Processo nº 5026716-05.2025.4.04.7000
ID: 293029862
Tribunal: TRF4
Órgão: 3ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5026716-05.2025.4.04.7000
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOSE ADELAR DE MORAES
OAB/PR XXXXXX
Desbloquear
PROCEDIMENTO COMUM Nº 5026716-05.2025.4.04.7000/PR
AUTOR
: ANTONIO PETENASSI
ADVOGADO(A)
: JOSE ADELAR DE MORAES (OAB PR086373)
DESPACHO/DECISÃO
RELATÓRIO
Trata-se de ação pelo procedimento comum po…
PROCEDIMENTO COMUM Nº 5026716-05.2025.4.04.7000/PR
AUTOR
: ANTONIO PETENASSI
ADVOGADO(A)
: JOSE ADELAR DE MORAES (OAB PR086373)
DESPACHO/DECISÃO
RELATÓRIO
Trata-se de ação pelo procedimento comum por meio da qual a parte autora pretende, inclusive liminarmente, o fornecimento do medicamento NIVOLUMABE para tratamento do diagnóstico de carcinoma de células renais papilífero tipo 2 (CID C64).
Alega que necessita do medicamento para adequado tratamento da enfermidade e fundamenta sua pretensão na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional.
Atribuiu à causa o valor de R$ 438.961,44 e juntou documentos com a inicial, dentre eles: declaração de hipossuficiência (
evento 1, DECLPOBRE3
), comprovante de renda (
evento 1, INFBEN6
), receita médica (
evento 1, RECEIT7
) e negativa administrativa (
evento 1, CERTNEG9
).
Foi proferida decisão deferindo a justiça gratuita e a prioridade de tramitação, reconhecendo a incapacidade financeira da parte autora para arcar com o custo do medicamento e determinando a emenda da inicial.
Emenda no evento 8.
Foram juntadas notas técnicas (
nota técnica 1
e
nota técnica 2
) e laudo pericial emprestado (
laudo pericial
).
Intimadas, as partes se manifestaram (
evento 16, PET1
e
evento 18, PED_LIMINAR/ANT_TUTE1
).
Decido.
TUTELA DE URGÊNCIA
O art. 294 e seguintes do CPC, estabelece os requisitos referentes à concessão de tutela provisória, que pode fundamentar-se na urgência ou na evidência.
A tutela de urgência é regulada no art. 300 do CPC/15, nos seguintes termos:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3
o
A
tutela
de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Como já decidido no Tribunal Regional Federal da 4ª Região,
"o risco de lesão grave ou de difícil reparação deve ser um risco concreto, devidamente comprovado por elementos nos autos, e não um risco meramente potencial, existente em qualquer processo"
(TRF4 5000817-73.2013.404.0000, 2ª Turma, Rel. Otávio Roberto Pamplona, Data da decisão: 20/03/2013).
Competência, legitimidade da União e responsabilidade financeira
O STF designou o RE 1366243/SC como tema de repercussão geral para discutir especificamente a legitimidade da União em ser ré em processos que buscam tecnologias não contempladas nas políticas públicas. Como resultado, o RE abordou a competência para julgar tais processos, conforme o art. 109, I da CF.
Em 17/04/2023, o Ministro Relator proferiu decisão, que foi referendada pelo colegiado, nos seguintes termos:
"O Tribunal, por unanimidade, referendou a decisão proferida em 17.4.2023, no sentido de conceder parcialmente o pedido formulado em tutela provisória incidental neste recurso extraordinário, "para estabelecer que, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a atuação do Poder Judiciário seja regida pelos seguintes parâmetros:
(i)
nas demandas judiciais envolvendo medicamentos ou tratamentos
padronizados
: a composição do polo passivo deve observar a repartição de responsabilidades estruturada no Sistema Único de Saúde, ainda que isso implique deslocamento de competência, cabendo ao magistrado verificar a correta formação da relação processual, sem prejuízo da concessão de provimento de natureza cautelar ainda que antes do deslocamento de competência, se o caso assim exigir;
(ii)
nas demandas judiciais relativas a medicamentos
não incorporados
:
devem ser processadas e julgadas pelo Juízo, estadual ou federal, ao qual foram direcionadas pelo cidadão, sendo vedada, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a declinação da competência ou determinação de inclusão da União no polo passivo;
(iii) diante da necessidade de evitar cenário de insegurança jurídica, esses parâmetros devem ser observados pelos processos
sem sentença prolatada
; diferentemente, os processos
com sentença prolatada até a data desta decisão (17 de abril de 2023)
devem permanecer no ramo da Justiça do magistrado sentenciante até o trânsito em julgado e respectiva execução (adotei essa regra de julgamento em: RE 960429 ED-segundos Tema 992, de minha relatoria, DJe de 5.2.2021);
(iv) ficam mantidas as demais determinações contidas na decisão de suspensão nacional de processos na fase de recursos especial e extraordinário".
