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Simone Regina De Souza Kapi…
OAB/SP 205.337
SIMONE REGINA DE SOUZA KAPITANGO A SAMBA consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça como advogado.
A. M. D. A. A. S.
Envolvido
A. M. D. A. A. S. consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça.
ID: 305721413
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de Dourados
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5002693-43.2024.4.03.6002
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANDERSON ALVES DE OLIVEIRA
OAB/SP XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5002693-43.2024.4.03.6002 / 2ª Vara Federal de Dourados AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/MS REU: WEIDER ROMAS LEPOS CORREIA Advogado do(a) REU: ANDE…
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Processo nº 5000074-28.2025.4.03.6125
ID: 260750065
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Federal de Ourinhos
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5000074-28.2025.4.03.6125
Data de Disponibilização:
25/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RAMON COSTA PACHECO
OAB/ES XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5000074-28.2025.4.03.6125 / 1ª Vara Federal de Ourinhos AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, POLÍCIA FEDERAL - SR/PF/SP REU: ROXANA ROMERO MERCADO A…
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5000074-28.2025.4.03.6125 / 1ª Vara Federal de Ourinhos AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, POLÍCIA FEDERAL - SR/PF/SP REU: ROXANA ROMERO MERCADO Advogados do(a) REU: RAMON COSTA PACHECO - ES34392, TATIANE PEREIRA DA SILVA - SP373153 S E N T E N Ç A I – RELATÓRIO. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, com base no Inquérito Policial nº 2025.0011543-DPF/MII/SP, ofereceu denúncia contra ROXANA ROMERO MERCADO, devidamente qualificada na denúncia, atualmente recolhida junto à Penitenciária Feminina de Sant’ana/SP, tendo-a como incursa nas sanções do artigo 33, caput, c/c o artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/06, na forma do artigo 29 do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso, assim narrado na inicial acusatória (id. 355576688): No dia 4 de fevereiro de 2025, por volta das 12h18min, no km 414 da rodovia SP 270, na altura do município de Palmital/SP, local de formalização da respectiva prisão em flagrante, CAROLINA MENDEZ MENDOZA e ROXANA ROMERO MERCADO, dolosamente e cientes da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, transportaram, sem autorização legal ou regulamentar, 1,991 kg (um quilo e novecentos e noventa e um gramas) e 1,929 kg (um quilo e novecentos e vinte e nove gramas), respectivamente - totalizando 3,920 kg (três quilos e novecentos e vinte gramas) - da substância vulgarmente conhecida como cocaína, cuja origem aponta a transnacionalidade do delito. Nas circunstâncias de tempo e espaço acima descritas, policiais militares rodoviários, em fiscalização de rotina, deram ordem de parada a um ônibus que fazia a linha Puerto Suarez/BO - Rio de Janeiro/RJ e trafegava pela via no sentido capital. Formalizada a abordagem, foram identificados 56 passageiros de nacionalidade boliviana no salão do ônibus. Durante as entrevistas, a passageiras da poltrona nº 37, identificada com CAROLINA MENDEZ MENDOZA, chamou os policiais à atenção, pois disse que era a primeira vez que vinha ao Brasil, mas não soube dizer exatamente aonde iria e o que faria, limitando-se a dizer que iria a São Paulo/SP. Em prosseguimento à diligência, ROXANA ROMERO MERCADO, que viajava sentada na poltrona nº 16, foi abordada, sendo que apresentou versões desencontradas sobre o motivo da viagem, além de informar que não despachou nenhuma mala no respectivo bagageiro do ônibus. Na mochila de CAROLINA MENDEZ MENDOZA foram encontrados dois volumes contendo substância com características de cocaína, que foram imediatamente apreendidas. Os policiais também vistoriaram o bagageiro do ônibus e verificaram que a bagagem sob responsabilidade de CAROLINA MENDEZ MENDOZA tratava-se de um carrinho de mão, o qual aparentava ter um peso além do normal. Ao desmontar o carrinho, os policiais encontraram, escondidos dentro de um pneu, outros dois volumes contendo substância com características de cocaína. Quanto a ROXANA ROMERO MERCADO, apesar de ter informado aos policiais que supostamente não transportava nenhuma bagagem no bagageiro do ônibus, após consulta ao mapa de bagagens fornecido pelo motorista, os policiais confirmaram a existência de uma bagagem em seu nome, a qual se tratava também de um carrinho de mão, que estava armazenado dentro de uma sacola. Após vistoria, os policiais encontraram, também nos pneus deste carrinho de mão, dois volumes contendo substância com características de cocaína. Por fim, realizada revista pessoal em ROXANA ROMERO MERCADO, foram encontrados, junto ao seu peito e inseridos em sua genitália, dois volumes contendo substância com características de cocaína. Questionadas sobre as drogas, CAROLINA MENDEZ MENDOZA e ROXANA ROMERO MERCADO, ambas bolivianas, admitiram que estavam viajando juntas e que foram contratadas em Corumbá/MS (fronteira com Porto Quijarro/BO), para transportar a droga até São Paulo/SP, serviço pelo qual cada uma receberia R$ 1.000,00. Os volumes de droga foram pesados, totalizando 3,920 kg (três quilos e novecentos e vinte gramas). Desse total, 1,991 kg (um quilo e novecentos e noventa e um gramas) do entorpecente estava acondicionado 4 volumes apreendidas em poder de CAROLINA MENDEZ MENDOZA, enquanto 1,929 kg (um quilo e novecentos e vinte e nove gramas) estavam em poder de ROXANA ROMERO MERCADO em 4 volumes. Submetida a exames periciais preliminar e definitivo de constatação, confirmou-se se tratar de cocaína, substância proscrita no Brasil, nos termos da Lista F1 da Portaria nº 344, de 12 de março de 1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, conforme republicação no Diário Oficial da União em 1-2-1999 e atualizações posteriores. A materialidade delitiva e a respectiva autoria estão suficientemente demonstradas pelos seguintes elementos de informação: (a) auto de prisão em flagrante, com destaque para os depoimentos prestados pelos policiais militares rodoviários e os interrogatórios dos indiciados (id. 352773276, p. 4-7, 8-9 e 22-23); (b) termo de apreensão (id. 352773276, p. 44-45); (c) laudos de constatação (id. 352773276 - p. 56-61; e id. 352783726) e definitivos (id. 355369096, p. 9-12 e 17-20) das drogas que eram transportadas por cada uma das indiciados. [...] A ré foi presa em flagrante no dia 04.02.2025, na praça de pedágio de Palmital/SP, no km 414 da rodovia SP 270, por Policiais Militares Rodoviários, e conduzida à Delegacia de Polícia Federal de Marília/SP, para a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante (id. 352773276, p. 1). A autoridade policial representou pela quebra do sigilo de dados telefônicos dos aparelhos celulares apreendidos e pela destruição da droga apreendida (id. 352773276, p. 52). O MPF representou pela segregação cautelar e pelo deferimento de acesso, extração e análise do conteúdo dos telefones, bem como pela autorização de destruição da droga (id. 352862946). Realizada audiência de custódia no dia 05.02.2025, ocasião em que foi homologada a prisão em flagrante das rés, convertendo-se em preventiva a prisão da custodiada ROXANA. A ré CAROLINA foi posta em liberdade mediante o cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão (id. 352929176). Na mesma decisão, foi autorizado o pedido de quebra de sigilo dos registros telefônicos e de incineração do entorpecente, bem como a realização de exame de gravidez quanto à presa ROXANA, que o autorizou em audiência. O Consulado da Bolívia em São Paulo/SP foi comunicado da prisão em flagrante (id. 352773276, p. 59) e da decretação da prisão preventiva da ré ROXANA (id. 353235801). Juntada informação dando conta do resultado negativo do exame de gravidez requisitado pelo Juízo por ocasião da audiência de custódia (id. 353799518) Oferecida denúncia (id. 355576688), a acusada ROXANA foi notificada para apresentação de defesa preliminar (id. 356556976), tendo-lhe sido nomeada defensora dativa ante a declaração da ré de não ter condições de contratar advogado (id. 356710199). Frustrada a tentativa de notificação da ré CAROLINA (id. 356102517). O MPF manifestou-se pela revogação da prisão domiciliar da ré CAROLINA (id. 357188867). Decretada a prisão preventiva da ré CAROLINA (id. 357206282). A defesa preliminar de que trata o artigo 55 e §§ da Lei nº 11.343/06 foi apresentada pela defensora dativa nomeada pelo juízo, que não arguiu preliminares e reservou-se a provar a inocência da ré durante a instrução processual (id. 357336788). Em decisão datada de 24.03.2025, foi (a) recebida a denúncia após análise das provas de materialidade e dos indícios de autoria, e verificada a ausência de causas manifestas de exclusão de ilicitude e de culpabilidade e, ainda, de extinção da punibilidade; (b) designado o dia 23.04.2025 para a audiência de instrução e julgamento; (c) determinada a citação da ré com a determinação de sua participação na audiência por meio de tele audiência com o estabelecimento prisional em que se encontra reclusa, por meio da plataforma Microsoft Teams, conforme autorizado pelo artigo 6º da Resolução CNJ n. 354, de 18.11.2020; (d) determinada diligência visando à nomeação de intérprete para atuar no ato; e (e) determinado o desmembramento do feito quanto à ré CAROLINA (id. 357657506). Foram atualizadas as certidões de antecedentes da ré ROXANA (id. 359776479 e id. 359779882). Em audiência realizada em 23.04.2025, foram ouvidas as testemunhas de acusação Rodolfo Lopes e Márcio Alves Perez (id. 361519315, id. 361519317 e id. 361519324). Não foram arroladas testemunhas pela defesa. A ré foi interrogada (id. 361520565, id. 361520570 e id. 361520575), fazendo-se acompanhar no ato de defensor constituído, ao qual se facultou prévia entrevista com a acusada. As partes não requereram diligências, apresentando alegações orais em audiência. O Ministério público Federal pediu a procedência da denúncia, com a condenação da ré ROXANA ROMERO MERCADO como incursa nas sanções do artigo 33, caput, c/c o artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06. Referiu que houve justa causa para a abordagem realizada pelos Policiais, eis que a acusada apresentou nervosismo e prestou informações desencontradas sobre a viagem, encontrando-se em rota de tráfico conhecida como “rota caipira” de internalização de drogas, em que há prisões corriqueiras de nacionais da Bolívia. Passando a dosimetria da pena, manifestou-se pela exasperação da pena base, em razão da qualidade e da quantidade da droga, assim como pela aplicação da majorante de tráfico internacional, prevista no art. 40, I, da Lei nº 11.343/06 (id. 361520575). A defesa, por sua vez, defendeu a ausência de justa causa para abordagem e revista pessoal da acusada, que teria se baseado em critérios estritamente subjetivos (ut primeira viagem ao Brasil, nervosismo e nacionalidade Boliviana). Afirmou que não há prova de internalização da droga, sendo insuficiente, para tanto, o itinerário da viagem e a nacionalidade da ré. Por fim, referiu ser a ré primária e ter bons antecedentes, sendo-lhe aplicável a minorante do § 4º do artigo 33 da Lei de Drogas, que deve ser aplicada em seu grau máximo. Por fim, postulou que se possibilite a ré recorrer em liberdade (id. 361520575). Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO. 1. (I)legalidade da abordagem policial. A defesa alega a ilegalidade da abordagem policial e da consequente apreensão da droga, sob o fundamento de que a busca pessoal se baseou em critérios estritamente subjetivos, a saber, primeira viagem da acusada, nervosismo e nacionalidade boliviana, fatos que, por si só, não justificariam a diligência. Não assiste razão à alegação de ausência de justa causa para a abordagem realizada pelos Policiais Militares Rodoviários. Conforme consta dos autos, a ação policial se deu no contexto de inspeção de rotina em transporte coletivo que transitava por rota reconhecida como utilizada para o tráfico internacional de entorpecentes, comumente denominada “rota caipira”. No caso concreto, os agentes de segurança, no exercício regular de suas funções, depararam-se com a acusada, que apresentou informações desencontradas acerca do itinerário da viagem, além de demonstrar visível estado de nervosismo. Tais circunstâncias, consideradas em seu conjunto, são suficientes para configurar a fundada suspeita exigida pelos artigos 240 a 244 do Código de Processo Penal, autorizando, assim, a realização de busca pessoal sem a necessidade de prévia autorização judicial. Não bastasse isso, segundo já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no HC n. 625.274/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 17/10/2023, DJe de 20/10/2023, a busca pessoal por razões de segurança (inspeção de segurança), que ocorre rotineiramente em aeroportos, rodoviárias, prédios públicos, eventos festivos, ou seja, locais em que há grande circulação de pessoas e, em consequência, necessidade de zelar pela integridade física dos usuários, bem como pela segurança dos serviços e instalações, não exige fundada suspeita, in verbis: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. PRELIMINAR DE NULIDADE. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 240, § 2.º, E 244, AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DROGAS ENCONTRADAS NAS BAGAGENS DE PASSAGEIROS DO ÔNIBUS VISTORIADAS PELA POLÍCIA RODOVIÁRIA, EM FISCALIZAÇÃO DE ROTINA. INSPEÇÃO DE SEGURANÇA QUE NÃO SE CONFUNDE COM BUSCA PESSOAL (NATUREZA PROCESSUAL PENAL). LEGÍTIMO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA. LICITUDE DAS PROVAS OBTIDAS. DOSIMETRIA. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA. QUANTIDADE E NATUREZA DAS DROGAS APREENDIDAS. CIRCUNSTÂNCIAS QUE, POR SI SÓS, NÃO PERMITEM AFERIR A DEDICAÇÃO DO ACUSADO À ATIVIDADE CRIMINOSA. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. CABÍVEL O SEMIABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR SANÇÕES RESTRITIVAS DE DIREITOS. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. ORDEM DE HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. A partir do julgamento do RHC n.º 158580/BA, da relatoria do Ministro Rogério Schietti Cruz, a Sexta Turma aprofundou a compreensão acerca do instituto da busca pessoal, analisando de forma exaustiva os requisitos do art. 244 do Código de Processo Penal. A análise do caso concreto revela a necessidade de se atentar para a distinção existente entre a busca pessoal prevista na lei processual penal e outros procedimentos que não possuem a mesma natureza, os quais, a rigor, não exigem a presença de "fundada suspeita". 2. A denominada "busca pessoal por razões de segurança" ou "inspeção de segurança", ocorre rotineiramente em aeroportos, rodoviárias, prédios públicos, eventos festivos, ou seja, locais em que há grande circulação de pessoas e, em consequência, necessidade de zelar pela integridade física dos usuários, bem como pela segurança dos serviços e instalações. 3. Embora a inspeção de segurança também envolva restrição a direito fundamental e possa ser alvo de controle judicial a posteriori, a fim de averiguar a proporcionalidade da medida e a sua realização sem exposição vexatória, o principal ponto de distinção em relação à busca de natureza penal é a faculdade que o indivíduo tem de se sujeitar a ela ou não. Em outras palavras, há um aspecto de contratualidade, pois a recusa a se submeter à inspeção apenas irá obstar o acesso ao serviço ou transporte coletivo, funcionando como uma medida de segurança dissuasória da prática de ilícitos. Doutrina. 4. A título exemplificativo, destaco que a inspeção de segurança em aeroportos decorre de cumprimento de diretriz internacional, prevista no Anexo 17 da Convenção da Organização Internacional de Aviação Civil (OACI), da qual o Brasil é signatário. O Decreto n.º 11.195/22 regulamenta a questão e prevê expressamente que a inspeção de passageiros e bagagens é de responsabilidade do operador de aeródromo, sob supervisão da Polícia Federal (art. 81). Ou seja, delega-se essa possibilidade ao agente privado, sendo a atuação policial também prevista, de forma subsidiária e complementar. 5. Nesse contexto, se a busca ou inspeção de segurança- em espaços e transporte coletivos - pode ser realizada por agentes privados incumbidos da segurança, com mais razão pode - e deve - ser realizada por agentes públicos que estejam atuando no mesmo contexto, sem prejuízo do controle judicial a posteriori acerca da proporcionalidade da medida, em ambos os casos. 6. O contexto que legitima a inspeção de segurança em espaços e meios de transporte de uso coletivo é absolutamente distinto daquele que ampara a realização da busca pessoal para fins penais, na qual há que se observar a necessária referibilidade da medida (fundada suspeita de posse de objetos ilícitos), conforme já muito bem tratado no referido RHC n.º 158.580/BA, da relatoria do Ministro Rogerio Schietti Cruz. 7. No caso concreto, policiais rodoviários federais, em fiscalização na Rodovia Castelo Branco, abordaram ônibus que fazia o trajeto de Dourados-MS para São Paulo-SP. A inspeção teve início a partir dos passageiros que se situavam no final do veículo, momento em que selecionaram para inspeção aleatória de bagagem a Paciente e o adolescente que viajava ao seu lado. 8. Os agentes públicos acrescentaram que a seleção se deu a partir de análise comportamental (nervosimo visível e troca de olhares entre um adolescente viajando sozinho e outra passageira que afirmou não conhecer). Afirmaram ainda que informaram à Paciente quanto ao direito de permanecer em silêncio e, em seguida, iniciaram a vistoria das bagagens, localizando cerca de 30kg de maconha, divididos em tabletes, tanto nos pertences da Paciente, como nos do adolescente que viajava ao seu lado, embalados da mesma forma. 9. Assim, forçoso concluir que a inspeção de segurança nas bagagens dos passageiros do ônibus, em fiscalização de rotina realizada pela Polícia Rodoviária Federal, teve natureza administrativa, ou seja, não se deu como busca pessoal de natureza processual penal e, portanto, prescindiria de fundada suspeita. Dito de outro modo, se a bagagem dos passageiros poderia ser submetida à inspeção aleatória na rodoviária ou em um aeroporto, passando por um raio-X ou inspeção manual detalhada, sem qualquer prévia indicação de suspeita, por exemplo, não há razão para questionar a legalidade da vistoria feita pelos policiais rodoviários federais, que atuaram no contexto fático de típica inspeção de segurança em transporte coletivo. 10. Ainda que assim não se entenda, penso que a busca do caso concreto também seria capaz de preencher os requisitos do art. 244 do Código de Processo Penal. Com efeito, penso que se pode ter por fundada a suspeita que decorre da troca de olhares nervosos entre um adolescente viajando sozinho e uma outra passageira que afirmou desconhecer, sobretudo quando se considera que o ônibus partiu de localidade conhecida como um dos mais relevantes pontos de entrada e distribuição de drogas no país (NUNES, MARIA. Dinâmicas Transfronteiriças e o avanço da violência na fronteira sul-mato-grossense. Disponível em: https://repositorio. ipea.gov.br/bitstream/11058/7934/1/BRU_n16_Dinamicas.pdf. Acessado em: 01/10/2023). 11. Quanto à dosimetria, não há fundamentação idônea para afastar a incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/2006, tendo em vista que somente se fez menção à quantidade de entorpecente, já utilizada para majorar a pena-base, o que contraria o entendimento da Terceira Seção a respeito do tema (HC n. 725.534/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2022, DJe 1.º/06/2022; sem grifos no original.) 12. Considerando o quantum de pena estabelecido, a primariedade da Condenada e a fixação da pena-base aci ma do mínimo legal, ante a presença de circunstância judicial desfavorável, mostra-se cabível o estabelecimento do regime inicial semiaberto, conforme o disposto no art. 33, § 2.º, alínea b, e § 3.º, do Código Penal. Precedentes. 13. Com relação ao pedido de substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos, salienta-se que "[n]ão há como determinar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, por ausência de cumprimento do requisito subjetivo (circunstância judicial desfavorável, com a fixação da pena-base acima do mínimo legal - art. 44, III, do Código Penal). (AgRg no AREsp 1058790/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2018, DJe 09/08/2018)". (AgRg no HC 527.992/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/12/2019, DJe 09/12/2019.) 14. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida para, reformando o acórdão impugnado e a sentença condenatória, reduzir as sanções da Paciente para 02 (dois) anos, 05 (cinco) meses e 19 (dezenove) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e 247 (duzentos e quarenta e sete) dias-multa, no mínimo legal. (HC n. 625.274/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 17/10/2023, DJe de 20/10/2023., sem grifos no original) Repilo, nesses termos, a alegação de nulidade da atuação policial. 2. Materialidade. A materialidade delitiva restou comprovada por meio dos seguintes documentos: (a) Auto de Prisão em Flagrante (id. 352773276), contendo os depoimentos do condutor Rodolfo Lopes e da testemunha Márcio Alvez Perez e termo de qualificação e interrogatório da ré ROXANA (ID. 352773276, pp. 1/9); (b) bilhetes de passagem rodoviária e de embarque em nome da ré ROXANA ROMERO MERCADO, documento 12664642, emitidos em 03/02/2025 pela Empresa de Transportes Andorinha, com endereço na Av. Simon Bolivar S/N, Arroyo Conception, em Santa Cruz, na Bolívia, BO, referente ao trajeto Rio de Janeiro (RJ) x Puerto Suarez, com origem de embarque em Porto Suarez na Bolívia, BO, e destino rodoviário à cidade de São Paulo - Terminal Rodoviário de Barra Funda (id. 352773276, p. 22); (c) Termo de Apreensão nº 430336/2025 - IPL 2025.0011543-DPF/MII/SP, elencando que foram apreendidos na posse da acusada ROXANA (i) 503 (quinhentos e três)g de Cocaína sal (cloridrato ou pó), acondicionado em Lacre D 00216569; (ii) 1426 (um mil quatrocentos e vinte e seis)g de Cocaína em forma de base livre (crack, merla, pasta base e similares), Lacre D 00216569; e (iii) 01 Celular Smartphone, TECNO SPARK 8C - KG5j - lacre B0002269759 (id. 352773276, p. 44); (d) Laudo de Perícia Criminal Federal nº 033/2025 (Preliminar de Constatação), elaborado em 04.02.2025, relatando que ao Perito Criminal foram apresentados “04 (quatro) invólucros, sendo que 02 (dois) deles continham em seu interior substância em pó, na cor branca, com cheiro e aparência que indicam suspeita de ser cocaína em forma sal, e os outros 02 (dois) continham substância compactada, na cor beje, com cheiro e aparência que indicam suspeita de ser cocaína em forma de pasta base. [...] O material apresentava a massa bruta1 de 503 g (quinhentos e três gramas) de substância suspeita de ser cocaína em forma de sal e 1.426 g (um mil quatrocentos e vinte seis gramas) de substância suspeita de ser cocaína em forma de pasta base. Na Figura 1, a seguir, observa-se o material apreendido[...]. Foram retiradas 04 (quatro) amostras para fins de exame definitivo e contraprova, sendo 02 (duas) amostras de cada tipo substância totalizando a massa líquida de 4,25 g (quatro gramas e vinte e cinco centigramas) – cocaína em forma de sal e 4,87 g (quatro gramas e oitenta e sete centigramas) – cocaína em forma de pasta base. Foi feita retirada de amostras das substâncias e submetidas ao teste de Scott (específico para exame preliminar de cocaína), fornecendo resultado POSITIVO para a presença de COCAÍNA, em ambas substâncias, constante em Lista de Substâncias Psicotrópicas de uso proscrito no Brasil [...] (id. 352773276, pp. 56/58); (e) Laudo de Perícia Criminal Federal nº 508/2025 (Química Forense), de acordo com o qual foram realizadas análises em 04 (quatro) amostras do material apreendido em poder da ré ROXANA, contendo em seu interior sólidos suspeitos de cor branca (02 embalagens plásticas transparentes) e sólidos suspeitos de cor bege (02 embalagens plásticas transparentes). Quanto às características da substância analisada, o perito concluiu que os exames realizados no material resultaram positivos para COCAÍNA, que se apresentava na forma de sal nas amostras do item A (brancas) e como base nas amostras do item B (beges). Em resposta aos quesitos sobre a dependência e a presença da substância em listas da ANVISA, o perito afirmou que "a Cocaína está relacionada na atualização vigente da Lista de Substâncias Entorpecentes (Lista F1) de uso proscrito no Brasil, sendo considerada capaz de causar dependência física ou psíquica, em conformidade com a Portaria nº 344-SVS/MS, de 12.05.98, republicada no D.O.U. de 01.02.99”. (id. 355369096, pp. 17/20); (f) Depoimentos prestados pelas testemunhas de acusação e pelo interrogatório da ré em Juízo (acostados à certidão de id. 361519304). 3. Autoria. A certeza da autoria delitiva deriva notadamente da própria prisão em flagrante da ré. Conforme já relatado, a acusada ROXANA ROMERO MERCADO foi presa em flagrante no dia 04 de fevereiro de 2025, por volta das 12h18min, quando se encontrava a bordo de um ônibus da Viação Andorinha, que fazia o trajeto Puerto Suarez/BO – Rio de Janeiro/RJ. A abordagem foi realizada na praça de pedágio de Palmital/SP, localizada no quilômetro 414 da Rodovia SP-270, ocasião em que foram encontrados em sua posse aproximadamente 1,929 kg (um quilo e novecentos e vinte e nove gramas) de cocaína, ocultos no interior dos pneus de um carrinho de mão e também acondicionados junto ao seu peito e região genital. Em seu interrogatório judicial, ROXANA confirmou os fatos, disse que foi levada por um Senhor até a cidade de Corumbá/MS, local em que conheceu a corré CAROLINA, o qual pediu que trouxessem a droga até São Paulo, sendo que, por esse encargo, receberia a quantia de R$ 1.000,00 (id. 361520570). Os Policiais Militares Rodoviários que participaram da abordagem à ré declararam, em síntese (id. 361519315 e id. 361519317), que geralmente costumam parar os veículos coletivos estrangeiros para fiscalização. E, no caso, ROXANA viajava sentada na poltrona nº 16, ao ser abordada, apresentou versões desencontradas sobre o motivo da viagem, além de informar que não tinha despachado nenhuma mala no respectivo bagageiro do ônibus. Todavia, após consulta ao mapa de bagagens fornecido pelo motorista, os policiais confirmaram a existência de uma bagagem em seu nome, a qual se tratava de um carrinho de mão, que estava armazenado dentro de uma sacola. Ao vistoriá-lo, os policiais encontraram nos pneus deste carrinho de mão dois volumes contendo substância com características de cocaína. Já, em revista pessoal realizada em ROXANA foram encontrados, junto ao seu peito e inseridos em sua genitália, dois volumes contendo substância com características de cocaína. Não há dúvidas, portanto, acerca da autoria delitiva. 4. Conduta e adequação típica. De acordo com a denúncia, no dia 04.02.2025, por volta das 12h18min, no km 414 da rodovia SP 270, a acusada ROXANA ROMERO MERCADO transportou, sem autorização legal ou regulamentar, 1,929 kg (um quilo e novecentos e vinte e nove gramas) da substância vulgarmente conhecida como cocaína, cuja origem aponta a transnacionalidade do delito. De fato, a abordagem se deu durante fiscalização de rotina realizada por Policiais Militares Rodoviários em ônibus da empresa Viação Andorinha, que faz o trajeto internacional Puerto Suarez (BO) x Rio de Janeiro (RJ), quando trafegava pela via no sentido da Capital Paulista. Com a ré foram apreendidos bilhete de passagem e bilhete de embarque, emitidos, respectivamente, em 03/02/2025, constando como origem de embarque a província de Porto Suarez na Bolívia, BO (id. 352773276, p. 21): A substância entorpecente, conforme indicam as circunstâncias da prisão e o itinerário percorrido, teve origem na Bolívia, país fronteiriço, e seria transportada até o estado de São Paulo, caracterizando, portanto, o tráfico transnacional de drogas, nos termos do art. 33, §1º, inciso I, c/c o art. 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006. A transnacionalidade do delito é evidenciada não apenas pelo ponto de partida do transporte — cidade boliviana de Puerto Suárez — como também pela escolha de rota terrestre que atravessa diversos estados brasileiros, confirmando o intento de internalizar e redistribuir a droga em território nacional. A natureza da substância apreendida também corrobora a transnacionalidade do delito, uma vez que o Brasil não é um país com expertise na produção de cocaína, mas sim tradicionalmente reconhecido como território de trânsito e distribuição no contexto do tráfico internacional de entorpecentes. A cocaína é produzida, em regra, em países da região andina, como Bolívia, Peru e Colômbia, sendo posteriormente transportada por rotas terrestres ou aéreas até centros urbanos brasileiros, de onde segue para o mercado consumidor interno ou para o exterior. No mais a abordagem policial restou confirmada em juízo e a ré confessou espontaneamente os fatos. Outrossim, ainda que a droga tivesse sido supostamente recebida em Corumbá/MS, é firme o entendimento jurisprudencial que admite o reconhecimento da majorante da transnacionalidade do tráfico de drogas quando as circunstâncias do caso concreto evidenciam a origem estrangeira da substância ilícita, ainda que não haja prova direta da transposição de fronteiras. Os artigos 33, caput, e 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, nos quais se encontra incursa a ré, dispõem o seguinte: Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito; [...] O delito do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06 é de ação múltipla, bastando que o agente pratique um dos verbos nucleares nele descritos para que esteja caracterizado o ilícito. Por sua vez, para que tenha incidência a majorante da transnacionalidade do artigo 40, inciso I, da Lei nº 11. 343/06, é preciso que o sujeito tenha conhecimento sobre a origem forânea do entorpecente ou que tenha a possibilidade de alcançar este conhecimento. No caso, restou evidenciado que a ré realizou o transporte da droga escondida nos pneus de um carrinho de mão localizado no compartimento de bagagens do ônibus que viajava e acondicionada no próprio corpo. Transportar consiste em levar a droga de um lugar para outro. E, por ser um crime permanente, a sua consumação se protraiu no tempo, tendo sido interrompida apenas com a prisão em flagrante da ré. O elemento subjetivo do tipo é o dolo genérico e consistente na vontade livre e consciente de transportar substância entorpecente em desacordo com determinação legal ou regulamentar, o qual restou claramente evidenciado nos autos. A própria acusada confessou a prática delitiva, admitindo que transportava a substância entorpecente, o que corrobora o juízo de certeza quanto à sua atuação dolosa. Além disso, o modo de transporte da droga — parte oculta junto ao corpo da ré, nas regiões do peito e da genitália, e parte acondicionada de forma dissimulada nos pneus de um carrinho de mão despachado como bagagem — reforça o caráter deliberado de sua conduta, evidenciando que não se tratava de ato impensado ou alheio à sua vontade. Trata-se, portanto, de ação executada com plena consciência da ilicitude e da finalidade de inserção da droga no território nacional, sendo absolutamente inviável qualquer alegação de erro de tipo, coação ou desconhecimento. A ocultação da droga e o contexto da abordagem em transporte internacional consolidam o entendimento de que a ré assumiu voluntariamente os riscos da conduta típica, o que configura de forma inequívoca o dolo na prática do crime de tráfico de drogas. Satisfeito, portanto, o elemento subjetivo do tipo, consistente na vontade livre e consciente de transportar substância entorpecente em desacordo com as normas legais e regulamentares, cuja procedência estrangeira era pela ré conhecida. Verificada, portanto, a tipicidade objetiva e subjetiva da conduta. Noutro aspecto, não incide no caso qualquer causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade diante da alegação apresentada em juízo no sentido de que a ré aceitou realizar o transporte mediante pagamento porque precisava de dinheiro. Isso porque, eventuais dificuldades financeiras do agente não servem para respaldar a prática criminosa, não caracterizando estado de necessidade ou inexigibilidade de conduta diversa, e tampouco justificam o abrandamento da pena também. Dito isso, comprovada a materialidade e a autoria delitivas e constatada a tipicidade objetiva e subjetiva da conduta, e não existindo causas que excluam o crime ou isentem a ré de pena, a procedência da ação penal se impõe com a condenação de ROXANA ROMERO MERCADO às penas do artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06. 5. Da aplicação das penas. 5.1. Da individualização da pena privativa de liberdade. Atendendo à garantia constitucional da individualização da pena (art. 5º, XLVI), passo à cominação da reprimenda, seguindo o método trifásico previsto no art. 68 do Código Penal, sopesando a necessidade e suficiência para reprovação e prevenção dos crimes praticados (art. 59 do Código Penal c/c art. 42 da Lei 11.343/06). A pena prevista para a infração capitulada no artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 está compreendida entre 05 (cinco) e 15 (quinze) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. 1ª Fase, pena-base (artigos 59, CP e 42 da Lei 11.343/2006). A culpabilidade é normal à espécie delitiva. A acusada não registra antecedentes criminais certificados nos autos (documentos anexos às certidões de id. 359776479 e id. 359779882). Não existem elementos que retratem a conduta social e a personalidade da ré. Sobre os motivos do crime, nada em seu desfavor. No que diz com as circunstâncias do crime, observo que sua prática envolveu certa engenhosidade, tendo em vista que o entorpecente foi escondido nos pneus de carrinho de mão e em partes íntimas da acusada na tentativa de despistar as autoridades. Todavia, tendo sido meio para prática delitiva, o STJ não tem feito juízo em desfavor do acusado, cf. STJ AREsp nº 653.324 – SP. As consequências foram mitigadas pela apreensão da droga. Não houve contribuição da vítima para o delito. Cuidando-se de crime previsto na Lei 11.343/06, há de se observar seu art. 42: “O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente”. Nesse aspecto, reclama rigor o incremento da vetorial negativa quanto à natureza da substância apreendida, pois foram apreendidas com a acusada 503g (quinhentos e três gramas) de Cocaína sal (cloridrato ou pó) e 1426g (um mil quatrocentos e vinte e seis gramas) de Cocaína em forma de base livre (crack, merla, pasta base e similares), com potencial deletério à saúde pública extremamente grave. A pasta base, em especial, possui potencial de multiplicação após refino, podendo originar quantidade significativamente superior de droga para revenda, inclusive na forma de crack, substância de alta toxicidade, rápida absorção e elevado grau de dependência. Sendo assim, elevo a pena-base em razão da natureza da droga em 1 ano e 3 meses de reclusão e 125 dias-multa, mediante a aplicação da fração de 1/8 sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima estabelecidas no tipo penal, fixando-a em 06 anos e 03 meses de reclusão e 625 dias-multa. 2ª Fase, pena intermediária. Não há agravantes. Considerando que a ré confessou o delito de traficância, reconheço a incidência da atenuante da confissão espontânea (artigo 65, inciso III, "d", do CP). É aplicável, ainda, a atenuante da menoridade (artigo 65, inciso I, do CP), uma vez que à época dos fatos a acusada, nascida em 11/10/2005 (id. 352773276, p. 15), tinha 19 anos de idade. Dessa forma, aplicável a redução da pena em 1/6 para cada uma das atenuantes. No entanto, em atenção à Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, cujo cancelamento foi rejeitado pela sua Terceira Seção, no julgamento do REsp 1.869.764-MS, conforme acórdão publicado em 18.04.2024, que impede nessa fase a redução da pena abaixo do mínimo legal, fixo-a provisoriamente em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 dias-multa. 3ª Fase, pena definitiva. De outra parte, incide a majorante do artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, dada a transnacionalidade do delito, conforme fundamentação. Exaspero a pena no mínimo legal, ou seja, em 1/6 (um sexto), e fixo-a provisoriamente em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 dias-multa. Por outro lado, considero aplicável a minorante do artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, que dispõe: nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. A ré é primária, não registra antecedentes, não há provas de que se dedica às atividades criminosas, ou que integra organização criminosa, limitando-se a aceitar o transporte do entorpecente, o que não é suficiente para afirmar que se dedica a atividades criminosas ou que integra organização criminosa, de modo que incide a minorante do § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06. Nesse aspecto, cumpre pontuar que não foi possível o acesso ao celular apreendido com a acusada (id. 360378781). Reduzo a reprimenda no patamar mínimo de 1/6 (um sexto), considerando que a ré atuou como “mula” no transporte de entorpecentes, desempenhando papel imprescindível na cadeia delitiva de distribuição das drogas no território nacional, circunstância que se revela apta a justificar a redução da pena no mínimo legal (Precedentes: AgRg no AREsp n. 2.648.731/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 20/3/2025, DJEN de 26/3/2025; AgRg no REsp n. 2.102.114/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 10/6/2024, DJe de 12/6/2024; TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim 5000248-60.2022.4.03.6119, julgado em 14/03/2025, DJEN DATA: 20/03/2025; 11ª Turma, ApCrim - 5000467-84.2024.4.03.6125, julgado em 28/02/2025, Intimação via sistema DATA:10/03/2025, dentre outros). Portanto, não havendo outras causas modificativas, fixo a pena privativa de liberdade definitivamente em 04 (quatro) anos, 10 (meses) e 10 (dez) dias de reclusão e 487 dias-multa. 5.2. Da pena de multa. O valor do dia-multa deve ser estabelecido entre um trinta avos e cinco salários-mínimos, segundo as condições econômicas do acusado (art. 43 da Lei 11.343/2006). Fixo o valor do dia-multa no patamar mínimo legal, correspondente a 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos (04 de fevereiro de 2025), devendo tal valor ser atualizado monetariamente até o efetivo pagamento. A opção pela fixação no mínimo legal encontra respaldo na análise das condições econômicas da ré, que, conforme declarou nos autos, trabalhava em um restaurante recebendo cerca de $ 1.700 pesos bolivianos, não detinha bens patrimoniais, residia em imóvel alugado e, atualmente, encontra-se recolhida ao sistema prisional. Tais elementos evidenciam a hipossuficiência econômica da ré, tornando adequada e proporcional a adoção do valor mínimo. 5.3. Do regime inicial de cumprimento da pena e da detração. Fixo o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena de reclusão, a teor do artigo 33, §2º, alínea "b", do Código Penal, tendo em vista que a ré foi condenada à pena superior a 04 (quatro), mas inferior a 08 (oito) anos, e não é reincidente. Dispõe o artigo 387, §2º, do CPP, que: O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Habeas Corpus n.º 118.533, firmou entendimento no sentido de que o tráfico de drogas na forma privilegiada, previsto no §4º do art. 33 da Lei n.º 11.343/06, não ostenta natureza hedionda, afastando, portanto, sua equiparação aos crimes previstos na Lei n.º 8.072/90. Referido entendimento foi consolidado no acórdão de relatoria da Ministra Cármen Lúcia, proferido em 23 de junho de 2016. No mesmo sentido, a Lei n.º 13.964/2019, ao alterar dispositivos da Lei de Execução Penal, reforçou tal orientação ao dispor, em seu art. 112, §5º, que o tráfico privilegiado não se equipara a crime hediondo para fins de progressão de regime. De acordo com o artigo 112, inciso V, da Lei nº 7.210/84, com as alterações promovidas pela Lei nº 13.964/19, se o apenado é primário e o crime foi cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, a transferência para o regime menos rigoroso será possível com o cumprimento de ao menos 16% da pena, o que, no caso, equivale a 09 (nove) meses e 10 (dez) dias. No caso concreto, a acusada se encontra em prisão cautelar há aproximadamente 03 meses, o que representa menos de 5,5% da reprimenda fixada pela prática do delito de tráfico de entorpecentes, não sendo suficiente, portanto, para influenciar na definição do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade. Dessa forma, deixo de proceder à detração do período de prisão processual compreendido desde 04.02.2025, por entender que tal abatimento, neste momento, revela-se inócuo à alteração do regime inicialmente fixado, podendo, entretanto, ser oportunamente analisado pelo juízo da execução penal, na fase própria, conforme previsão legal. Cumpre registrar, no ponto, o Enunciado nº 59 de Súmula Vinculante: É impositiva a fixação do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando reconhecida a figura do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06) e ausentes vetores negativos na primeira fase da dosimetria (art. 59 do CP), observados os requisitos do art. 33, § 2º, alínea c e do art. 44, ambos do Código Penal. Na hipótese dos autos, houve o reconhecimento do tráfico privilegiado, mas também houve a valoração negativa das circunstâncias judiciais na primeira fase da dosimetria. Impende ressaltar que a parte final da tese sumular preceitua - como não poderia deixar de ser, tendo em vista tratar-se de comandos emanados da própria lei penal -, a observância do teor dos artigos 33, § 2º, letra ‘c’ e do artigo 44, ambos do Código Penal. Ambos os artigos do diploma repressivo estabelecem, respectivamente, que tanto o regime inicial aberto de cumprimento de pena privativa de liberdade, como também o benefício da substituição por penas restritivas de direitos, são institutos que devem ser utilizados desde que a pena aplicada no caso concreto seja igual ou inferior a quatro anos de reclusão. Forçoso reconhecer, portanto, que na situação presente não se pode aplicar a tese estipulada pela Súmula Vinculante nº 59, em respeito ao critério objetivo previsto pelos artigos 33, § 2º, ‘b’ e artigo 44, ambos do Código Penal, uma vez que a pena aplicada no caso concreto foi superior a quatro anos de reclusão. Por fim, a pena aplicada (superior a quatro anos) obsta a concessão do benefício da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (artigo 44, inciso I, do Código Penal). Da mesma forma, não há falar de aplicação do sursis, nos termos do artigo 77, caput, do Código Penal, ante a pena aplicada. 6. Da manutenção da prisão preventiva. A ré foi presa em flagrante no dia 04.02.2025, teve a sua prisão convertida em preventiva e permaneceu segregada durante toda a instrução processual. Ultimada a instrução criminal, com a prolação de sentença condenatória, impende, nos termos do art. 387, §1º, do Código de Processo Penal, reavaliar a necessidade da prisão preventiva anteriormente decretada, à luz dos artigos 312 e 316, parágrafo único, do mesmo diploma legal. A conduta atribuída à ré enquadra-se como crime doloso com pena máxima fixada superior a quatro anos, preenchendo, portanto, o requisito objetivo exigido pelo artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal. De igual forma, resta cumprido o requisito subjetivo, uma vez que a custódia cautelar se faz necessária para assegurar a aplicação da lei penal e para garantia da ordem pública (art. 312 do CPP). Com efeito, trata-se de ré natural da Bolívia, que não possui quaisquer vínculos familiares, sociais ou profissionais comprovados no território nacional, circunstância que evidencia a inexistência de raízes que justifiquem sua permanência no país ou que possam servir como garantidores de seu comparecimento aos atos do processo ou ao cumprimento da sanção penal imposta. Conforme restou apurado nos autos, a ré ingressou no território brasileiro com o exclusivo propósito de internalizar aproximadamente dois quilos de cocaína, sendo cerca de um quilo e meio de pasta base — substância de elevado valor no mercado ilícito —, revelando a gravidade concreta da conduta e o risco potencial à saúde pública. Segundo relatou a autora, a droga foi entregue por terceiro que a levou até a cidade de Corumbá, local no qual a droga foi entregue, circunstância que indica o provável envolvimento deste terceiro com organização criminosa especializada na remessa e distribuição internacional de substâncias entorpecentes. Ao ser presa em flagrante, a ré alegou estar grávida. No entanto, a informação não foi confirmada por exame médico regularmente autorizado por ela durante a audiência de custódia, sugerindo tentativa deliberada de manipular a atuação jurisdicional com o claro intuito de obter benefício processual indevido, mediante alegação sabidamente inverídica, visando à substituição da prisão preventiva por medida cautelar menos gravosa, com a intenção de se evadir ao seu país de origem, frustrando assim a aplicação da lei penal brasileira. Tal comportamento, por sua natureza e finalidade, reforça o risco concreto de fuga e a necessidade de manutenção da segregação cautelar. Ou seja, tratando-se de ré estrangeira, sem vinculação com o chamado distrito da culpa, é de se considerar que a revogação da prisão preventiva, colocando-a em liberdade, levaria à inocuidade da condenação, porquanto são comuns os casos em que ocorre o imediato retorno à origem, não mais se tendo notícia do paradeiro da condenada. Na prática, a soltura imediata da condenada representaria o não cumprimento da pena, o que é de todo desaconselhável. Ademais, observo que a manutenção da segregação cautelar não é incompatível com o regime semiaberto fixado para o início do cumprimento da pena pela ré. Fossem incompatíveis os sistemas de preventiva e do regime semiaberto, o próprio legislador teria estabelecido o cabimento da segregação cautelar apenas aos crimes dolosos punidos com pena máxima superior a 08 anos, caso em que haveria simetria com o regime inicialmente fechado, a teor do art. 33, §2º, "a", do Código Penal. Aliás, o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que não há incompatibilidade entre a negativa do direito de recorrer em liberdade e a fixação do regime semiaberto, caso preenchidos os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, como ocorre no caso, devendo, no entanto, ser compatibilizada a manutenção da custódia cautelar com o regime inicial determinado na sentença condenatória, sob pena de estar impondo ao condenado modo de execução mais gravoso tão somente pelo fato de ter optado pela interposição de recurso, em flagrante ofensa ao princípio da razoabilidade (STJ, RHC 117770 2019.02.71284-1, Quinta Turma, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, DJE 12/11/2019). Por esses motivos, mantenho a prisão preventiva da ré ROXANA, valendo tal decisão para os fins do art. 316, parágrafo único, do CPP. 7. Dos efeitos da condenação. 7.1. Dos bens apreendidos. A droga foi periciada, armazenadas amostras para contraprova, e incinerada com autorização judicial (id. 352929176). Do aparelho celular apreendido em poder da ré nada pode ser extraído, tendo em vista que o equipamento apresentou defeito em um dos seus componentes eletrônicos, de forma que poderá ser restituído a ré após o trânsito em julgado. Caso a acusada não postule a devolução do aparelho telefônico, fica desde já determinada a destruição ambientalmente adequada do referido equipamento, observadas as formalidades legais e sob a supervisão da autoridade competente, notadamente porque apresentou defeito em um de seus componentes eletrônicos. 7.2. Considerações finais. Deixo de fixar um valor mínimo para a reparação dos eventuais danos (inciso IV do art. 387 do CPP) pela ausência de requerimento do órgão acusatório nesse sentido, o que inviabiliza o contraditório e a ampla defesa. III – DISPOSITIVO. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para CONDENAR a ré ROXANA ROMERO MERCADO à pena privativa de liberdade de 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e à pena de multa de 487 (quatrocentos e oitenta e sete) dias-multa, à razão unitária de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente na data do fato (04.02.2025), atualizado desde então até o efetivo pagamento, por infração ao artigo 33, caput e §4º, c/c o artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06. Condeno a ré, ainda, ao pagamento das custas processuais. Mantenho a prisão preventiva da ré, conforme item 6 da fundamentação. Sendo assim, a ré não poderá apelar em liberdade. Deixo de efetuar a detração dos dias em que a ré permaneceu presa provisoriamente desde 04.02.2025, conforme item 5.3 da fundamentação. Desnecessária a expedição de oficio ao Tribunal Regional Eleitoral, para fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal, haja vista se tratar de ré estrangeira. Considerando o disposto no Enunciado nº 192 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, declino da competência para a execução provisória da pena privativa de liberdade a que foi condenada a ré ROXANA ROMERO MERCADO à Vara de Execuções Criminais que tem jurisdição sobre a Penitenciária Feminina de Sant’ana/SP, onde se encontra recolhida a ré. Assim, providencie-se a remessa das principais peças dos autos ao Juízo ora declinado, com urgência, comunicando-se à Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) do Estado de São Paulo, extraindo-se a ficha individual com a pena total da condenada e a observação de que está presa provisoriamente desde 04.02.2025, a fim de que perante aquele Juízo possa ser feita a detração, de tudo formando-se o processo de Execução Penal Provisória, para fins de controle e acompanhamento, pelo Juízo Federal, das decisões relativas à sentenciada. Encaminhe-se, de imediato, cópia desta sentença ao Consulado da Bolívia, em São Paulo, SP. Providencie-se o imediato pagamento dos honorários do intérprete que atuou na audiência de instrução, os quais, considerando a duração do ato em mais de duas horas, fixo em duas vezes do valor máximo da tabela. Arbitro os honorários da defensora dativa nomeada, que atuou até a fase de instrução, Dra. TATIANE PEREIRA DA SILVA - OAB SP373153 (id. 356710199), em 1/3 do valor máximo da tabela. Providencie-se o pagamento. Retifique-se a autuação do feito para excluir a POLÍCIA FEDERAL - SR/PF/SP, que não é autor da persecução penal em juízo. Após o trânsito em julgado: 1) lance-se o nome da ré no rol dos culpados; 2) comunique-se ao Instituto de Identificação e à Polícia Federal para que este proceda aos ajustes das informações do réu em relação à ação penal objeto desta sentença. 3) remetam-se os autos ao SUDP para mudança da situação do réu nos autos; e 4) providencie-se a destinação dos bens apreendidos, conforme item 7.1 da fundamentação. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. Ourinhos, na data em que assinado eletronicamente. ANDRÉIA LOUREIRO DA SILVA, Juíza Federal Substituta.
