Processo nº 1002054-47.2021.4.01.3903
ID: 325301108
Tribunal: TRF1
Órgão: Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Altamira-PA
Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Nº Processo: 1002054-47.2021.4.01.3903
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Altamira-PA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Altamira-PA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1002054-47.2021.4.01.3903 CLASSE: AÇÃO CIVIL DE IMP…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Altamira-PA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Altamira-PA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1002054-47.2021.4.01.3903 CLASSE: AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (64) POLO ATIVO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - MPF e outros POLO PASSIVO: EDILSON CARDOSO DE LIMA e outros SENTENÇA Vistos, etc. Cuida-se de ação civil de improbidade administrativa promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e direcionada em desfavor de EDILSON CARDOSO DE LIMA e TOP ASM COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA, buscando a condenação dos requeridos por atos de improbidade administrativa capitulados na L8.429/92. Relata a inicial, em síntese, que a Controladoria Geral da União (CGU), em conjunto com o Ministério Público do Estado do Pará, realizou a Operação Maturu, que descortinou um esquema de corrupção e favorecimento de empresas em licitações realizadas no Município de Porto de Moz, durante a gestão do requerido EDILSON CARDOSO DE LIMA. Em suma, no âmbito do Inquérito Civil 1.23.003.000325/2019-21 (id 634791492 a id 634809955) teria sido apurado que, durante o exercício financeiro de 2015, o ente municipal recebeu repasses de R$ 1.362.349,20 (um milhão, trezentos e sessenta e dois mil trezentos e quarenta e nove reais e vinte centavos) oriundos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), a título de Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Desse montante, R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos) teria sido repassado à empresa TOP ASM COMÉRCIO E SERVIÇOS, durante o interregno de 10/03/2015 e 31/12/2015. Dita contratação se deu de forma direta, sob fundamento de anterior convocação deserta. Tal sociedade empresária seria uma empresa fantasma, vocacionada a auxiliar o requerido EDILSON a desviar recursos, inclusive com laços familiares com servidores da Prefeitura. São ainda inventariadas provas de inexistência de serviços prestados pela dita sociedade (como a ausência de funcionários contratados e notas fiscais apreendidas durante o curso de mandados de busca e apreensão). Pediu, assim, a condenação dos réus nas sanções do art. 12, II, da L8.429/92, além de medida liminar de indisponibilidade de bens no patamar de R$ 3.746.649,90 (três milhões setecentos e quarenta e seis mil seiscentos e quarenta e nove reais e noventa centavos) (id 654997480). Liminar parcialmente deferida para determinar a indisponibilidade dos bens dos réus no patamar de R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos). O FNDE externou interesse em ingressar na demanda (id 870821059). Determinada a citação dos réus (id 936652194). TOP ASM COMÉRCIO E SERVIÇO LTDA (id 1187801793) e EDILSON LIMA CARDOSO (id 1187954764) foram citados. Facultada a emenda à inicial pelo MPF e pelo FNDE (id 1665453976), providência atendida pelo dominus litis (id 1673792475). Nova decisão de saneamento foi proferida, determinando-se a intimação dos autores para que se pronunciassem sobre as modificações da L14.230/2021 (id 1900313150). O MPF requereu a emenda da petição inicial apenas para excluir a imputação do inciso VIII do art. 10 da Lei nº 8.429/1992, mantendo-se a demanda quanto à imputação do inciso XII do art. 10 da Lei nº 8.429/1992, nos termos da fundamentação apresentada (id 1940544374). A emenda foi recebida (id 2148821203), reabrindo-se a intimação dos réus para que falassem sobre a correção dos termos da exordial. A par disso, EDILSON CARDOSO DE LIMA (id 2181827832) apresentou pronunciamento, invocando preliminares e rebatendo o mérito. Determinada a provocação dos autores sobre a manifestação (id 2185021198), havendo réplica do FNDE (id 2189849102). Em decisão proferida na fase do art. 17, §10-C, da L8.429/92 (na redação conferida pela L14.230/2021), foi rejeitada a preliminar de litisconsórcio passivo necessário, postergado para a sentença o exame das matérias meritórias e fixado, para os fins do art. 17, §10-C, da L8.429/92, os atos de improbidade que seriam perscrutados. Foi decretada a revelia da ré TOP ASM COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA e determinada a intimação das partes sobre eventual interesse probatório (id 2189849102). Sem interesse probatório pelos autores (id 2190456092 e id 2190457947), decorrido o prazo para os réus, os autos regressam para julgamento. É o breve relatório. Vieram-me para sentença. Decido. As questões preliminares já foram examinadas e enfrentadas na decisão saneadora (id 2189849102), de forma que passo, de imediato, ao mérito da demanda, observando os lindes cognitivos que foram traçados naquele provimento: (...) 1. Litisconsórcio passivo necessário O réu EDILSON alega a existência de litisconsórcio passivo necessário com outros agentes públicos, os quais, na sua visão, também deveriam compor a relação jurídica processual, notadamente os fiscais de contratos que foram tidos como simulados pelo MPF. Rejeito a alegação. A orientação jurisprudencial majoritária é no sentido de inexistir litisconsórcio passivo necessário em ações de improbidade administrativa, especialmente porquanto compete ao Ministério Público Federal (e, por arrastamento, aos demais legitimados) avaliar a existência de indícios de autoria e materialidade dos atos da L8.429/92, relativamente a cada um dos implicados. Ademais, tratando-se de um exame que envolve uma análise eminentemente subjetiva (com comprovação do dolo no proceder), não consigo conceber uma uniformidade da relação jurídica que demande a presença simultânea de todos os agentes públicos envolvidos na prática de determinado ato que venha a ser objeto de questionamento em relação a sua moralidade. Na mesma ordem de ideias, um litisconsórcio passivo multitudinário se revela, na prática judicial, fonte de morosidade excessiva e transforma, não raras vezes, as ações de improbidade em processos perenes, inacabáveis, de forma que uma grande presença de agentes no polo passivo é desaconselhado, também, sob a ótica do devido processo legal (na perspectiva da duração razoável do processo). Tal é a lição dos TRF1: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. BNDES . LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INOCORRÊNCIA. NÃO CONFIGURADO INTERESSE EM INGRESSAR NA DEMANDA. SENTENÇA REFORMADA . RECURSOS PROVIDOS. 