Processo nº 1005454-62.2022.4.01.3603
ID: 310899621
Tribunal: TRF1
Órgão: 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Sinop-MT
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO
Nº Processo: 1005454-62.2022.4.01.3603
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JESSICA DE ALMEIDA
OAB/MT XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Sinop-MT 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Sinop-MT Avenida Alexandre Ferronato, nº 2082, R-38, CEP: 78.557-267, Sinop/MT - Fone (66) 3901-1250 - e-mai…
JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Sinop-MT 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Sinop-MT Avenida Alexandre Ferronato, nº 2082, R-38, CEP: 78.557-267, Sinop/MT - Fone (66) 3901-1250 - e-mail: 01vara.sno.mt@trf1.jus.br Sentença Tipo D PROCESSO Nº: 1005454-62.2022.4.01.3603 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO SUMÁRIO (10943) AUTORIDADE: Polícia Federal no Estado de Mato Grosso (PROCESSOS CRIMINAIS) REU: EDSON FEITOSA DINIZ Advogado do(a) REU: JESSICA DE ALMEIDA - MT32466/O SENTENÇA Tipo D 1. RELATÓRIO O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra Edson Feitosa Diniz em razão da suposta prática dos delitos tipificados no art. 55, da Lei 9.605/98; e no art. 2º, da Lei 8.176/91, na forma do art. 70 do Código Penal. Segundo a acusação, no dia 07/09/2019, o réu, de forma livre e consciente, executou a extração de recursos minerais e explorou matéria-prima pertencente à União, sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, no interior da Terra Indígena Kayabi, por meio de balsa de mergulho que navegava no Rio Teles Pires, com mergulhadores e equipamentos de extração de minério (ouro). A denúncia foi recebida em 02/05/2024 (ID 2124656587). Devidamente citado, o réu pugnou pela declaração de extinção da punibilidade quanto ao crime previsto no art. 55 da Lei n. 9.605/98, em razão da prescrição da pretensão punitiva pela pena máxima em abstrato, e pugnou pelo reconhecimento de excesso de acusação (ID 2133306657). O MPF apresentou manifestação no ID 2130301003, na qual aquiesceu com o reconhecimento da prescrição e pugnou pela rejeição dos demais pedidos. Por meio da decisão 2148982545, foi reconhecida a prescrição em relação ao crime tipificado no art. 55, da Lei 9.605/98 e determinado o prosseguimento do feito quanto ao crime remanescente. As testemunhas foram ouvidas nas audiências realizadas no ID 2159665942 e 2171532293, bem como foi realizado o interrogatório do réu. A defesa apresentou novas provas no evento 2173837872. O Ministério Público Federal apresentou alegações finais no evento 2175393611 e a defesa no evento 2177047604. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Reconheço presentes os pressupostos processuais e as condições da ação penal, razão pela qual passo ao exame do mérito. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra Edson Feitosa Diniz em razão da suposta praticado delito tipificado no artigo 2º da Lei 8.176/91, a seguir reproduzido: Art. 2° Constitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpacão, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo. Pena: detenção, de um a cinco anos e multa. Segundo a acusação, no dia 07/09/2019, o réu, de forma livre e consciente, executou a extração de recursos minerais e explorou matéria-prima pertencente à União, sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, no interior da Terra Indígena Kayabi, por meio de balsa de mergulho que navegava no Rio Teles Pires, com mergulhadores e equipamentos de extração de minério (ouro). O Relatório de Fiscalização n. IIP480P, elaborado pelo ICMBIO, dá conta de que, no dia 02/09/2019, uma balsa de garimpo de mergulho, pertencente ao acusado, foi encontrada “subindo o Rio São Marcos 09°04'31" Sul e 57°03'39" Oeste, no trecho compreendido ou Teles Pires, nas coordenadas aproximadas entre a foz do Rio São Benedito e a cachoeira da Rasteira, controlado por índios da etnia Kayabi”. Vejam-se os detalhes da fiscalização no trecho a seguir: No dia 07 de setembro de 2019, visando impedir a atividade de garimpo ilegal, a degradação ambiental e a contaminação dos corpos hídricos, uma equipe de fiscalização do Ibama, composta por seis agentes do Grupo Especial de Fiscalização distribuídos em duas aeronaves, realizou ação fiscalizatória no âmbito da Operação Norte no interior da Terra Indígena Kayabi, localizada nos município de Apiacás/MT e Jacareacanga/PA. O alvo da ação fiscalizatória em questão foi identificado por intermédio de sobrevoo de reconhecimento, correspondendo