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Processo nº 1015247-20.2025.8.26.0554

ID: 312582836

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Santo André - 1ª Vara Criminal Classe: CRIMES DE CALúNIA, INJúRIA E DIFAMAçãO DE COMPETêNCIA DO JUIZ SINGULAR Nº Processo: 1015247-20.2025.8.26.0554

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

I. F. DE O.

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

CARLA LETÍCIA PEREIRA NUNES

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

Processo 1015247-20.2025.8.26.0554 - Crimes de Calúnia, Injúria e Difamação de Competência do Juiz Singular - Calúnia - I.F.O. - Vistos. Ivani Francisco de Oliveira ofereceu a presente QUEIXA-CRIME e… Processo 1015247-20.2025.8.26.0554 - Crimes de Calúnia, Injúria e Difamação de Competência do Juiz Singular - Calúnia - I.F.O. - Vistos. Ivani Francisco de Oliveira ofereceu a presente QUEIXA-CRIME em face de Ana Lígia Bragueto da Costa, imputando-lhe a prática dos delitos previstos nos artigos 138 e 139, ambos do Código Penal. A inicial veio instruída com os documentos de fls. 09/71. O representante do Ministério Público manifestou-se pela rejeição do pedido inicia em razão da ausência de justa causal (fls. 74/80). É o que se apresenta até o momento. Decido. Necessário consignar que no tocante aos crimes de calúnia e difamação, o procedimento criminal somente pode ser iniciado se a inicial vier instruída com provas de ocorrência do delito e indícios de autoria, sob pena de faltar ao querelante justa causa para agir. Da análise da petição inicial e dos documentos que a instruem, verifica-se que a querelada foi responsável por denúncia perante o Conselho Federal de Psicologia, que ensejou a instauração de Processo Ético, onde se alega que a querelante, na condição de vice-presidenta do referido Conselho, teria vazado um documento sigiloso à, então, presidenta do Conselho Regional de Psicologia da 8ª Região, CRPPR, imputando-lhe, assim a prática de um crime de Divulgação de segredo, nos termos do artigo 153, §1-A, bem como que a querelante, no momento de sua retirada da vice presidência, vazou os acontecimentos via whatsapp para um grupo de psicólogos, novamente tentando atribuir sigilo a um evento que afetava diretamente a querelada. Sustenta ainda a querelada que as afirmações foram reproduzidas e reafirmadas na rede social Instagram. Colocada a questão nesses termos, com relação ao crime de calúnia, observando o art. 138 do Código Penal, conclui-se que ela consiste em atribuir a alguém, falsamente, a prática de um crime. Isto é, a falsidade é elementar do crime decalúnia - O agente só realiza o crime quando tem consciência da falsidade do que relata. Se, por erro ao interpretar a sua fonte de informação, imputa fato verdadeiro, não há se falar em crime. Igualmente, se está convencido de que a imputação é verdadeira ou tem dúvidas sobre a sua falsidade, está isento de punição (TACRIM SPAC 360.123 Rel. José Pacheco) (grifei). No presente caso, a descrição dos fatos na petição inicial e nos documentos que a acompanham não indica que a querelada tinha plena consciência de eventual falsidade dos fatos imputados à querelante. Em consequência, ausente na queixa crime o elemento normativo do tipo atribuição de fato falso a alguém -, impõe se a sua rejeição. Assim já se decidiu: A certeza ou fundadas suspeitas, mesmo errôneas, que tem o agente de que seu relato corresponde à verdade afasta o dolo do delito de calúnia. Narrar arbitrariedades e pedir apuração não constitui calúnia, mas sim exercício do direito individual de pedir (TACRIM SP HC Rel. Régio Barbosa JUTACRIM 96/295). A imputação de fato criminoso a alguém, embora feita precipitadamente, não configura o crime de calúnia, se fundada em razoável suspeita. O ânimo que move o agente não é o propósito deliberado de enxovalhar a honra de alguém, mas apenas a vontade de encontrar a verdade (STJ REsp Rel. Édson Vidigal RSTJ 41/343). O crime de difamação, por sua vez, configura-se pela imputação a alguém de fato ofensivo à sua reputação. Na lição de Cezar Roberto Bitencourt, em Tratado de direito penal,2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, págs.342/344: "Difamação é a imputação a alguém de fato ofensivo à sua reputação. Imputar tem o sentido de atribuir, acusar de. O fato, ao contrário da calúnia, não precisa ser falso nem ser definido como crime. (...) Difamação é a imputação de fato, repetindo, fato determinado, individualizado, identificado, e não de defeitos ou de qualidades negativas. (...) O elemento subjetivo do crime de difamação é o dolo de dano, que se constitui da vontade consciente de difamar o ofendido imputando-lhe a prática de fato desonroso; (...) Não há animus diffamandi na conduta de quem se limita a analisar e argumentar sobre dados, fatos, elementos, circunstâncias, sempre de forma impessoal, sem personalizar a interpretação. Na