1. Apelações cíveis interpostas pelo Ministério Público Federal e pela União Federal contra sentença que, em ação de improbidade administrativa, extinguiu o processo sem exame do mérito, com base na falta de pedido de citação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES para integrar a lide como litisconsorte passivo necessário. 2 . A ação de improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público Federal objetivando apurar irregularidades em procedimentos licitatórios ocorridas no âmbito de Concorrências Públicas, no Estado de Tocantins, ocasionando prejuízo ao patrimônio público federal. Sendo o BNDES mero repassador de recursos. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Regional é no sentido de que, na ação civil por improbidade administrativa, não há que se falar na formação de litisconsórcio passivo necessário, por falta de previsão legal e de relação jurídica entre as partes que obrigue o magistrado a decidir de modo uniforme a demanda . Precedentes. 4. Não há que se falar em litisconsórcio passivo necessário do BNDES na presente demanda. A petição inicial da Ação Civil de improbidade administrativa deve ser recebida e, ato contínuo, devem os autos ser devolvidos à origem para prosseguimento do feito . 5. Recursos providos para reformar a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TRF-1 - (AC): 10141280820214010000, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, Data de Julgamento: 10/07/2024, DÉCIMA TURMA, Data de Publicação: PJe 10/07/2024 PAG PJe 10/07/2024 PAG) Rejeito a preliminar. 2. Demais matérias As demais matérias (retroatividade da L14.320/2021, inexistência de dolo e observância das dificuldades do gestor) tocam o mérito da demanda e devem ser enfrentadas em sentença. 3. Da fixação dos atos de improbidade Diz o art. 17, §10-C, da L8429/92 (na redação dada pela L14.230/2021) que após a réplica do autor, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal apresentada pelo autor. Acolho, portanto, a limitação das condutas expostas no parecer do MPF, que bem delineia a questão: As condutas denunciadas se amoldam ao artigo 10, caput, inciso XII, da Lei nº 8.429/1992, pois EDILSON CARDOSO DE LIMA, que atuava como ordenador de despesas, de forma livre e plenamente consciente da ilicitude de sua conduta, frustrou a licitude de processo licitatório, mediante dispensa de licitação, visando o enriquecimento ilícito de terceiros, ao contratar empresa de fachada por R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos), sem capacidade operacional para a prestação do serviço contratado, e para favorecimento de parentes de empregados do município. Ainda, se amoldam ao artigo 10, caput, inciso VIII, da Lei nº 8.429/1992, por ter frustrado o processo licitatório para que houvesse dispensa de licitação e consequente favorecimento de terceiros, tendo ocorrido o pagamento do montante de R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos) a empresa de fachada contratada e constatada a ausência de atesto nas notas fiscais emitidas, o que representa não ter comprovação da prestação do serviço contratado, em contrário entendimento firmado pelo TCU por meio do Acórdão nº 2.512/2009 incorrendo em inequívoca lesão ao erário e impedimento para que a Administração Pública contratasse a melhor proposta Decisão. ANTE O EXPOSTO, na forma da fundamentação, rejeito a preliminar ventilada, postergo para sentença o exame das matérias meritórias e fixo, para os fins do art. 17, §10-C, da L8429/92 (na redação dada pela L14.230/2021), os atos de improbidade administrativa imputados aqueles descritos nos termos do item 3, do presente provimento. (...) Vejamos. 1. Das modificações da L14.230/2021 Em 26/10/2021, a L14.230/2021 promoveu uma profunda alteração na sistemática da L8.429/92. Uma das modificações principais foi a inclusão de um conceito de improbidade administrativa que somente comporta uma modalidade dolosa. Eis o teor do ato normativo: Art. 1º (...) § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. Com isso, foi elidida a possibilidade de condenação pelas modalidades culposas anteriormente previstas na L8.429/92. Esse entendimento é reforçado pelo teor do art. 17-C, §1º, do mesmo diploma: Art. 17-C (...) § 1º A ilegalidade sem a presença de dolo que a qualifique não configura ato de improbidade. Da mesma sorte, foi revogado o art. 5º, da L8.429/92, que preconizava, em sua redação original, que ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano. Já a definição de dolo foi assim disciplinada pela L14.230/2021: Art. 1º (...) § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (Incluído pela Lei nº 14.230/2021) § 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. (Incluído pela Lei nº 14.230/2021) Art. 11 (...) § 1º Nos termos da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, somente haverá improbidade administrativa, na aplicação deste artigo, quando for comprovado na conduta funcional do agente público o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. (Incluído pela Lei nº 14.230/2021) § 2º Aplica-se o disposto no § 1º deste artigo a quaisquer atos de improbidade administrativa tipificados nesta Lei e em leis especiais e a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa instituídos por lei. (Incluído pela Lei nº 14.230/2021) A L14.230/2021 também incorporou uma orientação já predominante no STJ, no sentido de aplicar ao sistema da improbidade administrativa o regramento do direito sancionador: Art. 1º (...) § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador. Além disso, no campo dos aspectos processuais, notadamente dos requisitos da petição inicial, a L14.230/2021 impôs ao autor o ônus de evidenciar um elemento subjetivo detalhado, uma individualização das condutas e indicações de dano ao erário (caso imputada essa modalidade). Eis a redação legal: Art. 17 (...) § 6º A petição inicial observará o seguinte: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - deverá individualizar a conduta do réu e apontar os elementos probatórios mínimos que demonstrem a ocorrência das hipóteses dos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei e de sua autoria, salvo impossibilidade devidamente fundamentada; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) II - será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições constantes dos arts. 77 e 80 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) Alguns temperamentos foram realizados pela jurisprudência em relação aos impactos da L14.230/2021. O