Em 19/09/2024 foi julgado o RE 1366243/SC tendo o Supremo Tribunal Federal assim decidido:
O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 1.234 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e homologou, em parte, os termos dos 3 (três) acordos, com as condicionantes e adaptações, assim sintetizados como as teses fixadas no presente tema da sistemática da repercussão geral, a saber:
I – Competência.
1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS, mas com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG – situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC.
1.1) Existindo mais de um medicamento do mesmo princípio ativo e não sendo solicitado um fármaco específico, considera-se, para efeito de competência, aquele listado no menor valor na lista CMED (PMVG, situado na alíquota zero).
1.2) No caso de inexistir valor fixado na lista CMED, considera-se o valor do tratamento anual do medicamento solicitado na demanda, podendo o magistrado, em caso de impugnação pela parte requerida, solicitar auxílio à CMED, na forma do art. 7º da Lei 10.742/2003.
1.3) Caso inexista resposta em tempo hábil da CMED, o juiz analisará de acordo com o orçamento trazido pela parte autora.
1.4) No caso de cumulação de pedidos, para fins de competência, será considerado apenas o valor do(s) medicamento(s) não incorporado(s) que deverá(ão) ser somado(s), independentemente da existência de cumulação alternativa de outros pedidos envolvendo obrigação de fazer, pagar ou de entregar coisa certa.
II – Definição de Medicamentos Não Incorporados.
2.1) Consideram-se medicamentos não incorporados aqueles que não constam na política pública do SUS; medicamentos previstos nos PCDTs para outras finalidades; medicamentos sem registro na ANVISA; e medicamentos
off label
sem PCDT ou que não integrem listas do componente básico.
2.1.1) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na tese fixada no tema 500 da sistemática da repercussão geral, é mantida a competência da Justiça Federal em relação às ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa, as quais deverão necessariamente ser propostas em face da União, observadas as especificidades já definidas no aludido tema.
(...)
Inserem-se no limite de alçada fixado no RE 1366243/SC os medicamentos oncológicos:
(...)
Por sua vez, citem-se os termos do adendo no que diz respeito aos medicamentos oncológicos:
"1.1. Serão consideradas como de competência da Justiça Federal as demandas de medicamentos para tratamento oncológico, cujo valor anual de aquisição de fármaco, por paciente, seja igual ou superior a 210 (duzentos e dez) salários mínimos. As demandas de medicamentos para tratamento oncológico cujo custo seja inferior a este valor, serão de competência da Justiça Estadual.
(...)
4.2) Medicamento não incorporado (incluindo oncológico) cujo tratamento anual custe igual ou mais de 210 salários mínimos: competência da Justiça Federal e responsabilidade integral da União, com posterior ressarcimento integral ao Estado, caso este venha a arcar com o tratamento.
(...)
Ainda se inserem na mesma regra dos medicamentos não incorporados, aqueles já incorporados às políticas públicas mas ainda sem pactuação pela Comissão Intergestores Tripartite:
(...)
4.7.2) Medicamentos com responsabilidade financeira ainda não pactuada na CIT: em relação à competência, ao ressarcimento e ao financiamento, devem ser utilizados o valor do tratamento e definida a competência nos mesmos termos em que definidos nos itens 4.2, 4.3 e 4.4 acima.