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Processo nº 0002811-08.2018.4.03.6102
ID: 305675558
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Federal de Barretos
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0002811-08.2018.4.03.6102
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOSUE JUSTINO DO RIO
OAB/SP XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 0002811-08.2018.4.03.6102 / 1ª Vara Federal de Barretos AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP REU: CASSIO IZIQUE CHEBABI Advogado do(a) REU: JOSUE JUS…
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 0002811-08.2018.4.03.6102 / 1ª Vara Federal de Barretos AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP REU: CASSIO IZIQUE CHEBABI Advogado do(a) REU: JOSUE JUSTINO DO RIO - SP327363 S E N T E N Ç A RELATÓRIO Trata-se de denúncia (ID 306221301) apresentada no dia 07/11/2023, pelo Ministério Público Federal (MPF), em desfavor de CÁSSIO IZIQUE CHEBABI, qualificado nos autos, pela prática, em tese, do crime previsto no art. 89, §1º, da Lei 8.666/93 c/c. art. 20, §2º, do Código Penal. A denúncia descreve, em resumo, que o réu, no período compreendido entre fevereiro de 2012 e dezembro de 2021, agiu, de maneira livre, consciente e voluntária, no desempenho das funções definidas no estatuto social de presidente da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (COAF), induziu e manteve em erro, na Chamada 01/2012 e na execução do Contrato nº 05/2012, os agentes públicos da Prefeitura de Bebedouro/SP, a fim de dispensassem licitação fora da hipótese prevista no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), gerido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia federal (ID 306221301). Alega, ainda, o Parquet Federal que o réu, valendo-se do uso indevido de Declarações de Aptidão ao Pronaf (DAPs), fez transparecer que os produtos fornecidos pela COAF seriam provenientes de agricultura familiar, enquanto, na realidade, eram adquiridos de empresas da região como CEASA, CEAGESP, TECPOLPA, PALAZO e LOUIS DAYFROUS, algo que não seria permitido, pois o art. 14, caput e §1º, da Lei 11.947/09 trazia consigo a obrigatoriedade de que os gêneros alimentícios fossem obtidos diretamente da agricultura familiar (ID 306221301). Por fim, o MPF entendeu que não seria o caso de propor Acordo de Não Persecução Penal, pois o réu estava sendo processado em quatro outras ações destinadas a apurar fraudes semelhantes, o que, segundo entendimento do dominus litis, demonstra indícios de habitualidade e profissionalismo na conduta de CASSIO IZIQUE CHEBABI, ora réu, os quais seriam incompatíveis com o mencionado instrumento negocial de caráter processual penal (ID 306221301 – fls. 4) Não obstante, o dominus litis requereu o ARQUIVAMENTO PARCIAL DO INQUÉRITO POLICIAL, mais especificamente em relação a JOÃO ROBERTO FOSSALUZZA JUNIOR, CARLOS ALBERTO SANTANA DA SILVA e CARLOS LUCIANO LOPES, pois o ingresso deles ocorreu após os fatos narrados na denúncia, não havendo, assim vínculo subjetivo, nem contribuição para prática delitiva (ID 306221301 – fls. 4/5). Ainda, também, o MPF requereu o arquivamento em relação aos crimes decorrentes da celebração dos Contratos nº 115/2010 e 11/2021, pois, desde suas respectivas assinaturas, houve o transcurso de lapso temporal superior a doze anos, restando, portanto, a pretensão punitiva criminal fulminada pela prescrição (ID 306221301 – fls. 5). Por fim, requereu o arquivamento em relação ao ex-prefeito JOÃO BATISTA BIANCHINI e os demais agentes públicos. Entendeu o MPF que aqueles não mantiveram vínculo subjetivo e nem contribuíram para a prática delitiva, mas sim foram induzidos pelo réu CÁSSIO IZIQUE CHEBABI a incorrer em erro (ID 306221301 – fls. 5). A denúncia foi recebida, em 29/01/2024, em desfavor do réu CÁSSIO IZIQUE CHEBABI (ID 312926498), sendo determinado o arquivamento em relação aos demais envolvidos, a saber: JOÃO ROBERTO FOSSALUZZA JUNIOR, CARLOS ALBERTO SANTANA DA SILVA e CARLOS LUCIANO LOPES. O réu apresentou sua resposta à acusação e constituiu advogado em 29/07/2024 (ID 333229299). De forma resumida, pugnou pela sua absolvição sumária, sob a alegação de que sua conduta seria atípica e que ausente seria a justa causa para instrução do feito. Outrossim, o réu afirmou que não houve dolo em seu agir ou prejuízo aos cofres públicos (ID 333229297). A fase prevista no art. 397 do CPP foi superada sem absolvição sumária (ID 337208273) A audiência de instrução e julgamento foi realizada em 21/11/2024, ocasião em que foi decidido que as alegações finais seriam apresentadas, na forma de memoriais, em razão da complexidade do caso, conforme o disposto no art. 403 do Código de Processo Penal (ID 346313107). O Ministério Público Federal apresentou seus memoriais, em 29/12/2024, reiterando os termos da denúncia, especialmente no que tange ao prejuízo causado à Prefeitura de Bebedouro/SP, e solicitando que as justificativas apresentadas pelo réu fossem desconsideradas (ID 347280940). De forma subsequente, a defesa apresentou seus memoriais em 12/12/2024. Afirmou inexistirem provas quanto ao dolo específico de causar prejuízo à Administração Pública, destacando-se a necessidade de perícia contábil para comprovar o alegado dano. Por fim, pediu a desconsideração dos depoimentos testemunhais daqueles que foram incluídos no COAF, após os fatos descritor na denúncia (ID 348999754). É O RELATÓRIO, no essencial. FUNDAMENTO E DECIDO. MATERIALIDADE Tanto em depoimento colhido perante a Polícia Federal, no dia 23/11/2020 (ID 295225005 – fls. 6/7), quanto no âmbito do Poder Judiciário (ID 346313107), a testemunha LUIZ HENRIQUE LUGATTO afirmou, de forma consistente, que nunca participou de procedimentos licitatórios, no Município de Bebedouro/SP, não fez parte da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar de Bebedouro (COAF) e nunca produziu produtos destinados à agricultura familiar (v.g: laranjas). A testemunha declarou que sua atividade se restringe à produção de soja, que é vendida para grandes compradores, como CARGIL e COOPERCITRUS. Ressalta-se que, em ambos os depoimentos, prestados virtualmente, disse que não houve qualquer coação ou constrangimento por parte dos investigadores federais ou do Ministério Público Federal. No entanto, ao se analisar o documento intitulado "Projeto de Venda de Gêneros Alimentícios da Agricultura Familiar para Alimentação Escolar", destinado à Chamada Pública nº 01/SME/DME/2010, observa-se que a testemunha LUIZ HENRIQUE LUGATTO constava como um dos participantes do fornecimento de 3.461 litros de suco de laranja, no valor total de R$8.998,60, com a inclusão de seu CPF e DAP (ID 37816650 – fls. 9/11). O mesmo ocorre com a testemunha CLEITON BOSSOLANI, que, tanto em sua oitiva perante a Polícia Federal, em 23/11/2020 (ID 295225005 – fls. 9/10), quanto em seu depoimento prestado no âmbito do Poder Judiciário (ID 346313107), afirmou que nunca fez parte da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar de Bebedouro (COAF), nem vendeu laranjas para a cooperativa ou para a Prefeitura de Bebedouro/SP, tendo comercializado apenas com mercadistas da sua região. Assim como a outra testemunha, o depoimento de CLEITON BOSSOLANI foi prestado de forma virtual, sem qualquer indício de coação ou constrangimento. Ao se analisar o documento referente ao projeto de atendimento à Chamada Pública nº 0001/2012, intitulado "Projeto de Venda de Gêneros Alimentícios da Agricultura Familiar para Alimentação Escolar", verifica-se que CLEITON BOSSOLANI também estava registrado como fornecedor da COAF, com seu CPF e número de DAP(ID 37817106 – fls. 5/6). Em outra parte do mesmo documento, sob o título "Identificação da Entidade Executora do PNAE/FNDE/MEC", consta que a testemunha seria responsável pelo fornecimento de 3.000 litros de suco de laranja, comercializados pelo valor de R$9.000,00 (ID 37817106 – fls. 6/8). Dessa forma, fica evidenciado, nos autos que, embora os nomes de LUIZ HENRIQUE LUGATTO e CLEITON BOSSOLANI apareçam em documentos relacionados ao fornecimento de suco de laranja à COAF, para atender à demanda da Prefeitura de Bebedouro/SP, por meio da Chamada Pública nº 0001/2012, ambos afirmaram, de forma categórica, tanto perante a Polícia Federal, quanto na Audiência de Instrução e Julgamento realizada na Subseção da Justiça Federal de Barretos/SP, que nunca realizaram negociações com a COAF ou com a Prefeitura de Bebedouro/SP. Não obstante, LUIZ HENRIQUE LUGATTO ainda declarou, de forma enfática, que nunca esteve envolvido com a agricultura familiar ou com a produção de laranjas, limitando-se à produção de cana e soja. Nesse contexto, embora o réu sustente que houve a aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar, do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, as provas produzidas, neste contraditório judicial, nos levam ao convencimento de que, de fato, houve a adulteração da origem dos produtos fornecidos à COAF, o que desvirtua, por completo, a finalidade da Lei nº 11.947/2009. O mencionado diploma legal, em seu art. 14, regula o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) aos alunos da educação básica: Art. 14. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas, as comunidades quilombolas e os grupos formais e informais de mulheres. Ou seja, para que o Município de Bebedouro/SP pudesse acessar e utilizar os recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), no âmbito do PNAE, a aquisição direta de produtos e gêneros alimentícios advindos da agricultura familiar é condição prevista em lei. Do que se tem da leitura dos autos, percebe-se que, na realidade, houve a compra dos produtos e gêneros alimentícios de grandes produtores, o que viola os ditames legais e põe em xeque a própria finalidade do PNAE. A alteração do procedimento adotado quanto à origem dos gêneros alimentícios destinados à Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar de Bebedouro (COAF), que foi levada a registrar, como fornecedores, pessoas que, quando inquiridas como testemunhas, seja perante a Autoridade Policial, seja no âmbito do Poder Judiciário, afirmaram, de forma coerente e assertiva, que sequer produziam os itens contratados, o que configura fraude à execução do programa, o que, por via reflexa, compromete a finalidade social da política pública. Uma das teses defensivas apresentadas foi a alegação de que não seria possível comprovar a origem não familiar dos produtos entregues, uma vez que isso exigiria, segundo o réu, uma análise complexa de documentos fiscais e rastreamento dos alimentos fornecidos. Tal argumento defensivo, todavia, não merece acolhimento. A identificação de agricultores familiares não depende de inferências documentais complexas, mas sim do cumprimento de requisitos objetivos previstos, na Lei nº 11.326/2006, especialmente em seu artigo 3º, que define quem pode ser considerado agricultor familiar e que, portanto, possa ser considerado elegível a participar dos programas governamentais vinculados ao PRONAF: Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; III - tenha renda familiar predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. Em apertada síntese, o procedimento exigido é de que o produtor interessado se dirija à entidade cadastradora da DA, em seu município, munido dos documentos necessários para obtenção da Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP). Tal documento, à época dos fatos, era o instrumento oficial de identificação do agricultor familiar, sendo condição para acesso a diversas políticas públicas, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), conforme esclarece o próprio Governo Federal, em sua plataforma oficial (https://www.gov.br/pt-br/servicos/obter-declaracao-de-aptidao-ao-pronaf). Portanto, a alegação de que seria necessário um rastreamento aprofundado para verificar a origem dos produtos não se sustenta, uma vez que a regularidade da contratação depende, essencialmente, da verificação da titularidade válida e ativa da DAP vinculada ao produtor efetivamente envolvido na venda. No presente caso, o MPF demonstrou, de forma convincente, que os produtores cujos dados (CPF e DAP) constavam, nos projetos e documentos apresentados pela COAF, na realidade, jamais comercializaram produtos com a cooperativa ou com a Prefeitura de Bebedouro/SP. Em outras palavras, temos que as DAPs foram utilizadas indevidamente, em nome de terceiros alheios à operação, com o intuito de simular o cumprimento do requisito legal de origem familiar dos alimentos. Assim, a inclusão fraudulenta de dados de agricultores familiares que não participaram da venda ou sequer produziam os gêneros fornecidos configura violação ao artigo 14 da Lei nº 11.947/2009. A lei exige a comprovação da origem dos alimentos com base na identificação do produtor familiar, mediante DAP válida, e não através de notas fiscais ou rastreamento posterior. A conduta da COAF, portanto, compromete a integridade do programa público e evidencia a materialidade da fraude perpetrada. Assim, COMPROVADA ESTÁ A MATERIALIDADE DELITIVA. AUTORIA Conforme demonstrado nos tópicos anteriores, os documentos intitulados “Projeto de Venda de Gêneros Alimentícios da Agricultura Familiar para Alimentação Escolar” (ID 37816650 – fls. 10 e ID 37817106 – fls. 6), utilizados nos processos de contratação formalizados junto à Prefeitura de Bebedouro/SP, contêm a assinatura do réu CÁSSIO IZIQUE CHEBABI, à época presidente da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar de Bebedouro/SP (COAF). Em seu interrogatório, o réu afirmou que não era o responsável por elaborar os projetos, investindo pessoas de sua confiança em tal atribuição. No entanto, admitiu que era o responsável por assiná-los, juntamente com o então vice-presidente da cooperativa, WEDER PIFER. Apesar disso, os documentos analisados não apresentam qualquer assinatura de WEDER PIFER, mas tão aenas a do próprio réu, CÁSSIO CHEBABI, o que reforça sua centralidade nos atos de gestão e sua responsabilidade direta na documentação utilizada para fins de contratação pública. A testemunha JOÃO ROBERTO FOSSALUZZA JUNIOR, embora só tenha ingressado na COAF em 2013, confirmou que trabalhou com o réu e descreveu, de forma detalhada, o modus operandi adotado pela cooperativa. Nas palavras da testemunha, os produtos comercializados com o poder público não eram oriundos da agricultura familiar, mas sim de grandes produtores. Para simular o cumprimento da exigência legal prevista na Lei nº 11.947/09, incluíam-se, nos projetos e documentos, números de DAPs vinculadas a pequenos agricultores que, na realidade, jamais haviam fornecido os produtos ali descritos. JOÃO ROBERTO FOSSALUZZA JUNIOR, ainda, relatou que o réu era quem conferia a lista de DAPs antes da formalização dos projetos. Segundo o depoimento testemunhal, os agricultores cujas DAPs eram utilizadas não tinham qualquer ciência de que seus dados estavam sendo empregados para mascarar a origem dos produtos — o que evidencia o uso indevido e fraudulento dessas declarações, a fim de simular regularidade. O mesmo padrão foi confirmado pela testemunha CARLOS ALBERTO SANTANA DA SILVA, que, embora também tenha ingressado na COAF, em 2013, reiterou que os produtos adquiridos eram provenientes da CEAGESP, e não de agricultores familiares. A lista de DAPs era montada apenas para atender formalmente aos requisitos legais, sem que os verdadeiros titulares das declarações tivessem qualquer participação ou recebimento de valores. A defesa tentou desqualificar os depoimentos testemunhais produzidos por JOÃO ROBERTO FOSSALUZZA JUNIOR e CARLOS ALBERTO SANTANA DA SILVA, sob o argumento de que ambos ingressaram na cooperativa apenas após os fatos ocorridos, em 2012. Segundo suscitado pela defesa, os testemunhos não poderiam ser considerados para comprovar o modus operandi adotado pelo grupo à época dos contratos cuja fraude é objeto desta instrução processual penal. Entretanto, a tese defensiva não merece guarida. Ainda que as testemunhas tenham iniciado suas atividades, na COAF, em momento posterior aos fatos centrais da denúncia, seus depoimentos convergem com as demais provas aqui produzidas, nos autos, especialmente com os depoimentos de CLEITON BOSSOLANI e LUIZ HENRIQUE LUGATTO, os quais, como mencionado alhures, afirmam nunca terem participado da COAF e/ou terem fornecido os produtos indicados nos projetos, em que pese seus dados (v.g: nomes, CPFs e DAPs) se fizessem constantes nos documentos assinados pelo réu. Os elementos probatórios demonstram que o padrão fraudulento de atuação — consistente na falsificação da origem dos produtos, por meio do uso indevido de DAPs — já era adotado antes de 2013, sob a gestão do réu. Destaco, ainda, que, nas alegações finais, a defesa não apresentou qualquer impugnação ou justificativa quanto aos depoimentos de CLEITON BOSSOLANI e LUIZ HENRIQUE LUGATTO, revelando que a defesa não nos trouxe elementos com aptidão de infirmar a força probatória destas provas. Portanto, diante da farta documentação assinada pelo réu, dos depoimentos consistentes e convergentes produzidos pelas testemunhas e da ausência de qualquer tese válida por parte da defesa, resta devidamente comprovada a autoria criminosa por parte de CÁSSIO IZIQUE CHEBABI, na condição de presidente da COAF e responsável direto pela elaboração e assinatura dos projetos utilizados para a contratação com o Poder Público, em desconformidade com os requisitos legais exigidos pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar. Nessa senda, COMPROVADA ESTÁ A AUTORIA DELITIVA. ELEMENTO SUBJETIVO Em sua defesa, o réu traz consigo duas principais teses (ID 348999754): 1 – Não há demonstração de dolo específico. 2 – Não há qualquer perícia técnica para comprovar o prejuízo alegado pelo Ministério Público. Restou amplamente comprovado nos autos que houve inserção de informações falsas em documentos oficiais, entregues à Prefeitura de Bebedouro/SP, com a falsa afirmação de que os produtos fornecidos pela Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar de Bebedouro (COAF) seriam oriundos da agricultura familiar. Contudo, conforme demonstrado por testemunhos e documentos, diversos produtores listados como fornecedores jamais comercializaram qualquer produto com a COAF ou com a Prefeitura de Bebedouro/SP, sendo que alguns, inclusive, nunca atuaram na agricultura familiar, a exemplo do sr. LUIS HENRIQUE LUGATTO, inquirido como testemunha, o qual afirma que sua atividade é limitada à monocultura de soja e cana-de-açúcar. Os documentos que continham tais informações falsas foram assinados diretamente pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI, que, além de autenticar tais projetos com sua assinatura, participava da gestão direta da cooperativa e autorizava transações financeiras com o ente público. Diante desse cenário, não subsiste a alegação de ausência de dolo específico, uma vez que o réu agiu de forma consciente e voluntária ao desvirtuar a finalidade legal do contrato administrativo, cuja cláusula essencial era o fornecimento de gêneros alimentícios provenientes da agricultura familiar, conforme exige o art. 14 da Lei nº 11.947/09. Ao adquirir produtos de grandes produtores, ao invés de agricultores familiares, e ao utilizar DAPs de terceiros sem qualquer vínculo com a operação, o réu deliberadamente simulou o cumprimento dos requisitos legais, com o claro objetivo de viabilizar contratos públicos e, por via de consequência, receber os valores decorrentes dessas contratações. Tal conduta configura o dolo direto do réu CASSIO IZIQUE CHEBABI, que demonstrou conhecer a disposição legal e contratual, envidando esforços a fim de transparecer juridicidade aos seus atos fraudulentos. A alegação defensiva de que não possuía dolo específico não encontra respaldo nos autos, tampouco foi acompanhada de qualquer explicação razoável sobre o uso indevido das DAPs ou a substituição dos produtores reais pelos fictícios. A ausência de justificativa para tais irregularidades, somada à comprovação de que os documentos falsos foram assinados pessoalmente pelo réu, reforça o caráter consciente, voluntário e intencional de sua conduta. A segunda tese defensiva, referente à ausência de perícia contábil para apuração do suposto prejuízo ao erário, também não merece prosperar. A legislação brasileira não exige a realização de perícia contábil como condição de procedibilidade ou como pressuposto para condenação, nos crimes relacionados à fraude em licitação ou execução contratual, seja sob a égide da Lei nº 8.666/1993, ou da nova Lei nº 14.133/2021. A presença do dolo específico não depende da demonstração exata do valor do dano causado, sendo bastante a comprovação de que a conduta foi dirigida à prática de fraude com potencial de lesar o patrimônio público — o que se fez cabalmente evidenciado ao longo desta instrução processual penal. O requerimento postulado pela defesa quanto à necessidade de uma perícia técnica como condição obrigatória para o reconhecimento do dolo carece de fundamento legal, e, além disso, não foi requerida ao longo da instrução processual. Trata-se, portanto, de uma tentativa tardia de provocar dúvidas na formação do livre convencimento motivado do Poder Judiciário, o que, por sua vez, não se faz aplicável diante da prova de materialidade e de autoria. De mais a mais, os cálculos apresentados pelo Ministério Público Federal basearam-se em documentação oficial e simples operações matemáticas, cuja conferência está ao alcance da defesa, que não apresentou qualquer impugnação concreta aos valores ou ao método de cálculo adotado. Impende destacar, ainda, que a contratação de perícia contábil é faculdade do Ministério Público, e não imposição legal. Caso a defesa considerasse indispensável essa prova técnica, poderia ter requerido a produção da perícia ao longo da instrução processual penal, o que não fez. A simples alegação genérica quanto à ausência de laudo técnico não é suficiente para afastar a a autoria e a materialidade delitiva. Assim, todas as evidências convergem para a conclusão de que os atos praticados pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI foram realizados de forma livre, consciente e voluntária, com o inequívoco propósito de fraudar contratos administrativos firmados com a Prefeitura de Bebedouro/SP, burlando a legislação de regência. Isto posto, RECONHEÇO O DOLO ESPECÍFICO de CASSIO IZIQUE CHEBABI, bem como a DISPENSABILIDADE DA PERÍCIA TÉCNICA PARA FORMAÇÃO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO deste Juízo Federal investido na Jurisdição Criminal. EMENDATIO LIBELLI É cediço que o réu se defende dos fatos que lhe foram imputados e não da classificação jurídica indicada na peça acusatória. À luz da correlação ou da congruência, o juiz está adstrito aos limites da acusação, sendo-lhe defeso afastar-se dos fatos descritos na denúncia, podendo, contudo, dar-lhes capitulação jurídica diversa, ainda que implique em penalidade mais severa, nos termos do art. 383 do CPP. Preceitua o art. 383 do Código de Processo Penal poder o juiz dar ao fato definição jurídica diversa da que constar da peça acusatória, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, com a redação dada pela Lei 11.719/2008. É a denominada Emendatio Libelli. A respeito do tema, Eugênio Pacelli assevera: “...a emendatio não é outra coisa senão a correção da inicial (libelo, nessa acepção), para o fim de adequar o fato narrado e efetivamente provado (ou não provado, se a sentença não for condenatória, caso em que seria dispensável a emendatio) ao tipo penal previsto na lei. Nos termos do art. 383 do CPP, com redação dada pela Lei nº 11.719/08, 'o juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave' Na redação da lei, deve-se entender por definição jurídica precisamente a capitulação ou classificação feita pelo autor na inicial, em cumprimento da exigência prevista no art. 41 do CPP. Assim, dar definição jurídica diversa é alterar a capitulação, isto é, a consequência jurídica do fato imputado na denúncia ou queixa. O fato, evidentemente, há de permanecer o mesmo. Não se exige, então, a adoção de quaisquer providências instrutórias, bastando a prolação da sentença com a capitulação jurídica (do fato) que parecer mais adequada ao juiz. Nem mais, nem menos, sobretudo porque o réu não se defende da capitulação, mas da imputação da prática de conduta criminosa. Por isso, ainda que da nova definição jurídica resulte pena mais grave, não haverá qualquer prejuízo à defesa (pelo menos em face do Direito). Por essa razão, a providência pode ser adotada em qualquer grau de jurisdição, ao contrário da mutatio libelli, conforme veremos a seguir. Cumpre observar, porém, que, embora possível, a emendatio libelli em segundo grau sofre as mesmas limitações pertinentes aos efeitos devolutivos dos recursos, em geral. Vige aqui a regra da proibição da reformatio in pejus, ou reforma para pior, segundo a qual o julgamento do recurso não poderá ser mais desfavorável que a decisão de primeira instância, em relação à impugnação aviada exclusivamente pelo recorrente. Não havendo recurso do Ministério Público, o tribunal não poderá piorar a situação do acusado com base no recurso por ele interposto. Assim, ainda que o tribunal esteja autorizado a corrigir a capitulação do crime, da emenda não poderá resultar, nunca, aplicação da pena mais grave. (Curso de processo penal, 20. ed. rev., atualizada e ampliada., São Paulo: Editora Atlas S.A., 2016, p. 653). Portanto, pode o presente juízo realizar a alteração a definição jurídica do fato, sem qualquer cerceamento de defesa, pois o que está em jogo é a sua visão de tipicidade, que pode variar no exercício do seu livre convencimento motivado. Em outras palavras, o Poder Judiciário não está adstrito à tipificação trazida aos autos pelas partes. Consta expressamente na Denúncia (ID 306221301): A partir do expediente narrado, CÁSSIO IZIQUE CHEBABI induziu em erro os agentes públicos de Bebedouro, ao passo que, valendo-se do uso indevido de Declarações de Aptidão ao Pronaf (DAPs), fez transparecer que os produtos fornecidos pela COAF (adquiridos em indústrias) seriam provenientes da agricultura familiar, razão pela qual a municipalidade acreditou que os requisitos legais para a dispensa, previstos no art. 14, caput e §1º, da Lei 11.947/09, estariam presentes. Corroborando com esses fatos, destacam-se os depoimentos de João Roberto Fossaluzza Junior (Num. 37815698 - Pág. 6), Carlos Alberto Santana da Silva (Num. 37816295 - Pág. 12) e Carlos Luciano Lopes (Num. 37816295 - Pág. 17), os quais demonstram que CÁSSIO IZIQUE CHEBABI adquiria os produtos industrializados de empresas da região - como o CEASA, CEAGESP, Tecpolpa, Palazo e Louis Dayfrous e, em seguida, revendia-os à municipalidade como se fossem provenientes da agricultura familiar, havendo, inclusive, indícios de superfaturamento nos valores praticados à época. O mesmo se diga pelas informações prestadas por diversos produtores familiares no curso do inquérito policial, dentre os quais se destacam os depoimentos prestados por Luiz Henrique Lugatto (Num. 295225005 - Pág. 6) e Cleiton Bossolani (Num. 295225005 - Pág. 9/10). Assim, a fraude perpetrada pelo denunciado buscou conferir a aparência de que os produtos oferecidos pela COAF seriam passíveis de aquisição pela dispensa prevista no art. 14, caput e §1º, da Lei 11.947/09, expediente através do qual induziu em erro a Prefeitura de Bebedouro e seus agentes públicos e pôde celebrar o Contrato nº 05/2012 (Num. 37816272 - Pág. 7/12), causando um prejuízo total à Administração Pública de R$422.653,03 (quatrocentos e vinte e dois mil e seiscentos e cinquenta e três reais e três centavos). Segundo o entendimento do dominus litis, a conduta praticada pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI encontra subsunção ao tipo penal previsto no .art. 89, §1º, da Lei 8.666/93 c/c. art. 20, §2º, do Código Penal. Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público. Erro sobre elementos do tipo Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. O objeto principal da denúncia decorre da venda de produtos adquiridos das grandes empresas da região em detrimento de produtos provenientes da agricultura familiar, o que nos leva ao forçoso reconhecimento de que houve o fornecimento de mercadorias por meio de fraude quanto ao "uso indevido de Declarações de Aptidão ao PRONAF". Convenço-me que a documentação apresentada pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI teve aptidão de levar o ente municipal a incorrer em erro, vez que, de sua parte, houve fraude, em prejuízo à Fazenda Pública, no que se refere à aquisição e venda de bens ou mercadorias, a partir do instante em que o réu entregou mercadoria advinda de grandes fornecedores da região em detrimento de produtos provenientes da agricultura familiar, afrontando livre e conscientemente as previsões legais e contratuais que lhe eram exigidas. Nessa senda, a conduta praticada pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI encontra tipificação no art. 96, III, da Lei 8.666/1993, in verbis: Art. 96. Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: III- entregando uma mercadoria por outra Com o advento da Lei 14.133/21, que entrou em vigor em 1º de abril de 2021, o legislador infraconstitucional deslocou para a Parte Especial do Código Penal, na parte dedicada aos crimes contra a Administração Pública, a tipificação de condutas referentes a delitos praticados no âmbito das licitações e contratos.. O art. 337-L, CP, discorre sobre as fraudes praticadas, em prejuízo à Administração Pública, em sede de licitação ou contrato, a partir da entrega de mercadorias com qualidades diversas daquelas previstas no edital ou nos instrumentos contratuais (art. 337-L, I, CP), bem como nas hipóteses em que há entrega de uma mercadoria por outra (art. 337-L, III, CP). Art. 337-L. Fraudar, em prejuízo da Administração Pública, licitação ou contrato dela decorrente, mediante: I - entrega de mercadoria ou prestação de serviços com qualidade ou em quantidade diversas das previstas no edital ou nos instrumentos contratuais; (Incluído pela Lei nº 14.133, de 2021) III - entrega de uma mercadoria por outra; (Incluído pela Lei nº 14.133, de 2021) Fala-se, portanto, no fenômeno da continuidade normativo-típica, uma vez que as condutas praticadas pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI encontram previsão típica no art. 337-L, I e III, CP e não mais no art. 96, III, da revogada Lei 8.666/1993. Em outras palavras, não se pode falar em abolitio criminis. Contudo, necessário que façamos um estudo quanto à aplicação da Lei Penal no Tempo. O Código Penal Brasileiro adota a Teoria da Atividade quanto ao tempo do crime. Assim sendo, o crime considera-se praticado quando da sua ação ou omissão, ainda que o resultado ocorra em outro momento (art. 4º, CP). Ao confrontarmos as penas previstas nos sobreditos tipos penais, temos o revogado art. 96 da Lei 8.666/1993 previa a possibilidade de detenção de 3 a 6 anos e multa, ao passo que o art. 337-L, CP, em vigor desde 1º de abril de 2021, trouxe consigo a pena de reclusão de 4 a 8 anos e multa. Portanto, temos que a tipificação penal das condutas praticadas pelo réu CÁSSIO IZIQUE CHEBABI, à época dos fatos (art. 96 da Lei 8.666/1993), embora tenha sido posteriormente revogada pela Lei nº 14.133/2021, lhe é mais benéfica do que o art. 337-L, CP. Nestes termos, há a ultra-atividade da lei penal anterior (art. 96, III, Lei 8.666/1993), vez que mais benéfica ao réu, quando comparada ao novel legislativo (art. 337-L, CP). Nesse diapasão, promovo, na forma do art. 383, CPP, a ADEQUAÇÃO DA TIPIFICAÇÃO atribuída às condutas praticadas pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI, as quais, segundo convencimento motivado deste magistrado, encontram previsão penal sancionatória no art. 96, III, da Lei 8.666/1993. PREJUÍZO À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Entende a melhor doutrina que a fraude em licitação é crime material ou causal. Seu aperfeiçoamento, portanto, depende da produção do resultado naturalístico, consistente no prejuízo à Administração Pública. Pode ser crime instantâneo ou permanente, se a consumação se prolongar no tempo, pela vontade do agente, como no exemplo em que, durante a execução do contrato ao longo de um ano, com entregas mensais da mercadoria pelo contratado, a fraude venha a incidir sobre todas as parcelas atinentes ao cumprimento da avença. No caso em tela, estamos diante de crime no qual a consumação se prolongou no tempo, em função das diversas entregas feitas à Prefeitura de Bebedouro/SP de mercadorias atestadas como provenientes de agricultura familiar, quando, na realidade, eram advindas de grandes produtores. O Ministério Público Federal, em sua denúncia, nestes termos asseverou (ID 306221301): Assim, a fraude perpetrada pelo denunciado buscou conferir a aparência de que os produtos oferecidos pela COAF seriam passíveis de aquisição pela dispensa prevista no art. 14, caput e §1º, da Lei 11.947/09, expediente através do qual induziu em erro a Prefeitura de Bebedouro e seus agentes públicos e pôde celebrar o Contrato nº 05/2012 (Num. 37816272 - Pág. 7/12), causando um prejuízo total à Administração Pública de R$422.653,03 (quatrocentos e vinte e dois mil e seiscentos e cinquenta e três reais e três centavos). O Ministério Público Federal (MPF) considerou, para o cálculo do prejuízo, o valor total do contrato, que é de R$ 422.653,00 (ID 37816272 – fls. 7/12), referente à contratação da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar de Bebedouro (COAF) para fornecimento de produtos alimentícios ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Em sua linha defensiva, o réu, inicialmente, alegou a necessidade de perícia contábil para calcular o valor do prejuízo. Todavia, tal argumento já foi superado em tópico anterior, uma vez que a exigência de perícia contábil foi rejeitada (ID 348999754). O réu também argumenta que, apesar da troca da origem dos produtos, a entrega dos itens afastaria qualquer tese de prejuízo financeiro (ID 348999754). Contudo, é importante esclarecer que o Ministério Público não questiona a entrega dos produtos, mas sim a falsificação da origem e da substância dos produtos entregues. O programa governamental exigia que os alimentos fossem provenientes da agricultura familiar, e o réu entregou produtos oriundos de grandes produtores, desvirtuando, assim, a finalidade do contrato e da norma legal aplicável. Como já foi demonstrado nos tópicos anteriores, a origem dos produtos fornecidos pela COAF não corresponde à agricultura familiar, o que, por si só, configura uma violação às disposições legais do PNAE. Nessa ordem de ideias, é imprescindível analisar se essa alteração na origem dos produtos, ao substituir a agricultura familiar por grandes produtores, gerou prejuízo financeiro à Fazenda Pública, e, em caso afirmativo, qual seria o valor desse prejuízo. Primeiramente, é necessário fazer algumas considerações sobre a agricultura familiar, no contexto da economia nacional. Segundo o Anuário Estatístico da Agricultura Familiar de 2024, realizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), a agricultura familiar ocupa apenas 23% das terras brasileiras, mas gera 67% das ocupações no campo e 23% do valor bruto da produção agropecuária. Além disso, a agricultura familiar é um motor econômico significativo, com impacto direto na dinamização de 90% dos municípios com até 20 mil habitantes (https://ww2.contag.org.br/documentos/pdf/18459-2234957-anua%CC%81rio-agricultura-2024.pdf). O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), ao incluir a agricultura familiar nas compras para as escolas, gerou benefícios econômicos substanciais para os pequenos produtores. De acordo com estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a exigência do PNAE de compra de gêneros alimentícios de origem familiar levou a um aumento médio de 32,6% no Valor Bruto da Produção (VBP) das unidades de agricultura familiar participantes. Esse aumento representou R$ 8.590,00 a mais no VBP das unidades analisadas. O estudo empírico realizado pelo IPEA, combinando técnicas de análise de diferença-em-diferenças e balanceamento por entropia, revelou que o impacto positivo do PNAE foi mais expressivo para as unidades com menor VBP, com um aumento de 64,5% no 10º percentil e 34,5% no 75º percentil. Esses resultados demonstram claramente que o PNAE é um instrumento eficaz para a elevação da renda e a inclusão produtiva da agricultura familiar, beneficiando diretamente o setor rural e os pequenos agricultores (https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/12092/1/TD_2884_Web.pdf). Além dos impactos econômicos, estudos da Faculdade de Tecnologia de Mococa destacam a importância social e sustentável da agricultura familiar. Comparado ao modelo de latifúndios, a agricultura familiar se caracteriza pela diversificação da produção, o que implica menor dependência de insumos industriais e agrotóxicos, promovendo uma maior sustentabilidade e qualidade dos alimentos produzidos. Além disso, as propriedades familiares tendem a ser menos mecanizadas, com um menor uso de combustíveis poluentes, o que contribui para um impacto ambiental positivo (https://congresso.fatecmococa.edu.br/index.php/congresso/article/download/153/67/399#:~:text=A%20agricultura%20familiar%20produz%20mais,global%20(FAO%2C%202019). Portanto, ao não adquirir os produtos de agricultores familiares, o réu não apenas fraudou os termos do contrato com a Prefeitura de Bebedouro/SP, mas também impediu o desenvolvimento econômico e social sustentável do setor agrícola familiar. Essa conduta resultou em um prejuízos não apenas para os pequenos produtores da região - que poderiam atender a demanda e que, por força de uma conduta egoística praticada pelo réu CASSIO IZIQUE CHEBABI, foram excluídos do PNAE-, mas também para o meio ambiente, vez que a prática da agricultura familiar lhe é mais benéfica. Assim, necessário levarmos em consideração três vetores: 1 – Os produtos foram realmente entregue (fato incontroverso no processo); 2 - O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) gerou um aumento de 32,6% na renda dos agricultores familiar (pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA); 3 – Agricultura familiar propõe melhores condições de sustentabilidade, gerar a criação de emprego e menos impactos negativos ao meio ambiente, em comparação ao modelo de agricultura desenvolvido por grandes produtores (pesquisa da Faculdade de Tecnologia de Mococa). Concluo que é possível calcular que houve prejuízo à Fazenda Pública de, no mínimo, 40% (quarenta por cento) em relação valor do contrato. A partir do instante em que houve a entrega dos produtos- ainda que provenientes de origem diversa daquela prevista em lei e no contrato- afasto o entendimento de que o prejuízo provocado à Administração Pública seja equivalente a 100% (cem por cento) dos valores pactuados nos instrumentos contratuais. Destes 40% (quarenta por cento), 32,60% (trinta e dois, vírgula sessenta por cento) seriam decorrentes do valor que os agricultores familiares deixaram de auferir, ao passo que os outros 7,40% (sete vírgula quarenta por cento) seriam decorrentes dos impactos ao meio ambiente provocados pela conduta do réu, vez que os grandes produtores provocam maiores danos ambientais, em seu modelo de produção, quando comparados aos produtores familiares. Isto posto, considero que a FAZENDA PÚBLICA foi submetida a um PREJUÍZO QUE FIXO EM R$169.061,21 (cento e sessenta e nove mil, sessenta e um reais, vinte e um centavos). DECISÃO Ante o exposto, a partir do cotejo das provas produzidas neste contraditório judicial, observado o devido processo legal, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a DENÚNCIA oferecida pelo MPF em desfavor do réu CÁSSIO IZIQUE CHEBABI, razão pela qual promovo sua CONDENAÇÃO como incurso nas penas do art. 96, III, da Lei 8.666/1993. DOSIMETRIA DA PENA Passo à dosimetria das penas, à luz dos arts. 59 e 68 do Código Penal e dos incisos XLVI e IX dos arts. 5º e 93, respectivamente, da Constituição Federal. Na primeira fase da individualização da pena, analisam-se as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP. 1ª FASE As circunstâncias judiciais, previstas no art. 59 do Código Penal, são compostas por oito fatores. Numa perspectiva geral, se os oito elementos inseridos no quadro da culpabilidade forem favoráveis, a censurabilidade será mínima, restando a pena-base no patamar básico; se desfavoráveis, a censurabilidade, obviamente, será extrema, devendo-se partir do máximo previsto pelo tipo penal. Importante destacar constituírem a personalidade, os antecedentes e os motivos como fatores preponderantes, conforme previsão formulada pelo art. 67 do Código Penal (nessa norma, menciona-se a reincidência, que não deixa de ser antecedente criminal). A eles, então, atribui-se o peso 2. Portanto, a projeção dos pesos atribuídos aos elementos do artigo 59, em escala de pontuação, forneceria o seguinte: personalidade = 2; antecedentes = 2; motivos = 2; culpabilidade = 1, conduta social = 1; circunstâncias do crime = 1; consequências do crime = 1; comportamento da vítima = 1. O total dos pontos é 11. Firmados os critérios, torna-se fundamental que o magistrado promova a verificação da existência fática de cada elemento, avaliando as provas constantes dos autos, para, na sequência, promover o confronto entre os fatores detectados. Dessa comparação, surgirá a maior ou menor culpabilidade, ou seja, a maior ou menor censura ao crime e seu autor. Vale ressaltar, a individualização da pena é um processo discricionário, juridicamente vinculado aos motivos enumerados pelo julgador. Essa pode ser a regra, embora somente a situação concreta, espelhada nas provas dos autos, permita ao magistrado avaliar se não cabe uma exceção. A) Culpabilidade: conforme é cediço, a culpabilidade está ligada à intensidade do dolo ou grau de culpa do agente, tendo em vista a existência de um plus de censurabilidade e reprovação social da conduta praticada, que poderia ser evitada. A frieza do agente e a premeditação, por exemplo, são características a serem examinadas nessa oportunidade. No caso dos autos a culpabilidade é normal à espécie. B) Antecedentes: Trata-se de requisito objetivo, que impede qualquer análise subjetiva do julgador. O réu possui certidão de antecedentes criminais (ID 339334938): Condenação pelo Art. 304 c/c 299, caput, do Código Penal com trânsito em julgado para defesa em 09/03/2022 (ID 339334938 – fls. 1); Condenação pelo Art. 304 c/c 299, caput, Parte 1 do Código Penal com trânsito em julgado para defesa em 09/03/2022 (ID 339334938 – fls. 1). A despeito de haver condenações com trânsito em julgado, tais fatos são posteriores àqueles que são objeto desta instrução processual penal. É importante frisar a condenação definitiva deve ser por fato anterior ao crime cuja pena se deseja individualizar. Essa ilação extrai-se do próprio nome da circunstância judicial – “antecedente”. Na dicção do Superior Tribunal de Justiça: No cálculo da pena-base, é impossível a consideração de condenação transitada em julgado correspondente a fato posterior ao narrado na denúncia para valorar negativamente os maus antecedentes, a personalidade ou a conduta social do agente (HC 189.385/RS, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6.