retira seu substrato normativo diretamente do texto constitucional, conforme reconhecido pacificamente por essa SUPREMA CORTE (TEMA 576 de Repercussão Geral, de minha relatoria, RE n° 976.566/PA). 7. O ato de improbidade administrativa é um ato ilícito civil qualificado – “ilegalidade qualificada pela prática de corrupção” – e exige, para a sua consumação, um desvio de conduta do agente público, devidamente tipificado em lei, e que, no exercício indevido de suas funções, afaste-se dos padrões éticos e morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas (artigo 9º da LIA) ou gerar prejuízos ao patrimônio público (artigo 10 da LIA), mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções, apesar de ferir os princípios e preceitos básicos da administração pública (artigo 11 da LIA). 8. A Lei 14.230/2021 reiterou, expressamente, a regra geral de necessidade de comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação do ato de improbidade administrativa, exigindo – em todas as hipóteses – a presença do elemento subjetivo do tipo – DOLO, conforme se verifica nas novas redações dos artigos 1º, §§ 1º e 2º; 9º, 10, 11; bem como na revogação do artigo 5º. 9. Não se admite responsabilidade objetiva no âmbito de aplicação da lei de improbidade administrativa desde a edição da Lei 8.429/92 e, a partir da Lei 14.230/2021, foi revogada a modalidade culposa prevista no artigo 10 da LIA. 10. A opção do legislador em alterar a lei de improbidade administrativa com a supressão da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa foi clara e plenamente válida, uma vez que é a própria Constituição Federal que delega à legislação ordinária a forma e tipificação dos atos de improbidade administrativa e a gradação das sanções constitucionalmente estabelecidas (CF, art. 37, §4º). 11. O princípio da retroatividade da lei penal, consagrado no inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal (“a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”) não tem aplicação automática para a responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de expressa previsão legal e sob pena de desrespeito à constitucionalização das regras rígidas de regência da Administração Pública e responsabilização dos agentes públicos corruptos com flagrante desrespeito e enfraquecimento do Direito Administrativo Sancionador. 12. Ao revogar a modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, entretanto, a Lei 14.230/2021, não trouxe qualquer previsão de “anistia” geral para todos aqueles que, nesses mais de 30 anos de aplicação da LIA, foram condenados pela forma culposa de artigo 10; nem tampouco determinou, expressamente, sua retroatividade ou mesmo estabeleceu uma regra de transição que pudesse auxiliar o intérprete na aplicação dessa norma – revogação do ato de improbidade administrativa culposo – em situações diversas como ações em andamento, condenações não transitadas em julgado e condenações transitadas em julgado. 13. A norma mais benéfica prevista pela Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa –, portanto, não é retroativa e, consequentemente, não tem incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes. Observância do artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal. 14. Os prazos prescricionais previstos em lei garantem a segurança jurídica, a estabilidade e a previsibilidade do ordenamento jurídico; fixando termos exatos para que o Poder Público possa aplicar as sanções derivadas de condenação por ato de improbidade administrativa. 15. A prescrição é o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela INÉRCIA do próprio Estado. A prescrição prende-se à noção de perda do direito de punir do Estado por sua negligência, ineficiência ou incompetência em determinado lapso de tempo. 16. Sem INÉRCIA não há PRESCRIÇÃO. Sem INÉRCIA não há sancionamento ao titular da pretensão. Sem INÉRCIA não há possibilidade de se afastar a proteção à probidade e ao patrimônio público. 17. Na aplicação do novo regime prescricional – novos prazos e prescrição intercorrente – , há necessidade de observância dos princípios da segurança jurídica, do acesso à Justiça e da proteção da confiança, com a IRRETROATIVIDADE da Lei 14.230/2021, garantindo-se a plena eficácia dos atos praticados validamente antes da alteração legislativa. 18. Inaplicabilidade dos prazos prescricionais da nova lei às ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa, que permanecem imprescritíveis, conforme decidido pelo Plenário da CORTE, no TEMA 897, Repercussão Geral no RE 852.475, Red. p/Acórdão: Min. EDSON FACHIN. 