Supremo Tribunal Federal fixou as seguintes compreensões em relação ao alcance retroativo da L14.230/2021 para alcançar processos já em tramitação quando da vigência do novel diploma: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se — nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA — a presença do elemento subjetivo — DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 — revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa —, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. STF. Plenário. ARE 843989/PR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/8/2022 (Repercussão Geral – Tema 1.199) (Info 1065). Isso significa dizer, conforme encampado pelo STJ, que os novos requisitos para configuração de atos de improbidade administrativa se aplicam aos processos em curso. Justamente por isso, a exigência do efetivo prejuízo, em relação ao ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário, prevista no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92 (com redação dada pela Lei nº 14.230/2021) se aplica aos processos ainda em curso (STJ. 1ª Turma. REsp 1.929.685-TO, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 27/8/2024, Info 823). Na mesma linha: (...) 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. STF. Plenário. ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Rel. Min. LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 22/08/2023. Logo, os processos distribuídos sob o regramento anterior devem demonstrar, ainda que no deambular de seu curso, a presença dos requisitos previstos na L14.230/2021, notadamente uma conduta individualizada, um elemento subjetivo doloso e a presença de prejuízo ao erário (quando houver essa modalidade de imputação). 2. Do caso concreto Inicialmente, cabe esclarecer que os fatos aqui examinados já foram apreciados sob a ótica criminal no âmbito da Ação Penal n. 1002055-32.2021.4.01.3903, movida em face de EDILSON CARDOSO DE LIMA e Aberlardo da Silva Maciel, ocasião em que ambos restaram condenados por este Juízo como incursos nas penas do art. 1º, I, do DL 201/67 e art. 89, da L8.666/93, conforme trechos da sentença lá proferida (id 2173870962, daqueles autos): II-Fundamentação Narra a denúncia que: EDILSON CARDOSO DE LIMA, na qualidade de então Prefeito do Município de Porto de Moz/PA, no exercício financeiro de 2015, desviou recursos públicos federais oriundos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) em favor da empresa de ABELARDO DA SILVA MACIEL e dispensou licitação fora das hipóteses previstas em lei para beneficiar empresa pertencente a familiar de funcionários da prefeitura. 2.1.Crime descrito no art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 201/1967: A materialidade do crime foi suficientemente demonstrada nos autos, destacando-se: a)relatórios da "Operação Maturu" da CGU (ID 635035465 - pág.51-188) o qual constatou-se: 4. Notas fiscais da empresa Belforte Ind. Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. ME (CNPJ 83.337.386/0001-59) e comprovantes de transferência no valor de R$ 177.080,79. Trata-se de pagamento de transporte escolar, analisado no alvo 16. (id. 635035465 – pág.120); 3. Lista denominada “Transporte”, contendo anotações à mão com nomes de pessoas e dados de pagamentos referentes a transporte escolar no município de Porto de Moz/PA.(id. 635035465-pág.146); 1. Favorecimento de empresas pertencentes a grupo familiar de servidora da Prefeitura Municipal. As empresas TOP ASM Comércio & Serviços Ltda. – ME, nome fantasia TOP Comércio & Serviços (CNPJ 21.442.257/0001-73), A. P. Maciel – ME, nome fantasia TOP Consultorias e Assessorias (CNPJ 18.265.964/0001-27), e Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. - ME (CNPJ 83.337.386/0001-59), todas contratas pela Prefeitura Municipal de Porto de Moz (PMPM), fazem parte do mesmo grupo familiar, conforme demonstrado no diagrama abaixo: (id. 635035465-pág.147); id. 635035465 – pág.148-149) - A Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. - ME, por exemplo, possui 57 atividades econômicas cadastradas. Pelo seu Cnae, era de se esperar que a empresa Belforte detivesse uma estrutura física considerável, até mesmo incompatível com uma empresa de pequeno porte, como está oficialmente cadastrada. No entanto, a empresa aparenta ser uma empresa de fachada. Isto porque, conforme relatado na Nota Técnica nº 2830, em visita realizada em 13/11/2016 à sede da empresa, no endereço no qual está cadastrada na Receita Federal do Brasil, constatou-se que se trata de uma residência familiar, sem nenhuma estrutura ou aspecto empresarial nem de empresa de pequeno porte e muito menos de uma empresa com estrutura para todas as atividades empresariais para as quais está cadastrada. c) As empresas TOP ASM Comércio & Serviços Ltda. – ME, e A. P. Maciel - ME são empresas abertas recentemente, ambas após o início do mandato do Prefeito Edilson Cardoso de Lima. Apesar de ter sido aberta apenas em novembro de 2014, a TOP ASM passou a ser contratada pela prefeitura de Porto de Moz já em março de 2015, tendo inclusive recebido pagamento nesse mesmo mês. Além disso, conforme também relatado na Nota Técnica nº 2830, a empresa Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. só passou a ser assim denominada a partir de 8 de março de 2016, sendo que antes disso se chamava Serviços de Cargas e Postagens Belém Ltda. - ME, exercendo como atividade principal a “prestação de serviços postais e telemáticos, bem como compra e venda de artigos de papelaria em geral d) Apesar de terem recebido pagamentos de quase R$ 5 milhões oriundos de recursos do PNATE, nenhuma das três empresas apresenta veículos cadastrados em seus nomes na base do Denatran (apenas a TOP ASM passou a apresentar uma camionete cadastrada em seu nome a partir de 2016). Id. 635035465-pág.150 - 3. Ausência de atesto nas Notas Fiscais. Entre o material apreendido nos alvos 08 e 20, constam também 31 notas fiscais emitidas pelas empresas TOP ASM Comércio & Serviços Ltda. – ME e pela Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. – ME, em favor da Prefeitura Municipal de Porto de Moz (CNPJ 05.183.827/0001-00), todas referentes a pagamentos por prestação de serviço de transporte escolar ou pelo fornecimento de gêneros alimentícios nos exercícios de 2015 e 2016. É importante mencionar que nenhuma das notas fiscais apreendidas encontra-se atestada, o que vai de encontro ao normativo do TCU, que por meio do Acórdão nº 2512/2009 – TCU – Plenário, aduziu a importância do atesto dos documentos que comprovam as Despesas 4. Contratação de empresas para execução de serviços adversos, mediante dispensas de licitação indevidas e