ª Turma, j. 20.02.2014.) Por isso, não há maus antecedentes a serem considerados. C) Conduta Social e da Personalidade: a conduta social do agente não se refere a fatos criminosos, mas sim ao papel assumido por ele na sociedade, sobre a forma de se portar no ambiente familiar, profissional, perante seus vizinhos, conhecidos e amigos, para que se possa concluir se este se comporta ou não de acordo com as normas sociais que exigem uma conduta harmônica e baseada em respeito mútuo. Ricardo Augusto Schmitt, in Sentença Penal Condenatória, 4ª Edição, 2009, Editora JusPodivm, afirma que "a conduta social trata-se do comportamento do agente no seio social, familiar e profissional. Revela-se por seu relacionamento no meio em que vive, tanto perante a comunidade, quanto perante sua família e seus colegas de trabalho" e "difere-se dos antecedentes, pois àqueles estão ligados a prática de um delito que mereceu sanção definitiva do Estado. A conduta social não se refere a fatos criminosos e sim ao comportamento da pessoa no mundo exterior que habita"- páginas 96/97. No caso concreto, poucos elementos foram coletados em relação à conduta social do acusado, não podendo esta ser aferida negativamente. Em relação à personalidade, nada digno de nota foi constatado além do desvio que o levou à prática delitiva; D) Motivo: são os fatores psíquicos que levam a pessoa a praticar o crime ou a contravenção penal. Só tem cabimento essa circunstância judicial (favorável ou desfavorável ao réu) quando a motivação não caracterizar elementar do delito, qualificadora, causa de diminuição ou de aumento da pena, ou atenuante ou agravante genérica. No caso em tela, só há informações que correspondem às elementares do delito, razão pela qual, quando da avaliação dos motivos do delito, estes devem ser considerados circunstâncias judiciais neutras. E) Circunstâncias e Consequências: por um lado, as circunstâncias do crime são os dados acidentais, secundários, relativos à infração penal, mas que não integram sua estrutura, tais como o modo de execução do crime, os instrumentos empregados em sua prática, as condições de tempo e local em que ocorreu o ilícito penal, o relacionamento entre o agente e o ofendido. No caso em análise, a fraude ao contrato administrativo pode ter reflexos sobre diversas fontes e finalidades de recursos públicos, uma vez que as verbas utilizadas em contratações pelo Poder Público são destinadas a múltiplas áreas de interesse coletivo. Entre elas, destacam-se os recursos voltados à construção de infraestrutura, à execução de programas sociais, bem como ao fomento de políticas públicas nas áreas da cultura, educação e saúde. Em outras palavras, o orçamento público abrange um amplo espectro de destinações, e a sua indevida aplicação compromete diretamente a eficácia das políticas públicas e o atendimento das necessidades da população. No caso em tela, trata-se de uma verba oriunda do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação destinada ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), ou seja, uma verba de uma política pública que consiste no “repasse de recursos financeiros federais para o atendimento de estudantes matriculados em todas as etapas e modalidades da educação básica nas redes municipal, distrital, estadual e federal e nas entidades qualificadas como filantrópicas ou por elas mantidas, nas escolas confessionais mantidas por entidade sem fins lucrativos e nas escolas comunitárias conveniadas com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com o objetivo de contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo” conforme o site do Governo Federal” (https://www.gov.br/fnde/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/programas/pnae) . Uma verba destinada à alimentação dos estudantes do ensino básico, durante sua permanência na escola, reveste-se de um caráter mais sensível, razão pela qual merece maiores proteções do ordenamento jurídico brasileiro. Assim, no que tange a valoração negativa das circunstâncias do crime, perfilho do entendimento de que o uso ilícito de verbas ligados à educação, em especial, alimentação dos estudantes, justifica a elevação da pena-base. Por outro lado, as consequências do crime envolvem o conjunto de efeitos danosos provocados pelo crime, em desfavor da vítima, de seus familiares ou da coletividade. Dessa forma, é imprescindível ressaltar que a destinação dessa verba tem como objetivo fomentar a agricultura familiar no Brasil. De acordo com o Anuário Estatístico da Agricultura Familiar de 2024, a agricultura familiar no país ocupa apenas 23% das terras, mas abriga 3,9 milhões de estabelecimentos familiares, sendo responsável por 23% do valor bruto da produção agropecuária e por impulsionar a economia de 90% dos municípios com até 20 mil habitantes, conforme dados do Censo Agropecuário de 2017 do IBGE (https://ww2.contag.org.br/documentos/pdf/18459-2234957-anua%CC%81rio-agricultura-2024.pdf). Ou seja, ao deixar de adquirir produtos desses agricultores, o réu afetou um dos pilares essenciais da economia brasileira, particularmente em relação a municípios de pequeno porte, que dependem diretamente dessa atividade econômica. Como resultado, houve não apenas uma redução na movimentação financeira desses municípios — já de si limitada — como também um impacto negativo no desenvolvimento econômico local e na arrecadação de tributos para a Fazenda Pública. Assim, as consequências da conduta do réu extrapolam os limites normais do tipo penal, dado o impacto significativo que a ação teve sobre a sustentabilidade econômica dos pequenos municípios que dependem dessa política pública. Dentre as cidades que ficam em torno de Bebedouro/SP e que poderiam oferecer produtos frutos de agricultura familiar, podemos citar Terra Roxa (7.900 habitantes), Taquaral (2.600 habitante), Taiúva (6.500 habitantes), Taiaçu (5.600 habitantes), Pirangi (10.000 habitantes) e Monte Azul Paulista (18.000 habitantes), segundo dados do IBGE. Portanto, são cidades com menos de 20.000 habitantes e que dependem, de maneira significativa, da política pública do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Assim, no que tange à valoração negativa das consequências do crime, perfilho do entendimento de que o fato do Autor não ter comprado de agricultores familiares, mas sim de grandes produtores justifica a elevação da pena-base. F) Comportamento da Vítima: o comportamento da vítima em nada influenciou no cometimento do delito. Fixo ao réu CASSIO IZIQUE CHEBABI, na primeira fase da dosimetria, a pena base de 3 (três) anos 6 (seis) meses e 16 (dezesseis) dias de detenção e 72 (setenta e dois) dias-multa. 2ª FASE As atenuantes e agravantes atuam, primeiro estas, depois aquelas, na fração de um sexto, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, na ação penal originária nº 470. Reconheço a agravante do Art. 62, II, g “com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão”, uma vez que a expressão “violação de dever inerente a ofício, ministério ou profissão” se refere a atividades de natureza privada, sendo que profissão, como assevera Celso Delmanto, “é a atividade habitualmente exercida por alguém, como seu meio de vida". No caso, o cargo de Presidente da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar tem, dentre suas atribuições, a de fornecer informações verdadeiras ao Poder Público, em especial, nas contratações com ele celebradas. Assim sendo, a atuação do réu ofendeu os deveres inerentes ao seu cargo, ofício e profissão. Assim, fixa-se a pena intermediária em 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 18 (dezoito) dias de detenção e 84 (oitenta e quatro) dias-multa. 3ª FASE Não há outras atenuantes ou agravantes, nem causas de aumento ou diminuição de pena, pelo que torno definitiva a pena em 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 18 (dezoito) dias de detenção e 84 (oitenta e quatro) dias-multa, cada dia-multa no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo do fato, cujo montante será corrigido monetariamente a partir do trânsito em julgado da sentença. REGIME DE CUMPRIMENTO No que concerne ao regime de cumprimento da pena, o acusado não é reincidente e as circunstâncias subjetivas do art. 59 não justificam a fixação do regime mais gravoso. O regime inicial de cumprimento de pena é o SEMIABERTO (alínea “b” do §2º do art. 33 do Código Penal). SUBSTITUIÇÃO DA PENA Quanto à substituição por restritivas de direito, vejo que o acusado não preenche os requisitos objetivos para substituição, uma vez que a pena é superior a 4 anos. DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE Não há razões atuais que justifiquem a segregação cautelar do réu, razão pela qual lhe deve ser resguardado o direito de recorrer em liberdade. DISPOSITIVO Diante disso, com base nos motivos expendidos, e no mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A PRETENSÃO PUNITIVA e CONDENO o acusado CASSIO IZIQUE CHEBABI, qualificada nos autos, à pena privativa de liberdade por infringência ao artigo 96, inciso III, da Lei 8.666/93. Fixo a pena em 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 18 (dezoito) dias de detenção e 84 (oitenta e quatro) dias-multa, cada dia-multa no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo do fato, cujo montante será corrigido monetariamente a partir do trânsito em julgado da sentença a ser cumprida em REGIME INICIAL SEMIABERTO. O condenado poderá apelar em liberdade. Tendo em vista a Resolução CJF nº 947, de 15/04/2025, que revogou a Resolução CJF nº 408/2004, deixo de determinar o lançamento do nome do condenado no Rol Nacional dos Culpados. Com o trânsito em julgado da sentença: a) oficie-se ao TRE/SP para suspensão dos direitos políticos (art. 15, III, da Constituição Federal); b) oficie-se ao instituto de identificação para anotação de antecedentes; c) expeça-se guia de execução da pena; d) expeça-se o necessário para a destinação dos bens e produção dos efeitos da condenação, nos termos desta sentença. Custas pelo condenado. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Barretos/SP, na data da assinatura eletrônica [Assinado, datado e registrado eletronicamente] ALEX CERQUEIRA ROCHA JÚNIOR Juiz Federal Substituto
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Processo nº 5001381-71.2020.4.03.6002
ID: 308305148
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de Dourados
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5001381-71.2020.4.03.6002
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WAGNER DA SILVA SANTOS
OAB/MG XXXXXX
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PAULO ROGERIO DA MOTA
OAB/MS XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5001381-71.2020.4.03.6002 / 2ª Vara Federal de Dourados AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/MS REU: REGINALDO DE SOUZA SILVA Advogados do(a) REU: PAULO…
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5001381-71.2020.4.03.6002 / 2ª Vara Federal de Dourados AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/MS REU: REGINALDO DE SOUZA SILVA Advogados do(a) REU: PAULO ROGERIO DA MOTA - MS21969, WAGNER DA SILVA SANTOS - MG150422 S E N T E N Ç A 1 - RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia em face de REGINALDO DE SOUZA SILVA imputando-lhe a prática, em concurso material (art. 69 do CP), dos crimes previstos no art. 70 da Lei n. 4.117/62 e art. 33, caput, c/c art. 40, inc. I, da Lei n. 11.343/06. Em audiência de custódia, foi homologada a prisão em flagrante e concedida a liberdade provisória (33146852). Segundo a inicial (243525298): “No dia 01º de junho de 2020, por volta das 16h07, na Rodovia MS-156 (trevo de Amabai), zona rural do município de Caarapó/MS, REGINALDO DE SOUZA SILVA, de maneira consciente e voluntária, foi flagrado transportando, após ter importado do Paraguai, 5.215,583 quilogramas de maconha, substância de uso proscrito conforme Lista F1 do Anexo I da Portaria SVS/MS n.° 344/98. Além disso, REGINALDO DE SOUZA SILVA, de maneira consciente e voluntária, nessas mesmas condições de tempo e lugar, utilizou aparelho de telecomunicações (rádio transceptor) sem observância dos requisitos legais. Nas circunstâncias acima descritas, equipe de policiais da Polícia Rodoviária Federal, durante fiscalização na referida rodovia, abordou REGINALDO DE SOUZA SILVA quando conduzia o caminhão VW/19320, branco, placas ESU-8779, tracionando o semirreboque de placas AGV-0951. Ao realizaram abordagem do motorista, REGINALDO disse estava se deslocando com o caminhão vazio para o Paraná, a fim de realizar um reparo. Então, se deslocaram até o pátio do posto San Fernando, no km 207 da BR 163 e deram início a uma vistoria minuciosa. Ao baterem com a mão na parte da frente do tanque, os policiais perceberam que fazia som de tanque vazio, mas quando batiam a mão na parte traseira, o som era diferente, como se o tanque estivesse cheio. Embora REGINALDO continuasse negando conhecer qualquer irregularidade ou dispositivo de abertura de compartimento adrede, perceberam uns pingos de solda prendendo uma caixa ao lado da entrada do tanque. Após isso, com o uso de um pé de cabra arrancaram a caixa e tiveram acesso a tanque, onde havia grande quantidade de tabletes plastificados contendo material análogo à maconha. No intuito de abrandar o odor característico da droga, a carga estava embebida em "Criolina". Ouvido em sede policial (ID 33112731 - f. 7), REGINALDO fez uso de seu direito constitucional de permanecer em silêncio. De acordo com o auto de constatação prévia (f. 24-25 ID 33112731), a substância apreendida tratava-se de maconha, o que foi confirmado pelo laudo definitivo (f. 7-11 ID 37768148 e f. 22-26 ID 43790932). No curso das investigações, com a realização da perícia veicular (f. 15-21 ID 43790932), foi localizado o rádio transceptor que estava oculto no caminhão, o qual foi apreendido (f. 1 ID 51834202) e devidamente periciado (f. 4-9 ID 51834202), tendo sido constatado o seu funcionamento e potência.” A denúncia foi recebida em 06/09/2022 (id 251744481). Defesa ofertada pela defesa, reservando-se o direito de discutir o mérito com maior profundidade no curso da instrução criminal. Foram arroladas as mesmas testemunhas indicadas pela acusação (id 271107551). Designada audiência de instrução (293571234) Em audiência de instrução, ouviram-se as testemunhas arroladas e foi realizado o interrogatório do réu, com registros em mídia eletrônica (329273967). Na fase do art. 402 do CPP, a defesa requereu prazo para apresentação de diligencias adicionais. Apresentou sua manifestação em id. 329922256. Decisão de id. 353635380, indeferiu o pedido, especialmente pelo requerimento não se originar de circunstâncias apuradas na instrução. Intimado, o Ministério Público Federal deixou de apresentar memoriais. A Defesa, em alegações finais (366064966), requereu a absolvição do réu REGINALDO DE SOUZA SILVA de todas as imputações que lhe são feitas, com fundamento no art. 386, incisos IV, V ou VII, do Código de Processo Penal;. Subsidiariamente, a desclassificação do crime de tráfico de drogas para outra figura penal menos grave; O reconhecimento de causas de diminuição da pena; A fixação da pena no mínimo legal; A fixação de regime inicial de cumprimento de pena mais brando; A substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos; A concessão do sursis. Os autos vieram conclusos para a sentença. É o relatório. Fundamento e decido. 2 – FUNDAMENTAÇÃO 2.1 – QUESTÕES PRELIMINARES 2.1.1 – Ausência de advogado no inquérito Inicialmente, observo que a defesa teceu considerações acerca de um suposto prejuízo em razão de ter havido renúncia do advogado anterior durante o curso do inquérito policia, mas sem realização de requerimento específico. Não obstante, destaco que o inquérito policial possui natureza de procedimento administrativo investigativo não sendo necessária a participação de advogado constituído. Nenhum ato no qual a presença de advogado é necessária foi realizado sem representação. Ademais, observo que ao contrário do narrado, houve comunicação da renúncia ao réu no mesmo número indicado para contato pelo próprio réu (31-9285-0110), id. Num. 39777608 - Pág. 2) no momento de sua colocação em liberdade. Com o início da ação penal, o réu foi citado apresentando sua defesa por advogado constituído. Deste modo, não houve nenhuma irregularidade nos procedimentos realizados. Não há mais questões preliminares a enfrentar. 2.2 – MÉRITO A denúncia imputa ao réu a prática, em concurso material (art. 69 do CP), dos crimes previstos no art. 70 da Lei n. 4.117/62 e art. 33, caput, c/c art. 40, inc. I, da Lei n. 11.343/06 e art. 62, inc. IV, do CP: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa”; “Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito.(…) Art. 70. Constitui crime punível com a pena de detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, a instalação ou utilização de telecomunicações, sem observância do disposto nesta Lei e nos regulamentos. ” Passo à análise do conjunto probatório. 2.2.1 - Art. 33, caput, c/c art. 40, inc. I, da Lei n. 11.343/06 A materialidade do delito de tráfico de entorpecentes está demonstrada nos autos pelas seguintes provas: auto de prisão em flagrante (f. 1-7 ID 33112731); auto de apreensão (f. 8 ID 33112731); laudo preliminar de constatação (f. 24-25 ID 33112731); boletim de ocorrência n.° 1503292200601194700 (f. 26-30 ID 33112731); apreensão complementar (f. 7 ID 33232674); laudo definitivo de drogas (f. 7-11 ID 37768148 e f. 22-26 ID 43790932); laudo de perícia veicular (f. 15-21 ID 43790932); laudo pericial de informática (f. 28-33 ID 43790932); TERMO DE APREENSÃO Nº 1893316/2020 de celular e rádio transceptor (f. 1 ID 51834202); laudo eletroeletrônico (f. 4-9 ID 51834202); informação de polícia judiciária contendo análise dos dados armazenados em celular (f. 10-11 51834202), após devida autorização judicial (f. 1-3 ID 33232674). A autoria também está comprovada, visto que a prova colhida em Juízo, abrangendo oitiva de testemunhas e interrogatório do réu, corroborou as informações constantes nos autos do inquérito policial no sentido de que o acusado com vontade e consciência importou e transportou 5.215,583 quilogramas de maconha, provenientes do Paraguai. A testemunha Carlos José Souza Paschoal declarou, em suma, se recorda da abordagem, recebeu informações da polícia federal que um veículo com as características similares de tanque estava trazendo drogas, havia toneladas dentro do tanque, a carga iria para Minas Gerais, Reginaldo informou que deixou o caminhão e alguém devolveu pra ele, lavrou o BO com a participação de outros policias, a princípio ele negou o crime, depois confessou aos policiais, informou que precisava de dinheiro, ele entregou os documentos do caminhão e do semireboque, foi juntamente com Charles prestar depoimento, não é comum aplicar golpes em face dos motoristas, dificilmente ele não sabe da droga, nunca presenciou o motorista não saber, teria que entregar o caminhão e não ver o carregamento. A testemunha ouvida por requerimento da defesa, Charles Fruguli Moreira, declarou, em suma, se recorda da abordagem ao acusado, ele foi abordado na entrada de Carapó, após a suspeita de ilícito na carga foi realizado deslocamento ao pátio da PRF para verificar o veículo, não se recorda de mais detalhes. A informante Rosemary de Souza Silva e Silva, irmã do acusado, ouvida por requerimento da defesa, declarou, em suma, ficando sabendo que seu irmão foi preso no dia seguinte ao da prisão, ele é caminhoneiro, seu irmão passou um contato de um advogado para negociar com ele, não conseguiu o contato com ele após transferir o dinheiro. A testemunha ouvida por requerimento da defesa, Manoel Reginaldo dos Santos Almeida, declarou, em suma, ser motorista, conhece o réu da profissão, não tem conhecimento de condutas desabonadoras do acusado, já levou cargas para Ponta Porã, usa um aplicativo fretebrás para pegar cargas, nunca trabalhou com caminhão tanque, ele transporta ferragem e grãos, não tem ciência dele usar caminhão tanque, conhece o aparelho de comunicação entre caminhões, era comum antes do WhatsApp, o motorista é quem escolhe o frete no aplicativo, o réu informou que foi prestar um favor no dia dos fatos, o caminhão que puxava o tanque teve um problema e ele prestou auxílio, ele disse que não sabia da droga. Em seu interrogatório judicial, o acusado declarou, em suma, ser motorista, veio carregado do Paraná para Dourados, após descarregar no posto se informou sobre um local de pneus mais baratos, foi até uma borracharia em Ponta Porã, quanto estava na borracharia foi abordado por duas pessoas que pediram para ele buscar um caminhão que estava quebrado. Ao pegar o caminhão, foi preso, não sabia que havia droga no veículo. Saiu da borracharia em Ponta Porã e foi buscar o semireboque. Indagado sobre ter sido abordado numa rodovia que liga Amambai até Carapó, distante de Ponta Porã, disse que não conhecia a região, que tinha documentação do frete levado até Dourados, mas não tem ele pra apresentar, entregou a mercadoria no Ceasa, não ia com frequência para o MS, não sabe de quem era a carga, nunca disse que sabia da droga. Indagado sobre não ter contado essa versão ao delegado, disse que não aceitaram sua versão, não se recorda do interrogatório policial, não viu nem a droga mais a mostra, nem a que estava no tanque, Não conhece Edmilson e André Luís, Indagado sobre estar sozinho no momento da abordagem, informou que as pessoas que o levaram até o caminhão não estavam nesse momento, tinham ido na frente, não acessou o caminhão depois da apreensão, documentos teriam ficado no caminhão. Analisando as provas, conclui-se pela autoria do acusado. Apesar de sua tese defensiva de que apenas realizou um favor, sem conhecimento da existência das drogas, o que resultaria em erro de tipo ou ausência de dolo e, ainda, que não haveria provas para a condenação, as provas existentes permitem concluir pela sua vontade e consciência na pratica do crime, não tendo havido erro sobre nenhum dos elementos constitutivos do tipo legal (falsa percepção da realidade). Ou seja, o cotejo das provas permite concluir pelo conhecimento do transporte da droga e, portanto, pela existência de autoria e dolo quanto a conduta imputada. Inicialmente, destaco o depoimento dos condutores colhidos perante a autoridade policial e confirmados em juízo no sentido de que o acusado foi flagrado dirigindo veículo com mais de cinco toneladas de droga. No mais, apesar de o acusado negar que o semireboque era seu e que não sabia da droga ali colocada, infirma sua versão a a existência de Certificado de Registro de Veículo nos autos ( id 84412915 - Pág. 15), assinado por autenticidade em Cartório, em data anterior ao flagrante, aproximadamente 45 dias antes dos fatos, em 14 de abril de 2020, apontando a aquisição da Carreta S/Reboque/Tanque de Placa AGV-0951, Renavam 00668965959 pelo réu da proprietária formal do veículo A. L. Magalhães de Assis Eireli. O referido documento, além de ter sido realizado em cartório, possuindo fé pública, encontra corroboração mediante transferências realizadas e nos demais depoimentos colhidos pela autoridade policial no curso do inquérito, em especial de Edmilson Paludo e de Reginaldo Aparecido de Abreu. A cadeia de documentos e extratos apresentadas demonstram, ao final, ter o sr. Edmilson Paludo efetuado a venda para Reginaldo Souza Silva, conforme detalhou a autoridade policial em seu relatório final do inquérito. No mesmo sentido, observa-se que o telefone apreendido com o réu no momento do flagrante (laudo eletroeletrônico (f. 4-9 ID 51834202) demonstra que no dia dos fatos o mesmo seguia orientações e realizava conversa com celular registrado no Paraguai, em contato com o codinome "MARIDÃO", reforçando o seu conhecimento e participação no crime, bem como a origem do entorpecente e a participação em conjunto com terceiros não identificados, provavelmente proprietários do entorpecente. Apesar de o réu também negar que esse número era seu, não há como negar a apreensão do telefone em seu poder, demonstrando a titularidade das mensagens. No mais, é praxe a utilização de chip diverso do de sua titularidade em empreitadas criminosas de grande vulto, não havendo como acolher a versão de que não trocou as referidas mensagens. O celular foi apreendido no caminhão em que o acusado dirigia sozinho, não havendo como atribuir o aparelho para terceiros. Ao final, ressalto que a versão do réu é por demais inverossímil, eis que, segundo ele, teria desengatado sua carreta e a deixado em Ponta Porã se deslocando para estrada que fica mais de 120 quilômetros de distância, sendo que somente para chegar em Caarapó seriam mais de 2 horas de viagem, em região de fronteira, que segundo o mesmo, era desconhecida por ele, para pegar uma carreta tanque de dois desconhecidos, sem nenhuma contrapartida, em estrada que foge as rotas principais de transporte, sendo a região notoriamente conhecida como rota de tráfico internacional de entorpecentes. Ao final, foi flagrado dirigindo sozinho, entre Amambai e Caarapó. Igualmente, indagado sobre não ter contado essa versão ao delegado, bem como não ter apresentado os documentos que alegava possuir, disse que não aceitaram sua versão, depois que não se recorda do interrogatório policial registrado nos autos, o que causa estranheza. Como se vê, a história apresentada não possui lógica para que se possa concluir pela sua veracidade, bem como está em contradição com todo o conjunto probatório acima narrado. Portanto, não há como refutar a procedência da acusação. Igualmente, inexistem dúvidas quanto à transnacionalidade do tráfico, considerado que a grande quantidade de droga de origem paraguaia (5.215,583 quilogramas de maconha) foi apreendida no caminhão dirigido pelo acusado na região de fronteira com o Paraguai. O teor das conversas com número de celular Paraguaio também confirma a transnacionalidade. Logo, há de incidir a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006. Não se verificam causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade. Cumpre pontuar que, conforme já decidido pelo e. Tribunal Regional Federal da Terceira Região, “Dificuldades financeiras são bastante comuns na sociedade contemporânea, mas isso não justifica que alguém cometa qualquer crime para superá-las, ainda mais o tráfico (transnacional ou não) de drogas, conduta com altíssimo grau de reprovação social. Aceitar o cometimento de crime como justificativa para satisfação de necessidades individuais (superar dificuldades financeiras, p. ex.) significaria abrir mão do mínimo sentido de civilidade e de organização social, na medida em que cada ser humano passaria a satisfazer suas próprias necessidades a qualquer custo, o que levaria a evidente caos social.” (TRF3 - 0010260-10.2011.4.03.6119 - DATA:04/12/2017) Sendo assim, declaro o réu incurso nas penas do artigo 33, caput, c.c. art. 40, I, da Lei nº 11.343/06 pela importação e transporte de 5.215,583 quilogramas de maconha, provenientes do Paraguai. 2.2.2 - Art. 70 da Lei 4.117/62 A materialidade do delito de utilização de telecomunicações, sem observância do disposto nesta Lei e nos regulamentos está demonstrada nos autos pelas seguintes provas: (a) auto de prisão em flagrante (f. 1-7 ID 33112731); auto de apreensão (f. 8 ID 33112731); laudo preliminar de constatação (f. 24-25 ID 33112731); boletim de ocorrência n.° 1503292200601194700 (f. 26-30 ID 33112731); apreensão complementar (f. 7 ID 33232674); laudo de perícia veicular (f. 15-21 ID 43790932); laudo pericial de informática (f. 28-33 ID 43790932); TERMO DE APREENSÃO Nº 1893316/2020 de celular e rádio transceptor (f. 1 ID 51834202); laudo eletroeletrônico (f. 4-9 ID 51834202); informação de polícia judiciária contendo análise dos dados armazenados em celular (f. 10-11 51834202), após devida autorização judicial (f. 1-3 ID 33232674); e LAUDO Nº 087/2021 - LAUDO DE PERÍCIA CRIMINAL FEDERAL (ELETROELETRÔNICOS); A perícia técnica atestou a funcionalidade do transceptor, o qual estava configurado inicialmente para operar no canal “9”, que corresponde à frequência de 27,065 MHz (vinte e sete mega-hertz e sessenta e cinco milésimos) e não possui o Certificado de Homologação emitido. Apesar da materialidade do crime, não foi produzida prova acerca da efetiva utilização do equipamento, o que somada a existência de comunicação via celular já mencionada na análise do crime anterior gera duvida razoável quanto a efetiva utilização do equipamento. Impõe-se a absolvição desse crime. 2.3 - DOSIMETRIA Passo à dosimetria da pena, conforme dispõe o art. 68 do Código Penal. 2.3.1 – Pena base do crime de tráfico A personalidade e culpabilidade do agente não destoam do normal à espécie; os antecedentes são favoráveis, dada a inexistência de registro de condenação penal anterior transitada em julgado, e não se tem notícia de conduta social inadequada, para além dos fatos objeto da presente ação penal, sendo tais circunstâncias favorável ao réu. Da mesma forma, não se identificam nos motivos do crime de tráfico justificativa (ganho financeiro) para reprimenda superior ao nível mínimo estabelecido em lei e o mesmo se diga em relação às consequências do crime e ao comportamento da vítima, já que a droga foi apreendida antes de atingir seu destino final, segundo procedimento que não se distingue do padrão identificado em situações da espécie. No que diz respeito às circunstâncias do delito, merecem valoração negativa, considerando a ocultação das drogas em veículo preparado para o crime, o que demonstra a intenção de dificultar a fiscalização. Nesse ponto, ressalto que o Superior Tribunal de Justiça entende que "a forma utilizada para esconder a droga em compartimentos ocultos de veículo autoriza a valoração negativa das circunstâncias do crime de tráfico de entorpecentes." ( AgRg no HC 637.676/MS , relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, julgado em 21/9/2021, DJe 24/9/2021) Aumento 10 meses da pena base. No mais, observando-se o art. 42 da Lei nº 11.343/06, há de se constatar que foram aprendidos com o réu 5.215,583 quilogramas de maconha, mais de 5 toneladas da droga, quantia significativa, de valor elevado e bem acima de casos análogos da mesma espécie. Aumento 5 anos da pena base. Destaco aqui haver proporcionalidade no aumento, considerando que não há, na primeira fase, um critério matemático para a escolha das frações de aumento. Ao contrário, é garantida a discricionariedade motivada do julgador de acordo com as peculiaridades do caso e a grande quantidade da droga justifica esse aumento, havendo obediência ao art. 42 da Lei nº 11.343/06. No mais, tem-se que o aumento guarda proporcionalidade com a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região: “(…) o acusado transportava 5.000,00 Kg (cinco toneladas) de maconha. 2. Dosimetria da pena . 1ª Fase. Com base nos critérios adotados por esta Turma, o aumento a pena-base deve ser fixado em dobro, tendo em vista que a droga apreendida corresponde a aproximadamente 5000,00 kg (cinco toneladas) de maconha, conforme consta da denúncia. (…)” (TRF-3 - ApCrim: 50014384620214036005 MS, Relator.: Desembargador Federal PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES, Data de Julgamento: 10/05/2022, 5ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 13/05/2022) Sendo assim, fixo a pena base em 10 anos e 10 meses de reclusão e pagamento de 1.080 dias-multa. 2.3.2 – Atenuantes e agravantes Não há agravantes e atenuantes. 2.3.3 – Causas de aumento e diminuição de pena Conforme fundamentação acima, aplico ao réu a causa de aumento de pena da transnacionalidade (art. 40, I, Lei nº 11.343/06), com a incidência da elevação no patamar mínimo de 1/6 (um sexto). Fica a pena em 12 anos 7 meses e 20 dias de reclusão e pagamento de 1.260 dias-multa. Não há outras causas de aumento de pena. O art. 33, § 4º, da Lei de Entorpecentes, prevê: “Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.” A jurisprudência estabelece parâmetros na fixação da margem de redução a ser aplicada em concreto, esclarecendo que a redução máxima, no patamar de dois terços, deve ser reservada aos casos de menor potencialidade lesiva. Ademais, a condição de transporte de droga para organizações criminosas não afasta a aplicação do referido § 4º, mas permite a redução em patamar reduzido, considerando que o transportador tem consciencia de estar a servico de um grupo dessa natureza, o que nao pode ser desprezado. Nesse sentido: “A condição de 'mula' do tráfico, por si só, não comprova que o acusado integra organização criminosa e, por via de consequência, não se presta a fundamentar a não aplicação da minorante do tráfico privilegiado, mas, tão-somente, justifica a aplicação da referida causa de diminuição em seu patamar mínimo, de 1/6 (um sexto). STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 2.482.593-PI, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 18/6/2024 (Info 21 – Edição Extraordinária).” No caso, verifico que os requisitos legais para concessão do privilégio encontram-se preenchidos visto que o agente é primário, detém bons antecedentes e não há prova que se dedique a atividades criminosas ou que efetivamente integre organização criminosa. No tocante ao patamar de diminuição do § 4º, entendo, em consonância com a jurisprudência acima citada, que impõe-se a redução em grau mínimo considerando o transporte da droga a serviço de organização criminosa. As circunstâncias já mencionadas na análise das circunstâncias judiciais deixam clara essa contribuição, com o transporte de mercadoria de alto valor a serviço de terceiros. Sendo assim, consideradas as especificidades do caso concreto, aplico a redução do art. 33, parágrafo 4º, da Lei no. 11.343/06 no nível de 1/6. Não há outras causas de diminuição de pena a serem analisadas. Logo, fica o réu condenado à pena privativa de liberdade de 10 anos, 6 meses e 12 dias de reclusão e pagamento de 1.050 dias-multa. Inexistindo nos autos referência objetiva acerca da situação econômica da parte condenada, fixo o valor do dia-multa no mínimo legal em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, valor a ser atualizado monetariamente, na forma do § 2º do art. 49 do CP, sendo que a liquidação da pena de multa deve se fazer em fase de execução. 2.3.4 – Regime de cumprimento da pena O cumprimento da pena dar-se-á inicialmente em REGIME FECHADO, mostrando-se o regime adequado ao se considerar o quantum de pena fixado e as circunstâncias do art. 59 do CP (art. 33, § 2º e § 3º do CP). Incabível a detração prevista no art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal, pois o réu não ficou preso preventivamente por decisão vinculada ao presente feito. Ante a quantidade de pena, incabível a substituição ou suspensão da pena, nos termos dos artigos 44 e 77 do Código Penal. 2.3.5 – Das cautelares Mantenho as cautelares fixadas na decisão de id. 33146852 e concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade. 2.3.6 – Pena de inabilitação para dirigir veículo A pena de inabilitação para dirigir veículo deve ser aplicada como medida excepcional. No caso, impõe-se a sua aplicação, com fundamento no art. Art. 92, III, do Código Penal, eis que está demonstrada, de forma concreta, a imprescindibilidade de tal medida, dada a gravidade da conduta praticada conforme as circunstâncias judiciais já mencionadas na fundamentação da autoria e da dosimetria. Portanto, declaro a inabilitação do réu para dirigir veículo automotor, pelo prazo da pena imposta, nos termos do artigo 92, inciso III, do Código Penal. 3 – DISPOSITIVO 3.1. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da presente ação penal e CONDENO REGINALDO DE SOUZA SILVA - CPF: 088.054.447-31, pela prática do delito previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, inc. I, da Lei n. 11.343/06, a uma pena privativa de liberdade de 10 anos, 6 meses e 12 dias de reclusão e pagamento de 1.050 dias-multa, cada dia-multa no patamar de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato delituoso, devidamente atualizado. No mais, absolvo o réu da imputação da prática do delito previsto no Art. 70 da Lei 4.117/62, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal. O cumprimento da pena dar-se-á inicialmente em REGIME FECHADO. O(a) ré(u) poderá recorrer em liberdade. Deixo de fixar valor mínimo para a indenização civil, por inaplicável à espécie (art. 387, IV, CPP) 3.2. Condeno o(s) réu(s) ao pagamento das custas processuais (art. 804, CPP). 3.3. Decreto perdimento do veículo apreendido (Caminhão Trator, marca/modelo VW/19.320 CLC TT, ano/modelo 2011/2011, cor branca, placas ESU-8779 e b) Semirreboque marca/modelo REB/KRONE TANQUE, ano/modelo 1997/1997, cor cinza, placas AGV-0951), utilizado para o transporte da droga/ realização do serviço de batedor. Tendo em vista que já foi autuado incidente de alienação antecipada (autos 5000680-76.2021.4.03.6002), após o trânsito em julgado, oficie-se à Senad para conversão do procedimento em alienação definitiva. 3.4. A droga apreendida já foi incinerada (Num. 37768148 - Pág. 4). Sem prejuízo, determino a destruição das frações da droga guardadas para contraprova. Após o trânsito em julgado, comunique-se à Delegacia de Polícia Federal/Civil para providências. 3.5. Decreto o perdimento dos celulares (auto de apreensão ID 33112731, f.8 item 5 e (ID 51834202, f. 1, item 2) utilizados como instrumento do crime, determinando sua destruição, por se tratar de bem cuja tecnologia rapidamente se torna obsoleta. Tendo em vista que não há informações acerca do recebimento do referido bem neste Juízo, após o trânsito em julgado, comunique-se a DPF/DRS para destruição, devendo informar nos autos a providências adotadas. Caso recebido, comunique-se ao Setor de Depósito para providências. 3.6. Tendo em vista se tratar de produto/proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso, decreto o perdimento do valor apreendido (ID 33173170 - Pág. 2) em poder do acusado, e sua reversão ao FUNAD. (ID 51834202, f. 1, item 2) 3.7. Tendo em vista que não mais interessa ao processo, determino a destruição dos Documentos apreendidos (ID 33232674, f. 7, item 2 e ID 33112731, f.8 item 6), com fulcro no art. 291, parágrafo único, do Provimento CORE 01/2020. Oportunamente, comunique-se ao Setor de Depósito para providências. 3.8. Tendo em vista que não é homologado pela Anatel, decreto o perdimento e determino a destruição do rádio transceptor apreendido (ID 51834202, f. 1, item 1), nos temos do art. 91, II, “a”, do Código Penal e art. 291 do Provimento CORE 01/2020. Oportunamente, comunique-se ao Setor de Depósito para providências. 4 – PROVIDÊNCIAS FINAIS Após o trânsito em julgado, tomem-se as seguintes providências: 4.1. lance-se o nome da parte ré no rol dos culpados; 4.2. comunique-se ao Departamento competente responsável pelo registro de estatística e dos antecedentes criminais; 4.3. oficie-se à Polícia Federal, autorizando a destruição de material entorpecente (inclusive, eventual material para contraprova); 4.4. expeça-se guia de execução definitiva, sendo que, na hipótese de cumprimento de pena privativa de liberdade, a guia deverá ser expedida após certificação quanto ao recolhimento do réu à prisão. 4.5. Oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral para os fins previstos no artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. 4.6. Inclua-se no sistema RENAJUD a inabilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo da pena imposta, com fulcro no artigo 92, III, do CP. Cópia da presente sentença servirá para as comunicações acima referidas (ofícios/carta precatória). Expeça-se o necessário para cumprimento da decisão e façam-se as anotações de estilo. Ultimadas as diligências devidas, arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. DOURADOS, 25 de junho de 2025.
