Em Segredo De Justiça x J. D. 2. V. D. D. D. T. D. C. D. P. V.
ID: 278105667
Tribunal: TJRO
Órgão: Gabinete Des. Álvaro Kalix Ferro
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 0805416-53.2025.8.22.0000
Data de Disponibilização:
26/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FRANCIS HENCY OLIVEIRA ALMEIDA DE LUCENA
OAB/RO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Gabinete Des. Álvaro Kalix Ferro Rua José Camacho, nº 585, Bairro Olaria, CEP 76801-330, Porto Velho, - de 480/481 a 859/860 Núm…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Gabinete Des. Álvaro Kalix Ferro Rua José Camacho, nº 585, Bairro Olaria, CEP 76801-330, Porto Velho, - de 480/481 a 859/860 Número do processo: 0805416-53.2025.8.22.0000 Classe: Habeas Corpus Criminal Polo Ativo: D. D. D. ADVOGADO DO PACIENTE: Francis Hency Oliveira Almeida de Lucena, OAB nº RO11026A Polo Passivo: J. D. 2. V. D. D. D. T. D. C. D. P. V. IMPETRADO SEM ADVOGADO(S) DECISÃO Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Francis Hency Oliveira Almeida de Lucena (OAB/RO nº 11.026) em favor de E. S. D. J., preso no contexto da denominada “Operação Puritas”, apontando como autoridade coatora o Juízo da 2ª Vara de Delitos de Tóxicos da Comarca de Porto Velho, que manteve a prisão preventiva do paciente. O impetrante sustenta que a prisão preventiva do paciente funda-se em fatos ocorridos em 7/7/2023, sendo incompatíveis com a reavaliação da prisão em abril de 2025, em afronta ao disposto no art. 312, §2º, do Código de Processo Penal, que exige contemporaneidade dos elementos justificadores da custódia cautelar. Argumenta que a decisão que mantém a custódia do Paciente não atende ao comando do art. 315, §2º, do CPP, que exige motivação concreta e individualizada, assentada em elementos dos autos que demonstrem, de forma clara, a necessidade da medida extrema. Aponta, ainda, violação ao princípio da isonomia, pois diversos corréus obtiveram a revogação de suas prisões preventivas. Alega que o juízo de primeiro grau não substituiu, de forma fundamentada e individualizada, a prisão preventiva pelas medidas cautelares. Firme nesses fundamentos, requer, liminarmente, a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares diversas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. No mérito, pugna pela confirmação da liminar Relatei. Decido. Conforme se extrai dos autos, a prisão preventiva do paciente, decretada em 6/11/2024, teve como fundamento representação da Autoridade Policial, no curso das investigações conduzidas no âmbito da Operação Puritas, com o objetivo de preservar a ordem pública, assegurar a aplicação da lei penal e atender à conveniência da instrução criminal. Transcreve-se, a seguir, a decisão: Denota-se, portanto, que a decretação da prisão cautelar é medida excepcional, a ser deferida com base em elementos concretos reunidos na investigação e desde que ela seja a única medida cabível para assegurar a garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. No que tange à materialidade, tenho que todos os relatórios que instruem a presente cautelar são indícios suficientes, por ora, para demonstrar a existência da citada associação criminosa, cujo objetivo aparente é voltado à prática de tráfico de drogas, conforme se extrai das Informações Policiais anexas aos autos. Em relação aos indícios de autoria, tenho que também se encontram presentes nos documentos apresentados, consistentes, em maior parte, em diálogos extraídos de aparelhos celulares apreendidos nas ocasiões em que houve flagrante e, posteriormente, corroborado com informações extraídas da interceptação telefônica, conforme passo a expor. É certo que a presente representação é fundamentada nas investigações conduzidas no bojo do inquérito policial n. 2022.0073041 - DRE/DRPJ/SR/PF/RO, instaurado para identificar uma associação criminosa voltada ao tráfico de drogas, valendo-se de policiais para o êxito da empreitada. Durante a investigação, foram deferidas as representações pela interceptação telefônica (autos n. 7042935-41.2023.8.22.0001), sobrevindo os autos circunstanciados apresentados pela autoridade policial, em que há elementos concretos aptos a justificar a medida, vide exposição dos eventos abaixo. Também é certo que a medida, embora