19. Recurso Extraordinário PROVIDO. Fixação de tese de repercussão geral para o Tema 1199: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). Portanto, na linha da interpretação conferida ao tema pelo Supremo Tribunal Federal, descabe a aplicação dos novos prazos prescricionais ao feito em exame, sendo, contudo, impositivo, analisar a presença do elemento subjetivo (dolo) para fins de reconhecimento da eventual prática da improbidade administrativa. Por outro seguimento, observo que a presente lide ostenta vínculo de pertinência com o Tema 1089-STJ, que sedimentou a compreensão acerca da possibilidade de continuidade da ação de improbidade para pleitear o ressarcimento de eventual dano ao erário, mesmo em face da prescrição das demais sanções estabelecidas na Lei n.º 8.429/92, nos seguintes termos: Tema 1089 – STJ: Na ação civil pública por ato de improbidade administrativa é possível o prosseguimento da demanda para pleitear o ressarcimento do dano ao erário, ainda que sejam declaradas prescritas as demais sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92. Para melhor ilustrar, colaciono ementa proferida no recurso representativo da controvérsia: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA DE NATUREZA REPETITIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QUANTO AO PEDIDO DE IMPOSIÇÃO DE SANÇÕES PREVISTAS NO ART. 12 DA LEI 8.429/92. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO QUANTO À PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO DOS DANOS CAUSADOS AO ERÁRIO. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ. TESE FIRMADA SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. I. Recurso Especial interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/2015, aplicando-se, no caso, o Enunciado Administrativo 3/2016, do STJ, aprovado na sessão plenária de 09/03/2016 ("Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC"). II. Na origem, o Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública, postulando a condenação de ex-Senador da República e de outros cinco réus pela prática de atos de improbidade administrativa, decorrentes de nomeação, pelo primeiro réu, dos demais requeridos, para cargos em comissão, embora não exercessem, de fato, qualquer atividade de caráter público ("funcionários fantasmas"). Em 1º Grau, o Juiz reconheceu a prescrição, em relação a um dos réus, e recebeu a inicial e determinou o prosseguimento da ação apenas em relação aos demais. Contra essa decisão, o autor da ação interpôs Agravo de Instrumento. No acórdão recorrido, o Tribunal de origem deu parcial provimento ao Agravo de Instrumento, ao fundamento de que, "apesar da imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento do prejuízo ao erário, não se mostra cabível o prosseguimento da ação civil pública por ato de improbidade administrativa exclusivamente com o intuito de ressarcimento do dano ao erário, o qual deverá ser postulado em ação autônoma". III. A controvérsia ora em apreciação, submetida ao rito dos recursos especiais representativos de controvérsia, nos termos do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, cinge-se à análise da "possibilidade de se promover o ressarcimento do dano ao erário nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ainda que se declare a prescrição para as demais punições previstas na Lei n. 8.429/92, tendo em vista o caráter imprescritível daquela pretensão específica". IV. Nos termos do art. 5º da Lei 8.429/92, "ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano". Tal determinação é ressaltada nos incisos I, II e III do art. 12 da Lei 8.429/92, de modo que o ressarcimento integral do dano, quando houver, sempre será imposto juntamente com alguma ou algumas das demais sanções previstas para os atos ímprobos. Assim, por expressa determinação da Lei 8.429/92, é lícito ao autor da ação cumular o pedido de ressarcimento integral dos danos causados ao erário com o de aplicação das demais sanções previstas no seu art. 12, pela prática de ato de improbidade administrativa. V. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que "se mostra lícita a cumulação de pedidos de natureza condenatória, declaratória e constitutiva nesta ação, quando sustentada nas disposições da Lei nº 8.429/1992" (STJ, REsp 1.660.381/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 26/11/2018). Nesse sentido: STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 437.764/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 12/03/2018. VI. Partindo de tais premissas, o Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência no sentido de que "a declaração da prescrição das sanções aplicáveis aos atos de improbidade administrativa não impede o prosseguimento da demanda quanto à pretensão de ressarcimento dos danos causados ao erário" (STJ, REsp 1.331.203/DF, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, PRIMEIRA TURMA, DJe de 11/04/2013). Em igual sentido: STJ, AgInt no REsp 1.518.310/SE, Rel. p/ acórdão Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 01/07/2020; REsp 1.732.285/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 21/11/2018; AgRg no AREsp 160.306/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 16/04/2015; REsp 1.289.609/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 02/02/2015; AgRg no REsp 1.427.640/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 27/06/2014; REsp 1.304.930/AM, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 28/08/2013; AgRg no REsp 1.287.471/PA, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe de 04/02/2013; EREsp 1.218.202/MG, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 28/09/2012; REsp 1.089.492/RO, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJe de 18/11/2010; REsp 928.725/DF, Rel. p/ acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, DJe de 05/08/2009. VII. Tese Jurídica firmada: "Na ação civil pública por ato de improbidade administrativa é possível o prosseguimento da demanda para pleitear o ressarcimento do dano ao erário, ainda que sejam declaradas prescritas as demais sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92." VIII. Recurso Especial conhecido e provido, para, reformando o acórdão recorrido, determinar o prosseguimento da demanda em relação à parte recorrida, Lenilda Fernandes Maia Teixeira, quanto ao pedido de ressarcimento dos danos causados ao erário. IX. Recurso julgado sob a sistemática dos recursos especiais representativos de controvérsia (art. 1.036 e seguintes do CPC/2005 e art. 256-N e seguintes do RISTJ). (REsp n. 1.899.407/DF, relatora Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, julgado em 22/9/2021, DJe de 13/10/2021.) Tem-se, ainda, que a Suprema Corte, por ocasião do julgamento do RE 852.475/SP, com repercussão geral reconhecida, firmou a tese quanto à imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Tema 897/STF): DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5 º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. A prescrição é instituto que milita em favor da estabilização das relações sociais. 2. Há, no entanto, uma série de exceções explícitas no texto constitucional, como a prática dos crimes de racismo (art. 5º, XLII, CRFB) e da ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV, CRFB). 3. O texto constitucional é expresso (art. 37, § 5º, CRFB) ao prever que a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos na esfera cível ou penal, aqui entendidas em sentido amplo, que gerem prejuízo ao erário e sejam praticados por qualquer agente. 4. A Constituição, no mesmo dispositivo (art. 37, § 5º, CRFB) decota de tal comando para o Legislador as ações cíveis de ressarcimento ao erário, tornando-as, assim, imprescritíveis. 5. São, portanto, imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. 6. Parcial provimento do recurso extraordinário para (i) afastar a prescrição da sanção de ressarcimento e (ii) determinar que o tribunal recorrido, superada a preliminar de mérito pela imprescritibilidade das ações de ressarcimento por improbidade administrativa, aprecie o mérito apenas quanto à pretensão de ressarcimento. (RE 852475, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 08-08-2018, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-058 DIVULG 22-03-2019 PUBLIC 25-03-2019) Tese 897 – STF: São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. Na hipótese em estudo, há claro óbice quanto à continuidade do feito para aferir a efetiva prática de ato doloso de improbidade administrativa pelo demandado, tendo em conta seu falecimento no curso de tramitação do feito. Efetivamente, tratando-se de demanda que reclama responsabilização subjetiva do agente, não mais resta possível resolver o mérito propriamente dito, a teor da regra consagrada no artigo 485, inciso IX, do Código de Processo Civil, segundo a qual: Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (…) IX - em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal; Neste contexto restrito, vislumbro acerto na fundamentação consignada na sentença ao reputar obstado o prosseguimento do feito quanto à imputação por ato doloso de improbidade administrativa dirigida em face do falecido Roberto Pereira Varela. Contudo, consoante fundamentação acima, havendo pleito expresso de ressarcimento na forma do artigo 10 da Lei n.º 8.429/1992, impera reconhecer sua natureza imprescritível, inclusive com expressão no conteúdo do artigo 8º da Lei n.º 8.429/1992, com as alterações decorrentes da Lei n.