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Processo nº 5000405-25.2020.4.03.6112
ID: 300729175
Tribunal: TRF3
Órgão: 3ª Vara Federal de Presidente Prudente
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5000405-25.2020.4.03.6112
Data de Disponibilização:
17/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CELSO CORDEIRO
OAB/SP XXXXXX
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MARCOS HAMILTON BONFIM
OAB/SP XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5000405-25.2020.4.03.6112 / 3ª Vara Federal de Presidente Prudente AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP REU: EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, PEDRO LUIZ…
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5000405-25.2020.4.03.6112 / 3ª Vara Federal de Presidente Prudente AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP REU: EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA INVESTIGADO PUNIBILIDADE EXTINTA: JOSE CARLOS STABILLE CRUZ, CARLOS CORDEIRO MORAES JUNIOR, ENISE VALERIA BEZERRA DA CUNHA, RENAN ENDRIGO DOS SANTOS SILVA, SAMANTA CARNEIRO DE OLIVEIRA INVESTIGADO INQUÉRITO ARQUIVADO: SILVANA BUENO CABREIRA Advogado do(a) REU: MARCOS HAMILTON BONFIM - SP350833 Advogado do(a) REU: CELSO CORDEIRO - SP323527 S E N T E N Ç A Vistos, em sentença. 1. Relatório O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente ação penal em face de EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA como incurso no artigo 171, §3º (9 vezes), c.c. artigo 29 “caput”, ambos do Código Penal, e PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA e LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES como incursos no artigo 171, §3º e artigo 29 “caput”, ambos do Código Penal (id 335965212, de 21/08/2024). Segundo a peça acusatória, nos anos de 2012 a 2020, o acusado EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, com consciência e vontade, utilizou das empresas inativas JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS e JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES LTDA, para a inserção de vínculos empregatícios falsos nos sistemas oficiais, vínculos esses que permitiram o recebimento de benefícios previdenciários e de seguro-desemprego por parte dos denunciados, os quais tinham total conhecimento da ilicitude dos registros e dos indevidos pagamentos decorrentes de benefícios previdenciários e de seguro- desemprego, quando nunca houve nenhuma relação empregatícia. De acordo com o Relatório de Informação nº 058/NUINT-SP/CGINT/SUCOR/SEPRT/ME, de 20 de julho de 2020, foram identificados 18 (dezoito) benefícios com indícios de irregularidades, estimando-se um prejuízo na cifra de R$ 1.923.937,96 (um milhão, novecentos e vinte e três mil, novecentos e trinta e sete reais e noventa e seis centavos) (id. 39044105 - Pág. 74/76). O feito foi redistribuído em razão da implantação do juiz das garantias na Justiça Federal de Primeiro Grau da 3ª Região (id 335995077, de 22/08/2024). A denúncia foi recebida em 06 de setembro de 2024, oportunidade em que foi reconhecida a prescrição e declarada extinta a punibilidade em face de JOSÉ CARLOS STABILLE CRUZ, CARLOS CORDEIRO MORAES JUNIOR, ENISE VALÉRIA SILVA BEZERRA, RENAN ENDRIGO DOS SANTOS SILVA E SAMANTA CARNEIRO. Na ocasião, também foi determinado o arquivamento do feito em relação à investigada SILVANA BUENO CABREIRA e desmembrado o feito ante a homologação do Acordo de Não Persecução Penal - ANPP em relação às investigadas BENEDITA LIDIONETE FERRARI NESTI E MARLENE KIYOKO TAKENOBU (id 337106283, de 06/09/2024). Antecedentes criminais juntados nos ids 338032521, 338032540, 338190700 e seguintes. O réu PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA foi regularmente citado (id 339121630), tendo apresentado defesa prévia, por meio de advogado constituído (id 341050814). Juntou documentos (id 341050818). EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA foi devidamente citado (id 341574368), sendo-lhe nomeado defensor dativo (id 346411508), o qual apresentou defesa (id 347446257). A ré LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES foi citada (id 345377267) e apresentou resposta à acusação no id 345812348, por meio de advogado constituído. O Ministério Público Federal apresentou proposta de Não Persecução Penal à LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES (id 348734982) e réplica na manifestação de id 348734982. Ante o aceite da ré (id 351704006), o acordo foi homologado e determinado o desmembramento do feito em relação a ela (id 358779049). Na mesma oportunidade, foi afastou as hipóteses de absolvição sumária em face dos demais acusados e designada audiência de instrução. Na fase instrutória do feito foi realizada audiência em 15 de maio de 2025, sendo ouvidas cinco testemunhas comuns e os réus interrogados. Oportunizada a fase do art. 402 do CPP, as partes nada requereram (id 364174766). Em alegações finais, o Parquet requereu a condenação dos acusados por entender comprovados os fatos narrados na denúncia (id 364976492). A defesa do réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA requereu a aplicação da atenuante da confissão e o reconhecimento da prescrição do fato VII, tendo em vista os fatos terem ocorrido entre dezembro de 2012 a março de 2013 (id 366384902). O réu PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA, por sua vez, apresentou alegações finais, requerendo a absolvição do acusado por se tratar de fato atípico, bem como pela ausência de provas de que concorreu para a prática do crime (id 366409222). A autoridade policial solicitou a destinação legal dos materiais apreendidos (id 367630947). Os autos vieram conclusos para sentença. É o relatório. DECIDO. 2. Decisão/Fundamentação Ao acusado EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA foram imputadas as condutas previstas no artigo 171, § 3º, do Código Penal, pois teria, mediante meio fraudulento, com inserção de dados, obtido para si e terceiras pessoas, 18 (dezoito) benefícios com indícios de irregularidades, estimando-se um prejuízo à União na cifra de R$ 1.923.937,96 (um milhão, novecentos e vinte e três mil, novecentos e trinta e sete reais e noventa e seis centavos). Já o acusado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA teria obtido vantagem ilícita decorrente do recebimento indevido de benefício previdenciário NB 42/1567375887 - Aposentadoria por tempo de contribuição, no período de 04/12/2014 a 31/12/2020, totalizando um prejuízo de R$ 168.007,60 (cento e sessenta e oito mil e sete reais e sessenta centavos). O tipo penal do estelionato se encontra vazado, nos seguintes termos: Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena – reclusão de um a cinco anos, e multa. (...) 2º . Nas mesmas penas incorre quem: (...) 3º. A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência. Com efeito, pela redação do artigo 171, “caput”, do Código Penal, configura estelionato “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento” (grifei). Nesse caso, a figura típica do delito de estelionato somente estará completa quando o agente se utilizar de artifício, ardil ou outro meio fraudulento. Quando este meio fraudulento (em qualquer de suas formas) se traduzir em falsidade, constituindo o crime-meio para alcançar o crime-fim (estelionato), o agente somente responderá por este último, pois “o estelionato absorve a falsidade, quando esta foi o meio fraudulento empregado para a prática do crime-fim que era o estelionato” (Súmula n. 17 do Superior Tribunal de Justiça). Lembre-se que o crime que se imputa ao acusado é o de estelionato, com o aumento de pena previsto no § 3º, por ter sido praticado em detrimento de Fundo de natureza pública. Para que o estelionato se configure é necessário: a) o emprego, pelo agente, de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento; b) induzimento ou manutenção da vítima em erro; 3º) obtenção de vantagem patrimonial ilícita pelo agente; 4º) prejuízo alheio (do enganado ou de terceira pessoa). Necessário, portanto, que haja o duplo resultado (vantagem ilícita e prejuízo alheio) relacionado com a fraude e o erro que esta provocou. Trata-se de crime que pode ser cometido por qualquer pessoa, cujo objeto jurídico é o patrimônio. O tipo subjetivo do crime exige o dolo, com especial fim de agir, qual seja, obter vantagem ilícita em prejuízo alheio. Não há, portanto, crime culposo. Da mesma forma, mister para a configuração do crime que a vantagem obtida seja ilícita e que cause prejuízo à vítima. O crime consuma-se no momento e local em que o agente obtém vantagem ilícita. Da Autoria e Materialidade do Crime de Estelionato 2.1. Em relação ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA De acordo com o Relatório de Informação nº 058/NUINT-SP/CGINT/SUCOR/SEPRT/ME, de 20 de julho de 2020, foram identificados 18 (dezoito) benefícios com indícios de irregularidades, estimando-se um prejuízo na cifra de R$ 1.923.937,96 (um milhão, novecentos e vinte e três mil, novecentos e trinta e sete reais e noventa e seis centavos) (id. 39044105 - Pág. 74/76). A fraude consistia na inserção de vínculos falsos no CNIS através da transmissão de GFIP extemporâneas, utilizando-se de empresas inativas e inidôneas (JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS e JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES LTDA), para segurados da previdência social, com a finalidade posterior de obterem benefícios previdenciários, normalmente aposentadorias por idade (B41) e de tempo de contribuição (B42), auxílios por incapacidade temporária (B31) e permanente (B32), bem como "Pensões por Morte Previdenciária (B21), embasadas com estas falsas relações empregatícias, inclusive com documentação falsa que instruíam os processos concessórios. A acusação denunciou o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA por nove dos fatos apurados pela investigação policial. Considerando que todos os fatos possuíam o mesmo “modus operandi”, para fins de exemplificação, transcrevo os fatos imputados ao réu, resumidamente, apenas com o benefício concedido, nome do beneficiário, vantagem ilícita e a fraude realizada: 1. NB 42/152.098.440-2 - Aposentadoria por Tempo de Contribuição, concedido a beneficiária MARLENE KIYOKO TAKENOBU, no período de 02/03/2014 a 30/09/2020, totalizando um prejuízo de R$ 102.377,92, em detrimento do INSS - anotação de falsos registros de trabalho com as empresas JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 01/04/1992 a 30/06/2002 (10 anos e 3 meses); JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS, no período de 01/07/2009 a 30/11/2009 (5 meses) e; JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 01/02/2010 a 30/09/2013; 2. NB 41/1589949944 - Aposentadoria por Idade, concedido a beneficiária Benedita Lidionete Ferrari Nesti, no período de 17/12/2015 a 30/11/2020, totalizando um prejuízo de R$ 77.135,85 (setenta e sete mil, cento e trinta e cinco reais e oitenta e cinco centavos), em detrimento do INSS - anotação de falso registro de trabalho com a empresa JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS ME, no período de 03/01/2004 a 30/04/2009 (64 contribuições); 3. NB 42/1567375887 - Aposentadoria por tempo de contribuição, concedido ao imputado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA, no período de 04/12/2014 a 31/12/2020, totalizando um prejuízo de R$ 168.007,60 (cento e sessenta e oito mil e sete reais e sessenta centavos), em detrimento do INSS - anotação de falso registro de trabalho com a empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 02/01/2005 a 15/12/2005 (12 contribuições); 4. requerimento nº 1307396176 – seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de R$ 1.304,63 (mil, trezentos e quatro reais e sessenta e três centavos) cada, totalizando R$ 5.218,52 (cinco mil, duzentos e dezoito reais e cinquenta e dois centavos) em detrimento CEF, MTE e FAT – anotação falsa de registro como empregado da empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS LTDA, com data de admissão em 02/12/2013 e data de demissão em 21/05/2014; 5. requerimento nº 7729776215 – seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de R$ 1.464,00 (mil, quatrocentos e sessenta e quatro reais) cada, totalizando R$ 5.856,00 (cinco mil, oitocentos e cinquenta e seis reais), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregado empresa JOÃO APARECIDO COSMÉTICOS-ME, com data de admissão em 17/11/2015 e data de demissão em 07/01/2016; 5. requerimento nº 1307396179 – seguro-desemprego concedido à LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES - 03 parcelas do benefício do seguro-desemprego no valor de R$ 1.385,91 (mil, trezentos e oitenta e cinco reais e noventa e um centavos) cada, totalizando R$ 4.157,73 (quatro mil, cento e cinquenta e sete reais e setenta e três centavos), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregada empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS LTDA, com data de admissão em 15/08/2014 e data de demissão em 09/02/2015; 7. requerimento nº 1243140239 - seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de benefício do seguro-desemprego no valor de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais) cada, totalizando R$ 2.880,00 (dois mil, oitocentos e oitenta reais), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregado da clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, com data de admissão em 02/04/2012 e data de demissão em 01/11/2012; 8. requerimento nº 7744417734 - seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 3 prestações de benefício do seguro-desemprego no valor de R$ 1.136,00 (mil, cento e trinta e seis reais) cada, totalizando R$ 3.408,00 (três mil, quatrocentos e oito reais), em detrimento CEF, TEM e FAT - anotação falsa de registro como empregado da clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, com data de admissão em 27/03/2017 e data de demissão em 10/05/2017; 9. requerimento nº 7768694190 - seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de benefício do seguro-desemprego, totalizando R$ 4.127,00 (quatro mil, cento e vinte e sete reais), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregado da clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, com data de admissão em 31/07/2019 e data de demissão em 20/08/2019; Em todos os fatos o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA foi o responsável pela inserção indevida de dados de vínculos empregatícios de diferentes pessoas físicas ou de si próprio e as empresas JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS e JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES LTDA (inativas à época dos registros), bem como na clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, gerando benefícios previdenciários ou seguro-desemprego indevidos. O réu transmitiu diversas GFIPS para as empresas mencionadas, sempre como responsável pelas informações, além de se utilizar de carimbos para a falsificação de documentos, bem como livros de registro de empregados nas empresas JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME (id. 37631270 - Pág. 11/12), estando devidamente comprovadas as materialidades dos fatos. A autoria também é inconteste, tendo o réu, inclusive, confessado os fatos. Em seu interrogatório judicial (id 364317107), o réu reconheceu que fez tais inserções indevidas (em geral, de quatro a doze contribuições), porém esclareceu que as contribuições foram recolhidas. Disse que estava desempregado e que nunca cobrou para fazer a inserção dos dados, mas apenas sobre a concessão do benefício. Relatou que as pessoas que o procuravam, sabiam que era necessário algum período para completar o benefício. Reconheceu que usou o certificado do Luiz Roberto para receber o seguro desemprego, bem como que nunca trabalhou para essas empresas. Disse que, na época não era necessário certificado digital para as transmissões da GFIP e que tinha acesso às contas do JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME, porque fazia o recolhimento do INSS para os empresários. Por fim, explanou que não vendia a inserção de vínculos falsos e que seu honorário era de um a dois benefícios concedido. As testemunhas BENEDITA LIDIONETE FERRARI SESTI e MARLENE KYOKO TAKENOBU afirmaram que contrataram o réu para realizar o requerimento de aposentadoria e que foi incluído vínculos de trabalho inverídicos em seus documentos. Confirmaram que nunca trabalharam para as empresas JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME (id 364315682 e 364315691). Já as testemunhas JOÃO APARECIDO BARBOSA e LUIZ ROBERTO FLORIANO FILHO, proprietários da empresa João Aparecido Barbosa Cosmético ME e da clínica odontológica, respectivamente, afirmaram que o réu EVANDRO era contratado como contador de suas empresas e declararam como inverídicos os registros empregatícios vinculados a eles (id 364315676 e 364317102). Por fim, a testemunha SABRINA ELOÍSA DE FREITAS SOARES, delegada da Polícia Federal, responsável pelas investigações, relatou que receberam uma denúncia da procuradoria geral em que Evandro atuava como intermediário, uma vez que pedia benefícios previdenciários para algumas pessoas e, observaram que todas elas possuíam vínculos com as mesmas pessoas jurídicas, gerando benefícios indevidos, com prejuízo ao INSS em torno de 2 milhões. Relatou que as investigações apuraram que Evandro continuou prestando serviços para as pessoas jurídicas (JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME) mesmo após o encerramento de suas atividades, escriturando vínculos empregatícios falsos para completar o tempo de serviço dessas pessoas, bem como transmitia GFIPs em nome dessas empresas. A transmissão dessas guias e informações eram realizados por EVANDRO, constando seus dados como o de responsável pelas informações, como por exemplo, seu e-mail (id 364315697). Desse modo, resta devidamente comprovado que o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, obteve, para si ou para outrem, vantagem ilícita (benefícios prevideciários e seguro-desemprego), em prejuízo alheio (INSS, CEF, MET e FAT), induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento (inserção de dados falsos). Não acolho a tese da prescrição referente ao fato VII, alegado pela defesa, tendo em vista que os fatos ocorreram nas datas de 3 de dezembro de 2012, 15 de janeiro de 2013, 13 de fevereiro de 2013 e 13 de março de 2013. Tendo em vista que a denúncia foi recebida em 06/09/2024, não se verifica o advento da prescrição da pretensão punitiva do Estado, tendo em vista que, de acordo com o art. 109, III, do referido diploma, a pretensão punitiva do Estado a ele pertinente prescreve em 12 anos para o delito previsto no 3º,do artigo 171, do Código Penal. Assim, não há dúvida em relação à Autoria e a Materialidade, razão pela qual o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA é CONDENADO por incurso nas penas do art. 171, §3º do Código Penal. 2.2. Em relação ao réu PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA Segundo a denúncia, o réu teria obtido vantagem ilícita decorrente do recebimento indevido de benefício previdenciário NB 42/1567375887 - Aposentadoria por tempo de contribuição, no período de 04/12/2014 a 31/12/2020, totalizando um prejuízo de R$ 168.007,60 (cento e sessenta e oito mil e sete reais e sessenta centavos), induzindo a erro os responsáveis pela concessão do benefício, mediante meio fraudulento, consistente na anotação de falso registro de trabalho com a empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 02/01/2005 a 15/12/2005 (12 contribuições), cujo registro falso foi realizado pelo imputado EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA. Segundo suas declarações prestadas no interrogatório judicial, o réu afirmou que não trabalhou na empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS e não tinha conhecimento da inserção desse vínculo em seus registros laborais. Disse que na época trabalhava em 2 serviços concomitantes e que já possuía os requisitos para concessão do benefício. Contou que entregou a documentação para Evandro para que fizesse o pedido de aposentadoria. Esclareceu ainda, que o período acrescido não foi determinante para a concessão do benefício e que só teve conhecimento da anotação fraudulenta quando foi intimado pela Polícia Federal. Por fim, revelou que o benefício foi restaurado judicialmente (id 364317105). Da análise das provas produzidas nos autos, entendo que o réu, apesar de receber indevidamente o benefício, não agiu com meio fraudulento, nem tampouco induziu ou manteve a vítima em erro. Se houve algum erro, entendo que não se originou das declarações do réu. Por certo, quando da concessão do benefício nº 42/156.737.588-7, em nome de PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA – CPF 847.078.798-53 houve a inserção no CNIS (por meio de GFIPs extemporâneas) e aproveitamento na aposentadoria do período fictício de 02/01/2005 a 15/12/2005, em nome de JOCAR SCAN REPRESENTACOES COMERCIAIS. Todavia, nos termos da sentença proferida nos autos nº 5002884-88.2020.403.6112 foi reconhecido o direito ao restabelecimento do benefício NB 156.737.588-7, desde a sua cessação indevida (em 30/09/2020). Na ocasião, este juízo observou que o INSS não se atentou ao tempo de professor exercido pelo réu, de modo que, se a autarquia tivesse promovido o devido reconhecido dos períodos de 01 /03/1977 a 30/11/1979 e de 04/03/1980 a 01/02/1981, e sua devida conversão em tempo comum restaria evidente que mesmo que se excluísse da contagem o período de 02/01/2005 a 15/12/2005, na Jocar Sacan Representações, o autor continuaria com direito a manter sua aposentadoria por tempo de contribuição. E assim referida sentença concluiu: “Logo, a suspensão e cancelamento do benefício foi indevida não porque não tenha havido fraude em relação ao tempo de Jocar, mas porque o INSS se equivocou em não reconhecer, de ofício, o tempo de Professor anterior à EC nº 18/91 como especial. 2.4 Do Pedido de Restabelecimento do Benefício e do Pedido de Reconvenção Tendo em vista o exposto nos itens anteriores, resta evidente que o benefício deve ser restabelecido, desde a sua cessação. Da mesma forma, considerando o restabelecimento determinado, resta improcedente a Reconvenção para a cobrança de valores supostamente recebidos de forma indevida.” Por tais motivos, entendo que não restou caracterizado o fato típico, tendo em vista que o réu não recebeu vantagens indevidas, devendo o acusado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA ser absolvido na forma do art. 386, incisos III, do CPP. Passo à dosimetria da pena em relação ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA. Da Dosimetria da Pena: -A) as circunstâncias judiciais (CP, artigo 59): as folhas de antecedentes (Ids 338032531, 338032539, 338194668 e 338191255) demonstram que o réu não possui outros apontamentos de natureza penal. Não há dados desabonadores da personalidade do réu no seu meio social. O réu, entretanto, agiu com dolo exacerbado para o tipo, tendo em vista que o réu agiu inserindo dados falsos em sistema de informações da Administração Pública, visando a obtenção de vantagem indevida para si ou para outrem. O réu não tentou se furtar à aplicação da lei penal. Os motivos do crime são os comuns ao tipo penal, ou seja, a vontade livre e consciente dirigida a obter vantagem ilícita. O prejuízo causado à Administração Pública foi estimado em cerca de 2 (dois) milhões de reais, com o que as consequências do crime foram gravíssimas. Em geral, as circunstâncias relacionadas ao crime, portanto, são parcialmente favoráveis ao réu. Assim, fixo a pena-base pouco acima do mínimo legal, ou seja, em 2 (dois) anos de reclusão, bem como multa de 20 dias-multa, para o crime de estelionato. -B) No exame de atenuantes e agravantes, reconheço a atenuante da confissão (CP, artigo 65, inciso III, alínea c), de modo que reduzo a pena em seis meses e 5 dias-multa. Logo, nesta fase, a pena fixada é de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e 15 dias-multa. Não há motivo para aplicação da circunstância excepcional do artigo 66 do Código Penal. -C) Não reconheço qualquer causa de diminuição da pena. Reconheço a causa de aumento prevista no art. 171, § 3º, do CP, pois o réu praticou o crime detrimento de entidade de direito público, estando sujeita a tal causa de aumento. Assim, aumento a pena em 1/3, fixando-a em 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa. Reconheço também a continuidade delitiva das condutas praticadas, tendo em vista que o réu praticou nove crimes da mesma espécie, em circunstâncias que demonstrem a unidade de propósito e a execução de forma continuada. Atento à súmula 659 do STJ, que estabelece que a fração de aumento deve ser fixada proporcionalmente ao número de crimes, sendo 1/6 para duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais, a pena deverá ser aumentada em 2/3. Torno, portanto, a pena definitiva em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, bem com 33 dias multa. -D) o regime inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade será o ABERTO, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea ‘c’ do CP. -E) pelos motivos já expostos quando da análise das circunstâncias do art. 59 do CP e atento à situação econômica do réu, fixo o valor de cada dia-multa no valor de um terço (1/3) do valor salário-mínimo vigente à época dos fatos, nos termos do art. 49, do CP. Tal montante deverá ser atualizado monetariamente quando do efetivo pagamento (art. 49, § 2º, do CP). -F) não estando presentes os requisitos previstos no artigo 77 do Código Penal, deixo de suspender a execução da pena privativa de liberdade. -G) no entanto, verifico que, diante da quantidade da pena privativa de liberdade fixada, em consonância com a orientação do Supremo Tribunal Federal, é cabível para o caso em tela a aplicação do benefício previsto no artigo 44, inciso I do Código Penal. Assim sendo, com fundamento no § 2º do citado dispositivo legal, substituo a pena privativa de liberdade por: G.1) Prestação Pecuniária (artigo 43, inciso I do Código Penal) a ser revertida para entidade filantrópica definida pelo juízo das execuções penais, no valor total de 5 (cinco) salários-mínimos, considerando a atual situação financeira; podendo ser paga ao longo da execução da pena, à critério do juiz responsável. G.2) Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo período da pena corporal substituída, a ser cumprida em entidade pública ou privada, a ser designada pelo juízo das execuções penais, em audiência admonitória, em regime de oito horas semanais, a teor do art. 46 e 55 do Código Penal; No que tange à reparação dos danos causados, muito embora fosse cabível a condenação da mesma, tendo em vista que o prejuízo causado deve ser objeto de contraditório individualizado, levando-se em conta não apenas eventual defesa administrativa dos segurados, mas até mesmo repercussões de ações judiciais propostas pelos mesmos, deixo de condená-lo neste feito, remetendo à cobrança por meio de ação civil própria, que poderá ser proposta tanto pela autarquia previdenciária, quanto pelo MPF. -H) concedo o réu o direito de apelar em liberdade, nos termos do artigo 594 do Código de Processo Penal, pois verifico que não estão presentes os requisitos da custódia cautelar. -I) após o trânsito em julgado da sentença, a ré terá o seu nome lançado no rol dos culpados, nos termos do art. 804 do CPP. 3. Dispositivo Ante o exposto, absolvo o denunciado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA da imputação que lhe foi feita na denúncia, com fundamento no artigo 386, III do Código de Processo Penal. Em relação ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, brasileiro, filho de Euclides Bezerra de Siqueira e Carmoza Silva Bezerra, nascido em 09 de dezembro de 1977, portador da Cédula de Identidade – RG nº 325045513/SSP/SP, inscrito no CPF/MF sob o nº 262.009.468-25, JULGO PROCEDENTE a denúncia, e a CONDENO, à pena de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto (art. 33, § 2º, “c”, do CP), bem como ao pagamento de 33 (trinta e três) dias multa, nos termos em que delineados no tópico da dosimetria da pena, por incurso nas sanções do artigo art. 171, § 3º, c/c art. 71, todos do Código Penal. Deixo de fixar o valor do dano a ser reparado, remetendo à cobrança por meio de ação civil própria, que poderá ser proposta tanto pela autarquia previdenciária, quanto pelo MPF. Cumpram-se as demais disposições lançadas no tópico da dosimetria da pena. Por oportuno, tendo em vista as condições sociais do acusado e que foi defendido por advogado dativo, concedo-lhe os benefícios da justiça gratuita, de modo que não há custas processuais a serem recolhidas. Anote-se. Considerando o excelente trabalho desenvolvido, fixo ao Advogado Dativo nomeado nos autos, honorários que fixo no valor máximo da tabela. Promova a Secretaria a solicitação de pagamento. Quanto aos bens apreendidos, dê-se vistas ao Ministério Público Federal do ofício da polícia federal juntado no id 367630947. Após, retornem os autos conclusos para deliberações. Cópia desta sentença servirá de CARTA PRECATÓRIA, devidamente instruída com termo de apelação, com prazo de 30 (trinta) dias, para intimação do réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - CPF: 262.009.468-25 - 18-98151-4766 - evandrobezerra@hotmail.com - Endereço: Rua Varginha 219, Bairro Ernance Murad, Presidente Venceslau/SP - CEP 19400-000, podendo ser encontrado também na rua Varginha, nº 219, bairro Ernane Murad, em Presidente Venceslau/SP, fone (18) 981514766, da sentença ora prolatada, bem como se deseja dela apelar. Providenciem-se as comunicações de praxe. P.I.C. PRESIDENTE PRUDENTE, 12 de junho de 2025.