a uma balsa de garimpo de mergulho, flagrada em atividade de fuga, subindo o Rio São Marcos 09°04'31" Sul e 57°03'39" Oeste, no trecho compreendido ou Teles Pires, nas coordenadas aproximadas entre a foz do Rio São Benedito e a cachoeira da Rasteira, controlado por índios da etnia Kayabi. Durante o sobrevoo do alvo de exploração mineral ilegal ficam nítidos os impactos adversos da atividade minerária em curso naquele trecho do rio, verificando-se a formação de extensa ilha de detritos, denominadas vulgarmente como ¿arrotos¿, assoreando o leito do curso d¿água e alterando sua vazão, além de visivelmente deteriorar a qualidade e características da água. Com objetivo de cessar imediatamente o dano ambiental em curso, a tripulação da aeronave sobrevoou a balsa em movimento e sinalizando para que desligassem os motores. A equipe encontrava-se na água, abordando outra balsa. Como verificaram que o IBAMA estava atuando na região, imediatamente empreenderam fuga, sem sequer recolher um dos mangotes, que seguia solto à popa, em direção à UHE São Marcos, provavelmente no intuito de sair da Terra Indígena, onde a atividade é sabidamente proibida. A equipe abordou a balsa através de uma canoa de alumínio que foi apreendida de uma balsa anterior, orientando os ocupantes a desligar os motores e realizar os demais procedimentos de praxe visando a segurança da equipe durante a abordagem. A equipe realizou a abordagem, constatando no local a presença de 4 pessoas, não indígenas, devidamente qualificadas conforme relatório fotográfico em anexo. A balsa apresentava uma placa indicando sua propriedade e, inclusive, a entidade à qual o responsável seria filiado, Cooperativa de Pequenos Mineradores de Ouro e Pedras Preciosas de Alta Floresta e outros Municípios ¿ COOPERALFA. Impende destacar que todos os abordados eram filiados a alguma entidade de classe ligada à atividade de mineração, três eram vinculados ao Sindicato das Indústrias Extrativas de Minérios do Estado de Mato Grosso ¿ SINDIMINÉRIO, na categoria de Garimpeiro Autônomo, um também vinculado à COOPERALFA além do SINDIMINÉRIO e outro à Associação Nacional do Ouro ¿ ANORO. Foi realizada a varredura do interior da balsa que, como já citado, encontrava-se em plena atividade de fuga na hora do sobrevoo. A balsa possuía estrutura simples, como é a característica geral das dragas de garimpo que utilizam o método de mergulho. Sua estrutura é toda feita em madeira, à exceção dos flutuantes metálicos. Não existem cômodos, apenas prateleiras onde ficam armazenados os mantimentos, equipamentos, combustível e objetos pessoais. A calha concentradora com carpetes em sua superfície ocupa praticamente metade do espaço disponível na balsa. Apesar do tamanho diminuto, a balsa necessita de grande quantidade de combustível (óleo diesel) para manter seu funcionamento. O mangote de sucção operado pelo mergulhador funciona através da ação de um motor estacionário e o ar comprimido do qual o mergulhador se utiliza para realização da atividade subaquática é fornecido por um compressor de ar. As balsas de mergulho oferecem enormes riscos operacionais em virtude da precariedade dos equipamentos, falta de equipamentos de salvatagem e primeiros socorros e uso indiscriminado de material combustível e tóxico (mercúrio). Também foi documentada a existência de cadinho, maçarico e bujão de gás utilizados na sublimação do mercúrio metálico, sem câmara de contenção dos vapores ou equipamentos de proteção individual, permitindo livremente a contaminação dos trabalhadores e meio ambiente. A fiscalização foi documentada e fotografada, conforme evento 1387515292 - Pág. 23 em diante, onde se vê a mapa de localização das coordenadas da balsa dentro da reserva indígena Kayabi, bem como foto da balsa n. 07, identificada com o nome do acusado Edson Feitosa Diniz, além de foto dos documentos e das pessoas encontradas na balsa. Everaldo Caetano, identificado como uma das pessoas que estava operando a balsa, declarou à Polícia Federal que o proprietário da balsa era Edson Feitora (1545992362 - Pág. 4). No mesmo sentido foram as declarações de Manoel Ceverino Cruz (1545992362 - Pág. 6) e de Francisco da Conceição (1545992362 - Pág. 8). Também foram ouvidas testemunhas em juízo. Em seu depoimento, o agente ambiental Felipe Augusto Finger, servidor do IBAMA, relatou que participou de operação fiscalizatória realizada em 17 de setembro de 2019, na região da Terra Indígena Kayabi, especificamente no leito do Rio Teles Pires. Segundo o depoente, a equipe identificou diversas