Processo nº 1001434-61.2022.4.01.3301
ID: 309628860
Tribunal: TRF1
Órgão: Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jequié-BA
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 1001434-61.2022.4.01.3301
Data de Disponibilização:
27/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Jequié-BA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jequié-BA SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1001434-61.2022.4.01.3301 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIM…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Jequié-BA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jequié-BA SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1001434-61.2022.4.01.3301 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:JOAO JORGE MATOS SOUZA SENTENÇA I – RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia (ID 1389055770) contra JOAO JORGE MATOS SOUZA, qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 334-A, § 1º, inciso I, do Código Penal, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68. A peça acusatória tem por base os elementos informativos colhidos no Inquérito Policial nº 2022.0016960 - DPF/ILS/BA (distribuído inicialmente sob o nº 1001434-61.2022.4.01.3301 na Subseção Judiciária de Ilhéus-BA e posteriormente redistribuído para esta Subseção Judiciária de Jequié-BA). Narra a peça acusatória que, no dia 16 de março de 2017, no Município de Jequié/BA, o denunciado JOAO JORGE MATOS SOUZA, de forma livre e consciente, importou e manteve em depósito, em sua residência, mercadoria proibida, a saber, 630 (seiscentos e trinta) maços de cigarros da marca GUDANG, de origem estrangeira e comercialização não permitida no Brasil. Consta que, na referida data, durante a deflagração da "Operação Solana", agentes da Polícia Federal, em cumprimento a mandado de busca e apreensão expedido nos autos nº 4247-88.2016.4.01.3301 (da Vara Federal de Ilhéus/BA), diligenciaram até a residência do denunciado, localizada na Rua Itajuru, nº 255, Bairro Joaquim Romão, Jequié/BA. No local, foram apreendidos os referidos maços de cigarro. A denúncia foi recebida em 12 de janeiro de 2023 (ID 1450276858). O réu foi regularmente citado (Certidão de Oficial de Justiça ID 1521408383). Diante da informação de que o réu não possuía recursos para constituir advogado, foi nomeado defensor dativo (ID 1578183850), que apresentou resposta à acusação (ID 1588194885 e ID 1588194886), arguindo, em síntese, ausência de interesse de agir, falta de justa causa e atipicidade da conduta em razão do princípio da insignificância. Em decisão de ID 1609901381, foi ratificado o recebimento da denúncia, por não se vislumbrar nenhuma das hipóteses de absolvição sumária previstas no artigo 397 do Código de Processo Penal. Durante a instrução processual, foi realizada audiência em 21 de novembro de 2023 (ata ID 1923192146 e gravação audiovisual ID 1923192160), na qual foram ouvidas as testemunhas de acusação, os Policiais Federais Rômulo Sossai Berger e Gabriel Coelho de Sousa Costa, e procedeu-se ao interrogatório do réu JOAO JORGE MATOS SOUZA. Na ocasião, as partes não requereram diligências complementares na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal. Foram juntadas aos autos as certidões de antecedentes criminais do réu (ID 1960005148). O Ministério Público Federal, em suas alegações finais (ID 1937681148), pugnou pela condenação do réu nos termos da denúncia, sustentando a comprovação da materialidade e da autoria delitivas, bem como do dolo. A Defesa, por sua vez, em alegações finais por memoriais (ID 1949213152), pleiteou a absolvição do acusado por ausência de provas suficientes para a condenação, nos termos do artigo 386, incisos V e VII, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, em caso de condenação, requereu a fixação da pena-base no mínimo legal, com o reconhecimento de circunstâncias judiciais favoráveis. É o relatório. Passo a decidir. II – FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação penal pública incondicionada, por meio da qual o Ministério Público Federal