Processo nº 0016372-03.2016.4.01.3200
ID: 257367026
Tribunal: TRF1
Órgão: 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJAM
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 0016372-03.2016.4.01.3200
Data de Disponibilização:
16/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WALDEMIR MORAES TORRES
OAB/AM XXXXXX
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RUBELI DA SILVA NASCIMENTO
OAB/AM XXXXXX
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ERIAS TOFANI DAMASCENO JUNIOR
OAB/RO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Amazonas 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJAM SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 0016372-03.2016.4.01.3200 CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) POLO AT…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Amazonas 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJAM SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 0016372-03.2016.4.01.3200 CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:JOSE VALDEMIR RIBEIRO TORRES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ERIAS TOFANI DAMASCENO JUNIOR - RO2845, RUBELI DA SILVA NASCIMENTO - AM7824 e WALDEMIR MORAES TORRES - AM11126 SENTENÇA 1 – RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MPF contra JOSÉ VALDEMIR RIBEIRO TORRES, JORGE MICHEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA, PRESTATIVA SERVIÇOS DE NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO, FRANCISCO ALBERTO SOUZA DOS SANTOS E FRANCISCO CANINDÉ FREITAS. A pretensão contida na inicial é de responsabilização civil dos réus por dano ambiental, provocado por extração irregular de minério, na margem direita do leito do Rio Negro, no Município de Novo Airão/AM. Realizada audiência de conciliação (pág. 99 do id. 313540363). FRANCISCO ALBERTO DE SOUSA DOS SANTOS apresentou contestação (pág. 109/121, id. 313540363), oportunidade em que alegou a incompetência da justiça federal e inépcia da inicial. No mérito, pugnou pela improcedência dos pedidos, sob a alegação de nulidade do auto de infração que deu origem a presente ação. FRANCISCO CANINDÉ FREITAS DE LIMA foi citado e intimado por meio de carta precatória (pág. 159/161, id. 313540363). PRESTATIVA SERVIÇOS NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO LTDA. foi citada na pessoa de seu representante legal Albano Henrique Gomes Machado (pág. 175/176, id. 313540363), que teria apresentado defesa de próprio punho, sem estar representado por advogado (pág. 179/181, id. 313540363). A defesa de JOSÉ VALDEMIR RIBEIRO TORRES apresentou instrumento de procuração (pág. 9/12, id. 313540365). A DPU (pág. 18, id. 313540365) requereu a vista dos autos para apresentação da defesa de PRESTATIVA SERVIÇOS NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO LTDA. (pág. 21, id. 313540365), onde ratificou a defesa apresentada de próprio punho pelo representado. Na oportunidade, alegou que a extração de minério pelo réu teria sido realizada em conformidade com as licenças e autorizações dos órgãos competentes, sem danos consideráveis às comunidades e ao meio ambiente. Alegou ainda que "sequer houve precisão sobre os danos ambientais alegados na inicial, o que torna impossível a reparação ou compensação pela parte ré". Certidão (pág. 22, id. 313540365) consignando a não apresentação de contestação pelos requeridos JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA e FRANCISCO CANINDÉ FREITAS DE LIMA, a despeito de terem sido devidamente citados. Em réplica, o MPF impugnou as preliminares de inépcia da inicial, ilegitimidade passiva e incompetência da Justiça Federal (pág. 26/38, id. 313540365) e ratificou o pedido de inversão do ônus da prova constante na inicial. A defesa de JOSÉ VALDEMIR RIBEIRO TORRES requereu prazo para, administrativamente, solucionar sua questão junto aos órgãos ambientais (pág. 42, id. 313540365). Dada vista ao MPF, este se manifestou pelo indeferimento do pedido (pág. 45/46, id. 313540365). Decisão (pág. 48/55, id. 313540365) rejeitou as preliminares de incompetência da Justiça Federal e de inépcia da inicial, determinando a intimação do MPF para emendar a inicial, para o fim de delimitar os fatos referentes a cada um dos réus, bem como para que explique a existência de vínculo entre os fatos praticados por cada réu e sua inclusão em uma mesma ação civil pública, justificando o nexo causal. Postergou a apreciação da preliminar de ilegitimidade de partes para após a emenda da inicial e subsequente contestações dos réus. Foi apresentada emenda à inicial, onde o MPF teria individualizado as condutas dos réus (pág. 60/61, id. 313540365), complementando com documentos de pág. 65/80, id. 313540365. Despacho exarado à pág. 84, id. 313540365, determinando a intimação dos réus para se manifestarem sobre a emenda à inicial, nos termos do art. 329, II do CPC. A ré PRESTATIVA SERVIÇOS NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO LTDA. apresentou manifestação pela inadmissão da emenda da inicial. Intimadas por publicação (pág. 90/92, id. 313540365), a defesa de JOSÉ VALDEMIR RIBEIRO TORRES (pág. 96/98, id. 313540365) informa que o MPF não atendeu em sua totalidade a decisão judicial de emenda à inicial e ao final requereu a juntada aos autos de cópia integral do processo administrativo ambiental e do processo criminal, após o que pretende se manifestar em contestação. A defesa DE FRANCISCO ALBERTO SOUSA DOS SANTOS (pág. 102/104, id. 313540365) se manifestou pela intempestividade da emenda à inicial, pedindo pelo indeferimento da petição inicial. Digitalizados os autos, as partes foram intimadas da sua migração para o PJE (id. 313540360). O MPF se manifestou ciente da migração (id. 327732349). A defesa de FRANCISCO ALBERTO SOUSA DOS SANTOS requereu a extinção do feito sem resolução do mérito pela ausência de nexo causal entre a conduta dos réus que justifique a solidariedade pretendida (id. 685150034). Despacho (id. 748680465) determinando a intimação da DPU da migração dos autos, bem como a certificação, pela SECVA, acerca da intimação das partes a respeito do aditamento da inicial pelo MPF (pág. 84, id. 313540365). Certidão da SECVA (id. 952976156) informando que os réus JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA e FRANCISCO CANINDÉ FREITAS DE LIMA não foram intimados da migração por não possuírem advogado constituído nos autos. A DPU, representante da ré PRESTATIVA SERVIÇOS NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO LTDA., manifestou ciência da migração. Certidão da SECVA (id. 1498965394) relativamente à intimação das partes quanto ao aditamento da inicial, informando que os réus JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA e FRANCISCO CANINDÉ FREITAS DE LIMA não foram intimados para se manifestar. Os réus JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA e FRANCISCO CANINDE FREITAS E LIMA foram devidamente citados (ids. 1926417192, 2013122650). Ambos deixaram de se manifestar sobre a emenda à inicial. Em réplica (id. 2128548754), o MPF manifestou-se pelo reconhecimento da revelia de JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA e FRANCISCO CANINDÉ FREITAS DE LIMA e o indeferimento das preliminares arguidas, bem como a declaração da inversão do ônus da prova. Em decisão saneadora (id. 2138707985), foi rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva, invertido o ônus da prova, decretada a revelia de JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA e FRANCISCO CANINDÉ FREITA DE LIMA e determinada a intimação das partes para especificar as provas que pretendem produzir. A pessoa jurídica PRESTATIVA SERVIÇOS DE NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO LTDA. requereu a realização de perícia técnica, “a fim de avaliar os danos ambientais alegados na inicial, identificando a sua extensão e seu impacto” (id. 2144811495). As demais partes não requereram a produção de provas. Em decisão de ID n. 2148787817 foi indeferido o pedido de produção de prova pericial. O Ministério Público apresentou alegações finais (ID de n. 2158320237) argumentando que as condutas atribuídas aos réus ocorreram em um mesmo contexto temporal e geográfico, caracterizando-se por infrações ambientais praticadas de forma sucessiva e com impacto cumulativo no ecossistema local. Destaca que os elementos de prova produzidos nos autos, tais como autos de infração, relatórios de fiscalização ambiental elaborados pelo IPAAM e ICMBio, indicam que as atividades foram exercidas sem observância dos limites das licenças ambientais ou em desacordo com suas condicionantes. Sustenta que, por se tratar de responsabilidade civil ambiental, aplica-se o regime objetivo previsto na Lei nº 6.938/81, bastando a demonstração do dano ambiental e do nexo causal para que haja a obrigação de reparação. Requer a condenação solidária dos réus às obrigações de recuperação dos danos mediante execução de Planos de Recuperação de Áreas Degradadas (PRADs), pagamento de indenizações por danos interinos, residuais e morais coletivos, ou, alternativamente, a imposição de medidas compensatórias. A parte ré Prestativa Serviços de Navegação e Comércio Ltda., representada pela Defensoria Pública da União, apresentou Alegações Finais sustentando a inexistência de prova suficiente dos danos ambientais alegados, bem como a ausência de nexo causal entre sua atividade e os supostos prejuízos ao meio ambiente. Afirma que operava com base em licenças regularmente expedidas pelos órgãos competentes, dentre elas a Licença de Operação nº 573/13, autorização do IPAAM, registro junto ao DNPM/AM e Licença Municipal de Conformidade expedida pela Prefeitura de Novo Airão. Defende que a exploração era acompanhada e fiscalizada, inclusive com o conhecimento da comunidade local, à qual prestava apoio por meio do fornecimento de combustível e doações esporádicas. Alega ainda que encerrou suas atividades no ano de 2012, não exercendo mais qualquer operação extrativa desde então. Em relação ao dano moral coletivo, alega que não restou configurada lesão concreta e relevante ao corpo social, motivo pelo qual requer a improcedência total dos pedidos iniciais ou, subsidiariamente, a fixação de eventual indenização em patamar compatível com sua realidade econômica. Transcorreu in albis o prazo para apresentação de alegações finais dos réus José Valdemir Ribeiro Torres, Jorge Michael Souza Barroso de Almeida Pereira, Francisco Alberto Souza dos Santos e Francisco Canindé Freitas de Lima, embora devidamente citados ou intimados, conforme certidão datada de 28 de março de 2025 (ID de n. 2179221352). Os autos vieram conclusos para sentença. É o relatório. 2 – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. – DO MÉRITO Considerando que o tema proposto na presente ação encontra solução à luz dos documentos acostados nos autos, julgo antecipadamente a lide, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil. Cinge-se a controvérsia sobre a responsabilização civil por dano ambiental, provocado por extração irregular de minério, na margem direita do leito do Rio Negro, no Município de Novo Airão/AM. A responsabilidade civil consistiria em reparação integral do dano ambiental por meio da recuperação da área degradada, além do pagamento de indenização pelo dano interino ou intermediário, bem como pelo dano residual e a indenização por danos morais coletivos. 2.1.1 O meio ambiente e sua proteção. Dever de recomposição da área degradada (obrigação de fazer ou não fazer) A Constituição Federal preceitua, no art. 225, caput, que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” O meio ambiente equilibrado é um bem difuso, inserido entre os chamados direitos humanos de terceira geração. É constitucionalmente definido como de uso comum do povo e, portanto, diverso dos bens que o integram, adquirindo natureza própria. Assim, uma pessoa poderá ser eventualmente proprietária de um imóvel e sua cobertura vegetal, mas toda a coletividade terá o direito ao uso sustentável daqueles recursos naturais, segundo a legislação ambiental. O final do dispositivo impõe a todos o dever de defendê-lo, estabelecendo um pacto intergeracional, o qual se deve respeitar. O dano ambiental, por sua vez, pode ser descrito como um prejuízo causado ao meio ambiente por uma ação ou omissão humana, que afeta de modo negativo o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e por consequência atinge, também de modo