excepcional, afigura-se necessária para fins de apreensão de proveitos e objetos do crime de tráfico de drogas e associação para o tráfico. Segundo apresentado nos relatórios, estão sendo investigado os sujeitos associados, ao menos, em 02 eventos de tráfico de drogas resultantes em prisões em flagrantes com apreensão de vultuosa quantidade de entorpecente, além de diversos outros eventos aptos a demonstrar uma possível estabilidade e permanência. Registro que, neste momento processual, bastam indícios de autoria e prova da materialidade, sendo desnecessário que todos os elementos informativos sejam amplamente mencionados. Ao que tudo indica, a suposta organização criminosa está atuante há alguns anos, sendo indicada movimentações desde dezembro de 2021 (conforme dados extraídos do aparelho telefônico do investigado Raphael Angelo da Nobrega por ocasião da sua prisão em flagrante em 07/07/2023), quando houve um possível transporte de drogas levados por Raphael e E. S. D. J., com auxílio de José Heliomar, conforme exposto na IPJ 019.2024. Segundo a autoridade policial, Raphael discutiu com Diego a respeito do valor para pagamento do transporte, dizendo que R$1.500,00 por quilo era pouco, que o ideal era R$2.000,00 por quilo de droga, mas que José Heliomar pediu para que fechassem o valor menor nesse transporte, pois abriria portas. A partir dos dados obtidos na nuvem do terminal telefônico atribuído ao Kelvin, em 04/08/2022, houve indícios de um deslocamento em conjunto dos investigados Kelvin, José Heliomar, Roberte Aguiar, Marcos Vinicius, Rafael Evêncio e Diego Dias, conforme relatado na IPJ 006.2023. Neste período, foram compradas passagens aéreas para Gedeon, pagas por José Heliomar, mas adquiridas pela conta de Kelvin no sítio eletrônico emissor das passagens. Em 24/09/2022, o PM do Estado da Bahia Francisco de Assis Araújo Melo foi abordado na zona rural do município de Icó/CE, levando consigo R$689.100,00. Questionado sobre o valor, disse que pegou com “Leo”, apelido de José Heliomar, e que pertencia ao colega PRF Diego Duarte lotado em Capim Grosso/BA. Em 08/10/2022, José Heliomar, Kelvin Rodrigo e Suziele foram abordados na divisa entre Mato Grosso e Goiás, a bordo do veículo S10, placa RUA5F88. Em que pese não tenha sido apreendida droga na oportunidade, foi constatado um certo nervosismo entre os passageiros. Segundo os policiais da abordagem, José Heliomar disse que seu colega, ora investigado, PRF Diego havia alugado um JEEP Compass em Cuiabá e levado até Porto Velho, onde José Heliomar teria pegado o veículo e levado até Cuiabá para devolvê-lo, alugando, então, a referida S10 para seguir até Goiânia, onde negociariam brita para a empresa de Kelvin. Não obstante não se tratem de eventos com a apreensão de drogas, é importante mencioná-los como indícios da estabilidade e da autoria, pois demonstra o modus operandi da empreitada criminosa. Em 07/01/2023, houve a primeira apreensão de drogas atribuída ao grupo, em que Roberte Paulo Aguiar Souza, vulgo “Cabo Aguiar”, e Gedeon Rocha de Almeida transportavam cerca de 500kg de cocaína, bem como uma pistola TAURUS G2C, calibre 9 mm, nº de série ACD812486, tendo a ação penal tramitado perante a 2ª Vara Criminal de Vilhena, sob o n. 7000131-19.2023.8.22.0014, em que foram ambos condenados, atualmente em fase de recurso no Superior Tribunal de Justiça. A autoridade policial aponta, ainda, indícios de envolvimento dos investigados José Heliomar de Souza, Kelvin Rodrigo O. Santos (vulgo “Loirinho”, já falecido), Marcos Vinicius de Souza, Rafael Evêncio Silva e Juliane Evêncio Silva no delito em comento. O investigado José Heliomar está sendo apontado como o suposto líder da organização criminosa, utilizando agentes da segurança pública como transportadores na finalidade de driblar a fiscalização, bem como para se beneficiar do conhecimento referente às abordagens policiais, tanto que, como será observado, há indícios do envolvimento de policiais militares e rodoviários na empreitada. Neste fato em específico, o envolvimento de José Heliomar foi porque o investigado Roberte levava consigo uma arma de fogo registrada em nome dele (José Heliomar), bem como a circunstância de que a empresa dele pagou a cegonha para transportar o veículo utilizado