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Eliene Mendes Vieira x Banco Votorantim S.A.

ID: 317672718

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de São Simão - Vara Única Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1002867-67.2024.8.26.0596

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

ELIENE MENDES VIEIRA

Polo Passivo:

BANCO VOTORANTIM S.A.

Intimação

Advogados:

ISAI SAMPAIO MOREIRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

EDUARDO DI GIGLIO MELO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Processo 1002867-67.2024.8.26.0596 - Procedimento Comum Cível - Contratos Bancários - Eliene Mendes Vieira - BANCO VOTORANTIM S.A. - Vistos. Trata-se de AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO… Processo 1002867-67.2024.8.26.0596 - Procedimento Comum Cível - Contratos Bancários - Eliene Mendes Vieira - BANCO VOTORANTIM S.A. - Vistos. Trata-se de AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO proposta por ELIENE MENDES VIEIRA em face de BANCO VOTORANTIM S/A, alegando, em síntese, que, em 06/04/2019, firmou com a parte ré o contrato de financiamento de veículo em alienação fiduciária sob nº 171082383, no valor liberado de R$ 32.450,74, com pagamento previsto em 48 parcelas mensais de R$ 928,00. Sustentou que as taxas de juros pactuadas, de 1,52% ao mês e 19,78% ao ano, são onerosas e abusivas, superando a taxa média de mercado. Alegou, ainda, que submeteu o contrato à perícia particular, onde constatou descumprimento contratual da parte ré, uma vez que esta teria praticado taxas divergentes daquelas pactuadas. Por fim, afirmou a previsão de outras cláusulas abusivas no contrato, quais sejam, tarifa de registro de contrato, tarifa de avaliação do bem e tarifa de seguro prestamista, configurando, esta última, venda casada. Requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita e a concessão de tutela antecipada para readequar as taxas de juros. No mérito, pediu a revisão contratual a fim de adequar as taxas de juros aos patamares efetivamente contratados; a declaração de nulidade da tarifa de registro, da tarifa de avaliação do bem e do seguro prestamista; e a condenação da ré à restituição em dobro dos valores indevidamente cobrados, apurados em R$ 8.248,81, alusivos à diferença entre as taxas de juros efetivamente praticadas com aquelas previstas em contrato, somado ao valor dispendido a título das cláusulas acima especificadas. Atribuiu à causa o valor de R$ 15.992,62. Juntou procuração e documentos (fls. 23/63). O juízo da comarca de Serrana/SP declinou da competência e determinou a remessa dos autos a este juízo (fl. 64). Indeferida a concessão de antecipação dos efeitos da tutela e a tramitação do feito em segredo de justiça. Os benefícios da justiça gratuita, por sua vez, foram deferidos (fls. 68/69). Citada (fls. 74), a parte ré BANCO VOTORANTIM S/A apresentou contestação (fls. 113/128). Em caráter preliminar, arguiu a impugnação à concessão da justiça gratuita à parte autora e advocacia massiva. No mérito, alegou a fragilidade dos cálculos apresentados junto à inicial, não se prestando eles a comprovar a autenticidade das alegações tecidas pela parte autora, constituindo-se prova unilateral. Sustentou, também, a legalidade das taxas de juros remuneratórios pré-fixadas, as quais compactuam-se com a taxa média do mercado, arrazoando que a parte autora teve ciência prévia e concordou com todos os termos do contrato, devendo-se prestigiar a autonomia da vontade. Alegou, também, inexistir ilegalidade na cobrança das tarifas de registro e de avaliação do bem, sustentando a efetiva prestação de ambos os serviços. Sustentou, outrossim, que as contratações dos seguros foram facultativas, em instrumento apartado, e não possui vínculo econômico com a seguradora contratada, o que afastaria a caracterização de venda casada. Alegou, ainda, a impossibilidade da repetição do indébito em qualquer modalidade, ante a legalidade das cláusulas questionadas pela parte autora, sob pena de enriquecimento ilícito. Pugnou pela total improcedência dos pedidos da parte autora, requerendo a condenação da parte autora em litigância de má-fé, caso constatada a irregularidade na atuação de seu procurador. Juntou procuração (fls. 76/112) e documentos (fls. 129/140). A parte autora apresentou réplica (fls. 144/150), na qual refutou as preliminares levantadas pela parte ré, reiterando, quanto ao mérito, suas razões para o reconhecimento da conduta abusiva da instituição bancária, sob o fundamento de inobservância da boa-fé contratual e desrespeito a direitos consumeristas. Houve a inversão do ônus da prova, ao passo que as partes foram instadas a especificarem provas (fl. 152). Não houve requerimento de produção de provas pelas partes, e ambas não manifestaram interesse na designação de audiência de conciliação (fl. 157). Vieram os autos conclusos. É o relatório. DECIDO. O feito comporta julgamento antecipado do mérito, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria controvertida é eminentemente de direito e os fatos relevantes para o seu deslinde encontram-se suficientemente comprovados pelos documentos já carreados aos autos, sendo desnecessária a