negativo, todas as pessoas, de maneira direta ou indireta. Quanto à obrigação de reparar o dano causado, a própria Constituição Federal em seu art. 225, § 3º, estabeleceu que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”; e, textualmente, resguardou especial tratamento à Floresta Amazônica, senão vejamos: Art. 225. (...) § 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. Note-se que a responsabilidade pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade, como obrigação propter rem, sendo possível cobrar do atual proprietário/possuidor condutas derivadas de danos provocados pelos proprietários antigos ou terceiros. Portanto, o dever fundamental de recomposição e recuperação ambiental pode ser exigido de qualquer pessoa. A matéria já foi pacificada pelo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, na Súmula n. 623: “As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor.” O TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO, em recente decisão (AC 1005976-24.2020.4.01.4100 - PJe 16/07/2024) seguiu o entendimento da Corte Superior: A responsabilidade ambiental é objetiva e propter rem, vinculando-se ao imóvel independentemente de quem tenha praticado o ato danoso. A obrigação de reparar o dano acompanha a propriedade, conforme disposto no art. 2º, § 2º, da Lei n. 12.651/2012, e na Súmula 623 do STJ. No caso em análise, em relação à materialidade do dano ambiental, a parte autora instaurou IC n. 1.13.000.001240/2014-21, a partir da remessa, pelo IPAAM, de cópia do Processo n. 1961/T/14, referente ao Auto de Infração n. 6085/14, por realizar extração mineral (lavra a céu aberto por dragagem) na margem direita do Rio Negro, em frente à comunidade Bom Jesus do Puduari, em descumprimento às condicionantes da licença ambiental – LO n. 233/11-02. Consoante o Relatório Técnico de Fiscalização n. 27/13-GRHM do IPAAM encontra-se materializada a prática de extração mineral irregular, o que gera danos ao meio ambiente. No caso, inexistiu regularização por parte dos infratores, consoante a Notificação n. 036957/14-GRHM, não havendo resposta ou adimplemento da multa aplicada pelo AI acima citado. No que se refere à autoria, as condutas de cada réu foram identificadas, de modo que foi possível assim destacá-las: a) JOSÉ VALDEMIR RIBEIRO TORRES : nos termos do auto de infração nº 4109/12, em 30.09.2012, na margem direita do Rio Negro, próximo a Comunidade Puduari (coordenadas geográficas: 02° 06’ 17, 10″S/ 61° 11’ 16, 20″ W), Município de Novo Airão, o réu deixou de atender às condições da LO n° 233/22-01, relativo ao processo de licenciamento 3643/T/10, ao extrair areia 480m fora da área licenciada e lançar óleos para ambiente aquático no entorno das unidades de conservação Parque Rio Negro Setor Norte (110m de distância) e Parque Nacional das Anavilhanas (2,8km de distância) oriundo da draga utilizada para a extração., conforme constatado em 30/09/2012. b) JORGE MICHAEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA: nos termos do auto de infração nº 2478/13 e do Relatório de Vistoria nº 147/13, em 26.10.2012, no leito do Rio Negro (coordenadas geográficas: 61° 11’ 53, 77″ W/ 02° 5’ 43, 68″ S), no Município de Novo Airão, o réu executou extração de areia em desacordo com a licença obtida junto ao IPAAM – LO n° 470/12, em uma área de 4,8ha, fato constatado em 10/10/2013. c) PRESTATIVA SERVIÇOS DE NAVEGAÇÃO E COMERCIO: nos termos do auto de fiscalização nº 6092/2014 e do relatório de fiscalização nº 28/2014, em 21.03.2014, no leito do Rio Negro (coordenadas geográficas: 02° 05’ 42, 69433″ S/ 61° 11’ 51,61814″ W), no Município de Novo Airão, a empresa foi autuado por descumprir o condicionante da LO nº 573/13, não implantando o sistema acústico em todos os conjuntos de motobombas, dragas sem identificação e sem sistema de contenção de óleo. Ainda, de acordo com o auto de infração n° 239/12 e relatório de fiscalização n° 265/12, em 14.06.2012, na rua Comandante Gutemberg Barbosa, 02, a referida empresa despejou materiais sólidos – areia e seixo – sem o devido licenciamento ambiental, mesmo após diversas notificações. d) FRANCISCO ALBERTO SOUZA DOS SANTOS: nos termos do auto de infração n° 3570/2012 e o relatório de fiscalização n° 017/2012, em 27.11.2012, na Rodovia AM – 352, km 14, Ramal do Braulino, o réu foi autuado por transportar 40 m³ de madeira serrada sem licença de operação. Nos termos do auto de infração 2465/11 e do relatório de fiscalização n° 141/11, em 18.04.2011, no leito do rio negro (coordenadas geográficas 02° 3’ 03,94″ S/ 61° 13’ 53″ 94 W), o réu foi autuado por exercer atividade de lavra em área diversa da licenciada. e) FRANCISCO CANINDÉ FREITAS DE LIMA: nos termos do auto de infração nº 6837/13 e do relatório de fiscalização nº 488/13, em 18.09.2013, no leito do rio negro (coordenadas geográficas: 02° 06’10,2″ S 61° 12’05,4” W), o réu executou atividade de extração mineral em desacordo com a licença ambiental concedida. Para fins de aferição do nexo causal, o autor demonstra que em face dos réus foi lavrado o Relatório Técnico de Fiscalização n. 546/12-GEFA, lavrando-se, por conseguinte, o Auto de Infração nº 6085/14. O relatório assim enalteceu (ID n. 313540366, Apenso (ANEXO 1- PÁGINAS 02-100) fls. 127 a 135): Em procedimento de fiscalização realizado no dia 30 de setembro de 2012, às 08h30min, por ocasião da operação Rio Negro, a equipe técnica de fiscalização deste Instituto composta pelos Analistas Ambientais Marcelo Garcia, Lúcia Handa e Vara Leila Gonçalves Andrade, o Chefe de Grupo Amoldo Martins da Silva e o Assessor de Controle Ambiental Antônio de Souza Viana encontrou a situação relatada a seguir. Chegando ao local foi avistada uma draga em funcionamento extraindo areia nas coordenadas geográficas 61° 11' 16,20" W e 02° 06' 17,10" S (no momento da leitura a precisão do GPS era de 6 metros) (figura 1). Ao realizar a abordagem fomos recebidos pelo Sr. Eldes Maciel Siqueira, que se identificou como responsável pela draga. Ao solicitarmos a licença o Sr. Eldes nos apresentou a LO N° 233/11-01 em nome de José Valdemir Ribeiro Torres, relativa ao processo de licenciamento ambiental 3643/T/10. Ao confrontar as coordenadas geográficas dos pontos (P1, P2, P3 e P4) constantes na LO N° 233/11-01 com a coordenada onde a draga estava em funcionamento, constatamos que a mesma estava a cerca de 480 metros distantes do limite da área licenciada pelo IPAAM, a 110 metros do Parque Nacional das Anavilhanas e a 2,8 km do Parque Estadual do rio Negro Setor Norte (figura 2), portanto no entorno das Unidades de Conservação. Ainda durante a fiscalização a equipe identificou um vazamento de óleo para o ambiente aquático, proveniente dos motores que estavam em funcionamento (figura 3). 