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Anderson Andre Goncalves
OAB/RS 91.622
ANDERSON ANDRE GONCALVES consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça como advogado.
ID: 280527588
Tribunal: TRF4
Órgão: SECRETARIA DA 3a. TURMA
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 5014353-34.2025.4.04.0000
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ESIO COSTA JUNIOR
OAB/RJ XXXXXX
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LETICIA ALLE ANTONIETTO
OAB/PR XXXXXX
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RAPHAELA THEMIS LEITE JARDIM
OAB/PR XXXXXX
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KARLIN OLBERTZ NIEBUHR
OAB/PR XXXXXX
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PAULO OSTERNACK AMARAL
OAB/PR XXXXXX
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ANDRE GUSKOW CARDOSO
OAB/PR XXXXXX
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EDUARDO TALAMINI
OAB/PR XXXXXX
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FERNAO JUSTEN DE OLIVEIRA
OAB/PR XXXXXX
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DIEGO BATISTA LOPES
OAB/PR XXXXXX
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ROGERIO ZOUEIN
OAB/RJ XXXXXX
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BRENO ZANOTELLI DE LIMA
OAB/ES XXXXXX
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LILIAN CHRISTINE REOLON
OAB/RS XXXXXX
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SALO DE CARVALHO
OAB/RS XXXXXX
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MARIANA JUCA LEAL FERREIRA RODRIGUES
OAB/RJ XXXXXX
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DANIEL RIBEIRO DA SILVA AGUIAR
OAB/RJ XXXXXX
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JULIA THOMAZ SANDRONI
OAB/RJ XXXXXX
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CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO
OAB/SP XXXXXX
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Agravo de Instrumento Nº 5014353-34.2025.4.04.0000/PRPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5071542-58.2021.4.04.7000/PR
AGRAVANTE
: ROGERIO SANTOS DE ARAUJO
ADVOGADO(A)
: SALO DE CARVALHO (OAB RS034749)
ADVOGADO…
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Rosa Maria Grando x Banco Pan S.A.
ID: 315358066
Tribunal: TRF4
Órgão: 11ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5001477-78.2025.4.04.7006
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
OCTAVIO CORREA OLIVEIRA SCHIFFTER
OAB/PR XXXXXX
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ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO
OAB/PE XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5001477-78.2025.4.04.7006/PR
AUTOR
: ROSA MARIA GRANDO
ADVOGADO(A)
: OCTAVIO CORREA OLIVEIRA SCHIFFTER (OAB PR103942)
RÉU
: BANCO PAN S.A.
ADVOGADO(A)
: ANT…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5001477-78.2025.4.04.7006/PR
AUTOR
: ROSA MARIA GRANDO
ADVOGADO(A)
: OCTAVIO CORREA OLIVEIRA SCHIFFTER (OAB PR103942)
RÉU
: BANCO PAN S.A.
ADVOGADO(A)
: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO (OAB PE023255)
DESPACHO/DECISÃO
Conversão do julgamento em diligência.
I - RELATÓRIO
Em 19 de março de 2025,
ROSA MARIA GRANDO
deflagrou a presente demanda, sob o rito dos juizados, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e do BANCO PAN S.A., pretendendo a condenação dos requeridos a se absterem de promover descontos junto à sua prestação previdenciária e a lhe pagarem o dobro do valor que disse ter sido desbastado a tal título. Ela postulou, ademais, a condenação dos requeridos à reparação dos danos morais que alegou ter suportado em virtude de tais abatimentos, a ser promovida com o pagamento de indenização.
Para tanto, a autora disse auferir proventos de aposentadoria por idade e ter sido surpreendida ao constatar a ocorrência de descontos mensais em seu benefício no valor de R$ 18,22 a partir de abril de 2020, decorrentes de suposto empréstimo consignado contratado. Alegou não ter celebrado aludido contrato, tampouco tendo autorizado os desbastes de algum outro modo. Requereu a gratuidade de Justiça, a inversão do ônus da prova diante da aplicabilidade da legislação consumerista ao caso. Atribuiu à causa o valor de R$ 12.149,96, anexando documentos.
O INSS apresentou contestação, alegando ter se operado a prescrição. Discorreu sobre as normas concernentes à consignação em pagamento, com descontos em benefícios previdenciários. Disse não terem sido preenchidos os requisitos para sua responsabilização.
O Banco Pan apresentou contestação, argumentando faltar interesse processual à autora; a peça inicial seria inepta por ausência de apresentação de comprovante de residência válido e dado ter sido encartado instrumento de procuração vaga. Sustentou a ocorrência de prescrição e defendeu a validade do negócio jurídico, por conta da anuência da autora e a realização de depósito do valor contraído em sua conta bancária.
A autora apresentou réplica, requerendo a promoção de diligência grafotécnica. Os autos vieram conclusos para prolação de sentença.
II - FUNDAMENTAÇÃO
2.1. C
ompetência da Justiça Federal:
Declaro a competência da Justiça Federal para o caso, dado que a autora endereçou sua pretensão ao INSS, autarquia federal criada com força na lei n. 8.029/1990, art. 17. Logo, aplica-se ao caso o art. 109, I, CF/1988.
2.2. Submissão do caso aos Juizados:
Por outro lado, a competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta, diante do previsto no art. 98, I, Constituição e art. 3 da lei n. 10.259, de 2001. Logo, em princípio, não pode ser ampliada ou reduzida, impondo sua apreciação de ofício pelo Poder Judiciário, conforme art. 64, CPC.
Não se submetem à "
competência do Juizado Especial Cível as causas: (...) para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal
."
Convém ter em conta, todavia, que o processo é individualizado pela conjugação do trinômio partes, pedido e causa de pedir (art. 337, §2 CPC). Em decorrência do princípio da substanciação, a parte autora é obrigada a detalhar, na peça inicial, a sua pretensão, indicando o pedido e também a motivação do pedido. Note-se ainda que, como notório, apenas o dispositivo transita em julgado, conforme se infere do rt. 504, I, CPC:
"Não fazem coisa julgada: I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença."
Logo, como têm entendido os tribunais, os Juizados Especiais são competentes para apreciação de pretensões, nas quais a alegada nulidade do ato administrativo é invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido:
"(....)
Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º , § 1º , III , da Lei 10.259 , uma vez que a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
. Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal."
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50446614920184047000 PR 5044661-49.2018.4.04.7000, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, Data de Julgamento: 02/04/2020).
Ainda segundo a Turma Recursal,
"O valor da causa atribuído pela parte autora é inferior a 60 salários, o qual não foi impugnado, logo, não há o que discutir quanto a esse aspecto. Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259, uma vez que "a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória". Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal. "
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50029127820204047001 PR 5002912-78.2020.4.04.7001, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, 22/10/2020, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Atente-se para os julgados que transcrevo abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE JUÍZO FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. COMPETÊNCIA DESTA E. CORTE. SÚMULA 428 DO STJ. AÇÃO INDIVIDUAL DE DISPENSA DE PAGAMENTO DE PEDÁGIO. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. PRECEDENTES DESTA 2ª SEÇÃO. CONFLITO PROCEDENTE. 1 - Nos termos da Súmula 428 do Superior Tribunal de Justiça, compete a esta E. Corte dirimir o presente conflito negativo de competência entre Juízo Federal e Juizado Especial Federal Cível. 2 - Busca a autora tão somente o reconhecimento de seu direito individual à dispensa do pagamento de pedágio na praça de arrecadação instalada no entroncamento das rodovias BR 153 e BR 369, localizada no município de Jacarezinho/PR, com fundamento na Portaria do Ministério dos Transportes nº 155/2004 bem como na sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 2006.70.13.002434-3. 3 -
A questão relativa à desconstituição de ato administrativo não faz parte do pedido do autor, que dela tratou apenas de forma incidental, como causa de pedir, de modo que, no caso dos autos, resta afastada a aplicação do art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259/01. Precedentes desta Segunda Seçã
o. 4 - Aplicável à hipótese em tela a regra geral prevista no caput do artigo 3º da Lei 10.259/2001, que estabelece a competência dos Juizados Especiais Federais em se tratando de causas com valor inferior a sessenta salários mínimos. 5 - Conflito procedente, para declarar a competência do Juizado Especial Federal Cível de Ourinhos/SP.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o conflito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
(CC - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 21150 0000310-88.2017.4.03.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - SEGUNDA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/07/2017).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. AÇÃO ORDINÁRIA QUE VISA O RECONHECIMENTO DE DIREITO. MERA REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DO INCISO III DO §1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 10.250/01. A
parte autora pleiteia a declaração de direito à percepção de determinada vantagem pecuniária, não havendo pedido imediato de anulação de qualquer ato administrativo, o qual só seria atingido via reflexa, razão pela qual não se aplica, na espécie, a regra que excepciona da competência dos Juizados Especiais Federais para causas valoradas até sessenta salários mínimos. Inaplicável ao caso a exceção prevista no inc. III do §1º do art. 3º da Lei nº 10.259/01
. (TRF4 5018358-17.2016.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 22/12/2016).
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. COMPETÊNCIA DO STJ PARA APRECIAR O CONFLITO. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. COMPETÊNCIA. CRITÉRIOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL EM FACE DO VALOR DA CAUSA. 1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que juízo de juizado especial não está vinculado jurisdicionalmente ao tribunal com quem tem vínculo administrativo, razão pela qual o conflito entre ele e juízo comum caracteriza-se como conflito entre juízos não vinculados ao mesmo tribunal, o que determina a competência do STJ para dirimi-lo, nos termos do art. 105, I, d, da Constituição. Precedentes. 2. A Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, estabeleceu que a competência desses Juizados têm natureza absoluta e que, em matéria cível, obedece como regra geral a do valor da causa: são da sua competência as causas com valor de até sessenta salários mínimos (art. 3º). 3. A essa regra foram estabelecidas exceções ditadas (a) pela natureza da demanda ou do pedido (critério material), (b) pelo tipo de procedimento (critério processual) e (c) pelos figurantes da relação processual (critério subjetivo). Entre as exceções fundadas no critério material está a das causas que dizem respeito a "anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal". 4. No caso, a demanda tem valor da causa inferior a sessenta salários mínimos e visa a obter indenização por danos morais. A ilegitimidade dos atos administrativos constitui apenas fundamento do pedido, não seu objeto. 5. Conflito conhecido, declarando-se a competência do Juízo Federal da 7ª Vara do Juizado Especial Cível da Subseção Judiciária de São Luís -MA, o suscitante. (STJ, CC 75314/MA, 1ª Seção, Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 27/08/2007).
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXCEÇÃO DO ART. 3º, § 1º, INC. III, DA LEI Nº 10.259/01 AFASTADA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
A pretensão formulada nesta ação não se enquadra em nenhuma das hipóteses arroladas no § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, visto não tratar a ação de anulação ou cancelamento de ato administrativo típico. O pedido envolve, apenas, reconhecimento de direito. Sendo o valor da causa inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, cabe ao Juizado Especial Federal a competência para processar, conciliar e julgar as causas de competência da Justiça Federal. (TRF4, conflito de competência (Seção) Nº 5008065-61.2011.404.0000, 2ª Seção, Des. Federal VILSON DARÓS, POR UNANIMIDADE, em 08/09/11).
Assim, e atribuído à causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tem-se que competente para o processamento e julgamento da lide o Juizado Especial Federal
. Diante do exposto, nos termos do disposto no art. 120, § único, do CPC, conheço do presente conflito e declaro competente para o processamento e julgamento da lide o juízo suscitado (Juízo Substituto da 1ª Vara de Florianópolis). Publique-se. Comuniquem-se os juízos conflitantes e, com as formalidades de estilo, dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos.
(TRF4 5013834-11.2015.404.0000, Segunda Seção, Relator Candido Alfredo Silva Leal Junior, 11/07/2015)
Assim, a presente causa submete-se ao rito e à alçada dos Juizados Especiais Federais, dado que o conteúdo econômico da pretensão da autora é inferior a 60 salários mínimos, definidos na lei 14.358/2022, atendendo ao art. 3º da lei n. 10.259, de 2001. A aventada nulidade do ato administrativo de averbação dos descontos mensais, no benefício previdenciário da autora, foi invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido.
Atente-se ainda para a seguinte deliberação:
"Conforme a Jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça, nem a complexidade da causa, nem a necessidade de produção de prova pericial afastam a competência dos Juizados Especiais Federais.
Ocorre que a competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta para aquelas causas cujo valor seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, ressalvadas as exceções previstas na Lei nº 10.259/2001. Como a complexidade da causa e a necessidade de prova pericial não estão entre as exceções arroladas na lei, descabe afastar a competência dos Juizados Especiais com base em quaisquer dessas duas causas
."
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50161052320214047100 RS 5016105-23.2021.4.04.7100, Relator: ANDREI PITTEN VELLOSO, Data de Julgamento: 16/12/2021, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS)
O conteúdo econômico da pretensão da autora é inferior a 60 salários mínimos, vigentes ao tempo do ingresso em Juízo, conforme
decreto 12.342, de 30 de dezembro de 2024
,
o que atende ao art. 3,
caput,
da lei n. 10.259/2001. Ademais, cuida-se de
pedido condenatório
, não esbarrando nas exceções do art. 3º, §1º, lei n. 10.259, de 2001. RECONHEÇO, pois, a competência dos Juizados Especiais para a tramitação dessa demanda.
2.3. Competência da presente Subseção Judiciária:
Cuidando-se de pedido de reparação de danos, aplica-se ao caso o art. 53, IV, "a", CPC, apontando como competente o Juízo do local em que tenham sido praticados os atos apontados como causadores dos alegados danos. Por outro lado, anoto que o STF tem aplicado o art. 109,§2º, CF, também quando em causa pretensões endereçadas às autarquias federais.
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA. CAUSAS AJUIZADAS CONTRA A UNIÃO. ART. 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO DO FORO COMPETENTE. APLICABILIDADE ÀS AUTARQUIAS FEDERAIS, INCLUSIVE AO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. I - A faculdade atribuída ao autor quanto à escolha do foro competente entre os indicados no art. 109, § 2º, da Constituição Federal para julgar as ações propostas contra a União tem por escopo facilitar o acesso ao Poder Judiciário àqueles que se encontram afastados das sedes das autarquias. II –
Em situação semelhante à da União, as autarquias federais possuem representação em todo o território nacional. III - As autarquias federais gozam, de maneira geral, dos mesmos privilégios e vantagens processuais concedidos ao ente político a que pertencem. IV - A pretendida fixação do foro competente com base no art. 100, IV, a, do CPC nas ações propostas contra as autarquias federais resultaria na concessão de vantagem processual não estabelecida para a União, ente maior, que possui foro privilegiado limitado pelo referido dispositivo constitucional. V - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem decidido pela incidência do disposto no art. 109, § 2º, da Constituição Federal às autarquias federais. Precedentes. VI - Recurso extraordinário conhecido e improvido
. (STF - RE: 627709 DF, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 20/08/2014, Tribunal Pleno, Data de Publicação: REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO)
Nesse mesmo sentido, convergem os julgados: RE 499.093-AgR-segundo/PR e AI 793.409/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski; RE 234.059/AL, Rel. Min. Menezes Direito; RE 484.235-AgR/MG, Rel. Min. Ellen Gracie; RE 488.704/RJ, RE 527.498/SC e RE 603.311/RS, Rel. Min. Marco Aurélio; RE 590.649/RJ, RE 474.691/SC e RE 491.331/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 474.825/PR, Rel. Min. Dias Toffoli.
Na espécie, a parte autora endereçou sua pretensão ao INSS,
autarquia federal criada por força da lei n. 8.029/1990, art. 17
, de modo que referido entendimento se aplica. Acrescento que o art. 109, §2º, CF, prevalece sobre o art. 3º, §3º, da lei n. 10.259, de 2001.
Com efeito,
"A competência absoluta dos Juizados Especiais, referida no art. 3º , § 3º , da Lei n. 10.259 /01 não constitui obstáculo à redistribuição para fins de equalização de acervo, desde que o encaminhamento ocorra para outra Vara com competência também vinculada ao sistema dos Juizados Especiais Federais. 5. A norma que afirma que "no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta" tem ligação histórica com a interpretação dada pela doutrina e pela jurisprudência à Lei nº 9.099 /95, no sentido de que "o ajuizamento da ação perante o juizado especial é uma opção do autor (art. 3 ., par.3., da Lei 9.099 /95)" ( REsp 151.703/RJ , Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 24/03/1998, DJ 08/06/1998, p. 124). 6.
O ajuizamento obrigatório de causas de até 60 salários mínimos nos Juizados Especiais Federais empresta a essas ações uma competência absoluta para o próprio sistema dos Juizados Especiais, mas não torna essas ações infensas às medidas de equalização. Nada impede, portanto, a incidência do art. 109 , § 2º , da Constituição Federal , no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal
."
(TRF-4 - CC: 50799694420214047000 PR 5079969-44.2021.4.04.7000, Relator: NICOLAU KONKEL JÚNIOR, Data de Julgamento: 24/02/2022, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Por conseguinte,
considerando o alcance do art. 109, §2, CF, a tramitação desta causa perante esta Subseção Judiciária está em conformidade com a legislação
. Ademais, as partes não suscitaram exceção, na forma do art. 65, CPC e súmula 33, Superior Tribunal de Justiça.
2.4. Submissão do caso ao presente Juízo:
Dentre as unidades desta Subseção de Curitiba, o processo restou distribuído perante este Juízo Substituto da 11.VF, por conta de sorteio, o que atendeu à garantia do Juízo Natural - art. 5, LIII, Constituição/88.
2.5. Eventual conexão processual:
O processualista Bruno Silveira Dantas enfatiza que
"com o início de vigência do CPC/2015, será considerado
prevento o juízo perante o qual houver ocorrido o registro ou a distribuição (conforme o caso) da primeira de uma série de demandas conexas, ainda que tal registro ou distribuição tenha ocorrido durante a vigência do CPC/1973
. Desde que a prevenção, ela própria, não se tenha consumado sob a égide do CPC/1973 (por um dos alternativos critérios previstos nos seus arts. 106 e 2019), incidirá de plano o disposto no art. 59 da codificação de 2015 definindo-se o juízo prevento para um conjunto de demandas conexas pela anterioridade dos registros ou das distribuições (conforme o caso) das mesmas. Os arts. 60 e 61 do CPC/2015, por sua vez, praticamente repetem os arts. 107 e 108 do CPC/1973, dispensando, por tal razão, maiores comentários a respeito nesta oportunidade."
(DANTAS, B. S.
in
WAMBIER, Teresa A. Alvim et al.
Breves comentários ao novo código de processo civil.
SP: RT, 2015, p. 229).
Convém term em conta a lição de Araken de Assis, sobre o tema:
"(...)
O art. 55, caput, definiu a conexão como a identidade de pedido ou de causa inspirado no propósito de erradicar as tergiversações constatadas na vigência do CPC de 1939. A proposição legislativa, excepcional no direito estrangeiro, porque prepondera a tendência de encarregar o órgão judicial de indicar os casos do fenômeno, consonante controvérsia haurida do direito comum, e feita em sentido oposto à do CPC de 1939, em todo caso revela-se incompleta e insuficiente. Não abrange a totalidade das hipóteses de conexão
. O art. 55, § 3.º (“… mesmo sem conexão entre eles”) alude à conexão em sentido estrito do art. 55, caput. Ao nosso ver, os vínculos que geram o risco da prolação de “decisões conflitantes ou contraditórias”, a teor do art. 55, § 3.º, inserem-se na rubrica da conexão em sentido amplo. Não há outro sítio adequado para situar o liame entre os objetos litigiosos
O art. 113 do NCPC, arrolando os casos em que se admite a demanda conjunta, ou litisconsórcio, demonstra que existem outros laços, mais tênues e distantes, que autorizam o processo cumulativo. E a outro juízo não se chega ao avaliar o nexo exigido pelo art. 343 na reconvenção, como ocorria no direito anterior. Retira-se, daí, segura conclusão
. As duas hipóteses descritas no art. 55, caput – identidade de causa ou identidade de pedido – constituem “uma, entre as várias em que ocorre a conexão”. Por isso, antes do CPC de 1939, descreveu-se a conexão como “laço envolvente, que se insinua por entre as relações jurídicas, ora prendendo-as de um modo indissolúvel, por forma a exigir uma única decisão; ora criando entre elas pontos de contato mais ou menos íntimo, que aconselham a reunião em um só processo, ainda quando possam ser decididas separadamente, sem maior dano, a não ser a lentidão e o gravame de maiores despesas”.
Exemplos de causas conexas, segundo a literalidade do art. 55, caput: (a) A reivindica o imóvel x perante B, e, paralelamente, C também reivindica o imóvel x, do mesmo réu, hipótese em que a identidade recai sobre o pedido (objeto) mediato; (b) o locatário A propõe consignatória dos aluguéis perante o locador B, o qual, de seu turno, propõe ação de despejo, fundada no inadimplemento dos aluguéis, perante o inquilino.
Para os efeitos da modificação da competência, as hipóteses contempladas no art. 55, caput – identidade de causa de pedir ou identidade de pedido –, então, ainda consideram-se exemplificativas. Um laço menos intenso já serve para reunir os processos. O objetivo da regra reside em evitar decisões conflitantes, “por isso a indagação sobre o objeto ou a causa de pedir, que o artigo por primeiro quer que seja comum, deve ser entendida em termos, não se exigindo a perfeita identidade, senão que haja um liame que os faça passíveis de decisão unificada”. Em outra oportunidade, reiterou-se que “não é necessário que se cuide de causas idênticas (quanto aos fundamentos e ao objeto {rectius: pedido})”, bastando “que as ações sejam análogas, semelhantes”, insistiu no “escopo da junção das demandas para um único julgamento é a mera possibilidade da superveniência de julgamentos discrepantes
”.
Por conseguinte, a jurisprudência, atendendo às finalidades da modificação da competência, em que a derrogação das regras gerais se justifica pela economia de atividade e pela erradicação do risco de julgamentos conflitantes, rejeita a exigência de identidade absoluta de causa ou de pedido, aceitando simples analogia entre as ações
. Porém, preocupa-se com o risco de julgamentos contraditórios, evento apurado caso a caso, mas verificado em todas as hipóteses do art. 113, inclusive na afinidade de ponto comum de direito ou de fato (inc. III). Ora, parece difícil visualizar semelhante risco no cúmulo simples de pedidos, em que há total autonomia das pretensões deduzidas, no mesmo processo, contra o réu. Por isso, o intuito de erradicar pronunciamentos conflitantes não oferece a única e constante justificativa para o processo cumulativo e, muito menos, a prorrogação da competência. Ao menos na conexão subjetiva, no caso da cumulação simples de pedidos, impera o princípio da economia processual. E, de toda sorte, as finalidades visadas no processo cumulativo, e na reunião de causas inicialmente autônomas, mostram-se estranhas à verdadeira causa desses fenômenos, que residiria no vínculo entre partes, causa e pedido." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume I. São Paulo: RT, 2015, tópico 302)
Deve-se aferir, ademais, a eventual aplicação do art. 55, §1º, parte final, CPC/15:
"Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta,
salvo se um deles já houver sido sentenciado
."
Semelhante é o conteúdo da mencionada súmula 235, STJ:
"
A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado
."
No caso em análise, não diviso conexão desta demanda com algum outro processo versando sobre a cominação de multas em desfavor da parte autora, para eventual reunião de causas e solução conjunta.
2.6. Respeito à coisa julgada:
No que toca à delimitação do crédito do requerente,
convém ter em conta que a coisa julgada é uma garantia constitucional, nos termos do art. 5º, XXXVI, Constituição Federal/88:
"a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada."
"A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que
haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei
, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal,
estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo STF, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade
. A superveniência de decisão do STF, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia ex tunc - como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, in abstracto, da Suprema Corte." (RE 592.912-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 3-4-2012, Segunda Turma, DJE de 22-11-2012.)
Atente-se também para a lição de Humberto Theodoro Jr.:
"A coisa julgada é fenômeno próprio do processo de conhecimento, cuja sentença tende a fazer extinguir a incerteza provocada pela lide instalada entre as partes. Mas fazer cessar a incerteza jurídica não significa apenas fazer conhecer a solução cabível, mas impô-la, tornando-a obrigatória para todos os sujeitos do processo, inclusive o próprio juiz. Às vezes, o comando sentencial tem de ser executado por meio de realização coativa da prestação devida pelo vencido. Outras vezes, a declaração apenas é suficiente para eliminar o foco da desavença. Nem sempre, portanto, o processo civil está predisposto a providências executivas. Há acertamentos condenatórios, mas há também os não condenatórios, que se desenvolvem em torno de pretensões constitutivas ou apenas declaratórias.
Uma vez, porém, concluído o acertamento da controvérsia, seja por sentença de imposição de sanção, seja por sentença puramente declaratória, a coisa julgada se estabelece com a mesma função, ou seja, a certeza jurídica em torno da relação controvertida se implanta com plenitude, vinculando as partes e o juiz.
Essa situação jurídica cristalizada pela coisa julgada caracteriza-se por dois aspectos fundamentais: de um lado, vincula definitivamente as partes; de outro, impede, partes e juiz, de restabelecer a mesma controvérsia não só no processo encerrado, como em qualquer outro.
Admite-se, dessa maneira, uma
função negativa
e uma
função positiva
para a coisa julgada. Pela função negativa exaure ela a
ação exercida
, excluindo a possibilidade de sua
reproposição
. Pela função positiva, “impõe às partes obediência ao julgado como norma
indiscutível
de disciplina das relações extrajudiciais entre elas e obriga a autoridade judiciária a ajustar-se a ela, nos pronunciamento que a pressuponham e que a ela se devem coordenar
” (
apud
NEVES, Celso.
Coisa Julgada Civil.
São Paulo: RT, 1971, p. 383-383).
A coisa julgada, por sua força vinculativa e impeditiva, não permite que partes e juiz escapem da definitiva sujeição aos efeitos do acertamento consumado no processo de conhecimento. O resultado prático é caber a qualquer dos litigantes “a
exceptio rei iudicatae,
para excluir novo debate sobre a relação jurídica decidida” (
apud
NEVES, Celso. Op. Cit, p. 489), e ao juiz o poder de, até mesmo de ofício, extinguir o processo sem julgamento do mérito, sempre que encontrar configurada a ofensa à coisa julgada (ar. 267, V e § 3º).
Portanto, quando o art. 467 fala em
indiscutibilidade
e
imutabilidade
da sentença transitada em julgado refere-se a duas coisas distintas: a) pela
imutabilidade
, as partes estão proibidas de propor ação idêntica àquela em que se estabeleceu a coisa julgada; b) pela
indiscutibilidade
, o juiz é que em novo processo, no qual se tenha de tomar a situação jurídica definida anteriormente pela coisa julgada como razão de decidir, não poderá reexaminá-la ou rejulgá-la; terá de tomá-la simplesmente como
premissa
indiscutível. No primeiro caso atua a força
proibitiva
(ou negativa) da coisa julgada, e, no segundo, sua força
normativa
(ou positiva)
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Curso de Direito Processual Civil:
Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 587-588).
Nesse mesmo sentido, leiam-se também os seguintes julgados: RE 444.816, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 29-5-2012, Primeira Turma, DJE de 27-8-2012; RE 594.350, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 25-5-2010, DJE de 11-6-2010.
Segundo o conhecido art. 502, CPC/15,
"
Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso
.
" O art. 503, do mesmo código, preconiza que
"A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida."
Merece ênfase, ademais, o art. 508, CPC:
"Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero são precisos quando enfatizam que
"A coisa julgada pressuposto do discurso jurídico - constitui uma regra sobre o discurso. Não admite, nesse sentido, ponderação. Representa evidente agressão ao Estado Constitucional e ao próprio discurso jurídico a tentativa de relativizar a coisa julgada."
(MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.
Código de processo cvil.
6. ed. rev. atual. São Paulo: RT, 2014, p. 449).
Desse modo, a sentença transitada em julgado não pode ser alterada ou desconsiderada pelo Juízo, conforme lógica do art. 508, CPC/15. Tal alteração apenas seria admissível em casos de negócio processual, avençado entre as partes, versando sobre pretensões disponíveis, conforme art. 190, CPC/15. Também seria cabível em hipótese de ação rescisória, interposta perante o Tribunal competente e com atenção ao prazo do art. 975, CPC/15; em caso de
querela nullitatis insanabilis
ou de declaração, pela Suprema Corte, da inconstitucionalidade de norma tomada como fundamento para prolação da sentença (art. 535, §4º, CPC).
Aludidas exceções não se aplicam ao caso vertente. De toda sorte, não diviso sinais de que esta demanda seja reiteração de alguma outra porventura já julgada, com sentença transitada em julgado
.
2.7. Eventual litispendência:
De alguma forma, o tema do
ne bis in idem
tem origem no âmbito do direito sancionador, dado que ninguém pode ser sancionado duplamente por uma mesma infração administrativa ou penal
. Essa vedação decorre da própria cláusula do devido processo, tanto na vertente substantiva quanto procedimental. Daí que ninguém pode responder a simultâneos processos administrativos versando sobre a mesma suspeita/imputação, tampouco podendo responder a distintos processo penais com lastro na mesma arguição.
Esse é o conteúdo da cláusula do
double jeopardy,
assegurada pela 5ª e pela 14ª Emendas da Constituição dos EUA (aplicadas aos Estados-membros a partir do caso
Benton v. Maryland - 1969,
Suprema Corte). No âmbito da
Civil Law
isso se traduz na cláusula do
ne bis in idem,
assegurado expressamente pelo art. 8º do Pacto de San José da Costa Rica e em inúmeros outros tratados internacionais. No caso alemão, essa vedação está expressa no art. 103 da Lei Fundamental (
Doppelverwertungsverbot -
proibição de dupla valoração do mesmo fato:
"
Ninguém pode ser punido mais de uma vez pelo mesmo fato, com base no direito penal comum
",
em tradução livre).
Apesar de se tratar de garantia antiga - há quem alegue que o
ne bis in idem
teria origem sob o governo de Henrique II, na Inglaterra (por volta de 1100 D.C, conforme RUDSTEIN, David S.
Double
jeopardy:
a reference guide to the United States Constitution. Westport: Praeger, 2004, p. 4-8), há várias discussões a respeito do seu alcance. Anote-se, por exemplo, que García de Enterría sustentava que o
ne
bis
in idem
impediria a cumulação de sanções penais e administrativas diante de uma mesma imputação, por força da redação do art. 25 da Constituição da Espanha (veja-se AISA, Estrella Escuchuri.
Teoría del concurso de leyes y de delitos:
bases para una revisión crítica. Granada: Comares, 2004, p. 123). Mas, essa opinião não ganhou maiores adeptos.
O fato é que o
bis in idem
ocorre quando alguém é sancionado mais de uma vez pela mesma imputação. Daí que deve se tratar da mesma conduta e também da punição ao mesmo título, dado que é cabível - no território nacional - que alguém responda a uma sanção pela infração tributária e também responda por eventual crime previsto na lei 8.137/1990. Em outras palavras, um determinado comportamento pode configurar, a um só tempo, infração a cláusulas contratuais - dando ensejo à aplicação de cláusulas penais -; ilícito administrativo; ilícito tributário e ilícito penal, contanto que haja efetiva diferença entre os escopos sancionatórios de cada uma dessas imputações.
No caso, nesse primeiro e precário exame, não diviso sinais de litispendência, o que pressupõe - conforme
art. 337, §2, CPC/15
- identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. No presente processo, a aludida exceção não foi suscitada pelas partes e não constato o cogitado
bis in idem
, no que tange ao exame de ofício.
Aludido requisito de identidade de partes nas demandas é esmaecido, e fato, quando em causa processos coletivos, na medida em que o(a) autor(a) pode então deduzir pretensão em nome de coletividades.
Quando em causa ações coletivas
, o que não é a hipótese em exame, é salutar ter em conta
"que a aferição da litispendência na tutela coletiva deve ser regida não pela análise de quem formalmente se apresenta como autor das diversas demandas, mas, sim, pela qualificação jurídica de tal legitimação. Vale dizer, indagando-se a que título estão as diferentes entidades autoras em juízo, deduzindo idênticas pretensões de tutela de direitos meta-individuais (mesmos pedidos e causas de pedir), quando, então, será possível afirmar serem idênticas as demandas coletivas.
Deste modo, em virtude da especialidade do modelo processual coletivo, e, notadamete da qualificação da legitimação ativa empregaada, revela-se equivocada a afirmação de inexistência de litispendência entre ações coletivas através das quais sejam deduzidas idênticas pretensões, pelo tão-só fato de terem sido propostas por entidades diferentes
."
(VENTURI, Elton.
Processo civil coletivo:
a tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 331).
No caso em exame, não há sinais de litispendência.
2.8. Eventual suspensão do processo:
Não diviso a presença dos requisitos que ensejariam eventual suspensão do processo, nesta etapa da causa, por conta de alguma questão prejudicial - art. 313, Código de Processo Civil/15: "
Suspende-se o processo: (...) V -
quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente
; b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo. (...) § 4 O prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso V e 6 (seis) meses naquela prevista no inciso II. §5 O juiz determinará o prosseguimento do processo assim que esgotados os prazos previstos no §4."
A respeito dos aludidos preceitos, convém registrar aqui a análise detida promovida por Araken de Assis:
"Prejudicial externa civil – A hipótese mais frisante de suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa homogênea é a prevista no art. 313, V, a, do NCPC.
Toda vez que o julgamento do mérito “depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente”, o juiz suspenderá o processo
. Derivações dessa regra avultam na possibilidade de o relator suspender os processos que dependam do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade (art. 21 da Lei 9.868/1999) e da arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 5.º, § 3.º, da Lei 9.882/1999) – não, porém, a suspensão em decorrência do incidente de resolução das demandas repetitivas ou do julgamento do recurso extraordinário e do recurso especial repetitivos: a questão aí julgada é principal. O art. 313, V, a, trata da suspensão por causa prejudicial, que é a aptidão da prejudicial em tornar-se objeto litigioso em outro processo.
Fica evidente da redação da norma que a prejudicial é externa, porque há de consistir em “objeto principal de outro processo”. Não importa a circunstância de a questão prejudicial consistir no objeto originário do outro processo (v.g., A postula a invalidade do contrato firmado com B, mas B pleiteia o cumprimento da prestação devida por A) ou decorrer do alargamento desse objeto, por força de declaração incidente (v.g. B pleiteou de A, no primeiro processo, o principal da dívida, mas A reagiu pleiteando a declaração incidente da validade do contrato; no segundo processo, B pleiteia de A os juros da dívida). Importa a resolução da questão comum no outro processo, com autoridade de coisa julgada. E, nesse caso, o vínculo produzido na causa subordinante estender-se-á à causa subordinada ou, vencido o prazo máximo de suspensão – hipótese mais do que provável, vez que o interregno de um ano (art. 313, § 4.º) é muito curto, pressupondo-se elastério mais dilatado para o julgamento, por forçada ordem cronológica do art. 12, e o trânsito em julgado –, sobre a deliberação incidental na causa subordinada não recairá a coisa julgada (art. 503, § 1.º, III, in fine). Realmente, a questão comum não constitui o objeto principal da causa condicionada. Do contrário, configurar-se-ia um dos efeitos da litispendência, a proibição de renovação de causa idêntica. Cumprirá ao juiz julgá-la vencido o prazo hábil de espera, incidentalmente, apesar dos esforços de concatenação empreendidos pelo expediente da suspensão.
O exemplo ministrado, em que uma das partes pleiteia a decretação da invalidade do contrato e a outra reclama a prestação, releva que tampouco importa a diversidade da força da ação (declarativa, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental) e a espécie de procedimento. A pretensão de A contra B para decretar a invalidade do contrato tem força constitutiva negativa, a de B contra A para realizar a prestação tem força condenatória. Nada obstante, o primeiro processo funciona como causa prejudicial relativamente à pretensão deduzida no segundo: decretada a invalidade do contrato naquele, fica predeterminado o desfecho deste (improcedência). Evidentemente, havendo a possibilidade de reunir os processos no mesmo juízo (retro, 305), para julgamento simultâneo, por força da conexão (retro, 303), inexiste a necessidade de suspender a causa condicionada, porque os processos conexos serão julgados simultaneamente (art. 55, § 1.º).
O objetivo da suspensão prevista no art. 313, V, a, consiste em evitar a emissão de provimentos conflitantes, logicamente incompatíveis, a respeito da questão prejudicial. Por esse motivo, causa prejudicial envolvendo partes distintas raramente constitui razão bastante para suspender outro processo, por mais relevante que seja a questão comum controvertida em ambos, ressalva feita às hipóteses de o julgamento da causa subordinante produzir efeitos erga omnes, como acontece na ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, § 2.º, da CF/1988). Aliás, essa é uma característica – a falta de identidade de partes – da prejudicial de constitucionalidade, objeto do controle concentrado, todavia alheio à incidência do art. 313, V, a. Em outras palavras, o juiz da causa condicionada não suspenderá o processo em que se controverta norma objeto de controle concentrado de constitucionalidade
. Em tal hipótese, ou o STF concedeu liminar, suspendendo a vigência da norma, e o juiz não poderá aplicá-la; ou não concedeu, e o juiz haverá de aplicá-la no julgamento do mérito, ou não, exercendo o controle difuso. A superveniência do julgamento do STF, pronunciando a inconstitucionalidade, será recepcionado no julgamento do mérito ou, havendo ocorrido o trânsito em julgado, a sentença se tornará inexequível, nas condições do art. 525, § 1.º, III, c/c § 12.
No tocante ao estágio do processo subordinado, a suspensão poderá ocorrer no primeiro e no segundo graus; em particular, “o fato de já ter sido proferida sentença no processo prejudicado não afasta, portanto, a possibilidade de sua suspensão”. Conforme deflui da cláusula final do art. 313, V, a, que alude a “outro processo pendente”, tampouco o estágio do processo subordinante se mostra relevante à suspensão, bastando que subsistam os efeitos da litispendência. Encontrando-se a causa prejudicial no tribunal, por força de apelação, admite-se a suspensão, hipótese em que, presumivelmente, o desfecho ocorrerá dentro do prazo de suspensão
.
Era particularmente difícil a interpretação da regra particular do direito anterior, declarando haver suspensão do processo que “tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente” (art. 265, IV, c, do CPC de 1973). A esse propósito, havia dois termos de alternativa: ou se cuidava de prejudicial externa, caracterizada pelo fato se tratar de questão de estado (v.g., na ação de divórcio, a validade do casamento), hipótese em que incorreria a lei em indesejável redundância; ou se tratava de prejudicial interna, caso em que ocorreria colisão com o sistema da declaração incidente, e, pior, nenhuma justificativa plausível para suspender o processo, pois o juiz da causa resolverá conjuntamente a questão prejudicial, e, conforme o teor da resolução, passando ou não à análise da questão prejudicada. Essa situação constitui simples subespécie da regra geral do art. 313, V, a, do NCPC. É digno de nota a possibilidade de o juízo não exibir competência em razão da matéria para julgar questões de estado em caráter principalmente, hipótese em que a resolução incidental porventura tomada não se revestirá de auctoritas rei iudicate, nos termos do art. 503, § 1.º, III." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume II. Tomo II. Parte geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT. 2015. p. 809 e ss.)
No caso em apreço, não diviso a presença de causas ensejadoras da suspensão desta demanda, a exemplo de cogitada necessidade de se aguardar a evolução de algum outro processo
. Tampouco foi determinada a suspensão em alguma demandada suscetível de produzir tal efeito, a exemplo do disposto no art. 982, do Código de Processo Civil/2015. Ressalvo eventual novo exame do tema, caso a tanto instado.
2.9
. Legitimidade das partes - considerações gerais:
É sabido que, em alguma medida, as questões alusivas à pertinência subjetiva tangenciam o próprio mérito da causa. Nosso sistema ainda se vincula à concepção eclética de Túlio Liebmann - quem distinguia entre pressupostos processuais, condições para o válido exercício do direito de ação e, por fim, as questões de mérito.
O problema é que, no mais das vezes, os temas próprios ao mérito (procedência/improcedência da pretensão) e os temas próprios às condições da ação (legitimidade/ilegitimidade, possibilidade do pedido) não podem ser distinguidos de uma forma absolutamente clara. Como se infere do seu 'Tratado das ações', Pontes de Miranda promovia uma distinção entre (a) ação em sentido material - como uma espécie de projeção do direito subjetivo - ainda vinculada à concepção imanentista do direito civil antigo e (b) ação em sentido processual.
Com base nessa diferenciação pontiana, é que o desembargador gaúcho Adroaldo Furtado Fabrício tem criticado a teoria eclética, ao enfatizar que as 'condições da ação' também tratam, no geral, do mérito da causa (saber se a parte é legítima é, de certa forma, um exame conexo ao mérito: saber se ela poderia ser demandada, se teria a obrigação de indenizar etc).
Confira-se com Adroaldo Furtado Fabrício. Extinção do Processo e Mérito da Causa, in OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de (org).
Saneamento do processo:
Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1990, p. 33.
De todo modo, em sentido pontualmente distinto, e por conta dos dispositivos do Código de Processo Civil em vigor, atente-se para a lição de Araken de Assis:
"
A legitimidade não condiciona a ação, como quer a opinião há pouco exposta, haja vista um motivo trivial: a sua falta jamais impedirá a formação do processo
. A pessoa que toma a iniciativa de provocar o órgão judiciário, seja quem for, cria a relação processual, embora fadada a perecer através de juízo de admissibilidade negativo – item que constitui pressuposto lógico e cronológico do exame do mérito.
Legitimidade é, descansando no direito material, problema distinto do juízo acerca do caráter fundado ou infundado da pretensão deduzida contra o réu
. A demanda movida por alguém sem legitimidade é inadmissível, e, não, infundada. Sentença terminativa desse teor limita-se a repelir, a partir dos dados ministrados pelo direito material, sempre
in status assertionis,
a habilitação da parte para conduzir o processo, relativamente ao objeto litigioso alegado. Aos esquemas abstratos, traçados na lei, gerando tal capacidade, chamam-se de situações legitimadoras. Portanto, a dissociação entre o sujeito da lide e o do processo evidencia a verdadeira natureza da legitimidade e a situa no lugar próprio no conjunto das questões submetidas à apreciação do órgão judicial. É um pressuposto processual preenchido mediante a simples enunciação do autor. Ninguém se atreverá a reputar respeitante ao mérito eventual juízo quanto à inexistência, em determinado caso concreto, do título legal para alguém pleitear em juízo direito alheio. . Descontada a errônea concepção que ilegitimidade do autor obsta à formação do processo, o art. 485, VI, houve-se com acerto ao situar o problema fora do mérito."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. SP: RT. 2015. p. 178).
Em outras palavras, deve-se aferir a pertinência subjetiva dos contendores, tendo-se em conta a causa de pedir detalhada na peça inicial.
2.10. Legitimidade das partes - caso em exame:
Atentando para o art. 17, CPC, anoto que a parte autora está legitimada para a causa, dado que, segundo narrou na peça inicial, os seu benefício previdenciário estaria sendo alvo de descontos indevidos. Ela deduziu pretensão nome próprio, na defesa de interesse próprio, não esbarrando na vedação do art. 18, CPC/15.
Por seu turno, o INSS possui legitimidade para responder à pretensão indenizatória, fundada em alegados vícios em consignação de pagamentos, no âmbito de prestações previdenciárias. Segundo a peça inicial, a autarquia teria sido descuidada ao promover aludidos descontos mensais, mediante averbação de contrato que a autora disse não ter celebrado.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. INTERESSE DE AGIR. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO.
O INSS é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda em que os segurados buscam desconstituir contrato de compra e venda de produto que deu origem a descontos nos benefícios previdenciários por meio de consignação em folha de pagamento. Precedentes
. O esgotamento da via administrativa não constitui requisito essencial ao ajuizamento de ação judicial, cujo acesso se dá ao jurisdicionado, nos termos do art. 5º, XXXV, da Carta Magna. Comprovado o evento danoso e o nexo causal, o INSS responde, juntamente com a instituição financeira, pelos descontos indevidos em benefício previdenciário causados por empréstimos consignados fraudulentos. Cabível indenização por danos morais à autora que teve seu benefício previdenciário reduzido em decorrência de fraude praticada por terceiro no âmbito de operações bancárias. (TRF4, AC 5014498-92.2014.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 26/07/2019).
Acrescento que o Banco figura como demandado no presente processo, dada a alegação - formulada pelo autor na peça inicial - de que referida instituição financeira teria sido destinatária dos desbastes, no benefício previdenciário, impugnados nesta causa. Saber se a pretensão procede no que toca à mencionada instituição financeira é questão a ser aferida com exame de mérito.
2.11. Litisconsórcio
necessário - considerações
gerais:
O litisconsórcio previsto inicialmente no art. 47, CPC/1973 e atualmente no
art. 114, CPC/2015
, decorre da lógica do
inauditus damnare potest,
imposto pelo art. 5º, LIV e LV, CF. A sentença apenas faz coisa julgada entre as partes, conforme art. 506, CPC/15, exceção feita à regra do art. 109. Código de Processo Civil/2015.
Ora, justamente por força da necessidade de que as decisões judiciais sejam consistentes, é que o Código de Processo civil obriga o demandante, em determinados casos, a orientar a sua pretensão contra todas as pessoas intimamente vinculadas a determinado evento (causa de pedir). Busca-se, com isso, inibir soluções judiciais contraditórias, ao mesmo tempo em que também se otimiza a prestação jurisdicional e se assegura o postulado
nemo inauditus damnare potest.
Reporto-me à lição de Luís Marinoni e Sérgio Arenhart:
"Em princípio, a determinação da formação do litisconsórcio necessário vem estipulada no caput do art. 47, CPC, que afirma que há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. Portanto, da leitura desse artigo tem-se que duas causas podem gerar o litisconsórcio necessário; a lei ou a natureza da relação jurídica.
E, somando-se a isso, para a caracterização da necessidade da formação do litisconsórcio, será necessário que essas causas exijam que o juiz julgue o litígio de maneira uniforme para todas as partes (rectius, litisconsortes). Note-se, porém, que a redação do dispositivo é bastante defeituosa, podendo levar à conclusão de que as figuras do litisconsórcio necessário e unitário identificam-se, ou melhor, que o litisconsórcio unitário deve ser necessário e que o litisconsórcio necessário deve ser unitário
.
Nem sempre, porém, assim será. Imagine-se a hipótese em que a lei obriga, por qualquer causa, a formação de determinado litisconsórcio, ainda que a questão não precise, necessariamente, ser resolvida de maneira idêntica para todos os litisconsortes. Pense-se na hipótese da ação popular, em que a lei determina que devam ser citados para a ação todos aqueles que direta ou indiretamente tenham contribuído, por ação ou omissão, para a edição do ato inquinado como ilegal (art. 6º da lei 4.717/1965 - lei de ação popular), bem como seus beneficiários diretos. Ninguém duvida que esse é um litisconsórcio simples, não exigindo solução idêntica perante todos os litisconsortes. Não obstante isso, a lei impõe a formação de litisconsórcio. Seria, por acaso, indevida essa exigência do litisconsórcio? Poderia alguém questionar a exigibilidade desse litisconsórcio? Não parece que a resposta possa ser positiva. Em verdade, a exigência da formação do litisconsórcio, no caso, em que a lei o exija, independe do caráter unitário ou não da figura. Impõe simplesmente porque a lei o quer.
Somente na outra hipótese, em que a formação do litisconsórcio decorre da natureza da relação jurídica, é que efetivamente tem algum interesse a questão da unitariedade ou não da figura
. Aqui, sim, é possível que, diante da necessidade de que a solução da causa seja idêntica para várias pessoas, imponha-se o litisconsórcio ainda que a lei não o determine. E, como já visto, a unitariedade do litisconsórcio decorre não apenas do fato de que a sentença deve decidir a questão de forma uniforme para todos os litisconsortes, mas, sobretudo, da ideia de que essa imposição decorra da unitariedade da relação jurídica material deduzida em juízo. Vale dizer: no litisconsórcio unitário, exige uma relação jurídica material (cuja afirmação é o objeto da demanda) que possui vários sujeitos em um dos pólos. Pense-se no caso de um imóvel que possua vários coproprietários. Ou no negócio jurídico celebrado por marido e mulher com terceiro. Ou ainda em um ato administrativo (por exemplo, uma portaria) complexo, que é emitido por mais de uma entidade. Nesses casos, a relação jurídica material realizada possui, em pelo menos um dos seus pólos, mais de um sujeito. E é precisamente essa pluralidade subjetiva em um dos pólos da relação jurídica material deduzida em juízo que determina, na forma do que prevê o art. 47, CPC (natureza da relação jurídica), o litisconsórcio necessário." (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.
Processo
de conhecimento.
7. ed. São Paulo: RT, 2008, p. 173-174)
Atente-se também para a análise de Marcelo Abelha Rodrigues:
"A necessidade deste tipo de litisconsórcio, prevista no art. 47, CPC, decorre ou por força de lei, ou por natureza da relação jurídica. Será por força de lei no caso, por exemplo, do art. 6º da LAP, ou ainda no caso do art. 942, II, CPC.
Estaremos diante da segunda hipótese quando se cuidar de ação anulatória proposta contra todos os contratantes. Não se pode ser contra apenas um deles, pois a natureza da relação jurídica requer que possuam a mesma decisão. Outro exemplo, por força da lei, é o previsto no art. 10, §2º, CPC
."
(RODRIGUES, Marcelo Abelha.
Elementos de direito processual civil.
vol. 1. 2. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 296)
O litisconsórcio pode ser necessário ou facultativo, no que toca à obrigatoriedade da sua formação. Também pode ser unitário ou simples, quanto à solução a ser dispensada às partes. O litisconsórcio é facultativo quando determinadas pessoas aquiescem em litigar juntas contra um mesmo demandado; ou quando o autor endereça, a um só tempo, pretensões contra várias pessoas, desde sejam todas legítimas a figurar na causa (art. 17, CPC/15). A respeito do litisconsórcio necessário, atente-se para o seguinte:
"
A obrigatoriedade da formação do litisconsórcio pode ser dada pela lei ou pela relação jurídica. São exemplos de litisconsórcio necessário por disposição de lei: a) CPC 246 §3º, que manda citar os confinantes nas ações de usucapião de imóvel; b) LAP 6º, que manda citar o funcionário que autorizou a prática do ato impugnado, bem como a pessoa jurídica de direito público ou privado a que ele pertence
; c) CPC, art. 76 §1º II, que manda citar ambos os cônjuges em ação na qual se discutam fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou atos praticados por eles (v.g., fiança - CC 1647 III) São exemplos de litisconsórcio necessário por força da relação jurídica: a) todos os partícipes de um contrato, para a ação anulatória do mesmo contrato, porque a sentença que decidir a lide não poderá anular o contrato para um dos contratantes e declará-lo válido para os demais que eventualmente não estivessem no processo como partes. Não sendo obrigatória a formação do litisconsórcio, este se caracteriza como facultativo, cujos casos mais comuns estão enumerados no CPC 113." (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade.
Comentários ao código de
processo
civil.
1ª. ed. SP: RT, 2015)
2.12. Litisconsórcio - caso em exame:
No presente caso, não diviso um contexto de litisconsórcio necessário, a ensejar que a parte autora enderece sua pretensão em face de quem ainda não figure como litigante, de modo a convocá-lo para a demanda. Eventual acolhimento da pretensão da parte autora não atingirá diretamente a esfera de terceiros, o que registro para os fins do art. 506, CPC.
2.13. Possibilidade jurídica do pedido:
A respeito da impossibilidade jurídica, convém atentar para a lição de Marcelo Abelha Rodrigues:
"Presente no nosso ordenamento jurídico explicitamente no art. 295, III, e implicitamente quando este adotou o conceito abstrato de ação, a possibilidade jurídica do pedido diz respeito à previsão
in abstracto
daquilo que se pede, dentro do ordenamento jurídico.
A possibilidade jurídica do pedido é instituto processual, e significa que ninguém pode ajuizar uma ação sem que peça uma providência que esteja, em tese (abstratamente) prevista no ordenamento jurídico material (no direito alemão é usado o termo viabilidade, donde se abstrai o mesmo significado). Veja o exemplo: 'A' pede o despejo de 'B' por falta de pagamento
.
Basta ao juiz a análise superficial e ver se tal situação é prevista (despejo por falta de pagamento) no nosso ordenamento jurídico, sem adentrar contudo em considerações fático-jurídicas do problema. Veja que ele não vai dizer, naquele momento, se 'B' vai ser despejado, mas apenas se existe no nosso ordenamento jurídico a hipótese invocada.
Por isso mesmo é que esta condição é prejudicial das demais, ou seja, deve ser a primeira a ser analisada, à luz da logicidade e do princípio da economia processual.
Dizer que um pedido é juridicamente possível significa que o ordenamento não o proíbe expressamente
. Destarte, o vocábulo 'pedido', que faz parte da referida condição da ação, está disposto na sua acepção mais ampla, ou seja, não somente em seu sentido estrito de mérito, mas também conjugado com a causa de pedir.
Afinal, é lapidar a conceituação de Arruda Alvim: 'Verificação se o pedido é, abstrata ou idealmente, contemplado pelo ordenamento, senão vedado pelo mesmo.' Também é essencial a colocação feita por Nery, quando lembra que o termo 'pedido' (que integra a expressão 'possibilidade jurídica do...'), tem de ser entendido na sua acepção mais lata, ou seja, conjugado com a causa de pedir. Assim, embora o pedido de cobrança, estritamente considerado, seja admissível pela lei brasileira, não o será se tiver como causa petendi dívida de jogo (art. 1.477, caput, Código Civil)." (RODRIGUES, Marcelo
Abelha
.
Elementos de direito processual civil.
vol. 1. 2. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 183-184)
Na espécie, a pretensão do requerente não esbarra na mencionada condição para válido exercício do direito de ação. Não há norma juridicamente válida que a impeça de deduzir em juízo a pretensão sob exame. Saber se tal pretensão merece acolhida é tema pertinente ao mérito.
2.14. Interesse processual - considerações gerais:
Por imposição constitucional, o Poder Judiciário está obrigado a apreciar a alegação de que haja lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV, CF), mecanismo indispensável para que haja efetivo império da lei, ao invés da prevalência dos poderes hegemônicos de ocasião. A prestação jurisdicional não se destina, todavia, a emitir meros pareceres ou cartas de intenções.
O ingresso em juízo deve estar fundado, tanto por isso, em uma situação de efetiva necessidade, de modo que o pedido - caso venha a ser acolhido - se traduza em uma utilidade para o demandante. O meio processual eleito deve ser adequado para tanto. Daí que os processualistas tratem do interesse processual em uma
troika:
a necessidade, a utilidade e a adequação. Por fim, o interesse processual deve persistir no curso da demanda, nos termos do art. 17 e art. 85, §10, CPC/15.
Ora,
"Mediante a força declaratória, a aspiração do autor consiste na extirpação da incerteza. Deseja tornar indiscutível, no presente e no futuro, graças à autoridade da coisa julgada, a existência ou a inexistência de relação jurídica, a autenticidade ou a falsidade de documento. É o que dispõe, fortemente inspirado no direito germânico e reproduzindo a regra anterior, o art. 19 do NCPC. Também comporta declaração a exegese de cláusula contratual (Súmula do STJ, n.º 181), ou seja, o modo de ser de uma relação jurídica. Na ação declarativa, ignora-se outra eficácia relevante que a de coisa julgada material. Neste sentido, a pretensão à declaração representa fonte autônoma de um bem valiosíssimo na vida social: a certeza. O autor que só pleiteia declaração ao juiz, e obtém êxito, dar-se-á por satisfeito, e cabalmente, desde o curso em julgado da sentença. Então apropria-se do que pedira ao órgão judicial – certeza –, carecendo a regra jurídica emitida de qualquer atividade complementar em juízo. Focalizando o ponto com preciosa exatidão, diz-se que a sentença declaratória é instrumento autossuficiente de
tutela
jurisdicional, pois assegura, de maneira plena e completa, a efetividade da situação jurídica substancial deduzida em juízo."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume I. Parte geral: fundamentos e distribuição de conflitos. São Paulo: RT. 2015. p. 675).
Ainda segundo Araken de Assis,
"
O provimento declaratório tem nítido caráter prescritivo. A parte adquire o direito incontestável de comportar-se em consonância ao comando sentencial, e, principalmente, não é dado àqueles que se vincularam à declaração impedi-la
. A finalidade da ação declaratória da inteligência e do alcance de cláusula contratual é a de prescrever aos parceiros do negócio, sucessivamente, determinada pauta de conduta, independentemente de execução alguma, de que não se cogita e de que não se pode cogitar."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 676).
Dado que o Poder Judiciário não é consultor jurídico das partes, impõe-se que haja uma situação de incerteza jurídica a justificar o ingresso com a ação declaratória:
"Impende recordar que a certeza implicará a vinculação futura das partes. O provimento exibirá caráter prescritivo para o futuro. O ato judicial legitima a prática (ou a abstenção) de atos jurídicos “ao abrigo e em conformidade com o conteúdo da sentença. Em geral, a antevisão desse problema provoca o nascimento do interesse. Por assim dizer, o provimento declarativo tem os pés no passado, mas olhar no futuro. É preciso aceitar com reservas, portanto, o julgado da 4.ª Turma do STJ, que assentou: Não é detentor de interesse processual justificador da pretensão declarativa quem não está exposto à possibilidade de dano imediato e concreto. Ora, imediato é o interesse, pois o dano, em sentido amplíssimo, pode ser futuro. Por exemplo, não cabe declarar a inteligência da cláusula contratual em tese; o autor necessitará expor a dificuldade na interpretação da cláusula, os reflexos que este ou aquele entendimento provocará no programa contratual."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 661).
2.15. Interesse processual - caso em exame:
No que toca a esse exame de ofício, conforme art. 485, §3, CPC -, a autora atendeu aludidos requisitos. Eventual acolhimento da pretensão lhe será útil; a medida revela-se necessária para a otimização do processo administrativo de titulação; por fim, o processo em causa é adequado ao fim visado. Logo, o art. 17, CPC, restou satisfeito. Não há maiores sinais de que a pretensão do requerente seria satisfeita no âmbito administrativo.
Ademais, o exaurimento do debate, no âmbito administrativo, não é condição para a deflagração de demandas como a presente, em juízo. O requerente insurge-se justamente contra a demora no procedimento de titulação, de modo que não se pode condicionar a deflagração desse processo ao aguardo da solução da causa no âmbito extrajudicial.
2.16. Valor da causa - considerações gerais:
A toda causa deve ser atribuído algum valor econômico, por força do art. 291, CPC/2015 - projeção do art. 258, CPC/73 -, pois se cuida da base de cálculo da taxa judiciária. Referido valor pode influenciar, em muitos casos, a determinação da competência das unidades judiciais ou o procedimento aplicável, também surtindo reflexos sobre a definição de encargos sucumbenciais.
Trata-se, tanto por isso, de requisito para que a petição inicial seja válida - art. 319, CPC. Como explicita Araken de Assis,
"às vezes, na oportunidade da respectiva fixação (infra, 1.290),
o conteúdo econômico real e imediato da pretensão mostra-se inestimável, ou seja, não pode ser quantificado precisamente. Tal circunstância não constitui motivo bastante para eliminar o ônus atribuído ao autor nos arts. 319, V, e 292, caput
. É apenas causa de estimação voluntária do autor, pois o art. 291 dispõe expressamente que a toda causa será atribuído valor certo. Nada obstante, a indicação aproximar-se-á, tanto quanto possível, do conteúdo econômico mediato da pretensão. Não há incompatibilidade daquelas regras com a do art. 85, § 8.º. aludindo a causas de valor inestimável. Entende-se por tal as causas desprovidas de conteúdo econômico imediato, como é o caso da ação declaratória, e, por esse motivo, sujeitas à estimação do autor."
(ASSIS, Araken.
Processo
civil brasileiro.
Volume II - Tomo I: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 1695)
Convém atentar, tanto por isso, para o art. 292, CPC/15:
"O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação; II -
na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida
; III - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais pedidas pelo autor; IV - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor de avaliação da área ou do bem objeto do pedido; V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; VI - na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor; VIII - na ação em que houver pedido subsidiário, o valor do pedido principal. § 1º
Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, considerar-se-á o valor de umas e outras. § 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à soma das prestações
. § 3º O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
Menciono novamente a análise promovida por Araken de Assis:
"
É exemplificativa a enumeração dos acessórios. Os juros compensatórios, por exemplo, dificilmente se quadram na figura de penalidade. A correção monetária integra o valor originário do crédito e, nesse aspecto, sua menção no art. 292, corrige o direito anterior
. Ressalva feita aos juros moratórios e à correção monetária, verbas implicitamente incluídas no pedido respeitante ao principal (art. 322, § 1.º), e, nada obstante, integrantes do valor da causa, quaisquer outras verbas devem ser objeto de pedido. É o caso, expressis verbis, da cláusula penal moratória ou compensatória e dos juros compensatórios. Omisso que seja o pedido, a respeito da cláusula penal (v.g., o autor quer evitar a controvérsia em torno da interpretação do contrato), tampouco conta-se o respectivo valor. Por óbvio, deixando o autor de pedir os juros moratórios, explicitamente, dificilmente realizará seu cômputo no valor da causa, ensejando a intervenção do órgão judiciário. E os juros vencidos posteriormente ao ajuizamento, automaticamente incluídos na condenação (art. 323), não entram na estimativa da causa.
O custo financeiro do processo (despesas processuais e honorários advocatícios), suportado pelo réu no caso de êxito do autor, não precisa ser computado para apurar o valor da causa. Tais verbas têm caráter eventual e decorrem da lei.
Em face do caráter imperativo do art. 292, I, mostra-se irrelevante a estimativa lançada pelo autor na petição inicial em desacordo com a regra. Prevalecerá o valor da importância reclamada no pedido.
O art. 292, I, aplica-se, por analogia, à pretensão a executar fundada em título judicial ou extrajudicial (infra, 1.292.2.2). O valor da causa é o total do crédito: o principal corrigido, os juros e os demais consectários legais ou contratuais, conforme, aliás, dispõe o art. 6.º, § 4.º, da Lei 6.830/1980. Esse valor constará na planilha aludida no art. 798, I, b, e parágrafo único
.
Também se poderia cogitar do enquadramento da pretensão a executar no art. 292, II, por que pretensão visando ao cumprimento do negócio jurídico, eventualmente consubstanciado em documento dotado de força executiva. O resultado final é idêntico, mas o art. 292, I, avantaja-se ao inciso precedente em ponto decisivo, ao impor um critério simples, direto e analítico ao valor da causa." (ARAKEN, Assis.
Obra citada.
p. 1698 e ss.)
Ora, não se pode perder de vista que o valor atribuído à causa deve corresponder, tanto quanto possível, ao conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial, como bem equaciona o art. 292, §3º, CPC/15:
"O juiz corrigirá, de
ofício e por arbitramento
, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou
ao proveito econômico perseguido pelo autor
, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
D'outro tanto, é assegurado ao requerido impugnar, em preliminar de contestação, o valor atribuído à causa pela autora (art. 293, CPC/15).
2.17. Valor da causa - situação em exame:
No caso, aludidos requisitos foram atendidos, pois a autora atribuiu à demanda montante compatível com o conteúdo da sua pretensão - obtenção do dobro do valor descontado + reparação de danos morais (valor da causa:
R$ 12.149,96
).
2.18. Gratuidade de Justiça - considerações gerais:
No que toca à gratuidade de Justiça, anoto que a Constituição da República dispôs, no seu art. 5º LXXIV, que
"
o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos
."
Essa mesma lógica eclode do art. 24, XIII e do art. 134, Constituição Federal/1988.
Ademais, a Constituição recepcionou a antiga lei 1060/1950, responsável por detalhar as hipóteses do que se convencionou chamar de justiça gratuita.
Registro que o CPC/15 manteve a vigência da norma veiculada no art. 13 da lei 1060/1950 (art. 1072, III,
a contrario senso
), ao tempo em que admitiu o deferimento parcial da gratuidade:
"- Isenção total -
Em princípio, ao litigante interessa forrar-se integralmente do custo financeiro do processo. A isenção total tem por objeto, portanto, o art. 98, §1º, I a IX, ficando suspensa a exigibilidade do dever de reembolsar as despesas suportadas pelo adversário, no todo ou em parte - a perícia requerida por ambas a partes tem seu custo repartido, a teor do art. 95, caput, e, portanto, competiria ao beneficiário reembolsar em parte o vencedor - o pagamento de honorários ao advogado do vencedor, pelo prazo de cinco anos, a teor do art. 98, §3º
.
- Isenção parcial - Mantido pelo art. 1.072, III, NCPC, o art. 13 da lei 1060/1950 subtende a concessão parcial do benefício de gratuidade. Essa possibilidade encontra-se prevista de modo mais nítido no art. 98, §5º, segundo o qual o juiz concederá gratuidade em relação a algum ou a todos os atos processuais. Pode acontecer de o litigante, conduzindo-se segundo os ditames da boa-fé (art. 5º) alegar não dispor de recursos para adiantar, v.g., os honorários do perito, sem dúvida despesa de vulto. Em tal hipótese, o órgão judiciário concederá isenção parcial, provocando a incidência, nesse caso, do art. 95, §2º.