produção de outras provas. Inicialmente, passo ao exame das questões preliminares. A impugnação à justiça gratuita arguida pela ré não prospera. O benefício foi concedido à autora após análise da documentação pertinente, notadamente da sua CTPS, onde consta a situação de desemprego da parte (fl. 26), não tendo a parte ré trazido aos autos qualquer elemento concreto capaz de infirmar a presunção de hipossuficiência anteriormente reconhecida, ônus que lhe incumbia. A respeito do ajuizamento reiterado de ações com o mesmo teor, verifico que não restou demonstrada irregularidade alguma na conduta da parte autora e de seu procurador. O argumento lançado pela parte ré não é contra o direito pleiteado, mas contra o do procurador da parte autora, por estar, em tese, ingressando em juízo com várias ações similares. Entretanto, a simples propositura de demandas, ainda que com petições padronizadas, não pode ser tida como litigância de má-fé, advocacia predatória ou conduta atentatória à dignidade da justiça. É notório que a massificação dos contratos para abarcar uma maior quantidade de clientes acaba gerando um maior fluxo de consumidores insatisfeitos com a prestação do serviço, acarretando o aumento de ações judiciais. No mais, eventual captação irregular de clientela deve ser apurada pelo órgão de classe a que pertence o profissional que patrocina a parte autora, facultando-se à parte ré a comunicação do fato que entende antiético. Superadas as questões preliminares, passo ao exame do mérito. No mérito, o pedido é parcialmente procedente. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, nos termos da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". Incidem, portanto, as normas protetivas do diploma consumerista, notadamente o direito à informação clara e adequada e a possibilidade de revisão de cláusulas contratuais que se revelem abusivas ou coloquem o consumidor em desvantagem exagerada (art. 6º, III e V, do CDC). A controvérsia cinge-se à legalidade da taxa de juros efetivamente aplicada e à validade das cobranças a título de Tarifa de Avaliação do Bem e Tarifa de Cadastro e Seguros Prestamista e de Acidentes Pessoais. No que tange aos juros remuneratórios, a parte autora alega que a taxa aplicada (1,54% a.m.) foi superior àquela expressamente pactuada no instrumento contratual (1,52% a.m.). A instituição financeira, em sua defesa, não impugnou especificamente tal alegação, limitando-se a defender a unilateralidade do documento e a incorreção do cálculo apresentado, sem, contudo, apontar os alegados erros de cálculo. Nessa senda, há verossimilhança da alegação autoral, pois amparada em laudo técnico e cálculos elaborados por órgão integrante do Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor, mantido pelo Ministério Público (fl. 28). Assim, diante da ausência de prova em contrário por parte do banco, que detém os meios técnicos para demonstrar a exatidão do cálculo da parcela, impõe-se o reconhecimento da cobrança a maior. Desse modo, o contrato deve ser recalculado com estrita observância da taxa de juros de 1,52% ao mês, e os valores pagos em excesso deverão ser restituídos. Quanto às tarifas administrativas, a análise deve seguir as teses firmadas pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos. A despesa com Registro de Contrato, no valor de R$ 121,99, se mostra regular. O REsp nº 1.578.553/SP (Tema 958) pacificou o entendimento de que é válida a cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, por corresponder a um serviço necessário à formalização da garantia em favor da própria financeira, que comprovou o efetivo registro à fl. 136. Do mesmo modo, a cobrança da Tarifa de Avaliação do Bem, no valor de R$ 435,00 (fl. 58), não se revela abusiva. A validade de tal encargo, conforme a tese fixada no REsp nº 1.578.553/SP, está condicionada à efetiva prestação do serviço. O ônus de comprovar a realização da avaliação recaía sobre a instituição financeira, que, por sua vez, desincumbiu-se do encargo probatório, pois trouxe aos autos o laudo de avaliação do bem, acompanhado de imagens dele (fls. 137/138), atestando a execução do serviço. Portanto, a previsão contratual, com a correspondente contraprestação, legitima a cobrança. Quanto ao Seguro Prestamista no valor de R$ 979,00, sua cobrança é indevida. O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp nº 1.639.259/SP (Tema 972), firmou a tese de que, nos contratos bancários, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada. Embora a parte ré tenha juntado nos autos o termo de adesão ao seguro em instrumento apartado (fls. 139/140), há menção da inclusão do prêmio do seguro no próprio instrumento de financiamento do veículo (fl. 129 item 5.5), constatando que não foi oferecida à consumidora a opção de contratar o seguro com outra seguradora de sua escolha, configurando venda casada, prática vedada pelo artigo 39, I, do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido: AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. JUROS. Descabimento da alegação de que a taxa de juros cobrada é maior do que a pactuada. Custo efetivo total (CET), expresso no contrato, que inclui todos os encargos e despesas das operações. SEGURO. Para a caracterização ou não da venda casada, não basta observar a liberdade de contratar da cobertura securitária, sendo necessária também a demonstração da liberdade de escolher o outro contratante. Venda casada configurada na hipótese. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1016695-93.2024.8.26.0576; Relator (a): Afonso Bráz; Órgão Julgador: 17ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José do Rio Preto - 10ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/07/2025; Data de Registro: 03/07/2025) (negritei) Deverá a parte ré, portanto, também restituir o valor cobrado a título de Seguro Prestamista. Reconhecida a inexigibilidade dos débitos, a restituição dos valores indevidamente cobrados é medida de rigor. A parte autora pleiteia a devolução em dobro, com fundamento no parágrafo único do artigo 42 do CDC. Nos moldes da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a restituição em dobro exige: 1) Para as cobranças anteriores a 30/03/2021: há necessidade do concurso de dois requisitos: o pagamento e a má-fé do credor (AgInt no AREsp 1166061/PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 17/04/2018). 2) Já nas cobranças a partir de 31/03/2021: se deve observar o pagamento indevido e a conduta contrária à boa-fé objetiva, sem a necessidade de se perquerir quanto ao dolo ou à culpa, conforme entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, lançado em processo submetido ao regime dos recursos repetitivos (Tema 929). O contrato foi celebrado em abril de 2019 (fl. 44), de forma que a repetição do indébito em dobro, prevista no artigo 42, parágrafo único, do CDC, a qual independe da existência de má-fé por parte do credor, deverá incidir apenas sobre as cobranças realizadas a partir de 31/03/2021. As cobranças anteriores a esta data, porém, deverão ocorrer na forma simples, já que exigem a existência de má-fé por parte do credor e, tratando-se de cobranças amparadas em cláusulas contratuais, ainda que ora declaradas abusivas, não redundam em má-fé. Por oportuno, ressalta-se que a divergência entre as taxas de juros previstas em contrato com as efetivamente cobradas pela parte ré, ainda que caracterizadora de abusividade, não onerou sobremaneira o consumidor, não constituindo, portanto, má-fé por parte daquele. Por fim, os valores a serem restituídos deverão ser apurados em fase de liquidação de sentença. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: a) DECLARAR a abusividade parcial da cobrança de juros remuneratórios, para determinar que o contrato seja recalculado à taxa de 1,52% ao mês, conforme originariamente pactuado pelas partes; e DECLARAR a nulidade da cláusula que estabeleceu a cobrança do Seguro Prestamista, mantendo-se a cobrança da "Tarifa de Cadastro" e da despesa com "Registro de Contrato"; b) CONDENAR o réu, BANCO VOTORANTIM S.A., a restituir à autora, os valores pagos a maior a título de juros remuneratórios (diferença entre a taxa de 1,52% a.m. e a taxa de 1,54% a.m.), bem como os valores integrais pagos a título de "Seguro" (R$ 979,00). Os valores a serem restituídos deverão ser apurados em fase de liquidação de sentença, corrigidos monetariamente desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora a contar da citação (art. 405 do Código Civil), observando-se, também, o seguinte: as cobranças realizadas a partir de 31/03/2021 deverão ser reembolsadas na forma dobrada; ao passo que as cobranças anteriores a esta data deverão ocorrer na forma simples. A correção monetária e os juros de mora serão aplicados em conformidade com os artigos 389 e 406 do Código Civil, observadas as alterações promovidas pela Lei 14.905/2024, conforme a seguinte sistemática: I) até 29/08/2024 (data anterior à vigência da Lei nº 14.905/2024), a correção monetária será calculada com base na Tabela Prática do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, e os juros de mora serão de 1% ao mês (arts. 406 do C. Civil c.c. 161 § 1º do CTN); II) a partir de 30/08/2024 (início da vigência da Lei 14.905/2024), os índices a serem adotados serão: a) o IPCA-IBGE, quando houver apenas correção monetária; b) a taxa SELIC, deduzida do IPCA-IBGE, quando houver apenas a incidência de juros de mora; c) a taxa SELIC, quando ocorrer a aplicação conjunta de correção monetária e juros de mora. Diante da sucumbência recíproca, mas em maior parte da ré, condeno-a ao pagamento de 60% das custas e despesas processuais, e ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da autora, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Condeno a autora ao pagamento dos 40% restantes das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios em favor do patrono da ré, que fixo em 10% sobre o valor dos pedidos em que decaiu (referentes às Tarifas de Cadastro, Avaliação do Bem e repetição do indébito na forma simples dos valores cobrados antes de 31/03/2021), observada a suspensão da exigibilidade em razão da gratuidade de justiça que lhe foi deferida, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC. Publique-se. Intimem-se. - ADV: EDUARDO DI GIGLIO MELO (OAB 189779/SP), ISAI SAMPAIO MOREIRA (OAB 114510/SP)

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