(...)
Responsabilidade financeira
Medicamentos incluídos nas políticas públicas
Nos termos do Tema 1234, a responsabilidade de custeio por
medicamentos incorporados com pactuação na Comissão Intergestores Tripartite
(CIT) foi a seguinte:
- medicamentos do grupo 1A do CEAF, medicamentos do CESAF e medicamentos pleiteados por indígenas - custeio da União.
- medicamentos do grupo 1B, 2 e 3 do CEAF, medicamentos do CBAF - custeio do Estado.
Medicamentos não incorporados ou incorporados sem pactuação na CIT
Nos termos do Tema 1234, a responsabilidade de custeio por medicamentos não incorporados às políticas públicas ou incorporados mas ainda não pactuados na CIT foi a seguinte:
- medicamentos cujo custo anual de tratamento supere 210 salários-mínimos - custeio da União;
- medicamentos cujo custo anual de tratamento seja inferior a 210 salários-mínimos - custeio do Estado, com ressarcimento pela União pelo Fundo Nacional de Saúde de:
a) 65%, caso o tratamento anual custe entre 7 e 210 salários-mínimos;
b) 80%, caso o tratamento anual custe entre 7 e 210 salários-mínimos e seja oncológico para os processos ajuizados até 10/06/2024 e para os oncológicos posteriores, o ressarcimento será pactuado na CIT;
- medicamentos cujo custo anual seja inferior a 7 salários-mínimos - custeio do Estado sem ressarcimento pela União.
Medicamentos sem registro na ANVISA
Nesses casos, segue-se o tema 500 do STF.
Procedimentos, órteses, próteses, cirurgias, exames e insumos
No julgamento do RE nº 855.178, submetido ao rito de repercussão geral sob o Tema 793, o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese, de observância obrigatória:
"Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro."
Diante disso, percebe-se que a parte autora pode, em tese, ajuizar ação contra qualquer um dos entes que compõem o SUS. Todavia, cabe ao juiz verificar se a pessoa jurídica de direito público responsável pelo financiamento de determinada tecnologia está no polo passivo. Caso não esteja, o juiz deve determinar a sua inclusão, ainda que isso signifique deslocamento de competência.
,No caso dos autos, a ação foi ajuizada na Justiça Federal em 19/05/2025 o pedido é de fornecimento de medicamento oncológico não incluído nas políticas públicas e o valor anual do tratamento é superior a 210 salários mínimos, razão pela qual a responsabilidade financeira é da União, estando presentes a legitimidade passiva da União e a competência da Justiça Federal.
Direito à saúde
O artigo 196 da Constituição estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado
"garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."
Por sua vez, o artigo 197 dispõe que
"são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle(...)".
Ou seja, o direito à saúde é garantido de acordo com as políticas públicas que forem estabelecidas para tanto, o que já é um limitador. Ao garantir o acesso universal para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a Constituição deixa claro que isso ocorrerá mediante políticas sociais e econômicas (art. 196), considerando-se como de relevância pública aquilo que estiver regulado por lei (art. 197).
A Lei nº 8.080/90, por sua vez, dispõe que a integralidade de assistência é constituída por um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema (art. 7º, II) e estabelece que a assistência terapêutica integral consistirá na
"I - dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P"
(art. 19-M).
A diretriz da integralidade vem disposta no artigo 198 da Constituição, nos seguintes termos:
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
(...)
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
(...)
O atendimento integral eleito como diretriz do sistema guarda relação com atenção plena à pessoa.
O conceito foi trazido da chamada medicina integral, movimento surgido nos Estados Unidos para contrapor a crescente fragmentação ou especialização do atendimento médico, buscando que o paciente fosse visto como um todo, valorizando a saúde e a doença, permitindo o atendimento em todos os níveis, físico, mental e social, e que a atenção se desse não somente na fase preventiva, mas também curativa.
Os artigos citados deixam claro que a afirmação que a Constituição garante a integralidade do direito à saúde, vista como a obrigação de dar tudo que é possível no mundo dos fatos, não é uma verdade.