-
Isenção remissória - O art. 98, §5º, in fine, autoriza o juiz a reduzir percentualmente as despesas processuais que incumbe à parte adiantar no curso do processo. O benefício não alivia a parte da antecipação quanto a um ato específico. Limita o benefício à parte da despesa; por exemplo, fixada a indenização da testemunha em 100, o beneficiário paga 50, ficando a parte remanescente postergada para o fim do processo. Saindo-se vencedor o beneficiário, a contraparte cumprirá o art. 492, quanto à parte isentada, e reembolsará o beneficiário da outra metade
.
- Isenção diferida - A isenção parcial do art. 13 da lei 1060/1950 inspirou duas modalidades de diferimento: (a) o pagamento ao final, embora vencido o beneficiário; (b) o pagamento parcelado da despesa, objeto de previsão no art. 98, §6º. Por exemplo a parte não dispõe da totalidade dos honorários do perito arbitrado pelo juiz e, nessa contingência, requer o pagamento em três ou mais parcelas mensais consecutivas. O pagamento ao fim do processo é mais radical. A parte aposta no sucesso, transferindo, secundum eventuam litis, todas as despesas ao adversário. E, não logrando êxito, ficará isenta pelo prazo legal (art. 98, §3º)." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. Institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, p. 535-536)
Quanto aos requisitos para a concessão, reporto-me à análise de Rafale Alexandria de Oliveira: "
Faz jus ao benefício da gratuidade de justiça aquela pessoa com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios (art. 98). Não se exige miserabilidade, nem estado de necessidade, nem tampouco se fala em renda familiar ou faturamento máximos
. É possível que uma pessoa natural, mesmo com boa renda mensal, seja merecedora do benefício, e que também o seja aquele sujeito que é proprietário de bens imóveis, mas não dispõe de liquidez. A gratuidade judiciária é um dos mecanismos de viabilização do acesso à justiça; não se pode exigir que, para ter acesso à justiça, o sujeito tenha que comprometer significativamente a sua renda, ou tenha que se desfazer de seus bens, liquidando-os para angariar recursos e custear o processo."
(OLIVEIRA, Rafael Alexandria in WAMBIER, Teresa Alvim.
Breves comentários ao novo CPC.
São Paulo: RT, 2015, p. 359)
Convém atentar, ademais, para a avaliação de Araken de Assis:
"
À concessão do benefício, nos termos postos no art. 98, caput, fundamentalmente interessa não permitir a situação econômica da parte atender às despesas do processo. É irrelevante a renda da pessoa, porque as causas podem ser vultuosas e sem recursos para ela o interessado. Igualmente, nenhum é o relevo da existência de patrimônio
. E, de fato, se mesmo tendo um bem imóvel, os rendimentos da parte não lhe são suficientes para arcar com custas e honorários sem prejuízo do sustenta, tal propriedade não é empecilho à concessão da gratuidade. Parece pouco razoável exigir que alguém se desfaça de seus bens para atender ás despesas do processo. Nada assegura, a fortiori, o retorno à situação patrimonial anterior, em virtude do desfecho vitorioso do processo. (...) Funda-se o benefício da gratuidade numa equação econômica: a noção da necessidade decorre da inexistência de recursos financeiros, apuradas entre a receita e a despes, capazes de atender o custo da demanda. Considera-se a situação atual da pessoa, mostrando-se irrelevante a sua antiga fortuna, dissipada ou perdida nos azares da vida."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. Institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, p. 549)
Note-se também que o TRF4 consolidou sua jurisprudência, enfatizando que a gratuidade de Justiça haveria de ser deferida a quem receba remuneração mensal líquida inferior ao teto de benefícios do RGPS, atualmente definido em
R$ 7.507,49
, conforme Portaria Interministerial MPS/MF Nº 26, de 10 de janeiro de 2023.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. HIPÓTESES DE CABIMENTO. COMPLEMENTAÇÃO. NECESSIDADE. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. RENDIMENTOS SUPERIORES AO TETO DOS BENEFÍCIOS DO RGPS. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. REVOGAÇÃO MANTIDA. RESULTADO DO JULGAMENTO INALTERADO. 1. São cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão ou corrigir erro material, consoante dispõe o artigo 1.022 do Código de Processo Civil. 2.
A Terceira Turma adota como critério de concessão/manutenção do benefício da gratuidade judiciária o fato de a parte auferir renda inferior ao teto dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, pois mostra-se razoável presumir a hipossuficiência nessas hipóteses. 3. Para o deferimento da mencionada benesse, devem ser apurados os rendimentos líquidos da parte interessada e considerados, para tal fim, apenas, os descontos obrigatórios/legais (tais como Importo de Renda, Contribuição Previdenciária e pensão) e, excepcionalmente, gastos com saúde (apurada a gravidade da doença no caso concreto e os gastos respectivos, ainda que não descontados em folha de pagamento)
. 4. Caso em que acolhidos, em parte, os embargos de declaração, para complementar o decisum no ponto referente à revogação do benefício da justiça gratuita, sem alteração de resultado. (TRF-4 - AC: 50021421220124047116 RS 5002142-12.2012.4.04.7116, Relator: VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 28/01/2020, TERCEIRA TURMA)
Aludido entendimento foi reiterado pelo TRF4, ao julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas nº 5036075-37.2019.4.04.0000.
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. ACESSO À JUSTIÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DISTINÇÃO. CRITÉRIOS. 1. Conforme a Constituição brasileira, "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos". 2. Assistência jurídica integral configura gênero que abarca diferentes serviços gratuitos, a cargo do poder público, voltados a assegurar a orientação, a defesa e o exercício dos direitos. 3. A consultoria jurídica gratuita é prestada pelas Defensorias Públicas quando do acolhimento dos necessitados, implicando orientação até mesmo para fins extrajudiciais e que nem sempre redunda na sua representação em juízo. 4. A assistência judiciária gratuita é representação em juízo, por advogado não remunerado, realizada pelas defensorias públicas e também advogados conveniados com o Poder Público ou designados pelo juiz pro bono. 5. A gratuidade de justiça assegura a prestação jurisdicional independentemente da realização dos pagamentos normalmente exigidos para a instauração e o processamento de uma ação judicial, envolvendo, essencialmente, custas, despesas com perícias e diligências e honorários sucumbenciais. 6. Nos termos das Leis 9.099/95, 10.259/01 e 12.153/19, o acesso à primeira instância dos Juizados de pequenas causas é gratuito, o que aproveita a todos, indistintamente. 7. O acesso à segunda instância dos juizados, às Varas Federais e aos tribunais é oneroso, de modo que depende de pagamento ou da concessão do benefício da gratuidade de justiça. 8. A Corte Especial, por ampla maioria, definiu que faz jus à gratuidade de justiça o litigante cujo rendimento mensal não ultrapasse o valor do maior benefício do Regime Geral de Previdência Social, sendo suficiente, nessa hipótese, a presunção de veracidade da declaração de insuficiência de recursos, que pode ser afastada pela parte contrária mediante elementos que demonstrem a capacidade econômica do requerente. 9. Rendimentos mensais acima do teto do Regime Geral de Previdência Social não comportam a concessão automática da gratuidade de justiça. A concessão, em tais casos, exige prova a cargo do requerente e só se justifica em face de impedimentos financeiros permanentes. A par disso, o magistrado deve dar preferência ao parcelamento ou à concessão parcial apenas para determinado ato ou mediante redução percentual. (TRF4 5036075-37.2019.4.04.0000, Corte Especial, Relator Leandro Paulsen, juntado aos autos em 07/01/2022)
D'outro tanto, o CPC/15 manteve a lógica do art. 12 da lei 1060/1950, de modo que a concessão do benefício não implica efetiva exoneração da obrigação de recolher despesas e pagar honorários sucumbenciais (incabíveis, porém, no rito do mandado de segurança), observado o prazo suspensivo previsto, agora, no art. 98, §2º, CPC/15 (05 anos).
O detalhe está no fato de que, como registrei acima, nos termos do art. 98, §5º, CPC/15,
"
A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento
."
Anote-se que a Constituição preconiza que o postulante demonstre a incapacidade para o pagamento (art. 5º, LXXIV, CF). Aliás, como bem expressa Araken de Assis,
"A dispensa de o postulante da gratuidade, cuidando-se de pessoa natural, produzir prova documental do seu estado de necessidade provocou efeito colateral de graves reflexos. Fica o respectivo adversário em situação claramente desvantajosa. É muito difícil, a mais das vezes, e na imensa maioria dos litígios civis, a parte contrária reunir prova hábil da equação entre receita e despesa que gera a figura do necessitado. Enfraqueceu-se, em suma, o controle judiciário desse dado. A concessão do benefício é automática, e, na prática, simultaneamente irreversível, por força da inutilidade dos esforços em provar o contrário."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. Institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, p. 559).
2.19. Gratuidade de justiça - eventual pedido de associação:
Quando se cuida, porém, pedido de gratuidade deduzido por pessoa jurídica, a presunção prevista no art. 99, §2º, CPC, não se aplica. Em tal caso, a entidade deve comprovar a situação de precariedade financeira.
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO. SÚMULA 316/STJ. SINDICATO. JUSTIÇA GRATUITA. ESTADO DE POBREZA. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE. PRECEDENTES DA CORTE ESPECIAL. EMBARGOS ACOLHIDOS PARA, REFORMANDO O ACÓRDÃO RECORRIDO, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. 1. "Cabem embargos de divergência contra acórdão que, em agravo regimental, decide recurso especial" (Súmula 316/STJ). 2. "
Na linha da jurisprudência da Corte Especial, as pessoas jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, para obter os benefícios da justiça gratuita, devem comprovar o estado de miserabilidade, não bastando simples declaração de pobreza"
(EREsp 1.185.828/RS, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, Corte Especial, DJe 1º/7/11). 3. Embargos de divergência acolhidos para, reformando o acórdão embargado, negar provimento ao agravo de instrumento do SINDISPREV/RS. ( EAg 1245766/RS, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Corte Especial, julgado em 16/11/2011, DJe 27/04/2012)
SINDICATO. PESSOA JURÍDICA SEM FINS LUCRATIVOS. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. NECESSIDADE DE PROVA DA MISERABILIDADE. INSUFICIÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE POBREZA. I - As pessoas jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, para obter os benefícios da justiça gratuita, devem comprovar o estado de miserabilidade, não bastando simples declaração de pobreza. Precedentes: EREsp nº 1.185.828/RS, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, CORTE ESPECIAL, DJe de 01/07/2011 e AgRg no AgRg no REsp nº 1.153.751/RS, Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 07/04/2011. II - Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 130.622/MG, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 17/04/2012, DJe 08/05/2012) -
PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA. SINDICATO. NÃO COMPROVAÇÃO DE MISERABILIDADE JURÍDICA. 1. "...as entidades sindicais possuem a função de representar os interesses coletivos da categoria ou individuais dos seus integrantes, perante as autoridades administrativas e judiciais, e em razão de terem revertidas a seus cofres as mensalidades arrecadadas de seus associados, formando fundos para o custeio de suas funções, entre as quais função de assistência judiciária. Assim, descabe a concessão da assistência judiciária gratuita, salvo se comprovada a necessidade do benefício" ( AgRg no REsp. 963.553/SC, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJU 07.03.2008 e REsp 876812 / RS, Relator (a): Ministro LUIZ FUX, Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA, DJe 01/12/2008). No mesmo sentido, vejam-se os seguintes julgados, proferidos por esta e. Corte: AC 200734000228892, Segunda Turma, Desembargador Federal Francisco De Assis Betti, e-DJF1, Data: 02/04/2009, Página: 194. 2. É firme o entendimento dos Tribunais pátrios que os sindicatos e associações fazem jus ao benefício da assistência judiciária gratuita, mediante comprovação da necessidade do benefício. 3. Na hipótese dos autos, verifica-se que pressuposto fático necessário à avaliação e acolhimento do pedido, qual seja, a miserabilidade jurídica, não foi atendido pelo apelante. 4. Apelação improvida. (AC 2008.38.00.009635-4/MG, Rel. Desembargadora Federal Ângela Catão, Primeira Turma, e-DJF1 p.46 de 18/01/2012)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS. REVISÃO GERAL ANUAL DE REMUNERAÇÃO. ART. 37, X, DA CF/88, COM A REDAÇÃO DA EC 19/98. LEI 10.697/03. VANTAGEM PECUNIÁRIA INDIVIDUAL. LEI 10.698/03. CONCESSÃO DE REAJUSTE SALARIAL PELO ÍNDICE DE 14,23%. AUSÊNCIA DE DIREITO. PRECEDENTES. JUSTIÇA GRATUITA INDEFERIDA. AGRAVO RETIDO E APELAÇÃO NÃO PROVIDOS. 1. "Somente pode ser deferido o pedido de assistência judiciária gratuita à pessoa jurídica sem fins lucrativos quando na defesa de seus próprios direitos" (TRF-1ª Região, AG 0037923-22.2005.4.01.0000/BA, Segunda Turma, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, DJ 8.7.2010), situação inocorrente na espécie, já que o Sindicato autor atua na defesa de interesse de seus filiados. "Ao sindicato, pessoa jurídica de direito privado, independentemente de ter fins lucrativos, impõe-se o ônus de comprovar a insuficiência de recursos financeiros para arcar com as custas do processo para que lhe seja deferido o benefício da assistência judiciária gratuita" (TRF-1ª Região, AGA 0075250-59.2009.4.01.0000/DF, Primeira Turma, acórdão de minha relatoria, DJ 6.7.2010), o que também não se verifica nos autos. (...) 4. Apelação a que se nega provimento. (AC 2008.38.00.033486-0/MG, Rel. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, Primeira Turma, e-DJF1 p.323 de 25/11/2011)
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSOCIAÇÃO DE CLASSE. JUSTIÇA GRATUITA. DEMONSTRAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. AUSÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO. 1.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o benefício da justiça gratuita desafia a demonstração da impossibilidade de pagar as custas e despesas do processo, mesmo quando se tratar de pessoa jurídica sem fins lucrativos na qualidade de entidade beneficente de assistência social
. 2. No caso em testilha, a associação não carreou aos autos qualquer documento hábil a demonstrar a hipossuficiência. 3. Agravo interno ao qual se nega provimento. (TRF-1 - AGTAG: 00268691020154010000, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY, Data de Julgamento: 27/04/2022, 2ª Turma, Data de Publicação: PJe 09/05/2022 PAG PJe 09/05/2022 PAG)
Assim, segundo entendimento consolidado dos Tribunais (
súmula 481, Superior Tribunal de Justiça
), quando em causa pedidos de gratuidade de justiça, deduzido por pessoa jurídica - com ou sem escopo lucrativo - a situação de precariedade econômica deve ser comprovada. Eventual condição de entidade filantrópica não exonera a entidade, segundo os Tribunais, da comprovação das dificuldades financeiras.
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS PRESTADORA DE SERVIÇOS HOSPITALARES. CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA. REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 51 DA LEI N. 10.741/2003 (ESTATUTO DO IDOSO). HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. DEMONSTRAÇÃO. DESNECESSIDADE. EXIGÊNCIA DE SE TRATAR DE ENTIDADE FILANTRÓPICA OU SEM FINS LUCRATIVOS DESTINADA À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À PESSOA IDOSA.
1. Segundo o art. 98 do CPC, cabe às pessoas jurídicas, inclusive as instituições filantrópicas ou sem fins lucrativos, demonstrar sua hipossuficiência financeira para que sejam beneficiárias da justiça gratuita. Isso porque, embora não persigam o lucro, este pode ser auferido na atividade desenvolvida pela instituição e, assim, não se justifica o afastamento do dever de arcar com os custos da atividade judiciária. 2.
Como exceção à regra, o art. 51 da Lei n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) elencou situação específica de gratuidade processual para as entidades beneficentes ou sem fins lucrativos que prestem serviço à pessoa idosa, revelando especial cuidado do legislador com a garantia da higidez financeira das referidas instituições
. 3. Assim, não havendo, no art. 51 do Estatuto do Idoso, referência à hipossuficiência financeira da entidade requerente, cabe ao intérprete verificar somente o seu caráter filantrópico e a natureza do público por ela atendido. 4. Recurso especial provido. (REsp n. 1.742.251/MG, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 23/8/2022, DJe de 31/8/2022.)
2.20. Gratuidade - pedido da parte autora:
No que toca à parte autora, a solução é distinta, porquanto a legislação veiculou uma presunção relativa, decorrente da subscrição de termo de hipossuficiência, conforme art. 99, §2, CPC.
Cabe à parte demandada infirmar aludida presunção, apresentando comprovantes de que o demandante tenha rendimentos mensais superiores ao teto dos benefícios do INSS. No caso, aludida prova não foi encartada nos autos, de modo que a autora faz jus à gratuidade de justiça
.
A medida surte reduzidos efeitos, porém, no rito dos Juizados, em primeira instância, conforme arts. 54 e 55 da lei n. 9.099/1995.
2.21. Prescrição - considerações gerais:
Registro que o
"O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo.
As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada
."
(NERY JÚNIOR, Nelson.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Daí que a prescrição é oponível às pretensões condenatórias.
Anoto, de outro tanto, que o art. 189, Código Civil, preconiza que
"
Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206
."
Isso significa que o cômputo da prescrição deve ser promovido com atenção à teoria da
actio nata.
Ou seja,
"o início do prazo prescricional se verifica com o nascimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo, momento a partir do qual a ação poderia ter sido proposta - enquanto não nascer a ação conferida para a tutela de um direito, não é dado falar em prescrição:
actioni nondum natae non prescritibur." (CAHALI, Yussef Said.
Prescrição
e decadência.
São Paulo: RT, 2008, p. 35).
Yussef Cahali menciona, ademais, a lição de Câmara Leal, para quem
"
A ação nasce, portanto, no momento em que se torna necessária para a defesa do direito violado
- é desse desse momento, em que o titular pode se utilizar da ação, que começa a correr o prazo de prescrição. Portanto, o prazo é contado da data em que a ação poderia ser proposta. O
dies a quo
da prescrição surge em simultaneidade com o direito de ação."
(CAHALI, Yussef Said. Obra cit. p. 36).
Vê-se, portanto, que a prescrição deve ser computada a partir do momento em que o cogitado titular de uma situação jurídica toma conhecimento da agressão ao seu interesse.
"(...) O cômputo do prazo prescricional quinquenal, objetivando o ingresso de ação de indenização contra conduta do Estado, previsto no artigo 1.º do Decreto 20.910/32,
começa quando o titular do direito lesionado conhece o dano e suas sequelas, segundo reza o princípio actio nata
. Precedentes: AgRg no REsp: 1369886/PE Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ de 20.05.2013; AC 0013010-49.2005.4.01.3500/GO, Rel. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, Sexta Turma, DJ de 16.05.2013." (AC 0011884-90.2007.4.01.3500 / GO, Rel. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, Sexta Turma, e-DJF1 p.137 de 15/10/2014).
"(...) Ademais, mesmo que se considerasse o prazo de 3 anos, como quer a requerida, não haveria prescrição. Pelo princípio da
actio nata
, que é adotado pelo ordenamento jurídico pátrio, a pretensão somente nasce com a violação do direito (art. 189 do Código Civil). E a pretensão da autora somente surgiu no momento em que tomou conhecimento da irregularidade cuja prática atribui à ré e que teria causado o dano cujo ressarcimento é postulado. Antes disso, não há como se exigir do lesado o exercício da sua pretensão, até porque a existência de dano é requisito da responsabilidade e, portanto, pressuposto da ação que visa à sua reparação." (AC 00053846420074047108, CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 26/05/2010.)
Com efeito, dado que o instituto tem por fundamento que o Direito não tutela quem permanece inerente na defesa dos seus interesses (
Dormientibus non sucurrit jus
), a prescrição apenas pode ser oposta a quem podia efetivamente agir. E isso pressupõe, por certo, que o atingido tenha conhecimento da agressão às suas pretensões, na forma do art. 189, Código Civil:
"O início da eficácia dos atos administrativos se assinala pela publicação, ou pelo termo que indicarem; mas os atos administrativos que afetem pessoa certa e determinada assumem eficácia ao serem por ela conhecidos por via de regular comunicação."
(NASSAR, Elody.
Prescrição
na Administração Pública.
2. ed. SP: Saraiva, 2009, p. 148).
Ainda a respeito da definição do termo inicial, atente-se para a lição de Humberto Theodoro Júnior:
"Todo prazo tem um termo inicial (a quo) e tem um termo final (ad quem), ou seja, há sempre um momento para iniciar e outro para encerrar a contagem do tempo de duração.
No caso da prescrição, o
termo a quo
é aquele em que nasce a pretensão e o termo final é aquele em que se completa o lapso temporal assinalado pela lei para o exercício da ação destinada a fazer atuar em juízo a pretensão. Há um prazo geral e vários prazos especiais, segundo o critério da lei, o que faz com que o termo final seja mais próximo ou mais longínquo para as diferentes pretensões.
Uma vez que, para haver prescrição, a inércia do titular do direito afrontado e requisito necessário, somente se pode iniciar a contagem do prazo extintivo a partir do momento em que sua atividade contra a situação injurídica se tornou possível (e, não obstante, deixou de ser exercida)
.
Prescritividade e exigibilidade são ideias que se intervinculam. Apenas as prestações exigíveis (i.e., vencidas), não sendo satisfeitas, sujeitam-se aos efeitos da prescrição. Se a obrigação ainda não se venceu, não está o credor autorizado a exercer o direito que lhe cabe contra o devedor. Não se pode perder por inércia um direito que, posto existente, ainda não se pode exigir. Donde 'o início da prescrição só pode ter lugar quando o direito está em condições de o seu titular poder exercitá-lo.'
Por isso, não corre prescrição nas obrigações a prazo ou sujeitas à condição suspensiva, senão depois de ocorrido o vencimento ou verificada a condição (art. 199, I e II). Termo e condição suspensiva, nessa ordem de ideias, são causas que impedem a prescrio, porque, no primeiro caso, o direito subjetivo nem sequer surgiu, e, no segundo, já existe mas tem o seu exercício suspenso.
Sendo a via judicial o caminho que a ordem jurídica oferece ao titular da pretensão insatisfeita para compelir o obrigado a realizar a prestação devida, é intuitivo que se deverá contar a prescrição a partir de quando a respectiva ação se mostrou exercitável. Nesse sentido, somente se pode cogitar de prescrição em face da chamada actio nata (actioni nondum natae non praescribitur). Vale dizer: o prazo prescricional corre a partir do momento em que o credor pode lançar mão da pretensão, se necessário, por uma ação em juízo.(...)
No caso de obrigação derivada de ato ilícito, desde a ocorrência deste está fluindo a ação para impor a obrigação genérica de indenizar. Sem se saber, porém, o montante do prejuízo, não se pode desde logo exigir-lhe a indenização. Enquanto estiver fluindo a ação condenatória genérica, não corre o prazo para liquidar e exigir a reparação. Mas, se o credor não propõe logo a ação genérica, desde então estarão em risco as pretensões também da liquidação e do respectivo valor líquido. É que a inércia do titular da pretensão terá prejudicado todas as ações que poderia manejar
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Comentários ao novo código civil.
Volume III. Tomo II. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 174-177).
Delimitada a questão quanto ao termo inicial do cômputo da prescrição, outro tópico relevante diz respeito ao seu prazo, quando se cuide de pretensão oponível ao Estado. Ora, no âmbito das obrigações pessoais, as pretensões condenatórias formuladas em face da Fazenda Pública prescrevem, EM REGRA, no prazo de 05 anos, conf. art. 1º do Dec. 20.910/1932 com o Decreto-lei 4.597/1942.
Convém atentar para a lição de Pontes de Miranda:
"
A prescrição
quinquenal somente concerne às ações condenatórias pessoais; não às ações declarativas, constitutivas negativas (e.g., declaração de inconstitucionalidade ou nulidade de lei, ou do ato do Poder Público), mandamentais e executivas que não sejam de dívidas pessoais, ou a de execução de julgado. As ações pessoais (...) são as oriundas de dívidas de direito das obrigações, em que a Fazenda Pública teria de pagar
."
(MIRANDA, F. C. Pontes de
apud
NASSAR, Elody.
Prescrição
na Administração Pública.
2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 271).
Trata-se de norma de conteúdo especial quando confrontada com o art. 206, §3º, V, Código Civil:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. DECRETO 20.910/32. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA RESP 1.251.993/PR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. 1.251.993/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, assentou que o prazo de prescriçãoquinquenal, previsto no Decreto nº 20.910/32, aplica-se às ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002
. a4. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201302893979, MARGA TESSLER (JUÍZA FEDERAL CONVOCADA DO TRF 4ª REGIÃO), STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:12/03/2015 ..DTPB:.)
O prazo de 05 anos também prevalece sobre aquele preconizado no art. 206, §2º, do Código Civil:
"
Prescreve: § 2º Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem
.
"
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA PROPOSTA POR SERVIDORES PÚBLICOS.. VERBA DENOMINADA 'ETAPA ALIMENTAÇÃO'. PRESCRIÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PRAZO DE CINCO ANOS. ART. 1º DO DECRETO. 20.910/1932. INAPLICABILIDADE DOS ARTS. 206, § 3º, DO CÓDIGO CIVIL E 10 DO DECRETO 20.910/32. 1. O entendimento do STJ é no sentido de que a prescrição quinquenal prevista no art. 1º. do Decreto 20.910/1932 deve ser aplicada a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja ela federal, estadual ou municipal, independentemente da natureza da relação jurídica estabelecida entre a Administração Pública e o particular. 2. Não incide, portanto, a prescrição bienal do art. 206, § 2º, do CC de 2002, uma vez que o conceito jurídico de prestação alimentar nele previsto não se confunde com o de verbas remuneratórias de natureza alimentar. O Código Civil de 2002 faz referência às prestações alimentares de natureza civil e privada, incompatíveis com as percebidas em relação de Direito Público. Inexiste, no caso, norma específica mais benéfica a ensejar a incidência do art. 10 do Decreto 20.910/32. 3. Agravo Regimental não provido. ..EMEN: (AGARESP 201200734389, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:27/08/2012 ..DTPB:.)
O Min. Herman Benjamin enfatizou, naquela ocasião, que
"se mostra inaplicável, no caso dos autos, a prescrição bienal do art. 206, §2º, Código Civil, uma vez que o conceito jurídico de prestações alimentares nele previsto não se confunde com o de verbas remuneratórias de natureza alimentar. O Código Civil de 2002 faz referência às prestações alimentares de natureza civil e privada, incompatíveis com as percebidas em relação de direito público.
Não há, no caso, norma específica mais benéfica a ensejar a incidência do art. 10 do Decreto 20.910/1932
."
(Agravo no REsp n. 164.513/MS).
2.22.
Prescrição
de fundo de direito:
Vale a pena atentar, uma vez mais, para a lição de Elody Nassar, quanto trata da prescrição do fundo de direito:
"
A denominada prescrição do fundo de direito tem suporte legal no disposto no art. 1. do Decreto n. 20.910/1932, que dispõe sobre a prescrição das ações contra a Fazenda Pública
(...). Para efeito da compreensão da expressão 'fundo de direito' deve ser observado o marco inicial, ou seja, o momento a partir do qual inicia-se o prazo prescricional. Esse marco inicial é contado a partir da consolidação de uma situação jurídica fundamental que estabelece um ponto ceto e delimitado para a eventual impugnação de um ato lesivo de direito. Essa situação jurídica fundamental, no dizer da mais renomada doutrina, importa em ato único do qual derivam os subsequentes e que, portanto, se torna definitivo se não impugnado em tempo hábil, juntamente com todos os seus efeitos. Destaca-se aqui a existência da teoria estatutária da função pública, distinguindo a prescrição que atinge o fundo de direito (art. 1 do Decreto 20910) da prescrição das prestações sucessivas ou vincendas (art. 3º do mesmo diploma legal). Dessa teoria decorre a exegese de que, enquanto existente o vínculo entre servidor e Poder Público, são imprescritíveis os direitos dele decorrentes, sendo atingidos pela prescrição, tão-somente, alguns de seus efeitos."
(NASSAR, Elody.
Obra citada.
p. 273).
Segundo antiga jurisprudência da Suprema Corte,
"
Quando existe um ato ou fato que ofenda de modo geral, permanente, definitivo, o direito do autor, como a demissão, a preterição no acesso, o cancelamento de pensão, a tomada de coisas sem as formalidades legais, o lapso prescricional corre da data do ato ou do fato
. Quando, porém, a prestação periódica não for paga (vencimentos, juros de apólices, pensões, aluguéis de imóveis etc.), por negligência do credor, por falta de verba orçamentária, ou ainda em consequência de dificuldade burocrática, o prazo é contado da data em que cada prestação for exigível"
(STF, 1ª Turma, 28.08.1969, RT 416/426, citado por CAHALI, Yousse Said.
Prescrição
e decadência.
3. tiragem. São Paulo: RT. 2008. p. 303).
Em período mais recente, o Min. Cézar Peluso sustentou que
"São discerníveis, no plano teórico dos direitos subjetivos funcionais a que correspondem obrigações administrativas, de um lado, a própria relação jurídica estatutária e todas as determinações que, segundo as modalidades legais, é ela capaz de assumir em termos de situações jurídicas do servidor, como as decorrentes de promoção, acesso, reenquadramento, reclassificação, decurso de tempo, desempenho de funções ou serviços especiais, aposentadoria etc. (a), e, de outro, as consequências pecuniárias (b). Perante ambas (a e b), é possível cogitar de direitos à prestação obrigacional, cuja violação desencadeie pretensão sujeita a lapso prescritivo, no sentido de que, realizado o suporte fático, pode o funcionário exigir prestação administrativa, que tenha por objeto o próprio vínculo estatutário, ou uma das muitas situações configuráveis no lado dinâmico do mesmo vínculo, ou ainda só os seus efeitos pecuniários."
(PELUSO, Cézar
apud
CAHALI.
Obra cit.
p. 304).
Cahali sustenta, na sequência, que
"consideradas do ângulo de suas repercussões de caráter financeiro (b), a relação estatutária e suas situações jurídicas (a) são fonte objetiva do direito do servidor de receber as prestações correlatas. Desse ponto de vista, os diretos incidentes sobre a relação jurídico-funcional e cada uma das situações jurídico-subjetivas em que ela se desdobra podem, sem grande impropriedade técnica, chamar-se direitos originantes, e os direitos irradiados às respectivas consequências econômicas, direitos originados. É aos primeiros que a jurisprudência costuma referir-se sobre a expressão 'fundo de direito', a qual se reconhece 'usada para significar o direito de ser o funcionário (situação jurídica fundamental) ou os direitos que se admitem com relação a essa situação jurídica fundamental, como reclassificações, reenquadramentos, direito a adicionais por tempo de serviço, direito à gratificação por prestação de serviço de natureza especial. Os conceitos assim enunciados definem as hipóteses de prescrição do
fundo de direito
(art. 1º), envolvendo os direitos originantes, e de prescrição das prestações vencidas (art. 3º), que diz respeito aos direitos originados."
(CAHALI, Yousse Said.
Obra citada.
p. 304-305).
Isso significa que, em princípio, sempre que determinado pleito é indeferido pela Administração Pública, o interessado possui o prazo de até 05 anos para deflagrar a pertinente demanda judicial, salvo eventuais hipóteses de interrupção do cômputo do prazo, observada, em qualquer caso, o entendimento consagrado com a súmula 383, STF, já transcrita acima.
Atente-se também para a distinção entre suspensão e interrupção da prescrição, reporto-me à lição de Elody Nassar:
"
Chama-se suspensão a circunstância especial, em vista da qual a lei paralisa a fluência do prazo prescricional. As causas suspensivas da prescrição são as que, temporariamente, paralisam o seu curso; superado o fato suspensivo, a prescriçãocontinua a correr, computado o tempo decorrido antes dele
. Denomina-se interrupção a ocorrência de um fato hábil a destruir o efeito do tempo já decorrido, com a anulação da prescrição já iniciada. As causas interruptivas da prescrição são as que inutilizam a prescrição iniciada, de modo que o seu prazo recomeça a correr da data do fato que a interrompeu ou do último ato do processo que a interromper (CC, art. 202, parágrafo único)."
(NASSAR, Elody.
Obra citada.
p. 156-157)
Dado que o instituto tem por fundamento que o Direito não tutela quem permanece inerente na defesa dos seus interesses (
Dormientibus non sucurrit jus
), a prescrição apenas pode ser oposta a quem podia efetivamente agir. E isso pressupõe, por certo, que o atingido tenha conhecimento da agressão às suas pretensões, na forma do art. 189, Código Civil.
2.23.
Diferença entre suspensão
e
interrupção da prescrição:
Quanto à distinção entre suspensão e interrupção da prescrição, reporto-me à lição de Elody Nassar:
"Chama-se suspensão a circunstância especial, em vista da qual a lei paralisa a fluência do prazo prescricional. As causas suspensivas da prescrição são as que, temporariamente, paralisam o seu curso;
superado o fato suspensivo, a prescrição continua a correr, computado o tempo decorrido antes dele
.
Denomina-se interrupção a ocorrência de um fato hábil a destruir o efeito do tempo já decorrido, com a anulação da prescrição já iniciada. As causas interruptivas da prescrição são as que inutilizam a prescrição iniciada, de modo que o seu prazo recomeça a correr da data do fato que a interrompeu ou do último ato do processo que a interromper (CC, art. 202, parágrafo único)." (NASSAR, Elody.
Obra citada.
p. 156-157)
Dado que o instituto tem por fundamento que o Direito não tutela quem permanece inerente na defesa dos seus interesses (
Dormientibus non sucurrit jus
), a prescrição apenas pode ser oposta a quem podia efetivamente agir. E isso pressupõe, por certo, que o atingido tenha conhecimento da agressão às suas pretensões, na forma do art. 189, Código Civil.
Em regra, no curso do processo administrativo o cômputo da prescrição resta suspenso, por força do art. 4º do decreto 20.910/32:
"Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la."
O cômputo da prescrição também resta suspenso nas hipóteses do art. 200, Código Civil/2002:
"Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva."
2.24. Prescrição
- situação em exame:
A pretensão deduzida na peça inicial submete-se à prescrição quinquenal, prevista no art. 1º, do
decreto 20.910, de 1932
. O prazo de 05 anos deve ser computado a partir da data em que o autor tenha tomado conhecimento da existência de descontos em seu benefício previdenciário. No curso de eventual processo administrativo, o cômputo da prescrição resta suspenso - art. 4 do decreto 20.910/32. Não se operou a prescrição de fundo de direito.
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. PROGRESSÃO FUNCIONAL HORIZONTAL. NÃO OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. INEXISTÊNCIA DE NEGATIVA DO DIREITO PELA ADMINISTRAÇÃO. OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO. PRESTAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. SÚMULA 85/STJ. SÚMULA 568/STJ.
No caso dos autos, não se discute violação do fundo de direito, mas sim o não pagamento de valores decorrentes de obrigação de trato sucessivo. Isso porque a servidora, ao não ser beneficiada com a progressão funcional garantida na legislação municipal, vê caracterizada uma omissão da Administração, renovada mês a mês, uma vez que não houve nenhum ato concreto negando o direito, mas uma inadimplência em relação jurídica de trato sucessivo
. Logo, somente as parcelas vencidas há mais de 5 anos da propositura da ação devem ser consideradas prescritas nos termos da Súmula 85 do STJ. Agravo interno improvido. (STJ - AgInt no AREsp: 875628 MG 2016/0054585-5, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 02/08/2016, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/08/2016)
No caso, portanto, a pretensão do(a) demandante não foi atingida pela prescrição, como se infere dos documentos encartados no movimento-1. O termo inicial do cômputo da prescrição recai na data em que o autor tenha tomado conhecimento da alegada fraude. No curso de eventual arguição penal, o cômputo da prescrição resta suspenso (art. 200, Código Civil). A suspensão também se dá no curso do processo administrativo em cujo âmbito a pretensão da parte autora tenha sido discutida.
2.25. Eventual caducidade:
Em regra, os prazos decadenciais são oponíveis às pretensões constitutivas ou desconstitutivas. Atingem os chamados
direitos potestativos
- ou seja, direitos formativos geradores, na dicção de Francisco Pontes de Miranda, a exemplo do divórcio, rescisão unilateral de contratos de locação etc.
Sustenta-se que a
"decadência, ou caducidade, na definição de Câmara Leal, é a extinção ou perecimento do direito pelo decurso do prazo fixado ao seu exercício, sem que seu titular o tivesse feito.
O principal efeito da decadência, seguindo o raciocínio de Câmara Leal, é o de extinguir o direito
. Desta circunstância decorre o fato de que a decadência do direito faz desaparecer a ação que deveria assegurá-lo: a) quando direito e ação não se identificam, a ação não chega sequer a nascer; b) a decadência perece com o direito, quando ambos nascem simultaneamente."
(NERY, Rosa; NERY JR, Nelson.
Instituições de Direito Civil. vol. 1
São Paulo: RT. 2019. item 79).
No presente caso, no que toca à relação mantida com o INSS,
não está em debate a invocação de direito potestativo
, de modo que a situação jurídica, reclamada pela parte autora, não está submetida a prazos decadenciais.
2.26. Eventual
decadência
- aplicação do CDC:
Pode-se cogitar de decadência, por conta do eventual decurso do prazo previsto no art. 26, II, §1º, CDC/1990:
"O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...) II -
noventa dias
, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. §1°
Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços
."
A respeito do tema, os Tribunais têm decidido como segue:
"Para a solução da questão é necessário conceituar o defeito que macula os serviços ora discutidos. Se estivermos diante da hipótese de responsabilidade por fato do serviço (art. 14, do CDC), o prazo prescricional a ser aplicado é o do art. 27 dessa lei, de cinco anos. Se estivermos diante de responsabilidade por vício do produto (art. 18, do CDC) o prazo será decadencial, disciplinado no art. 26.
Esta Terceira Turma, em precedente de minha relatoria, já teve a oportunidade de se posicionar no sentido de que, nas hipóteses de inadimplemento absoluto, não se estaria no âmbito do art. 18 (e, conseqüentemente, do art. 26 do CDC), mas no âmbito do art. 14, que, quanto à prescrição, leva à aplicação do art. 27, com prazo de cinco anos para o exercício da pretensão do consumidor. Isso se deu por ocasião do julgamento do REsp nº 278.893/DF (DJ de 4/11/2002), assim ementado:
Recurso Especial. Civil. "Pacote turístico". Inexecução dos serviços contratados. Danos materiais e morais. Indenização. Art. 26, I, do CDC. Direto à reclamação. Decadência. -
O prazo estatuído no art. 26, I, do CDC, é inaplicável à espécie, porquanto a pretensão indenizatória não está fundada na responsabilidade por vícios de qualidade do serviço prestado, mas na responsabilidade contratual decorrente de inadimplemento absoluto, evidenciado pela não-prestação do serviço que fora avençado no "pacote turístico
". (STJ, Resp, rel. Min. Nancy Andrighi, julgamento unânime por não conhecer do Recurso Especial)
(...)
Além disso, o acórdão recorrido reconheceu a existência de dano moral causado pela conduta das requerentes. Na esteira do precedente formado a partir do julgamento do REsp nº 722.510/RS (de minha relatoria, DJ de 1/2/2006), nas hipóteses em que "
o vício não causa dano, correrá para o consumidor o prazo decadencial, para que proceda a reclamação, previsto neste artigo 26. No entanto, vindo a causar dano, ou seja, concretizando-se a hipótese do artigo 12, deste mesmo Código, deve-se ter em mente o prazo qüinqüenal, disposto no art. 27, sempre que se quiser pleitear indenização
" (Arruda Alvim, Código do Consumidor Comentado. 2ª ed., São Paulo: RT, 1995, pp. 172/173).
(STJ, REsp n.º 773.994/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, em 22/05/2007)
Como têm deliberado o TRF4,
"O prazo de 90 dias estatuído no art. 26, II, § 1º, do CDC, não se subsume ao caso vertente, em que não se está a tratar de reclamação quanto a um vício aparente na prestação de serviços, mas do alegado direito da parte autora de obter o diploma pelo curso que prestou, assim como a reparação civil pela impossibilidade de obtê-lo."
(TRF-4 - AC: 50147831220144047003 PR, Relatora: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 30/10/2019, QUARTA TURMA)
No caso em exame, o aventado direito, alegado pela parte autora, não restou atingido pela caducidade.
2.27.
Cogitada aplicação do regime consumerista ao caso:
Com a publicação do CDC, inaugurou-se uma conhecida polêmica sobre o alcance das suas disposições. Grosso modo, as opiniões distribuíram-se em duas grandes correntes: os finalistas e os maximalistas.
Os finalistas amparam-se sobremodo na regra do art. 2º da lei 8078/1990:
"
Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final
."
Logo, em princípio, o CDC apenas tutelaria aquelas relações em que o serviço fosse prestado ou o bem fosse fornecido ao destinatário último, sem subsequentes repasses. Essa orientação foi compartilhada, ao que se sabe, pelos principais idealizadores do projeto que eclodiu no código consumerista brasileiro: Ada Pellegrini Grinover, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin e outros.
Já a orientação maximalista promove uma leitura ampla do conceito de consumidor, destacando que a lei 8078 não tutelaria apenas o destinatário final de bens e serviços, sendo oponível também às relações entre empresas e até mesmo a órgãos públicos (amparando-se, nesse caso, na regra do art. 22, CDC). Essa orientação é compartilhada por Rizzato Nunes, por exemplo (
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004).
Com esse pano de fundo, inúmeras discussões foram promovidas ao longo desses anos de vigência da lei 8078. Ao que releva, o CDC também se aplica a entidades da Administração Pública, quando em causa serviços remunerados mediante preços públicos, ou quando em causa atividades econômicas
stricto senso
(art. 22, CDC).
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3.
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado
. 4. Recurso a que se nega provimento.(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
CIVIL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. CONTRATO DE TRANSPORTE DE ENCOMENDA SEM DECLARAÇÃO DE VALOR. EXTRAVIO DE MERCADORIA. VALOR DA INDENIZAÇÃO.1.
Qualifica-se como de consumo a relação jurídica contratual de transporte de encomendas. Precedente do STJ
. 2. É do fornecedor o ônus de provar claramente as condições contratuais particularmente em relação à opção de informar ou não o valor da mercadoria e o custo do serviço para o fim de indenização em caso de extravio segundo o valor exato da mercadoria transportada.3. Não é aceitável o fornecedor simplesmente alegar que o consumidor não declarou o valor para indenizar o prejuízo de acordo com critério unilateral.4. Apelação provida. (AC 00626681319984010000, JUIZ FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA (CONV.), TRF1 - TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR (INATIVA), DJ DATA:23/06/2005 PAGINA:81.)
D'outro tanto, em princípio, pessoas jurídicas também podem ser qualificadas como consumidoras, para fins de aplicação da lei 8.078/1990, desde que não esteja em causa a aquisição de matéria prima para seus processos produtivos.
RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. CONSUMIDOR. DESTINATÁRIO FINAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 2º E 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 8.078/90.I - "
O conceito de "destinatário final", do Código de Defesa do Consumidor, alcança a empresa ou o profissional que adquire bens ou serviços e os utiliza em benefício próprio
" (AgRg no Ag nº807159/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, DJ de 25/10/2008).II - No caso em exame, a recorrente enquadra-se em tal conceituação,visto ser empresa prestadora de serviços médico-hospitalares, que utiliza a água para a manutenção predial e o desenvolvimento de suas atividades, ou seja, seu consumo é em benefício próprio.III - A empresa por ser destinatária final do fornecimento de água e, portanto, por se enquadrar no conceito de consumidora, mantém coma recorrida relação de consumo, o que torna aplicável o disposto no artigo 42, parágrafo único, da Lei 8.078/90.IV - Recurso especial conhecido e provido...EMEN: (RESP 200800133166, FRANCISCO FALCÃO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:30/04/2008..DTPB:.)
Quanto à aplicação do CDC, quando se trate da prestação de serviços por empresas públicas, remunerados mediante preços públicos/tarifas, convém atentar para o art. 22, CDC:
"
Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos
. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código."
Atente-se ainda para os seguintes julgados:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CORREIOS. CARTA REGISTRADA. EXTRAVIO. DANOS MORAIS. IN RE IPSA. 1. As empresas públicas prestadoras de serviços públicos submetem- se ao regime de responsabilidade civil objetiva, previsto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal e nos arts. 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor. 2. No caso, a contratação de serviços postais oferecidos pelos Correios, por meio de tarifa especial, para envio de carta registrada, que permite o posterior rastreamento pelo próprio órgão de postagem revela a existência de contrato de consumo, devendo a fornecedora responder objetivamente ao cliente por danos morais advindos da falha do serviço quando não comprovada a efetiva entrega. 3. É incontroverso que o embargado sofreu danos morais decorrentes do extravio de sua correspondência, motivo pelo qual o montante indenizatório fixado em R$ 1.000,00 (mil reais) pelas instâncias ordinárias foi mantido pelo acórdão proferido pela Quarta Turma, porquanto razoável, sob pena de enriquecimento sem causa. 4. Embargos de divergência não providos. ..EMEN:
(ERESP 201303279910, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - SEGUNDA SEÇÃO, DJE DATA:24/02/2015 ..DTPB:.)
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado. 4. Recurso a que se nega provimento.
(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
De sua parte, Justen Filho enfatiza a dificuldade, não raro, de se conjugar o regime jurídico público - próprio das concessões - com a aplicação da lógica do Código de Defesa do Consumidor:
"Ocorre que nem sempre é possível conciliar o regime de direito público com aquele do direito do consumidor. A cumulação dos mecanismos de serviço público e de direito do consumidor provoca um conflito de competências e de regime jurídico, cuja solução deve ser realizada com cautela.
Um exemplo permite compreender de imediato o problema. Segundo o direito do consumidor, é obrigatório o empresário manter a oferta realizada nas condições originais. Já no âmbito do serviço público, a mutabilidade é da sua inerência. Suponha-se, portanto, o caso da telefonia fixa. Imagine-se que o concessionário estabeleça relação jurídica com o usuário, orientando-se por determinada regulação do poder concedente. Se houver necessidade e conveniência, o poder concedente alterará as regras pertinentes, com reflexos na situação jurídica do usuário. Em face do regime de Direito Administrativo, o usuário não poderia invocar direito adquirido à manutenção de regime jurídico. Mas sua pretensões poderia encontrar respaldo no regime característico do direito do consumidor.
Não seria excessivo afirmar que a concepção do serviço público defere ao poder concedente a função de tutelar e defender o interesse coletivo (aí abrangido também o interesse do usuário). Já o direito do consumidor assegura ao próprio consumidor e às entidades da sociedade a função de sua defesa (sem que isso exclua a intervenção de órgãos estatais)
.
É fundamental tomar em vista, então, que a aplicação das normas do direito do consumidor não pode fazer-se em face do serviço público com idêntica extensão aplicável no caso de relações puramente privadas, relacionadas com a exploração de atividade econômica em sentido restrito." (JUSTEN FILHO, Marçal.
Teoria geral das
concessões
de serviço público.
São Paulo: Dialética, 2003, p. 557-558)
De outro norte, consolidou-se a orientação jurisprudencial que reconhece a sua plena aplicação no âmbito dos contratos bancários, desde que pactuados depois de 1990.
Ora, essa solução é alvo de duas conhecidas súmulas do STJ:
Súmula 297 -
O Código de Defesa do consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Súmula 285 - Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do consumidor incide a multa moratória nele prevista.
A Suprema Corte reconheceu, ademais, a plena aplicação do CDC às relações estabelecidas entre os bancos e seus clientes, nessa condição, conforme se infere da ADIn 2591/DF, relatada pelo Min. Carlos Velloso.
Tudo conjugado, o CDC não se aplica ao caso, eis que a relação entre a demandante e a associação é de natureza civil, não configurando a venda de produtos ou prestação de serviços no mercado. Tampouco incide na relação entre o autor e o INSS, eis que regrado pelo direito administrativo em sentido estrito, conforme art. 37, Constituição
.
2.28. Considerações gerais sobre o instituto do contrato:
O contrato é projeção da autonomia da vontade. Em regra, desde que a vontade seja exteriorizada sem vícios (dolo, coação, vício redibitório, teoria da lesão etc.), ele vincula as partes, obrigando-as ao cumprimento das cláusulas que tenham sido avençadas. Em caso de descumprimento, eventuais cláusulas penais - se pactuadas - podem ser invocadas como meios de dissuasão do inadimplemento.
É fato que essa concepção liberal do contrato tem sido esmaecida, dada a sua progressiva funcionalização. Importa dizer: a legislação atual também exige, para exame da validade das avenças, que os seus resultados sejam tidos em conta (por exemplo, isso se dá com a vedação da onerosidade excessiva, conforme arts. 39 e 51, CDC/1990 e arts. 478-480, CC/2002).
Logo, em determinados casos, esse caráter vinculante dos contratos resta mitigado, frente à constatação de que muitos pactos são celebrados por adesão (contratos formulário), a existência de contratos cativos, superendividamento de muitos consumidores, propaganda abusiva etc. Assim, não se desconhece que o Direito pátrio esposou, de certa forma, a teoria das bases objetivas do contrato, desenvolvida por Karl Larenz em solo alemão:
"Pela base objetiva do negócio tem de se entender o conjunto de circunstâncias e estado geral de coisas cuja existência ou subsistência é objetivamente necessária para que o contrato, segundo o significado das intenções de ambos os contratantes, possa subsistir como regulação dotada de sentido.
A base do negócio objetivo tem desaparecido: a) quando a relação de equivalência entre prestação e contraprestação pressuposta no contrato se tem destruído em tal medida que não pode falar-se racionalmente de uma contraprestação (destruição da relação de equivalência); b) quando a comum finalidade objetiva do contrato, expressada em seu conteúdo, tenha resultado definitivamente inalcançável, ainda quando a prestação do devedor seja, todavia, possível (frustração da finalidade).
Nos casos de destruição da relação de equivalência (IX, a), a parte prejudicada, no caso de não haver realizado a prestação, pode negar-se a fazê-lo contanto que a outra parte não consinta um adequado aumento da contraprestação que restaure a equivalência. Se se rechaça este aumento terminantemente
, a parte prejudicada pode resolver ou, em caso de uma prestação de larga duração já iniciada, denunciar imediatamente o contrato. Se tem realizado sua prestação pode, quando não se admita um adequado aumento posterior da contraprestação, reclamar uma indenização pelo valor do enriquecimento da outra parte.
Nos casos de frustração da finalidade (IX, b), o credor da prestação que resultou inútil pode recusá-la e negar-se a realizar sua contraprestação desde que suporte os gastos que a outra parte tenha realizado para a preparação e execução do contrato e que podiam considerar-se indispensáveis" (LARENZ, Karl.
Base del negócio jurídico y cumplimiento de los contratos.
Tradução do alemão para o espanhol por Carlos Fernándes Rodrigues. Granada: Editorial Comares, 2.002, pp. 211-212. Traduzi).
Reporto-me, a respeito do tema, ao seguinte julgado:
"
Não se perquire mais, como na teoria da Imprevisão, sobre a previsibilidade do fato econômico superveniente. E nem se deveria
. Com efeito, o fato pode ser até previsível, mas não é esperado, porque se esperado fosse, nem o Banco emprestaria o dinheiro e nem o tomador assumiria um compromisso que não pode arcar. Logo, o fato previsível, mas não esperado, situa-se na área do risco inerente a qualquer atividade negocial."
(TJRS, apelação cível de autos 193051083, quarta câmara cível, relator desembargador Márcio de Oliveira Puggina, julgado em 24 de junho de 1994)
Ademais, a legislação consumerista determina a revisão parcial dos contratos, atingindo-se apenas as cláusulas eventualmente viciadas, mas preservando seus demais termos (art. 51, §2º, CDC).
Em que pese tudo isso, é fato, porém, que o contrato não pode ser simplesmente desconsiderado pelo Judiciário. Ele ainda é instituto fundamental para a economia, permitindo o fluxo de bens e o planejamento individual. Logo, conquanto seja certo que o contrato não pode ser suposto como algo inexorável, igualmente certo que tampouco pode ser simplesmente abstraído, como se fosse destituído de qualquer eficácia obrigacional. Tanto por isso, a revisão contratual deve ser promovida com cautelas. Deve-se conjugar a preservação dos direitos fundamentais - cláusulas de ordem pública veiculadas na lei 8078/1990 -, com o reconhecimento da força vinculante dos pactos.
Por sinal, eventuais dificuldades financeiras, caso suportadas pelo devedor, não justificam, por si, o reconhecimento de onerosidade excessiva. Pode-se cogitar de eventual aplicação da teoria da lesão contratual, mas desde que preenchidos os rigorosos requisitos do art. 157, Código Civil/2002.
Como explicita Judith Martins-Costa,
"
A desproporção manifesta é sempre referida à prestação considerada objetivamente, e não à situação subjetiva na qual se encontra o devedor cujas dívidas derivadas de outras relações obrigacionais tenham, por hipótese, aumentado
."
(Judith Martins-Costa.
Comentários ao novo código civil.
Do direito das obrigações. Do adimplemento e da extinção das obrigações. Arts. 304 a 388, volume V, tomo I. 2ª ed. RJ: Forense, 2003, p. 305).
2.29. Funcionalização dos contratos:
Logo, durante muito tempo, um contrato apenas poderia ser invalidado por conta de vícios na manifestação da vontade, promovida ao tempo da sua celebração. Em período mais recente, porém, o Estado tem empregado os vínculos negociais com meio para implementação de valores e interesses coletivos, promovendo significativa ingerência no seu meio.
É o que se infere da regulamentação dos contratos de locação, promovida por meio da lei 8.245, de 18 de outubro de 1991; por meio dos contratos de seguro (lei 15.040, de 9 de dezembro de 2024); contratos de prestação de serviços educaionais (lei 9.870, de 23 de novembro de 1999) e assim por diante. Isso implica a mencionada funcionalização dos contratos, que deixam de serem instrumentos exclusivamente privados, versando sobre os interesses das partes diretamente afetadas, para se converterem em instrumentos para implementação de vetores de relevo coletivo.
Sem dúvida que essa publicização dos contratos não pode ser promovida sem maiores cuidados, sob pena de comprometimento da autonomia da vontade e da livre iniciativa, fundamentos da ordem econômica - art. 170, Constituição Federal/88.
2.30. Interpretação de contratos de adesão:
Diante do já exposto, vê-se que o instituto jurídico do contrato tem sido funcionalizado, em tempo mais recente. Isso significa que ele deve atender a interesses sociais relevantes, viabilizando-se um controle do seu conteúdo quanto às cláusulas abusivas, manifestamente desproporcionais. O tema é bem exemplificado pela ingerência estatal em contratos de locação, contratos educacionais etc.
Ao mesmo tempo, porém, o sistema continua a viabilizar a revisão e anulação de pactos, sempre que comprovado que, por época da sua celebração, a vontade não teria sido manifestada de modo livre, como se infere dos conhecidos institutos do dolo, coação, vício redibitório e teoria da lesão (arts. 138, 145, 151 e 157, Código Civil/2002).
Note-se, todavia, que o contrato não pode ser presumido como inválido tão somente por ter sido lavrado em um formulário padronizado (contrato de adesão). Afinal de contas, tais instrumentos são indispensáveis para o comércio jurídico contemporâneo.
Contudo, havendo cláusulas ambíguas, a lei determina que sejam interpretadas de modo mais favorável ao aderente, conforme art. 423, Código Civil:
"Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente."
Outra ressalva importante é ditada pelo art. 424, CC/2002:
"
Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio
."
De outro tanto, registro que a súmula nº 381 do STJ preconiza que "
nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas
.
" Na espécie, todavia, referida norma é suavizada por força da designação do defensor dativo para atuar no caso.
2.31. Eventuais
novações
contratuais:
Com cognição precária
, anoto que eventual novação contratual não impede, por si, a revisão de todo o período de dívida, desde que o tema seja alvo de pedido expresso e fundamentado na peça inicial (art. 141, novo CPC), apontando-se qual o pretenso vício (p.ex., vício redibitório, aplicação da teoria da lesão contratual, presença de dolo, coação, onerosidade excessiva etc.).
Atente-se para a conhecida súmula 286, STJ:
"
A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores
."
Assim, caso o(a) demandante tenha celebrado novações contratuais com a parte requerida, isso não impedirá a revisão da avença, observados os limites da pretensão deduzida em juízo.
2.32. Eventuais contratos bilaterais:
Cuidando-se de contrato sinalagmático,
"nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.
" (art. 476, Código Civil/2002). Cuida-se de simples projeção do postulado
non venire contra factum proprium,
dado que ninguém pode exigir aquilo que não está disposto a cumprir. Quem inadimpliu o contrato tampouco pode exigir que o outro contratante cumpra suas obrigações, como cediço.
Explicita Maria Helena Diniz que
"A exceptio non adimpleti contractus é a cláusula resolutiva tácita que se prende ao contrato bilateral.
Isto é assim porque o contrato bilateral requer que as duas prestações sejam cumpridas simultaneamente, de forma que nenhum dos contratantes poderá, antes de cumprir suas obrigações, exigir o implemento das do outro
. (...) Pelo enunciado n. 24, aprovado na 1. Jornada de direito comercial, os contratos empresariais coligados, concretamente formados por unidade de interesses econômicos, permitem a arguição da exceção de contrato não cumprido, salvo quando a obrigação inadimplida for de escassa importância."
(DINIZ, Maria Helena.
Código civil anotado.
17. ed. São Paulo: Saraiva. 2014. p. 450). Por conseguinte, também nesse âmbito, deve-se aferir se houve adimplemento substancial.
2.33. Exceção de contrato não cumprido:
Cuidando-se de contrato sinalagmático,
"nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.
" (art. 476, Código Civil/2002). Cuida-se de simples projeção do postulado
non venire contra factum proprium,
dado que ninguém pode exigir aquilo que não está disposto a cumprir. Quem inadimpliu o contrato tampouco pode exigir que o outro contratante cumpra suas obrigações, como cediço.
Explicita Maria Helena Diniz que
"A exceptio non adimpleti contractus é a cláusula resolutiva tácita que se prende ao contrato bilateral.
Isto é assim porque o contrato bilateral requer que as duas prestações sejam cumpridas simultaneamente, de forma que nenhum dos contratantes poderá, antes de cumprir suas obrigações, exigir o implemento das do outro
. (...) Pelo enunciado n. 24, aprovado na 1. Jornada de direito comercial, os contratos empresariais coligados, concretamente formados por unidade de interesses econômicos, permitem a arguição da exceção de contrato não cumprido, salvo quando a obrigação inadimplida for de escassa importância."
(DINIZ, Maria Helena.
Código civil anotado.
17. ed. São Paulo: Saraiva. 2014. p. 450). Por conseguinte, também nesse âmbito, deve-se aferir se houve adimplemento substancial.
2.34. Eventual invalidade da celebração do acordo:
Note-se que eventual falsidade na avença - a exemplo da contrafação da assinatura do pretenso contratante - implica a ausência de vínculo contratual, não devendo surtir efeitos jurídicos
.
Algo um tanto distinto ocorre quando há vícios na manifestação da vontade, a exemplo do que ocorre nos casos de erro (art. 138, Código Civil), dolo (art. 145, CC), coação (art. 151, CC), teoria da lesão (art. 157, CC), vício redibitório (art. 441, Código Civil), dentre outros.
Em tais casos, o contratante não toma adequado conhecimento do objeto da negociação; ou, mesmo quando toma, não chega a atuar com liberdade suficiente para se comprometer ao cumprimento das obrigações previstas (como ocorre nos casos de coação e teoria da lesão). Demonstrado isso, o pacto pode ser invalidado, apurando-se a proporcionalidade do vício em face do objeto contratual (p.ex., art. 157, §2, Código Civil/2002).
2.35. Eventual
simulacro
de negociação:
Eventual emprego de falsidade ideológica, de falsidade documental documental, de estelionato - crimes tipificados nos arts. 299, 296, 297, 304, 171, Código Penal, dentre outros - implica a existência de um substrato documental inidôneo para dar ensejo à constituição de vínculos contratuais, envolvendo as pessoas atingidas pela fraude.
Assim, por óbvio, quando alguém prega documentos alheios para obter um financiamento fraudulento - crime tipificado no art. 19 da lei n. 7.492/1986 -, isso implica a própria ausência de contrato, quanto à pessoa atingida pelo financiamento
. Os fraudador devem ser alvo de responsabilização criminal e cível - nesse último caso, responsabilização extracontratual.
Releva enfatizar, portanto, esse tópico: a inautenticidade das assinaturas atribuídas à contraparte, em um instrumento contratual escrito
implica a própria ausência do pacto
. A falsidade ideológica empregada em um contrato meramente verbalizado surte efeito semelhante.
2.36.
Liberdade de associação:
Quando em causa descontos a favor de associações, deve-se atentar para a garantia do art. 5º, XX, CF:
"
Ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado
."
No dizer de Ingo W. Sarlet,
"A liberdade de associação abarca toda e qualquer forma associativa, incluindo, além das cooperativas (expressamente contempladas pelo texto constitucional), as associações comerciais, de natureza cultural, esportiva etc., não importando a nomenclatura, de modo a assegurar uma proteção mais ampla possível da liberdade."
(SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.
Curso de direito constitucional.
3. ed. rev. ampl. São Paulo: RT, p. 520).
Ainda segundo Sarlet,
"Outro problema constantemente debatido diz respeito à dimensão negativa da liberdade de associação, mais precisamente, da possibilidade de a lei exigir que os integrantes de algumas categorias se vinculem a determinadas entidades setoriais (p.ex., Conselhos de Medicina, Odontologia, Engenharia, Advogados etc.), mas o pressuposto para a legitimidade constitucional de tal exigência é a de que a associação exerça uma função pública, para cujo funcionamento a filiação constitui exigência."
(SARLET, Ingo Wolfgang
et al
.
Obra citada,
p. 526).
Logo, a associação é projeção de um direito potestativo: a escolha de se vincular a uma agremiação, o que encontra paralelo no direito de desvincular-se, sendo o caso.
2.37.
Eventual contrato de cartão de crédito consignado:
Sabe-se, ademais, que o contrato de administração de cartão de crédito está orientado a facilitar as transações comerciais, antecipando-se renda futura. Com isso, os sujeitos podem parcelar suas compras, celebrar transações internacionais e consolidar pagamentos.
Como diz Efing,
"
Utilizado como uma forma de facilitar o funcionamento de operações de natureza comercial, o cartão de crédito encerra em seu conteúdo a articulação de três peças fundamentais concernentes às relações levadas a efeito em sua dinâmica funcional
. Tais peças, reconhecidas como pessoas integrantes do sistema de cartões de crédito, na doutrina recebem, cada qual, sua respectiva denominação: emissor, titular do cartão e fornecedor. O emissor, cumprindo com a promessa de intermediar a relação de compra e venda entre o titular do cartão de crédito e o fornecedor, aparece como uma pessoa jurídica dedicada à atividade financeira. No âmbito do cartão de crédito, o emissor facilita a venda ao titular, emitindo o cartão. Esse ato, portanto, credencia o portador (titular do cartão de crédito) à aquisição de mercadorias e serviços junto aos fornecedores afiliados."
(EFING, Antônio.
Contratos e procedimentos bancários à luz do código de defesa do consumidor
. São Paulo: RT. 2015. tópico 6.7.).
Acrescente-se que,
"de modo contrário do que se pode imaginar, o titular beneficiário do cartão de crédito, se dele fizer uso para adquirir produtos ou serviços junto aos fornecedores, não se responsabiliza pelo pagamento frente aos fornecedores. É ao emissor do cartão que se atribui a responsabilidade de pagar aos fornecedores o montante deliberado pelo usuário do cartão, vindo posteriormente a ser reembolsado pelo usuário.
O contrato de cartão de crédito autoriza ao consumidor titular do cartão efetuar pagamentos com o limite de crédito aberto pelo fornecedor emissor, podendo o consumidor restituir ao emissor a importância paga em determinada data aprazada ou parceladamente, mediante, neste caso, o pagamento de juros decorrentes do crédito cedido
."
(EFING.
Obra citada.
tópico 6.7).
Desse modo, o contrato de cartão de crédito é celebrado entre a instituição administradora e o(a) interessado(a). A instituição se obriga a lhe conceder crédito, encaminhando-lhe faturas periódicas para pagamento, ao tempo em que o tomador do empréstimo se obrigada a reembolsar o valor emprestado, com os juros contratados, além de se obrigar a pagar taxas administrativas decorrente do uso do cartão. A administradora do cartão torna0-se, assim, uma intermediária na relação entre o usuário e as empresas que tenham aceitado aludido instrumento para pagamento de seus produtos e bens. Segundo súmula 283, STJ, tais entidades são equiparadas a instituições financeiros, muito embora não criem "moeda escritural" - o que ocorre corriqueiramente com bancos, ao receberem recursos em depósito e repassarem a tomadores de empréstimo. Isso pode ensejar a aplicação da
súmula 596, STF, por conta da conjugação do decreto 22.626/1933 com a lei n. 4.595/1964
.