na empreitada cegonha de Marabá/PA para Ji-Paraná/RO. Por seu turno, o envolvimento do Kelvin foi porque, após abordado, Roberte confessou que “Loirinho”, descrevendo-o fisicamente, havia lhe contratado para o transporte, sendo que as características eram compatíveis com Kelvin. Não bastasse, após oficiada, a empresa que realizou o transporte do veículo apresentou o recibo do pix, cuja descrição realizada por José Heliomar era “S10 loirin”, além de que era de uma oficina mecânica em Ji-Paraná. Alegam que, em tese, Rafael Evencio Silva, irmão de Juliane Evencio Silva que, à época, era companheira de Kelvin, seria responsável por receber o veículo em Ji-Paraná/RO, enquanto Marcos Vinicius teria entregado o veículo em Marabá/PA à transportadora. O que reforçam as suspeitas da autoridade policial em relação a Rafael é que, embora registrado como motorista da empresa Campeão Construtora, sediada em Guajará-Mirim, o capital social registrado é de R$1.500.000,00, mas durante as investigações, nunca observaram o local aberto aos clientes, tratando-se, muito provavelmente, de uma empresa de fachada, e localizada bem distante de onde Rafael reside (Ji-Paraná). Em que pese a gravidade da conduta de Roberte, há informação da fuga dele do sistema prisional em 31/10/2023, inclusive pontuaram na IPJ 011.2024 que, ainda que constasse que ele havia sido encaminhado para a Unidade Prisional Especial de Segurança, observaram nos registros telemáticos de sua esposa, Ana Paula Vieira da Silva, que ele permanecia no Comando Geral da Polícia Militar em Porto Velho, transitando livremente e com acesso à telefone. Após a evasão do Roberte, lograram êxito em localizar uma fotografia dele em companhia da esposa dentro de um veículo, com base no chassi gravado no vidro, descobriram que o veículo foi locado pela advogada Gigliane Portugal de Castro, bem como que o bem foi avistado em frente a casa de José Heliomar. Em 03/04/2023, ao que indica a IPJ 03.2024, houve uma apreensão de 200kg de cocaína em Peritoró/MA. Os dados obtidos na nuvem de José Heliomar demonstram um diálogo entre ele e Emerson Miranda Santos, vulgo “Cumpadre”, também apontado como líder. Na ocasião, estavam discutindo porque Emerson perdeu os 200kg de cocaína, mas ainda tinha que pagar para José Heliomar a questão do transporte, até mesmo sobre a aquisição do JEEP Compass para pagamento do transporte, em tese, realizado por Raphael. Na mesma época, Lucas Acácio Botelho também enviou dinheiro para Emerson que, segundo apontado, estava financiando a droga que foi apreendida. Entre 04/05/2023, aparentemente Lucas Acácio e José Heliomar também trataram sobre a aquisição de drogas, em tese, proveniente do Peru, tanto que Lucas disse que haviam lhe cobrado $100.000,00 (cem mil dólares) pelo entorpecente, passando a tratar das questões envolvendo o transporte primeiro pela modalidade aérea para Comodoro, onde pegariam a substância e depois seguiriam via terrestre até o destino final. Em 29/05/2023, na cidade de Jericoacoara, aparentemente lograrem êxito no transporte terrestre da droga mencionado no diálogo entre Lucas Acácio Botelho e José Heliomar, falando, ainda, da participação de Thiago Rodrigues Pinheiro, Rafael Assunção Gadelha, Suziele, Mateus Lourenço de Oliveira, Raphael e Diego Dias. Realizaram um encontro pessoal em Pindoretama/CE e, após, Matheus Lourenço fez um pix de R$80.000,00 para José Heliomar, mas quem enviou o comprovante da transação foi o Lucas Acácio. Os dados do celular apreendido com Suziele, bem como os dados obtidos da interceptação do terminal atribuído ao Diego, apontaram que, neste mesmo período, ambos estavam em Pindoretama na data do encontro e em Jericoacora no dia seguinte, retornando para Porto Velho de avião, saindo de Fortaleza. Já os PRFs, por sua vez, foram responsáveis por enviar consulta ao sistema informatizado da PRF do período de 25 a 30 de maio, correspondente ao suposto evento. No dia 30/05/2023, Diego disse ao Raphael que havia acabado de “entregar”. Ainda, sustenta a autoridade policial que, a mando de Lucas, Rafael Gadelha teria recebido o entorpecente de Diego. Em 29/06/2023, Lucas Acácio, por intermédio de Mateus Lourenço de Oliveira, transferiu, por meio de diversas movimentações, R$365.000,00 para contas