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Processo nº 5000405-25.2020.4.03.6112
ID: 299133246
Tribunal: TRF3
Órgão: 3ª Vara Federal de Presidente Prudente
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5000405-25.2020.4.03.6112
Data de Disponibilização:
16/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CELSO CORDEIRO
OAB/SP XXXXXX
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MARCOS HAMILTON BONFIM
OAB/SP XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5000405-25.2020.4.03.6112 / 3ª Vara Federal de Presidente Prudente AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP REU: EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, PEDRO LUIZ…
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5000405-25.2020.4.03.6112 / 3ª Vara Federal de Presidente Prudente AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP REU: EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA INVESTIGADO PUNIBILIDADE EXTINTA: JOSE CARLOS STABILLE CRUZ, CARLOS CORDEIRO MORAES JUNIOR, ENISE VALERIA BEZERRA DA CUNHA, RENAN ENDRIGO DOS SANTOS SILVA, SAMANTA CARNEIRO DE OLIVEIRA INVESTIGADO INQUÉRITO ARQUIVADO: SILVANA BUENO CABREIRA Advogado do(a) REU: MARCOS HAMILTON BONFIM - SP350833 Advogado do(a) REU: CELSO CORDEIRO - SP323527 S E N T E N Ç A Vistos, em sentença. 1. Relatório O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente ação penal em face de EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA como incurso no artigo 171, §3º (9 vezes), c.c. artigo 29 “caput”, ambos do Código Penal, e PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA e LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES como incursos no artigo 171, §3º e artigo 29 “caput”, ambos do Código Penal (id 335965212, de 21/08/2024). Segundo a peça acusatória, nos anos de 2012 a 2020, o acusado EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, com consciência e vontade, utilizou das empresas inativas JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS e JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES LTDA, para a inserção de vínculos empregatícios falsos nos sistemas oficiais, vínculos esses que permitiram o recebimento de benefícios previdenciários e de seguro-desemprego por parte dos denunciados, os quais tinham total conhecimento da ilicitude dos registros e dos indevidos pagamentos decorrentes de benefícios previdenciários e de seguro- desemprego, quando nunca houve nenhuma relação empregatícia. De acordo com o Relatório de Informação nº 058/NUINT-SP/CGINT/SUCOR/SEPRT/ME, de 20 de julho de 2020, foram identificados 18 (dezoito) benefícios com indícios de irregularidades, estimando-se um prejuízo na cifra de R$ 1.923.937,96 (um milhão, novecentos e vinte e três mil, novecentos e trinta e sete reais e noventa e seis centavos) (id. 39044105 - Pág. 74/76). O feito foi redistribuído em razão da implantação do juiz das garantias na Justiça Federal de Primeiro Grau da 3ª Região (id 335995077, de 22/08/2024). A denúncia foi recebida em 06 de setembro de 2024, oportunidade em que foi reconhecida a prescrição e declarada extinta a punibilidade em face de JOSÉ CARLOS STABILLE CRUZ, CARLOS CORDEIRO MORAES JUNIOR, ENISE VALÉRIA SILVA BEZERRA, RENAN ENDRIGO DOS SANTOS SILVA E SAMANTA CARNEIRO. Na ocasião, também foi determinado o arquivamento do feito em relação à investigada SILVANA BUENO CABREIRA e desmembrado o feito ante a homologação do Acordo de Não Persecução Penal - ANPP em relação às investigadas BENEDITA LIDIONETE FERRARI NESTI E MARLENE KIYOKO TAKENOBU (id 337106283, de 06/09/2024). Antecedentes criminais juntados nos ids 338032521, 338032540, 338190700 e seguintes. O réu PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA foi regularmente citado (id 339121630), tendo apresentado defesa prévia, por meio de advogado constituído (id 341050814). Juntou documentos (id 341050818). EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA foi devidamente citado (id 341574368), sendo-lhe nomeado defensor dativo (id 346411508), o qual apresentou defesa (id 347446257). A ré LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES foi citada (id 345377267) e apresentou resposta à acusação no id 345812348, por meio de advogado constituído. O Ministério Público Federal apresentou proposta de Não Persecução Penal à LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES (id 348734982) e réplica na manifestação de id 348734982. Ante o aceite da ré (id 351704006), o acordo foi homologado e determinado o desmembramento do feito em relação a ela (id 358779049). Na mesma oportunidade, foi afastou as hipóteses de absolvição sumária em face dos demais acusados e designada audiência de instrução. Na fase instrutória do feito foi realizada audiência em 15 de maio de 2025, sendo ouvidas cinco testemunhas comuns e os réus interrogados. Oportunizada a fase do art. 402 do CPP, as partes nada requereram (id 364174766). Em alegações finais, o Parquet requereu a condenação dos acusados por entender comprovados os fatos narrados na denúncia (id 364976492). A defesa do réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA requereu a aplicação da atenuante da confissão e o reconhecimento da prescrição do fato VII, tendo em vista os fatos terem ocorrido entre dezembro de 2012 a março de 2013 (id 366384902). O réu PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA, por sua vez, apresentou alegações finais, requerendo a absolvição do acusado por se tratar de fato atípico, bem como pela ausência de provas de que concorreu para a prática do crime (id 366409222). A autoridade policial solicitou a destinação legal dos materiais apreendidos (id 367630947). Os autos vieram conclusos para sentença. É o relatório. DECIDO. 2. Decisão/Fundamentação Ao acusado EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA foram imputadas as condutas previstas no artigo 171, § 3º, do Código Penal, pois teria, mediante meio fraudulento, com inserção de dados, obtido para si e terceiras pessoas, 18 (dezoito) benefícios com indícios de irregularidades, estimando-se um prejuízo à União na cifra de R$ 1.923.937,96 (um milhão, novecentos e vinte e três mil, novecentos e trinta e sete reais e noventa e seis centavos). Já o acusado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA teria obtido vantagem ilícita decorrente do recebimento indevido de benefício previdenciário NB 42/1567375887 - Aposentadoria por tempo de contribuição, no período de 04/12/2014 a 31/12/2020, totalizando um prejuízo de R$ 168.007,60 (cento e sessenta e oito mil e sete reais e sessenta centavos). O tipo penal do estelionato se encontra vazado, nos seguintes termos: Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena – reclusão de um a cinco anos, e multa. (...) 2º . Nas mesmas penas incorre quem: (...) 3º. A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência. Com efeito, pela redação do artigo 171, “caput”, do Código Penal, configura estelionato “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento” (grifei). Nesse caso, a figura típica do delito de estelionato somente estará completa quando o agente se utilizar de artifício, ardil ou outro meio fraudulento. Quando este meio fraudulento (em qualquer de suas formas) se traduzir em falsidade, constituindo o crime-meio para alcançar o crime-fim (estelionato), o agente somente responderá por este último, pois “o estelionato absorve a falsidade, quando esta foi o meio fraudulento empregado para a prática do crime-fim que era o estelionato” (Súmula n. 17 do Superior Tribunal de Justiça). Lembre-se que o crime que se imputa ao acusado é o de estelionato, com o aumento de pena previsto no § 3º, por ter sido praticado em detrimento de Fundo de natureza pública. Para que o estelionato se configure é necessário: a) o emprego, pelo agente, de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento; b) induzimento ou manutenção da vítima em erro; 3º) obtenção de vantagem patrimonial ilícita pelo agente; 4º) prejuízo alheio (do enganado ou de terceira pessoa). Necessário, portanto, que haja o duplo resultado (vantagem ilícita e prejuízo alheio) relacionado com a fraude e o erro que esta provocou. Trata-se de crime que pode ser cometido por qualquer pessoa, cujo objeto jurídico é o patrimônio. O tipo subjetivo do crime exige o dolo, com especial fim de agir, qual seja, obter vantagem ilícita em prejuízo alheio. Não há, portanto, crime culposo. Da mesma forma, mister para a configuração do crime que a vantagem obtida seja ilícita e que cause prejuízo à vítima. O crime consuma-se no momento e local em que o agente obtém vantagem ilícita. Da Autoria e Materialidade do Crime de Estelionato 2.1. Em relação ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA De acordo com o Relatório de Informação nº 058/NUINT-SP/CGINT/SUCOR/SEPRT/ME, de 20 de julho de 2020, foram identificados 18 (dezoito) benefícios com indícios de irregularidades, estimando-se um prejuízo na cifra de R$ 1.923.937,96 (um milhão, novecentos e vinte e três mil, novecentos e trinta e sete reais e noventa e seis centavos) (id. 39044105 - Pág. 74/76). A fraude consistia na inserção de vínculos falsos no CNIS através da transmissão de GFIP extemporâneas, utilizando-se de empresas inativas e inidôneas (JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS e JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES LTDA), para segurados da previdência social, com a finalidade posterior de obterem benefícios previdenciários, normalmente aposentadorias por idade (B41) e de tempo de contribuição (B42), auxílios por incapacidade temporária (B31) e permanente (B32), bem como "Pensões por Morte Previdenciária (B21), embasadas com estas falsas relações empregatícias, inclusive com documentação falsa que instruíam os processos concessórios. A acusação denunciou o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA por nove dos fatos apurados pela investigação policial. Considerando que todos os fatos possuíam o mesmo “modus operandi”, para fins de exemplificação, transcrevo os fatos imputados ao réu, resumidamente, apenas com o benefício concedido, nome do beneficiário, vantagem ilícita e a fraude realizada: 1. NB 42/152.098.440-2 - Aposentadoria por Tempo de Contribuição, concedido a beneficiária MARLENE KIYOKO TAKENOBU, no período de 02/03/2014 a 30/09/2020, totalizando um prejuízo de R$ 102.377,92, em detrimento do INSS - anotação de falsos registros de trabalho com as empresas JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 01/04/1992 a 30/06/2002 (10 anos e 3 meses); JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS, no período de 01/07/2009 a 30/11/2009 (5 meses) e; JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 01/02/2010 a 30/09/2013; 2. NB 41/1589949944 - Aposentadoria por Idade, concedido a beneficiária Benedita Lidionete Ferrari Nesti, no período de 17/12/2015 a 30/11/2020, totalizando um prejuízo de R$ 77.135,85 (setenta e sete mil, cento e trinta e cinco reais e oitenta e cinco centavos), em detrimento do INSS - anotação de falso registro de trabalho com a empresa JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS ME, no período de 03/01/2004 a 30/04/2009 (64 contribuições); 3. NB 42/1567375887 - Aposentadoria por tempo de contribuição, concedido ao imputado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA, no período de 04/12/2014 a 31/12/2020, totalizando um prejuízo de R$ 168.007,60 (cento e sessenta e oito mil e sete reais e sessenta centavos), em detrimento do INSS - anotação de falso registro de trabalho com a empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 02/01/2005 a 15/12/2005 (12 contribuições); 4. requerimento nº 1307396176 – seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de R$ 1.304,63 (mil, trezentos e quatro reais e sessenta e três centavos) cada, totalizando R$ 5.218,52 (cinco mil, duzentos e dezoito reais e cinquenta e dois centavos) em detrimento CEF, MTE e FAT – anotação falsa de registro como empregado da empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS LTDA, com data de admissão em 02/12/2013 e data de demissão em 21/05/2014; 5. requerimento nº 7729776215 – seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de R$ 1.464,00 (mil, quatrocentos e sessenta e quatro reais) cada, totalizando R$ 5.856,00 (cinco mil, oitocentos e cinquenta e seis reais), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregado empresa JOÃO APARECIDO COSMÉTICOS-ME, com data de admissão em 17/11/2015 e data de demissão em 07/01/2016; 5. requerimento nº 1307396179 – seguro-desemprego concedido à LUCIANA SILVA DE OLIVEIRA MORAES - 03 parcelas do benefício do seguro-desemprego no valor de R$ 1.385,91 (mil, trezentos e oitenta e cinco reais e noventa e um centavos) cada, totalizando R$ 4.157,73 (quatro mil, cento e cinquenta e sete reais e setenta e três centavos), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregada empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS LTDA, com data de admissão em 15/08/2014 e data de demissão em 09/02/2015; 7. requerimento nº 1243140239 - seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de benefício do seguro-desemprego no valor de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais) cada, totalizando R$ 2.880,00 (dois mil, oitocentos e oitenta reais), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregado da clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, com data de admissão em 02/04/2012 e data de demissão em 01/11/2012; 8. requerimento nº 7744417734 - seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 3 prestações de benefício do seguro-desemprego no valor de R$ 1.136,00 (mil, cento e trinta e seis reais) cada, totalizando R$ 3.408,00 (três mil, quatrocentos e oito reais), em detrimento CEF, TEM e FAT - anotação falsa de registro como empregado da clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, com data de admissão em 27/03/2017 e data de demissão em 10/05/2017; 9. requerimento nº 7768694190 - seguro-desemprego concedido ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - 4 prestações de benefício do seguro-desemprego, totalizando R$ 4.127,00 (quatro mil, cento e vinte e sete reais), em detrimento CEF, MTE e FAT - anotação falsa de registro como empregado da clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, com data de admissão em 31/07/2019 e data de demissão em 20/08/2019; Em todos os fatos o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA foi o responsável pela inserção indevida de dados de vínculos empregatícios de diferentes pessoas físicas ou de si próprio e as empresas JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS e JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES LTDA (inativas à época dos registros), bem como na clínica odontológica Luiz Roberto Floriano Filho, gerando benefícios previdenciários ou seguro-desemprego indevidos. O réu transmitiu diversas GFIPS para as empresas mencionadas, sempre como responsável pelas informações, além de se utilizar de carimbos para a falsificação de documentos, bem como livros de registro de empregados nas empresas JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME (id. 37631270 - Pág. 11/12), estando devidamente comprovadas as materialidades dos fatos. A autoria também é inconteste, tendo o réu, inclusive, confessado os fatos. Em seu interrogatório judicial (id 364317107), o réu reconheceu que fez tais inserções indevidas (em geral, de quatro a doze contribuições), porém esclareceu que as contribuições foram recolhidas. Disse que estava desempregado e que nunca cobrou para fazer a inserção dos dados, mas apenas sobre a concessão do benefício. Relatou que as pessoas que o procuravam, sabiam que era necessário algum período para completar o benefício. Reconheceu que usou o certificado do Luiz Roberto para receber o seguro desemprego, bem como que nunca trabalhou para essas empresas. Disse que, na época não era necessário certificado digital para as transmissões da GFIP e que tinha acesso às contas do JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME, porque fazia o recolhimento do INSS para os empresários. Por fim, explanou que não vendia a inserção de vínculos falsos e que seu honorário era de um a dois benefícios concedido. As testemunhas BENEDITA LIDIONETE FERRARI SESTI e MARLENE KYOKO TAKENOBU afirmaram que contrataram o réu para realizar o requerimento de aposentadoria e que foi incluído vínculos de trabalho inverídicos em seus documentos. Confirmaram que nunca trabalharam para as empresas JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME (id 364315682 e 364315691). Já as testemunhas JOÃO APARECIDO BARBOSA e LUIZ ROBERTO FLORIANO FILHO, proprietários da empresa João Aparecido Barbosa Cosmético ME e da clínica odontológica, respectivamente, afirmaram que o réu EVANDRO era contratado como contador de suas empresas e declararam como inverídicos os registros empregatícios vinculados a eles (id 364315676 e 364317102). Por fim, a testemunha SABRINA ELOÍSA DE FREITAS SOARES, delegada da Polícia Federal, responsável pelas investigações, relatou que receberam uma denúncia da procuradoria geral em que Evandro atuava como intermediário, uma vez que pedia benefícios previdenciários para algumas pessoas e, observaram que todas elas possuíam vínculos com as mesmas pessoas jurídicas, gerando benefícios indevidos, com prejuízo ao INSS em torno de 2 milhões. Relatou que as investigações apuraram que Evandro continuou prestando serviços para as pessoas jurídicas (JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES E COMÉRCIO LTDA e JOÃO APARECIDO BARBOSA COSMÉTICOS-ME) mesmo após o encerramento de suas atividades, escriturando vínculos empregatícios falsos para completar o tempo de serviço dessas pessoas, bem como transmitia GFIPs em nome dessas empresas. A transmissão dessas guias e informações eram realizados por EVANDRO, constando seus dados como o de responsável pelas informações, como por exemplo, seu e-mail (id 364315697). Desse modo, resta devidamente comprovado que o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, obteve, para si ou para outrem, vantagem ilícita (benefícios prevideciários e seguro-desemprego), em prejuízo alheio (INSS, CEF, MET e FAT), induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento (inserção de dados falsos). Não acolho a tese da prescrição referente ao fato VII, alegado pela defesa, tendo em vista que os fatos ocorreram nas datas de 3 de dezembro de 2012, 15 de janeiro de 2013, 13 de fevereiro de 2013 e 13 de março de 2013. Tendo em vista que a denúncia foi recebida em 06/09/2024, não se verifica o advento da prescrição da pretensão punitiva do Estado, tendo em vista que, de acordo com o art. 109, III, do referido diploma, a pretensão punitiva do Estado a ele pertinente prescreve em 12 anos para o delito previsto no 3º,do artigo 171, do Código Penal. Assim, não há dúvida em relação à Autoria e a Materialidade, razão pela qual o réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA é CONDENADO por incurso nas penas do art. 171, §3º do Código Penal. 2.2. Em relação ao réu PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA Segundo a denúncia, o réu teria obtido vantagem ilícita decorrente do recebimento indevido de benefício previdenciário NB 42/1567375887 - Aposentadoria por tempo de contribuição, no período de 04/12/2014 a 31/12/2020, totalizando um prejuízo de R$ 168.007,60 (cento e sessenta e oito mil e sete reais e sessenta centavos), induzindo a erro os responsáveis pela concessão do benefício, mediante meio fraudulento, consistente na anotação de falso registro de trabalho com a empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS, no período de 02/01/2005 a 15/12/2005 (12 contribuições), cujo registro falso foi realizado pelo imputado EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA. Segundo suas declarações prestadas no interrogatório judicial, o réu afirmou que não trabalhou na empresa JOCAR SCAN REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS e não tinha conhecimento da inserção desse vínculo em seus registros laborais. Disse que na época trabalhava em 2 serviços concomitantes e que já possuía os requisitos para concessão do benefício. Contou que entregou a documentação para Evandro para que fizesse o pedido de aposentadoria. Esclareceu ainda, que o período acrescido não foi determinante para a concessão do benefício e que só teve conhecimento da anotação fraudulenta quando foi intimado pela Polícia Federal. Por fim, revelou que o benefício foi restaurado judicialmente (id 364317105). Da análise das provas produzidas nos autos, entendo que o réu, apesar de receber indevidamente o benefício, não agiu com meio fraudulento, nem tampouco induziu ou manteve a vítima em erro. Se houve algum erro, entendo que não se originou das declarações do réu. Por certo, quando da concessão do benefício nº 42/156.737.588-7, em nome de PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA – CPF 847.078.798-53 houve a inserção no CNIS (por meio de GFIPs extemporâneas) e aproveitamento na aposentadoria do período fictício de 02/01/2005 a 15/12/2005, em nome de JOCAR SCAN REPRESENTACOES COMERCIAIS. Todavia, nos termos da sentença proferida nos autos nº 5002884-88.2020.403.6112 foi reconhecido o direito ao restabelecimento do benefício NB 156.737.588-7, desde a sua cessação indevida (em 30/09/2020). Na ocasião, este juízo observou que o INSS não se atentou ao tempo de professor exercido pelo réu, de modo que, se a autarquia tivesse promovido o devido reconhecido dos períodos de 01 /03/1977 a 30/11/1979 e de 04/03/1980 a 01/02/1981, e sua devida conversão em tempo comum restaria evidente que mesmo que se excluísse da contagem o período de 02/01/2005 a 15/12/2005, na Jocar Sacan Representações, o autor continuaria com direito a manter sua aposentadoria por tempo de contribuição. E assim referida sentença concluiu: “Logo, a suspensão e cancelamento do benefício foi indevida não porque não tenha havido fraude em relação ao tempo de Jocar, mas porque o INSS se equivocou em não reconhecer, de ofício, o tempo de Professor anterior à EC nº 18/91 como especial. 2.4 Do Pedido de Restabelecimento do Benefício e do Pedido de Reconvenção Tendo em vista o exposto nos itens anteriores, resta evidente que o benefício deve ser restabelecido, desde a sua cessação. Da mesma forma, considerando o restabelecimento determinado, resta improcedente a Reconvenção para a cobrança de valores supostamente recebidos de forma indevida.” Por tais motivos, entendo que não restou caracterizado o fato típico, tendo em vista que o réu não recebeu vantagens indevidas, devendo o acusado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA ser absolvido na forma do art. 386, incisos III, do CPP. Passo à dosimetria da pena em relação ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA. Da Dosimetria da Pena: -A) as circunstâncias judiciais (CP, artigo 59): as folhas de antecedentes (Ids 338032531, 338032539, 338194668 e 338191255) demonstram que o réu não possui outros apontamentos de natureza penal. Não há dados desabonadores da personalidade do réu no seu meio social. O réu, entretanto, agiu com dolo exacerbado para o tipo, tendo em vista que o réu agiu inserindo dados falsos em sistema de informações da Administração Pública, visando a obtenção de vantagem indevida para si ou para outrem. O réu não tentou se furtar à aplicação da lei penal. Os motivos do crime são os comuns ao tipo penal, ou seja, a vontade livre e consciente dirigida a obter vantagem ilícita. O prejuízo causado à Administração Pública foi estimado em cerca de 2 (dois) milhões de reais, com o que as consequências do crime foram gravíssimas. Em geral, as circunstâncias relacionadas ao crime, portanto, são parcialmente favoráveis ao réu. Assim, fixo a pena-base pouco acima do mínimo legal, ou seja, em 2 (dois) anos de reclusão, bem como multa de 20 dias-multa, para o crime de estelionato. -B) No exame de atenuantes e agravantes, reconheço a atenuante da confissão (CP, artigo 65, inciso III, alínea c), de modo que reduzo a pena em seis meses e 5 dias-multa. Logo, nesta fase, a pena fixada é de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e 15 dias-multa. Não há motivo para aplicação da circunstância excepcional do artigo 66 do Código Penal. -C) Não reconheço qualquer causa de diminuição da pena. Reconheço a causa de aumento prevista no art. 171, § 3º, do CP, pois o réu praticou o crime detrimento de entidade de direito público, estando sujeita a tal causa de aumento. Assim, aumento a pena em 1/3, fixando-a em 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa. Reconheço também a continuidade delitiva das condutas praticadas, tendo em vista que o réu praticou nove crimes da mesma espécie, em circunstâncias que demonstrem a unidade de propósito e a execução de forma continuada. Atento à súmula 659 do STJ, que estabelece que a fração de aumento deve ser fixada proporcionalmente ao número de crimes, sendo 1/6 para duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais, a pena deverá ser aumentada em 2/3. Torno, portanto, a pena definitiva em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, bem com 33 dias multa. -D) o regime inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade será o ABERTO, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea ‘c’ do CP. -E) pelos motivos já expostos quando da análise das circunstâncias do art. 59 do CP e atento à situação econômica do réu, fixo o valor de cada dia-multa no valor de um terço (1/3) do valor salário-mínimo vigente à época dos fatos, nos termos do art. 49, do CP. Tal montante deverá ser atualizado monetariamente quando do efetivo pagamento (art. 49, § 2º, do CP). -F) não estando presentes os requisitos previstos no artigo 77 do Código Penal, deixo de suspender a execução da pena privativa de liberdade. -G) no entanto, verifico que, diante da quantidade da pena privativa de liberdade fixada, em consonância com a orientação do Supremo Tribunal Federal, é cabível para o caso em tela a aplicação do benefício previsto no artigo 44, inciso I do Código Penal. Assim sendo, com fundamento no § 2º do citado dispositivo legal, substituo a pena privativa de liberdade por: G.1) Prestação Pecuniária (artigo 43, inciso I do Código Penal) a ser revertida para entidade filantrópica definida pelo juízo das execuções penais, no valor total de 5 (cinco) salários-mínimos, considerando a atual situação financeira; podendo ser paga ao longo da execução da pena, à critério do juiz responsável. G.2) Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo período da pena corporal substituída, a ser cumprida em entidade pública ou privada, a ser designada pelo juízo das execuções penais, em audiência admonitória, em regime de oito horas semanais, a teor do art. 46 e 55 do Código Penal; No que tange à reparação dos danos causados, muito embora fosse cabível a condenação da mesma, tendo em vista que o prejuízo causado deve ser objeto de contraditório individualizado, levando-se em conta não apenas eventual defesa administrativa dos segurados, mas até mesmo repercussões de ações judiciais propostas pelos mesmos, deixo de condená-lo neste feito, remetendo à cobrança por meio de ação civil própria, que poderá ser proposta tanto pela autarquia previdenciária, quanto pelo MPF. -H) concedo o réu o direito de apelar em liberdade, nos termos do artigo 594 do Código de Processo Penal, pois verifico que não estão presentes os requisitos da custódia cautelar. -I) após o trânsito em julgado da sentença, a ré terá o seu nome lançado no rol dos culpados, nos termos do art. 804 do CPP. 3. Dispositivo Ante o exposto, absolvo o denunciado PEDRO LUIZ SOBREIRO CABREIRA da imputação que lhe foi feita na denúncia, com fundamento no artigo 386, III do Código de Processo Penal. Em relação ao réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA, brasileiro, filho de Euclides Bezerra de Siqueira e Carmoza Silva Bezerra, nascido em 09 de dezembro de 1977, portador da Cédula de Identidade – RG nº 325045513/SSP/SP, inscrito no CPF/MF sob o nº 262.009.468-25, JULGO PROCEDENTE a denúncia, e a CONDENO, à pena de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto (art. 33, § 2º, “c”, do CP), bem como ao pagamento de 33 (trinta e três) dias multa, nos termos em que delineados no tópico da dosimetria da pena, por incurso nas sanções do artigo art. 171, § 3º, c/c art. 71, todos do Código Penal. Deixo de fixar o valor do dano a ser reparado, remetendo à cobrança por meio de ação civil própria, que poderá ser proposta tanto pela autarquia previdenciária, quanto pelo MPF. Cumpram-se as demais disposições lançadas no tópico da dosimetria da pena. Por oportuno, tendo em vista as condições sociais do acusado e que foi defendido por advogado dativo, concedo-lhe os benefícios da justiça gratuita, de modo que não há custas processuais a serem recolhidas. Anote-se. Considerando o excelente trabalho desenvolvido, fixo ao Advogado Dativo nomeado nos autos, honorários que fixo no valor máximo da tabela. Promova a Secretaria a solicitação de pagamento. Quanto aos bens apreendidos, dê-se vistas ao Ministério Público Federal do ofício da polícia federal juntado no id 367630947. Após, retornem os autos conclusos para deliberações. Cópia desta sentença servirá de CARTA PRECATÓRIA, devidamente instruída com termo de apelação, com prazo de 30 (trinta) dias, para intimação do réu EVANDRO CARLOS SILVA BEZERRA - CPF: 262.009.468-25 - 18-98151-4766 - evandrobezerra@hotmail.com - Endereço: Rua Varginha 219, Bairro Ernance Murad, Presidente Venceslau/SP - CEP 19400-000, podendo ser encontrado também na rua Varginha, nº 219, bairro Ernane Murad, em Presidente Venceslau/SP, fone (18) 981514766, da sentença ora prolatada, bem como se deseja dela apelar. Providenciem-se as comunicações de praxe. P.I.C. PRESIDENTE PRUDENTE, 12 de junho de 2025.
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Processo nº 0001545-74.2017.4.03.6181
ID: 317457786
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. Vice Presidência
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0001545-74.2017.4.03.6181
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
BRUNO ALVES PEREIRA DE MASCARENHAS BRAGA
OAB/DF XXXXXX
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AMILCAR BARCA TEIXEIRA JUNIOR
OAB/DF XXXXXX
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JOSE CARLOS FERNANDES
OAB/SP XXXXXX
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JORGE FERNANDO VAZ
OAB/SP XXXXXX
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JOSE AUGUSTO DELGADO
OAB/RN XXXXXX
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EDISON REGINALDO BERALDO
OAB/SP XXXXXX
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VALDIR PAIS
OAB/SP XXXXXX
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ANGELO AUGUSTO COSTA DELGADO
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região Vice Presidência APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001545-74.2017.4.03.6181 RELATOR: Gab. Vice Presidência APELANTE: A. F., F. J. B., J. C. F. Advoga…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região Vice Presidência APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001545-74.2017.4.03.6181 RELATOR: Gab. Vice Presidência APELANTE: A. F., F. J. B., J. C. F. Advogados do(a) APELANTE: AMILCAR BARCA TEIXEIRA JUNIOR - DF10328-A, ANGELO AUGUSTO COSTA DELGADO - DF15537-A, BRUNO ALVES PEREIRA DE MASCARENHAS BRAGA - DF25496, EDISON REGINALDO BERALDO - SP126577-N, JOSE AUGUSTO DELGADO - RN7490-A, VALDIR PAIS - SP122818-A Advogado do(a) APELANTE: JORGE FERNANDO VAZ - SP273575-A Advogados do(a) APELANTE: AMILCAR BARCA TEIXEIRA JUNIOR - DF10328-A, ANGELO AUGUSTO COSTA DELGADO - DF15537-A, BRUNO ALVES PEREIRA DE MASCARENHAS BRAGA - DF25496, EDISON REGINALDO BERALDO - SP126577-N, JOSE AUGUSTO DELGADO - RN7490-A, J. C. F. - SP122063-A, VALDIR PAIS - SP122818-A APELADO: M. P. F. -. P. OUTROS PARTICIPANTES: D E C I S Ã O Trata-se de RECURSOS ESPECIAIS e EXTRAORDINÁRIO interpostos por F. J. B. e por JOSÉ CARLOS FERNANDES e A. F. contra o v. acórdão proferido pela Décima Primeira Turma desse Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3R), assim ementado e que foi alvo de embargos de declaração: PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. GESTÃO TEMERÁRIA (ART. 4º, PARÁGRAFO ÚNICO, LEI 7.492/1986). INCONSTITUCIONALIDADE: AFASTADA. NULIDADE DECORRENTE DO EXCESSO DE PRAZO PARA TRAMITAÇÃO DO INQUÉRITO: AFASTADA. NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA E INDEVIDO BIS IN IDEM NA FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA: NÃO CARACTERIZADA. ILICITUDE DA PROVA: NÃO CARACTERIZADA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. ESTADO DE NECESSIDADE: NÃO CONFIGURADO. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. A jurisprudência reconhece a constitucionalidade da Lei nº 7.492/1986, recepcionada pela Constituição da República de 1988. Especificamente no que respeita ao tipo penal do parágrafo único do artigo 4º, compreende-se incabível que o legislador esgotasse todas as condutas ditas temerárias capazes de serem praticadas no âmbito da gestão de instituições financeiras. Assim, embora o tipo penal seja aberto, por se tratar de crime pluriofensivo, não há violação ao princípio da reserva legal, uma vez que se mostra possível inferir o conjunto abstrato de condutas relacionadas ao adjetivo temerária, consubstanciando atos arriscados de gestão da instituição financeira, com o potencial de, em último caso, levá-la à insolvência. Precedentes. 2. Os prazos para conclusão de inquéritos policiais em caso de investigados soltos são impróprios e podem ser ajustados de acordo com a complexidade do caso concreto. Precedentes. No caso, a investigação do delito imputado aos apelantes compreendeu a análise de grande volume de documentos, estando justificada a dilação do prazo para conclusão do inquérito policial. 3. Não se há de confundir fundamentação concisa com a ausência dela, não se exigindo do juiz a análise pormenorizada de cada uma das argumentações lançadas pelas partes, podendo ele limitar-se àquelas de relevância ao deslinde da causa, atendendo, assim, ao princípio basilar insculpido no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Precedente. 4. O valor do dia-multa previsto no artigo 49 do Código Penal não se confunde com a pena de prestação pecuniária presente no rol das penas restritivas de direitos, do artigo 43 do Código Penal, por se tratar de institutos com natureza jurídica diversa. Precedente. 5. O Banco Central do Brasil tem o poder-dever de fiscalização das atividades das instituições financeiras e das que lhes são equiparadas, como é o caso da cooperativa de crédito rural descrita nos autos. Desse modo, os atos de gestão praticados estão submetidos à supervisão da autarquia federal. Nesse contexto, deve-se considerar que a fiscalização apurou irregularidades praticadas quando a Credimogiana ainda não havia alterado seu objeto social e exercia atividades de cooperativa de crédito rural. 6. Não houve homologação do encerramento das atividades da cooperativa, mas tão somente a homologação da mudança do seu objeto social. Desse modo, o cancelamento da autorização para funcionamento como cooperativa de crédito não afasta a responsabilidade administrativa de seus gestores por eventuais ilícitos cometidos pela instituição financeira, nem tampouco afasta o poder-dever do Banco Central de apurar a prática de irregularidades. 7. A materialidade do crime previsto no artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986 está demonstrada pelos documentos integrantes do processo administrativo instaurado pelo Banco Central do Brasil, notadamente o Parecer 268/2013 – BCB/DESUC, bem como pelos contratos de concessão de crédito entabulados entre a Credimogiana e associados determinados, nos quais a fiscalização identificou a prática de irregularidades. 8. Não há dissídio quanto ao fato de que os apelantes ocupavam os cargos de diretora administrativa, diretor operacional e diretor presidente da Credimogiana à época dos fatos delituosos apurados. Desse modo, compondo o corpo diretivo da instituição financeira, exerciam funções relacionadas no artigo 25 da Lei nº 7.492/1986, caracterizando a autoria delitiva. 9. O conjunto probatório aponta para a conduta livre e consciente dos acusados de aceitarem o risco de um resultado danoso ou perigoso para a instituição financeira mediante a prática habitual de atos de gestão que não observavam as normativas reguladoras das atividades de cooperativas de crédito. 10. Não há nos autos elementos de prova aptos a corroborarem a afirmação de que a antiga diretoria da Credimogiana teria deixado a instituição à beira da bancarrota. Ainda que a grave dificuldade financeira fosse presumível, não seria propriamente o “perigo” para o réu de que trata o artigo 24 do Código Penal, nem tampouco poderia ser considerado inevitável que os acusados tomassem as medidas que optaram por tomar. No sentido de que a mera alegação de dificuldade financeira não exclui o delito: 11. A defesa dos acusados pauta-se pela alegação de inexistência de prejuízo aos cooperados. Todavia, o conjunto probatório não confirma a inexistência de prejuízo. Pelo contrário, o relatório do BACEN indica prejuízo de R$ 10.572.149,35, decorrente de créditos baixados como tal, sem comprovação de que a cooperativa tomou as providências cabíveis para sua recuperação. 12. Em Juízo, os acusados sustentaram que a mera indicação de prejuízo contábil não implicaria a ocorrência de prejuízo econômico, querendo significar perda de dinheiro para os cooperados. No entanto, não se pode ignorar que a redução drástica no número de cooperados durante a gestão dos acusados (de 500 para menos de 30) é indicativa de que algo não andava bem com a saúde financeira da cooperativa. 13. O crime do parágrafo único do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986 é formal e, por isso, independe da efetiva ocorrência de prejuízo para sua consumação. De fato, a gestão temerária estará caracterizada com a prática reiterada de atos de gestão exageradamente arriscados e contrários às normas e recomendações do mercado financeiro, passíveis de levar a instituição financeira à insolvência. 14. O conjunto probatório aponta de maneira segura para a prática de referidos atos pelos acusados que, no exercício da administração de instituição financeira, aprovaram operações de crédito em desacordo com as normas regulamentares do BACEN sobre diversificação de riscos; sem a observação do limite legal para a concessão de crédito pela cooperativa; sem a exigência de garantias suficientes; sem a correta classificação de risco das operações aprovadas e, consequentemente, sem o adequado provisionamento, estando devidamente configurado o delito de gestão temerária. 15. A r. sentença embasou suas considerações em pontos objetivos extraídos do conjunto probatório contido nos autos, mostrando-se devidamente fundamentada. O caso concreto não permite o afastamento das circunstâncias tomadas por desfavoráveis, sob pena de infringência ao princípio da proporcionalidade. Não obstante, a fim de adequar a dosimetria ao critério mais amplamente aceito por esta Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, e visando à razoabilidade na fixação da pena-base, reduz-se para 1/6 o acréscimo atribuído a cada circunstância judicial negativa, porquanto a fração usual mostra-se suficiente diante do caso concreto. 16. Preliminares afastadas. Apelações interpostas pela defesa parcialmente providas. PENAL. PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO. PRÉ-QUESTIONAMENTO: INADMISSÍVEL NA ESPÉCIE. EMBARGOS REJEITADOS. 1. Os embargos de declaração têm o objetivo específico de sanar ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão da sentença ou acórdão, a teor do artigo 619 do Código de Processo Penal. 2. No caso vertente, verifica-se que o acórdão embargado não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no artigo 619 do CPP. Ao contrário do alegado pelo embargante, o acórdão embargado analisou detidamente as teses apresentadas em sede de apelação à luz do conjunto probatório constante nos autos, tendo fundamentadamente concluído pela manutenção da condenação do réu. 3. A contradição que autoriza o manejo dos embargos declaratórios é a contradição intrínseca ao julgado, que não se verifica no caso concreto. A alegada contradição entre o que foi decidido e as normas ou o entendimento jurisprudencial que, no entender do embargante, aplicam-se ao caso dos autos, não autoriza o uso dos embargos de declaração, pois a insurgência revela-se verdadeira rediscussão de mérito. Observa-se da leitura da peça recursal, que o embargante não aponta, no recurso, contradições intrínsecas do julgado. 4. Os embargos para fim de pré-questionamento têm como pressuposto de admissibilidade a ocorrência de qualquer das hipóteses de cabimento legalmente previstas, caso que não se configurou nos autos. 5. Não se há de confundir fundamentação concisa com a ausência dela, não se exigindo do juiz a análise pormenorizada de cada uma das argumentações lançadas pelas partes, podendo ele limitar-se àquelas de relevância ao deslinde da causa, atendendo, assim, ao princípio basilar insculpido no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Precedente. 