balsas em funcionamento voltadas à prática de garimpo ilegal. Uma dessas embarcações, conforme afirmou, foi abordada pelos fiscais e identificada como pertencente ao réu, Edson Feitosa Diniz. A testemunha Felipe Augusto destacou que a abordagem ocorreu após a constatação de que a balsa estava em movimento, tentando se deslocar para fora da área indígena. Essa movimentação, conforme explicou, é comum em ações fiscalizatórias, pois os operadores de garimpo buscam fugir do flagrante e se refugiar entre os limites da terra indígena e a usina hidrelétrica São Manuel. O servidor confirmou que a operação foi realizada com o uso de duas ou três aeronaves, e que participou diretamente da ação, sobrevoando o local dos fatos. O depoente também informou que a balsa possuía os equipamentos típicos de garimpo com mergulhadores, como carpetes e caixa concentradora. Foram encontrados, inclusive, dispositivos específicos para a queima da amálgama, como retorta ou cadinho, o que indicaria o uso de mercúrio na separação do ouro. Embora não se recordasse com precisão se havia mercúrio no momento da apreensão, afirmou que a presença dos equipamentos evidencia a prática da atividade mineradora. Indagado acerca da eventual existência de licença, afirmou não se lembrar se foi apresentada pelos tripulantes. No entanto, ressaltou que a embarcação estava identificada como pertencente à cooperativa Cooperalpha, sediada em Alta Floresta, o que poderia indicar a existência de alguma autorização. Ainda assim, Felipe esclareceu que a exploração mineral em terras indígenas está sujeita à autorização do Congresso Nacional, e que a atividade flagrada era incompatível com os requisitos legais exigidos para licenciamento ambiental. Por sua vez, a testemunha Denilson Mateus Gomes Dias afirmou que foi contratado pelo réu para prestar serviço de transporte da balsa, em regime de diária. Declarou que não integrava a equipe de mergulhadores nem exercia funções diretamente ligadas à mineração, estando presente apenas para ajudar a mover a embarcação de um ponto a outro. Segundo Denilson, o grupo se encontrava parado quando Edson os chamou para ajudar a levar a balsa até o porto, a fim de que pudesse ser realocada em outro local. Afirmou que, no momento da abordagem, não estavam minerando, apenas conduzindo a embarcação. Narrou que a ação do IBAMA foi realizada por dois helicópteros, cujos agentes ordenaram que os ocupantes se afastassem para o mato, recolheram seus documentos e posteriormente destruíram a balsa. Disse que os agentes não realizaram qualquer pergunta sobre licenças ou documentação e que, após os acontecimentos, retornou às suas atividades habituais. Em seguida, foi colhido o depoimento de Manoel Severino Cruz, o qual informou que estava a caminho de buscar a referida balsa a pedido do réu, com o objetivo de empregá-la em nova atividade de garimpo. Declarou que ainda não havia iniciado qualquer operação na balsa e que esta se encontrava parada quando foi interceptada. Manoel afirmou que seu trabalho era remunerado em regime de divisão percentual, combinando 40% do produto da lavra entre os quatro trabalhadores embarcados. Questionado, declarou que o plano era levar a balsa para a localidade conhecida como "boca do São Benedito", situada, segundo ele, fora dos limites da Terra Indígena Kayabi. Contudo, reconheceu não saber com precisão os marcos geográficos da região. Ao ser indagado sobre o motivo de a balsa estar dentro da terra indígena no momento em que foi chamado para ajudar, Manoel disse não saber, relatando apenas que, ao chegar ao local, a embarcação já se encontrava ali. Por fim, relatou que, em sua compreensão, o trecho do Rio Teles Pires em que pretendiam trabalhar seria área de uso federal, não necessariamente dentro de terra indígena, mas reconheceu não ter certeza quanto a essa delimitação territorial. Já o servidor do IBAMA, Alexandre Marques, iniciou relatando que a operação fiscalizatória ocorrida em 7 de setembro de 2019 teve como foco o combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena Kayabi e em outras áreas da União situadas ao longo da BR-163. Destacou que o local apresenta um mosaico de áreas prioritárias para fiscalização ambiental, incluindo unidades de conservação e terras indígenas. A operação, segundo Alexandre, teve como objetivo a abordagem de balsas de garimpo ilegais que atuavam no leito do rio São Manuel (Teles Pires), local onde há recorrência de denúncias de exploração mineral irregular, com impactos negativos para o meio ambiente e para as comunidades