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Sionara Pereira
OAB/PR 17.118
SIONARA PEREIRA consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça como advogado.
ID: 318877587
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0001297-42.2013.4.01.4003
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Advogados:
FABLINE SIQUEIRA BATISTA
OAB/DF XXXXXX
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FERNANDA TORRES DE LIMA
OAB/DF XXXXXX
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CASSIA KELLY DOS SANTOS BARCELOS
OAB/DF XXXXXX
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FERNANDA PINHEIRO DO VALE LOPES
OAB/DF XXXXXX
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LISE REIS BATISTA DE ALBUQUERQUE
OAB/DF XXXXXX
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HERMAN TED BARBOSA
OAB/DF XXXXXX
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ALEXANDRE CERQUEIRA DA SILVA
OAB/PI XXXXXX
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JOSE ADAILTON ARAUJO LANDIM NETO
OAB/PI XXXXXX
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DANILO MENDES DE AMORIM
OAB/PI XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001297-42.2013.4.01.4003 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001297-42.2013.4.01.4003 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOAO DIAS RIBEIRO e …
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Processo nº 0001297-42.2013.4.01.4003
ID: 318877595
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0001297-42.2013.4.01.4003
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Advogados:
FABLINE SIQUEIRA BATISTA
OAB/DF XXXXXX
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FERNANDA TORRES DE LIMA
OAB/DF XXXXXX
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CASSIA KELLY DOS SANTOS BARCELOS
OAB/DF XXXXXX
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FERNANDA PINHEIRO DO VALE LOPES
OAB/DF XXXXXX
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LISE REIS BATISTA DE ALBUQUERQUE
OAB/DF XXXXXX
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HERMAN TED BARBOSA
OAB/DF XXXXXX
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ALEXANDRE CERQUEIRA DA SILVA
OAB/PI XXXXXX
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JOSE ADAILTON ARAUJO LANDIM NETO
OAB/PI XXXXXX
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DANILO MENDES DE AMORIM
OAB/PI XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001297-42.2013.4.01.4003 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001297-42.2013.4.01.4003 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOAO DIAS RIBEIRO e …
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001297-42.2013.4.01.4003 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001297-42.2013.4.01.4003 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOAO DIAS RIBEIRO e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: DANILO MENDES DE AMORIM - PI10849-A, JOSE ADAILTON ARAUJO LANDIM NETO - PI13752-A, ALEXANDRE CERQUEIRA DA SILVA - PI4865-A, HERMAN TED BARBOSA - DF10001-A, LISE REIS BATISTA DE ALBUQUERQUE - DF25998-A, FERNANDA PINHEIRO DO VALE LOPES - DF43909-A, CASSIA KELLY DOS SANTOS BARCELOS - DF44747, FERNANDA TORRES DE LIMA - DF73152 e FABLINE SIQUEIRA BATISTA - DF29372-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0001297-42.2013.4.01.4003 RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Trata-se de apelações interpostas pelos réus contra a sentença - proferida em ação de improbidade administrativa - que os condenou em sanções do artigo 12 da Lei 8.429/1992. A ré Tânia Mara de Souza Paes Lima alega, preliminarmente, a inépcia da inicial, pela não quantificação do dano ao erário. No mérito, sustenta que não há dolo de sua parte nem provas que justifiquem a condenação, insurgindo-se da mesma forma contra a não quantificação do dano, circunstância que, no seu entender, inviabiliza a aplicação das sanções de ressarcimento ao erário e de multa civil. O réu Humberto Ferreira Dias também suscita a preliminar de inépcia da inicial e pugna, no mérito, pela improcedência do pedido, ante a ausência de conduta ímproba a ele imputável. Requer, ainda, o afastamento ou redução da penalidade de suspensão dos direitos políticos, bem assim a diminuição do valor atinente à multa civil aplicada em seu desfavor. Insurge-se, por fim, contra a sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios e custas processuais. As rés Sileide Dias Ribeiro e Ismênia da Silva Dias da mesma forma levantam a preliminar de inépcia da inicial, aduzindo, no mérito, que não há dolo, culpa ou má-fé que justifiquem a sua condenação. Pleiteiam, ainda, o afastamento ou redução da penalidade de suspensão dos direitos políticos, bem assim a diminuição do valor atinente à multa civil aplicada em seu desfavor. Insurgem-se, por fim, contra a sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios e custas processuais. Os réus João Dias Ribeiro e Ivoneide Ribeiro Dias pugnam pela reforma da sentença, ante a inexistência de atos configuradores de improbidade administrativa que tenham sido praticados por eles. Requerem também que seja afastada a penalidade de perda da função pública aplicada contra o primeiro réu, com a exclusão da sanção de suspensão de direitos políticos ou a sua redução ao mínimo legal. Pleiteiam, ainda, a redução do valor da multa aplicada em seu desfavor. Pugna, por fim, pela exclusão da condenação ao pagamento de honorários e custas e pela concessão em seu favor da justiça gratuita. Com contrarrazões. O Ministério Público Federal, nesta instância, opina pelo parcial provimento das apelações, apenas para a exclusão da condenação em honorários advocatícios. É o relatório. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0001297-42.2013.4.01.4003 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Antes de mais nada, observo que não deve prosperar a preliminar de inépcia da inicial, considerando que as condutas atribuídas a cada um dos réus foram suficientemente descritas pelo Ministério Público, não havendo que se falar em prejuízo à sua defesa. Ademais disso, é de se registrar que o dano ao erário está devidamente quantificado, em valor correspondente ao das remunerações do cargo de professor recebidas pelos réus Tânia, Ivoneide e Humberto no período de 2009 a junho de 2010, devendo a liquidação dessa quantia ficar para fase de cumprimento da sentença condenatória, se for o caso. Em relação ao mérito da demanda, assim consigna o provimento de piso: II - FUNDAMENTAÇÃO A inicial imputa a TÂNIA MARIA DE SOUSA PAES LIMA, IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS a prática de atos de improbidade que importam enriquecimento ilícito, consubstanciados na percepção da remuneração de professor sem a correspondente prestação de serviços. Outrossim, a exordial afirma que JOÃO DIAS RIBEIRO, SILEIDE DIAS RIBEIRO, ISMÊNIA BERIAMINO DA SILVA DIAS, na qualidade de gestores, concorreram para o enriquecimento ilícito daqueles. A percepção de remuneração por TÂNIA MARIA DE SOUSA PAES LIMA, IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS, sem a correspondente prestação de serviços, restou devidamente comprovada nos autos. Constato inicialmente que, de fato, TÂNIA MARIA DE SOUSA PAES LIMA, IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS ocupavam cargo de docência no quadro de professores da Prefeitura de Várzea Branca/ PI no ano de 2009, conforme folha de pagamento de pessoal de abril/2009 de fls. 38/40. Em janeiro de 2009, IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS assumiram cargos de secretários municipais por nomeação do então prefeito JOÃO DIAS RIBEIRO, conforme portarias de fls. 30/31. Já TÂNIA MARA DE SOUSA PAES LIMA, não obstante o cargo de professora, matriculou-se em uma faculdade de Fisioterapia localizada em Floriano/PI ainda no primeiro semestre de 2009, conforme documento de fl. 34 c/c histórico escolar de fls. 163/167. A cópia das autorizações da Folha de Pagamento para crédito em conta corrente dos servidores da Prefeitura Municipal de Várzea Branca/PI fornecida pelo Banco do Brasil, juntamente com as Folhas de Pagamento do FFM, arroladas às fls. 52/152. revelam que os requeridos IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS continuavam percebendo regularmente a remuneração do cargo de professor, oriunda do FUNDEB. durante o ano de 2009 até meados de 2010 e que TÂNIA MARA DE SOUSA PAES LIMA recebeu durante todo o ano de 2009. Durante o período os requeridos IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS também recebiam a remuneração por ocuparem cargos de secretaria do município, conforme fls. 116/129,135/137. Não obstante o recebimento da verba do cargo de docência, os requeridos não lecionaram na rede municipal a partir de janeiro de 2009, o que foi por eles confessado perante a 3a Promotoria de Justiça de São Raimundo Nonato/PI e em juízo, conforme declarações de fls. 180/183 e 297/298. Cabem breves transcrições das declarações prestadas perante o Parquet estadual: IVONEIDE RIBEIRO DIAS: "que é professora concursada do município de Várzea Branca desde o ano de 2002; que é companheira do atual Prefeito Municipal de Várzea Branca-PI, SR. João Dias Ribeiro, mantendo com o mesmo união estável, que também é sua prime (sic), fato que explica a coincidência dos sobrenomes; que é Secretária Municipal de Assistência Social desde janeiro de 2009; que por conta de seu cargo atual encontra-se afastada das salas de aula desde janeiro de 2009; que não leciona desde então; que recebeu seu salário como Secretária Municipal de Assistência Social até meados de 2010, recebendo cumulativamente com o de professora da rede municipal de ensino até tal período; que recebia aproximadamente R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) como Secretária de Assistência Social e R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) como professora; que não sabia que era errado receber os dois vencimentos, mas na medida em que obteve tal informação em meados de 2010, procurou junto ao gestor municipal receber apenas o salário de professora." HUMBERTO FERREIRA DIAS: "que é professor concursado do município de Várzea Branca desde o ano de 1998; que perguntado se detém algum parentesco com o atual Prefeito municipal de Várzea Branca/Pi, Sr.João Dias Ribeiro, manteve-se calado; que é Secretário Municipal de Finanças de Várzea Branca desde janeiro de 2009; que por conta de seu cargo atual encontra-se afastado das salas de aula desde janeiro de 2009; que não leciona desde então, que seu salário como Secretário Municipal de Finanças é de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) que como professor recebe cerca de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais); que recebeu cumulativamente os dois salários ate o mês de junho de 2010; que desde então recebe somente o salário de professor; que deixou de receber os dois salários a partir do momento em que percebeu que estava errado; que pesquisou a legislação e descobriu que era errado receber os dois salários, por isso, a partir de julho de 2010, optou apenas por receber o salário de professor; [...]" TÂNIA MARA: "que cursa faculdade de Fisioterapia, no CEUT, em Teresina/PI; que iniciou o curso no início de 2009, estando atualmente no 6° período; que fez vestibular na faculdade. FAESF localizada em Floriano, onde Cursou o 1° período de Fisioterapia; que no segundo semestre de 2009 foi transferida para o CEUT, na capital; que foi professora concursada na rede municipal de ensino de Várzea Branca-PI; que não parente do atual Prefeito Municipal, não possuindo relevantes ligações políticas no município; que assumiu o cargo de professora no início de 2008; que naquele ano lecionou na escola da localidade Pau de Rato e em uma escola da sede, por breve período, substituindo uma colega; que no ano de 2009 a declarante não lecionou. uma vez que já cursava, a faculdade de Fisioterapia em Floriano/PI; que prestou vestibular no mês de fevereiro de 2009 e diante da inesperada aprovação, decidiu estudar, sendo impossível, em virtude da distância entre Várzea Branca e Floriano, conciliar a faculdade e o trabalho; que se mudou para Floriano/Pl no início do mês do março de 2009; que antes da mudança conversou com o atual Prefeito Municipal JOÃO DIAS RIBEIRO, para expor sua situação e lhe pedir uma ajuda, uma espécie de bolsa de estudos; que o Prefeito disse que, iria ver o que podia ser feito; que continuou recebendo seu salário de professora até o mês de dezembro de 2009; que acredita que os meses de salário que recebeu sem trabalhar se devem à ajuda dada pelo atual Prefeito Municipal; que o dinheiro entrava diretamente em conta bancária; que não chegou a pedir exoneração do cargo "que conversou sozinha com o Prefeito Municipal na casa do mesmo, pois o procurou um dia antes de viajar para Floriano; que mesmo com o seu salário mensalmente"sendo depositado em sua conta, acreditou que não havia nada de errado, pois pensou se tratar da bolsa de estudos que havia conversado com o Prefeito Municipal; que somente no dia de hoje tem conhecimento que não se tratava de bolsa de estudos, não sabendo afirmar se o referido pagamento que lhe foi feito é indevido; que por tal razão não procurou ressarcir o erário. Em juízo/ os réus corroboraram os depoimentos tecidos na fase investigatória. TÂNIA, IVONEIDE E HUMBERTO reconheceram que não lecionaram no período de 2009, em relação à primeira ré, e de 2009 até meados de 2010, para os dois últimos, mesmo recebendo a correspondente remuneração. Os demais réus-gestores também reconheceram em juízo que estavam cientes dos pagamentos indevidos, conforme será analisado a seguir, no tópico atinente ao elemento subjetivo. No caso, consoante apurado acima pelo Ministério Público, TÂNIA MARIA DE SOUSA PAES LIMA, IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS, auferiram vantagem patrimonial indevida em razão de cargo, enriquecendo-se ilicitamente. Incorreram, desse modo, no disposto no art. 9° da Lei n° 8.429/92, assim redigido: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: Noutro giro, os gestores JOÃO DIAS RIBEIRO, SILEIDE DIAS RIBEIRO, ISMÊNIA BERIAMINO DA SILVA DIAS concorreram com o enriquecimento ilícito e causaram lesão ao erário, atraindo a incidência do art. 10, caput, incisos I, XI e XII, a seguir transcritos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1° desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao património particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei; XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Registro que o prejuízo ao erário é patente, dado o pagamento da remuneração sem a correspondente prestação de serviços. Registre-se que as justificativas apresentadas pelos requeridos não são suficientes para afastar a ilegalidade apontada, o que será analisado no tópico que segue. II.1 - Do elemento subjetivo Conforme reiterada jurisprudência do STJ "a improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente, sendo indispensável à sua caracterização a existência de dolo para as condutas descritas nos artigos 9° e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos de culpa grave nas do artigo 10" (STJ, Corte Especial, AIA 30/AM, Rei. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 28.09.2011; STJ, 2a Turma, AgRg no REsp 1.397.590, Rei. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJe 05.03.2015). Em juízo, TÂNIA, IVONEIDE E HUMBERTO reconheceram que não lecionaram no período de 2009, em relação à primeira ré, e de 2009 até meados de 2010, para os dois últimos, mesmo recebendo a correspondente remuneração. A tese de TÂNIA MARA de que "pensava que se tratava de uma bolsa de estudos" é deveras inverossímil: ora, não houve qualquer pedido de exoneração do cargo ou de bolsa de estudos. A ré demonstrou ter consciência de que se tratava mesmo de algo escuso, pois foi a um encontro informal com o gestor municipal para pedir uma "ajuda", uma "espécie de bolsa de estudos", fora das instalações oficiais, tendo pleno conhecimento que tal pedido não tinha qualquer embasamento legal. JOÃO DIAS RIBEIRO estava ciente do enriquecimento ilícito dos réus TÂNIA MARIA DE SOUSA PAES LIMA, IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS, porquanto foi comunicada pela própria Tânia de seu afastamento, conforme depoimento desta, afora o seu parentesco com IVONEIDE RIBEIRO DIAS, sua companheira, e com HUMBERTO FERREIRA DIAS, seu tio. O dado reforça o caráter gracioso da remuneração, bem como afasta o propalado desconhecimento das irregularidades pela descentralização administrativa. JOÃO DIAS chegou a reconhecer em juízo que os réus IVONEIDE E HUMBERTO não restaram aulas no período que exerciam o mister de secretários municipais, e, ao ser indagado sobre TÂNIA, afirmou que "em 2009 ela foi estudar em Floriano e a gente achava que era legal ela poder estudar, mas quando a gente teve conhecimento foi retirada". Ou seja, tinha pleno conhecimento que os três professores não estavam lecionando aula enquanto percebiam o pagamento do FUNDEB. SILEIDE DIAS RIBEIRO e ISMÊNIA BERLARMINO DA SILVA DIAS também não afastaram a presença do elemento subjetivo: agiam na condição de gestoras da Pasta da Educação do Município de Várzea Branca/PI, como secretárias de educação (fl. 356 e fls. 368/368v). Em juízo, SILEIDE afirmou em juízo que os docentes estavam sendo pagos, ao tempo em que os réus IVONEIDE e HUMBERTO ficavam só na função de secretários. ISMÊNIA também afirmou em juízo que os docentes estavam sendo pagos, ao tempo em que os réus IVONEIDE e HUMBERTO ficavam só na função de secretários. Em juízo, ambas reconheceram o pagamento das remunerações sem a prestação do serviço, com a escusa de que ao tomarem conhecimento pela assessoria jurídica do município, cessaram o pagamento cumulativo (de secretário e professor). Ora, não se exige um menor conhecimento técnico para se concluir ser ilegal/antijurídico o percebimento de verba sem qualquer contraprestação, ainda mais quando se trata de gestores públicos. IVONEIDE confirmou em juízo que percebia a remuneração de professor sem lecionar, pois exercia apenas a função de secretária de assistência social, pois não sabia que seria "errado". HUMBERTO também confessou que acumulou as remunerações de secretário e professor mesmo exercendo apenas a função do executivo, alegando desconhecimento acerca da ilegalidade. Na hipótese, tenho que ficou suficiente demonstrado que os requeridos agiram com dolo manifesto, porquanto não é crível que os réus desconhecessem o caráter antijurídico da percepção de remuneração sem a prestação de serviços, não se exigindo o mínimo conhecimento técnico para chegar a tal conclusão. Se qualquer leigo tem consciência de que o pagamento se dá somente após a competente prestação dos serviços, com mais razão tal princípio é de conhecimento básico de gestores públicos e de profissionais da docência, os quais figuram na presente demanda como réus. Diante de tudo, o dolo no cometimento de ato ímprobo salta aos olhos, uma vez que todos estavam conscientes do pagamento a professores com recursos do FUNDEB sem a correspondente prestação dos serviços de docência. Conforme se pode constatar, está provado nos autos o dolo específico dos réus de lesar o erário, uma vez que, primeiro, Tânia Maria de Sousa Paes Lima, Ivoneide Ribeiro Dias e Humberto Ferreira Dias confessaram em juízo que receberam as remunerações do cargo de professor no período em referência sem que tenham prestados os serviços correspondentes. Quanto ao réu João Dias Ribeiro, ex-Prefeito do Município, destaca-se que ele tinha ciência de que a ré Tânia estava afastada de suas funções de professora no período em que, mesmo assim, percebia a remuneração respectiva, avisado que foi por ela própria, enquanto que, em relação aos réus Ivoneide e Humberto, reconheceu ele expressamente em juízo que não deram aulas no período em que exerciam o cargo de secretários municipais. Aliás, como ressaltado na sentença, não se pode desconsiderar também a ligação de parentesco entre o ex-gestor e estes dois últimos, sua companheira e seu tio, respectivamente. Em relação às rés Sileide Dias Ribeiro e Ismênia Belarmino da Silva Dias, ex-Secretárias de Educação do Município, afirmaram elas expressamente em juízo, conforme o provimento de piso, que os professores estavam sendo pagos "ao tempo que os réus IVONEIDE e HUMBERTO ficavam só na função de secretários". Saliente-se, a propósito, que os réus foram condenados na esfera penal, em primeira instância, pelos mesmos fatos objeto da presente ação de improbidade administrativa, valendo a transcrição do seguinte trecho da sentença respectiva: O parquet imputou aos réus a prática do crime tipificado no art. 1°, inciso I, do Decreto-lei n° 201/67, que assim dispõe, in verbis: Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; (...) §1° Os crimes definidos nêste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos. No caso, a materialidade e a autoria do crime se encontram comprovadas de maneira inequívoca, a partir dos seguintes elementos: a) portarias de nomeação de IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS, para exercer, respectivamente, os cargos de secretária de assistência social e secretário de finanças do Município de Várzea Branca/PI, assinadas em 01/01/2009 (fls. 09/10); b) cópias das autorizações de folha de pagamento para crédito em conta bancária dos servidores públicos municipais de Várzea Branca/PI, no período de janeiro de 2009 a junho de 2010 (fls. 32/50 e 51/69); c) cópias das folhas de pagamento dos servidores públicos do referido município (fls. 90/108 e 109/116); e d) depoimentos colhidos em sede extrajudicial, confirmados em Juízo (fls. 06/07, 159/160, 161/162, 683). Com efeito, da análise do conjunto probatório, depreende-se que, no período de janeiro de 2009 a junho de 2010, os réus JOÃO DIAS RIBEIRO, na condição de prefeito do Município de Várzea Branca/PI, SILEIDE DIAS RIBEIRO, atuando como secretária municipal de educação (entre 22/01/2010 e junho de 2010), e ISMÊNIA BELARMINO DA SILVA DIAS, também na condição de secretária municipal de educação (entre janeiro de 2009 e 21/01/2010), desviaram em proveito de IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS verbas públicas provenientes do FUNDEB, ao efetuarem, em favor destes, o pagamento de remunerações pelo exercício do cargo de professor, sem que estes tenham, de fato, ministrado aulas nas escolas da rede municipal de ensino. Neste sentido, constatou-se que IVONEIDE RIBEIRO DIAS, companheira do então prefeito JOÃO DIAS RIBEIRO, e HUMBERTO FERREIRA DIAS, tio do então prefeito, foram nomeados, em 01/01/2009, para exercerem, respectivamente, os cargos de secretária de assistência social e secretário de finanças do Município de Várzea Branca/PI. Os acusados, então, passaram a desempenhar efetivamente as atividades administrativas correspondentes aos aludidos cargos, porém, mantiveram concomitantemente vínculo com o ente municipal na condição de professores, recebendo as respectivas remunerações, mesmo sem ministrar aulas. Saliente-se, neste ponto, que o recebimento cumulativo das remunerações correspondentes aos cargos de docência e de secretariado, assim como a ausência de prestação de serviços educacionais por parte de IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS, são pontos incontroversos nos autos, uma vez que tais fatos foram confirmados pela testemunha de acusação GILSON DOS REIS SOARES e pelos próprios réus, em Juízo (fls. 679/680 e 683). A tese defensiva no sentido de que os fatos ora tratados consubstanciam, no máximo, atos de improbidade administrativa merece ser rejeitada. O Decreto-lei n° 201/67, ao referir-se a desvio, tipifica a conduta de dar destino diverso daquele que deveria ser dado às verbas públicas. Neste contexto, é evidente que o ato de pagar remuneração a servidor público, sem a respectiva contraprestação, consubstancia o mencionado delito. Vale destacar, ainda, que, no caso em apreço, não se trata simplesmente de servidores públicos que estavam faltando ao serviço, porém, recebendo salários, mas sim de pessoas que, afastadas do efetivo exercício da função de magistério devido ao desempenho de atividades administrativas, continuaram a receber as respectivas remunerações, por mais de um ano. Cumpre rejeitar, igualmente, a tese de que os acusados não tinham consciência da ilicitude do fato (erro de proibição). A proibição de acumular referidos cargos é conclusão que se extrai, expressamente, da dicção do art. 37, XVI, a e b da Constituição Federal, bem como, especificamente em relação aos servidores daquele município, a partir da Lei Municipal n° 114/08, a qual, dentre outras providências, instituiu o Regime Jurídico Único e Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Várzea Branca/PI (cópia às fls. 277/311). O referido diploma legal, precisamente em seu art. 94, veda a acumulação remunerada de cargos públicos, ressalvadas as hipóteses previstas na Constituição, condicionando, ainda, no §l°, a acumulação lícita de cargos à comprovação da compatibilidade de horários. Trata-se de disposições de conhecimento elementar para quaisquer servidores públicos, sendo, pelo conteúdo direto e objetivo destas, inverossímil qualquer alegação de dúvida sobre o alcance de suas disposições. Note-se, ademais, que os réus são pessoas com elevado grau de instrução, eleitas ou nomeadas para exercerem altos cargos na gestão municipal, não podendo socorrer-lhes o alegado desconhecimento da lei. Particularmente em relação ao FUNDEB, o pagamento de profissionais do magistério é condicionado ao efetivo exercício das atividades na rede pública. Inclusive, a Lei n° 11.494/2007 traz o conceito do que se considera "efetivo exercício", com a finalidade de evitar possíveis interpretações errôneas que possam burlar os fins ali colimados: Art. 22. Pelo menos 60% (sessenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos serão destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício na rede pública. Parágrafo único. Para os fins do disposto no caput deste artigo, considera-se: I - remuneração: o total de pagamentos devidos aos profissionais do magistério da educação, em decorrência do efetivo exercício em cargo, emprego ou função, integrantes da estrutura, quadro ou tabela de servidores do Estado, Distrito Federal ou Município, conforme o caso, inclusive os encargos sociais incidentes; II - profissionais do magistério da educação: docentes, profissionais que oferecem suporte pedagógico direto ao exercício da docência: direção ou administração escolar, planejamento, inspeção, supervisão, orientação educacional e coordenação pedagógica; III - efetivo exercício: atuação efetiva no desempenho das atividades de magistério previstas no inciso II deste parágrafo associada à sua regular vinculação contratual, temporária ou estatutária, com o ente governamental que o remunera, não sendo descaracterizado por eventuais afastamentos temporários previstos em lei, com ônus para o empregador, que não impliquem rompimento da relação jurídica existente. (grifou-se) Diante de tais circunstâncias, não é crível o argumento de que os acusados não soubessem da impossibilidade de acumulação dos cargos e, mais ainda, da ilicitude da conduta de continuar a autorizar (no caso de JOÃO DIAS RIBEIRO, SILEIDE DIAS RIBEIRO e ISMÊNIA BELARMINO DA SILVA DIAS) Os pagamentos das remunerações correspondentes ao cargo de professor, ou recebê-las (no caso de IVONEIDE RIBEIRO DIAS e HUMBERTO FERREIRA DIAS), sem a contraprestação devida, consistente no efetivo exercício de atividades na rede pública de ensino. Presente, portanto, o dolo em sua conduta. Diante de tais considerações, impõe-se a condenação dos réus pela prática do crime descrito no art. 1°, inciso I, do Decreto-lei 201/1967. Assim, tendo sido comprovados o dolo específico e o dano ao erário, não resta dúvida de que deve ser mantida a condenação dos réus, mesmo após o advento da Lei 14.230/2021. Quanto às sanções aplicadas em desfavor dos réus, convém asseverar, de início, a propósito do recurso da ré Tânia Mara de Souza Paes Lima, que, como já dito, o dano ao erário já está suficientemente delimitado na espécie, não comportando acolhimento a sustentação em sentido contrário. Sobre a multa civil aplicada em desfavor de todos os réus, entendo que é o caso de se proceder à redução de seu percentual, de 100% (cem por cento) do valor do dano, para metade disso (AC 0040017-54.2007.4.01.3400, TRF1, Quarta Turma, Rel. Juiz Federal convocado Paulo Ricardo de Souza Cruz, PJe 21/03/2025). Acerca da suspensão dos direitos políticos, estabelecida pelo período de oito anos em relação a todos os réus, exceto Sileide e Ismênia, cuja penalidade foi fixada em cinco anos, observo que, sopesada a gravidade dos fatos, bem assim os parâmetros do artigo 12 da LIA, seu estabelecimento pelo período de cinco anos em relação aos primeiros e três anos relativamente às últimas atende com mais proporcionalidade e razoabilidade à finalidade da sanção. Quanto ao mais, não há o que reparar nas sanções fixadas no provimento de piso. No que tange aos honorários advocatícios, não são eles devidos na espécie, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1335291/PE, Segunda Turma, Rel. Min. Afrânio Vilela, DJe 21/03/2024). Por fim, haja vista pedido formulado nesse sentido, deve ser deferida em favor dos réus João Dias Ribeiro e Ivoneide Ribeiro Dias a justiça gratuita. Ante o exposto, rejeito a preliminar e dou parcial provimento às apelações, para reduzir o valor da multa civil para o percentual de 50% (cinquenta por cento) do valor do dano e os períodos de suspensão dos direitos políticos para cinco anos em relação aos réus João Dias Ribeiro, Tânia Maria de Sousa Paes Lima, Ivoneide Ribeiro Dias e Humberto Ferreira Dias e três anos em relação às rés Sileide Dias Ribeiro e Ismênia Belarmino da Silva Dias, bem assim para afastar a condenação de todos eles ao pagamento de honorários advocatícios. Defiro o pedido de justiça gratuita em favor dos réus João Dias Ribeiro e Ivoneide Ribeiro Dias. É o voto. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0001297-42.2013.4.01.4003 APELANTE: JOAO DIAS RIBEIRO, HUMBERTO FERREIRA DIAS, IVONEIDE RIBEIRO DIAS, ISMENIA BELARMINO DA SILVA DIAS, SILEIDE DIAS RIBEIRO, TANIA MARA DE SOUZA PAES LIMA Advogado do(a) APELANTE: JOSE ADAILTON ARAUJO LANDIM NETO - PI13752-A Advogados do(a) APELANTE: CASSIA KELLY DOS SANTOS BARCELOS - DF44747, FABLINE SIQUEIRA BATISTA - DF29372-A, FERNANDA PINHEIRO DO VALE LOPES - DF43909-A, FERNANDA TORRES DE LIMA - DF73152, HERMAN TED BARBOSA - DF10001-A, LISE REIS BATISTA DE ALBUQUERQUE - DF25998-A Advogado do(a) APELANTE: DANILO MENDES DE AMORIM - PI10849-A Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CERQUEIRA DA SILVA - PI4865-A APELADO: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MALVERSAÇÃO DE VERBAS DO FUNDEB. DOCENTES. RECEBIMENTO DE SALÁRIOS SEM A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS CORRESPONDENTES. CONDENAÇÃO DOS PROFESSORES E DOS GESTORES DO MUNICÍPIO À ÉPOCA. INÉPCIA DA INICIAL. INEXISTÊNCIA. DOLO ESPECÍFICO DE LESAR O ERÁRIO. PREJUÍZO AOS COFRES PÚBLICOS. COMPROVAÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA, MESMO APÓS O ADVENTO DA LEI 14.230/2021. SANÇÕES. REDUÇÃO DA MULTA CIVIL E DO PERÍODO DE SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. VERBA HONORÁRIA ADVOCATÍCIA INDEVIDA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. JUSTIÇA GRATUITA DEFERIDA EM FAVOR DE DOIS RÉUS. 1. As condutas atribuídas a cada um dos réus foram suficientemente descritas pelo Ministério Público, inexistindo prejuízo à sua defesa, e o dano ao erário está devidamente quantificado na exordial, não havendo que se falar em inépcia. 2. Está provado nos autos o dolo específico dos réus de lesar o erário, uma vez que, primeiro, Tânia Maria de Sousa Paes Lima, Ivoneide Ribeiro Dias e Humberto Ferreira Dias confessaram em juízo que receberam as remunerações do cargo de professor no período em referência sem que tenham prestados os serviços correspondentes. Quanto ao réu João Dias Ribeiro, ex-Prefeito do Município, destaca-se que ele tinha ciência de que a ré Tânia estava afastada de suas funções de professora no período em que, mesmo assim, percebia a remuneração respectiva, avisado que foi por ela própria, enquanto que, em relação aos réus Ivoneide e Humberto, reconheceu ele expressamente em juízo que não deram aulas no período em que exerciam o cargo de secretários municipais. Aliás, como ressaltado na sentença, não se pode desconsiderar também a ligação de parentesco entre o ex-gestor e estes dois últimos, sua companheira e seu tio, respectivamente. Em relação às rés Sileide Dias Ribeiro e Ismênia Belarmino da Silva Dias, ex-Secretárias de Educação do Município, tem-se que afirmaram elas expressamente em juízo, conforme o provimento de piso, que os professores estavam sendo pagos "ao tempo que os réus IVONEIDE e HUMBERTO ficavam só na função de secretários". De se frisar também que os réus foram condenados na esfera penal, em primeira instância, pelos mesmos fatos objeto da presente ação de improbidade administrativa. 3. Tendo sido comprovados o dolo específico e o dano ao erário, deve ser mantida a condenação dos réus, mesmo após o advento da Lei 14.230/2021. 4. Sobre a multa civil, é cabível a redução de seu percentual, de 100% (cem por cento) do valor do dano, para metade disso (AC 0040017-54.2007.4.01.3400, TRF1, Quarta Turma, Rel. Juiz Federal conv. Paulo Ricardo de Souza Cruz, PJe 21/03/2025). 5. Acerca da suspensão dos direitos políticos, estabelecida pelo período de oito anos em relação a todos os réus, exceto Sileide e Ismênia, cuja penalidade foi fixada em cinco anos, sopesada a gravidade dos fatos, bem assim os parâmetros do artigo 12 da LIA, seu estabelecimento pelo período de cinco anos em relação aos primeiros e três anos relativamente às últimas atende com mais proporcionalidade e razoabilidade à finalidade da sanção. 6. Honorários advocatícios não são devidos na espécie, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1335291/PE, Segunda Turma, Rel. Min. Afrânio Vilela, DJe 21/03/2024). 7. Haja vista pedido formulado nesse sentido, deve ser deferida em favor dos réus João Dias Ribeiro e Ivoneide Ribeiro Dias a justiça gratuita. 8. Preliminar rejeitada. Apelações parcialmente providas. Justiça gratuita deferida a dois réus. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar a preliminar, dar parcial provimento às apelações e deferir a justiça gratuita em favor de dois réus. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 24/06/2024 (data do julgamento). Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator
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Processo nº 1002147-21.2023.4.01.4103
ID: 324675655
Tribunal: TRF1
Órgão: Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Vilhena-RO
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 1002147-21.2023.4.01.4103
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
AIDEVALDO MARQUES DA SILVA
OAB/RO XXXXXX
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MARINA BRENTANO COLOMBO
OAB/RS XXXXXX
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MARCELO AUGUSTO RODRIGUES DE LEMOS