imputa a JOAO JORGE MATOS SOUZA a prática do crime de contrabando, previsto no artigo 334-A, § 1º, inciso I, do Código Penal, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68. O feito tramitou regularmente, tendo sido assegurados ao acusado os princípios do contraditório e da ampla defesa. Passo à análise das questões processuais pendentes e, em seguida, ao exame do mérito da causa. II.1 - DAS QUESTÕES PRELIMINARES A Defesa, em sede de resposta à acusação (ID 1588194886), arguiu a ausência de interesse de agir e a falta de justa causa, com fundamento na atipicidade da conduta pela aplicação do princípio da insignificância. Embora não reiteradas expressamente como preliminares em alegações finais, mas sim como tese de mérito para absolvição, a natureza da matéria impõe sua análise prioritária. II.1.1 - Da Alegada Atipicidade da Conduta pelo Princípio da Insignificância Sustenta a Defesa, em sua resposta à acusação, a atipicidade material da conduta imputada ao réu, em razão da aplicação do princípio da insignificância, considerando o valor dos tributos supostamente iludidos (R$ 2.559,38) e a quantidade de cigarros apreendidos (630 maços). O princípio da insignificância, ou bagatela, tem sido reconhecido pela jurisprudência como causa supralegal de exclusão da tipicidade material, aplicável quando a lesão ao bem jurídico tutelado é ínfima, a ponto de não justificar a movimentação da máquina estatal penal. Para sua incidência, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu a necessidade de observância de quatro vetores cumulativos: (a) mínima ofensividade da conduta do agente; (b) nenhuma periculosidade social da ação; (c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC 84.412/SP, Rel. Min. Celso de Mello). No que tange especificamente ao crime de contrabando de cigarros, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial repetitivo (Tema 1143), firmou a seguinte tese no julgamento do REsp 1.971.993/SP: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. CONTRABANDO DE CIGARROS. SAÚDE PÚBLICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA . APLICABILIDADE RESTRITA (APREENSÃO DE ATÉ 1.000 MAÇOS), SALVO REITERAÇÃO. DIMINUTA REPROVABILIDADE DA CONDUTA E NECESSIDADE DE SE CONFERIR PRIMAZIA À REPRESSÃO AO CONTRABANDO DE VULTO. MODULAÇÃO DE EFEITOS . NOVEL ORIENTAÇÃO APLICÁVEL AOS FEITOS AINDA EM CURSO QUANDO DO ENCERRAMENTO DO JULGAMENTO. 1. O crime de contrabando de cigarros tutela, entre outros bens jurídicos, a saúde pública, circunstância apta a não recomendar a aplicação do princípio da insignificância. 2 . Obstar a aplicação do princípio da insignificância para todos os casos, notadamente para aqueles em que verificada a apreensão de quantidade de até 1.000 (mil) maços, é uma medida ineficaz à luz dos dados estatísticos apresentados, além do que não é razoável do ponto de vista de política criminal e de gestão de recursos dos entes estatais encarregados da persecução penal, razão pela qual se revela adequado admitir a incidência do princípio em comento para essa hipótese - apreensão de até 1.000 (mil) maços -, salvo reiteração da conduta, circunstância que, caso verificada, é apta a afastar a atipicidade material, ante a maior reprovabilidade da conduta e periculosidade social da ação. 3 . Modulado os efeitos do julgado, de modo que a tese deve ser aplicada apenas aos feitos ainda em curso na data em que encerrado o julgamento, sendo inaplicáveis aos processos com trânsito em julgado, notadamente considerando os fundamentos que justificaram a alteração jurisprudencial no caso e a impossibilidade de rescisão de coisa julgada calcada em mera modificação de orientação jurisprudencial. 