indígenas, como contaminação por mercúrio e deterioração da qualidade da água. Relatou que, no momento da abordagem, a balsa já se encontrava em movimento, deslocando-se no sentido de saída da Terra Indígena, subindo o rio em direção à usina. Informou que a operação contou com apoio de aeronaves e que foi dado comando de parada à embarcação. Houve, inicialmente, hesitação por parte dos ocupantes, mas, posteriormente, a balsa encostou. Alexandre relatou que o mangote de sucção, instrumento utilizado para dragar o fundo do rio, estava solto na popa da balsa, o que indicava que a estrutura estava em plena atividade de garimpo. A equipe conseguiu acessar a embarcação com uma lancha de alumínio, e constatou tratar-se de uma balsa rudimentar, do tipo mergulho, equipada com compressor e carpetes para separação do ouro, em condições precárias para os trabalhadores. Foi observado, ainda, o uso de cadinho para incineração do ouro amalgamado com mercúrio, sem qualquer capela de contenção, expondo os operadores ao risco de contaminação. Alexandre afirmou que o réu, Edson Feitosa, não estava presente no momento da abordagem, mas que havia vínculo entre ele e a embarcação, conforme identificado por uma placa da cooperativa de Alta Floresta afixada na balsa e por informações prestadas pelos ocupantes. Diante da inviabilidade logística de remoção da estrutura e visando à cessação do dano ambiental, a balsa foi inutilizada no próprio local, conforme previsto no artigo 111 do Decreto 6.514/2008. Destacou que havia registro fotográfico da embarcação e que as coordenadas geográficas comprovam que a abordagem se deu no interior da Terra Indígena Kayabi, ainda que próxima do limite sul. Acrescentou que, pelas características da balsa e pelos indícios encontrados – como carpetes úmidos, mangote solto e fuga apressada –, restava evidente que a embarcação estava em plena operação. Questionado sobre a possibilidade de desconhecimento quanto aos limites da Terra Indígena, afirmou que a região é amplamente conhecida, com demarcação desde 2002, e que, geralmente, há placas da FUNAI indicativas nas margens. Negou que os ocupantes da balsa tenham apresentado qualquer tipo de licença ambiental, tampouco documento de lavra garimpeira. Informou que todos foram qualificados, tiveram seus documentos fotografados e devolvidos, não houve resistência à abordagem, nem necessidade de uso de algemas. A inutilização da balsa foi realizada no local, e os trabalhadores foram deixados em segurança à margem do rio, em região de fácil acesso e tráfego fluvial intenso. Por sua vez, o réu Edson Feitosa declarou que sua balsa estava localizada acima da foz do rio São Benedito, fora dos limites da Terra Indígena, e que possuía documentação válida até dezembro de 2019, incluindo autorização da Marinha para tráfego fluvial. Alegou que a fiscalização não conferiu a documentação e que os fiscais agiram de forma truculenta, queimando a balsa, os pertences dos trabalhadores e os deixando somente com a roupa do corpo e os documentos. Contestou a localização apontada pela equipe do IBAMA, sustentando que o local da abordagem estava a aproximadamente 25 a 30 km do início da Terra Indígena, e sugeriu a possibilidade de erro nas coordenadas geográficas registradas pelas aeronaves. Edson afirmou ser filiado à cooperativa, assim como os mergulhadores que trabalhavam com ele, e explicou que o regime de trabalho previa divisão de lucros, com 45% para os trabalhadores. A amalgamação do ouro, segundo ele, não era feita na balsa, mas sim na sede da cooperativa, localizada em Alta Floresta, onde há estrutura adequada para esse fim. Disse possuir documentos e registros da entrega de ouro para fins de amalgamação, devidamente comunicados ao órgão competente. Informou que os mergulhadores estavam apenas levando o equipamento para o ponto de lavra autorizado, localizado próximo à barragem São Manuel, e que a embarcação estava amarrada na margem do rio para proteção contra temporais, prática comum na região. Veja-se que, não obstante os trabalhadores que estavam na balsa tenham tentado descaracterizar que já estavam no local de lavra no momento da fiscalização, o depoimento de Alexandre Marques confirma que a balsa estava em operação, pois, conforme dito por ele, “o mangote de sucção, instrumento utilizado para dragar o fundo do rio, estava solto na popa da balsa, o que indicava que a estrutura estava em plena atividade de garimpo.” O relatório de fiscalização também confirma que havia atividade garimpeira contemporânea à abordagem do ICMBIO, conforme