03. Conclusão: Diante da constatação de que a exploração de areia estava ocorrendo fora dos limites contidos na Licença de Operação N° 233/11-01, em desacordo com a restrição N° 9 e N° 11 por lançar resíduos oleosos no ambiente aquático, a equipe de fiscalização decidiu pela autuação, visto que o empreendimento infringiu o disposto no Art. 60 da Lei Federal N° 9605/98 combinada com o inciso II do Art. 66 do Decreto Federal N° 6514/08 com nova redação dada pelo Decreto N° 6686/08, combinado ainda com o Art. 93 do Decreto N° 6514/08, por deixar de atender as condicionantes números 9 e 11 da Licença de Operação NQ 233/11-01. Foi lavrado então o auto de infração N° 004109/12-GEFA com multa simples no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) de acordo com o Art. 72, 11, IV e VII da Lei Federal N° 9605/98 combinada com o Art. 2°, II,IV e VII e Art. 60 da Lei Federal N° 9605/98, combinada com o inciso 11 do Art. 66 do Decreto Federal N° 6514/08 com nova redação dada pelo Decreto N° 6686/08, combinado ainda com o Art. 93 do Decreto N° 6514/08, totalizando o valor da multa em R$ 20.000,00 (vinte mil reais); foi lavrado também o Termo de Embargo para a área licenciada N° 000620/12-GEFA; o Termo de Apreensão da draga N° 000903/12GEFA e o termo de apreensão da balsa Dona Raimunda IV N° 000902/12-GEFA. Diante disso, conclui-se que restam comprovadas nos autos a materialidade, a autoria e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano praticado pelos réus, qual seja a extração irregular de mineral sem a devida autorização do órgão competente, devendo a requerida elaborar projeto de recuperação da área degradada. Cumpre realçar que não há nos autos elementos que demonstrem que a restauração in natura da área (art. 2º, XIV, Lei nº 9.985/00) não seja viável. O projeto de recuperação deve ser elaborado por profissional habilitado, no prazo de 90 (noventa) dias, contado da intimação da presente sentença, o qual deve ser submetido à imediata aprovação do IPAAM, que deverá analisá-lo e aprová-lo no prazo de 60 (sessenta) dias, mediante concomitante comunicação ao Ministério Público Federal (MPF), em Manaus/AM. O referido projeto deve conter cronograma, com etapas definidas – não superior a 1 (um) ano - para a restauração ambiental, a fim de que o IPAAM e/ou o MPF verifique(m) o efetivo cumprimento do projeto. 2.1.2. Responsabilidade civil pelo dano material causado ao meio ambiente Os elementos da responsabilidade civil ambiental podem ser extraídos do art. 14, §1º da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981), de maneira que o responsável pelo ilícito ambiental, por meio das atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, pessoa física ou jurídica, fica sujeito à obrigação de reparar os danos causados, independentemente da existência de culpa ou dolo. O Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de assentar em sede de recurso especial repetitivo, o Tema n. 707, segundo o qual a responsabilidade por dano ambiental é objetiva e em sua modalidade mais rigorosa, ou seja, pelo risco integral, sendo, portanto, incabível a oposição de excludente de ilicitude: a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais causados e c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado. (STJ- SEGUNDA SEÇÃO- RECURSO ESPECIAL 1374284 / MG MINISTRO RELATOR LUIS FELIPE SALOMÃO, julgado em 27/08/2014, DJe 05/09/2014) Por outro turno, a responsabilidade civil solidária caracteriza-se pelo fato de que a sanção civil da indenização pode ser imputada, em pé de igualdade e de forma integral, a todos aqueles que, de qualquer forma, tenham contribuído para a consumação do dano ambiental, pouco importando, aqui, a maior ou a menor participação do poluidor para o ato lesivo, bem como a maior ou menor instrução do poluidor a respeito de sua atividade predatória do meio ambiente. Enfim, estando comprovada a autoria da lesão ao meio ambiente, quem quer que seja o poluidor, sempre, tem o dever legal e constitucional de arcar com a responsabilidade civil ambiental em sua inteireza. A responsabilidade ambiental, consoante previsto no art. 14, §1º, da Lei de Política Nacional de Meio Ambiente, tem a obrigação de reparar o poluidor direto e indireto, isto é, todos aqueles que de alguma forma contribuíram para a existência danosa da conduta são responsáveis pela reparação. Conforme se verifica do Auto de Infração n. 6085/14 ocorreu a extração mineral irregular, por intermédio de lavra a céu aberto por dragagem na margem direita do Rio Negro, em frente à comunidade Bom Jesus do Puduari. A extração ocorreu sem a devida autorização do órgão ambiental competente. Portanto, é evidente o dano ambiental e o nexo de causalidade entre a conduta da requerida e o dano perpetrado. No que tange à alegação de que não há comprovação inequívoca dos danos ambientais, rejeito esse argumento. A atividade fiscalizatória, com base no poder de polícia ambiental, bem como os documentos produzidos pelo IPAAM e ICMBio e pelo Ministério Público Federal, que embasaram a presente demanda, são provas suficientes para demonstrar o dano ambiental ocasionado. Ante a fundamentação exposta estão comprovados os elementos da responsabilidade civil (conduta, dano e nexo de causalidade), de modo que resta incontroversa que a imputação de responsabilidade deve recair sobre os réus. Cumpre-lhes, além do dever de recomposição da área degradada, a obrigação de reparação do dano ambiental, através do pagamento de indenização pelos danos interinos, morais e materiais que provocaram. A reparação ambiental deve ser realizada da forma mais abrangente possível. Dessa forma, a condenação que determina a recuperação da área ambientalmente