direcionamento em processos licitatórios. Em consulta ao Sistema Integrado de Gestão Financeira – SIGEF/FNDE, foram identificados pagamentos realizados às três empresas com recursos do FUNDEB, do PNATE, e do PNAE, num total de pelo menos1 R$ 6.778.118,43, conforme detalhado nos quadros abaixo. Id. 635035465-pág.154 - 5. Documentos de uso interno da empresa Belforte encontrados na residência do Prefeito de Porto de Moz/PA, Edilson Cardoso de Lima. Na busca e apreensão realizada na residência do prefeito de Porto de Moz/PA, Edilson Cardoso de Lima (alvo 01), foram encontrados três blocos de requisição de combustível da “AB Belforte Consultoria & Assessoria”, contendo dados de endereço e contato da empresa Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. - ME (CNPJ 83.337.386/0001-59). Os talonários apresentam tanto páginas de requisições preenchidas quanto em branco, sendo que todas estão assinadas por “Lauriane Soares”, pessoa identificada como Lauriane Soares Machado (CPF 021.635.362-97), assistente administrativa da PMPM até 31 de dezembro de 2015 (RAIS); análise destes itens, em conjunto com o material apreendido nos alvos 08 e 20, indicam: a) Favorecimento das empresas TOP ASM Comércio & Serviços Ltda. – ME, nome fantasia TOP Comércio & Serviços (CNPJ 21.442.257/0001-73), A. P. Maciel – ME, nome fantasia TOP Consultorias e Assessorias (CNPJ 18.265.964/0001-27), e Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. - ME (CNPJ: 83.337.386/0001-59) para a celebração de diversos contratos na área da educação, entre outras; b) Contratação de empresas de fachada e sem capacidade operacional para execução de contratos de fornecimento de merenda escolar e transporte escolar; c) Ausência de atesto em Notas Fiscais emitidas pelas empresas investigadas em favor da PMPM; Procedimento 1.23.003.000325/2019-21, Documento 16, Página 108; d) Contratação de empresas para execução de serviços adversos, mediante dispensas de licitação indevidas e direcionamento em processos licitatórios; e) Documentos de uso interno da empresa Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação Ltda. – ME, encontrados na residência do Prefeito de Porto de Moz/PA, Edilson Cardoso de Lima. b) pelo Parecer do FNDE nº 298/2021/DIAPC/COECS/CGPAE/DIRAE (ID 635035471 - pág.497- 515). A aprovação parcial decorre de que: a) A EEx. não atendeu alunos matriculados em instuição de Atendimento Educacional Especializado - AEE, gerando um prejuízo ao erário no valor de R$ 6.300,00 (seis mil e trezentos reais); e b) Houve a aquisição de alimentos restritos em percentual acima de 30% dos recursos repassados, uma vez que a EEx. adquiriu o percentual de 37,18%, excedendo em 7,18% do percentual previsto, gerando um prejuízo ao erário no valor de R$ 97.749,74 (noventa e sete mil setecentos e quarenta e nove reais e setenta e quatro centavos), totalizando um prejuízo ao erário no valor total de R$ 104.049,74 (cento e quatro mil, quarenta e nove reais e setenta e quatro centavos). Nesse caso, torna-se necessário que o gestor apresente jusficava ou proceda à devolução dos recursos aos cofres públicos federais devidamente corrigidos. É importante, também, que a área financeira verifique se a cobrança já foi realizada, com vistas a evitar a duplicidade do débito. Nessa linha, as testemunhas ouvida em juízo afirmaram: Ivandro: que foi tesoureiro do Município de Porto de Moz de 2016 a 2019; Durante a gestão do prefeitura do prefeito Edilson; que fazia os pagamentos; não tinha acesso aos processos de licitação; que não era efetivo, que foi indicado pelo prefeito; Que foi efetuado pagamento a empresa TOP; que os pagamentos eram feitos nos finais do mês; que não lembra o valor, mas eram mais de 100.000,00 por mês; Que não sabia a origem dos recursos; Que tinha conhecimento que Aberlado era sócio da empresa TOP; Que lembra que pagou também para TOP consultoria; Que foi feito pagamento Bel forte; Que sabia que Aberlado era sócio das empresas; que os pagamento eram na faixa de 20 a 40 mil; Que lembra que eram de consultoria; merenda e transporte; Que verificava se o serviço foi prestado; Que o prefeito tinha conhecimento, porque o prefeito também assinava; Que antes do pagamento passava pela contadoria; Que o prefeito nunca pediu para favorecer empresas; Humbercley: que era o presidente da CPL na época; que recorda que foi feito o procedimento de licitação, que não compareceu nenhuma, na segunda só apareceu a empresa TOP; que apareceu outras empresas; que na época era comum fazer dispensa, porque não aparecia ninguém; que era observado todas formalidades de licitação; que não sabe informar pelo controle interno; Que não lembra como foi extraviado os documentos da licitação envolvendo a Top. Pelo cotejo analítico das provas constantes nos autos, conclui-se, de maneira inequívoca, que do total repassado pelo FNDE ao Município de Porto de Moz, no montante de R$ 1.362.349,20, a empresa TOP ASM COMÉRCIO & SERVIÇOS LTDA, de propriedade do corréu ABELARDO DA SILVA MACIEL, recebeu indevidamente a quantia de R$ 1.248.883,30. Evidencia-se, portanto, desvio de verba pública em proveito alheio, nos moldes do tipo penal ora em comento. Outrossim, não há nos autos documentos que comprovem, de forma suficiente, a adequada prestação dos serviços contratados, tampouco justificativa legal para a contratação direta em detrimento das normas que regem a licitação. Ademais, as testemunhas ouvidas confirmaram a ocorrência de pagamentos e contratações sem qualquer controle efetivo por parte da administração pública. Na hipótese dos autos, as provas constantes do relatório mencionado revelam a existência de notas fiscais com descrições genéricas dos serviços contratados, sem qualquer detalhamento quanto aos veículos supostamente locados (ausência de identificação por placas), nem indicação precisa da finalidade dos serviços executados. Tal deficiência documental compromete a comprovação da efetiva execução dos serviços e inviabiliza a adequada fiscalização pelos órgãos de controle interno e externo, em afronta ao disposto no art. 63, § 1º, inciso III, da Lei nº 4.320/1964. Ainda em reforço, conforme apontado no quadro de pagamento de fornecedores constante do relatório, constatou-se a inexistência dos devidos processos de contratação e pagamento, tendo sido localizados apenas comprovantes de despesas, como notas fiscais e faturas. Essa constatação evidencia que os serviços e/ou produtos não foram devidamente processados e que a documentação apresentada não se presta a comprovar a legalidade da despesa pública. Quanto à autoria delitiva, a conduta de EDILSON CARDOSO DE LIMA é clara e inequívoca. Na qualidade de Prefeito e ordenador