trecho a seguir: “Durante o sobrevoo do alvo de exploração mineral ilegal ficam nítidos os impactos adversos da atividade minerária em curso naquele trecho do rio, verificando-se a formação de extensa ilha de detritos, denominadas vulgarmente como ¿arrotos¿, assoreando o leito do curso d¿água e alterando sua vazão, além de visivelmente deteriorar a qualidade e características da água.” Quanto às coordenadas geográficas, extrai-se que elas foram identificadas na abordagem da balsa, durante a atividade de fuga na subida do Rio São Marcos (1387515292 - Pág. 8). As fotos juntadas no evento 1387515292 - Pág. 23 demonstram que a abordagem foi feita in loco, de modo que não se justifica a tese de que as coordenadas foram marcadas em sobrevoo. E a localização estava inserida na terra indígena Kayabi, conforme mapa juntado no evento 1387515292 - Pág. 23, não havendo dúvida a esse respeito. Saliente-se que, ainda que a balsa não estivesse exatamente em área indígena, é fato que a cooperativa da qual o acusado era parte não possuía autorização nem para pesquisa nem para lavra garimpeira, conforme comprovado pela própria defesa. Conquanto o crime ambiental não esteja mais em questionamento, observa-se que as licenças ambientais apresentadas pela defesa não cobrem a da data da fiscalização (2173845837 e 2173845240) e, o mais importante, não há autorização da ANM para lavra garimpeira, já que o documento juntado no evento 2173859439 é apenas um requerimento, sem indicativo da existência de título autorizativo. Em conclusão, verifico a presença de todos os elementos do tipo do artigo 2º da Lei n. 8.176/91, estando configurada a materialidade do delito. Além da materialidade, também está comprovada a autoria, conforme provas já citadas acima, que indicam o acusado como proprietário da balsa, fato que não foi negado por ele em seu interrogatório. Além de configurada a tipicidade, verifico também inexistir qualquer causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade. 3. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA Com relação à individualização da pena, destaque-se que a pena privativa de liberdade obedece ao sistema trifásico, critério este adotado pelo Código Penal, no art. 68, cuja pena base será fixada atendendo-se ao critério estabelecido no art. 59 do Código Penal; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e aumento. Por sua vez, a fixação da pena de multa obedece ao sistema bifásico, conforme preconizam os arts. 49 e 60 do Código Penal, sendo que o juiz deverá inicialmente quantificar os dias-multa, conforme o grau de culpabilidade do réu, e, posteriormente, atentando à situação econômica do réu, estabelecer o valor do dia-multa. Quanto ao valor do dia-multa, o artigo §3º, artigo 2º, Lei n. 8.176/91, estabelece que "o dia-multa será fixado pelo juiz em valor não inferior a quatorze nem superior a duzentos Bônus do Tesouro Nacional (BTN)". Considerando-se que o BTN foi extinto, adoto o entendimento esposado pelo Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual, diante da revogação da regra específica sobre o valor da multa, deve ser aplicada a regra geral prevista no artigo 40, §1º, do Código Penal. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 8º DA LEI Nº 8.137/90. OCORRÊNCIA. PENA PECUNIÁRIA. EXTINÇÃO DO ÍNDICE BTN. ART. 49, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. MULTA. ADEQUAÇÃO LEGAL. RESTABELECIMENTO DA MULTA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O entendimento deste Tribunal Superior é no sentido de que a extinção da BTN, a que faz referência o artigo 8º, parágrafo único, da Lei n° 8.137/90, não conduz à inaplicabilidade da pena de multa, pois tratando-se dos crimes contra a ordem tributária, aplica-se, subsidiariamente, a regra geral contida no artigo 49, § 1º do Código Penal. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1531334/DF, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 01/10/2015, DJe 23/10/2015) Aplicação da pena-base (1ª fase): passo a analisar as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal: a) O grau de culpabilidade é normal, sendo que o réu tinha consciência da conduta criminosa que realizou. b) No que se refere aos antecedentes, o réu não tem registros de ações penais anteriores. c) Quanto à conduta social, não consta dos autos nenhum fato que desabone a conduta do réu no meio social em que convive. d) Com relação à personalidade, não há nos autos elementos capazes de concluir pela personalidade violenta ou voltada para a prática do crime por parte do