degradada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo denominado dano interino ou intermediário, que corresponde ao prejuízo experimentado entre a ocorrência do dano e o pleno restabelecimento do ambiente afetado, bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual, este último sendo a degradação ambiental que persiste, mesmo após os esforços empreendidos na recuperação. No tocante à aferição dos danos interinos, a determinação carece de diferimento, pois a complexidade da situação não torna possível estabelecer de antemão a extensão da obrigação, devendo ser apurada em sede de liquidação da sentença. Para a adequada recomposição da área, no caso de mora, deve ser o requerido condenado a não usar a área degradada ilegalmente (tutela inibitória), bem como autorizar que os órgãos de poder de polícia ambiental possam realizar a apreensão, retirada e destruição de qualquer bem móvel ou imóvel pertencente a ele existente na área, que esteja impedindo a regeneração natural da área em apreço (tutela de remoção do ilícito). Estas medidas encerram verdadeira tutela de remoção do ilícito e se mostram fundamentais para permitir a recuperação passiva da área (regeneração que ocorre pelas dinâmicas próprias da natureza e sem intervenção humana). 2.1.3. Extensão/fixação da indenização São lícitos os pedidos aduzidos pelo autor de recomposição da lesão ao meio ambiente concomitante à indenização pecuniária, não sendo esta medida substitutiva, necessariamente, da obrigação de reparação in natura do dano, sob o argumento de configuração de bis in idem. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito reconhece a existência do dano ambiental em suas variadas dimensões, admitindo a cumulação da obrigação de fazer ou não fazer com a obrigação de pagar. O entendimento foi objeto da Súmula n. 629: “Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar.” No mesmo sentido recente decisão do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO, ao assentar que “Em matéria de danos ambientais, para os quais os requeridos não fizeram prova de pronta recuperação ou reparação, tem-se como cabível a cumulação dos deveres de reparar e de indenizar.” (TRF - PRIMEIRA REGIÃO - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA - APELAÇÃO CIVEL (AC) 0000955-35.2016.4.01.3903 - DESEMBARGADORA FEDERAL RELATORA ANA CAROLINA ALVES ARAUJO ROMAN- PJe 05/07/2024) Com efeito, é cabível a cumulação da obrigação de fazer (reparação da área degradada) com as obrigações de dar (dano material e moral), não se configurando a dupla punição pelo mesmo fato. O §3º do art. 225 da Constituição Federal, o inciso VII do art. 4º, e o § 1º do art. 14, os últimos ambos da Lei nº 6938/81, são claros quanto à necessidade de reparação integral do dano ambiental, de modo que se afigura legal a cumulação da obrigação de recuperação in natura do meio ambiente degradado com a compensação indenizatória em espécie. A possibilidade técnica, no futuro (prestação jurisdicional prospectiva), de restauração in natura nem sempre se mostra suficiente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, as várias dimensões do dano ambiental causado; por isso não exaure os deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação integral. A recusa de aplicação ou aplicação parcial dos princípios do poluidor-pagador e da reparação integral arrisca projetar, moral e socialmente, a nociva impressão de que o ilícito ambiental compensa. Daí a resposta administrativa e judicial não passar de aceitável e gerenciável "risco ou custo do negócio", acarretando o enfraquecimento do caráter dissuasório da proteção legal, verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de impunidade de fato, mesmo que não de direito, do infrator premiado, imitem ou repitam seu comportamento deletério. A responsabilidade civil ambiental deve ser compreendida o mais amplamente possível, de modo que a condenação a recuperar a área prejudicada não exclua o dever de indenizar - juízos retrospectivo e prospectivo. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização, em vez de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível. Essa degradação transitória, remanescente ou reflexa do meio ambiente inclui: a) o prejuízo ecológico que medeia, temporalmente, o instante da ação ou omissão danosa e o pleno restabelecimento ou recomposição da biota, vale dizer, o hiato passadiço de deterioração, total ou parcial, na fruição do bem de uso comum do povo (dano interino ou intermediário), algo frequente na hipótese, p. ex., em que o comando judicial, restritivamente, se satisfaz com a exclusiva regeneração natural e a perder de vista da flora ilegalmente suprimida, b) a ruína ambiental que subsista ou perdure, não obstante todos os esforços de restauração (dano residual ou permanente), e c) o dano moral coletivo. Também deve ser reembolsado ao patrimônio público e à coletividade o proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento degradador, a mais-valia ecológica ilícita que auferiu (p. ex., madeira ou minério retirados irregularmente da área degradada ou benefício com seu uso espúrio para fim agrossilvopastoril, turístico, comercial). Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1180078/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 28/02/2012): A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização não é para o dano especificamente já reparado, mas para os seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios, com destaque para a privação temporária da fruição do bem de uso comum do povo, até sua efetiva e completa recomposição, assim como o retorno ao patrimônio público dos benefícios econômicos ilegalmente auferidos. Assim, além da obrigação de recuperação ativa da área (elaboração de Plano de Recuperação de Áreas Degradadas - PRAD, cercamento da área, monitoramento, dentre outras medidas que compõem a pretensão de condenação em obrigação de fazer), deve o requerido interromper uso da área (obrigação de não fazer), inclusive com autorização para que as autoridades de fiscalização ambiental promovam a remoção de qualquer empecilho à regeneração natural (recuperação passiva). Nas hipóteses de descumprimento de obrigação de fazer de recuperação da área degradada é possível converter esta obrigação de fazer em seu equivalente pecuniário (art. 499 do Código de Processo Civil), que deve coincidir com os cálculos apresentados na referida nota técnica. Para a adequada recomposição da área, no caso de mora, deve o requerido ser condenado a não usar a área degradada ilegalmente, com a recuperação passiva da área (regeneração que ocorre pelas dinâmicas próprias da natureza e sem intervenção humana). 