º 14.230/2021: Art. 8º O sucessor ou o herdeiro daquele que causar dano ao erário ou que se enriquecer ilicitamente estão sujeitos apenas à obrigação de repará-lo até o limite do valor da herança ou do patrimônio transferido. Referida compreensão encontra ressonância em precedentes desta Corte de Justiça: EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALECIMENTO DO RÉU NO CURSO DA AÇÃO. HABILITAÇÃO DOS HERDEIROS. POSSIBILIDADE. SANÇÕES DE ORDEM PATRIMONIAL DECORRENTES DOS ATOS QUE CAUSEM LESÃO AO ERÁRIO (ART. 10). EXPRESSA DISPOSIÇÃO LEGAL. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 8º DA LEI N. 8.429/92. DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE DEVE SER REFORMADA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0806777-96.2024.8.20.0000, Des. Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 01/02/2025, PUBLICADO em 03/02/2025) Há que assentir que referida compreensão somente se projeta em relação aos potenciais atos praticados em violação dos arts. 9º (que trata dos atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito) e 10º (que trata dos atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário), restando integralmente prejudicadas as ponderações quanto a possíveis sanções de natureza personalíssima, mas autorizando a transmissão aos sucessores dos possíveis efeitos patrimoniais da condenação, na medida do acervo legado pelo falecido. Desta feita, afastada a ocorrência da prescrição na espécie, vislumbro relevância no fundamento defendido no apelo de sorte a reconhecer a possibilidade de responsabilização dos sucessores, admitida no momento em tese, no limite do patrimônio legado em caso de efetiva comprovação do dano ensejado ao erário, de modo que a ação pode prosseguir no juízo de origem tão somente em relação ao pleito de ressarcimento. Nesse sentido, trago à colação precedentes angulares firmados no âmbito do Superior Tribunal de justiça: ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. FALECIMENTO DO RÉU NO CURSO DA AÇÃO. HABILITAÇÃO DOS HERDEIROS. POSSIBILIDADE. 1. Nas ações de improbidade administrativa fundadas nos arts. 9º e/ou 10 da Lei n. 8.429/1992, os sucessores do réu, falecido no curso do processo, estão legitimados a prosseguir no polo passivo da demanda, nos limites da herança, para fins de ressarcimento ao erário. Precedentes. 2. O art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa, norteador da matéria, não contém ressalvas acerca do momento do óbito como requisito para a sua aplicação. 3. Somente com o trânsito em julgado da demanda principal é que virá à lume se os herdeiros terão de reembolsar o erário ou não, ocasião em que deverão estar habilitados no processo. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 890.797/RN, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 6/12/2016, DJe de 7/2/2017.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALECIMENTO DO RÉU NO CURSO DA DEMANDA. HABILITAÇÃO INCIDENTAL DE HERDEIROS. POSSIBILIDADE. ART. 8º DA LEI N. 8.429/1992. SÚMULA 83/STJ. 1. Com efeito, a Lei n. 8.429/1992 em seu art. 8º dispõe expressamente que "o sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer, ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança". 2. Somente os sucessores do réu nas ações de improbidade administrativa fundadas nos arts. 9º e/ou 10 da Lei n. 8.429/1992 estão legitimados a prosseguir no polo passivo da demanda, nos limites da herança, para fins de ressarcimento e pagamento da multa civil. 3. O art. 8º da LIA não estabelece qualquer marco sobre momento do óbito como condição de sua aplicabilidade. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.307.066/RN, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 26/11/2019, DJe de 2/12/2019.) Tem-se, portanto, como possível e viável o seguimento do curso do feito em relação aos sucessores do Sr. Roberto Pereira Varela especificamente em relação à pretensão de ressarcimento ao erário, merecendo a sentença reforma neste contexto. Registro, outrossim, que o presente feito não se encontra em condições de imediato julgamento por esta instância ad quem, não tendo incidência a regra do artigo 1.013, § 3º, I, II e III, do Código de Processo Civil, especialmente considerando a necessidade de abertura de fase de instrução exaustiva, com respeito ao devido processo legal e garantia de ampla defesa e contraditório, somente possível no juízo de origem, se impondo o retorno dos autos ao primeiro grau de jurisdição para seguimento do feito. Ante o exposto, em consonância com o parecer da 7ª Procuradoria de Justiça, voto pelo conhecimento e provimento do recurso de apelação interposto, para, reformando a sentença hostilizada, afastar a ocorrência da prescrição intercorrente na situação dos autos, determinando o retorno do feito ao juízo de origem para seguimento do curso processual quanto ao pedido de ressarcimento. É como voto. Natal/RN, 24 de Março de 2025.
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