OAB/RS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Vilhena-RO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Vilhena-RO SENTENÇA: TIPO D PROCESSO: 1002147-21.2023.4.01.4103 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDI…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Vilhena-RO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Vilhena-RO SENTENÇA: TIPO D PROCESSO: 1002147-21.2023.4.01.4103 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) DENUNCIADO: JUSCELINO BELLINCANTA, KLEYSON ORLANDO SENTENÇA O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra KLEYSON ORLANDO como incurso nos crimes previstos no art. 312, caput, e no art. 317, § 1º, c/c art. 327, § 2º, todos do Código Penal e JUSCELINO BELLINCANTA como incurso nos crimes previstos no art. 312, caput, c/c art. 29 e no art. 333, parágrafo único, todos do Código Penal (Id 1760557594, Pág. 1-25, 1760585564 - Pág. 536-561), pelos seguintes fatos: Fato 1 (art. 312, caput, c/c art. 327, § 1º, ambos do Código Penal): Entre setembro de 2013 e outubro de 2015, na cidade de Cerejeiras-RO, no âmbito da prefeitura municipal, no Processo Administrativo nº 2593/2012, subsidiado com recursos federais (Convênio SIAFI/SICONV nº 668779 - FUNASA), o denunciado KLEYSON ORLANDO, com consciência e vontade, em comunhão de esforços com agente particular, valendo-se das facilidades da função pública que exercia, teria realizado medições fraudulentas na obra de esgotamento sanitário, propiciando em benefício de outrem o desvio, à época, de recursos federais no valor de R$ 1.266.364,45 (um milhão, duzentos e sessenta e mil, trezentos e sessenta e quatro reais e quarenta e cinco centavos), a valores de abril de 2012, haja vista o sobrepreço dos serviços, uma vez que não seriam compatíveis com os trabalhos, de fato, realizados. No caso, teria sido indevidamente beneficiada a pessoa jurídica CONSTRUTORA MOSAICO LTDA. Para tanto, o desvio das verbas públicas teria contado com as ações do empresário/engenheiro JUSCELINO BELLINCANTA, administrador de fato da aludida empresa, o qual teria realizado atos de emissão ardilosa de notas fiscais e demais documentos administrativos, tudo isso alinhado às condutas do engenheiro KLEYSON. Fato 2 (art. 317, § 1º, c/c art. 327, § 2º, do Código Penal): Entre março de 2014 e outubro de 2015, o denunciado KLEYSON ORLANDO, com consciência e vontade, na qualidade de engenheiro civil contratado pelo Município de Cerejeiras-RO, teria recebido, por intermédio da empresa RITTER ORLANDO, o valor R$ 279.353,72 (duzentos e setenta e nove mil trezentos e cinquenta e três reais e setenta e dois centavos), como contrapartida à prática de atos de ofício com infração ao seu dever funcional (medições fraudulentas da obra de esgotamento sanitário). Fato 3 (art. 333, parágrafo único, do Código Penal): Como espelho da corrupção passiva, JUSCELINO BELLINCANTA, por meio da empresa MOSAICO LTDA, teria oferecido e entregado vantagem indevida a KLEYSON ORLANDO, no valor de R$ 279.353,72 (duzentos e setenta e nove mil trezentos e cinquenta e três reais e setenta e dois centavos), mediante transferências bancárias, para que o funcionário público praticasse atos de ofício com infringência aos deveres funcionais. A denúncia foi recebida no dia 02/06/2023 (Id 1760585569, Pág. 568-572). Os réus KLEYSON ORLANDO e JUSCELINO BELLINCANTA foram citados pessoalmente (Id 2033340182), e apresentaram resposta à acusação (Id 2039908158, 2138556502). Foi proferida Decisão que rejeitou as preliminares apresentadas pelas defesas dos acusados, e afastou as hipóteses de absolvição sumária e determinou o prosseguimento do feito. Na mesma decisão determinou-se a intimação da Polícia Federal para juntada de cópia em melhor resolução dos Laudos nº 465/2019 – SETEC/SR/PF/RO e 466/2019 – SETEC/SR/PF/RO (ID 1760585564 - Pág. 50/327) e descrição, por meio de seus peritos que elaboraram o Laudo nº 465/2019 – SETEC/DR/PF/RO, dos 08 (oito) poços citados no exame (com seus códigos), a fim de auxiliar posterior diligência a ser realizada pela defesa. Deferiu-se a indicação de assistentes técnicos pelas partes, no prazo de 15 dias. Em atendimento à determinação do juízo, a Polícia Federal juntou os laudos n. 0465/2019-SETEC/SR/PF/RO e n. 0466/2019-SETEC/SR/PF/RO (Id 2143649896, 2143649348). A defesa do acusado KLEYSON ORLANDO requereu a intimação de todas as testemunhas arroladas na Resposta à Acusação, sob pena de nulidade (Id 2148538967). O Ministério Público Federal manifestou-se pelo deferimento do pedido da defesa (Id 2148608955). A defesa do acusado JUSCELINO BELLINCANTA requereu a intimação e oitiva das testemunhas arroladas (Id 2150342837). A defesa do acusado JUSCELINO BELLINCANTA indicou assistente técnico e requereu disponibilização de login e senha de acesso ao assistente para acesso aos autos (Id 2152526290). Na decisão Id 2157555452, o juízo determinou fosse, apresentado o parecer, concedida vista às partes por 5 dias, para ciência. Na mesma decisão, deferiu o pedido da defesa de KLEYSON ORLANDO de intimação das testemunhas de defesa pelo Juízo. A defesa do acusado JUSCELINO BELLINCANTA requereu a juntada do Parecer do Assistente Técnico (Id 2161299086). Em audiência de instrução foram inquiridas as testemunhas de acusação João Cláudio Nabas e Rafael Gomez Fochs e, pela defesa, das testemunhas Willias Conti Soares, André Filipi Hoffmam Cardoso, Klever Kempner Moreira, Leandro de Oliveira da Silva, Doralino Castaman, André Alves dos Santos Neto, Sílvio Braz Marques, Genair Gabriel, Roberto Kenshi Kuroda, Lucilene Carvalho Silva, Janine Martinez Bellincanta e Jadison Ronaldo Paganini (Id 2180311301). Em continuidade à instrução, foram inquiridas as testemunhas de defesa Josafá Piauí Marreiro, José Eduardo Guidi e Maycon Júnior Barreto, após, interrogados os réus Kleyson Orlando e Juscelino Bellincanta (Id 2184917082). Na fase do art. 402 do Código de Processo Penal, as partes nada requereram. O Ministério Público apresentou alegações finais por memoriais requerendo a improcedência da denúncia, a fim de que os réus os réus KLEYSON ORLANDO e JUSCELINO BELLINCANTA sejam ABSOLVIDOS, com fundamento no art. 386, VII, do Código Penal. O réu KLEYSON ORLANDO apresentou alegações finais escritas postulando pela absolvição, por ausência de provas, nos termos do art. 386, V e VII do Código de Processo Penal. No mesmo sentido, o réu JUSCELINO BELLINCANTA apresentou alegações finais, com pedido de absolvição, em virtude da atipicidade das condutas que lhe foram imputadas ou da falta de provas para a condenação. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO O feito tramitou regularmente e não há vícios a serem sanados. Ausentes arguições preliminares, passo à análise do mérito. MÉRITO CRIME DE PECULATO (FATO 1) – art. 312 c/c art. 327, §1º, todos do CP Consta na denúncia que para a contratação de empresa de engenharia para a execução das obras de ampliação do sistema de esgotamento sanitário no Município de Cerejeiras-RO, a Administração Pública local procedeu ao certame na modalidade concorrência, no regime de execução de empreitada por preço global e tipo menor preço, identificado pelo nº 002/2012 O valores eram oriundos do Convênio SIAFI/SICONV nº 668779, relativo ao Termo de Compromisso nº 0542/2011, celebrado entre o Governo Federal, por meio do Ministério da Saúde, representado pela FUNASA, e o Município de Cerejeiras-RO, no valor de R$ 23.796.069,80 (vinte três milhões, setecentos e noventa e seis mil, sessenta e nove reais e oitenta centavos), cujo valor do repasse efetivamente realizado foi de R$ 23.090.877,56 (vinte e três milhões, noventa mil, oitocentos e setenta e sete reais e cinquenta e seis centavos), conforme Processo Administrativo nº 2593/2012 (ID 808261573, pág. 12). Após o esgotamento da disputa licitatória, na Concorrência nº 002/2012, desenvolvida no bojo do Processo Administrativo nº 2593/2012, em 10 de setembro de 2013, foi firmado termo de Contrato nº 78/2013, entre o Município de Cerejeiras-RO e a empresa CONSTRUTORA MOSAICO LTDA, por meio de seu procurador JUSCELINO BELLINCANTA, a fim de realizar obra de ampliação do sistema de esgotamento sanitário, cujo valor do contrato foi orçado em R$ 22.869.629,44 (vinte e dois milhões, oitocentos e sessenta e nove mil reais e quarenta e quatro centavos), com recursos advindos da FUNASA/PAC II (ID 1496720381, Volume 10, págs. 8-15). Para a fiscalização e acompanhamento da obra, o ente municipal contratou o engenheiro civil KLEYSON ORLANDO - Contrato nº 034/2013, de 05/2013 (ID 1453442376, pág. 8). Em 25 de outubro de 2013, a CONSTRUTORA MOSAICO LTDA solicitou a primeira medição dos serviços, conforme cronograma físico-financeiro (ID 1496720381, Volume 10, págs. 55-60). A denúncia apontou que algumas medições, informadas por documentos elaborados pelos denunciados, não corresponderam ao tipo real de serviços realizados, e que eles teriam produziram documentação ideologicamente falsa, que visou ao superfaturamento dos serviços. Tal fato fundamentou-se no estudo técnico produzido pela unidade de perícia da Polícia Federal, que atestou um sobrepreço no importe de R$ 1.266.364,45 (um milhão, duzentos e sessenta e seis mil, trezentos e sessenta e quatro reais e quarenta e cinco centavos) a preços de 04/2012, o que representa cerca de 5 % (cinco por cento) de todo o valor pago a contratada (Laudo nº 0465/2019-SETEC/SR/PF/RO - ID 808261573, págs. 9-33 e ID 808261579, págs. 1-27). Para fundamentar a suposta inflação dos custos, o laudo apontou que houve a cobrança de serviços de escavação em material 3ª categoria por qualquer processo, descrito nos itens B.1.4.8 e C.2.4 das medições da CONSTRUTORA MOSAICO. Contudo, tais materiais não teriam sido utilizados, com base nas imagens apresentadas, sendo que estas indicaram que os materiais eram apenas de primeira categoria, que seriam escaváveis com equipamentos comuns. Ainda, consta que foi indevida a utilização do custo unitário do serviço 2 S 04 020 00 do SICRO (escavação de material de 3ª categoria em vala), quando o correto seria o SICRO 2 S 01 102 01 - Escavação, carga e transporte de material de 3ª categoria DMT até 50 metros, utilizadas para serviços em céu aberto, como na construção da lagoa. Logo, teria havido superfaturamento nos seguintes termos da denúncia: O superfaturamento por sobrepreço oriundo da medição/pagamento pelo serviço descrito no item C.2.4 “Escavação em rocha ou em material de 3ª categoria por qualquer processo”, em função do emprego de serviço errôneo (diferente do executado), foi igual a R$ 86.681,50 (oitenta e seis mil, seiscentos e oitenta e um reais e cinquenta centavos) a preços de 04/2012. Já a diferença entre o valor medido/pago referente à escavação de material de 3ª categoria para o item B.1.4.8, igual R$ 33.494,36 (trinta e três mil, quatrocentos e noventa e quatro reais e trinta e seis centavos), e o valor calculado pelos peritos, referente à escavação de material de 1a categoria, igual a R$ 3.612,11 (três mil, seiscentos e doze reais e onze centavos), é igual a R$ 29.882,25 (vinte e nove mil, oitocentos e oitenta e dois reais e vinte e cinco centavos) a preços de 04/2012. Ainda, o superfaturamento teria ocorrido com declarações falsas atinentes à "escavação mecânica de valas, qualquer terreno, exceto rocha até 2 metros de profundidade" (item B.1.4.4) e “escavação mecânica de valas, qualquer terreno, exceto rocha, além de 2,01 metros até 4 metros de profundidade" (item B.1.4.5), que estariam sem registros fotográficos da escavação de material com características de 2ª categoria, nem indícios da existência deste material até a profundidade de 6 metros. Com isso, a diferença entre o valor medido/pago, igual a R$ 2.508.076,56 (dois milhões, quinhentos e oito mil, setenta e seis reais e cinquenta e seis centavos) a preços de 04/2012, e o valor calculado pelos peritos, igual a R$ 1.606.494,59 (um milhão, seiscentos e seis mil, quatrocentos e noventa e quatro reais e cinquenta e nove centavos), resultou no valor de R$ 901.581,98 (novecentos e um mil, quinhentos e oitenta e um reais e noventa e oito centavos) a preços de 04/2012. Também se verificou no Laudo como método para elevação arbitrária dos preços a forma de execução dos serviços denominados de "estruturas de escoramento contínuo de valas" (B.1.6.1) e "estruturas de escoramento descontínuo de valas" (B.1.6.2). Concluíram, assim, pela ocorrência de superfaturamento por sobrepreço oriundo da medição/pagamento pelos serviços descritos nos itens B.1.6.1 “estruturas de escoramento contínuo de valas” e B.1.6.2 “estruturas de escoramento descontínuo de valas” foi igual a R$ 152.958,28 (cento e cinquenta e dois mil, novecentos e cinquenta e oito reais e vinte e oito centavos) a preços de 04/2012. Por fim, consta que os denunciados teriam realizado superfaturamento devido aos recebimentos contratuais antecipados (medição e pagamento por serviço antes de sua execução), pois o serviço de fornecimento e instalação das geomembranas ocorreu, pelo menos, 5 (cinco) meses após a medição e pagamento de sua primeira medição (sétima medição). Pois bem. A imputação amolda-se ao crime tipificado no artigo 312 do Código, que prevê, in verbis: Peculato Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Sobre o “peculato-desvio”, leciona Rogério Greco: “a segunda parte do art. 312, do Código Penal, prevê o peculato desvio. Aqui o agente não atua no sentido de inverter a posse da coisa, agindo como se fosse dono, mas sim desvia o dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, em proveito próprio ou alheio. No peculato-desvio exige-se que o servidor público se aproprie do dinheiro do qual tenha posse direta ou indireta, ainda que mediante mera disponibilidade jurídica” (in Código Penal Comentado, 9ª Ed, RJ. Impetus. 2015, p. 1040/1041). O próprio elemento normativo do tipo exige o desvio de valor em proveito próprio ou alheio e, não demonstrado tal fim específico de agir, não se consuma o delito de peculato-desvio. Nesse sentido, analisando as provas colhidas nos autos, verifica-se que não restou demonstrado nos autos o dano material necessário para configurar o delito, consubstanciado pelo efetivo prejuízo ao erário. Da mesma forma, não se demonstra o dolo dos acusados, representado pela consciência e vontade de empregar os valores recebidos para fim diverso daquele determinado, e a intenção de obtenção de proveito próprio ou alheio. Para que as provas do inquérito sejam confirmadas em juízo, é necessário que elas sejam corroboradas por outros elementos de prova colhidos durante a fase judicial. O entendimento das Cortes Superiores e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região convergem no sentido de que as provas colhidas na fase de inquérito policial não podem, por si só, fundamentar decisões condenatórias ou de pronúncia, sendo imprescindível sua confirmação em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, conforme disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal (CPP). O perito da Polícia Federal João Cláudio Nabas, esclareceu em juízo: "Que se recorda da sua atuação como perito no Município de Cerejeiras/RO. Que foram feitos dois laudos de engenharia, um sobre a análise da licitação e o segundo sobre análise de preços e serviços executados. Que atuou apoiando o perito Rafael Fochs. Inclusive, à época houve contato com o ORLANDO, fiscal da obra, para fins de realização de algum questionamentos para elaboração do laudo. Quanto à licitação, houve algumas intervenções judiciais, o que ocasionou na demora. Que o desconto ofertado foi bem baixo, contudo na perícia não foi possível concluir pela existência de algum conluio. Quanto à análise dos preços, foi feita pelo Rafael. O entendimento da perícia foi de que não havia necessidade de material de terceira categoria, material rochoso que foi indicado em planilha e depois medido na obra, e pago para a MOSAICO, que fosse equivalente ao serviço de terceira categoria, de modo que os serviços poderiam ter sido realizados com materiais mais simples, de primeira categoria. Que esses fatos foram constatados de maneira indireta, com base nos registros fotográficos e dados do processo. Que confirma os termos do laudo quanto à constatação de desnecessidade de materiais de segunda categoria e da profundidade apresentada, de modo que houve pagamento a maior do que seria realmente devido. Que pelas informações que constataram seria possível concluir que o que ocorreu não foi um mero erro formal de quem fez as medições. Que a análise da perícia criminal não apresenta todos os itens da obra, mas apenas aquilo que é mais evidente. [...] Quanto ao superfaturamento, esclareceu que os peritos fizeram uma análise do que seria devido, principalmente em relação aos reajustamentos, conforme constava no processo analisado, e que eventualmente pode ocorrer o pagamento dos reajustamentos em processos apartados, pela Prefeitura. Que a conclusão do laudo foi de que entre as contas de superfaturamento e reajustamento não foi apurado dano. Que geralmente esses contratos são empreitada por preço global. Que utilizaram a análise do superfaturamento por custo unitário/serviço, e não uma análise global. Que essa aferição por custo unitário possui uma data base, contudo não se recorda qual foi utilizada na perícia." No mesmo sentido, o perito da Polícia Federal Rafael Gomez Fochs também esclareceu: "Que à época verificaram quais serviços estariam em discordância, pois existiam indícios de que o serviço descrito não condizia com as informações disponíveis da obra. Se recorda que o tempo de medição da manta era incompatível com as imagens de satélite. A medição da manta foi anterior e imagem no satélite aparece meses depois. Quanto à análise de material de terceira categoria, disse que as análises foram feitas com base em fotos das medições e pesquisas em órgãos federais. Que nas imagens não constava o material rochoso escavado. Que se recorda que na lagoa consideraram que os materiais estariam corretos. [...] Quanto ao superfaturamento no escoramento das valas, se recorda que constataram que os materiais não condiziam com os serviços. Que se recorda que foi colocado quanto à possibilidade de reajustamentos no contrato, mas não sabe dizer se houve o pagamento dos reajustamentos, o que poderia ter “compensado” os danos. Quanto aos valores, informou que os preços da tabela são de Porto Velho/RO. Confirma que não chegou a cotar preços em Cerejeiras/RO.” Ocorre que, o laudo técnico da polícia federal restou destoante das demais provas produzidas, inclusive quando contraposta ao laudo técnico particular elaborado. O perito José Eduardo Guidi esclareceu: “Que é engenheiro civil. Confirmou que realizou laudo pericial nos autos, tendo utilizado a mesma metodologia da Polícia Federal. Quanto à metodologia, afirmou que usou a de limitação do preço global, por se tratar de empreitada global. No caso em questão, chegou-se à conclusão de que não houve sobrepreço. Essa metodologia é a mais indicada para esse tipo de obra, conforme Tribunal de Contas da União. Esclareceu que na perícia da Polícia Federal não foram considerados os valores de mercado em relação à Cerejeiras/RO. Que a tabela SICRO é adequada para infraestruturas em campo aberto. Que considerou como data-base a data do contrato, conforme entendimento do próprio TCU, não a data de elaboração da proposta.” Nos termos do art. 182, do Código de Processo Penal, o juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte, nesse último caso, desde que o faça fundamentadamente, por força do princípio do livre convencimento motivado. No caso, as divergências apontadas pelo parecer de assistente técnico (Id 2161299528 - Pág. 1-35), especialmente quanto à metodologia utilizada e fixação da data-base para realização dos cálculos, restaram coerentes. De fato, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Contas da União, pelo critério legal, o sobrepreço só restaria configurado se o contrato tivesse sido celebrado com preço global superior ao preço indicado nos sistemas oficiais de custos, o que não ocorreu no caso dos autos. Veja-se: Acórdão 1302/2015-TCU-Plenário, Ministro Relator Marcos Bemquerer: Os sobrepreços unitários de serviços, quando não avaliados em conjunto com outros itens da planilha orçamentária, não são suficientes para caracterizar, por si só, eventual sobrepreço ou superfaturamento do empreendimento. Quando não houver sobrepreço global, mas apenas unitário, o contrato é vantajoso para a Administração se as alterações contratuais posteriores não reduzirem o desconto global obtido originalmente, configurando o jogo de planilha. Acórdão 1925/2010-TCU-Plenário, Ministro Relator André de Carvalho: Estando o preço global no limite aceitável, dado pelo orçamento da licitação, os sobrepreços existentes, devido à falta de critérios de aceitabilidade de preços unitários, apenas causam prejuízos quando se acrescentam quantitativos aos itens de serviço correspondentes. Acórdão 2885/2008-TCU-Plenário, Ministro Relator Ubiratan Aguiar: Não há como se caracterizar sobrepreço, analisando apenas alguns itens isolados da proposta de preços, se o preço global praticado está situado dentro de parâmetros considerados adequados. Acórdão 2482/2008-TCU-Plenário, Ministro Relator Raimundo Carreiro: Ainda que existam distorções nos preços unitários de determinados itens, caso se mantenham as condições originais da contratação, não haverá sobrepreço no contrato celebrado por valor global compatível com o mercado. Ademais, nos termos do parecer técnico de ID 2161299528, para se avaliar se houve ou não dano patrimonial derivado de superfaturamento, é necessário computar quanto seria o valor de mercado na data-base em que efetivamente os serviços foram contratados, o que não foi observado no Laudo Nº 0465/2019-SETEC/SR/PF/RO, que tomou como base os preços de 04/2012, data-base do orçamento de referência da Administração. Isso conforme jurisprudência do Tribunal de Contas: "23. Consoante exame da unidade técnica, a metodologia de cálculo utilizada pelo Tribunal para apurar o valor do débito nos presentes autos, com a utilização de referencial de preços mais próximo à data-base do contrato, é correta e encontra amparo em farta jurisprudência desta Corte, que está referenciada no relatório que fundamenta esta deliberação. 24. Registro que a referência na data-base do contrato também é aquela que se presta melhor a avaliar o aspecto subjetivo das condutas dos responsáveis, pois o exame que se exigiria tanto de um agente público quanto da empresa licitante que oferta sua proposta no certame seria a comparação dos preços orçados/ofertados com os vigentes em sistemas referenciais CONTEMPORÂNEOS da contratação. 25. O equilíbrio econômico-financeiro do contrato também deve ser sempre analisado na data de apresentação das propostas, conforme expresso no art. 37, inciso XXI, do texto constitucional, ao disciplinar a manutenção das condições efetivas da proposta. Nesse sentido, leciona Marçal Justen Filho, em sua obra Comentários à lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11ª edição (grifo meu): A equação econômico-financeira delineia-se a partir da elaboração do ato convocatório. Porém, a equação se firma no instante em que a proposta é apresentada. Aceita a proposta pela Administração, está consagrada a equação econômico-financeira dela constante. A partir de então essa equação está protegida e assegurada pelo Direito. 26. Ante o exposto, em casos que se avaliam indícios de dano ao erário por conta da prática denominada jogo de planilha, a perda do equilíbrio econômico-financeiro do contrato deve ser avaliada com base em referenciais de preços contemporâneos à contratação, e não em datas futuras, aparentemente escolhidas de forma arbitrária pela recorrente. (Acórdão 167/2017-Plenário. Min. Relator: Benjamim Zymler)." Com isso, levando-se em conta a metodologia correta e a data-base apontada, o perito particular chegou à seguinte conclusão: “Em seguida, para verificarmos se houve superfaturamento, e repita-se à exaustão, de acordo com a jurisprudência do TCU e doutrina especializada, basta subtrair os valores de mercado estimados pelos diversos índices na data de início efetivo do contrato, do valor que foi efetivamente pago à contratada (R$ 23.796.069,80). Veja-se que a lógica é verificar se o valor desembolsado pela Administração, na data em que foi desembolsado, correspondia ao valor de mercado. Dizendo de outro modo, pretende-se saber se a Administração pagou o que efetivamente o objeto valia, no exato momento em que foi executado. Assim sendo, seja qual for o índice considerado à estimativa do valor de mercado contemporâneo ao início do contrato, o superfaturamento não restou caracterizado. Tal decorre porque em se tratando de empreitada por preço global, a Administração pagou pelo objeto contratado aquilo que ele efetivamente valia na data de partida do contrato. Significa que não houve desequilíbrio econômico-financeiro em favor do contratado, e por consequência, não há que se falar em dano patrimonial à Administração.” Logo, é possível concluir que os possíveis motivos que teriam levado ao superfaturamento sequer existiram, inclusive quanto aos tipos de materiais encontrados na obra, de modo que não ficou comprovado nos autos que houve descrições maliciosamente distorcidas, com o fim de obter proveito econômico pessoal ou de terceiros. De fato, o Relatório Geotécnico (Id 2138559509) apresentado pela defesa, com a sondagem do solo, foram identificados em doze dos quinze furos avaliados, a existência de material de 2ª categoria, bem como vestígios de material de 3ª categoria. As testemunhas de defesa inquiridas durante a instrução processual também relataram a existência de material de segunda e terceira categoria na obra, bem como a utilização de equipamentos mais complexos, em razão do tipo de solo. A testemunha André Filipi Hoffmam Cardoso afirmou: “Que estudou com o réu KLEYSON e trabalhou com ele no município de Cerejeiras. Se recorda que a empresa dele tinha um contrato com a Prefeitura de fiscalização de obras. Que participava da fiscalização das medições que a empresa executora solicitava. Que todo serviço era verificado. Quanto ao aluguel de máquinas, disse que na região não tinha muita disponibilização desse serviço. Confirma que existia material rochoso em alguns locais, mas não que necessitasse de explosivos, e que as máquinas eram utilizadas. Confirma que teve algumas medições que o KLEYSON constatou que estavam a maior, o que não foi pago. Que as fotos eram enviadas pela empresa executora e depois confirmados em local. [...]” A testemunha Klever Kempner Moreira disse: “Que era estagiário da MOSAICO em Cerejeiras, à época. Que chegou a acompanhar algumas medições. Que eram bem criteriosos nas fiscalizações, sendo que inclusive a FUNASA também comparecia. Que o KLEYSON tinha duas máquinas alugadas, que são escassas na região. Que a MOSAICO também tinha outras máquinas. Confirmou que foram realizados serviços em locais rochosos, só que em quantidade menor, por isso foram reduzidos, pois não tinha a quantidade indicada. Confirmou que foram utilizados materiais de terceira categoria, retroescavadeiras e pc’s hidráulicas. Quanto às valas, eram utilizadas madeiras normais.” A testemunha Genair Gabriel disse: “Que trabalhou como operador de PC e participou das escavações durante quase todo o período. Confirma que foram utilizados materiais de terceira categoria. Quanto aos escoramentos, se recorda que eram “metalão, com placa de maderite”.Na lagoa também foram encontrados materiais de terceira categoria, que foram utilizados.” A testemunha Roberto Kenshi Kuroda disse: “Que trabalha como engenheiro civil na área de saneamento, com a prestação de consultoria. Confirmou que a Caixa Econômica/FUNASA são exigentes na fiscalização. Quanto aos orçamentos, geralmente utilizam a tabela do SINAP do governo federal, que considera os dados de Porto Velho/RO. Quantas às tabelas da EMPRESA MOSAICO, informou que elas tem sido aceitas no Estado em obras semelhantes. Quanto à obra em Cerejeiras, afirmou que se recorda que foi necessária a utilização de alguns materiais de terceira categoria, pois havia um trecho relevante que era profundo e de difícil escavação.” A testemunha Lucilene Carvalho Silva disse: “Que é engenheira civil e trabalhou na empresa MOSAICO. Que a tabela utilizada a tabela SINAP, gerida pela Caixa Econômica. [...] Quanto aos materiais, teve conhecimento de que foi necessária a utilização de materiais de terceira categoria. Que o processo executivo foi aprovado pela FUNASA, e depois disso teve a aprovação de outra planilha, com supressão e alteração de quantitativos, sendo que os valores unitários não foram alterados.” A informante Janine Martinez Bellincanta disse: “Que participou como engenheira na obra em Cerejeiras, com participação em todos os setores. [...] Quanto às escavações, confirmou que foi encontrado materiais de terceira categoria na lagoa, rochas em decomposição, por isso utilizaram várias máquinas, inclusive hidráulicas. Confirmou que foram utilizados materiais de escoramento, principalmente onde as pessoas estavam trabalhando. Que o KLEYSON também acompanhava as obras. Quanto à geomembrana da lagoa, se recorda que ela chegou, mas houve atraso na instalação, pois o profissional contratado era do Sul. Na obra de Cerejeiras se recorda que a empresa BETA realizou a primeira etapa e a MOSAICO a segunda. Que as planilhas utilizadas eram da SINAP. Acredita que empresa BETA também tenha encontrado materiais rochosos.” A testemunha Jadison Ronaldo Paganini disse: “Que é engenheiro civil e de segurança do trabalho e também atuou na obra de Cerejeiras. Que participou da atualização do projeto, que posteriormente foi apresentado na FUNASA, para fins de recebimento de valores do PAC. Que foi selecionado na Convite que foi realizado. Confirmou que usavam a tabela SINAP ou outras tabelas oficiais. A própria FUNASA fazia a gestão dos projetos em alguns casos. Quanto à realização de sondagem na obra, afirmou que não havia essa previsão, até porque o custo seria mais alto. Na primeira fase foi solicitada a realização de sondagem, contudo foi questionada a necessidade, pois não havia essa previsão no projeto básico. Que elaborou a planilha orçamentária e houve diversas adequações pela FUNASA. A Prefeitura não realizou a sondagem. Que realizou visitas em Cerejeiras e em contato com outras pessoas foi informado quanto às características do terreno da região. Que considerou essas previsões nas planilhas. Que os equipamentos foram selecionados conforme a necessidade do serviço, e depois a planilha foi repassada à FUNASSA, que concordou com os valores/serviços, sendo que ela também foi ao local confirmar. Que todo seu serviço foi reavaliado pela FUNASA, sem o que os convênios não teriam sido aprovados. Confirma que colocou na planilha acerca da necessidade de materiais de terceira categoria.” A testemunha Josafá Piauí Marreiro disse: “Que trabalhava como superintendente da FUNASA em Rondônia. O Município fazia o projeto que era analisado pela FUNASA e com a aprovação, era encaminhado à Brasília. Que às vezes faziam apontamentos para correção pela Prefeitura. Os técnicos da FUNASA faziam as análises dos projetos, inclusive as planilhas. A fiscalização era feita pelo engenheiro do Município e a FUNASA fazia análise da prestação de conta, que também era feita no local. As parcelas só eram liberadas com a prestação de contas da parcela anterior.” A testemunha Maycon Júnior Barreto disse: “Que é engenheiro civil e foi contratado para fazer um serviço na obra em Cerejeiras a pedido da contratante. Confirmou que foram encontrados materiais de terceira categoria, e também de classes um e dois. Que na primeira investigação foram realizadas 15 perfurações, ocasião em que encontraram materiais de primeira e segunda classe. Na segunda oportunidade (na lagoa), realizaram umas 6 perfurações e encontraram materiais de terceira classe.” O réu Kleyson Orlando foi interrogado e apresentou as seguintes informações: “Que a acusação é falsa. Que a investigação da Polícia Federal quanto aos aspectos técnicos foram deturpadas para o fim de indicar superfaturamento, que não houve. Também não houve recebimento de valores ilícitos por parte da construtora. [...] Confirmou que também participou do projeto executivo da obra. Que recebiam a ordem de serviço e entregavam para a Prefeitura. Acredita que os documentos eram encaminhados à FUNASA para conferir o que era feito. Com isso, o engenheiro MAURÍCIO vinha ao local para conferir. Que estava semanalmente no local da obra. Que sem a aprovação da FUNASA não seria possível a realização de pagamento. Confirma que também fez a fiscalização da obra na empresa BETA. Que na avaliação dos materiais sempre seguia o projeto básico. Que fazia a aferição da obra com base na planilha base, e havia anotações do que efetivamente estava sendo executado. Quanto ao material de terceira categoria, explicou que no projeto básico havia previsão de um valor maior, contudo nas suas aferições o valor foi reduzido em 88%, conforme consta nas suas análises. Como o serviço relacionado ao material rochoso não foi executado em sua maioria, isso justifica o fato de não ter havido muitas fotos. Afirmou que durante o inquérito recebeu um e-mail perguntando sobre o serviço em rocha, ocasião em que enviou fotos, conforme consta no item 36 do laudo da Polícia, que por sua vez afirmou que era possível verificar a existência de material de terceira categoria. Que suas decisões na fiscalização visaram a conclusão da obra, que finalizou com uma quantidade maior de atendimento domiciliar do que o previsto. Que não houve desvio de valores, mas apenas prestação de serviço.” O réu Juscelino Bellincanta afirmou: “Que a acusação é falsa. Não foi realizada nenhuma medição fraudulenta, sendo que estas eram realizadas mensalmente, além da fiscalização da própria empresa. Que as planilhas apresentadas correspondiam ao que estava sendo executado. [...] Confirmou que nas escavações da lagoa foram encontrados materiais de terceira categoria.” Além disso, no laudo n. 0465/2019-SETEC/SR/PF/RO os peritos federais analisaram imagem da escavação de uma das lagoas (fotografia), enviada pelo engenheiro Kleyson, no formato digital, da camada inferior do talude da lagoa, e concluíram pela existência de aspecto de rocha alterada, portanto, compatível com material de 3ª categoria (fotografia 01 Id 2143649896 - Pág. 22). Assim sendo, não existem elementos probatórios contundentes que apontem que houve erro nas medições realizadas pelos réus, tampouco certeza quanto aos métodos utilizados pelos peritos federais para análise de possível superfaturamento por sobrepreço, o que restou confirmado pela perícia técnica particular. Dessa forma, não está comprovada a materialidade delitiva do crime de peculato, consistente em desviar, em proveito próprio ou alheio, dinheiro, valor ou qualquer outro bem público ou particular de que tenha posse em razão do cargo. CRIMES DE CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA (FATOS 2 E 3) Os delitos de corrupção passiva e ativa estão previstos, respectivamente, nos arts. 317 e 333, parágrafo único do Código Penal: Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Art. 333. Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional. É certo que prevalece o entendimento de que, via de regra, os crimes de corrupção passiva e ativa, por estarem previstos em tipos penais distintos e autônomos, são independentes, de modo que a comprovação de um deles não pressupõe a do outro. STJ. 5ª Turma. RHC 52465-PE, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/10/2014 (Info 551). Excepcionalmente, parte da doutrina sustenta que, quando configurar o art. 317 do Código Penal (corrupção passiva) na modalidade “receber", significa que alguém "ofereceu”, modo a também configurar o art. 333 (corrupção ativa), conforme consta na denúncia do caso em questão. No caso dos autos, o principal indício que lastreou a imputação dos delitos de corrupção passiva (Fato 2) e corrupção ativa (Fato 3), consistiu nas operações financeiras entre as empresas Construtora Mosaico Ltda e Ritter Orlando demonstradas no Laudo nº 170/2022- NUTEC/DPF/VLA/RO (Id 1453442376, págs. 3-22) que detalha 30 (trinta) transações entre o Município de Cerejeiras-RO e a CONSTRUTORA MOSAICO e, no mesmo período, notadamente entre março de 2014 e outubro de 2015, 20 (vinte) transferências realizadas pela MOSAICO em favor da empresa RITTER E ORLANDO, as quais perfizeram a quantia de R$ 279.353,72 (duzentos e setenta e nove mil trezentos e cinquenta e três reais e setenta e dois centavos). Contudo, as referidas transferências restaram justificadas nos autos como decorrentes de locação de máquinas da empresa RITTER E ORLANDO para a construtora MOSAICO, o que foi corroborado pelas oitivas realizadas em juízo. A testemunha Willias Conti Soares disse: “Que prestava serviços para o KLEYSON como construtor. Que ele tinha retroescavadeiras, que eram utilizadas nas obras construídas.” A testemunha André Filipi Hoffmam Cardoso afirmou: “[...] Quanto ao aluguel de máquinas, disse que na região não tinha muita disponibilização desse serviço. [...] Confirma que algumas máquinas do KLEYSON foram alugadas para a MOSAICO, mas não só para esta empresa. Que a MOSAICO tinha muitas máquinas. O KLEYSON alugou retroescavadeiras.” A testemunha Klever Kempner Moreira disse: “Que era estagiário da MOSAICO em Cerejeiras, à época. [...] Que o KLEYSON tinha duas máquinas alugadas, que são escassas na região. Que a MOSAICO também tinha outras máquinas. [...].” A testemunha Leandro de Oliveira da Silva afirmou em juízo: “Que o KLEYSON tinha uma máquina que fazia serviços na região, como limpeza de terreno e em propriedades rurais. Que a hora-máquina seria em torno de R$200,00 (duzentos) reais.” A testemunha Doralino Castaman afirmou: “Que conhece o KLEYSON de Cerejeiras. Confirma que ele tinha máquinas para locação, inclusive este também fez alguns serviços para ele [testemunha].” A testemunha André Alves dos Santos Neto disse: “Que conhece o KLEYSON de Cerejeiras. Confirma que ele tinha máquinas e alugava para terceiros, inclusive empresas.” A testemunha Sílvio Braz Marques disse: “Que conhece o KLEYSON de Cerejeiras. Confirma que ele tinha máquinas e alugava para terceiros, inclusive empresas. Que comprou uma máquina do KLEYSON e foi feito um contrato.” A testemunha Lucilene Carvalho Silva disse: “Que é engenheira civil e trabalhou na empresa MOSAICO. Que a tabela utilizada a tabela SINAP, gerida pela Caixa Econômica. Confirmou que foi necessária a realização de algumas locações de máquinas, e que o preço do aluguel geralmente era mensal e variava de acordo com existência de operador ou não da máquina. Confirmou que foi locada retroescavadeira com a empresa RITTER, durante a maior parte de duração da obra. Acredita que à época o valor de locação poderia chegar em torno R$10.000,00 (dez mil reais). Confirmou que existia contrato de locação das máquinas. [...]” A informante Janine Martinez Bellincanta disse: “Que participou como engenheira na obra em Cerejeiras, com participação em todos os setores. Quanto ao pagamento das máquinas, era feito de forma mensal, sendo que cada uma tinha uma ficha para controle. Se recorda que teve uma época que houve uma demanda maior por máquinas, com isso algumas máquinas foram locadas, inclusive de outras cidades. Confirmou que houve locação da empresa RITTER (provavelmente duas). Todas as máquinas locadas tinham um contrato e era feito o controle de recibos. [...].” O réu Kleyson Orlando foi interrogado e apresentou as seguintes informações: “Que a acusação é falsa. Que a investigação da Polícia Federal quanto aos aspectos técnicos foram deturpadas para o fim de indicar superfaturamento, que não houve. Também não houve recebimento de valores ilícitos por parte da construtora. Confirma que recebeu valores decorrentes das locações das suas máquinas para a construtora, conforme a demanda. Que chegou a entrar em contato com a Prefeitura à época procurando informações se poderia locar as máquinas, e obteve resposta positiva. Que as máquinas suas eram duas retroescavadeiras. Que as máquinas maiores (PC’S) não eram suas. Confirmou que foi contratado, por licitação, pela Prefeitura para assessoria de projetos e fiscalização de todas as obras do município de Cerejeiras/RO. Confirmou que acompanhou a maior parte das medições na obra. Que as locações das suas máquinas ocorreram entre 2014 e 2015, conforme a demanda, sendo que também locava para outras pessoas. Todo pagamento era feito com a emissão de nota fiscal, conforme política da própria MOSAICO. Que o valor variava conforme as horas trabalhadas no mês, sendo que a MOSAICO reembolsava os combustíveis. Os valores fixos que aparecem são decorrentes da locação só da máquina, sem o operador. Que havia escassez de locação de máquinas na região, e outras máquinas também foram locadas, de terceiros. [...]” O réu Juscelino Bellincanta afirmou: “[...] Os pagamentos ao KLEYSON foram decorrentes de locação de obras. Também foram alugados outras máquinas e equipamentos, sendo que sempre era feito algum contrato e emitidas notas fiscais. Que se recorda que alugou uma PC de Ji-Paraná. Que se recorda que o KLEYSON trabalhava como fiscal da obra. Que não chegou buscar autorização para a locação das máquinas do KLEYSON, pois seu foco era a execução do projeto. Que havia o pagamento mensal dos trabalhadores e dos prestadores de serviços. [...]” Ainda, os valores de pagamentos constantes na planilha e nos comprovantes de pagamentos apresentados pela defesa (Id 2138558822), observa-se que são correspondentes aos valores relacionados na Tabela 02 do Laudo n. 170/2022 – NUTEC/DPF/VLA/RO (Id 1760585564 – Pág. 449). Desse modo, não restou comprovado se, de fato, JUSCELINO BELLINCANTA, por meio da empresa MOSAICO LTDA, ofereceu e entregou vantagem indevida a KLEYSON ORLANDO, no valor de R$ 279.353,72 (duzentos e setenta e nove mil trezentos e cinquenta e três reais e setenta e dois centavos), mediante transferências bancárias, para que o funcionário público praticasse atos de ofício com infringência aos deveres funcionais. De igual modo, não restou demonstrado de forma cabal que o denunciado KLEYSON ORLANDO, recebeu, por intermédio da empresa RITTER ORLANDO, o valor R$ 279.353,72 (duzentos e setenta e nove mil trezentos e cinquenta e três reais e setenta e dois centavos), como contrapartida à prática de atos de ofício com infração ao seu dever funcional. Conquanto os elementos probatórios colhidos na fase inquisitorial tenham sido suficientes para promover a persecução penal com o oferecimento da denúncia e o recebimento da peça acusatória, as provas produzidas durante a instrução processual são insuficientes para embasar uma sentença condenatória em relação aos delitos previstos no art. 312, caput, e no art. 317, § 1º, c/c art. 327, § 2º, todos do Código Penal, imputados ao réu KLEYSON ORLANDO, art. 312, caput, c/c art. 29 e no art. 333, parágrafo único, todos do Código Penal, imputados ao réu JUSCELINO BELLINCANTA. Evidencia-se necessária, portanto, a absolvição dos acusados, diante da fragilidade dos indícios existentes, com base no princípio in dubio pro reo, que tem fundamentação no princípio constitucional da presunção de inocência, segundo o qual se impõe a absolvição quando a acusação não lograr provar a existência dos crimes. DISPOSITIVO Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a denúncia e, por consequência ABSOLVO os acusados KLEYSON ORLANDO e JUSCELINO BELLINCANTA, quanto aos delitos descritos na denúncia, nos termos do art. 386, inciso II do Código de Processo Penal. Sem custas. Na ausência de recurso tempestivamente interposto, certificado o trânsito em julgado e cumpridas todas as determinações acima descritas, arquivem-se estes autos, com baixa no sistema processual. Intime-se. Cumpra-se. SERVE A PRESENTE COMO CARTA/MANDADO/OFÍCIO/PRECATÓRIA Vilhena/RO, data e assinatura eletrônicas. Juiz Federal
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Processo nº 0004602-65.2012.4.01.4101
ID: 318824164
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0004602-65.2012.4.01.4101
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HULGO MOURA MARTINS
OAB/RO XXXXXX
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MAGUIS UMBERTO CORREIA