2.1.4. Reparação pelos Danos Morais Coletivos De outra parte, também é efeito do dano ambiental a agressão injustificada à coletividade, baseada na vontade de auferir lucro explorando terra pública, de modo a transgredir o direito fundamental à sadia qualidade de vida. Note-se que o tempo em que o processo natural de crescimento das espécies exigirá para que se atinja o nível antes existente, é proporcional à vantagem que o infrator auferiu. No tocante ao dano moral difuso, no caso dos autos, o valor indenizatório deve reparar a significativa perda de nutrientes e do próprio solo como reflexos do dano ambiental, os reflexos na população local, a perda de capital natural, incremento de dióxido de carbono na atmosfera, diminuição da disponibilidade hídrica. Desse modo, o valor da indenização por danos morais coletivos deve ser fixado com base na gravidade do dano, no grau de culpa do ofensor e no porte socioeconômico do causador do dano, de modo a ser suficiente para reprovar a conduta ilícita. Nos termos da jurisprudência do STJ: 1. Os danos morais coletivos são presumidos. É inviável a exigência de elementos materiais específicos e pontuais para sua configuração. 2. A configuração dessa espécie de dano depende da verificação de aspectos objetivos da causa. Trata-se de operação lógica em que os fatos conhecidos permitem ao julgador concluir pela ocorrência de fatos desconhecidos (STJ - REsp: 1940030 SP 2021/0038297-6, Data de Julgamento: 16/08/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/09/2022). É intolerável, pois, à sociedade, a conduta de quem age como se fosse dono absoluto dos recursos naturais, ante os efeitos nefastos à saúde e ao bem-estar humano, decorrentes do dano ambiental em exame, o qual, em razão de sua extensão, tem potencial capacidade de extinguir espécies da flora e da fauna. A mera exploração de bem público, mediante a extração de mineral irregularmente, sem autorização do órgão ambiental competente, é suficiente para causar abalo negativo à moral da coletividade, configurando-se dano moral coletivo. Com relação ao montante devido a título de indenização por danos morais coletivos, há recente entendimento firmado pela 11ª e 12ª Turma deste Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região, a saber: AMBIENTAL. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROJETO AMAZÔNIA PROTEGE. DESMATAMENTO OCORRIDO NA FLORESTA AMAZÔNICA. DANOS MORAIS COLETIVOS. POSSIBILIDADE. REPARAÇÃO INTEGRAL. SÚMULA 629 DO STJ. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DOR OU DOS EFEITOS DA DEGRADAÇÃO AMBIENTAL. ARTIGO 18 DA LEI 7.347/1985. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO CABIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. A questão em análise é quanto ao cabimento de indenização por danos morais coletivos nos casos de desmatamento na Floresta Amazônica. 2. No sistema jurídico brasileiro é consagrado o princípio da reparação integral do dano ambiental. Isso significa que os responsáveis devem arcar com todas as consequências decorrentes de suas ações prejudiciais ao meio ambiente. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça firmou o seguinte entendimento na Súmula 629: "Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar". 3. A reparação por dano moral coletivo decorrente de danos ambientais é um instituto que deve ser empregado como resposta a qualquer violação do direito a um meio ambiente equilibrado e, para que seja estabelecido, não é necessário que seja: a) demonstrada a extensão econômica da degradação causada e b) apresentadas evidências de sofrimento ou prejuízo, principalmente quando se trata de desmatamento no bioma amazônico. Precedentes do STJ e deste Tribunal. 4. No caso em análise, a parte apelada foi condenada pelo desmatamento de 84,52 hectares em área de floresta amazônica. 5. "Na fixação do quantum indenizatório para os danos morais coletivos, com base na razoabilidade e na proporcionalidade, deve ser levada em consideração a gravidade do dano ambiental. À míngua de critério legal, arbitra-se tal indenização no montante de 5% (cinco por cento) do valor dos danos materiais." (AC 0025802-23.2010.4.01.3900, Des. Federal JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF 1 - SEXTA TURMA, PJe 10/04/2023). In casu, danos morais coletivos fixados em R$ 45.395,69 (quarenta e cinco mil, trezentos e noventa e cinco reais e sessenta e nove centavos). 6. O STJ afirmou que "em favor da simetria, a previsão do art. 18 da Lei 7.347/1985 deve ser interpretada também em favor do requerido em ação civil pública. Assim, a impossibilidade de condenação do Ministério Público ou da União em honorários advocatícios - salvo comprovada má-fé - impede serem beneficiados quando vencedores na ação civil pública" (STJ, AgInt no AREsp 996.192/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 30/8/2017). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.531.504/CE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 21/9/2016; AgInt no REsp 1.127.319/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 18/8/2017; AgInt no REsp 1.435.350/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 31/8/2016; REsp 1.374.541/RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 16/8/2017. Sendo assim, como no presente caso não houve má-fé da parte apelada, não deve existir a condenação em honorários advocatícios em favor do IBAMA. 7. Apelação provida. (AC 1007577-65.2020.4.01.4100, 11ª Turma, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PABLO ZUNIGA DOURADO, julgado em 17/03/2025). AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MATERIAL E DANO MORAL COLETIVO. FRAUDE PERPETRADA ATRAVÉS DA INSERÇÃO DE CRÉDITOS FICTÍCIOS NO SISTEMA DOF DO IBAMA. LEGALIZAÇÃO DE MADEIRA ORIUNDA DE DESMATAMENTO ILÍCITO NO ESTADO DO PARÁ. OPERAÇÃO OURO VERDE. DANO AMBIENTAL COMPROVADO. OBRIGAÇÃO DE PROCEDER AO REFLORESTAMENTO. DANO MATERIAL QUANTIFICADO COM BASE NO PREÇO MÉDIO PRATICADO PARA A VENDA DE CARVÃO. SENTENÇA REFORMADA. DANO MORAL COLETIVO CONFIGURADO. SEM CONDENAÇÃO EM VERBA HONORÁRIA. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROVIDA EM PARTE. 1. Caracterizada, na espécie, a ocorrência do dano ambiental, decorrente da inserção fraudulenta de dados no sistema de controle ambiental implantado pelo IBAMA para fins de emissão do Documento de Origem Florestal (DOF), permitindo que um grande número de empresas passe a ter créditos fictícios, legitimando, desse modo, operações de comercialização de madeira extraída de forma ilegal, impõe-se o dever de indenizar. 2. Constatou-se que os réus comercializaram 5.501,001 mdc de carvão, sem a devida autorização da autoridade competente. 3. Impossibilidade de quantificação do dano proposto pelo autor com base no valor da tora de madeira, sem considerar que a nota técnica do IBAMA constatou apenas a comercialização de carvão, sem indicação das espécies de madeira utilizadas, considerando-se que o carvão normalmente é obtido através de resíduos sólidos de madeira. 4. Dano moral coletivo devidamente configurado, tendo em vista o desmatamento ilegal na região da floresta amazônica, que causa lesão injusta a toda uma comunidade, em especial no caso dos autos, em que ficou constatada que a degradação ambiental resultou de fraude na inserção de dados falsos no sistema do IBAMA. Montante fixado em 5% (cinco por cento) do valor da condenação dos danos materiais, conforme entendimento prevalecente nesta 12ª Turma. Definida ainda a condenação em obrigação de fazer correspondente ao reflorestamento da área respectiva. 5. Sem condenação em honorários de sucumbência recursal. Mantida a condenação do réu ao pagamento das custas processuais. 6. Apelação parcialmente provida. (AC 00121804220084013900, 12ª Turma, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL ROSANA NOYA ALVES WEIBEL KAUFMANN, julgado em 05/07/2024). Desta forma, considerando as particularidades do caso em comento fixo a indenização por danos morais coletivos a serem pagos pelos réus no patamar de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). 2.1.5. Suspensão de Financiamentos e Incentivos Fiscais e de Acesso a Linhas de Crédito De acordo com o art. 72, § 8º, IV, da Lei 9.605/98, a perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de créditos, correspondem a umas das sanções restritivas de direito aplicadas a infrações ambientais. Outro dispositivo que prever a perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais é o art. 14, II e III, da Lei nº 6.938/81. Cabe destacar que a referida medida corresponde à sanção imposta a quem não cumprir as medidas necessárias à preservação ou não corrigir os danos ambientais causados pela degradação ambiental. Fato que pressupõe condenação do requerido. No caso, os réus foram autores de extração irregular de mineral no bioma amazônico, logo, entendo preenchidos os requisitos legais para ser decretada a perda do direito de participação em linhas de financiamento oferecidas por estabelecimentos oficiais de crédito aos réus, relativa à área degradada objeto deste processo. 2.1.6. Decretação da Indisponibilidade de Bens e Valores A imposição da indisponibilidade de bens ao infrator ambiental objetiva possibilitar a reparação do dano causado. Assim, insta salientar que em razão do princípio da precaução, quando envolve a incolumidade do meio ambiente e havendo risco de danos irreversíveis à fauna e a flora, é cogente que se proteja o direito coletivo no intuito da reparação do dano ambiental. Trata-se de medida cautelar voltada a resguardar interesse coletivo e dar efetividade à recuperação do meio ambiente degradado, decorrente de grave e reprovável conduta lesiva. Com efeito, decisão da DÉCIMA-SEGUNDA TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO (AC 1029316-70.2023.4.01.0000, PJe 23/04/2024) acompanhou jurisprudência do STJ, para dispensar, na hipótese (gravidade dos prejuízos causados), a demonstração de eventual dilapidação patrimonial pelo agente causador do dano: A indisponibilidade de bens é medida que se impõe para ressarcimento proporcional dos danos ambientais verificados, a partir do qual se pretende a recuperação do meio ambiente. Trata-se de medida de caráter cautelar, voltada à salvaguarda dos interesses de índole ambiental. Precedentes. 6. Há crucial distinção entre o propósito de fiscalização administrativa e a busca de tutela jurisdicional adequada para, no âmbito da responsabilidade civil, viabilizar a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente. 7. No Superior Tribunal de Justiça há entendimento no sentido de que a indisponibilidade dos bens não se condiciona à comprovação de dilapidação de patrimônio. "A decretação de indisponibilidade de bens não se condiciona à comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de patrimônio, porquanto tal medida consiste em 'tutela de evidência, uma vez que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente dilapidar seu patrimônio e, sim, da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao erário, o que atinge toda a coletividade'" (STJ, REsp 1.319.515/ES, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ acórdão Min. Mauro Campbell Marques, DJe 21.9.2012). Nesse contexto, deve ser decretada indisponibilidade dos bens do requerido até o limite necessário à reparação do dano, correspondente ao valor mínimo de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), tendo em vista a condenação específica em danos morais coletivos. Finalmente, é importante ressaltar que a indisponibilidade dos bens do réu não retira dele o direito de usufruí-los, apenas proíbe a alienação/transferência desses bens. 3 - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos contidos na inicial, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, inciso I do CPC, para o fim de CONDENAR JOSÉ VALDEMIR RIBEIRO TORRES, JORGE MICHEL SOUZA BARROSO DE ALMEIDA PEREIRA, PRESTATIVA SERVIÇOS DE NAVEGAÇÃO E COMÉRCIO, FRANCISCO ALBERTO SOUZA DOS SANTOS E