Não há em nenhum momento demonstração no sentido que era isso que buscava o constituinte.
Dessa forma, ainda que se entenda que em um caso concreto seja possível obrigar o Estado, em sentido amplo, a oferecer serviços e prestações que não estão instituídos em políticas públicas, não há como se entender que integralidade é acesso irrestrito a tudo, inclusive àquelas opções de tratamento que não importam em maior efetividade, mas somente comodidade, dar a todos o tratamento de ponta e a melhor tecnologia, mas sim dar a todos os pacientes uma resposta satisfatória em todos os níveis de atenção.
Por fim, todo o contexto constitucional demonstra que na apreciação do que é acesso integral à saúde não se pode desvincular os conceitos de eficácia, custo-efetividade, nem ignorar que o sistema público de saúde tem por finalidade atender a coletividade.
Condicionantes
Os requisitos para a concessão de tratamentos, medicamentos, produtos ou procedimentos não incluídos nas políticas públicas foram definidos pelo STJ em sede de recursos repetitivos e pelo STF em sede de repercussão geral, sendo, portanto, de observância obrigatória.
A definição mais recente coube ao Supremo Tribunal Federal, ao reapreciar o
Tema n° 6
, que elencou os seguintes requisitos a serem observados pelo Poder Judiciário:
1. A ausência de inclusão de medicamentos nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUNE, entre outras)
impede, como regra geral,
o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo.
2. É possível,
excepcionalmente
, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos,
cumulativamente,
os seguintes requisitos,
cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação
:
(a)
negativa de fornecimento
do medicamento na via administrativa, nos termos do item "4" do Tema 1.234 da repercussão geral;
(b)
ilegalidade do ato
de não incorporação
do medicamento pela Conitec,
ausência de pedido
de incorporação
ou da mora na sua apreciação
, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei n° 8.080/1990 e no Decreto n° 7.646/2011;
(c)
impossibilidade de substituição
por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;
(d) comprovação, à luz da medicina baseada em eviências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja,
unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise
;
(e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante
laudo técnico fundamentado,
descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e
(f)
incapacidade financeira
de arcar com o custeio do medicamento.
3. Sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do artigo 489, §1°, incisos V e VI, e artigo 927, inciso III, §1°, ambos do Código de Processo Civil, o Pder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente:
(a) analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo de não incorporação pela Conitec ou da negativa de fornecimento da via administrativa, à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, especialmente a política pública do SUS,
não sendo possível a incursão no mérito do ato administrativo
;
(b) aferir a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, previstos no item 2, a partir da
prévia consulta
ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível na respectiva jurisdição, ou a entes ou pessoas com expertise técnica na área, não podendo fundamentar a sua decisão unicamente em prescrição, relatório ou laudo médico juntado aos autos pelo autor da ação; e
(c) no caso de deferimento judicial do fármaco,
oficiar aos órgãos competentes
para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS.
Tal definição foi igualmente delimitada no RE 1.366.243/SC (
Tema nº 1.234
):
IV – Análise judicial do ato administrativo de indeferimento de medicamento pelo SUS.
4) Sob pena de nulidade do ato jurisdicional (art. 489, § 1º, V e VI, c/c art. 927, III, § 1º, ambos do CPC), o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo da não incorporação pela Conitec e da negativa de fornecimento na via administrativa, tal como acordado entre os Entes Federativos em autocomposição no Supremo Tribunal Federal.
4.1) No exercício do controle de legalidade, o Poder Judiciário não pode substituir a vontade do administrador, mas tão somente verificar se o ato administrativo específico daquele caso concreto está em conformidade com as balizas presentes na Constituição Federal, na legislação de regência e na política pública no SUS.
4.2) A análise jurisdicional do ato administrativo que indefere o fornecimento de medicamento não incorporado restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de não incorporação e do ato administrativo questionado, à luz do controle de legalidade e da teoria dos motivos determinantes, não sendo possível incursão no mérito administrativo, ressalvada a cognição do ato administrativo discricionário, o qual se vincula à existência, à veracidade e à legitimidade dos motivos apontados como fundamentos para a sua adoção, a sujeitar o ente público aos seus termos.