6. Embargos de declaração rejeitados. DO RECURSO ESPECIAL DE F. J. B. (artigo 105, III, a, da Constituição Federal) Nas razões de recurso alega-se, em apertada síntese, (1) violação ao artigo 4º da Lei nº 7.492/1986, pela ausência de dolo específico na conduta do recorrente; inexistência de prejuízos à cooperativa; conformidade das operações de crédito com a normatização aplicável; (2) violação ao artigo 10 do Código de Processo Penal, ante o encerramento do inquérito policial fora do prazo; (3) violação ao artigo 659 do Código de Processo Penal, por perda de objeto, pelo ajuizamento da ação penal após o encerramento da cooperativa pelo BACEN, sem prejuízos; (4) violação aos artigos 23 e 24 do Código Penal, pois ...todos os atos praticados foram no intuito de salvar a cooperativa de encerramento das atividades na situação em que se encontrava e, consequentemente, salvar os cooperados de prejuízos financeiros...; (5) violação ao artigo 59 do Código Penal, ante o desproporcional aumento da pena-base por duas circunstancias judicias desfavoráveis (ID 325102895). Contrarrazões pela inadmissão do recurso (ID 327092479). Decido Presentes os pressupostos genéricos de admissibilidade (ID 326665499). A Décima Primeira Turma dessa Corte, soberana na análise das questões fático-processuais, após detido estudo do caso concreto, afastou as preliminares de nulidade decorrente do excesso de prazo para tramitação do inquérito policial e de perda de objeto da ação penal e, no mérito, concluiu que o conjunto probatório demonstra com suficiência que o recorrente praticou o crime do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986, confirmando a sua condenação: ...Afasta-se, igualmente, a preliminar de nulidade decorrente do excesso de prazo para tramitação do inquérito policial. Os prazos para conclusão de inquéritos policiais em caso de investigados soltos são impróprios e podem ser ajustados de acordo com a complexidade do caso concreto. Nesse sentido: ... (STJ, AgRg no REsp n. 2.145.350/AL, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 8/10/2024, DJe de 14/10/2024) ... (STJ, AgRg no HC n. 901.797/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 15/8/2024) No caso, a investigação do delito imputado aos apelantes compreendeu a análise de grande volume de documentos, estando justificada a dilação do prazo para conclusão do inquérito policial. ... Por fim, afasta-se a preliminar de ilicitude da prova e perda de objeto da fiscalização sofrida pela cooperativa de crédito, ao argumento de que o relatório elaborado pelo Banco Central foi posterior à homologação do encerramento das atividades da Credimogiana. O Banco Central do Brasil tem o poder-dever de fiscalização das atividades das instituições financeiras e das que lhes são equiparadas, como é o caso da cooperativa de crédito rural descrita nos autos. Desse modo, os atos de gestão praticados estão submetidos à supervisão da autarquia federal. Nesse contexto, deve-se considerar que a fiscalização apurou irregularidades praticadas quando a Credimogiana ainda não havia alterado seu objeto social e exercia atividades de cooperativa de crédito rural. Note-se, ademais, que não procede a afirmação segundo a qual teria havido a perda de objeto da fiscalização, uma vez que o encerramento da cooperativa de crédito teria sido homologado poucos meses antes do seu início. Com efeito, o Ofício 025695/2016-BCB/Decon/Diadi/Coadi-02 do Banco Central esclarece a situação da cooperativa quando da instauração do procedimento administrativo, nestes termos (ID 277580733, p. 99/100): ... Vê-se, portanto, que não houve homologação do encerramento das atividades da cooperativa, mas tão somente a homologação da mudança do seu objeto social. Desse modo, o cancelamento da autorização para funcionamento como cooperativa de crédito não afasta a responsabilidade administrativa de seus gestores por eventuais ilícitos cometidos pela instituição financeira, nem tampouco afasta o poder-dever do Banco Central de apurar a prática de irregularidades. Superadas as preliminares, passo ao mérito recursal. Da materialidade A materialidade do crime previsto no artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986 está demonstrada pelos documentos integrantes do processo administrativo instaurado pelo Banco Central do Brasil, notadamente o Parecer 268/2013 – BCB/DESUC, bem como pelos contratos de concessão de crédito entabulados entre a Credimogiana e associados determinados, nos quais a fiscalização identificou a prática de irregularidades (ID 277581313, p. 3/17 e p. 76/97; IDs 277581314, 277581315, 277581316, 277581322, 277581330, 277581335, 277581345, 277581350, 277581357, 277581363, 277581381, 277581388, 277581400, 277581405, 277581407, 277581408, 277581410, 277581411, 277581412; 277581415, 277581419, 277581420, 277581422, 277581423, 277581425, 277581427, 277581428, 277581429, 277581431, 277581482, 277581483, 277581484, 277581486, 277581488, 277581491, 277581492, 277581493 e 277581496). Da autoria e do dolo de A. F., Fábio Junio Bacarolli e José Carlos Fernandes Não há dissídio quanto ao fato de que os apelantes, respectivamente, ocupavam os cargos de diretora administrativa, diretor operacional e diretor presidente da Credimogiana à época dos fatos delituosos apurados. Desse modo, compondo o corpo diretivo da instituição financeira, os apelantes exerciam funções relacionadas no artigo 25 da Lei nº 7.492/1986, caracterizando a autoria delitiva. Quanto ao elemento subjetivo do tipo, o conjunto probatório aponta para a conduta livre e consciente dos acusados de aceitarem o risco de um resultado danoso ou perigoso para a instituição financeira mediante a prática habitual de atos de gestão que não observavam as normativas reguladoras das atividades de cooperativas de crédito. Assim é que o Parecer 268/2013 – BCB/DESUC descreve as irregularidades encontradas na Cooperativa, identificando quatro eixos de condutas habituais ditas temerárias, no sentido de exporem a Credimogiana a risco desnecessário, a saber: (a) ausência ou insuficiência da análise cadastral do tomador do crédito; (b) realização de empréstimos sem as garantias de praxe do mercado ou com aceitação de garantias insuficientes; (c) falta de avaliação da capacidade de pagamento do devedor; e (d) concessão de créditos em valores superiores ao permitido pelas normas prudenciais. Além disso, a fiscalização encontrou indícios de manipulação da contabilidade da cooperativa, levando os cooperados e o próprio Banco Central a uma falsa percepção da situação financeira e patrimonial da instituição. Para melhor compreensão dos fatos, veja-se o seguinte excerto do mencionado documento (ID 277581313, p. 3/17): ... Da análise dos documentos juntados aos autos, destacam-se, a título de exemplo, dezenas de contratos de desconto de cheques pré-datados, renovados sem a amortização significativa do saldo devedor. Todos foram garantidos apenas com notas promissórias emitidas pelo próprio tomador do crédito e, sem exceção, foram classificados como de baixo risco ou risco inexistente, levando a um provisionamento aquém do necessário (ID 277581313, p. 3/17 e p. 76/97; IDs 277581314, 277581315, 277581316, 277581322, 277581330, 277581335, 277581345, 277581350, 277581357, 277581363, 277581381, 277581388, 277581400, 277581405, 277581407, 277581408, 277581410, 277581411, 277581412; 277581415, 277581419, 277581420, 277581422, 277581423, 277581425, 277581427, 277581428, 277581429, 277581431, 277581482, 277581483, 277581484, 277581486, 277581488, 277581491, 277581492, 277581493 e 277581496). Essa constatação é corroborada pela Tabela de apuração de provisão contabilizada a menor (ID 277581497, p. 7/8). Como a classificação de risco atribuída pela cooperativa era sistematicamente divergente daquela estipulada pela Resolução BACEN nº 2.682/1999, houve a chamada concentração de risco, com diferença a menor no provisionamento de R$ 2.130.976,00. Ademais, a manipulação da contabilidade da cooperativa implicou a indicação de uma situação patrimonial distante da realidade. De acordo com os dados constantes do Parecer emitido pela fiscalização levada a efeito pelo Banco Central do Brasil, o patrimônio líquido da Credimogiana em setembro de 2010 corresponderia a mais de quatro milhões de reais, quando de fato consistia em cerca de metade disso. Essa prática impediu que os cooperados – principais interessados – tivessem ciência da real situação financeira e patrimonial da cooperativa. Nos termos do Parecer Jurídico 10/2014-BCB/PGBC(ID 277581497, p. 24/33): ... A análise da documentação também revela que a maioria das operações irregulares identificadas pelo Banco Central do Brasil, na prática, beneficiou poucos cooperados, coincidentemente pessoas que no passado atuaram como conselheiros fiscais da Credimogiana. É o caso das dezenas de contratos em que figuram como tomador de crédito as pessoas de Antônio Marino Brandão de Almeida e Amarildo Gonçalo de Almeida, renovados sem a devida amortização do saldo devedor, não se podendo ignorar que, por vezes, um figurou como avalista da obrigação contraída pelo outro. Nesse sentido, também chama a atenção o fato de que os acusados desempenharam papéis na administração de pessoas jurídicas beneficiadas com recursos da cooperativa. Com efeito, A. F. e Flávio Junio Bacarolli foram conselheiros administrativos, e José Carlos Fernandes foi secretário da Somar – Cooperativa de Energia Elétrica e Desenvolvimento (ID 277581429, p. 4/8). Além disso, A. F. atuou como administradora com poder de gestão da empresa denominada Vox Populi Mogi Mirim Comunicações Ltda. (ID 277581491, p. 116/117). Nenhuma dessas pessoas jurídicas foi submetida a uma análise criteriosa da capacidade de pagamento, tanto que estiveram inadimplentes por quase todo o período compreendido pela fiscalização. Não obstante a inadimplência, continuaram recebendo valores elevados da Credimogiana, como se vê pelo seguinte excerto do parecer do BACEN (ID 277581313, p. 11 /13): ... De acordo com o depoimento da testemunha de defesa Nelson Pigozzi, cooperado da Credimogiana, nos anos finais, quando o número de cooperados já estava bastante reduzido, quem sustentava a cooperativa eram as pessoas jurídicas como Somar e Vox Populi, porque mantinham os investimentos (ID 277581136). Por seu turno, o analista do Banco Central ouvido como testemunha da acusação esclareceu que as operações de crédito são classificadas de acordo com o nível de risco que apresentam. Dependendo do nível de risco, a instituição é obrigada a fazer uma provisão tendo em vista a maior probabilidade de inadimplemento e consequente prejuízo. No caso da Credimogiana, diversas operações não foram classificadas corretamente e contaram com provisões insuficientes, tendo sido informado ao BACEN um resultado financeiro em desacordo com a realidade. Além disso, a cooperativa tem um limite para a concessão de crédito por associado, baseado no seu próprio patrimônio. A observância desse limite está ligada à diversificação de risco. O BACEN entende que há concentração de risco quando a cooperativa extrapola o limite para a concessão de crédito. A defesa dos acusados pauta-se pela alegação de inexistência de prejuízo aos cooperados. José Carlos Fernandes admitiu em Juízo que as medidas tomadas pela administração da cooperativa foram heterodoxas e não observaram as normas do BACEN. Reiteradamente, alega que as medidas tomadas teriam visado ao saneamento das contas da cooperativa, para que sua atuação como instituição financeira pudesse ser regularmente encerrada (ID 277581678, a partir de 3”). O argumento segundo o qual a cooperativa era “quase familiar” indica que as análises de crédito, se de fato eram feitas, não eram rigorosas. De se destacar que o acusado não respondeu objetivamente quando o Ministério Público perguntou se as garantias oferecidas estavam documentadas nos autos, para que se pudesse avaliar se eram ou não suficientes. Igualmente não respondeu quando o Ministério Público perguntou se a análise de crédito passava por um processo formal. Insistiu na alegação de que a homologação de baixa da cooperativa seria suficiente para provar que todos os empréstimos teriam sido pagos, sem prejuízo a ninguém (ID 277581767). Por fim, Flávio Junio Bacarolli alegou estranhar que o BACEN tenha apontado as irregularidades da cooperativa apenas após seu encerramento voluntário pelos cooperados. Afirmou que a cooperativa e seu sistema contábil eram anualmente auditados por entidades credenciadas pelo Banco Central e, em todos os anos de operação, nunca teriam sido apontadas irregularidades. Por fim, declarou que os prejuízos contábeis que eventualmente tenham acontecido não teriam gerado prejuízo financeiro para nenhum dos cooperados, pois, do contrário, teriam sofrido ações de cobrança, o que nunca teria acontecido (ID 277581823). A. F. optou por permanecer em silêncio. Em primeiro lugar, deve ser afastado o argumento segundo o qual os atos praticados teriam visado ao saneamento da cooperativa e, desse ponto de vista, poderiam implicar a excludente de ilicitude do estado de necessidade. Não há nos autos elementos de prova aptos a corroborarem a afirmação de que a antiga diretoria da Credimogiana teria deixado a instituição à beira da bancarrota. Ainda que a grave dificuldade financeira fosse presumível, não seria propriamente o “perigo” para o réu de que trata o artigo 24 do Código Penal, nem tampouco poderia ser considerado inevitável que os acusados tomassem as medidas que optaram por tomar. No sentido de que a mera alegação de dificuldade financeira não exclui o delito: ... (STJ, AgRg no REsp n. 1.591.408/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 24/5/2016, DJe de 17/6/2016) Ademais, é necessário esclarecer que o conjunto probatório não confirma a inexistência de prejuízo. Pelo contrário, o relatório do BACEN indica prejuízo de R$ 10.572.149,35, decorrente de créditos baixados como tal, sem comprovação de que a cooperativa tomou as providências cabíveis para sua recuperação (ID 277581313, 14). Em Juízo, os acusados sustentaram que a mera indicação de prejuízo contábil não implicaria a ocorrência de prejuízo econômico, querendo significar perda de dinheiro para os cooperados. No entanto, não se pode ignorar que a redução drástica no número de cooperados durante a gestão dos acusados (de 500 para menos de 30) é indicativa de que algo não andava bem com a saúde financeira da cooperativa. De toda sorte, é preciso considerar que o crime do parágrafo único do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986 é formal e, por isso, independe da efetiva ocorrência de prejuízo para sua consumação. De fato, a gestão temerária estará caracterizada com a prática reiterada de atos de gestão exageradamente arriscados e contrários às normas e recomendações do mercado financeiro, passíveis de levar a instituição financeira à insolvência. Desse modo, tem-se que o conjunto probatório aponta de maneira segura para a prática de referidos atos pelos acusados que, no exercício da administração de instituição financeira, aprovaram operações de crédito em desacordo com as normas regulamentares do BACEN sobre diversificação de riscos; sem a observação do limite legal para a concessão de crédito pela cooperativa; sem a exigência de garantias suficientes; sem a correta classificação de risco das operações aprovadas e, consequentemente, sem o adequado provisionamento, estando devidamente configurado o delito de gestão temerária. Uma vez caracterizados a autoria delitiva e o dolo, resta mantido o decreto condenatório... (ID 316096794) E as teses apresentadas pelo recorrente estão indubitavelmente adstritas ao reexame do conjunto probatório, o que é vedado em sede de recurso especial pela Súmula 7 do STJ: A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. (STJ - Súmula 7, Corte Especial, julgado em 28/6/1990, DJ de 3/7/1990, p. 6478) Com efeito, é incabível a via excepcional para perscrutar a dinâmica criminosa e os atos praticados com o fim de se aquilatar a correção da adequação típica, já que isso demanda o revolvimento da situação fática. No ponto: STJ – AgRg no AREsp n. 2.423.220/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 11/12/2023, DJe de 19/12/2023; AgRg no AgRg no REsp n. 2.067.937/PB, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 15/12/2023; AgRg no AREsp n. 2.471.304/MT, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 5/12/2023, DJe de 11/12/2023. Em relação à dosimetria da pena, verifica-se que a Décima Primeira Turma reformou a pena-base para adequação ao critério de aumento comumente utilizado, tendo em vista a culpabilidade e as circunstâncias do delito: ...Da dosimetria da pena cominada a A. F., Fábio Junio Bacarolli e José Carlos Fernandes A defesa dos acusados pede a redução da pena ao mínimo legal. Na primeira fase, a r. sentença exacerbou a pena-base por considerar desfavoráveis as circunstâncias da culpabilidade e das consequências do delito, atribuindo a cada uma o acréscimo de oito meses a partir da pena-base. No que respeita à culpabilidade, foi valorada negativamente ao fundamento de que os acusados administraram a cooperativa em situação típica de conflito de interesses, ao beneficiarem entidades às quais estavam vinculados. Além disso, praticaram reiteradamente a desinformação acerca dos reais riscos das operações admitidas no período considerado, bem como recusaram-se de maneira contumaz a atender às solicitações do Banco Central, causando embaraço à fiscalização. Por seu turno, quanto às consequências negativas do delito, a r. sentença considerou que a atuação dos acusados à frente da Credimogiana levou a cooperativa a uma progressiva decadência financeira, que se refletiu na saída em massa de cooperados e, por fim, na alteração do objeto social para atividade diversa. Ao final do período fiscalizado, em dezembro de 2011, o valor dos créditos baixados como prejuízo correspondia a aproximadamente 88% do patrimônio da cooperativa. A r. sentença embasou suas considerações em pontos objetivos extraídos do conjunto probatório contido nos autos, mostrando-se devidamente fundamentada. Em vista disso, o caso concreto não permite o afastamento das circunstâncias tomadas por desfavoráveis, sob pena de infringência ao princípio da proporcionalidade. Não obstante, a fim de adequar a dosimetria ao critério mais amplamente aceito por esta Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região (TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 5001069-15.2022.4.03.6006, Rel. Desembargador Federal FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, julgado em 15/03/2024, DJEN DATA: 20/03/2024; TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 78589 - 0013892-47.2010.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 12/11/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/01/2021), e visando à razoabilidade na fixação da pena-base, reduzo para 1/6 o acréscimo atribuído a cada circunstância judicial negativa, por considerar a fração usual suficiente diante do caso concreto. Pena-base fixada em 02 anos, 08 meses e 20 dias de reclusão e 14 dias-multa. Na segunda fase, não há agravantes nem atenuantes a serem sopesadas. Na terceira fase, não incidem causas de aumento nem de diminuição de pena. Pena definitiva reduzida para 02 anos, 08 meses e 20 dias de reclusão no regime inicial aberto e 14 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente em dezembro de 2011, atualizado pelos índices legais. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade, tal como determinado pela r. sentença. (ID 316096794) Considerando que a dosimetria da pena está atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas do agente, qualquer incursão nessa seara também é inviável em sede de recurso especial por força da Súmula 7 do STJ. Nesse sentido: STJ - AgRg no AREsp n. 1.955.976/RS, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 12/3/2024, DJe de 15/3/2024; AgRg no HC n. 879.108/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/3/2024, DJe de 7/3/2024; AgRg no AREsp n. 2.169.349/GO, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 27/6/2023, DJe de 30/6/2023; AgRg no AREsp n. 2.154.006/DF, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 13/6/2023, DJe de 16/6/2023. Ante o exposto, não admito o recurso especial de F. J. B.. DO RECURSO ESPECIAL DE JOSÉ CARLOS FERNANDES E A. F. (artigo 105, III, a e c, da Constituição Federal) Nas razões de recurso alega-se, em apertada síntese, (1) violação ao artigo 26 da Lei nº 7.492/1986, pela incompetência da Justiça Federal, ante a ausência de comprovação de prejuízos União Federal; (2) violação ao artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986, ante a condenação dos recorrentes por condutas negligentes, omissivas, que caracterizam crime culposo, mas o crime de gestão temerária somente admite a conduta dolosa; (3) violação ao artigo 619 do Código de Processo Penal, pois as omissões apontadas nos embargos de declaração não foram sanadas; (4) violação aos artigos 59 e 68 do Código Penal, pois os recorrentes fazem jus à pena-base no mínimo legal, considerando que a culpabilidade dos mesmos e as consequências do crime são inerentes ao tipo penal; a existência de divergência jurisprudencial com o STJ (ID 325102895). Contrarrazões pela inadmissão do recurso (ID 327089843). Decido Presentes os pressupostos genéricos de admissibilidade (ID 326665499). Em relação à alegação de incompetência da Justiça Federal, não conheço o recurso especial por ausência de prequestionamento no julgado recorrido, incidindo aqui por analogia as Súmulas 282 e 356 do STF: É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada. (STF - Súmula 282, Direito Processual Civil, Sessão Plenária de 13/12/1963) O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento. (STF - Súmula 356, Direito Processual Civil, Sessão Plenária de 13/12/1963) No ponto: PENAL. PROCESSO PENAL. CONDENAÇÃO POR HOMICÍDIO. TESE DE CONDENAÇÃO PROFERIDA EM CONTRARIEDADE À PROVA DOS AUTOS. AFASTAMENTO DA TESE NA ORIGEM. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS NS. 7 E 83, STJ. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO DO ARGUMENTO DE AFRONTA AO ART. 489, §1º, INCISOS III e IV, DO CPC. SÚMULAS N.S 282 E 356, STF. AUSÊNCIA DE REALIZAÇÃO DO COTEJO ANALÍTICO ENTRE OS ACÓRDÃOS RECORRIDO E O CONFRONTADO. AGRAVO DESPROVIDO. ... IV - Carece de prequestionamento tese suscitada pela primeira vez no recurso especial, que não foi debatida na origem, nem tampouco suscitada por embargos de declaração. Incidência das Súmulas n.s 282 e 356, STF. Precedentes. V - O recurso especial não apresentou o necessário cotejo analítico entre os julgados apontados como divergentes, o que obsta o seu seguimento (arts. 1.029, § 1.º, do Código de Processo Civil e 255, § 1.º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça). Precedentes. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no AREsp n. 2.165.290/AP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 20/2/2024, DJe de 29/2/2024) E ainda: STJ - AgRg no REsp n. 2.049.512/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 20/2/2024, DJe de 27/2/2024; AgRg no REsp n. 2.064.887/PA, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 5/12/2023, DJe de 12/12/2023; AgRg no AREsp n. 1.649.862/RN, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 24/10/2023, DJe de 30/10/2023; REsp n. 2.046.123/MT, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 24/10/2023, DJe de 27/10/2023). Prosseguindo, a Décima Primeira Turma dessa Corte, soberana na análise das questões fático-processuais, após detido estudo do caso concreto concluiu que o conjunto probatório demonstra com suficiência que os recorrentes praticaram o crime do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986, confirmando as suas condenações: ...Da materialidade A materialidade do crime previsto no artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986 está demonstrada pelos documentos integrantes do processo administrativo instaurado pelo Banco Central do Brasil, notadamente o Parecer 268/2013 – BCB/DESUC, bem como pelos contratos de concessão de crédito entabulados entre a Credimogiana e associados determinados, nos quais a fiscalização identificou a prática de irregularidades (ID 277581313, p. 3/17 e p. 76/97; IDs 277581314, 277581315, 277581316, 277581322, 277581330, 277581335, 277581345, 277581350, 277581357, 277581363, 277581381, 277581388, 277581400, 277581405, 277581407, 277581408, 277581410, 277581411, 277581412; 277581415, 277581419, 277581420, 277581422, 277581423, 277581425, 277581427, 277581428, 277581429, 277581431, 277581482, 277581483, 277581484, 277581486, 277581488, 277581491, 277581492, 277581493 e 277581496). Da autoria e do dolo de A. F., Fábio Junio Bacarolli e José Carlos Fernandes Não há dissídio quanto ao fato de que os apelantes, respectivamente, ocupavam os cargos de diretora administrativa, diretor operacional e diretor presidente da Credimogiana à época dos fatos delituosos apurados. Desse modo, compondo o corpo diretivo da instituição financeira, os apelantes exerciam funções relacionadas no artigo 25 da Lei nº 7.492/1986, caracterizando a autoria delitiva. Quanto ao elemento subjetivo do tipo, o conjunto probatório aponta para a conduta livre e consciente dos acusados de aceitarem o risco de um resultado danoso ou perigoso para a instituição financeira mediante a prática habitual de atos de gestão que não observavam as normativas reguladoras das atividades de cooperativas de crédito. Assim é que o Parecer 268/2013 – BCB/DESUC descreve as irregularidades encontradas na Cooperativa, identificando quatro eixos de condutas habituais ditas temerárias, no sentido de exporem a Credimogiana a risco desnecessário, a saber: (a) ausência ou insuficiência da análise cadastral do tomador do crédito; (b) realização de empréstimos sem as garantias de praxe do mercado ou com aceitação de garantias insuficientes; (c) falta de avaliação da capacidade de pagamento do devedor; e (d) concessão de créditos em valores superiores ao permitido pelas normas prudenciais. Além disso, a fiscalização encontrou indícios de manipulação da contabilidade da cooperativa, levando os cooperados e o próprio Banco Central a uma falsa percepção da situação financeira e patrimonial da instituição. Para melhor compreensão dos fatos, veja-se o seguinte excerto do mencionado documento (ID 277581313, p. 3/17): ... Da análise dos documentos juntados aos autos, destacam-se, a título de exemplo, dezenas de contratos de desconto de cheques pré-datados, renovados sem a amortização significativa do saldo devedor. Todos foram garantidos apenas com notas promissórias emitidas pelo próprio tomador do crédito e, sem exceção, foram classificados como de baixo risco ou risco inexistente, levando a um provisionamento aquém do necessário (ID 277581313, p. 3/17 e p. 76/97; IDs 277581314, 277581315, 277581316, 277581322, 277581330, 277581335, 277581345, 277581350, 277581357, 277581363, 277581381, 277581388, 277581400, 277581405, 277581407, 277581408, 277581410, 277581411, 277581412; 277581415, 277581419, 277581420, 277581422, 277581423, 277581425, 277581427, 277581428, 277581429, 277581431, 277581482, 277581483, 277581484, 277581486, 277581488, 277581491, 277581492, 277581493 e 277581496). Essa constatação é corroborada pela Tabela de apuração de provisão contabilizada a menor (ID 277581497, p. 7/8). Como a classificação de risco atribuída pela cooperativa era sistematicamente divergente daquela estipulada pela Resolução BACEN nº 2.682/1999, houve a chamada concentração de risco, com diferença a menor no provisionamento de R$ 2.130.976,00. Ademais, a manipulação da contabilidade da cooperativa implicou a indicação de uma situação patrimonial distante da realidade. De acordo com os dados constantes do Parecer emitido pela fiscalização levada a efeito pelo Banco Central do Brasil, o patrimônio líquido da Credimogiana em setembro de 2010 corresponderia a mais de quatro milhões de reais, quando de fato consistia em cerca de metade disso. Essa prática impediu que os cooperados – principais interessados – tivessem ciência da real situação financeira e patrimonial da cooperativa. Nos termos do Parecer Jurídico 10/2014-BCB/PGBC(ID 277581497, p. 24/33): ... A análise da documentação também revela que a maioria das operações irregulares identificadas pelo Banco Central do Brasil, na prática, beneficiou poucos cooperados, coincidentemente pessoas que no passado atuaram como conselheiros fiscais da Credimogiana. É o caso das dezenas de contratos em que figuram como tomador de crédito as pessoas de Antônio Marino Brandão de Almeida e Amarildo Gonçalo de Almeida, renovados sem a devida amortização do saldo devedor, não se podendo ignorar que, por vezes, um figurou como avalista da obrigação contraída pelo outro. Nesse sentido, também chama a atenção o fato de que os acusados desempenharam papéis na administração de pessoas jurídicas beneficiadas com recursos da cooperativa. Com efeito, A. F. e Flávio Junio Bacarolli foram conselheiros administrativos, e José Carlos Fernandes foi secretário da Somar – Cooperativa de Energia Elétrica e Desenvolvimento (ID 277581429, p. 4/8). Além disso, A. F. atuou como administradora com poder de gestão da empresa denominada Vox Populi Mogi Mirim Comunicações Ltda. (ID 277581491, p. 116/117). Nenhuma dessas pessoas jurídicas foi submetida a uma análise criteriosa da capacidade de pagamento, tanto que estiveram inadimplentes por quase todo o período compreendido pela fiscalização. Não obstante a inadimplência, continuaram recebendo valores elevados da Credimogiana, como se vê pelo seguinte excerto do parecer do BACEN (ID 277581313, p. 11 /13): ... De acordo com o depoimento da testemunha de defesa Nelson Pigozzi, cooperado da Credimogiana, nos anos finais, quando o número de cooperados já estava bastante reduzido, quem sustentava a cooperativa eram as pessoas jurídicas como Somar e Vox Populi, porque mantinham os investimentos (ID 277581136). Por seu turno, o analista do Banco Central ouvido como testemunha da acusação esclareceu que as operações de crédito são classificadas de acordo com o nível de risco que apresentam. Dependendo do nível de risco, a instituição é obrigada a fazer uma provisão tendo em vista a maior probabilidade de inadimplemento e consequente prejuízo. No caso da Credimogiana, diversas operações não foram classificadas corretamente e contaram com provisões insuficientes, tendo sido informado ao BACEN um resultado financeiro em desacordo com a realidade. Além disso, a cooperativa tem um limite para a concessão de crédito por associado, baseado no seu próprio patrimônio. A observância desse limite está ligada à diversificação de risco. O BACEN entende que há concentração de risco quando a cooperativa extrapola o limite para a concessão de crédito. A defesa dos acusados pauta-se pela alegação de inexistência de prejuízo aos cooperados. José Carlos Fernandes admitiu em Juízo que as medidas tomadas pela administração da cooperativa foram heterodoxas e não observaram as normas do BACEN. Reiteradamente, alega que as medidas tomadas teriam visado ao saneamento das contas da cooperativa, para que sua atuação como instituição financeira pudesse ser regularmente encerrada (ID 277581678, a partir de 3”). O argumento segundo o qual a cooperativa era “quase familiar” indica que as análises de crédito, se de fato eram feitas, não eram rigorosas. De se destacar que o acusado não respondeu objetivamente quando o Ministério Público perguntou se as garantias oferecidas estavam documentadas nos autos, para que se pudesse avaliar se eram ou não suficientes. Igualmente não respondeu quando o Ministério Público perguntou se a análise de crédito passava por um processo formal. Insistiu na alegação de que a homologação de baixa da cooperativa seria suficiente para provar que todos os empréstimos teriam sido pagos, sem prejuízo a ninguém (ID 277581767). Por fim, Flávio Junio Bacarolli alegou estranhar que o BACEN tenha apontado as irregularidades da cooperativa apenas após seu encerramento voluntário pelos cooperados. Afirmou que a cooperativa e seu sistema contábil eram anualmente auditados por entidades credenciadas pelo Banco Central e, em todos os anos de operação, nunca teriam sido apontadas irregularidades. Por fim, declarou que os prejuízos contábeis que eventualmente tenham acontecido não teriam gerado prejuízo financeiro para nenhum dos cooperados, pois, do contrário, teriam sofrido ações de cobrança, o que nunca teria acontecido (ID 277581823). A. F. optou por permanecer em silêncio. Em primeiro lugar, deve ser afastado o argumento segundo o qual os atos praticados teriam visado ao saneamento da cooperativa e, desse ponto de vista, poderiam implicar a excludente de ilicitude do estado de necessidade. Não há nos autos elementos de prova aptos a corroborarem a afirmação de que a antiga diretoria da Credimogiana teria deixado a instituição à beira da bancarrota. Ainda que a grave dificuldade financeira fosse presumível, não seria propriamente o “perigo” para o réu de que trata o artigo 24 do Código Penal, nem tampouco poderia ser considerado inevitável que os acusados tomassem as medidas que optaram por tomar. No sentido de que a mera alegação de dificuldade financeira não exclui o delito: ... (STJ, AgRg no REsp n. 1.591.408/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 24/5/2016, DJe de 17/6/2016) Ademais, é necessário esclarecer que o conjunto probatório não confirma a inexistência de prejuízo. Pelo contrário, o relatório do BACEN indica prejuízo de R$ 10.572.149,35, decorrente de créditos baixados como tal, sem comprovação de que a cooperativa tomou as providências cabíveis para sua recuperação (ID 277581313, 14). Em Juízo, os acusados sustentaram que a mera indicação de prejuízo contábil não implicaria a ocorrência de prejuízo econômico, querendo significar perda de dinheiro para os cooperados. No entanto, não se pode ignorar que a redução drástica no número de cooperados durante a gestão dos acusados (de 500 para menos de 30) é indicativa de que algo não andava bem com a saúde financeira da cooperativa. De toda sorte, é preciso considerar que o crime do parágrafo único do artigo 4º da Lei nº 7.492/1986 é formal e, por isso, independe da efetiva ocorrência de prejuízo para sua consumação. De fato, a gestão temerária estará caracterizada com a prática reiterada de atos de gestão exageradamente arriscados e contrários às normas e recomendações do mercado financeiro, passíveis de levar a instituição financeira à insolvência. Desse modo, tem-se que o conjunto probatório aponta de maneira segura para a prática de referidos atos pelos acusados que, no exercício da administração de instituição financeira, aprovaram operações de crédito em desacordo com as normas regulamentares do BACEN sobre diversificação de riscos; sem a observação do limite legal para a concessão de crédito pela cooperativa; sem a exigência de garantias suficientes; sem a correta classificação de risco das operações aprovadas e, consequentemente, sem o adequado provisionamento, estando devidamente configurado o delito de gestão temerária. Uma vez caracterizados a autoria delitiva e o dolo, resta mantido o decreto condenatório... (ID 316096794) E as teses apresentadas pelos recorrentes estão indubitavelmente adstritas ao reexame do conjunto probatório, o que é vedado em sede de recurso especial pela Súmula 7 do STJ: A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. (STJ - Súmula 7, Corte Especial, julgado em 28/6/1990, DJ de 3/7/1990, p. 6478) Com efeito, é incabível a via excepcional para perscrutar a dinâmica criminosa e os atos praticados com o fim de se aquilatar a correção da adequação típica, já que isso demanda o revolvimento da situação fática. No ponto: STJ – AgRg no AREsp n. 2.423.220/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 11/12/2023, DJe de 19/12/2023; AgRg no AgRg no REsp n. 2.067.937/PB, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 15/12/2023; AgRg no AREsp n. 2.471.304/MT, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 5/12/2023, DJe de 11/12/2023. Em relação à dosimetria da pena, verifica-se que a Décima Primeira Turma reformou a pena-base para adequação ao critério de aumento comumente utilizado, tendo em vista a culpabilidade e as circunstâncias do delito: ...Da dosimetria da pena cominada a A. F., Fábio Junio Bacarolli e José Carlos Fernandes A defesa dos acusados pede a redução da pena ao mínimo legal. Na primeira fase, a r. sentença exacerbou a pena-base por considerar desfavoráveis as circunstâncias da culpabilidade e das consequências do delito, atribuindo a cada uma o acréscimo de oito meses a partir da pena-base. No que respeita à culpabilidade, foi valorada negativamente ao fundamento de que os acusados administraram a cooperativa em situação típica de conflito de interesses, ao beneficiarem entidades às quais estavam vinculados. Além disso, praticaram reiteradamente a desinformação acerca dos reais riscos das operações admitidas no período considerado, bem como recusaram-se de maneira contumaz a atender às solicitações do Banco Central, causando embaraço à fiscalização. Por seu turno, quanto às consequências negativas do delito, a r. sentença considerou que a atuação dos acusados à frente da Credimogiana levou a cooperativa a uma progressiva decadência financeira, que se refletiu na saída em massa de cooperados e, por fim, na alteração do objeto social para atividade diversa. Ao final do período fiscalizado, em dezembro de 2011, o valor dos créditos baixados como prejuízo correspondia a aproximadamente 88% do patrimônio da cooperativa. A r. sentença embasou suas considerações em pontos objetivos extraídos do conjunto probatório contido nos autos, mostrando-se devidamente fundamentada. Em vista disso, o caso concreto não permite o afastamento das circunstâncias tomadas por desfavoráveis, sob pena de infringência ao princípio da proporcionalidade. Não obstante, a fim de adequar a dosimetria ao critério mais amplamente aceito por esta Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região (TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 5001069-15.2022.4.03.6006, Rel. Desembargador Federal FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, julgado em 15/03/2024, DJEN DATA: 20/03/2024; TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 78589 - 0013892-47.2010.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 12/11/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/01/2021), e visando à razoabilidade na fixação da pena-base, reduzo para 1/6 o acréscimo atribuído a cada circunstância judicial negativa, por considerar a fração usual suficiente diante do caso concreto. Pena-base fixada em 02 anos, 08 meses e 20 dias de reclusão e 14 dias-multa. Na segunda fase, não há agravantes nem atenuantes a serem sopesadas. Na terceira fase, não incidem causas de aumento nem de diminuição de pena. Pena definitiva reduzida para 02 anos, 08 meses e 20 dias de reclusão no regime inicial aberto e 14 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente em dezembro de 2011, atualizado pelos índices legais. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade, tal como determinado pela r. sentença. (ID 316096794) Considerando que a dosimetria da pena está atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas do agente, qualquer incursão nessa seara também é inviável em sede de recurso especial por força da Súmula 7 do STJ. Nesse sentido: STJ - AgRg no AREsp n. 1.955.976/RS, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 12/3/2024, DJe de 15/3/2024; AgRg no HC n. 879.108/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/3/2024, DJe de 7/3/2024; AgRg no AREsp n. 2.169.349/GO, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 27/6/2023, DJe de 30/6/2023; AgRg no AREsp n. 2.154.006/DF, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 13/6/2023, DJe de 16/6/2023. Pelo exposto, não admito o recurso especial de JOSÉ CARLOS FERNANDES e A. F.. DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE JOSÉ CARLOS FERNANDES E A. F. (artigo 102, III, a, da Constituição Federal) Nas razões de recurso alega-se, em apertada síntese, (1) negativa de vigência aos artigos 5º, XXXV, LIV e LV, e 93, IX, da Constituição Federal, ...porquanto se a lei assegura o contraditório e o devido processo legal, os atos judiciais que emanam da lei não podem, nesse contexto, serem ausentes de fundamentação e de excluir lesão da apreciação do Judiciário, o que de fato ocorreu quando se optou pela rejeição dos embargos declaratórios, mantendo-se o manifesto prejuízo processual demonstrado desde a fase de conhecimento...; (2) negativa de vigência ao artigo 109 da Constituição Federal, pela incompetência da Justiça Federal, ante a ausência de comprovação de prejuízos União Federal; (3) negativa de vigência ao artigo 93, IX, da Constituição Federal, pela manutenção da pena-base acima do mínimo legal sem qualquer fundamentação inidônea (ID 325239446). Contrarrazões pela inadmissão do recurso (ID 327092288). Decido Presentes os pressupostos genéricos de admissibilidade (ID 326665499). Em relação à alegação de negativa de vigência ao artigo 109 da Constituição Federal, pela incompetência da Justiça Federal, não conheço o recurso especial por ausência de prequestionamento no julgado recorrido, incidindo aqui as Súmulas 282 e 356 do STF: É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada. (STF - Súmula 282, Direito Processual Civil, Sessão Plenária de 13/12/1963) O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento. (STF - Súmula 356, Direito Processual Civil, Sessão Plenária de 13/12/1963) No ponto: Direito Penal e Processual Penal. Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Estupro de vulnerável. Ausência de prequestionamento. Súmulas 282 e 356/STF. I. Caso em exame 1. Agravo regimental contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário com agravo interposto para impugnar acórdão que negou provimento ao recurso. II. Questão em discussão 2. Preenchimento dos pressupostos de admissibilidade do recurso extraordinário com agravo. III. Razão de decidir 3. A petição de agravo não trouxe novos argumentos aptos a desconstituir a decisão agravada, a qual deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos. 4. A alegada violação aos dispositivos constitucionais, nos termos trazidos no recurso extraordinário, não foi objeto de apreciação pelo acórdão do Tribunal de origem, de modo que o recurso extraordinário carece do necessário prequestionamento. Incidência das Súmulas 282 e 356/STF. IV. Dispositivo 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - ARE 1519359 AgR, Relator(a): LUÍS ROBERTO BARROSO (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 19-11-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 22-11-2024 PUBLIC 25-11-2024) Prosseguindo, o STF firmou a seguinte tese no Tema 660, sem repercussão geral – A questão da ofensa aos princípios do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e dos limites à coisa julgada, tem natureza infraconstitucional, e a ela se atribuem os efeitos da ausência de repercussão geral, nos termos do precedente fixado no RE n. 584.608, rel. a Ministra Ellen Gracie, DJe 13/03/2009. Confira-se o leading case: Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais. Rejeição da repercussão geral. (STF - ARE 748371 RG, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 06-06-2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-148 DIVULG 31-07-2013 PUBLIC 01-08-2013) Consequentemente, a aventada ofensa ao artigo 5º, XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal contraria o Tema 660 STF, devendo ser negado seguimento ao recurso extraordinário nos termos do artigo 1.030, I, a, do Código de Processo Civil. No ponto: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AOS INCS. LIV, LV, LVI, LVII E LXVIII DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. APLICAÇÃO DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL NA ORIGEM. TEMA 660 DA REPERCUSSÃO GERAL. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DE RECURSO OU AÇÃO NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL E DE REEXAME DE PROVAS: SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (STF - ARE 1548538 AgR, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 26-05-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 28-05-2025 PUBLIC 29-05-2025) Ementa: Direito Processual Penal. Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Roubo majorado pelo uso de arma de fogo, concurso de agentes e restrição da liberdade da vítima, em concurso material com o crime de extorsão majorado por uso de arma de fogo. Autoria e materialidade delitiva. Fundamentação das decisões judiciais. Inexistência de repercussão geral. Súmula 279/STF. I. Caso em exame 1. Agravo regimental contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário com agravo interposto para impugnar acórdão que deu parcial provimento ao recurso de apelação. II. Questão em discussão 2. Preenchimento dos pressupostos de admissibilidade do recurso extraordinário com agravo. III. Razão de decidir 3. A petição de agravo não trouxe novos argumentos aptos a desconstituir a decisão agravada, a qual deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos. 4. O STF já decidiu que as decisões judiciais não precisam ser necessariamente analíticas, bastando que contenham fundamentos suficientes para justificar suas conclusões (AI 791.292-QO-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes). 5. O Plenário desta Corte afastou a existência de repercussão geral da controvérsia relativa à suposta violação ao art. 5º, II, XXXV, XXXVI, LIV E LV, da CF, quando o julgamento da causa depender de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais (ARE 748.371-RG - Tema 660). 6. Para dissentir do entendimento firmado pelo Tribunal de origem, seria necessário analisar a legislação infraconstitucional aplicada ao caso, assim como reexaminar fatos e provas constantes dos autos, procedimentos vedados neste momento processual. Incidência da Súmula 279/STF. IV. Dispositivo 7. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - ARE 1550517 AgR, Relator(a): LUÍS ROBERTO BARROSO (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 10-06-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 17-06-2025 PUBLIC 18-06-2025) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. MATÉRIA CRIMINAL. HOMICÍDIO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL, CONTRADITÓRIO E AMPLA DFFESA. TEMA 660 DA REPERCUSSÃO GERAL. REEXAME DE FATOS PROVAS. SÚMULA 279 DO STF. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. TEMA 182 DA REPERCUSSÃO GERAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal já assentou a inexistência da repercussão geral quando a alegada ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, da legalidade e dos limites da coisa julgada é debatida sob a ótica infraconstitucional (ARE-RG 748.371, da relatoria do Min. Gilmar Mendes, DJe 1º.08.2013, Tema 660 da sistemática da RG). 2. No caso, eventual divergência em relação ao entendimento adotado pelo Tribunal de origem reclamaria inequívoco reexame do conjunto fático-probatório presente nos autos, medida incabível em sede extraordinária, tendo em vista o óbice contido na Súmula 279 do STF. Precedentes. 3. Esta Corte Suprema possui entendimento de que não possui repercussão geral o tema acerca da valoração das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal na fundamentação da fixação da pena-base pelo juízo sentenciante (AI 742.460, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 25.09.2009, Tema 182). 4. Agravo regimental desprovido. (STF - ARE 1545697 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 26-05-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 28-05-2025 PUBLIC 29-05-2025) EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APLICAÇÃO DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DESCABIMENTO DE AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA O STF. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA POR HOMICÍDIO QUALIFICADO. COMPREENSÃO DIVERSA. REELABORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICA. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 279/STF. DECISÃO FUNDAMENTADA. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. *.É pacífica a jurisprudência desta Suprema Corte no sentido de que é incabível agravo ao Supremo Tribunal Federal contra a aplicação, pelo tribunal de origem, da sistemática da repercussão geral (arts. 1.030, § 2º, e 1.042 do CPC), sendo cabível apenas agravo interno no âmbito do próprio Tribunal a quo. O entendimento consignado na decisão agravada está em conformidade com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal. *. Esta Suprema Corte já decidiu que a matéria relacionada à alegação de violação dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, quando o julgamento da causa depender de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais, não apresenta repercussão geral (Tema 660). *. A controvérsia, conforme já asseverado na decisão guerreada, está restrita ao âmbito infraconstitucional e à análise de fatos e provas. Compreensão diversa demandaria a reelaboração da moldura fática delineada e a interpretação da legislação aplicável, procedimentos vedados em recurso extraordinário. Não há falar, portanto, em afronta aos preceitos constitucionais indicados nas razões recursais. Incidência da Súmula nº 279/STF. 4. Agravo interno conhecido e não provido. (STF - ARE 1543099 AgR, Relator(a): FLÁVIO DINO, Primeira Turma, julgado em 19-05-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 22-05-2025 PUBLIC 23-05-2025) No mais, o STF firmou a seguinte tese no Tema 339, com repercussão geral – O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas. Confira-se o leading case: Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3° e 4°). 2. Alegação de ofensa aos incisos XXXV e LX do art. 5º e ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Inocorrência. 3. O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. 4. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral. (STF - AI 791292 QO-RG, Relator(a): GILMAR MENDES, julgado em 23-06-2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-149 DIVULG 12-08-2010 PUBLIC 13-08-2010 EMENT VOL-02410-06 PP-01289 RDECTRAB v. 18, n. 203, 2011, p. 113-118) Assim, a suposta ofensa ao artigo 93, IX, da Constituição Federal contraria o Tema 339 STF, devendo ser negado seguimento ao recurso extraordinário nos termos do artigo 1.030, I, a, do Código de Processo Civil. A saber: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. OMISSÃO DO ACÓRDÃO A QUO. INOCORRÊNCIA. TEMA 339 DA REPERCUSSÃO GERAL. COMPENSAÇÃO. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DESPROVIMENTO DO AGRAVO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo Interno em face de decisão monocrática, na qual foi negado seguimento ao recurso extraordinário com agravo, com base no Tema 339 da repercussão geral e porque ausente ofensa direta à Constituição Federal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Verificar a viabilidade, ou não, do recurso extraordinário, no caso concreto, em face dos óbices apontados na decisão recorrida. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A petição de agravo regimental não trouxe novos argumentos aptos a desconstituir a decisão agravada, a qual deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos. 4. Ao julgar o AI-QO-RG 791.292, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, DJe 13.08.2010, o Plenário desta Corte assentou a repercussão geral do Tema 339 referente à negativa de prestação jurisdicional por ausência de fundamentação e reafirmou a jurisprudência segundo a qual o art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. 5. A discussão envolvendo a compensação de indébito tributário possui natureza infraconstitucional, de modo que eventual incompatibilidade com a Constituição Federal, caso ocorresse, dar-se-ia de forma reflexa ou indireta, o que inviabiliza a análise do apelo extremo. IV. DISPOSITIVO 6. Agravo regimental a que se nega provimento, com aplicação da multa do art. 1.021, § 4º, do CPC. (STF - ARE 1536548 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 25-06-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 02-07-2025 PUBLIC 03-07-2025) EMENTA: AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA, DANO QUALIFICADO, AMEAÇA E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ALEGADA VIOLAÇÃO AO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DECISÃO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. APLICAÇÃO DE PRECEDENTE DESTA CORTE PROFERIDO NA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 339). INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO. DESCABIMENTO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ARTIGO 5º, XLVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. OFENSA REFLEXA AO TEXTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PLEITO DE AFASTAMENTO DE QUANTIA FIXADA À TÍTULO REPARAÇÃO DE DANOS. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO CARREADO AOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 279 DO STF. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (STF - ARE 1517857 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 10-06-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 10-06-2025 PUBLIC 11-06-2025) AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INOVAÇÃO RECURSAL. DESCABIMENTO. SUFICIÊNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO DO JULGADO RECORRIDO. CONFORMIDADE COM O TEMA N. 339/STF. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSO DE COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE DE DEBATE OU DE SUPERAÇÃO. TEMA N. 181 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA N. 660/STF. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. 1. Descabe, no agravo interno, a alegação de suposta infringência à Constituição Federal não trazida no recurso extraordinário, configurando-se, com isso, indevida inovação recursal. 2. "O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão" (Tema n. 339 do STF, QO no Ag n. 791.292/PE). 3. Existente a fundamentação, entende o Supremo Tribunal Federal que foi respeitado o art. 93, IX, da CF, mesmo que a parte não a repute adequada ou completa, conforme a conclusão firmada no Tema n. 339 do STF, tese de observância obrigatória (CPC, art. 927, III). 4. Quanto às demais alegações, em caso de não conhecimento do recurso anterior por ausência de algum de seus requisitos, as razões do recurso extraordinário, sejam voltadas ao óbice aplicado ou à matéria de fundo, demandariam a reapreciação da conclusão que não conheceu do recurso. 5. A Corte Suprema definiu, sob o regime da repercussão geral, que a questão relativa a pressupostos de admissibilidade de recurso da competência de outros tribunais não possui repercussão geral (Tema n. 181 do STF). 6. Nos termos do art. 1.030, I, a, do Código de Processo Civil, não é possível a remessa do recurso extraordinário ao STF nos casos em que definida a ausência de repercussão geral. 7. A suscitada afronta aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, bem como ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e aos limites da coisa julgada, se dependente da análise de normas infraconstitucionais, configura ofensa reflexa ao texto constitucional, não tendo repercussão geral (Tema n. 660 do STF). 8. Agravo interno parcialmente conhecido e improvido nessa extensão. (STF - AgInt no RE no AgInt no AREsp n. 1.152.603/MS, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 27/2/2024, DJe de 29/2/2024) Pelo exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário de JOSÉ CARLOS FERNANDES e A. F.. São Paulo, 3 de julho de 2025.
