Processo nº 5000314-94.2022.4.03.6004
ID: 291599153
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 5000314-94.2022.4.03.6004
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
YURI SERGIO CAMPOS DA COSTA PANNIAGO
OAB/MS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000314-94.2022.4.03.6004 RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES APELANTE: RUTIELLE SOUZA DA SILVA Advog…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000314-94.2022.4.03.6004 RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES APELANTE: RUTIELLE SOUZA DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: YURI SERGIO CAMPOS DA COSTA PANNIAGO - MS26787-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000314-94.2022.4.03.6004 RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES APELANTE: RUTIELLE SOUZA DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: YURI SERGIO CAMPOS DA COSTA PANNIAGO - MS26787-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de RUTIELLE SOUZA DA SILVA em face da sentença (Id. 308761303), que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, condenando-o como incurso nas sanções do artigo 33, caput, c.c. artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06, à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 350 (trezentos e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente na data do fato. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 3 (três) salários-mínimos. Em suas razões, a defesa, pleiteia a absolvição do réu pela insuficiência probatória da materialidade e autoria delitivas e a restituição do aparelho celular apreendido (Id. 308761309). Contrarrazões da acusação (Id. 308761311). Subindo os autos a esta E. Corte, a Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Álvaro Luiz de Mattos Stipp, opinou pelo desprovimento do recurso (Id. 308870849). É o Relatório. À revisão, nos termos regimentais. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000314-94.2022.4.03.6004 RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES APELANTE: RUTIELLE SOUZA DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: YURI SERGIO CAMPOS DA COSTA PANNIAGO - MS26787-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denunciou RUTIELLE SOUZA DA SILVA como incurso nas penas do artigos 33, caput, e 40, inciso I, todos da Lei nº 11.343/06. É o teor da denúncia (Id. 308760872): "No dia 25/04/2022, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, localizado próximo à Ponte do Rio Paraguai, na BR 262, KM 708, nesta cidade de Corumbá/MS, RUTIELLE SOUZA DA SILVA foi flagrado importando/transportando/trazendo consigo 900g (novecentos gramas) de cocaína proveniente da Bolívia. Na mencionada data, durante fiscalização de rotina, Policiais Rodoviários Federais avistaram um veículo tipo Van, placas OOP-7685, que seguia em direção a Campo Grande. Ao abordar o referido automóvel, verificaram que havia dezesseis passageiros em seu interior, solicitando que todos descessem para fazerem a revista. No momento da abordagem RUTIELLE permaneceu no veículo e, por este motivo, o PRF STERFERSON abriu a porta de onde ele se encontrava (porta dianteira). Assustado, o denunciado deixou cair dois tabletes de pasta-base de cocaína, que teria retirado de sua mochila na tentativa de escondê-los entre os bancos da van. Interrogado em sede policial, RUTIELLE SOUZA DA SILVA disse que reside em Florianópolis e viajou a Corumbá sozinho para o carnaval. Negou a propriedade da droga e afirmou que em sua mochila só havia duas latinhas de cerveja que adquirira na Bolívia. Ainda que tenha negado a prática do crime em questão, a materialidade delitiva e a respectiva autoria estão suficientemente demonstradas pelo: (a) auto de prisão em flagrante; (b) depoimentos dos policiais condutores; (c) auto de apresentação e apreensão; (d) laudos preliminar e definitivo de constatação e pelos demais elementos de informação carreados aos autos." A denúncia foi recebida em 13/12/2023 (Id. 308761275). Após a instrução probatória, foi proferida sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, condenando-o como incurso nas sanções do artigo 33, caput, c.c. artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06, à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 350 (trezentos e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente na data do fato. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 3 (três) salários-mínimos (Id. 308761303). Em suas razões, a defesa, pleiteia a absolvição do réu pela insuficiência probatória da materialidade e autoria delitivas e a restituição do aparelho celular apreendido (Id. 308761309). Da materialidade delitiva. A defesa pugna pela absolvição do réu alegando a fragilidade da prova da materialidade do crime bem como a insuficiência de provas da autoria. O pleito não merece prosperar. A materialidade delitiva restou plenamente comprovada por meio das seguintes prova documentais: Auto de Prisão em Flagrante (Id. 308760867 - fl. 1); Auto de Apreensão nº 1457127/2022 (Id. 308760867 - fl. 8); Laudo Preliminar de Constatação nº 1457488/2022 (Id. 308760867 - fls. 09/11); e Laudo de Perícia Criminal Federal nº 0666/2022 (Id. 308760867 - fls. 46/49). De fato, conforme comprovam os laudos mencionados, a substância orgânica encontrada em poder do acusado, na quantidade total de 900 g (novecentas gramas), resultou positivo cocaína, substância considerada entorpecente pela legislação em vigor. A substância entorpecente identificada, COCAÍNA, é de uso proscrito no Brasil, conforme Portaria SVS/MS nº 344/1998 e atualizações. Neste ponto, necessário observar o que consta dos laudos constantes dos autos. Inequívoca a presença da materialidade, passo ao exame da autoria. Da autoria delitiva. De acordo com a denúncia, no dia 25/04/2022, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, localizado próximo à Ponte do Rio Paraguai, na BR 262, KM 708, nesta cidade de Corumbá/MS, RUTIELLE SOUZA DA SILVA foi flagrado importando/transportando/trazendo consigo 900g (novecentos gramas) de cocaína proveniente da Bolívia. No momento da abordagem RUTIELLE permaneceu no veículo e, por este motivo, o PRF STERFERSON abriu a porta de onde ele se encontrava (porta dianteira). Assustado, o denunciado deixou cair dois tabletes de pasta-base de cocaína, que teria retirado de sua mochila na tentativa de escondê-los entre os bancos da van. A autoria do réu também é inconteste, notadamente pelas provas documentais corroboradas pelos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela acusação, bem como pelo próprio interrogatório do réu, que não se sustenta. A respeito dos fatos, tanto na esfera policial como em juízo, o réu negou a autoria delitiva, afirmando que dentro de sua mochila havia apenas duas latas de cerveja e que não obedeceu à ordem de descida, pois estava distraído mexendo no celular. Ademais, relatou que estaria a passeio em Corumbá/MS. No entanto, sua versão se mostra isolada diante dos elementos colhidos nos autos e não se sustenta. Os depoimentos das testemunhas da acusação, os agentes da polícia rodoviária federal, Caio Ruan e Steferson, que realizaram a abordagem do apelante, foram unânimes e precisos ao descrever a abordagem, tendo sido o réu o único passageiro a não atender a ordem de descida, além de ser observada uma movimentação do réu tentando se desvencilhar da droga, todavia não logrou êxito em razão de não haver abertura entre seu banco e a parte de trás do veículo, de modo que os invólucros permaneceram próximo a seu pé e à porta, e caíram quando esta foi aberta. Ademais, para justificar a desobediência à ordem de descida do veículo, afirmou que sequer percebeu toda a movimentação causada pela fiscalização, já que estava desatento pois manipulava seu celular - que se encontrava sem sinal. Além disso, a versão apresentada pelo réu é inverossímil, alegando que veio a Corumbá/MS a passeio, inspirado na novela "Pantanal" - embora durante sua estadia não tenha visitado qualquer local da região - e, durante a viagem, decidiu ir até a Bolívia, onde teria tão somente comprado duas cervejas para presentear sua esposa e retornado ao Brasil. Quanto à quantidade expressiva de dinheiro que trazia (dois mil reais), alegou que não seria um valor alto e possuiria tal quantia exclusivamente para realizar pagamentos em locais que não aceitassem outros meios de pagamento. Sendo assim, a versão apresentada pelo acusado é absurda e dissonante das demais provas dos autos, já que não há demonstração que tenha visitado algum