FRANCISCO CANINDÉ FREITAS solidariamente: a) na obrigação de recuperar a área degradada descrita na exordial, conforme Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) assinado por profissional habilitado, com anotação de responsabilidade técnica (ART), cabendo ao órgão ambiental avaliar e aprovar o PRAD, bem como acompanhar a sua execução. Fixo para cumprimento dessa obrigação o prazo de 90 (noventa) dias, a contar do trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa mensal de R$ 1.000,00 (mil reais), até atingir o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) (art. 537 do Código de Processo Civil). Em caso de mora, ficam os requerentes autorizados a realizar as intervenções necessárias à melhor recomposição do bem ambiental, quando poderão se valer da colaboração de entidades públicas e privadas, ressalvada a possibilidade de conversão da obrigação de fazer em obrigação de pagar (arts. 497 e 499 do Código de Processo Civil). Durante a execução do PRAD, a área em apreço não poderá ser utilizada pelos réus, permitindo-se a adequada recuperação ambiental. Ademais, no caso de mora dos requeridos, AUTORIZO os órgãos de controle e fiscalização à apreensão, retirada e destruição de qualquer bem móvel ou imóvel pertencente a eles existente na área, que esteja impedindo a sua regeneração natural. Subsidiariamente, caso não seja possível a completa recuperação do ambiente degradado, com a restituição do staus quo ante, deverão os réu executarem medidas compensatórias aos danos ambientais produzidos, a serem estabelecidas pelo IPAAM, ou, em último caso, ao pagamento de indenização por perdas e danos. Prazo: 90 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa mensal de R$ 1.000,00 (mil reais), até atingir o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), em caso de desobediência, nos termos do art. 537 do CPC; b) ao pagamento de indenização por danos materiais, referentes as danos interinos ou intermediário (aquele que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio afetado), bem como pelo dano residual (degradação ambiental que subsiste, apesar de todos os esforços de restauração) em valor a ser apurado na fase de liquidação de sentença, porém em valor não inferior ao proveito econômico obtido com a atividade ilícita, a ser revertido para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, forte no art. 13 da Lei n. 7.347/85; c) ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, correspondente a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). d) a perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento oferecidas aos estabelecimentos oficiais de crédito e a perda ou restrição de acesso a incentivos e benefícios fiscais oferecidos pelo Poder Público, comunicando-se a decisão a todas as autoridades com competência nestas áreas, para tanto expeça-se ofício ao BACEN; e) decretar a indisponibilidade de bens móveis e imóveis dos requeridos, em montante suficiente para garantir a recuperação do dano ambiental, limitado a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). Para efetivar a medida determino: a) a inclusão de indisponibilidade de bens dos réus por meio do sistema Central Nacional de Indisponibilidade de Bens - CNIB, nos termos do Provimento n. 39/2014-CNJ, autorizado pelo art. 837 do CPC; b) a realização de pesquisas de bens em nome dos requeridos no sistema INFOJUD; c) a restrição de alienação dos bens móveis por meio do sistema RENAJUD; d) a indisponibilidade de valores depositados em conta corrente e poupança por meio do sistema SISBAJUD. Com relação às obrigações de fazer, nelas incluídas a recuperação do meio ambiente degradado e a realização de medidas compensatórias, em caso de mora por parte dos condenados, fica o autor, desde logo, autorizado a realizar as intervenções necessárias à melhor recomposição e compensação do bem ambiental, podendo se valer da colaboração de entidades públicas e privadas, atentando-se ao disposto nos artigos 249, caput e parágrafo único do Código Civil e 536 do Código de Processo Civil, com a conversão da obrigação de fazer em obrigação de pagar, pelos réus, o valor total despendido nessa finalidade. Como efeito automático desta sentença, determino: A averbação de tais determinações no CAR da área, devendo constar: 1. número deste processo; 2. valor dos danos ambientais devidos pela área; 3. valor do dano moral coletivo devido pela área; 4. que a área está sob restrição de incentivos e benefícios fiscais pelo Poder Público; 5. que a área degradada está suspensa de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito; e 6. que essas medidas perduram até a comprovação do pagamento integral, recuperação do dano ambiental e integral regulamentação ambiental da área. Correção monetária e juros devem incidir com base no Manual de Cálculos da Justiça Federal, desde o evento danoso (Art. 398, do Código Civil e Súmulas n. 43 e n. 54 do STJ). Considero como a data do evento danoso (infração ambiental) para fins de atualização da indenização objeto da presente condenação, a data em que lavrado o Auto de Infração n. 6085, ou seja, 12/05/2014. Os recursos obtidos a partir desta ação deverão ser destinados ao Fundo de Direitos Difusos (art. 13 da Lei n. 7.347/1985). Condeno os réus em custas proporcionais a sua sucumbência, nos termos do art. 86 do Código de Processo Civil. Isento o autor de custas, forte no art. 4º, inciso III, da Lei n. 9.289/96. Deixo de condenar os réus em honorários advocatícios, na forma do art. 18, Lei n. 7.347/1985 (STJ Resp n. 201202166746 e Resp n. 201101142055). Sentença sujeita à remessa necessária na parte em que restou sucumbente o autor, conforme art. 19 da Lei n. 4.717/65, aplicando-se o microssistema de ações coletivas. Interpostos recursos voluntários, intimem-se as partes para contrarrazões no prazo legal de 15 (quinze) dias, forte no art. 1.010, §1º, do CPC. Após, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade, forte no art. 1.010, §3º, do CPC. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Sentença registrada eletronicamente. Manaus/AM, 10 de abril de 2025. ALEXSANDER KAIM KAMPHORST Juiz Federal Substituto em auxílio
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