réu. e) Quanto aos motivos do crime, entendo que são aqueles inerentes ao próprio crime cometido. f) A análise das circunstâncias do crime, por sua vez, não indica nenhum elemento capaz de aumentar ou diminuir a pena. g) Com relação às consequências do crime, são elas inerentes ao delito. Com estas considerações, não havendo circunstâncias judiciais desfavoráveis, e considerando que, nos termos do art. 59 do Código Penal, a pena será fixada “conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”, fixo a pena-base do réu em 1 (um) anos de detenção e na pena de multa de 10 dias-multa. Circunstâncias legais – Agravantes e atenuantes (2ª Fase): não há agravantes ou atenuantes. Causas de aumento e de diminuição da pena (3ª fase): não há causas de aumento ou diminuição da pena incidentes no caso sob análise. Diante da fundamentação exposta, aplicando-se as três fases do processo de individualização da pena, torno-a DEFINITIVA para condenar o réu ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 1 (um) anos de detenção e na pena de multa de 10 dias-multa. Não havendo maiores informações quanto às condições socioeconômicas do réu, fixo o valor do dia-multa, considerando o disposto no artigo 49, parágrafo 1º do Código Penal, em 1 (um) do salário-mínimo vigente à época dos fatos (2019), que deverá ser atualizado por ocasião do pagamento. 4. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Considerando que o somatório das penas é inferior a quatro anos, com fundamento no art. 33, § 2º, c, do Código Penal, o regime inicial de cumprimento da pena será o aberto. 5. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS Verifico que o réu preenche os requisitos do art. 44 do CP, fazendo jus à substituição. A pena privativa de liberdade é inferior a quatro anos, o réu não é reincidente, e as circunstâncias do crime e as condições do réu indicam a suficiência da cominação de pena não privativa de liberdade. Assim, em atenção ao art. 44, § 2º (segunda parte), do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas no total de 365 horas de tarefa, nos termos do artigo 46, §§ 3º e 4º do Código Penal. 6. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA Incabível em razão da substituição da pena por restritiva de direitos (art. 77, inciso III, do Código Penal). 7. APELO EM LIBERDADE O réu respondeu ao processo em liberdade. Além disso, não há indícios de que, solto, voltaria a delinquir. Por fim, não há sentido em se pretender a prisão do réu quando a própria sentença fixa como regime inicial para cumprimento de pena o aberto. 8. VALOR MÍNIMO DA REPARAÇÃO DE DANOS Nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, deve o juiz fixar, por ocasião da sentença, o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. Não obstante o Ministério Público Federal tenha pedido a fixação de valor, não foi apresentado laudo ou outro documento que alicerce seu pedido e que permita a análise judicial com mínima segurança, razão pela qual deixo de fixar o valor mínimo para reparação de danos. 10. DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA DENÚNCIA, e acolho a pretensão punitiva do Estado deduzida em face de EDSON FEITOSA DINIZ, brasileiro, filho de Ruth Benetatti Diniz, nascido aos 06.07.1958, portador da célula de identidade nº 877268 inscrito sob o CPF de 329.379.629-04, residente na Rua D4, nº 421, Setor D, Alta Floresta/MT,, CONDENANDO-O como incurso no crime previsto no art. 2º da Lei 8.176/91, com aplicação da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de detenção, em regime aberto, e da pena de multa de 10 dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário-mínimo vigente em 2019, época dos fatos. 11. DISPOSIÇÕES GERAIS Após o trânsito em julgado da presente sentença, determino: a) a inclusão do nome do réu no rol dos culpados (art. 393, II, do Código de Processo Penal); b) a expedição de boletim de decisão judicial, bem como a expedição de ofício ao Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Mato Grosso (TRE/MT), para os fins do art. 15, III, da Constituição Federal da República; c) baixa na distribuição, remetendo-se os autos ao Setor competente para autuar o feito como Execução Penal. Eventuais custas processuais devidas pelo réu, a serem calculadas em conformidade com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal (Resolução n.º 242/01 do Conselho da Justiça Federal). Intime-se. Datado e assinado eletronicamente. JUIZ FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DA SSJ DE SINOP
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