bancárias de José Heliomar e de suas empresas para financiar o transporte das drogas abaixo mencionadas. Mais uma apreensão de drogas ocorreu em 07/07/2023, na cidade de Canarana/MT, Suziele Gomes de Oliveira e o PRF Raphael Angelo Alves da Nobrega foram presos em flagrante, transportando aproximadamente 540kg de cocaína, a bordo do veículo Chevrolet S10, placa RSU3H86. A partir da extração dos dados dos telefones apreendidos, bem como com as informações coletadas ao longo da interceptação telefônica, em especial os arquivos armazenados na nuvem, foi possível verificar a possível participação de José Heliomar, Eleandro Nascimento Pereira, João Ademir Mallmann Filho, Diego Duarte e Rafael Dias Andrade da Cunha. Nos dias que antecederam o flagrante, José Heliomar manteve contato com Eleandro, ao que parece, para tratarem sobre o veículo utilizado na empreitada criminosa, tanto que José Heliomar, em tese, fez um pagamento de R$1.000,00 para Eleandro após a confirmação de que estava tudo pronto. Também apontaram diálogos entre Raphael e Diego, em que o primeiro pede ao segundo o contato de Suziele, ambos conversam sobre Heliomar não estar atendendo o telefone. Em relação ao investigado Rafael Dias Andrade da Cunha, o contato de um terminal telefônico atribuído a ele estava salvo na agenda do telefone apreendido com Suziele como “ADV”. Após diligências, constataram que ele é primo do PRF Diego e, além disso, após a prisão em flagrante de Raphael e Suziele, o terminal telefônico foi desativado, o que levantou suspeitas sobre o envolvimento de Rafael na empreitada. Assim, ao consultarem o ERB do respectivo terminal telefônico, pontuaram que, no dia 07/07/2023, Rafael também estava em Canarana, conforme exposto no IPJ 008.2024. Além dos eventos, reputo importante ressaltar que, segundo a autoridade policial, a liderança da referida organização criminosa é atribuída aos investigados José Heliomar de Souza, Lucas Acácio Botelho (Don Princípe) e Emerson Miranda (Cumpadre), a quem compete as funções logísticas, financeiras e compra e venda. Apontaram o envolvimento dos PRFS E. S. D. J. e Raphael Angelo Alves da Nobrega, que detém conhecimento sobre o sistema utilizado pela instituição para evitar abordagens, bem como das rotas alternativas, inclusive foram responsáveis pelo aluguel de veículos para despistar eventual abordagem (Raphael aluguel por 7 vezes e Diego 16 vezes nos últimos anos). Conforme exposto pela autoridade policial, os PRF’s alugavam os veículos para driblar a abordagem, pois caso utilizassem o mesmo para transportar droga por várias vezes, seria acusado no sistema da instituição com base na placa, o que poderia levantar suspeitas, razão pela qual variavam o veículo. Em relação ao investigado Thiago Duarte, em que pese não esteja necessariamente vinculado aos eventos acima mencionados, foi pontuado que Lucas Acácio contava com seu auxílio na empreitada criminosa, como por exemplo o diálogo ocorrido em dezembro de 2023, quando negociavam sobre a entrega da chave do veículo JEEP Compass, bem como possuía comunicação com com Lucas e fotografia dos documentos pessoais de outros investigados. Na ocasião, Thiago Duarte adquiriu uma passagem de ônibus em nome de Lucas Lourenço que, em tese, teria que ir buscar o referido veículo. Assim como Thiago Duarte, Thiago Rodrigues também foi apontado como comparsa de Lucas Acácio, sendo apelidado de “Babuíno” ou “Babu”. Em um vídeo obtido da nuvem de Lucas, havia registro de cerca de 200 quilos de cocaína e, enquanto filmavam, foi mencionado que “Babu” estava no local, casa de “Boleta” (Lucas Lourenço). Por fim, foi mencionado por Lucas em um diálogo com José Heliomar, indicando que estava no encontro ocorrido em Jericoacoara. Já no tocante aos investigados Heberton Luiz Cavalcante Nepomuceno, Delson Artur de Almeida, Josan Santos Rodrigues e João Ademir Mallmann Filho, tratam-se de empresários com suposto envolvimento na associação criminosa, em tese, por terem movimentado ou cedido veículos para a empreitada criminosa ou por terem movimentado valores nas contas bancárias das suas empresas. Ainda, a autoridade policial apresentou algumas informações obtidas com diligências em campo, apontando um encontro entre José Heliomar, Débora Michele (esposa de José