ponto desta região, não obstante, mencionar uma viagem turística; e apesar de mencionar ter se distraído ao celular, relata-se que houve movimentação intensa com parada veículo, ordem de descida e movimentação dos demais ocupantes, o que dificilmente passaria despercebido. Nessa ordem de ideias, a prova dos autos aponta para o fato de que o réu se manteve no veículo para tentar, sem sucesso, desvencilhar-se da droga que trazia consigo. Destaque-se, ainda, que no celular do réu foram encontradas imagens e “prints” de pesquisas e artigos relacionados ao tráfico de drogas nesta região de fronteira, levando a crer que (o réu) pretendia conhecer o fluxo e planejava a prática delitiva. Desse modo, tendo o acusado praticado os fatos descritos na peça acusatória, e inexistentes alegações ou elementos capazes de excluir a ilicitude ou a culpabilidade, tratando-se, pois, de fato típico, antijurídico e culpável, a condenação à pena cominada no artigo 33, caput c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06, é medida que se impõe. Da dosimetria da pena. Na sentença, o juiz a quo julgou procedente a pretensão punitiva estatal, condenando o réu como incurso nas sanções do artigo 33, caput, c.c. artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06, à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 350 (trezentos e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente na data do fato. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 3 (três) salários-mínimos, nos seguintes termos (Id. 308761303): "Tráfico de drogas internacional A pena prevista para o crime está compreendida entre 5 e 15 anos de reclusão e 500-1500 dias-multa (art. 33, caput da Lei n° 11.343/06). Com relação às circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, caput, infere-se que: a) quanto à culpabilidade, o grau de reprovabilidade e o dolo apresentam-se normais à espécie; b) a parte acusada não possui maus antecedentes certificados nos autos; c) não existem elementos que retratem a conduta social e a personalidade da parte ré; d) nada a ponderar sobre os motivos do crime, que foi a obtenção de lucro, inerente ao crime; e) relativamente às circunstâncias do crime, observo que o crime foi praticado de modo a não denotar um maior juízo de reprovabilidade que não seja inerente ao tipo; f) as consequências do crime não foram consideráveis, em razão da apreensão da droga; g) nada a ponderar a respeito do comportamento da vítima. Dispõe ainda o art. 42 da Lei de Drogas que o magistrado, na fixação das penas, considerará, com preponderância ao previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou produto, a personalidade e a conduta social do agente. No caso concreto, a apreensão foi de 900 gramas de cocaína, quantidade não exorbitante, mas de qualidade especialmente deletéria, visto o alto potencial viciante da droga. Considerando tais circunstâncias fixo a PENA-BASE em 6 anos. Sem circunstâncias agravantes ou atenuantes, mantenho em 6 anos a pena intermediária. Na terceira fase, o art. 40, da Lei nº 11.343/2006, determina que a pena deverá ser aumentada, de 1/6 a 2/3, caso a conduta praticada incida em um ou mais dos seus incisos. No caso dos autos, a conduta da parte ré incidiu no inciso I (internacionalidade do delito), pelo que aumento a pena na razão de 1/6 (um sexto), a qual fica, agora, fixada em 7 anos de reclusão. Quanto à minorante da Lei 11.343/2006, artigo 33, § 4º, esta somente deve ser aplicada se o réu preencher cumulativamente as condições legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa. Entendo que a prova do envolvimento com a organização criminosa é da acusação. Andrey Borges de Mendonça e Paulo Roberto Galvão de Carvalho, a esse respeito, afirmam o seguinte: Vislumbramos que, em decorrência do princípio da presunção de inocência, o réu não precisa comprovar que é primário e de bons antecedentes e, principalmente, que não se dedica às atividades criminosas nem integra organização criminosa, devendo tal ônus recair sobre o Ministério Público. (Lei de Drogas: comentada artigo por artigo. 