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Processo nº 0007989-91.2016.4.03.6106
ID: 261418405
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0007989-91.2016.4.03.6106
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RODOLFO SHIMOZAKO NATES
OAB/SP XXXXXX
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ALAN DUARTE PAZ
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007989-91.2016.4.03.6106 RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO APELANTE: ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREI…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007989-91.2016.4.03.6106 RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO APELANTE: ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS, ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS Advogados do(a) APELANTE: ALAN DUARTE PAZ - SP299552-N, RODOLFO SHIMOZAKO NATES - SP391761-N APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007989-91.2016.4.03.6106 RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO APELANTE: ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS, ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS Advogados do(a) APELANTE: ALAN DUARTE PAZ - SP299552-N, RODOLFO SHIMOZAKO NATES - SP391761-N APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (RELATOR): Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS e ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME, em razão da suposta prática de atos de improbidade administrativa. A petição inicial afirma que a pessoa jurídica ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME recebeu, mediante fraude, valores do Fundo Nacional de Saúde devido à participação no Programa Farmácia Popular do Brasil, o qual é regido pela Lei nº 10.858/04, pelo Decreto nº 5.090/04 e, na época dos fatos, pela Portaria GM/MS nº 971/2012. Isso porque, no período de janeiro de 2013 a novembro de 2014, valendo-se da condição de autorizada pelo Programa Farmácia Popular do Brasil (PFPB), por meio de prestação de informações falsas ao Ministério da Saúde/Fundo Nacional de Saúde (FNS), recebeu, indevidamente, valores por vendas simuladas, em razão de transações fictícias lançadas no Sistema Autorizador de Vendas (DATASUS), em valores que totalizam R$ 110.546,58. Diz que as pessoas naturais indicadas no polo passivo são as únicas a exercer função na drogaria, sendo uma a proprietária e a outra o responsável técnico. Pleiteia a indisponibilidade de bens dos requeridos e, ao final, a condenação por atos de improbidade administrativa capitulados no art. 9º da Lei nº 8.429/92. Atribuiu à causa o valor de R$ 442.186,32 (quatrocentos e quarenta e dois mil, cento e oitenta e seis reais e trinta e dois centavos) em 03.11.2016 – fls. 5/39 do id 256363394. A indisponibilidade de bens foi decretada pela decisão de fls. 43/47 do id 256363394. Defesa preliminar apresentada às fls. 151/161 do id 256363394. A petição inicial foi recebida pela decisão de fls. 182 (id 256363394). Citadas, as partes deixaram transcorrer o prazo para contestar. Por meio da sentença de id 256364750 o juízo, fundamentado no art. 487, I, do CPC, julgou procedente o pedido para condenar os requeridos por prática de atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 9º, XI, 10, I e 11, I, da LIA, aplicando-se-lhes as seguintes sanções: a) ressarcimento integral do dano no montante de R$ 110.546,58; b) pagamento de multa civil no valor de ¼ acréscimo patrimonial, ou seja, R$ 27.636,64; c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber quaisquer benefícios, incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, no prazo de 10 (dez) anos; e, d) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos. Em apelação interposta no id 256364754, ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS e ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME alegam que há “bis in idem” na condenação porque foram condenados no âmbito do Tribunal de Contas da União, de modo que a manutenção da sentença que determinou o ressarcimento ao erário implicaria dupla penalidade e enriquecimento ilícito. Postulam a concessão da justiça gratuita por não terem condições de arcar com as custas do processo. Dizem que RODOLPHO é parte ilegítima para figurar na lide porque atuou apenas como farmacêutico habilitado, sem ingerência nas decisões comerciais. Argumentam não ter havido dano ao erário porque “procederam com a compra e entrega de todos os medicamentos aqui discutidos”, inexistindo, assim, conduta ímproba. Sustentam não terem agido com má-fé e que não há provas “suficientemente claras de qualquer ato reprovável”. Pleiteiam a reforma da sentença, com a absolvição de todas as acusações. Não foram apresentadas contrarrazões. Processado o recurso, subiram os autos a esta E. Corte. Parecer do custos legis no id 256500191. Os autos vieram a mim redistribuídos por sorteio, em razão de criação da unidade judiciária, em 11.09.2023. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007989-91.2016.4.03.6106 RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO APELANTE: ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS, ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS Advogados do(a) APELANTE: ALAN DUARTE PAZ - SP299552-N, RODOLFO SHIMOZAKO NATES - SP391761-N APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (RELATOR): Trata-se de apelação interposta por ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS e ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME contra sentença que os condenou por atos de improbidade administrativa. Da gratuidade da justiça. De início, em razão dos documentos juntados com o apelo, bem como em consideração ao estatuído no art. 98 do CPC, concedo aos apelantes o benefício da gratuidade da Justiça. A gratuidade, contudo, não alcança efeitos pretéritos, não tendo o condão de retroagir para isentar de pagamento eventuais verbas a que condenados. Cuida-se de benefício concedido apenas com efeitos ex nunc, consoante entendimento majoritário da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIMENTO. EFEITOS EX NUNC. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O benefício da assistência judiciária gratuita, conquanto possa ser requerido a qualquer tempo, não retroage para alcançar encargos processuais anteriores ao pedido, aí incluída a condenação ao pagamento de honorários advocatícios. 2. Agravo interno não provido. (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.422.521/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 28/10/2024, DJe de 4/11/2024.) Da preliminar de ilegitimidade de parte. O recorrente RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS aduz ser parte ilegítima para figurar na lide porque “era apenas o técnico responsável da empresa de propriedade de ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS”. No entanto, a Lei de Improbidade Administrativa veio a lume com o intuito de penalizar pessoas, físicas ou jurídicas, que agem de forma desleal com Poder Público ou que malversem recursos públicos. Neste sentido, a lei é categórica ao elencar a responsabilidade da pessoa física (art. 2º da LIA): Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se agente público o agente político, o servidor público e todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no art. 1º desta Lei. Parágrafo único. No que se refere a recursos de origem pública, sujeita-se às sanções previstas nesta Lei o particular, pessoa física ou jurídica, que celebra com a administração pública convênio, contrato de repasse, contrato de gestão, termo de parceria, termo de cooperação ou ajuste administrativo equivalente. Ademais, consta dos autos (fls. 14 do id 256364529) que o recorrente é casado com a requerida ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS, legítima e única proprietária da pessoa jurídica ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME. Não bastasse o vínculo matrimonial, RODOLPHO é o farmacêutico responsável pelo estabelecimento comercial familiar e único funcionário da farmácia, o que denota a existência de comunhão de interesses no âmbito da condução dos negócios. Por fim, mas não menos importante, observa-se do depoimento de RODOLPHO perante a autoridade policial (fls. 18 do id 256364529) o reconhecimento de que ele próprio realizou condutas que, em tese, se amoldam à tipificação de improbidade administrativa. Ante todo o exposto, rejeito a preliminar de ilegitimidade de parte. Primeiro esclarecimento de mérito: dispositivos da Lei 8.429/92 com eficácia suspensa ou modificada pela medida cautelar deferida na ADI 7236/DF, em razão das alterações promovidas pela Lei 14.320/21. De bom grado preconizar que, em razão de medida cautelar deferida na ADI 7236/DF, em 27/12/2022, pelo Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, encontram-se com eficácia suspensa os seguintes dispositivos da Lei 8.429/92, com as modificações produzidas pela Lei 14.320/21: Art. 1º, § 8º: Não configura improbidade a ação ou omissão decorrente de divergência interpretativa da lei, baseada em jurisprudência, ainda que não pacificada, mesmo que não venha a ser posteriormente prevalecente nas decisões dos órgãos de controle ou dos tribunais do Poder Judiciário. Art. 12, § 1º: A sanção de perda da função pública, nas hipóteses dos incisos I e II do caput deste artigo, atinge apenas o vínculo de mesma qualidade e natureza que o agente público ou político detinha com o poder público na época do cometimento da infração, podendo o magistrado, na hipótese do inciso I do caput deste artigo, e em caráter excepcional, estendê-la aos demais vínculos, consideradas as circunstâncias do caso e a gravidade da infração. Art. 12, § 10: Para efeitos de contagem do prazo da sanção de suspensão dos direitos políticos, computar-se-á retroativamente o intervalo de tempo entre a decisão colegiada e o trânsito em julgado da sentença condenatória. Art. 17-B, § 3º: Para fins de apuração do valor do dano a ser ressarcido, deverá ser realizada a oitiva do Tribunal de Contas competente, que se manifestará, com indicação dos parâmetros utilizados, no prazo de 90 (noventa) dias. Art. 21, § 4º: A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). Ademais, também na ADI 7236/DF, foi deferida medida cautelar para conferir interpretação conforme ao art. 23-C, da LIA, “no sentido de que os atos que ensejem enriquecimento ilícito, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação de recursos públicos dos partidos políticos, ou de suas fundações, poderão ser responsabilizados nos termos da Lei 9.096/1995, mas sem prejuízo da incidência da Lei de Improbidade Administrativa”. A decisão emanada da ADI 7236/DF, no que for pertinente, será adotada no presente voto. Segundo esclarecimento de mérito: Da eventual comunicação dos efeitos absolutórios de sentenças civis e penais (art. 21, §§ 3º e 4º, da Lei 14.230/2021) Dispõem os parágrafos 3º e 4º do art. 21 da LIA, incluídos pela Lei 14.230/21: § 3º As sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria. § 4º A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). Todavia, na medida cautelar deferida na ADI 7236/DF, pelo Supremo Tribunal, foi suspensa a eficácia do § 4º do art. 21, por encontrar-se em conflito com a independência de instâncias consagrada no § 4º do art. 37 da Constituição Federal. Preservou-se, no entanto, com base em precedentes da própria Corte Suprema, a eficácia do § 3º, uma vez reconhecida, em sentença civil ou penal, a inexistência material do fato ou a negativa expressa da autoria, hipóteses em que o reconhecimento judicial deve se estender à ação de improbidade em que sejam imputados ao réu os mesmos fatos. Entretanto, havendo absolvição com fundamento na mera insuficiência de provas, o resultado absolutório não se estende automaticamente à ação por improbidade, uma vez que, em decorrência da medida cautelar concedida na ADI 7236/DF, encontram-se suspensos os efeitos do parágrafo 4º do 21 da LIA, segundo a redação da Lei 14.230/21. Impõe-se, destarte, o julgamento de mérito, para verificação da materialidade da conduta e seu caráter doloso. Da alegação de prescrição: as regras sobre prescrição na LIA com a nova redação da Lei 14.230/21 Em sua nova redação, o caput art. 23 da LIA passou a dispor que a prescrição se regula pelo prazo de oito (anos), sujeito às suspensões e interrupções previstas nos parágrafos 1º a 8º, inclusive trazendo novos benefícios como a prescrição intercorrente (§ 4º) e a contagem pela metade do prazo interrompido (§ 5º): Quanto a isso, o Supremo Tribunal Federal, no RE 843.989/PR, definiu que as novas regras de prescrição serão aplicáveis somente aos atos praticados após a data da publicação da Lei 14.230/21: “O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei”. Este entendimento foi integralmente acompanhado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, nos embargos de declaração e agravos interpostos no RESP 1.305.753/MG. Portanto, somente ficam subsumidas às novas regras prescricionais as condutas ocorridas ou cessadas a partir de 26 de outubro de 2021, quando se deu a publicação da Lei 14.230/2021. Em sendo assim, em matéria de prescrição, o presente caso ainda se submete aos ditames da antiga redação do art. 23 da LIA. Vale transcrever a antiga redação do art. 23: Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I - Até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; II - Dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego. III - Até cinco anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único do art. 1o desta Lei (incluído pela Lei n. 13.019/2014). Cumpre verificar, no caso concreto, se houve a consumação do prazo prescricional. Para tanto, observo que os atos imputados aos réus foram praticados no período compreendido entre janeiro/2013 a novembro/2014 e que a ação foi proposta no ano de 2016, de modo que não há que se falar em prescrição. Da não exigência de dolo específico para a configuração da improbidade administrativa Entendem alguns que a nova redação da LIA (art. 1º, § 2º) introduziu a dolo específico como requisito para a caracterização da improbidade administrativa, entendimento que cheguei a perfilhar. Todavia, examinando a questão com mais profundidade, penso que basta o dolo comum ou genérico para que esteja atendido o elemento subjetivo da improbidade. De fato, exigir “dolo específico” na improbidade administrativa constitui um caminho certo para a impunidade, caso isso seja entendido como prova cabal de que o agente agiu desonestamente e com a “intenção de ser desonesto”, desaguando em verdadeira redundância típica e, portanto, em colisão lógica, como farei explicar. Em primeira ordem, devemos anotar que o Supremo Tribunal Federal confirmou o caráter civil (“ilícito civil qualificado”) dos atos de improbidade (RE 843.989). Não poderia ser outra a conclusão, uma vez que a própria Carta Constitucional distingue improbidade e ilícitos penais. Primeiro, quando prevê a cassação de direitos políticos (art. 15), claramente separando as hipóteses de condenação criminal (inciso III) e punição por improbidade (inciso V). Depois, no § 4º do art. 37, quando estabelece a punibilidade dos atos de improbidade, “sem prejuízo da ação penal cabível”. Eliminada qualquer dúvida sobre o caráter civil dos ilícitos por improbidade, devemos assinalar que em momento algum a LIA, em sua nova redação, menciona “dolo específico”, tese que, com a devida vênia, resulta de interpretação açodada do parágrafo 2º do art. 1º, incluído pela Lei 14.230/2021, quando diz que “considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos art. 9º, 10 e 11”, não bastando a simples “voluntariedade do agente”. Ao fazer isso, o citado dispositivo não dispõe sobre o dolo específico, mas apenas sobre o dolo genérico, com o que pretende afastar qualquer hipótese de punição por simples culpa. Oportuno destacar que não existe, na seara civil, distinção entre dolo genérico e dolo específico. Há somente o “dolo”. O art. 186 do Código Civil diz que comete ato ilícito aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, “violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral”. Não se encontra, no apontado código, qualquer distinção entre dolo genérico e dolo específico. Ele nem mesmo faz a distinção entre dolo e culpa, o que resulta de construção doutrinária (cf. Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de direito civil. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense. 2022, p. 562). Segundo Orlando Gomes (Introdução ao direito civil, 2019, p. 350), haverá dolo “quando houver uma violação intencional de um dever jurídico”, distinguindo-o da conduta apenas culposa. Neste mesmo sentido, vai a lição de Carlos Roberto Gonçalves (Direito Civil Brasileiro - Parte Geral, 2023, p. 205), para quem o dolo é a violação deliberada, intencional, do dever jurídico, que consiste na vontade de cometer uma violação de direito. A culpa, por sua vez, consiste no agir com falta de diligência. Mesmo no âmbito penal, segundo a Teoria Finalista da Ação, amplamente majoritária na doutrina e na jurisprudência, o dolo não constitui espécie qualificada de culpabilidade ou reprovabilidade (como induz a pensar a nova redação da LIA). É tão-somente um “elemento subjetivo” de alguns tipos penais. O mesmo ocorre com o “dolo específico”: é elemento subjetivo de alguns crimes, como o sequestro (art. 148 do CP). Portanto, não há que se exigir uma espécie de “culpabilidade qualificada” (dolo específico?) para que os atos de improbidade sejam puníveis. Basta o dolo, traduzido na consciência, pura e simples, daquilo que se está a fazer. Descabido cogitar de um “fim específico de agir”, à moda de uma desonestidade superdimensionada. A “vontade livre e consciente de alcançar o resultado”, como diz o § 2º do art. 1º da LIA, não tem relação com o “dolo específico”. É premissa de qualquer tipo de dolo, inclusive o genérico ou comum. Nestes termos, se é inadmissível, na clara dicção do novo texto, que a conduta ímproba seja meramente culposa (ou decorrente da simples falta de diligência), tampouco se pode exigir que esteja escancarada em manifestação explícita da intencionalidade do agente. A intencionalidade não decorre somente da palavra expressa. Pode ser identificada por meio de indícios reveladores dessa intenção, a serem ponderados em cada caso e objetivamente expostos na acusação e na eventual condenação. Daí resulta uma pergunta crucial: como verificar a intencionalidade do agente ao adotar uma conduta? A resposta não é difícil, desde que se tenha em mente o quadro de premissas possíveis no momento de escolha da conduta, escrutínio que deve ser necessariamente feito pelos órgãos acusatório e julgador. Se a conduta escolhida implica necessariamente no resultado ilícito, sem que haja outras explicações plausíveis para a deliberação do agir, não há dúvida de que se trata de conduta dolosa, pela simples inexistência de outras opções. Com efeito, na presença de enriquecimento sem origem, favorecimento indevido, desvio de finalidade ou outras condutas típicas, conscientemente adotadas e à mingua de quaisquer outras explicações razoáveis, seria até jocoso exigir a prova cabal da intenção de pecar, de fazer ruborizar qualquer cidadão de bem. Por outro lado, havendo premissas de agir (outras motivações razoáveis) que possam justificar a deliberação da conduta, não se pode atribuir ao agente uma intencionalidade presuntiva, posto que a presunção, por si só, acarreta a desqualificação lógico-jurídica do dolo. Em conclusão, se não precisa estar escancarado, o dolo tampouco pode ser presumido, cabendo ao órgão acusador, diante de razoáveis justificativas da conduta do administrador público, o ônus de comprovar que sua intenção foi sub-reptícia, para o que não basta a mera discordância pessoal quanto aos fins perseguidos na conduta, sob pena de a função persecutória se converter em usurpação da discricionariedade administrativa. Presente uma escolha razoável do agir, sem indícios concretos do enviesamento desonesto, não há como qualificar ímproba a conduta do administrador público. Do caso dos autos. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por meio de inquérito civil, apurou que os apelantes receberam de forma fraudulenta valores do Fundo Nacional de Saúde devido à participação da empresa no Programa Farmácia Popular do Brasil. A investigação teve início após elaboração do Relatório Final da Auditoria nº 16.000 do Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS), a qual teve por objeto verificar a regularidade na execução do Programa Farmácia Popular do Brasil na empresa denominada ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME, cujo nome fantasia é Drogaria Nossa Senhora Aparecida, situada no município de Riolândia/SP. Aludido documento (fls. 2 e seguintes do id 256364492), elaborado por órgão vinculado ao Ministério da Saúde, apresenta a constatação de nº 399845 segundo a qual “A empresa auditada não apresentou as cópias das notas fiscais das aquisições do total de medicamentos dispensados por meio do Programa Farmácia Popular do Brasil nos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2013, e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2014, relacionados no Anexo III. Tal procedimento está em desacordo com o estabelecido no artigo 11 do Decreto Federal nº 1.651 de 28/09/1995 e no § 2º do artigo 23, artigo 39 e inciso I do artigo 40 da Portaria GM/MS nº 971, em vigência desde 15/05/2012”. Além disso, constatou-se (constatação nº 399486) que “houve dispensação de medicamentos em nome de funcionário da empresa Ana Cornélia de Carvalho Pugas ME, por meio do Programa Farmácia Popular do Brasil, no mês de junho de 2013”, sem que houvesse prescrição médica. Concluiu a auditoria, assim, que “A empresa Ana Cornélia de Carvalho Pugas ME executou as ações do Programa Farmácia Popular do Brasil em desacordo com as normas estabelecidas pelo Ministério da Saúde, no que se refere a não comprovação das aquisições por meio de notas fiscais dos medicamentos: Maleato de Enalapril (EAN 7896523210759) nos meses: 01 a 07/2013, 10/2013 e 12/2013 a 11/2014; Losartana Potássica (EAN 7898148301720) nos meses: 02/2013 e 11/2013 a 11/2014; Atenolol (EAN 7896181900122) nos meses: 10/2013 a 07/2014 e 09 a 11/2014; Captopril (EAN 7896714205687) nos meses: 07/2013 a 06/2014 e 09/2014; Losartana Potássica (EAN 7898910350239) nos meses: 08/2013; Cloridrato de Metformina (EAN 7898148291298) nos meses: 01/2013, 03/2013 e 02/2014 a 11/2014; Sinvastatina (EAN 7897595609892) nos meses: 02/2014, 04/2014 e 09 a 11/2014; Maleato de Enalapril (EAN 7896181900894) nos meses: 02 a 11/2014; Atenolol (EAN 7894916144209) nos meses: 01/2013, 03 a 05/2013, 08 e 09/2013 e 12/2013 a 11/2014 e Sivasmax (EAN 7898060138091) nos meses: 05/2013 a 11/2014”. Importante observar que apesar de chamados a se defenderem no procedimento administrativo, os requeridos não apresentaram defesa e, consequentemente, nenhuma documentação que justificasse a regularidade das dispensações dos medicamentos. O Programa Farmácia Popular do Brasil tem origem na Lei nº 10.858/04, que inicialmente tratou de disponibilizar medicamentos pela Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, mediante ressarcimento, visando assegurar à população o acesso a produtos básicos e essenciais à saúde. Com o intuito de regulamentar a previsão legislativa, o Governo Federal editou o Decreto nº 5.090/2004, instituindo o programa “Farmácia Popular do Brasil” prevendo a disponibilização de medicamentos em municípios e regiões do território nacional. O decreto estabelecia que a disponibilização de medicamentos seria efetivada “em farmácias populares, por intermédio de convênios firmados com Estados, Distrito Federal, Municípios e hospitais filantrópicos, bem como em rede privada de farmácias e drogarias”, e que, nos casos de distribuição em redes privadas de farmácias e drogarias, o preço dos itens seria “subsidiado parcial ou integralmente” (art. 1º, §§ 1º e 2º). À época dos fatos, a Portaria MS 184/2011 do Ministério da Saúde disciplinava sobre a disponibilização de medicamentos à população por meio de rede própria ou por farmácias ou drogarias particulares que firmassem convênio e aderissem ao programa “Aqui Tem Farmácia Popular”. Dentre outros preceitos, dispunha a portaria: Art. 2º O PFPB consiste na disponibilização de medicamentos e/ou correlatos à população, pelo Ministério da Saúde (MS), por meio dos meios descritos abaixo: I - a "Rede Própria", constituída por Farmácias Populares, em parceria com os Estados, Distrito Federal, Municípios e hospitais filantrópicos; e II - o "Aqui Tem Farmácia Popular", constituído por meio de convênios com a rede privada de farmácias e drogarias. Art. 21. A Autorização de Dispensação de Medicamentos e Correlatos (ADM) será processada por meio eletrônico, em tempo real, com base no código de barras EAN da embalagem do medicamento e/ou do correlato. Art. 22. As ADMs serão validadas pelo MS quando contiverem todas as informações indicadas na Seção VII deste Capítulo, desde que atendidos todos os critérios do PFPB. Art. 23. A cada operação, obrigatoriamente, o estabelecimento deve emitir duas vias do cupom fiscal e do cupom vinculado. Art. 24. O cupom vinculado, obrigatoriamente, deverá conter as seguintes informações, conforme modelo sugerido no Anexo V a esta Portaria: I - nome completo do beneficiário ou seu representante legal, por extenso; II - número do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do beneficiário ou seu representante legal; III - assinatura do beneficiário ou seu representante legal; IV - endereço do beneficiário ou espaço para preenchimento; V - razão social e CNPJ da empresa; VI - nome do responsável legal da empresa; VII - número de autorização do DATASUS; VIII - UF e Número de inscrição do médico no Conselho Regional de Medicina (CRM); IX - valor total da venda, do subsídio do MS, da parcela a ser paga pelo beneficiário e do custo-zero dos medicamentos para hipertensão arterial e diabetes melittus; X - data da compra; XI - nome do medicamento, apresentação e/ou correlato; XII - código de barras do medicamento e/ou correlato; XIII - posologia diária ou prescrição diária; XIV - quantidade autorizada; XV - saldo atual (conforme posologia ou prescrição diária); XVI - data da próxima compra; XVII - identificação do operador da transação; e XVIII - número da Ouvidoria do MS para consultas ou denúncias (0800 61 1997). Parágrafo único. Fica concedido o prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da publicação desta Portaria, para que as farmácias e drogarias adotem, obrigatoriamente, o padrão das informações a serem contidas no cupom vinculado. Art. 25. O paciente, obrigatoriamente, deve assinar o cupom vinculado, sendo que uma via deve ser mantida pelo estabelecimento e a outra entregue ao paciente. Art. 26. O estabelecimento deve manter por 5 (cinco) anos as vias assinadas dos cupons vinculados e cupons fiscais arquivadas em ordem cronológica de emissão, que deverão ser disponibilizados sempre que necessário. Art. 27. Para a comercialização e a dispensação dos medicamentos e/ou correlatos no âmbito do PFPB, as farmácias e drogarias devem obrigatoriamente observar as seguintes condições: I - apresentação pelo paciente, de documento no qual conste o seu número de CPF, e sua fotografia; II - apresentação de prescrição médica, no caso de medicamentos, ou prescrição, laudo ou atestado médico, no caso de correlatos, com as seguintes informações: a) número de inscrição do médico no CRM, assinatura e carimbo médico e endereço do consultório; b) data da expedição da prescrição médica; e c) nome e endereço residencial do paciente. § 1º As farmácias e drogarias deverão providenciar uma cópia da prescrição, laudo ou atestado médico apresentado pelo paciente no ato da compra e mantê-la por 5 (cinco) anos para apresentação sempre que for solicitado. § 2º Caberá as farmácias e drogarias manter por um prazo de 5 (cinco) anos para apresentação, sempre que necessário, as notas fiscais de aquisição dos medicamentos e/ou correlatos do PFPB junto aos fornecedores. Art. 42. As transações das empresas serão verificadas mensalmente, ou quando houver necessidade, segundo os dados processados pelo Sistema Autorizador de Vendas, para controle e monitoramento do Programa. Art. 43. O MS solicitará ao estabelecimento credenciado, sempre que necessário, a prestação de informações detalhadas sobre as suas operações, cópia das prescrições, laudos ou atestados médicos, das notas fiscais, dos cupons fiscais e vinculados, amostra de material publicitário e demais documentos comprobatórios das autorizações realizadas, as quais deverão ser encaminhadas no prazo máximo de 10 (dez) dias. Art. 44. O descumprimento de qualquer das regras dispostas nesta Portaria e seus Anexos pelas farmácias e drogarias caracteriza prática de irregularidade no âmbito do PFPB, sendo consideradas situações irregulares, dentre outras: I - comercializar e dispensar medicamentos e/ou correlatos fora da estrita observância das regras de execução do PFPB, dispostas nesta Portaria; II - deixar de exigir a prescrição, laudo ou atestado médico, a apresentação do CPF e a assinatura do titular do CPF no cupom vinculado; III - deixar de cobrar do paciente o pagamento da sua parcela referente à compra do(s) medicamento(s) e/ou correlato(s), salvo para as dispensações de medicamentos indicados para hipertensão arterial e diabetes mellitus que poderá atingir até 100% do vr; IV - comercializar e dispensar medicamentos e/ou correlatos do Programa em nome de terceiros, conforme disposto no art. 32 desta Seção; V - estornar a venda cancelada ou irregular, com prazo superior a 7 (sete) dias da consolidação da transação; VI - comercializar medicamentos e correlatos com senha diversa daquela que foi conferida exclusivamente ao estabelecimento credenciado; VII - firmar convênios e parcerias com empresas, cooperativas e instituições congêneres para operações coletivas no âmbito do PFPB; VIII - fazer uso publicitário do PFPB fora das regras definidas nesta Portaria; IX - deixar de expor as peças publicitárias que identifiquem o credenciamento ao PFPB, estabelecidas no Art. 38; X - cadastrar pacientes em nome do PFPB fora do estabelecimento, especialmente, em domicílio; XI - entregar medicamentos e/ou correlatos do PFPB fora do estabelecimento, especialmente em domicílio, uma vez que a venda exige a presença do paciente no estabelecimento, munido dos documentos necessários; XII - deixar de observar as regras do órgão de vigilância sanitária para funcionamento do estabelecimento; XIII - permitir que pessoa distinta do titular da receita ou seu procurador legal assine em nome do paciente, o que poderá caracterizar falsidade ideológica; XIV - rasurar quaisquer documentos necessários para a validação da venda dos itens constantes do elenco do programa; XV - receber a prescrição, laudo ou atestado médico com data posterior a autorização consolidada; XVI - lançar no sistema de vendas do programa, informações divergentes das constantes na prescrição, laudo ou atestado médico e no documento do paciente; XVII - dispensar medicamentos e/ou correlatos cuja prescrição, laudo ou atestado médico que já tiverem sido dispensados ou fornecidos, cuja comprovação se dê por meio da presença de carimbo com a inscrição fornecido; e XVIII - realizar a substituição do medicamento prescrito em desacordo com a Legislação vigente. Parágrafo único. O DAF/SCTIE/MS poderá, a qualquer tempo, requisitar os documentos que comprovam a regularidade das farmácias e drogarias junto ao órgão de vigilância sanitária. Os apelantes deixaram de seguir as regras previstas. Da análise dos documentos colacionados, em especial a auditoria realizada pelo Ministério da Saúde, tem-se que a empresa ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME, de propriedade de ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS e cujo responsável técnico e único funcionário era seu marido, RODOLPHO RODRIGO DE PAULA PUGAS, executou ações do programa em desacordo com as normas estabelecidas. Dentre as irregularidades apuradas, houve registros de dispensação de medicamentos em nome de funcionário e dispensações sem comprovação de aquisição por meio de notas fiscais. Ao ser indagado pela autoridade policial a respeito da dispensação de medicamento para funcionário, RODOLPHO apresentou justificativa pouco crível no sentido de que “não foi uma venda efetivada e as iniciais de nome que constam e as iniciais de CPF são do próprio declarante; QUE esclarece que o sistema de vendas do Programa Farmácia Popular era muito lento e com conexão ruim; QUE naquela ocasião, para o declarante “não perder a tela” do sistema que se encontrava naquele momento digitou o próprio CPF, pois é número que possui de cor, e colocou medicamentos aleatórios; QUE caso “perdesse a tela” deveria reiniciar todo o procedimento que já estava realizado para venda; QUE acredita que naquele momento estava realizando uma venda de medicamento a terceira pessoa; QUE perguntado sobre a nota fiscal 007398, disse que como não houve a venda efetiva, descartou a nota; QUE perguntado se no sistema de venda pelo programa há uma opção de estornar a venda ou corrigir, disse não se recordar” – fls. 18 do id 256364529. A falta de credibilidade advém de RODOLPHO ser profissional experiente, que além de responsável técnico da empresa ANA CORNELIA DE CARVALHO PEREIRA PUGAS – ME, era proprietário de outro estabelecimento comercial, cujo nome fantasia era “Drogaria Santa Clara”. Nesse sentido, confira-se o depoimento da testemunha Natália Cristina Marques de Oliveira Souza (fls. 22 do id 256364529): QUE é universitária do curso de Farmácia na Unifev de Votuporanga/SP; QUE perguntado se trabalhou na Drogaria Nossa Senhora Aparecida de Riolândia, disse que não; QUE trabalhou por cerca de seis meses como balconista na Drogaria Santa Clara; QUE informa que a Drogaria Santa Clara pertencia a Rodolpho Rodrigo de Paula Pugas, esposo de Ana Cornelia de Carvalho Pereira Pugas e foi erroneamente registrada como empregada pela Drogaria Nossa Senhora Aparecida; Portanto, considerando se tratar de profissional experiente, que também é proprietário de farmácia, não se pode acolher o argumento de que “para não perder a tela” optou por inserir os próprios dados e medicamentos aleatórios, além de dispensar a nota fiscal. Os apelantes também não infirmaram as conclusões da auditoria referentes à Constatação nº 399845 (fls. 7 do id 256364492), a respeito de ausência de notas fiscais de aquisições de medicamentos dispensados pelo Programa Farmácia Popular do Brasil. As notas apresentadas em juízo, como observou o magistrado em sua sentença, “são as mesmas já desconsideradas pela DENASUS por não corresponderem aos EANs dos medicamentos auditados, ou seja, correspondem à aquisição de medicamentos, mas não aos que foram objeto de auditoria, isto é, os que foram objeto das “vendas” relacionadas ao PFPB e do correspondente repasse de subsídios pelo Governo Federal”. Em outras palavras, os apelantes juntaram aos autos documentos (notas fiscais) que não se referem aos medicamentos auditados pelo Governo Federal. Diante de toda essa situação, é incontestável que os apelantes agiram em descompasso com a previsão contatual do Programa Farmácia Popular do Brasil, de forma a propiciar enriquecimento indevido próprio e prejuízo ao erário. O art. 9º da Lei 8.429/92 pune as condutas que importam enriquecimento ilícito. Para a configuração do ato ímprobo exige-se dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito (enriquecimento ilícito). Conforme explicam Fernão Borba Franco e Luana Pedrosa de Figueiredo Cruz na obra coletiva Comentários à Nova Lei de Improbidade Administrativa, “O dolo, para fins de caracterização de ato de improbidade, poderá e deverá ser tratado como a vontade livre e consciente de praticar os atos de tal maneira que vai além do ato praticado sem cuidado, sem cautela, e sim com o específico propósito ou a ausência de cuidado deliberados, para lesar o erário” (Comentários à Lei de Improbidade Administrativa, RT, 6ª edição, pág. 39). Para os autores, trata-se do ato eivado de má-fé. Os apelantes tinham conhecimento de que agiam de forma contrária às determinações legais visando o lucro na revenda de medicamentos, conduta que se amolda à tipificação descrita no art. 9º, XI, da Lei 8.429/92. Com a mesma conduta, causaram prejuízo ao erário, em conduta tipificada no art. 10, I, da Lei 8.429/92. Deve ser afastado, no entanto, o enquadramento realizado pelo magistrado no que concerne ao art. 11, caput, da Lei 8.429/92. Isso porque, conquanto os apelantes não tenham agido em conformidade com o que se espera daquele que contrata com a Administração Pública, a Lei 14.230/21 alterou o panorama jurídico da improbidade administrativa. Com relação específica às condutas violadoras dos princípios da Administração Pública, atualmente mostra-se imprescindível que a ação ou omissão ocorra na forma de um dos modos expressamente previstos. Se antes bastava a simples afronta aos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, agora é preciso que aduzidos princípios sejam violados mediante condutas específicas, como revelando ou divulgando fato de que tem conhecimento por força do ofício ou profissão, frustrando procedimento de concurso público ou de licitação, deixando de prestar contas quando se está obrigado a fazê-lo etc. Em outras palavras, com a Lei 14.230/21, o art. 11, que possuía uma tipificação aberta, passou a prever um rol fechado de condutas consideradas ímprobas. Nesse sentido, veja-se a doutrina de Daniel Amorim Assumpção Neves e Rafael Carvalho Rezende de Oliveira: Em sua redação originária, o caput do art. 11 da LIA utilizava a expressão “notadamente”, que também constava (e ainda consta) dos arts. 9º e 10 da LIA. Ocorre que a reforma introduzida pela Lei 14.230/2021 suprimiu a citada expressão no dispositivo legal e inseriu no seu lugar a expressão “caracterizada por uma das seguintes condutas”. Assim, a partir da reforma da LIA, a improbidade por violação aos princípios depende da prática de uma das condutas descritas taxativamente nos incisos do art. 11, sendo insuficiente a violação aos princípios da Administração Pública para a caracterização da improbidade administrativa. (Improbidade Administrativa, Direito Material e Processual, Forense, 9ª ed., pág. 97) As ações praticadas pelos apelantes, atualmente, não se enquadram em nenhum dos incisos do art. 11 da atual redação da Lei nº 8.429/92. O enquadramento efetuado pelo autor da ação (art. 11, caput), não mais subsiste no ordenamento jurídico. Apesar de não se tratar de lei penal, como direito sancionador é de se aplicar, de igual modo, a garantia da retroatividade da lei mais benéfica consagrada no inciso XL do art. 5º da Constituição Federal. Portanto, devido à atipicidade superveniente da conduta, não se justifica, embora material e moralmente reprovável, a punição dos apelantes. A propósito, assim já se decidiu no âmbito desta E. Turma julgadora: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 14.230/21. CONHECIMENTO DE OFÍCIO OU A REQUERIMENTO DA PARTE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 493 DO CPC/2015. ATIPICIDADE SUPERVENIENTE DA CONDUTA. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA NÃO ULTRA-ATIVIDADE DAS NORMAS. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS MANTIDA. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS. 1 - Em sua estrutura organizacional e no exercício de suas funções, a Administração Pública deve se orientar, entre outros, pelos princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade, nos termos do artigo 37, caput, da Constituição Federal. 2 - Isso porque a desconsideração dos limites legais e o tratamento jurídico diferenciado, sem respaldo em princípios e valores constitucionalmente admitidos, enfraquecem a legitimidade do Estado e, consequentemente, colocam em risco a própria democracia representativa e, no limite, o Estado de Direito. 3 - A observância apenas dos procedimentos legais, contudo, é insuficiente para assegurar a coesão social. Eis a razão pela qual o poder constituinte originário também determinou que a Administração Pública, em suas relações jurídicas, atue segundo padrões de natureza ética, atendendo aos deveres de boa-fé e de honestidade, nos termos do princípio da moralidade administrativa. 4 - Neste sentido, foi delegada ao Poder Legislativo a tarefa de regulamentar a repressão aos atos de improbidade administrativa, nos termos do artigo 37, §4º, da Constituição Federal. 5 - A fim de atingir esse propósito, foi promulgada a Lei n. 8.429/92 que definiu os contornos do ato de improbidade, seus sujeitos ativo e passivo, a forma e a gradação das sanções imputáveis aos responsáveis por tais atos, bem como os procedimentos administrativos e judiciais a serem observados nesta seara. 6 - Entretanto, em 26/10/2021, entrou em vigor a Lei n. 14.230, que alterou diversas disposições da Lei n. 8.429/92, o que provocou dissenso jurisprudencial acerca da aplicação imediata dessas modificações aos processos em curso. 7 - Quanto a esta questão, é relevante esclarecer que a jurisprudência das Cortes Superiores vinha reconhecendo a comunicabilidade de alguns princípios constitucionais de direito penal na aplicação do direito administrativo sancionador, sob a justificativa de que ambos são manifestações do poder punitivo do Estado. Precedentes. 8 - Nesta linha de raciocínio, com esteio na garantia prevista no artigo 5º, XL, da Constituição Federal, cogitou-se da aplicação da Lei 14.230/2021 aos fatos ocorridos antes do início de sua vigência, tendo em vista o seu caráter nitidamente benéfico. 9 - Entretanto, quando do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n. 843.989/PR (Tema 1.199), ao analisar a exigência de dolo do agente para a configuração do ato de improbidade administrativa, em todas as suas modalidades, a Suprema Corte afastou a aplicação automática do disposto no artigo 5, XL, da Constituição Federal às sanções por ilícitos administrativos. 10 - Na ocasião, consignou-se que a responsabilização dos atos de improbidade administrativa possui natureza civil e, portanto, deve ser disciplinada conforme a lei vigente na época da prática do ilícito, em respeito ao princípio tempus regit actum. 11 - Neste sentido, destacou-se que a garantia da retroatividade da lei mais benéfica, prevista no artigo 5, XL, da Constituição, constitui exceção reservada à esfera penal e se fundamenta nas peculiaridades desse ramo, que não só possibilita o cerceamento do direito fundamental à liberdade de locomoção pelo Estado, como também, em razão do princípio da intervenção mínima, lida com a repressão de ilícitos que ostentam o grau mais intenso de reprovação social. 12 - Assim, considerando a ausência de expressa disposição legal, o caráter civil das sanções aplicadas aos atos de improbidade administrativa e diante da necessidade de se assegurar segurança jurídica e estabilidade às demandas em curso, as inovações introduzidas pela Lei n. 14.230/21, em regra, devem se submeter ao princípio geral de irretroatividade das leis, previsto no artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal. 13 - Todavia, tendo em vista a impossibilidade de normas já revogadas produzirem efeitos nos processos em que a convicção acerca da responsabilidade do agente pelo ato ímprobo ainda não foi definitivamente formada, devido ao princípio da não ultra-atividade, concluiu-se pela aplicabilidade imediata da revogação da modalidade culposa, promovida pela nova redação do artigo 10 da Lei n. 8.429/92, com as alterações da Lei n. 14.230/21, aos feitos em tramitação, desde que já não tenha sido formada a coisa julgada material. 14 - No mesmo julgamento, reconheceu-se a irretroatividade do novo regime prescricional previsto na Lei n. 14.230/21, sob o fundamento da impossibilidade fática do Estado deduzir sua pretensão condenatória dentro de marcos temporais que sequer existiam à época. Eis a ementa do Recurso Extraordinário com Agravo n. 843.989/PR, julgado sob o regime da repercussão geral. Precedente. 15 - Assim, conquanto a totalidade das inovações introduzidas pela Lei n. 14.230/21 não tenha sido objeto de análise do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 1.199, é inegável que a fundamentação do voto condutor proporciona importante chave hermenêutica para aferir a aplicabilidade, ou não, do referido diploma legal aos processo que já estavam em curso quando do início de sua vigência. 16 - Quanto à prescrição das pretensões que visem à aplicação das sanções previstas na Lei n. 8.429/92, ela deve observar os prazos estabelecidos originariamente no artigo 23 do referido diploma legal. No entanto, a punição na esfera cível dos atos de improbidade praticados após 26/10/2021, somente será exigível se for deduzida no prazo prescricional comum de 8 (oito) anos, contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência, nos termos do artigo 23 da Lei n. 8.429/92, com a nova redação dada pela Lei n. 14.230/21. 17 - No mais, impende salientar que o Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de serem "imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa" (Tema 897). 18 - A Lei n. 8.429/92, com a redação dada pela Lei n. 14.230/21 classificou os atos de improbidade administrativa em três categorias: atos que importam em enriquecimento ilícito; atos que causam prejuízo ao erário e atos atentatórios aos princípios da Administração Pública. 19 - Segundo a narrativa desenvolvida na petição inicial, os réus teriam praticado as seguintes irregularidades no âmbito do Programa Farmácia Popular: "i) no registro de dispensação de medicamentos pelo PFPB sem a comprovação das aquisições por meio de notas fiscais, nos meses de janeiro/2012 a agosto/2013 (…), ii) registros de dispensações de medicamentos em nome de funcionários e/ou responsáveis da pessoa jurídica auditada no mês de abril/2013 (…) e iii) dispensação de medicamentos pelo PFPB em nome de pessoa falecida após a data do óbito, no período de agosto de 2012 e maio a agosto de 2013". Assim, afirmou que os réus "não observaram as formalidades legais ou regulamentares na gestão dos recursos públicos repassados pelo Ministério da Saúde, por meio do Fundo Nacional de Saúde, para custeio do Programa Farmácia Popular do Brasil". 20 - Por conseguinte, postulou a condenação dos demandados nas condutas tipificadas no artigo 11, caput e I, da Lei n. 8.429/92 em sua redação original, por suposto descumprimento dos "deveres de honestidade, legalidade e lealdade às instituições". 21 - Por outro lado, cabe ao magistrado, de ofício ou a requerimento das partes, considerar os fatos constitutivos, modificativos ou extintivos que possam influir no julgamento da lide, em respeito ao artigo 493 do Código de Processo Civil. 22 - Em 26/10/2021, entrou em vigor a Lei n. 14.230/21 que revogou expressamente o artigo 11, I, da Lei n. 8.429/92. Houve, portanto, reconhecimento superveniente da atipicidade da referida conduta, para fins de aplicação das sanções previstas na LIA. 23 - Como se não bastasse, o rol do artigo 11 da LIA, que era exemplificativo, tornou-se taxativo, uma vez que constou expressamente do caput da referida norma que apenas "uma das seguintes condutas" passariam a ser consideradas lesivas aos princípios que regem a Administração Pública, no âmbito da repressão à improbidade administrativa. 24 - Em decorrência, em razão da atipicidade superveniente da conduta imputada aos réus, a improcedência do pedido é de rigor, devendo ser mantida a sentença de 1º grau neste aspecto. Precedentes. 25 - Remessa necessária e apelação do Ministério Público Federal desprovidas. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0000661-19.2017.4.03.6125, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 20/10/2023, DJEN DATA: 25/10/2023) – destaquei. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO CONDENATÓRIA DO PARQUET FEDERAL. INEXISTÊNCIA. IRRETROATIVIDADE DO NOVO REGIME PRESCRICIONAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO DO STF. APLICAÇÃO RETROATIVA DAS ALTERAÇÕES DA LEI 14.230/2021 A ATOS CULPOSOS PRATICADOS NA VIGÊNCIA DO TEXTO ANTERIOR SEM TRÂNSITO EM JULGADO. ART. 11, CAPUT, I e II, DA LEI 8.429/1992. REVOGAÇÃO. NOVA REDAÇÃO. CONDUTAS TAXATIVAS. ATIPICIDADE. IMPROCEDÊNCIA DOS CORRESPONDENTES PEDIDOS. ART. 10, I, DA LEI 8.429/1992. EXAME SOB A NOVA REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI 14.230/2021. LAVRA DE AREIA SEM AUTORIZAÇÃO ADEQUADA. FALHA NA FISCALIZAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE PRÁTICA DE CONDUTA DOLOSA. AUSÊNCIA DE PROVAS DE QUE OS AGENTES EM QUESTÃO BUSCARAM BENEFICIAR A SI OU A TERCEIROS. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE CUSTAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AFASTAMENTO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. ART. 18 DA LEI 7.347/1985. 1. Primeiramente, é de se observar que, in casu, a sentença de improcedência deve ser submetida à remessa oficial, conforme aplicação analógica do estabelecido no art. 19 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular). 2. Muito embora a Lei 8.429/1992, com a redação conferida pela Lei 14.230/2021, preveja que (...) não se aplicam na ação de improbidade administrativa: (...) o reexame obrigatório da sentença de improcedência (art. 17, § 19, IV), assim como que (...) não haverá remessa necessária nas sentenças de que trata esta Lei (art. 17-C, § 3º), por se tratar de norma processual e levando-se em consideração o interesse público no caso vertente, as novas disposições devem ser aplicadas tão somente às sentenças proferidas a partir da publicação da norma. 