Destaco que
"
cabe ao consumidor o pagamento dos débitos por ele contraídos com a utilização do cartão, obrigando-se ao pagamento da fatura. Todavia, não raro nas faturas de cartão de crédito constam valores indevidamente lançados, bem como são comuns as cláusulas abusivas nos contratos de cartão de crédito
. Podem ser encontradas, entre outras, as seguintes cláusulas: outorga de poderes para, junto à instituição financeira de escolha do emissor fornecedor, por conta do consumidor, negociar e obter crédito; bem como poderes para assinar o aludido contrato de financiamento, abrir conta-corrente em banco, assinar títulos representativos do débito do consumidor, inclusive notas promissórias, acertar prazos, juros, comissões e encargos; em caso de perda, furto ou roubo do cartão de crédito, mesmo que este tenha sido cancelado automaticamente, responderá o consumidor por débitos oriundos do mau uso do cartão decorrente da perda, furto ou roubo. Tais cláusulas, inseridas no contrato de adesão, ao desobrigarem o emissor fornecedor e colocarem o consumidor em situação excessivamente desvantajosa, são nulas de pleno direito, por afrontarem o sistema de proteção do consumidor."
(EFING.
Obra citada.
tópico 6.7).
Ademais, também é importante ter em conta que,
"
atualmente pode-se aderir a um contrato de cartão de crédito enquanto se abastece um automóvel num posto de serviço e revenda de combustíveis, por exemplo, sendo que nesta e em outras situações semelhantes o consumidor sequer é esclarecido das condições básicas do contrato, não chegando a analisar suas cláusulas.
O consumidor termina por assinar a proposta para a contratação do cartão de crédito e vem a receber pelo correio a confirmação da contratação sem, muitas vezes, receber da instituição financeira ou administradora as informações e esclarecimentos minimamente necessários ao suficiente cumprimento do dever de informação."
(EFING.
Obra citada.
tópico 6.7).
Quanto aos requisitos de validade do cartão, registro:
"a) Requisitos subjetivos – Em relação ao titular, este poderá ser pessoa física ou jurídica. Sendo pessoa física, deverá ser civilmente capaz. Se pessoa jurídica, deve funcionar regularmente, ou seja, deverá ter sido constituída e funcionar de acordo com a Lei. Uma sociedade de fato não poderá ser titular de cartão de crédito. Apenas seus sócios poderão sê-lo.
Quanto ao emissor, deverá ser pessoa jurídica autorizada a emitir e administrar cartões de crédito. Pode ser instituição financeira ou não e servirá de intermediário entre o titular e os fornecedores, para que se opere entre eles a compra e venda de bens ou serviços
.
Por fim, o fornecedor poderá ser pessoa física ou jurídica, credenciada junto ao emissor, para oferecer seus bens ou serviços aos titulares do cartão. Se pessoa física, deverá ser civilmente capaz. Se pessoa jurídica deverá funcionar dentro dos parâmetros legais.
b) Requisitos objetivos –
O objeto do contrato é, em última instância, o financia- mento da aquisição de bens e/ou serviços, que deverão ser possíveis tanto do ponto de vista material quanto jurídico. Não se pode comprar um lugar no céu com cartão, nem tampouco cocaína, pelo menos aqui no Brasil
.
c) Requisitos formais – Quanto à forma, já vimos que o contrato de cartão de crédito é consensual, em respeito ao princípio do consensualismo. Na prática, porém, é sempre celebrado por escrito, sendo tipicamente de adesão." (FIUZA, César.
Direito civil:
curso completo. SP: SP. 2015).
2.38. Contrato de mútuo feneratício:
Sabe-se que o empréstimo é um contrato em regra unilateral, gratuito, real e personalíssimo em que uma das partes recebe, para usar ou consumir, uma coisa que, depois de certo tempo, deve restituir ou – no caso de ser fungível o objeto – restituir por outra do mesmo gênero, quantidade e qualidade. Sua função econômica está em propiciar, para aquele que não é dono do que necessita, o uso (em regra, mas também a fruição, excepcionalmente) do que lhe pode ser disponibilizado, para a finalidade almejada. As modalidades de empréstimo são o comodato e o mútuo.
O comodato é o empréstimo de bens infungíveis. Nesse contrto, não há transmissão da propriedade do objeto emprestado, devendo-se o comodatário restituir ao comodante - ou seja, o proprietário do bem - exatamente a mesma coisa emprestada, devidamente preservada. Caso não a restitua, por dolo, pode responder por apropriação indébita - art. 168, Código Penal.
Já o mútuo cuida do empréstimo de bens fungíveis. Nesse caso, o objeto do contrato é consumido, em regra, pelo mutuário. Ao receber o objeto, ele se torna seu dono, ao tempo em que se torna devedor do mutuante. Fica obrigada a lhe entregar coisa do mesmo gênero, espécie, com eventuais juros remuneratórios, se pactuados (nesse caso, o mútuo será feneratício). O inadimplemento da obrigação não caracteriza apropriação indébita - dado que o mútuo transmite a propriedade por época da tradição (entrega) do objeto emprestado ao mutuário. Contudo, o mutuário poderá ser demandado, exigindo-se o pagamento do valor pertinente, com os juros remuneratórios, juros moratórios, correção monetária e eventuais multas, quando pactuados.
A diferença entre comodato e mútuo pode ser compreendida da seguinte forma. Se alguém empresta um veículo para uma empresa (comodato) e a empresa acaba falindo, pode requerer a restituição do bem específico, que lhe pertence, ainda que se encontre mantido indevidamente no pátio da massa falida
. Caso, porém, tenha emprestado dinheiro em espécie para essa mesma empresa (ou seja, bem fungível), não poderá requerer que lhe seja entregue a quantia específica - com mesmo número de série das notas emprestadas -, desde logo, ao argumento de ser sua tal quantia. Nesse caso, trata-se de crédito, oponível ao patrimônio da massa falida, devendo se habilitar em lista de credores.
Atente-se para os arts. 586 e 587, Código Civil/2002:
"O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade.
Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição
."
Menciono ainda o que segue:
"
O contrato de mútuo é a modalidade de empréstimo prevista no art. 586 do CC/2002 e seguintes, e diferencia-se do comodato quanto à natureza da coisa em- prestada. Enquanto no comodato se dá o empréstimo de coisa não fungível para uso e posterior devolução (art. 579 do CC/2002 ), no mútuo se dá o empréstimo coisa fungível a fim de que seja consumida e posteriormente substituída por coisa de mesma espécie ou gênero, qualidade e quantidade. Assim dispõe o art. 586
: “Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade”.
A fungibilidade de determinado bem é constatada no caso concreto, mas o Código Civil de 2002 oferece alguns critérios: “Art. 85. São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Art. 86. São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação”.
Nas palavras de Sérgio Covello: “Há mútuo, ou empréstimo de consumo, toda vez que uma parte entrega à outra certa quantidade de coisas fungíveis, que esta última fica autorizada a consumir, arcando com a obrigação de restituir no tempo avençado, não as mesmas coisas, mas em quantidade, gênero e qualidade equivalentes”. Ou, como define Maria Helena Diniz, “o mútuo é o contrato pelo qual um dos contraentes transfere a propriedade de bem fungível a outro, que se obriga a lhe restituir coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade (art. 586 do CC/2002 )”.
Conforme o art. 587 do CC/2002 , o mútuo é um contrato real, visto que somente se aperfeiçoa com a tradição da coisa fungível: “Art. 587. Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição”. A relação contratual, assim, somente se tem por formada com a transferência da propriedade do bem fungível, a fim de que seja consumido e, ao final, substituído por outro.
Sendo a tradição requisito para a formação do contrato de mútuo, a entrega da coisa fungível pelo mutuante (aquele que dá a coisa fungível em empréstimo) é apenas um ato de aperfeiçoamento do contrato, não uma obrigação. Como esclarece Carlos Roberto Gonçalves: “a traditio é, pois, requisito de constituição da relação contratual, sem a qual há apenas promessa de mutuar (pactum de mutuo dando), contrato preliminar que se não confunde com o próprio mútuo”. Uma vez aperfeiçoado o contrato pela tradição da coisa, ali se esgota a atuação do mutuante e, em regra, apenas o mutuário (aquele que toma a coisa em empréstimo) contrai obrigações, como a devolução de coisa de mesmo gênero, quantidade e qualidade. O mútuo também é, desta forma, um contrato unilateral." (
EFING, Antônio.
Contratos e procedimentos bancários à luz do código de defesa do consumidor
. SP: RT. 2015. item 5.4.).
2.40.
Consignação em pagamento - desconto em folha:
Deve-se ter em conta, ademais, o
art. 115, lei n. 8.213
, de 1991, com a redação dada pela lei nº 13.846, de 2019, ao preconizar que podem ser desbastados dos benefícios pagos pelo INSS os valores pagos a maior do que o devido.
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: (...) II -
pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento
;
(...) VI -
pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, ou por entidades fechadas ou abertas de previdência complementar, públicas e privadas, quando expressamente autorizado pelo beneficiário, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor do benefício, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para
: (Redação dada pela Lei nº 13.183, de 2015)
a) a
mortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito
; ou (Redação dada pela Lei nº 13.183, de 2015)
b) utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Quando em causa consignação em pagamento de contratos de mútuo, exige-se que o segurado autorize aludida averbação, mediante instrumento contratual. Eventuais vícios no consentimento - erro, dolo, coação, vício redibitório, teoria da lesão etc - comprometem a validade da averbação.
Desse modo, sempre que evidenciados vícios no alegado negócio jurídico, o Poder Judiciário deverá assegurar o retorno ao
status quo ante,
o que implica a restituição ao segurado dos valores descontados indevidamente no seu benefício previdenciário. Caso tenham sido depositados valores indevidos na conta do pretenso mutuário, a quantia deverá ser restituída ao agente financeira, na forma do art. 884, Código Civil/2002 e art. 169, Código Penal, exceção feita aos casos em que o valor tenha sido depositado sem conhecimento do segurado, tendo sido gasto com boa-fé, sem perceber o equívoco cometido.
Atente-se para a lógica dos seguintes julgados:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II -
Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração
. III - Recurso Especial não provido.
(REsp 1550569/SC, STJ, 1ª Turma, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, DJe 18-05-2016)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1.
Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido
.
(REsp 1553521/CE, STJ, 2ª Turma, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 02-02-2016)
2.41. Requisitos da responsabilização civil - exame precário:
Como sabido, o tema da responsabilidade civil pode ser distribuído em dois grandes blocos: (a) a responsabilidade por condutas ilícitas, em sentido amplo, e (b) também responsabilidade por comportamentos lícitos.
No primeiro caso - isto é, a responsabilização por condutas ilícitas - tem-se o que se costuma chamar de responsabilidade subjetiva ou de responsabilidade fundada na culpa (responsabilidade civil aquiliana e a responsabilidade civil por violação do contrato).
Todo aquele que cause dano a terceiros, mediante violação de cláusula contratual ou violação da lei, tem o dever de indenizar, como evidenciam os arts. 186-187, Código Civil:
"Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."
Segundo o art. 187,
"
Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes
."
Nesse âmbito, a responsabilização demanda os seguintes requisitos:
"A caracterização genérica do ato ilícito absoluto (ato ilícito stricto sensu), segundo a definição legal do art. 186,
exige a conjugação de elementos objetivos e subjetivos
: I - os requisitos objetivos são - a) a conduta humana antijurídica; b) o dano; c) o nexo de causalidade entre a conduta humana e o dano. II - os requisitos subjetivos são - a) a imputabilidade e b) a culpa em sentido estrito (dolo ou culpa em sentido estrito)."
(THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Comentários ao código civil.
Vol. III. Arts. 185 a 232. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 31)
Já o art. 187, CC/2002, trata da figura do abuso de direito. Ainda segundo a lição de Humberto Teodoro Jr.,
"
O titular de qualquer direito para conservar-se no campo da normalidade não basta legitimar sua conduta dentro das faculdades reconhecidas pelas normas legais em face de sua individual situação jurídica. Haverá de cuidar para que o uso das prerrogativas legais não se desvie para objetivos ilícitos e indesejáveis, dentro do contexto social
. O abuso de direito acontecerá justamente por infringência desse dever e se dará sempre que o agente invocar uma faculdade prevista em lei, aparentemente de forma adequada, mas para alcançar objetivo ilegítimo ou não tolerado pelo consenso social."
(THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Obra citada,
p. 113).
Por conseguinte, o art. 187, CC/02, impõe certos temperamentos à ideia de 'direito subjetivo', compreendido formalmente (isto é, compreendido como uma absoluta faculdade de agir, franqueada pela lei). Não basta apenas a adequação à norma legal, exigindo-se também certa proporcionalidade, um uso comedido e adequado das prerrogativas asseguradas pelo ordenamento jurídico. O STJ já reconheceu como abuso de direito, por exemplo, a conduta do agente bancário que, invocando cláusula contratual, satisfaz seu crédito utilizando recursos mantidos pelo correntista e destinados ao pagamento dos seus empregados (STJ,
REsp. 250.523
, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar p. DJ 18/12/2000). Ou seja, a despeito de haver cláusula contratual prevendo-a, a conduta seria viciada por destoar de um uso comedido, razoável, do direito.
Os requisitos para o reconhecimento do abuso de direito são os seguintes:
"Partindo da definição legal do exercício abusivo de um direito como ato ilícito (art. 187), teremos os seguintes requisitos como necessários à sua configuração: a) conduta humana, b) exercício de um direito subjetivo, c) exercício desse direito de forma emulativa (ou, pelo menos, culposa), d) dano para outrem, e) ofensa aos bons costumes e à boa fé; ou f) prática em desacordo com o fim social ou econômico do direito subjetivo."
(THEODORO JÚNIOR, H.
Obra cit.
p. 120-121).
Esses são os contornos, grosso modo, da responsabilização por comportamentos inválidos (ilícitos ou que violem regras contratuais). Por outro lado, a
responsabilidade por condutas lícitas
corresponde, em síntese, à responsabilidade fundada no incremento do risco (p.ex., art. 14 da lei 6938 e também à responsabilidade objetiva estatal, prevista no art. 37, §6º, CF/88).
Ora, a responsabilidade pelo incremento do risco diz respeito àquelas atividades que - conquanto lícitas - ensejam um grau maior de contingências para a vida em comum. Nesse âmbito, portanto, busca-se simplesmente uma internalização das externalidades provocadas pela atividade econômica, a fim de que o poluidor arque com os resultados do seu extrativismo ou industrialização.
Essa responsabilização pelo risco está prevista, por exemplo, no art. 14, §1º, lei 6.938/1981; no art. 927, parágrafo único, Código Civil e - destaque-se - também art. 225, §§2º e 3º, Constituição/1988.
Há a responsabilização objetiva do Estado, prevista no art. 37, §6º, CF. Cuida-se de simples decorrência do postulado da isonomia (igual distribuição do custeio público).
"A atividade administrativa exerce-se no interesse de todos; se os danos que daí resultam para alguns não fossem reparados, eles seriam sacrificados à coletividade, sem que nada pudesse justificar semelhante discriminação. A indenização restabelece o equilíbrio afetado em seu detrimento."
(RIVERO, Jean.
Direito administrativo.
Coimbra: Almedina, 1981, p. 305).
Menciono também a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello:
"No caso de comportamentos lícitos, assim como na hipótese de danos ligados a situação criada pelo Poder Público - mesmo que não seja o Estado o próprio autor do ato danoso -,
entendemos que o fundamento da responsabilidade estatal é garantir uma equânime repartição dos ônus provenientes de atos ou efeitos lesivos
, evitando que alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião ou por causa de atividades desempenhadas no interesse de todos. De conseguinte, seu fundamento é o princípio da igualdade, noção básica do Estado de Direito."
(MELLO, Celso Antônio Bandeira de.
Curso de direito administrativo.
17. ed. SP: Malheiros, 2004, p. 890)
2.42. Responsabilização estatal por condutas omissivas:
Note-se, todavia, que o Estado não pode ser imaginado como uma espécie de resseguro universal. Ainda que, na atualidade, a noção de Estado de Bem Estar Social deva ser privilegiada e haja quem imagine que a Administração Pública deva garantir até mesmo a felicidade individual (p.ex., projeto de emenda à Constituição n. 10, proposto pelo Senador Cristóvam Buarque), não há como obrigá-la a reparar toda sorte de infortúnios a que todos estamos sujeitos.
Daí que é salutar atentar, em um primeiro exame, para a diferença de tratamento a ser dispensada entre condutas omissas e comissivas da Administração Pública. Cuidando-se de atuação ativa que cause prejuízos aos administrados, aplica-se, em regra, o art. 37, §6º, CF (responsabilidade objetiva), o que comporta pontuais exceções, mesmo nesse âmbito, a exemplo da conduta ativa da Administração que, no afã de salvar alguém que se encontra em um veículo trancado, se vê obrigada a destruir a porta do automóvel, caso em que, por óbvio, a reparação dos danos será incabível. Tratando-se de conduta omissiva, por parte da Administração, a responsabilidade apenas será cabível se provado, pelo interessado, que a omissão teria se dado de modo ilícito.
Do contrário, todos quanto tenham algum bem subtraído, mediante furto ou roubo, nas rodovias e logradouros públicos, poderiam processar o Estado, dado que lhe cabe garantir a segurança. Todos quanto sejam lesados, de algum modo, seriam então declarados credores de quantias junto aos cofres públicos. No afã de impedir tais lesões, o Estado teria que se converter em um mecanismo absolutamente autoritário, com controles totais sobre a vida dos indivíduos. A ocorrência de danos infelizmente é uma inexorável consequência do convívio de pessoas com certo grau de liberdade. Com isso não se faz pouco caso dos prejuízos suportados pelo demandante. Não! Mas, ao mesmo tempo, enfatiza-se que os responsáveis pelo furto é que hão de reparar os danos, tão logo sejam identificados.
O prof. Celso Bandeira de Mello, já aludido acima, argumenta que
"Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conseqüências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberando propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva."
(MELLO, Celso Antônio Bandeira de.
Obra citada.
p. 981).
Não se pode perder de vista, porém, o confronto entre a
omissão genérica e a omissão específica do Estado
; tratando-se em omissão específica quando
“o Estado, por omissão sua, cria a situação propícia para a ocorrência do evento em situação em que tinha o dever de agir para impedi-lo.”
(CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 231). Desse modo,
"Se o motorista embriagado atropela e mata pedestre que está na beira da estrada, a Administração (entidade de trânsito) não poderá ser responsabilizada pelo fato de estar esse motorista ao volante sem condições. Isso seria responsabilizar a Administração por omissão genérica. Mas se esse motorista, momentos antes, passou por uma patrulha rodoviária, teve o veículo parado, mas os policiais, por alguma razão, deixaram-no prosseguir viagem, aí já haverá omissão específica que se erige em causa adequada do não-impedimento do resultado. Nesse segundo caso haverá responsabilidade objetiva do Estado."
(CAVALIERI FILHO, Sérgio.
Obra citada.
p. 231).
Por conseguinte, em caso de alegada omissão estatal, impõe-se ao interessado o ônus de comprovar uma atuação dolosa ou negligente da Administração Pública, conforme art. 373, I, CPC, exceção feita aos casos de omissão específica, em que a responsabilidade objetiva soa cabível. Com efeito,
"A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que "a responsabilidade civil do estado por condutas omissivas é subjetiva, sendo necessário, dessa forma, comprovar a negligência na atuação estatal, o dano e o nexo causal entre ambos"
(STJ, AgRg no AREsp 501.507/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, DJe de 02/06/2014). Em igual sentido: STJ, REsp 1.230.155/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 17/09/2013 e AGRESP 201202023900, ASSUSETE MAGALHÃES, DJE 02/12/2015.
Atente-se também para os julgados abaixo transcritos:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÃO GENÉRICA. SÚMULA 284/STF. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. OMISSÃO. NEXO DE CAUSALIDADE. DANOS MORAIS E MATERIAIS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. A alegação genérica de violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, sem explicitar os pontos em que teria sido omisso o acórdão recorrido, atrai a aplicação do disposto na Súmula 284/STF. 2.
Nos termos da jurisprudência do STJ, a responsabilidade civil do estado por condutas omissivas é subjetiva, sendo necessário, dessa forma, comprovar a negligência na atuação estatal, o dano e o nexo causal entre ambos
. 3. O Tribunal de origem, com base no conjunto fático probatório dos autos, expressamente consignou que "restou evidente o nexo de causalidade entre a omissão do ente municipal e o evento danoso". 4. Dessa forma, não há como modificar a premissa fática, pois para tal é indispensável o reexame do contexto fático-probatório dos autos, o que é vedado por esta Corte, pelo óbice da Súmula 7/STJ. Agravo regimental improvido. ..EMEN:
(AGARESP 201400845416, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:02/06/2014 ..DTPB:.)
"(...) 7. É fato que a doutrina atual orienta-se no sentido de que a responsabilidade civil do Estado somente é objetiva quanto a atos comissivos praticados por seus agentes ou prepostos.
Quando, todavia, se trata de conduta omissiva, para que se caracterize a responsabilidade estatal, é mister que se demonstre, além do dano causado à vítima e o respectivo nexo causal, o dolo ou culpa do representante do Estado que tinha o dever de agir de modo a impedir a ocorrência do evento danoso (falta do serviço). Precedentes jurisprudenciais. 8. A responsabilidade civil por omissão de atos da Administração Pública é subjetiva, hipótese em que a culpa passa a se constituir em pressuposto da responsabilidade, não se aplicando, assim, a regra do art. 37, § 6º, da CF. 9. Ou seja, admitindo-se a responsabilidade objetiva em hipóteses que tais, o Estado seria um segurador universal, o que não se entremostra razoável
. 10. A doutrina e a jurisprudência mais recente, todavia, vem gradativamente adotando, quando se trata de danos da Administração Pública por omissão, o entendimento de que existe uma clara distinção entre omissão específica e omissão genérica. 11.
A omissão é específica quando o Estado tem a obrigação de evitar o dano. Um exemplo desse tipo de omissão são os bueiros destampados, que ocasionam a queda de uma pessoa, provocando-lhe danos físicos. Quando há responsabilidade civil por omissão específica, o Estado responde objetivamente, conforme o art. 37, § 6º, da CF
. 12.
Há situações outras, todavia, que é impossível ao Estado impedir, através de seus agentes, eventuais danos aos seus administrados. Por exemplo, o de lesões sofridas por atos de vandalismo de terceiros, em estádios de futebol. Nesses casos, se diz que a omissão é genérica e a responsabilidade do Poder Público é subjetiva, havendo a necessidade de se aferir a culpa
. 13. Além disso, quando não for possível identificar o agente que causou o dano, caberá à vítima comprovar que não houve serviço, que o serviço funcionou mal ou que foi ineficiente. É o que se denomina responsabilidade civil por culpa anônima do serviço, outra modalidade de responsabilidade subjetiva da Administração Pública. 14. Destarte, em se tratando de omissão genérica do serviço ou quando não for possível identificar um agente público responsável, a responsabilidade civil do Estado será sempre subjetiva, não se aplicando a essas hipóteses a teoria objetiva do risco administrativo. Precedentes desta Corte. 15. O caso dos autos é a típica responsabilidade do Estado por omissão. (...)" (APELREEX 00174935819874036100, JUIZ CONVOCADO ALEXANDRE SORMANI, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/10/2009 PÁGINA: 200 ..FONTE_REPUBLICACAO:., omiti parte da ementa)
RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - ANIMAIS NA PISTA - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA - CULPA - RODOVIA COMUM. Nas rodovias comuns - ao contrário do que se dá nas auto-estradas, destinadas ao trânsito de alta velocidade, onde as exigências de segurança são naturalmente mais acentuadas e, por isso, a vigilância deve ser mais rigorosa - é virtualmente impossível impedir o ingresso de animais na pista, durante as vinte e quatro horas de dia.
A responsabilidade do Estado quando o dano resulta de suposta omissão - falta de serviço - obedece a teoria subjetiva e só se concretiza mediante prova da culpa, isto é, do descumprimento do dever legal de impedir o evento lesivo. O Estado não é segurador universal: sem a prova da conduta omissiva censurável, tendo em conta o tipo de atuação que seria razoável exigir, não há como responsabilizar o poder público
.
(AC 9704012225, AMIR JOSÉ FINOCCHIARO SARTI, TRF4 - TERCEIRA TURMA, DJ 17/09/1997 PÁGINA: 75102.)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – BANCO CENTRAL DO BRASIL – RESPONSABILIDADE CIVIL – LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL – PREJUÍZOS FINANCEIROS – INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO BACEN – CONDUTA OMISSIVA 1. Apelação em face de r. sentença que julgou improcedente o pedido de ressarcimento, pelo Banco Central do Brasil (BACEN), de prejuízos sofridos pelos autores, em razão de suposta omissão por parte da autarquia em fiscalizar instituição financeira na qual eles depositaram recursos financeiros, e que sofreu liquidação extrajudicial. 2. O BACEN não foi o responsável pela conduta que levou à decretação da liquidação extrajudicial na cooperativa na qual os autores depositaram seus recursos, e a liquidação extrajudicial, por si só, não gera o dever da Autarquia de indenizar aqueles que foram prejudicados pela má administração. 3. A responsabilidade do Estado por ato omissivo é responsabilidade por comportamento ilícito, sendo responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia. 4.
O Poder Público não é segurador automático de investimento de risco, não assumindo a obrigação de indenizar o investidor prejudicado pela má administração do fundo
. 5. O risco do negócio há de ser suportado pelos investidores, e o Poder Público não assume a condição de garantidor dos negócios firmados por aqueles. 6. Precedentes deste Eg. TRF da 2a Região (AC n° 96.02.41250-0/RJ) e do Eg. TRF da 4a Região (AC 95.04.60816-7). 7. Apelação a que se nega provimento.
(AC 00414456920014020000, RALDÊNIO BONIFACIO COSTA, TRF2.)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – BANCO CENTRAL DO BRASIL – RESPONSABILIDADE CIVIL – LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL – PREJUÍZOS FINANCEIROS – INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO BACEN – CONDUTA OMISSIVA 1. Apelação em face de r. sentença que julgou improcedente o pedido de ressarcimento, pelo Banco Central do Brasil (BACEN), de prejuízos sofridos pelos autores, em razão de suposta omissão por parte da autarquia em fiscalizar instituição financeira na qual eles depositaram recursos financeiros, e que sofreu liquidação extrajudicial. 2. O BACEN não foi o responsável pela conduta que levou à decretação da liquidação extrajudicial na cooperativa na qual os autores depositaram seus recursos, e a liquidação extrajudicial, por si só, não gera o dever da Autarquia de indenizar aqueles que foram prejudicados pela má administração. 3.
A responsabilidade do Estado por ato omissivo é responsabilidade por comportamento ilícito, sendo responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia
. 4. O Poder Público não é segurador automático de investimento de risco, não assumindo a obrigação de indenizar o investidor prejudicado pela má administração do fundo. 5. O risco do negócio há de ser suportado pelos investidores, e o Poder Público não assume a condição de garantidor dos negócios firmados por aqueles. 6. Precedentes deste Eg. TRF da 2a Região (AC n° 96.02.41250-0/RJ) e do Eg. TRF da 4a Região (AC 95.04.60816-7). 7. Apelação a que se nega provimento.
(AC 00032248020024020000, RALDÊNIO BONIFACIO COSTA, TRF2.)
2.43. Caracterização de danos
materiais:
O dano material compreende o desfalque do patrimônio do ofendido, a ser traduzido em pecúnia. Ele pode ser reconduzido ao dano emergente (montante que a vítima efetivamente perdeu) e o lucro cessante (aquilo que ela deixou de lucrar).
Colho a lição de Humberto Theodoro Júnior:
"O
dano emergente é mais facilmente quantificável
. Resume-se a uma avaliação do patrimônio lesado, antes e depois do ato ilícito. Já no caso de lucros cessantes, a situação é mais delicada, pois é preciso determinar que vantagens esperadas efetivamente o ilícito impediu a vítima de perceber. Não se pode levar o ressarcimento a cobrir expectativas remotas de lucros e vantagens que poderiam ou não acontecer, no futuro.
O lucro cessante tem de ser visto como lucro certo, em função do quadro afetado pelo ato ilícito. Deve corresponder a consequência imediata da paralisação de um negócio lucrativo que a vítima explorava, ou a frustração do rendimento que era razoavelmente esperado do bem lesado.
Para evitar pretensões quiméricas, o art. 403 do novo Código, na tradição do art. 1059 do Código anterior, determina que a reparação dos lucros cessantes só compreenda o que a vítima razoavelmente deixou de lucrar. Com isso se impede a vítima do ato ilícito de afastar-se dos critérios objetivos e navegar nas águas do meramente hipotético ou imaginário.
A indenização terá de ser fixada à luz do bom senso e do razoável, sempre a partir de dados concretos e não de simples suposições. É por isso que o art. 403 completa o enunciado do art. 402, que fala em reparação para o que a vítima razoavelmente deixou de lucrar, acrescentando que os lucros indenizáveis são apenas os que cessaram por efeito direto e imediato da inexecução da obrigação (i.e., do ato ilícito).
Em suma, nem o dano material, nem os lucros cessantes, podem ser deferidos sob condição de apuração futura em liquidação. A parte que pleiteia reparação tem de prová-los adequadamente, antes da condenação, mesmo que essa seja genérica." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Comentários ao código civil.
Vol. III. Arts. 185 a 232. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 36-37)
Por sinal, a lei processual civil veda a prolação de sentenças condicionadas (art. 460, parágrafo único, CPC); ao mesmo tempo em que também veda ao demandante a formulação de pedidos genéricos, com as exceções verbalizadas no art. 286, CPC.
Convém apenas destacar que a lei não vaticina a pretensão à percepção de lucros cessantes de caráter hipotético:
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO - ACIDENTE SOFRIDO NO INTERIOR DE HOSPITAL PÚBLICO - DANOS MATERIAIS E MORAIS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE - INDENIZAÇÃO INDEVIDA. 1- A responsabilidade objetiva independe da comprovação de culpa ou dolo, ou seja, basta estar configurada a existência do dano, da ação ou omissão e do nexo de causalidade entre ambos (art. 37, §6º, da CF/88). 2 - Ante o conjunto probatório trazido aos autos, ausente, na hipótese, nexo de causalidade entre o acidente que provocou o ferimento na Autora e qualquer ato omissivo ou comissivo por parte da Administração. 3 -
Não restando nos autos qualquer despesa ou ônus de origem material, deve ser afastada a indenização por dano material, pois, para ser indenizável, o dano deve ser certo, não sendo passíveis de indenização os danos hipotéticos
. 4 - Ante a ausência do nexo de causalidade, incabível também a indenização por danos morais. 5 - Apelação improvida. Sentença confirmada. (AC 200751010001080, Juiz Federal WILSON JOSE WITZEL, TRF2 - SEXTA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data::24/03/2010 - Página::307/308.)
D'outro tanto, a teoria da perda de uma chance tem origem na França (
perte d’une chance),
nos idos de 1950, conquanto já houvesse sido reconhecida no caso inglês Chaplin
versus
Hicks, de 1911.
Segundo Sérgio Cavalieri,
"
caracteriza-se essa perda de uma chance quando, em virtude da conduta de outrem, desaparece a probabilidade de um evento que possibilitaria um benefício futura para a vítima, como progredir na carreira artística ou militar, arrumar um melhor emprego, deixar de recorrer de uma sentença desfavorável pela falha do advogado, e assim por diante
. Deve-se, pois, entender por chance a probabilidade de se obter um lucro ou de se evitar uma perda" (
CAVALIERI FILHO, Sérgio.
Programa de Responsabilidade Civil.
8. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 71).
Trata-se, pois, de um exame estocástico, estatístico.
Em princípio, não há como se obrigar alguém a responder poder eventos futuros e incertos. Exagerando, para melhor compreender: alguém subtrai, da vítima, o valor de R$ 2,00. Ele ingressa em Juízo, dizendo que iria utilizar aquele recurso para jogar na mega-sena, com a chance de se tornar milionário, exigindo a reparação do dano na sua totalidade.
Por óbvio que não se pode imputar ao causador do dano o dever de responder por consequências incertas e improváveis. Situação obviamente diversa ocorre quando o único candidato de um concurso público, selecionado para a última etapa, já tendo demonstrado expertise nas fases anteriores, é impedido de realizar a última prova por conta de um acidente de trânsito.
O Superior Tribunal de Justiça tem enfatizado o seguinte:
RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PERDA DE UMA CHANCE. DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE COLETA DE CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS DO CORDÃO UMBILICAL DO RECÉM NASCIDO. NÃO COMPARECIMENTO AO HOSPITAL. LEGITIMIDADE DA CRIANÇA PREJUDICADA. DANO EXTRAPATRIMONIAL CARACTERIZADO. 1. Demanda indenizatória movida contra empresa especializada em coleta e armazenagem de células tronco embrionárias, em face da falha na prestação de serviço caracterizada pela ausência de prepostos no momento do parto. 2. Legitimidade do recém nascido, pois "as crianças, mesmo da mais tenra idade, fazem jus à proteção irrestrita dos direitos da personalidade, entre os quais se inclui o direito à integralidade mental, assegurada a indenização pelo dano moral decorrente de sua violação" (REsp. 1.037.759/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 05/03/2010). 3.
A teoria da perda de uma chance aplica-se quando o evento danoso acarreta para alguém a frustração da chance de obter um proveito determinado ou de evitar uma perda. 4. Não se exige a comprovação da existência do dano final, bastando prova da certeza da chance perdida, pois esta é o objeto de reparação
. 5. Caracterização de dano extrapatrimonial para criança que tem frustrada a chance de ter suas células embrionárias colhidas e armazenadas para, se for preciso, no futuro, fazer uso em tratamento de saúde. 6. Arbitramento de indenização pelo dano extrapatrimonial sofrido pela criança prejudicda. 7. Doutrina e jurisprudência acerca do tema. 8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. ..EMEN: (RESP 201102672798, PAULO DE TARSO SANSEVERINO, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:01/10/2014 ..DTPB:.)
(...) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PREJUÍZOS DECORRENTES DE DESAPROPRIAÇÃO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1.
A jurisprudência desta Corte admite a responsabilidade civil e o consequente dever de reparação de possíveis prejuízos com fundamento na denominada teoria da perda de uma chance, "desde que séria e real a possibilidade de êxito, o que afasta qualquer reparação no caso de uma simples esperança subjetiva ou mera expectativa aleatória
" (REsp 614.266/MG, DJe de 2/8/2013). 2. Impossível rever a premissa fática fixada pelas instâncias ordinárias por demandar o reexame do acervo fático-probatório dos autos, a atrair o óbice da Súmula 7/STJ. 3. Agravo em recurso especial não provido. ..EMEN: (RESP 201202432776, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, REPDJE DATA:06/03/2014 DJE DATA:24/10/2013)
2.44. Reparação de danos morais - considerações gerais:
O art. 5º, V, CF/1988, preconiza que
"é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem."
Por seu turno, o art. 5º, X, dispõe que
"são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação."
Segundo Ramon Pizarro,
"dano moral é uma modificação desvaliosa do espírito, no desenvolvimento da sua capacidade de entender, querer ou sentir, consequência de uma lesão a um interesse não patrimonial, que haverá de traduzir-se em um modo de estar diferente daquele ao que se encontrava antes do fato, como consequência deste e animicamente prejudicial."
(PIZARRO citado por SANTOS, Antonio Jeová.
Dano moral indenizável.
4. ed. SP: RT, 2003, p. 97).
Como explica o juiz Jeová Santos,
"
Dano é prejuízo. É diminuição de patrimônio ou detrimento a afeições legítimas. Todo ato que diminua ou cause menoscabo aos bens materiais ou imateriais, pode ser considerado dano
. O dano é um mal, um desvalor ou contravalor, algo que se padece com dor, posto que nos diminui e reduz; tira de nós algo que era nosso, do qual gozávamos ou nos aproveitávamos, que era nossa integridade psíquica ou física, as possibilidades de acréscimo ou novas incorporações, como diz Jorge Mosse Iturraspe."
(SANTOS, Antônio Jeová.
Obra citada.
p. 74).
Anote-se, pois, que
nem todo dissabor é suscetível de indenização
. O convívio humano é marcado por maiores ou menores conflitos; há situações que, conquanto desconfortáveis, não ensejam, só por isso, reparação (p.ex., a permanência por vários minutos em uma fila de banco, o tom ríspido com que perguntas são respondidas, sarcasmos ou irritações variadas etc.).
Melhor dizendo,
"
o dano moral não deve ser confundido com os acontecimentos indesejáveis próprios da existência em sociedade, ou seja, não são quaisquer sensações desagradáveis do cotidiano, como também não são os simples aborrecimentos do dia-a-dia, que ensejam a indenização
"
(ARAÚJO, Mariana de Cássia. A reparabilidade do dano moral transindividual in
Revista Jurídica nº 378.
abril/2009, p. 85).
Desse modo,
"conquanto existam pessoas cuja suscetibilidade aflore na epiderme, não se pode considerar que qualquer mal-estar seja apto para afetar o âmago, causando dor espiritual. Quando alguém diz ter sofrido prejuízo espiritual, mas este é consequência de uma sensibilidade exagerada ou de uma suscetibilidade extrema, não existe reparação. Para que exista dano moral é necessário que a ofensa tenha alguma grandeza e esteja revestida de certa importância e gravidade."
(SANTOS, Antônio Jeová.
Obra citada.
p. 111).
Destaco, ademais, o seguinte excerto da obra de Jeová Santos:
"Simples desconforto não justifica a indenização (....) asseveram GABRIEL STIGLITZ e CARLOS ECHEVESTI (responsabilidad civil, p. 24 3), diferente do que ocorre com o dano material, a alteração desvaliosa o bem-estar psicofísico do indivíduo deve apresentar certa magnitude para ser reconhecida como prejuízo moral. Um mal-estar trivial, de escassa importância, próprio do risco cotidiano da convivência ou da atividade que o indivíduo desenvolva, nunca o configurarão (....) O mero incômodo, o desconforto, o enfado decorrentes de alguma circunstância, como exemplificados aqui, e que o homem médio tem de suportar em razão mesmo do viver em sociedade, não servem para que sejam concedidas indenizações.
O dano moral somente ingressará no mundo jurídico, com a subseqüente obrigação de indenizar, em havendo alguma grandeza no ato considerado ofensivo a direito personalíssimo
. Se o ato tido como gerador do dano extrapatrimonial não possui virtualidade para lesionar sentimentos ou causar dor e padecimento íntimo, não existiu dano moral passível de ressarcimento. Para evitar a abundância de ações que tratam de danos morais presentes no foro, havendo uma autêntica confusão do que seja lesão que atinge a pessoa e do que é mero desconforto, convém repetir que não é qualquer sensação de desagrado, de molestamento ou de contrariedade que merecerá a indenização. O reconhecimento do dano moral exige certa envergadura." (SANTOS, Antônio Jeová.
Dano moral indenizável.
4ª ed. rev. SP: RT, 2.003, p. 112 e 113)
Semelhante é a análise de Humberto Theodoro Júnior, quando afirma que
"Se o incômodo é pequeno (irrelevância) e se, mesmo sendo grave, não corresponde a um comportamento indevido (licitude), obviamente não se manifestará o dever de indenizar (ausência da
responsabilidade
civil cogitada no art. 186 do CC)."
(THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Comentários ao código civil.
Vol. III. Arts. 185 a 232. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 44)
Com efeito, não se pode prodigalizar a condenação para pagamento de alegados danos morais. Solução diversa teria o condão apenas de diminuir a própria importância do instituto, banalizando a sua invocação.
Em casos verdadeiramente graves fixam-se valores módicos de indenização, insuscetíveis, concessa vênia, de realmente ressarcir o dano extrapatrimonial (p.ex., o sofrimento da mãe que perdeu um filho em acidente). Justamente por isto, deve-se empregar grande prudência do Judiciário na fixação do dever de indenizar, de modo que não se transforme em uma verdadeira responsabilização objetiva, sem previsão legal.
Reporto-me aos seguintes julgados:
".... I - Como anotado em precedente(REsp 202.504-SP, DJ 1.10.2001), o inadimplemento do contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao outro contratante - e normalmente o traz - trata-se, em princípio, do desconforto a que todos podem estar sujeitos, pela própria vida em sociedade." STJ, REsp 338162, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 18/02/2002, p. 459.
"Para viabilizar a procedência da ação de ressarcimento de prejuízos, a prova da existência do dano efetivamente configurado e pressuposto essencial e indispensável. ainda mesmo que se comprove a violação de um dever jurídico, e que tenha existido culpa ou dolo por parte do infrator, nenhuma indenização será devida, desde que, dela, não tenha decorrido prejuízo." STJ, REsp 20.386, rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJU de 27/06/94, p. 16.894.
De outro tanto, sempre que preenchidos os requisitos para a reparação de danos morais, a indenização deve ser arbitrada com lastro nos seguintes critérios: a) as circunstâncias e peculiaridades do caso; b) a repercussão do ato ilícito; c) a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso; d) o caráter pedagógico da indenização, a ponto de desestimular a prática de novas condutas ilícitas; e, por fim, e) a moderação/proporcionalidade, de modo a se evitar enriquecimento sem causa.
2.45.
Pagamento do
dobro
descontado:
Registro que o CDC não se aplica à relação travada entre o autor e o INSS, dado não serem aplicáveis ao caso o art. 3º e 22, da lei n. 8.078/1990. Note-se que não está em debate neste processo eventual prestação de serviço público remunerado por meio de tarifas. Tanto por isso, não se aplica ao conflito havido entre o autor e o INSS o disposto no art. 42, CDC, que preconiza o direito do consumidor em receber o dobro do que porventura ele tenha pago indevidamente.
Em princípio, mesmo que se supusesse a aplicação do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, ao presente caso, tem-se que
"A lei não pune a simples cobrança (com as exceções que na sequência exporemos). Diz que há ainda a necessidade de queo consumidor tenha pago.
Isto é, para ter direito a repetir o dobro, é preciso que a cobrança seja indevida e que tenha havido pagamento pelo consumidor. A hipótese legal soa estranha, uma vez que não parece normal que alguém que não deva pague novamente
. Mas os pagamentos em função de cobrança indevida não são raros."
(RIZZATTO NUNES.
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 544)
Atente-se para os seguintes julgados, versando sobre o alcance do referido art. 42, CDC:
"(...)
Consoante jurisprudência consolidada desta Corte, a condenação à repetição em dobro do indébito, prevista no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe, além da ocorrência de pagamento indevido, a má-fé do credor
." (RESP 200500278731, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:06/12/2012 ..DTPB:.)
REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ENERGIA ELÉTRICA. DECISÃO RECORRIDA QUE SE ASSENTA EM MAIS DE UM FUNDAMENTO SUFICIENTE E O RECURSO NÃO ABRANGE TODOS ELES. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. ART. 42 DO CDC. IMPOSSIBILIDADE ANTE O RECONHECIMENTO DA INEXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ. I - Na decisão agravada, além de entender que o recorrente não teria logrado demonstrar de plano como o aresto hostilizado teria malferido os artigos elencados na peça recursal, entendeu-se que tais dispositivos não teriam sido devidamente prequestionados, o que ensejou a incidência da Súmula nº 282/STF. Desse modo, não infirmado este último fundamento, o qual é autônomo e suficiente para manter o julgado quanto ao ponto, aplica-se a Súmula nº 283 do STF. II -
Esta Corte Superior possui entendimento firme no sentido de que, somente quando caracterizada a má-fé na cobrança indevida, é cabível a aplicação do art. 42 do CPC (restituição em
dobro
do valor pago indevidamente)
. Precedentes: AgRg no REsp nº 1.245.373/MS, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe de 29/06/2011; REsp nº 1.250.314/MS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe de 10/06/2011; REsp nº 1.231.803/MS, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 31/03/2011. III - Tendo o Tribunal de origem entendido que não se havia comprovado má-fé na conduta da ora recorrida, forçoso reconhecer que, para rever o juízo ordinário acerca da ausência da má-fé, na espécie, se mostra indispensável a análise das circunstâncias fático-probatórias constantes dos autos, procedimento vedado em recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. IV - Agravo regimental improvido. ..EMEN:(AGRESP 201102817155, FRANCISCO FALCÃO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:09/10/2012 ..DTPB:.)
Tampouco se poderia aplicar ao caso o art. 940 e 941, do Código Civil, de 2002, alvo dos lúcidos comentários de Maria Helena Diniz como segue:
"Responsabilidade do demandante por débito já solvido: O artigo sub examine trata do caso do excesso de pedido, ou seja, do re plus petitur (Revista do Direito, 59:593, RT, 804:189, 799:363), com o escopo de impedir que se cobre dívida já paga, e
só será aplicável mediante prova da má-fé do credor
, ante a gravidade da penalidade que impõe.
Assim, quem cobrar judicialmente dívida já paga, no todo ou em parge, sem ressalvar o
quantum recebido, ficará obrigado a pagar ao devedor o dobro do que houver cobrado.
Responsabilidade por cobrança de quantia indevida - Se o credor vive a pedir mais do que lhe for devido, deverá pagar ao devedor o equivalente ao dobro do que dele exigir
. (...)
Desistência da ação. Se o autor desistir da ação antes da contestação ad lide, as penas dos arts. 939 e 940 não lhe serão aplicadas, salvo ao réu o direito de haver indenização por algum prejuízo que prove ter sofrido. Isto porque, com a desistência, o autor veio a reconhecer seu erro, arrependendo-se do que fez. Todavia, mesmo assim, deverá pagar as custas processuais do processo intentado, embora não as pague em dobro." (DINIZ, Maria Helena.
Código Civil anotado.
17. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 702-704. Omiti parte do texto)
Vê-se que a sanção do art. 940, Código Civil/2002, somente seria cabível quando demonstrada a má-fé daquele que cobrou dívida já adimplida. Semelhante é a orientação jurisprudencial:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. NÃO OCORRÊNCIA. COBRANÇA EM EXCESSO. ARTIGO 940 DO CC/2002. MÁ-FÉ DO CREDOR. REEXAME DE CONTEÚDO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido analisou todas as questões pertinentes para a solução da lide, pronunciando-se, de forma clara e suficiente, sobre a controvérsia estabelecida nos autos. 2.
Consoante a jurisprudência desta Corte, somente quando comprovada a má-fé da parte que realizou a cobrança indevida é que ela ficará obrigada a devolver em dobro o que cobrou em excesso
. 3. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7 do STJ). 4. No caso concreto, o Tribunal de origem analisou os elementos fáticos dos autos para afastar a litigância de má-fé quanto à cobrança do valor em excesso e para distribuir os encargos sucumbenciais. Dessa forma, inviável o conhecimento do recurso especial, ante o óbice da mencionada súmula. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201101253069, ANTONIO CARLOS FERREIRA, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:31/10/2014 ..DTPB:.)
CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. QUANTUM FIXADO DENTRO DA RAZOABILIDADE. INAPLICABILIDADE DO ART. 940 DO CÓDIGO CIVIL. 1. Na fixação da reparação por danos morais leva-se em conta o critério de razoabilidade, tendo em vista as circunstâncias da causa. 2.
Para que haja o pagamento em dobro da dívida já paga (art. 940 do Código Civil) é necessária comprovação de má-fé do credor
. Precedentes. 3. Apelação a que se nega provimento. (AC 00422684520074013400, JUIZ FEDERAL VALLISNEY DE SOUZA OLIVEIRA (CONV.), TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 DATA:27/05/2013 PAGINA:829.)
Registro, d'outro tanto, que o Superior Tribunal de Justiça
consolidou sua jurisprudência em sentido distinto
, como registro abaixo:
"CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. SERVIÇOS BANCÁRIOS. COBRANÇA INDEVIDA. CULPA DA CONCESSIONÁRIA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. PRESSUPOSTO. MÁ-FÉ. PRESCINDIBILIDADE. DEFINIÇÃO DO TEMA PELA CORTE ESPECIAL DO STJ (EARESP 600.663/RS, DJE DE 30.3.2021). MODULAÇÃO DOS EFEITOS. PREVISÃO DE QUE OS RETROMENCIONADOS EARESP SÓ PRODUZIRIAM EFEITOS AOS INDÉBITOS POSTERIORES À DATA DE PUBLICAÇÃO DE SEU ACÓRDÃO. SOLUÇÃO EXCEPCIONAL NO CASO CONCRETO. INDÉBITO E ACÓRDÃO EMBARGADO ANTERIORES À PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO DOS EARESP 600.663/RS. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Nos presentes Embargos, discute-se a prescindibilidade ou não de se aferir a má-fé como condição essencial para se exigir a restituição em dobro de quantia cobrada indevidamente, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. DISCIPLINA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 2.
Consoante o art. 42, parágrafo único, do CDC, na relação de consumo, o pagamento de cobrança indevida, a restituição do indébito dar-se-á em dobro, salvo se o fornecedor provar, no caso concreto, o engano justificável. A norma analisada não exige culpa, dolo ou má-fé do fornecedor quando este cobra - e recebe - valor indevido do consumidor. Ao fornecedor, a imputação que se lhe faz a lei é objetiva, independentemente de culpa ou dolo
. DEFINIÇÃO PELA DA CORTE ESPECIAL DO STJ 3. A Corte Especial do STJ definiu a questão, em data posterior à prolação do acórdão embargado, no julgamento dos EAREsp 600.663/RS (Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Rel. para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, DJe de 30.3.2021.).Assentou a tese: "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.modulação dos efeitos". MODULAÇÃO DOS EFEITOS 4. A regra geral é a devolução, na forma dobrada, dos valores debitados. Contudo, no caso concreto, há um detalhe, em especial, que o exime da aplicação do entendimento prevalecente no STJ. É o fato de os anteditos EAREsp 600.663/RS terem trazido critério de modulação de efeitos na aplicação de sua tese. Consoante os itens 24 a 27 da sua ementa, ficou estabelecido que, não obstante a regra geral, "o entendimento aqui fixado seja aplicado aos indébitos de natureza contratual não pública cobrados após a data da publicação deste acórdão" .5. Ora, a data dos indébitos (a partir de 03.2014), ou mesmo a publicação do acórdão ora embargado (17.12.2019), são anteriores ao julgamento e publicação do acórdão dos EAREsp 600.663/RS, da Corte Especial do STJ (DJe de 30.3.2021) .6. Portanto, excepcionalmente, a solução do caso concreto contará com comando distinto do atual posicionamento vigente no STJ, por atender ao critério de modulação previsto nos EAREsp 600.663/RS.Logo, o embargado não deverá devolver, de forma dobrada, os valores debitados na conta da embargante.CONCLUSÃO 8. Embargos de Divergência não providos."(STJ - EAREsp: 1501756 SC 2019/0134650-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 21/02/2024, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 23/05/2024)
Note-se, porém, que o STJ modulou os efeitos desta decisão:
"A regra geral é a devolução, na forma dobrada, dos valores debitados. Contudo, no caso concreto, há um detalhe, em especial, que o exime da aplicação do entendimento prevalecente no STJ. É o fato de os anteditos EAREsp 600.663/RS terem trazido critério de modulação de efeitos na aplicação de sua tese. Consoante os itens 24 a 27 da sua ementa, ficou estabelecido que, não obstante a regra geral, "
o entendimento aqui fixado seja aplicado aos indébitos de natureza contratual não pública cobrados após a data da publicação deste acórdão
."
A publicação do acórdão
EAREsp 600.663/RS
, da Corte Especial do STJ -
DJe de 30.3.2021
.
Ainda nesse sentido, leia-se:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CONDENATÓRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ. SERVIÇO DE TELEFONIA MÓVEL. COBRANÇA DE VALORES INDEVIDOS RECONHECIDA EM AÇÃO PRETÉRITA. PRETENDIDO O AFASTAMENTO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA DOBRADA. ACOLHIMENTO. ENTENDIMENTO FIRMADO NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO SENTIDO DE QUE A RESTITUIÇÃO EM DOBRO DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE NO ÂMBITO DE RELAÇÃO CONSUMERISTA DISPENSA A COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO DA CORTE CIDADÃ. TESE JURÍDICA QUE SE APLICA SOMENTE ÀS COBRANÇAS REALIZADAS APÓS A DATA DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO PROFERIDO NAQUELE TRIBUNAL. INAPLICABILIDADE NO CASO CONCRETO. DEVOLUÇÃO NA FORMA SIMPLES. REFORMA DA SENTENÇA NO PONTO. 24. Sob o influxo da proposição do Ministro Luis Felipe Salomão, acima transcrita, e das ideias teórico-dogmáticas extraídas dos Votos das Ministras Nancy Andrighi e Maria Thereza de Assis Moura e dos Ministros Og Fernandes, João Otávio de Noronha e Raul Araújo,
fica assim definida a resolução da controvérsia: a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.(...) 26. Na hipótese aqui tratada, a jurisprudência da Segunda Seção, relativa a contratos estritamente privados, seguiu compreensão (critério volitivo doloso da cobrança indevida) que, com o presente julgamento, passa a ser completamente superada, o que faz sobressair a necessidade de privilegiar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos jurisdicionados
. 27.
Parece prudente e justo, portanto, que se deva modular os efeitos da presente decisão, de maneira que o entendimento aqui fixado seja aplicado aos indébitos de natureza contratual não pública cobrados após a data da publicação deste acórdão
.TESE FINAL (...) 29. Impõe-se modular os efeitos da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a [...] (TJ-SC - APL: 03007478320178240082, Relator: Carlos Roberto da Silva, Data de Julgamento: 01/12/2022, Sétima Câmara de Direito Civil)
Assim, a nova orientação jurisprudencial se aplica quanto às cobranças indevidas
promovidas a partir de 30 de março de 2021
.
2.46.
Eventual aplicação do
art. 935
, Código Civil:
Sabe-se que há diferença entre injusto administrativo e crime. Há distintos graus de responsabilização jurídica, de modo que - mesmo quando afastada a suspeita criminal - pode ainda subsistir lastro para a aplicação de sanções administrativas ou de outra ordem
.
Mal comparando, alguém pode ser absolvido da acusação da prática de crime contra a ordem tributária e, ainda assim, ser alvo de multas fiscais, por conta do disposto no art. 136 do Código Tributário Nacional, por exemplo. Também é certo, todavia, que o Estado não pode se contradizer. Não há como o Estado imputar ao sujeito a prática de um fato se, com cognição
exaustiva
, a própria Administração Pública reputa que tal conduta não teria ocorrido ou que o sujeito em questão não tenha sido seu autor.
Deve-se atentar, tanto por isso, para a redação do art. 935, CC:
"A responsabilidade civil é independente da criminal,
não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal
."
Cumpre não perder de vista que a jurisdição criminal é infensa a consensos probatórios e a ficções jurídicas
contra libertatem
. Isso significa que, como regra, o exame probatório promovido na temática penal é mais denso do que aquele levado a efeito em outros âmbitos. Sempre que a jurisdição criminal sustentar, em decisão transitada em julgado, que o fato imputado não teria ocorrido ou que o sujeito não o teria praticado, isso deve ser respeitado pelo Estado em todas as suas esferas de atuação, para distintos efeitos de responsabilização civil/administrativa.
Essa mesma solução não parece se aplicar, todavia, quando a sentença absolutória, prolatada pelo juízo criminal, tenha sido calcada no reconhecimento de nulidades ou quando estiver fundada em
non liquet
(ou seja,
in dubio pro reo
). Em tais casos, o juízo de imputação administrativa não fica inibido, eis que depende de graus menores de convicção probatória. Com idêntica lógica, se o Ministério Público houver promovido o arquivamento de um inquérito policial, atestando, de forma peremptória, ter sido comprovado que o aventado fato ilícito não teria ocorrido ou que, quando ocorrido, que o suspeito não teria sido seu autor, então aludida promoção de arquivamento, quando acolhida judicialmente, surtirá efeitos transcendentes, atingindo também processos cíveis, tributários, administrativos. Caso, porém, a promoção de arquivamento houver sido fundada em ausência de justa causa para uma arguição penal, por ausência de provas suficientes, então tal medida não vinculará as demais esferas do discurso jurídico, conforme art. 935, CC/2002.
Enfim, não se invocar essa transposição automática de efeitos, do sistema de justiça criminal para a jurisdição cível, quando uma apuração criminal tenha sido arquivada por ausência de justa causa para a deflagração de uma arguição criminal, diante do que preconiza o art. 18, CPP e diante da lógica da conhecida súmula 524, STF, em leitura
a contrario sensu.
Atente-se para a lógica da argumentação de Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves sobre o alcance do art 935, Código Civil, ainda que tendo em conta o processo de improbidade administrativa:
"Os atos ilícitos praticados pelo agente público podem acarretar a sua responsabilidade penal, civil e administrativa, sendo cada qual perquirida perante o órgão competente.
Conforme fora visto, a Lei 8.429/1992 é expressa ao dispor que as penalidades cominadas em seu art. 12 serão aplicadas independentemente das sanções penais, civis e administrativas. Esse preceito, de natureza eminentemente material, visa a dirimir quaisquer dúvidas no sentido de que a aplicação de determinada sanção em uma seara não agasta as sanções passíveis de aplicação nas demais.
Ainda que única seja a conduta, poderá o agente sofrer sanções de natureza penal, desde que haja a integral subsunção de seu ato a determinada norma incriminadora; administrativa, em restando configurado algum ilícito dessa natureza; e civil, que apresenta natureza supletiva, podendo importar na complementação do ressarcimento dos danos causados ao Poder Público, política etc.
No que concerne às sanções passíveis de aplicação ao ímprobo, a independência entre as instâncias se apresenta absoluta, mas é tão somente relativa quanto à possibilidade de interpenetração dos efeitos da decisão proferida em uma seara nas demais.
Em um primeiro plano, cumpre perquirir os efeitos da sentença penal em relação à persecução da conduta do agente nas esferas cível e administrativa. Sobre a correlação existente entre a actio civilis ex delicto e a responsabilidade penal, tema fecundamente estudado pela doutrina penal e perfeitamente aplicável à espécie, os vários sistemas legislativos podem ser ordenados em quatro grandes grupos: o da solidariedade, o da concussão , o da livre escolha e o da independência
.
Nos países que adotam a solidariedade, há duas ações diferentes, uma penal, outra civil, mas no mesmo processo e diante do mesmo juiz, o criminal. Na confusão, existe uma única ação, civil e penal ao mesmo tempo, possibilitando um direito amplo de pedir ao órgão jurisdicional a reparação por inteiro do malefício causado pelo crime, quer ao interesse geral, quer ao particular. No sistema da livre escolha é permitido cumular as duas ações no processo penal; é uma cumulação facultativa, aplicando-se o brocardo electa una via non datur recursus ad alteram. Por derradeiro, no sistema da independência, a ação civil somente pode ser proposta no juízo cível, concedendo-se a este a faculdade de suspender o curso do processo civil até o julgamento definitivo do criminal.
Realizado um breve resumo dos sistemas existentes, é possível afirmar, à luz do disposto nos arts. 935 do Código Civil de 2002, 110 do CPC/ 1974, 315 do CPC/2015 e 64 do CPP, que o ordenamento jurídico pátrio adotara, até o advento da Lei n. 11. 719/2008, o sistema da independência, de modo que as instâncias civil e penal permaneciam alijadas uma da outra
. Após a Lei n. 11.719/2008, que conferiu nova redação ao art. 387, IV, do CPP para dispor que o juiz, na sentença condenatória, "fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido", passamos a ter um sistema de independência com influxos de confusão. Falamos em influxos de confusão e não propriamente em confusão, por três razões básicas: (1) o ofendido pode pleitear a reparação na esfera cível paralelamente à tramitação do processo penal; (2ª) o juiz com competência criminal não julga, em linha de princípio, a lide civil, limitando-se a estabelecer um valor mínimo para a reparação do dano; e (3ª) a teor do art. 63, parágrafo único do CPP, poderá o ofendido promover a execução do "valor fixado nos termos e do inciso IV do caput do art. 387 deste Código,sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido", liquidação esta que será realizada pelo juízo cível.
Na medida em que o processo penal e o processo cível puderam tramitar juntos, terá o juízo cível a faculdade de suspender o processo cível sempre que tiver razões ponderáveis para tanto, sendo certo que esta faculdade deve ser exercida com cuidado e ponderação, pois o tempo, que atua de forma furtiva e eficaz, é um algoz incansável do tão sonhado ideal de Justiça, não sendo exagero afirmar que a concreção deste se distancia na mesma proporção em que aquele flui.
Por ser mera faculdade, não vislumbramos uma relação de prejudicialidade entre a ultimação do processo penal e o prosseguimento da ação civil e do procedimento administrativo que visam a perquirir a conduta do ímprobo, nada impedindo que estes sejam instaurados e encerrados antes daquele
. No entanto, em sendo julgada a pretensão deduzida na ação penal anteriormente às demais, fará ela coisa julgada nas esferas administrativa e cível sempre que reconhecerem: a) ter sido o ato praticado em circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e §1º do art. 28, todos do Código Penal e arts. 65 e 386, VI, do CPP); b) a inexistência material do fato (arts. 66 e 386, I, do CPP); c) estar provado que o réu não concorreu para a infração penal (art. 386, IV, art. 935 do Código Civil de 2002 e art. 1.525 do Código Civil de 1916). Note-se que tais efeitos somente alcançam os fatos discutidos no processo, permanecendo a possibilidade de livre valoração em relação aos demais.
Em havendo absolvição por ausência de provas (art. 386, II e VII, do CPP) ou por não constituir o fato infração penal (386, III, do CPP), poderá a questão ser amplamente examinada nas esferas cível e administrativa. O mesmo ocorrerá nas hipóteses em que sequer for deflagrada a ação penal, havendo o arquivamento do procedimento inquisitorial respectivo (art. 67, I, do CPP).
No caso de condenação criminal, tornar-se-á certa a obrigação de reparar o dano causado, servindo a sentença de título executivo judicial (art. 91 do CP, art. 584, II, do ACP/1974 e art. 515, VI, do CPC/2015).
Tratando-se de conduta que se subsuma a um tipo penal, mas que não configure ilícito administrativo (crimes não funcionais), por óbvio, a sentença absolutória, qualquer que seja sua fundamentação, sempre influirá na esfera administrativa, já que a competência para valorar os fatos era exclusiva do Poder Judiciário. Nos crimes não funcionais, considerados como tais aqueles dissociados dos deveres administrativos, quando a condenação importar na aplicação de pena privativa de liberdade superior a quatro anos, o agente, como efeito da condenação, perderá o cargo, a função ou mandato eletivo (art. 92, I, b, do CP); em se tratando de pena inferior a quatro anos, será ele normalmente afastado de suas atividades até o seu cumprimento. A depender do ilícito penal e do que dispuser o estatuto regente da categoria, a condenação criminal poderá caracterizar a incontinência de conduta ou o procedimento irregular de natureza grave motivadores da sanção de demissão
.
Ainda que a conduta não caracterize nenhum ilícito penal, entendemos que a decisão proferida pelo juízo cível ao apreciar o ato de improbidade, observadas as mesmas circunstâncias relativas à sentença penal, influirá na esfera administrativa.
Restando provada, verbi gratia, a inexistência do fato perante o Poder Judiciário, seria no mínimo insensato entender-se legítima uma penalidade aplicada em procedimento administrativo com base no mesmo fato. Seria injurídico entender que o fato não existe perante a Justiça, mas representa substrato adequado para embasar uma punição de ordem administrativa
.
Essa comunicabilidade entre as instâncias tem o seu alicerce no art. 5º, XXXV, da Constituição, o que garante o amplo acesso ao Poder Judiciário sempre que houver lesão ou ameaça a direito. No exemplo sugerido, a ilegalidade e a lesão ao direito do agente seriam flagrantes, pois qualquer punição pressupõe uma conduta em desacordo com as normas legais; inexistindo conduta e, ipso facto,motivo para a prática do ato administrativo, afigura-se ilegal a punição."(GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério
Pacheco
.
Improbidade
administrativa.
7. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva. 2013. p. 678-681)
A tanto convergem o art. 66, CPP, e o art. 126, da lei n. 8.112/1990. Em determinados casos, quando a questão criminal se constituir em tema prejudicial à apreciação da pretensão, deduzida no processo civil, isso pode dar ensejo à suspensão da demanda, na forma do art. 313, V, "a", Código de Processo Civil/15, podendo ensejar a suspensão da prescrição, caso os requisitos do art. 200, Código Civil, tenham sido atendidos.
Atente-se para o seguinte julgado:
"
(...) A turma julgadora da Câmara Criminal entendeu por bem em absolver o réu, fundamentando-se no brocardo in dubio pro reo.
Porém, na esfera cível é diferente. Como o próprio magistrado fundamentou em seu despacho de fis. 227 e 228, enquanto na esfera criminal está em jogo a liberdade do cidadão, na cível o que prevalece é o aspecto patrimonial
.
Na esfera cível, para que nasça a obrigação de reparar, necessário que estejam presentes pressupostos, a saber: a conduta, o dano, o nexo de causalidade entre este e aquela e a culpa, sendo que os três primeiros são exigidos em toda forma de responsabilização civil, enquanto que na responsabilidade objetiva o elemento subjetivo se mostra dispensável - diante do que se convenciona nominar responsabilidade sem culpa.
Existe, portanto, independência das responsabilidades cível e criminal.' (e-STJ, fls. 361 ⁄ 365). Ao reconhecer a responsabilidade civil do agravante pelo acidente, a despeito da existência de decisão criminal absolutória, a Corte a quo decidiu em consonância com o jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, eis que a responsabilidade civil independe da criminal e o grau de culpa exigido em ambas a s esferas é diferente, somente existindo vinculação quando o provimento criminal afasta a existência do fato ou a autoria, o que não ocorreu no caso.
A título ilustrativo, confira-se os seguintes precedentes:
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO
INDENIZATÓRIA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. PRODUÇÃO
DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.