2 ª Ed. São Paulo: Método, 2008. p. 113) Todavia, as circunstâncias objetivas da prática do delito impedem a aplicação da causa de diminuição no grau máximo. Conforme a jurisprudência deste E. TRF da 3ª Região, “para definição do grau de diminuição do tráfico privilegiado, embora o réu atenda aos requisitos legais, deve ser considerado o grau de auxílio prestado ao tráfico internacional de drogas e a consciência de que estava a serviço de um grupo de tal natureza, bem como a audácia maior de seu comportamento quando cotejada com o agente que se atreve a comercializar drogas em pequenos pontos de venda” (TRF3, ApCrim - 5001665-06.2021.4.03.6112, Rel. Desembargadora Federal LOUISE VILELA LEITE FILGUEIRAS, julgado em 19/10/2022). Desse modo, considerando que houve a adesão deliberada à cadeia do tráfico internacional, pretendendo o acusado encaminhar a droga para Florianópolis-SC, fixo a minorante em 1/2 (metade). Desse modo, fixo a pena definitivamente em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Fixo proporcionalmente a pena de multa em 350 (trezentos e cinquenta) dias-multa. Considerando o padrão de renda declarado pelo acusado em seu interrogatório, fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trinta avos) de salário-mínimo à época dos fatos, corrigido monetariamente até a data de efetivo recolhimento da pena de multa." No que se refere à dosimetria da pena, as partes não se insurgiram. Contudo, tendo em vista os parâmetros acolhidos por esta E. Corte, de ofício, passo ao reexame da dosimetria da pena. Primeira fase da dosimetria. Na sentença, o juiz a quo exasperou a pena-base por força da qualidade especialmente deletéria, e do alto potencial viciante da droga (cocaína). Nesta sede, observo que na primeira fase de fixação da pena, além das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, deve ser considerado, preponderantemente, nos termos do artigo 42 da Lei nº 11.343/2006, o grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela nocividade e quantidade de tóxico que se buscou transportar, o que indicará se a pena-base deverá ser fixada no mínimo legal ou acima desse patamar. A jurisprudência é uníssona no sentido de que as circunstâncias da quantidade e da natureza do entorpecente devem ser consideradas na fixação da pena-base, amparada no artigo 42 da Lei nº 11.343/2006, uma vez que, atendendo à finalidade da lei, que visa coibir o tráfico ilícito de entorpecentes, esse fundamento apresenta-se válido para individualizar a pena, dado o maior grau de censurabilidade da conduta. Nesse sentido: REGIME INICIAL MAIS GRAVOSO. CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS. DIVERSIDADE E NATUREZA DOS ESTUPEFACIENTES APREENDIDOS. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, circunstância concreta relacionada à natureza e quantidade da droga apreendida, é motivação suficiente a ensejar a fixação de regime mais gravoso, no caso, o fechado, não havendo ilegalidade a sanar, no ponto. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 1034892/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 06/10/2017). PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. NATUREZA E ELEVADA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA. EXERCÍCIO DA FUNÇÃO DE "MULA". PARTICIPAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DA PENA PREVISTA NO ART. 33, §4.º, DA LEI Nº 11.343/06. INAPLICABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A natureza e a quantidade da droga justificam a exasperação da pena-base acima no mínimo legal, nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/06. 2. Reconhecido pelo Tribunal a quo, com base nos elementos fático-probatórios dos autos, que o agravante integra organização criminosa voltada ao comércio de drogas, inviável a aplicação da minorante, diante do não preenchimento dos requisitos previstos no §4º do art. 33 da Lei 11.343/06. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. O agente transportador de drogas, na qualidade de "mula" do tráfico, integra organização criminosa, não fazendo jus, portanto, à causa especial de diminuição da pena prevista no art. 33, §4º, da Lei 11.343/2006. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 634.411/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016). Desse modo, considerando a quantidade e a qualidade do entorpecente apreendido, qual seja, 900 g (noventas gramas) de COCAÍNA, reduzo a pena-base ao patamar mínimo legal, em conformidade com os parâmetros acolhidos por esta E. Corte. Sendo assim, de ofício, a pena-base cominada ao réu em 5 (cinco) anos e 500 (quinhentos) dias-multa. Segunda fase Na sentença, o juiz a quo considerou ausentes as circunstâncias atenuantes e/ou agravantes da pena. Nesta sede, considero ausentes as circunstâncias atenuantes e/ou agravantes da pena. Logo, fixo a pena intermediária cominada ao réu em 5 (cinco) anos e 500 (quinhentos) dias-multa. Terceira fase Na terceira fase, foi reconhecida na sentença a incidência da causa de aumento da pena do artigo 40, inciso I, da Lei de Drogas, à razão de 1/6 (um sexto). Nesta sede, observo que restou demonstrada a internacionalidade delitiva, uma vez que o réu foi preso em flagrante próximo à Ponte do Rio Paraguai, na cidade de Corumbá/MS, em região de fronteira com a Bolívia. Desse modo, não há retificação no que diz respeito à majoração prevista no artigo 40, inciso I, da Lei de Drogas, dado que suficientemente comprovada pelas circunstâncias do flagrante e provas testemunhais, a qual já foi aplicada na fração mínima prevista. Ademais, tal majorante aplica-se ao tráfico com o exterior, seja quando o tóxico venha para o Brasil, seja quando esteja em vias de ser exportado. Portanto, é evidente, a tipificação do tráfico internacional de entorpecentes. No que se refere ao pleito pela aplicação da causa de diminuição do artigo 33, §4.º da norma já mencionada em sua fração máxima, cumpre dizer que o mencionado benefício do tráfico privilegiado foi reconhecido na sentença, aplicando o juiz a quo o fator redutor da ordem de 1/2 (metade), com fundamento nos seguintes termos: "Quanto à minorante da Lei 11.343/2006, artigo 33, §4º, esta somente deve ser aplicada se o réu preencher cumulativamente as condições legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa. Entendo que a prova do envolvimento com a organização criminosa é da acusação. Andrey Borges de Mendonça e Paulo Roberto Galvão de Carvalho, a esse respeito, afirmam o seguinte: Vislumbramos que, em decorrência do princípio da presunção de inocência, o réu não precisa comprovar que é primário e de bons antecedentes e, principalmente, que não se dedica às atividades criminosas nem integra organização criminosa, devendo tal ônus recair sobre o Ministério Público. (Lei de Drogas: comentada artigo por artigo. 2 ª Ed. São Paulo: Método, 2008. p. 113) Todavia, as circunstâncias objetivas da prática do delito impedem a aplicação da causa de diminuição no grau máximo. Conforme a jurisprudência deste E. TRF da 3ª Região, “para definição do grau de diminuição do tráfico privilegiado, embora o réu atenda aos requisitos legais, deve ser considerado o grau de auxílio prestado ao tráfico internacional de drogas e a consciência de que estava a serviço de um grupo de tal natureza, bem como a audácia maior de seu comportamento quando cotejada com o agente que se atreve a comercializar drogas em pequenos pontos de venda” (TRF3, ApCrim - 5001665-06.2021.4.03.6112, Rel. Desembargadora Federal LOUISE VILELA LEITE FILGUEIRAS, julgado em 19/10/2022). Desse modo, considerando que houve a adesão deliberada à cadeia do tráfico internacional, pretendendo o acusado encaminhar a droga para Florianópolis-SC, fixo a minorante em 1/2 (metade)." Vejamos. Os requisitos desse benefício são os seguintes: "Art. 33: (...) §4º. Nos delitos definidos no caput e no §1.º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa." Ressalte-se também que a Segunda Turma do STF entendeu que: "A habitualidade e o pertencimento a organizações criminosas deverão ser comprovados, não valendo a simples presunção, de modo que o acusado tem direito à redução se ausente prova nesse sentido. 