Heliomar) e Lucas Acácio em Fortaleza, bem como entre José Heliomar e Débora em Porto Velho. Por fim, transcrevo as funções que estão atribuídas aos investigados, conforme Auto Circunstanciado apresentado pela autoridade policial: [...] E. S. D. J., CPF 014.546.815-19, é POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL, atualmente lotado no estado da BAHIA, entretanto já foi lotado na cidade de GUAJARÁ-MIRIM/RO. DIEGO atuaria diretamente nos transportes de entorpecente da organização, alugando veículos, consultando sistemas da PRF e como motorista. [...] Não obstante, é de interesse mencionar que, além dos requisitos já expostos, é necessária, ainda, a contemporaneidade do fato para a decretação da prisão preventiva. Consigno que a referida contemporaneidade não é analisada exclusivamente com base no lapso temporal decorrido entre o fato criminoso e a medida cautelar de prisão preventiva, mas quanto à presença de seus pressupostos autorizadores, como a garantia da ordem pública nos casos dos crimes permanentes e reiterados, tal como a associação criminosa. Vejamos o entendimento das Cortes Superiores: [...] Além da necessidade da contemporaneidade, devendo ter em mente que a prisão preventiva é a última medida a ser adotada, também deve ser observado que, nos casos de organização criminosa, justifica-se a excepcionalidade da medida quando adotada com o objetivo de interromper a atividade criminosa. Dito isso, deve-se separar, dentro dos indícios da autoria, àqueles que detém funções que podem, além de incorrer em eventual embaraço à investigação e à instrução processual, atuar com o objetivo de manter a ORCRIM na ausência dos que porventura são presos. Não se objetiva segregar, cautelarmente, de forma indistinta, todos que atuam numa organização criminosa, mas àqueles que detém poder, gestão e conhecimento da atuação do grupo para cessar a atividade. Assim, tendo a análise da contemporaneidade, bem como almejando cessar a continuidade delitiva, com base nos fundamentos necessários à decretação da prisão preventiva, vejo necessária a divisão dos representados em dois grupos. O primeiro composto pelos representados José Heliomar de Souza, Roberte Paulo Aguiar Souza, Gedeon Rocha de Almeida, E. S. D. J., Raphael Angêlo Alves da Nóbrega, Suziele Gomes de Oliveira, Emerson Miranda Santos, Lucas Acácio Botelho, Thiago Silva Duarte, Thiago Rodrigues Pinheiro, Matheus Lourenço de Oliveira, Rafael Assunção Gadelha, Francisco de Assis Araújo Melo, Rafael Dias Andrade da Cunha e Lucas Lourenço de Oliveira, dos quais verifico a presença dos pressupostos autorizadores de forma contemporânea. Conforme exposto acima, José Heliomar, Emerson e Lucas Acácio são apontados como líderes e financiadores do tráfico de drogas e, com base na logística de divisão de tarefas empenhadas por eles, os demais atendem às solicitações, fazendo movimentações bancárias em seus nomes, buscando e levando droga, mas o comando, em tese, parte deles. Assim, é imperioso que os três sejam cautelarmente presos para garantir não só a segurança pública, mas a conveniência para a investigação e instrução processual, bem como para coibir que, caso solto, possam se evadir, posto que é consabido que possuem considerável poder aquisitivo. Da mesma forma quanto aos investigados Gedeon, Roberte, Diego Dias, Raphael e Thiago Rodrigues, todos agentes da segurança pública o que, por si só, já é suficiente para atestar a periculosidade daqueles que detém poder do estado e utilizam as informações e treinamento para a prática justamente daquilo que deviam coibir, sem desconsiderar a sensação de insegurança que esse tipo de conduta traz à sociedade. No tocante à Suziele, em que pese seja de conhecimento sua absolvição quanto ao delito de tráfico de drogas pelo qual foi presa em flagrante, não se pode descurar dos dados obtidos com a interceptação telefônica aptos a demonstrar que ela atuava de forma reiterada a mando da organização criminosa. Ainda que se trate de coisa julgada sua absolvição pelo tráfico de drogas, subsistem os indícios de autoria do delito de organização criminosa, delito autônomo, e com isso surge a necessidade de seu cárcere preventivo. [...] Considerando que os líderes dos núcleos da associação criminosa já vão ser presos, é