SUSPENSÃO DA AÇÃO CIVIL ATÉ A CONCLUSÃO DA AÇÃO PENAL. SÚMULA Nº 83 DO STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.
(...)
3. A responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que, a despeito de reconhecer a culpa exclusiva da vítima pelo acidente, não ilide a autoria ou a existência do fato. 4. Agravo regimental não provido." (AgRg no REsp 1483715 SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO
, TERCEIRA TURMA, julgado em 05.05.2015, DJe 15 05 2015)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL.
ACIDENTE DE TRÂNSITO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7⁄STJ. SENTENÇA PENAL ABSOLUTÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. EFEITOS. DECISÃO MANTIDA. (...) 2. No caso concreto, o Tribunal de origem examinou a prova dos autos para concluir que o evento danoso decorreu de conduta
imprudente do ora agravante. Alterar tal conclusão demandaria
o reexame de fatos e provas, inviável em recurso especial, a teor
do disposto na mencionada súmula.3.
É pacífico no âmbito desta Corte o entendimento de que,
devido à relativa independência entre as instâncias, a absolvição no juízo criminal somente vincula o cível quando reconhecida a inexistência do fato ou declarada a negativa de autoria, o que não é o caso dos autos
. 4. Agravo regimental a que nega provimento." (AgRg no AREsp 518.502 SC, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA
, QUARTA TURMA, julgado em 19.03.2015, DJe 27.03.2015)
(acórdão do TJ-MG, transcrito em decisão do STJ - AgRg no AREsp: 105683 MG 2011/0247041-1, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 23/06/2015, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/08/2015)
Por conta disso, eventual absolvição dos arguidos, no âmbito criminal, com lastro na premissa
in dubio pro libertatis,
não se transporta automaticamente para a seara cível, por conta das limitações do aludido art. 935, Código Civil/2002, ao versar sobre a independência relativa entre as esferas cível e penal.
2.48. Distribuição do
ônus
da prova:
Aplico ao caso,
no essencial
, a regra de distribuição do ônus da prova, prevista no art. 373, I e II, CPC/15. Conquanto haja natural assimetria entre a autora e a requerida - autarquia federal, com amplo suporte jurídico e corpo burocrático -, não houve maiores embaraços, na espécie, para que a autora apresentasse elementos probatórios sobre a narrativa dos fatos, promovida na sua petição inicial.
A lei 8078/1990 dispõe, no seu art. 6º, VIII, que
"São direitos básicos do consumidor: (...) a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências."
No que toca à aludida cláusula, leia-se:
"(...) Por isso, o reconhecimento da hipossuficiência do consumidor para fins de inversão do ônus da prova não pode ser visto como forma de proteção ao mais pobre. Ou, em outras palavras, não é por ser pobre que deve ser beneficiado com a inversão do ônus da prova, até porque a questão da produção da prova é processual, e a condição econômica do consumidor diz respeito ao direito material.
Na realidade, para beneficiar o carente econômico no processo não seria necessária a inversão. Bastaria determinação judicial de que o fornecedor arcasse com eventuais custas processuais para a produção de provas, tais como as periciais. Determinar-se-ia a inversão do pagamento, e aí sim estar-se-ia protegendo, de forma justa, o economicamente fraco
. Não se pode olvidar que, para os pobres, na acepção jurídica do termo, existe a justiça gratuita, a qual permitem ao beneficiário a isenção do pagamento de custas judiciais, o que não significa que ele está isento de provar o seu direito.
(...) Assim, se a questão for meramente de falta de capacidade financeira de suportar o custo do processo, basta ao consumidor servir-se do benefício legal da lei 1060/1950. E o inverso é verdadeiro: existem consumidores economicamente poderosos, o que não implica a sua não hipossuficiência técnica. Mas, mesmo no caso de o consumidor ter grande capacidade econômica, a inversão do ônus da prova deve ser feita na constatação de sua hipossuficiência técnica (técnica e de informação)." (NUNES, Rizzatto.
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 731-733)
Por seu turno, os Tribunais têm decidido como segue:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 273 DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356/STF. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Inviável o recurso especial quando ausente o prequestionamento das questões de que tratam os dispositivos da legislação federal apontados como violados. 2. A
inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança das alegações do consumidor ou de sua hipossuficiência
. 3. Na hipótese em exame, a eg. Corte de origem manteve a aplicação ao caso do Código de Defesa do Consumidor, e após sopesar o acervo fático-probatório reunido nos autos, concluiu pela configuração da verossimilhança das alegações da parte agravada, bem como de sua hipossuficiência. Desse modo, o reexame de tais elementos, formadores da convicção do d. Juízo da causa, não é possível na via estreita do recurso especial, por exigir a análise do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201300457409, RAUL ARAÚJO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:24/06/2013 ..DTPB:.)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA. ART. 130 DO CPC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REEXAME PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2.
Cabe ao magistrado, como destinatário da prova, determinar aquelas necessárias à instrução do processo, sempre em busca de seu convencimento racional. O reexame do juízo acerca da produção probatória encontra óbice na Súmula n° 7/STJ. 3. A inversão do ônus da prova se submete ao critério do julgador mediante análise das circunstâncias fáticas, cujo reexame é vedado em sede especia
l. 4. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGA 201000593699, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:26/03/2013 ..DTPB:.)
Como registrei acima, o CDC/90 não se aplica no que toca à relação entre a autora e a autarquia, demandada nessa causa. Atente-se, p.ex., para o fato de que, nesse âmbito, mesmo quando o requerido não apresenta resposta, sequer é possível aplicar os efeitos da revelia (art 345, CPC/15), dada a indisponibilidade do interesse público primário. Quanto ao INSS, não há como inverter o ônus probatório, com lastro no Código de Defesa do Consumidor.
Por outro lado, também se revel incabível a inversão do ônus da prova, prevista no art. 373, §1º, CPC/15. A vingar solução diversa, dever-se-ia então converter o julgamento em diligência, a fim de se assegurar que o(s) requerido(s) produzisse(m) as dilações probatórias porventura devidas, conforme preconiza a parte final do aludido art. 373, §1º, CPC.
O processualista Araken de Assis promove uma avaliação crítica da ampliação das hipóteses de inversão do ônus da prova, promovida com o CPC/2015:
"(...) A distribuição dinâmica do ônus da prova ocorre em outros ordenamentos. O art. 217.6 da Ley de Enjuiciamiento Civil espanhola institui dois meios para corrigir a inadequação formal do critério geral (onus probandi incumbit qui ei dicit): (a) a disponibilidade da prova (v.g., na investigação de paternidade, o suposto pai tem condições de esclarecer o fato biológico, através de exame de DNA); e (b) a facilidade probatória (v.g., a empresa encontra-se melhor situada para arrolar as testemunhas de eventos que ocorreram em suas dependências que o visitante ocasional). E, no direito norte-americano, o juiz alocará o ônus da prova segundo numerosas e complicadas regras.
Essa teoria tem cunho autoritário, porque concentra poderes no órgão judiciário, e, desse modo, traz consigo alto risco de subjetivismo
. Duas objeções principais, relevando o risco de prevaricação e o dever de fidelidade do juiz ao direito, opõem-se à doutrina: (a) o já mencionado risco de subjetividade e, ademais, de relatividade: o que é fácil para certo juiz pode não o ser para outro; e (b) a violação positiva ao direito fundamental processual do contraditório. Contra o risco de subjetividade, inexiste remédio; para a violação do contraditório, a medida cabível é a exigência de que haja motivo concreto, prévio e delimitado para a distribuição ope judicis. A distribuição do ônus da prova na decisão de saneamento e de organização do processo (art. 357, III) contrabalança os riscos, norteando a atividade das partes na instrução das causas. Seja como for, as objeções evidenciam que, entre nós, inexiste ainda densidade do direito fundamental à prova. O contraditório argumentantivo (dizer e contradizer) não mais satisfaz.
As repercussões positivas ou negativas da repartição casuística podem ser aquilatadas e medidas nas relações de consumo. Em tal matriz, considerando o disposto no art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990, passa-se à análise do tema, sublinhando que não se limita a tais espécies de litígio, em tese, a distribuição dinâmica." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 203-209)
2.49. Inversão do ônus - autenticidade de assinaturas:
Registro, de toda sorte, que - quando em causa a impugnação de descontos em benefícios previdenciários por conta de alegados contratos de mútuo ou de filiação a associações -, em novembro de 2021, o STJ consolidou o entendimento de que
"
o ônus da prova da falsidade documental compete à parte que o arguiu, mas se a falsidade apontada disser respeito à assinatura lançada no documento, o ônus da prova caberá a quem o produziu
".
(STJ, REsp. 1.846.649, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze).
Com efeito,
"No julgamento do REsp 1.846.649 (Tema 1.061), sob a sistemática dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça fixou tese no sentido de que "na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em
contrato bancário
juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade (CPC, arts. 6º, 369 e 429, II)"
(5054473-47.2020.4.04.7000, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR, Relator GERSON LUIZ ROCHA, julgado em 28/07/2022)
No caso em exame, conquanto não se cuide de alegado vínculo com instituição financeira, a mesma lógica se coloca. Note-se que é dado à associação exigir que a firma seja reconhecida em contratos e outros cuidados a fim de assegurar a autenticidade de quem subscreve o documento. Em caso de impugnação, cabe ao demandado aludido encargo probatório.
2.50. Juízos de abdução:
A distribuição do ônus da prova cuida de um critério de solução da causa, diante da eventual insuficiência da comprovação da veracidade de determinadas asserções. Na forma do art. 373, I, CPC/15, caso a parte autora tenha promovido a narrativa de um fato, apontado como causa da sua pretensão, e a veracidade dessa narrativa não tenha sido comprovada, a pretensão há de ser julgada improcedente. De modo semelhante, caso a parte requerida tenha alegado a ocorrência de um fato obstativo do acolhimento da pretensão da parte autora - por exemplo, causação do dano por um terceiro, desvinculado da sua atividade econômica -, e isso não seja provado, sua impugnação não poderá ser acolhida.
Algo diferente ocorre com os critérios de interpretação dos meios de prova. Nesse âmbito, tem-se em conta a forma como o Juízo deve apreciar os elementos probatórios veiculados nos autos, para fins de reconstrução histórica dos fatos narrados pelas partes
.
Como sabido, indício
"
é todo rastro, vestígio, sinal e, em geral, todo fato conhecido, devidamente provado, suscetível de conduzir ao conhecimento de um fato desconhecido, a ele relacionado, por meio de um raciocínio indutivo-dedutivo
"
(MOURA, Maria Thereza.
A prova por
indícios
no processo penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 109). Tais sinais, fundamentando
juízos
de
abdução
, podem amparar um decreto condenatório; desde que sejam coerentes, harmônicos entre si, e não refutados por contraindícios.
"
Indício não é uma prova menor, mas uma prova que deve ser verificada. O indício é idôneo para apurar a existência de um fato histórico delituoso somente quando presentes outras provas que excluam uma diversa reconstrução do acontecimento. O princípio é formulado no art. 192, inc. 2, do CPP [italiano]: a existência de um fato não pode ser deduzida por meio de indícios, a menos que estes sejam graves, precisos e consonantes
. Desta regra emerge, em primeiro lugar, que um único indício nunca é suficiente." (TONINI,
Paolo.
A prova no processo penal italiano.
SP:RT, p. 58)
"Valor probatório dos indícios: como já afirmamos em nota anterior, os indícios são perfeitos tanto para sustentara a condenação, quanto para a absolvição. Há autorização legal para a sua utilização e não se pode descurar que há muito preconceito contra essa espécie de prova, embora seja absolutamente imprescindível ao juiz utilizá-la. Nem tudo se prova diretamente, pois há crimes camuflados - a grande maioria - que exigem a captação de indícios para a busca da verdade real. Lucchini, mencionado por Espínola Filho, explica que a eficácia do indício não é menor que a data prova direta, tal como não é inferior a certeza racional à histórica e física. O indício é somente subordinado à prova, porque não pode subsistir sem uma premissa, que é a circunstância indiciante, ou seja, uma circunstância provada; e o valor crítico do indício está em relação direta com o valor intrínseco da circunstância indiciante. Quando esteja bem estabelecida, pode o indício adquirir uma importância predominante e decisiva no juízo (...) Assim também Bento de Faria, apoiado em Malatesta.
Realmente, o indício apóia-se e sustenta-se numa outra prova. No exemplo citado na nota anterior, quando se afirma que a coisa objeto do furto foi encontrada em poder do réu não se está provando o fato principal, que consiste na subtração, mas tem-se efetiva demonstração de que a circunstância ocorreu, através do auto de apreensão e de testemunhas. Em síntese, o indício é um fato provado e secundário (circunstância) que somente se torna útil para a construção do conjunto probatório ao ser usado o processo lógico da indução." (NUCCI, Guilherme de Souza.
Código de processo penal comentado.
8ª ed., SP: RT, p. 514)
"
Inicialmente, é de ser recordar que todos os meios de prova no processo penal são relativos, não existindo hierarquia entre eles. Fixada essa premissa, é óbvio que os indícios podem servir para sustentar uma condenação, a depender evidentemente da sua qualidade
. (...) [Nota de rodapé:] Em passagem pitoresca Denílson Pacheco afirma: É possível se condenar com base em indícios? Desde que sejam veementes e insofismáveis, a resposta é positiva. Para ilustrar, vamos contar uma estória muito difundida no meio forense. Um gato e um passarinho foram colocados no interior de uma sala hermeticamente fechada e completamente vazia. Várias testemunhas idôneas foram colocadas do lado de fora da sala durante todo o evento. A única saída foi fechada e, rapidamente, foi aberta novamente, com todas as testemunhas observando a única saída. No interior da sala, o passarinho tinha sumido. Havia somente penas pelo chão. O gato encontrava-se num canto da sala, lambendo os beiços, com sangue pelos bigodes e, ainda, umas penas pelos dentes. Alguém viu o gato comendo o passarinho? Alguém viu o assassinato do passarinho? Todas as provas são indiciárias: a sala hermeticamente fechada, o gato e passarinho sozinhos na sala, as testemunhas idôneas que observaram todo o evento etc. Mas, de todos esses indícios veementes, podemos tirar nossa firme conclusão: alguém tem dúvida de que foi o gato que comeu o passarinho? (Direito processual penal, Teoria, crítica e práxis, p. 896)." (BEDÊ JÚNIOR, Américo; SENNA, Gustavo.
Princípios do processo penal:
entre o garantismo e a efetividade da sanção. RT, p. 113.
"
A prova indiciária, ou prova por indícios, terá a sua eficiência probatória condicionada à natureza do fato ou da circunstância que por meio dela (prova indiciária) se pretender comprovar
. Por exemplo, tratando-se de prova do dolo ou da culpa, ou dos demais elementos subjetivos do tipo, que se situam no mundo das idéias e das intenções, a prova por indícios será de grande valia." (Pacelli de Oliveira,
Curso de processo penal,
6ª ed. Del Rey, p. 367).
"Se é verdade que na investigação da subjetividade do agente, o fato externo é que indica o elemento interno, isto não quer dizer que o dolo possa ser presumido. O juiz deverá se convencer da ocorrência do dolo, ainda que - para tanto - deva se basear em elementos objetivos. Estes dados objetivos devem estar provados e convencer o julgador, sem margem de dúvida, sobre qual era a intenção do acusado. A inferência do elemento subjetivo a partir de dados objetivos não significa que o dolo seja presumido." (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy.
Ônus da prova no processo penal.
SP: RT, 2.003, p. 307, grifei.
Transcrevo também alguns julgados a respeito desse tema:
"
Uma sucessão de indícios e circunstâncias, coerentes e concatenadas, podem ensejar a certeza fundada que e exigida para a condenação
."
(STJ, 5ª turma, REsp n. 130.570, rel. Min. Felix Fischer, DJU de 06.10.97, p. 50.035, omiti o restante da ementa). Ademais,
"
Indícios e circunstâncias quando múltiplos, sucessivos, coerentes concatenados e veementes, como no caso dos autos, têm o mesmo valor das provas diretas e são suficientes para embasar uma decisão condenatória, ainda mais quando excluem quaisquer outras hipóteses favoráveis ao condenado
."
(TRF da 4ª Rg., 7ª Turma, Apelação criminal de autos 200104010635742/PR, rel. Des. Fed. José Luiz Borges Germano da Silva, DJU 01.09.2004, p. 802, omiti parte da ementa).
Ainda nesse sentido,
"
Pressuposta a impenetrabilidade de consciência, se o réu não confessa, a prova do elemento subjetivo do delito só pode ser fornecida por meios indiretos, por indícios, vale dizer
."
(TRF 3ª Rg., ACR 17.877, DJU de 05.08.2005, p. 383, rel. Juiz Peixoto Júnior).
Em princípio, cabe a quem alega o ônus da demonstração segura, ou seja, crível e filtrada racionalmente, tanto quanto possível, de que os argüidos teriam praticado, ao tempo reportado pela petição inicial, a conduta imputada, ainda que isso possa ser promovido por meio da conjugação de significativos e consistentes indícios da prática infracional. Sendo isso aplicável na temática processual penal, solução semelhante impõe-se também no âmbito da ação civil pública, com os contornos próprios ao processo civil.
2.51. Eventual apresentação de cópias de diálogos:
No que toca à cogitada apresentação de extratos de conversação mantida por correio eletrônico, telefone ou vídeo - reputo cuidar-se de projeção do precedente Magri - inquérito 657-2, STF. Ora, a Suprema Corte tem reconhecido a validade da gravação, por um dos interlocutores, do diálogo próprio:
"A alegação no sentido de que a prova é ilícita não tem procedência, dado que não ocorre, no caso, violação do sigilo de comunicações (CF, art. 5º, inc. XII), nem seria possível a afirmativa de que fora ela obtida por meios ilícitos (CF, art. 5º, LVI). Não há, ao que penso, ilicitude em alguém gravar uma conversa que mantém com outrem, com a finalidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa. A alegação talvez pudesse encontrar ressonância no campo ético, não no âmbito do Direito." (STF, Inquérito n. 657-2, voto do Min. Carlos Mário Velloso)
"
Quanto à prova ilícita: tal como ponderou o ministro relator, dificilmente se encontrará na ordem jurídica reinante algo que nos autorizasse a ver como ilícita essa gravação de uma conversa a dois, por um dos interlocutores. É a ação do terceiro, é a interferência do terceiro - no grampeamento telefônico, na violação da correspondência alheia - que fere determinadas normas expressas na própria Carta da República
.
Quando, entretanto, um dos participantes da comunicação oral ou escrita entende de documentá-la de algum modo, ainda que na inconsciência da outra parte, isso não configura - em princípio - afronta à regra protetiva do sigilo.
O resultado pode variar entre a indiscrição inofensiva e a mais reprovável vilania; mas não há - aí - um ato ilícito. Admitiria que normas protetivas da privacidade, da estatura também constitucional, poderiam ser invocadas em repressão ao uso que um dos interlocutores queira fazer da carta ou da gravação do entendimento a dois, quando visa - por exemplo - a auferir lucro à custa da notoriedade da imagem alheia; um propósito bem diverso daquele de desencadear a ação da Justiça Pública." (STF, Inquérito 657-2, voto do Min. Francisco Rezek)
A Suprema Corte reiterou essas deliberações em outros casos, conforme segue:
"
Utilização de gravação de conversa telefônica feita por terceiro com a autorização de um dos interlocutores sem o conhecimento do outro quando há, para essa utilização, excludente da antijuridicidade. - Afastada a ilicitude de tal conduta - a de, por legítima defesa, fazer gravar e divulgar conversa telefônica ainda que não haja o conhecimento do terceiro que está praticando crime
-, é ela, por via de conseqüência, lícita e, também conseqüentemente, essa gravação não pode ser tida como prova ilícita, para invocar-se o artigo 5º, LVI, da Constituição com fundamento em que houve violação da intimidade (art. 5º, X, da Carta Magna). HC indeferido."
(STF, HC 74.678-1/SP, rel. Min. Moreira Alves, DJU de 15.08.97).
"Habeas corpus. Prova. Licitude. Gravação de telefonema por interlocutor. É lícita a gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, ou com sua autorização, sem ciência do outro, quando há investida criminosa deste último. É inconsistente e fere o senso comum falar-se em violação do direito à privacidade quando interlocutor grava diálogo com seqüestradores, estelionatários ou qualquer tipo de chantagista. Ordem indeferida." STF, HC 75.338-8/RJ, rel. Min. Nelson Jobim, DJU de 25.09.98
"Gravação de conversa. A gravação feita por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, nada tem de ilicitude, principalmente quando destinada a documentá-la em caso de negativa. Precedente Inq. 657-2, Carlos Velloso. Conteúdo da gravação confirmado em Juízo. AGRRE improvido." STF, agravo regimental no recurso extraordinário n. 402.031-1/SP, rel. Min. Ellen Gracie, DJU 06.02.2004:
"A gravação de conversa entre dois interlocutores feita por um deles, sem conhecimento do outro, com a finalidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de defesa." STF, agravo regimental no agravo de instrumento n. 503.617-7, rel. Min. Carlos Velloso, DJU de 04.03.2005.
Nesse mesmo sentido, leia-se o voto proferido pelo Min. Cezar Peluso ao julgar o
RE 40.717-8, STF
. Assim, em primeiro exame, a apresentação de extratos de tela de diálogos se revela adequada, mesmo que se parta da premissa de que não tenham sido promovidos diretamente pela autora; mas, por alguém pretensamente usando seu nome.
Ninguém pode invocar fato próprio em seu benefício (
non venire contra factum proprium
)
, de modo que a pessoa que porventura tenha se feito passar pela autora (em princípio, estelionato - consumado ou tentado - art. 171, CP) não pode invocar a seu favor privacidade oponível à real titular dos dados. Ademais, ao que parece, aludidos dados foram cedidos pela autora por pessoas que teriam mantido aludidas conversas, dando ensejo à aplicação do precedente Magri-STF.
2.52. Elementos de convicção - exame precário:
No caso em exame, o autor apresentou planilha indicando a margem para descontos consignados:
Indicou o histórico dos descontos:
Apresentou planilha indicando 59 descontos mensais de R$ 18,22.
No evento 20, o INSS apresentou cópia de despacho prolatado no processo administrativo de autos 00421.150462/2021-59. Juntou cópia da instrução normativa PRES/INSS n. 136, de 11 de agosto de 2022. Seguiu-se o dossiê previdenciário, indicando consignação bancária de R$ 18,22, código 216. O Banco Pan apresentou instrumento de contrato:
No movimento 22, o banco juntou ainda uma planilha evolutiva do mútuo feneratício. Anexou comprovante de transferência:
Esses são os elementos de convicção até o momento, o que examino com cognição não exaustiva.
2.53. Narrativas veiculadas nos autos:
A parte autora sustentou ter tomado conhecimento da ocorrência de descontos indevidos na sua prestação previdenciária. O INSS argumentou ter observado as regras concernentes à consignação em pagamento - art. 121, lei 8.213/1991. O banco argumentou ter celebrado contrato de mútuo com a demaandante, tendo promovido depósito do valor diretamente na conta da autora. A demandante sustentou não ter autorizado os descontos.
2.54. Normas que se cogitam aplicáveis ao caso:
Com cognição não exaustiva
, mencionei acima algumas normas suscetíveis de serem aplicadas ao caso no que diz respeito à promoção de descontos em benefícios previdenciários em razão de contratos ou de vinculação a associações. Tratei da questão alusiva à responsabilização civil dentre outros tópicos, todos com exame precário, ressalvando nova análise por época da prolação da sentença.
2.55.
Diligências probatórias:
Em regra, o Poder Judiciário deve facultar a ambas as partes, observados os prazos de lei, a realização da mais ampla dilação probatória, desde que se revele conexa com o pedido e a causa de pedir deduzidos nos autos. Isso não significa, porém, que todo e qualquer pedido, lançado pelos contendores, deva ser automaticamente deferido.
Ao contrário, as diligências destinadas a esclarecer fatos totalmente impertinentes com o
thema decidendum
não hão de ser realizadas, sob pena de converter o processo em um verdadeiro trabalho de Sísifo. Como sabido,
frusta probatur quod probantum non relevat.
Importa dizer: não se defere a realização de diligências destinadas a demonstrar fatos insuscetíveis de influenciar o resultado da demanda.
Esse é, por exemplo, o conteúdo do art. 464, §1º, CPC/15 ou do art. 420, parágrafo único, do CPC/73. Reporto-me ao art. 38, §2, da lei 9.784/99, que versa sobre o processo administrativo:
"
Somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando sejam ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias
."
2.56. Inquirição de testemunhas:
Eventual inquirição de testemunhas deve se dar com atenção ao limite do
art. 34 da lei n. 9.099/1995
, contanto que não seja manifestamente impertinente à solução da demanda.
2.57. Tomada do depoimento pessoal:
No que toca ao depoimento pessoal, convém atentar para os arts. 385 e 386, CPC/15:
Art. 385.
Cabe à parte requerer o depoimento pessoal da outra parte, a fim de que esta seja interrogada na audiência de instrução e julgamento, sem prejuízo do poder do juiz de ordená-lo de ofício
. §1 Se a parte, pessoalmente intimada para prestar depoimento pessoal e
advertida da pena de confesso
, não comparecer ou, comparecendo, se recusar a depor, o juiz aplicar-lhe-á a pena. § 2
É vedado a quem ainda não depôs assistir ao interrogatório da outra parte. § 3
O depoimento pessoal da parte que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser colhido por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.
Art. 386.
Quando a parte, sem motivo justificado, deixar de responder ao que lhe for perguntado ou empregar evasivas, o juiz, apreciando as demais circunstâncias e os elementos de prova, declarará, na sentença, se houve recusa de depor.
Logo, a tomada do depoimento pessoal se destina à eventual obtenção da confissão da contraparte. E isso mitiga a aplicação do instituto, quando em causa entidades de Direito Público, por força da indisponibilidade do interesse público primário. Com efeito, reitero que, quanto a entidades de regime jurídico, sequer o decurso
in albis
do prazo para contestação enseja os efeitos inerentes à revelia, conforme se infere do art. 344, II, CPC/15).
Não desconheço a análise pontualmente distinta de Araken de Assis, quem afirma
"Não ser diferente o regime das pessoas jurídicas de direito público. Já se sustentou que semelhante depoimento traduziria providência juridicamente inadmissível, porque a indisponibilidade do objeto litigioso torna ineficaz a confissão dos órgãos das pessoas jurídicas de direito público. Na perspectiva aqui adotada, não se pode tomar os efeitos como causa. O depoimento pessoal serve a outros propósitos e, precipuamente, à formação da convicção do juiz. E, nesse sentido, as declarações desses órgãos são tão boas ou más como as de qualquer outra pessoa."
(ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume III. Parte especial. São Paulo: RT. 2015. p. 515).
Anoto que prepostos apenas podem ser ouvidos, nessa condição, quando disponham de poderes suficientes para confessar em nome do banco. Nos demais casos, devem ser inquiridos como informantes ou testemunhas.
2.58. Complementação da documentação:
Como regra, incumbe à parte autora apresentar, com a petição inicial, os documentos em que ampara sua pretensão - art. 320, CPC. Os requeridos devem apresentar seus documentos junto com a resposta, na forma do art. 434, CPC.
Em princípio, documentos complementares apenas podem ser apresentados, em momentos posteriores a estas fases, quando de se tratar de meios probatórios novos - surgidos no curso da demanda -, ainda que destinados a comprovar fatos anteriores ao início do processo. Também podem ser anexados quando - a despeito de se cuidar de documentos antigos -, sua relevância para o processo apenas teria sido conhecida no curso do processo, a exemplo do que ocorre quando reportados por testemunhas e desconhecidos das partes até então. Também há os casos de fatos havidos no curso do processo, na forma do art. 493, CPC/15, e que podem/devem ser comprovados pelas partes, com lastro em documentos pertinentes, ainda que havidos em fases distintas daquelas indicadas no movimento 434, CPC/15.
2.59.
Eventual exame grafotécnico - considerações gerais:
O exame grafotécnico destina-se a aferir se determinado grafismo é compatível com aquela produzida por uma determinada pessoa.
Cuida-se, portanto, de um exame de autenticidade de determinados escritos ou mesmo desenhos. No seu âmbito, promove-se a análise - dentre outros tópicos - da carga da escrita, do grau de inclinação de determinados traços; velocidade do escrito; espaçamento entre letras e palavras; altra da palavra em relação às linhas de escrita; se a escrita é linear ou é angulada; a forma como determinadas letras são cortadas etc.
Para tanto, o perito/a perita deve promover a coleta do material gráfico a ser tido como verdadeiro - fornecido, por exemplo, pela parte autora, pela alegada vítima de um crime, por quem questiona um determinado contrato etc. -, para fins de confronto com o documento alvo de impugnação.
Em princípio, revela-se
"
imprescindível que a prova grafotécnica seja feita com base na análise do documento original, uma vez que o trabalho realizado na cópia do contrato torna duvidosa a prova técnica realizada
."
(TJ-MT - APL: 00186724820158110002 MT, Relator: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 25/10/2017, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Data de Publicação: 07/11/2017). Assim,
"é imprescindível que a prova grafotécnica seja feita com base na análise do documento original, uma vez que o trabalho realizado na cópia do contrato torna duvidosa a prova técnica realizada. Há o risco da prova pericial apresentar resultados imprecisos e ambíguos, o que ensejaria a realização de nova perícia.”
(TJMT, AI 126859/2014, de minha relatoria, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Publicado no DJE 12/12/2014)
Destaco, que em situação similar o Setor de Perícias de Polícia Federal já comunicou a este Juízo a inviabilidade de realização dos exames grafotécnicos sem a apresentação dos originais.
"(...)
Os documentos foram apresentados em forma de cópia. Os exames grafoscópicos devem ser preferencialmente realizados sobre as vias originais, pois em cópias as minúcias mais sutis da escrita não se encontram reproduzidas e o grau de certeza atingível nas conclusões é impactado negativamente – quanto menor a qualidade da cópia, menor o grau de certeza possível
. Em observância ao disposto na Orientação Técnica nº 15/2019-DITEC/PF, que padroniza os exames documentoscópicos no âmbito da Polícia Federal, como regra, os exames em cópias são realizados apenas quando a solicitação de exame declara explicitamente a inexistência ou indisponibilidade das vias originais (Art. 3º § 1º, Art. 8º parágrafo único).
6. A combinação dos dois problemas acima descritos inviabiliza a realização dos exames a partir do material ora apresentado.
7. Para que o exame seja viabilizado, é necessário providenciar: (...) [2] a via original do documento questionado, ou seja, o contrato apresentado no evento 8 (CONTR6). - autos 50370163620194047000).
2.60. Honorários
periciais
- gratuidade de Justiça:
O arbitramento de honorários periciais,
no regime da gratuidade de justiça
, no âmbito da Justiça Federeal, é regulamentado pela
Resolução n. 305
, de 07 de outubro de 2014, CJF. Por outro lado, tratando-se de perícia realizada perante a Justiça Federal e não se enquadrando na área de engenharia, contábil e ciências econômicas, o valor mínimo de R$ 62,13 e máximo de R$ 248,53.
Note-se que o limite de pagamento dos honorários periciais é do triplo do máximo, redundando em
R$ 745.59
, o que se revela insuficiente, em muitos casos, para remuneração do perito judicial, profissional liberal que atua sob regime de livre iniciativa.
Não há como o Juízo obrigar as partes a aceitarem eventual orçamento apresentado pelo(a) perito(a). Tampouco pode obrigaro o(a) perito(a) a promover a diligência probatória pelo valor ofertado pelas partes
.
Em princípio, aludido valor é aplicável à totalidade dos demandantes, conquanto se possa cogitar que - caso houvessem distribuído demandas autônomas, 01 autor por processo - cada um faria jus então à cota de até R$ 745,59. No mais das vezes, porém, a multiplicidade de demandantes não altera o limite inerente aos honorários sucumbenciais. E, ainda que assim não fosse, cogita-se que, no caso, os honorários superariam até mesmo o montante corresndente a R$ 745,59 multiplicado pelo número de requerentes.
Assim, há uma aparente dificuldade quanto ao custeio de eventual perícia. Isso não implica, por si, a inversão do ônus da prova, com registrei acima, por conta da adequada exegese do art. 373, §1, CPC/15
. Nâo há como o orçamento da Justiça Federal assumir encargos superiores ao mencionado. Isso não impede que os eventuais postulantes da diligência se predisponham a antecipar aludidos honorários periciais, caso se revelem suepriores ao limite acima detalhado.
III - EM CONCLUSÃO
3.1. DECLARO a competência desta unidade jurisdicional para o processo e julgamento desta demanda e a sua submissão ao rito dos Juizados.
3.2. DESTACO que, no presente caso, não vislumbro um contexto de conexão processual, para fins de reunião e julgamento conjunto das demandas, conforme art. 55, §1, CPC/15 e leitura
a contrario sensu
235, Superior Tribunal de Justiça.
3.3. REGISTRO que não diviso sinais de desrespeito à garantia da coisa julgada (art. 5, XXXVI, Constituição, art. 508, CPC), indicativos de eventual litispendência (art 337, §2, CPC), tampouco sendo caso de suspensão da tramitação da demanda - art. 313, CPC.
3.4. REPUTO que a partes estão legitimadas para a causa; que a peça inicial é apta e o(a) autor(a) possui interesse processual - art. 17, CPC.
3.5. ACRESCENTO que não diviso situação de litisconsórcio necessário na situação em exame, de modo a exigir a convocação de terceiros para comporem a relação processual - arts. 114, 115, 506, CPC/15.
3.6. SUBLINHO que o valor atribuído à causa se revela escorreito, em primeira análise eis que parece corresponder ao conteúdo econômico da pretensão da autora.
3.7. DESTACO ainda que a pretensão condenatória não foi atingida pela prescrição - art. 1. do decreto 20.910/32 - e que tampouco se operou a decadência do direito invocado na inicial.
3.8. DISCORRI acima, com cognição precária, sobre temas relacionados aos descontos em benefício previdenciários e sobre o intituto dos contratos, com suas consequências jurídicas.
3.9. REPUTO saneado o processo, quanto aos temas acima equacionados. Faculto manifestação às partes, para os fins do art. 357, §1, CPC, nos prazos abaixo detalhados, e quanto à indicação de eventuais diligências probatórias, como menciono tópicos abaixo. Prazo comum de 05 dias úteis, contados da intimação - arts. 219, 224, CPC.
3.10. ANOTO que não haverá estabilização quanto ao alcance das categorias jurídicas e equacionamento dos elementos de convicção, detalhads acima, eis que poderão ser revistas em sentença, não havendo preclusão
pro iudicato
quanto ao tema. Ressalvo, pois, nova análise de tais questões por época da prolação da sentença.
3.11. REGISTRO que cabe ao banco requerido o ônus de comprovar a autenticidade de assinaturas porventura lançadas em termos de associação da autora junto àquela entidade.
3.13. INTIMEM-SE as partes para, querendo, detalharem as diligências probatórias pertinentes e necessárias à solução da demanda. Prazo comum de 15 dias úteis, contados da intimação.
3.14. ANOTO que, caso requeiram a inquirição de testemunhas deverão apresentar, no prazo de 15 dias, contados da intimação deste despacho, o pertinente rol, com a qualificação devida, atentando para o limite do art. 34 da lei n. 9.099/95.
3.15. REGISTRO que, caso requeiram dilação pericial, deverão apresentar - no prazo de 15 dias úteis, contados da intimação deste despacho - os quesitos correlatos, sem prejuízo de oportuna intimação para indicação de assistentes periciais e demais medidas do art. 465, §1, CPC, caso a medida venha a ser deferida pelo Juízo. Ficam cientes de que o decurso
in albis
do aludido prazo implicará preclusão temporal.
3.16. VOLTEM-ME conclusos para complementar o saneamento ou, não sendo suscitadas outras objeções, tampouco requerida dilação probatória, para prolação de sentença - arts. 355 e 357, CPC/15.
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Processo nº 5041345-52.2023.4.04.7000
ID: 312812361
Tribunal: TRF4
Órgão: 14ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PETIçãO CRIMINAL
Nº Processo: 5041345-52.2023.4.04.7000
Data de Disponibilização:
01/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LUCIANO NEI CESCONETTO
OAB/PR XXXXXX
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Petição - Comunicação Nº 5041345-52.2023.4.04.7000/PR
REQUERIDO
: MARCIO JOSE FERNANDES
ADVOGADO(A)
: Luciano Nei Cesconetto (OAB PR031655)
DESPACHO/DECISÃO
1.
Trata-se de procedimento instaurado pa…
Petição - Comunicação Nº 5041345-52.2023.4.04.7000/PR
REQUERIDO
: MARCIO JOSE FERNANDES
ADVOGADO(A)
: Luciano Nei Cesconetto (OAB PR031655)
DESPACHO/DECISÃO
1.
Trata-se de procedimento instaurado para a fiscalização da medida cautelar de monitoramento eletrônico imposta a
MARCIO JOSE FERNANDES
.
Certificado por esta Secretaria o transcorrimento do prazo de 1 (um) ano do início do monitoramento do réu (evento
264.1
), o MPF manifestou-se pela manutenção da medida cautelar (evento
267.1
).
A Defesa de
MARCIO JOSE FERNANDES
requereu revogação da medida cautelar de monitoramento eletrônico, alegando excesso de prazo e "desproporcionalidade" da medida (
270.1
).
Vieram-me os autos conclusos.
2.
Ao ser revogada a prisão preventiva de
MARCIO JOSE FERNANDES
, em 23/11/2023, foram aplicadas as seguintes medidas cautelares:
3. ANTE O EXPOSTO
, por se vislumbrar nesse momento a
alteração parcial
do substrato fático-jurídico, diante de motivos
supervenientes
que justificam a revogação da custódia cautelar em benefício sobretudo da tutela da família e dos filhos menores da Requerente,
REVOGO a prisão preventiva decretada em face de
MARCIO JOSE FERNANDES
(“Brad”), com amparo nos arts. 282, I e II e §§ 5º e 6º, 315 e 316, todos do CPP), FIXANDO as seguintes medidas cautelares diversas da prisão:
(i)
obrigação de manter endereços e telefones (inclusive
whatsapp
) atualizados, comunicando previamente ao Juízo sobre qualquer alteração futura;
(ii)
compromisso de comparecimento a todos os atos do processo e não se ausentar da Cidade de seu domicílio —
Pinhais/PR
—
,
sem comunicação prévia ao Juízo do lugar onde poderá ser encontrado, sob pena de, quebrado o compromisso assumido, implicar — independentemente de outra decisão — na revogação automática dos benefícios ora concedidos, com a consequente e imediata expedição de mandado de prisão;
(iii)
obrigação de não realizar qualquer tipo de comunicação com os demais indiciados, ou pessoas que tenham sido referidas na investigação, exceto em se tratando de pessoas da própria família;
(iv)
monitoramento
através de tornozeleira eletrônica em seu domi
cílio
—
Pinhais/PR
;
(v)
fiança
, a qual arbitro em
R$ 100.000,00 (cem mil reais),
na forma do art. 319, VIII, §4º c/c art. 325, II, ambos do CPP.
A necessidade de cominação conjunta da
fiança com o monitoramento eletrônico
tem por função estabelecer
dupla garantia
, tanto em relação ao processo como para evitar que a tornozeleira seja rompida sem consequências para o acusado.
O monitorado deverá arcar com os custos relacionados ao monitoramento eletrônico, uma vez que estes somente são gerados por impossibilidade de ser concedida a soltura sem imposição de cautelares alternativas à prisão.
O equipamento possui um custo mensal atualmente de R$ 259,00 (duzentos e cinquenta e nove reais), além do carregador que vale R$ 259,00 (duzentos e cinquenta e nove reais), sem prejuízo de eventuais atualizações dos valores respectivos.
Fixo prazo de 5 dias para recolhimento do valor, contados da instalação do equipamento.
Registro que o descumprimento das condições fixadas implicará a revogação do benefício da liberdade provisória
.
3.1. APÓS o pagamento da
FIANÇA, e
xpeça-se o respectivo Alvará de Soltura
, adotando o DEPEN, quando da colocação da tornozeleira eletrônica, as providências necessárias à implementação do monitoramento eletrônico do investigado, devendo proceder ao seu monitoramento sob os seguintes termos
:
a) Trata-se de monitorados de baixa, média ou alta periculosidade?
Média-alta.
b) Se autorizada a saída da residência para desempenho do trabalho, em quais horários e em que dias da semana deverá o monitorado ficar recolhido em seu domicílio?
Livre circulação dentro do Município de domicílio (Pinhais/PR),
não podendo se ausentar da Cidade de seu domicílio — Pinhais/PR —, sem comunicação prévia ao Juízo do lugar onde poderá ser encontrado, sob pena de revogação imediata do benefício.
c) Se autorizada a saída da residência para desempenho do trabalho, o monitorado - dentro do horário para tanto autorizado - poderá circular com liberdade irrestrita ou ficará limitado ao Município de domicilio?
Livre circulação dentro do Município de domicílio (Pinhais/PR)
,
não podendo se ausentar da Cidade de seu domicílio — Pinhais/PR —, sem comunicação prévia ao Juízo do lugar onde poderá ser encontrado, sob pena de revogação imediata do benefício.
d) Qual o endereço domiciliar e comercial a ser considerado?
Rua Tico Tico, nº 76, Pinhais-PR, CEP 83326450
Caso haja alguma incorreção ou necessidade de alteração, deverá ser imediatamente informada a partir da ciência da presente decisão, sob pena de revogação do benefício e decretação da
prisão
preventiva
.
Recolhida a fiança (eventos 66 e 67), foi dado cumprimento ao alvará de soltura com termo de compromisso mediante carta precatória (evento
85.1
). A medida de monitoramento eletrônico iniciou em 18/03/2024 (evento
90.1
), e perdura, portanto, há cerca de 1 ano e 3 meses.
O presente pedido guarda relação com o Inquérito Policial nº 2022.0045641-SR/DPF/PR (autos nº 5041753-77.2022.4.04.7000), instaurado para investigar a atuação de uma Organização Criminosa especializada no tráfico internacional e interestadual de drogas, que possui ampla estrutura logística de recebimento, armazenamento, distribuição dentro do território nacional e remessa dos carregamentos de cocaína para o exterior, utilizando-se de diversas rotas e metodologias delitivas, tendo como principal foco de atuação o Porto de Paranaguá. Ademais, restou demonstrado que a presente OrCrim envolveu-se em guerra com facções rivais, havendo demonstrativo da prática de homicídios em decorrência da atuação implacável dos grupos antagonistas.
A denúncia em desfavor de
MARCIO JOSE FERNANDES
foi recebida em 09/08/2023 (
processo 5053644-61.2023.4.04.7000/PR, evento 18, RECDEN1
), pela prática do delito tipificado no artigo 2º, §2º e §4º, III, IV e V, da Lei nº 12.850/2013. Desde então, a ação penal se desenvolve de forma regular, aguardando, atualmente, audiência de instrução, conforme
processo 5053644-61.2023.4.04.7000/PR, evento 898, DESPADEC1
.
Portanto, não há qualquer demonstração de procedimento omissivo deste Juízo, o que afasta a alegação de excesso de prazo.
Ademais, cumpre ressaltar que não há prazo máximo de vigência das medidas cautelares, dentre elas o monitoramento eletrônico, devendo vigorar enquanto for necessária ao caso concreto.
Nesse sentido já decidiu o e. TRF da 4ª Região:
HABEAS CORPUS. CONTRABANDO. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. RETIRADA DE EQUIPAMENTO DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO. EXCESSO DE PRAZO. INDEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. O monitoramento eletrônico constitui mecanismo de fiscalização para garantir o cumprimento das demais medidas fixadas pelo Juízo de origem. 2.
O sentimento de desaprovação em relação ao uso do
monitoramento
eletrônico não é suficiente para afastar a medida adotada, a qual visa, primordialmente, beneficiar o próprio investigado por meio da substituição de sua prisão preventiva. 3. Não se verifica excesso de prazo na manutenção da monitoração eletrônica - excesso que não se afere por mero critério aritmético -, quando a complexidade dos fatos investigados justificam o seu elastecimento e não se verifica inércia no processamento do apuratório.
Precedente desta Turma. 3. Ordem denegada. (TRF4, HCorp 5008847-77.2025.4.04.0000, 8ª Turma , Relatora para Acórdão BIANCA GEORGIA CRUZ ARENHART , julgado em 09/04/2025)
No mesmo sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO FIM DE LINHA. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. EXCESSO DE PRAZO. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Recorrente denunciado por crimes de organização criminosa, corrupção ativa e contra a economia popular, relacionados à exploração de jogos de azar, com medidas cautelares impostas, incluindo monitoramento eletrônico.
2. Ação mandamental impetrada visando à revogação das medidas cautelares alternativas e à retirada do monitoramento eletrônico, alegando excesso de prazo.
II. Questão em discussão
3. As questões em discussão consistem em saber se: (i) as medidas cautelares diversas da prisão devem ser revogadas; (ii) se há excesso de prazo a amparar a revogação.
III. Razões de decidir
4. A necessidade das medidas cautelares foi reconhecida pelo STJ, que substituiu a prisão preventiva por domiciliar com monitoramento eletrônico, considerando a garantia da ordem pública e a aplicação da lei penal.
5.
Não há demonstração de violação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, uma vez que o
monitoramento
eletrônico é uma restrição de menor impacto e não impede o exercício profissional do recorrente.
6. O encerramento da instrução processual torna superada a discussão sobre excesso de prazo, conforme a Súmula 52 do STJ, e não se vislumbra desídia do Juiz a quo, considerando a complexidade do caso.
IV. Dispositivo e tese
7. Recurso desprovido.
Tese de julgamento: "
1. As medidas cautelares diversas da prisão podem ser mantidas quando necessárias para garantir a ordem pública e a aplicação da lei penal.
2. O encerramento da instrução processual supera a discussão sobre excesso de prazo, não havendo constrangimento ilegal quando não se verifica desídia do Juiz a quo".
Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 282, 312, 319; Lei nº 12.850/2013, art. 2º; Lei nº 1.521/1951, art. 2º.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no RHC 174.143/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 13/3/2024; STJ, AgRg no RHC 160.743/MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 20/5/2022.
(RHC n. 209.788/RJ, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 30/4/2025, DJEN de 7/5/2025.)
DIREITO PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06. PRETENSÃO DE REVOGAÇÃO DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO. TESE DE CONFIGURAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DE CULPA. NÃO ACOLHIMENTO. TRÂMITE REGULAR À LUZ DAS ESPECIFICIDADES DO CASO. TESE DE DESPROPORCIONALIDADE DA MEDIDA. NÃO ACOLHIMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO. RECURSO EM HABEAS CORPUS. MONITORAMENTO ELETRÔNICO. RECURSO IMPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Recurso em habeas corpus visando à revogação de medida cautelar de monitoramento eletrônico imposta ao paciente, acusado de tráfico de drogas, em substituição à prisão preventiva.
II. Questão em discussão
2. A questão em discussão consiste na verificação da legalidade e necessidade da manutenção do monitoramento eletrônico como medida cautelar diversa da prisão.
III. Razões de decidir
3. A prisão preventiva deve ser excepcional e substituída por medida menos gravosa quando possível, conforme art. 282, § 6º, do CPP.
4. O
monitoramento
eletrônico foi mantido com base em fundamentos idôneos, sendo necessário para garantir a aplicação da lei penal e a ordem pública.
5. Não há excesso de prazo na instrução criminal, considerando a complexidade do caso e a regularidade do trâmite processual.
IV. Dispositivo 6. Recurso improvido.
(RHC n. 183.351/RN, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 27/11/2024, DJEN de 4/12/2024.)
3.
Ainda, restou demonstrado durante as investigações que
MARCIO JOSE FERNANDES
detinha papel relevante na ORCRIM, cabendo a ele coordenar a contabilidade do tráfico internacional de drogas,
elaborando planilhas com entradas e saídas de dinheiro relacionadas ao tráfico internacional de drogas, balancetes, bem como conversando diretamente com os principais associados na exportação de cocaína para confirmar os valores transacionados, prestar contas e liberar pagamentos
(
processo 5041801-36.2022.4.04.7000/PR, evento 56, DESPADEC1
)
Além disso, assim manifestou-se esse Juízo quando da revogação da prisão cautelar (evento
31.1
):
[...]
2.2.
Ocorre que
, por outro lado, a natureza concreta do delito imputado ao Requerente - considerada a pena cominada ao crime do art. 2º,
caput
, da Lei 12850/13 -, o decurso de tempo desde a data da prisão cautelar, ocorrida em 04/05/2023, a ausência de posição de protagonismo e/ou liderança de
MARCIO JOSE FERNANDES
no suposto esquema da Organização Criminosa investigada, as funções supostamente desempenhadas por
MARCIO
(
seria responsável por elaborar planilhas com entradas e saídas de dinheiro relacionadas ao tráfico internacional de drogas, balancetes, bem como conversar diretamente com os principais associados na exportação de cocaína para confirmar os valores transacionados, prestar contas e liberar pagamentos
)
— que, após a desarticulação da suposta ORCRIM em razão das prisões, dificultam a continuidade de sua atuação em nome daquele grupo pelo papel concretamente desempenhado —
,
são suficientes para
REDUZIR
o patamar de periculosidade social do custodiado, apto a ensejar a
REVOGAÇÃO
de sua custódia cautelar, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
Entende-se, pois, como necessária, adequada e proporcional a
REVOGAÇÃO
da medida extrema de prisão preventiva e FIXAÇÃO de medidas cautelares diversas da prisão
, na forma dos arts. 282, I e II e §§ 5º e 6º, 315 e 316, todos do CPP), sem haver um prejuízo à persecução penal.
3. ANTE O EXPOSTO
, por se vislumbrar nesse momento a
alteração parcial
do substrato fático-jurídico, diante de motivos
supervenientes
que justificam a revogação da custódia cautelar em benefício sobretudo da tutela da família e dos filhos menores da Requerente,
REVOGO a prisão preventiva decretada em face de
MARCIO JOSE FERNANDES
(“Brad”), com amparo nos arts. 282, I e II e §§ 5º e 6º, 315 e 316, todos do CPP), FIXANDO as seguintes medidas cautelares diversas da prisão
[...]
Considerando que não houve o surgimento de novos fatos que possam alterar os fundamentos para a imposição dessa medida, além desses já analisados por este Juízo no referido evento,
entende-se imperiosa e adequada a manutenção da medida cautelar de
monitoramento
eletrônico
, tendo em a medida ainda é necessária para a garantia da ordem pública e aplicação da lei penal.
4.
Haja vista
que o monitoramento eletrônico em questão atende a todos os requisitos legais, e a Ação Penal nº 5053644-61.2023.4.04.7000 se encontra em andamento,
indefiro o pedido
da Defesa, e mantenho, por ora, a medida cautelar de monitoramento eletrônico aplicada nos presentes autos, uma vez que não há qualquer fato novo apto a modificar os fundamentos de sua imposição.
5.
Intimem-se.
6.
No mais, mantenha-se a fiscalização do monitoramento eletrônico.
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Processo nº 5035844-40.2025.4.04.7100
ID: 310591173
Tribunal: TRF4
Órgão: 22ª Vara Federal de Porto Alegre
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5035844-40.2025.4.04.7100
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANNA CAROLLINE SANTANA PEREIRA
OAB/RS XXXXXX
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ADRIANO MARCOS SANTOS PEREIRA
OAB/RS XXXXXX
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AÇÃO PENAL Nº 5035844-40.2025.4.04.7100/RS
RÉU
: SILVIO AZEVEDO DIAS JUNIOR
ADVOGADO(A)
: ANNA CAROLLINE SANTANA PEREIRA (OAB RS128602)
ADVOGADO(A)
: ADRIANO MARCOS SANTOS PEREIRA (OAB RS059787)
DES…
AÇÃO PENAL Nº 5035844-40.2025.4.04.7100/RS
RÉU
: SILVIO AZEVEDO DIAS JUNIOR
ADVOGADO(A)
: ANNA CAROLLINE SANTANA PEREIRA (OAB RS128602)
ADVOGADO(A)
: ADRIANO MARCOS SANTOS PEREIRA (OAB RS059787)
DESPACHO/DECISÃO
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de
SILVIO AZEVEDO DIAS JUNIOR
,
ROGER DA SILVA HUGENTOBLER
,
MARCIO MENDES DE SOUZA
,
ADAO ADONES DA SILVA FAGUNDES
e
FABIANO DA SILVA
pela prática do(s) delito(s) disposto(s) no art. XXX, do Código Penal, porque (Evento 1):
"2.1 A partir de data não completamente precisa, mas pelo menos desde janeiro de 2022 até 06 de maio de 2025, por volta das 06 horas e 30 minutos, na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS e na cidade de Caxias do Sul/RS, SILVIO AZEVEDO DIAS JÚNIOR fabricou e falsificou papel-moeda em curso legal no país, bem como, em comunhão de esforços e unidade de desígnios com
ROGER DA SILVA HUGENTOBLER
,
FABIANO DA SILVA
e
MARCIO MENDES DE SOUZA
, manteve em guarda, vendeu e introduziu na circulação papel-moeda de curso legal no país, em incontáveis oportunidades e, em relação aos dois últimos verbos dos tipos imputados, para diversos destinatários, incorrendo reiteradamente e de forma continuada nas sanções do art. 289, caput e § 1º, combinado com o artigo 71, do Código Penal.
2.2 A partir de data não completamente precisa, mas pelo menos desde janeiro de 2022 até 06 de maio de 2025, por volta das 06 horas e 30 minutos, no endereço Rua Guatemala, nº 61, bairro Águas Mortas, CEP 94100-660, em Gravataí/RS, SILVIO AZEVEDO DIAS JÚNIOR, de forma livre e consciente, adquiriu, possuiu e guardou máquinas, aparelhos e instrumentos especialmente destinados à falsificação de moeda, incorrendo nas sanções do art. 291 do Código Penal.
2.3 A partir de data não completamente precisa, mas pelo menos desde setembro de 2024 até 06 de maio de 2025, por volta das 06 horas e 30 minutos, na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS e Caxias do Sul/RS, SILVIO AZEVEDO DIAS JÚNIOR,
ROGER DA SILVA HUGENTOBLER
,
FABIANO DA SILVA
,
MARCIO MENDES DE SOUZA
e ADÃO ADONES DA SILVA FAGUNDES, constituíram e integraram associação criminosa, incorrendo nas sanções do art. 288, caput, do Código Penal.
[...]
Por fim, necessário ressaltar a evidente grande escala da operação dessa associação criminosa, quer em relação ao tempo total em que operou, quer em relação ao vulto de valores de moedas falsas fabricadas, falsificadas, guardadas introduzidas e inseridas no meio circulante, quer, ainda, em relação à sofisticação dos meios de produção das cédulas contrafeitas.
Como já referido, há registro de que, entre 01/01/2022 e 29/05/2025, foram apreendidas 17.490 (dezessete mil e quatrocentos e noventa) cédulas falsas cédulas falsas com o código de chapa G019F5, introduzidas na circulação, ainda que em parte, pela associação criminosa ora imputada o que perfaz o valor total de UM MILHÃO SETECENTOS E QUARENTA E NOVE MIL REAIS em notas falsas apreendidas em circulação, montante corresponde a uma pequena fração do que efetivamente foi introduzido (evento 47, INF3, do IPL).
E, como referido, as cédulas contrafeitas exibiam padrões de qualidade muito elevados, considerando o tipo de papel, tintas especiais e impressoras de alta resolução utilizados para a sua confecção, hábeis a impedir a detecção por canetas especiais para tal finalidade e pelo uso de luz UV, em razão da presença de itens de segurança falsificados.
Exatamente em razão disso, estima-se que os ora denunciados auferiram, ao menos, considerando o valor mínimo pela venda das cédulas falsas, a quantia de R$ 249.757,29 (duzentos e quarenta e nove mil, setecentos e cinquenta e sete reais e vinte e nove centavos), como provento dos reiterados crimes praticados."
A inicial encontra-se formalmente regular, contendo a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, qualificação do(s) acusado(s) e classificação do crime, de modo a atender aos requisitos do art. 41 do CPP.
De outro turno, os fatos narrados apontam para uma possível tipicidade, não havendo ocorrência de prescrição ou outra causa de extinção da punibilidade, verificando-se a presença dos pressupostos processuais e das condições para o exercício da ação penal.
Por fim, a acusação está baseada em provas da existência do fato que, em tese, caracterizam a infração penal -
materialidade e autoria delitivas
- que se verificam pelos documentos colacionados ao Inquérito Policial nº 50178226520244047100 e aos autos correlatos (Pedido de Quebra de Sigilo nº 5036597-31.2024.4.04.7100, Pedido de Quebra de Sigilo nº 5046421-14.2024.4.04.7100, Pedido de Busca e Apreensão nº 5005281-63.2025.4.04.7100, Pedido de Prisão Preventiva nº 5005285-03.2025.4.04.7100, Sequestro nº 5005291-10.2025.4.04.7100 e Pedido de Quebra de Sigilo nº 5017656-96.2025.404.7100), especialmente:
a)
Informação de Polícia Judiciária nº 379995/2025 (
evento 29, INF2
, do IPL);
b)
Termo de Apreensão nº 1781781/2025 (
evento 36, MANDBUSCAAPREENS2
, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
c)
Laudo Pericial nº 1038/2025 – INC/DITEC/PF (
evento 40, LAUDO2
, do IPL);
d)
Relatório de Análise de Polícia Judiciária Nuvem Google – Parte 1 (
evento 92, INF3
e
evento 92, INF4
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100);
e)
Relatório de Análise de Polícia Judiciária Nuvem Google – Parte 2 (
evento 92, INF5
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100);
f)
Informação de Polícia Judiciária nº 379995/2025 (
evento 92, INF6
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100);
g)
Informação de Polícia Judiciária nº 1783093/2025 (
evento 15, MANDBUSCAAPREENS2
, p. 12-35, do PPP nº 5005285-03.2025.404.7100);
h)
Informação Polícia Judiciária nº 1777173/2025 (
evento 36, MANDBUSCAAPREENS4
, p. 10-12, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
i)
Informação Polícia Judiciária nº 2266266/2025 (
evento 52, INF11
, do IPL);
j)
Termo De Apreensão nº 1776766/2025 (
evento 36, MANDBUSCAAPREENS4
, p. 5-9, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
k)
Relatório de Análise de Polícia Judiciária – Material Apreendido – Parte 1 (
evento 47, INF2
, do IPL);
l)
Termo de Apreensão nº 1774286/2025 (
evento 40, MANDBUSCAAPREENS2
, p. 6, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
m)
Auto Circunstanciado nº 03 (
evento 91, INF2
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100).
Por estas razões,
RECEBO A DENÚNCIA
.
Consoante as alterações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei nº 11.719/2008, deve ser oportunizada a possibilidade de apresentação de resposta à acusação, no prazo de 10 (dez) dias (arts. 396 e 396-A), após o qual deverá o Juízo analisar as hipóteses de absolvição sumária, dispostas no art. 397 do mencionado diploma modificador.
Sendo assim,
cite(m)-se
o(s) acusado(s) para responder(em) à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, oportunidade em que deverá(ão) arguir preliminares e alegar tudo o que interessar à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário, mediante o fornecimento de endereço residencial (ou profissional) e eletrônico (ou contato de
Whatsapp
).
Cientifique(m)-se o(s) acusado(s) sobre os fins do
caput
do art. 330-A do Provimento nº 62/2017, do TRF4
, bem como de que, não tendo condições de constituir defensor, deverá(ão) dirigir-se à Defensoria Pública da União.
Por ocasião da
citação
, deverá o Sr. Oficial de Justiça certificar os endereços
residencial e eletrônico
do(s) acusado(s), bem como
telefone de contato para contato por
Whatsapp
, além de cientificá-lo(s) de que deverá(ão) manter o Juízo atualizado sobre eventuais mudanças de endereço, sob pena de revelia.
Solicite-se ao Oficial de Justiça que: 1) caso o(s) denunciado(s) se oculte(m) para não serem citado(s), observe o disposto nos artigos 362 e 370 do Código de Processo Penal; 2) na hipótese de o(s) acusado(s) não ser(em) encontrado(s), após esgotadas todas as diligências necessárias, certifique que encontra(m)-se em lugar incerto e não sabido, a fim de possibilitar a futura citação por edital.
Se o(s) réu(s), regularmente citado(s), não constituir(írem) defensor, remetam-se os autos à Defensoria Pública para os fins do disposto no art. 396-A, § 2º, da Lei nº 11.719/08.
Não sendo o(s) acusado(s) localizado(s) por Oficial de Justiça, dê-se vista dos autos ao Ministério Público Federal.
Cadastre(m)-se o(s) advogado(s) que vier(em) a atuar na defesa do(s) acusado(s)s, uma vez apresentada a(s) respectiva(s) procuração(ões).
Certifiquem-se
os antecedentes criminais do(s) denunciado(s) nas Justiças Federal e Estadual.
Caso haja valores depositados nos autos do IPL
,
transfiram-se
as referidas quantias para esta Ação Penal.
Altere-se
a situação de parte dos réus SILVIO e FABIANO para "DENUNCIADO - PRESO POR ESTE" e dos demais para "DENUNCIADO".
Diligencie a Secretaria
, em consulta ao SEEU, para verificar a existência de eventual execução penal
ativa
em desfavor do(s) acusado(s) e,
em caso positivo
, deverá ser comunicado ao respectivo Juízo da Execução Penal o recebimento da presente denúncia.
Intime-se
o Ministério Público Federal.
Nos termos do art. 330-A do Provimento nº 62/2017, da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região,
intime-se
o MPF para especificar, dentre os bens apreendidos no IPL correlato, quais entende devem ser mantidos sob guarda judicial para a instrução processual e quais podem ser objeto de devolução, destinação, alienação antecipada ou destruição.
Finalmente, considerando a manifestação fundamentada do
Parquet
ao
evento 1
,
esclarecendo
não
ser o caso de oferecimento de Acordo de Não Persecução Penal (ANPP),
intime(m)-se
o(s) denunciado(s) de que, se quiser(em), poderá(ão) requerer a remessa dos autos à Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, na forma do art. 28 deste Código, para reanálise.
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Processo nº 5035844-40.2025.4.04.7100
ID: 314221875
Tribunal: TRF4
Órgão: 22ª Vara Federal de Porto Alegre
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5035844-40.2025.4.04.7100
Data de Disponibilização:
02/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARIA GABRIELA DE ABREU MACHADO
OAB/RS XXXXXX
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AÇÃO PENAL Nº 5035844-40.2025.4.04.7100/RS
RÉU
: ADAO ADONES DA SILVA FAGUNDES
ADVOGADO(A)
: MARIA GABRIELA DE ABREU MACHADO (OAB RS107384)
RÉU
: FABIANO DA SILVA
ADVOGADO(A)
: MARIA GABRIELA DE ABR…
AÇÃO PENAL Nº 5035844-40.2025.4.04.7100/RS
RÉU
: ADAO ADONES DA SILVA FAGUNDES
ADVOGADO(A)
: MARIA GABRIELA DE ABREU MACHADO (OAB RS107384)
RÉU
: FABIANO DA SILVA
ADVOGADO(A)
: MARIA GABRIELA DE ABREU MACHADO (OAB RS107384)
DESPACHO/DECISÃO
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de
SILVIO AZEVEDO DIAS JUNIOR
,
ROGER DA SILVA HUGENTOBLER
,
MARCIO MENDES DE SOUZA
,
ADAO ADONES DA SILVA FAGUNDES
e
FABIANO DA SILVA
pela prática do(s) delito(s) disposto(s) no art. XXX, do Código Penal, porque (Evento 1):
"2.1 A partir de data não completamente precisa, mas pelo menos desde janeiro de 2022 até 06 de maio de 2025, por volta das 06 horas e 30 minutos, na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS e na cidade de Caxias do Sul/RS, SILVIO AZEVEDO DIAS JÚNIOR fabricou e falsificou papel-moeda em curso legal no país, bem como, em comunhão de esforços e unidade de desígnios com
ROGER DA SILVA HUGENTOBLER
,
FABIANO DA SILVA
e
MARCIO MENDES DE SOUZA
, manteve em guarda, vendeu e introduziu na circulação papel-moeda de curso legal no país, em incontáveis oportunidades e, em relação aos dois últimos verbos dos tipos imputados, para diversos destinatários, incorrendo reiteradamente e de forma continuada nas sanções do art. 289, caput e § 1º, combinado com o artigo 71, do Código Penal.
2.2 A partir de data não completamente precisa, mas pelo menos desde janeiro de 2022 até 06 de maio de 2025, por volta das 06 horas e 30 minutos, no endereço Rua Guatemala, nº 61, bairro Águas Mortas, CEP 94100-660, em Gravataí/RS, SILVIO AZEVEDO DIAS JÚNIOR, de forma livre e consciente, adquiriu, possuiu e guardou máquinas, aparelhos e instrumentos especialmente destinados à falsificação de moeda, incorrendo nas sanções do art. 291 do Código Penal.
2.3 A partir de data não completamente precisa, mas pelo menos desde setembro de 2024 até 06 de maio de 2025, por volta das 06 horas e 30 minutos, na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS e Caxias do Sul/RS, SILVIO AZEVEDO DIAS JÚNIOR,
ROGER DA SILVA HUGENTOBLER
,
FABIANO DA SILVA
,
MARCIO MENDES DE SOUZA
e ADÃO ADONES DA SILVA FAGUNDES, constituíram e integraram associação criminosa, incorrendo nas sanções do art. 288, caput, do Código Penal.