4. Recurso especial desprovido. Acolhida a seguinte tese: O princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1 .000 (mil) maços, seja pela diminuta reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão ao contrabando de vulto, excetuada a hipótese de reiteração da conduta, circunstância apta a indicar maior reprovabilidade e periculosidade social da ação. (STJ - REsp: 1971993 SP 2021/0371977-2, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 13/09/2023, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 19/09/2023. Desse precedente vinculante, O STJ fixou a seguinte TESE: "O princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1.000 (mil) maços, seja pela diminuta reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão ao contrabando de vulto, excetuada a hipótese de reiteração da conduta, circunstância apta a indicar maior reprovabilidade e periculosidade social da ação". Extrai-se, da construção jurisprudencial firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, a consolidação de entendimento no sentido de que, em regra, admite-se a incidência do princípio da insignificância nos delitos de contrabando, quando a quantidade de cigarros apreendida não excede o limite quantitativo de 1.000 (mil) maços, haja vista a avaliação de que, nessa hipótese, a lesão ao bem jurídico tutelado revelar-se-ia, em tese, de reduzida significância, não justificando a atuação do jus puniendi estatal. Entretanto, ressalvou expressamente a Corte Superior, como causa impeditiva à aplicação do princípio da insignificância, a reiteração da conduta delitiva pelo agente, reconhecendo que a reiteração/habitualidade na prática criminosa invalida os vetores da mínima ofensividade e da ausência de periculosidade social da ação, os quais são imprescindíveis à incidência da excludente de tipicidade material. No caso, o Ministério Público Federal, em suas alegações finais (ID 1937681148, p. 5-6), destacou que o réu JOAO JORGE MATOS SOUZA responde a outra Ação Penal (nº 0005146-31.2017.4.01.3308), também em trâmite nesta Subseção Judiciária de Jequié/BA, pela suposta prática do crime de contrabando de cigarros ocorrido em 08 de agosto de 2016, ou seja, anteriormente ao fato apurado nestes autos (16 de março de 2017). A certidão de antecedentes criminais expedida pela Justiça Federal (ID 1960005148, p. 3) corrobora inequivocamente a existência de dois processos criminais distintos, relacionado a mesma conduta delitiva (contrabando de cigarros) e em período temporal exíguo entre um e outro, o que afasta, de modo inequívoco, a ideia de um comportamento episódico ou isolado. A existência de outro processo criminal pela mesma espécie de delito - contrabando de cigarros - e em curto espaço de tempo entre si, ainda que sem trânsito em julgado, configura a reiteração da conduta mencionada no precedente do STJ como óbice à aplicação do princípio da insignificância. Não obstante inquéritos policiais, ações penais em trâmite e procedimentos administrativos fiscais não sejam aptos à configuração de maus antecedentes criminais - consoante preceitua a Súmula 444 do STJ - podem caracterizar a reiteração delitiva, inibindo a aplicação do princípio da insignificância. O fato de o réu, mesmo após ser alvo de uma investigação anterior por contrabando (referente aos fatos da Ação Penal nº 0005146-31.2017.4.01.3308), ter sido novamente flagrado na posse de cigarros contrabandeados, indica uma persistência na atividade delituosa que afasta a mínima ofensividade da conduta e o reduzido grau de reprovabilidade. A conduta do réu, portanto, não traduz a excepcionalidade que justifica o reconhecimento da insignificância, na medida em que a prática reiterada do mesmo ilícito penal sinaliza clara disposição volitiva em persistir na atividade criminosa, indiferente às sanções legais e às investigações em curso. Rejeito, pois, a tese de aplicação do princípio da insignificância e, por conseguinte, as preliminares de ausência de interesse de agir e falta de justa causa que nele se fundavam. Superada essa temática, passo ao exame em concreto da conduta imputada ao acusado. II.2 - DO MÉRITO A imputação que pesa sobre o acusado JOAO JORGE MATOS SOUZA é a de ter praticado o crime previsto no artigo 334-A, § 1º, inciso I, do Código Penal, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68, que assim dispõe: Código Penal: Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. § 1º Incorre na mesma pena quem: I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando; Decreto-Lei