de se supor a interrupção da atividade, de forma que os indivíduos que, em tese, organizam a logística dos veículos, de forma isolada, não apresentariam demasiado risco à garantia da ordem pública. Desta feita, em relação à maioria dos representados, as investigações iniciais mostraram-se suficientes para demonstrar indícios de autoria e de materialidade, pois os elementos informativos produzidos até o presente momento evidenciaram que os sujeitos passivos da cautelar, em tese, participam de grupo criminoso, envolvido em condutas relacionadas ao tráfico de drogas. A medida pleiteada, diante disso, servirá para cessar a atividade da organização criminosa e dos crimes praticados por esta. Sendo assim, desponta dos autos a certeza da necessidade da segregação para impedir que, soltos(as), os(as) requeridos (as) eventualmente voltem a delinquir, constatação apta a justificar a decretação da medida constritiva excepcional para garantia da ordem pública. (destaquei com grifos) Em 7/11/2024, cumpriu-se o mandado de prisão em desfavor do paciente em Natal/RN. Em 5/2/2025, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do paciente, imputando-lhe a suposta prática do delito tipificado no art. 2°, §§ 2º, e 4º, IV, da lei 12.850/2013 (1º fato), art. 33, caput, c.c art. 40, inciso V, ambos da Lei 11.343/2006 (3º fato), art. 1°, §1°, inciso II, c.c §4°da Lei 9.613/1998 (5º fato) e art. 1°, §1°, inciso II, c.c §2°, inciso II, c.c §4°da Lei 9.613/1998 (11º fato). Veja-se: 2.1 Primeiro fato: Constituir e integrar organização criminosa agravada pelo emprego de arma de fogo e conexão com outras organizações independentes (art. 2°, §§ 2º, 3º e 4º, inciso IV, da lei 12.850/2013) No período compreendido entre os anos de 2022 e 2024, em Porto Velho/RO e em Fortaleza/CE, os denunciados [...] , E. S. D. J. (“DDD”) [...] O denunciado E. S. D. J. (“DDD”) é uma das principais figuras do grupo criminoso, visto que detém diversas funções, desde auxiliar na locação de veículos para o transporte das drogas 28 , cooptar outros indivíduos para integrarem o grupo, fornecer telefones celulares para os traficantes e atuar como batedor durante os transportes 29 . Ainda, DIEGO ocultou quantidades vultosas de dinheiro em espécie proveniente do tráfico de drogas, conforme foi apreendido em sua residência quando da deflagração da fase ostensiva da Operação “Puritas”30 . No entanto, destaca-se a sua principal função como transportador de drogas, realizando, por mais de uma vez, deslocamentos a mando de JOSÉ HELIOMAR para levar drogas até o Estado do Ceará.31 2.3 Terceiro fato: tráfico de drogas ocorrido em 07 de julho de 2023 - art. 33, caput, c.c art. 40, inciso V, ambos da Lei 11.343/2006 Em julho de 2023, na rodovia BR 364, em Canarana/MT, os denunciados [...] E. S. D. J. [...] todos de forma livre e consciente, concorreram para o crime de tráfico interestadual de drogas, pelo qual os denunciados RAPHAEL ANGELO ALVES DA NÓBREGA e SUZIELE GOMES DE OLIVEIRA, foram presos enquanto transportavam aproximadamente 540 kg (quinhentos e quarenta quilos) de “cocaína”, acondicionados em tabletes organizados em fardos, utilizando o veículo Chevrolet/S10, de cor branca, com placas RSU3H8655. Dessa forma, RAPHAEL ANGELO ALVES DA NÓBREGA e SUZIELE GOMES DE OLIVEIRA foram autuados em flagrante delito e processados pelo crime de tráfico interestadual de drogas nos autos da ação penal n° 1001326-05.2023.8.11.0029 (2ª Vara de Canarana/MT). Já os ora denunciados JOSÉ HELIOMAR DE SOUZA, LUCAS ACÁCIO BOTELHO, EMERSON MIRANDA SANTOS, JOÃO ADEMIR MALLMANN FILHO, ELEANDRO NASCIMENTO PEREIRA, MATEUS LOURENÇO OLIVEIRA, E. S. D. J., e RAFAEL DIAS ANDRADE DA CUNHA não foram presos, nem processados naquela ação penal em concurso com RAPHAEL ANGELO ALVES DA NOBREGA e SUZIELE GOMES DE OLIVEIRA, eis que monitoravam, financiavam ou acompanhavam o transporte da droga à distância. Dessa forma, até a conclusão do respectivo inquérito, suas participações e identidades eram desconhecidas da polícia e estavam sendo mantidas em sigilo pelos executores presos em flagrante. Todavia, a partir da análise da quebra telemática dos telefones de RAPHAEL ANGELO e SUZIELE GOMES, devidamente autorizada pelo Juízo Natural 57, foi possível elucidar a participação dos denunciados acima referenciados no citado evento de tráfico, cujo resultado foi frustrado pela prisão em flagrante dos executores. [...] O denunciado E. S. D. J. realizou o acompanhamento da droga à distância, gerenciando, instruindo e direcionando os transportadores até que chegassem ao seu destino, possivelmente no Estado do Ceará 65. 