[...]
Por fim, necessário ressaltar a evidente grande escala da operação dessa associação criminosa, quer em relação ao tempo total em que operou, quer em relação ao vulto de valores de moedas falsas fabricadas, falsificadas, guardadas introduzidas e inseridas no meio circulante, quer, ainda, em relação à sofisticação dos meios de produção das cédulas contrafeitas.
Como já referido, há registro de que, entre 01/01/2022 e 29/05/2025, foram apreendidas 17.490 (dezessete mil e quatrocentos e noventa) cédulas falsas cédulas falsas com o código de chapa G019F5, introduzidas na circulação, ainda que em parte, pela associação criminosa ora imputada o que perfaz o valor total de UM MILHÃO SETECENTOS E QUARENTA E NOVE MIL REAIS em notas falsas apreendidas em circulação, montante corresponde a uma pequena fração do que efetivamente foi introduzido (evento 47, INF3, do IPL).
E, como referido, as cédulas contrafeitas exibiam padrões de qualidade muito elevados, considerando o tipo de papel, tintas especiais e impressoras de alta resolução utilizados para a sua confecção, hábeis a impedir a detecção por canetas especiais para tal finalidade e pelo uso de luz UV, em razão da presença de itens de segurança falsificados.
Exatamente em razão disso, estima-se que os ora denunciados auferiram, ao menos, considerando o valor mínimo pela venda das cédulas falsas, a quantia de R$ 249.757,29 (duzentos e quarenta e nove mil, setecentos e cinquenta e sete reais e vinte e nove centavos), como provento dos reiterados crimes praticados."
A inicial encontra-se formalmente regular, contendo a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, qualificação do(s) acusado(s) e classificação do crime, de modo a atender aos requisitos do art. 41 do CPP.
De outro turno, os fatos narrados apontam para uma possível tipicidade, não havendo ocorrência de prescrição ou outra causa de extinção da punibilidade, verificando-se a presença dos pressupostos processuais e das condições para o exercício da ação penal.
Por fim, a acusação está baseada em provas da existência do fato que, em tese, caracterizam a infração penal -
materialidade e autoria delitivas
- que se verificam pelos documentos colacionados ao Inquérito Policial nº 50178226520244047100 e aos autos correlatos (Pedido de Quebra de Sigilo nº 5036597-31.2024.4.04.7100, Pedido de Quebra de Sigilo nº 5046421-14.2024.4.04.7100, Pedido de Busca e Apreensão nº 5005281-63.2025.4.04.7100, Pedido de Prisão Preventiva nº 5005285-03.2025.4.04.7100, Sequestro nº 5005291-10.2025.4.04.7100 e Pedido de Quebra de Sigilo nº 5017656-96.2025.404.7100), especialmente:
a)
Informação de Polícia Judiciária nº 379995/2025 (
evento 29, INF2
, do IPL);
b)
Termo de Apreensão nº 1781781/2025 (
evento 36, MANDBUSCAAPREENS2
, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
c)
Laudo Pericial nº 1038/2025 – INC/DITEC/PF (
evento 40, LAUDO2
, do IPL);
d)
Relatório de Análise de Polícia Judiciária Nuvem Google – Parte 1 (
evento 92, INF3
e
evento 92, INF4
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100);
e)
Relatório de Análise de Polícia Judiciária Nuvem Google – Parte 2 (
evento 92, INF5
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100);
f)
Informação de Polícia Judiciária nº 379995/2025 (
evento 92, INF6
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100);
g)
Informação de Polícia Judiciária nº 1783093/2025 (
evento 15, MANDBUSCAAPREENS2
, p. 12-35, do PPP nº 5005285-03.2025.404.7100);
h)
Informação Polícia Judiciária nº 1777173/2025 (
evento 36, MANDBUSCAAPREENS4
, p. 10-12, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
i)
Informação Polícia Judiciária nº 2266266/2025 (
evento 52, INF11
, do IPL);
j)
Termo De Apreensão nº 1776766/2025 (
evento 36, MANDBUSCAAPREENS4
, p. 5-9, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
k)
Relatório de Análise de Polícia Judiciária – Material Apreendido – Parte 1 (
evento 47, INF2
, do IPL);
l)
Termo de Apreensão nº 1774286/2025 (
evento 40, MANDBUSCAAPREENS2
, p. 6, do PBA nº 5005281-63.2025.404.7100);
m)
Auto Circunstanciado nº 03 (
evento 91, INF2
, do PQS nº 5036597-31.2024.4.04.7100).
Por estas razões,
RECEBO A DENÚNCIA
.
Consoante as alterações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei nº 11.719/2008, deve ser oportunizada a possibilidade de apresentação de resposta à acusação, no prazo de 10 (dez) dias (arts. 396 e 396-A), após o qual deverá o Juízo analisar as hipóteses de absolvição sumária, dispostas no art. 397 do mencionado diploma modificador.
Sendo assim,
cite(m)-se
o(s) acusado(s) para responder(em) à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, oportunidade em que deverá(ão) arguir preliminares e alegar tudo o que interessar à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário, mediante o fornecimento de endereço residencial (ou profissional) e eletrônico (ou contato de
Whatsapp
).
Cientifique(m)-se o(s) acusado(s) sobre os fins do
caput
do art. 330-A do Provimento nº 62/2017, do TRF4
, bem como de que, não tendo condições de constituir defensor, deverá(ão) dirigir-se à Defensoria Pública da União.
Por ocasião da
citação
, deverá o Sr. Oficial de Justiça certificar os endereços
residencial e eletrônico
do(s) acusado(s), bem como
telefone de contato para contato por
Whatsapp
, além de cientificá-lo(s) de que deverá(ão) manter o Juízo atualizado sobre eventuais mudanças de endereço, sob pena de revelia.
Solicite-se ao Oficial de Justiça que: 1) caso o(s) denunciado(s) se oculte(m) para não serem citado(s), observe o disposto nos artigos 362 e 370 do Código de Processo Penal; 2) na hipótese de o(s) acusado(s) não ser(em) encontrado(s), após esgotadas todas as diligências necessárias, certifique que encontra(m)-se em lugar incerto e não sabido, a fim de possibilitar a futura citação por edital.
Se o(s) réu(s), regularmente citado(s), não constituir(írem) defensor, remetam-se os autos à Defensoria Pública para os fins do disposto no art. 396-A, § 2º, da Lei nº 11.719/08.
Não sendo o(s) acusado(s) localizado(s) por Oficial de Justiça, dê-se vista dos autos ao Ministério Público Federal.
Cadastre(m)-se o(s) advogado(s) que vier(em) a atuar na defesa do(s) acusado(s)s, uma vez apresentada a(s) respectiva(s) procuração(ões).
Certifiquem-se
os antecedentes criminais do(s) denunciado(s) nas Justiças Federal e Estadual.
Caso haja valores depositados nos autos do IPL
,
transfiram-se
as referidas quantias para esta Ação Penal.
Altere-se
a situação de parte dos réus SILVIO e FABIANO para "DENUNCIADO - PRESO POR ESTE" e dos demais para "DENUNCIADO".
Diligencie a Secretaria
, em consulta ao SEEU, para verificar a existência de eventual execução penal
ativa
em desfavor do(s) acusado(s) e,
em caso positivo
, deverá ser comunicado ao respectivo Juízo da Execução Penal o recebimento da presente denúncia.
Intime-se
o Ministério Público Federal.
Nos termos do art. 330-A do Provimento nº 62/2017, da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região,
intime-se
o MPF para especificar, dentre os bens apreendidos no IPL correlato, quais entende devem ser mantidos sob guarda judicial para a instrução processual e quais podem ser objeto de devolução, destinação, alienação antecipada ou destruição.
Finalmente, considerando a manifestação fundamentada do
Parquet
ao
evento 1
,
esclarecendo
não
ser o caso de oferecimento de Acordo de Não Persecução Penal (ANPP),
intime(m)-se
o(s) denunciado(s) de que, se quiser(em), poderá(ão) requerer a remessa dos autos à Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, na forma do art. 28 deste Código, para reanálise.
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Cleonice Da Silva Alves x Banco Bmg S.A
ID: 331795642
Tribunal: TRF4
Órgão: 11ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5009122-09.2024.4.04.7001
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ADRIANO MOLIN AURELIANO
OAB/PR XXXXXX
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CRISTIANA NEPOMUCENO DE SOUSA SOARES
OAB/MG XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5009122-09.2024.4.04.7001/PR
AUTOR
: CLEONICE DA SILVA ALVES
ADVOGADO(A)
: ADRIANO MOLIN AURELIANO (OAB PR087257)
RÉU
: BANCO BMG S.A
ADVOGADO(A)
: CRISTIAN…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5009122-09.2024.4.04.7001/PR
AUTOR
: CLEONICE DA SILVA ALVES
ADVOGADO(A)
: ADRIANO MOLIN AURELIANO (OAB PR087257)
RÉU
: BANCO BMG S.A
ADVOGADO(A)
: CRISTIANA NEPOMUCENO DE SOUSA SOARES (OAB MG071885)
DESPACHO/DECISÃO
I - RELATÓRIO
CLEONICE DA SILVA ALVES ingressou com a presente ação de cobrança em face de BANCO BMG S.A e INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS.
Relatou, para tanto, que recebe benefício previdenciário de pensão por morte do INSS, e que constatou a existência de descontos intitulado "Empréstimos sobre a RMC", com descontos iniciais de cerca de R$ 12,00 (doze reais), aumentando gradualmente, até chegar no importe de R$ 136,52 (cento e trinta e seis reais e cinquenta e dois centavos). Sustenta, entretanto, que jamais efetuou empréstimos através de cartão de crédito. Relata que se dirigiu a uma agência da requerida BMG, local no qual foi surpreendida com a notícia de que possuía um cartão de crédito ativo. Prossegue esclarecendo que, embora tenha formalizado um contrato de empréstimo junto à requerida BMG, jamais formalizara contrato de cartão de crédito.
No mérito, postulou a condenação das requeridas ao pagamento de indenização por danos materiais no importe mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e repetição de indébito dos valores pagos. Pugnou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso, com a consequente inversão do ônus probatório.
Atribuiu à causa o valor de R$ 15.000,00 e anexou documentos.
Contestação do INSS em movimento
9.1
invocando sua ilegitimidade para a demanda, alegou não possuir responsabilidade pelos fatos relatados e requereu, em eventual concessão da tutela antecipada, que o cumprimento da obrigação de fazer seja imposto à instituição financeira.
O BANCO BMG S.A apresentou sua contestação em evento
12.1
, ocasião na qual apresentou informações sobre o seu produto (cartão de crédito consignado). No mérito, em preliminar, aduziu ser cabível a exclusão do INSS no polo passivo, com a consequente declaração de incompetência do juizado especial federal para julgamento da causa. Prosseguiu aduzindo que a petição inicial é inepta, diante da ausência de prévia reclamação na esfera administrativa.
No mérito, a requerida BMG sustenta a ocorrência de prescrição, aduzindo que o contrato foi firmado em 24/07/2013 e a demanda proposta somente em 21/05/2024, pleiteando a extinção do processo sem julgamento do mérito. Ademais, sustenta a ocorrência de decadência tendo em vista o lapso temporal entre ajuizamento da ação e data de celebração do contrato. Alegou a regularidade dos descontos, tendo em vista a efetiva contratação do cartão de crédito consignado, havendo prévia ciência da autora sobre suas condições, não podendo ser o contrato anulado. Por fim, pugnou a improcedência da demanda.
Intimadas a esclarecerem as provas que pretendem produzir (movimento
14.1
), o INSS não manifestou interesse na produção de outras provas (movimento
19.1
), o BANCO BMG S.A manifestou interesse na realização de audiência de instrução e julgamento para oitiva da autora, para fins de demonstrar a contratação do cartão de crédito em discussão, e, por fim, a autora apresentou réplica em evento
25.1
e esclarece não possuir interesse na produção de outras provas.
O BANCO BMG requereu a juntada das faturas de cartão de crédito em movimento
22.1
.
É o relatório. Decido.
II - FUNDAMENTAÇÃO
2.1.
Competência
da
Justiça
Federal:
Reconheço a competência da Justiça Federal para o caso, dado que a autora endereçou sua pretensão ao INSS, autarquia federal criada com força na
lei n. 8.029/1990, art. 17
. Logo, aplica-se ao caso o art. 109, I, CF/1988.
2.2. Submissão do caso à alçada e rito dos Juizados:
Por outro lado, a competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta, diante do previsto no art. 98, I, Constituição e art. 3 da lei n. 10.259, de 2001. Logo, em princípio, não pode ser ampliada ou reduzida, impondo sua apreciação de ofício pelo Poder Judiciário, conforme art. 64, CPC.
Não se submetem à "
competência do Juizado Especial Cível as causas: (...) para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal
."
Convém ter em conta, todavia, que o processo é individualizado pela conjugação do trinômio partes, pedido e causa de pedir (art. 337, §2 CPC). Em decorrência do princípio da substanciação, a parte autora é obrigada a detalhar, na peça inicial, a sua pretensão, indicando o pedido e também a motivação do pedido. Note-se ainda que, como notório, apenas o dispositivo transita em julgado, conforme se infere do rt. 504, I, CPC:
"
Não fazem coisa julgada: I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença
."
Logo, como têm entendido os tribunais, os Juizados Especiais são competentes para apreciação de pretensões nas quais a alegada nulidade do ato administrativo é invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido:
"(....) Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º , § 1º , III , da Lei 10.259 ,
uma vez que a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
. Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal."
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50446614920184047000 PR 5044661-49.2018.4.04.7000, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, Data de Julgamento: 02/04/2020).
Ainda segundo a Turma Recursal,
"O valor da causa atribuído pela parte autora é inferior a 60 salários, o qual não foi impugnado, logo, não há o que discutir quanto a esse aspecto.
Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259, uma vez que "a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
". Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal. "
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50029127820204047001 PR 5002912-78.2020.4.04.7001, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, 22/10/2020, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Atente-se para os julgados que transcrevo abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE JUÍZO FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. COMPETÊNCIA DESTA E. CORTE. SÚMULA 428 DO STJ. AÇÃO INDIVIDUAL DE DISPENSA DE PAGAMENTO DE PEDÁGIO. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. PRECEDENTES DESTA 2ª SEÇÃO. CONFLITO PROCEDENTE. 1 - Nos termos da Súmula 428 do Superior Tribunal de Justiça, compete a esta E. Corte dirimir o presente conflito negativo de competência entre Juízo Federal e Juizado Especial Federal Cível. 2 - Busca a autora tão somente o reconhecimento de seu direito individual à dispensa do pagamento de pedágio na praça de arrecadação instalada no entroncamento das rodovias BR 153 e BR 369, localizada no município de Jacarezinho/PR, com fundamento na Portaria do Ministério dos Transportes nº 155/2004 bem como na sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 2006.70.13.002434-3. 3 -
A questão relativa à desconstituição de ato administrativo não faz parte do pedido do autor, que dela tratou apenas de forma incidental, como causa de pedir, de modo que, no caso dos autos, resta afastada a aplicação do art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259/01. Precedentes desta Segunda Seçã
o. 4 - Aplicável à hipótese em tela a regra geral prevista no caput do artigo 3º da Lei 10.259/2001, que estabelece a competência dos Juizados Especiais Federais em se tratando de causas com valor inferior a sessenta salários mínimos. 5 - Conflito procedente, para declarar a competência do Juizado Especial Federal Cível de Ourinhos/SP.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o conflito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
(CC - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 21150 0000310-88.2017.4.03.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - SEGUNDA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/07/2017).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. AÇÃO ORDINÁRIA QUE VISA O RECONHECIMENTO DE DIREITO. MERA REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DO INCISO III DO §1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 10.250/01. A
parte autora pleiteia a declaração de direito à percepção de determinada vantagem pecuniária, não havendo pedido imediato de anulação de qualquer ato administrativo, o qual só seria atingido via reflexa, razão pela qual não se aplica, na espécie, a regra que excepciona da competência dos Juizados Especiais Federais para causas valoradas até sessenta salários mínimos. Inaplicável ao caso a exceção prevista no inc. III do §1º do art. 3º da Lei nº 10.259/01
. (TRF4 5018358-17.2016.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 22/12/2016).
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. COMPETÊNCIA DO STJ PARA APRECIAR O CONFLITO. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. COMPETÊNCIA. CRITÉRIOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL EM FACE DO VALOR DA CAUSA. 1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que juízo de juizado especial não está vinculado jurisdicionalmente ao tribunal com quem tem vínculo administrativo, razão pela qual o conflito entre ele e juízo comum caracteriza-se como conflito entre juízos não vinculados ao mesmo tribunal, o que determina a competência do STJ para dirimi-lo, nos termos do art. 105, I, d, da Constituição. Precedentes. 2. A Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, estabeleceu que a competência desses Juizados têm natureza absoluta e que, em matéria cível, obedece como regra geral a do valor da causa: são da sua competência as causas com valor de até sessenta salários mínimos (art. 3º). 3. A essa regra foram estabelecidas exceções ditadas (a) pela natureza da demanda ou do pedido (critério material), (b) pelo tipo de procedimento (critério processual) e (c) pelos figurantes da relação processual (critério subjetivo).
Entre as exceções fundadas no critério material está a das causas que dizem respeito a "anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal". 4. No caso, a demanda tem valor da causa inferior a sessenta salários mínimos e visa a obter indenização por danos morais. A ilegitimidade dos atos administrativos constitui apenas fundamento do pedido, não seu objeto
. 5. Conflito conhecido, declarando-se a competência do Juízo Federal da 7ª Vara do Juizado Especial Cível da Subseção Judiciária de São Luís -MA, o suscitante. (STJ, CC 75314/MA, 1ª Seção, Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 27/08/2007).
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXCEÇÃO DO ART. 3º, § 1º, INC. III, DA LEI Nº 10.259/01 AFASTADA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
A pretensão formulada nesta ação não se enquadra em nenhuma das hipóteses arroladas no § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, visto não tratar a ação de anulação ou cancelamento de ato administrativo típico.
O pedido envolve, apenas, reconhecimento de direito. Sendo o valor da causa inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, cabe ao Juizado Especial Federal a competência para processar, conciliar e julgar as causas de competência da Justiça Federal
. (TRF4, conflito de competência (Seção) Nº 5008065-61.2011.404.0000, 2ª Seção, Des. Federal VILSON DARÓS, POR UNANIMIDADE, em 08/09/11).
Assim, e atribuído à causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tem-se que competente para o processamento e julgamento da lide o Juizado Especial Federal
. Diante do exposto, nos termos do disposto no art. 120, § único, do CPC, conheço do presente conflito e declaro competente para o processamento e julgamento da lide o juízo suscitado (Juízo Substituto da 1ª Vara de Florianópolis). Publique-se. Comuniquem-se os juízos conflitantes e, com as formalidades de estilo, dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos.
(TRF4 5013834-11.2015.404.0000, Segunda Seção, Relator Candido Alfredo Silva Leal Junior, 11/07/2015)
Assim, em princípio, a presente causa submete-se ao rito e à alçada dos Juizados Especiais Federais, dado que o conteúdo econômico da pretensão da parte autora é inferior a 60 salários mínimos, definidos na Medida Provisória n. 1.143/2022 - convertida na lei n. 14.663/2023 -, atendendo ao art. 3 da lei n. 10.259, de 2001. A aventada nulidade do ato administrativo de averbação dos descontos mensais, no benefício previdenciário da autora, foi invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido.
Eventual complexidade da demanda não implica incompetência dos Juizados:
"A Lei 10.259/2001 estabelece a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para causas de valor até 60 salários mínimos,
independentemente da complexidade
. 5. O critério de competência dos Juizados Especiais Federais é quantitativo, e o argumento da agravante quanto ao número de testemunhas não é capaz de afastar tal competência. 6. Agravo Interno não provido."
(STJ - AgInt no REsp: 2059305 AL 2023/0090671-3, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 16/10/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/12/2023)
A pretensão da autora é de natureza condenatória, não esbarrando nas exceções do art. 3º, §1º, lei n. 10.259, de 2001.
2.3.
Competência
da presente Subseção Judiciária:
A pretensão deduzida na peça inicial submete-se à alçada desta Subseção Judiciaria de Curitiba, por força do art. 53, III, "d", CPC/15
, dado constituir-se no local de cogitado adimplemento da obrigação aludida na peça inicial, caso a pretensão da autora venha a ser julgada procedente, em sentença transitada em julgado. Ademais, ainda que assim não fosse, é fato que o STF tem aplicado o art. 109,§2º, CF, também quando em causa pretensões endereçadas às autarquias federais.
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA. CAUSAS AJUIZADAS CONTRA A UNIÃO. ART. 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO DO FORO COMPETENTE. APLICABILIDADE ÀS AUTARQUIAS FEDERAIS, INCLUSIVE AO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. I - A faculdade atribuída ao autor quanto à escolha do foro competente entre os indicados no art. 109, § 2º, da Constituição Federal para julgar as ações propostas contra a União tem por escopo facilitar o acesso ao Poder Judiciário àqueles que se encontram afastados das sedes das autarquias. II –
Em situação semelhante à da União, as autarquias federais possuem representação em todo o território nacional. III - As autarquias federais gozam, de maneira geral, dos mesmos privilégios e vantagens processuais concedidos ao ente político a que pertencem. IV - A pretendida fixação do foro competente com base no art. 100, IV, a, do CPC nas ações propostas contra as autarquias federais resultaria na concessão de vantagem processual não estabelecida para a União, ente maior, que possui foro privilegiado limitado pelo referido dispositivo constitucional. V - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem decidido pela incidência do disposto no art. 109, § 2º, da Constituição Federal às autarquias federais. Precedentes. VI - Recurso extraordinário conhecido e improvido
. (STF - RE: 627709 DF, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 20/08/2014, Tribunal Pleno, Data de Publicação: REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO)
Nesse mesmo sentido, convergem os julgados: RE 499.093-AgR-segundo/PR e AI 793.409/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski; RE 234.059/AL, Rel. Min. Menezes Direito; RE 484.235-AgR/MG, Rel. Min. Ellen Gracie; RE 488.704/RJ, RE 527.498/SC e RE 603.311/RS, Rel. Min. Marco Aurélio; RE 590.649/RJ, RE 474.691/SC e RE 491.331/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 474.825/PR, Rel. Min. Dias Toffoli.
O art. 109, §2º, CF, prevalece sobre o art. 3º, §3º, da lei n. 10.259, de 2001. Com efeito,
"A competência absoluta dos Juizados Especiais, referida no art. 3º , § 3º , da Lei n. 10.259 /01 não constitui obstáculo à redistribuição para fins de equalização de acervo, desde que o encaminhamento ocorra para outra Vara com competência também vinculada ao sistema dos Juizados Especiais Federais. 5. A norma que afirma que "no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta" tem ligação histórica com a interpretação dada pela doutrina e pela jurisprudência à Lei nº 9.099 /95, no sentido de que "o ajuizamento da ação perante o juizado especial é uma opção do autor (art. 3 ., par.3., da Lei 9.099 /95)" ( REsp 151.703/RJ , Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 24/03/1998, DJ 08/06/1998, p. 124). 6.
O ajuizamento obrigatório de causas de até 60 salários mínimos nos Juizados Especiais Federais empresta a essas ações uma competência absoluta para o próprio sistema dos Juizados Especiais, mas não torna essas ações infensas às medidas de equalização. Nada impede, portanto, a incidência do art. 109 , § 2º , da Constituição Federal , no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal
."
(TRF-4 - CC: 50799694420214047000 PR 5079969-44.2021.4.04.7000, Relator: NICOLAU KONKEL JÚNIOR, Data de Julgamento: 24/02/2022, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Por conseguinte,
considerando o alcance do art. 109, §2, CF, a tramitação desta causa perante esta Subseção Judiciária está em conformidade com a legislação
. Ademais, a declinação de competência territorial depende de prévia exceção de incompetência, na forma do art. 65, CPC/15, e súmula 33, Superior Tribunal de Justiça.
2.4. Submissão da causa ao presente Juízo:
A demanda em causa foi distribuída ao presente Juízo Substituto da 11.VF, em razão de auxílio de equalização, o que atendeu à garantia do Juízo Natural - art. 5, LIII, Constituição/88.
2.5. Pertinência subjetiva da autora:
Atentando para o art. 17, CPC, anoto que a autora está legitimada para a causa, dado que, segundo narrou na peça inicial, o seu benefício previdenciário estaria sendo alvo de descontos indevidos. Ela deduziu pretensão em nome próprio, na defesa de interesse próprio, não esbarrando na vedação do art. 18, CPC/15
.
2.6. Legitimidade do INSS para a causa:
Por seu turno,
o INSS possui legitimidade para responder à pretensão indenizatória, fundada em alegados vícios na transferência da conta de depósito de prestações previdenciárias
. Na forma do art.115, da lei n. 8.213/1990, a autarquia é responsável pela averbação dos descontos no benefício previdenciário.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. INTERESSE DE AGIR. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO.
O INSS é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda em que os segurados buscam desconstituir contrato de compra e venda de produto que deu origem a descontos nos benefícios previdenciários por meio de consignação em folha de pagamento. Precedentes
. O esgotamento da via administrativa não constitui requisito essencial ao ajuizamento de ação judicial, cujo acesso se dá ao jurisdicionado, nos termos do art. 5º, XXXV, da Carta Magna. Comprovado o evento danoso e o nexo causal, o INSS responde, juntamente com a instituição financeira, pelos descontos indevidos em benefício previdenciário causados por empréstimos consignados fraudulentos. Cabível indenização por danos morais à autora que teve seu benefício previdenciário reduzido em decorrência de fraude praticada por terceiro no âmbito de operações bancárias. (TRF4, AC 5014498-92.2014.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 26/07/2019).
2.7. Litisconsórcio passivo necessário - banco requerido:
O banco demandado também está legitimado para a demanda, diante da alegação de que referidos valores, desbastados no benefício previdenciário do requerente, lhe teriam sido transferidos, na condição de mutuante. Aplica-se ao caso, também aqui, o art. 17, CPC
.
DIREITO ADMINISTRATIVO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. INTERESSE DE AGIR. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO.
O INSS é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda em que os segurados buscam desconstituir contrato de compra e venda de produto que deu origem a descontos nos benefícios previdenciários por meio de consignação em folha de pagamento. Precedentes
. O esgotamento da via administrativa não constitui requisito essencial ao ajuizamento de ação judicial, cujo acesso se dá ao jurisdicionado, nos termos do art. 5º, XXXV, da Carta Magna. Comprovado o evento danoso e o nexo causal, o INSS responde, juntamente com a instituição financeira, pelos descontos indevidos em benefício previdenciário causados por empréstimos consignados fraudulentos. Cabível indenização por danos morais à autora que teve seu benefício previdenciário reduzido em decorrência de fraude praticada por terceiro no âmbito de operações bancárias. (TRF4, AC 5014498-92.2014.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 26/07/2019).
Na espécie, a autora deduziu pretensão à declaração da invalidade e inexigibilidade das aludidas prestações, desbastadas junto à sua prestação previdenciária mensal. Assim, cuida de efetivo litisconsórcio passivo necessário, por força do
art. 506 e dos arts. 114-115, CPC
.
2.8. Interesse processual:
Ao que se infere dos autos, a pretensão da demandante dificilmente seria acolhida pelos requeridos na espera extrajudicial. É o que indicam as contestações apresentadas pelos demandados. Ademais, por força do
art. 5, XXXV, Constituição
, o requerente não está obrigado a exaurir o debate no âmbito administrativo, antes de ingressar em Juízo.
Por outro lado, caso a pretensão venha a ser julgada procedente pelo Poder Judiciário, isso lhe será útil, por ensejar a suspensão dos descontos no seu benefício previdenciário. A via processual eleita se revela adequada, de modo que aludido requisito, previsto no art. 17, CPC, foi atendido. Assim, a tríade necessidade/utilidade/adequação procedimental restou satisfeita,
razão pela qual indefiro a preliminar aventada pela requerida BANCO BMG S/A.
2.9. Gratuidade de Justiça:
No que toca à gratuidade de Justiça, anoto que a Constituição da República dispôs, no seu art. 5º LXXIV, que
"
o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos
."
Essa mesma lógica eclode do art. 24, XIII e do art. 134, Constituição Federal/1988.
Ademais, a Constituição recepcionou a antiga lei 1060/1950, responsável por detalhar as hipóteses do que se convencionou chamar de justiça gratuita.
Registro que o CPC/15 manteve a vigência da norma veiculada no art. 13 da lei 1060/1950 (art. 1072, III,
a contrario senso
), ao tempo em que admitiu o deferimento parcial da gratuidade.
Araken de Assis assim analisa a questão:
"- Isenção total - Em princípio, ao litigante interessa forrar-se integralmente do custo financeiro do processo. A isenção total tem por objeto, portanto, o art. 98, §1º, I a IX, ficando suspensa a exigibilidade do dever de reembolsar as despesas suportadas pelo adversário, no todo ou em parte - a perícia requerida por ambas a partes tem seu custo repartido, a teor do art. 95, caput, e, portanto, competiria ao beneficiário reembolsar em parte o vencedor - o pagamento de honorários ao advogado do vencedor, pelo prazo de cinco anos, a teor do art. 98, §3º.
- Isenção parcial - Mantido pelo art. 1.072, III, NCPC, o art. 13 da lei 1060/1950 subentende a concessão parcial do benefício de gratuidade. Essa possibilidade encontra-se prevista de modo mais nítido no art. 98, §5º, segundo o qual o juiz concederá gratuidade em relação a algum ou a todos os atos processuais. Pode acontecer de o litigante, conduzindo-se segundo os ditames da boa-fé (art. 5º) alegar não dispor de recursos para adiantar, v.g., os honorários do perito, sem dúvida despesa de vulto. Em tal hipótese, o órgão judiciário concederá isenção parcial, provocando a incidência, nesse caso, do art. 95, §2º.
- Isenção remissória - O art. 98, §5º, in fine, autoriza o juiz a reduzir percentualmente as despesas processuais que incumbe à parte adiantar no curso do processo. O benefício não alivia a parte da antecipação quanto a um ato específico. Limita o benefício à parte da despesa; por exemplo, fixada a indenização da testemunha em 100, o beneficiário paga 50, ficando a parte remanescente postergada para o fim do processo. Saindo-se vencedor o beneficiário, a contraparte cumprirá o art. 492, quanto à parte isentada, e reembolsará o beneficiário da outra metade.
-
Isenção diferida - A isenção parcial do art. 13 da lei 1060/1950 inspirou duas modalidades de diferimento: (a) o pagamento ao final, embora vencido o beneficiário; (b) o pagamento parcelado da despesa, objeto de previsão no art. 98, §6º. Por exemplo a parte não dispõe da totalidade dos honorários do perito arbitrado pelo juiz e, nessa contingência, requer o pagamento em três ou mais parcelas mensais consecutivas. O pagamento ao fim do processo é mais radical. A parte aposta no sucesso, transferindo, secundum eventuam litis, todas as despesas ao adversário. E, não logrando êxito, ficará isenta pelo prazo legal
(art. 98, §3º)." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. São Paulo: RT, 2015, p. 535-536)
Quanto aos requisitos para a concessão, reporto-me à análise de Rafael Alexandria de Oliveira:
"Faz jus ao benefício da gratuidade de justiça aquela pessoa com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios (art. 98). Não se exige miserabilidade, nem estado de necessidade, nem tampouco se fala em renda familiar ou faturamento máximos. É possível que uma pessoa natural, mesmo com boa renda mensal, seja merecedora do benefício, e que também o seja aquele sujeito que é proprietário de bens imóveis, mas não dispõe de liquidez. A gratuidade judiciária é um dos mecanismos de viabilização do acesso à justiça; não se pode exigir que, para ter acesso à justiça, o sujeito tenha que comprometer significativamente a sua renda, ou tenha que se desfazer de seus bens, liquidando-os para angariar recursos e custear o processo."
(OLIVEIRA, Rafael Alexandria in WAMBIER, Teresa Alvim.
Breves comentários ao novo CPC.
São Paulo: RT, 2015, p. 359)
Convém atentar, ademais, para a precisa avaliação de Araken de Assis:
"À concessão do benefício, nos termos postos no art. 98, caput, fundamentalmente interessa não permitir a situação econômica da parte atender às despesas do processo. É irrelevante a renda da pessoa, porque as causas podem ser vultuosas e sem recursos para o interessado. Igualmente, nenhum é o relevo da existência de patrimônio. E, de fato, se mesmo tendo um bem imóvel, os rendimentos da parte não lhe são suficientes para arcar com custas e honorários sem prejuízo do sustenta, tal propriedade não é empecilho à concessão da gratuidade. Parece pouco razoável exigir que alguém se desfaça de seus bens para atender ás despesas do processo. Nada assegura, a fortiori, o retorno à situação patrimonial anterior, em virtude do desfecho vitorioso do processo. (...) Funda-se o benefício da gratuidade numa equação econômica: a noção da necessidade decorre da inexistência de recursos financeiros, apuradas entre a receita e a despesa, capazes de atender o custo da demanda. Considera-se a situação atual da pessoa, mostrando-se irrelevante a sua antiga fortuna, dissipada ou perdida nos azares da vida."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. São Paulo: RT, 2015, p. 549)
Note-se também que o TRF4 tem entendido que a gratuidade de Justiça há de ser deferida a quem receba
remuneração mensal
líquida
inferior ao
teto de benefícios do RGPS
, definido em
R$ 7.786,02
, conforme Portaria Interministerial MPS/MF nº 2, de 11.01.2024:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. HIPÓTESES DE CABIMENTO. COMPLEMENTAÇÃO. NECESSIDADE. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. RENDIMENTOS SUPERIORES AO TETO DOS BENEFÍCIOS DO RGPS. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. REVOGAÇÃO MANTIDA. RESULTADO DO JULGAMENTO INALTERADO. 1. São cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão ou corrigir erro material, consoante dispõe o artigo 1.022 do Código de Processo Civil. 2.
A Terceira Turma adota como critério de concessão/manutenção do benefício da gratuidade judiciária o fato de a parte auferir renda inferior ao teto dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, pois mostra-se razoável presumir a hipossuficiência nessas hipóteses. 3. Para o deferimento da mencionada benesse, devem ser apurados os rendimentos líquidos da parte interessada e considerados, para tal fim, apenas, os descontos obrigatórios/legais (tais como Importo de Renda, Contribuição Previdenciária e pensão) e, excepcionalmente, gastos com saúde (apurada a gravidade da doença no caso concreto e os gastos respectivos, ainda que não descontados em folha de pagamento)
. 4. Caso em que acolhidos, em parte, os embargos de declaração, para complementar o decisum no ponto referente à revogação do benefício da justiça gratuita, sem alteração de resultado. (TRF-4 - AC: 50021421220124047116 RS 5002142-12.2012.4.04.7116, Relator: VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 28/01/2020, TERCEIRA TURMA)
D'outro tanto, o CPC/15 manteve a lógica do art. 12 da lei 1060/1950, de modo que a concessão do benefício não implica efetiva exoneração da obrigação de recolher despesas e pagar honorários sucumbenciais (incabíveis, porém, no rito do mandado de segurança), observado o prazo suspensivo previsto, agora, no art. 98, §2º, CPC/15 (05 anos).
O detalhe está no fato de que, como registrei acima, nos termos do art. 98, §5º, CPC/15,
"
A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento
."
Anote-se que a Constituição preconiza que o postulante demonstre a incapacidade para o pagamento (art. 5º, LXXIV, CF). Aliás, como bem expressa Araken de Assis,
"A dispensa de o postulante da gratuidade, cuidando-se de pessoa natural, produzir prova documental do seu estado de necessidade provocou efeito colateral de graves reflexos. Fica o respectivo adversário em situação claramente desvantajosa. É muito difícil, a mais das vezes, e na imensa maioria dos litígios civis, a parte contrária reunir prova hábil da equação entre receita e despesa que gera a figura do necessitado. Enfraqueceu-se, em suma, o controle judiciário desse dado. A concessão do benefício é automática, e, na prática, simultaneamente irreversível, por força da inutilidade dos esforços em provar o contrário."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. Institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, p. 559).
No caso em exame, na forma do art. 99, §2º, CPC, a requerente apresentou documento de identificação e extrato dos valores que recebe a título de benefício previdenciário, bem como declaração de hipossuficiência no evento 1. Não há indicativos de que a autora tenha rendimentos líquidos superiores ao teto do RGPS.
DEFIRO-LHE, portanto, a gratuidade de justiça, conquanto a medida surta reduzidos efeitos no rito dos juizados especiais, em 1. instância, conforme arts. 54 e 55 da lei n. 9.099/1995
.
2.10.
Valor
da causa:
Como sabido, a toda causa deve ser atribuído algum valor econômico, por força do art. 291, CPC/2015 - projeção do art. 258, CPC/73 -, pois se cuida da base de cálculo da taxa judiciária. Referido valor pode influenciar, em muitos casos, a determinação da competência das unidades judiciais ou o procedimento aplicável, também surtindo reflexos sobre a definição de encargos sucumbenciais.
Trata-se, tanto por isso, de requisito para que a petição inicial seja válida - art. 319, CPC. Como explicita Araken de Assis,
"às vezes, na oportunidade da respectiva fixação (infra, 1.290), o conteúdo econômico real e imediato da pretensão mostra-se inestimável, ou seja, não pode ser quantificado precisamente. Tal circunstância não constitui motivo bastante para eliminar o ônus atribuído ao autor nos arts. 319, V, e 292, caput. É apenas causa de estimação voluntária do autor, pois o art. 291 dispõe expressamente que a toda causa será atribuído valor certo. Nada obstante, a indicação aproximar-se-á, tanto quanto possível, do conteúdo econômico mediato da pretensão. Não há incompatibilidade daquelas regras com a do art. 85, § 8.º. aludindo a causas de valor inestimável. Entende-se por tal as causas desprovidas de conteúdo econômico imediato, como é o caso da ação declaratória, e, por esse motivo, sujeitas à estimação do autor."
(ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo I: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 1695)
Convém atentar, tanto por isso, para o art. 292, CPC/15:
Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação; II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida; III - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais pedidas pelo autor; IV - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor de avaliação da área ou do bem objeto do pedido; V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; VI - na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor; VIII - na ação em que houver pedido subsidiário, o valor do pedido principal. § 1º Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, considerar-se-á o valor de umas e outras. § 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à soma das prestações. § 3º O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes.
Atente-se novamente para a análise de Araken de Assis:
"É exemplificativa a enumeração dos acessórios. Os juros compensatórios, por exemplo, dificilmente se quadram na figura de penalidade. A correção monetária integra o valor originário do crédito e, nesse aspecto, sua menção no art. 292, corrige o direito anterior. Ressalva feita aos juros moratórios e à correção monetária, verbas implicitamente incluídas no pedido respeitante ao principal (art. 322, § 1.º), e, nada obstante, integrantes do valor da causa, quaisquer outras verbas devem ser objeto de pedido. É o caso, expressis verbis, da cláusula penal moratória ou compensatória e dos juros compensatórios. Omisso que seja o pedido, a respeito da cláusula penal (v.g., o autor quer evitar a controvérsia em torno da interpretação do contrato), tampouco conta-se o respectivo valor. Por óbvio, deixando o autor de pedir os juros moratórios, explicitamente, dificilmente realizará seu cômputo no valor da causa, ensejando a intervenção do órgão judiciário. E os juros vencidos posteriormente ao ajuizamento, automaticamente incluídos na condenação (art. 323), não entram na estimativa da causa.
O custo financeiro do processo (despesas processuais e honorários advocatícios), suportado pelo réu no caso de êxito do autor, não precisa ser computado para apurar o valor da causa. Tais verbas têm caráter eventual e decorrem da lei.
Em face do caráter imperativo do art. 292, I, mostra-se irrelevante a estimativa lançada pelo autor na petição inicial em desacordo com a regra. Prevalecerá o valor da importância reclamada no pedido.
O art. 292, I, aplica-se, por analogia, à pretensão a executar fundada em título judicial ou extrajudicial (infra, 1.292.2.2). O valor da causa é o total do crédito: o principal corrigido, os juros e os demais consectários legais ou contratuais, conforme, aliás, dispõe o art. 6.º, § 4.º, da Lei 6.830/1980. Esse valor constará na planilha aludida no art. 798, I, b, e parágrafo único
.
Também se poderia cogitar do enquadramento da pretensão a executar no art. 292, II, por que pretensão visando ao cumprimento do negócio jurídico, eventualmente consubstanciado em documento dotado de força executiva. O resultado final é idêntico, mas o art. 292, I, avantaja-se ao inciso precedente em ponto decisivo, ao impor um critério simples, direto e analítico ao valor da causa." (ARAKEN, Assis.
Obra citada.
p. 1698 e ss.)
Ora, não se pode perder de vista que o valor atribuído à causa deve corresponder, tanto quanto possível, ao conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial, como bem equaciona o art. 292, §3º, CPC/15:
"O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou
ao proveito econômico perseguido pelo autor
, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
NO CASO, a autora atribuiu à causa o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Aludido montante corresponde ao conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial - art. 292, V e VI, §§ 1º e 2º, CPC.
2.11. Prazos prescricionais:
No que toca ao INSS, a pretensão da autora está submetida ao prazo
prescricional de 05 anos
, conforme art. 1º do Decreto 20.910/1932, com a interrupção na forma da súmula 383, Supremo Tribunal Federal. Trata-se de norma de conteúdo especial quando confrontada com o art. 206, §3º, V, Código Civil:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. DECRETO 20.910/32. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA RESP 1.251.993/PR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. 1.251.993/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, assentou que o prazo de prescrição quinquenal, previsto no Decreto nº 20.910/32, aplica-se às ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002
. a4. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201302893979, MARGA TESSLER (JUÍZA FEDERAL CONVOCADA DO TRF 4ª REGIÃO), STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:12/03/2015 ..DTPB:.)
No que toca ao banco requerido, aplica-se também o prazo de 05 anos, em decorrência, porém, do art. 27 da lei 8.028/1990
. Aludida norma prevalece sobre a regra do art. 206, §3º, V, Código Civil, que preconiza prazo de 03 anos para prescrição.
Eventual deflagração de processo administrativo, versando sobre a pretensão do requerente, implica suspensão do cômputo da prescrição, conforme art. 4, do decreto 20.910/1932. Quando há suspeitas de fraudes, apuradas mediante inquérito penal ou processo penal, o cômputo do prazo prescricional permanece suspenso no curso da sua evolução - art. 200, Código Civil.
Na espécie, no que diz respeito à pretensão endereçada à autarquia, aplica-se ao caso o
prazo prescricional de 5 anos
. Referido lapso deve ser computado a partir da data em que o sujeito toma conhecimento da agressão aos seus interesses, conforme conhecido postulado da
actio nata,
e art. 189, Código Civil/2002. Na espécie não há comprovação da data que a autora tomou ciência da agressão a seus direitos, razão pela qual reputo prescrita as parcelas anteriores a 21/05/2019, eis que a demanda foi distribuída em 21/05/2024.
2.12. Eventual
decadência
do direito invocado na inicial:
Pode-se cogitar de decadência, por conta do eventual decurso do prazo previsto no art. 26, II, §1º, CDC/1990:
"O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...) II -
noventa dias
, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. §1°
Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços
."
A respeito do tema, os Tribunais têm decidido como segue:
"Para a solução da questão é necessário conceituar o defeito que macula os serviços ora discutidos. Se estivermos diante da hipótese de responsabilidade por fato do serviço (art. 14, do CDC), o prazo prescricional a ser aplicado é o do art. 27 dessa lei, de cinco anos. Se estivermos diante de responsabilidade por vício do produto (art. 18, do CDC) o prazo será decadencial, disciplinado no art. 26.
Esta Terceira Turma, em precedente de minha relatoria, já teve a oportunidade de se posicionar no sentido de que, nas hipóteses de inadimplemento absoluto, não se estaria no âmbito do art. 18 (e, conseqüentemente, do art. 26 do CDC), mas no âmbito do art. 14, que, quanto à prescrição, leva à aplicação do art. 27, com prazo de cinco anos para o exercício da pretensão do consumidor. Isso se deu por ocasião do julgamento do REsp nº 278.893/DF (DJ de 4/11/2002), assim ementado:
Recurso Especial. Civil. "Pacote turístico". Inexecução dos serviços contratados. Danos materiais e morais. Indenização. Art. 26, I, do CDC. Direto à reclamação. Decadência. -
O prazo estatuído no art. 26, I, do CDC, é inaplicável à espécie, porquanto a pretensão indenizatória não está fundada na responsabilidade por vícios de qualidade do serviço prestado, mas na responsabilidade contratual decorrente de inadimplemento absoluto, evidenciado pela não-prestação do serviço que fora avençado no "pacote turístico
". (STJ, Resp, rel. Min. Nancy Andrighi, julgamento unânime por não conhecer do Recurso Especial) (...)
Além disso, o acórdão recorrido reconheceu a existência de dano moral causado pela conduta das requerentes. Na esteira do precedente formado a partir do julgamento do REsp nº 722.510/RS (de minha relatoria, DJ de 1/2/2006), nas hipóteses em que "
o vício não causa dano, correrá para o consumidor o prazo decadencial, para que proceda a reclamação, previsto neste artigo 26. No entanto, vindo a causar dano, ou seja, concretizando-se a hipótese do artigo 12, deste mesmo Código, deve-se ter em mente o prazo qüinqüenal, disposto no art. 27, sempre que se quiser pleitear indenização
" (Arruda Alvim, Código do Consumidor Comentado. 2ª ed., São Paulo: RT, 1995, pp. 172/173).
(STJ, REsp n.º 773.994/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, em 22/05/2007)
Como têm deliberado o TRF4,
"O prazo de 90 dias estatuído no art. 26, II, § 1º, do CDC, não se subsume ao caso vertente, em que não se está a tratar de reclamação quanto a um vício aparente na prestação de serviços, mas do alegado direito da parte autora de obter o diploma pelo curso que prestou, assim como a reparação civil pela impossibilidade de obtê-lo."
(TRF-4 - AC: 50147831220144047003 PR, Relatora: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 30/10/2019, QUARTA TURMA)
Em primeiro exame, o aventado direito, alegado pela parte autora, não restou atingido pela caducidade
.
2.13. Quanto à aplicação do regime consumerista:
Com a publicação do CDC, inaugurou-se uma conhecida polêmica sobre o alcance das suas disposições. Grosso modo, as opiniões distribuíram-se em duas grandes correntes: os finalistas e os maximalistas.
Os finalistas amparam-se sobremodo na regra do art. 2º da lei 8078/1990:
"Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final."
Logo, em princípio, o CDC apenas tutelaria aquelas relações em que o serviço fosse prestado ou o bem fosse fornecido ao destinatário último, sem subsequentes repasses.
Essa orientação foi compartilhada, ao que se sabe, pelos principais idealizadores do projeto que eclodiu no código consumerista brasileiro: Ada Pellegrini Grinover, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin e outros.
Já a orientação maximalista promove uma leitura ampla do conceito de consumidor, destacando que a lei 8078 não tutelaria apenas o destinatário final de bens e serviços, sendo oponível também às relações entre empresas e até mesmo a órgãos públicos (amparando-se, nesse caso, na regra do art. 22, CDC). Essa orientação parece ser compartilhada por Rizzato Nunes, por exemplo (
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004).
Com esse pano de fundo, inúmeras discussões foram promovidas ao longo desses anos de vigência da lei 8078. Ao que releva, o CDC se aplica a entidades da Administração Pública, quando em causa serviços remunerados mediante preços públicos (art. 22, CDC).
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3.
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado
. 4. Recurso a que se nega provimento.(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
CIVIL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. CONTRATO DE TRANSPORTE DE ENCOMENDA SEM DECLARAÇÃO DE VALOR. EXTRAVIO DE MERCADORIA. VALOR DA INDENIZAÇÃO.1.
Qualifica-se como de consumo a relação jurídica contratual de transporte de encomendas. Precedente do STJ
. 2. É do fornecedor o ônus de provar claramente as condições contratuais particularmente em relação à opção de informar ou não o valor da mercadoria e o custo do serviço para o fim de indenização em caso de extravio segundo o valor exato da mercadoria transportada.3. Não é aceitável o fornecedor simplesmente alegar que o consumidor não declarou o valor para indenizar o prejuízo de acordo com critério unilateral.4. Apelação provida. (AC 00626681319984010000, JUIZ FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA (CONV.), TRF1 - TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR (INATIVA), DJ DATA:23/06/2005 PAGINA:81.)
D'outro tanto, em princípio, pessoas jurídicas também podem ser qualificadas como consumidoras, para fins de aplicação da lei 8.078/1990, desde que não esteja em causa a aquisição de matéria prima para seus processos produtivos.
RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. CONSUMIDOR. DESTINATÁRIO FINAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 2º E 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 8.078/90.I - "
O conceito de "destinatário final", do Código de Defesa do Consumidor, alcança a empresa ou o profissional que adquire bens ou serviços e os utiliza em benefício próprio
" (AgRg no Ag nº807159/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, DJ de 25/10/2008).II - No caso em exame, a recorrente enquadra-se em tal conceituação,visto ser empresa prestadora de serviços médico-hospitalares, que utiliza a água para a manutenção predial e o desenvolvimento de suas atividades, ou seja, seu consumo é em benefício próprio.III - A empresa por ser destinatária final do fornecimento de água e, portanto, por se enquadrar no conceito de consumidora, mantém coma recorrida relação de consumo, o que torna aplicável o disposto no artigo 42, parágrafo único, da Lei 8.078/90. IV - Recurso especial conhecido e provido...EMEN: (RESP 200800133166, FRANCISCO FALCÃO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:30/04/2008..DTPB:.)
Quanto à aplicação do CDC, quando se trate da prestação de serviços por empresas públicas, remunerados mediante preços públicos/tarifas, convém atentar para o art. 22, CDC:
"
Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos
. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código."
Atente-se ainda para os seguintes julgados:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CORREIOS. CARTA REGISTRADA. EXTRAVIO. DANOS MORAIS. IN RE IPSA. 1. As empresas públicas prestadoras de serviços públicos submetem- se ao regime de responsabilidade civil objetiva, previsto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal e nos arts. 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor. 2. No caso, a contratação de serviços postais oferecidos pelos Correios, por meio de tarifa especial, para envio de carta registrada, que permite o posterior rastreamento pelo próprio órgão de postagem revela a existência de contrato de consumo, devendo a fornecedora responder objetivamente ao cliente por danos morais advindos da falha do serviço quando não comprovada a efetiva entrega. 3. É incontroverso que o embargado sofreu danos morais decorrentes do extravio de sua correspondência, motivo pelo qual o montante indenizatório fixado em R$ 1.000,00 (mil reais) pelas instâncias ordinárias foi mantido pelo acórdão proferido pela Quarta Turma, porquanto razoável, sob pena de enriquecimento sem causa. 4. Embargos de divergência não providos. ..EMEN:
(ERESP 201303279910, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - SEGUNDA SEÇÃO, DJE DATA:24/02/2015 ..DTPB:.)
DANO MORAL. DANO MATERIAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE PRAZO PROCESSUAL. APLICAÇÃO DO CDC. 1. Entrega de correspondência para o destinatário errado, causando demora na entrega ao endereço correto e conseqüente perda de prazo processual. 2. Cabível dano material e dano moral. 3. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois demonstrado a relação de consumo entre a ECT e o apelado. 4. Recurso a que se nega provimento.
(AC 200071050018995, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - QUARTA TURMA, DJ 25/09/2002 PÁGINA: 704.)
De sua parte, Justen Filho enfatiza a dificuldade, não raro, de se conjugar o regime jurídico público - próprio das concessões ou de empresas públicas - com a aplicação da lógica do Código de Defesa do Consumidor:
"Ocorre que nem sempre é possível conciliar o regime de direito público com aquele do direito do consumidor. A cumulação dos mecanismos de serviço público e de direito do consumidor provoca um conflito de competências e de regime jurídico, cuja solução deve ser realizada com cautela.
Um exemplo permite compreender de imediato o problema. Segundo o direito do consumidor, é obrigatório o empresário manter a oferta realizada nas condições originais. Já no âmbito do serviço público, a mutabilidade é da sua inerência. Suponha-se, portanto, o caso da telefonia fixa. Imagine-se que o concessionário estabeleça relação jurídica com o usuário, orientando-se por determinada regulação do poder concedente. Se houver necessidade e conveniência, o poder concedente alterará as regras pertinentes, com reflexos na situação jurídica do usuário. Em face do regime de Direito Administrativo, o usuário não poderia invocar direito adquirido à manutenção de regime jurídico. Mas sua pretensões poderia encontrar respaldo no regime característico do direito do consumidor.
Não seria excessivo afirmar que a concepção do serviço público defere ao poder concedente a função de tutelar e defender o interesse coletivo (aí abrangido também o interesse do usuário). Já o direito do consumidor assegura ao próprio consumidor e às entidades da sociedade a função de sua defesa (sem que isso exclua a intervenção de órgãos estatais)
.
É fundamental tomar em vista, então, que a aplicação das normas do direito do consumidor não pode fazer-se em face do serviço público com idêntica extensão aplicável no caso de relações puramente privadas, relacionadas com a exploração de atividade econômica em sentido restrito." (JUSTEN FILHO, Marçal.
Teoria geral das
concessões
de serviço público.
São Paulo: Dialética, 2003, p. 557-558)
De outro norte, consolidou-se a orientação jurisprudencial que reconhece a sua plena aplicação no âmbito dos contratos bancários, desde que pactuados depois de 1990.
Ora, essa solução é alvo de duas conhecidas súmulas do STJ:
Súmula 297 - O Código de Defesa do consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Súmula 285 -
Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do consumidor incide a multa moratória nele prevista.
A Suprema Corte reconheceu, ademais, a plena aplicação do CDC às relações estabelecidas entre os bancos e seus clientes, nessa condição, conforme se infere da ADIn 2591/DF, relatada pelo Min. Carlos Velloso. Tudo conjugado, o CDC aplica-se ao caso vertente, no que diz respeito à relação entre o demandante e o banco requerido.
Solução semelhante não pode ser dispensada, contudo, à relação entre a autora e o INSS,
eis que submetida aos ditames do direito administrativo, não se tratando de vínculo consumerista.
Com efeito, na espécie, o vínculo com o INSS não deu ensejo ao pagamento de preços públicos ou tarifas -- ao contrário do que ocorre com o uso de rodovias pedagiadas, ou pagamento do fornecimento de água e energia elétrica.
Não se aplica ao caso o art. 22, CDC
, de modo que não se aplica o código do consumidor quanto à relação travada entre a autora e a autarquia.
2.14. Efeitos da aplicação parcial do CDC ao caso:
Dada a aplicação do CDC, no que toca à relação entre a autora e o banco demandado, isso implica o reconhecimento de um conjunto de garantias asseguradas ao consumidor - arts. 4º, 39 e 51 da lei 8078/1990.
Destaco, nesse âmbito, o dever de atuar com boa-fé (e o correspondente respeito à boa-fé objetiva), preconizado no art. 4º, III, CDC. Como diz Rizzatto Nunes,
"a boa-fé objetiva, que é a que está presente no Código de
defesa do consumidor
, pode ser definida, grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo (...) Assim, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra."
(RIZZATTO NUNES
apud
EFING, Antônio Carlos.
Contratos e procedimentos bancários à luz do Código de defesa do consumidor.
2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2012, p. 87).
Esse dever de respeito à boa-fé objetivo também foi preconizado pelo art. 422, Código Civil/2002:
"Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé."
Vale a pena atentar para a lição de Antônio Carlos Efing:
"A boa-fé, assim, possui no macrossistema de direito civil, e, consequentemente no microssistema do direito do consumidor, uma séria de efeitos, seja como um princípio de função interpretativa, seja como cláusula geral geradora de deveres anexos e critério de constatação de exercício abusivo de um direito ou de uma cláusula abusiva. Como bem sintetiza Cláudia Lima Marques, 'o princípio da boa-fé objetiva na formação e na execução das obrigações possui muitas funções na nova teoria contratual: (a) como fonte de novos deveres especiais de conduta na nova teoria contratual; (b) como causa limitadora do exercício, antes lícito, hoje abusivo, dos direitos subjetivos, e (c) na concreção e interpretação dos contratos."
(EFING, Antônio Carlos.
Obra citada.
p. 90).
De outro tanto, a incidência do CDC implica o dever, por parte do fornecedor, de disponibilizar ao consumidor informação adequada e clara sobre os diferentes serviços e produtos, com especificação correta da quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço (art. 6º, III, CDC c/ redação veiculada pela lei 12.741/2012).
Esses são alguns dos efeitos decorrentes da aplicação do CDC, quanto ao vínculo entre o(a) requerente e o banco requerido.
2.15. Eficácia vinculante dos contratos:
COM COGNIÇÃO PRECÁRIA, anoto que o contrato é manifestação da autonomia da vontade. Em regra, desde que a vontade seja exteriorizada sem vícios (dolo, coação, vício redibitório etc.), ele vincula as partes, obrigando-as ao cumprimento das cláusulas avençadas. É fato que essa concepção liberal do contrato tem sido esmaecida, dada a sua progressiva funcionalização. Importa dizer: a legislação atual também exige, para exame da validade do contrato, que os seus resultados sejam tidos em conta (p.ex., a vedação da onerosidade excessiva - arts. 39 e 51,
CDC
e arts. 478/480, CC).
Logo, em determinados casos, esse caráter vinculante dos contratos resta mitigado, frente à constatação de que muitos pactos são celebrados por adesão (contratos formulário), a existência de contratos cativos, superendividamento de muitos consumidores, propaganda abusiva etc. Assim, não se desconhece que o Direito pátrio esposou, de certa forma, a teoria das bases objetivas do contrato, desenvolvida por Karl Larenz em solo alemão:
"Pela base objetiva do negócio tem de se entender o conjunto de circunstâncias e estado geral de coisas cuja existência ou subsistência é objetivamente necessária para que o contrato, segundo o significado das intenções de ambos os contratantes, possa subsistir como regulação dotada de sentido.
A base do negócio objetivo tem desaparecido: a) quando a relação de equivalência entre prestação e contraprestação pressuposta no contrato se tem destruído em tal medida que não pode falar-se racionalmente de uma contraprestação (destruição da relação de equivalência); b) quando a comum finalidade objetiva do contrato, expressada em seu conteúdo, tenha resultado definitivamente inalcançável, ainda quando a prestação do devedor seja, todavia, possível (frustração da finalidade).
Nos casos de destruição da relação de equivalência (IX, a), a parte prejudicada, no caso de não haver realizado a prestação, pode negar-se a fazê-lo contanto que a outra parte não consinta um adequado aumento da contraprestação que restaure a equivalência. Se se rechaça este aumento terminantemente
, a parte prejudicada pode resolver ou, em caso de uma prestação de larga duração já iniciada, denunciar imediatamente o contrato. Se tem realizado sua prestação pode, quando não se admita um adequado aumento posterior da contraprestação, reclamar uma indenização pelo valor do enriquecimento da outra parte.
Nos casos de frustração da finalidade (IX, b), o credor da prestação que resultou inútil pode recusá-la e negar-se a realizar sua contraprestação desde que suporte os gastos que a outra parte tenha realizado para a preparação e execução do contrato e que podiam considerar-se indispensáveis" (LARENZ, Karl.
Base del negócio jurídico y cumplimiento de los contratos.
Tradução do alemão para o espanhol por Carlos Fernándes Rodrigues. Granada: Editorial Comares, 2.002, pp. 211-212. Traduzi).
Reporto-me, a respeito do tema, ao seguinte julgado:
"
Não se perquire mais, como na teoria da Imprevisão, sobre a previsibilidade do fato econômico superveniente. E nem se deveria
. Com efeito, o fato pode ser até previsível, mas não é esperado, porque se esperado fosse, nem o Banco emprestaria o dinheiro e nem o tomador assumiria um compromisso que não pode arcar. Logo, o fato previsível, mas não esperado, situa-se na área do risco inerente a qualquer atividade negocial."
(TJRS, apelação cível de autos 193051083, quarta câmara cível, relator desembargador Márcio de Oliveira Puggina, julgado em 24 de junho de 1994)
Ademais, a legislação consumerista determina a revisão parcial dos contratos, atingindo-se apenas as cláusulas eventualmente viciadas, mas preservando seus demais termos (art. 51, §2º, CDC).
Em que pese tudo isso, é fato, porém, que o contrato não pode ser simplesmente desconsiderado pelo Judiciário. Ele ainda é instituto fundamental para a economia, permitindo o fluxo de bens e o planejamento individual. Logo, conquanto seja certo que o contrato não pode ser suposto como algo inexorável, igualmente certo que tampouco pode ser simplesmente abstraído, como se fosse destituído de qualquer eficácia obrigacional. Tanto por isso, a revisão contratual deve ser promovida com cautelas. Deve-se conjugar a preservação dos direitos fundamentais - cláusulas de ordem pública veiculadas na lei 8078/1990 -, com o reconhecimento da força vinculante dos pactos.
Por sinal, eventuais dificuldades financeiras, caso suportadas pelo devedor, não justificam, por si, o reconhecimento de onerosidade excessiva. Pode-se cogitar de eventual aplicação da teoria da lesão contratual, mas desde que preenchidos os rigorosos requisitos do art. 157, CC.
"A desproporção manifesta é sempre referida à prestação considerada objetivamente, e não à situação subjetiva na qual se encontra o devedor cujas dívidas derivadas de outras relações obrigacionais tenham, por hipótese, aumentado."
(COSTA, Judith Martins.
Comentários ao novo código civil.
Do direito das obrigações. Do adimplemento e da extinção das obrigações. Arts. 304 a 388.
Volume V, tomo I, 2. ed. RJ: Forense, 2003, p. 305).
2.16. Funcionalização dos pactos:
Com cognição precária, anoto que, em que pese tudo isso, é fato, porém, que o contrato não pode ser simplesmente desconsiderado pelo Judiciário. Ele ainda é instituto fundamental para a economia, permitindo o fluxo de bens e o planejamento individual.
Logo, conquanto seja certo que o contrato não pode ser suposto como inexorável, igualmente certo que tampouco pode ser simplesmente abstraído, como se fosse destituído de eficácia obrigacional. Tanto por isso, a revisão contratual deve ser promovida com cautelas. Deve-se conjugar a preservação dos direitos fundamentais - cláusulas de ordem pública veiculadas na lei 8078 -, com o reconhecimento da força vinculante dos pactos.
Por sinal, eventuais dificuldades financeiras, caso suportadas pelo devedor, não justificam, por si, o reconhecimento de onerosidade excessiva. Pode-se cogitar de eventual aplicação da teoria da lesão contratual, mas desde que preenchidos os rigorosos requisitos do art. 157, CC.
"A desproporção manifesta é sempre referida à prestação considerada objetivamente, e não à situação subjetiva na qual se encontra o devedor cujas dívidas derivadas de outras relações obrigacionais tenham, por hipótese, aumentado." (Judith Martins-Costa. Comentários ao novo código civil. Do direito das obrigações.
Do adimplemento e da extinção das obrigações.
Arts. 304 a 388, volume V, tomo I. 2ª ed. RJ: Forense, 2003, p. 305).
2.17. Interpretação de contratos de adesão:
Diante do já exposto, vê-se que o instituto jurídico do contrato tem sido funcionalizado, em tempo mais recente. Isso significa que ele deve atender a interesses sociais relevantes, viabilizando-se um controle do seu conteúdo quanto às cláusulas abusivas, manifestamente desproporcionais. O tema é bem exemplificado pela ingerência estatal em contratos de locação, contratos educacionais etc.
Ao mesmo tempo, porém, o sistema continua a viabilizar a revisão e anulação de pactos, sempre que comprovado que, por época da sua celebração, a vontade não teria sido manifestada de modo livre, como se infere dos conhecidos institutos do dolo, coação, vício redibitório e teoria da lesão (arts. 138, 145, 151 e 157, Código Civil/2002).
Note-se, todavia, que o contrato não pode ser presumido como inválido tão somente por ter sido lavrado em um formulário padronizado (contrato de adesão). Afinal de contas, tais instrumentos são indispensáveis para o comércio jurídico contemporâneo.
Contudo, havendo cláusulas ambíguas, a lei determina que sejam interpretadas de modo mais favorável ao aderente, conforme art. 423, Código Civil:
"Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente."
Outra ressalva importante é ditada pelo art. 424, CC/2002:
"
Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio
."
De outro tanto, registro que a súmula nº 381 do STJ preconiza que "
nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas
.
" Na espécie, todavia, referida norma é suavizada por força da designação do defensor dativo para atuar no caso.
2.18. Exceção de contrato não cumprido:
Cuidando-se de contrato sinalagmático,
"nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.
" (art. 476, Código Civil/2002). Cuida-se de simples projeção do postulado
non venire contra factum proprium,
dado que ninguém pode exigir aquilo que não está disposto a cumprir. Quem inadimpliu o contrato tampouco pode exigir que o outro contratante cumpra suas obrigações, como cediço.
Explicita Maria Helena Diniz que
"A exceptio non adimpleti contractus é a cláusula resolutiva tácita que se prende ao contrato bilateral.