de despesas, cabia-lhe não apenas o controle, mas também o dever legal de zelar pela correta e lícita aplicação dos recursos públicos. No presente caso, a documentação apreendida durante a operação e os depoimentos colhidos em juízo demonstram que o réu não apenas autorizou, como também direcionou conscientemente recursos públicos à empresa de propriedade do corréu ABELARDO DA SILVA MACIEL, ciente da ausência dos requisitos legais para a dispensa de licitação. No contexto, denota dos depoimentos e provas materiais, que ABELARDO DA SILVA MACIEL, na qualidade de proprietário da empresa beneficiada, colaborou diretamente para a consumação do delito, aceitando e se beneficiando dos pagamentos indevidos feitos à sua empresa, sem que esta demonstrasse possuir capacidade técnica e operacional para a prestação dos serviços contratados, circunstância comprovada pela ausência de funcionários registrados na RAIS e pela evidente incompatibilidade das atividades registradas no CNAE da empresa com o objeto dos contratos. Por fim, não há dúvidas razoáveis que beneficiem os acusados neste contexto probatório, por conseguinte, os elementos apontam para tipicidade, ilicitude e culpabilidade dos réus pelos fatos narrados na denúncia. Dessa forma, a conduta dos réus se caracteriza por ser fato típico e antijurídico, não havendo causa de justificação a excluir a ilicitude de suas condutas, nem qualquer causa que exclua sua culpabilidade, razão pela qual tenho que os acusados devem ser responsabilizados pelo delito previsto no art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 201/67. 2.2. Crime descrito no art. 89 da Lei nº 8.666/1993: Neste ponto, afirma a denúncia que houve dispensa de licitação fora das hipóteses previstas em lei para beneficiar empresa pertencente a familiar de funcionários da prefeitura, denota-se que os fatos narrados se limitam a envolver a conduta praticadas pelos réus em relação as dispensa e consequente desvio das verbas públicas em benefício próprio e do terceiro corréu. Na hipótese, o STJ. Corte Especial. APn 480-MG, Rel. originária Min. Maria Thereza de Assis Moura, Rel. para acórdão Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 29/3/2012, firmou entendimento que no caso do crime previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/93, exige-se: a) que tenha havido resultado danoso (dano ao erário) para que ele se consuma (trata-se de crime material); b) que o agente tenha elemento subjetivo especial (“dolo específico”), consistente na intenção de violar as regras de licitação. No contexto, a análise das provas já apontadas ao norte, confirmam a materialidade, porquanto demonstraram a total ausência dos pressupostos exigidos por lei para a dispensa de licitação. A fundamentação do MPF encontra sólido amparo nas provas produzidas, que demonstraram claramente o direcionamento ilícito para a empresa TOP ASM e outras empresas, pertencente a familiares diretos de servidores municipais, o que viola frontalmente os princípios constitucionais da Administração Pública, sobretudo os princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade. O elemento subjetivo do tipo penal (dolo específico) encontra-se devidamente comprovado pelo conjunto probatório produzido, especialmente pela prova testemunhal e pela documentação apreendida na residência do então prefeito, indicando pleno conhecimento das ilegalidades cometidas. Os réus agiram de forma coordenada e consciente, com propósito específico de infringir as regras licitatórias, obtendo vantagem econômica direta e causando prejuízo efetivo ao erário federal, fato comprovado pelo parecer técnico do FNDE que constatou prejuízo superior a cem mil reais (Parecer do FNDE nº 298/2021/DIAPC/COECS/CGPAE/DIRAE (ID 635035471 - pág.497- 515)), valor que pode ser ainda maior considerando as irregularidades identificadas pela CGU. Os argumentos defensivos, embora relevantes, não se sustentam diante do conjunto probatório robusto e coerente produzido pelo MPF. A tese da atipicidade da conduta, ausência de dolo e inexistência de prejuízo ao erário foram todas superadas pelas provas materiais e testemunhais. Não há dúvidas razoáveis que beneficiem os acusados neste contexto probatório. Nessa linha, as testemunhas ouvida em juízo confirmaram que as licitações eram dispensadas: Humbercley: que era o presidente da CPL na época; que recorda que foi feito o procedimento de licitação, que não compareceu nenhuma, na segunda só apareceu a empresa TOP; que apareceu outras empresas; que na época era comum fazer dispensa, porque não aparecia ninguém; que era observado todas formalidades de licitação; que não sabe informar pelo controle interno; Que não lembra como foi extraviado os documentos da licitação envolvendo a Top; Gilbran – que foi pregoeiro na época; Que não lembra se estava na licitação da Top; que era reduzido o número de empresas que participavam; Que não houve reclamação ou prejuízo na entrega do objeto da licitação. Dessa forma, diante dos fatos não há dúvida razoável que os réus em unidade de proposítio promovem a dispensa indevida de licitação causando dano direto aos erário, porquanto restou evidenciado que objeto da licitação não foram prestado ou prestados de forma precária, consoante revelou o relatório produzido, ao asseverar que não foram localizados processos de contratação e de pagamentos, mas tão somente comprovantes de pagamentos, como notas fiscais e faturas. Desse modo, evidenciou-se que os serviços/produtos foram prestados/entregues. Por fim, reconheço que os crimes foram praticados em concurso material, uma vez que as dispensas de licitação ocorreram em contexto diverso. III-Dispositivo Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia para condenar o réu EDILSON CARDOSO DE LIMA e ABELARDO DA SILVA MACIEL pela prática dos crimes previstos no artigo 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 201/1967 e artigo 89 da Lei nº 8.666/1993, em concurso material (art. 69 do Código Penal). Embora proferida em cenário diverso (ação criminal), não consigo divisar solução diversa daquela que alcançou o Juiz Federal Clécio Alves de Araújo para o presente caso. São fatos incontroversos que o Município de Porto de Moz/PA recebeu, em 2015 (durante a gestão do réu EDILSON CARDOSO DE LIMA), repasses financeiros provenientes do FNDE, a título de Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), a quantia de R$ 1.362.349,20 (um milhão trezentos e sessenta e dois mil trezentos e quarenta e nove reais e vinte centavos). Desse montante, os documentos encartados pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL no âmbito do Inquérito Civil n. 1.23.003.000325/2019-21 (id 