nº 399/68: Art 2º O Ministro da Fazenda estabelecerá medidas especiais de controle fiscal para o desembaraço aduaneiro, a circulação, a posse e o consumo de fumo, charuto, cigarrilha e cigarro de procedência estrangeira. Art 3º Ficam incursos nas penas previstas no artigo 334 do Código Penal os que, em infração às medidas a serem baixadas na forma do artigo anterior adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuírem ou consumirem qualquer dos produtos nele mencionados. Para a configuração do delito em tela, na modalidade "ter em depósito" ou "possuir" mercadoria proibida (cigarros de comercialização não permitida), exige-se a comprovação da materialidade (existência da mercadoria proibida) e da autoria (que o agente efetivamente tinha em depósito ou possuía a mercadoria), além do elemento subjetivo do tipo, o dolo, consistente na vontade livre e consciente de praticar a conduta, ciente da natureza proibida da mercadoria. II.2.1 - Da Materialidade Delitiva A materialidade do crime de contrabando encontra-se devidamente comprovada nos autos. O Auto Circunstanciado de Busca e Apreensão (ID 1263460285, fls. 3-8, referente ao IPL 0044/2016-4 DPF/ILS/BA, que originou a presente ação) e o Auto de Apreensão nº 61/2017-DPF/ILS/BA (mencionado no Relatório Final do Inquérito, ID 1201394755, p. 3, e detalhado na Representação Fiscal para Fins Penais) atestam a apreensão de 630 (seiscentos e trinta) maços de cigarros da marca "GUDANG GARAM PROFESSIONAL" na residência do acusado em 16 de março de 2017. A Representação Fiscal para Fins Penais nº 10508.720406/2017-10 (ID 1046948751, fls. 6-9) emitida pela Receita Federal do Brasil, informa que os cigarros apreendidos são de origem estrangeira e que "não há autorização para importação, tendo em vista não haver registro especial na Secretaria da Receita Federal". A mesma representação avaliou os cigarros apreendidos em R$ 3.150,00 (três mil, cento e cinquenta reais) e estimou os tributos devidos na importação em R$ 2.559,38 (dois mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e trinta e oito centavos). A natureza proibida da mercadoria (cigarros da marca GUDANG, sem autorização para comercialização no Brasil) é inconteste, configurando o objeto material do crime de contrabando. Dessa forma, não pairam dúvidas quanto à materialidade do delito. II.2.2 - Da Autoria e da Tipicidade Delitiva A autoria delitiva imputada a JOAO JORGE MATOS SOUZA também ficou demonstrada pelo conjunto probatório carreado aos autos. As testemunhas de acusação, Policiais Federais Rômulo Sossai Berger e Gabriel Coelho de Sousa Costa, ouvidos em juízo (ID 1923192160), confirmaram sua participação na diligência que resultou na apreensão dos cigarros na residência do acusado. O Delegado Rômulo Sossai Berger relatou que a equipe cumpriu mandado de busca e apreensão na residência do Sr. João Jorge, no âmbito da Operação Solana, e que foram recebidos pela filha do acusado, tendo sido encontrados os cigarros de origem estrangeira (Gudang Garam) e alguns documentos. O Escrivão Gabriel Coelho de Sousa Costa corroborou a narrativa, afirmando que a entrada na residência foi franqueada pela parente do alvo e que foram localizados os cigarros de origem estrangeira. O próprio acusado JOAO JORGE MATOS SOUZA, em seus depoimentos na fase policial (ID 1046948751, fls. 22-25, em 29/03/2017, e ID 1201353250, p. 4, em 08/06/2022), admitiu a propriedade dos 630 maços de cigarros apreendidos em sua residência, afirmando que os adquiriu de um indivíduo conhecido como "Antônio" que os trazia do Paraguai, e que pretendia revendê-los. Em seu interrogatório judicial (ID 1923192160), o réu confirmou que os cigarros apreendidos em sua residência eram seus e que estavam guardados em seu quarto. Alegou, contudo, que não sabia da origem paraguaia ou da proibição de comercialização, embora tenha mencionado que comprava de "Seu Antônio" que "trazia de lá pra cá de Conquista, do Paraguai" e que revendia os cigarros em mercados e bares em Jequié. Questionado pelo MPF se, ao comprar do Sr. Antônio, tinha