Isto é assim porque o contrato bilateral requer que as duas prestações sejam cumpridas simultaneamente, de forma que nenhum dos contratantes poderá, antes de cumprir suas obrigações, exigir o implemento das do outro
. (...) Pelo enunciado n. 24, aprovado na 1. Jornada de direito comercial, os contratos empresariais coligados, concretamente formados por unidade de interesses econômicos, permitem a arguição da exceção de contrato não cumprido, salvo quando a obrigação inadimplida for de escassa importância."
(DINIZ, Maria Helena.
Código civil anotado.
17. ed. São Paulo: Saraiva. 2014. p. 450). Por conseguinte, também nesse âmbito, deve-se aferir se houve adimplemento substancial.
2.19. Eventual
simulacro
de negociação:
Destaco, com COGNIÇÃO CONTINGENTE, emprego de falsidade ideológica, de falsidade documental documental, de estelionato - crimes tipificados nos arts. 299, 296, 297, 304, 171, Código Penal, dentre outros - implica a existência de um substrato documental inidôneo para dar ensejo à constituição de vínculos contratuais, envolvendo as pessoas atingidas pela fraude.
Assim, por óbvio, quando alguém prega documentos alheios para obter um financiamento fraudulento - crime tipificado no art. 19 da lei n. 7.492/1986 -, isso implica a própria ausência de contrato, quanto à pessoa atingida pelo financiamento
. Os fraudador devem ser alvo de responsabilização criminal e cível - nesse último caso, responsabilização extracontratual.
Releva enfatizar, portanto, esse tópico: a inautenticidade das assinaturas atribuídas à contraparte, em um instrumento contratual escrito implica a própria ausência do pacto. A falsidade ideológica empregada em um contrato meramente verbalizado surte efeito semelhante.
2.20. Eventual invalidade da celebração do acordo:
Note-se que eventual falsidade na avença - a exemplo da contrafação da assinatura do pretenso contratante - implica a ausência de vínculo contratual, não devendo surtir efeitos jurídicos
.
Algo um tanto distinto ocorre quando há vícios na manifestação da vontade, a exemplo do que ocorre nos casos de erro (art. 138, Código Civil), dolo (art. 145, CC), coação (art. 151, CC), teoria da lesão (art. 157, CC), vício redibitório (art. 441, Código Civil), dentre outros.
Em tais casos, o contratante não toma adequado conhecimento do objeto da negociação; ou, mesmo quando toma, não chega a atuar com liberdade suficiente para se comprometer ao cumprimento das obrigações previstas (como ocorre nos casos de coação e teoria da lesão). Demonstrado isso, o pacto pode ser invalidado, apurando-se a proporcionalidade do vício em face do objeto contratual (p.ex., art. 157, §2, Código Civil/2002).
2.21.
Contrato de mútuo feneratício:
Sabe-se que o empréstimo é um contrato em regra unilateral, gratuito, real e personalíssimo em que uma das partes recebe, para usar ou consumir, uma coisa que, depois de certo tempo, deve restituir ou – no caso de ser fungível o objeto – restituir por outra do mesmo gênero, quantidade e qualidade. Sua função econômica está em propiciar, para aquele que não é dono do que necessita, o uso (em regra, mas também a fruição, excepcionalmente) do que lhe pode ser disponibilizado, para a finalidade almejada. As modalidades de empréstimo são o comodato e o mútuo.
O comodato é o empréstimo de bens infungíveis. Nesse contrato, não há transmissão da propriedade do objeto emprestado, devendo-se o comodatário restituir ao comodante - ou seja, o proprietário do bem - exatamente a mesma coisa emprestada, devidamente preservada. Caso não a restitua, por dolo, pode responder por apropriação indébita - art. 168, Código Penal.
Já o mútuo cuida do empréstimo de bens fungíveis. Nesse caso, o objeto do contrato é consumido, em regra, pelo mutuário. Ao receber o objeto, ele se torna seu dono, ao tempo em que se torna devedor do mutuante. Fica obrigada a lhe entregar coisa do mesmo gênero, espécie, com eventuais juros remuneratórios, se pactuados (nesse caso, o mútuo será feneratício). O inadimplemento da obrigação não caracteriza apropriação indébita - dado que o mútuo transmite a propriedade por época da tradição (entrega) do objeto emprestado ao mutuário. Contudo, o mutuário poderá ser demandado, exigindo-se o pagamento do valor pertinente, com os juros remuneratórios, juros moratórios, correção monetária e eventuais multas, quando pactuados.
A diferença entre comodato e mútuo pode ser compreendida da seguinte forma. Se alguém empresta um veículo para uma empresa (comodato) e a empresa acaba falindo, pode requerer a restituição do bem específico, que lhe pertence, ainda que se encontre mantido indevidamente no pátio da massa falida
. Caso, porém, tenha emprestado dinheiro em espécie para essa mesma empresa (ou seja, bem fungível), não poderá requerer que lhe seja entregue a quantia específica - com mesmo número de série das notas emprestadas -, desde logo, ao argumento de ser sua tal quantia. Nesse caso, trata-se de crédito, oponível ao patrimônio da massa falida, devendo se habilitar em lista de credores.
Atente-se para os arts. 586 e 587, Código Civil/2002:
"O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade.
Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição
."
Menciono ainda o que segue:
"
O contrato de mútuo é a modalidade de empréstimo prevista no art. 586 do CC/2002 e seguintes, e diferencia-se do comodato quanto à natureza da coisa em- prestada. Enquanto no comodato se dá o empréstimo de coisa não fungível para uso e posterior devolução (art. 579 do CC/2002 ), no mútuo se dá o empréstimo coisa fungível a fim de que seja consumida e posteriormente substituída por coisa de mesma espécie ou gênero, qualidade e quantidade. Assim dispõe o art. 586
: “Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade”.
A fungibilidade de determinado bem é constatada no caso concreto, mas o Código Civil de 2002 oferece alguns critérios: “Art. 85. São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Art. 86. São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação”.
Nas palavras de Sérgio Covello: “Há mútuo, ou empréstimo de consumo, toda vez que uma parte entrega à outra certa quantidade de coisas fungíveis, que esta última fica autorizada a consumir, arcando com a obrigação de restituir no tempo avençado, não as mesmas coisas, mas em quantidade, gênero e qualidade equivalentes”. Ou, como define Maria Helena Diniz, “o mútuo é o contrato pelo qual um dos contraentes transfere a propriedade de bem fungível a outro, que se obriga a lhe restituir coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade (art. 586 do CC/2002 )”.
Conforme o art. 587 do CC/2002 , o mútuo é um contrato real, visto que somente se aperfeiçoa com a tradição da coisa fungível: “Art. 587. Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição”. A relação contratual, assim, somente se tem por formada com a transferência da propriedade do bem fungível, a fim de que seja consumido e, ao final, substituído por outro.
Sendo a tradição requisito para a formação do contrato de mútuo, a entrega da coisa fungível pelo mutuante (aquele que dá a coisa fungível em empréstimo) é apenas um ato de aperfeiçoamento do contrato, não uma obrigação. Como esclarece Carlos Roberto Gonçalves: “a traditio é, pois, requisito de constituição da relação contratual, sem a qual há apenas promessa de mutuar (pactum de mutuo dando), contrato preliminar que se não confunde com o próprio mútuo”. Uma vez aperfeiçoado o contrato pela tradição da coisa, ali se esgota a atuação do mutuante e, em regra, apenas o mutuário (aquele que toma a coisa em empréstimo) contrai obrigações, como a devolução de coisa de mesmo gênero, quantidade e qualidade. O mútuo também é, desta forma, um contrato unilateral." (
EFING, Antônio.
Contratos e procedimentos bancários à luz do código de defesa do consumidor
. SP: RT. 2015. item 5.4.).
2.22. Contrato de cartão de crédito
consignado:
COM COGNIÇÃO NÃO EXAUSTIVA, registro que o contrato de administração de cartão de crédito está orientado a facilitar as transações comerciais, antecipando-se renda futura. Com isso, os sujeitos podem parcelar suas compras, celebrar transações internacionais e consolidar pagamentos.
Como diz Efing,
"
Utilizado como uma forma de facilitar o funcionamento de operações de natureza comercial, o cartão de crédito encerra em seu conteúdo a articulação de três peças fundamentais concernentes às relações levadas a efeito em sua dinâmica funcional
. Tais peças, reconhecidas como pessoas integrantes do sistema de cartões de crédito, na doutrina recebem, cada qual, sua respectiva denominação: emissor, titular do cartão e fornecedor. O emissor, cumprindo com a promessa de intermediar a relação de compra e venda entre o titular do cartão de crédito e o fornecedor, aparece como uma pessoa jurídica dedicada à atividade financeira. No âmbito do cartão de crédito, o emissor facilita a venda ao titular, emitindo o cartão. Esse ato, portanto, credencia o portador (titular do cartão de crédito) à aquisição de mercadorias e serviços junto aos fornecedores afiliados."
(EFING, Antônio.
Contratos e procedimentos bancários à luz do código de defesa do consumidor
. São Paulo: RT. 2015. tópico 6.7.).
Acrescente-se que,
"de modo contrário do que se pode imaginar, o titular beneficiário do cartão de crédito, se dele fizer uso para adquirir produtos ou serviços junto aos fornecedores, não se responsabiliza pelo pagamento frente aos fornecedores. É ao emissor do cartão que se atribui a responsabilidade de pagar aos fornecedores o montante deliberado pelo usuário do cartão, vindo posteriormente a ser reembolsado pelo usuário.
O
contrato de cartão de crédito
autoriza ao consumidor titular do cartão efetuar pagamentos com o limite de crédito aberto pelo fornecedor emissor, podendo o consumidor restituir ao emissor a importância paga em determinada data aprazada ou parceladamente, mediante, neste caso, o pagamento de juros decorrentes do crédito cedido
."
(EFING.
Obra citada.
tópico 6.7).
Desse modo, o contrato de cartão de crédito é celebrado entre a instituição administradora e o(a) interessado(a). A instituição se obriga a lhe conceder crédito, encaminhando-lhe faturas periódicas para pagamento, ao tempo em que o tomador do empréstimo se obrigada a reembolsar o valor emprestado, com os juros contratados, além de se obrigar a pagar taxas administrativas decorrente do uso do cartão. A administradora do cartão torna-se, assim, uma intermediária na relação entre o usuário e as empresas que tenham aceitado aludido instrumento para pagamento de seus produtos e bens. Segundo súmula 283, STJ, tais entidades são equiparadas a instituições financeiros, muito embora não criem "moeda escritural" - o que ocorre corriqueiramente com bancos, ao receberem recursos em depósito e repassarem a tomadores de empréstimo. Isso pode ensejar a aplicação da súmula 596, STF, por conta da conjugação do decreto 22.626/1933 com a lei n. 4.595/1964.
Destaco que
"
cabe ao consumidor o pagamento dos débitos por ele contraídos com a utilização do cartão, obrigando-se ao pagamento da fatura. Todavia, não raro nas faturas de cartão de crédito constam valores indevidamente lançados, bem como são comuns as cláusulas abusivas nos contratos de cartão de crédito
. Podem ser encontradas, entre outras, as seguintes cláusulas: outorga de poderes para, junto à instituição financeira de escolha do emissor fornecedor, por conta do consumidor, negociar e obter crédito; bem como poderes para assinar o aludido contrato de financiamento, abrir conta-corrente em banco, assinar títulos representativos do débito do consumidor, inclusive notas promissórias, acertar prazos, juros, comissões e encargos; em caso de perda, furto ou roubo do cartão de crédito, mesmo que este tenha sido cancelado automaticamente, responderá o consumidor por débitos oriundos do mau uso do cartão decorrente da perda, furto ou roubo. Tais cláusulas, inseridas no contrato de adesão, ao desobrigarem o emissor fornecedor e colocarem o consumidor em situação excessivamente desvantajosa, são nulas de pleno direito, por afrontarem o sistema de proteção do consumidor."
(EFING.
Obra citada.
tópico 6.7).
Ademais, também é importante ter em conta que,
"
atualmente pode-se aderir a um contrato de cartão de crédito enquanto se abastece um automóvel num posto de serviço e revenda de combustíveis, por exemplo, sendo que nesta e em outras situações semelhantes o consumidor sequer é esclarecido das condições básicas do contrato, não chegando a analisar suas cláusulas.
O consumidor termina por assinar a proposta para a contratação do cartão de crédito e vem a receber pelo correio a confirmação da contratação sem, muitas vezes, receber da instituição financeira ou administradora as informações e esclarecimentos minimamente necessários ao suficiente cumprimento do dever de informação."
(EFING.
Obra citada.
tópico 6.7).
Quanto aos requisitos de validade do cartão, registro:
"a) Requisitos subjetivos – Em relação ao titular, este poderá ser pessoa física ou jurídica. Sendo pessoa física, deverá ser civilmente capaz. Se pessoa jurídica, deve funcionar regularmente, ou seja, deverá ter sido constituída e funcionar de acordo com a Lei. Uma sociedade de fato não poderá ser titular de cartão de crédito. Apenas seus sócios poderão sê-lo.
Quanto ao emissor, deverá ser pessoa jurídica autorizada a emitir e administrar cartões de crédito. Pode ser instituição financeira ou não e servirá de intermediário entre o titular e os fornecedores, para que se opere entre eles a compra e venda de bens ou serviços
.
Por fim, o fornecedor poderá ser pessoa física ou jurídica, credenciada junto ao emissor, para oferecer seus bens ou serviços aos titulares do cartão. Se pessoa física, deverá ser civilmente capaz. Se pessoa jurídica deverá funcionar dentro dos parâmetros legais.
b) Requisitos objetivos –
O objeto do contrato é, em última instância, o financia- mento da aquisição de bens e/ou serviços, que deverão ser possíveis tanto do ponto de vista material quanto jurídico. Não se pode comprar um lugar no céu com cartão, nem tampouco cocaína, pelo menos aqui no Brasil
.
c) Requisitos formais – Quanto à forma, já vimos que o contrato de cartão de crédito é consensual, em respeito ao princípio do consensualismo. Na prática, porém, é sempre celebrado por escrito, sendo tipicamente de adesão." (FIUZA, César.
Direito civil:
curso completo. SP: SP. 2015).
2.23. Consignação em pagamento:
DESTACO, com cognição não exaustiva, que a consignação em pagamento, com desconto em benefícios previdenciários, é medida autorizada pelo art. 115 da lei n. 8213/1991:
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: (...) VI -
pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, ou por entidades fechadas ou abertas de previdência complementar, públicas e privadas, quando expressamente autorizado pelo beneficiário, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do
valor
do benefício, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para
: (Redação dada pela Lei nº 13.183, de 2015)
a) a
mortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito
; ou (Redação dada pela Lei nº 13.183, de 2015)
b) utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Para tanto, contudo, exige-se que o segurado autorize aludida averbação, mediante instrumento contratual. Eventuais vícios no consentimento - erro, dolo, coação, vício redibitório, teoria da lesão (art. 157, Código Civil) - implicam nulidade da relação jurídica.
Anota Frederico Amado que
"
Em caso de concorrência, vale ressaltar que os débitos do beneficiário em decorrência do pagamento de benefício além do devido terão preferência sobre os créditos consignados em favor de instituições financeiras em razão de empréstimos contratados pelo aposentado ou pensionista
."
(AMADO, Frederico.
Curso de direito previdenciário.
Salvador: Iuspodium. p. 1005).
2.24.
Consignação
de valores em Juízo:
Sabe-se que, quando em causa debates sobre
tributos
, é direitos dos sujeitos promover o depósito em Juízo, na forma do art. 151, II, CTN.
"
A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o depósito de que trata o art. 151 , II , do CTN constitui direito subjetivo do contribuinte, que pode efetuá-lo tanto nos autos da ação principal quanto em Ação Cautelar, sendo desnecessária a autorização do Juízo
. É facultado ao sujeito passivo da relação tributária efetivar o depósito do montante integral do valor da dívida, a fim de suspender a cobrança do tributo e evitar os efeitos decorrentes da mora, enquanto se discute na esfera administrativa ou judicial a exigibilidade da exação ( AgRg no REsp 517937/PE , Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/4/2009, DJe 17/6/2009)"
(STJ - REsp: 1691774 SP 2017/0202085-2, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 10/10/2017, T2 - 2. TURMA, Data de Publicação: DJe 16/10/2017)
No presente processo, porém, a requerente insurgiu-se em face de descontos promovidos em seu benefício previdenciário, advindos de alegado empréstimo consignado de cartão de crédito
. Assim, a lógica do art. 151, II, CTN, não se aplica ao caso, ao menos, não de forma automática.
Desde que haja fundamentos para isso
, no âmbito do direito civil ou administrativo, é dado à parte autora promover consignação em pagamento, conforme arts. 334 e ss., Código Civil/2002, ainda que seja promovido de forma incidental - arts. 539 e ss., Código de Processo Civil/15. Logo, desde que haja "
justa causa
", é dado à parte autora depositar em juízo os valores controvertidos, conforme lógica do art. 539, CPC/15 e 334, Código Civil/2002, à sua conta e risco. Anoto que a consignação em pagamento apenas afasta a mora quando julgada procedente - art. 337, Código Civil, art. 546, Código de Processo Civil e lógica da súmula 405, STF.
A esse respeito, o TJSP já deliberou:
"Observo que ambas as decisões (consignatória e embargos) ressalvaram expressamente o direito do embargante obter a amortização do saldo devedor até o limite do valor depositado, inexistindo interesse nesse tópico do recurso.
No entanto, tendo em conta que a ação de consignação em pagamento foi julgada improcedente, os encargos moratórios não foram afastados, nos termos do artigo 337 do Código Civil
: O depósito requerer-se-á no lugar do pagamento, cessando, tanto que se efetue, para o depositante, os juros da dívida e os riscos, salvo se for julgado improcedente."
(TJ-SP - AC: 10095119820208260100 SP 1009511-98.2020.8.26.0100, Relator: Vianna Cotrim, Data de Julgamento: 26/10/2021, 26ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/10/2021)
Com efeito, alguém pode depositar valores em Juízo, alegando que o credor tem cobrado valores excessivos ou mediante procedimento incorreto - pode alegar cuidar-se de dívida
quérable
(quesível), ao invés de
portable
(portável). Ou seja, pode ter alegado que caberia ao credor promover os meios para o recebimento, ao invés de o devedor ter de promover as diligências pertinentes. Deferido o depósito, depois a pretensão do demandante é julgada improcedente. Em tal caso, a existência do depósito não afastará a mora, quanto ao período em que o demandado houver sido privado do recebimento dos recursos pertinentes. Como registrei acima, o processo não pode causar prejuízos a quem não tenha dado causa à demanda.
Assim, saber se o depósito terá condão de afastar eventuais consectários moratórios dependerá do exame do mérito da pretensão do requerente, por época da prolação da sentença
. Caso seja realizado aludido depósito, o valor será atualizado pela variação da TRB - taxa referencial básica, conforme art. 11 da lei n. 9.289/1996, não se aplicando ao caso a taxa SELIC, diante dos limites da lei n. 9.703/1998, dado não se cuidar de controvérsia tributária. Note-se que a legislação não preconiza a incidência de juros remuneratórios ou moratórios sobre o valor depositado em Juízo. Por outro lado, caso a pretensão da autora seja acolhida, em sentença transitada em julgado, o valor lhe será restituído ao final da demanda. Caso a pretensão seja julgada improcedente, o montante será transferido ao banco requerido/mutuante, para imputação em pagamento no contrato, conforme art. 354, Código Civil/2002. Em tal caso, não haverá supressão de consectários moratórios, devendo a autora responder por eventuais juros moratórios e multa contratual, porventura previstos (art. 337, parte final, Código Civil/02, lógica dos arts. 332 e 512, Código de Processo Civil/15)
2.25. Depósitos em juízo e consectários moratórios:
Convém enfatizar que, em princípio, é dado aos interessados deflagrarem processos de consignação em pagamento, na forma dos arts. 334 e ss., Código Civil/2002, com o fim de obter a pertinente outorga de quitação das obrigações pertinentes. Note-se, porém, que a consignação apenas afasta a mora quando a pretensão da autora tenha sido julgada procedente - art. 337, parte final, Código Civil/2002 e arts. 539 e ss., Código de Processo Civil/15. Importa dizer: os encargos moratórios são afastados quando a parte interessada haja comprovado cuidar-se de
mora accipiendi,
ao invés de
mora debitoris.
Conjecture-se, reitero, que, no âmago de um contrato de locação, o locatário sustenta competir ao locador a adoção dos meios para a cobrança (obrigação quesível). Já o locador alega o contrário, argumentando cuidar-se de obrigação
portable
. Suponha-se que o locatário ingresse com uma consignação em pagamento, sem impugnar o valor da dívida; mas, limitando-se ao referido tema - natureza da obrigação. Ele deposita o valor exato postulado pelo credor. Ao final, o Juízo reputa que o locator, o demandado, possui razão, cuidando-se de obrigação portable. Nesse caso, por óbvio, o depósito em Juízo não terá aptidão para afastar a mora, de modo que os encargos serão devidos desde a data do vencimento da obrigação até a data em que os valores sejam convertidos em renda a favor da parte demandada.
Atente-se, uma vez mais, para o art. 337, parte final, Código Civil/2002:
"O depósito requerer-se-á no lugar do pagamento, cessando, tanto que se efetue, para o depositante, os juros da dívida e os riscos,
salvo se for julgado improcedente
."
Por outro lado, a mora pode ser afastada em vínculos bilaterais, sinalagmáticos, quando presentes os requisitos para a exceção de contrato não cumprido - arts. 476 e 477, Código Civil/2002, dentre outros casos.
2.26. Eventual destinação dos valores consignados:
Desse modo, em princípio, caso os
depósitos venham a ser deferidos e efetivados em conta vinculada
aos autos, haverão de ser levantados, total ou parcialmente, pela parte autora - caso sua pretensão seja acolhida em sentença transitada em julgado -, observando-se o alcance de sua eventual sucumbência. Caso ela sucumba totalmente na demanda, os valores deverão ser levantados então pela parte demandada/mutuante, como segue:
"RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL. ART. 151,
II, DO CTN. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CONVERSÃO EM RENDA. DECADÊNCIA.
1.
Com o depósito do montante integral, tem-se verdadeiro
lançamento por homologação. O contribuinte calcula o valor do tributo e substitui o pagamento antecipado pelo depósito, por
entender indevida a cobrança. Se a Fazenda aceita como integral o depósito, para fins de suspensão da exigibilidade do crédito, aquiesceu expressa ou tacitamente com o valor indicado pelo
contribuinte, o que equivale à homologação fiscal prevista no art.
150, § 4º, do CTN.
2. Uma vez ocorrido o lançamento tácito, encontra-se
constituído o crédito tributário, razão pela qual não há mais falar no transcurso do prazo decadencial nem na necessidade de lançamento de ofício das importâncias depositadas. Precedentes da Primeira
Seção.
3. A extinção do processo sem resolução de mérito, salvo o
caso de ilegitimidade passiva ad causam, impõe a conversão do
depósito em renda da Fazenda Pública respectiva. Precedentes:
AgRg nos EREsp 1.106.765⁄SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
Primeira Seção, DJe 30.11.2009, AgRg nos EDcl no Ag 1378036⁄CE,
Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 29⁄06⁄2011; REsp 901.052⁄SP,
Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJe 03.03.2008.
4. Os fundamentos de fato trazidos pela agravante são premissas não contempladas no acórdão recorrido, de modo que não
podem aqui ser discutidas ou modificadas sob pena de inaceitável
incursão em matéria de prova, o que é vedado na instância especial,
nos termos da Súmula 7⁄STJ.
5. Agravo regimental não provido."
(AgRg no REsp 1.213.319⁄SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 17⁄05⁄2012, DJe 28⁄05⁄2012)
TRIBUTÁRIO. PROCESSO JUDICIAL. DEPÓSITO COM A FINALIDADE DE SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO EQUIVALENTE AO PAGAMENTO. DESNECESSIDADE DE LANÇAMENTO. 1. O depósito judicial do montante integral do débito é causa suspensiva de exigibilidade do crédito tributário, ex vi do artigo 151, II do CTN e, por força do seu desígnio, implica lançamento por homologação tácito, no montante exato do quantum depositado, conjurando eventual alegação de decadência do direito de constituir o crédito tributário. Precedentes: EREsp 898.992/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08.08.2007, DJ 27.08.2007; REsp 895.604/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01.04.2008, DJ 11.04.2008; AgRg no REsp 971.054/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06.12.2007, DJ 24.03.2008. .
Julgado improcedente o pedido da empresa e, em havendo depósito, torna-se desnecessária a constituição do crédito tributário no qüinqüênio legal, não restando consumada a decadência. Conseqüentemente, revela-se escorreita a conversão em renda dos depósitos judiciais efetuados no âmbito da ação ordinária, uma vez não configurada a decadência do direito de o Fisco constituir o crédito tributário e tendo em vista a improcedência do pedido do contribuinte
. 3. Indevidamente realizado o levantamento do depósito judicial pelo contribuinte, afasta-se a razão da suspensão do crédito tributário, forçando ao FISCO FEDERAL a realização do lançamento tributário, inscrevendo o contribuinte em CDA, não existindo decadência ou prescrição do crédito tributário. 4. Apelação do autor improvida e apelação da UNIÃO FEDERAL e Remessa Oficial providas. (APELREEX 200171000285040, MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 13/10/2009.)
2.27. Correção monetária:
Reitero que, caso futuramente, tais valores venham a ser depositados em conta vinculada aos autos - mediante prévia autorização judicial -,
o montante haverá de ser corrigido pela taxa referencial básica - TRB, prevista na lei 9.289/1996, de caráter especial, se confrontada com a lei n. 9.703/1998, que se aplica aos depósitos tributário
s. Em princípio, a norma do art 11 da lei n. 9.289/1996 não restou alterada pela promulgação da emenda constitucional 113, de 08 de dezembro de 2011. Não há previsão de incidência de juros remuneratórios nesse âmbito, conforme se infere do art. 11 da lei 9.289
2.28. Distribuição do
ônus
da prova CDC - exame provisório:
A lei 8078/1990 dispõe, no seu art. 6º, VIII, que
"
São direitos básicos do consumidor: (...) a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências
."
No que toca à aludida cláusula, leia-se:
"(...) Por isso, o reconhecimento da hipossuficiência do consumidor para fins de inversão do ônus da prova não pode ser visto como forma de proteção ao mais pobre. Ou, em outras palavras, não é por ser pobre que deve ser beneficiado com a inversão do ônus da prova, até porque a questão da produção da prova é processual, e a condição econômica do consumidor diz respeito ao direito material.
Na realidade, para beneficiar o carente econômico no processo não seria necessária a inversão. Bastaria determinação judicial de que o fornecedor arcasse com eventuais custas processuais para a produção de provas, tais como as periciais. Determinar-se-ia a inversão do pagamento, e aí sim estar-se-ia protegendo, de forma justa, o economicamente fraco
. Não se pode olvidar que, para os pobres, na acepção jurídica do termo, existe a justiça gratuita, a qual permitem ao beneficiário a isenção do pagamento de custas judiciais, o que não significa que ele está isento de provar o seu direito.
(...) Assim, se a questão for meramente de falta de capacidade financeira de suportar o custo do processo, basta ao consumidor servir-se do benefício legal da lei 1060/1950. E o inverso é verdadeiro: existem consumidores economicamente poderosos, o que não implica a sua não hipossuficiência técnica. Mas, mesmo no caso de o consumidor ter grande capacidade econômica, a inversão do ônus da prova deve ser feita na constatação de sua hipossuficiência técnica (técnica e de informação)." (NUNES, Rizzatto.
Curso de direito do consumidor.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 731-733)
Por seu turno, os Tribunais têm decidido como segue:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 273 DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356/STF. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Inviável o recurso especial quando ausente o prequestionamento das questões de que tratam os dispositivos da legislação federal apontados como violados. 2. A
inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança das alegações do consumidor ou de sua hipossuficiência
. 3. Na hipótese em exame, a eg. Corte de origem manteve a aplicação ao caso do Código de Defesa do Consumidor, e após sopesar o acervo fático-probatório reunido nos autos, concluiu pela configuração da verossimilhança das alegações da parte agravada, bem como de sua hipossuficiência. Desse modo, o reexame de tais elementos, formadores da convicção do d. Juízo da causa, não é possível na via estreita do recurso especial, por exigir a análise do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN: (AGARESP 201300457409, RAUL ARAÚJO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:24/06/2013 ..DTPB:.)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA. ART. 130 DO CPC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REEXAME PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2.
Cabe ao magistrado, como destinatário da prova, determinar aquelas necessárias à instrução do processo, sempre em busca de seu convencimento racional. O reexame do juízo acerca da produção probatória encontra óbice na Súmula n° 7/STJ. 3. A inversão do ônus da prova se submete ao critério do julgador mediante análise das circunstâncias fáticas, cujo reexame é vedado em sede especia
l. 4. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGA 201000593699, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:26/03/2013 ..DTPB:.)
2.29.
Inversão
do
ônus
da prova - art.
373
, CPC:
Por outro lado, aparentemente se revela incabível a inversão do ônus da prova, prevista no art. 373, §1º, CPC/15. A vingar solução diversa, dever-se-ia então converter o julgamento em diligência, a fim de se assegurar que os requeridos produzissem as dilações probatórias porventura devidas, conforme preconiza a parte final do aludido art. 373, §1º, CPC.
O processualista Araken de Assis promove uma avaliação crítica da ampliação das hipóteses de inversão do ônus da prova, promovida com o CPC/2015:
"(...) A distribuição dinâmica do ônus da prova ocorre em outros ordenamentos. O art. 217.6 da Ley de Enjuiciamiento Civil espanhola institui dois meios para corrigir a inadequação formal do critério geral (onus probandi incumbit qui ei dicit): (a) a disponibilidade da prova (v.g., na investigação de paternidade, o suposto pai tem condições de esclarecer o fato biológico, através de exame de DNA); e (b) a facilidade probatória (v.g., a empresa encontra-se melhor situada para arrolar as testemunhas de eventos que ocorreram em suas dependências que o visitante ocasional). E, no direito norte-americano, o juiz alocará o ônus da prova segundo numerosas e complicadas regras.
Essa teoria tem cunho autoritário, porque concentra poderes no órgão judiciário, e, desse modo, traz consigo alto risco de subjetivismo
. Duas objeções principais, relevando o risco de prevaricação e o dever de fidelidade do juiz ao direito, opõem-se à doutrina: (a) o já mencionado risco de subjetividade e, ademais, de relatividade: o que é fácil para certo juiz pode não o ser para outro; e (b) a violação positiva ao direito fundamental processual do contraditório. Contra o risco de subjetividade, inexiste remédio; para a violação do contraditório, a medida cabível é a exigência de que haja motivo concreto, prévio e delimitado para a distribuição ope judicis. A distribuição do ônus da prova na decisão de saneamento e de organização do processo (art. 357, III) contrabalança os riscos, norteando a atividade das partes na instrução das causas. Seja como for, as objeções evidenciam que, entre nós, inexiste ainda densidade do direito fundamental à prova. O contraditório argumentativo (dizer e contradizer) não mais satisfaz.
As repercussões positivas ou negativas da repartição casuística podem ser aquilatadas e medidas nas relações de consumo. Em tal matriz, considerando o disposto no art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990, passa-se à análise do tema, sublinhando que não se limita a tais espécies de litígio, em tese, a distribuição dinâmica." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 203-209)
2.30. Inversão do
ônus
-
autenticidade
de assinaturas:
Destaco que, quando em causa a impugnação de descontos em benefícios previdenciários por conta de alegados contratos de mútuo ou de filiação a associações -, em novembro de 2021, o STJ consolidou o entendimento de que
"
o ônus da prova da falsidade documental compete à parte que o arguiu, mas se a falsidade apontada disser respeito à assinatura lançada no documento, o ônus da prova caberá a quem o produziu
".
(STJ, REsp. 1.846.649, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze).
Com efeito,
"No julgamento do REsp 1.846.649 (Tema 1.061), sob a sistemática dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça fixou tese no sentido de que "na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em
contrato bancário
juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade (CPC, arts. 6º, 369 e 429, II)"
(5054473-47.2020.4.04.7000, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR, Relator GERSON LUIZ ROCHA, julgado em 28/07/2022)
Logo, em princípio, incumbe ao banco requerido o encargo de comprovar a autenticidade de assinaturas que tenham sido impugnadas pela parte demandante.
2.31.
Elementos de convicção:
A autora, junto à petição inicial, anexou procuração, declaração de hipossuficiência, termo de renúncia ao excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, histórico de créditos do benefício do INSS, histórico de empréstimo consignado, carta de concessão de benefício de pensão por morte, e fatura de cartão de crédito.
Em extrato de benefício previdenciário (movimento 1.6) relativo ao mês 06/2024 consta:
Ademais, consta em referido relatório a existência de contrato ativo para desconto de RMC junto à requerida:
Consta, ainda, que há saldo devedor relativo a referido cartão de crédito:
A requerida, por sua vez,
não anexou o contrato
firmado com a requerida, limitando-se a anexar os extratos de cartão de crédito (movimento
22.2
), no qual se extrai raras utilizações, todas relacionadas à contratação de seguro prestamista, conforme se verifica abaixo:
2.32. Valoração precária:
No caso em exame, a autora sustenta que não formalizou contrato de cartão de crédito junto à requerida, e que não o utiliza, mas sofre descontos de RMC a esse título.
A requerida, por sua vez, aduz que o contrato foi formalizado mediante concordância expressa da requerida e consentimento livre e esclarecido.
A requerida BMG
não anexou aos autos a cópia do contrato formalizado com a requerida.
Por sua vez, de análise das provas constantes nos autos observa-se que não há a efetiva utilização do cartão de crédito pela requerente, com exceção da contratação anual de seguro prestamista.
Os seguros são renovados anualmente no mês de janeiro, e a partir deste momento é que passou a haver alguma utilização do cartão, e diante do pagamento apenas do limite do RMC gerou-se encargos de juros, IOF e multa, tornando os descontos intermináveis à requerente..
No presente caso, não se discute a falsidade do contrato de cartão de crédito, pois o mesmo não foi apresentado. Por outro lado, nesse momento, os autos não permitem conclusões mais densas a respeito da aventada nulidade. Deve-se aferir se a contratação promovida anualmente, geradora de saldo devedor à requerente, foi realizada de forma voluntária, e quem é o beneficiário de tais valores, pois, aparentemente, se trata de renovação anual automática.
2.33. Ainda quanto aos alegados fatos:
Assim, em primeiro exame, a demanda gravita em torno dos seguintes tópicos
: (a) a existência de efetiva contratação do cartão de crédito; (b) a existência de efetiva contratação do seguro prestamista gerador de saldo devedor; (c) verificação do responsável pelo lançamento de valores.
Diante das premissas acima equacionadas - notadamente, diante do REsp nº 1.846.649-MA -, é ônus da entidade financeira demandada comprovar a autenticidade das assinaturas e dos documentos atribuídos ao requerente. Isso pode ser promovido com a demonstração de ter sido exigido reconhecimento de firma, testemunhas etc., hábeis a demonstrar que, de fato, o requerente teria realmente celebrado os mencionados mútuos feneratícios.
Cabe ao banco demonstrar, ademais, a regularidade das cobranças lançadas em fatura, demonstrando quem é o beneficiário de transações, e o modo pelo qual foram realizadas e autorizadas (uso de cartão físico, uso de senha, etc).
2.34. Dilação probatória:
Em regra, o Poder Judiciário deve facultar às partes, observados os prazos de lei, a realização da mais ampla dilação probatória, desde que conexa o pedido e causa de pedir deduzidos nos autos.
Isso não significa, porém, que todo e qualquer pedido, lançado pelos contendores, deva ser automaticamente deferido. Ao contrário, as diligências destinadas a esclarecer fatos totalmente impertinentes com o
thema decidendum
não hão de ser realizadas, sob pena de converter o processo em um verdadeiro trabalho de Sísifo. Como sabido,
frusta probatur quod probantum non relevat.
Não se defere a realização de diligências destinadas a demonstrar fatos insuscetíveis de influenciar o resultado da demanda.
Esse é, por exemplo, o conteúdo do art. 464, §1º, do CPC. Reporto-me também ao art. 38, §2º, da Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo:
"Somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando sejam ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias."
Outro não é o conteúdo do art. 370, parágrafo único, CPC/15.
2.35. Tomada de depoimento pessoal:
No que toca ao depoimento pessoal da autora, convém atentar para os arts. 385 e 386, CPC/15:
Art. 385.
Cabe à parte requerer o depoimento pessoal da outra parte, a fim de que esta seja interrogada na audiência de instrução e julgamento, sem prejuízo do poder do juiz de ordená-lo de ofício
. §1 Se a parte, pessoalmente intimada para prestar depoimento pessoal e
advertida da pena de confesso
, não comparecer ou, comparecendo, se recusar a depor, o juiz aplicar-lhe-á a pena. § 2
É vedado a quem ainda não depôs assistir ao interrogatório da outra parte. § 3
O depoimento pessoal da parte que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser colhido por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.
Art. 386.
Quando a parte, sem motivo justificado, deixar de responder ao que lhe for perguntado ou empregar evasivas, o juiz, apreciando as demais circunstâncias e os elementos de prova, declarará, na sentença, se houve recusa de depor.
Logo, a coleta do depoimento pessoal se destina à eventual obtenção da confissão da parte inquirida. E isso mitiga a aplicação do instituto, quando em causa entidades de Direito Público, por força da indisponibilidade do interesse público primário. Com efeito, reitero que, quanto a entidades de regime jurídico, sequer o decurso
in albis
do prazo para contestação enseja os efeitos inerentes à revelia, conforme se infere do art. 344, II, CPC/15).
Não desconheço, porém, a análise pontualmente distinta de Araken de Assis, quem afirma
"Não ser diferente o regime das pessoas jurídicas de direito público. Já se sustentou que semelhante depoimento traduziria providência juridicamente inadmissível, porque a indisponibilidade do objeto litigioso torna ineficaz a confissão dos órgãos das pessoas jurídicas de direito público. Na perspectiva aqui adotada, não se pode tomar os efeitos como causa. O depoimento pessoal serve a outros propósitos e, precipuamente, à formação da convicção do juiz. E, nesse sentido, as declarações desses órgãos são tão boas ou más como as de qualquer outra pessoa."
(ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume III. Parte especial. São Paulo: RT. 2015. p. 515).
No caso em exame, entendo desnecessária a oitiva da autora, posto que o suposto contrato teria sido formalizado no ano de 2003, de acordo com a requerida, logo, assim sendo, o grande lapso temporal decorrido torna referida prova extremamente frágil.
Por outro lado, a efetiva contratação deverá ser realizada por meio documental. Não poderá a confissão eventualmente obtida pela autora, embora frágil, dado o decurso de prazo, suprir completamente a prova documental, quando inexistente qualquer início de prova documental acerca da contratação.
2.36. Apresentação de documentos.
No mais das vezes, incumbe à parte autora apresentar, com a petição inicial, os documentos em que ampara sua pretensão - art. 320, CPC. Os requeridos devem apresentar seus documentos junto com a impugnação, na forma do art. 434, CPC/15.
Em princípio, documentos complementares apenas poderiam ser apresentados, em momentos posteriores a estas fases (art. 435, CPC), quando de se tratasse de meios probatórios novos - surgidos no curso da demanda -, ainda que destinados a comprovar fatos anteriores ao início do processo. Também poderiam ser anexados quando - a despeito de se cuidar de documentos antigos -, sua relevância para o processo apenas teria sido conhecida no curso do processo, a exemplo do que ocorre quando reportados por testemunhas e desconhecidos das partes até então. Também há os casos de fatos havidos no curso do processo, na forma do art. 493, CPC/15, e que podem/devem ser comprovados pelas partes, com lastro em documentos pertinentes, ainda que havidos em fases distintas daquelas indicadas no movimento 434, CPC/15.
No caso, diante da iniciativa probatória concedida ao juiz,
determino à requerida BANCO BMG S/A que esclareça os dados acerca dos seguros prestamistas contratados
, em especial: data da contratação, forma de contratação, forma de autorização da transação e beneficiário de valores.
III - EM CONCLUSÃO
3.1. DECLARO a competência desta unidade jurisdicional para o o presente processo, na forma do art. 109, I e §2, Constituição/88 e art. 10 da lei n. 5.010/66, e a submissão do processo ao rito dos Juizados Especiais.
3.2. REGISTRO que as partes estão legitimadas para a demanda e que a autora possui interesse processual.
3.3. ACRESCENTO que a pretensão deduzida na inicial resta prescrita quanto a valores porventura devidos à autora há mais de 05 (cinco) anos, contados retroativamente da data da deflagração da demanda - art. 1 do decreto 20.910/32.
3.4. DEFIRO a gratuidade de justiça, em que pese tal medida surta reduzidos efeitos em primeira instância, no rito dos juizados, conforme arts. 54 e 55 da lei n. 9.099/95.
3.5. DELIMITEI, acima, as narrativas sobre os fatos havidos e também as questões jurídicas que tangenciam o debate travado nestes autos. RESSALVO nova análise de tais questões por época da prolação da sentença.
3.6. ANOTO que tampouco é o caso de se autorizar a promoção de depósitos em Juízo, quanto às parcelas mensais descontadas na prestação previdencíárias.
3.7. INTIMEM-SE as partes, outrossim, para, querendo, tecerem considerações do art. 357, §1.º, CPC, também aplicável ao rito dos Juizados. Prazo: 5 (cinco) dias úteis, contados na forma do artigo 219 e 357, CPC.
3.8. INDEFIRO a tomada de depoimento pessoal da autora pleiteada pelo requerido BANCO BMG;
3.9. INTIME-SE a requerida para anexar aos autos os documentos relativos à contratação de seguro prestamista, esclarecendo a forma de autorização dos mesmos e beneficiários de valores;
3.10. Com a manifestação da requerida ou com o esgotamento do prazo para tanto fixado, INTIME-SE a parte autora para, querendo, apresentar alegações finais - facultando-lhes manifestação sobre o estado do processo - art. 364, §2, CPC. Apresentadas as razões finais da partes autora ou esgotado o prazo para tanto, INTIMEM-SE os requeridos para, querendo, apresentarem suas razões em 15 dias úteis, prazo comum.
3.11. VOLTEM-ME conclusos para prolação de sentença, tão logo as razões finais dos requeridos sejam anexados aos autos ou esgote-se o prazo para tanto fixado.
3.12. INTIMEM-SE as partes a respeito deste despacho.
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Processo nº 5038646-36.2024.4.04.7200
ID: 333706231
Tribunal: TRF4
Órgão: 7ª Vara Federal de Florianópolis
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5038646-36.2024.4.04.7200
Data de Disponibilização:
24/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LETICIA DISBEZER DE MELLO
OAB/PR XXXXXX
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GASPAR FIDELIS DE ALMEIDA JUNIOR
OAB/SC XXXXXX
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AÇÃO PENAL Nº 5038646-36.2024.4.04.7200/SC
RÉU
: ANDERSON FERNANDO BIGUILINI
ADVOGADO(A)
: GASPAR FIDELIS DE ALMEIDA JUNIOR (OAB SC036823)
RÉU
: MATEUS MARTINS
ADVOGADO(A)
: LETICIA DISBEZER DE MELL…
AÇÃO PENAL Nº 5038646-36.2024.4.04.7200/SC
RÉU
: ANDERSON FERNANDO BIGUILINI
ADVOGADO(A)
: GASPAR FIDELIS DE ALMEIDA JUNIOR (OAB SC036823)
RÉU
: MATEUS MARTINS
ADVOGADO(A)
: LETICIA DISBEZER DE MELLO (OAB PR128297)
DESPACHO/DECISÃO
O Ministério Público Federal, com base no inquérito policial n. 5000521-55.2022.4.04.7204, ofereceu denúncia em desfavor de:
a)
ANDERSON FERNANDO BIGUILINI
,
filho de Gladis Maria Carbonera Biliguili, nascido aos 07/06/1988, CPF n. 066.931.289- 47, residente na Rua Epapinondas Ribeiro da Costa, n. s/n, bairro Salete, Dionísio Cerqueira/SC, telefone (49) 99126-1296,
pela prática, em tese, do crime tipificado no artigo 334 do Código Penal;
b)
MATEUS MARTINS
,
brasileiro, nascido em 03/04/1999, filho de Ivanilda Martins, inscrito no CPF n. 107.954.419-40, residente na Rua 73, n. 15, Casa, bairro Copasa, Barracão/PR, CEP 85700-000
,
pela prática, em tese, dos crimes tipificados no artigo 334,
caput,
no artigo 330 e no artigo 163, parágrafo único, III, todos do Código Penal c/c artigo 69 do Código Penal.
Conforme narração dos fatos (evento 1, INIC1):
[...]
[...]
Deixou de oferecer proposta de acordo de não persecução penal, pelas seguintes razões:
[...]
[...]
Ao final, arrolou 6 (seis) testemunhas.
O Juízo da 1ª Vara Federal de Florianópolis determinou a redistribuição dos autos a este Juízo, uma vez que os autos do inquérito policial n. 5000521-55.2022.4.04.7204 foram a ele distribuídos na qualidade de juiz das garantias, (evento 3).
Antecedentes criminais certificados (evento 9).
Pela decisão proferida no evento 11, determinou-se a intimação do Ministério Público Federal para juntar nos autos a decisão judicial que autorizou o compartilhamento de provas.
O Ministério Público Federal juntou documentos (evento 14).
A
denúncia foi recebida em 21/03/2025
(evento 16).
Citado/intimado (evento 24), ANDERSON, por meio de defensor constituído (evento 27), apresentou resposta à acusação, reservando-se o direito de apresentar suas teses defensivas ao longo da instrução criminal. Arrolou 1 (uma) testemunha (evento 32).
Citado/intimado (evento 26), MATEUS, por meio de defensor constituído (evento 30), apresentou resposta à acusação. Em preliminar, arguiu a falta de justa causa para a persecução penal, em razão da atipicidade da conduta, uma vez que aplicável o princípio da insignificância, e o cabimento de acordo de não persecução penal. No mais, reiterou a incidência do princípio da insignificância, uma vez que o valor dos impostos iludidos é inferior a R$ 20.000,00. Informou não possuir antecedentes criminais, não praticar o crime de descaminho de forma reiterada, exercer atividade lícita e possuir residência fixa. Ressaltou não estar comprovado o dolo necessário à configuração do crime de dano e que o fato de
'o acusado ter evadido da abordagem policial não preenche os elementos normativos do tipo penal desobediência'
. Arrolou como testemunhas aquelas indicadas pelo Ministério Público Federal (evento 35).
É o relatório. Decido.
1
. Absolvição
sumária
O artigo 397 do Código de Processo Penal, com redação dada pela Lei n. 11.719/08, prevê a possibilidade de absolvição sumária do acusado quando se verificar:
I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;
II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;
III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou
IV - extinta a punibilidade do agente.
Conforme se infere dos incisos transcritos, a existência das causas de
absolvição sumária deve ser manifesta, ou seja, não pode deixar margem a dúvidas ou à produção de prova em contrário.
Em sua resposta à acusação, MATEUS arguiu a atipicidade da conduta, em razão da incidência do princípio da insignificância.
A questão foi analisada quando do recebimento da denúncia (evento 16):
[...]
Anoto que, mesmo que o valor dos impostos iludidos (II e IPI) não alcance R$ 20.000,00, a orientação do STF, confirmada pelas duas Turmas, bem como da 4ª Seção do TRF4 é firme no sentido de não se cogitar da aplicação do princípio da insignificância em casos de reiteração delitiva e quando comprovada a destinação comercial das mercadorias.
É o caso dos autos.
MATEUS registra outras apreensões administrativas e anterior prisão em flagrante por fatos semelhantes (evento 62, INQ1, fls. 12/13 e 55/56, e anexos eletrônicos).
Em seu depoimento prestado na esfera policial, ANDERSON declarou
'QUE já teve mercadorias apreendidas pela RFB, quando caiu com um Corsa, carregando mais de trinta caixas de vinhos argentinos, em 2020; QUE também foram apreendidas trinta e poucas caixas em sua casa'
(evento 71, INQ1, fl. 4, e ÁUDIO2).
Ainda, a análise de conversas extraídas de aparelho telefônico apreendido em poder de MATEUS evidencia a reiteração delitiva (informação de polícia judiciária n. 1940069/2024: evento 77, INQ1, fls. 5/31).
A quantidade de produtos apreendidos indica a finalidade comercial.
[...]
As demais alegações (ausência de dolo, não configuração do crime de desobediência) demandam instrução probatória.
Por sua vez, ANDERSON reservou-se o direito de apresentar suas teses defensivas ao longo da instrução criminal.
Dessa forma, com base na resposta apresentada, não reconheço, na atual fase do processo, a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no artigo 397 do Código de Processo Penal.
2. Prosseguimento do feito
2.1. Acordo de não persecução penal
MATEUS requereu a remessa dos autos ao Ministério Público Federal para oferta de acordo de não persecução penal.
Na denúncia, o Ministério Público Federal já esclareceu as razões pelas quais deixou de oferecer proposta de acordo de não persecução penal ao acusado:
[...]
[...]
Nesse viés, entendo desnecessária nova intimação do Ministério Público Federal para manifestação.
Por fim, anoto que, nos termos da jurisprudência, não cabe ao Poder Judiciário propor o acordo de não persecução penal de ofício, tampouco impor ao Ministério Público Federal a sua oferta.
Ainda, o não oferecimento do acordo de não persecução penal, ainda que presentes seus requisitos, não enseja qualquer nulidade, uma vez que não se trata de um direito subjetivo do acusado.
2.2. Audiência de instrução e julgamento
Designe-se data para a realização de audiência de instrução e julgamento, na qual serão inquiridas as seguintes testemunhas:
- arroladas pela acusação (evento 1) e pela defesa de MATEUS (evento 35):
1) JONATHAN DA SILVA, proprietário do veículo apreendido, pintor, CPF nº 025.252.870- 02, Rua Cesar de Oliveira, 342, bairro COHAB, CEP 95630-000, Parobé/RS, BRASIL, fone(s) (49) 999645887;
2) DANIELA BORGES, Policial Rodoviária Federal, Matrícula n° 3262672, lotada e em exercício na Delegacia da Policia Rodoviária Federal em Lages/SC;
3) JOÃO PAULO HAAS, Policial Rodoviário Federal, matrícula 1880274, lotado e em exercício na Delegacia da PRF em Lages/SC;
4) LORIVALDO BOCATE, Policial Rodoviário Federal, matrícula nº 1539420, lotado e em exercício na Delegacia da Policia Rodoviária Federal em Lages/SC;
5) MARCELO DE CORDOVA, Policial Militar da Policia Militar Rodoviária, matrícula nº 928454, lotado e em exercício na PMRV - P11 PALMEIRA, Rodovia SC 114, Km 202, em Palmeira/SC.
6) FERNANDO BORGES LOURENÇO, Policial Militar, , matricula 923881-6, lotado e em exercício na BPMRE em Palmeira/SC.
- arrolada pela defesa de ANDERSON (evento 32):
7) CARLOS BRANDÃO DOS SANTOS, brasileiro, solteiro, empresário, portador do CPF n. 022.804.389-17, podendo ser localizado na rua Rio Grande do Sul, 160, centro, cidade de Barracão – Pr, WhatsApp n. 49 99832-1754.
Na sequência, será realizado o interrogatório dos acusados e alegações finais orais e sentença em audiência se for o caso, nos termos do artigo 400 do Código de Processo Penal.
Para as testemunhas que ostentem a condição de servidor público, proceda-se da forma estabelecida no § 3º do art. 221 do Código de Processo Penal.
Nos termos do artigo 3º,
caput
, da Resolução n. 354/2020 do CNJ, na redação dada pela Resolução n. 481/2022 do CNJ,
intimem-se as defesas para, no prazo de 05 (cinco) dias, manifestarem-se sobre a possibilidade de a
audiência
ser realizada de maneira telepresencial
(
'telepresenciais: as audiências e sessões realizadas a partir de ambiente físico externo às unidades judiciárias'
).
Em caso de concordância ou no silêncio (inexistência de negativa expressa), a
audiência
será realizada de modo virtual/telepresencial por meio da plataforma de videoconferência
Zoom
Cloud Meetings.
Anoto que, com as restrições impostas pela pandemia da Covid-19, desde meados de 2020, este Juízo tem realizado as audiências de forma virtual, com observância de todas as garantias constitucionalmente previstas, garantindo facilidade e amplo acesso aos envolvidos no ato.
Com a retomada gradual do trabalho presencial, as audiências permaneceram sendo realizadas por meio da plataforma de videoconferência
Zoom Cloud Meetings
, justamente em razão da facilidade da participação das partes e testemunhas de forma virtual, de modo eficaz e econômico, consagrando o princípio do acesso à justiça.
Caso a defesa expressamente discorde da realização do ato de maneira telepresencial, os defensores, os réus, o Ministério Público Federal e as testemunhas com endereço nesta Subseção Judiciária deverão comparecer presencialmente na sede deste Juízo. As testemunhas com endereço em cidade não pertencente à circunscrição territorial desta Subseção Judiciária serão ouvidas por meio da plataforma de videoconferência
Zoom Cloud Meetings
.
O telefone/WhatsApp dos acusados ANDERSON (evento 24: 49 991261296) e MATEUS (evento 26: (45) 9 9966-8404) já consta nos autos.
Ressalto que qualquer alteração do telefone/WhatsApp dos acusados deverá ser comunicado de imediato, mantendo-se os dados para localização sempre atualizados.
3. Demais providências
Cumpra-se o determinado na decisão do evento 16:
[...]
Retire-se o sigilo atribuído ao inquérito policial, uma vez que o feito deverá tramitar sem sigilo.
[...]
Intimem-se.
Autorizo
que as intimações sejam realizadas por meio de contato telefônico/e-mail/whatsapp, certificando-se a providência nos autos.
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Processo nº 5020661-63.2024.4.04.7100
ID: 308338344
Tribunal: TRF4
Órgão: 6ª Vara Federal de Porto Alegre
Classe: EXECUçãO DE TíTULO EXTRAJUDICIAL
Nº Processo: 5020661-63.2024.4.04.7100
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANA AMÉLIA PIUCO
OAB/RS XXXXXX
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EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL Nº 5020661-63.2024.4.04.7100/RS
EXEQUENTE
: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
DESPACHO/DECISÃO
1.
Requer a Parte Exequente a utilização do Sistema
CNIB
(
CENTRAL NACIONA…
EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL Nº 5020661-63.2024.4.04.7100/RS
EXEQUENTE
: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
DESPACHO/DECISÃO
1.
Requer a Parte Exequente a utilização do Sistema
CNIB
(
CENTRAL NACIONAL DE INDISPONIBILIDADE DE BENS
) para a constrição de bens da Parte Executada.
1.1
A indisponibilidade de bens pelo Juízo Cível junto ao sistema CNIB somente é aplicável às ações de improbidade administrativa, insolvência civil e como medida cautelar entre outros, conforme convênio estabelecido com a Justiça Federal pelo Provimento nº 39/2014 do CNJ, e orientação existente no sítio da própria Central (
https://www.indisponibilidade.org.br/legislacao
).
Nesse sentido, confira-se os seguintes julgados do TRF4:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. INDISPONIBILIDADE DE BENS. CNIB. UTILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA. POSSIBILIDADE. INDEFERIMENTO PRÉVIO DE MEDIDAS EXECUTIVAS. NULIDADE. 1. A Central Nacional de Indisponibilidade de Bens é um sistema que foi criado para dar efetividade às medidas de indisponibilidade de bens previstas em casos específicos (improbidade administrativa, recuperação judicial, medida cautelar fiscal, planos de saúde, previdência complementar e, em especial, execução fiscal de dívida de natureza tributária), constituindo providência excepcional, a ser utilizada com cautela. 2. Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça vem admitindo a possibilidade de utilização do CNIB nas demandas cíveis, de maneira subsidiária, desde que exauridos os meios executivos típicos, como ocorre no caso em tela. 3. Em relação ao indeferimento prévio de medidas que não foram sequer requeridas pela exequente, deve ser declarada a nulidade da decisão agravada, pois foi proferida de forma condicional, o que é vedado pelo ordenamento jurídico. Precedentes. (TRF4, AG 5025419-45.2024.4.04.0000, 4ª Turma , Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE , julgado em 04/06/2025).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CNIB - CENTRAL NACIONAL DE INDISPONIBILIDADE DE BENS. EXECUÇÃO. DÍVIDA ATIVA NÃO TRIBUTÁRIA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. HIPÓTESES RESTRITAS. ART. 185-A DO CTN. INAPLICABILIDADE. 1. A Central Nacional de Indisponibilidade de Bens - CNIB é um sistema criado e regulamentado pelo Provimento nº 39/2014 da Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ. 2. Nessa acepção, o sistema foi criado a fim de dar efetividade às medidas de indisponibilidade de bens previstas em casos específicos. Assim,
perfaz-se como medida excepcional, a ser utilizada nos casos em que há previsão legal da medida de indisponibilidade de bens
. 3. O art. 185-A do CTN não se aplica às execuções extrajudiciais para cobrança de dívida de natureza não-tributária e, portanto, não se afigura possível a utilização da CNIB para indisponibilidade de bens da parte executada. (TRF4, AG 5033136-11.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator para Acórdão ROGERIO FAVRETO, julgado em 10/12/2024) (grifou-se)
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CRÉDITO DE EMPRESA PÚBLICA FEDERAL. INDISPONIBILIDADE DE BENS. CNIB. INAPLICABILIDADE. 1. A Central Nacional de Indisponibilidade de Bens - CNIB foi criada por meio do Provimento 39/2014 do CNJ, para garantir maior efetividade às decisões administrativas e/ou judiciais que determinem a indisponibilidade de bens, em benefício da segurança jurídica, além de permitir o rastreamento, em âmbito nacional, da propriedade de imóveis e outros direitos reais imobiliários. 2.
A utilização da
CNIB
deve se dar apenas nas hipóteses regulamentares previstas (improbidade administrativa, recuperação judicial, medida cautelar fiscal, planos de saúde, previdência complementar e, em especial, execução fiscal de dívida de natureza tributária), não podendo ser utilizada indistintamente
. 3. No caso concreto, trata-se de execução de título extrajudicial que tem por objeto crédito de empresa pública federal, hipótese para a qual não há previsão de utilização da medida requerida. 4. Agravo de instrumento desprovido. (TRF4, AG 5015025-76.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator LADEMIRO DORS FILHO, julgado em 03/12/2024) (grifou-se)
DECISÃO: Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO PARANÁ, em face de decisão proferida nos autos de n.º 50017564720194047015 (Execução de Título Extrajudicial), pela qual o juízo de origem indeferiu o pedido de consulta ao sistema SERP-JUD. Sustenta o agravante, em suma, que (a) o indeferimento da utilização da ferramenta é manifestamente contrário ao disposto no artigo 797 do Código de Processo Civil que dispõe que a execução se realiza no interesse do credor; (b) é majoritário o entendimento quanto à possibilidade de utilização das ferramentas ágeis dos sistemas de pesquisa de bens postos à disposição do Poder Judiciário. É o relatório. Passo a decidir. 1. No que importa transcrever, a decisão agravada foi proferida nos seguintes termos (processo 5001756-47.2019.4.04.7015/PR, evento 106, DESPADEC1): 1. A parte exequente requer a consulta ao sistema SERP-JUD, a fim de localizar bens penhoráveis em nome do(s) executado(s). Com a finalidade de promover o célere andamento do feito e com fundamento no princípio da economia processual, passo a analisar o requerimento formulado (item 08), bem como os demais requerimentos usualmente formulados pela exequente em casos análogos.
2.