2.5 Quinto fato: lavagem de capitais por meio da movimentação dissimulada de valores em contas bancárias – art. 1°, §1°, inciso II, c.c §4°da Lei 9.613/1998 Entre os anos de 2022 e 2024, nesta Comarca de Porto Velho, os denunciados [...] E. S. D. J. [...] todos de forma livre e consciente, em concurso de vontades e atuando de forma reiterada, ocultaram e dissimularam a origem e movimentação de bens e valores provenientes direta e indiretamente de infração penal, notadamente tráfico interestadual de drogas, bem ainda de origem suspeita ou simplesmente desconhecida (cegueira deliberada), dos quais foram identificadas diversas transações suspeitas ou típicas de lavagem de dinheiro. Conforme já detalhado no 1º fato desta denúncia, os denunciados constituíram e integraram uma organização criminosa com atuação profissional e especializada voltada para a prática sistemática de tráfico de drogas e lavagem de capitais. Durante a investigação documentada no Inquérito Policial e medidas cautelares criminais que sustentam esta denúncia, notadamente a análise do afastamento de sigilos bancário e fiscal 72 , constatou-se que os denunciados, de fato, operaram o esquema realizando transações típicas de lavagem de capitais, incidindo nas seguintes tipologias elencadas na Carta Circular 4.001/2020 do Banco Central do Brasil, abarcadas pelas recomendações do Grupo de Atuação Financeira – GAFI 73 e pelas Convenções Internacionais de Viena 74, Palermo 75 e de Mérida 76. 2.12 Décimo primeiro fato: lavagem de capitais por meio da ocultação de valores em espécie – art. 1°, §1°, inciso II, c.c §2°, inciso II, c.c §4°da Lei 9.613/1998 E. S. D. J. ocultou valores em espécie e que são provenientes de infração penal, guardando-os em depósito no interior de um cofre, enquanto integrava organização criminosa voltada para o tráfico interestadual de drogas. Nesse sentido, no dia 07/11/2024, conforme relatório de diligência de ID 114705453 - fls 131, foram apreendidos o total de R$ 580.000,00 (quinhentos e oitenta mil reais) e USD$ 8.157,00 (oito mil cento e cinquenta e sete dólares), em espécie, localizados dentro de um cofre no interior da residência de DIEGO. Em razão dos antecedentes de DIEGO com crimes de lavagem de capitais, como quando cooptou o codenunciado FRANCISCO DE ASSIS ARAUJO MELO a transportar aproximadamente quantia de R$ 700.000,00 (setecentos mil reais) para o grupo criminoso, assim como pelos delitos de tráfico de drogas imputados a DIEGO nesta denúncia, há claros indícios da prática de crimes antecedentes relacionados ao tráfico interestadual de drogas e organização criminosa. Ressalta-se, ainda, que o montante apreendido é incompatível com seus rendimentos lícitos como Policial Rodoviário Federal, sendo certo que DIEGO ocultou valores em espécie e que são provenientes do tráfico de drogas. (destaquei com grifos) O juízo de primeiro grau, em 17/2/2025, recebeu a denúncia. Em 16/4/2025, o Juízo de primeiro grau procedeu à reavaliação da necessidade da prisão preventiva do paciente, ocasião em que decidiu por sua manutenção, nos seguintes termos: 5) Reavaliação das prisões preventivas Passo a reavaliar a necessidade da manutenção das prisões preventivas dos réus, nos termos do art. 316, parágrafo único do CPP. Desde a última decisão, não houve alteração fática capaz de ensejar eventual revogação da prisão dos réus José Heliomar de Souza, E. S. D. J., Raphael Angêlo Alves da Nóbrega, Emerson Miranda Santos, Lucas Acácio Botelho, Matheus Lourenço de Oliveira, Rafael Dias Andrade Cunha e Gedeon Rocha de Almeida, pelos motivos reiterados e expostos no ID 117063043. No mais, registro que o processo é de considerável complexidade diante da pluralidade de réus, mas está com o curso processual regular, sendo saneadas as diligências pertinentes às citações nesta data, não havendo excesso de prazo ou desproporcionalidade na manutenção da prisão. Neste sentido: [...] Diante do exposto, mantenho as