OAB/RO XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004602-65.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004602-65.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: AROLDO MARTINS JU…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004602-65.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004602-65.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: AROLDO MARTINS JUNIOR e outros REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MAGUIS UMBERTO CORREIA - RO1214-A e HULGO MOURA MARTINS - RO4042-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0004602-65.2012.4.01.4101 RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelos réus Aroldo Martins Junior, Edilce Machado, Renildo dos Santos Motta contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Ji-Paraná, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva para: a) condenar Edilce Machado por 11 vezes, Aroldo Martins Junior, por 1 vez, na forma do art. 29, c/c art. 71 do Código Penal e Renildo dos Santos Moita, por 13 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, todos, nas penas constantes no art. 304 c/c art. 297, ambos do Código Penal; b) absolver Paulo Prado Gomes quanto à acusação da prática do crime previsto no art. 304 do Código Penal, por ausência de provas para a condenação, na forma do art. 386, V e VII, do Código Penal. A ré Edilce Machado foi condenada à pena de 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de multa correspondente a 258 (duzentos e cinquenta e oito) dias-multa, cada qual fixado em 1 (um) salário mínimo vigente à época da prolação desta sentença. O Juízo a quo deixou de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, com base no art. 44, II, do Código Penal, bem como do art. 77 do CP. O réu Aroldo foi condenado à pena de 8 (oito) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e ao pagamento de multa correspondente a 410 (quatrocentos e dez) dias-multa, cada qual fixado em 1 (um) salário mínimo vigente à época da prolação desta sentença. O Juízo a quo deixou de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, com base no art. 44, ll, do Código Penal. Por sua vez, o réu Renildo foi condenado à pena de 5 (cinco) anos de reclusão, e ao pagamento de multa correspondente a 129 (cento e vinte e nove) dias-multa, cada qual fixado na ½ (metade) do salário-mínimo vigente à época da prolação desta. O Juízo a quo deixou de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, com base no art. 44, ll, do Código Penal (ID. 91642049, fls.191/247). Narra a denúncia que, no ano de 2005, os denunciados Edilce Machado e Aroldo Martins Júnior na qualidade, respectivamente, de sócia-proprietária e contador da pessoa jurídica Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda.- ME; Renildo dos Santos Mota, na condição de representante comercial das empresas M. D. Gualôa e Gilson Fernandes- ME; Paulo César Sepp e Paulo Prado Gomes, na condição, respectivamente, de proprietário de fato e vendedor da pessoa jurídica V. S. da Silva Madeiras usaram Autorizações para Transporte de Produto Florestal - ATPF's falsificadas, documentos públicos emitidos pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, com a finalidade de legalizar o transporte de madeiras extraídas irregularmente. Em suas razões recursais, a defesa de Edilce Machado sustenta a sua absolvição com base na insuficiência de provas para a condenação e na ausência de provas do dolo em sua conduta. Subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria para reduzir a pena ao seu patamar mínimo (ID. 91642050, fls. 31/41). Já a defesa de Renildo dos Santos Moda, em seu apelo, sustenta a ausência de comprovação do delito de uso de documento falso. Subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria para: a) reduzir a pena-base ao seu patamar mínimo; b) diminuir a fração relativa ao aumento da pena pela continuidade delitiva; c) reduzir a pena de multa, em razão das condições financeiras do réu. Por fim, requer a redução do valor da reparação do dano civil (ID. 91642050, fls. 69/76). Por sua vez, a defesa de Aroldo Martins Júnior, argui a inépcia da denúncia por ausência de individualização da sua conduta, violando o art.41 do Código de Processo Penal. Sustenta a sua absolvição com base na ausência de provas de sua autoria. Subsidiariamente, requer a aplicação do princípio da consunção do crime de uso de documento falso pelo crime contra o meio ambiente, uma vez que aquele foi apenas meio para prática do delito ambiental (ID. 91642050, fls. 105/ 116). Com contrarrazões (ID. 91642050, fls. 82/93). O MPF (PRR1) opina pelo provimento das apelações (ID. 91642050, fls. 119/126). É o relatório. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0004602-65.2012.4.01.4101 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Os réus pretendem a reforma da sentença que os condenou pela prática do delito previsto no artigo 304 c/c artigo 297, ambos do Código Penal. Um deles argui a inépcia da denúncia e a aplicação do princípio da consunção do crime de uso de documento falso pelo crime contra o meio ambiente. Alegam, em síntese, as suas respectivas absolvições, com base na insuficiência de provas para a condenação e na ausência de provas do dolo em sua conduta. Subsidiariamente, requerem a reforma da dosimetria. Preliminar A Preliminar de inépcia da denúncia deve ser rejeitada. Segundo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, bem como desta Corte Regional, após a prolação da sentença condenatória, torna-se preclusa a alegação de inépcia da denúncia. Precedentes (STJ, AgRg no HC 768373/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/04/2023, DJe 20/04/2023; Aglnt no AREsp 10460 12/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 16/03/2017, DJe 23/03/2017; TRF1, ACR 0001129-68.2007.4.01.3900, Rel. Desembargador Federal César Jatahy, Quarta Turma, PJe 14/02/2023). Ademais a matéria já está preclusa considerando que a defesa renova discussão já rechaçada pelo juízo, na decisão de recebimento da inicial acusatória. No mais, a exordial descreve detalhadamente o fato criminoso imputado ao acusado, com todas as suas circunstâncias, qualificações dos réus e a classificações dos crimes. Mérito Não há que se falar em aplicação do princípio da consunção entre o crime de uso de documento falso e o crime de recebimento de transporte de madeiras, eis que os delitos são autônomos e os bens jurídicos tutelados são distintos, a saber, a fé pública e o meio ambiente. Note-se que a aplicação do princípio da consunção pressupõe a existência de um delito como fase de preparação ou execução de outro. Contudo, este não é o caso dos autos. Não se pode considerar que o crime de uso de documento falso (artigo 304 c/c artigo 297, ambos do Código Penal) seja fase preparatória para o crime ambiental (artigo 46 da Lei n. 9.605/98), pois a falsificação não teve como fim a venda irregular de madeira, mas sim para dar ares de legalidade ao produto ilegalmente comercializado, conforme narrado na denúncia. Verifico, todavia, que não foi oferecida a denúncia em face dos réus quanto ao crime previsto no artigo 46, parágrafo único da Lei 9.605/1998, em razão da prescrição da pretensão punitiva nos termos do artigo 109, V, do CP, conforme cota do Ministério Público Federal (ID. 91642074, fl. 96). A materialidade e autoria em relação ao crime de uso de documento falso são comprovadas pelo vasto acervo probatório constante dos autos, notadamente: a) Ofícios IBAMA n° 185 e 194/ESREG/Vilhena (ID. 91642075, fl. 14 e ID. 91642075, fl. 50); b) Relatório de distribuição de ATPF's em 2005 (ID. 91642075, fls. 29/32; c) Laudo Pericial (ID. 91642047, fls. 75/83); c) Laudo Pericial de máquina de escrever (ID. 91642048, fls. 54/57; e) Contratos de Compra e Venda e ATPF's (ID. 91642075, fl. 198 ao ID. 91642076, fl. 03); f) Auto de Infração (ID. 91642075, fls. 119/135); g) pelos depoimentos testemunhais (ID. 91642047, fls. 208/209; ID. 91642073, fls. 35/36; ID. 91642073, fls. 141/142; e h) interrogatórios policiais (ID. 91642073, fls. 33/34 e ID. 91642073, fls. 123/124; ID. 91642047, fl.191) e judiciais (ID. 91642049, fl. 33). De acordo com o Laudo Pericial (ID. 91642047, fls.75/83), as APTF's n° 7364937, 7364933, 7364934, 6855148, 6855150, 6875262, 6876242, 6876240, 7741665, 77411715, 7741725, 7741944, 7741976, 7364577, 7364575, 7364573, 7364571, 7583251, 7582425, 7582426, 7582427, 7583253, 7583196, 7583252, 7582428, 7583219, 7583202, constituem contrafações de ATPF's autênticas. Extrai-se dos autos que os réus utilizaram os documentos falsificados nas operações comerciais retratadas (ID. 91642075, fl. 197 ao ID. 91642076, fl. 59), objetivando simular a legalidade à venda de madeira sem licença outorgada pela autoridade competente. Edilce Macedo A ré era sócia-proprietária da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda. O laudo pericial de exame documentoscópico da Policia Federal comprovou a falsificação das ATPFs, sendo que das 39, apenas uma ATPF era autêntica (ID. 91642047, fls.75/83). Já o laudo pericial de máquina de escrever constatou que o preenchimento das referidas ATPFs foi realizado por meio de máquina datilográfica apreendida no escritório de contabilidade do corréu Aroldo Martins Júnior, esposo da ré, havendo nítido conluio entre eles (ID. 91642048, fls. 54/57). Em seu interrogatório policial, a ré informou detalhes a respeito da constituição da pessoa jurídica Curitibanos Indústria e Comércio de Madeiras Ltda., especialmente quanto à data de seu reingresso no quadro societário da empresa e de encerramento das atividades e quanto à forma de aquisição das madeiras descritas nas ATPF's materialmente falsas. Nesse sentido, transcrevo o trecho de seu depoimento (ID. 91642047, fl.191): Que era sócia, juntamente com seu esposo AROLDO MARTINS JÚNIOR, da RAPHAEL COMÉRCIO DE MADEIRAS E MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO LTDA.; QUE constituiu a referida empresa em outubro de 2003; Que em outubro de 2004 vendeu as suas quotas as Elisângelo Fernandes Ribas; Que nesta época a empresa passou a se chamar Curitibanos Comércio e Indústria de Madeira Ltda.; Que em junho de 2005 comprou de ELISANGELO todas as cotas vendidas a este; Que desde agosto de 2005 a empresa Curitibanos encerrou suas atividades de fato em face de multas recebidas pelo IBAMA pela comercialização de madeira sem cobertura; Que sempre foi a depoente que administrou a empresa Curitibanos Comércio e Indústria de Madeira Ltda.; Que era a única responsável pela compra e venda de madeiras da empresa; que a contabilidade era feita pelo escritório de seu marido J. C. ASSESSORIA CONTÁBIl; Que sempre compra madeira serrada de um representante das empresas; Que o representante das madeireiras TIMBORANA, BRAGANTINA e V.C. DA SILVA MADEIRAS -ME era AMARILDO, sendo que este reside em ARIQUEMES/RO; Que não sabe seu nome completo nem seu telefone, tendo já buscado maiores informações sobre sua localização mas não obteve êxito; Que reafirma que nunca comprou madeira diretamente das madeireiras, sempre por intermédio de representantes; Que as ATPF's sempre vinham acompanhando as cargas de madeiras; Que não se recorda quem foi o representante responsável pela negociação das madeiras da empresa MD GUALÔA-ME; Que nunca comprou madeira diretamente da MD GUALÔA - ME. Já em seu interrogatório judicial (ID. 91642049, fl. 33), objetivando afastar a sua autoria, a ré alterou parte da versão dos fatos prestada à autoridade policial, ao afirmar, de forma imprecisa e desacompanhada de qualquer elemento probatório, que atuava em conjunto com seu ex-marido, o corréu Aroldo Martins Júnior, e que só realizava as vendas em balcão, atribuindo a ele as negociações da empresa. Todavia, admitiu que a empresa esteve em seu nome durante dois anos e que trabalhava na empresa Curitibanos ao seu lado de seu ex marido no comércio de madeiras. Acrescentou que eles tinham um depósito na avenida Curitiba e que ela vendia madeira naquela cidade. Não é crível que, na qualidade de sócia-proprietária da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda., a ré Edilce Macedo, com experiência decorrente do exercício de sua atividade comercial, não tivesse ciência da falsidade das ATPF's em questão que acobertaram a aquisição de 200 m³ (duzentos metros cúbicos) de madeiras, conforme o relatório de fiscalização (ID. 91642075, fls. 131/132) e contratos de compra e venda (ID. 91642075, fls. 26 a ID. 91642076, fl. 03). Também não convence a tese de que ela teria comprado uma elevadíssima quantidade de madeira de um desconhecido, sem receber qualquer tipo de garantia e sem tomar conhecimento da identificação da pessoa que lhe vendeu os bens. Além disso, na condição de empresária, responsável pelas compras dos produtos florestais em nome da referida pessoa jurídica, a ré deveria ter o conhecimento mínimo da legislação que envolve a exploração de produtos florestais ou da existência de práticas ilícitas para acobertar a extração ilegal de madeira. Ademais, deveria ter se acautelado com a observância dos requisitos formais e documentais e com a fiscalização do conteúdo da carga adquirida. Do contrário, evidencia-se, no mínimo do dolo eventual da ré, em verdadeira cegueira deliberada e de forma intencional, ao evitar tomar conhecimento da origem ilícita das madeiras. Aroldo Martins Júnior O réu Aroldo Martins Júnior atuou como contador da pessoa jurídica Curitibanos Ind. e Com. de Transporte Ltda., tendo conhecimento das operações comerciais realizadas pela empresa mencionada. Através da busca e apreensão no bojo do RE 015/2006/DPF/VLA/R0 (ID. 91642048, fls. 4/5), a máquina de escrever mecânica da marca Underwood, modelo 298, foi apreendida na sede do escritório da empresa Curitibanos Comércio e Indústria de Madeira Ltda. A prova técnica atestou que foram preenchidos pela aludida máquina, os campos de 09 a 19 (correspondentes, respectivamente, à espécie do produto florestal, especificação, quantidade, unidade de medida, valor, destinatário, município, unidade de federação, número da nota fiscal, meio de transporte e data de emissão) das ATPF's em questão. Em seu depoimento policial, o réu limitou-se a sustentar que qualquer pessoa poderia ter realizado a anotação dos dados nas ATPFs materialmente falsas (ID. 91642073, fls. 123/124). No relatório realizado pelos fiscais do IBAMA na sede da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda. - ME., confeccionado em 31/08/2005, os servidores públicos arrolaram os réus Aroldo Martins Júnior e Edilce Macedo como responsáveis pela empresa (ID. 91642075, fl. 135) e, ao descreverem as atividades executadas na vistoria, indicaram o réu Aroldo Martins como auxiliar da inspeção, demonstrando que ele tinha conhecimento do saldo de pátio da empresa. Além disso, o IBAMA apresentou fichas de controle ambiental, todas elas assinadas pelo réu Aroldo Martins Júnior, em que constam informações sobre as espécies de produtos florestais que deram entrada no pátio da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda., em 10 e 24 de julho e 16 de agosto de 2005 (ID. 91642075, fls. 59/60 e 64/65). Não merece prosperar a tese defensiva no sentido de que o réu não tinha qualquer poder de administração ou conhecimento das atividades da empresa, tampouco a de que qualquer pessoa de seu escritório poderia ter realizado o preenchimento das ATPF's, tendo em vista que ele era contador e responsável pela administração da empresa Curitibanos Com. e Ind. de Madeiras Ltda. – ME. Evidencia-se o dolo do réu através da prova técnica concluindo que parte das ATPFs teve os seus campos de 09 a 19 preenchidos pelo réu, quando, sabidamente, o correto seria a inserção de dados pela empresa vendedora da madeira. Assim, resta comprovado que Aroldo Martins Júnior e Edilce Machado agiram em conluio e planejaram a apresentação das referidas ATPF's contrafeitas ao IBAMA. Renildo Dos Santos Mota A materialidade e autoria do réu Renildo dos Santos Mota está comprovada, em especial, pelos depoimentos de Zulmir Sartor (ID. 91642047, fls. 208/209), sócio-proprietário da pessoa jurídica Sartor e Sartor Ltda.; de José Severino Rocha, representante da empresa Zanardi e Camargo Ltda.; e de Irani Gomes da Silva (ID. 91642073, fls. 35/36), ambos corroborados pelas cópias dos contratos de compra e venda de madeira em lâminas (ID. 91642073, fls. 37/47), demonstrando que o réu Renildo dos Santos Mota se apresentava como representante comercial das pessoas jurídicas Gilson Fernandes - ME e M. D. Gualôa-ME. Zulmar Sartor declarou que as ATPFs 6855148 e 6855150 (ID. 91642076, fl. 4/8) foram negociadas com Renildo e acrescentou que César e Renildo apresentaram um plano de manejo de cerca de 10 (dez) ATPF's em branco, em nome da MADEIREIRA RONDÔNIA – MD GUALÔA – ME. Os referidos contratos de compra e venda firmados entre as pessoas jurídicas Gilson Fernandes - ME, MD Gualôa-ME e Irani Gomes da Silva – ME (ID. 91642073, fls. 37/47), confirmam as declarações da ré Irani no sentido de que ela adquiriu madeira das empresas Gilson Fernandes - ME e MD Gualôa - ME por meio do réu Renildo dos Santos Mota. Além disso, compulsando os aludidos documentos, verifica-se que o réu reconheceu firma no referido negócio jurídico, evidenciando-se o dolo de sua conduta. Resta comprovado, portanto, que o réu Renildo Santos Mota utilizava em suas operações comerciais as ATPF's materialmente falsas. Por fim, evidencia-se o dolo na conduta de todos os apelantes, eis que, de forma livre e consciente da falsidade, concorreram para a inserção, em documentos públicos (ATPFs), de declarações e dados contrafeitos, objetivando alterar a verdade quanto a fatos juridicamente relevantes. Dessa forma, o conjunto probatório demonstra, de modo seguro e suficiente, a materialidade e a autoria delitivas, assim como o dolo na conduta dos réus, referente ao crime de uso de documento falso, nos moldes exigidos pelo art. 304 c/c art. 297 do Código Penal, devendo ser mantidas as condenações dos réus. Quanto à dosimetria, esta merece reparos. É consabido que a pena deve obedecer aos princípios da suficiência e necessidade, de modo a atender ao grau de reprovabilidade da conduta do agente – nem mais, nem menos. A maior ou menor ofensividade do delito vem descrita no próprio tipo penal, quando o legislador comina uma pena mínima e outra, máxima. No intervalo legal entre essa sanção mínima e a máxima devem ser sopesadas as circunstâncias judiciais do caso concreto, não havendo fórmula matemática para tal mister, mas apenas a conduta ilícita perpetrada pelo agente, com todas as suas nuances, que deve ser analisada à luz do princípio do livre convencimento motivado do magistrado, sempre em consonância com os ditames legais do Estatuto Repressivo. Edilce Macedo A pena-base da ré foi afastada do mínimo legal, em razão de três das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem julgadas desfavoráveis, quais sejam: 1- a culpabilidade justificada pelo descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, pelo senso egoístico, causando o prejuízo ambiental, pela obtenção do lucro fácil; 2- os antecedentes criminais, com fundamento na condenação criminal por fato anterior ao objeto destes autos (11/04/2004 e 24/0712005), com trânsito julgado posterior ao ajuizamento desta ação penal (11/07/2017) (ID. 91642049, fl. 128); 3- as consequências, com base no volume total de madeiras declarado nas ATPF's falsas, que alcançou 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos), encontrando-se, dentre elas, espécies de alto valor econômico (jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira), conforme laudo pericial (ID. 91642047, fls.75/83. Assim, o Juízo a quo fixou a pena-base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 141 (cento e quarenta e um) dias-multa. Contudo, a valoração negativa da culpabilidade deve ser afastada, pois os fundamentos utilizados para tanto, a saber, o descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, o senso egoístico, causando o prejuízo ambiental e a obtenção do lucro fácil são, todos, ínsitos ao tipo penal. Dessa forma, afastada a valoração negativa da culpabilidade do agente, a pena- base deve ser reduzida para 3 anos de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Entretanto, presente a agravante de reincidência, conforme certidão (ID 91642049, fls. 43/44), razão pela qual mantenho a fração de aumento da pena em 1/6 e estabeleço a pena intermediária em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 114 (cento e quatorze) dias-multa. Na terceira fase, ausentes as causas de aumento e as de diminuição de pena. Assim, mantenho a pena retro. Considerando que a condenada incorreu na prática de uso de documentos falsos corporificados pelas ATPF's falsas n° 7741665, 77411715, 7741753, 7741714, 7741725, 7741711, 7741944, 7583196, 7583226, 7583219 e 7583202, ou seja, 11 (onze) delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, em conluio com seu marido Amoldo, configura-se a continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplico a fração de 2/3 e elevo a pena para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 190 (cento e noventa) dias- multa. Mantenho o valor do dia-multa à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica da ré. Mantenho o regime inicial de cumprimento da pena fechado, fato diante da reincidência da ré, conforme o art. 33, § 2º, c e §3º do CP. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, II e 77, ambos do CP). Aroldo Martins Junior A pena-base do réu foi afastada do mínimo legal, em razão de quatro das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem julgadas desfavoráveis, quais sejam: 1- a culpabilidade justificada pelo descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, pelo senso egoístico, causando o prejuízo ambiental, pela obtenção do lucro fácil; 2- os antecedentes criminais, com fundamento na condenação criminal por fato anterior ao objeto destes autos (11/04/2004 e 24/0712005), com trânsito julgado posterior ao ajuizamento desta ação penal (11/07/2017) (ID. 91642049, fl. 112); 3- a conduta social com fundamento no comportamento desajustado e alheio às regras e normas legais, não raramente envolvido em procedimentos da seara criminal, demonstrando ter conduta voltada à prática de delito, inclusive ostentando diversos registros de prática de crimes contra o meio ambiente. 4- as consequências, com base no volume total de madeiras declarado nas ATPF's falsas, que alcançou 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos), encontrando-se dentre elas espécies de alto valor econômico (jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira), conforme laudo pericial (ID. 91642047, fls. 75/83. Assim, o Juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 185 (cento e oitenta e cinco) dias-multa. Contudo, a valoração negativa da culpabilidade deve ser afastada, pois os fundamentos utilizados para tanto, a saber, o descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, o senso egoístico, causando o prejuízo ambiental e a obtenção do lucro fácil são, todos, ínsitos ao tipo penal. A valoração negativa da conduta social também deve ser afastada, eis que a condenação anterior não é fundamento idôneo para fundamentá-la. A conduta social consiste no caráter comportamental, revelando-se pelo relacionamento do acusado no meio em que vive, perante a comunidade, a família e os colegas de trabalho. Logo, devem ser valorados o relacionamento familiar, a integração comunitária e a responsabilidade funcional do agente. Ademais, o entendimento jurisprudencial foi pacificado no sentido de que ações penais ou inquéritos policiais em andamento, ou condenações ainda não transitadas em julgado, não podem ser considerados como maus antecedentes, má conduta social, personalidade desajustada e acentuar a culpabilidade do réu, sob pena de malferir o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade. Assim, não podem agravar a pena, conforme se depreende do enunciado da Súmula 444/STJ: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena". Por isso, afasto o desvalor da conduta social. Dessa forma, afastadas as valorações negativas da culpabilidade e da conduta social do agente, a pena-base deve ser reduzida para 3 (três) anos de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Entretanto, presentes as agravantes da reincidência, conforme certidão (ID 91642049, fl. 156); e da violação de dever inerente a profissão (contador) (art. 61, I e II, g, do CP), razão pela qual mantenho a fração de aumento da pena em 1/3 e estabeleço a pena intermediária em 4 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 131 (cento e trinta e um) dias-multa. Na terceira fase, ausentes as causas de aumento e as de diminuição de pena. Assim, mantenho a pena retro. Considerando que o condenado incorreu na prática de uso de documentos falsos corporificados pelas ATPF's falsas n° 7741665, 77411715, 7741753, 7741714, 7741725, 7741711, 7741944, 7583196, 7583226, 7583219 e 7583202, ou seja, 11 (onze) delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, e em conluio com sua esposa Edilce, configura-se a continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplico a fração de 2/3 e elevo a pena para 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 218 (duzentos e dezoito) dias- multa. Mantenho o valor do dia-multa à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica do réu. Mantenho o regime inicial de cumprimento da pena fechado, fato diante da reincidência da ré, conforme o art. 33, § 2º, c e § 3º do CP. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, II e 77, ambos do CP). Renildo dos Santos Motta A pena-base do réu foi afastada do mínimo legal, em razão de duas das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem julgadas desfavoráveis, quais sejam: 1- a culpabilidade justificada pelo descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, pelo senso egoístico, causando o prejuízo ambiental, pela obtenção do lucro fácil; 2- as consequências, com base no volume total de madeiras declarado nas ATPF's falsas, que alcançou 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos), encontrando-se dentre elas espécies de alto valor econômico (jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira), conforme laudo pericial (ID. 91642047, fls.75/83. Assim, o Juízo a quo fixou a pena- base em 3 (três) de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 97 (noventa e sete) dias-multa. Contudo, a valoração negativa da culpabilidade deve ser afastada, pois os fundamentos utilizados para tanto, a saber, o descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, o senso egoístico, causando o prejuízo ambiental e a obtenção do lucro fácil são, todos, ínsitos ao tipo penal. Dessa forma, afastada a valoração negativa da culpabilidade, a pena-base deve ser reduzida para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 54 (cinquenta e quatro) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes e agravantes. Na terceira fase, ausentes as causas de aumento e as de diminuição de pena. Assim, mantenho a pena retro. Considerando que o condenado incorreu na prática de uso de documentos falsos corporificados pelas ATPF's falsas de (ID. 91642075, fls. 197/199, 209/217 e ID. 91642076, FLS. 4 a ID. 91642076, fl. 22), ou seja, 13 (treze) delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, configura-se a continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplico a fração de 2/3 e elevo apena para 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 54 (cinquenta e quatro) dias- multa. Quanto ao pedido da defesa para reduzir a fração de aumento da pena da continuidade delitiva, este não merece prosperar, visto que a fração de 2/3 está em consonância com o entendimento jurisprudencial do STJ e dentro do intervalo de 1/6 a 2/3, previsto no artigo 71 do Código Penal, sendo proporcional à quantidade de infrações praticadas. Ou seja, para a prática de 7 ou mais infrações, aplica-se o aumento de pena em 2/3 (AgRg no Ag no REsp 1367472/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 29.8.2014). Quanto ao pedido de redução do valor da multa, este não tem respaldo, eis que o valor adotado pelo juízo a quo é proporcional à situação econômica do réu. Assim, mantenho o valor do dia-multa à base de 1/2 (metade) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. Mantenho o regime inicial de cumprimento da pena semiaberto, conforme o art. 33, § 2º, b, do CP. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, do CP). Quanto ao pedido para diminuir o valor da condenação por reparação ao dano, este não tem respaldo, tendo em vista que o valor arbitrado em R$ 212.948,35 (duzentos e doze mil, novecentos e quarenta e oito reais e trinta e cinco centavos) tem como fundamento a planilha (ID. 91642047, fls. 80/81) e é proporcional ao volume total de madeiras declarado nas ATPFs falsas, perfazendo o total de 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos). Dentre as essências transportadas encontram-se quatro espécies de alto valor comercial e econômico, quais sejam, jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira, tendo o valor apurado sido de R$ 464.297,14 (quatrocentos e sessenta e quatro mil, duzentos e noventa e sete reais e quatorze centavos), de acordo com o laudo pericial. Ante o exposto, rejeito a preliminar e dou parcial provimento às apelações para diminuir as penas dos réus nos seguintes termos: Edilce Macedo para 5 (cinco) anos, em regime fechado, e 10 (dez) meses de reclusão e 190 (cento e noventa) dias- multa, à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica da ré. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos. Aroldo Martins Junior para 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, e 218 (duzentos e dezoito) dias- multa, à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica do réu. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos. Renildo dos Santos Motta para 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em regime semiaberto e 54 (cinquenta e quatro) dias- multa, à base de 1/2 (metade) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica do réu. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, do CP). É o voto. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004602-65.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004602-65.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) APELANTE: AROLDO MARTINS JUNIOR, EDILCE MACHADO, RENILDO DOS SANTOS MOTTA Advogado do(a) APELANTE: HULGO MOURA MARTINS - RO4042-A Advogado do(a) APELANTE: MAGUIS UMBERTO CORREIA - RO1214-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) VOTO REVISOR O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (Revisor): Adiro aos fundamentos lançados pelo e. Relator em seu judicioso voto. Há nos autos prova suficiente para a condenação. O acervo probatório revela a materialidade delitiva, bem como a autoria e o elemento volitivo dos réus, condenados pelo uso de documentos falsos, em continuidade delitiva. Quanto à dosimetria, concordo igualmente com o e. Relator, no sentido de reduzir as penas que foram impostas, tendo em vista a necessidade de extirpar a valoração negativa da culpabilidade para todos os réus, bem como da conduta social quanto ao réu Aroldo. Ante o exposto, acompanho o e. Relator. É como voto. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Revisor M PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0004602-65.2012.4.01.4101 APELANTE: AROLDO MARTINS JUNIOR, EDILCE MACHADO, RENILDO DOS SANTOS MOTTA Advogado do(a) APELANTE: HULGO MOURA MARTINS - RO4042-A Advogado do(a) APELANTE: MAGUIS UMBERTO CORREIA - RO1214-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) EMENTA PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. ART. 304 C/C O ART. 297 DO CP. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. NÃO CONFIGURADO. DOSIMETRIA. DIMINUIÇÃO DA PENA-BASE. CONTINUIDADE DELITIVA. CONFIGURADA. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. 1. Apelações contra sentença que condenou os réus pela prática do crime de uso de documento falso, previsto no art. 304 c/c art. 297 do Código Penal. A defesa de um dos réus argui a inépcia da denúncia e a aplicação do princípio da consunção do crime de uso de documento falso pelo crime contra o meio ambiente. No mérito, eles alegam, em síntese, as suas respectivas absolvições, com base na insuficiência de provas para a condenação e na ausência de provas do dolo em sua conduta. Subsidiariamente, requerem a reforma da dosimetria. 2. Há cinco questões a serem verificadas: (i) se existe inépcia da denúncia: (ii) deve ser aplicado o princípio da consunção; (iii) se há provas para a condenação; (iv) se há prova do dolo nas condutas; (v) se deve haver a reforma da dosimetria da pena. 3. A preliminar de inépcia da denúncia deve ser rejeitada. Segundo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, bem como desta Corte Regional, após a prolação da sentença condenatória, torna-se preclusa a alegação de inépcia da denúncia. Precedentes ( AgRg no HC 768373/PR, STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 20/04/2023; Aglnt no AREsp 10460 12/RJ, STJ, Rel. Sexta Turma, Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 23/03/2017; ACR 0001129-68.2007.4.01.3900, TRF1, Quarta Turma, Rel. Des. Federal César Jatahy, PJe 14/02/2023). 4. Não há que se falar em aplicação do princípio da consunção entre o crime de uso de documento falso com o crime de recebimento de transporte de madeiras, eis que os delitos são autônomos e os bens jurídicos tutelados são distintos, a saber, a fé pública e o meio ambiente . Ademais, a falsificação não teve como fim a venda irregular de madeira, mas sim dar ares de legalidade ao produto ilegalmente comercializado, conforme narrado na denúncia. 5. A materialidade e autoria delitivas são comprovadas pelo vasto acervo probatório constante dos autos. Extrai-se dos autos que os réus utilizaram os documentos falsificados nas operações comerciais em questão, objetivando simular a legalidade à venda de madeira sem licença outorgada pela autoridade competente. 6. Evidencia-se o dolo na conduta de todos os apelantes, eis que, de forma livre e consciente da falsidade, concorreram para a inserção de declarações e dados contrafeitos em documentos públicos (ATPFs), objetivando alterar a verdade quanto a fatos juridicamente relevantes. Assim, deve ser mantidas as condenações dos réus. 7. Quanto à dosimetria, as penas-base de todos os réus foram redimensionadas, tendo sido afastadas as valorações negativas da culpabilidade, pois os fundamentos utilizados para tanto, são, todos, ínsitos ao tipo penal; bem como a valoração negativa da conduta social, eis que a condenação anterior não é fundamento idôneo para fundamentá-la. 8. Configurada a continuidade delitiva, pois se tratam de delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplica-se a fração de 2/3, que está em consonância com o entendimento jurisprudencial do STJ e dentro do intervalo de 1/6 a 2/3, previsto no artigo 71 do Código Penal, sendo proporcional à quantidade de infrações praticadas (AgRg no Ag no REsp 1.367.472/SC, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Dje 29/08/2014). 9. Inviável a diminuição do valor da condenação por reparação ao dano, tendo em vista que o valor arbitrado em R$ 212.948,35 tem como fundamento a planilha e é proporcional ao volume total de madeiras declarado nas ATPFs falsas, perfazendo o total de 2.434,492 m³. Dentre as essências transportadas encontram-se quatro espécies de alto valor comercial e econômico, quais sejam, jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira, tendo o valor apurado sido de R$ 464.297,14, de acordo com o laudo pericial. 10. Preliminar rejeitada. Apelações parcialmente providas. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar a preliminar e dar parcial provimento às apelações. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 17/06/2025 (data do julgamento). Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator
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Processo nº 0004602-65.2012.4.01.4101
ID: 318824167
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0004602-65.2012.4.01.4101
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HULGO MOURA MARTINS
OAB/RO XXXXXX
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MAGUIS UMBERTO CORREIA
OAB/RO XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004602-65.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004602-65.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: AROLDO MARTINS JU…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004602-65.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004602-65.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: AROLDO MARTINS JUNIOR e outros REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MAGUIS UMBERTO CORREIA - RO1214-A e HULGO MOURA MARTINS - RO4042-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0004602-65.2012.4.01.4101 RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelos réus Aroldo Martins Junior, Edilce Machado, Renildo dos Santos Motta contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Ji-Paraná, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva para: a) condenar Edilce Machado por 11 vezes, Aroldo Martins Junior, por 1 vez, na forma do art. 29, c/c art. 71 do Código Penal e Renildo dos Santos Moita, por 13 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, todos, nas penas constantes no art. 304 c/c art. 297, ambos do Código Penal; b) absolver Paulo Prado Gomes quanto à acusação da prática do crime previsto no art. 304 do Código Penal, por ausência de provas para a condenação, na forma do art. 386, V e VII, do Código Penal. A ré Edilce Machado foi condenada à pena de 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de multa correspondente a 258 (duzentos e cinquenta e oito) dias-multa, cada qual fixado em 1 (um) salário mínimo vigente à época da prolação desta sentença. O Juízo a quo deixou de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, com base no art. 44, II, do Código Penal, bem como do art. 77 do CP. O réu Aroldo foi condenado à pena de 8 (oito) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e ao pagamento de multa correspondente a 410 (quatrocentos e dez) dias-multa, cada qual fixado em 1 (um) salário mínimo vigente à época da prolação desta sentença. O Juízo a quo deixou de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, com base no art. 44, ll, do Código Penal. Por sua vez, o réu Renildo foi condenado à pena de 5 (cinco) anos de reclusão, e ao pagamento de multa correspondente a 129 (cento e vinte e nove) dias-multa, cada qual fixado na ½ (metade) do salário-mínimo vigente à época da prolação desta. O Juízo a quo deixou de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, com base no art. 44, ll, do Código Penal (ID. 91642049, fls.191/247). Narra a denúncia que, no ano de 2005, os denunciados Edilce Machado e Aroldo Martins Júnior na qualidade, respectivamente, de sócia-proprietária e contador da pessoa jurídica Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda.- ME; Renildo dos Santos Mota, na condição de representante comercial das empresas M. D. Gualôa e Gilson Fernandes- ME; Paulo César Sepp e Paulo Prado Gomes, na condição, respectivamente, de proprietário de fato e vendedor da pessoa jurídica V. S. da Silva Madeiras usaram Autorizações para Transporte de Produto Florestal - ATPF's falsificadas, documentos públicos emitidos pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, com a finalidade de legalizar o transporte de madeiras extraídas irregularmente. Em suas razões recursais, a defesa de Edilce Machado sustenta a sua absolvição com base na insuficiência de provas para a condenação e na ausência de provas do dolo em sua conduta. Subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria para reduzir a pena ao seu patamar mínimo (ID. 91642050, fls. 31/41). Já a defesa de Renildo dos Santos Moda, em seu apelo, sustenta a ausência de comprovação do delito de uso de documento falso. Subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria para: a) reduzir a pena-base ao seu patamar mínimo; b) diminuir a fração relativa ao aumento da pena pela continuidade delitiva; c) reduzir a pena de multa, em razão das condições financeiras do réu. Por fim, requer a redução do valor da reparação do dano civil (ID. 91642050, fls. 69/76). Por sua vez, a defesa de Aroldo Martins Júnior, argui a inépcia da denúncia por ausência de individualização da sua conduta, violando o art.41 do Código de Processo Penal. Sustenta a sua absolvição com base na ausência de provas de sua autoria. Subsidiariamente, requer a aplicação do princípio da consunção do crime de uso de documento falso pelo crime contra o meio ambiente, uma vez que aquele foi apenas meio para prática do delito ambiental (ID. 91642050, fls. 105/ 116). Com contrarrazões (ID. 91642050, fls. 82/93). O MPF (PRR1) opina pelo provimento das apelações (ID. 91642050, fls. 119/126). É o relatório. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0004602-65.2012.4.01.4101 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Os réus pretendem a reforma da sentença que os condenou pela prática do delito previsto no artigo 304 c/c artigo 297, ambos do Código Penal. Um deles argui a inépcia da denúncia e a aplicação do princípio da consunção do crime de uso de documento falso pelo crime contra o meio ambiente. Alegam, em síntese, as suas respectivas absolvições, com base na insuficiência de provas para a condenação e na ausência de provas do dolo em sua conduta. Subsidiariamente, requerem a reforma da dosimetria. Preliminar A Preliminar de inépcia da denúncia deve ser rejeitada. Segundo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, bem como desta Corte Regional, após a prolação da sentença condenatória, torna-se preclusa a alegação de inépcia da denúncia. Precedentes (STJ, AgRg no HC 768373/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/04/2023, DJe 20/04/2023; Aglnt no AREsp 10460 12/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 16/03/2017, DJe 23/03/2017; TRF1, ACR 0001129-68.2007.4.01.3900, Rel. Desembargador Federal César Jatahy, Quarta Turma, PJe 14/02/2023). Ademais a matéria já está preclusa considerando que a defesa renova discussão já rechaçada pelo juízo, na decisão de recebimento da inicial acusatória. No mais, a exordial descreve detalhadamente o fato criminoso imputado ao acusado, com todas as suas circunstâncias, qualificações dos réus e a classificações dos crimes. Mérito Não há que se falar em aplicação do princípio da consunção entre o crime de uso de documento falso e o crime de recebimento de transporte de madeiras, eis que os delitos são autônomos e os bens jurídicos tutelados são distintos, a saber, a fé pública e o meio ambiente. Note-se que a aplicação do princípio da consunção pressupõe a existência de um delito como fase de preparação ou execução de outro. Contudo, este não é o caso dos autos. Não se pode considerar que o crime de uso de documento falso (artigo 304 c/c artigo 297, ambos do Código Penal) seja fase preparatória para o crime ambiental (artigo 46 da Lei n. 9.605/98), pois a falsificação não teve como fim a venda irregular de madeira, mas sim para dar ares de legalidade ao produto ilegalmente comercializado, conforme narrado na denúncia. Verifico, todavia, que não foi oferecida a denúncia em face dos réus quanto ao crime previsto no artigo 46, parágrafo único da Lei 9.605/1998, em razão da prescrição da pretensão punitiva nos termos do artigo 109, V, do CP, conforme cota do Ministério Público Federal (ID. 91642074, fl. 96). A materialidade e autoria em relação ao crime de uso de documento falso são comprovadas pelo vasto acervo probatório constante dos autos, notadamente: a) Ofícios IBAMA n° 185 e 194/ESREG/Vilhena (ID. 91642075, fl. 14 e ID. 91642075, fl. 50); b) Relatório de distribuição de ATPF's em 2005 (ID. 91642075, fls. 29/32; c) Laudo Pericial (ID. 91642047, fls. 75/83); c) Laudo Pericial de máquina de escrever (ID. 91642048, fls. 54/57; e) Contratos de Compra e Venda e ATPF's (ID. 91642075, fl. 198 ao ID. 91642076, fl. 03); f) Auto de Infração (ID. 91642075, fls. 119/135); g) pelos depoimentos testemunhais (ID. 91642047, fls. 208/209; ID. 91642073, fls. 35/36; ID. 91642073, fls. 141/142; e h) interrogatórios policiais (ID. 91642073, fls. 33/34 e ID. 91642073, fls. 123/124; ID. 91642047, fl.191) e judiciais (ID. 91642049, fl. 33). De acordo com o Laudo Pericial (ID. 91642047, fls.75/83), as APTF's n° 7364937, 7364933, 7364934, 6855148, 6855150, 6875262, 6876242, 6876240, 7741665, 77411715, 7741725, 7741944, 7741976, 7364577, 7364575, 7364573, 7364571, 7583251, 7582425, 7582426, 7582427, 7583253, 7583196, 7583252, 7582428, 7583219, 7583202, constituem contrafações de ATPF's autênticas. Extrai-se dos autos que os réus utilizaram os documentos falsificados nas operações comerciais retratadas (ID. 91642075, fl. 197 ao ID. 91642076, fl. 59), objetivando simular a legalidade à venda de madeira sem licença outorgada pela autoridade competente. Edilce Macedo A ré era sócia-proprietária da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda. O laudo pericial de exame documentoscópico da Policia Federal comprovou a falsificação das ATPFs, sendo que das 39, apenas uma ATPF era autêntica (ID. 91642047, fls.75/83). Já o laudo pericial de máquina de escrever constatou que o preenchimento das referidas ATPFs foi realizado por meio de máquina datilográfica apreendida no escritório de contabilidade do corréu Aroldo Martins Júnior, esposo da ré, havendo nítido conluio entre eles (ID. 91642048, fls. 54/57). Em seu interrogatório policial, a ré informou detalhes a respeito da constituição da pessoa jurídica Curitibanos Indústria e Comércio de Madeiras Ltda., especialmente quanto à data de seu reingresso no quadro societário da empresa e de encerramento das atividades e quanto à forma de aquisição das madeiras descritas nas ATPF's materialmente falsas. Nesse sentido, transcrevo o trecho de seu depoimento (ID. 91642047, fl.191): Que era sócia, juntamente com seu esposo AROLDO MARTINS JÚNIOR, da RAPHAEL COMÉRCIO DE MADEIRAS E MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO LTDA.; QUE constituiu a referida empresa em outubro de 2003; Que em outubro de 2004 vendeu as suas quotas as Elisângelo Fernandes Ribas; Que nesta época a empresa passou a se chamar Curitibanos Comércio e Indústria de Madeira Ltda.; Que em junho de 2005 comprou de ELISANGELO todas as cotas vendidas a este; Que desde agosto de 2005 a empresa Curitibanos encerrou suas atividades de fato em face de multas recebidas pelo IBAMA pela comercialização de madeira sem cobertura; Que sempre foi a depoente que administrou a empresa Curitibanos Comércio e Indústria de Madeira Ltda.; Que era a única responsável pela compra e venda de madeiras da empresa; que a contabilidade era feita pelo escritório de seu marido J. C. ASSESSORIA CONTÁBIl; Que sempre compra madeira serrada de um representante das empresas; Que o representante das madeireiras TIMBORANA, BRAGANTINA e V.C. DA SILVA MADEIRAS -ME era AMARILDO, sendo que este reside em ARIQUEMES/RO; Que não sabe seu nome completo nem seu telefone, tendo já buscado maiores informações sobre sua localização mas não obteve êxito; Que reafirma que nunca comprou madeira diretamente das madeireiras, sempre por intermédio de representantes; Que as ATPF's sempre vinham acompanhando as cargas de madeiras; Que não se recorda quem foi o representante responsável pela negociação das madeiras da empresa MD GUALÔA-ME; Que nunca comprou madeira diretamente da MD GUALÔA - ME. Já em seu interrogatório judicial (ID. 91642049, fl. 33), objetivando afastar a sua autoria, a ré alterou parte da versão dos fatos prestada à autoridade policial, ao afirmar, de forma imprecisa e desacompanhada de qualquer elemento probatório, que atuava em conjunto com seu ex-marido, o corréu Aroldo Martins Júnior, e que só realizava as vendas em balcão, atribuindo a ele as negociações da empresa. Todavia, admitiu que a empresa esteve em seu nome durante dois anos e que trabalhava na empresa Curitibanos ao seu lado de seu ex marido no comércio de madeiras. Acrescentou que eles tinham um depósito na avenida Curitiba e que ela vendia madeira naquela cidade. Não é crível que, na qualidade de sócia-proprietária da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda., a ré Edilce Macedo, com experiência decorrente do exercício de sua atividade comercial, não tivesse ciência da falsidade das ATPF's em questão que acobertaram a aquisição de 200 m³ (duzentos metros cúbicos) de madeiras, conforme o relatório de fiscalização (ID. 91642075, fls. 131/132) e contratos de compra e venda (ID. 91642075, fls. 26 a ID. 91642076, fl. 03). Também não convence a tese de que ela teria comprado uma elevadíssima quantidade de madeira de um desconhecido, sem receber qualquer tipo de garantia e sem tomar conhecimento da identificação da pessoa que lhe vendeu os bens. Além disso, na condição de empresária, responsável pelas compras dos produtos florestais em nome da referida pessoa jurídica, a ré deveria ter o conhecimento mínimo da legislação que envolve a exploração de produtos florestais ou da existência de práticas ilícitas para acobertar a extração ilegal de madeira. Ademais, deveria ter se acautelado com a observância dos requisitos formais e documentais e com a fiscalização do conteúdo da carga adquirida. Do contrário, evidencia-se, no mínimo do dolo eventual da ré, em verdadeira cegueira deliberada e de forma intencional, ao evitar tomar conhecimento da origem ilícita das madeiras. Aroldo Martins Júnior O réu Aroldo Martins Júnior atuou como contador da pessoa jurídica Curitibanos Ind. e Com. de Transporte Ltda., tendo conhecimento das operações comerciais realizadas pela empresa mencionada. Através da busca e apreensão no bojo do RE 015/2006/DPF/VLA/R0 (ID. 91642048, fls. 4/5), a máquina de escrever mecânica da marca Underwood, modelo 298, foi apreendida na sede do escritório da empresa Curitibanos Comércio e Indústria de Madeira Ltda. A prova técnica atestou que foram preenchidos pela aludida máquina, os campos de 09 a 19 (correspondentes, respectivamente, à espécie do produto florestal, especificação, quantidade, unidade de medida, valor, destinatário, município, unidade de federação, número da nota fiscal, meio de transporte e data de emissão) das ATPF's em questão. Em seu depoimento policial, o réu limitou-se a sustentar que qualquer pessoa poderia ter realizado a anotação dos dados nas ATPFs materialmente falsas (ID. 91642073, fls. 123/124). No relatório realizado pelos fiscais do IBAMA na sede da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda. - ME., confeccionado em 31/08/2005, os servidores públicos arrolaram os réus Aroldo Martins Júnior e Edilce Macedo como responsáveis pela empresa (ID. 91642075, fl. 135) e, ao descreverem as atividades executadas na vistoria, indicaram o réu Aroldo Martins como auxiliar da inspeção, demonstrando que ele tinha conhecimento do saldo de pátio da empresa. Além disso, o IBAMA apresentou fichas de controle ambiental, todas elas assinadas pelo réu Aroldo Martins Júnior, em que constam informações sobre as espécies de produtos florestais que deram entrada no pátio da empresa Curitibanos Ind. e Com. de Madeiras Ltda., em 10 e 24 de julho e 16 de agosto de 2005 (ID. 91642075, fls. 59/60 e 64/65). Não merece prosperar a tese defensiva no sentido de que o réu não tinha qualquer poder de administração ou conhecimento das atividades da empresa, tampouco a de que qualquer pessoa de seu escritório poderia ter realizado o preenchimento das ATPF's, tendo em vista que ele era contador e responsável pela administração da empresa Curitibanos Com. e Ind. de Madeiras Ltda. – ME. Evidencia-se o dolo do réu através da prova técnica concluindo que parte das ATPFs teve os seus campos de 09 a 19 preenchidos pelo réu, quando, sabidamente, o correto seria a inserção de dados pela empresa vendedora da madeira. Assim, resta comprovado que Aroldo Martins Júnior e Edilce Machado agiram em conluio e planejaram a apresentação das referidas ATPF's contrafeitas ao IBAMA. Renildo Dos Santos Mota A materialidade e autoria do réu Renildo dos Santos Mota está comprovada, em especial, pelos depoimentos de Zulmir Sartor (ID. 91642047, fls. 208/209), sócio-proprietário da pessoa jurídica Sartor e Sartor Ltda.; de José Severino Rocha, representante da empresa Zanardi e Camargo Ltda.; e de Irani Gomes da Silva (ID. 91642073, fls. 35/36), ambos corroborados pelas cópias dos contratos de compra e venda de madeira em lâminas (ID. 91642073, fls. 37/47), demonstrando que o réu Renildo dos Santos Mota se apresentava como representante comercial das pessoas jurídicas Gilson Fernandes - ME e M. D. Gualôa-ME. Zulmar Sartor declarou que as ATPFs 6855148 e 6855150 (ID. 91642076, fl. 4/8) foram negociadas com Renildo e acrescentou que César e Renildo apresentaram um plano de manejo de cerca de 10 (dez) ATPF's em branco, em nome da MADEIREIRA RONDÔNIA – MD GUALÔA – ME. Os referidos contratos de compra e venda firmados entre as pessoas jurídicas Gilson Fernandes - ME, MD Gualôa-ME e Irani Gomes da Silva – ME (ID. 91642073, fls. 37/47), confirmam as declarações da ré Irani no sentido de que ela adquiriu madeira das empresas Gilson Fernandes - ME e MD Gualôa - ME por meio do réu Renildo dos Santos Mota. Além disso, compulsando os aludidos documentos, verifica-se que o réu reconheceu firma no referido negócio jurídico, evidenciando-se o dolo de sua conduta. Resta comprovado, portanto, que o réu Renildo Santos Mota utilizava em suas operações comerciais as ATPF's materialmente falsas. Por fim, evidencia-se o dolo na conduta de todos os apelantes, eis que, de forma livre e consciente da falsidade, concorreram para a inserção, em documentos públicos (ATPFs), de declarações e dados contrafeitos, objetivando alterar a verdade quanto a fatos juridicamente relevantes. Dessa forma, o conjunto probatório demonstra, de modo seguro e suficiente, a materialidade e a autoria delitivas, assim como o dolo na conduta dos réus, referente ao crime de uso de documento falso, nos moldes exigidos pelo art. 304 c/c art. 297 do Código Penal, devendo ser mantidas as condenações dos réus. Quanto à dosimetria, esta merece reparos. É consabido que a pena deve obedecer aos princípios da suficiência e necessidade, de modo a atender ao grau de reprovabilidade da conduta do agente – nem mais, nem menos. A maior ou menor ofensividade do delito vem descrita no próprio tipo penal, quando o legislador comina uma pena mínima e outra, máxima. No intervalo legal entre essa sanção mínima e a máxima devem ser sopesadas as circunstâncias judiciais do caso concreto, não havendo fórmula matemática para tal mister, mas apenas a conduta ilícita perpetrada pelo agente, com todas as suas nuances, que deve ser analisada à luz do princípio do livre convencimento motivado do magistrado, sempre em consonância com os ditames legais do Estatuto Repressivo. Edilce Macedo A pena-base da ré foi afastada do mínimo legal, em razão de três das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem julgadas desfavoráveis, quais sejam: 1- a culpabilidade justificada pelo descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, pelo senso egoístico, causando o prejuízo ambiental, pela obtenção do lucro fácil; 2- os antecedentes criminais, com fundamento na condenação criminal por fato anterior ao objeto destes autos (11/04/2004 e 24/0712005), com trânsito julgado posterior ao ajuizamento desta ação penal (11/07/2017) (ID. 91642049, fl. 128); 3- as consequências, com base no volume total de madeiras declarado nas ATPF's falsas, que alcançou 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos), encontrando-se, dentre elas, espécies de alto valor econômico (jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira), conforme laudo pericial (ID. 91642047, fls.75/83. Assim, o Juízo a quo fixou a pena-base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 141 (cento e quarenta e um) dias-multa. Contudo, a valoração negativa da culpabilidade deve ser afastada, pois os fundamentos utilizados para tanto, a saber, o descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, o senso egoístico, causando o prejuízo ambiental e a obtenção do lucro fácil são, todos, ínsitos ao tipo penal. Dessa forma, afastada a valoração negativa da culpabilidade do agente, a pena- base deve ser reduzida para 3 anos de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Entretanto, presente a agravante de reincidência, conforme certidão (ID 91642049, fls. 43/44), razão pela qual mantenho a fração de aumento da pena em 1/6 e estabeleço a pena intermediária em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 114 (cento e quatorze) dias-multa. Na terceira fase, ausentes as causas de aumento e as de diminuição de pena. Assim, mantenho a pena retro. Considerando que a condenada incorreu na prática de uso de documentos falsos corporificados pelas ATPF's falsas n° 7741665, 77411715, 7741753, 7741714, 7741725, 7741711, 7741944, 7583196, 7583226, 7583219 e 7583202, ou seja, 11 (onze) delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, em conluio com seu marido Amoldo, configura-se a continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplico a fração de 2/3 e elevo a pena para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 190 (cento e noventa) dias- multa. Mantenho o valor do dia-multa à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica da ré. Mantenho o regime inicial de cumprimento da pena fechado, fato diante da reincidência da ré, conforme o art. 33, § 2º, c e §3º do CP. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, II e 77, ambos do CP). Aroldo Martins Junior A pena-base do réu foi afastada do mínimo legal, em razão de quatro das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem julgadas desfavoráveis, quais sejam: 1- a culpabilidade justificada pelo descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, pelo senso egoístico, causando o prejuízo ambiental, pela obtenção do lucro fácil; 2- os antecedentes criminais, com fundamento na condenação criminal por fato anterior ao objeto destes autos (11/04/2004 e 24/0712005), com trânsito julgado posterior ao ajuizamento desta ação penal (11/07/2017) (ID. 91642049, fl. 112); 3- a conduta social com fundamento no comportamento desajustado e alheio às regras e normas legais, não raramente envolvido em procedimentos da seara criminal, demonstrando ter conduta voltada à prática de delito, inclusive ostentando diversos registros de prática de crimes contra o meio ambiente. 4- as consequências, com base no volume total de madeiras declarado nas ATPF's falsas, que alcançou 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos), encontrando-se dentre elas espécies de alto valor econômico (jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira), conforme laudo pericial (ID. 91642047, fls. 75/83. Assim, o Juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 185 (cento e oitenta e cinco) dias-multa. Contudo, a valoração negativa da culpabilidade deve ser afastada, pois os fundamentos utilizados para tanto, a saber, o descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, o senso egoístico, causando o prejuízo ambiental e a obtenção do lucro fácil são, todos, ínsitos ao tipo penal. A valoração negativa da conduta social também deve ser afastada, eis que a condenação anterior não é fundamento idôneo para fundamentá-la. A conduta social consiste no caráter comportamental, revelando-se pelo relacionamento do acusado no meio em que vive, perante a comunidade, a família e os colegas de trabalho. Logo, devem ser valorados o relacionamento familiar, a integração comunitária e a responsabilidade funcional do agente. Ademais, o entendimento jurisprudencial foi pacificado no sentido de que ações penais ou inquéritos policiais em andamento, ou condenações ainda não transitadas em julgado, não podem ser considerados como maus antecedentes, má conduta social, personalidade desajustada e acentuar a culpabilidade do réu, sob pena de malferir o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade. Assim, não podem agravar a pena, conforme se depreende do enunciado da Súmula 444/STJ: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena". Por isso, afasto o desvalor da conduta social. Dessa forma, afastadas as valorações negativas da culpabilidade e da conduta social do agente, a pena-base deve ser reduzida para 3 (três) anos de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Entretanto, presentes as agravantes da reincidência, conforme certidão (ID 91642049, fl. 156); e da violação de dever inerente a profissão (contador) (art. 61, I e II, g, do CP), razão pela qual mantenho a fração de aumento da pena em 1/3 e estabeleço a pena intermediária em 4 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 131 (cento e trinta e um) dias-multa. Na terceira fase, ausentes as causas de aumento e as de diminuição de pena. Assim, mantenho a pena retro. Considerando que o condenado incorreu na prática de uso de documentos falsos corporificados pelas ATPF's falsas n° 7741665, 77411715, 7741753, 7741714, 7741725, 7741711, 7741944, 7583196, 7583226, 7583219 e 7583202, ou seja, 11 (onze) delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, e em conluio com sua esposa Edilce, configura-se a continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplico a fração de 2/3 e elevo a pena para 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 218 (duzentos e dezoito) dias- multa. Mantenho o valor do dia-multa à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica do réu. Mantenho o regime inicial de cumprimento da pena fechado, fato diante da reincidência da ré, conforme o art. 33, § 2º, c e § 3º do CP. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, II e 77, ambos do CP). Renildo dos Santos Motta A pena-base do réu foi afastada do mínimo legal, em razão de duas das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem julgadas desfavoráveis, quais sejam: 1- a culpabilidade justificada pelo descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, pelo senso egoístico, causando o prejuízo ambiental, pela obtenção do lucro fácil; 2- as consequências, com base no volume total de madeiras declarado nas ATPF's falsas, que alcançou 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos), encontrando-se dentre elas espécies de alto valor econômico (jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira), conforme laudo pericial (ID. 91642047, fls.75/83. Assim, o Juízo a quo fixou a pena- base em 3 (três) de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 97 (noventa e sete) dias-multa. Contudo, a valoração negativa da culpabilidade deve ser afastada, pois os fundamentos utilizados para tanto, a saber, o descumprimento do dever a todos imposto de não causar degradação ambiental, o senso egoístico, causando o prejuízo ambiental e a obtenção do lucro fácil são, todos, ínsitos ao tipo penal. Dessa forma, afastada a valoração negativa da culpabilidade, a pena-base deve ser reduzida para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de multa correspondente a 54 (cinquenta e quatro) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes e agravantes. Na terceira fase, ausentes as causas de aumento e as de diminuição de pena. Assim, mantenho a pena retro. Considerando que o condenado incorreu na prática de uso de documentos falsos corporificados pelas ATPF's falsas de (ID. 91642075, fls. 197/199, 209/217 e ID. 91642076, FLS. 4 a ID. 91642076, fl. 22), ou seja, 13 (treze) delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, configura-se a continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplico a fração de 2/3 e elevo apena para 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 54 (cinquenta e quatro) dias- multa. Quanto ao pedido da defesa para reduzir a fração de aumento da pena da continuidade delitiva, este não merece prosperar, visto que a fração de 2/3 está em consonância com o entendimento jurisprudencial do STJ e dentro do intervalo de 1/6 a 2/3, previsto no artigo 71 do Código Penal, sendo proporcional à quantidade de infrações praticadas. Ou seja, para a prática de 7 ou mais infrações, aplica-se o aumento de pena em 2/3 (AgRg no Ag no REsp 1367472/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 29.8.2014). Quanto ao pedido de redução do valor da multa, este não tem respaldo, eis que o valor adotado pelo juízo a quo é proporcional à situação econômica do réu. Assim, mantenho o valor do dia-multa à base de 1/2 (metade) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. Mantenho o regime inicial de cumprimento da pena semiaberto, conforme o art. 33, § 2º, b, do CP. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, do CP). Quanto ao pedido para diminuir o valor da condenação por reparação ao dano, este não tem respaldo, tendo em vista que o valor arbitrado em R$ 212.948,35 (duzentos e doze mil, novecentos e quarenta e oito reais e trinta e cinco centavos) tem como fundamento a planilha (ID. 91642047, fls. 80/81) e é proporcional ao volume total de madeiras declarado nas ATPFs falsas, perfazendo o total de 2.434,492 m³ (dois mil quatrocentos e trinta e metros cúbicos e quatrocentos e noventa e dois centímetros cúbicos). Dentre as essências transportadas encontram-se quatro espécies de alto valor comercial e econômico, quais sejam, jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira, tendo o valor apurado sido de R$ 464.297,14 (quatrocentos e sessenta e quatro mil, duzentos e noventa e sete reais e quatorze centavos), de acordo com o laudo pericial. Ante o exposto, rejeito a preliminar e dou parcial provimento às apelações para diminuir as penas dos réus nos seguintes termos: Edilce Macedo para 5 (cinco) anos, em regime fechado, e 10 (dez) meses de reclusão e 190 (cento e noventa) dias- multa, à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica da ré. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos. Aroldo Martins Junior para 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, e 218 (duzentos e dezoito) dias- multa, à base de 1 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica do réu. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos. Renildo dos Santos Motta para 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em regime semiaberto e 54 (cinquenta e quatro) dias- multa, à base de 1/2 (metade) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, proporcional à situação econômica do réu. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (arts. 44, do CP). É o voto. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004602-65.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004602-65.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) APELANTE: AROLDO MARTINS JUNIOR, EDILCE MACHADO, RENILDO DOS SANTOS MOTTA Advogado do(a) APELANTE: HULGO MOURA MARTINS - RO4042-A Advogado do(a) APELANTE: MAGUIS UMBERTO CORREIA - RO1214-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) VOTO REVISOR O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (Revisor): Adiro aos fundamentos lançados pelo e. Relator em seu judicioso voto. Há nos autos prova suficiente para a condenação. O acervo probatório revela a materialidade delitiva, bem como a autoria e o elemento volitivo dos réus, condenados pelo uso de documentos falsos, em continuidade delitiva. Quanto à dosimetria, concordo igualmente com o e. Relator, no sentido de reduzir as penas que foram impostas, tendo em vista a necessidade de extirpar a valoração negativa da culpabilidade para todos os réus, bem como da conduta social quanto ao réu Aroldo. Ante o exposto, acompanho o e. Relator. É como voto. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Revisor M PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0004602-65.2012.4.01.4101 APELANTE: AROLDO MARTINS JUNIOR, EDILCE MACHADO, RENILDO DOS SANTOS MOTTA Advogado do(a) APELANTE: HULGO MOURA MARTINS - RO4042-A Advogado do(a) APELANTE: MAGUIS UMBERTO CORREIA - RO1214-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) EMENTA PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. ART. 304 C/C O ART. 297 DO CP. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. NÃO CONFIGURADO. DOSIMETRIA. DIMINUIÇÃO DA PENA-BASE. CONTINUIDADE DELITIVA. CONFIGURADA. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. 1. Apelações contra sentença que condenou os réus pela prática do crime de uso de documento falso, previsto no art. 304 c/c art. 297 do Código Penal. A defesa de um dos réus argui a inépcia da denúncia e a aplicação do princípio da consunção do crime de uso de documento falso pelo crime contra o meio ambiente. No mérito, eles alegam, em síntese, as suas respectivas absolvições, com base na insuficiência de provas para a condenação e na ausência de provas do dolo em sua conduta. Subsidiariamente, requerem a reforma da dosimetria. 2. Há cinco questões a serem verificadas: (i) se existe inépcia da denúncia: (ii) deve ser aplicado o princípio da consunção; (iii) se há provas para a condenação; (iv) se há prova do dolo nas condutas; (v) se deve haver a reforma da dosimetria da pena. 3. A preliminar de inépcia da denúncia deve ser rejeitada. Segundo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, bem como desta Corte Regional, após a prolação da sentença condenatória, torna-se preclusa a alegação de inépcia da denúncia. Precedentes ( AgRg no HC 768373/PR, STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 20/04/2023; Aglnt no AREsp 10460 12/RJ, STJ, Rel. Sexta Turma, Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 23/03/2017; ACR 0001129-68.2007.4.01.3900, TRF1, Quarta Turma, Rel. Des. Federal César Jatahy, PJe 14/02/2023). 4. Não há que se falar em aplicação do princípio da consunção entre o crime de uso de documento falso com o crime de recebimento de transporte de madeiras, eis que os delitos são autônomos e os bens jurídicos tutelados são distintos, a saber, a fé pública e o meio ambiente . Ademais, a falsificação não teve como fim a venda irregular de madeira, mas sim dar ares de legalidade ao produto ilegalmente comercializado, conforme narrado na denúncia. 5. A materialidade e autoria delitivas são comprovadas pelo vasto acervo probatório constante dos autos. Extrai-se dos autos que os réus utilizaram os documentos falsificados nas operações comerciais em questão, objetivando simular a legalidade à venda de madeira sem licença outorgada pela autoridade competente. 6. Evidencia-se o dolo na conduta de todos os apelantes, eis que, de forma livre e consciente da falsidade, concorreram para a inserção de declarações e dados contrafeitos em documentos públicos (ATPFs), objetivando alterar a verdade quanto a fatos juridicamente relevantes. Assim, deve ser mantidas as condenações dos réus. 7. Quanto à dosimetria, as penas-base de todos os réus foram redimensionadas, tendo sido afastadas as valorações negativas da culpabilidade, pois os fundamentos utilizados para tanto, são, todos, ínsitos ao tipo penal; bem como a valoração negativa da conduta social, eis que a condenação anterior não é fundamento idôneo para fundamentá-la. 8. Configurada a continuidade delitiva, pois se tratam de delitos da mesma espécie, praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução (art. 71 do Código Penal), razão pela qual, aplica-se a fração de 2/3, que está em consonância com o entendimento jurisprudencial do STJ e dentro do intervalo de 1/6 a 2/3, previsto no artigo 71 do Código Penal, sendo proporcional à quantidade de infrações praticadas (AgRg no Ag no REsp 1.367.472/SC, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Dje 29/08/2014). 9. Inviável a diminuição do valor da condenação por reparação ao dano, tendo em vista que o valor arbitrado em R$ 212.948,35 tem como fundamento a planilha e é proporcional ao volume total de madeiras declarado nas ATPFs falsas, perfazendo o total de 2.434,492 m³. Dentre as essências transportadas encontram-se quatro espécies de alto valor comercial e econômico, quais sejam, jatobá, cabreúva, ipê e cerejeira, tendo o valor apurado sido de R$ 464.297,14, de acordo com o laudo pericial. 10. Preliminar rejeitada. Apelações parcialmente providas. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar a preliminar e dar parcial provimento às apelações. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 17/06/2025 (data do julgamento). Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator
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Processo nº 0002762-61.2014.4.01.4000
ID: 276601484
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 12 - DESEMBARGADOR FEDERAL LEÃO ALVES
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0002762-61.2014.4.01.4000
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EUGENIO JOSE GUILHERME DE ARAGAO
OAB/DF XXXXXX
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WILLER TOMAZ DE SOUZA
OAB/CE XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002762-61.2014.4.01.4000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002762-61.2014.4.01.4000 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: JADYEL SILVA ALEN…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002762-61.2014.4.01.4000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002762-61.2014.4.01.4000 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: JADYEL SILVA ALENCAR e outros REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: WILLER TOMAZ DE SOUZA - CE22715-A e EUGENIO JOSE GUILHERME DE ARAGAO - DF4935-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):MARCELO ELIAS VIEIRA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 12 - DESEMBARGADOR FEDERAL LEÃO ALVES Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) n. 0002762-61.2014.4.01.4000 R E L A T Ó R I O Juiz Federal MARCELO ELIAS VIEIRA (Relator Convocado): O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou a presente ação penal contra Jeferson Eudes de Aquino Gonçalves (Jefferson), Uiramilton de Sousa Cunha (Uiramilton) e Jadyel Silva Alencar (Jadyel) imputando aos dois primeiros a prática do crime tipificado no Art. 312, § 1º, do Código Penal, na forma de seu Art. 29, e, ao terceiro, a prática do crime previsto no Art. 180, § 1º, do Código Penal. Consta da denúncia, ofertada no dia 27 de agosto de 2013, a seguinte narrativa fática. “1 - Conta dos autos do IPL em epígrafe, instaurado para apurar responsabilidade pelas condutas típicas perpetradas pelos denunciados, que a polícia judiciária do Estado do Piauí apreendeu 371 (trezentos e setenta e uma) caixas de cloreto de sódio fisiológico sem nota fiscal e com adesivo de identificação do Ministério da Saúde. 2 - A apreensão foi levada a efeito por Danilo Sousa da Silveira, Auditor Fiscal da Fazenda Estadual, ao realizar inspeção no depósito clandestino da empresa DIMENSÃO DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS LTDA., CAGEP n° 19.442.757-9, CNPJ n° 02.956.130/0001-28, localizado à rua Piripiri, 1210, bairro Pio XII, Teresina/PI. 3 - Ao perceber tratar-se de produto de venda proibida no varejo, o Auditor Fiscal acionou a polícia que procedeu a apreensão dos produtos (auto de apreensão - fls.l3). Desmontou-se, assim, um esquema de desvio de medicamentos do Ministério da Saúde estocados no depósito da Secretaria de Saúde do Piauí SESAPI, cuja venda era proibida. 4 - O esquema dava-se da seguinte forma: os denunciados, JEFERSON EUDES e UIRAMILTON combinaram que seria possível desviar medicamentos do Ministério da Saúde (de. venda proibida) que estavam estocados no depósito da SESAPI, onde o último trabalhava como vigilante, vez que ficava sozinho no local. JEFERSON EUDÉS pegaria os produtos no horário em que UIRAMILTON estivesse no trabalho. 5 - JEFERSON EUDES, como trabalhava com venda de medicamentos, era o responsável por encontrar comprador para o produto desviado. Assim, contatou JADYEL ALENCAR, proprietário da empresa DIMENSÃO DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS LTDA. JADYEL ALENCAR comprava o soro desviado por JEFERSON EUDES e UIRAMILTON e oferecia e revendia a seus clientes. 6 - O soro fisiológico pertencente ao Ministério da Saúde era suprimido do depósito da SESAPI em veículos de propriedade de JEFERSON EUDES e levados diretamente para o depósito da empresa DIMENSÃO, ou para a casa do próprio JEFERSON EUDES. 7 - Cada unidade de soro fisiológico era vendida por JEFERSON EUDES a JADYEL- ALENCAR por 0,85 (oitenta e cinco centavos) e comercializada pela empresa DIMENSÃO a R$ 1,3 0 (um real e trinta centavos) a unidade. 8 - Nos termos de inquirição colacionados às fls.138-150, os denunciados confessam a prática do esquema acima narrado. Assim, evidenciou-se que JEFERSON EUDES DE AQUINO GONÇALVES, mentor intelectual do esquema de desvio de medicamentos do Ministério da Saúde, e UIRAMILTON SOUSA CUNHA, responsável pela viabilização da retirada dos produtos do depósito da SESAPI, desviaram 371 (trezentos e setenta e uma) caixas de soro fisiológico (venda proibida) e venderam para a empresa DIMENSÃO DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS LTDA. e diretamente para o sócio proprietário desta, JADYEL SILVA ALENCAR, que por seu turno revendia a terceiros/clientes. 9 - Destarte, autoria e materialidade estão sobejamente comprovadas na medida em que os denunciados JEFERSON EUDES DE AQUINO GONÇALVES e UIRAMILTON SOUSA CUNHA subtraíram as caixas de soro pertencentes ao Ministério da Saúde em proveito próprio, valendo-se da qualidade deste último por ser vigilante do depósito da SESAPI, subsumindo-se ambos na tipificação do art.312,§l° do CP. [...] 11 - Por sua vez, JADYEL SILVA ALENCAR, recebeu o produto, manteve em depósito e o vendeu a seus clientes, obtendo vultoso lucro em sua atividade comercial ciente de que tratava-se de produto oriundo de origem criminosa, vez que as caixas apreendidas continha selos do Ministério da Saúde e de proibição da comercialização, de modo que não havia como o denunciado escusar-se da imputação sob alegativa (sic) de não saber tratar-se de produto de crime. Subsumiu-se, pois, ao tipo penal inserto no art.180,§1° do CP.” Id. 250092061, PP. 1-5. A denúncia foi recebida no dia 27 de agosto de 2013. Id. 250092063, PP. 1-2. No dia 1º de setembro de 2017 o juízo de origem julgou procedente o pedido formulado na denúncia e condenou: i) Uiramilton, por violação ao Art. 312, § 1º do CP, nas penas de 3 anos de reclusão e 10 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo, fixando o regime inicial aberto e substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos; ii) Jefferson, por violação ao Art. 312, § 1º do CP, nas penas de 3 anos e 6 meses de reclusão e 30 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo, fixando o regime inicial aberto e substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos; iii) Jadyel, por violação ao Art. 180, § 1º do CP, nas penas de 3 anos e 6 meses de reclusão e 10 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo, fixando o regime inicial aberto e substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. Id. 250095516, PP. 1-32. O sentenciado Jefferson não apelou da sentença. Inconformado, Uiramilton apelou da sentença, tendo formulado os seguintes pedidos: “a) A reforma da decisão com o reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa e consequente absolvição do Apelante, nos termos do art. 386, VI, do CPP; b) Ultrapassado o pleito anterior, requer a desclassificação do crime previsto no art. 312 do CP para o art. 155 do CP; c) Subsidiariamente, seja revista a dosimetria da pena para que seja, inicialmente, fixada no mínimo legal - dois anos -, e, reconhecida a atenuante genérica do art. 65, III, “d”, do CP, seja reduzida para abaixo do mínimo legal.” Id. 250095523, PP. 2-10. O MPF, em contrarrazões, formulou o seguinte pedido: “CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL do recurso de apelação interposto, no sentido de reformar a sentença condenatória no sentido de fixar a pena-base no mínimo legal ante a presença de circunstâncias judiciais favoráveis, devendo ser mantida a sentença nos demais termos.” Id. 250095525, PP. 2-5. Também inconformado, Jadyel apelou da sentença, tendo apresentado razões neste tribunal revisor, com os seguintes pleitos: “a) Preliminarmente, o PROVIMENTO do recurso de apelação, para DECRETAR A NULIDADE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA, determinando-se a remessa dos autos ao juízo de origem para que este presida a realização do exame merceológico, prolatando, após regular manifestação das partes, novo julgamento. b) No mérito, o CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO PRESENTE RECURSO. PARA REFORMAR TOTALMENTE A SENTENÇA RECORRIDA E, POR CONSEGUINTE. JULGAR IMPROCEDENTE A DENÚNCIA, nos termos do art. 386, do CPP e ABSOLVER O ACUSADO/RECORRENTE, conforme os argumentos ora expendidos, afastando a condenação quanto ao tipo penal descrito no artigo 180, §1°, do Código Penal. c) Subsidiariamente, caso não acolhido o pleito acima narrado, pugna a defesa, em homenagem ao princípio da eventualidade, PELO PROVIMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO PARA QUE SEJA DETERMINADA A DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA IMPUTADA AO RECORRENTE PARA O DELITO DE RECEPTAÇÃO CULPOSA, nos moldes do art. 180, § 3°, do Código Penal e, por conseguinte, ante o preenchimento dos requisitos legais SEJA DECLARADA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO APELANTE. EM VIRTUDE DO RECONHECIMENTO DO PERDÃO JUDICIAL NOS TERMOS DO ART. 180, § 5º, DO CP. d) Caso não seja acolhido os pedidos dispostos nos ITENS “B” E “C”, REQUER-SE ALTERNATIVAMENTE, O PROVIMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO PARA RECONHECER A APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E, POR CONSEGUINTE. SE DETERMINE A ABSOLVIÇÃO DO RECORRENTE COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 386, III DO CPP.” Id. 250095530, PP. 2-30. A Procuradoria Regional da República da 1ª Região (PRR1) manifestou-se pelo “desprovimento da apelação.” Id. 250095532, PP. 1-11. É o relatório. Ao eminente Revisor. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 12 - DESEMBARGADOR FEDERAL LEÃO ALVES APELAÇÃO CRIMINAL (417) n. 0002762-61.2014.4.01.4000 VOTO Juiz Federal MARCELO ELIAS VIEIRA (Relator Convocado): I Em suas razões recursais, o apelante Jadyel alega, como questão preliminar, a ocorrência de nulidade processual decorrente da ausência de exame de corpo de delito (laudo merceológico), cuja falta teria impossibilitado: “a) Demonstrar a correta origem dos medicamentos aprendidos e a quem compete a responsabilidade sobre sua fiscalização; b) Verificar se a comercialização do soro fisiológico era totalmente proibida e, no caso de uma resposta negativa por parte do perito responsável pelo exame merceológico, esclarecer acerca de quem poderia vender e comprar tais medicamentos.” Id. 250095530. São os seguintes os principais fundamentos articulados pelo apelante a título de questão preliminar: “Ocorre que, nada obstante o entendimento exarado pelo n. Magistrado de primeira instância, a realização do exame merceológico, neste caso, é imprescindível, [...] Neste ponto, data vênia ao posicionamento adotado, a confissão por parte do réu/UIRAMILTON acerca do desvio de medicamentos do depósito da SESAPI e, posterior, venda em favor do sr. Jadyel, por si só não é suficiente para suprir o exame merceológico, pois consoante disposto no art. 158 do Código de Processo Penal, “quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direito ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”. Da leitura do artigo, depreende-se que a infração quando deixa vestígios, como no presente caso, em que os réus foram condenados por peculato-furto e receptação qualificada de medicamentos supostamente de origem pública, é indispensável o exame de corpo de delito, o qual deve ser compreendido como exame merceológico. [...] Ocorre que, no curso da investigação criminal, por conta do slogan do “Ministério da Saúde” estar adesivado nas embalagens dos medicamentos apreendidos, criou-se, uma controvérsia acerca da efetiva origem dos produtos, especialmente, se os medicamentos eram de origem federal ou se já estavam incorporados ao patrimônio do Estado do Piauí, competindo-lhe com exclusividade a fiscalização quanto ao armazenamento, segurança e distribuição em favor dos hospitais públicos. Cumpre esclarecer que a resposta a tal quesito é de suma importância, pois incidirá diretamente na competência para o processamento desta ação, visto que, uma vez certificado, através de perícia, que os produtos já estavam efetivamente incorporados ao patrimônio do Estado do Piauí, não havendo qualquer interesse direto da União quanto à utilização destes bens, o reconhecimento de nulidade da sentença e remessa dos autos para a Justiça Estadual é medida que se impõe. [...] Logo, tendo em vista que o resultado da perícia em questão influirá diretamente na competência para o processamento da presente ação, faz-se necessária uma investigação aprofundada junto aos órgãos de controle federal e estadual sobre a efetiva incorporação dos medicamentos ao patrimônio do Estado do Piauí. [...] Verificar se a comercialização do soro fisiológico era totalmente proibida e, no caso de uma resposta negativa por parte do perito responsável pelo exame merceológico, esclarecer acerca de quem poderia vender e comprar tais medicamentos. No caso em análise, para o i. Magistrado a quo, a inscrição constante na embalagem dos produtos apreendidos (“USO RESTRITO A HOSPITAL – PRIBICÃO VENDA AO COMÉRCIO”) já seria suficiente para que o apelante pudesse ter ciência de que a mercadoria possuía origem ilícita, visto que sua comercialização era vedada para o comércio varejista em geral. Ocorre que, nos termos da RESOLUCÃO-RDC N° 71/09 do Ministério da Saúde, quando um produto/medicamento possui o selo com a descrição supramencionada, isto significa dizer que os distribuidores, como por exemplo, a empresa DIMENSÃO, têm a PERMISSÃO para negociá-los apenas no atacado e com os hospitais públicos e privados, clínicas e ambulatórios. [...] Logo, a vedação constante nas embalagens por si só não impossibilita o administrador da empresa Dimensão de comercializar (no atacado) as mercadorias em favor de hospitais, clínicas e ambulatórios, os quais, inclusive, são o público alvo de comércio da empresa. Outrossim. o exame também tem a finalidade de esclarecer se a logomarca constando o nome do “Ministério da Saúde” era suficiente para a compreensão de que os produtos adquiridos pelo apelante possuíam origem ilícita, vez que supostamente tinha como origem o governo federal. [...] Em verdade, somente com a realização da perícia em questão, é que o próprio magistrado poderia ter subsídios para condenar o apelante sob o fundamento de que os dados constantes nas mercadorias eram suficientes para demonstrar ou pelo menos criar uma dúvida pertinente acerca da procedência do produto. [...] Como já esclarecido, não se trata de pretender judicializar a prova técnica que vem com o inquérito, reproduzindo os laudos periciais, o que efetivamente não se faz necessário. Cuida-se, sim, de falta de prova técnica que ateste a origem, o valor, por quem e para quem a mercadoria apreendida poderia ser alienada. Em face do exposto, REQUER-SE o provimento do recurso de apelação, para decretar a nulidade da sentença condenatória. determinando-se a remessa dos autos ao juízo de origem para que este presida a realização do exame merceológico, o qual, reitera-se, fora requerido em sede de defesa, prolatando novo julgamento, após manifestação das partes.” Id. 250095530. Não ocorreu a nulidade processual arguida pelo apelante, decorrente da ausência do exame de corpo de delito (laudo merceológico), pelas seguintes razões. Primeiro, porque a norma do Art. 158 do CPP deve ser interpretada em cotejo com a regra do Art. 167 também do CPP, o qual admite que eventual ausência de exame de corpo de delito pode ser suprida pela prova testemunhal. Segundo, porque a jurisprudência do STF e do STJ é uníssona no sentido de que a ausência do exame de corpo de delito pode ser suprida por outros meios de prova, mormente de natureza documental ou testemunhal. Nesse sentido, o STF, em decisão paradigmática sobre o tema, de que foi Relator o eminente Ministro Celso de Mello, afirmou que “[o]s postulados da verdade real, do livre convencimento do magistrado e da inexistência de hierarquia legal em matéria probatória admitem e legitimam - consoante orientação jurisprudencial firmada pela Suprema Corte - a utilização da prova testemunhal, da prova documental e, até mesmo, da confissão do próprio réu, como elementos hábeis ao válido suprimento da ausência do exame pericial de corpo de delito. Precedentes: RTJ 84/425 - 89/109 - 103/1040 - 112/167.” (STF, HC 69174; Órgão julgador: Primeira Turma; Relator(a): Min. CELSO DE MELLO; Julgamento: 07/04/1992; Publicação: 14/08/1992). O STJ, “instância máxima da interpretação do direito ordinário” (STF, RE 561485, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 13/08/2009, DJe-035 26-02-2010), segue a mesma linha de entendimento. Em decisão de sua 6ª Turma, o Tribunal da Cidadania afirmou que “[n]os termos da jurisprudência desta Corte, a simples ausência de laudo de exame de corpo de delito da vítima ou o caráter não conclusivo desse exame não têm o condão de conduzir à conclusão de inexistência de provas da materialidade do crime, se presentes outros meios de prova capazes de convencer o julgador quanto à efetiva ocorrência do delito, por aplicação do art. 167 do CPP.” (STJ, AgRg no RHC n. 135.564/MT, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 15/12/2020, DJe de 18/12/2020.) A 5ª Turma do STJ comunga de idêntico entendimento, já tendo decidido que “[a] ausência de exame de corpo de delito no crime de homicídio não constitui, necessariamente, nulidade, podendo a prova da materialidade da conduta ser suprida, tanto de forma direta quanto indireta, com base no conjunto probatório, o que atende aos pressupostos do art. 41 do CPP.” (STJ, AgRg no HC n. 661.479/PA, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 23/11/2021, DJe de 26/11/2021.) Terceiro, porque restou esclarecido na sentença, para além de qualquer dúvida razoável, que o apelante Jadyel tinha perfeito conhecimento da origem ilícita das “371 (trezentos e setenta e uma) caixas de cloreto de sódio fisiológico sem nota fiscal e com adesivo de identificação do Ministério da Saúde” apreendidos em seu poder. Quanto ao ponto, impende transcrever a seguinte passagem da sentença. “Jadyel, como o próprio se qualificou, é empresário do ramo farmacêutico desde 2009. Mas mesmo que se conte o tempo a partir do mês em que pôs em funcionamento sua distribuidora, em fevereiro de 2011, nove meses se passaram até a constatação do fato delituoso. Como bem frisou em seu interrogatório, soro é um produto que tem grande demanda no mercado, o que demonstra ser sabedor dos meandros deste. Não é razoável, assim, que desconheça advertências elementares para quem trabalha na venda. Frise-se que a proibição de venda estampada em fármacos é usual e de conhecimento elementar, não se justificando que seja confundido com qualquer controle de qualidade, como afirmou em seu interrogatório. A afirmação de que funcionário seu teria lhe informado que determinada tarja seria decorrente de controle de qualidade, não foi objeto de comprovação, que poderia ser realizado por testemunha, de forma que seus argumento resta sem suporte. Ademais, não há como conceber pudesse Jadyel adquirir de um particular tais mercadorias sem a prévia emissão de nota e comprovação da origem lícita, eis que habituado a tais procedimentos no seu dia a dia, do que se evidencia a busca de um lucro mais vantajoso, não obstante sua pequena representatividade. Não é razoável afasta tal ilação tão somente com o argumento de que seria apenas mais um item entre centenas em seu estoque, bem assim que o pequeno valor seria pequeno quando comparado ao seu faturamento mensal.” Id. 250095516. Quarto, porque conforme bem esclarecido pela PRR1 em contrarrazões ao recurso de apelação: “De fato, a origem pública e a vedação ao comércio dos bens apreendidos restou determinada elo auto de apreensão (fl. 16) e pelo termo de restituição (fl. 153), pelos quais restaram apreendidos 317 caixas de cloreto de sódio fisiológico 0,9% 600 ml c/12, com adesivo de identificação do Ministério da Saúde, bem como a seguinte informação impressa na caixa "USO RESTRITO A HOSPITAL - PROIBIÇÃO VENDA AO COMÉRCIO" e pelo ofício CAF/DUAF/SESAPI n° 090/2011 (fls. 64-74) e n° 002/2012 (fls. 89-90), nos quais constam cópias de notas fiscais relativas ao recebimento, pela SESAPI, de 2.084 caixas de soro, com os mesmos lotes daqueles apreendidos em posse do réu.” Id. 250095532. Quinto, e não menos importante, porque houve confissão plena dos fatos pelo corréu Uiramilton, conforme se observa do seguinte trecho de seu interrogatório, transcrito na sentença impugnada: “Que trabalhou na SESAPI, mas não era funcionário, era terceirizado, como vigilante, no período de 2011, por um ano, aproximadamente; que era um depósito de medicamento da SESAPI, dentre eles, soro; que é verdadeira a denúncia; que ele e Jefferson, amigos de infância, se toparam, falando que trabalhava em um depósito, tendo Jefferson dito que trabalhava com remédio, tendo acertado tal venda, desviando a medicação lá de dentro; que entre 7 e 8 vezes isso aconteceu; que isso foi em 2011; que Jefferson disse que já tinha comprador; que na época não teve contato com Jadyel e não o conhecia; QUE UMA VEZ JADYEL O CONTATOU PARA UMA POSSÍVEL PARCERIA; QUE ACHA QUE ERA DESVIO DE MEDICAMENTO, MAS NÃO FALOU DIRETAMENTE; QUE PERGUNTOU SE ERA UM DEPÓSITO DE MEDICAMENTO, TENDO RESPONDIDO POSITIVAMENTE; QUE À PARCERIA, RESPONDEU NEGATIVAMENTE.” Id. 250095516, P. 16. Conforme se observa do trecho acima em destaque do interrogatório de Uiramilton, o apelante Jadyel tinha pleno conhecimento da origem ilícita do produto, tanto que tentou corromper Uiramilton para conseguir mais mercadoria pertencente à União, de comercialização proibida. Todos esses elementos probatórios, analisados em conjunto e cotejados entre si, autorizam concluir pela absoluta desnecessidade da realização do exame de corpo de delito, isso porque as provas coligidas ao feito esclarecem satisfatoriamente não somente a correta origem das “371 (trezentos e setenta e uma) caixas de cloreto de sódio fisiológico sem nota fiscal e com adesivo de identificação do Ministério da Saúde”, mas também que se tratava de produto de comercialização totalmente proibida, mesmo porque a proibição da venda das caixas de cloreto de sódio aos consumidores estava estampada nas próprias embalagens do produto. Forte nesses fundamentos, rejeito a preliminar. II A. “No Processo Penal cabe à acusação demonstrar e provar que a conduta do agente se amolda ao tipo penal, com a presença de todos os seus elementos”. (TRF1, ACR 4514-94.2006.4.01.3500/GO, Rel. Desembargador Federal MÁRIO CÉSAR RIBEIRO, Quarta Turma, e-DJF1 p. 50 de 22/03/2012.) “Nenhuma acusação penal se presume provada. Não compete ao réu demonstrar a sua inocência. Cabe ao Ministério Público comprovar, de forma inequívoca, a culpabilidade do acusado.” (STF, HC 73.338/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 13/08/1996, DJ 19/12/1996, P. 51766. Grifo original.) A condenação demanda a produção, pelo órgão da acusação, de prova “além de qualquer dúvida razoável” quanto à “ocorrência do fato constitutivo do pedido”. (STF, HC 73.338/RJ, supra.) “Em matéria penal, a densificação do valor constitucional do justo real é o direito à presunção de não-culpabilidade (inciso LVII do art. 5º da CF). É dizer: o que dispensa qualquer demonstração ou elemento de prova é a não-culpabilidade (que se presume). O seu oposto (a culpabilidade) é que demanda prova, e prova inequívoca de protagonização do fato criminoso.” (STF, HC 92435/SP, Rel. Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 25/03/2008, DJe-197 17-10-2008.) (Grifo acrescentado.) Por isso, o juiz não pode proferir decisão condenatória, “louva[ndo-se] em provas insuficientes ou imprecisas ou contraditórias para atestar a culpabilidade do sujeito que se ache no pólo passivo da relação processual penal.” (STF, HC 92435/SP, supra.) (Grifo acrescentado.) B. Em geral, as constatações de fato fixadas pelo Juízo Singular somente devem ser afastadas pelo Tribunal Revisor quando forem claramente errôneas, ou carentes de suporte probatório razoável. “A presunção é de que os órgãos investidos no ofício judicante observam o princípio da legalidade.” (STF, AI 151351 AgR, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma, julgado em 05/10/1993, DJ 18-03-1994 P. 5170.) Essa doutrina consubstancia o “[p]rincípio da confiança nos juízes próximos das pessoas em causa, dos fatos e das provas, assim com meios de convicção mais seguros do que os juízes distantes.” (STF, RHC 50376/AL, Rel. Min. LUIZ GALLOTTI, Primeira Turma, julgado em 17/10/1972, DJ 21-12-1972; STJ, RESP 569985, Rel. Min. ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, 20/09/2006 [prevalência da prova que foi capaz de satisfazer o Juízo Singular]; TRF1, REO 90.01.18018-3/PA, Rel. Desembargador Federal JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Segunda Turma, DJ p. 31072 de 05/12/1991 [prevalência da manifestação do órgão do Ministério Público em primeiro grau de jurisdição].) Dessa forma, as constatações de fato fixadas pelo Juízo Singular somente devem ser afastadas pelo Tribunal Revisor mediante demonstração inequívoca, a cargo do recorrente, de que elas estão dissociadas do conjunto probatório contido nos autos. Quando as constatações de fato fixadas pelo Juízo estão baseadas na análise de prova oral e na determinação da credibilidade das testemunhas ouvidas, maior deve ser a deferência do Tribunal Revisor a elas. É indubitável que o juiz responsável pela oitiva da testemunha, ao vivo, está em melhor posição do que os juízes de revisão para concluir pela credibilidade do depoimento respectivo. Na avaliação da prova testemunhal, somente o juiz singular pode estar ciente das variações no comportamento e no tom de voz da testemunha ao depor, elementos cruciais para a compreensão do ouvinte e a credibilidade do depoimento prestado. (TRF1, AC 60624-50.2000.4.01.0000/GO, Rel. Juiz Federal LEÃO APARECIDO ALVES, 6ª Turma Suplementar, e-DJF1 p. 183 de 19/10/2011.) Em suma, e considerando que o processo judicial consiste na tentativa de reconstituição de fatos históricos, as conclusões do Juízo responsável pela colheita da prova são de indubitável relevância na avaliação respectiva. Além disso, uma das principais responsabilidades dos juízes singulares consiste na oitiva de pessoas em audiência, e a repetição no cumprimento desse dever conduz a uma maior expertise. Nesse ponto, é preciso reconhecer a capacidade do juiz singular de interpretar os depoimentos testemunhais para avaliar a credibilidade respectiva. Nesse sentido, esta Corte tem prestigiado as conclusões de fato expostas pelo magistrado que ouviu as testemunhas em audiência. (TRF1, ACR 2006.35.00.021538-0/GO, Rel. Juiz TOURINHO NETO, Terceira Turma, e-DJF1 p. 89 de 14/08/2009.) C. No entanto, a decisão do juiz deve “encontr[ar] respaldo no conjunto de provas constante dos autos.” (STF, AO 1047 ED/RR, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2008, DJe-043 06-03-2009.) (Grifo acrescentado.) Dessa forma, os elementos probatórios presentes nos autos devem ser “vistos de forma conjunta” (TRF1, ACR 2003.37.01.000052-3/MA, Rel. Desembargador Federal OLINDO MENEZES, Terceira Turma, DJ de 26/05/2006, p. 7; STF, RHC 88371/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 14/11/2006, DJ 02-02-2007 P. 160; RHC 85254/RJ, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 15/02/2005, DJ 04-03-2005 P. 37), e, não, isolada. Efetivamente, é indispensável “a análise do conjunto de provas para ser possível a solução da lide.” (STF, RE 559742/SE, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 28/10/2008, DJe-232 05-12-2008.) (Grifo acrescentado.) Por outro lado, cada prova, individualmente, deve ser analisada em conjunto com as demais constantes dos autos. Assim, “[o] laudo pericial há que ser examinado em conjunto com as demais provas existentes nos autos.” (STF, HC 70364/GO, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 17/08/1993, DJ 10-09-1993 P. 18376.) (Grifo acrescentado.) Em resumo, a decisão judicial deve “result[ar] de um amplo e criterioso estudo de todo o conjunto probatório”. (STF, RE 190702/CE, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 04/08/1995, DJ 18-08-1995 P. 25026.) Com base nesses parâmetros, passo ao exame do presente caso. III A. São os seguintes os pontos capitais da sentença impugnada. “Tenho como não haver dúvidas quanto à materialidade, notadamente pelo auto de apreensão de fl. 16 e termo de interdição de fl. 17, pelo qual restaram apreendidos "371 caixas de cloreto de sódio fisiológico 0,9% 600 ml c/12, com adesivo de identificação do Ministério da Saúde, bem como a seguinte informação impressa na caixa: “USO RESTRITO A HOSPITAL - PROIBIÇÃO VENDA AO COMÉRCIO, apreendidos na Rua Piripiri, 1210, Pio XII, em Teresina(PI), no depósito clandestino da empresa DIMENSÃO DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS LTDA.” Ademais, nenhum dos réus nega a ocorrência do fato. A participação dos réus no episódio resta evidenciada pelos próprios depoimentos externados nos interrogatórios. Neste sentido, reproduzo o resumo dos depoimentos colhidos em Juízo. [...] Como foi colocado acima, resta incontroverso o desvio dos soros das dependências da SEFAZ, fato confirmado por Uiramilton integralmente, conforme se viu acima. Alega que foi movido pelo estado de necessidade em razão de penúria econômica, entretanto a gravidade e intensidade não são possíveis de aferir senão através de provas concretas. Mesmo assim, “não são aptas a atrair a aplicação do estado de necessidade como causa excludente de ilicitude, não estando comprovado que a prática delitiva fosse o único meio ao alcance da ré para prover as necessidades financeiras, que podem ser contornadas por outros meios e atividades lícitas, ao invés do cometimento de delitos (ACR 00040768720104036114, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 16/10/2014.. FONTE_REPUBLICACAO:.). Deste modo, tendo Uiramilton confessado o crime em comentário, mantendo-se fiel às suas declarações tanto perante a Polícia Civil, quanto à Polícia Federal, resta incontroversa sua participação dolosa no esquema de desvio de produtos farmacêuticos do depósito da SESAPI. A confissão será levada em consideração como atenuante genérica. Tanto Uiramilton como Jefferson foram acordes no sentido de que as entregas se deram por cerca de 07 a 08 vezes no ano de 2011, seguindo até por volta de dezembro. O fato da existência de advertência frascos quanto à origem e venda proibida se torna um obstáculo instransponível para qualquer escusa por parte de Jefferson. Este pegava os medicamentos, não sendo minimamente razoável que nem mesmo examinasse o que “comprava”. O encadeamento lógico acima, aliado à longa experiência venda de medicamentos (por cerca de 10 anos), permite concluir, com segurança, que Jefferson sabia da ilegalidade do fornecimento. A sua alegação de que a aquisição dos soros decorreu de quitação por Uiramilton de suposto débito decorrente de reparo no motor de seu veículo, foi desmentido por este último. Ademais, nada foi trazido aos autos que comprovasse o evento como nota fiscal de conserto do motor contemporânea aos fatos. Ainda que fosse verdadeira tal afirmação, tal circunstância não retiraria a ilicitude da sua conduta. Chama a atenção o fato de que, no âmbito do inquérito policial, a versão contada por Jefferson foi totalmente distinta da apresentada Juízo. Naquela oportunidade citou uma pessoa de nome Aldimar como sendo a que lhe teria vendido os soros (fls. 29/32, à fl. 66). Entretanto, este último desmentiu a versão apresentada. Igualmente não procede a assertiva de Jefferson de que não sabia que o depósito, no qual buscava os soros, pertencia à Secretaria de Saúde. Conforme dito acima, além da mensagem no frasco de proibição de venda, disse em seu depoimento (fl. 76 ) que “descobriu que o depósito é da Secretaria de Saúde do Estado do Piauí”. Por fim, descabe a desclassificação do crime de peculato. Conforme precedentes judiciais, aos quais me alinho, a condição de vigilante do réu Uiramilton, embora terceirizado, de um órgão público, faz com que esse se enquadre no conceito de servidor público para fins penais e, por ser elementar do crime, se comunica ao réu Jefferson. [...] Deste modo, patente a prática de crime de peculato por parte de Uiramilton e Jefferson. Analiso a conduta de Jadyel. Jadyel, como o próprio se qualificou, é empresário do ramo farmacêutico desde 2009. Mas mesmo que se conte o tempo a partir do mês em que pôs em funcionamento sua distribuidora, em fevereiro de 2011, nove meses se passaram até a constatação do fato delituoso. Como bem frisou em seu interrogatório, soro é um produto que tem grande demanda no mercado, o que demonstra ser sabedor dos meandros deste. Não é razoável, assim, que desconheça advertências elementares para quem trabalha na venda. Frise-se que a proibição de venda estampada em fármacos é usual e de conhecimento elementar, não se justificando que seja confundido com qualquer controle de qualidade, como afirmou em seu interrogatório. A afirmação de que funcionário seu teria lhe informado que determinada tarja seria decorrente de controle de qualidade, não foi objeto de comprovação, que poderia ser realizado por testemunha, de forma que seus argumento resta sem suporte. Ademais, não há como conceber pudesse Jadyel adquirir de um particular tais mercadorias sem a prévia emissão de nota e comprovação da origem lícita, eis que habituado a tais procedimentos no seu dia a dia, do que se evidencia a busca de um lucro mais vantajoso, não obstante sua pequena representatividade. Não é razoável afasta tal ilação tão somente com o argumento de que seria apenas mais um item entre centenas em seu estoque, bem assim que o pequeno valor seria pequeno quando comparado ao seu faturamento mensal. Por fim, encontrando-se em sua posse a mercadoria desviada, o ônus é seu, e não do MPF, em provar a licitude de sua conduta, o que não ocorreu.” Id. 250095516. B. Irresignado com a condenação, o apelante Uiramilton aduziu, em síntese, que: “Desde o início das investigações, o Apelante sempre se mostrou colaborativo com a justiça, confessando que subtraiu medicamentos do depósito da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí. No entanto, em juízo, pôde esclarecer que, na ocasião, encontrava-se em estado de extrema necessidade, posto que, conforme declarações prestadas em seu interrogatório judicial, seu salário era insuficiente para fazer frente às necessidades básicas da família, tendo, ademais, contraído muitas dívidas e efetuado gastos com medicamentos. Viu, portanto, na proposta do corréu, seu amigo de infância, a oportunidade dessa situação desesperadora. O Direito não exige atitudes heroicas. A análise da culpabilidade como integrante do conceito tripartite do crime também não fica adstrita aos manuais teóricos ou ao conteúdo editalício dos concursos públicos. A vida impõe uma rápida escolha. As imediatas necessidades do Apelante e sua família, bem como sua pouca instrução são fatores que compeliram o réu a tomar tal atitude. Não há reprovabilidade em sua conduta, [...] Não se pretende, no caso, frustrar o objetivo do ordenamento jurídico penal, o qual consiste em conferir segurança jurídica às instituições, mas sim impedir que uma pessoa humilde, sem antecedentes criminais e baixo grau de instrução seja condenado por um crime que teria praticado em virtude de situação tormentosa. Dessa forma, impõe-se a reforma da sentença a fim de absolver o Apelante, nos termos do art. 386, inciso VI, do CPP. [...] Caso ultrapassado o argumento anterior, entendendo o Egrégio Tribunal pela condenação do Defendente, há que se reconhecer que não praticou a conduta descrita no tipo penal previsto no art. 312 do Código Penal, mas no previsto no art. 155 do mesmo diploma legal. Isto porque nos termos do art. 327 do Código Penal, apenas quem exerce atividade típica da Administração Pública é equiparado a funcionário público, [...] Desta feita, por mais amplo que o Direito Penal possa dar ao conceito de “servidor público”, este jamais poderá abranger a situação do defendente, vez que este não exercia cargo, emprego ou função pública, mas tão-somente prestava serviços, de maneira informal, de vigilante para a Secretaria de Saúde do Estado do Piauí e não da Secretaria de Saúde do Estado do Piauí. [...] Importa lembrar que, nos termos do princípio da legalidade, só são típicas aquelas atividades que o ordenamento assim alcunha e considera, sendo as atividades atípicas aquelas em que o gestor possui maior discricionariedade para executá-las, inexistindo vedação para projetos desta estirpe, salvo para incluí-las, sem alteração legislativa e a seu bel-prazer, na vala das atividades típicas. Partindo de tal premissa, resta claro que a função de vigilante não é atividade típica da Administração Pública. Se fosse, nem mesmo poderia ser desempenhada por empresa terceirizada já que a terceirização da atividade-fim é incompatível com a Administração Pública. A Justiça do Trabalho possui entendimento sedimentado quanto à licitude de terceirização de atividades secundárias e, logicamente, quanto à inadmissibilidade de terceirização das funções típicas da Administração Pública, conforme se extrai do Enunciado 331 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “[...] Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei 7.102, de 20.06.83), de conservação e limpeza, bem como a dos serviços especializados ligados à atividade meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta”. O Tribunal de Contas da União, por sua vez, é firme no posicionamento de que “a terceirização é legítima desde que não implique a execução de atividades inerentes aos quadros próprios dessas entidades”. Assim, não subsistem dúvidas de que, não sendo o Apelante servidor ou empregado da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí, mas, se muito, um prestador de serviços, e estando claro que esse serviço para o qual a empregadora do Recorrente foi contratada não é função típica da Administração Pública, como exige o conceito de servidor público por equiparação, ainda que houvesse provas para eventual condenação do Apelante, jamais poderia sê-lo pelo crime de peculato, eis que, efetivamente, Uiramilton de Sousa Cunha não era servidor público, por mais ampliado que seja esse conceito para fins penais. Dessa forma, tal conduta não poderia caracterizar crime de peculato, ao qual a lei comina rigorosa punição, mas tão-somente o delito descrito no art. 155 do Código Penal. [...] Na sentença proferida pelo juízo a quo, verifica-se que, quando da análise das circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal, entendeu “como favoráveis todas as circunstâncias”. No entanto, contraditoriamente, não fixou a pena no mínimo legal - dois anos -, mas em três anos, sem qualquer fundamentação para tanto, contrariando o disposto no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal. Diante do exposto, caso mantida a condenação do Apelante, requer a diminuição da pena-base para o mínimo previsto legalmente, dois anos de reclusão, com a substituição pertinente. Conforme se verifica à fl. 506 dos autos, o Juízo a quo entendeu presente a circunstância atenuante da confissão espontânea, no entanto, não a utilizou para fixação da pena, em observância ao Enunciado nº 231 da Súmula do STJ. Consoante já argumentado, a pena-base não foi fixada no mínimo legal. No entanto, considerando a justificativa do Juízo a quo para não aplicação da atenuante, entende-se que se tratou de um equívoco. Inobstante, ainda que tivesse sido fixada a pena-base em dois anos, a confissão deveria ter sido levada em consideração para diminuição da pena-base. Excelentíssimos, não se desconhece o Enunciado n° 231 da Súmula do STJ, no entanto, a sua aplicação de forma acrítica acarreta a incidência do Direito Penal em flagrante afronta ao princípio da individualização das penas, da isonomia, da dignidade da pessoa humana, da legalidade, da proporcionalidade entre outros direitos fundamentais do Réu. No presente caso, o Apelante não logrou nenhum benefício concreto com a confissão, sendo equiparado ao réu que não se dispõe a colaborar de forma tão contundente com a Justiça. A interpretação da súmula contraria o texto legal do art. 65 do CP, [...] Não há razão aparente, dentro do sistema trifásico de fixação da pena, que justifique uma interpretação contra legem, a impedir que a pena fixada no mínimo, quando da segunda fase de dosimetria, possa ser diminuída aquém do mínimo legal, se por força das circunstâncias judiciais do art. 59, a pena-base foi fixada em seu patamar mínimo. Assim sendo, por não se tratar de entendimento vinculante, bem como não se descurando a sua concepção totalmente dissociada de uma interpretação adequada às garantias constitucionais do acusado em Processo Penal, a súmula 231 deve ser afastada ante sua flagrante inconstitucionalidade. Pugna, pois, que seja reconhecida e aplicada a atenuante de confissão readequando-se a dosimetria da pena em benefício do Apelante, inclusive no tocante À pena de multa.” Id. 250095523. C. Igualmente irresignado com a condenação, o apelante Jadyel, em razões de apelação, aduziu, quanto ao mérito, os seguintes argumentos. “Consoante será esclarecido e fartamente comprovado nos tópicos que se seguem, o i. Magistrado, data vênia ao posicionamento adotado, baseou-se em MERAS PRESUNCÕES, visto que a instrução processual, especialmente, os depoimentos prestados pelos demais réus, evidencia de forma contundente que o sr. Jadyel Silva Alencar NÃO tinha conhecimento do ilícito antecedente (peculato) e, muito menos que os produtos adquiridos pudessem advir de origem ilícita. Soma-se a isto, o fato de que as informações constantes nas embalagens dos produtos não eram suficientes para que o apelante levantasse dúvida acerca da ilicitude de sua origem, especialmente, porque o soro fisiológico foi ofertado por alguém que comprovadamente vendia medicamentos há bastante tempo, sem qualquer notícia de fraude, e foi entregue diretamente em seu depósito, recebido por funcionário da empresa que não notou qualquer indicação de produto de origem ilícita. Portanto, restou comprovado que Jadyel Silva Alencar jamais teve contato visual com a mercadoria em questão, não tendo tido qualquer oportunidade de identificar o selo do Ministério da Saúde. Também restou comprovado que tais produtos não foram vendidos a ninguém, tendo sido encontrados no depósito da empresa praticamente no mesmo momento em que recebidos pelo funcionário. Assim, tendo em vista que as provas acostadas aos autos, as quais serão dissecadas neste petitório, demonstram que as aquisições ora questionadas ocorreram em um cenário envolvido pelo princípio da boa-fé objetiva, não havendo por parte do sr. Jadyel, ora apelante, o cometimento voluntário de qualquer ilícito que mereça repreensão no âmbito penal, o reconhecimento da absolvição, ante o provimento do recurso de apelação, é medida que se impõe. Outrossim, caso não seja o entendimento adotado por Vossa Excelência, requer-se, como pedido subsidiário, a desclassificação do crime de receptação qualificada (art. 180, § 1º, do CP) para a receptação culposa (art. 180, § 3º, do CP) e, por conseguinte a decretação do perdão judicial (art. 180, § 5º, do CP), visto que em nenhum momento da instrução processual, restou confirmado o “dolo” por parte do ora apelante, consistente na vontade livre e consciente de adquirir produtos com o objetivo de obter vantagem em proveito próprio, no exercício de atividade comercial, tendo por objeto material medicamento que “deveria saber ser produto de crime.” Id. 250095530. A defesa técnica de Jadyel, na última parte de suas razões e como último argumento, requereu a absolvição com base no princípio da insignificância, o qual, segundo alega, tem sido adotado nos crimes de descaminho e apropriação indébita previdenciária. IV A. Não há razão para acolher a alegação do apelante Uiramilton, de inexigibilidade de conduta diversa, decorrente de suposta situação de dificuldade financeira. Segundo alegado, o apelante Uiramilton, à época dos fatos, “encontrava-se em estado de extrema necessidade, posto que, conforme declarações prestadas em seu interrogatório judicial, seu salário era insuficiente para fazer frente às necessidades básicas da família, tendo, ademais, contraído muitas dívidas e efetuado gastos com medicamentos.” A excludente de inexigibilidade de conduta diversa somente pode ser aceita naqueles raríssimos casos em que há nos autos prova expressa, contundente, irrefutável e inequívoca de situação de absoluta miserabilidade, o que não é o caso do apelante Uiramilton, o qual, conforme ele próprio admite, estava empregado à época dos fatos, recebendo o correspondente salário. Se o apelante geriu mal os seus recursos financeiros, vindo a endividar-se, isso não é razão suficiente para que se acolha a tese de inexigibilidade de conduta diversa, mesmo porque essa é a situação de grande parte da população brasileira. O entendimento acima é corroborado por decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região na qual se assentou que “[c]rises financeiras genéricas, retração de mercado, queda de produção ou iliquidez episódica não têm similitude com estado de necessidade ou com a inexigibilidade de outra conduta, o que somente se poderia admitir nas hipóteses de impossibilidade econômico-financeira aguda, extrema e terminal, a ser vista em cada caso, e não demonstrada na espécie.” (TF1, ACR 0004134-24.2017.4.01.3100, JUIZ FEDERAL SAULO JOSÉ CASALI BAHIA (CONV.), TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 01/09/2023 PAG.) Diante de tais fundamentos, não se mostra razoável, na hipótese, acolher a tese de inexigibilidade de conduta diversa, devendo ser mantida a condenação. B. Também não merece guarida o pedido do apelante Uiramilton para a desclassificação do crime de peculato-furto (CP, Art. 312, § 1º) imputado na denúncia para o crime de furto simples (CP, Art. 155). A diferença ontológica entre o furto e o peculato-furto reside em que, neste último, além de a subtração ser realizada por funcionário público, a coisa alheia é de propriedade do Estado. O Código Penal, conforme se observa de seu Art. 327, adota conceito alargado de funcionário público, nos seguintes termos: Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. No caso dos autos, segundo consta da própria denúncia, o apelante Uiramilton, à época dos fatos, trabalhava como vigilante junto à SESAPI – Secretaria de Saúde do Piauí, local onde estavam guardadas e de onde foram subtraídas as “371 (trezentos e setenta e uma) caixas de cloreto de sódio fisiológico sem nota fiscal e com adesivo de identificação do Ministério da Saúde.” Portanto, à luz do citado Art. 327, Uiramilton era funcionário público para fins penais à época em que praticados os fatos, do que decorre, necessariamente, que a conduta de subtrair de órgão público estadual bens pertencentes à União amolda-se à descrição típica do Art. 312, § 1º, do Código Penal, que tipifica a conduta de peculato-furto. Acrescente-se que, não fosse sua condição, ainda que eventual e transitória, de funcionário público, o apelante Uiramilton não teria tido acesso aos objetos subtraídos. A condição de funcionário público, portanto, foi causa sine qua non do resultado. (CP, Art. 13, última parte). Destarte, a sentença não merece reparos quanto a esse aspecto, visto que o juízo a quo aplicou corretamente a lei ao caso concreto. V A. A condenação do apelante Jadyel nas penas do Art. 180, § 1º, do Código Penal não merece quaisquer reparos, tendo em vista que o juízo a quo, após cotejar uns com os outros os diversos elementos probatórios coligidos aos autos, concluiu acertadamente pela responsabilidade penal do apelante. O pedido de absolvição, sob o argumento de que os “produtos não foram vendidos a ninguém, tendo sido encontrados no depósito da empresa praticamente no mesmo momento em que recebidos pelo funcionário” não constitui fundamento idôneo para afastar a condenação. Com efeito, o crime do Art. 180, § 1º, do CP é de conduta múltipla alternativa (adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar). Aquele que realiza qualquer um dos núcleos verbais pratica o crime de receptação. No presente caso, tendo o apelante Jadyel perpetrado duas condutas típicas (adquirir e ter em depósito), houve a consumação do delito de receptação, à luz da norma do Art. 14, inciso I, do Código Penal. O argumento, portanto, não prospera. B. Também não é caso de desclassificação da conduta imputada na denúncia para o crime do Art. 180, § 3º, do CP (receptação culposa). As provas dos autos, conforme exaustivamente analisado pelo juízo de origem, evidenciam, para além de qualquer dúvida razoável, que Jadyel adquiriu as “371 (trezentos e setenta e uma) caixas de cloreto de sódio fisiológico sem nota fiscal e com adesivo de identificação do Ministério da Saúde” do corréu Jefferson, com o mais pleno conhecimento de que se tratava de bens pertencentes à União, cuja proibição de venda estava estampada nos próprios frascos dos soros fisiológicos. Tanto isso é verdade que Jadyel, tempos depois, entabulou contato diretamente com Uiramilton (segundo confissão deste) na tentativa de corrompê-lo, com vistas a adquirir, de modo ilícito, outros medicamentos pertencentes à União. Destarte, incide na espécie o tipo do Art. 181, § 1º, do CP, tal como acertadamente reconhecido na sentença impugnada. C. Por fim, mostra-se incabível a aplicação do princípio da insignificância na conduta do apelante Jadyel, pelas seguintes razões. O delito antecedente, no caso concreto, é o de peculato. A jurisprudência brasileira, de modo uníssono, não admite a aplicação do princípio da insignificância nos casos de crime de peculato, por se tratar de crime contra a administração pública. Nesse sentido, aliás, o enunciado 599 da Súmula do STJ, verbis: O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública. In casu, tendo restado comprovado, bem acima de qualquer dúvida razoável, que o apelante Jadyel adquiriu bens que sabia serem produto de peculato, a impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao delito antecedente, ou seja, o peculato, estende-se ao crime de receptação. A corroborar esse entendimento, reporto-me, tal como se aqui transcritas, às decisões do TRF1 sobre o tema, colacionadas pela Procuradoria Regional da República em sua manifestação nos autos. Id. 250095532, PP. 6-8. Diante desses fundamentos, impossível acolher o pedido de aplicação do princípio da insignificância nos presentes autos. VI A. “A dosimetria da pena submete-se a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena. Cabe às instâncias ordinárias, mais próximas dos fatos e das provas, fixar as penas. Às Cortes Superiores, no exame da dosimetria das penas em grau recursal, compete precipuamente o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, com a correção apenas de eventuais discrepâncias gritantes e arbitrárias nas frações de aumento ou diminuição adotadas pelas instâncias anteriores.” (STF, RHC 112706, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 18/12/2012, DJe-044 07-03-2013. Grifei.) Nesse precedente, o recurso foi provido para restabelecer a pena fixada pelo Juízo. Em suma, “[o] julgador possui discricionariedade vinculada para fixar a pena-base, devendo observar