634791492 a id 634809955) indicam que a quantia de R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos) foi repassado à sociedade empresária TOP ASM SERVIÇOS LTDA, durante o interregno de 10/03/2015 e 31/12/2015. O Município sequer teve a capacidade de remeter ao MPF a íntegra dos documentos que subsidiariam a contratação da indigitada empresa. O único lastro probatório que se tem é a Edição n. 48, do Diário Oficial da União (Seção 3, p. 229), de 12/03/2015, indicando a celebração dos Contratos n. 100301/2015 e 100302/2015, oriundos das Dispensas de Licitação n. 100301/2015 e n. 100302/2015, tendo como objeto contratação de empresa para fornecimento de gêneros alimentícios para o Programa Nacional de Alimentação Escolar, com vigências, de 10/03/2015 a 31/12/2015, no valor de R$ 1.251.765,50 (um milhão, duzentos e cinquenta e um mi, setecentos e sessenta e cinco reais e cinquenta centavos) e R$ 53.273,50 (cinquenta e três mil, duzentos e setenta e três reais e cinquenta centavos). O fundamento para uma dispensa desse quilate foi a realização de uma licitação deserta decorrente do Pregão n. 60301/2015, de 11 de março de 2015, subscrita pelo requerido EDILSON CARDOSO DE LIMA. Na esteira do que bem fundamentou o Ministério Público, a sociedade empresária agraciada com os contratos era constituída por uma empresa desenvolvida por Abelardo da Silva Maciel (id 634809955), formalizada em 17/11/2014 (id 634809947, fls. 492/496), às vésperas das contratações diretas que lhe renderam milionários contratos. O capital social, àquela altura, era de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). Há duas frentes de considerações que merecem ser frisadas. A primeira é de que, conforme bem fundamentou o MPF, embora a TOP ASM fosse contratada nas mais diversas áreas pelo Município, não possuía sequer um funcionário registrado no sistema RAIS, patenteando que se tratava, a todas as luzes, de um empreendimento fantasma. Reforça o acerto dessa conclusão a inexistência de bens registrados em seu nome, pateteado pelas medidas de indisponibilidade malogradas (id 669817979). O segundo é que Abelardo da Silva Maciel possuía vínculos firmes e sólidos com a própria Prefeitura, na medida em que era casado com Jucirlany Gonçalves Pontes, servidora da prefeitura do Município de Porto de Moz. Ambos são sócios na sociedade Belforte Indústria, Comércio, Serviços, Importação e Exportação LTDA, outra das contempladas pelos recursos repassados pelo ente municipal. Avançando, quanto ao elemento subjetivo doloso do réu EDILSON, a inicial também recorda que após o cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência de EDILSON CARDOSO DE LIMA, realizada pela CGU com apoio do Ministério Público do Estado do Pará, foi encontrado o Contrato PMPM nº 02201/2015, referente à licitação CC nº 020201/2015-CPL, tendo como contratada a empresa TOP Construtora e Serviço Eireli – ME (CNPJ 21.442.257/0001-73) e objeto a prestação de Serviços de Manutenção de EMEF Fátima Pinto, no valor de R$ 52.671,55 (Documento 1.1 – RAMA-Maturu-Alvo 01). O CNPJ da empresa em questão é idêntico ao da requerida TOP ASM, o que evidencia que o então prefeito tinha plena ciência de todas as irregularidades e contribuía ativamente enquanto ordenador de despesas para o favorecimento dos sócios da empresa TOP ASM (id 634791448, fl. 7). Em suma: a) há prova da dispensa de licitação, desacompanhada dos procedimentos mínimos necessários para a formalização da contratação direta, indicando que houve simulação de chamamento deserto; b) a contratada para a execução dos serviços foi constituída pouco tempo antes dos contratos (já durante a gestão do réu EDILSON), não contabilizando funcionários ou bens para a consecução dos encargos que lhe foram repassados; c) há fortes vínculos entre a contratada e os próprios servidores da Prefeitura, pateteando que foi erigida com o único e exclusivo propósito de respaldar as contratações. A respeito, pontuo que, entre os meios de prova, tendentes a informarem esse convencimento motivado do julgador, inserem-se, os indícios (na acepção de prova indireta), definidos pelo art. 239 do CPP – em conceito perfeitamente apropriável pelo processo civil – como “a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.” Sobre o tema, leciona a doutrina (DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil. v. 2. 9.ed., Salvador: Juspodivm, 2014, p. 53) 9.2.1 Indício Um fato conhecido, como causa ou efeito de outro, está a indicar este outro, de algum modo. Dada a existência deste fato conhecido, certo é que outro existiu ou existe, com grandes chances de este fato desconhecido ser o que se pretende conhecer e provar. O conhecimento de determinado fato pode ser induzido da verificação de um outro fato. Indício é, exatamente, este fato conhecido, que, por via de raciocínio, sugere o fato desconhecido (fato probando), do qual é causa ou efeito. "É o fato ou parte de fato certo, que se liga a outro fato que se tem de provar, ou a fato que, provado, dá ao indício valor re levante na convicção do juiz, como homem". Perceba que, por si só, o indício não tem qualquer valor. No entanto, como causa ou efeito de outro fato, suscita o indício uma operação por meio da qual poder-se-á chegar ao conhecimento desse outro.(...) Trata-se de mecanismo útil para a prova de fatos de difícil verificação ou ocorrência, bem como para a prova de fatos futuros, como no caso das demandas preventivas. Ações preventivas e ações de reparação por dano moral servem de exemplo. [g.n.] Constituem-se, pois, os indícios em dados objetivos, conhecidos e provados, que se prestam, mediante um raciocínio presuntivo, a confirmarem ou negarem uma asserção a respeito de um outro fato, desconhecido e a ele relacionado, que se quer provar, por interessar à decisão judicial. A partir deles, elabora-se uma presunção judicial, expressamente autorizada pelo legislador no art. 212 do Código Civil e indiscutivelmente cabível em situações de árdua verificação ou que não deixam provas diretas de sua existência, evitando-se que os julgamentos, em tais circunstâncias, redundem, fatalmente, na absolvição por ausência de provas ou, ainda, na extinção sem a derradeira resolução do mérito. Sua eficácia, como já assentou o Supremo Tribunal Federal no paradigmático julgamento do Caso Mensalão, “não é menor do que a da prova direta, tal como não é inferior a certeza racional à histórica e física” (STF, AP 470, Pleno, 2012, voto da Ministra Rosa Weber). Quanto ao cabimento da prova indiciária ou circunstancial, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, autores da obra “Novo Curso de Processo Civil, prelecionam: Inicialmente, vale