4. A quantidade e natureza da droga são circunstâncias que, apesar de configurarem elementos determinantes na modulação da causa de diminuição de pena, por si sós, não são aptas a comprovar o envolvimento com o crime organizado ou a dedicação à atividade criminosa". (HC 152001 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 29/10/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-260 DIVULG 27-11-2019 PUBLIC 28-11-2019). Como é cediço, o legislador ao instituir o referido benefício legal teve como objetivo conferir tratamento diferenciado aos pequenos e eventuais traficantes, não alcançando, assim, aqueles que fazem do tráfico de entorpecentes um meio de vida. No presente caso, ainda que a atuação no mero transporte de entorpecente, enquanto "mula", não seja suficiente para caracterizar integração em organização criminosa, tal conduta denota desvalor incompatível com a redutora na fração máxima, visto que o réu assentiu em tomar parte em uma empreitada criminosa estruturada (v.g. aporte financeiro, acondicionamento do entorpecente, contatos com intermediários) por organização criminosa, como só ocorre em delitos desse porte. Desta feita, sendo o réu primário e não ostentando maus antecedentes, deve ser observada a causa de diminuição do artigo 33, § 4.º, da Lei nº 11.343/2006, a qual aplico na fração redutora da ordem de 1/2 (metade), conforme entendimento acolhido pela Quinta Turma desta E. Corte para hipóteses semelhantes. Desse modo, ao término do sistema trifásico, resulta, pois, a pena privativa de liberdade infligida ao réu 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa. Mantido o valor do dia multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. Do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade. Em virtude do próprio quantum da privação de liberdade, e não havendo circunstância do artigo 59 do CP que recomende o contrário, deve ser fixado o regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, § 2.º, alínea "c" e § 3.º, do Código Penal. Da substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos. Preenchidos os requisitos fixados no artigo 44 do Código Penal, cabível a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 2 (dois) salários-mínimos, vigentes à época do pagamento. Da restituição do aparelho celular apreendido. Por fim, a defesa pleiteia a restituição do aparelho celular apreendido. O pedido não merece acolhimento. A respeito do tema, a Constituição Federal, no artigo 243, parágrafo único, determina que: “Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins (…) será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei”. No mesmo sentido, o artigo 61, caput, da Lei nº 11.343/2006 prevê a apreensão de instrumentos ou objetos de qualquer natureza utilizados para a prática, habitual ou não, dos crimes previstos na referida Lei, incluindo, assim, o crime de tráfico de drogas praticado pelo apelante. Ressalta-se, ainda, que artigo 91, inciso II, alínea "b", do Código Penal, determina como efeito da condenação a perda em favor da União “do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso”. Na hipótese, o referido aparelho celular apreendido se enquadra como tendo sido usado na prática delitiva de tráfico de drogas. Desse modo, como o aparelho celular foi apreendido em decorrência do tráfico de drogas, tendo sido possivelmente utilizado para a prática delituosa, não se justifica a restituição. Sendo assim, rejeito o pedido de restituição do aparelho celular suscitado pela defesa. Do direito de recorrer em liberdade. Na sentença, o juiz a quo considerou que o réu deve responder ao processo em liberdade (Id. 308761303). Com efeito, tendo o réu respondido ao processo em liberdade e não havendo alteração fática que justifique a decretação da prisão preventiva, deverá aguardar em liberdade o julgamento de eventual recurso. Dispositivo. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo defensivo e, DE OFÍCIO, reduzo a pena-base, redimensionando a pena privativa de liberdade cominada ao réu para 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 2 (dois) salários-mínimos, vigentes à época do pagamento e, 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, mantidos, no mais, os termos da sentença. É o voto. E M E N T A PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, C.C. ARTIGO 40, INCISO I, DA LEI 11.343/2006. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE REDUZIDA DE OFÍCIO. REGIME INICIAL ABERTO. PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO. RECURSO DA DEFESA DESPROVIDO. 1. De acordo com a denúncia, no dia 25/04/2022, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, localizado próximo à Ponte do Rio Paraguai, na BR 262, KM 708, nesta cidade de Corumbá/MS, o réu foi flagrado importando/transportando/trazendo consigo 900g (novecentos gramas) de cocaína proveniente da Bolívia. 