o critério trifásico (art. 68 do Código Penal), e as circunstâncias delimitadoras do art. 59 do Código Penal, em decisão concretamente motivada e atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetiva dos agentes.” (STJ, HC 425.504/RJ, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 18/12/2017.) A fixação da pena-base parte do mínimo legal. (TRF1, EINACR 2005.35.00.023131-6/GO, Rel. Juíza Federal Convocada ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO, Segunda Seção, e-DJF1 07/04/2008 P. 112; STF, HC 76196/GO, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, julgado em 29/09/1998, DJ de 15/12/2000, p. 62.) “[E]ntretanto, basta que um [dos fatores mencionados no Art. 59 do CP] não seja favorável para que a pena não mais possa ficar no patamar mínimo.” (STF, HC 76196/GO, supra; HC 91350/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 17/06/2008, DJe-162 29-08-2008). “À fixação da pena-base acima do mínimo legal é suficiente a presença de apenas uma das circunstâncias judiciais desfavoráveis (HC 76.196-GO, 2ª Turma, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ 29.09.1998).” (STF, HC 112784, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 18/12/2012, DJe-109 11-06-2013.) Porém, “[a] pena não pode ser aplicada de forma padronizada, mecanizadamente, tendo, portanto, de observar o que acusado tem de particular, uma vez que os homens são naturalmente desiguais. Deve a pena ser aplicada atentando-se para o critério da proporcionalidade dos princípios constitucionais e das normas infraconstitucionais. Não se deve esquecer, nunca, o princípio da humanidade, visto que uma das finalidades da pena é a ressocialização.” (TRF1, EINACR 0014237-16.2001.4.01.3500/GO, Rel. Desembargador Federal TOURINHO NETO, Segunda Seção, e-DJF1 p. 64 de 24/05/2012.) Destaca-se, também, que a lei determina que o juiz deve fixar a pena que seja necessária (qualidade da pena) e suficiente (quantidade da pena) à reprovação e à prevenção do crime. CP, Art. 59, caput. Essa disposição legal consagra a incidência do princípio da proporcionalidade na fixação da pena. A pena não precisa ser maior do que a necessária e suficiente à reprovação e à prevenção do crime. “O juiz não pode fixar pena em quantidade além da necessária, nem mais do que o suficiente para a reprovação.” (NEY MOURA TELES, Direito penal: parte geral: arts. 1º a 120, volume 1, São Paulo: Atlas, 2004, p. 394.) Assim sendo, os juízes estão autorizados a impor a pena suficiente, mas não maior do que a necessária à consecução dos objetivos visados pela lei. Por outro lado, é pacífico o entendimento de que o fato de o acusado ser primário e de ter bons antecedentes não constitui, em favor dele, direito subjetivo à fixação da pena-base no mínimo legal. Assim, “[n]ão obstante o réu tenha bons antecedentes e seja primário, a pena-base pode ser fixada acima do mínimo legal com fundamento nos demais fatores referidos no ‘caput’ do artigo 59 do Código Penal.” (STF, HC 73444/RJ, Rel. Min. MOREIRA ALVES, julgado em 27/02/1996, Primeira Turma, DJ 11-10-1996, P. 38499). Além da necessidade de fundamentação, é preciso que haja “congruência lógico-jurídica entre os motivos declarados e a conclusão (v.g. HC 69.419, 23.6.92, Pertence, RTJ 143/600).” (STF, Caso “Bateau Mouche”, HC 70362/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 05/10/1995, DJ 12-04-1996 P. 11072, RTJ 159/132.) Finalmente, a fixação da pena de multa se faz com base na fundamentação utilizada na fixação da pena privativa de liberdade. “Fixação da pena pecuniária que está justificada pelas mesmas circunstâncias que motivaram a fixação da pena privativa de liberdade.” (STF, HC 72657/MT, Rel. Min. MOREIRA ALVES, julgado em 14/11/1995, Primeira Turma, DJ 09-08-1996 P. 27100.) B. O crime do Art. 312 do Código Penal prevê, em abstrato, penas de reclusão de 2 a 12 anos. Sabendo-se que 2 anos correspondem a 24 meses, e que 12 anos correspondem a 144 meses, tem-se que o intervalo entre a pena mínima e a máxima, abstratamente previstas, corresponde a 120 meses (144 – 24 = 120). Desse modo, sendo 8 as circunstâncias judiciais (CP, Art. 59), e dividindo-se o montante de 120 meses por 8 circunstâncias judiciais, conclui-se, inexoravelmente, que cada circunstância judicial desfavorável autoriza a exasperação da pena em, no máximo, 15 meses (120 meses ÷ por 8 circunstâncias judiciais = a 15 meses). Embora, seja certo que “a ponderação das circunstâncias judiciais não constitui mera operação aritmética, em que se atribuem pesos absolutos a cada uma delas, mas sim exercício de discricionariedade, devendo o julgador pautar-se pelo princípio da proporcionalidade e, também, pelo elementar senso de justiça” (STJ, AgRg no AREsp n. 2.304.167/DF, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 22/8/2023, DJe de 28/8/2023.), não é menos certo que a ponderação aritmética, ao menos no que concerne ao aumento máximo de 15 meses para cada circunstância judicial no crime do Art. 312 do Código Penal, constitui razão segura para impedir erro ou evitar arbítrio judicial. Basta pensar na hipotética situação de um crime do Art. 312 do Código Penal em que todas as circunstâncias judiciais sejam desfavoráveis ao réu. Se houver, para pelo menos uma das circunstâncias, aumento superior a 15 meses (ainda que por um único dia), a pena, já na primeira fase da dosimetria (CP, Art. 68), será superior ao máximo legal previsto em abstrato (12 anos ou 144 meses). Tal hipótese configuraria abuso na dosimetria da pena, a ser sandado por apelação ou mesmo habeas corpus. Conforme sabido e ressabido, a interpretação da lei não pode conduzir a resultado absurdo. C. O crime do Art. 180, § 1º do Código Penal prevê, em abstrato, penas de reclusão de 3 a 8 anos. Sabendo-se que 3 anos correspondem a 36 meses, e que 8 anos correspondem a 96 meses, tem-se que o intervalo entre a pena mínima e a máxima, abstratamente previstas, corresponde a 60 meses (96 – 36 = 60). Desse modo, sendo 8 as circunstâncias judiciais (CP, Art. 59), e dividindo-se o montante de 60 meses por 8 circunstâncias judiciais, conclui-se, inexoravelmente, que cada circunstância judicial desfavorável autoriza a exasperação da pena em, no máximo, 7,5 meses (60 meses ÷ por 8 circunstâncias judiciais = a 7,5 meses). Embora, seja certo que “a ponderação das circunstâncias judiciais não constitui mera operação aritmética, em que se atribuem pesos absolutos a cada uma delas, mas sim exercício de discricionariedade, devendo o julgador pautar-se pelo princípio da proporcionalidade e, também, pelo elementar senso de justiça” (STJ, AgRg no AREsp n. 2.304.167/DF, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 22/8/2023, DJe de 28/8/2023.), não é menos certo que a ponderação aritmética, ao menos no que concerne ao aumento máximo de 7,5 meses para cada circunstância judicial no crime do Art. 180, § 1º, do Código Penal, constitui razão segura para impedir erro ou evitar arbítrio judicial. Basta pensar na hipotética situação de um crime do Art. 180, § 1º, do Código Penal em que todas as circunstâncias judiciais sejam desfavoráveis ao réu. Se houver, para pelo menos uma das circunstâncias, aumento superior a 7,5 meses (ainda que por um único dia), a pena, já na primeira fase da dosimetria (CP, Art. 68), será superior ao máximo legal previsto em abstrato (8 anos ou 96 meses). Tal hipótese configuraria abuso na dosimetria da pena, a ser sandado por apelação ou mesmo habeas corpus. Conforme sabido e ressabido, a interpretação da lei não pode conduzir a resultado absurdo. D. A DPU, ao subscrever a apelação de Uiramilton, questionou a validade e aplicação do enunciado 231 da Súmula do SJT, pleiteando que o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, conforme reconhecido pelo juízo a quo, seja empregado para reduzir as penas-base desse apelante aquém do mínimo legal, com a consequente desconsideração do enunciado 231 da súmula do STJ. O pedido não merece acolhida, pelas seguintes razões. A despeito do advérbio “sempre”, contido no Art. 65, III, d, do CP, o STJ, “instância máxima da interpretação do direito ordinário” (STF, RE 561485, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 13/08/2009, DJe-035 26-02-2010), consagrou o entendimento de que “[a] incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.” (STJ, Súmula n. 231, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/9/1999, DJ de 15/10/1999, p. 76.) Esse entendimento foi reafirmando em recurso representativo da controvérsia no qual se afirmou que: “É firme o entendimento que a incidência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo estabelecido em lei, conforme disposto na Súmula n.º 231 desta Corte Superior. [...] O critério trifásico de individualização da pena, trazido pelo art. 68 do Código Penal, não permite ao Magistrado extrapolar os marcos mínimo e máximo abstratamente cominados para a aplicação da sanção penal. [...] Cabe ao Juiz sentenciante oferecer seu arbitrium iudices dentro dos limites estabelecidos, observado o preceito contido no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, sob pena do seu poder discricionário se tornar arbitrário, tendo em vista que o Código Penal não estabelece valores determinados para a aplicação de atenuantes e agravantes, o que permitiria a fixação da reprimenda corporal em qualquer patamar.” (STJ, REsp n. 1.117.073/PR, relatora Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/10/2011, DJe de 29/6/2012.) No mesmo sentido, o STF concluiu, em julgado submetido à sistemática da repercussão geral, que: “Circunstância atenuante genérica não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.” (STF, RE 597270 RG-QO/RS, Rel. Min. CEZAR PELUSO, julgado em 26/03/2009, DJe-104 05-06-2009.) A jurisprudência desta Corte também é nessa direção: “A confissão atrai a aplicação da atenuante de confissão espontânea prevista no artigo 65, III, ‘d’, do Código Penal [...]. Entretanto, neste caso, há óbice no Enunciado 231 da Súmula do STJ (‘A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal’).” (TRF 1ª Região, ACR 2010-76.2010.4.01.3500/GO, Rel. Desembargador Federal TOURINHO NETO, Terceira Turma, e-DJF1 p. 1297 de 08/02/2013; ACR 0034642-43.2005.4.01.3400/DF, Rel. Desembargador Federal CARLOS OLAVO, Terceira Turma, e-DJF1 p. 207 de 03/09/2010.) “Fixada a pena-base no mínimo legal, não comporta maior redução. O Supremo Tribunal Federal (STF), reconhecendo repercussão geral no RE 597270 QO-RG/RS, e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), com entendimento consolidado na Súmula 231, e reafirmado em recurso especial representativo da controvérsia (REsp 1117073 PR) firmaram a compreensão de que a existência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo estabelecido em lei.” (TRF1, ACR 0000254-10.2016.4.01.3601, Desembargador Federal OLINDO MENEZES, QUARTA TURMA, e-DJF1 15/05/2019.) Não se pode deixar de notar que: Em audiência pública realizada [em 17 de maio de 2023], integrantes da Terceira Seção – colegiado responsável por julgar matérias penais no Superior Tribunal de Justiça (STJ) – ouviram as manifestações de representantes de instituições públicas e de entidades dedicadas à defesa de pessoas acusadas em processos criminais sobre a possível revisão da Súmula 231 [no exame dos REsps 2057181, 2052085 e 1869764]. (
. Acesso em: 27.setembro.2023.) Por ora, no entanto, prevalece o entendimento de que, fixada a pena-base no mínimo legal, a incidência da atenuante da confissão espontânea não impõe a redução da pena aquém do patamar legal mínimo. Diante de tais fundamentos, não há razão jurídica para acolher o pleito da DPU nesse particular. VII A. Com base nas diretrizes acima, passo a refazer a dosimetria das penas dos apelantes, esclarecendo que, por se tratar de recurso exclusivo da defesa, a situação dos apelantes não pode ser piorada, o que configuraria reformatio in pejus. Assim, as circunstâncias judiciais consideradas favoráveis aos apelantes pelo juízo a quo não são objeto do recurso. B. Em relação ao apelante Uiramilton, o juízo de origem, na primeira fase da dosimetria, considerou “como favoráveis todas as circunstâncias” judiciais do Art. 59. Assim, dado que não pode haver modificação desse entendimento em sede de recurso exclusivo da defesa, fica o apelante inicialmente condenado nas penas de 2 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda fase da dosimetria, o juízo a quo afirmou: “Deixo de aplicar atenuante da confissão (art. 65, inciso III, letra "d", do Código Penal) vez que não pode ensejar, nesta fase, pena abaixo do mínimo legal, conforme Enunciado no 231 da Súmula do STJ, não antevendo razões nos fundamentos erigidos pela DPU para afastá-la do presente caso.” Esse entendimento fica mantido, conforme razões acima expostas (item VI, letra D). Como não ocorrem circunstâncias agravantes, o apelante permanece condenado nas penas acima. Na terceira fase da dosimetria, ausentes causas de diminuição e de aumento, conforme acertadamente reconhecido na sentença, fica o apelante Uiramilton definitivamente condenado nas penas de 2 anos de reclusão e 10 dias-multa. Ficam mantidas todas as demais determinações da sentença. C. Relativamente ao apelante Jadyel, o juízo a quo, na primeira fase da dosimetria, ponderou: “Com relação às condições do art. 59, caput, do Código Penal, tenho que o réu agiu com grande reprovabilidade dada a origem pública dos bens; sem antecedentes ou informação sobre a conduta social personalidade do agente; os motivos são atinentes ao crime praticado; circunstâncias sem elementos exasperantes; ante a recuperação dos bens, tenho que não há consequências que influam no aumento da pena base. O comportamento da vítima em nada colaborou para o evento.” Id. 250095516, P. 31. Conforme se observa, o juízo considerou como desfavorável ao réu tão somente a culpabilidade. A afirmação de que “tenho que o réu agiu com grande reprovabilidade dada a origem pública dos bens” não merece reparos. Com efeito, tendo restado plenamente comprovado que o apelante Jadyel sabia da origem pública dos bens receptados, esse conhecimento autoriza a majoração das penas-base na primeira fase da dosimetria. Com base nessa consideração o juízo a quo fixou as penas-base em 3 anos e 6 meses de reclusão e 10 dias-multa, pelo que atendeu ao critério adotado por este tribunal revisor, exposto no item VI, letra C, supra. Na segunda e terceira fases da dosimetria, o juízo a quo afirmou: “[s]em atenuantes, agravantes, causa de diminuição ou aumento”, tendo mantido as penas finais do apelante Jadyel em 3 anos e 6 meses de reclusão e 10 dias-multa. Com relação ao apelante Jadyel, ficam também mantidas todas as demais determinações constantes da sentença impugnada. VIII Em conformidade com a fundamentação acima, dou parcial provimento à apelação de Uiramilton, tão somente para reduzir as penas finais, ao mesmo tempo em que nego provimento ao recurso de Jadyel, nos termos acima delineados. É o voto. [1] No mesmo sentido, reconhecendo que “os Tribunais Superiores são soberanos no tocante ao exame de legalidade.” (STF, AI 360321 AgR, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 26/03/2002, DJ 26-04-2002 P. 75.) [2] No mesmo sentido, reconhecendo que “os Tribunais Superiores são soberanos no tocante ao exame de legalidade.” (STF, AI 360321 AgR, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 26/03/2002, DJ 26-04-2002 P. 75.) [3] No mesmo sentido, reconhecendo que “os Tribunais Superiores são soberanos no tocante ao exame de legalidade.” (STF, AI 360321 AgR, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 26/03/2002, DJ 26-04-2002 P. 75.) PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY APELAÇÃO CRIMINAL (417) n. 0002762-61.2014.4.01.4000 VOTO VISTA O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY: Trata-se de recursos de apelação interpostos contra sentença que, no que interessa, condenou os réus Uiramilton e Jadyel pela prática dos seguintes delitos: i) Uiramilton, por violação ao Art. 312, § 1º do CP, nas penas de 3 anos de reclusão e 10 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo, fixando o regime inicial aberto e substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos; [...]. iii) Jadyel, por violação ao Art. 180, § 1º do CP, nas penas de 3 anos e 6 meses de reclusão e 10 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo, fixando o regime inicial aberto e substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. Pedi vista para melhor exame dos autos, em razão da situação fática posta na denúncia: apreensão de 371 (trezentos e setenta e uma) caixas de cloreto de sódio sem nota fiscal e com adesivo de identificação do Ministério da Saúde. A prática delitiva ocorreu, segundo a denúncia, com a participação de três pessoas: Jefferson Eudes e Uiramilton combinaram que seria possível desviar medicamentos do Ministério da Saúde (de venda proibida), que estavam estocados no depósito da Secretaria de Estado de Saúde do Piauí. O réu Jefferson trabalhava com venda de medicamentos, responsável por encontrar comprador para o produto desviado; Jadyel era proprietário da empresa Dimensão Distribuidora de Medicamentos LTDA, responsável por comprar o soro desviado por Jefferson; e, finalmente, Uiramilton era vigilante que trabalhava no depósito da SESAPI. Ainda segundo a denúncia, o soro fisiológico pertencente ao Ministério da Saúde era suprimido do depósito da SESAPI em veículos de propriedade de Jefferson Eudes e levados diretamente para o depósito da empresa Dimensão, ou para a casa de Jefferson. Uiramilton e Jefferson foram condenados por peculato; e Jadyel foi condenado por receptação. O réu Jefferson não recorreu da sentença; a decisão ID 433531820, de 25/3/2025, homologou acordo de não persecução penal firmado entre o MPF e o réu Jadyel, vindo-me os autos conclusos, portanto, para prolação de voto-vista em relação ao réu Uiramilton. Como dito alhures, o pedido de vista restou justificado em razão da prática delitiva envolver a apreensão de 371 caixas de soro fisiológico, no ano de 2013, o que, como se sabe, não tem valor econômico expressivo. Todavia, tratando-se de peculato, deve-se observar o teor da Súmula 599 do STJ, no sentido de que "O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública.". Ante o exposto, acompanho o e. Relator, inclusive no que se refere à redução da pena fixada para o réu Uiramilton. É como voto. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY M PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 0002762-61.2014.4.01.4000 VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Revisor: Nada tenho a acrescentar ao relatório. As preliminares suscitadas foram devidamente enfrentada. No tocante ao exame do mérito, embasado no conjunto probatório dos autos, não há o que ser aditado ao voto do Relator, que examinou correta e suficientemente as alegações das partes recorrentes. A dosimetria da pena atende ao disposto nos arts. 59 e ss. do CP. Ante o exposto, acompanho integralmente o voto do eminente Relator e dou parcial provimento à apelação de Uiramilton de Sousa Cunha, apenas para reduzir as penas finais para 2 (dois) anos e 10 (dez) dias-multa, e nego provimento à apelação de Jadyel Silva Alencar. É o voto. Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Revisor PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 12 - DESEMBARGADOR FEDERAL LEÃO ALVES Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0002762-61.2014.4.01.4000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002762-61.2014.4.01.4000 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: JADYEL SILVA ALENCAR e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: WILLER TOMAZ DE SOUZA - CE22715-A e EUGENIO JOSE GUILHERME DE ARAGAO - DF4935-A POLO PASSIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) EMENTA PENAL E PROCESSUAL PENAL. PECULATO E RECEPTAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. DESACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO SUPRIDA PELA PROVA TESTEMUNHAL E INTERROGATÓRIO DE CORRÉU. POSSIBILIDADE. STJ E STF. PRECEDENTES. RECEPTAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENAS FINAIS INALTERADAS. PECULATO. DOLO CONFIGURADO. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. DOSIMETRIA. ALTERAÇÃO. PENAS FINAIS REDUZIDAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. A C Ó R D Ã O Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF. Juiz Federal MARCELO ELIAS VIEIRA Relator Convocado
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Processo nº 1016325-23.2018.4.01.3400
ID: 282792845
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 32 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON RAMOS
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1016325-23.2018.4.01.3400
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HUMBERTO FALRENE MIRANDA DE OLIVEIRA JUNIOR
OAB/DF XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1016325-23.2018.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1016325-23.2018.4.01.3400 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JESUS VICENTE SEVERI…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1016325-23.2018.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1016325-23.2018.4.01.3400 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JESUS VICENTE SEVERINO REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: HUMBERTO FALRENE MIRANDA DE OLIVEIRA JUNIOR - DF49935-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL RELATOR(A):NEWTON PEREIRA RAMOS NETO PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 32 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON RAMOS APELAÇÃO CÍVEL (198) 1016325-23.2018.4.01.3400 APELANTE: JESUS VICENTE SEVERINO Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO FALRENE MIRANDA DE OLIVEIRA JUNIOR - DF49935-A APELADO: UNIÃO FEDERAL RELATÓRIO O Exmo. Sr. Desembargador Federal NEWTON RAMOS (Relator): Trata-se de recurso de apelação interposto por JESUS VICENTE DA SILVA contra sentença que julgou improcedente o pedido de revisão do valor da prestação mensal, permanente e continuada, bem como de compensação por danos morais, ambos decorrentes da condição de anistiado político. Em síntese, a parte apelante alega que a prestação mensal foi fixada em valor inferior ao devido, contrariando o art. 6º da Lei nº 10.559/2002, que assegura o pagamento com base na remuneração que o anistiado teria se estivesse na ativa. Sustenta que a readmissão não exclui o direito à reparação econômica, de natureza indenizatória, podendo ser cumulada com a remuneração pelo trabalho exercido, nos termos do art. 1º, II, da referida Lei. Por fim, afirma que o pedido de danos morais é imprescritível, dada a violação de direitos fundamentais reconhecida pela própria Comissão de Anistia, sendo indevida a negativa da compensação. Contrarrazões apresentadas pugnando pela manutenção da sentença. Parecer do MPF pela desnecessidade de sua intervenção nestes autos. É o relatório. Desembargador Federal NEWTON RAMOS Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 32 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON RAMOS APELAÇÃO CÍVEL (198) 1016325-23.2018.4.01.3400 APELANTE: JESUS VICENTE SEVERINO Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO FALRENE MIRANDA DE OLIVEIRA JUNIOR - DF49935-A APELADO: UNIÃO FEDERAL VOTO O Exmo. Sr. Desembargador Federal NEWTON RAMOS (Relator): A controvérsia dos autos cinge-se à revisão da prestação mensal, permanente e continuada, concernente à condição de anistiado político do autor, bem como à compensação por danos morais decorrentes dos atos que culminaram na concessão de anistia. De início, insta consignar que, durante o processo de redemocratização do Brasil, a Constituição Federal de 1988 trouxe a previsão de concessão de anistia aos crimes políticos cometidos no período que compreendeu o início da ditadura militar e a promulgação da Constituição, conforme art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). A regulamentação do art. 8º da ADCT, por sua vez, foi realizada pela Lei nº 10.559/2002, conhecida como a Lei da Anistia. A referida Lei contemplou o direito de percepção de reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, além de estabelecer os critérios e procedimentos para a concessão de anistia. Acerca da prejudicial de prescrição, convém destacar que essa se configura com a perda da pretensão de direito material – que nasce com a violação do direito – pelo seu não exercício no prazo legal, prazo este que varia de acordo com a demanda e visa estabilizar as relações jurídicas e evitar litígios indefinidos. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece que o advento da Lei nº 10.599/2002 importou na renúncia tácita à prescrição. Contudo, a referida imprescritibilidade diz respeito à declaração do direito à anistia, tendo em vista que as ações que objetivam a revisão dos atos de sua concessão estão sujeitas ao prazo prescricional do Decreto nº 20.910/1932. Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 1.435.501/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 26/06/2020; AREsp n. 1.894.389/PA, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 26/4/2022, DJe de 29/4/2022; STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.947.491/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 17/12/2021. O entendimento firmado por esta Turma julgadora se alinha no sentido de que o pedido de revisão do ato concessivo de anistia política não constitui demanda de trato sucessivo, mas sim uma situação pontual, sujeita ao prazo prescricional quinquenal estabelecido pelo Decreto nº 20.910/1932. Dessa forma, entende-se que referido prazo decorre a partir da ciência do ato pelo interessado, findo o qual se opera a prescrição, precluindo a possibilidade de revisão judicial do ato administrativo. Por outro lado, vale ressaltar que a conclusão acima exposta não se estende ao pleito de compensação por danos morais, visto que, conforme jurisprudência do STJ, tal pedido é considerado imprescritível. A propósito: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. REGIME MILITAR. ANISTIA POLÍTICA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. HERDEIROS. LEGITIMIDADE. PRESCRIÇÃO. INAPLICABILIDADE. CONDENAÇÃO. REVISÃO DO QUANTUM. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. INCIDÊNCIA. [...] 3. O prazo quinquenal previsto no Decreto n. 20.910/1932 é inaplicável às ações que objetivam reparação por danos morais ocasionados por torturas sofridas durante o período do regime militar, demandas que são imprescritíveis, tendo em vista as dificuldades enfrentadas pelas vítimas para deduzir suas pretensões em juízo. [...] (AgInt no REsp n. 1.524.498/PE, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 13/12/2018, DJe de 20/2/2019.) No caso em análise, verifica-se que o autor foi declarado anistiado político nos termos da Portaria nº 1.170, de 31/7/2015 (fl. 27, id. 88770017) e a presente ação foi ajuizada em 14/8/2018, razão pela qual a pretensão não se encontra fulminada pela prescrição. Passo, portanto, à análise do mérito propriamente dito. In casu, narra a autora, ex-empregada da Empresa de Correios e Telégrafos - ECT, ter sido demitido na década de 80 por motivação exclusivamente política, razão pela qual obteve a Declaração de Anistiado Político e o direito à prestação mensal, permanente e continuada. Contudo, afirma que, se estivesse em atividade, faria jus a remuneração superior à que atualmente percebe, havendo significativa defasagem entre o valor pago e aquele que entende ser devido. Nesse contexto, defende que o arbitramento genérico não pode prevalecer em detrimento de informações específicas prestadas pela empresa à qual o recorrente era vinculado. Isso porque a prestação mensal, permanente e continuada deve estar fielmente vinculada à remuneração da ativa, de forma a ser preservado o propósito constitucional de assegurar ao anistiado punido na esfera profissional os verdadeiros rendimentos mensais que auferiria caso não tivesse sido vítima de perseguição política. Com efeito, dispõe o art. 6º, caput e § 1º, da Lei nº 10.599/2002, que o valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, conforme os elementos de prova oferecidos pelo requerente. Ato contínuo, o art. 7º, § 2º, da mesma Lei estipulou que, para o cálculo da prestação mensal, serão asseguradas, na inatividade, na aposentadoria ou na reserva, as promoções ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teria direito se estivesse em serviço ativo. Destarte, não se desconhece a possibilidade de revisão do valor correspondente à prestação mensal, permanente e continuada, toda vez que esse não esteja de acordo com os arts. 6º a 9º da referida Lei. No entanto, incumbe à parte autora fazer prova dos elementos que demonstram o equívoco dos valores previamente fixados pela Comissão de Anistia. Para corroborar suas alegações, a parte apelante trouxe aos autos tão somente a cópia do processo administrativo que tramitou perante à Comissão de Anistia (id. 88769541 a id. 88770017). Na hipótese, para fins de comprovação da evolução salarial e do correto enquadramento funcional do autor, não há documentos que estabeleçam de forma concreta e inequívoca a progressão funcional do apelante. Afigura-se essencial, portanto, a apresentação de elementos complementares, como contracheques de paradigmas e tabelas salariais da função exercida, para assegurar o estabelecimento de um montante equitativo, que reflita de maneira fidedigna a situação salarial que o anistiado vivenciaria. Ademais, registra-se que a evolução funcional dentro de uma empresa depende de critérios individuais, como desempenho, avaliações internas, tempo de serviço e necessidade do empregador. Dessa forma, não há como acolher a pretensão recursal quanto ao correto enquadramento salarial, diante da ausência de comprovação hábil a fundamentar o pedido. No tocante ao dano moral, esse pode ser definido como a violação objetiva de um direito da personalidade, cuja reparação tem por escopo compensar prejuízos advindos de um evento danoso. No âmbito da anistia política, admite-se a cumulação da compensação por dano moral com a reparação econômica estabelecida pela Lei nº 10.559/2002, dada a natureza distinta de seus fundamentos e propósitos (Súmula nº 627/STJ). No entanto, é imperativo ressaltar que o dano moral não é presumido (in re ipsa), demandando a apresentação de evidências probatórias específicas e concretas relacionadas aos prejuízos suportados. Tal entendimento também é adotado por esta Corte. Confira-se: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ANISTIA. ECT. REVISÃO DA PRESTAÇÃO CONTINUADA. DIRETRIZES PARA CÁLCULO. ART. 6º, § 1º, DA LEI N. 10.559/2002. DESCABIMENTO. VALOR IGUAL À REMUNERAÇÃO DO EMPREGO COMO SE NA ATIVA ESTIVESSE OU EQUIPARAÇÃO A PARADIGMAS. BENEFÍCIOS INDIRETOS. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA SUA EXISTÊNCIA NO MOMENTO DA DEMISSÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ABALO PSICOLÓGICO OU PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. SENTENÇA MANTIDA. [...] 9. Em se tratando de concessão de anistia, o entendimento deste Tribunal é de que não se aplica o dano moral in re ipsa, ou seja, o dano moral não é presumido, sendo imprescindível a comprovação de abalo psicológico sofrido pela pessoa anistiada no caso concreto, sendo "cabível indenização por dano moral a anistiado político e/ou dependente a quem foi submetido a perseguição política durante o período de exceção, atingindo suas esferas física e psíquica" (AC 1007912-84.2019.4.01.3400, Desembargador Federal SOUZA PRUDENTE, TRF1 - Quinta Turma, PJe 17/04/2023). [...] (AC 0067242-34.2016.4.01.3400, Des. Federal JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 – SEXTA TURMA, PJe 04/07/2023. Grifos nossos) Assim, não obstante os argumentos trazidos na inicial e na peça recursal, entendo que o apelante não se desincumbiu do ônus de provar o alegado. Constata-se, em verdade, que a parte se limitou a apresentar considerações genéricas, sem a devida individualização de eventual perseguição política sofrida e/ou outros atos de exceção praticados pelo Estado sob o regime ditatorial. Em consequência, a ausência de elementos específicos e concretos compromete a caracterização dos danos morais, uma vez que a comprovação de tais prejuízos exige evidências precisas e não meramente abstratas. Com tais razões, voto por negar provimento à apelação. Mantida a sucumbência, cabível a condenação da parte apelante ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como da verba honorária, ora majorada para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, a favor da parte apelada, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. Se a parte sucumbente for beneficiária da justiça gratuita, fica suspensa a exigibilidade das obrigações decorrentes da condenação (CPC, art. 98, § 3º). Desembargador Federal NEWTON RAMOS Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 32 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON RAMOS APELAÇÃO CÍVEL (198) 1016325-23.2018.4.01.3400 APELANTE: JESUS VICENTE SEVERINO Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO FALRENE MIRANDA DE OLIVEIRA JUNIOR - DF49935-A APELADO: UNIÃO FEDERAL EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. ANISTIA POLÍTICA. REVISÃO DO ATO CONCESSIVO DE ANISTIA. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO NÃO VERIFICADA. DEFASAGEM SALARIAL. AUSÊNCIA DE PROVAS CONCRETAS. DANOS MORAIS. IMPRESCRITIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. APELAÇÃO DESPROVIDA. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedente o pedido de revisão do valor da prestação mensal, permanente e continuada, bem como de compensação por danos morais, ambos decorrentes da condição de anistiado político. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é possível revisar o valor da prestação mensal, permanente e continuada com base em eventual equívoco no arbitramento inicial; e (ii) saber se é devida a compensação por danos morais, ainda que ausente prova concreta de prejuízo individualizado decorrente de perseguição política. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A jurisprudência do STJ reconhece que o advento da Lei nº 10.599/2002 importou na renúncia tácita à prescrição. Contudo, a referida imprescritibilidade diz respeito à declaração do direito à anistia e ao pleito de compensação por danos morais, tendo em vista que as ações que objetivam a revisão dos atos de sua concessão estão sujeitas ao prazo prescricional do Decreto nº 20.910/1932. 4. Conforme entendimento desta Turma, o pedido de revisão do ato administrativo que concede a anistia não se configura como demanda de trato sucessivo, mas sim como uma situação pontual, sujeita ao prazo prescricional quinquenal, contado a partir da ciência do ato pelo interessado. 5. O transcurso de prazo inferior a cinco anos entre a data da ciência do ato administrativo e a solicitação de sua retificação não configura a prescrição, permitindo a possibilidade de sua revisão judicial, como no caso dos autos. 6. O art. 6º da Lei nº 10.559/2002 prevê que o valor da prestação mensal deve corresponder à remuneração que o anistiado político perceberia se estivesse em atividade. Para tanto, exige-se prova concreta do enquadramento funcional e da evolução salarial, conforme critérios da empresa em que o anistiado atuava. 7. A inexistência de documentos aptos a demonstrar a progressão funcional do anistiado, bem como a ausência de parâmetros objetivos, como contracheques de paradigmas ou tabelas salariais do cargo de origem, inviabiliza a revisão do valor da prestação mensal, permanente e continuada. 8. Em matéria de anistia política, o dano moral não é presumido (in re ipsa), demandando a apresentação de evidências probatórias específicas e concretas relacionadas aos prejuízos suportados. 9. A apresentação de considerações genéricas, sem a devida individualização de eventual perseguição política sofrida e/ou de outros atos de exceção praticados pelo Estado sob o regime ditatorial, compromete a caracterização dos danos morais. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Apelação desprovida. Tese de julgamento: “1. A revisão de atos administrativos relacionados à anistia política está sujeita ao prazo prescricional quinquenal previsto no Decreto nº 20.910/1932. 2. O prazo prescricional para a revisão judicial de atos administrativos começa a fluir a partir da ciência do ato pelo interessado. 3. A revisão da prestação mensal prevista no art. 6º da Lei nº 10.559/2002 depende de prova documental inequívoca da evolução funcional e salarial do anistiado político. 4. O pleito de compensação por danos morais decorrentes de perseguição política é imprescritível, desde que devidamente comprovado o abalo psicológico ou o dano causado." Legislação relevante citada: CF/1988, art. 8º do ADCT; Lei nº 10.559/2002, arts. 6º, 7º, § 2º, e 9º; Decreto nº 20.910/1932; CPC, arts. 85, § 11, e 98, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.435.501/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 26/06/2020; STJ, AREsp 1.894.389/PA, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 29/04/2022; STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.947.491/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 17/12/2021; STJ, AgInt no REsp 1.524.498/PE, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 20/02/2019; TRF1, AC 0067242-34.2016.4.01.3400, Rel. Des. Fed. Jamil Rosa de Jesus Oliveira, Sexta Turma, PJe 04/07/2023. ACÓRDÃO Decide a 11ª Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator. Brasília/DF. Desembargador Federal NEWTON RAMOS Relator
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Processo nº 1009980-49.2024.4.01.3200
ID: 328529430
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1009980-49.2024.4.01.3200
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ELIZANDRA LUCIANE PINTO DA SILVA
OAB/AM XXXXXX
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JOAO EVANGELISTA GENEROSO DE ARAUJO
OAB/AM XXXXXX
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JAIR PINHEIRO SOUZA
OAB/AM XXXXXX
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CRISTIANE GAMA GUIMARAES