Central Nacional de Indisponibilidade de Bens Imóveis - CNIB Indefiro o pedido, por ausência de previsão legal para o caso dos autos. Com efeito, o sistema foi criado a fim de dar efetividade às medidas de indisponibilidade de bens previstas em diversas leis esparsas: art. 7º da Lei nº 8.429/1999 (improbidade administrativa), art. 82, § 2º da Lei nº 11.101/2005 (recuperação judicial), art. 4º da Lei nº 8.397/1992 (medida cautelar fiscal), art. 24-A da Lei nº 9.656/1998 (planos de saúde), arts. 59, §§ 1º e 2º, 60 e 61, § 2º, II da LC 109/2001 (previdência complementar) e art. 185-A do Código Tributário Nacional
. No caso dos autos, executa-se dívida em relação a qual não há previsão legal de aplicação da medida, que é excepcional. Nesse sentido: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE CRÉDITO BANCÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. DÍVIDA NÃO TRIBUTÁRIA. DESCABIMENTO. - A utilização da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB) deve ser restrita aos casos em que há previsão legal da medida e não genericamente, com amparo legal do art. 798 do CPC (poder geral de cautela). - Inviável a utilização do sistema para os casos de cobrança de dívida oriunda de contratos bancários, eis que esta espécie não está contemplada entre aquelas previstas no Provimento 39/2014 editado pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ. (TRF4, AG 5028171-05.2015.404.0000, TERCEIRA TURMA, Relator p/ Acórdão RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 05/10/2015) (grifei). 3. Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos - SNIPER O SNIPER é uma plataforma desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), no âmbito do Programa Justiça 4.0, que funciona da seguinte maneira: A partir do cruzamento de dados e informações de diferentes bases de dados, o Sniper destaca os vínculos entre pessoas físicas e jurídicas de forma visual (no formato de grafos), permitindo identificar relações de interesse para processos judiciais de forma mais ágil e eficiente. (...) Conclui-se, portanto, que referido sistema apenas identifica vínculos entre pessoas físicas e jurídicas, sem qualquer indicação de bens e valores. Ademais, o SNIPER não se destina a obter informações patrimoniais distintas daquelas já existentes em bancos de dados ordinariamente consultados pelo Juízo nos processos de execução. Trata-se de uma plataforma de busca unificada de informações já obtidas pela consulta individual aos diversos sistemas por ela abrangidos. Diante do exposto, indefiro o requerimento. 4. Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias - SIMBA O SIMBA (Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias) tem por objetivo a investigação de movimentação bancária como instrumento de combate a ilícitos penais. Não se aplica, portanto, para processos que visam a satisfação de créditos, como ocorre no caso dos autos. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PEDIDO DE QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS. Em relação ao COAF, SIMBA e Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional - CCS, importa considerar se tratarem de sistemas que têm por objetivo a investigação de movimentações bancárias para fins de combate a ilícitos penais, como lavagem de dinheiro, por exemplo, e não a localização de bens para garantia da execução, de modo que não se mostram instrumentos adequados à finalidade pretendida pelo credor, tampouco propiciam celeridade ou efetividade à execução. No que tange à consulta junto a B3 S.A. - Brasil, Bolsa, Balcão (BM&FBOVESPA e a CETIP), é firme o entendimento das Turmas que compõem a Segunda Seção desta Corte a necessidade do respectivo pedido vir acompanhado ao menos de indício de existência de ativos/títulos, condição não verificada no caso em exame. (TRF4, AG 5041785-38.2019.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES, juntado aos autos em 23/10/2020) Assim, indefiro o pedido de consulta ao SIMBA. 5. Apreensão da CNH e do passaporte; cancelamento de cartões de crédito e de chaves PIX; suspensão de serviços bancários; bloqueio de pacotes de canais a cabo e de serviços de streaming, telefonia e internet Indefiro o pedido de adoção das medidas atípicas acima listadas. Não obstante a possibilidade do juízo determinar a prática de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial (inteligência do art. 139, inciso IV, do CPC), ao meu ver, o pleito formulado extrapola os limites e poderes de atuação do juízo cível em um processo executivo. A responsabilidade do devedor no processo executivo é patrimonial (art. 789 do CPC) e não pessoal, razão pela qual os requerimentos formulados pela CEF, que acarretariam em sanções à pessoa do devedor, fogem ao sistema adotado pela legislação em vigor. A adoção de tais medidas, além de desproporcional e sem relação direta com a cobrança, não terá o efeito de garantir o direito da credora, cuja pretensão é o pagamento de seu crédito, seja de forma direta, seja pela localização de bens penhoráveis. Ademais, diante da ausência de indícios de que a parte executada possua patrimônio expropriável ou tenha condições de efetuar o pagamento do débito, não resta comprovada a utilidade de eventuais medidas executivas atípicas. 6. Consulta ao sistema Bacen-CCS O CCS - Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro consiste em um sistema do Banco Central de informações de natureza cadastral que tem por objeto principal os relacionamentos que são mantidos pelas instituições participantes com os seus correntistas e/ou clientes e com os representantes legais e/ou convencionais dos mesmos correntistas e/ou clientes, não contendo dados de valor, de movimentação financeira ou de saldos de contas e aplicações. É sistema utilizado em investigações de natureza criminal, criado por determinação da Lei 10.701/03, que, alterando a Lei dos Crimes de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98), imputou ao Banco Central a obrigação de manter registro centralizado formando o cadastro geral de correntistas e clientes de instituições financeiras, bem como de seus procuradores. Sua utilização é restrita a uma finalidade específica, conforme disposição do Convênio de Cooperação Institucional firmado entre o BACEN e o Conselho Nacional de Justiça (https://www.bcb.gov.br/acessoainformacao/gestao/convenios/ccs-20081202-convenio-bacen-cnj_.pdf), que não contempla consultas em processos de execução de natureza cível. Assim, incabível sua utilização nestes autos, razão pela qual, nesse ponto, indefiro o pedido. 7. CVM, PREVIC, CNSEG, SUSEP, BM&FBOVESPA, CETIP, FENASEG E FENAPREVI Indefiro a expedição de ofício à Comissão de Valores Mobiliários - CVM, Superintendência Nacional de Previdência Complementar - PREVIC, Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização - CNSEG, Superintendência de Seguros Privados - SUSEP, BM&FBOVESPA, Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos - CETIP, Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Previdência Complementar Aberta - FENASEG e Federação Nacional de Previdência Privada e Vida - FENAPREVI. A busca de eventuais aplicações, investimentos e instituições do Sistema Financeiro Nacional em que a parte executada realiza transações bancárias já está abrangida por meio da busca realizada pelo sistema Sisbajud. Segundo o regulamento do sistema, a ordem de bloqueio destina-se a bloquear tanto saldo existente em conta de depósito à vista (conta-corrente), quanto em contas de investimentos e de poupança, depósitos a prazo, aplicações financeiras, fundos de investimento, e demais ativos sob a administração, custódia ou registro da instituição participante. Além disso, destaco que a localização de bens do executado passíveis de constrição é responsabilidade da parte exequente. Em casos análogos, reputa o TRF4 que a expedição do ofício nessas situações onera o Poder Judiciário de forma excessiva. Nesse sentido: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PESQUISA DE BENS. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS. FENSEG. SUSEP. CVM. DESCABIMENTO. AUTORIZAÇÃO DE DILIGÊNCIA PELA EXEQUENTE. 1. A consulta à base de dados da Federação Nacional de Seguros Gerais - FENSEG, da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP e da Comissão de Valores Mobiliários - CVM depende de expedição de ofício àqueles órgãos, expediente que onera o Judiciário em demasia e faz com que este substitua o exequente, responsável pela localização de bens do executado passíveis de constrição. 2. Autorizada a exequente, contudo, a diligenciar junto à FENSEG, à SUSEP e à CVM, por seus próprios meios, a fim de buscar informações que indiquem a existência de bens do devedor. (TRF4, AG 5018771-20.2022.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 06/07/2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS. CONSULTA. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO. DESCABIMENTO. 1. A consulta às bases de dados da Federação Nacional de Seguros Gerais e da Superintendência de Seguros Privados depende de expedição de ofícios àqueles órgãos, expediente que onera o Judiciário em demasia e faz com que este substitua o exequente, responsável pela localização de bens do executado passíveis de constrição. 2. A pesquisa e penhora de valores mobiliários em nome da parte executada somente se faz possível se demonstrada, por prova idônea, a existência de aplicações em nome desta, demonstrando assim, alguma chance de êxito. (TRF4, AG 5029022-34.2021.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 31/08/2022) ADMINISTRATIVO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PESQUISA DE BENS. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À FENSEG. DESCABIMENTO. AUTORIZAÇÃO DE DILIGÊNCIA PELA EXEQUENTE. 1. A consulta à base de dados da Federação Nacional de Seguros Gerais - FENSEG - depende de expedição de ofício àquele órgão, expediente que onera o Judiciário em demasia e faz com que este substitua o exequente, responsável pela localização de bens do executado passíveis de constrição. 2. Autorizada a exequente, contudo, a diligenciar junto à FENSEG, por seus próprios meios, a fim de buscar informações que indiquem a existência de bens do devedor. (TRF4, AG 5013478-06.2021.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 15/06/2021) No entanto, fica a exequente autorizada a diligenciar junto às referidas instituições, por seus próprios meios, a fim de buscar informações que indiquem a existência de bens penhoráveis do devedor. Se necessário, cópia desta decisão servirá como Ofício para essa finalidade. 8. CAGED, CENSEC, CNIS, INFOSEG, NAVEJUD, PLENUS, SERPRO, SIEL, SISCOAF, SREI, SERP-JUD, PREVJUD, SNGB, SNCR, ARISP, ANAC e Capitania dos Portos Indefiro os pedidos de consulta ao Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED, Sistema do Colégio Notarial do Brasil - CENSEC, Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, Sistema de Informações ao Judiciário - INFOSEG, Cadastro Nacional de Informações dos Beneficiários da Previdência Social - PLENUS, Serviço Federal de Processamento de Dados - SERPRO, Sistema de Informações Eleitorais - SIEL e Sistema de Controle de Atividades Financeiras - SISCOAF, por não atenderem à finalidade pretendida (busca de bens penhoráveis). Indefiro também a expedição de ofício ao SNCR - Sistema Nacional de Cadastro Rural, visto que a localização de propriedades rurais em nome dos executados pode ser realizada por meio da declaração de operações imobiliárias (DOI) e da declaração de imposto sobre a propriedade rural (DITR), solicitadas pelo Infojud. Resta indeferido, da mesma forma, o requerimento de expedição de ofício à ANAC e à Capitania dos Portos/Marinha do Brasil, visto que referem-se a registro de aeronaves e embarcações, sendo as informações públicas, passíveis de pesquisa direta pelo exequente. Quanto ao NAVEJUD, informo que o sistema não está disponível a este Juízo. Além disso, não há indício de prova de que o executado possua bens dessa espécie em seu patrimônio. Eventuais aeronaves/embarcações existentes também serão abrangidas pela pesquisa ao Infojud. Com relação à CENSEC e ao SREI, destaco que as ferramentas são de acesso público e as informações pretendidas podem ser solicitadas diretamente pelo requerente por meio do sistema, dispensando a atuação do Judiciário. Por sua vez, o SERP-JUD é uma plataforma de acesso aos serviços dos Registros Públicos brasileiros, que também possibilita a localização de bens imóveis em nome dos executados. Tal finalidade pode ser atingida por meio da pesquisa ao SREI, que está disponível para busca direta pelo exequente, conforme já mencionado. Além disso, eventuais bens imóveis registrados em nome dos executados seriam abrangidos pela pesquisa realizada no Infojud. O sistema PREVJUD permite ao Judiciário o acesso imediato a informações previdenciárias e o envio automatizado de ordens judiciais ao INSS em ações previdenciárias. Portanto, eventual busca seria inócua e não atenderia a finalidade pretendida pela parte exequente, já que presumem-se impenhoráveis as verbas decorrentes dos vínculos previdenciários, que são destinadas ao sustento do devedor e de sua família, nos termos do art. 833, inciso IV, do CPC. O Sistema Nacional de Gestão de Bens - SNGB tem a finalidade de rastrear toda a cadeia de custódia, desde o cadastro do bem, valor, documento ou objeto judicializado até a sua destinação final, com controle do histórico de sua movimentação judicial. Portanto, não visa a localização de bens passíveis de penhora. Ademais, não há qualquer razoabilidade em permitir tal pesquisa, em vista da natureza da dívida ora executada. O sistema de busca ARISP é empregado para procedimentos de averbação de penhoras de bens imóveis perante os ofícios de registro imobiliários do Estado de São Paulo, conforme disposto no Provimento nº 6/2009 da Corregedoria Geral da Justiça. Destaco que o sistema não é utilizado para busca de bens e que este Juízo não detém acesso ao mencionado sistema. Por fim, quanto ao SERPRO, destaco que a base de dados utilizada é a mesma do Infojud. Diante do exposto, indefiro os mencionados requerimentos. 9. Ofício às fintechs e empresas de intermediação de pagamento digital: Paypal, Pagseguro, Bcash, Wirecard (Moip), Payu, Mercado Pago, Global Bc, Gerencianet, Pagar.me, Yapay, Iugu Indefiro o pedido, visto que ao criar uma conta com o intermediador de pagamento, o vendedor/empresário informa seus dados bancários, para que a intermediadora faça o repasse do pagamento recebido quando realizadas vendas online. Nesse cenário, a consulta realizada junto ao Sisbajud, ainda que de forma indireta, abrange eventuais valores recebidos das empresas intermediadoras de crédito, na medida em que os valores obtidos são repassados para a conta corrente do vendedor/empresário. Portanto, entendo dispensável a pesquisa de bens nos moldes requeridos. Destaco, por fim, que o sistema Sisbajud já permite a realização da pesquisa nas seguintes instituições: GERENCIANET PAGAMENTOS DO BRASIL LTDA; WIRECARD BRAZIL; PAGSEGURO INTERNET S.A. e PAYPAL DO BRASIL SERVICOS DE PAGAMENTOS LTDA. Ademais, as fintechs também estão integradas ao Sisbajud. 10. Penhora de créditos do programa Nota Fiscal Paraná O programa Nota Paraná representa uma liberalidade do Governo do Estado para incentivar o contribuinte a pedir nota fiscal, visando o recolhimento do ICMS. Os créditos oriundos do programa são destinados apenas às pessoas físicas, e, normalmente, de reduzido valor, de forma que a sua penhora não se mostra útil ou producente à presente execução. Anoto que pessoas jurídicas estão excluídas do rol de beneficiários, nos termos do artigo 2º, § 1°, II, da Lei Estadual nº 18.451/2015. Diante do exposto, tendo em vista a insignificância dos créditos normalmente encontrados no programa, indefiro o requerimento. 11. Ofício às corretoras de criptomoedas e outros ativos não regulados Criptomoeda é uma moeda digital com criptografia, não emitida por governo. Não é regulamentada ou controlada pelo Banco Central, tampouco operada pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Entre suas finalidades está permitir ao portador que a negocie de forma eletrônica, sem intermédio de terceiros e sem ser rastreado. Assim, embora seja possível a negociação através das exchanges (como são chamadas as corretoras para negociação de moedas digitais), sua transação também pode ocorrer diretamente entre as pessoas, de forma livre, privada e global. Quando utilizam sua plataforma, a praxe dos investidores é não deixar seus ativos digitais nas exchanges. Após a transação, ele recolhe o ativo e armazena em sua posse. A chance de localizar a criptomoeda é mínima, pois, embora em crescimento, a utilização deste tipo de ativo é muito restrita e, por suas características, impedem a efetivação do bloqueio judicial, a penhora e, menos ainda, a sua transferência sem os códigos para sua movimentação, os quais, em princípio, somente são conhecidos pelo seu proprietário. Ademais, no caso em tela, a parte exequente não trouxe elementos que indiquem que a parte executada seja titular de bens dessa natureza, limitando-se a requerer a expedição de ofícios para diligências pelo Juízo. Entretanto, compete ao credor indicar os bens do devedor sujeitos à penhora e não impor ao Judiciário a realização de pesquisas que, de plano, se mostram inúteis, seja em razão da natureza dos bens, seja em razão da inexistência de provas de que o devedor os possua. Nesse sentido: CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. Ação de indenização. Pedido de penhora de moedas virtuais Bitcoin - Descabimento - Bens que não possuem lastro e não estão regulamentados pelo Banco Central ou pela CVM e podem ser negociados por qualquer meio digital, o que dificulta não apenas a efetivação, como o gerenciamento da penhora nos autos - Ausência, ademais, de comprovação de que o devedor seja efetivamente titular de bens dessa natureza - Pedido demasiadamente genérico - Recurso desprovido. (AI 2059251-85.2018.8.26.0000, 9ª Câm. De Direito Privado do TJSP, Rel. Des. Galdino Toledo Júnio, j. 26/11/2019) AGRAVO DE INSTRUMENTO. Execução de título extrajudicial. Penhora de moeda virtual (bitcoin). Indeferimento. Pedido genérico. Ausência de indícios de que os executados sejam titulares de bens dessa natureza. Decisão mantida. Recurso desprovido (AI 2202157-35.2017.8.26.0000, Rel. Des. Milton Carvalho, j. 21/11/2017) Pelo exposto, indefiro a diligência. 12. Penhora de bens que guarnecem a residência da parte executada A prática demonstra que a diligência é inócua e ineficaz, uma vez que em inúmeros casos que tramitam perante este Juízo, os bens localizados possuem valor irrisório ou sequer são passíveis de penhora. Registre-se, por oportuno, que compete ao juiz dirigir o processo e velar pela rápida solução do litígio, devendo indeferir diligências inúteis, a partir da observação do que ordinariamente ocorre (arts. 139 e 375 do CPC). O argumento de que tal medida funciona como coação para que os devedores procurem a exequente para renegociar suas dívidas não é suficiente para o acolhimento do pedido. Sendo assim, resta desde logo indeferido pedido nesse sentido. 13. Penhora de pontos em programas de milhas de empresas aéreas e em cartões de crédito: Indefiro o pedido, uma vez que, a rigor, as empresas responsáveis por esses programas não convertem os pontos acumulados em pecúnia, mas sim em vantagens a serem usufruídas pelo titular, de forma pessoal e, como regra, intransferível. Sobre o tema, os seguintes precedentes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. MILHAS AÉREAS. AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO. NÃO CABIMENTO. 1. Não obstante a existência de expressão econômica, não há legislação específica regulatória de venda de milhas. 2. A ausência de mecanismos à disposição do Juízo para a conversão em pecúnia dos pontos/milhas viola o princípio da efetividade, não trazendo qualquer benefício econômico ao credor. 3. Inviável a expedição de ofício às companhias aéreas para que informem sobre a existência de cadastro, em nome da parte executada, em seus programas de fidelidade. (TRF4, AG 5048513-90.2022.4.04.0000, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relator LUIZ ANTONIO BONAT, juntado aos autos em 08/02/2023) 14. Penhora de faturamento da empresa e de recebíveis de cartão de crédito e débito A penhora de faturamento é medida excepcional e o percentual penhorado não pode inviabilizar o exercício da atividade empresarial, conforme disposto no art. 866 do Código de Processo Civil. A penhora de recebíveis, pela mesma razão, exige cautela, pois interfere na capacidade econômico-financeira da empresa. A fim de resguardar a efetividade da medida judicial, evitando a realização de diligências inúteis, a exequente deve apresentar elementos indicativos que a empresa encontra-se em efetiva atividade, atuando no mercado e gerando faturamento. Ademais, entendo que a penhora de recebíveis está condicionada à demonstração prévia, pela interessada, da existência de vínculo comercial entre os executados e as empresas de cartão de crédito. 15. Consulta ao CRC-JUD (Central de Informações do Registro Civil) e penhora de bens em nome do cônjuge do executado É ônus da parte exequente diligenciar para identificar se e com quem a parte ré é casada, comprovando a data de início do vínculo conjugal, o regime de bens e se continuam casados ou em união estável, por meio da certidão de casamento ou escritura pública atualizada. A disposição do artigo 790, IV do CPC deve ser interpretada em consonância com o Código Civil e os princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa. Assim, em razão da previsão de bens excluídos da comunhão (Código Civil, artigos 1.659, 1.666, 1.668 e 1.674), cabe à parte exequente comprovar que aqueles que estão registrados exclusivamente em nome do cônjuge do(a) executado(a) estão sujeitos à meação e/ou à responder pela dívida executada. E a busca por tais informações deve ser realizada diretamente pela parte, sem a intervenção do Poder Judiciário, uma vez que, de regra, a parte exequente possui informação sobre o estado civil da parte executada, bem como tem condições de realizar buscas no DETRAN e Cartórios de Registro de Imóveis, ao menos. O uso dos sistemas conveniados para consulta e bloqueio de bens em nome de pessoa que não integra a lide, sem a demonstração de que tais bens existem e estão sujeitos à execução, configura interferência indevida na esfera jurídica de terceiro e inobservância do devido processo legal. Desta feita, para análise do pedido, é ônus do requerente comprovar que a parte executada permanece casada (e com quem), qual o regime de bens adotado e a quais são os bens em nome do cônjuge da parte executada que estão sujeitos à meação e/ou responder pelo débito executado. 16. Intimação da parte executada para indicação de bens passíveis de penhora Em regra, a determinação para que a parte executada indique bens penhoráveis consta da citação anteriormente encaminhada. Para deferimento do requerimento, deverá a parte exequente informar que a medida ainda não foi realizada, bem como indicar a utilidade da medida e a possibilidade desta surtir algum efeito. 17. Penhora de seguro de vida e/ou expedição de ofício para localização de contratos de consórcio O art. 833, inciso VI, do CPC estabelece a impenhorabilidade do seguro de vida, o que inviabiliza, a princípio, o requerimento. Há precedente do STJ (REsp nº 1919998/PR) que reconhece a possibilidade de penhora de valores excedentes a 40 (quarenta) salários mínimos que a parte executada recebeu como beneficiária do seguro de vida, ou seja, não tratou de penhora de seguro de vida. Ademais, o recebimento de valores de seguro de vida pela parte executada deve ser verificado e comprovado pela exequente, a quem compete o ônus de localizar bens penhoráveis. Por fim, as administradoras de consórcio estão abrangidas pelo sistema Sisbajud, de forma que não há necessidade de expedição de ofício para localização de contratos de consórcio em nome da parte executada. Assim, por ora, ficam indeferidos os requerimentos. 18. Intime-se a parte exequente da presente decisão, bem como de que futuros requerimentos idênticos aos já analisados, desacompanhados de indícios de alteração da situação patrimonial da parte executada e de justificativa da utilidade da medida, não serão analisados. No prazo de 15 (quinze) dias, deverá a parte exequente indicar bem específico para penhora, sob pena de suspensão do processo em razão da ausência de bens penhoráveis, nos termos do art. 921, inciso III, do CPC. Pois bem. 2. Da leitura da decisão agravada, depreende-se que o juízo de origem indeferiu a utilização do sistema SERP-JUD para pesquisa patrimonial. A utilização de sistemas eletrônicos pelo Judiciário, para localização de bens dos devedores passíveis de serem penhorados, concretiza o entendimento de que a execução deve atender o interesse do credor, a teor do art. 797 do Código de Processo Civil: Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados. Antes um procedimento de caráter excepcional, a penhora por meio de sistemas eletrônicos passou a constituir o meio prioritário para localização de bens e ativos do executado, inclusive obedecendo à ordem de preferência prevista no art. 835 do Código de Processo Civil. Os sistemas eletrônicos foram criados visando tornar mais efetivo o processo de execução, oportunizando ao Judiciário a obtenção de resultados ágeis e concretos. Nessa linha, esta 12ª Turma já se manifestou quanto à possibilidade de consulta a ferramentas análogas, como por exemplo, o SNIPER: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. TENTATIVAS DE LOCALIZAÇÃO DE BENS INFRUTÍFERAS. CONSULTA AO SISTEMA NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO PATRIMONIAL E RECUPERAÇÃO DE ATIVOS (SNIPER). PESQUISA DE BENS. POSSIBILIDADE. 1. A utilização de sistemas eletrônicos pelo Judiciário, para localização de bens dos devedores passíveis de serem penhorados, concretiza o entendimento de que a execução deve atender o interesse do credor, a teor do art. 797 do Código de Processo Civil. 2. Conforme considerações colhidas no site do Conselho Nacional de Justiça, o SNIPER (Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos) é uma solução tecnológica desenvolvida pelo Programa Justiça 4.0 que agiliza e facilita a investigação patrimonial para servidores, servidoras, magistrados e magistradas de todos os tribunais brasileiros integrados à Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ). (...) (TRF4, AG 5026046-83.2023.4.04.0000, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 23/08/2023) Quanto à utilização do SERP-JUD, este Tribunal já possui precedentes no sentido de que é viável a consulta do sistema: Veja-se: AGRAVO DE INSTRUMENTO. UTILIZAÇÃO DOS SISTEMAS INFORMATIZADOS PARA PESQUISA DE BENS DO EXECUTADO. SERP-JUD. POSSIBILIDADE. 1. O SERP-JUD, criado pela Lei 14.382/2022, permite o acesso aos serviços dos registros públicos brasileiros, como registro civil, registro de imóveis e registro de títulos e documentos e pessoas jurídicas. 2. Este Tribunal possui entendimento no sentido de que é viável a consulta do sistema SERP/JUD, quando as pesquisas aos demais sistemas (SISBAJUD, RENAJUD E INFOJUD, etc) restaram infrutíferas. 3. Agravo de instrumento provido. (TRF4, AG 5036464-46.2024.4.04.0000, 4ª Turma, Relator para Acórdão MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, julgado em 12/02/2025) PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SISTEMAS INFORMATIZADOS. SERP-JUD. UTILIZAÇÃO AUTORIZADA. 1. Com relação à utilização de sistemas informatizados colocados à disposição do Judiciário, como forma de melhor instrumentalizar a efetivação de penhora ou busca de bens dos devedores em processos de execução, com o art. 655-A do CPC/1973 (atual art. 854 do CPC de 2015) foi retirada da utilização de sistemas como INFOJUD, RENAJUD, SISBAJUD e SERP-JUD seu caráter excepcional. 2. Tais sistemas se constituem o meio por excelência para localização de bens, depósitos ou aplicações em instituições financeiras, sendo que estes, por sua vez, se encontram em primeiro lugar na ordem de preferência dos bens penhoráveis. 3. Agravo de instrumento provido para autorizar a pesquisa pelo sistema SERP-JUD. (TRF4, AG 5027436-54.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator para Acórdão ROGERIO FAVRETO, julgado em 11/02/2025) AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. SERP-JUD. LOCALIZAÇÃO DE BENS DO EXECUTADO. SISTEMA ELETRÔNICO DOS REGISTROS PÚBLICOS. POSSIBILIDADE. 1. O SERP-JUD foi instituído pela Lei 14.382/2022 e consiste em módulo exclusivo de acesso do Poder Judiciário e demais Órgãos da Administração Publica ao Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (Serp), com acesso instantâneo, seguro e facilitado aos serviços digitais já implementados pelos Cartórios de Registros do Brasil. 2. É com o uso sem resistência dos inovadores e ágeis sistemas de pesquisa de bens postos à disposição do Poder Judiciário que se poderá chegar à solução mais rápida e efetiva do processo de execução. 3. Agravo de instrumento provido. (TRF4, AG 5028016-84.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator para Acórdão LADEMIRO DORS FILHO, julgado em 17/12/2024) 3. No presente caso, tendo em vista as tentativas infrutíferas de pesquisas de bens do executado, deve ser reformada a decisão agravada para deferir o pedido de consulta ao sistema SERP-JUD. 4. Prequestionamento A fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, e considerando as Súmulas n° 282 e n° 356 do Supremo Tribunal Federal e n° 98 do Superior Tribunal de Justiça, dou por prequestionadas as disposições legais e constitucionais citadas pelas partes e esclareço que a presente decisão não as contraria ou nega vigência. Como destacado pelo Min. André Mendonça no julgamento do RE 1519307/SP, em 14/10/2024, a apresentação de embargos de declaração com intuito protelatório assoberba ilegitimamente a justiça, prejudicando a mais célere e efetiva prestação jurisdicional. A incidência da multa prevista no art. 1.026, §§ 2º a 4º, do CPC constitui, inclusive, dever da magistratura. Assim, saliento, desde já, que a oposição de embargos de declaração com a finalidade exclusiva de rediscutir a matéria aqui decidida estará sujeita à multa prevista no art. 1.026, § 2º, do CPC. Ante o exposto, dou provimento ao Agravo de Instrumento. Intimem-se. Nada sendo requerido, dê-se baixa na distribuição com as cautelas de estilo. (TRF4, AG 5014921-50.2025.4.04.0000, 12ª Turma , Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO , julgado em 21/05/2025)(grifou-se)
1.2
Assim,
indefiro
o pedido de utilização do sistema CNIB, pois a situação dos autos não está abrangida nas hipóteses legais previstas.
2.
Quanto ao
SNIPER
(SISTEMA NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO PATRIMONIAL E RECUPERAÇÃO DE ATIVOS):
2.1
Trata-se de expediente de uso restrito, que provoca a quebra e o acesso a dados sigilosos, inclusive de terceiros não executados, e é direcionado à investigação de complexas estruturas de blindagem, criadas via colocação artificial de bens em nome de terceiros (laranjas). Seu uso deve ser restrito, conforme a natureza do crédito (condenação penal, improbidade administrativa, ressarcimento do erário), não tendo espaço de aplicação, senão excepcionalmente, em execução de crédito bancário, com pedido baseado na mera falta de localização de bens penhoráveis, circunstância que longe está de, mesmo indiciariamente, indicar a possível existência de uma tal estrutura e de bens penhoráveis. Sobre o tema, confira-se notícia do CNJ: <https://www.cnj.jus.br/tecnologia-da-informacao-e-comunicacao/justica-4-0/sniper>
Como funciona o Sniper:
A ferramenta atua na solução de um dos principais gargalos processuais: a execução e o cumprimento de sentença, especialmente quando envolvem o pagamento de dívidas, devido à dificuldade de localizar bens e ativos. Antes do Sniper, a investigação patrimonial era um procedimento de alta complexidade que mobilizava uma equipe especializada no pedido e na análise de documentos e no acesso individualizado a bases de dados. Esse procedimento podia durar vários meses.
A partir do cruzamento de dados e informações de diferentes bases de dados, o
Sniper
destaca os
vínculos entre pessoas físicas e jurídicas de forma visual (no formato de graficos), permitindo identificar relações de interesse para processos judiciais de forma mais ágil e eficiente.
Para pleitear o uso da ferramenta, deve o exequente demonstrar, ainda que indiciariamente, a existência de bens penhoráveis, por exemplo por sinais exteriores de riqueza incompatíveis com uma situação econômico-financeira de penúria, formalizada na ausência de bens penhoráveis, o que não foi feito no caso em foco.
Fora de tais hipóteses, como ocorre no caso (execução de crédito bancário; pedido baseado na mera falta de localização de bens penhoráveis; inexistência de qualquer indício de bens penhoráveis e de uma estrutura de blindagem que os oculte dos registros públicos de bens aos quais a exequente tem acesso independentemente de intervenção judicial), a busca de bens, para efeito de indicação à penhora, é tarefa que compete ao exequente (CPC, art. 524, VII), e não ao Poder Judiciário, ao qual não cabe admitir a transferência indevida de atribuições, absorvendo-as e onerando o serviço cartorário.
2.2
Assim,
indefiro
o pedido.
3.
No tocante ao pedido de utilização do Sistema SERASAJUD, embora este Juízo esteja ciente do convênio firmado entre o Conselho Nacional de Justiça e o SERASA Experien para utilização do audido Sistema, entendo que, no caso concreto,
o próprio credor pode requerer administrativamente a inscrição do devedor no cadastro restritivo de crédito
, pois se trata de inadimplência em um contrato, razão pela qual desnecessária a via judicial.
3.1
Do contrário, poderá haver duplo cadastramento, o que, no meu entender, se mostra ilegal.
Assim, indefiro o pedido.
4.
Intime-se a Parte Exequente para que, no prazo de 15 dias, indique bens à penhora.
Não havendo bens penhoráveis, retorne-se ao arquivo, nos moldes do art.921, §4º, do CPC.
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Processo nº 5001901-93.2025.4.04.7112
ID: 331867870
Tribunal: TRF4
Órgão: 3ª Vara Federal de Canoas
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5001901-93.2025.4.04.7112
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
BRUNO MESKO DIAS
OAB/RS XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM Nº 5001901-93.2025.4.04.7112/RS
AUTOR
: GUIDO GASPAR NICOLINI
ADVOGADO(A)
: BRUNO MESKO DIAS (OAB RS072493)
DESPACHO/DECISÃO
Vistos em decisão de saneamento e organização.
Forte n…
PROCEDIMENTO COMUM Nº 5001901-93.2025.4.04.7112/RS
AUTOR
: GUIDO GASPAR NICOLINI
ADVOGADO(A)
: BRUNO MESKO DIAS (OAB RS072493)
DESPACHO/DECISÃO
Vistos em decisão de saneamento e organização.
Forte nos arts. 10 e 357 do CPC,
impõe-se delimitar algumas questões de fato e de direito com repercussão na atividade probatória, adotando-se, preliminarmente - e sujeito à retificação/complementação superveniente, de ofício ou por provocação das partes -, as premissas a seguir.
Inicialmente, em relação aos pedidos de designação de prova pericial,
Indefiro
, no presente estágio processual, o pedido de prova pericial requerida pela parte autora.
É que a desconstituição do formulário voltado à comprovação do tempo especial e/ou de outros registros das condições ambientais de trabalho é controvérsia afeta às feições da relação empregatícia e, portanto, matéria que extravasa o litígio travado com a Previdência Social (objeto litigioso do processo judicial previdenciário), sendo dirimível apenas pela Justiça do Trabalho, nos termos da norma de competência definida na Constituição Federal, art. 114, a quem caberá eventualmente, em ação declaratória (imprescritível), compelir o empregador a emitir os papeis que espelhem a concreta situação laboral, caso confirmada a inveracidade de seu conteúdo. É dizer, consoante já decidiu o TST, que
“se a causa de pedir (remota e próxima) e o pedido têm origem no contrato de trabalho e nas figuras de empregador e empregado, resta indubitável a competência material da Justiça do Trabalho para julgar o conflito, nos termos do art. 114, I, da Constituição Federal, ainda que se trate de obrigação acessória ao contrato de trabalho, qual seja a de o empregador fornecer documento para que o empregado se habilite junto ao INSS para solicitar benefício previdenciário”
; por outro lado
, “a obrigação de fazer imposta à reclamada é restrita à expedição de novo PPP, cabendo ao INSS decidir se a realidade laboral vivenciada pelo empregado dá ensejo à aposentadoria especial ou não”
(Tribunal Superior do Trabalho - AIRR - 116340-12.2006.5.03.0033 , Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, Data de Julgamento: 22/09/2010, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 01/10/2010), com o que se deslinda
o foco de eventual ação previdenciária perante a Justiça Federal: a revisão
(judicial review)
da postura da Autarquia Previdenciária dentro daquilo que a ela cabe
legalmente
avaliar, isto é, a aferição da satisfação dos pressupostos da aposentadoria especial com base na “realidade laboral vivenciada pelo empregado”
devidamente documentada
(preferencialmente no PPP)
. A respeito dessa temática, é elucidativa a leitura de alguns precedentes do TST e TRT4 (RS):
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO DENEGATÓRIA DE RECURSO DE REVISTA EM AÇÃO DECLARATÓRIA. RECLAMAÇÃO PLÚRIMA MOVIDA CONTRA O EMPREGADOR PARA APURAÇÃO TÉCNICA DE CONDIÇÕES AMBIENTAIS DE TRABALHO. RECURSO DO INSS. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL. AÇÃO DE NATUREZA NITIDAMENTE TRABALHISTA, E NÃO PREVIDENCIÁRIA. INGRESSO DO INSS NO FEITO, COMO MERO ASSISTENTE, QUE NÃO COMPORTA O DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA PARA A JUSTIÇA FEDERAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 109, I, DA CONSTITUIÇÃO, MERECENDO CONFIRMAÇÃO O DESPACHO AGRAVADO AO ENTENDER AUSENTES, NA HIPÓTESE, OS PRESSUPOSTOS DE CABIMENTO DO RECURSO DE REVISTA. O acórdão regional, ao proclamar que não estão em discussão aspectos técnicos acerca da viabilidade, ou não, para os autores, de aposentadorias especiais - esta, sim, uma questão previdenciária -, mas tão somente a obrigação patronal de reconhecer, a partir de verificação por perito do Juízo, condições ambientais nocivas de trabalho dos empregados para que eles possam, noutra esfera, -acionar o estudo acerca da viabilidade de aposentadorias especiais-, deixa clara a observância, no caso, dos limites jurisdicionais da competência trabalhista, não incidindo, portanto, em vulneração do art. 109, I, da Constituição.
Decisão que limitou-se a julgar cabível, no âmbito trabalhista, a apuração pericial das condições de trabalho e a emissão de formulário antes conhecido como DSS (DIRBEN) 8030, hoje, PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) para que, -aí sim ao leito da legislação previdenciária e em contraditório outro-, os trabalhadores venham a discutir a questão previdenciária daí resultante junto ao INSS
. Precedentes. Agravo de instrumento não provido. (AIRR - 60741-19.2005.5.03.0132 , Relator Juiz Convocado: Flávio Portinho Sirangelo, Data de Julgamento: 17/11/2010, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/11/2010)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. FORMULÁRIO PPP E LAUDO TÉCNICO CORRELATO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Nos termos do art. 114 da Constituição Federal,
compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, incluindo outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, inclusive o formulário PPP e laudo técnico correlato
, em razão da relação de emprego mantida pelo reclamante com a empregadora. Agravo conhecido e desprovido. (AIRR - 61240-87.2005.5.03.0007 , Relator Juiz Convocado: José Ronald Cavalcante Soares, Data de Julgamento: 01/11/2006, 6ª Turma, Data de Publicação: DJ 24/11/2006)
RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114, I, da CF/88. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PREENCHIMENTO DA GUIA PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO- PPP. trabalho sob condições de risco acentuado à saúde. produção de prova. A guia do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP - deve ser emitida pelo empregador e entregue ao empregado quando do rompimento do pacto laboral, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos exatos termos da legislação previdenciária, contendo a relação de todos os agentes nocivos químicos, físicos e biológicos e resultados de monitoração biológica durante todo o período trabalhado, em formulário próprio do INSS, com preenchimento de todos os campos (art. 58, parágrafos 1º a 4º, da Lei 8.213/1991, 68, §§ 2º e 6º, do Decreto 3.048/1999, 146 da IN 95/INSS-DC, alterada pela IN 99/INSS-DC e art. 195, § 2º, da CLT).
A produção de prova, para apuração ou não de labor em reais condições de risco acentuado à saúde e integridade física do trabalhador, mesmo para fazer prova junto ao INSS visando à obtenção da aposentadoria especial, por envolver relação de trabalho, é da competência desta Justiça Especializada, art. 114, I, da CF, e não da Justiça Federal
. Há precedentes. A mera entrega da PPP não impede que a Justiça do Trabalho proveja sobre a veracidade de seu conteúdo. Recurso de revista conhecido e provido. (RR-18400-18.2009.5.17.0012, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, 6ª Turma, DEJT 30/09/2011).
RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EMISSÃO DO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO. OBRIGAÇÃO TÍPICA DA RELAÇÃO DE TRABALHO. ARTIGO 114, I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.
O artigo 58, § 4º, da Lei nº 8.213/91, ao estipular que 'a empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento', impõe obrigação típica da relação de trabalho, ainda que tenha implicações previdenciárias; logo, trata-se de matéria abrangida pela competência da Justiça do Trabalho
. Recurso de revista provido. (RR-271000-52.2005.5.12.0031, Relator Ministro: Horácio Raymundo de Senna Pires, 3ª Turma, DEJT 18/03/2011).
RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. EMISSÃO DE PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP. NÃO INCIDÊNCIA.
Nos termos do §1º do artigo 11 da CLT, os prazos prescricionais atinentes ao direito de ação quanto a créditos resultantes das relações de trabalho, não se aplicam às ações que tenham por objeto anotações para fins de prova junto à Previdência Social
. Precedentes. Recurso de revista não conhecido." (RR-617-72.2010.5.03.0107, Relator Ministro: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento: 20/2/2013, 5ª Turma, Data de Publicação: 1/3/2013)
RECURSO DE REVISTA. 1. PRESCRIÇÃO. DECLARAÇÃO DE DIREITOS. COMPROVAÇÃO. PREVIDÊNCIA SOCIAL. ARTIGO 11, § 1º, DA CLT. O artigo 11, § 1º, da CLT declara a imprescritibilidade das ações que tenham como finalidade a obtenção de informações que devam ser fornecidas pelo empregador, ainda que, em seu conteúdo, comine-se a este a obrigação de fazer as anotações relevantes à condição de segurado ou entregar documento que contenha tais informações.
Nota-se, assim, que a imprescritibilidade a que se refere o dispositivo não se circunscreve às ações meramente declaratórias, mas abrange qualquer modalidade de ação que tenha como finalidade a certificação de situações fáticas necessárias à comprovação de algum direito junto à Previdência Social
, como ocorreu no presente caso. Precedentes. Recurso de revista não conhecido. (RR-1195-96.2010.5.03.0022, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 13/11/2012, 5ª Turma, Data de Publicação: 16/11/2012)
INTERVALO INTRAJORNADA. FRACIONAMENTO. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. INVALIDADE. (...) RETIFICAÇÃO DO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP.
INSALUBRIDADE APURADA EM JUÍZO
. 1. Nos termos do § 1º do artigo 58 da Lei n.º 8.213/91, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP é o documento pelo qual o trabalhador segurado faz prova junto ao INSS da sua exposição a agentes nocivos no desempenho de suas funções, de modo a ter jus à aposentadoria especial. Ainda segundo o referido dispositivo, a empresa ou seu preposto são os responsáveis pela emissão do referido documento atestando as condições especiais de trabalho, com base em laudo técnico de condições ambientais de trabalho. 2.
Diante disso, constatada em Juízo a existência de insalubridade nas condições de trabalho do empregado, é lícita a ordem de retificação do documento PPP pela empregadora, de modo a atender plenamente o comando do artigo 58, § 1º, da Lei n.º 8.213/91
. 3. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR - 352-95.2010.5.03.0034 , Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 22/05/2013, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/05/2013)
RECURSO DO RECLAMANTE. Competência da Justiça do Trabalho. Retificação do Perfil Profissiográfico Previdenciário. Atividade insalubre
.
A Justiça do Trabalho é competente para julgar demanda entre empregado e empregador, na qual aquele pretende obrigar este a expedir o documento PPP com as informações acerca da natureza insalubre de suas atividades
. Recurso provido neste item. Nulidade do processo. Cerceamento de defesa. Prova pericial. Local de trabalho desativado.
Perícia
em outro local. O fechamento do local de trabalho do reclamante é insuficiente para impedir a realização da
perícia
quando as mesmas atividades estiverem sendo realizadas pela reclamada em local diverso, configurando cerceamento de defesa o indeferimento da prova. Recurso provido neste tópico (TRT4 - PROCESSO: 0000896-33.2014.5.04.0352 RO, Rel. Des. Marcelo Gonçalves de Oliveira, j. 12/08/2015)
MEIO AMBIENTE DO TRABALHO. DEVER DE DOCUMENTAÇÃO AMBIENTAL DO EMPREGADOR. DIREITO DE INFORMAÇÃO DO TRABALHADOR. PRESUNÇÃO DE NEXO ENTRE O AGRAVO À SAÚDE DO TRABALHADOR E O SERVIÇO PRESTADO. 1.
Adocumentação da existência ou não de condições ambientais nocivas e de risco à saúde e à segurança do empregado incumbe ao empregador. Estas obrigações ambientais desdobram-se, em sede processual, no dever do empregador de demonstrar, nos autos, de forma cabal, o correto cumprimento das medidas preventivas e compensatórias adotadas no ambiente de trabalho, para evitar danos aos trabalhadores
. 2. Obrigatoriedade de fornecimento do PPP - perfil profissiográfico previdenciário pelas empresas, documento no qual devem constar todas as informações relativas ao empregado, a atividade que exerce, o agente nocivo ao qual está exposto, a intensidade e a concentração do agente, exames médicos clínicos, além de dados referentes à empresa. Inteligência do art. 157 da CLT, c/c art. 19, §1º, e art. 58, §4º, da Lei 8213/91, e NR 09, do MTE. (...) (PROCESSO: 0001122-68.2013.5.04.0030 RO, 2ª Turma, Rel. Des. Marcelo José Ferlin D’Ambroso, j. 27/08/2015)
A questão da delimitação das atribuições da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho, dentro do âmbito de suas competências constitucionais, foi bem analisada no primeiro precedente,
verbis:
[N]ão se verifica a vulneração do art. 109, I, da Constituição da República, sendo por demais evidente que não se trata, no caso, de ação de previdenciária, até porque nenhuma cominação foi postulada e, portanto, deferida, contra os interesses da autarquia da Previdência. O INSS, como ressalta o despacho agravado, foi admitido como mero assistente, sendo a ação de natureza nitidamente trabalhista, já que destinada à apuração do trabalho em ambiente nocivo. É incensurável, aliás, o acórdão regional, ao proclamar que
não estão aqui em discussão aspectos técnicos acerca da viabilidade, ou não, para os autores, de aposentadorias especiais – esta sim uma questão previdenciária -, mas tão somente a obrigação patronal de reconhecer as condições de trabalho desses empregados para que eles possam "acionar o estudo acerca da viabilidade de aposentadorias especiais, aí sim ao leito da legislação previdenciária e em contraditório outro"
, para concluir: "Certo é que, de acordo com as conclusões periciais, a Empresa se obriga a fornecer o que era antes conhecido como DSS (DIRBEN) 8030, hoje, PPP" (fl. 82 – esclareço: Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP).
Como se vê,
não há como atinar pela alegada afronta à competência da Justiça Federal, esta prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, já que a ação, destinada a elucidar as condições de trabalho e obter o direito dos empregados à declaração patronal acerca dessas condições, é nitidamente trabalhista
.
É da competência da Justiça do Trabalho conhecer das condições laborais do empregado, para fins de emissão pela empresa do formulário DIRBEN-8030 (ou, em outros momentos, dos formulários SB-40, DSS-8030 e PPP)
. Conforme bem esclareceu o Tribunal
a quo
, a questão disposta na pretensão inicial tem origem no ambiente de trabalho, cuidando a espécie de declaração da realidade funcional, para se determinar à empresa o cumprimento da formalidade que lhe diz respeito, para que, munido desta documentação, possa o trabalhador pleitear junto ao órgão previdenciário estatal a averbação do tempo de serviço para o cálculo da aposentadoria especial
.
Não suficiente, a constatação de que os dados do PPP não se revestem de veracidade ou fidedignidade tem repercussões administrativas (art. 58, par. 3º, da Lei de Benefícios c/c 68, par. 2º, do Decreto n. 3.048/99), trabalhistas (art. 192 da CLT - adicional de insalubridade), tributárias (art. 22, II, da Lei nº. 8.212/91 - adicional de contribuição previdenciária) e penais (arts. 297 e 299 do Código Penal – crimes de falsificação de documento público e falsidade ideológica), razão por que, salvo impossibilidade, a correção dependeria da ciência e da oportunidade de participação do empregador, em nome do contraditório, da ampla defesa e da isonomia. A propósito, observe-se que é dever da empresa, em situação cadastral ativa, fornecer os documentos relativos às condições de trabalho do(a) segurado(a), nos termos dos arts. 58, §3º e 4º, e 133 da Lei n. 8.213/91, sob pena de multa:
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei
.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento.
Perante a Justiça Federal (assim como perante o INSS), poderá ser contestado o PPP ou alguma demonstração ambiental da empresa apenas por meio de prova preconstituída
oriunda da Justiça do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Previdência Social e do Ministério Público do Trabalho
ou
derivada do próprio estabelecimento empresarial
, impugnando-se, por exemplo, (a) a
regularidade do PPP
por meio da comprovação de que contém informações contrárias ou conflitantes com o laudo no qual se embasa, hipótese em que,
se viável, será aplicado o respectivo LTCAT ou PPRA
, ou (b) a
regularidade do próprio LTCAT ou
PPRA
por meio da apresentação de outras demonstrações ambientais pertinentes à própria empresa que contradigam o seu teor, inclusive as constantes em laudos técnico-periciais realizados no mesmo estabelecimento emitidos por determinação da JT, do MTPS ou do MPT (NR-15, itens 15.5, 15.6 e 15.7), ou ainda em ação judiciais pretéritas, que
serão substitutivamente utilizados no foro previdenciário
, sem prejuízo de eventual representação para os fins de apuração da responsabilidade civil, administrativa, fiscal e criminal cabível.
Apenas se for verificada omissão ou contradição insuperável nos registros ambientais da empresa capaz de impedir que se chegue a conclusão (
favorável
ou
desfavorável)
ao enquadramento da especialidade
é que se poderá lançar mão dos
meios de prova subsidiários
(na forma dos arts. 443, II, quanto à
prova testemunhal
, 464, par. 1º, II,
a contrario
sensu, quanto à
pericial
, ambos do CPC), na linha, aliás, do autorizado à própria Autarquia Previdenciária, no processo administrativo, quando exigida a sua atuação fiscalizatória para
confirmação das informações contidas no PPP ou nos demais registros ambientais por meio da inspeção no local de trabalho e/ou da oitiva de testemunhas
(arts. 68, par. 7º, 142-151, e 225, III, do Decreto nº 3.048/99; arts. 298, 574-600 e 686, da IN INSS/PRES nº 77/2015).
Logo, sobretudo quando estão disponíveis o
PPP regular e/ou os registros ambientais da empresa completos. íntegros e coerentes
, é descabida a realização de
perícia
, seja na esfera administrativa, seja ao longo da instrução do processo judicial previdenciário, restando assente que apenas quando houver
"dúvida sobre a fidedignidade ou suficiência de tal documentação é plausível a produção de laudo pericial em juízo"
(TRF4, AC 5011892-11.2016.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 15/12/2020).
1) Quanto ao período rural de 06/01/1970 a 06/01/1977:
Intime-se
a parte autora para,
em 30 (trinta) dias
, complementar a documentação constante nos autos, apresentando todo e qualquer elemento que possa servir de início de prova material para o(s) período(s) pleiteado(s) (ex: matrícula da propriedade, guias pagas de ITR, certidão ou cadastro INCRA);
2) Quanto aos períodos abaixo:
Momentum Engenharia LTDA
Período:
24/01/1979 a 20/03/1979
Cargo/função:
Ajudante de eletricista (
evento 1, PROCADM8, p. 25
)
Provas:
DSS-8030/PPP
Laudo Técnico
Laudo Similar/ empresa inativa
evento 1, PROCADM12, p. 57
O autor deverá comprovar documentalmente que trabalhava nas dependências da REFAP conforme alegado na inicial.
Outros docs.
Audiência
Empresa brasileira de Telecomunicações S.A. – Embratel
Período:
25/11/1993 a 19/07/2000
02/01/2001 a 08/01/2015
Cargo/função:
De 25/11/1993 a 19/07/2000: Técnico Telecomunicações (
evento 1, PROCADM8, p. 32
)
De 02/01/2001 a 08/01/2015: NÃO COMPROVADO
Provas:
DSS-8030/PPP
NÃO APRESENTADO
Laudo Técnico
NÃO APRESENTADO
Laudo Similar/ empresa inativa
comprovante de inatividade:
evento 1, PROCADM8, p. 80
A empresa foi incorporada, cabendo ao autor diligenciar na busca da documentação comprobatória da especialidade junto à Sucessora, encargo que não se desincumbiu.
Outros docs.
Audiência
Intime-se a parte autora para providenciar, junto à(s) empregadora(s):
(a)
PPP regular e completo
, preenchido com a descrição das funções/atividades exercidas durante o(s) período em que laborou na(s) empresa(s) e dos fatores de risco, bem como com a indicação do responsável pelos registros ambientais, devendo conter nome, cargo e NIT do responsável pela assinatura do documento e o carimbo da empresa (ou declaração da empresa informando que o responsável pela assinatura do PPP está autorizado a assinar o documento) - em caso de ausência de registros ambientais contemporâneos à prestação do trabalho, deverão ser utilizados os dados extraídos do(s) documento(s) referentes à época mais próxima ou, subsidiariamente, do(s) documento(s) atual(is), indicando-se, no campo dedicado à designação do responsável, o período de vigência do documento que lastreou o preenchimento;
ou, caso não logre obtê-lo,
(b) Cópia do
Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) e/ou
Programa(s) de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA)
que contenha(m) a avaliação da exposição a fatores de risco,
sendo facultada, quando inexistentes avaliações da época da prestação do trabalho, a apresentação de laudos extemporâneos (preferencialmente mais próximos de quando desempenhado o labor), desde que contenham informações pertinentes à mesma função/atividade desempenhada pelo requerente ou, caso não exista, à função/cargo equivalente
; e
(c)
Cópias dos registros do fornecimento de EPI (
livros, fichas ou sistema eletrônico), para o período posterior a 03/12/1998.
Em caso de eventual negativa de fornecimento do(s) documento(s) acima referido(a) por parte da(s) empresa(s),
serve a presente decisão como ofício, cuja cópia deverá ser obrigatoriamente encaminhada pela parte autora à(s) empresa(s)
, podendo a sua autenticidade ser aferida no
site
https://eproc.jfrs.jus.br/eprocV2/
na opção Consulta Pública (processo acima referido).
⇒
Para a PARTE AUTORA
:
O prazo para a juntada nos autos dos documentos que lhe forem diretamente entregues ou, em caso de negativa, do comprovante de recebimento pela empresa desta decisão/ofício é de
15 (quinze) dias
, atentando-se para o fato de que a
simples juntada de cópia de email ou da comprovação do recebimento da carta AR no endereço da empresa não evidencia a cientificação
, razão pela qual cabe ser comprovado o efetivo protocolo desta decisão/ofício junto à(s) empregadora(s),
devidamente carimbado e constando o CNPJ e assinatura do representante legal da empresa.
⇒
Para a EMPRESA
:
O prazo para encaminhar o(s) documento(s) requisitados é de
15 (quinze) dias
a partir da comprovação do recebimento, devendo ser enviado(s) diretamente a esta Vara Federal,
por meio eletrônico
, no endereço
rscan03sec@jfrs.jus.br
.
Fica cientificado o diretor ou administrador responsável da(s) empresa(s) destinatárias que:
(a) A utilização do(s) documento(s) terá
finalidade
exclusivamente
previdenciária
;
(b) O(s) documento(s) é/são de apresentação
obrigatória
, conforme o art. 378 (
“Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade”
) c/c os arts. 380, II, (
Incumbe ao terceiro, em relação a qualquer causa: (...) II - exibir coisa ou documento que esteja em seu poder
), do Novo Código de Processo Civil (CPC), advertindo-se que, por força dos arts. 58, par. 3º, da Lei n. 8.213/01 e 68, par. 6º, do Decreto n. 3.048/99,
“a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita às penalidades previstas na legislação”
; e
(c) Caso não apresentado o documento, será determinada a sua
busca e apreensão
, nos termos do art. art. 380, par. único, do CPC, podendo, na hipótese de
insucesso da medida, ser designada perícia judicial no estabelecimento
, cujas conclusões, se constatados indícios de que os registros ambientais da empresa disponíveis não se revestem de veracidade ou fidedignidade, serão encaminhadas à Delegacia Regional do Trabalho (DRT) e ao Ministério Público do Trabalho (MPT), de acordo com os arts. 154, 156, I-III, 157, 160, par. 1º, 189, 192 e 200, I-VII, da CLT, bem com ao Ministério Público Federal (MPF), a fim de que sejam apuradas as infrações administrativas (art. 58, par. 3º, da Lei de Benefícios), trabalhistas (art. 192 da CLT), tributárias (art. 22, II, da Lei nº. 8.212/91) e penais (arts. 297 e 299 do Código Penal).
Comprovando, o(a) autor(a), que a(s) empresa(s) encontra(m)-se ativa(s) e, não sendo fornecidos os documentos por parte do empregador, deverá a parte comprovar que diligenciou junto à(s) empresa(s), apresentando, neste caso, CNPJ, endereço atualizado, inclusive o eletrônico, e telefone para contato, situação na qual Determino que se diligencie na busca da documentação acima especificada, por meio eletrônico (
E-mail
) ou expedição de cartas
AR VPost
à(s) empresa(s), nos prazos anteriormente mencionados;
Por fim,
frustradas todas as tentativas de obtenção dos documentos, conforme as determinações acima, ou no caso de ficar comprovado que a(s) empresa(s) está(ão) inativa(s) ou ainda em local incerto e de difícil acesso, deverá(ão) ser apresentado(s) pela parte autora no prazo de intimação e cumulativamente:
(a)
Prova documental (ou início de prova material, a ser confirmado por prova testemunhal) do cargo/atividade/função desempenhado pelo segurado
(a exemplo de registro em CTPS, contrato de trabalho, recibos de pagamento ou outro referencial escrito, em que não poderá haver tão-somente alusão genérica à atuação como "serviços gerais", "auxiliar" etc.); e
(b)
Laudo de condições ambientais de trabalho referente à empresa baixada e, na sua falta, relativo à empresa similar, que deverá ser necessariamente trazido ao feito pela parte autora
, este último utilizado subsidiariamente e desde que contemple a mesma função desempenhada na empresa extinta e informações acerca do setor em que desempenhado o labor e/ou o equipamento manuseado, de modo a propiciar a verificação da correlação entre a sua profissão, cargo ou especialidade e a atividade avaliada pela empresa-paradigma (similaridade das empresas deve ser tanto em relação às atividades, como ao porte dos empreendimentos e à função do empregado).
3) Quanto aos períodos abaixo:
PSE Seleção e Locação de Mão de Obra Adm. LTDA
Período:
26/01/1988 a 26/12/1989
Cargo/função:
Aux. Téc. telecomunicações (
evento 1, PROCADM8, p. 29
)
Provas:
DSS-8030/PPP
Laudo Técnico
Laudo Similar/ empresa inativa
evento 1, PROCADM9, p. 20
evento 1, PROCADM9, p. 64
evento 1, LAUDO43
comprovante de inatividade||:
evento 1, PROCADM8, p. 70
Os laudos apresentados não contemplam atividade de Técnico em Telecomunicações.
Outros docs.
Audiência
Mayra Serviços Empresariais LTDA
Período:
27/12/1989 a 05/05/1992
Cargo/função:
Auxiliar Técnico em telecomunicações (
evento 1, PROCADM8, p. 31
)
Provas:
DSS-8030/PPP
Laudo Técnico
Laudo Similar/ empresa inativa
evento 1, PROCADM9, p. 20
evento 1, PROCADM9, p. 64
evento 1, LAUDO43
comprovante de inatividade:
evento 1, PROCADM8, p. 71
Os laudos apresentados não contemplam atividade de Técnico em Telecomunicações.
Outros docs.
Audiência
Embras-Empresa Brasileira de Eng. Projetos e Representações LTDA
Período:
06/05/1992 a 24/11/1993
Cargo/função:
Auxiliar Técnico em telecomunicações (
evento 1, PROCADM8, p. 31
)
Provas:
DSS-8030/PPP
Laudo Técnico
Laudo Similar/ empresa inativa
evento 1, PROCADM9, p. 20
evento 1, PROCADM9, p. 64
evento 1, LAUDO43
comprovante de inatividade:
evento 1, PROCADM8, p. 78
Os laudos apresentados não contemplam atividade de Técnico em Telecomunicações.
Outros docs.
Audiência
Global Village Telecom S.A.
Período:
24/07/2000 a 02/01/2001
Cargo/função:
Técnico em telecomunicações (
evento 1, PROCADM8, p. 33
)
Provas:
DSS-8030/PPP
evento 1, PROCADM8, p. 81
Laudo Técnico
Laudo Similar/ empresa inativa
evento 1, PROCADM9, p. 20
evento 1, PROCADM9, p. 64
evento 1, LAUDO43
comprovante de inatividade:
evento 1, PROCADM8, p. 71
Os laudos apresentados não contemplam atividade de Técnico em Telecomunicações.
Outros docs.
Audiência
Considerando que a(s) empresa(s) está(ão) inativa(s), entendo ser possível a produção de provas por similaridade, facultando à parte autora, no prazo de
15 (quinze) dias
, a juntada aos autos de
laudo similar
E
a apresentação de documentos que permitam enquadrar o cargo/atividade/função na(s) situação(ões) avaliadas tecnicamente na empresa-paradigma
.
Destaque-se que, conforme Resolução nº 7/2018, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, está disponível o Banco de Laudos Técnicos Periciais das Condições Ambientais do Trabalho, cuja consulta pode ser realizada por meio do
eproc
, no menu "Gerenciamento de Laudos".
Esclarece-se, desde já, que toda a prova por similaridade deve respeitar,
sob pena de invalidação da mesma,
as semelhanças entre o ramo de atividade da empresa inativa com o da empresa que exarou o documento, idem quanto ao porte entre ambas as empresas e quanto à profissão desempenhada pela parte autora na empresa inativa com a profissão a que se refere o laudo apresentado. Por isso mesmo, e em obediência ao disposto nos arts. 55, par. 3º, da Lei n. 8.213/91 e 444, do CPC, o socorro a tal expediente depende da existência de
prova documental (ou início de prova material, confirmado por prova testemunhal) do cargo/atividade/função desempenhado pelo segurado
(a exemplo de registro em CTPS, contrato de trabalho, recibos de pagamento ou outro referencial escrito, em que não poderá haver tão-somente alusão genérica à atuação como "serviços gerais", "auxiliar" etc.)
, que necessariamente integrar o caderno processual por iniciativa da parte autora.
Desta forma,
cabe rejeitar o pedido de realização de perícia técnica por semelhança
ao menos até o aparecimento de evidências de que não é possível a juntada de provas conclusivas da especialidade (ou não) do labor, frisando-se que tal meio de prova apresenta natureza excepcional, uma vez que implica custos ao Poder Judiciário (dado que a parte autora é beneficiária da gratuidade da justiça) e desatende, em sua maioria, os pressupostos de cabimento da medida –
a efetiva dependência de conhecimento técnico
para a prova do fato alegado, a
necessidade
(em vista das demais provas produzidas) e a
viabilidade de reconstituição
das condições ambientais (art. 464 do CPC).
Juntados os documentos, dê-se vista às partes pelo
prazo de 15 (quinze) dias
.
Intimem-se.
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Processo nº 5022049-24.2025.4.04.0000
ID: 329080261
Tribunal: TRF4
Órgão: SECRETARIA DA 7a. TURMA
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 5022049-24.2025.4.04.0000
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VANESSA DAS NEVES PICOUTO
OAB/PR XXXXXX
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Habeas Corpus Nº 5022049-24.2025.4.04.0000/PR
PACIENTE/IMPETRANTE
: DANIEL KENZO KOMIYAMA
ADVOGADO(A)
: VANESSA DAS NEVES PICOUTO (OAB PR034728)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de
habeas corpus
, com pedi…
Habeas Corpus Nº 5022049-24.2025.4.04.0000/PR
PACIENTE/IMPETRANTE
: DANIEL KENZO KOMIYAMA
ADVOGADO(A)
: VANESSA DAS NEVES PICOUTO (OAB PR034728)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de
habeas corpus
, com pedido liminar, impetrado em favor de
DANIEL KENZO KOMIYAMA
contra decisão do Juízo Federal da 3ª Vara Federal de Foz de Iguaçu/PR que, nos autos da Ação Penal nº 50139481220234047002, indeferiu pedido de produção de provas consistentes no acesso aos elementos da negociação do ANPP do corréu Diogo Conti, alegando cerceamento de defesa (
processo 5013948-12.2023.4.04.7002/PR, evento 237, DESPADEC1
e
evento 284, DESPADEC1
).
Sustenta a defesa, em síntese, que o Acordo de Não Persecução Penal homologado padece de ilegalidade, pois teria o Ministério Público Federal feito alterações nos termos do acordo de modo a obter delação premiada às avessas, obrigando o corréu Diogo a comparecer em audiência e circunstanciar os fatos contra o paciente, motivo pelo qual foi solicitado pela defesa o acesso pormenorizado dos elementos de negociação. Alega que sem esta diligência complementar, há prejuízo manifesto à defesa que ficará impedida de fiscalizar a legalidade das tratativas e a contextualização do depoimento de Diego como informante, configurando cerceamento de defesa.
Por fim, aduz que sequer deveria ter sido permitida a oitiva de Diego como informante, pois terminantemente vedada pelo sistema processual penal, uma vez que transmuta a figura do acusado em uma fonte de prova.
Requer a concessão de liminar para suspender o trâmite da ação penal e, no mérito, que seja concedida a ordem de habeas corpus para reconhecer a nulidade absoluta da oitiva de Diego Conti como informante, determinando-se seu desentranhamento e de todos os autos que dela derivem. Subsidiariamente, postula a declaração de nulidade da decisão que indeferiu o acesso aos aos elementos da negociação do ANPP do corréu Diogo Conti.
É o relatório.
Decido
.
A decisão impugnada foi proferida nos seguintes termos (
processo 5013948-12.2023.4.04.7002/PR, evento 237, DESPADEC1
):
(...)
4.1.
Pleito sobre ANPP de Diogo Conti
A Defesa constituída pelo réu
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a intimação do Ministério Público Federal para apresentar as gravações em vídeo das reuniões de negociação do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) envolvendo o informante
Diogo Conti
, alegando que apenas uma das três inexistentes foi disponilizada); a juntada de todos os e-mails enviados/recebidos sobre as tratativas (especialmente um
e-mail
encaminhado pelo assessor Arion em 05/02/2025) e todas as propostas de acordo formuladas durante as negociações do referido ANPP, para fins de instrução e análise no processo. A Defesa argumentou que tais elementos são cruciais para elucidar a regularidade, voluntariedade e lisura das tratativas, bem como para o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, impedindo a fiscalização da legalidade das tratativas e a contextualização do depoimento do informante.
O MPF rechaçou veementemente a pretensão defensiva, alegando que o ANPP é um instrumento de justiça penal consensual e personalíssimo, cuja celebração é ato privativo do Ministério Público e do investigado. Afirmou que a voluntariedade na adesão ao ANPP foi devidamente homologada em juízo, tornando-se ato jurídico perfeito e acabado; que as informações já são públicas e a disponibilização das mídias/e-mails representaria ingerência indevida e desnecessária, além de quebra de sigilo de informações que não guardam pertinência com a prova dos fatos imputados aos réus. O MPF sustentou que o pedido é protelatório e desvirtua a finalidade do art. 402 do CPP.
O Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), conforme introduzido pela Lei nº 13.964/2019, configura-se como um instrumento de justiça penal consensual. Suas negociações, por sua própria natureza e finalidade de estimular a autocomposição e a celeridade processual, são revestidas de um grau de confidencialidade que visa proteger a liberdade de diálogo entre o Ministério Público e o investigado.
A exposição indiscriminada dos detalhes das tratativas, das propostas iniciais e das comunicações intermediárias – que podem envolver estratégias, ponderações e até admissões preliminares não finalísticas – poderia inviabilizar ou desestimular a celebração de futuros acordos, comprometendo a efetividade desse importante mecanismo de desjudicialização penal. A preocupação do Ministério Público Federal com a "indevida quebra de sigilo de informações" é, portanto, legítima e amparada na necessidade de preservar a funcionalidade e a autonomia do instituto.
O ANPP de
Diogo Conti
foi devidamente homologado pelo juízo nos autos nº 5012848-85.2024.4.04.7002 - Ev. 31). A homologação judicial pressupõe a análise da legalidade e, crucialmente, da voluntariedade do investigado em aderir aos termos propostos. Além disso,
Diogo Conti
foi ouvido no presente processo (Autos nº 5013948-12.2023.4.04.7002 - evento 224, VÍDEOS 12 e 13) na condição de informante, depreendendo-se de suas declarações a espontaneidade e livre vontade de celebrar o acordo com o Ministério Público Federal. Ele, inclusive, esclareceu que trocou de advogado porque o anterior não aceitou o acordo, uma vez que ele "
queria muito fazer o acordo"
e
"precisava pensar em mim"
, pois o advogado anterior
"entendeu que poderia prejudicar os as outras pessoas que ele também estava defendendo
". Tais declarações, colhidas em audiência e submetidas ao contraditório, reforçam a higidez do ato praticado por
Diogo Conti
.
Importante relembrar, consoante aduzido pelo
Parquet
Federal na manifestação do evento 235, que "
a valoração de tal depoimento o, bem como de todas as provas, cabe ao E. Juízo, no exercício do princípio do livre convencimento motivado (...)",
o que certamente será realizado por este magistrado no momento sentencial.
Dessa maneira, considerando o teor do procedimento nº 5012848-85.2024.4.04.7002 e o teor das declarações prestadas pelo informante
Diogo Conti
nos presentes autos, especialmente no tocante à espontaneidade e voluntariedade em firmar o acordo de não persecução penal, bem como considerando que as declarações do referido informante foram submetidas ao regular contraditório por todas as partes, não vislumbro necessidade e tampouco adequação na providência requerida pela Defesa, razão pela qual
indefiro o pleito formulado no item 1 da petição do evento 232
.
4.2.
Pedido de esclarecimentos sobre a extração das gravações de vídeo utilizadas como prova emprestada do PAD
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a expedição de ofício à Corregedoria da PRF para que apresente documentação detalhada sobre o histórico de manuseio dos dispositivos e mídias das gravações de vídeo acostadas ao procedimento administrativo e utilizadas como prova emprestada, em especial do
vídeo 29009156
(gravação da entrevista da equipe BDCOR com o Sr. Elienai Xavier, realizada em 23/04/2020); dos vídeos sequenciais
25530538 e 25530677
(possível encontro entre CONTI e KENZO próximo à pizzaria do Onofre); do vídeo
25672137
(imagens de câmera com a suposta passagem da viatura CRUZE BDH-6F23 e do Honda Civic) e do vídeo
25536440
(gravação da abordagem em frente à empresa TAJMILI), incluindo identificação dos responsáveis por cada etapa, registro do percurso e tratamento da mídia de destino, condições de armazenamento, descrição do equipamento utilizado (marca, modelo, número de série do DVR/NVR, sistema operacional e firmware), data/hora e método de extração, existência de logs, cálculos de hashes criptográficos (MD5, SHA-1, SHA-256), formato dos arquivos, autorizações formais e eventual termo de consentimento do entrevistado Elienai Xavier.
A Defesa aduziu que
existem incertezas graves
que recaem sobre a autenticidade e integridade das referidas provas digitais, emprestadas ao Processo Administrativo Disciplinar, de maneira que haveria dúvidas quanto à legalidade da colheita de tais elementos, sustentando que a diligência é necessária para afastar eventuais alegações de irregularidade, adulteração ou quebra de integridade. Alegou, ademais, que quando há compartilhamento de informações a pedido da Corregedoria ao Ministério Público Federal, a correta documentação do histórico de manuseio das provas digitais é imprescindível para assegurar a autenticidade e integridade, nos termos do artigo 158-A e 158-B, ambos do CPP, que seriam aplicáveis subsidiariamente ao processo administrativo sancionador.