consciência de que os cigarros vinham do Paraguai, respondeu negativamente, mas depois mencionou que o Gudang Garam "acho que nem paraguaio ele é... acho que é da Indonésia", demonstrando conhecimento sobre a origem estrangeira da mercadoria. Afirmou também não ter emitido notas fiscais para a comercialização. O dolo, no crime de contrabando, consiste na vontade livre e consciente de praticar uma das condutas descritas no tipo penal (no caso, ter em depósito ou possuir mercadoria proibida), com o conhecimento da natureza ilícita da mercadoria. As circunstâncias do caso evidenciam o dolo do acusado. A aquisição de grande quantidade de cigarros de marca estrangeira, sem documentação fiscal, de um fornecedor que os trazia do exterior (Paraguai ou Indonésia, conforme as próprias declarações do réu em diferentes momentos), para revenda, demonstra que JOAO JORGE MATOS SOUZA tinha plena ciência da irregularidade da mercadoria e da sua conduta. A alegação de desconhecimento da ilicitude ou da origem estrangeira não se sustenta diante do conjunto probatório, especialmente suas confissões extrajudiciais detalhadas e as contradições em seu interrogatório judicial. Ademais, o fato de o réu já ser investigado e processado por crime idêntico (Ação Penal nº 0005146-31.2017.4.01.3308), referente a fatos anteriores, reforça a tese de que ele tinha conhecimento da natureza ilícita de sua atividade e agia com dolo. Assim, tenho por comprovadas a autoria e o dolo na conduta do acusado JOAO JORGE MATOS SOUZA. Não foram apresentadas teses de desclassificação para outro tipo penal, nem arguidas causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade que encontrem respaldo nos autos. A conduta do réu amolda-se perfeitamente ao tipo penal do artigo 334-A, § 1º, inciso I, do Código Penal, c/c os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia para CONDENAR o réu JOAO JORGE MATOS SOUZA, já qualificado nos autos, como incurso nas sanções do artigo 334-A, § 1º, inciso I, do Código Penal, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68. Atenta às diretrizes dos artigos 59 e 68 do Código Penal, passo à dosimetria da pena. 1. Pena-base (Primeira Fase): a) Culpabilidade: Compreendida como o grau de censura que merece o fato praticado, à luz da personalidade do agente – deve ser considerada normal à espécie, uma vez que não há, nos autos, elementos que indiquem que a conduta do acusado deve sofrer reprovação além da própria ao tipo. b) Antecedentes: Conforme certidão de antecedentes criminais da Justiça Federal (ID 1960005148, p. 3), consta a Ação Penal nº 0005146-31.2017.4.01.3308, por fatos de 08/08/2016, em trâmite. Não havendo condenação transitada em julgado anterior aos fatos ora apurados (16/03/2017), o réu é tecnicamente primário. c) Conduta Social: Não há elementos nos autos que permitam uma valoração negativa de sua conduta social. d) Personalidade do Agente: Não há elementos técnicos nos autos (como laudo psicossocial) que permitam aferir, com segurança, traços negativos da personalidade do agente para fins de exasperação da pena-base, para além da própria conduta criminosa. e) Motivos do Crime: O lucro fácil é inerente ao tipo penal de contrabando, visando à obtenção de vantagem econômica com a comercialização de mercadoria proibida. f) Circunstâncias do Crime: São as corriqueiras para os crimes desta jaez. g) Consequências do Crime: A quantidade de mercadoria apreendida não é exorbitante, de modo que também não merecem incrementar a reprimenda, haja vista que não ultrapassaram a danosidade já considerada na previsão típica. h) Comportamento da Vítima: A vítima primária é a coletividade (União, no que tange à administração da saúde pública e à ordem econômica), não havendo que se falar em comportamento que tenha influenciado a prática delitiva. Considerando que todas as circunstâncias judiciais são favoráveis ou neutras, fixo a pena-base no mínimo legal, qual seja, 02 (dois) anos de reclusão. 