verdade, postura comportamental como essa não traduz a intenção de ofender (...) Além do dolo, é indispensável o animus diffamandi, elemento subjetivo especial do tipo, como ocorre em todos os crimes contra a honra. A difamação também exige o especial fim de difamar, a intenção de ofender, a vontade de denegrir, o desejo de atingir a honra do ofendido. A ausência desse especial fim impede a tipificação do crime. Por isso, a simples idoneidade das palavras para ofender é insuficiente para caracterizar o crime, como ocorre, em determinados setores da sociedade, com o uso de palavras debaixo nível, por faltar-lhes o propósito de ofender. Em verdade pode existir uma série de animus que excluem a "responsabilidade penal" do agente: animus jocandi (intenção jocosa, de caçoar); animus consulendi (intenção de aconselhar, advertir), desde que tenha dever jurídico ou moral de fazê-lo; animus corrigendi (intenção de corrigir), desde que haja a relação de autoridade, guarda ou dependência, exercida em limites toleráveis; animus defendendi (intenção de defender), que, em relação à injúria e difamação, é excluído expressamente pelo art. 142, I, do CP e pelo Estatuto da OAB (art. 7°,§ 2º, da Lei n. 8.906/94). Enfim, qualquer animus que, de alguma forma, afaste o animus offendendi exclui o elemento subjetivo do crime." (grifos nossos) No mesmo sentido, vem a lume julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INJÚRIA E DIFAMAÇÃO. REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. MERO ANIMUS NARRANDI.ELEMENTOS SUBJETIVOS DOS CRIMES CONTRA A HONRA NÃO CONFIGURADOS. INEXISTÊNCIA DE MENÇÃO EXPRESSA À PESSOA OFENDIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.1. A denúncia ou queixa-crime é a peça processual por meio da qual o órgão acusador submete ao Poder Judiciário o exercício do direito de punir. O legislador estabeleceu alguns requisitos essenciais para a formalização da acusação, a fim de que seja assegurado ao denunciado o correto exercício do contraditório e da ampla defesa. Na verdade, a própria higidez da denúncia opera como uma garantia do acusado. 2. Segundo a orientação desta Corte, "Os delitos contra a honra reclamam, para a configuração penal, o elemento subjetivo consistente no dolo de ofender na modalidade de 'dolo específico', cognominado 'animus injuriandi'" (APn 555/DF, Rel. Ministro Luiz Fux, Corte Especial, julgado em 1º/4/2009, DJe de 14/5/2009). 3. No caso, não há nada que desabone a conduta da autoridade policial, que agiu como devido zelo de registrar o que entendeu ser o tumulto causado pela defesa do querelante durante a apuração dos fatos de outro processo em que este figura como suspeito. Ademais, a queixa-crime se mostra carente de quaisquer indícios mínimos de crimes contra a honra, pois o policial apenas narrou os fatos ocorridos em determinado momento da investigação, o que incluiu apostura dos defensores do investigado, o qual não foi mencionado. 4. A simples narrativa dos fatos pela autoridade policial (animus narrandi), que, no caso, registrou as dificuldades encontradas durante o procedimento investigativo, não se confunde com o elemento subjetivo dos crimes de injúria e difamação. Precedentes. 5. De acordo com a jurisprudência do STJ, a ausência de elementos que permitam individualizar a pessoa ofendida afasta o caráter personalíssimo necessário à configuração dos crimes contra a honra. 6.Na espécie, não há no ofício emitido pela autoridade policial nenhuma referência expressa ao querelante, mas somente à sua defesa. 7. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.713.332/BA, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 5/11/2024, DJe de 7/11/2024.) (grifos nossos) Com efeito, os documentos apresentados pela querelante não se revelam aptos a indicar o dolo específico da querelada. A lide penal, não obstante seja de alçada privada, por si só traz uma carga sancionatória, pois sujeita o indivíduo ao poder de punir do Estado. Assim, uma ação, sem que haja mínimos elementos de autoria e materialidade, revela-se temerária. Nesse sentir, a demonstração da justa causa, indicativo da autoria e da materialidade da infração penal, por se tratar de condição de procedibilidade para o exercício da ação penal pelo querelante, na inicial acusatória, é essencial para o recebimento ou não da queixa-crime ou da denúncia, nos termos do art. 395, III, do CPP. Vem a lume os ensinamentos de Gustavo Henrique Badaró: "A noção de justa causa evoluiu, então, de um conceito abstrato para um ideia concreta, exigindo a existências de elementos de convicção que demonstrem a viabilidade da ação penal. A justa causa passa a significar a existência de um suporte probatório mínimo, tendo por objeto a existência material de um crime e a autoria delitiva. A ausência desse lastro probatório ou da probable cause autoriza a rejeição da denúncia e, em caso de seu recebimento, faltará justa causa