O MPF se opôs à aplicação das exigências de "cadeia de custódia" dos moldes do Código de Processo Penal (art. 158-A do CPP) a provas originárias de Processo Administrativo Disciplinar (PAD). Argumentou que tais provas, ao serem trasladadas para o processo penal, adquirem natureza de prova emprestada documental, e sua validade é aferida pela regularidade de sua produção no âmbito administrativo (observância do contraditório e ampla defesa administrativa), que foram plenamente respeitados no PAD em questão. A ausência da cadeia de custódia criminal não as invalida. O MPF reiterou que os documentos relevantes já foram acostados e devem ser analisados pela sua natureza documental. Considerou, por fim, que se trata de pedido protelatório da defesa.
Decido.
Imperioso salientar que a aplicação irrestrita do regramento da cadeia de custódia, tal qual estabelecido na Lei Processual Penal, ao processo administrativo disciplinar (PAD) não se coaduna com a natureza e finalidade deste último. Enquanto o processo penal busca a aplicação da sanção criminal, com um regime probatório rigoroso e garantias robustas devido à gravidade das penas, o PAD visa a apuração de infrações administrativas e a aplicação de sanções disciplinares, com rito e finalidades distintas.
A cadeia de custódia, no âmbito criminal, é essencial para assegurar a integridade e autenticidade da prova material, minimizando riscos de contaminação, adulteração ou extravio, elementos cruciais para a formação da convicção do juiz e para evitar nulidades. As obras de autores como
Geraldo Prado e Aury Lopes Jr. destacam a importância dessas garantias no processo penal, onde a privação da liberdade está em jogo.
No entanto, transpor esse rigor para o PAD seria desconsiderar que as provas produzidas em sede administrativa devem ser regidas pela lei específica que disciplina o rito disciplinar de cada esfera (federal, estadual ou municipal), que já prevê mecanismos próprios para a validade e valoração da prova. Tais legislações, ao tratarem do PAD, geralmente priorizam a celeridade e a efetividade na apuração dos fatos, sem, contudo, abrir mão do contraditório e da ampla defesa.
Quando há a necessidade de empréstimo de provas produzidas no PAD para o processo criminal, a sua validade e admissibilidade não dependem da observância prévia da cadeia de custódia penal em sede administrativa. O que se exige, para que tais provas sejam utilizadas no âmbito criminal, é que elas sejam submetidas ao contraditório e à ampla defesa no próprio processo penal. Isso significa que deve ser garantido às partes a oportunidade de contestar, analisar e produzir contraprovas sobre o material probatório originado no PAD, garantindo a validade jurídica da prova no contexto criminal. Exigir o rito da cadeia de custódia penal no PAD seria um excesso formalista que desvirtuaria a natureza e os objetivos do processo administrativo.
Além disso, analisado os autos da íntegra do processo PAD/SEI 08659.016819/2020-18 através do
link
de acesso fornecido pela Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal no evento 159, depreende-se que:
a)
segundo o depoimento prestado por
Fabio Henrique Meurer Wasilewski,
o referido inspetor, ao ser inquirido no âmbito do referido PAD, pelo Presidente
Sérgio Brasil Silva
, respondeu que o primeiro contato que tiveram com Elienai Xavier, no dia 23/04/2020, foi foi filmado com
celular por Leandro
, tendo explicado:
"nós filmamos para respaldar a nossa ação e para mostrar a transparência no trabalho
". Declarou, ademais, que foi perguntado se Elienai Xavier se importava com a filmagem e ele respondeu que
não se importava
, sendo que a filmagem começou após a autorização. O depoente
Fabio Henrique Meurer Wasilewski
confirmou que possuía a gravação e poderia fornecê-la ao colegiado (28961254, 28955821). Consta dos autos do PAD um
email
dirigido por Sérgio Brasil Silva a
Fabio Henrique Meurer Wasilewski
(29003559)
e, na sequência, a juntada do vídeo SEI 29009156.
b)
segundo o teor do Termo de Diligências (documento SEI 25529848, assinado pelos PRFs
Cleandro da Silva Padilha
e
Fabio Henrique Meurer Wasilewski),
os vídeos 255300538 e 25530677 tratam das imagens cedidas pelo proprietário da
Pizzaria do Onofre
, captadas pela câmera da casa anexa à referida pizzaria, que fica localizada na esquina da
Rua Ipatinga com a Rua Consuelo
.
c)
O documento SEI 25672137 trata de um Termo de Diligências por meio do qual os Policiais Rodoviários Federais
Cleandro da Silva Padilha
e
Fábio Henrique Meurer Wasileski
descreveram as diligências realizadas para
Identificação do veículo e do PRF que aparece no encontro com o PRF Conti
, constantes do documento SEI 25529848 e vídeos 25530538 e 25530677. Segundo consta do referido Termo de Diligências, o vídeo juntado pelo evento SEI 256412221 trata-se da gravação de uma câmera de vigilância de uma residência localizada
"Rua Consuelo, número 1705",
obtido com autorização do morador.
d)
O documento SEI 25536440 trata-se de um Termo de Diligências por meio do qual os os Policiais Rodoviários Federais
Cleandro da Silva Padilha
e
Fábio Henrique Meurer Wasileski
descreveram as diligências que realizaram no local onde Elienai Xavier declarou ter sido abordado na marginal da Rodovia BR 277 em frente ao Posto Idaza; que nas imediações desse local verificaram a existência de
câmera de vigilância na empresa TAJMILI
,
localizada às margens da rodovia BR 277, na Rua Adolpho Lollato, 3996 - Área Industrial - Santa Terezinha do Itaipu
, sendo que as imagens gravadas no evento SEI 25536372 tratam-se das imagens da referida câmera, obtida "após autorização dos responsáveis pela empresa TAJMILI"
Assim, deve-se concluir pela desnecessidade da diligência para fins de verificar a existência de comunicação prévia da gravação do depoimento ou Termo de Consentimento ou ainda manifestação de ciência do entrevistado Elienai Xavier, objetivadas pela Defesa, pois consta do próprio vídeo SEI 29009156 que foi indagado a
Elienai Xavier
se este
se importava de ser filmado
, ao que respondeu: "
não, eu não me importo"
(vídeo SEI 29009156).
Além disso, depreendem-se dos autos de PAD que se trata de vídeo realizado pelo
aparelho celular de Cleandro
[Cleandro da Silva Padilha]; o qual foi fornecido por
Fabio Henrique Meurer Walileski por solicitação do
Presidente do PAD.
Quanto aos vídeos 255300538 e 25530677, depreende-se do PAD nº 08659.016819/2020-18 que as imagens foram obtidas pela equipe de policiais rodoviários federais
Fabio Henrique Meurer Walileski e Cleandro da Silva Padilha
, no âmbito de investigações preliminares, tendo sido fornecidas, respectivamente, pelo proprietário da
Pizzaria do Onofre
, localizada na esquina da Rua Ipatinga com a Rua Consuelo; pelo proprietário de uma residência localizada na Rua Consuelo, nº 1705 e pelos responsáveis pela empresa TAJMILI, localizada na Rua Adolpho Lollato, 3996 - Área Industrial - Santa Terezinha do Itaipu e que, embora não tenham sido qualificados nos autos do PAD, são pessoas plenamente identificáveis.
Deve-se pontuar, inclusive, que os Termos de Diligências e os respectivos vídeos já estavam juntados ao processo SEI nº 08659.016819/2020-18 quando do oferecimento da denúncia nos presentes autos e, consequentemente, quando da apresentação da defesa prévia pelo denunciado
Daniel Kenzo Komiyama
(evento 64), de modo que a Defesa poderia ter arrolado como testemunhas os moradores das residências indicadas e responsáveis legais pela empresa TAJMILI para o fim de questionar quaisquer circunstâncias acerca da autenticidade e integridade dos vídeos, o que não ocorreu, incidindo no ponto, os efeitos da preclusão temporal.
Considerando, por fim, que o acusado
Daniel Kenzo Komiyama
e sua Defesa
têm pleno acesso ao PAD nº SEI nº 08659.016819/2020-18, deve-se assinalar que a providência poderia ter sido requerida pela própria parte ao Presidente da Comissão Processante para o fim de apresentar as informações ao processo penal, não tendo sido noticiado qualquer impedimento ou obstáculo para tanto, que demandasse a intervenção do juízo.
Dessa maneira, considerando que o regramento acerca da cadeia de custódia estabelecido pelo Código de Processo Penal não é aplicável ao Processo Administrativo Disciplinar nos termos da fundamentação ora expendida, bem como que na prova compartilhada ao presente feito, oriunda do PAD nº 08659.016819/2020-18, existem elementos que, a princípio, fornecem segurança no tocante à origem, à forma e por quem foram obtidas as imagens indicadas pela Defesa e, sobretudo, considerando que não foi alegada a existência de qualquer impedimento, obstáculo ou impossibilidade de a Defesa obter as informações postuladas por suas próprias forças, não se vislumbra pertinência, adequação ou necessidade na produção da prova pleiteada.
De outro lado, deve-se assinalar que
Elienai Xavier
foi ouvido na qualidade de informante durante a instrução probatória, de maneira que suas declarações foram submetidas ao regular contraditório, tendo sido conferido às partes ampla liberdade para formular seus questionamentos ao informante, cujas declarações serão oportunamente valoradas e cotejadas com os demais elementos de prova granjeados aos autos no momento sentencial.
Forte nestes motivos,
indefiro o pleito formulado no item 2 da petição do evento 232
.
4.3.
Pedido de oitiva de Testemunha referida – PRF Sérgio Brasil Silva
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a oitiva, em audiência, do PRF SÉRGIO BRASIL SILVA, Presidente do CPAD, mencionado pelo PRF Fábio Henrique Meurer Wasilewski e pelo próprio réu. O objetivo é esclarecer sua participação na diligência, especialmente quanto ao recebimento, controle, transferência e preservação dos arquivos digitais produzidos (como a entrevista de Elienai Xavier), bem como sobre a condução da oitiva do PRF Meurer e a rotina de encaminhamento do material digital à comissão do PAD. A defesa justificou a necessidade diante de respostas evasivas da testemunha anterior sobre a cadeia de custódia.
Não houve manifestação explícita do MPF sobre a oitiva desta testemunha em particular.
Analisando o teor do depoimento prestado pela testemunha
Fábio Henrique Meurer Wasileski
(evento 198, VÍDEOS 2 e 3), este Juízo não encontrou menção expressa e específica ao nome de
Sérgio Brasil Silva
- Presidente da Comissão Processante do PAD. No entanto, depreende-se do referido depoimento que a testemunha afirmou que gravação de vídeo de Elienai Xavier, produzida por sua equipe, foi fornecida à comissão de debate.
Essa declaração encontra-se corroborada pelo acerca do teor dos eventos SEI 28961254, 28955821, 29003559
e nº 29009156, do PAD nº 08659.016819/2020-18, apresentada no item 4.2, letra "a", da presente decisão, certo que do documento SEI 29003559 foi assinado por "PRF Sergio Brasil - Presidente CPAD".
Assim, nada obstante o indeferimento do pleito referente à expedição de ofício à Corregedoria para obtenção de esclarecimentos sobre as extrações das gravações de vídeo realizadas no âmbito do procedimento administrativo (item 2 da presente decisão), entendo que está caracterizada a hipótese descrita no artigo, §1º do Código de Processo Penal, parecendo conveniente a este Juízo que o PRF Sérgio Brasil Silva seja devidamente inquirido no âmbito do presente processo penal.
Dessa maneira,
defiro o pedido formulado no item 3 da petição do evento 232
.
Para tanto,
paute-se
data para realização da inquirição da testemunha referida, a qual deverá ser requisitada. Demais providências necessárias, pela Secretaria.
4.4.
Pedido de esclarecimentos sobre a extração de imagens (capturas de tela) utilizadas como prova emprestada
Sob a alegação de que o confronto das palavras das testemunhas com os Termos de Diligências acostados aos autos do PAD (link pelo evento 159), teriam surgido "
dúvidas quanto à coleta das imagens de tela e fotografias"
, a Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a expedição de ofício à Corregedoria da PRF objetivando a prestação esclarecimentos detalhados acerca das imagens do evento
SEI nº 25645850
("Termo de Diligências - Dra ANGÉLICA MENK - 2º contato - print de conversa"); do evento
SEI nº 25468934
("supostas ligações para UOP em 24/04/2020 [sic], por volta das 19h25, no celular funcional da UOP"); do evento
SEI nº 25530804
("suposta anotação de entrega de materiais de limpeza pela senhora SANDRA MARA SOUZA DE MENDONÇA") e, por fim, do evento
SEI nº 25785376
("Termo de Diligências - Ligações Lange e W. Caldeira, supostas ligações entre o PRF LANGE e Caldeira").
Os pontos que a Defesa pretende que sejam esclarecidos incluem: quem realizou a captura, data e hora exatas, dispositivo utilizado, versão do aplicativo, titular do dispositivo, método de captura, existência de outras capturas, se é arquivo original ou cópia, cálculo de hashes criptográficos, resolução, formato e qualidade da imagem, exibição completa ou parcial da conversa/evento, nomes e números de telefone dos participantes, consistência de datas e horários, fuso horário, acesso ao dispositivo original para perícia, existência de backups, contexto geral da conversa e autorizações formais de terceiros.
Assim como para as gravações de vídeo do PAD, o MPF rejeitou a aplicação das regras de cadeia de custódia do CPP para provas oriundas de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), tratando-as como prova emprestada documental. Argumentou que sua validade se baseia na regularidade da produção administrativa, que foi respeitada. Qualificando-o como "reiteração de um pedido genérico, sem demonstrar a relevância específica para o caso e sem apontar uma nulidade concreta", o Parquet Federal asseverou que se trata de solicitação com "caráter protelatório".
Decido.
Quanto ao pleito de esclarecimentos referente à imagem (print de tela de celular) constante do Termo de Diligência referente ao evento SEI nº
25645850
, considerando que se refere ao 2º contato telefônico realizado pela equipe de investigação preliminar com a advogada
Dra. Angélica Terezinha Menk Ferreira
, este Juízo procederá a análise acerca de sua adequação, pertinência e necessidade no próximo tópico da presente decisão, juntamente com a apreciação do pleito formulado no item 5 da petição do evento 232.
Tocante aos dois
prints
de tela constantes do Termo
SEI nº 25468934
(supostas ligações para UOP em 23/04/2020, por volta das 19h25, no celular funcional da UOP), depreende-se do próprio Termo de Diligências que se trata do telefone operacional do Posto de Polícia Rodoviária de Santa Terezinha de Itaipu, habilitado na linha de nº "
045 991420512".
Por outro lado, quanto ao número nº "
043999291097"
, que teria efetuado ligação para o aparelho celular utilizado no Posto da PRF de Santa Terezinha na manhã do dia 23/04/2020, depreende-se que se trata do número utilizado pela advogada
Dra. Angélica Terezinha Menk Ferreira
, certo que foi por meio desse número que a Autoridade Policial Federal obteve contato com a referida testemunha para o fim de realizar a chamada que foi gravada no bojo do IPL nº 5014749-30.2020.404.7002 (evento 04, DESP1, CERT3 e evento 05, ÁUDIO2).
Por outro lado, depreende-se do termo do depoimento da referida advogada perante a Autoridade Policial que ela confirmou ter realizado a ligação para o Posto Policial de Santa Terezinha (e de outro posto policial do qual não lembra onde seria) para fins de verificação acerca de uma apreensão de celulares a pedido de uma cliente (evento 05, ÁUDIO 2, dos autos nº 5014749-30.2020.404.7002.
Perante este Juízo, em apertada suma, a referida testemunha confirmou ter ligado para diversos lugares para obter informações sobre a apreensão de celulares que teria acontecido em um trecho da rodovia. Relatando lapso de memória decorrente do decurso de tempo, a testemunha declarou que passou todas as afirmações que detinha, à época, para um policial da Corregedoria, poucos dias depois da data dos fatos (evento 198, VÍDEO7).
Por outro lado, a testemunha
Márcio Azevedo
, que declarou que estava trabalhando na Unidade Operacional (UOP) de Santa Terezinha na manhã do dia 23/04/2020, também declarou perante este Juízo que minutos antes da chegada de Elienai, uma advogada ligou para o Posto da PRF onde estava trabalhando na ocasião, para verificar se de fato ocorreu a apreensão e para onde a mercadoria foi destinada. Declarou, ademais, que anotou o nome e a OAB da referida advogada.
Além disso, consta do PAD nº 08659.016819/2020-18, o documento SEI 25468631 que se trata de uma cópia da Parte Diária Operacional do Posto da PRF de Santa Terezinha de Itaipu, da qual consta o relato adicionado pelo PRF
Márcio Azevedo,
que no dia 23/04/2020, o nacional
Elienai Xavier
compareceu no local solicitando uma cópia do documento de apreensão de celulares e que alguns minutos antes, a advogada identificada como
Dra Angélica Terezinha Menk Ferreira
, de Londrina/PR, OAB 45215, fez contato com a UOP, por celular (43 9.9929-1097), para saber sobre de uma apreensão e para onde a mercadoria foi destinada.
Dessa maneira, depreende-se que a informação constante do Termo de Diligências
SEI nº 25468934
encontra-se confirmada por outros elementos nos autos, de maneira que não se vislumbra necessidade das informações postuladas pela Defesa para o fim de afastar quaisquer dúvidas quanto à coleta dos elementos de prova consubstanciados pelos
prints
de tela referidos no mencionado Termo de Diligências.
Tocante ao
SEI nº 25530804
,
verifico que se trata do "
Termo de Diligência (Registro de Entrega de Materiais de Limpeza)
" por meio do qual os PRFs
Fabio Henrique Meurer Walileski e Cleandro da Silva Padilha
formalizaram da juntada da "imagem da anotação feita pela senhora SANDRA MARA SOUZA DE MENDONÇA dos materiais entregues na data de 23/04/2020 para equipe de serviço na UOP Santa Terezinha do Itaipu", referente aos esclarecimentos prestados conforme "Vídeo de Declaração" da referida servidora terceirizada, juntado aos autos do PAD pelo arquivo
SEI nº 25529924
.
Assim, depreende-se que o teor do vídeo SEI nº 25529924 corrobora as anotações constantes da imagem anexada pelo
Termo de Diligências
SEI nº 25530804,
de maneira que o Juízo tem por suprida a necessidade de informações postulada pela Defesa, seja porque os servidores que colacionaram a imagem e firmaram o Termo de diligências têm fé pública, seja porque está descrito que a anotação foi feita pela servidora terceirizada Sandra Mara Souza de Mendonça, devidamente ouvida por meio de vídeo gravado pela equipe de investigações no dia 27/04/2020.
Por fim, tocante ao evento
SEI nº 25785376
, verifico que se trata do "
Termo de Diligência - Ligação entre PRF Lange e PRF W. Caldeira"
, por meio da qual a equipe PRFs
Fabio Henrique Meurer Walileski e Cleandro da Silva Padilha
formalizou a juntada de um print de tela de ligações efetuadas e recebidas entre os PRFs Lange e Caldeira, na manhã do dia 23/04/2020, consoante informado pelo PRF Lange em sua oitiva, gravada e juntada no PAD pelo arquivo
SEI nº 25468531
.
Dessa maneira, assistindo ao vídeo
SEI nº 25468531
referente ao depoimento do PRF
Jaderson Dionei Lange,
depreende-se o depoente afirmou ter realizado contato por meio de ligação através do aplicativo WhatsApp com o o PRF Caldeira, no dia 23/04/2020, utilizando, para tanto, seu aparelho celular particular.
A partir do minuto 8:42 do referido vídeo, nota-se que o depoente pegou seu aparelho celular em suas mãos e virou a imagem da tela para a câmera que filmava o seu depoimento, mostrando os registros do contato que afirmou ter realizado com o PRF Caldeira. Assim, observo que exatamente no minuto 9:03 do vídeo, depreende-se a imagem cuja captura de tela foi colacionada ao Termo de Diligências SEI nº
25785376,
o que torna as informações pretendidas pela Defesa totalmente dispensáveis.
A par desses fundamentos, considerando que a Defesa não apontou, concretamente, quais seriam as dúvidas que teriam surgido quanto à coleta das imagens de captura de tela e fotografias,
indefiro o pleito formulado no item 4 da petição do evento 232
.
4.5.
Pedido de esclarecimentos sobre a extração do áudio da conversa com a advogada Angélica utilizada como prova emprestada
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
: A defesa requereu a expedição de ofício à Corregedoria da PRF para prestar esclarecimentos técnicos detalhados sobre a origem e o procedimento de gravação do áudio da conversa telefônica com a advogada Angélica Terezinha Menk Ferreira. Os pontos abrangem: quem realizou a gravação, data, hora, local e equipamento utilizado, se a gravação foi contínua e sem edições, se houve consentimento formal da advogada, metadados técnicos do arquivo, hashes criptográficos do arquivo original, histórico de manuseio e onde/como o arquivo foi armazenado.
O MPF reiterou sua posição quanto inaplicação das regras de cadeia de custódia do CPP a provas originárias de PADs, aduzindo que devem ser tratadas como prova emprestada documental. Aduziu que se trata de pleito protelatório.
Decido.
Compulsando os autos do PAD nº 08659.016819/2020-18, verifico que a gravação e o
print
de tela referidos pela Defesa na petição do evento 232, tratam dos contatos que a equipe da Corregedoria da PRF realizou com a advogada Angélica Terezinha Menk Ferreira, através do nº
043 99929-1097
, consoante se depreende dos
Termos de Diligência SEI nº 25543881
("Contato com Advogada Angélica Terezinha Menk Ferreira" - no dia
27/04/2020
) e
SEI nº 25645850
("Segundo Contato com Advogada Angélica Terezinha Menk Ferreira" - no dia
06/05/2020
).
Ao cotejar tais Termos de Diligências e os respectivos arquivos de áudio (SEI nº 25535902 - do dia 27/04/2020 e SEI 25645964, do dia 06/05/2020) depreende-se, portanto, que se tratam de gravações de duas conversas telefônicas entre os interlocutores "Cleandro" [PRF Cleandro da Silva Padinha] com a advogada
Angélica Terezinha Menk Ferreira,
para obtenção de declarações da referida advogada acerca de sua atuação nos fatos que envolveram a apreensão de mercadorias que estariam na posse de Elienai Xavier no dia 23/04/2020, objetivando apurar a quantidade de celulares que estariam sendo transportadas por ele. Depreende-se dos aúdios que há identificação de Cleandro, da Corregedoria, bem consta da conversa que as ligações estavam sendo gravadas.
Ao abrir o arquivo SEI 25535902, é reproduzida a seguinte imagem, da qual consta o número do procedimento administrativo no bojo do qual a conversa foi gravada, o nome da interlocutora, bem como o número de registro na OAB e o telefone:
Ouvindo o referido áudio, observa-se que o interlocutor Cleandro pediu à interlocutora Angélica se a cliente dela teria alguma forma de comprovar a quantidade de mercadorias que afirmava que teria sido apreendida, tal como
"conversa, ou algum recibo
". A interlocutora Angélica afirmou: "
Eu não sei se ela tem, mas eu posso perguntar, entrar em contato
", e Cleandro assegurou que
seria preservado o sigilo quanto ao nome da cliente, esclarecendo que o objetivo era tentar levantar a informação correta da quantidade de celulares que havia
".
No dia 06/05/2020, segundo consta do Termo de Diligências SEI 25645850 e respectivo áudio SEI 25645964, o interlocutor Cleandro, que identificou-se como sendo o "
Cleandro da Corregedoria PRF"
, voltou a entrar em contato com a Dra Angélica e, explicando que se tratavam dos fatos de Santa Terezinha, indagou à interlocutora se ela havia entrato em contato com a cliente consoante a conversa anterior, ao que a interlocutora respondeu que entrou em contato com a cliente e, durante a ligação, procedeu à consulta em seu aparelho celular sobre o teor do contato que realizou com a cliente, passando informações a respeito. Nessa ocasião, o PRF Cleandro solicitou se era possível que a advogada encaminhasse as conversas, ao que a interlocutora Angélica disse que as encaminharia,
mas que preservaria a identidade de sua cliente,
o que foi consentido pelo interlocutor Cleandro.
Assim, consta do Termo de Diligências SEI 25645850, um print de tela de celular, da qual se depreende a troca de mensagens realizadas no dia "27 de abril de 2020", entre a advogada e sua cliente, cujo nome foi ocultado por rabiscos de cor azul:
A referida advogada
Angélica Terezinha Menk Ferreira
foi arrolada pelo Ministério Público Federal e foi inquirida no evento 198, VIDEO7, oportunidade na qual relatou as circunstâncias dos fatos das quais se lembrava. Contudo, a referida testemunha declarou lapsos de memória sobretudo quanto a ter realizado contato com servidor da Corregedoria e de ter fornecido print de conversa com sua cliente. Depreende-se, por alto, de seu testigo, que a referida testemunha lembrou ter realizado chamada com o Delegado e reportou-se ao seu depoimento prestado em sede policial.
Com efeito, no bojo dos autos do IPL nº 5014749-30.2020.404.7002, a referida advogada foi inquirida na condição de testemunha pelo Delegado de Polícia Federal Fabrício Blini, consoante se depreende do víde juntado no evento 16. Analisando o teor das declarações prestadas em sede policial, depreende-se que a testemunha
Angélica Terezinha Menk Ferreira
relatou, nessa oportunidade, que na época, conversou com um policial que estava sendo responsável pela sindicância e passou as informações que falou com sua cliente diretamente para ele, por WhatsApp. Esclareceu que esse policial entrou em contato com ela
"logo em seguida, dias depois"
, e que passou todas as informações que ela tinha lhe passado, "
de números, assim
". A testemunha relatou, inclusive, que na época achou que eram celulares e computadores, mas que o referido policial que lhe ligou falou: "
não, doutora, é só celular"
(evento 16, ÁUDIO1).
Anoto que o primeiro contato realizado pelo PRF Cleandro no âmbito da investigação preliminar da Corregedoria ocorreu, segundo consta do Termo de Diligências SEI 25543881, no dia 27/04/2020, ou seja, apenas quatro dias depois da data dos fatos e que o segundo contato telefônico ocorreu em 06/05/2020 (SEI 25645850), treze dias depois da data dos fatos.
Por outro lado, depreende-se do teor do áudio SEI 25645850, que a própria testemunha disse que iria fornecer as conversas com sua cliente, mas resguardando o sigilo quanto ao nome dela, o que justifica e indica que ela forneceu o print de tela com os rabiscos de cor azul no local onde comumente está disposto o nome do contato em uma conversa realizada pelo aplicativo mensageiro. Também merece anotação que na conversa SEI 25645850 a interlocutora realmente achou que se tratavam de celulares
e oito notebooks
, mas Cleandro esclareceu que se tratavam apenas de celulares, sendo que o termo "Note 8" se referia ao modelo dos celulares apreendidos, consoante posteriormente relatado pela testemunha ao Delegado que a oitivou nos autos do IPL nº 5014749-30.2020.404.7002.
Dessa maneira, sem a intenção de realizar qualquer juízo de valor sobre a questão de fundo dos elementos probatórios ora descritos, evidentemente incabível nesse momento, o que este Juízo observa, entretanto, é que não existem - a princípio -, quaisquer dúvidas acerca da autenticidade, origem e forma de obtenção dos dois áudios e
prints
coligidos aos autos do PAD nº 08659.016819/2020-18 (acesso pelo
link
fornecido no evento 159), que pudessem justificar o deferimento da diligência postulada pela Defesa no item 4 da petição do evento 232.
Além disso, aplicam-se ao ponto, igualmente, os mesmos fundamentos expendidos por este Juízo no item 4.2 da presente decisão, que dizem respeito à inaplicabilidade do regramento acerca da cadeia de custódia estabelecido pelo Código de Processo Penal ao Processo Administrativo Disciplinar, bem como devendo-se salientar que a Defesa não alegou a existência de qualquer impedimento, obstáculo ou impossibilidade de obter as informações objetivadas, por suas próprias forças, razão pela qual não se vislumbra pertinência, adequação ou necessidade na produção da prova pleiteada, motivos pelos quais,
indefiro o pedido formulado no item 4 da petição do evento 232
.
4.6.
Pedido de esclarecimentos sobre a ausência de documentos no Processo Disciplinar Emprestado
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a expedição de ofício à Corregedoria da PRF para que esclareça a ausência de documentos específicos no processo administrativo disciplinar compartilhado. Isso inclui a resposta ao
Ofício 62 (25479758), o documento SEI 25733380
, o ofício requisitório de imagens das câmeras da EcoCataratas, e esclarecimentos sobre os SEIs 25806662 e 25565865. A Defesa postulou para que seja informado se houve extravio, omissão ou outra razão para a não juntada formal dos documentos e, caso estejam disponíveis, que sejam imediatamente inseridos nos autos.
O MPF rejeitou as solicitações que buscam impor formalidades de cadeia de custódia a elementos de PAD, considerando-as protelatórias. O pedido de acesso a documentos faltantes de um processo administrativo já emprestado se enquadra na discussão sobre a regularidade e completude da prova emprestada.
Decido.
Tocante à resposta do ofício 62
(SEI nº 25479758)
, verifico que se trata de expediente endereçado ao Chefe de Divisão de Telecomunicações - Brasília/DF, solicitando informações sobre os dados de rastreamento dos rádios digitais e transceptores digitais entre as
05h00 e 13h00 do dia 23/04/2020
, dos seguintes números e referências:
Consoante se depreende do
"Termo de Diligência (Rastreamento da Viatura Cruze BDH-6F23)"
(arquivo
SEI 25824456
), a Divisão de Telecomunicações disponibilizou acesso aos dados de rastreamento da mencionada viatura, os quais foram gravados diretamente do sistema WFM e analisados pela equipe de investigação mediante gravação dos vídeos juntados ao processo administrativo pelos arquivos SEI nº 25897289, nº 25897303 e nº 25897430, todos devidamente carregados ao PAD.
Por outro lado, depreende-se do
"Termo de Diligência (Rastreamento da Viatura Jetta BBZ-4114)
" (arquivo
SEI nº 25850387
), a Divisão de Telecomunicações disponibilizou acesso aos dados de rastreamento da referida viatura, os quais foram gravados diretamente do sistema WFM e analisados pela equipe de investigação mediante gravação dos vídeos juntados ao processo administrativo pelos arquivos SEI nº 25897182 e nº 2587255, ambos devidamente carreados ao PAD.
Verifico, também, que nos autos de Quebra de Sigilo de Dados e/ou Telefônicos nº 5016649-14.2021.404.7002, atendendo à determinação deste Juízo (decisão proferida no evento 03), o Ministério Público Federal promoveu a juntada de diversos arquivos de documentos e vídeos extraídos dos procedimentos administrativos instaurados perante a Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal (evento 27).
Dentre eles, encontra-se o documento
SEI nº 25729832 ("Termo de Diligências")
, expedido nos autos do
Processo nº 08659.017678/2020-51
, o informa a realização de diligência (via email) junto ao responsável pelo programa Rádio Digital - PRF Fábio Tibucheski, com o objetivo de confirmar a localização de terminais de rádios digitais de dotação da Delegacia de Fronteira de Foz do Iguaçu, cujos ISSI (Inter-RF Subsystem Interface) foram solicitados ao SICAI-PR (terminais móveis
10022595
e
10022029
e terminais portáteis
10500782
e
100500884).
Consta desse termo, inclusive, que
"o resultado da solicitação se encontra disponível no documento SEI 25733380"
(
evento 27, OUT2
).
Registro que esse documento
SEI nº 25729832 ("Termo de Diligências"),
juntado no evento 27 (OUT2) dos autos nº 5016649-14.2021.404.7002 encontra-se
anexado ao
PAD nº 08659.016819/2020-18
pelo
"Termo" - SEI 25779601
.
Por outro lado, o teor do
SEI nº 25733380 ("email resposta diligência rádio digital")
encontra-se juntado nas telas 02-03 do
evento 27, OUT2
)
e também refere-se ao Processo nº
08659.017678/2020-51
.
Assim, embora os dados de rastreamento tenham sido efetivamente jungidos aos autos do PAD nº 08659.016819/2020-18, este Juízo não logrou encontrar, em análise superficial, a efetiva resposta ao ofício 62 (
SEI nº
25479758)
encaminhada pela Divisão de Telecomunicações - Brasília/DF por meio da qual foi fornecido acesso ao sistema de rastreamento.
Tocante ao pedido referente ao ofício requisitório de imagens das câmeras da EcoCataratas, e esclarecimentos sobre os SEIs nº 25806662 e nº 25565865 (este último mencionado no teor do Termo - SEI nº 25779601), entendo necessário que a Corregedoria preste os esclarecimentos postulados pela Defesa no item 06 da petição do evento 232, pois embora as imagens das câmeras da empresa Ecocataratas tenha sido juntadas e analisadas nos autos do PAD nº 08659.016819/2020-18, este Juízo não logrou encontrar eventual ofício requisitório da mencionada diligência.
Dessa maneira, entendo que o pedido formulado pela Defesa no item 06 da petição do evento 232
merece deferimento
.
Nesse sentido,
expeça-se ofício à Corregedoria da PRF/PR
requisitando as informações postuladas pela Defesa no item 6 da petição do evento 232.
Deverá ser esclarecido, ademais, se o processo nº
08659.017678/2020-51 e o documento SEI
nº 25733380
têm algum tipo de relação com o FATO investigado no processo nº 08659.016819/2020-18 (pelos quais os réus foram denunciados na presente ação penal e que tratam do suposto desvio/apropriação de mercadorias em tese apreendidas em poder de
Elienai Xavier
,
no dia 23/04/2020
, em tese, praticado pelos PRFs
Eliel Wagner Caldeira
e
Daniel Kenzo Komiyama
).
Em sendo confirmada a relação do processo nº
08659.017678/2020-51 e do documento SEI
nº 25733380
com o FATO investigado no processo nº 08659.016819/2020-18,
requisite-se,
desde já, à Corregedoria da PRF, o fornecimento de
link
de acesso a este Juízo, por prazo de 06 meses.
Prazo para cumprimento da diligência: 05 (cinco) dias
.
4.7.
Pedido de juntada de informações sobre contas e operações em plataformas de e-Commerce (VTEX e Mercado Livre)
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a ofício à Autoridade Policial para que junte as respostas encaminhadas pelas plataformas VTEX e Mercado Livre aos ofícios enviados no curso da investigação. O objetivo é obter informações sobre a existência de conta em nome de
DANIEL KENZO KOMIYAMA
, histórico de transações, anúncios, vendas, compras e demais dados pertinentes para elucidar a real extensão e natureza das supostas operações realizadas pelo acusado.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo indeferimento veemente deste requerimento por "flagrante falta de pertinência probatória" e "caráter protelatório". Afirmou que os fatos denunciados referem-se a peculato e crimes conexos, e não há nos autos qualquer indício que vincule as transações comerciais do acusado em plataformas de e-commerce aos crimes que lhe são imputados. Considerou o pleito excessivamente amplo, genérico e desprovido de qualquer fundamentação, bem como aduziu que tais documentos sequer foram utilizados para o oferecimento da acusação inicial.
Decido.
Durante a fase das investigações a Autoridade Policial Federal requereu o afastamento do sigilo de transações financeiras (dados e comunicações telemáticas) supostamente efetuado pelo investigado
Daniel Kenzo Komiyama
(dentre outros), através da operadora Mercado Livre/PAGO, pois a análise do fluxo das comunicações realizadas pelos emails
emails
daniel_kenzo@hotmail.com
e
kenzo.daniel@hotmail.com,
teria revelado a existência de indícios de que o investigado possuiria constas nos
sites
de comércio eletrônicos
MERCADO LIVRE e VTEX
, já tendo realizado venda de aparelho celular (autos nº 5016649-14.2021.404.7002 - evento 57, AUTO2, telas 06-07).
O pleito de afastamento do sigilo de transações financeiras (dados e comunicações telemáticas) efetuadas na operadora Mercado Livre/Pago pelo investigado
Daniel Kenzo Komiyama
através da conta
kenzo.daniel@hotmail.com,
foi deferido pelo Juízo por força da decisão proferida no
processo 5016649-14.2021.4.04.7002/PR, evento 62, DESPADEC1
. Em cumprimento à referida decisão, foi expedido o alvará nº 700012300497 (evento 63, ALV4).
Segundo consta do teor do Ofício nº 0533/2022 - DPF/PR, que a Autoridade Policial Federal informou ao Juízo que foram analisados os dados da conta
kenzo.daniel@hotmail.com
fornecidos pelo site MERCADO LIVRE. Foi informado, ademais, que
"
no período foi oficiado a plataforma VTEX solicitando informações sobre a conta que
DANIEL KENZO KOMIYAMA
possui junto ao site de comércio eletrônico, contudo, sem resposta até o momento".
Nesse mesmo ofício a Autoridade Policial postulou o encerramento da quebra de sigilo de dados telemáticos tangentes ao investigado
Daniel Kenzo Komiyama
(
evento 80, REPRESENTACAO_BUSCA1
)
.
Depreende-se, portanto, do Auto Circunstanciado de Interceptação/Quebra de Sigilo Telefônico/Telemático nº 02 - Operação Viagem da Turma -, encaminhado juntamente com o ofício nº 0533/2022 DPF/PR, que a equipe policial colacionou imagens que se tratam dos dados fornecidos pelo Mercado Livre a respeito do endereçamento eletrônico de
Daniel Kenzo Komiyama
(evento 80, AUTO2, telas 04-09 do autos nº 5016649-14.2021.404.7002).
Todavia, além dos excertos colacionados ao ACIT nº 02/2022 (evento 80, AUTO2), este Juízo não encontrou nos autos o ofício por meio do qual o Mercado Livre encaminhou as respostas que foram colacionadas ao referido Auto Circunstanciado, tal como ocorreu, por exemplo, no evento 100.
Em seu interrogatório judicial, o acusado
Daniel Kenzo Komiyama
foi indagado por sua Defensora a respeito das contas no Mercado Livre e Mercado Pago e VTEX, ao que o acusado respondeu, em apertada suma, que nunca teve site de e-commerce; que adquiriu um produto (whey protein) de uma uma loja hospedada nesta plataforma e que sua esposa teria usado sua conta no Mercado Livre para anunciar um celular usado dela para venda e que teria recebido email que explicou ter sido uma tentativa de fraude. Explicou que sua conta no Mercado Livre foi bloqueada por questão de seguraça devido a reclamação que realizou (evento 224, VÍDEOS 1 a 7).
Diante disso e considerando que a Defesa demonstrou a necessidade e pertinência da diligência postulada,
entendo que o pleito formulado no item 07 da petição do evento 232 merece deferimento
.
Nesse sentido,
oficie-se/intime-se
a Autoridade Policial Federal que preside as investigações da Operação Viagem da Turma/Spoliare (IPL nº 5016099-19.2021.404.7002), requisitando as informações requeridas no item 7 da petição do evento 232,
no prazo de 05 (cinco) dias
.
No mesmo prazo
,
a Autoridade Policial deverá juntar aos autos o ofício
que, segundo constou do ofício nº 0533/2022 DPF/PR (evento 80, REPRESENTACAO_BUSCA1 dos autos nº 5016649-14.2021.404.7002 - tela 05) teria sido encaminhado para a empresa VTEX (solicitando informações sobre conta), bem como deverá juntar aos autos eventual resposta posteriormente recebida da mencionada empresa.
4.8.
Pedido de juntada das respostas das plataformas Facebook e Google aos ofícios de Quebra de Sigilo Telemático
A Defesa do réu
Daniel Kenzo Komiyama
requereu ofício à autoridade policial para que junte as respostas das empresas FACEBOOK e GOOGLE aos ofícios nº 2014/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR e nº 2017/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR, referentes ao fornecimento de dados cadastrais vinculados às contas identificadas na investigação. A ausência de acesso integral a essas respostas compromete o contraditório e a ampla defesa.
O
Parquet
Federal manifestou-se pelo indeferimento deste requerimento, alegando "flagrante falta de pertinência probatória" e "caráter protelatório". Considerou a solicitação excessivamente ampla, genérica e desprovida de fundamentação, além de não conectada à tese acusatória.
Decido.
Compulsando os autos verifico que a Autoridade Policial Federal informou ter oficiado as empresas FACEBOOK e GOOGLE ("Ofício 2014/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR e Ofício 2017/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR") requisitando o fornecimento de dados cadastrais das contas vinculadas ao investigado
Daniel Kenzo Komiyama
, bem como informou que, com base nas respostas recebidas teriam sido elaboradas as Informações 188/2021 e 190/2021, que indicaram os endereços eletrônicos
daniel_kenzo@hotmail.com
e
kenzo.daniel@hotmail.com
vinculadas a
Daniel Kenzo Komiyama
(
processo 5016649-14.2021.4.04.7002/PR, evento 1, REPRESENTACAO_BUSCA1
, telas 13-14).
Por outro lado, apesar de os dados recebidos das empresas FACEBOOK e GOOGLE foram compilados pela equipe policial nas Informações Policiais nº 188/2021 e 190/2021 (evento 01, INF4 e INF5, dos autos nº 5016649-14.2021.404.7002), verifico que não consta dos autos o Ofício 2014/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR e o Ofício 2017/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR", de maneira que é legítima a pretensão da defesa formulada no item 8 da petição do evento 232.
Nada obstante tais informações policiais já estivessem jungidas aos autos nº 50166491420214047002, ao tempo da apresentação da defesa prévia pela Defesa (evento 64) e embora não haja contestação específica acerca da titularidade e uso dos endereços eletrônicos
daniel_kenzo@hotmail.com
e
kenzo.daniel@hotmail.com
por parte do réu Daniel Kenzo, entendo por bem deferir o pleito defensivo em homenagem ao princípio da ampla defesa e contraditório, em razão da complexidade do feito.
Nesse sentido,
expeça-se ofício/intime-se
à Autoridade Policial que preside a investigação da chamada Operação Viagem da Turma/Spoliare, requisitando a juntada dos Ofícios 2014/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR e 2017/2021-NO/DELEX/PF/FIG/PR, bem como as respostas apresentadas pelas empresas FACEBOOK e GOOGLE, no
prazo de 05 (cinco) dias
.
4.9.
Pedido de expedição de ofício à PRF para envio do Manual 023 e esclarecimento sobre sua vigência à época dos fatos
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a expedição de ofício à Polícia Rodoviária Federal (PRF) para que envie cópia integral do M-023, que regulamenta a confecção de boletins de ocorrência policial, esclarecendo se era o manual vigente em 22/04/2020. Caso contrário, que informe qual norma ou manual disciplinava a matéria à época e encaminhe respectiva cópia.
O MPF manifestou-se pelo indeferimento do requerimento, afirmando que o pedido "carece de qualquer demonstração de pertinência e relevância" para o deslinde da ação penal. Argumenta que a validade de um boletim de ocorrência é aferida pela conformidade com a lei processual penal e os direitos constitucionais, e não por manual interno. Além disso, esta diligência "poderia e deveria ter sido requerida em momento processual anterior, notadamente na resposta à acusação", configurando um pedido protelatório neste momento.
Decido.
Embora a Defesa não tenha argumentado, especificamente, acerca da existência de eventual impedimento ou impossibilidade de realizar a diligência (juntada de eventual ato normativo que regulamentava a confecção do boletim de ocorrências policiais no âmbito da PRF em 23/04/2020), sem a intervenção do Juízo, mas considerando a relevância da diligência para o deslinde dos fatos e considerando que o acusado
Daniel Kenzo Komiyama
não mais integra o quadro de servidores da Polícia Rodoviária Federal, entendo, por bem, excepcionalmente,
deferir a diligência postulada,
para assegurar ao acusado o exercício da ampla defesa.
Dessa maneira,
expeça-se ofício
à Corregedoria da PRF requisitando o cumprimento das diligências descritas nas letras A e B descritas no item 9 da petição do evento 232 (telas 27-28) dos presentes autos,
no prazo de 05 (cinco) dias
.
4.10.
Pedido de apresentação de Ordem de Missão, Briefing e Documentação correlata à execução do mandado de busca e apreensão
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a expedição de ofício à autoridade policial responsável para que apresente cópia integral da ordem de missão, briefing, relatório interno ou qualquer documento correlato que tenha orientado a equipe policial na execução do mandado de busca e apreensão nº 700014498791 na residência do acusado. Solicitou, ainda, a indicação formal de todos os agentes designados e que compareceram, e esclarecimento sobre orientações específicas para coleta de imagens de móveis, cômodos ou outros elementos da residência, inclusive para fins de subsidiar investigações diversas.
Decido.
Quanto a este pleito, peço vênia para adotar, como razões de decidir, os argumentos expendidos pelo Ministério Público Federal na manifestação granjeada aos autos pelo evento 235, por esposar do entendimento expendido, nos seguintes termos, que passam a fazer parte da presente decisão:
"O Ministério Público Federal manifesta-se pelo indeferimento deste requerimento, por sua desnecessidade e por invadir o sigilo de documentos internos da atividade das forças de segurança pública.
O mandado de busca e apreensão nº 700014498791, bem como os respectivos autos de apreensão, já se encontram acostados aos autos do processo, comprovando a legalidade da medida e o que foi efetivamente arrecadado. A execução de um mandado judicial é ato público e sujeito à fiscalização do Poder Judiciário e do Ministério Público. Os agentes designados para a diligência são, via de regra, identificados nos próprios autos de apreensão ou em documentos já anexados ao inquérito policial ou processo.
A ordem de missão, briefings e relatórios internos da Polícia são documentos de natureza preparatória e interna da investigação policial. Sua divulgação integral, sem a demonstração de uma ilegalidade concreta ou de uma nulidade processual que se busque comprovar, poderia comprometer a estratégia investigativa da autoridade policial e a proteção de informações sensíveis que compromete a própria atuação dos Órgãos de Segurança Pública, que não são inerentes à prova dos fatos ou à legalidade da medida.
A defesa deve apontar, de forma específica e fundamentada, qual irregularidade ou vício busca comprovar com a obtenção de tais documentos, e não requerer uma devassa genérica sobre a atuação policial. Sem qualquer justificativa pontual e nexo causal com a nulidade arguida ou com a prova dos fatos, o pleito se mostra impertinente."
Dessa maneira e especialmente considerando que a diligência postulada não interessa ao deslinde dos fatos narrados na denúncia e aditamento oferecidos nos presentes autos,
indefiro o pedido
formulado pela Defesa no item 10 da petição do evento 232.
4.11.
Pedido de esclarecimentos sobre eventual retificação ou anulação do Boletim de Ocorrência Policial
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a expedição de ofício à Polícia Rodoviária Federal para que informe se houve retificação, alteração ou anulação do Boletim de Ocorrência Policial nº 1993629200423063000 (25468650), lavrado pelos policiais Kenzo e W. Caldeira. Em caso positivo, que seja encaminhada cópia integral do documento retificado/anulado e da justificativa para a alteração; caso negativo, que seja certificada a informação.
O MPF manifestou-se pelo indeferimento do requerimento, considerando-o "diligência protelatória e desnecessária" por ausência de demonstração de sua concreta pertinência com os fatos imputados. O MPF afirmou que a solicitação desvia o foco da instrução, gera ônus desnecessário e pode ser utilizada para retardar o feito, especialmente sem um claro nexo causal com suspeita de adulteração.
Decido.
Diante da relevância e pertinência da diligência requisitada para o deslinde dos fatos, entendo que o pleito formulado no item 11 da petição do evento 232 merece deferimento.
Dessa maneira,
expeça-se ofício
à Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal requisitando o cumprimento das diligências descritas nos itens A e B do item 11 da petição do evento 232 (telas 31-32),
no prazo de 05 (cinco) dias
.
Complementarmente, nos termos do artigo 156, inciso II, do CPP, determino que a Corregedoria da PRF encaminhe relatório dos LOGs de acesso aos sistemas eletrônicos informatizados do órgão (PDI ou PDO), tangente ao BOP nº 1993629200423063000, devendo esclarecer o nome do policial, data e horário que da criação e de eventuais edição ou exclusão do referido documento nos sistemas eletrônicos da Polícia Rodoviária Federal.
Deverá ser informado, ainda, se a Corregedoria da PRF formulou qualquer tipo de comunicação à Receita Federal do Brasil para fins de alteração das informações que constaram do Auto de Apreensão de Mercadorias relativo ao BOP nº 1993629200423063000. Hipótese positiva, deverá ser encaminhado a este Juízo cópia da comunicação realizada e da resposta da Receita Federal do Brasil, se houver.
4.12. Pedido de deferimento de prova emprestada da Ação Penal nº 5006727-07.2025.4.04.7002/PR (Processo Elienai)
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu o deferimento da produção de prova emprestada consistente na integralidade dos elementos probatórios colhidos na Ação Penal nº 5006727-07.2025.4.04.7002/PR (Processo Elienai), incluindo depoimentos, documentos, laudos e demais peças que guardem relação com os fatos objeto desta ação penal, com destaque para o ANEXO - RELAÇÃO DE MERCADORIAS E DEMONSTRATIVO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS EVADIDOS do TERMO Nº 46249/2020114.
O MPF manifestou-se pelo indeferimento do requerimento, argumentando que, conforme as informações disponíveis, "
nenhuma prova foi sequer produzida"
nos autos da Ação Penal nº 5006727-07.2025.4.04.7002/PR (processo de Elienai) até o presente momento processual. Assim, sustentou que "Não há o que ser 'emprestado' se não há prova constituída". O MPF considerou a solicitação protelatória e inadequada para o momento processual, não se enquadrando nas hipóteses do art. 402 do CPP.
Decido.
Diante da indiscutível conexão e pertinência temática alegadas pela Defesa, o pedido de compartilhamento de provas deverá ser deferido, em especial quanto ao documento denominado "ANEXO RELAÇÃO DE MERCADORIAS E DEMONSTRATIVO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS EVADIDOS do TERMO Nº 46249/2020114", na forma requerida pela Defesa.
Anoto que tais informações constam (ou deveriam constar) do PAD/SEI nº 08659.016819/2020-18, pois foi expedido o Ofício 63/2020/SICAI-PR/CORREG-PR/SPRF-PR (SEI 25485692) à Receita Federal solicitando justamente as informações que tratam o documento supramencionado, indicado pela Defesa, cujo compartilhamento ora se defere.
Esclareço que o compartilhamento ora deferido se refere a toda e qualquer prova existente e já produzida ou que venha a ser produzida no feito nº 5006727-07.2025.4.04.7002/PR, até a data da apresentação das alegações finais pelas partes, na presente ação penal.
4.13. Pedido de relatório de produtividade funcional do acusado
Daniel Kenzo Komiyama
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu o envio de ofício à Polícia Rodoviária Federal para que forneça relatório de produtividade funcional do acusado, abrangendo o período de 2015 a 2020, com indicação de apreensões, elogios, avaliações funcionais e histórico de desempenho. A defesa alegou que o relatório é relevante para a contextualização da trajetória profissional do réu e para uma apreciação mais completa de sua conduta.
O Ministério Público Federal opô-se ao deferimento deste requerimento. Considerou o pedido "manifestamente impertinente e desprovido de qualquer relação com os fatos criminosos" objeto da presente ação penal, revelando-se totalmente protelatório. A produtividade funcional do acusado, por si só, não possui conexão lógica ou fática com os crimes imputados. O MPF aponta que este tipo de diligência "poderia e deveria ter sido requerida em momento processual anterior, notadamente na resposta à acusação", configurando uma diligência protelatória e sem fundamento.
Decido.
Com razão o Ministério Público Federal porque, no ponto, deve incicir os efeitos da preclusão temporal, pois o prazo para requerer provas que não decorram diretamente da intrução probatória (artigo 402 do CPP) é, sem dúvidas, a apresentação da defesa prévia (ou resposta à acusação), certo que, naquela oportunidade, a Defesa não formulou o referido pedido.
Dessa maneira,
indefiro o pedido formulado no item 13 da petição do evento 232.
Em razão do disposto no artigo 231 do Código de Processo Penal, anota que não há qualquer óbice que Defesa providencie a juntada do relatório objetivado, pois é certo que se trata de documento que pode ser obtido pelo próprio réu
Daniel Kenzo Komiyama
perante a Polícia Rodoviária Federal, ainda que não mais integre o quadro de servidores do órgão.
4.14. Pedido de supressão de documentos inadmissíveis mantidos no aditamento da denúncia (anotações caderno de capa laranja)
A Defesa de
Daniel Kenzo Komiyama
requereu a supressão imediata das imagens e anotações extraídas do caderno de capa laranja (item 06 do Termo de Apreensão nº 3197703/2023), que ainda constam no ANEXO 2 do Evento 9 (aditamento da denúncia), em conformidade com decisão judicial anterior que já determinou a supressão.
O MPF não se opõe à supressão, desde que esta se restrinja e seja feita "em estrita conformidade com a decisão já proferida por este Juízo no Evento 77" (item “Do pleito de inadmissibilidade de documentos”). O MPF reiterou que a supressão deve se limitar às "anotações feitas pelo investigado, decorrentes de PAD".
Decido.
Diante da pertinência e adequação do pleito formulado pela Defesa no item 14 da petição do evento 232 e considerando que é consectário lógico da decisão proferida por este Juízo no evento 77 dos presentes autos,
defiro o pedido de supressão das imagens e anotações extraídas do caderno de capa laranja (item 06 do Termo de Apreensão nº 3197703/2023)
.
Dessa maneira, devem ser suprimidos dos presentes autos:
a) o teor da tela 33 do evento 09, ANEXO 2,
a partir
do terceiro parágrafo até o final da página;
b) todo o teor da tela 34 do evento 09, ANEXO 2;
c) todo o teor da tela 35 do evento 09, ANEXO 2;
d) todo o teor da tela 36 do evento 09, ANEXO 2;
e) todo o teor da tela 37 do evento 09, ANEXO 2;
f) todo o teor da tela 38 do evento 09, ANEXO 2, e
g) todo o teor da tela 39 do evento 09, ANEXO 2.
Para cumprimento da presente decisão, deverá a Secretaria verificar com o Setor de TI (ou Setor responsável pelo eproc) acerca da possibilidade de realizar as supressões ora determinadas no próprio documento juntado no ANEXO 2 do evento 09, para o fim de não realocar (fisicamente) o aditamento da denúncia para que não se altere a ordem de sua juntada cronológica.
Em não sendo possível, deverá a Secretaria providenciar as supressões ora determinadas em novo documento a ser juntado aos autos, mediante a lavratura de certidão, a exemplo do que foi realizado no evento 292 dos autos do IPL nº 5016099-19.2021.404.7002, não havendo necessidade do acompanhamento presencial das partes, pois basta, para fins de ciência e fiscalização da diligência, a prévia intimação acerca dos termos da presente.
V.
Prejudicada a análise do pleito formulado pelo acusado
Daniel Kenzo Komiyama
na parte final de seu interrogatório pelo teor da decisão proferida por este Juízo no evento 06 dos autos de Pedido de Liberdade Provisória Com ou Sem Fiança nº 5012090-72.2025.4.04.7002/PR (cópia juntada aos presentes autos pelo evento 229).
VI.
O Ministério Público Federal requereu a renovação do link de acesso à íntegra do PAD nº 08659.016819/2020-18, bem como de eventuais
links
de seus processos administrativos dele decorrentes, realizadas no âmbito da Corregedoria da PRF com relação aos fatos da presente Ação Penal, para integral acesso a documentos, imagens e termos de depoimentos coligidos e para a sua utilização como prova no presente processo (evento 235, item iv, telas 13-14).
Considerando que o
link
apresentado pelo ofício nº 40/2025/CORREG-PR/SPRF-PR, pela Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal, para acesso do PAD nº 08659.016819/2020-18, encontra-se válido
até 05/12/2025
(evento 159, OFIC2),
defiro
o pedido formulado pelo
Parquet
Federal no tocante ao fornecimento de
link
de acesso a eventuais processos administrativos diretamente decorrentes ou vinculados ao PAD nº 08659.016819/2020-18, sejam prévia ou posteriormente instaurados.
Nesse sentido,
oficie-se
à Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal, requisitando o cumprimento da diligência, a fim de que seja(m) fornecido(s) os
link(s),
com validade de 06 (seis) meses.
VII. Intimem-se.
Sustenta o impetrante, em suma, que o indeferimento das provas requeridas configura violação ao direito de defesa do réu.
Pois bem.
Inicialmente destaco que os Tribunais Superiores já firmaram entendimento no sentido de ser imperiosa a necessidade de racionalização do
writ
, devendo ser observada sua função constitucional de sanar ilegalidade ou abuso de poder que resulte coação ou ameaça à liberdade de locomoção, o que não se verifica na espécie, pois
o paciente não se encontra propriamente preso,
mas sim monitorado, com razoável área de circulação, conforme já exposto em anterior impetração de HC, autuado sob o nº 50073121620254040000.
Portanto, não está em pauta o cerceamento da liberdade e tampouco o risco de que isso venha a ocorrer.
Observo, também, que a utilização de
habeas corpus
para suspensão ou trancamento de ação penal ou inquérito, por ausência de justa causa ou inépcia da denúncia é medida excepcionalíssima, cabível apenas quando o fato narrado na denúncia não configurar, nem mesmo em tese, conduta delitiva, quando restar evidenciada a ilegitimidade ativa ou passiva das partes, ou quando incidir de forma inequívoca qualquer causa extintiva da punibilidade do agente, ou, quando eventual deficiência da inicial acusatória impedir a compreensão da acusação, comprometendo o direito de defesa, hipóteses a serem constatadas de plano, por prova pré-constituída, pois inviável o exame probatório em sede de
habeas corpus
.
Ainda, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça estabelece que o
habeas corpus
só será admitido como sucedâneo recursal em casos de flagrante ilegalidade ou teratologia, o que não é o caso do autos.
Nesse sentido, também, a Súmula nº 124 deste Regional:
O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, salvo em casos de flagrante ilegalidade.
Se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já aponta para a inadiável necessidade de racionalização do uso do
habeas corpus,
a análise detida de questões afetas à instrução processual em sede da ação mandamental exige, indubitavelmente, a máxima cautela. Tal diretriz, por analogia e com ainda mais razão, deve ser aplicada ao exame de matérias probatórias em sede habeas corpus.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal já se pronunciou de forma clara e inequívoca, assentando a inadequação da discussão antecipada da prova, reservando sua apreciação para o curso regular do processo.
Para melhor compreensão, transcrevo trecho do julgado pertinente:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. FURTO QUALIFICADO. RESPOSTA À ACUSAÇÃO. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAME
NTAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DECISÃO SUCINTA QUE REFUTOU ADEQUADAMENTE TODAS AS TESES DEFENSIVAS. RECURSO IMPROVIDO. 1. O juízo de primeiro grau, ainda que de forma concisa, registrou a presença dos requisit
os viabilizadores da ação penal, postergando as questões referentes à análise probatória para o momento adequado (= fase instrutória), não havendo falar, por isso, em nulidade da decisão por ausência de fundamentação. 2. Ademais, não se pode afirmar que a decisão que rejeitou as questões suscitadas na resposta à acusação (CPP, art. 396-A) implique constrangimento ilegal ao direito de locomoção do paciente.
A defesa terá toda a instrução criminal, com observância ao princípio do contraditório, para sustentar suas teses e produzir provas de suas alegações, as quais serão devidamente examinadas com maior profundidade no momento processual adequado
. 3. Recurso ordinário improvido. (RHC 120267, Relator Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, PUBLIC 02-04-2014, destaquei)
Este Tribunal, por vezes, tem demonstrado flexibilidade com impetrações que, em princípio, não se relacionam diretamente com a discussão do direito à liberdade. Contudo, tal flexibilização somente se mostra possível quando a decisão de primeira instância possa configurar, ainda que em tese,
flagrante ilegalidade
. No caso em análise, porém, não se verifica tal situação.
Eventual nulidade, se demonstrado o prejuízo sofrido pelo paciente em virtude da não produção das provas requeridas, consoante sólida jurisprudência, deverá ser suscitada pela defesa em preliminar de apelação, para então ser possível a análise por esse juízo recursal.
Ademais, não se está diante de flagrante ilegalidade, pois o magistrado indeferiu as diligências complementares consistentes no acesso aos elementos da negociação do ANPP do corréu Diogo Conti, sob o fundamento de que
o Acordo de Não Persecução Penal, conforme introduzido pela Lei nº 13.964/2019, configura-se como instrumento de justiça penal consensual. Suas negociações, por sua natureza e finalidade de estimular a autocomposição e a celeridade processual, são revestidas de um grau de de confidencialidade que visa proteger a liberdade de diálogo entre o Ministério Público e o investigado.
E segue:
O ANPP de
Diogo Conti
foi devidamente homologado pelo juízo nos autos nº 5012848-85.2024.4.04.7002 - Ev. 31). A homologação judicial pressupõe a análise da legalidade e, crucialmente, da voluntariedade do investigado em aderir aos termos propostos. Além disso,
Diogo Conti
foi ouvido no presente processo (Autos nº 5013948-12.2023.4.04.7002 - evento 224, VÍDEOS 12 e 13) na condição de informante, depreendendo-se de suas declarações a espontaneidade e livre vontade de celebrar o acordo com o Ministério Público Federal. Ele, inclusive, esclareceu que trocou de advogado porque o anterior não aceitou o acordo, uma vez que ele "queria muito fazer o acordo" e "precisava pensar em mim", pois o advogado anterior "entendeu que poderia prejudicar os as outras pessoas que ele também estava defendendo". Tais declarações, colhidas em audiência e submetidas ao contraditório, reforçam a higidez do ato praticado por
Diogo Conti
. Importante relembrar, consoante aduzido pelo Parquet Federal na manifestação do evento 235, que "
a valoração de tal depoimento o, bem como de todas as provas, cabe ao E. Juízo, no exercício do princípio do livre convencimento motivado (...)",
o que certamente será realizado por este magistrado no momento sentencial.
No ponto, observo que o Superior Tribunal de Justiça é claro em afirmar que a natureza jurídica do Acordo de Não Persecução (ANPP) é de negócio jurídico de natureza extrajudicial e, como tal, suas tratativas e detalhes dizem respeito aos celebrantes, de modo que não se confunde com o instituto da colaboração premiada, esta sim, um meio de obtenção de prova: Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. FURTO SIMPLES. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (ANPP). PODER-DEVER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE CONFISSÃO NO INQUÉRITO POLICIAL. NÃO IMPEDIMENTO. NECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO DO INDICIADO PARA CONFESSAR OU NÃO O CRIME. DENÚNCIA REJEITADA.
1. Esta Corte Superior, assim como a doutrina processualista em geral, entende que o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) tem natureza de negócio jurídico de natureza extrajudicial, e, por isso, cabe ao Ministério Público avaliar, fundamentadamente, se é cabível, no caso concreto, propor o acordo.
2. Ainda que o ANPP se trate de negócio jurídico de natureza extrajudicial, é também um instrumento de política criminal, além de uma medida despenalizadora, e o requisito da confissão revela justamente o caráter de justiça negocial do referido instrumento.
Assim, é razoável a cientificação do indiciado e de seu defensor acerca da conveniência e oportunidade em assumir formalmente a responsabilização penal do crime, ainda que, no curso do inquérito policial, tenha escolhido o direito de permanecer calado.
3. Recurso especial desprovido.
(REsp n. 2.068.891/BA, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 5/12/2023, DJe de 14/12/2023.)
Por outro lado, a oitiva do corréu Diego não se deu como testemunha, mas sim, como informante, cujas declarações foram tomadas em audiência e submetidas ao contraditório, deixando claro o juízo impetrado que
"
a valoração de tal depoimento o, bem como de todas as provas, cabe ao E. Juízo, no exercício do princípio do livre convencimento motivado (...)".
É imperioso ressaltar que o exame de conveniência na produção probatória constitui prerrogativa legítima do magistrado. Conforme preceitua o artigo 400, §1º, do Código de Processo Penal, o juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Compete exclusivamente ao julgador a aferição da necessidade das provas para a formação de seu convencimento. Desse modo, não se configura ilegalidade no indeferimento de diligências probatórias que se revelem impertinentes à apuração da verdade dos fatos.
Acrescente-se, por fim, que a análise quanto à imprescindibilidade de determinadas provas que demande aprofundada incursão nos fatos e elementos probatórios da ação penal não se compatibiliza com a via do
habeas corpus
(HC n. 541.052/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 18/8/2020, DJe de 24/8/2020).
Em síntese, a decisão judicial encontra-se suficientemente fundamentada e, à primeira vista, não configura ilegalidade manifesta a ser sanada por esta via. Não obstante, a matéria poderá ser reexaminada por ocasião da sentença ou, se for o caso, em recurso de apelação, especialmente se arguida eventual nulidade por cerceamento de defesa.
Ante o exposto,
indefiro liminarmente o presente
habeas corpus
,
nos termos do art. 148 do Regimento Interno desta Corte.
Comunique-se à autoridade apontada como coatora.
Preclusa a presente decisão, dê-se baixa na Distribuição com as cautelas de estilo.
Intime-se.
Retifique-se a autuação, para que conste como Impetrado somente o Juízo Federal da 3ª Vara Federal de Foz de Iguaçu/PR, excluindo-se o Ministério Público Federal.
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