2. Circunstâncias Atenuantes e Agravantes (Segunda Fase): Concorre a circunstância atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, inciso III, alínea "d", do Código Penal, uma vez que o réu, tanto em sede policial quanto em juízo, admitiu a propriedade dos cigarros apreendidos, ainda que tenha tentado minimizar sua responsabilidade quanto ao conhecimento da ilicitude. Não há circunstâncias agravantes a serem consideradas. Não obstante a presença de circunstância atenuante, em observância à Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça ("A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal"), mantenho a pena intermediária no patamar mínimo estabelecido na primeira fase, qual seja, 02 (dois) anos reclusão. 3. Causas de Diminuição e Aumento de Pena (Terceira Fase): Não há causas de diminuição ou de aumento de pena a serem aplicadas ao caso. 4. Pena Definitiva: Torno definitiva a pena em 02 (dois) anos de reclusão. 5. Regime Inicial de Cumprimento da Pena: Considerando o quantum da pena aplicada (02 anos), inferior a 04 anos, a primariedade técnica do réu e a análise das circunstâncias judiciais, fixo o regime inicial ABERTO para o cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea "c", e § 3º, do Código Penal. Não há detração a ser realizada nos presentes autos. 6. Substituição da Pena Privativa de Liberdade: Preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal (pena não superior a quatro anos, crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, réu tecnicamente primário e circunstâncias judiciais que indicam ser a substituição suficiente), SUBSTITUO a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, a serem definidas pelo Juízo da Execução, consistentes em: a) Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo prazo da pena substituída (artigo 46 do Código Penal); b) Prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário mínimo vigente à época do pagamento, a ser destinada a entidade pública ou privada com destinação social, a ser indicada pelo Juízo da Execução (artigo 45, § 1º, do Código Penal). Entendo que a prestação de serviços à comunidade é a pena alternativa que cumpre de forma mais eficaz o caráter pedagógico da repressão penal, pois requer do condenado um envolvimento pessoal e contínuo, convertendo seus esforços em utilidade para a sociedade. Do mesmo modo, a prestação pecuniária também se mostra adequada ao presente caso, pois proporciona uma compensação financeira ao ente prejudicado ou outros entes que promovam o interesse público. 7. Custas Processuais: Condeno o réu ao pagamento das custas processuais (art. 804 do CP). 8. Destinação dos Cigarros Apreendidos: Determino a destruição dos 630 (seiscentos e trinta) maços de cigarros apreendidos, caso ainda não tenha sido providenciada, oficiando-se à autoridade competente para as providências cabíveis, após o trânsito em julgado desta sentença. 9. Recurso em Liberdade: O réu tem direito de recorrer em liberdade, uma vez que permaneceu solto durante toda a instrução processual, não havendo, até o momento, qualquer fato novo apto a justificar a decretação da prisão preventiva. 10. Fixação de Indenização Mínima: Deixo de fixar o valor mínimo de indenização (art. 387, inciso IV, do CP), uma vez que não foi requerida pelo membro do Ministério Público Federal na exordial acusatória. 11. Honorários pela Defesa Dativa Arbitro os honorários do defensor dativo em R$ 781,93 (setecentos e oitenta e um reais e noventa e três centavos), a serem pagos na forma da Resolução n. 305/2014, do Conselho da Justiça Federal. Diligencie a Secretaria o pagamento. 12. Disposições Finais: Após o trânsito em julgado: a) Lance-se o nome do réu no rol dos culpados; b) Oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal; c) Expeça-se carta de guia para a execução definitiva da pena; d) Intime-se o réu para o pagamento das custas processuais; e) Quanto a destinação dos bens, cumpra-se conforme "item 8" desse dispositivo; f) Procedam-se às comunicações de praxe. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Jequié/BA, data do sistema. DIANDRA PIETRAROIA BONFANTE Juíza Federal Substituta
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