2. A materialidade delitiva restou plenamente comprovada por meio das seguintes prova documentais: Auto de Prisão em Flagrante; Auto de Apreensão nº 1457127/2022; Laudo Preliminar de Constatação nº 1457488/2022; e Laudo de Perícia Criminal Federal nº 0666/2022. De fato, conforme comprovam os laudos mencionados, a substância orgânica encontrada em poder do acusado, na quantidade total de 900 g (novecentas gramas), resultou positivo cocaína, substância considerada entorpecente pela legislação em vigor. 3. A autoria é igualmente induvidosa, visto que a prova colhida em Juízo, abrangendo oitiva de testemunhas e interrogatório do réu, corroborou plenamente as informações constantes nos autos do inquérito policial. A versão apresentada pelo acusado é inverossímil e dissonante das demais provas dos autos, já que não há demonstração que tenha visitado algum ponto desta região, não obstante, mencionar uma viagem turística; e apesar de mencionar ter se distraído ao celular, relata-se que houve movimentação intensa com parada veículo, ordem de descida e movimentação dos demais ocupantes, o que dificilmente passaria despercebido. 4. Dosimetria da pena. Na primeira fase de fixação da pena, além das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, deve ser considerado preponderantemente, nos termos do artigo 42 da Lei 11.343/2006, o grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela nocividade e quantidade de tóxico que se buscou transportar, o que indicará se a pena-base deverá ser fixada no mínimo legal, ou acima desse patamar. 5. In casu, considerando a quantidade e a qualidade do entorpecente apreendido, qual seja, 900 g (novecentas gramas) de cocaína, de ofício, deve a pena-base ser reduzida ao patamar mínimo legal, em conformidade com os parâmetros acolhidos por esta E. Corte. Pena-base redimensionada para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 6. Na segunda fase da dosimetria, ausentes as circunstâncias que atenuam e/ou agravam a pena. 7. Na terceira fase da dosimetria, restou demonstrada a internacionalidade delitiva, uma vez que o réu foi preso em flagrante próximo à Ponte do Rio Paraguai, na cidade de Corumbá/MS, em região de fronteira com a Bolívia. 8. Incidência da benesse do §4.º, do artigo 33 da Lei de Drogas. O réu é primário e não ostenta maus antecedentes, tampouco há comprovação de que se dedique às atividades delituosas ou que integre organização criminosa de forma permanente. 9. Fração da causa de diminuição aplicada em 1/2 (metade), conforme entendimento acolhido por esta E. Corte. 10. Pena definitiva cominada ao réu em 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. 11. Regime aberto para início de cumprimento de pena, nos termos do artigo 33, §2.º, alínea "c" e §3.º, do Código Penal. 12. Diante do disposto no artigo 44, inciso I, do Código Penal, cabível a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade pelo tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade em local a ser designado pelo Juízo da Execução e ao pagamento de prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos, vigentes à época do pagamento. 13. Do direito de recorrer em liberdade. Tendo em vista que o réu respondeu ao processo em liberdade e não havendo alteração fática que justifique a decretação da prisão preventiva, deverá aguardar em liberdade o julgamento de eventual recurso. 14. Da restituição do aparelho celular apreendido. Desse modo, como o aparelho celular foi apreendido em decorrência do tráfico de drogas, tendo sido possivelmente utilizado para a prática delituosa, não se justifica a restituição. 15. Apelação da defesa a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade decidiu NEGAR PROVIMENTO ao apelo defensivo e, DE OFÍCIO, reduzir a pena-base, redimensionando a pena privativa de liberdade cominada ao réu para 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou entidade pública e prestação pecuniária no valor de 2 (dois) salários-mínimos, vigentes à época do pagamento e, 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, mantidos, no mais, os termos da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. PAULO FONTES Desembargador Federal
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