ressaltar que, não raro, os únicos elementos de que dispõe o magistrado para julgar o caso que lhe é posto a exame são elementos circunstanciais, que de modo algum apontam diretamente para o fato. Várias situações não deixam provas diretas de sua existência, necessitando de um raciocínio judicial, tomado a partir de vestígios colhidos, que autorize a conclusão sobre a efetiva existência do fato ou não (...) De toda sorte, vedando-se o uso da prova indiciária e também sem se recorrer às presunções legais, corre-se o risco de sempre cair na vala comum da “absolvição de instância por falta de prova”. Embora esse recurso seja usual no processo penal – tendo ainda incidência em algumas situações do processo civil (como nas ações coletivas) –, representa ela grande demonstração de falha no desenvolvimento da atuação judicial. Carnelutti, com efeito, veementemente critica essa figura, considerando que “entende-se até que o juiz possa ter esta tentação; (…) Entre o sim e o não, o juiz, quando absolve por insuficiência de provas, confessa sua incapacidade de superar a dúvida e deixa o acusado na condição em que se encontrava antes do processo: acusado por toda a vida” (Francisco Carnelutti, Veritá, dubbio, certeza. Rivista di Diritto Processuale, vol. 20, II Série, p. 7). Apenas para deixar isso muito claro, conforme já ponderou o Excelentíssimo Ministro Cezar Peluso, havendo prova de determinado fato que, segundo a experiência, deve levar à convicção de outro fato que se infere da existência de outro, não se precisa indagar se a acusação produziu, ou não, a prova do fato que se infere do fato provado cuja prova já está feita. Se há algum fato extraordinário alegado, capaz de ilidir essa relação de constância entre os fatos, sua demonstração compete à defesa que alegue o fato extraordinário (STF AP 470/MG Pleno Voto Min. Cezar Peluso j. 28.08.12 Revista Trimestral de Jurisprudência, Volume 225, Tomo II, pág. 1.218/1.220). Noutras palavras, o ordinário se presume; extraordinário se comprova. No caso concreto, a profusão de indícios narrada pelo órgão acusador indica a existência concreta dos atos de improbidade administrativa que foram narradas na inicial, de sorte que há 2 (dois) atos de improbidade bem configurados: A frustração de licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva (L8.429/92, art. 10, VIII) e a permissão, facilitação e concorrência para que a sociedade se enriquecesse ilicitamente (L8.429/92, art. 10, XII). É integralmente procedente a demanda. 3. Análise específica da conduta do elemento subjetivo doloso Na linha do que preconiza o art. 17-C, da L8.429/92, na redação conferida pela L14.230/2021, passo a apreciar os requisitos ali desenhados: Art. 17-C. A sentença proferida nos processos a que se refere esta Lei deverá, além de observar o disposto no art. 489 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil): (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) I - indicar de modo preciso os fundamentos que demonstram os elementos a que se referem os arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, que não podem ser presumidos; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) II - considerar as consequências práticas da decisão, sempre que decidir com base em valores jurídicos abstratos; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) III - considerar os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados e das circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) Relativamente ao inc. I, do art. 17-C, da L8.429/92, indico que os elementos inventariados acima permitem concluir que o demandado EDILSON obteve recursos do FNDE (liberados durante sua gestão), repassando-os para sociedade sob seu controle indireto, a qual não possuía a mínima aptidão para a consecução do contrato. Reconheço as consequências práticas desta decisão, que apenas está selando, no campo da improbidade administrativa, condenações que já foram proclamadas pelo juízo penal na esfera diversa. Não foram alegados obstáculos ou dificuldades pelo gestor. Os valores foram repassados, justamente, para incrementar as políticas públicas a seu cargo, de forma que reconheço como presentes indícios concretos de improbidade administrativa. O dolo é evidente, diante do desvio de recursos, mediante dispensa indevida de licitação, para empresa fantasma constituída por pessoas próximas do próprio Prefeito. 4. Dosimetria Diz o art. 17, IV, da L8.429/92: Art. 17-C. A sentença proferida nos processos a que se refere esta Lei deverá, além de observar o disposto no art. 489 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil): (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) IV - considerar, para a aplicação das sanções, de forma isolada ou cumulativa: (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) a) os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) b) a natureza, a gravidade e o impacto da infração cometida; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) c) a extensão do dano causado; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) d) o proveito patrimonial obtido pelo agente; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) e) as circunstâncias agravantes ou atenuantes; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) f) a atuação do agente em minorar os prejuízos e as consequências advindas de sua conduta omissiva ou comissiva; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) g) os antecedentes do agente; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) Tendo isso em conta, reflito o dano causado foi de grande monta, girando em valores históricos em R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos). Há fortes indícios de que o réu tenha obtido proveito patrimonial com as condutas aqui narradas, considerando a triangularização que se desenvolveu com funcionários da prefeitura. Considero, da mesma sorte, especialmente grave que a malversação das verbas tenha recaído sobre valores que deveriam ter sido canalizados para a alimentação infantil. De outro norte, não há provas de que os acusados buscaram reparar ou minorar os prejuízos causados. Feitas essas considerações, averbo que as sanções cabíveis na espécie são aquelas anunciadas no art. 12, II, da L8.429/92: Art. 12. Independentemente do ressarcimento integral do dano patrimonial, se efetivo, e das sanções penais comuns e de responsabilidade, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) II - na hipótese do art. 10 desta Lei, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos até 12 (doze) anos, pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano e proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a 12 (doze) anos; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) Tangente ao dano ao erário, disciplina o art. 1º-F, da L9.494/97, na redação dada pela L11.960/09: Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. (Redação dada pela Lei nº 11.960/2009) Sob essa perspectiva, pela redação legal, deveriam incidir sobre as parcelas vencidas e devidas à Fazenda Pública a correção monetária pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR, Taxa Referencial), além de juros de mora simples no mesmo percentual que é remunerado na poupança (0,5% a.m / 6% a.a). Sucede que esse dispositivo foi alvo de controle abstrato pela Suprema Corte que compreendeu o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (art. 5º, XXII, da CF/88), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina (STF. Plenário. RE 870947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20/9/2017 repercussão geral, veiculado no Informativo 878). Logo, o STF, embora mantendo a validade dos juros de mora aplicáveis, entendeu que a indexação monetária pela TR reflete uma restrição desproporcional ao direito de propriedade (porquanto o critério é aferido ex ante, sem qualquer vinculação com o efeito corrosivo derivado da inflação). Resumindo, entendeu-se pela inconstitucionalidade do disposto no art. 1º-F, da L9.494/97, na redação dada pela L11.960/09, na parcela em que disciplina a indexação monetária pelos critérios que remuneram a poupança, mantendo-se íntegro, contudo, o dispositivo, na parcela em que se refere às balizas de juros moratórios. Curvando-se à compreensão da Suprema Corte, o Superior Tribunal de Justiça pronunciou-se sobre os critérios de indexação monetária que deveriam substituir a TR, deliberando, em sede de recursos repetitivos, que: As condenações judiciais de natureza administrativa em geral, sujeitam-se aos seguintes encargos: a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei nº 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; c) no período posterior à vigência da Lei nº 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E (STJ. 1ª Seção. REsp 1.495.146-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/02/2018 (recurso repetitivo) (Info 620). Sistematizando: CONDENAÇÕES JUDICIAIS DE NATUREZA ADMINISTRATIVA EM GERAL PERÍODOS ENCARGOS Até dezembro/2002 Juros de mora: 0,5% ao mês. Correção monetária: de acordo com o Manual de Cálculos da JF. Depois do CC/2002 e antes da L11.960/2009 Aplica-se apenas a taxa SELIC, vedada a cumulação com qualquer outro índice (isso porque a SELIC inclui juros e correção). Depois da vigência da L11.960/2009 Juros de mora: índice de remuneração da caderneta de poupança. Correção monetária: IPCA-E Concretamente, como os débitos investigados no presente procedimento tiveram origem após a vigência da L11.960/2009, serão eles corrigidos pelos juros de remuneração de caderneta de poupança (0,5% a.m; 6,0% a.a), com a indexação monetária operada pelo IPCA-e, cujo termo inicial de fluência será o mês imediatamente subsequente (data dos pagamentos), porquanto, a meu ver, cuida-se de responsabilidade extracontratual/aquiliana, na forma do art. 398, do CC e da Súmula 54, do STJ. Esses índices fluem até o advento da EC 113/2021 (08/12/2021), momento a partir do qual incide o art. 3º, do referido diploma, o qual preconiza que: Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. Eis, portanto, as balizas para o cálculo: • Valor total repassado à sociedade empresária TOP ASM COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA de R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos); • Data inicial da fluência de juros e da correção monetária: dezembro/2015 (data do último pagamento); A indenização fixada deverá ser revertida em favor do FNDE, enquanto canalizo a multa civil em proveito do Município de Porto de Moz/PA, o qual foi o principal lesado pelas condutas ímprobas aqui narradas. Finalmente, também aplico ao réu EDILSON CARDOSO DE LIMA a suspensão dos direitos políticos até 12 (doze) anos, diante da gravidade das condutas, indicando uma desonestidade ímpar e necessidade de afastamento da vida pública. Ambos os réus ficam proibidos de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a 12 (doze) anos; Dispositivo. ANTE O EXPOSTO, na forma da fundamentação, ratifico a decisão de urgência proferida, rejeito as preliminares invocadas e, no mérito (CPC, art. 487, I), julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para o efeito de condenar EDILSON CARDOSO DE LIMA e TOP ASM COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA como incursos no art. 10, VII e XII, da L8.429/92 (na redação dada pela L14.230/2021) e, por via de consequência, condeno-os às penas do art. 12, II, da L8.429/92 assim fixadas: a) reparação de danos ao erário no importe de de R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos), valor que deverá ser revertido em favor do FNDE e corrigido na forma da fundamentação; b) multa civil equivalente ao valor do dano ao erário no importe de R$ 1.248.883,30 (um milhão duzentos e quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta centavos), valor que deverá ser revertido em favor do Município de Porto de Moz/PA Pontuo que, na multa civil prevista na L8.429/1992, a correção monetária e os juros de mora devem incidir a partir da data do ato ímprobo, nos termos das Súmulas 43 e 54/STJ" (STJ, REsp n. 1.942.196/PR, relator Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, julgado em 12/3/2025, DJEN de 7/4/2025), de forma que posiciono o termo a quo da fluência dos índices corretivos (idênticos àqueles adotados para a reparação de danos ao erário), o marco de dezembro/2015 (data da última liberação de recursos). c) proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo máximo superior a 12 (doze) anos; d) suspensão de direitos políticos ao réu EDILSON CARDOSO DE LIMA, pelo prazo máximo de 12 (doze) anos; Sem custas e honorários advocatícios (L8.429/92, art. 23-B). Espécie não sujeita a reexame necessário (L8.429/92, art. 17-C, § 3º). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transitado em julgado, intimem-se o FNDE e o MUNICÍPIO DE PORTO DE MOZ/PA para que promovam o cumprimento de sentença (L8.429/92, art. 18, §2º). Não havendo manifestação dentro do prazo de 6 (seis) meses, diga o MPF sobre a satisfação do julgado (L8.429/92, art. 18, §3º). Incluam-se, também, os nomes dos réus no Cadastro Nacional de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade Administrativa e Inelegibilidade, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Altamira/PA, 14 de julho de 2025. PABLO KIPPER AGUILAR Juiz Federal
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