prisões preventivas. Por outro lado, quanto aos réus Thiago Rodrigues Pinheiro, Rafael Assunção Gadelha, Lucas Lourenço de Oliveira e Suziele Gomes de Oliveira, não vislumbro mais a necessidade de permanecerem recolhidos. Desde já, esclareço que não procederei à análise do mérito da causa neste momento, reservando-a para o momento oportuno. É cediço que a prisão cautelar é medida excepcional que somente pode ser deferida quando se encontrarem presentes os requisitos legais, pois confronta o direito de liberdade garantido constitucionalmente. Conforme o artigo 316 do CPP, a prisão preventiva rege-se pela cláusula rebus sic standibus, ou seja, pode ser revista em caso de insubsistência dos motivos que a ensejaram ou superveniência de novas circunstâncias que posteriormente a justifiquem. Embora os indícios de autoria sejam fortes em relação aos réus mencionados, deve ser pontuado que respondem apenas pela organização criminosa, e no caso de Lucas Lourenço, ainda pela lavagem de capitais. Aliado a isso, conforme consulta no BNMP e SEEU, os réus são aparentemente primários e não registram maus antecedentes. Além disso, os réus já estão citados e apresentaram resposta à acusação, estando regulares e denotando compromisso com a celeridade processual, de forma que entendo que o estado de liberdade dos réus não coloca em risco a ordem pública, tampouco gera risco à instrução processual ou à aplicação da Lei Penal. Ou seja, não subsistem os motivos que ensejaram a medida extrema. Assim, atento ao que dispõem os artigos 311, 312, 316 e 321, todos do Código de Processo Penal, considerando a excepcionalidade da prisão, entendo necessária a revogação da segregação cautelar, mediante a aplicação de medidas cautelares do art. 319 do CPP, as quais reputo suficientes para garantir a aplicação da lei penal e a conveniência da instrução processual. Pois bem. O recebimento da denúncia pressupõe a existência robusta de indícios suficientes de autoria e materialidade do delito. Por outro lado, em uma análise inicial, própria deste momento processual, observa-se que a segregação cautelar do paciente se fundamenta na necessidade de garantir a ordem pública, em razão da atuação contínua de uma organização criminosa desde 2021, com destaque para a gravidade do caso pela participação de servidores da segurança pública – entre eles o paciente, Policial Rodoviário Federal – no esquema criminoso.. Adicionalmente, a medida visa assegurar a aplicação da lei penal e a conveniência da instrução criminal, considerando o tráfico de 500 kg de cocaína e os vínculos internacionais com a Bolívia e o Paraguai. Ademais, “a demonstração da "[...] contemporaneidade não está restrita à época da prática do delito, e sim da verificação da necessidade no momento de sua decretação, ainda que o fato criminoso tenha ocorrido em um período passado." ( AgRg no HC 707.562/SP , Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK , QUINTA TURMA, julgado em 08/03/2022, DJe 11/03/2022) Assim, não constato, de forma satisfatória, informações suficientes para a concessão da liminar pleiteada. Dessa forma, neste juízo de cognição sumária, o caso noticiado nos autos não se enquadra nas hipóteses excepcionais passíveis de deferimento do pedido em caráter de urgência, por não se verificar situação configuradora de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade (fumus boni iuris e o periculum in mora). Posto isso, INDEFIRO o pedido LIMINAR, ressalvando melhor juízo quando do julgamento do mérito do Habeas Corpus. Requisitem-se informações à autoridade apontada como coatora, para resposta em 48h. Faculto resposta à solicitação pelo e-mail ccrim-cpe2g@tjro.jus.br, com confirmação de recebimento, sem necessidade do envio por malote por questão de celeridade e economia processual. A autoridade impetrada deverá informar a esta Corte a ocorrência de qualquer alteração relevante no quadro fático do processo de origem, especialmente se o paciente vier a ser solto, mesmo após as informações iniciais. Ato contínuo, dê-se vista dos autos à Procuradoria de Justiça para emissão de parecer. Expeça-se o necessário. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. 22 de maio de 2025 {orgao_julgador.magistrado}
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