3. Preliminarmente, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva do Ministério Público no caso vertente, uma vez que a presente demanda foi ajuizada em 09/03/2001 e os réus desligaram-se do DNPM em 09/07/1999, 25/03/2002 e 02/04/2012, considerando-se o termo inicial para contagem do lapso temporal o momento em que cessa o vínculo, deixando o agente de atuar no cargo. 4. Ainda que o termo inicial adotado fosse a data dos fatos em si, teria inocorrido a prescrição, uma vez que os atos de improbidade teriam sido praticados, de forma contínua, entre os anos de 1996 e 1998. 5. Inaplicável, in casu, a Lei 14.230/2021, no que se refere ao novo regime dos prazos prescricionais de ações de improbidade administrativa A questão foi tratada recentemente pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do ARE 843.989, dispondo o Pretório Excelso que (...) o novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. 6. Em contrapartida, por meio do mesmo julgado (ARE 843.989), o Pretório Excelso reputou possível a aplicação retroativa das alterações da Lei 14.230/2021 aos atos culposos praticados na vigência do texto anterior, haja vista a sua revogação, desde que não tenha havido, ainda, trânsito em julgado. 7. Na hipótese dos autos, o Ministério Público Federal utilizou o art. 11, caput e incisos I e II para fundamentar parte de seus pedidos de condenação dos requeridos nas sanções previstas no art. 12, III, da Lei 8.429/1992. 8. Não obstante, os aludidos incisos foram expressamente revogados pela Lei 14.230/2021 e o caput do artigo teve sua redação alterada, deixando nítido que as condutas descritas nos incisos elencados são numerus clausus, i.e. taxativas. 9. Enquanto o texto anterior utilizava o termo “notadamente”, a demonstrar a natureza exemplificativa do dispositivo, a nova redação utiliza a expressão “caracterizada por uma das seguintes condutas”, deixando claro o caráter exaustivo das condutas ali elencadas. 10. Nesse contexto, no caso vertente, mostra-se indubitável que os atos descritos pelo Ministério Público Federal como de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública, amparados nos incisos revogados, devem ser considerados atípicos, o que determina, consequentemente, a improcedência dos correspondentes pedidos. 11. Por sua vez, os atos praticados pelos réus cuja subsunção teria ocorrido no art. 10, I, da Lei 8.429/1992 devem ser examinados sob a nova redação conferida pela Lei 14.230/2021. 12. Conforme alega o Parquet federal, os réus, ora apelados, permitiram que as empresas mineradoras lavrassem areia em áreas ilegais, sem a autorização administrativa pertinente, i.e., concessão de lavra ou licenciamento, deixando, ainda, de fiscalizar o recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), o que teria causado indubitável prejuízo ao erário público diante da incorporação de bens da União Federal ao patrimônio das empresas mineradoras. 13. Pela leitura da novel legislação, percebe-se que, para fins de imputação da improbidade administrativa prevista no art. 10 da Lei 8.429/1992, passou a ser necessária a comprovação da prática de conduta dolosa pelo acusado, caracterizada pela sua desonestidade, má-fé, ou seja, o anseio explícito de lesar os cofres públicos. 14. Nesse sentido, a própria lei apresenta, em seu art. 1º, § 2º, o conceito de dolo como sendo (...) a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. 15. Da mesma forma, a lei em comento é categórica ao dispor que (...) o mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. (art. 1º, § 3º), assim como que (...) a ilegalidade sem a presença de dolo que a qualifique não configura ato de improbidade (art. 17-C, § 1º). 16. No caso concreto, inexistem provas de que os agentes em questão buscaram beneficiar a si ou a terceiros indevidamente. Mesmo porque as condições de trabalho para a fiscalização de mais de uma centena de empresas areeiras, apenas no trecho paulista do rio Paraíba do Sul, durante a década de noventa eram, no mínimo desafiadoras. 17. À época dos fatos, a Administração Pública brasileira ainda estava se aparelhando a fim de se adequar ao novo regime jurídico-administrativo idealizado pela Constituição da República de 1988 e embora afirme o Ministério Público Federal que os réus tinham as condições materiais necessárias ao cumprimento de seus deveres, não apontou, em nenhum momento, quais seriam os recursos humanos e materiais disponíveis. 18. Igualmente, a sentença recorrida não merece qualquer alteração em relação à ausência de condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios, tendo em vista o disposto no art. 18 da Lei 7.347/1985, segundo o qual (...) nas ações de que trata esta Lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais. 19. Portanto, não vislumbrada a má-fé por parte do Ministério Público, ou seja, diante da inexistência de sua intenção consciente de propor demanda que sabe ser inadequada, não há como prosperar o pleito de condenação do Parquet ao pagamento das despesas, custas processuais e honorários advocatícios. 20. Apelações e remessa necessária desprovidas. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0006922-37.2001.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 18/03/2023, DJEN DATA: 22/03/2023) – destaques inexistentes no original Não é outro senão este também o entendimento firmado pela C. 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal: SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA LEI 14.231/2021. INTELIGÊNCIA DO ARE 843.989 (TEMA 1.199). INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO. 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843.989 (tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações introduzidas pela Lei 14.231/2021, para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade relativa para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) a imputação promovida pelo autor da demanda, a exemplo da capitulação promovida pelo Tribunal de origem, restringiu-se a subsumir a conduta imputada aos réus exclusivamente ao disposto no caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) as condutas praticadas pelos réus, nos estritos termos em que descritas no arresto impugnado, não guardam correspondência com qualquer das hipóteses previstas na atual redação dos incisos do art. 11 da Lei 8.429/1992, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para julgar improcedente a pretensão autoral. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental desprovido. (ARE 1346594 AgR-segundo, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 24-10-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 30-10-2023 PUBLIC 31-10-2023) Da dosimetria das sanções. Alegação de bis in idem face a condenação pelo TCU. Reconhecendo a prática de atos ímprobos, o juízo aplicou aos apelantes as seguintes sanções: Dosimetria do artigo 12 da LIA Considerando ter sido infrutífera a ordem de indisponibilidade dos bens e valores dos réus, tenho que o valor apontado na inicial merece acolhida como ressarcimento em sua íntegra, uma vez que representa o valor indevidamente recebido pelos réus. Não há que se falar em perda da função pública no caso. Já quanto à suspensão dos direitos políticos, suspendo-os pelo prazo mínimo previsto no inciso I do art. 12 da LIA, em oito anos. Quanto à multa, considerando a fixação do ressarcimento em patamar integral, será fixada em valor moderado, visando reprovar a conduta não transparente dos réus, em ¼ do valor ilicitamente acrescido pelos réus com o recebimento do subsídio governamental. Ainda, ficam proibidos de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos. DISPOSITIVO Destarte, como consectário da fundamentação, julgo PROCEDENTE o pedido, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil para reconhecer a improbidade administrativa dos réus nos termos dos artigos 9º, XI, 10, I e 11, I da LIA – 8429/92. Aplico-lhes, por conseguinte e solidariamente, as sanções de: a) ressarcimento integral do dano no montante de R$ 110.546,58; b) pagamento de multa civil no valor de ¼ acréscimo patrimonial, ou seja, R$ 27.636,64; c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber quaisquer benefícios, incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, no prazo de 10 (dez) anos; e, d) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos. O valor da indenização e da multa será destinado à União, eis que esta a pessoa jurídica de direito público interno lesada pelos atos ímprobos, à luz do artigo 18 da Lei 8429/92, e corrigido monetariamente nos termos do Manual de Orientação para os Cálculos na Justiça Federal, com juros de mora de 1% ao mês partir da data da sentença. Não verifico motivos para modificar as sanções aplicadas, fixadas em conformidade com o art. 12, I, da Lei 8.429/92, previstas para os casos de enriquecimento ilícito. O ressarcimento integral do dano é o mínimo que o Estado e a sociedade exigem do agente ímprobo, anotam Luiz Manoel Gomes Júnior e Rogério Favreto na obra coletiva Comentários à Nova Lei de Improbidade Administrativa (RT, 9ª edição, pág. 192). Os mesmos autores, invocando precedente do Superior Tribunal de Justiça (RESP 1.019.555/SP), ponderam que “o ressarcimento dos danos não seria precisamente uma pena, mas uma obrigação decorrente do dever de reparar, o que leva à necessidade, em princípio, de cumulação desta obrigação com algumas das penas legalmente previstas: “(...) Caracterizado o ato de improbidade administrativa, o ressarcimento ao erário constitui o mais elementar consectário jurídico, não se equiparando a uma sanção em sentido estrito (...)” – obra e página citadas. A multa civil, por sua vez, tem a função de “desestimular a prática de atos de improbidade administrativa, como forma de lição a todos de que, além de todas as demais penas, tal espécie de ato terá repercussão no patrimônio do agente ímprobo pela condenação ao pagamento da multa” (Daniel Amorim Assumpção Neves e Rafael Carvalho Rezende Oliveira, Improbidade Administrativa – Direito Material e Processual, Forense, 9ª edição, pág. 283). Cuida-se de sanção distinta e que não se confunde com a obrigação de ressarcir os danos provocados, de forma que não configura bis in idem. Neste sentido, aliás, já decidiu o STJ: ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SANÇÕES. CONDENAÇÃO CUMULATIVA. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MULTA CIVIL E RESSARCIMENTO INTEGRAL DO DANO. NATUREZA DIVERSA. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a aplicação das penalidades previstas no art. 12 da Lei n. 8.429/92 exige que o magistrado considere, no caso concreto, "a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente". Assim, é necessária a análise da razoabilidade e proporcionalidade em relação à gravidade do ato de improbidade e à cominação das penalidades, as quais podem ser aplicadas cumulativas ou não. 2. No caso dos autos, o Tribunal de origem, mantendo a sentença de primeiro grau, condenou os recorrentes a perderem as funções públicas, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e vedação de contratarem com o poder público, com a efetiva consideração dos limites fixados na legislação e observância dos Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade. 3. A multa civil não se confunde com a penalidade de ressarcimento integral do dano, pois possui natureza jurídica diversa. Enquanto esta visa a recomposição do patrimônio público afetado, aquela tem caráter punitivo do agente ímprobo. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp n. 1.122.984/PR, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 21/10/2010, DJe de 9/11/2010.) No caso, a multa civil poderia ser fixada em até 3 vezes o valor do acréscimo patrimonial (art. 12, I), mas a sentença estabeleceu um valor módico, de ¼ (um quarto), montante que deve ser mantido por revelar adequação e proporcionalidade. Quanto às sanções remanescentes, quais sejam, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o poder público, nenhuma alteração há de ser realizada, porquanto observado, para a primeira, o prazo mínimo legal (8 anos), enquanto para a segunda foi fixado o prazo certo e determinado previsto na lei (10 anos). Por fim, não tenho como “bis in idem” a condenação imposta em sentença por improbidade administrativa e eventual condenação imposta administrativamente pelo Tribunal de Contas da União. O legislador previu a independência das condenações ao trazer, no caput do art. 12 da LIA, que independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas em legislação específica, estaria o responsável por atos de improbidade administrativa sujeito à pena de ressarcimento integral do dano, caso houvesse. Sem prejuízo, uma vez efetuado o pagamento do montante devido, as partes poderão pedir a dedução do montante pago, consoante previsto no § 6º do art. 12 da Lei 8.429/92: § 6º Se ocorrer lesão ao patrimônio público, a reparação do dano a que se refere esta Lei deverá deduzir o ressarcimento ocorrido nas instâncias criminal, civil e administrativa que tiver por objeto os mesmos fatos. Não há que se falar, assim, em existência de bis in idem. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação, apenas para excluir da condenação a infração capitulada no art. 11, caput, da LIA. É como voto. E M E N T A CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA JULGADA PROCEDENTE. PROGRAMA FARMÁCIA POPULAR. LEGITIMIDADE DO FARMACÊUTICO RESPONSÁVEL. FRAUDE NA DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS. ARTS. 9º, XI, 10, I E 11, CAPUT, DA LEI 8.429/92. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ROL FECHADO DE CONDUTAS. DOSIMETRIA ADEQUADA. SENTENÇA PARCIALMENTE MANTIDA. I. Caso em exame – Trata-se de ação civil pública por atos de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal contra estabelecimento comercial e pessoas naturais em razão de fraude na execução do Programa Farmácia Popular, com o recebimento indevido de valores do Fundo Nacional de Saúde. – Sentença julgou procedente o pedido e condenou os requeridos como incurso nos art. 9º, XI, 10, I e 11, caput, todos da Lei 8.429/92. II. Questão em discussão – O recurso, no qual se pleiteia a concessão da justiça gratuita, busca discutir a ilegitimidade de parte; a ocorrência de bis in idem face à condenação do TCU à devolução dos valores; inexistência de improbidade administrativa por falta de dolo ou de má-fé na execução do programa. III. Razões de decidir – Os documentos colacionados aos autos evidenciam a necessidade de concessão da gratuidade processual aos apelantes (art. 98, CPC), a qual, contudo, possui apenas efeitos ex nunc. – Descarta-se a ilegitimidade de parte de Rodolpho Rodrigo, pois se trata de pessoa casada com a proprietária da drogaria e que exerce, no estabelecimento, a função de responsável técnico. Ademais, segundo oitiva dele e de sua esposa perante a autoridade policial, somente os dois trabalham na drogaria. – Em razão de medida cautelar deferida na ADI 7236/DF, em 27/12/2022, pelo Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, encontram-se com eficácia suspensa os seguintes dispositivos da Lei 8.429/92, com as modificações produzidas pela Lei 14.320/21: art. 1º, §8º, art. 12, §§ 1º e 10, art. 17-B, §3º e art. 21, §4º. Ademais, também na ADI 7236/DF, foi deferida medida cautelar para conferir interpretação conforme ao art. 23-C, da LIA. – No que concerne ao regime prescricional, as novas regras trazidas pela Lei 14.230/21 tendem a ser mais benéficas aos acusados da prática de atos de improbidade. Quanto a isso, o Supremo Tribunal Federal, também no RE 843.989/PR, definiu que as novas regras de prescrição serão aplicáveis somente aos atos praticados após a data da publicação da Lei 14.230/21, isto é, 26 de outubro de 2021. – Prescrição. Tratando-se de atos praticados entre 2013 e 2014 e sendo a ação proposta em 2016, não há que se falar em decurso de prazo a impedir o transcurso da lide. – Os atos administrativos são puníveis quando praticados com dolo, isto é, com a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito. – Investigações realizadas pelo Ministério Público Federal, após auditoria do Ministério da Saúde, concluiu que os requeridos, na execução do Programa Farmácia Popular do Brasil, inobservaram regras previstas que ocasionaram enriquecimento ilícito e trouxeram prejuízo ao erário, além de afrontar princípios que regulamentam a Administração Pública. – Os requeridos deixaram de comprovar, mediante notas fiscais, as aquisições dos seguintes medicamentos: Maleato de Enalapril (EAN 7896523210759) nos meses: 01 a 07/2013, 10/2013 e 12/2013 a 11/2014; Losartana Potássica (EAN 7898148301720) nos meses: 02/2013 e 11/2013 a 11/2014; Atenolol (EAN 7896181900122) nos meses: 10/2013 a 07/2014 e 09 a 11/2014; Captopril (EAN 7896714205687) nos meses: 07/2013 a 06/2014 e 09/2014; Losartana Potássica (EAN 7898910350239) nos meses: 08/2013; Cloridrato de Metformina (EAN 7898148291298) nos meses: 01/2013, 03/2013 e 02/2014 a 11/2014; Sinvastatina (EAN 7897595609892) nos meses: 02/2014, 04/2014 e 09 a 11/2014; Maleato de Enalapril (EAN 7896181900894) nos meses: 02 a 11/2014; Atenolol (EAN 7894916144209) nos meses: 01/2013, 03 a 05/2013, 08 e 09/2013 e 12/2013 a 11/2014 e Sivasmax (EAN 7898060138091) nos meses: 05/2013 a 11/2014. – Também deixaram de esclarecer a contento a existência de dispensação de medicamentos em nome de funcionário da empresa. – As práticas engendradas pelos requeridos violaram diversos normativos atinentes à execução do programa social que ensejaram não só o próprio enriquecimento indevido (art. 9º, XI), como trouxeram lesão ao erário (art. 10, I). – O elemento anímico resta comprovado, pois se tratam de profissionais experientes, proprietários de duas farmácias em cidade do interior de São Paulo, habituados a comercializar medicamentos e cientes das regras existentes para a inscrição e permanência no Programa Farmácia Popular do Brasil. – No que se referem às condutas violadoras dos princípios da Administração, a Lei 14.230/2021 alterou o art. 11 da Lei 8.429/92 e passou a prever um rol fechado de condutas caracterizadoras de ato de improbidade administrativa. Não basta que a conduta afronte os princípios da Administração Pública; é necessário que a violação ocorra de acordo com uma das condutas descritas taxativamente nos incisos do art. 11. No caso, as condutas outrora elencadas no caput do art. 11 deixaram de ser puníveis. Precedentes. – Embora afastadas as condutas violadoras dos princípios da Administração, as sanções aplicadas mostram-se razoáveis e proporcionais, pois estabelecidas tendo como base as penas previstas para o enriquecimento ilícito. – Não constitui bis in idem a determinação de ressarcimento ao erário ocasionada por ato de improbidade administrativa, com a condenação administrativa aplicada pelo Tribunal de Contas. Nos termos do art. 12, § 6º, da LIA, havendo o pagamento administrativo, o montante poderá ser deduzido da condenação. IV – Dispositivo – Apelação parcialmente provida. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, DEU PARCIAL PROVIMENTO à apelação, apenas para excluir da condenação a infração capitulada no art. 11, caput, da LIA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. RUBENS CALIXTO Desembargador Federal
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Processo nº 5004521-80.2024.4.03.6000
ID: 292448343
Tribunal: TRF3
Órgão: 5ª Vara Federal de Campo Grande
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5004521-80.2024.4.03.6000
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS EDUARDO HOFF
OAB/MS XXXXXX
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SUELLEN BEATRIZ GIROLETTA
OAB/MS XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5004521-80.2024.4.03.6000 / 5ª Vara Federal de Campo Grande AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/MS REU: ADAO PEREIRA BARBOSA Advogados do(a) REU: CARLO…
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 5004521-80.2024.4.03.6000 / 5ª Vara Federal de Campo Grande AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/MS REU: ADAO PEREIRA BARBOSA Advogados do(a) REU: CARLOS EDUARDO HOFF - MS22893, SUELLEN BEATRIZ GIROLETTA - MS12049 S E N T E N Ç A I – RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia em desfavor de ADAO PEREIRA BARBOSA, pela prática do crime do art. 334-A, § 1º, I, do Código Penal c/c art. 3º do Decreto-Lei 399/1968. Narra a inicial acusatória (ID 328393950) que, em 24/02/2023, por volta das 05h40, no Km 91 da rodovia MS162, em Sidrolândia/MS, o réu foi flagrado no transporte de 1.000 (mil) maços de cigarro (da marca Euro) de origem estrangeira, em desacordo com a lei, no veículo Ford KA, cor prata, placa OOR-1468. O MPF entendeu não ser cabível o ANPP (ID 328393950 – Pág. 9). A denúncia foi recebida em 08/07/2024 (ID 331108181). O réu foi citado (ID 334709630) e juntou resposta à acusação (ID 335865911), reservando-se a discutir o mérito em alegações finais. Afastadas as causas de absolvição sumária e designada audiência (ID 343147144). Houve a colheita do depoimento da testemunha Giovani Maccarini (ID 365904787) e o interrogatório do réu (ID 365904784). Não houve requerimento de diligências complementares (ID 365896305). O MPF apresentou alegações finais orais (ID 365904783), requerendo a procedência da pretensão punitiva. A defesa também ofertou razões finais de forma oral (ID 365904783), pugnando pelo reconhecimento do princípio da insignificância. Em caso de condenação, manifestou-se pela aplicação da atenuante de confissão espontânea; fixação da pena mínima; estabelecimento do regime inicial aberto; a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos; e o afastamento da pena de inabilitação para dirigir veículo automotor. Vieram os autos conclusos para julgamento. É o relatório. Decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Não há preliminares ou nulidades suscitadas. Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do mérito. Imputa-se ao réu a prática do crime do art. 334-A, § 1º, I, do Código Penal c/c art. 3º do Decreto-Lei 399/1968, que possui a seguinte redação: Código Penal Contrabando Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 ( cinco) anos. § 1o Incorre na mesma pena quem: I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando […] Decreto-lei 399/68 Art 3º Ficam incursos nas penas previstas no artigo 334 do Código Penal os que, em infração às medidas a serem baixadas na forma do artigo anterior adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuirem ou consumirem qualquer dos produtos nêle mencionados. A materialidade do delito está demonstrada pelos documentos que instruem a notícia de fato nº 1.21.000.000800/2024-21 (ID 328399151), notadamente a representação fiscal para fins penais (pág. 6-7); relação de mercadorias e demonstrativo de crédito tributário evadido (pág. 9); termo de guarda e boletim de ocorrência da Polícia Militar (pág. 13-16); relação de mercadorias e auto de infração lavrado pela Receita Federal (pág. 18 e 26-27), além da prova oral colhida em audiência. A autoria também está evidenciada. Em juízo, a testemunha Giovani Maccarini disse que os policiais estavam realizando fiscalização de trânsito entre as cidades de Maracaju/MS e Sidrolândia/MS, quando avistaram o veículo do réu. Afirma que foi feita abordagem ao carro do acusado e, durante a vistoria dos itens do veículo, os agentes constataram a presença de caixas de cigarro em seu interior. Questionado sobre o fato, o réu relatou ter pego os cigarros na cidade de Maracaju/MS e que os levaria até Campo Grande/MS. Não se recorda se o acusado disse que iria receber alguma recompensa pela conduta. Em seu interrogatório judicial, o acusado confessou a prática do crime. Alegou também que ele mesmo iria revender os cigarros em Campo Grande/MS. Portanto, o conjunto probatório é uníssono, estando a confissão do réu devidamente amparada nos demais elementos de prova coligidos ao feito. Não é o caso de se reconhecer o princípio da insignificância porque há provas de que o acusado possui várias ocorrências no âmbito administrativo (ID 328393950 – Pág. 3-4) e criminal (ID 328393950 – Pág. 5 e ID 331263488) por ilícito semelhante. Registre-se que o mesmo precedente vinculante que, excepcionalmente, autorizou a aplicação do princípio da insignificância para o transporte de até 1.000 (mil) maços de cigarros, também estabeleceu que a medida não se aplica ao agente contumaz. Eis o teor do Acórdão proferido pelo STJ: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. CONTRABANDO DE CIGARROS. SAÚDE PÚBLICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE RESTRITA (APREENSÃO DE ATÉ 1.000 MAÇOS), SALVO REITERAÇÃO. DIMINUTA REPROVABILIDADE DA CONDUTA E NECESSIDADE DE SE CONFERIR PRIMAZIA À REPRESSÃO AO CONTRABANDO DE VULTO. MODULAÇÃO DE EFEITOS. NOVEL ORIENTAÇÃO APLICÁVEL AOS FEITOS AINDA EM CURSO QUANDO DO ENCERRAMENTO DO JULGAMENTO. 1. O crime de contrabando de cigarros tutela, entre outros bens jurídicos, a saúde pública, circunstância apta a não recomendar a aplicação do princípio da insignificância. 2. Obstar a aplicação do princípio da insignificância para todos os casos, notadamente para aqueles em que verificada a apreensão de quantidade de até 1.000 (mil) maços, é uma medida ineficaz à luz dos dados estatísticos apresentados, além do que não é razoável do ponto de vista de política criminal e de gestão de recursos dos entes estatais encarregados da persecução penal, razão pela qual se revela adequado admitir a incidência do princípio em comento para essa hipótese - apreensão de até 1.000 (mil) maços -, salvo reiteração da conduta, circunstância que, caso verificada, é apta a afastar a atipicidade material, ante a maior reprovabilidade da conduta e periculosidade social da ação. 3. Modulado os efeitos do julgado, de modo que a tese deve ser aplicada apenas aos feitos ainda em curso na data em que encerrado o julgamento, sendo inaplicáveis aos processos com trânsito em julgado, notadamente considerando os fundamentos que justificaram a alteração jurisprudencial no caso e a impossibilidade de rescisão de coisa julgada calcada em mera modificação de orientação jurisprudencial. 4. Recurso especial desprovido. Acolhida a seguinte tese: O princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1.000 (mil) maços, seja pela diminuta reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão ao contrabando de vulto, excetuada a hipótese de reiteração da conduta, circunstância apta a indicar maior reprovabilidade e periculosidade social da ação. (REsp n. 1.977.652/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 13/9/2023, DJe de 19/9/2023.) A jurisprudência do STJ também é pacífica no sentido de que procedimentos administrativos fiscais e/ou ações penais em curso, ainda que não caracterizem maus antecedentes e/ou reincidência, podem ser sopesados para análise da habitualidade delitiva com objetivo de afastar a incidência da bagatela. Neste sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 182/STJ. CRIME DE CONTRABANDO DE CIGARROS. HABEAS CORPUS DE OFÍCIO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. HABITUALIDADE DELITIVA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O agravo regimental não impugnou, especificamente, o fundamento da decisão monocrática que não admitiu o agravo em recurso especial, o que faz incidir a Súmula n. 182/STJ. 2. A decisão não admitiu o recurso especial assentou os óbices das Súmulas n. 7 e 83/STJ; todavia, no respectivo agravo, a Defesa limitou-se a arguir, genericamente, a inaplicabilidade das referidas súmulas e deixou de impugnar a ausência de prequestionamento. 3. A ausência de ataque a todos os fundamentos da decisão que inadmitiu o recurso especial obsta o conhecimento do agravo, nos termos do art. 932, III, CPC/2015, do art. 253, parágrafo único, I, do RISTJ e da Súmula n. 182/STJ, aplicável por analogia. 4. Não se verifica ilegalidade que autorize a concessão do habeas corpus de ofício em relação à aplicação do princípio da insignificância, mesmo sob a ótica do novo entendimento firmado no Tema Repetitivo n. 1.143 do STJ - crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1.000 (mil) maços. Apesar de não configurar reincidência, a existência de outras ações penais, inquéritos policiais em curso ou procedimentos administrativos fiscais é suficiente para caracterizar a habitualidade delitiva e, consequentemente, afastar a incidência do referido princípio. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.246.712/SP, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do TJSP), Sexta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 20/8/2024.) Na hipótese dos autos, o grande número de ocorrências em desfavor do réu demonstra que ele se dedica à prática do delito de contrabando/descaminho, de modo que há elevada reprovabilidade de sua conduta, não sendo possível que seja beneficiado com a incidência do princípio da insignificância. Deste modo, evidenciada a materialidade e a autoria delitiva, é imperiosa a condenação do réu às penas do art. 334-A do Código Penal. Aplicação da pena Consagrado no Código Penal o critério trifásico para o cálculo da pena (art. 68), inicio pela fixação da pena-base (primeira fase), considerando as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, atento ao preceito secundário do tipo penal em questão, que prevê de 2 a 5 anos de reclusão. A culpabilidade, juízo de reprovação que se faz pela opção que o agente escolheu, não se afasta dos padrões já sopesados pelo legislador ao delimitar o mínimo em abstrato da pena. O réu possui condenação definitiva nos autos 5007089-40.2022.4.03.6000, que tramitaram na 3ª Vara Federal de Campo Grande/MS, por fato anterior (ocorrido em 07/10/2021) e com trânsito em julgado em 22/04/2024 (ID 331263488 e comprovantes em anexo), o que configura maus antecedentes. Além disso, há notícia de que o réu responde a outros processos criminais, os quais não serão sopesados, por não haver prova de condenação transitada em julgado (súmula 444, STJ). Não há elementos por meio dos quais se possa avaliar negativamente sua personalidade e sua conduta social. Não se denota uma motivação especial configuradora de um agravamento da conduta, desbordante do que é normal à espécie. As circunstâncias não são desfavoráveis, eis que a quantidade de cigarros não destoa da prática de outros ilícitos semelhantes, motivo pelo qual não justificam a elevação da pena-base. Nada a valorar a título de consequências do crime, que foram minoradas com a apreensão do produto antes que entrasse em circulação. Também nada a valorar a título de comportamento da vítima, a União. Assim, em razão dos maus antecedentes do réu, fixo a pena-base em 2 anos e 2 meses de reclusão, parâmetro que considero suficiente e necessário para a prevenção e reprovação do crime, nas condições em que foi praticado. Na segunda fase, não há agravantes. Reconheço a presença da atenuante de confissão (art. 65, inc. III, alínea “d”, do Código Penal), já que o réu admitiu a prática do crime. Logo, reduzo a pena em 1/6 (um sexto), estabelecendo-a em 02 anos de reclusão, por ser vedada a sua fixação aquém do mínimo legal nesta fase da dosimetria (súmula 231, STJ). Na terceira fase, não há causa de aumento ou de diminuição da pena. Deste modo, torno a pena definitiva em 2 anos de reclusão. Regime inicial de cumprimento Considerando que o réu é tecnicamente primário e que a pena total não ultrapassa os 4 anos, o regime inicial de cumprimento a ser fixado é o aberto, nos termos do que prevê o art. 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal. Não há detração a ser aplicada, visto que o réu não foi preso cautelarmente no curso deste processo. Substituição da pena Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade do réu por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, em entidade a ser definida pelo Juízo da Execução Penal, pelo período da pena privativa de liberdade, e pagamento de prestação pecuniária em favor de entidade beneficente ou assistencial, a ser destinada pelo Juízo da Execução, no valor de 1 salário-mínimo vigente na presente data. Da pena acessória de inabilitação Aplico a pena acessória de inabilitação para dirigir veículo automotor em desfavor do acusado (art. 92, III, do CP), eis que estava na condução do carro no momento dos fatos, além de possuir várias outras imputações por ilícito semelhante (ID 328393950 – Pág. 3-5 e ID 331263488), de modo que a medida é necessária para prevenir novos crimes. III - DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido constante na denúncia para condenar o réu ADAO PEREIRA BARBOSA, qualificado nos autos, como incurso nas penas do art. 334-A, § 1º, inc. I, do Código Penal, c/c art. 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968, e determino que cumpra pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos de reclusão, inicialmente em regime aberto. SUBSTITUO a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e pagamento de prestação pecuniária de 1 (um) salário-mínimo, conforme a fundamentação. CONCEDO ao réu o direito de apelar em liberdade quanto a este processo, devendo-se atentar para a existência de eventual ordem de prisão emanada de outros autos. Custas pelo acusado (Lei 9.289/1996, art. 6º). Não há bens ou valores a destinar neste processo, eis que o material apreendido já foi encaminhado para a Receita Federal, dispensando outras providências pelo juízo. Considerando que não incidem tributos aduaneiros sobre mercadorias estrangeiras que tenham sido objeto de pena de perdimento (art. 1º, § 4º, inc. III, do Decreto-Lei 37/1966), e tendo em conta que não ficou comprovada a ocorrência de qualquer outro prejuízo, deixo de fixar o valor mínimo para indenização, previsto no art. 387, inc. IV, do Código de Processo Penal, sem prejuízo de que terceiros venham a pleitear, na esfera cível, a indenização que entendem devida. Com o trânsito em julgado: (i) expeça-se a guia de execução da pena; (ii) oficie-se à Justiça Eleitoral para os fins previstos no art. 15, inc. III, da Constituição da República; (iii) expeçam-se as demais comunicações e anotações de praxe; (iv) anote-se a restrição ao direito de dirigir imposta ao acusado, via RENAJUD. Sentença registrada eletronicamente no PJe. Publique-se. Intimem-se e dê-se vista ao Ministério Público Federal. Campo Grande-MS, data da assinatura digital.
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Processo nº 5001395-09.2022.4.03.6318
ID: 310159418
Tribunal: TRF3
Órgão: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP
Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL
Nº Processo: 5001395-09.2022.4.03.6318
Data de Disponibilização:
27/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO CARLOS FARDIN
OAB/SP XXXXXX
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LEONARDO DA COSTA ARAUJO LIMA
OAB/GO XXXXXX
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ALVIN FIGUEIREDO LEITE
OAB/SP XXXXXX
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EDUARDO FRANCISCO VAZ
OAB/SP XXXXXX
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RAMON HENRIQUE DA ROSA GIL
OAB/SP XXXXXX
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ALOIR ALVES VIANA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001395-09.2022.4.0…
PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001395-09.2022.4.03.6318 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: JOSE CARLOS DIAS GUIMARAES Advogado do(a) RECORRENTE: ALOIR ALVES VIANA - SP272812-N RECORRIDO: PICPAY SERVICOS S.A, BANCO BRADESCO SA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL PROCURADOR: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ALVIN FIGUEIREDO LEITE - SP178551-A, EDUARDO FRANCISCO VAZ - SP178858-A Advogado do(a) RECORRIDO: LEONARDO DA COSTA ARAUJO LIMA - GO26929-A Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO CARLOS FARDIN - SP103137-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001395-09.2022.4.03.6318 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: JOSE CARLOS DIAS GUIMARAES Advogado do(a) RECORRENTE: ALOIR ALVES VIANA - SP272812-N RECORRIDO: PICPAY SERVICOS S.A, BANCO BRADESCO SA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL PROCURADOR: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ALVIN FIGUEIREDO LEITE - SP178551-A, EDUARDO FRANCISCO VAZ - SP178858-A Advogado do(a) RECORRIDO: LEONARDO DA COSTA ARAUJO LIMA - GO26929-A Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO CARLOS FARDIN - SP103137-A OUTROS PARTICIPANTES: RELATÓRIO No início do Voto. PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001395-09.2022.4.03.6318 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: JOSE CARLOS DIAS GUIMARAES Advogado do(a) RECORRENTE: ALOIR ALVES VIANA - SP272812-N RECORRIDO: PICPAY SERVICOS S.A, BANCO BRADESCO SA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL PROCURADOR: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ALVIN FIGUEIREDO LEITE - SP178551-A, EDUARDO FRANCISCO VAZ - SP178858-A Advogado do(a) RECORRIDO: LEONARDO DA COSTA ARAUJO LIMA - GO26929-A Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO CARLOS FARDIN - SP103137-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se de ação movida em face da CEF, objetivando o ressarcimento por danos materiais e moral, em decorrência de movimentações fraudulentas em conta bancária. Disse a r. sentença recorrida: (...) A parte Autora move a presente ação em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CAIXA), BANCO BRADESCO (BRADESCO)e PIC PAY INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO (PIC), relatando, em síntese, ter sido contatada por meio de ligação celular, com instruções para evitar bloqueio de sua conta (ID 244484188). Alega que recebeu ligação telefônica com orientação para ir até o caixa eletrônico da CAIXA e realizar o desbloqueio da senha, o que fez. Nova mensagem para comparecer novamente a um terminal de atendimento de uma das agências da requerida, para atualização de procedimento para efetuar o respectivo desbloqueio. Sustenta que, no dia posterior a tal operação, percebeu que haviam sido subtraídos da sua conta bancária vários valores, que reputa irregulares. Após os fatos, elaborou Boletim de Ocorrência junto às Autoridades Policiais (ID 244484780). Pleiteia, assim, a condenação do banco em indenização por danos materiais e morais. Citada (ID 247772910) a Caixa Econômica Federal, em sua defesa, pugnou pela improcedência dos pedidos, sob o fundamento de que o setor de inteligência e segurança da CAIXA não apontou qualquer irregularidade nas operações, que foram feitas com senha eletrônica. A PIC PAY contestou (ID 265000976), e alegou ilegitimidade de parte passiva, vez que não lhe foi imputada qualquer conduta ilícita, e que não houve qualquer falha na prestação de seus serviços, e que, no mérito, não há relação entre sua conduta e os danos. O BRADESCO contestou (ID 265609174), e alegou ilegitimidade de parte passiva, vez que não lhe foi imputada qualquer conduta ilícita, e que não houve qualquer falha na prestação de seus serviços, e que, no mérito, não há relação entre sua conduta e os danos, vez que toda ação se deu no interior da CAIXA. Audiência restou infrutífera (ID 269835082). Em replica, a parte Autora insiste na adoção de suas teses (ID 275246483). II - FUNDAMENTAÇAO Verifico, de inicio, a ilegitimidade do BRADESCO e PIC PAY para figurar no polo passivo desta demanda. Entendo não terem as referidas instituições relação com os fatos narrados na inicial, vez que não há como lhes imputar a autoria de qualquer conduta que leve ao resultado. A abertura de conta, atendidos os requisitos do Banco Central do Brasil, não impende responsabilidade que o correntista faz do uso de tais contas. Admitir-se, no caso, seria permitir que as instituições bancárias fossem responsabilidades pelos crimes ou condutas ilícitas de seus clientes, o que foge ao controle de suas operações, e, por isto, impedem tal responsabilização. Por isto, de rigor a extinção do processo sem resolução do mérito quanto as requeridas BRADESCO e PIC PAY, na forma do artigo 485, inciso VI, do CPC. Quanto ao mais, o caso vertente se subsume às normas do Código de Defesa do Consumidor, já que a ré enquadra-se no conceito de fornecedora de produtos e serviços, nos termos do art. 3º, § 2º, do CDC e Súmula nº 297 do STJ, ao passo que a autora, como destinatária final do produto fornecido pela ré, na linha da teoria finalista referendada pelo Superior Tribunal de Justiça, é considerada consumidora, na forma do art. 2º, caput, da Lei 8.078/90. Consta no art. 14 do CDC: "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: (...) II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro." (grifei) De análise atenta aos autos é possível verificar que não ficou demonstrada qualquer falha no sistema bancário – a exemplo da clonagem de cartões - uma vez que a operação fraudulenta apontada se deu mediante de senha pessoal. A propósito: "PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CEF. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. APLICABILIDADE: LEI Nº 8078/90, ART. 3º, § 2º E ARTIGO 14 (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR). 1- Ação ajuizada objetivando indenização por danos morais e materiais, tendo em vista a ocorrência de supostos saques indevidos em conta-poupança da Autora. 2- Trata-se de caso em que a guarda da senha, bem como do cartão é incumbência do correntista, não sendo possível transmitir ao banco a responsabilidade por saques realizados quando dito cartão não esteja em poder do correntista, e nada tenha sido informado ao banco. Ainda mais, quando só é possível realizar transações bancárias com a senha a cujo acesso somente o cliente possui. 3- A relação jurídica de direito material está enquadrada como relação de consumo, de conformidade com o preceituado no art. 3º, § 2º, da Lei nº 8078/90. 4- Para a inversão do ônus da prova, nos termos do CDC, é imprescindível que as alegações da parte autora sejam verossímeis, de modo que o Juiz se convença da aparência de veracidade da sua narrativa. 5- In casu, a Autora limitou-se a alegar que foram efetuados saques indevidos em sua conta poupança, por intermédio do cartão magnético e senha pessoal, sem, no entanto, acrescentar quaisquer outros argumentos. 6- Negado provimento ao recurso." (TRF - 2ª Região - AC 471601 - Proc. 2009.51010187754 - 8ª Turma Especializada - d. 17/11/2010 - E-DJF2R de 25/11/2010, págs.448/449 - Rel. Des. Fed. Raldênio Bonifácio Costa)" (grifei). Dessa forma, a fraude invocada não pode ser configurada como ato ilícito cometido pela ré, portanto passível de reparação, nos termos dos artigos 927 e 186 do Código Civil. Dispõe o art. 927 que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. E ainda o art. 186 que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Não há, nos autos prova, alguma de eventual omissão, negligência ou imprudência que pode ser a ela relacionada ou imputada, observando-se, ainda, que na descrição dos fatos não emerge qualquer conduta da CAIXA, ou de seus prepostos. Dessa forma, o pedido de restituição dos valores contestados deve ser julgado improcedente por absoluta falta de amparo legal. III - DISPOSITIVO Isto posto JULGO EXTINTO o processo em face de PIC PAY e BRADESCO, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC, por ilegitimidade, e, quanto ao mérito, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado pela autora, na forma do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. (...) Recorre a parte autora, tempestivamente, para alegar que, tendo em vista nítida falha no serviço disponibilizado ao requerente, a indenização correspondente aos valores retirados da sua conta bancária é devida. Pleiteia, ainda, o ressarcimento por dano moral. Assevera que competia à CAIXA, diante dos altos valores transferidos de forma atípica relativamente ao histórico da parte recorrente, ter diligenciado para impedir que a fraude ocorresse. Sustenta haver responsabilidade de todos os litisconsortes e pede sejam solidariamente responsabilizados. A CEF apresentou contrarrazões. É o relatório. Dos fatos narrados na inicial não é possível extrair a responsabilidade dos litisconsortes em relação aos quais a sentença extinguiu o feito sem resolução do mérito. Fica a sentença mantida, por seus próprios e jurídicos fundamentos, no ponto. No caso concreto, o autor relata que abriu conta-poupança para recebimento de valores objeto de alvará judicial em 19/04/2021 (honorários advocatícios). Em 07.05.2021 o gerente da instituição bancária solicitou o cadastramento de nova senha, procedimento realizado na própria mesa do gerente. Após, foi instruído por ele a desbloquear a nova senha no caixa eletrônico, porém se esqueceu de tomar a providência. No mesmo dia, mais tarde, recebeu ligação de uma pessoa que se identificava como atendente da CEF, que informou que o sistema não acusava o desbloqueio da senha e solicitou que ele o fizesse. Assim, foi novamente à CEF para desbloquear a assinatura eletrônica e aproveitou para sacar R$ 1.500,00. Esclarece que todo procedimento foi feito presencialmente na própria agência bancária e que nunca passou sua chave PIX ou qualquer dado bancário para qualquer pessoa, seja via telefone, whatsapp ou SMS. No dia seguinte, 08/05/2021, ao consultar seus extratos verificou 5 transferências indevidas em sua conta: Acionou o gerente de sua conta e apresentou contestação administrativa, porém o banco emitiu parecer contrário à restituição. O Boletim de Ocorrência, de 10/05/2021, foi anexado no id. 298626776. Há, nos autos, documentos que sustentam as alegações do autor. Por seu lado, narra a CEF que o o autor, em sua contestação administrativa, declarou junto à CAIXA que “entregou seu cartão com senha aos fraudadores”. Afirma que para as operações foram “utilizadas as senhas cadastradas pela cliente, de uso pessoal e intransferível”. Assevera que não há registro de contato telefônico do autor com o atendimento CAIXA. Conclui que se trata de ato imputável exclusivamente à vítima. A Ré não apresenta qualquer documento comprobatório de suas alegações, sequer os endereços IP a partir dos quais foram efetuadas as movimentações em análise. Diferentemente do que afirma a defesa da CEF, da contestação administrativa de id 298626887 constam as seguintes declarações feitas pelo autor: Chama a atenção o fato de que os diversos requerimentos feitos pelo autor à CEF de acesso a informações e imagens, comprovados no id 298626887, foram indeferidos pela ré (cf. id 298626889). Os valores foram transferidos por 5 pix efetuados sucessivamente, em intervalos de poucos minutos, e em valores próximos de R$ 10.000,00, o que destoa do que lhe era comum naquele período, fato incontroverso. Isso demonstra que houve, de fato, negligência da ré para providenciar as medidas de segurança que lhe cabiam. Desse modo, a movimentação poderia ter despertado algum alerta por parte da instituição financeira. Nesse contexto, era possível à CEF detectar as movimentações na conta bancária do autor. No entanto, a CEF não indicou ter apurado se o pagamento realizado estava dentro do perfil de consumo da parte autora e se houve alguma investigação sobre os destinatários da transferência. Portanto, em homenagem aos posicionamentos superiores do STJ, é caso de se reconhecer a culpa da instituição financeira. Não há nos autos elementos sequer a indicar que foi o modus operandi do cliente que deu azo à fraude. Por sua vez, resta bastante claro que o banco violou o seu dever de segurança, por não criar mecanismos que obstem transações bancárias com aparência de ilegalidade por destoarem do perfil de compra do consumidor. Por conseguinte, há de se reconhecer a relação de causalidade entre o dano apurado e o ato praticado pela ré, razão pela qual a parte autora faz jus à indenização de 100% (cem por cento) dos danos materiais sofridos. Assim, a parte autora faz jus à indenização por danos materiais no valor total das movimentações, ou seja, no valor de R$ 49.999,85, quantia a ser atualizada da transferência indevida até o efetivo pagamento, com juros de mora da citação (responsabilidade contratual), tudo nos termos do Manual de Cálculos da JF em sua versão mais atualizada quando da liquidação do julgado. No tocante aos danos morais, não havendo outras repercussões além da financeira, este colegiado, seguindo posicionamentos da TNU, tem entendimento reiterado pela inadmissibilidade da condenação em dano moral. CONCLUSÃO Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da parte autora, para reformar parcialmente a sentença, a fim de julgar procedente apenas o pedido de danos materiais e condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 49.999,85 (quarenta e nove mil, noventa e nove reais e noventa e cinco centavos), nos termos da fundamentação. Sem honorários, por não haver recorrente integralmente vencido. Apesar dos valores a que faz jus e da profissão de nível superior, tendo em vista a documentação juntada (declaração de imposto de renda), defiro os benefícios da justiça gratuita presumindo a boa-fé. É como voto. PODER JUDICIÁRIO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001395-09.2022.4.03.6318 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: JOSE CARLOS DIAS GUIMARAES Advogado do(a) RECORRENTE: ALOIR ALVES VIANA - SP272812-N RECORRIDO: PICPAY SERVICOS S.A, BANCO BRADESCO SA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL PROCURADOR: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ALVIN FIGUEIREDO LEITE - SP178551-A, EDUARDO FRANCISCO VAZ - SP178858-A Advogado do(a) RECORRIDO: LEONARDO DA COSTA ARAUJO LIMA - GO26929-A Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO CARLOS FARDIN - SP103137-A OUTROS PARTICIPANTES: EMENTA Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por maioria, decidiu dar parcial provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. BRUNO VALENTIM BARBOSA Juiz Federal
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