para a ação penal, caracterizando constrangimento ilegal apto a ensejar a propositura de habeas corpus para o chamado "trancamento da ação penal".A razão de exigir a justa causa para a ação penal é evitar que denúncias ou queixas infundadas, sem uma viabilidade aparente, possam prosperar. Inegável o caráter infamante do processo penal. É exato que, sob o ponto de vista jurídico, a garantia constitucional da presunção de inocência,enquanto regra de tratamento do acusado, assegura que nenhuma diferenciação possa existir entre, de um lado, aquele que é acusado de um delito, sem que haja uma condenação transitada em julgado contra si, e, de outro, qual quercidadão que nunca foi processado. Contudo, também é certo que, do ponto de vista moral, social e mesmo psicológico, o simples fato de estar sendo processado criminalmente é um pesadíssimo fardo a ser carregado pelo acusado. Ser réu em processo criminal significa, portanto, de alguma forma, já estar sendo punido.Diante do caráter infamante e apenador do simples "estar sendo processado", seria uma intolerável agressão à dignidade do cidadão admitir que se pudesse processar alguém, imputando-lhe a prática de um delito, sem que houvesse uma mínima base probatória quanto à existência do crime e autoria delitiva. Isto é, sem que houvesse elementos, normalmente colhidos no inquérito policial, a indicar que a ação penal não é temerária. Ilusório seria o "Estado de Direito" em que qualquer acusação infundada pudesse prosperar, sendo apenas um "ato de fé" do acusador, ou sua "pura criação mental da acusação" (Badaró, Gustavo Henrique. Processo penal / Gustavo Henrique Badaró. 3. ed. rev., atual. eampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2015. Páginas 163-164) grifos nossos. No mesmo sentido, destaca-se elucidativos julgados: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - QUEIXA-CRIME VISANDO A APURAÇÃO DO CRIME DE INJÚRIA - REJEIÇÃO COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 395, III, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - RECURSO DA QUERELANTE VISANDO O PROSSEGUIMENTO DA QUEIXA-CRIME - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - FALTA DE PROVAS MÍNIMAS DE MATERIALIDADE E AUTORIA - INSUFICIÊNCIA DE BOLETIM DE OCORRÊNCIA PARA PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL - AUSÊNCIA DE DOLOESPECÍFICO NECESSÁRIO PARA A CONFIGURAÇÃO DOS CRIMES CONTRA A HONRA - RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Recurso em Sentido Estrito 0014623-26.2023.8.26.0564; Relator(a): Fernando Simão; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Criminal; Foro deSão Bernardo do Campo - 3ª Vara Criminal; Data do Julgamento: 04/12/2024;Data de Registro: 04/12/2024) (grifos nossos) PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.QUEIXA-CRIME. REJEIÇÃO. RECURSO DO QUERELANTE. Recurso contra decisão que rejeitou a exordial por falta de viabilidade do caderno probatório. Desprovido. Uma vez que a prática delitiva está apoiada em uma base documental unilateralmente produzida e jungida a relatos testemunhais despidos de selo notarial de autenticidade, vê-se de fato temerário o recebimento da queixa-crime, bem rejeitada no piso por ausência de demonstrada justa causa na seara probatória. Negado provimento. (TJSP; Recurso em Sentido Estrito 1027557-55.2022.8.26.0007; Relator (a): Alcides Malossi Junior; Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Criminal; Foro Regional VII - Itaquera - Vara Criminal e do Juizado Especial Criminal do Foro Regional de Itaquera; Data do Julgamento: 29/02/2024; Datade Registro: 29/02/2024) (grifos nossos) Nessa esteira, verifica-se que o próprio Ministério Público, como fiscal da lei, também se inclinou no sentido de que "a querelada apenas alegou que houve violação de segredo profissional, com a divulgação de documentos ditos sigilosos, para o seu conselho de classe, o que não configura calunia, e mencionou em mensagem que a questão configurava traição, mais especificamente a um projeto eleitoral, o que não configura difamação ou injuria. No mais, o feito está mal instruído. Não foram juntados os ditos documentos sigilosos, a querelada não foi ouvida para apresentar sua justificativa, os prints juntados não foram por atos notariais, de modo que não há justa causa para a ação penal" (fls. 78). Diante de todo o exposto, acolhendo a manifestação do Ministério Público, REJEITO a queixa crime ofertada por Ivani Francisco de Oliveira em face de Ana Lígia Bragueto da Costa, o que faço com fundamento no artigo 395, incisos II e III, todos do Código de Processo Penal. Transitada em julgado, arquivem-se os autos, procedendo-se as anotações de praxe. P.R.I.C. Santo André, 30 de junho de 2025. Maria Sílvia Gabrielloni Feichtenberger Juiz(a) de Direito - ADV: CARLA LETÍCIA PEREIRA NUNES (OAB 61316/RS)

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Processo nº 1015247-20.2025.8.26.0554