OAB/AM XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1009980-49.2024.4.01.3200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1009980-49.2024.4.01.3200 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: MINISTERIO PUBLIC…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1009980-49.2024.4.01.3200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1009980-49.2024.4.01.3200 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - MPF e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: CRISTIANE GAMA GUIMARAES - AM4507-A, JAIR PINHEIRO SOUZA - AM12722-A, JOAO EVANGELISTA GENEROSO DE ARAUJO - AM12394-A e ELIZANDRA LUCIANE PINTO DA SILVA - AM12704-A POLO PASSIVO:MARDEN SAMPAIO SENA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ALDEMIR DA ROCHA SILVA JUNIOR - AM5445-A e REINALDO DE LEMOS FREITAS - AM13396-A RELATOR(A):DANIELE MARANHAO COSTA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): Trata-se de apelações interpostas por Diogo Miller Abranches, Eduarda Bentes de Souza, contra sentença que os condenou pela prática, ambos, do delito do art. 157, §3º, II, c/c art. 14,II, os dois do CP (latrocínio tentado) e, a segunda, também pelo crime do art. 340 do CP, ao tempo em que absolveu Mardem Sampaio Sena, da imputação de latrocínio tentado, parte essa da sentença que é objeto da apelação também do Ministério Público Federal, mas o condenou pela prática do delito do art. 340 do CP, juntamente com Eduarda, condenação contra a qual não recorreu. Eduarda Bentes teve fixada a pena cumulada pelos dois crimes em 07 (sete) anos e 08 (oito) meses de reclusão, 01 (um) mês de detenção (regime inicial semiaberto) e 33 (trinta e três) dias-multa (1/30 do salário-mínimo); e Diogo Miller a uma pena cumulada de 13 (treze) anos e 03 (três) meses de reclusão (regime inicial fechado), além de 90 (noventa) dias-multa (1/10 do salário-mínimo). O Ministério Público Federal recorre com a intenção condenar Marden Sampaio pela prática do crime previsto no artigo 157, §3º, II, c/c o art. 14, II, ambos do CP, na compreensão de que a instrução teria produzida prova suficiente para sustentar a condenação. Em seu recurso, Diogo Miller, pugna pela anulação do processo, desde o início, tendo em vista cerceamento de defesa pelo indeferimento da diligência relativa à geolocalização do celular (95) 99111-7374, no dia 09/12/2023, no período da ocorrência dos fatos, com o sobrestamento do processo para que seja realizada a referida diligência. No mérito, alega ausência de provas de autoria contra o recorrente, em razão do que pede a sua absolvição. A defesa de Eduarda Bentes sustenta que a condenação, no tocante ao latrocínio tentado, deve ser desconstituída por ausência de prova suficiente quanto à autoria delitiva, postulando a aplicação do princípio constitucional da presunção de inocência, pois não foram produzidos elementos probatórios idôneos e consistentes que permitam afirmar, com segurança, a participação da recorrente no crime de latrocínio tentado, sendo a prova produzida em juízo frágil, contraditória e insuficiente. Destaca que, em seu interrogatório judicial, confessou apenas a prática do crime de comunicação falsa, negando integralmente sua participação nos fatos relativos à tentativa de latrocínio, tanto assim que a vítima Benildo Melo Rodrigues, ao ser ouvido em juízo, declarou não reconhecer a ré, tampouco saber se ela estava no veículo de onde partiram os disparos, o que fragiliza sobremaneira a acusação, devendo prevalecer a máxima in dubio pro reo. Oficiando nos autos, o órgão do Ministério Público Federal nesta instância, em parecer firmado pelo Procurador Regional da República José Alfredo de Paula Silva, opina pelo desprovimento da apelação do MPF e pelo provimento das apelações dos denunciados, para absolvê-los. (Id. 432896872) É o relatório. Sigam os autos ao exame da e. revisora, que pedirá a designação de dia para o julgamento (art. 613, I, CPP). PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): DO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Afirma o MPF que os autos conteriam elementos probatórios suficientes para ensejar a condenação de Marden Sena, destacando que, logo após a tentativa frustrada da prática do latrocínio, ele compareceu à delegacia juntamente com a corré Eduarda Bentes para registrar boletim de ocorrência falso, atribuindo o desaparecimento do veículo Fiat Doblò – utilizado no crime – a um suposto roubo previamente inexistente, conduta esta que, segundo o MPF, visa ocultar sua participação no delito. Ressaltou ainda que o rastreamento do veículo desmentiu a versão apresentada, demonstrando que o automóvel não esteve na oficina de Marden Sena nos dias indicados. Além disso, o acusado apresentou versões contraditórias ao longo da investigação, alegando, por exemplo, que teria sido coagido a prestar informações falsas, narrativa que também se mostrou incongruente com a linha cronológica dos eventos. Afirma que o vínculo com os demais corréus também teria sido comprovado, especialmente pela admissão, em juízo, de que teria recebido valores de Diogo Miller, sob a justificativa de supostos reparos mecânicos, o que o MPF entende ser tentativa de dissimulação do verdadeiro propósito da transação. A instrução foi posteriormente reforçada por relatório de análise pericial dos aparelhos celulares apreendidos com Marden Sena, no qual a Polícia Federal apontou diálogos comprometedores com interlocutores diretamente envolvidos no planejamento e execução do crime. As mensagens trocadas, inclusive com a corré Eduarda Bentes, indicam clara articulação para encobrir os fatos, inclusive mediante orientação jurídica para a criação de versões falsas e tentativa de retirada do veículo do pátio da Polícia Federal com uso de documentação forjada elementos que MPF entende suficientes para confirmar a condenação. Em que pesem os fundamentos do recurso, as conclusões acerca da eventual participação de Marden Sena são circunstanciais, sem aptidão de gerar certeza e segurança para a sua condenação, senão pelo delito de falsa comunicação de crime, pelo qual foi condenado. Não há elementos que o ligue na execução do delito, não podendo ser a sua participação no latrocínio decorrer apenas do fato de haver participado da falsa comunicação do furto do veículo Fiat/Doblô. Esse é apenas um juízo de probabilidade, mas não de certeza. Não socorre a pretensão do MPF o fato de haver laudo pericial de análise do aparelho celular do denunciado Marden, pois isso somente ocorreu após a prolação da sentença, o que impede a sua utilização como prova hábil para condenar o réu, pois se trata de prova produzida a destempo e, por isso, não submetida a contraditório ordinário. Nesse sentido há jurisprudência do STJ que desautoriza a sua utilização, no sentido de que “[a]figura-se ilegal a utilização, pelo Tribunal de Justiça, de laudo juntado aos autos de forma extemporânea, para fundamentar a manutenção da qualificadora. É que, quando da prolação da sentença, não havia laudo pericial acerca do arrombamento. O laudo, indispensável à demonstração da qualificadora, apenas foi juntado após a sentença, havendo, de fato, a produção extemporânea da prova.[...] (STJ, AgRg no AREsp n. 1.995.588/DF, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 8/3/2022, DJe de 14/3/2022). DOS RECURSOS DOS RÉUS Essa mesma fragilidade que se observa na demonstração da possível conduta do denunciado Marden Sena na eventual prática do latrocínio se observa para os outros dois denunciados, com a devida vênia do prolator da sentença. Nesse sentido é também a visão da Procuradoria Regional da República, quando afirma que “[a]pós a instrução, a imputação ficou amparada apenas na falsa comunicação do roubo do Fiat Doblô e no conhecimento da existência do Chevrolet Celta. Elementos, por óbvio, insuficientes para a condenação pelo delito de latrocínio tentado.[...] Vejamos o que disse a sentença (negritos acrescidos): [..] DA AUTORIA DE DIOGO MILLER ABRANCHES Em relação ao acusado DIOGO MILLER ABRANCHES, o MPF na denúncia aponta que este participou da tentativa de latrocínio, tendo agido diretamente na ação criminosa e cedido o automóvel Chevrolet Celta placa OAI 0744 para o intento. Analisando os autos, tem-se que DIOGO MILLER estava na posse do veículo Celta, que conforme exposto no tópico da materialidade, foi usado como carro de cobertura na ação, escoltando o Fiat Dobló usado na abordagem às vítimas, e servindo para a fuga dos agentes que perpetraram a tentativa de roubo. Neste sentido, a investigação policial apurou que o automóvel Celta usado na ação criminosa estava registrado em nome de DANIEL BARBOSA DA SILVA, porém, este declarou à Polícia Federal que havia vendido o carro em 2023, e fez uma procuração para DIOGO MILLER ABRANCHES, a fim deste resolver todo e qualquer assunto relacionado à venda e transferência do referido veículo. O instrumento de procuração foi juntado no ID 2115890749, após diligências junto ao cartório de notas que expediu o documento. Foi apurado ainda que, desde o dia da tentativa de latrocínio, o veículo Celta placa OAI 0744 não foi mais visto circulando nas ruas de Manaus. Conforme exposto no relatório de monitoramento juntado no ID 2115890751, a última passagem registrada do automóvel foi no dia 09/12/2023 às 11h24min, pouco tempo depois do horário estimado do crime, tendo sido detectado na Avenida Nathan Xavier de Albuquerque, sentido Parque das Garças, na altura do Residencial Estoril, ainda nas proximidades da Avenida das Torres, local do delito. O mesmo relatório ainda destacou a possível localização do automóvel (ID 2115890751 – pág. 4), e com base nesta informação, a Polícia Federal conseguiu localizar o Celta, que estava estacionado em uma casa na Rua Tocantins, no bairro Cidade Nova, dentro do perímetro apontado como possível paradeiro do carro. Durante a instrução processual, a testemunha ALFREDO SOUSA NETO declarou que via o veículo Celta estacionado na frente da casa de DIOGO MILLER todos os dias. Já a testemunha SANDRO ABREU RIBEIRO, dono da casa onde o Celta ficou guardado após o crime, confirmou que o carro ficou em sua residência a pedido de DIOGO, argumentando que não tinha lugar onde guardá-lo, ficando no local por cerca de um mês. Os fatos elencados acima, portanto, indicam não apenas a posse de DIOGO MILLER do Chevrolet Celta placa OAI 0744, utilizado na tentativa de roubo realizada no final da manhã de 09/12/2023, como a intenção inequívoca do acusado em ceder o veículo para a ação criminosa, visto ter escondido o mesmo em casa de terceiro logo após o delito. Diante da autoridade policial, DIOGO MILLER admitiu ser o dono do Chevrolet Celta, mas alega que o veículo estava alugado para uma pessoa chamada PINGO, do qual não sabe o nome verdadeiro e não tinha contrato escrito, apenas verbal. Afirmou que recebeu o valor de R$ 500,00 em espécie pelo aluguel. Declarou que não sabia que o Celta fora usado na tentativa de roubo, e que no dia do crime o veículo havia sido abandonado no conjunto Colina do Aleixo, sendo encontrado por um amigo chamado ALFREDO, que seria oficial de justiça, e que deixou o veiculo na casa de seu amigo SANDRO por medo de represálias. Em seu interrogatório judicial, DIOGO MILLER se declarou inocente, afirmando não saber por que estava tendo problemas por um carro que tinha alugado. Afirmou conhecer MARDEN por levar seus carros para fazer revisão na oficina do corréu. Afirmou novamente que alugou seu carro para PINGO na tarde de 04/12/2023, tendo o conhecido na oficina de MARDEN, mas desconhece seu verdadeiro nome. PINGO teria se interessado em alugar o carro do acusado, tendo acertado o valor do aluguel, que foi pago em espécie. Não pediu nenhum documento a PINGO, tendo confiado nele pelo fato de às vezes estar na oficina de MARDEN. Argumenta que no dia do delito estava em sua rotina normal de trabalho, cuidando de uma obra em um imóvel que estava alugando, saiu para comprar camarão junto com sua esposa em ma loja próxima, além de ter ido a um shopping à tarde para comprar roupa, pois iria viajar para Roraima. Declarou que PINGO teria lhe informado no fim da tarde que o carro Celta tinha dado pane e estava no conjunto Colina do Aleixo, e foi buscar o automóvel naquele local junto com um amigo chamado ALFREDO, tendo trazido o carro rebocado para sua residência. Afirmou que no dia seguinte viajou a Roraima e voltou a Manaus no dia 21 daquele mês. Declarou que deixou o carro na casa de SANDRO após ter bebido na casa dele no dia 30/12, e que estava sendo seguido pela Polícia Federal e filmado por um drone quando estava em um sítio. Afirmou que soube que o carro Celta foi usado no crime somente após sua prisão, através do delegado que tinha lhe prendido. Declarou que o carro teve um problema na bateria, e que PINGO estava junto com o carro em pane. Afirmou que não conseguiu mais contato com PINGO após este dia. Declarou que deixou o carro na casa de SANDRO pois estava negociando uma moto com a filha dele. A defesa técnica argumenta não existir provas de participação do acusado no crime, sustentando a versão dos fatos apresentada pelo réu em audiência, alegando que este não poderia ter participado diretamente da tentativa de latrocínio, pois estava em outro lugar da cidade no momento do crime. Diante do contexto fático presente nos autos, inicialmente não existem provas de que DIOGO MILLER tenha tido participação direta na tentativa de latrocínio, no local da ação. Em verdade, mesmo após diversas diligências e atos probatórios, não se conseguiu descobrir quem foram os agentes que perpetraram o crime nas proximidades da Avenida das Torres contra as vítimas BENÍCIO MELO e LUCAS CRUZ. Dessa forma, é possível que DIOGO MILLER estivesse no local dos fatos, dirigindo o automóvel Celta, porém nãohá prova cabal quanto à sua presença no local. Porém, as provas colhidas e descritas nesta sentença demonstram cabalmente que DIOGO MILLER ABRANCHES participou da preparação do crime, ao, no mínimo, ceder o automóvel Chevrolet Celta placa OAI 0744 aos agentes que perpetraram a tentativa de latrocínio, de forma livre, e consciente de que o carro seria utilizado para o cometimento do delito. Além de, pelo menos, ter cedido o automóvel, foi DIOGO MILLER quem providenciou que o automóvel imediatamente após o latrocínio ficasse escondido e fora de circulação detectável pelo "paredão" da Secretaria de Segurança Pública. Ou seja, o veículo ficou literalmente escondido na casa de um terceiro dentro da área para a qual houve a fuga dos envolvidos no latrocínio, sem detecção pelas câmeras da polícia que identificam a movimentação de automóveis dentro da cidade de Manaus. Note-se que o réu DIOGO apresentou diferentes versões tanto para ter reavido o carro após o crime, quanto para ter escondido o carro. Nenhuma delas, porém, foi respaldada pela prova dos autos, já que ALFREDO negou ter encontrado o automóvel abandonado e SANDRO negou que ele ou sua filha tivessem a intenção de comprar o Celta, que apenas guardou o automóvel a pedido de DIOGO, como um favor. Demonstram este fato a ausência de registros de circulação do veículo após o crime, tendo ficado escondido na casa de um terceiro, sem motivação aparente. Da mesma forma, as alegações de que alugou o carro para uma pessoa chamada PINGO, sem ao menos saber quem era, de forma verbal e não tendo sequer uma cópia de algum documento seu, demonstra a tentativa do réu de não apenas se eximir da responsabilização penal, mas também ocultar as pessoas que participaram diretamente da tentativa de roubo da carga de ouro. Desta forma, ficou demonstrado definitivamente a participação de DIOGO MILLER ABRANCHES na presente empreitada delituosa, ao ceder o automóvel Chevrolet Celta placa OAI 0744 utilizado no dia 09/12/2023 como veículo de escolta e de fuga na tentativa de latrocínio ocorrida naquela data. Assim sendo, tendo cometido o crime do artigo 157, §3°, II, c/c o art. 14, II, do Código Penal, deve o acusado DIOGO MILLER ABRANCHES ser condenado às respectivas penas do delito, sem que haja causa excludente de ilicitude ou culpabilidade a lhe beneficiar.” “DA AUTORIA DE EDUARDA BENTES DE SOUZA Conforme a denúncia, a ré acima nominada teria participado da tentativa de latrocínio ocorrida em 09/12/2023. A inicial discorre que a acusada teria cedido o veículo Fiat Dobló placa OAJ 7J07 para a ação criminosa, e participado diretamente da citada empreitada delituosa. Atentando-se aos elementos fáticos, tem-se que a acusada estava na posse do automóvel Fiat Dobló usado na tentativa de roubo. O veículo está registrado no nome de RICCELLI DOS SANTOS PINTO, que é seu companheiro, mas estava na posse da ré pelo fato de o proprietário estar preso pelo cometimento do crime de tráfico de drogas à época dos fatos. Como será melhor exposto em tópico próprio, EDUARDA registrou falsamente o roubo do Fiat Dobló usado na ação de forma a mitigar sua responsabilidade na empreitada criminosa efetuada. Como já exposto anteriormente, o veículo foi encontrado no local do crime, abandonado com uma pistola Glock, munições, “miguelitos” e roupas camufladas do tipo militar. Sobre os fatos, EDUARDA, em sede policial, declarou que o Fiat Dobló usado no crime estava sendo usado há cinco meses por um indivíduo chamado PINGO, e que vinha sendo ameaçada pelo mesmo. Negou qualquer tipo de envolvimento com a tentativa de roubo. A ré, em sede policial, reconheceu por meio de fotografia, e depois em acareação pessoal, PINGO como o nacional JANDERSON AGUIAR DA SILVA. Porém, este não foi reconhecido por RICCELLI DOS SANTOS PINTO. A investigação policial também não conseguiu encontrar nenhum outro elemento que vinculasse JANDERSON ao crime de latrocínio tentado. Em seu interrogatório judicial, EDUARDA declarou ser inocente das acusações de envolvimento no roubo, admitindo a falsa comunicação de crime. Declarou que PINGO estava com o carro Fiat Dobló desde 2023 e lhe pagava R$ 300,00 por semana, às vezes apenas R$ 100,00. Declarou que entregou o carro a PINGO a mando de seu marido RICCELLI, que estava preso. Na véspera do crime, afirmou ter levado o Fiat Dobló na oficina de MARDEN juntamente com PINGO para resolver um problema nos freios, e que levou neste local por ter “intimidade” com MARDEN, mas não soube dizer o valor do conserto. Confirmou que PINGO se trata de JANDERSON AGUIAR DA SILVA. Declarou não conhecer o corréu DIOGO MILLER. Afirmou que soube da tentativa de roubo somente na noite do crime, por meio de jornal e portais de notícias. Não sabe dizer porque RICCELLI declarou não conhecer PINGO na acareação diante da autoridade policial. Declarou não saber dirigir. A defesa técnica, por seu turno, argumenta não existir provas de que EDUARDA tenha participado da empreitada delituosa ou que tenha cometido os fatos imputados pela denúncia. Tendo em vista os elementos fáticos presentes nos autos, a princípio não existem provas de que EDUARDA tenha participado de forma direta na cena da tentativa de latrocínio, não se podendo confirmar de forma segura que a ré estava presente, no momento do crime, em um dos carros envolvidos na tentativa de latrocínio. Por outro lado, porém, é inegável que o veículo que estava na posse de EDUARDA foi utilizado na tentativa de latrocínio, conforme exposto no tópico da materialidade. Neste sentido, a atitude da ré em fazer a falsa comunicação de crime demonstra que esta tinha ciência de ter cedido o automóvel Fiat Dobló que estava em sua posse para a empreitada criminosa. Na realidade, não faz sentido a ré ter registrado um boletim de ocorrência, mesmo que fosse supostamente a mando de outra pessoa, a não ser que procurasse evitar eventual vinculação com o crime cometido por meio do veículo que estava na sua posse. Ademais, a ré também não procurou comprovar faticamente que o referido carro estava na posse de PINGO na época do crime, podendo-se concluir que EDUARDA estava na posse do carro Fiat Dobló usado no crime, e de forma livre e consciente, cedeu-o para a tentativa de latrocínio ocorrida no dia 09/12/2023. Isto posto, tem-se que EDUARDA BENTES DE SOUZA, ao ceder o veículo Fiat Dobló placa OAJ 7J07 de forma consciente para a realização da tentativa de roubo à mão armada de 47 kg de ouro no dia 09/12/2023 nesta cidade de Manaus, cometeu o crime do artigo 157, §3°, II c/c o art. 14, II do Código Penal, devendo ser condenada às respectivas penas do delito, sem que haja causa excludente de ilicitude ou culpabilidade a lhe beneficiar.”[...] A instrução permite colocar os veículos na cena do crime como aqueles utilizados na tentativa de latrocínio, mas não permite fazer o mesmo com os réus, senão por meio de suposição do órgão de acusação e do julgador, como se evidencia nos próprios termos da sentença, o que torna impossível a condenação, que deve observar rigorosamente os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e, sobretudo, da presunção de inocência, conforme insculpido no art. 5º, incisos LIV, LV e LVII da Constituição Federal. Nesse sentido, tem-se que a prova exclusivamente indiciária ou circunstancial, desacompanhada de elementos seguros de autoria e materialidade, é insuficiente para amparar um decreto condenatório. O Código de Processo Penal, em seu art. 386, inciso VII, estabelece que o juiz absolverá o réu quando não houver prova suficiente para a condenação, sendo este o desdobramento lógico do princípio in dubio pro reo, que exige certeza quanto à autoria e à materialidade delitivas para se firma uma sentença condenatória. A prova indiciária, embora admitida no ordenamento jurídico brasileiro como forma válida de instrução, exige a presença de um conjunto harmônico, coerente e convergente de circunstâncias que apontem, de maneira segura e inequívoca, para a responsabilidade penal do acusado. Quando isolada ou dissociada de provas diretas, ela assume caráter meramente especulativo, vulnerando os direitos fundamentais do imputado e tornando impossível o juízo de certeza exigido para a imposição da pena criminal. É dizer, a sentença penal condenatória deve se fundar em prova segura, inequívoca e convincente da autoria e da materialidade do delito, não se podendo admitir condenação com base apenas em indícios frágeis ou em meras conjecturas. Portanto, a inexistência de provas diretas e a presença apenas de elementos indiciários, sobretudo se frágeis ou isolados, impedem a formação do convencimento judicial necessário à condenação, sob pena de se incorrer em violação às garantias processuais penais e ao Estado Democrático de Direito. É imprescindível que a culpa do réu seja demonstrada de forma inequívoca, sob pena de se impor sanção penal sem base fática e jurídica adequada, o que é expressamente vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Isso, bem entendido, no que tange ao crime de latrocínio tentado, devendo prevalecer a sentença quanto à condenação da ré Eduarda Bentes no crime de art. 340 do CP, até porque o recurso não se insurgiu contra essa condenação, bem como porque a ré confessou essa prática delitiva. CONCLUSÃO Diante do exposto, nego provimento à apelação do MPF e dou provimento à apelação dos réus, para absolvê-los do crime do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, ambos do CP, com base no art. 386, VII, do CPP. Concedo habeas corpus de ofício para determinar a revogaçao imediata da prisão preventiva do réu Diogo Miller Abranches, se não estiver preso por outro motivo. É o voto. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA APELAÇÃO CRIMINAL (417) 1009980-49.2024.4.01.3200 VOTO REVISOR A Exma. Sra. Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva (Revisora): Após a análise dos autos, nada tenho a acrescentar ao relatório. A e. Relatora vota para I) negar provimento à apelação do MPF; e II) dar provimento aos recursos de apelação dos réus para absolvê-los do crime do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, ambos do CP, com fundamento no art. 386, VII, do CPP. Consta da denúncia (ID 424869143) que os réus EDUARDA BENTES, MARDEN SAMPAIO e DIOGO MILLER, em 09 de dezembro de 2023, tentaram subtrair coisa móvel alheia (ouro), mediante violência, que não resultou em morte por circunstâncias alheias às vontades deles. Narra ainda que em 09 de dezembro de 2023, EDUARDA BENTES e MARDEN SAMPAIO, provocaram a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime de roubo que sabiam não se ter verificado. Em sentença (ID 424869280), o Juízo a quo julgou parcialmente procedente a presente ação penal para i) Condenar EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES pela prática do crime previsto no artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada); ii) Condenar EDUARDA BENTES DE SOUZA e MARDEN SAMPAIO SENA às penas do artigo 340 do Código Penal (falsa comunicação de crime); e iii) Absolver o réu MARDEN SAMPAIO SENA da acusação referente ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada), na forma do artigo 386, V, do CPP. Nesta instância, a Procuradoria Regional da República manifesta pelo não provimento da apelação do MPF e pelo provimento das apelações defensivas para absolver os apelantes EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES da prática do crime previsto no artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (ID 432896872). Compulsando a íntegra dos autos, não divirjo dos fundamentos lançados no acurado voto da eminente Relatora para a) negar provimento à apelação do MPF; e b) dar provimento às apelações de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES para absolvê-los da prática do crime previsto no artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada). Do recurso do MPF O MPF insurge contra a absolvição do apelado MARDEN SAMPAIO SENA quanto ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada), sustentando que os elementos probatórios produzidos nos autos comprovaram a associação de MARDEN a EDUARDA BENTES e DIOGO MILLER na tentativa de roubar, mediante o emprego e disparo de arma de fogo, o ouro extraído ilegalmente pelas vítimas Benildo Melo e Lucas de Oliveira. Sem razão, contudo. Conforme bem delineado na sentença condenatória, a participação do apelado MARDEN SAMPAIO SENA na falsa comunicação de crime, por si só, não é capaz de confirmar a sua participação no crime de tentativa de latrocínio. A prova produzida contra o apelado se mostra frágil e meramente indiciária, não sendo suficiente para demonstrar a existência de vínculo direto e permanente entre o apelado e o veículo utilizado na prática do delito, conforme narrado na denúncia. Em juízo o apelado afirmou que foi até a delegacia, acompanhado de Eduarda, para registrar o desaparecimento do veículo Fiat Doblò, e que apenas fez reparos mecânicos no automóvel Fiat Doblô na véspera do crime, ocasião em que recebeu de Diogo valores correspondentes aos serviços prestados em sua oficina. Portanto, verifica-se que, além do fato de o apelado ter prestado serviços mecânicos para os demais corréus, e da sua participação na falsa comunicação de crime, não há qualquer outro elemento probatório que indique a efetiva participação do apelado na tentativa de roubo do ouro, tampouco em atos preparatórios ou no fornecimento de apoio logístico para a empreitada criminosa. Ademais, conforme destacou a e. Relatora, o laudo pericial de análise do aparelho celular do apelado MARDEN somente ocorreu após a prolação da sentença, o que impede a sua utilização como prova hábil para condenar o réu, pois se trata de prova produzida a destempo e, por isso, não submetida a contraditório ordinário. Diante do exposto, acompanho a e. Relatora, para negar provimento ao recurso de apelação do MPF, mantendo a absolvição do apelado MARDEN SAMPAIO SENA quanto ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada). Dos recursos de apelação de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES Em relação aos apelantes EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES, constata-se que não foram produzidas provas suficientes para amparar um decreto condenatório. Embora existam provas circunstanciais que evidenciam o vínculo de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES com os veículos utilizados na prática delituosa, não há elementos probatórios que comprovem a efetiva participação de tais apelantes na execução direta do crime. Na sentença, o juízo a quo reconheceu que não há provas da presença dos apelantes em um dos carros envolvidos na tentativa de latrocínio. Neste cenário, conforme bem destacou em parecer a Procuradoria Regional da República, “de fato, a prova é circunstancial e demonstra o relacionamento dos apelantes com os carros empregados no delito. Não mais que isso”. E ainda que, “As incongruências apresentadas nas versões defensivas, embora reforcem o juízo de probabilidade, não avançam a ponto de oferecer um juízo de certeza.” Ressalte-se que para amparar um decreto condenatório na esfera penal, o ordenamento jurídico exige a certeza da existência do crime, da autoria delitiva e da culpabilidade do agente, uma vez que a dúvida conduz à absolvição do réu, sendo certo que a mera verossimilhança do contexto factual com a tipificação delitiva não constitui verdade ou certeza, uma vez que a presunção, no processo penal, milita em favor do acusado. Ante o exposto, acompanho a e. Relatora para: 1) Negar provimento à apelação do MPF, mantendo a absolvição do apelado MARDEN SAMPAIO SENA quanto ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal; e 2) Dar provimento aos recursos de apelação de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES para absolvê-los do crime do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, ambos do CP, com fundamento no art. 386, VII, do CPP. 3) Em face da absolvição, conceder, de ofício (art. 647-A, CPP), ordem de habeas corpus para determinar a imediata colocação do réu Diogo Miller Abranches em liberdade, se não estiver preso por outro motivo. É o voto revisor. Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Revisora PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 1009980-49.2024.4.01.3200 APELANTE: EDUARDA BENTES DE SOUZA, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), DIOGO MILLER ABRANCHES Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANE GAMA GUIMARAES - AM4507-A, JAIR PINHEIRO SOUZA - AM12722-A, JOAO EVANGELISTA GENEROSO DE ARAUJO - AM12394-A Advogado do(a) APELANTE: ELIZANDRA LUCIANE PINTO DA SILVA - AM12704-A APELADO: MARDEN SAMPAIO SENA, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) Advogados do(a) APELADO: ALDEMIR DA ROCHA SILVA JUNIOR - AM5445-A, REINALDO DE LEMOS FREITAS - AM13396-A E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. LATROCÍNIO TENTADO. FALSA COMUNICAÇÃO DE CRIME. AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS DE AUTORIA. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. RECURSO DO MPF DESPROVIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO PARA REVOGAR A PRISÃO PREVENTIVA DO RÉU PRESO. 1. Trata-se de apelações interpostas pelos réus contra sentença que os condenou pelo crime de latrocínio tentado (art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, II, ambos do CP), e, no caso da segunda denunciada, também pelo crime de falsa comunicação de crime (art. 340 do CP). A sentença também absolveu Mardem Sampaio Sena da imputação pelo crime de latrocínio tentado, parte da decisão contra a qual recorre o Ministério Público Federal, que pretende a condenação do réu. 2. O MPF sustenta a suficiência de provas para a condenação do denunciado absolvido pelo crime de latrocínio tentado. O réu Diogo Miller pleiteia a anulação do processo por cerceamento de defesa e, subsidiariamente, sua absolvição por ausência de provas de autoria. Eduarda Bentes requer sua absolvição pela ausência de elementos probatórios que confirmem sua participação na tentativa de latrocínio. 3. As provas constantes nos autos não permitem afirmar, com segurança e certeza, a efetiva participação dos réus na execução do crime de latrocínio tentado. No tocante ao réu absolvido do crime de latrocínio tentado, embora haja elementos que o vinculem à falsa comunicação de crime, a sua responsabilização pela tentativa de latrocínio não se sustenta, dada a ausência de provas diretas e a existência de contradições e versões alternativas não refutadas adequadamente, circunstância que desautoriza o provimento do apelo do MPF. 4. Quanto aos réus condenados, os elementos probatórios se limitam a indícios quanto à cessão dos veículos utilizados na tentativa do roubo, não sendo possível afirmar que tinham conhecimento prévio do uso criminoso dos automóveis. A instrução permite colocar os veículos na cena do crime como aqueles utilizados na tentativa de latrocínio, mas não permite fazer o mesmo com os réus, senão por meio de suposição do órgão de acusação e do julgador de 1º grau, como se evidencia nos próprios termos da sentença. 5. Os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e da presunção de inocência impedem a condenação com base em provas exclusivamente indiciárias, quando não convergentes, seguras e submetidas ao contraditório. 6. Apelação do MPF desprovida. 7. Apelações dos réus providas para absolvê-los do crime de latrocínio tentado. Mantida a condenação de Eduarda Bentes pelo crime do art. 340 do CP, por não ter havido impugnação quanto a essa parte da sentença. 8. Habeas corpus concedido de ofício para determinar a revogação imediata da prisão preventiva do réu Diogo Miller Abranches, se não estiver preso por outro motivo. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação do MPF e dar provimento às apelações dos réus, para absolvê-los do delito do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14; e, de ofício, conceder habeas corpus em favor do réu Diogo Miller Abranches para revogar sua prisão preventiva, se não estiver preso por outro motivo, nos termos da relatora. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora
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Processo nº 1009980-49.2024.4.01.3200
ID: 328529433
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1009980-49.2024.4.01.3200
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ELIZANDRA LUCIANE PINTO DA SILVA
OAB/AM XXXXXX
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JOAO EVANGELISTA GENEROSO DE ARAUJO
OAB/AM XXXXXX
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JAIR PINHEIRO SOUZA
OAB/AM XXXXXX
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CRISTIANE GAMA GUIMARAES
OAB/AM XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1009980-49.2024.4.01.3200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1009980-49.2024.4.01.3200 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: MINISTERIO PUBLIC…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1009980-49.2024.4.01.3200 PROCESSO REFERÊNCIA: 1009980-49.2024.4.01.3200 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - MPF e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: CRISTIANE GAMA GUIMARAES - AM4507-A, JAIR PINHEIRO SOUZA - AM12722-A, JOAO EVANGELISTA GENEROSO DE ARAUJO - AM12394-A e ELIZANDRA LUCIANE PINTO DA SILVA - AM12704-A POLO PASSIVO:MARDEN SAMPAIO SENA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ALDEMIR DA ROCHA SILVA JUNIOR - AM5445-A e REINALDO DE LEMOS FREITAS - AM13396-A RELATOR(A):DANIELE MARANHAO COSTA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): Trata-se de apelações interpostas por Diogo Miller Abranches, Eduarda Bentes de Souza, contra sentença que os condenou pela prática, ambos, do delito do art. 157, §3º, II, c/c art. 14,II, os dois do CP (latrocínio tentado) e, a segunda, também pelo crime do art. 340 do CP, ao tempo em que absolveu Mardem Sampaio Sena, da imputação de latrocínio tentado, parte essa da sentença que é objeto da apelação também do Ministério Público Federal, mas o condenou pela prática do delito do art. 340 do CP, juntamente com Eduarda, condenação contra a qual não recorreu. Eduarda Bentes teve fixada a pena cumulada pelos dois crimes em 07 (sete) anos e 08 (oito) meses de reclusão, 01 (um) mês de detenção (regime inicial semiaberto) e 33 (trinta e três) dias-multa (1/30 do salário-mínimo); e Diogo Miller a uma pena cumulada de 13 (treze) anos e 03 (três) meses de reclusão (regime inicial fechado), além de 90 (noventa) dias-multa (1/10 do salário-mínimo). O Ministério Público Federal recorre com a intenção condenar Marden Sampaio pela prática do crime previsto no artigo 157, §3º, II, c/c o art. 14, II, ambos do CP, na compreensão de que a instrução teria produzida prova suficiente para sustentar a condenação. Em seu recurso, Diogo Miller, pugna pela anulação do processo, desde o início, tendo em vista cerceamento de defesa pelo indeferimento da diligência relativa à geolocalização do celular (95) 99111-7374, no dia 09/12/2023, no período da ocorrência dos fatos, com o sobrestamento do processo para que seja realizada a referida diligência. No mérito, alega ausência de provas de autoria contra o recorrente, em razão do que pede a sua absolvição. A defesa de Eduarda Bentes sustenta que a condenação, no tocante ao latrocínio tentado, deve ser desconstituída por ausência de prova suficiente quanto à autoria delitiva, postulando a aplicação do princípio constitucional da presunção de inocência, pois não foram produzidos elementos probatórios idôneos e consistentes que permitam afirmar, com segurança, a participação da recorrente no crime de latrocínio tentado, sendo a prova produzida em juízo frágil, contraditória e insuficiente. Destaca que, em seu interrogatório judicial, confessou apenas a prática do crime de comunicação falsa, negando integralmente sua participação nos fatos relativos à tentativa de latrocínio, tanto assim que a vítima Benildo Melo Rodrigues, ao ser ouvido em juízo, declarou não reconhecer a ré, tampouco saber se ela estava no veículo de onde partiram os disparos, o que fragiliza sobremaneira a acusação, devendo prevalecer a máxima in dubio pro reo. Oficiando nos autos, o órgão do Ministério Público Federal nesta instância, em parecer firmado pelo Procurador Regional da República José Alfredo de Paula Silva, opina pelo desprovimento da apelação do MPF e pelo provimento das apelações dos denunciados, para absolvê-los. (Id. 432896872) É o relatório. Sigam os autos ao exame da e. revisora, que pedirá a designação de dia para o julgamento (art. 613, I, CPP). PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): DO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Afirma o MPF que os autos conteriam elementos probatórios suficientes para ensejar a condenação de Marden Sena, destacando que, logo após a tentativa frustrada da prática do latrocínio, ele compareceu à delegacia juntamente com a corré Eduarda Bentes para registrar boletim de ocorrência falso, atribuindo o desaparecimento do veículo Fiat Doblò – utilizado no crime – a um suposto roubo previamente inexistente, conduta esta que, segundo o MPF, visa ocultar sua participação no delito. Ressaltou ainda que o rastreamento do veículo desmentiu a versão apresentada, demonstrando que o automóvel não esteve na oficina de Marden Sena nos dias indicados. Além disso, o acusado apresentou versões contraditórias ao longo da investigação, alegando, por exemplo, que teria sido coagido a prestar informações falsas, narrativa que também se mostrou incongruente com a linha cronológica dos eventos. Afirma que o vínculo com os demais corréus também teria sido comprovado, especialmente pela admissão, em juízo, de que teria recebido valores de Diogo Miller, sob a justificativa de supostos reparos mecânicos, o que o MPF entende ser tentativa de dissimulação do verdadeiro propósito da transação. A instrução foi posteriormente reforçada por relatório de análise pericial dos aparelhos celulares apreendidos com Marden Sena, no qual a Polícia Federal apontou diálogos comprometedores com interlocutores diretamente envolvidos no planejamento e execução do crime. As mensagens trocadas, inclusive com a corré Eduarda Bentes, indicam clara articulação para encobrir os fatos, inclusive mediante orientação jurídica para a criação de versões falsas e tentativa de retirada do veículo do pátio da Polícia Federal com uso de documentação forjada elementos que MPF entende suficientes para confirmar a condenação. Em que pesem os fundamentos do recurso, as conclusões acerca da eventual participação de Marden Sena são circunstanciais, sem aptidão de gerar certeza e segurança para a sua condenação, senão pelo delito de falsa comunicação de crime, pelo qual foi condenado. Não há elementos que o ligue na execução do delito, não podendo ser a sua participação no latrocínio decorrer apenas do fato de haver participado da falsa comunicação do furto do veículo Fiat/Doblô. Esse é apenas um juízo de probabilidade, mas não de certeza. Não socorre a pretensão do MPF o fato de haver laudo pericial de análise do aparelho celular do denunciado Marden, pois isso somente ocorreu após a prolação da sentença, o que impede a sua utilização como prova hábil para condenar o réu, pois se trata de prova produzida a destempo e, por isso, não submetida a contraditório ordinário. Nesse sentido há jurisprudência do STJ que desautoriza a sua utilização, no sentido de que “[a]figura-se ilegal a utilização, pelo Tribunal de Justiça, de laudo juntado aos autos de forma extemporânea, para fundamentar a manutenção da qualificadora. É que, quando da prolação da sentença, não havia laudo pericial acerca do arrombamento. O laudo, indispensável à demonstração da qualificadora, apenas foi juntado após a sentença, havendo, de fato, a produção extemporânea da prova.[...] (STJ, AgRg no AREsp n. 1.995.588/DF, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 8/3/2022, DJe de 14/3/2022). DOS RECURSOS DOS RÉUS Essa mesma fragilidade que se observa na demonstração da possível conduta do denunciado Marden Sena na eventual prática do latrocínio se observa para os outros dois denunciados, com a devida vênia do prolator da sentença. Nesse sentido é também a visão da Procuradoria Regional da República, quando afirma que “[a]pós a instrução, a imputação ficou amparada apenas na falsa comunicação do roubo do Fiat Doblô e no conhecimento da existência do Chevrolet Celta. Elementos, por óbvio, insuficientes para a condenação pelo delito de latrocínio tentado.[...] Vejamos o que disse a sentença (negritos acrescidos): [..] DA AUTORIA DE DIOGO MILLER ABRANCHES Em relação ao acusado DIOGO MILLER ABRANCHES, o MPF na denúncia aponta que este participou da tentativa de latrocínio, tendo agido diretamente na ação criminosa e cedido o automóvel Chevrolet Celta placa OAI 0744 para o intento. Analisando os autos, tem-se que DIOGO MILLER estava na posse do veículo Celta, que conforme exposto no tópico da materialidade, foi usado como carro de cobertura na ação, escoltando o Fiat Dobló usado na abordagem às vítimas, e servindo para a fuga dos agentes que perpetraram a tentativa de roubo. Neste sentido, a investigação policial apurou que o automóvel Celta usado na ação criminosa estava registrado em nome de DANIEL BARBOSA DA SILVA, porém, este declarou à Polícia Federal que havia vendido o carro em 2023, e fez uma procuração para DIOGO MILLER ABRANCHES, a fim deste resolver todo e qualquer assunto relacionado à venda e transferência do referido veículo. O instrumento de procuração foi juntado no ID 2115890749, após diligências junto ao cartório de notas que expediu o documento. Foi apurado ainda que, desde o dia da tentativa de latrocínio, o veículo Celta placa OAI 0744 não foi mais visto circulando nas ruas de Manaus. Conforme exposto no relatório de monitoramento juntado no ID 2115890751, a última passagem registrada do automóvel foi no dia 09/12/2023 às 11h24min, pouco tempo depois do horário estimado do crime, tendo sido detectado na Avenida Nathan Xavier de Albuquerque, sentido Parque das Garças, na altura do Residencial Estoril, ainda nas proximidades da Avenida das Torres, local do delito. O mesmo relatório ainda destacou a possível localização do automóvel (ID 2115890751 – pág. 4), e com base nesta informação, a Polícia Federal conseguiu localizar o Celta, que estava estacionado em uma casa na Rua Tocantins, no bairro Cidade Nova, dentro do perímetro apontado como possível paradeiro do carro. Durante a instrução processual, a testemunha ALFREDO SOUSA NETO declarou que via o veículo Celta estacionado na frente da casa de DIOGO MILLER todos os dias. Já a testemunha SANDRO ABREU RIBEIRO, dono da casa onde o Celta ficou guardado após o crime, confirmou que o carro ficou em sua residência a pedido de DIOGO, argumentando que não tinha lugar onde guardá-lo, ficando no local por cerca de um mês. Os fatos elencados acima, portanto, indicam não apenas a posse de DIOGO MILLER do Chevrolet Celta placa OAI 0744, utilizado na tentativa de roubo realizada no final da manhã de 09/12/2023, como a intenção inequívoca do acusado em ceder o veículo para a ação criminosa, visto ter escondido o mesmo em casa de terceiro logo após o delito. Diante da autoridade policial, DIOGO MILLER admitiu ser o dono do Chevrolet Celta, mas alega que o veículo estava alugado para uma pessoa chamada PINGO, do qual não sabe o nome verdadeiro e não tinha contrato escrito, apenas verbal. Afirmou que recebeu o valor de R$ 500,00 em espécie pelo aluguel. Declarou que não sabia que o Celta fora usado na tentativa de roubo, e que no dia do crime o veículo havia sido abandonado no conjunto Colina do Aleixo, sendo encontrado por um amigo chamado ALFREDO, que seria oficial de justiça, e que deixou o veiculo na casa de seu amigo SANDRO por medo de represálias. Em seu interrogatório judicial, DIOGO MILLER se declarou inocente, afirmando não saber por que estava tendo problemas por um carro que tinha alugado. Afirmou conhecer MARDEN por levar seus carros para fazer revisão na oficina do corréu. Afirmou novamente que alugou seu carro para PINGO na tarde de 04/12/2023, tendo o conhecido na oficina de MARDEN, mas desconhece seu verdadeiro nome. PINGO teria se interessado em alugar o carro do acusado, tendo acertado o valor do aluguel, que foi pago em espécie. Não pediu nenhum documento a PINGO, tendo confiado nele pelo fato de às vezes estar na oficina de MARDEN. Argumenta que no dia do delito estava em sua rotina normal de trabalho, cuidando de uma obra em um imóvel que estava alugando, saiu para comprar camarão junto com sua esposa em ma loja próxima, além de ter ido a um shopping à tarde para comprar roupa, pois iria viajar para Roraima. Declarou que PINGO teria lhe informado no fim da tarde que o carro Celta tinha dado pane e estava no conjunto Colina do Aleixo, e foi buscar o automóvel naquele local junto com um amigo chamado ALFREDO, tendo trazido o carro rebocado para sua residência. Afirmou que no dia seguinte viajou a Roraima e voltou a Manaus no dia 21 daquele mês. Declarou que deixou o carro na casa de SANDRO após ter bebido na casa dele no dia 30/12, e que estava sendo seguido pela Polícia Federal e filmado por um drone quando estava em um sítio. Afirmou que soube que o carro Celta foi usado no crime somente após sua prisão, através do delegado que tinha lhe prendido. Declarou que o carro teve um problema na bateria, e que PINGO estava junto com o carro em pane. Afirmou que não conseguiu mais contato com PINGO após este dia. Declarou que deixou o carro na casa de SANDRO pois estava negociando uma moto com a filha dele. A defesa técnica argumenta não existir provas de participação do acusado no crime, sustentando a versão dos fatos apresentada pelo réu em audiência, alegando que este não poderia ter participado diretamente da tentativa de latrocínio, pois estava em outro lugar da cidade no momento do crime. Diante do contexto fático presente nos autos, inicialmente não existem provas de que DIOGO MILLER tenha tido participação direta na tentativa de latrocínio, no local da ação. Em verdade, mesmo após diversas diligências e atos probatórios, não se conseguiu descobrir quem foram os agentes que perpetraram o crime nas proximidades da Avenida das Torres contra as vítimas BENÍCIO MELO e LUCAS CRUZ. Dessa forma, é possível que DIOGO MILLER estivesse no local dos fatos, dirigindo o automóvel Celta, porém nãohá prova cabal quanto à sua presença no local. Porém, as provas colhidas e descritas nesta sentença demonstram cabalmente que DIOGO MILLER ABRANCHES participou da preparação do crime, ao, no mínimo, ceder o automóvel Chevrolet Celta placa OAI 0744 aos agentes que perpetraram a tentativa de latrocínio, de forma livre, e consciente de que o carro seria utilizado para o cometimento do delito. Além de, pelo menos, ter cedido o automóvel, foi DIOGO MILLER quem providenciou que o automóvel imediatamente após o latrocínio ficasse escondido e fora de circulação detectável pelo "paredão" da Secretaria de Segurança Pública. Ou seja, o veículo ficou literalmente escondido na casa de um terceiro dentro da área para a qual houve a fuga dos envolvidos no latrocínio, sem detecção pelas câmeras da polícia que identificam a movimentação de automóveis dentro da cidade de Manaus. Note-se que o réu DIOGO apresentou diferentes versões tanto para ter reavido o carro após o crime, quanto para ter escondido o carro. Nenhuma delas, porém, foi respaldada pela prova dos autos, já que ALFREDO negou ter encontrado o automóvel abandonado e SANDRO negou que ele ou sua filha tivessem a intenção de comprar o Celta, que apenas guardou o automóvel a pedido de DIOGO, como um favor. Demonstram este fato a ausência de registros de circulação do veículo após o crime, tendo ficado escondido na casa de um terceiro, sem motivação aparente. Da mesma forma, as alegações de que alugou o carro para uma pessoa chamada PINGO, sem ao menos saber quem era, de forma verbal e não tendo sequer uma cópia de algum documento seu, demonstra a tentativa do réu de não apenas se eximir da responsabilização penal, mas também ocultar as pessoas que participaram diretamente da tentativa de roubo da carga de ouro. Desta forma, ficou demonstrado definitivamente a participação de DIOGO MILLER ABRANCHES na presente empreitada delituosa, ao ceder o automóvel Chevrolet Celta placa OAI 0744 utilizado no dia 09/12/2023 como veículo de escolta e de fuga na tentativa de latrocínio ocorrida naquela data. Assim sendo, tendo cometido o crime do artigo 157, §3°, II, c/c o art. 14, II, do Código Penal, deve o acusado DIOGO MILLER ABRANCHES ser condenado às respectivas penas do delito, sem que haja causa excludente de ilicitude ou culpabilidade a lhe beneficiar.” “DA AUTORIA DE EDUARDA BENTES DE SOUZA Conforme a denúncia, a ré acima nominada teria participado da tentativa de latrocínio ocorrida em 09/12/2023. A inicial discorre que a acusada teria cedido o veículo Fiat Dobló placa OAJ 7J07 para a ação criminosa, e participado diretamente da citada empreitada delituosa. Atentando-se aos elementos fáticos, tem-se que a acusada estava na posse do automóvel Fiat Dobló usado na tentativa de roubo. O veículo está registrado no nome de RICCELLI DOS SANTOS PINTO, que é seu companheiro, mas estava na posse da ré pelo fato de o proprietário estar preso pelo cometimento do crime de tráfico de drogas à época dos fatos. Como será melhor exposto em tópico próprio, EDUARDA registrou falsamente o roubo do Fiat Dobló usado na ação de forma a mitigar sua responsabilidade na empreitada criminosa efetuada. Como já exposto anteriormente, o veículo foi encontrado no local do crime, abandonado com uma pistola Glock, munições, “miguelitos” e roupas camufladas do tipo militar. Sobre os fatos, EDUARDA, em sede policial, declarou que o Fiat Dobló usado no crime estava sendo usado há cinco meses por um indivíduo chamado PINGO, e que vinha sendo ameaçada pelo mesmo. Negou qualquer tipo de envolvimento com a tentativa de roubo. A ré, em sede policial, reconheceu por meio de fotografia, e depois em acareação pessoal, PINGO como o nacional JANDERSON AGUIAR DA SILVA. Porém, este não foi reconhecido por RICCELLI DOS SANTOS PINTO. A investigação policial também não conseguiu encontrar nenhum outro elemento que vinculasse JANDERSON ao crime de latrocínio tentado. Em seu interrogatório judicial, EDUARDA declarou ser inocente das acusações de envolvimento no roubo, admitindo a falsa comunicação de crime. Declarou que PINGO estava com o carro Fiat Dobló desde 2023 e lhe pagava R$ 300,00 por semana, às vezes apenas R$ 100,00. Declarou que entregou o carro a PINGO a mando de seu marido RICCELLI, que estava preso. Na véspera do crime, afirmou ter levado o Fiat Dobló na oficina de MARDEN juntamente com PINGO para resolver um problema nos freios, e que levou neste local por ter “intimidade” com MARDEN, mas não soube dizer o valor do conserto. Confirmou que PINGO se trata de JANDERSON AGUIAR DA SILVA. Declarou não conhecer o corréu DIOGO MILLER. Afirmou que soube da tentativa de roubo somente na noite do crime, por meio de jornal e portais de notícias. Não sabe dizer porque RICCELLI declarou não conhecer PINGO na acareação diante da autoridade policial. Declarou não saber dirigir. A defesa técnica, por seu turno, argumenta não existir provas de que EDUARDA tenha participado da empreitada delituosa ou que tenha cometido os fatos imputados pela denúncia. Tendo em vista os elementos fáticos presentes nos autos, a princípio não existem provas de que EDUARDA tenha participado de forma direta na cena da tentativa de latrocínio, não se podendo confirmar de forma segura que a ré estava presente, no momento do crime, em um dos carros envolvidos na tentativa de latrocínio. Por outro lado, porém, é inegável que o veículo que estava na posse de EDUARDA foi utilizado na tentativa de latrocínio, conforme exposto no tópico da materialidade. Neste sentido, a atitude da ré em fazer a falsa comunicação de crime demonstra que esta tinha ciência de ter cedido o automóvel Fiat Dobló que estava em sua posse para a empreitada criminosa. Na realidade, não faz sentido a ré ter registrado um boletim de ocorrência, mesmo que fosse supostamente a mando de outra pessoa, a não ser que procurasse evitar eventual vinculação com o crime cometido por meio do veículo que estava na sua posse. Ademais, a ré também não procurou comprovar faticamente que o referido carro estava na posse de PINGO na época do crime, podendo-se concluir que EDUARDA estava na posse do carro Fiat Dobló usado no crime, e de forma livre e consciente, cedeu-o para a tentativa de latrocínio ocorrida no dia 09/12/2023. Isto posto, tem-se que EDUARDA BENTES DE SOUZA, ao ceder o veículo Fiat Dobló placa OAJ 7J07 de forma consciente para a realização da tentativa de roubo à mão armada de 47 kg de ouro no dia 09/12/2023 nesta cidade de Manaus, cometeu o crime do artigo 157, §3°, II c/c o art. 14, II do Código Penal, devendo ser condenada às respectivas penas do delito, sem que haja causa excludente de ilicitude ou culpabilidade a lhe beneficiar.”[...] A instrução permite colocar os veículos na cena do crime como aqueles utilizados na tentativa de latrocínio, mas não permite fazer o mesmo com os réus, senão por meio de suposição do órgão de acusação e do julgador, como se evidencia nos próprios termos da sentença, o que torna impossível a condenação, que deve observar rigorosamente os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e, sobretudo, da presunção de inocência, conforme insculpido no art. 5º, incisos LIV, LV e LVII da Constituição Federal. Nesse sentido, tem-se que a prova exclusivamente indiciária ou circunstancial, desacompanhada de elementos seguros de autoria e materialidade, é insuficiente para amparar um decreto condenatório. O Código de Processo Penal, em seu art. 386, inciso VII, estabelece que o juiz absolverá o réu quando não houver prova suficiente para a condenação, sendo este o desdobramento lógico do princípio in dubio pro reo, que exige certeza quanto à autoria e à materialidade delitivas para se firma uma sentença condenatória. A prova indiciária, embora admitida no ordenamento jurídico brasileiro como forma válida de instrução, exige a presença de um conjunto harmônico, coerente e convergente de circunstâncias que apontem, de maneira segura e inequívoca, para a responsabilidade penal do acusado. Quando isolada ou dissociada de provas diretas, ela assume caráter meramente especulativo, vulnerando os direitos fundamentais do imputado e tornando impossível o juízo de certeza exigido para a imposição da pena criminal. É dizer, a sentença penal condenatória deve se fundar em prova segura, inequívoca e convincente da autoria e da materialidade do delito, não se podendo admitir condenação com base apenas em indícios frágeis ou em meras conjecturas. Portanto, a inexistência de provas diretas e a presença apenas de elementos indiciários, sobretudo se frágeis ou isolados, impedem a formação do convencimento judicial necessário à condenação, sob pena de se incorrer em violação às garantias processuais penais e ao Estado Democrático de Direito. É imprescindível que a culpa do réu seja demonstrada de forma inequívoca, sob pena de se impor sanção penal sem base fática e jurídica adequada, o que é expressamente vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Isso, bem entendido, no que tange ao crime de latrocínio tentado, devendo prevalecer a sentença quanto à condenação da ré Eduarda Bentes no crime de art. 340 do CP, até porque o recurso não se insurgiu contra essa condenação, bem como porque a ré confessou essa prática delitiva. CONCLUSÃO Diante do exposto, nego provimento à apelação do MPF e dou provimento à apelação dos réus, para absolvê-los do crime do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, ambos do CP, com base no art. 386, VII, do CPP. Concedo habeas corpus de ofício para determinar a revogaçao imediata da prisão preventiva do réu Diogo Miller Abranches, se não estiver preso por outro motivo. É o voto. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA APELAÇÃO CRIMINAL (417) 1009980-49.2024.4.01.3200 VOTO REVISOR A Exma. Sra. Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva (Revisora): Após a análise dos autos, nada tenho a acrescentar ao relatório. A e. Relatora vota para I) negar provimento à apelação do MPF; e II) dar provimento aos recursos de apelação dos réus para absolvê-los do crime do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, ambos do CP, com fundamento no art. 386, VII, do CPP. Consta da denúncia (ID 424869143) que os réus EDUARDA BENTES, MARDEN SAMPAIO e DIOGO MILLER, em 09 de dezembro de 2023, tentaram subtrair coisa móvel alheia (ouro), mediante violência, que não resultou em morte por circunstâncias alheias às vontades deles. Narra ainda que em 09 de dezembro de 2023, EDUARDA BENTES e MARDEN SAMPAIO, provocaram a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime de roubo que sabiam não se ter verificado. Em sentença (ID 424869280), o Juízo a quo julgou parcialmente procedente a presente ação penal para i) Condenar EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES pela prática do crime previsto no artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada); ii) Condenar EDUARDA BENTES DE SOUZA e MARDEN SAMPAIO SENA às penas do artigo 340 do Código Penal (falsa comunicação de crime); e iii) Absolver o réu MARDEN SAMPAIO SENA da acusação referente ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada), na forma do artigo 386, V, do CPP. Nesta instância, a Procuradoria Regional da República manifesta pelo não provimento da apelação do MPF e pelo provimento das apelações defensivas para absolver os apelantes EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES da prática do crime previsto no artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (ID 432896872). Compulsando a íntegra dos autos, não divirjo dos fundamentos lançados no acurado voto da eminente Relatora para a) negar provimento à apelação do MPF; e b) dar provimento às apelações de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES para absolvê-los da prática do crime previsto no artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada). Do recurso do MPF O MPF insurge contra a absolvição do apelado MARDEN SAMPAIO SENA quanto ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada), sustentando que os elementos probatórios produzidos nos autos comprovaram a associação de MARDEN a EDUARDA BENTES e DIOGO MILLER na tentativa de roubar, mediante o emprego e disparo de arma de fogo, o ouro extraído ilegalmente pelas vítimas Benildo Melo e Lucas de Oliveira. Sem razão, contudo. Conforme bem delineado na sentença condenatória, a participação do apelado MARDEN SAMPAIO SENA na falsa comunicação de crime, por si só, não é capaz de confirmar a sua participação no crime de tentativa de latrocínio. A prova produzida contra o apelado se mostra frágil e meramente indiciária, não sendo suficiente para demonstrar a existência de vínculo direto e permanente entre o apelado e o veículo utilizado na prática do delito, conforme narrado na denúncia. Em juízo o apelado afirmou que foi até a delegacia, acompanhado de Eduarda, para registrar o desaparecimento do veículo Fiat Doblò, e que apenas fez reparos mecânicos no automóvel Fiat Doblô na véspera do crime, ocasião em que recebeu de Diogo valores correspondentes aos serviços prestados em sua oficina. Portanto, verifica-se que, além do fato de o apelado ter prestado serviços mecânicos para os demais corréus, e da sua participação na falsa comunicação de crime, não há qualquer outro elemento probatório que indique a efetiva participação do apelado na tentativa de roubo do ouro, tampouco em atos preparatórios ou no fornecimento de apoio logístico para a empreitada criminosa. Ademais, conforme destacou a e. Relatora, o laudo pericial de análise do aparelho celular do apelado MARDEN somente ocorreu após a prolação da sentença, o que impede a sua utilização como prova hábil para condenar o réu, pois se trata de prova produzida a destempo e, por isso, não submetida a contraditório ordinário. Diante do exposto, acompanho a e. Relatora, para negar provimento ao recurso de apelação do MPF, mantendo a absolvição do apelado MARDEN SAMPAIO SENA quanto ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal (latrocínio na modalidade tentada). Dos recursos de apelação de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES Em relação aos apelantes EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES, constata-se que não foram produzidas provas suficientes para amparar um decreto condenatório. Embora existam provas circunstanciais que evidenciam o vínculo de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES com os veículos utilizados na prática delituosa, não há elementos probatórios que comprovem a efetiva participação de tais apelantes na execução direta do crime. Na sentença, o juízo a quo reconheceu que não há provas da presença dos apelantes em um dos carros envolvidos na tentativa de latrocínio. Neste cenário, conforme bem destacou em parecer a Procuradoria Regional da República, “de fato, a prova é circunstancial e demonstra o relacionamento dos apelantes com os carros empregados no delito. Não mais que isso”. E ainda que, “As incongruências apresentadas nas versões defensivas, embora reforcem o juízo de probabilidade, não avançam a ponto de oferecer um juízo de certeza.” Ressalte-se que para amparar um decreto condenatório na esfera penal, o ordenamento jurídico exige a certeza da existência do crime, da autoria delitiva e da culpabilidade do agente, uma vez que a dúvida conduz à absolvição do réu, sendo certo que a mera verossimilhança do contexto factual com a tipificação delitiva não constitui verdade ou certeza, uma vez que a presunção, no processo penal, milita em favor do acusado. Ante o exposto, acompanho a e. Relatora para: 1) Negar provimento à apelação do MPF, mantendo a absolvição do apelado MARDEN SAMPAIO SENA quanto ao crime do artigo 157, §3°, II, c/c o artigo 14, II, do Código Penal; e 2) Dar provimento aos recursos de apelação de EDUARDA BENTES DE SOUZA e DIOGO MILLER ABRANCHES para absolvê-los do crime do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, ambos do CP, com fundamento no art. 386, VII, do CPP. 3) Em face da absolvição, conceder, de ofício (art. 647-A, CPP), ordem de habeas corpus para determinar a imediata colocação do réu Diogo Miller Abranches em liberdade, se não estiver preso por outro motivo. É o voto revisor. Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Revisora PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CRIMINAL (417) 1009980-49.2024.4.01.3200 APELANTE: EDUARDA BENTES DE SOUZA, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), DIOGO MILLER ABRANCHES Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANE GAMA GUIMARAES - AM4507-A, JAIR PINHEIRO SOUZA - AM12722-A, JOAO EVANGELISTA GENEROSO DE ARAUJO - AM12394-A Advogado do(a) APELANTE: ELIZANDRA LUCIANE PINTO DA SILVA - AM12704-A APELADO: MARDEN SAMPAIO SENA, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) Advogados do(a) APELADO: ALDEMIR DA ROCHA SILVA JUNIOR - AM5445-A, REINALDO DE LEMOS FREITAS - AM13396-A E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. LATROCÍNIO TENTADO. FALSA COMUNICAÇÃO DE CRIME. AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS DE AUTORIA. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. RECURSO DO MPF DESPROVIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO PARA REVOGAR A PRISÃO PREVENTIVA DO RÉU PRESO. 1. Trata-se de apelações interpostas pelos réus contra sentença que os condenou pelo crime de latrocínio tentado (art. 157, § 3º, II, c/c art. 14, II, ambos do CP), e, no caso da segunda denunciada, também pelo crime de falsa comunicação de crime (art. 340 do CP). A sentença também absolveu Mardem Sampaio Sena da imputação pelo crime de latrocínio tentado, parte da decisão contra a qual recorre o Ministério Público Federal, que pretende a condenação do réu. 2. O MPF sustenta a suficiência de provas para a condenação do denunciado absolvido pelo crime de latrocínio tentado. O réu Diogo Miller pleiteia a anulação do processo por cerceamento de defesa e, subsidiariamente, sua absolvição por ausência de provas de autoria. Eduarda Bentes requer sua absolvição pela ausência de elementos probatórios que confirmem sua participação na tentativa de latrocínio. 3. As provas constantes nos autos não permitem afirmar, com segurança e certeza, a efetiva participação dos réus na execução do crime de latrocínio tentado. No tocante ao réu absolvido do crime de latrocínio tentado, embora haja elementos que o vinculem à falsa comunicação de crime, a sua responsabilização pela tentativa de latrocínio não se sustenta, dada a ausência de provas diretas e a existência de contradições e versões alternativas não refutadas adequadamente, circunstância que desautoriza o provimento do apelo do MPF. 4. Quanto aos réus condenados, os elementos probatórios se limitam a indícios quanto à cessão dos veículos utilizados na tentativa do roubo, não sendo possível afirmar que tinham conhecimento prévio do uso criminoso dos automóveis. A instrução permite colocar os veículos na cena do crime como aqueles utilizados na tentativa de latrocínio, mas não permite fazer o mesmo com os réus, senão por meio de suposição do órgão de acusação e do julgador de 1º grau, como se evidencia nos próprios termos da sentença. 5. Os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e da presunção de inocência impedem a condenação com base em provas exclusivamente indiciárias, quando não convergentes, seguras e submetidas ao contraditório. 6. Apelação do MPF desprovida. 7. Apelações dos réus providas para absolvê-los do crime de latrocínio tentado. Mantida a condenação de Eduarda Bentes pelo crime do art. 340 do CP, por não ter havido impugnação quanto a essa parte da sentença. 8. Habeas corpus concedido de ofício para determinar a revogação imediata da prisão preventiva do réu Diogo Miller Abranches, se não estiver preso por outro motivo. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação do MPF e dar provimento às apelações dos réus, para absolvê-los do delito do art. 157, § 3º, II, c/c art. 14; e, de ofício, conceder habeas corpus em favor do réu Diogo Miller Abranches para revogar sua prisão preventiva, se não estiver preso por outro motivo, nos termos da relatora. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora
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Processo nº 1001869-92.2024.4.01.4100
ID: 282917814
Tribunal: TRF1
Órgão: 3ª Vara Federal Criminal da SJRO
Classe: PEDIDO DE BUSCA E APREENSãO CRIMINAL
Nº Processo: 1001869-92.2024.4.01.4100
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
TIAGO COELHO GONCALVES
OAB/GO XXXXXX
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JOAO VITOR COMIRAN
OAB/MS XXXXXX
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EDSON KOHL JUNIOR
OAB/MS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DE RONDÔNIA 3ª VARA FEDERAL – CRIMINAL ESPECIALIZADA EM CRIMES FINANCEIROS, LAVAGEM DE CAPITAIS E ORGANI…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DE RONDÔNIA 3ª VARA FEDERAL – CRIMINAL ESPECIALIZADA EM CRIMES FINANCEIROS, LAVAGEM DE CAPITAIS E ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS Av. Presidente Dutra, 2.203, Centro, Porto Velho/RO, telefone: (69) 2181-5871, e-mail: 03vara.ro@trf1.jus.br PROCESSO: 1001869-92.2024.4.01.4100 CLASSE: PEDIDO DE BUSCA E APREENSÃO CRIMINAL (309) REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) REQUERIDO: BRUNO CEZAR CECCHINI e BRUNA LAYANE CARVALHO CECCHINI DECISÃO Ref.: IP 1001833-50.2024.4.01.4100 (Operação Golden Greed) 1 RELATÓRIO Trata-se de pedido de busca e apreensão, em desfavor de BRUNO CÉZAR CECCHINI e BRUNA LAYANE CARVALHO CECCHINI, que tramitou perante a 2ª Vara Federal de Jundiaí. O pedido foi deferido, em maio de 2022, e os mandados foram cumpridos, em julho de 2022. Os autos foram saneados (ID 2163631598). Contra essa decisão, o Ministério Público Federal opôs embargos de declaração (ID 2167191436). BRUNO CÉZAR CECCHINI requereu a habilitação de advogados, conforme a procuração ID 2168958138 - Pág. 2. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. 2 FUNDAMENTAÇÃO 2.1 TEMPESTIVIDADE A decisão atacada foi proferida em 16/12/2024. Logo, o prazo para ciência (10 dias) passou a fluir até o dia 19, pois os prazos permaneceram suspensos do dia 20/12/2024 ao 20/01/2025, nos moldes preconizados pela Portaria Presi 431/2016 e pelo CPP: (...) Art 1º No período de 20 de dezembro a 20 de janeiro serão suspensos os prazos processuais, a realização de audiências e de sessões de julgamento, a expedição de notificações, as intimações ou qualquer ato que implique fluência de prazo para as partes, em toda a 1ª Região (2ª Grau, 1ª Grau, Juizados Especiais Federais e Turmas Recursais), nos termos do art. 220 do CPC. (...) Art. 798-A. Suspende-se o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e 20 de janeiro, inclusive, salvo nos seguintes casos: (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022) (...) Antes do retorno do transcurso do prazo para ciência e início do prazo para manifestação, o Ministério Público Federal opôs embargos de declaração, em 18/01/2025. Destaco que o órgão ministerial tomou ciência apenas em 20/01/2025, contudo, aparentemente essa incongruência permitida pelo sistema (o peticionamento antes da ciência) ocorreu em razão da suspensão dos prazos. Seja como for, os embargos são tempestivos. 2.2 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO O órgão ministerial apontou contradição na decisão atacada, porque: (...) Verifica-se, portanto, que o “item g” da decisão encontra-se em nítida contradição com a conclusão de que o objeto deste procedimento já está exaurido, o que tem por conclusão lógica a estabilização das decisões até então proferidas quanto à restituição de veículos, razão pela qual se faz necessária a correção desse equívoco, devendo o juízo esclarecer se a restituição deverá continuar sendo discutida nestes autos ou se, de fato, seu objeto está exaurido e a situação das apreensões, estabilizada. (...) Além disso, alegou as seguintes omissões: (...) a) o juízo deixou de intimar o MPF para se manifestar acerca da restituição dos veículos aos investigados, ferindo, assim, o contraditório; b) o juízo não fundamentou a razão da restituição dos veículos mediante nomeação de depositário fiel; c) principalmente, o juízo deixou de observar a existência de coisa julgada sobre o pedido de restituição já formulado: a modificação da decisão dependeria de mudança no contexto fático analisado, visto que a coisa julgada se submete à cláusula rebus sic stantibus. (...) 2.2.1 CONTRADIÇÃO De início, estabeleço as seguintes premissas: i) não houve pedido de restituição julgado na decisão ID 2163631598; ii) o presente feito exauriu-se com o cumprimento dos mandados de busca e apreensão. As providencias consignadas, na decisão ID 2163631598, visavam o saneamento e organização dos autos. No que tange a suposta contradição, o exaurimento assinalado tem por fim indicar aos investigados ou terceiros interessados que novos pedidos devem ser autuados em apartado. Os pedidos de restituição já julgados nos autos são impertinentes, mas são um fato consumado. A determinação deste juízo é para que qualquer novo pedido seja apresentado em separado, isso ficou consignado no seguinte item: l) Desde já, para se evitar tumulto processual e em estrita observância ao disposto no artigo 120, §§ 1º e 2º, do CPP, os pedidos de restituição de bens apreendidos devem ser autuados em apartado, por dependência a estes autos. 2.2.2 OMISSÃO 2.2.2.1 BENS APREENDIDOS Dois mandados de busca e apreensão foram expedidos, um para cada alvo. O mandado de BRUNA LAYANE CARVALHO CECCHINI foi cumprido em três endereços e o de BRUNO CÉZAR CECCHINI em dois. Em relação à BRUNA, os bens arrecadados no endereço: Av. Brigadeiro Haroldo Veloso, nº. 565, Itaiatuba/PA, foram relacionados no auto circunstanciado de busca e arrecadação ID 2039672676 - Pág. 69/72. Entretanto, não há um termo de apreensão, razão pela qual resta dúvida se todos bens permanecem apreendidos. Quanto ao endereço: Av. Dr. Hugo de Mendonça, 970, Centro, Itaituba/PA, também de BRUNA, o auto circunstanciado de busca e arrecadação ID 2039672676 - Pág. 81/84 originou o termo de apreensão ID 2039672676 - Pág. 85/86. Nesse, uma arma de BRUNO CÉZAR CECCHINI foi apreendida e deverá seguir os trâmites administrativos como consignado na Informação de Polícia Judiciária ID 2039672676 - Pág. 88. Na Rua CP 20, Quadra CP18, Lote 3, Residencial Celina Park, Goiânia/GO (placa Cecchini Buffet) nada foi arrecadado. O ponto comercial foi alugado, assim como as cotas da sociedade empresária foram transferidas a pessoa não investigada (ID 2039672676 - Pág. 101/103). No que tange aos endereços ligados a BRUNO, na Rua T-54, 64, Ap. 301, Setor Bueno, Goiânia/GO, os bens relacionados no auto circunstanciado de busca e arrecadação ID 2039672676 - Pág. 93/95 foram apreendidos, conforme o termo ID 2039672676 - Pág. 96. Na Rua 4, 515, Ed. Pathernon Center, Setor Central, salas 1416 a 1420 - (sede da empresa RJR MINA EXPORT EIRELLI), os bens relacionados no auto circunstanciado de busca e arrecadação ID 2039672676 - Pág. 125/131 foram apreendidos, conforme o termo ID 2039672676 - Pág. 132/134. Claudia Rosa Silva Moura Cecchini obteve a restituição do veículo BMW/X1 S20I Activeflex, branca, placa PQT7310, mediante a nomeação como fiel depositária (ID 2039672677 - Pág. 61), relacionado no termo de apreensão ID 2039672676 - Pág. 96 (BRUNO). 2.2.2.2 PROVIDÊNCIAS DETERMINADAS NA DECISÃO ID 2163631598 No que tange à suposta omissão, o Ministério Público Federal sustentou que não foi intimado para se manifestar acerca da restituição dos veículos, que a restituição determinada pelo Juízo foi infundada e que os pedidos indeferidos anteriormente estão estabilizados pela coisa julgada. Contudo, quando os autos aportaram nesta Vara, o Ministério Público Federal foi intimado e, na oportunidade, manifestou-se apenas quanto a competência. No que concerne a competência, a 2ª Vara Federal de Jundiaí declinou do feito (ID 2039672677 - Pág. 126), que teve a competência firmada por este Juízo, na decisão ID 2128241223 dos autos nº. 1001867-25.2024.4.01.4100. Os embargos de declaração ID 2130824678 também foram julgados, nos autos nº. 1001867-25.2024.4.01.4100. As decisões foram trasladadas para estes autos. Após isso, o órgão já teve outras duas oportunidades, sem requerer qualquer providência acerca dos bens, que se deterioram armazenados. Caberia ao órgão ministerial manifestar-se quanto a tudo que entendesse pertinente quando intimado, em homenagem ao princípio da eventualidade, do contrário os bens permaneceriam deteriorando-se por tempo indeterminado. Ressalto que a manutenção desses itens geram altos custos, já que exigem a locação de espaços, segurança e pessoal para a administração. Embora as decisões que indeferiram a restituição de bens estejam protegidas pela coisa julgada, essas decisões subjugam-se a cláusula rebus sic stantibus. Veja-se que a passagem do tempo, por si, é fato novo, que deve ser somado ao conjunto probatório. Nesse sentido, o CJF aprovou a Resolução nº 780/2022, que determinou o reexame dos bens apreendidos, em especial no art. 1º, §3º, in verbis: (...) Art. 1º Cabe aos magistrados com competência criminal zelar pelo correto emprego das medidas de apreensão e constrição judicial de bens, objetos e valores em procedimentos criminais, para evitar gastos públicos desnecessários oriundos da guarda de bens, bem como de sua depreciação ou deterioração, sendo a regra a sua guarda pela polícia judiciária na respectiva central de custódia. (...) § 3º A necessidade de manutenção da apreensão ou da constrição judicial de bens, objetos ou valores deverá ser reavaliada periodicamente pela autoridade judicial, especialmente na fase de recebimento da denúncia, durante a instrução criminal e na sentença, assegurado o contraditório. (...) Observada a ausência de informações, este juízo determinou diversas diligências: (...) d) Solicite-se a Polícia Federal que informe a localização dos bens apreendidos, conforme os termos de apreensão IDs. 2039672676 - Pág. 85/87, 2039672676 - Pág. 96 e 2039672676 - Pág. 132/134, que deverão ser enviados com esta decisão que servirá de ofício. e) Fica autorizado que a Polícia Federal proceda à devolução dos documentos, objetos e outros materiais apreendidos que não revelem interesse para as investigações. f) A Polícia Federal deverá informar se o laudo pericial ou o espelhamento dos dados foram concluídos, assim como fica autorizado a restituição dos aparelhos eletrônicos aos investigados/interessados (notebook, telefone, etc) com quem os bens foram apreendidos. g) Veículos apreendidos na posse do investigado, registrado no próprio nome, deverão ser restituídos mediante a nomeação do investigado como fiel depositário. h) No caso de veículos apreendidos, na forma do art. 240 do CPP, em nome de terceiros, a Secretaria da Vara deverá autuar incidente de alienação antecipada, alusivo aos bens que ostentem valor econômico e sujeitos à depreciação, nos termos dos arts. 144-A do CPP e 3º da Resolução nº 780/2022-CJF, bem como cadastrá-los no Sistema Nacional de Gestão de Bens, vinculando-os aos autos do inquérito policial, nos termos dos artigos 11, 12 e 26 da Portaria nº 3/2021 da 3ª Vara da SJRO. (...) Destaco que a busca e apreensão é meio de obtenção de prova e a apreensão de bens deveria estar de acordo com os parâmetros do art. 240 do CPP. No presente caso, passados já mais de dois anos do cumprimento da medida (agora mais de três), a apreensão de veículo deveria ter solução imediata, por isso, naquele momento, determinou-se que os automóveis apreendidos com os investigados deveriam ser restituídos mediante nomeação do proprietário como fiel depositário. A falta de informações acerca dos bens não deveria ser óbice à restituição, por duas razões. Primeiro, o tempo é determinante para o aproveitamento de bens materiais, nesse sentido a Resolução nº 780/2022 do CJF firmou no art. 1º: (...) § 2º Sempre que noticiada a apreensão ou a constrição judicial de bens, objetos ou valores em procedimentos criminais, o magistrado competente deverá avaliar a necessidade de manutenção da medida e, com brevidade, deliberar sobre restituição, utilização por órgãos de segurança, alienação antecipada, destinação, descarte ou destruição destes, respeitada a legislação aplicável e assegurado o contraditório. (...) Segundo, a própria Autoridade Policial deveria ter adotado providências para restituição de tudo o que não interessa ao processo, na forma do CPP: "Art. 120. A restituição, quando cabível, poderá ser ordenada pela autoridade policial ou juiz, mediante termo nos autos, desde que não exista dúvida quanto ao direito do reclamante". A providência tinha por fim preservar o valor econômico dos veículos, pois nos pátios de armazenamento não há qualquer proteção contra intempéries ou outros infortúnios (como fogo, furto, roubo etc), assim como garantir a possibilidade de revisão da decisão, mediante provocação das partes. Igual tratamento deveria ser dado aos aparelhos eletrônicos de uso pessoal, os quais a apreensão tinha como finalidade a extração dos dados. Note-se que os itens estão sujeitos à obsolescência, própria dos bens tecnológicos, assim como a deterioração causada pela falta de manutenção durante a guarda. Como já dito, os bens foram apreendidos em razão dos dados armazenados e após a perícia técnica, ou o espelhamento, já não representam interesse para a investigação. Ademais, caso se aventasse que os bens servem à reparação do dano, o valor que representam é ínfimo, principalmente porque estão estocados há muito tempo. Sublinho que toda medida cautelar é provisória e fundada em risco de tornar ineficaz o provimento jurisdicional definitivo, o que não se vislumbra por ora. 3 DISPOSITIVO Ante o exposto, conheço dos embargos de declaração, porque tempestivos, e no mérito julgo-os parcialmente procedentes, no que tange a omissão, para esclarecer que não será admitido novo pedido dos investigados/terceiros nos autos. Entretanto, já oportunizada a oitiva do órgão ministerial, este Juízo poderá exarar determinações em cumprimento ao art. 1º, §3º, da Resolução nº. 780/2022. Reitero que os pedidos de restituição indeferidos submetem-se a coisa julgada, rebus sic stantibus. a) Reitero à Polícia Federal que os veículos registrados em nome dos investigados, que estavam na posse do bem no momento da apreensão, deverão ser restituídos, com a nomeação do proprietário como fiel depositário. A Polícia Federal deverá juntar o termo de nomeação nestes autos. b) Em relação ao veículo de placa PQT7310, restituído à Claudia Cecchini, como fiel depositária, não há qualquer modificação. c) Intime-se a Polícia Federal para que informe a localização dos bens apreendidos, conforme os termos de arrecadação ID 2039672676 - Pág. 69/72 e de apreensão IDs 2039672676 - Págs. 85/86, 96 e 132/134, no prazo de cinco dias. Transcorrido o prazo sem a informação, intime-se o Ministério Público Federal para atuação no controle externo. d) Com a informação do item acima, no caso de veículos apreendidos, na forma do art. 240 do CPP, em nome de terceiros, a Secretaria da Vara deverá autuar incidente de alienação antecipada, porque estão sujeitos à depreciação, nos termos dos arts. 144-A do CPP e 3º da Resolução nº. 780/2022-CJF. e) Autorizo a restituição dos aparelhos eletrônicos (notebook, telefone, pendrive, HD etc) aos investigados/interessados, que tinham a posse dos bens quando apreendidos, assim como à devolução de documentos, objetos e outros materiais que não revelem interesse para as investigações. f) Retifique-se a autuação dos autos para fazer constar o procurador de BRUNO CÉZAR CECCHINI, conforme ID 2168958138 - Pág. 2. g) Traslade-se cópia desta decisão para os autos nº. 1001833-50.2024.4.01.4100. Intimem-se. Cumpra-se. Oportunamente, arquivem-se. Porto Velho, data e assinatura do sistema. Juiz Federal Assinante
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