4.3) Tratando-se de medicamento não incorporado, é do autor da ação o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS.
4.4) Conforme decisão da STA 175-AgR, não basta a simples alegação de necessidade do medicamento, mesmo que acompanhada de relatório médico, sendo necessária a demonstração de que a opinião do profissional encontra respaldo em evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados, revisão sistemática ou meta-análise.
Foram editados os seguintes enunciados de súmula vinculante:
Súmula vinculante nº 60:
O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede publica de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos 3 (três) acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243).
Súmula vinculante nº 61:
A concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471).
Ainda, o STF, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 657.718 (
Tema n° 500
), sob o rito de repercussão geral, firmou a seguinte tese:
1. O Estado
não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais
.
2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial.
3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos:
(i) a existência de
pedido de registro
do medicamento no Brasil (
salvo
no caso de
medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras
);
(ii) a existência de registro do medicamento
em renomadas agências de regulação no exterior
; e
(iii) a
inexistência de substituto terapêutico com registro
no Brasil.
4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União.
Assim, a regra de exigência do registro na ANVISA, antes definida pelo STJ no
Tema n° 106
, foi flexibilizada.
No que diz respeito aos medicamentos prescritos off label, no julgamento do Tema 1234/STF ficou estabelecido que se deve aplicar integralmente todas as teses envolvendo o referido Tema.
Por fim, em
decisão aclaratória
ao definido pelo
Tema nº 1.234
do STF, foi esclarecido que
o intuito das premissas constantes do voto, construídas a partir dos acordos realizados entre os entes federados, é conferir maior racionalidade ao sistema público de saúde, para que este seja mais eficiente voltado a racionalizar os dispêndios públicos, com o consequente atendimento de maior número de pessoas,
sendo que a exigência de evidências científicas de alto nível se aplicam a todas as doenças,
inclusive raras e ultrarraras
, valendo para todos os casos em andamento no Poder Judiciário e em qualquer grau de jurisdição.
Verifica-se, portanto, que as teses acima fixaram requisitos de observância obrigatória para a concessão judicial de medicamentos não incorporados às políticas públicas, que devem ser demonstrados no caso concreto.
Caso concreto
Incapacidade financeira
O STJ decidiu em sede de recurso repetitivo (REsp 1.657.156) requisitos para a concessão na via judicial de medicamentos não incorporados pelo SUS, dentre eles a incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito.
A parte autora juntou aos autos demonstrativo de crédito de benefício demonstrando o recebimento de benefício previdenciário no valor de R$ 2.277,00 (
evento 1, INFBEN6
), de modo que entendo demonstrada a incapacidade financeira de arcar com o valor do medicamento pleiteado.
Registro na ANVISA
O medicamento tem registro na ANVISA e as seguintes indicações em bula:
1. INDICAÇÕES
• Melanoma Avançado (Irressecável ou Metastático)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado em monoterapia ou em combinação com ipilimumabe para o tratamento de melanoma avançado (irressecável ou metastático).
• Tratamento Adjuvante de Melanoma
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento adjuvante de adultos com melanoma com envolvimento de linfonodos ou doença metastática completamente ressecada.
• Câncer de Pulmão de Células Não Pequenas (CPCNP)
OPDIVO (
nivolumabe
) em combinação com quimioterapia dupla à base de platina é indicado para o tratamento neoadjuvante de pacientes adultos com câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP) ressecável (tumores ≥4 cm ou nódulo positivo).
OPDIVO (
nivolumabe
) em combinação com ipilimumabe e 2 ciclos de quimioterapia à base de platina é indicado para o tratamento de primeira linha de CPCNP metastático em adultos cujos tumores não têm mutação EGFR sensibilizante ou translocação de ALK.
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento de CPCNP localmente avançado ou metastático com progressão após quimioterapia à base de platina. Pacientes com mutação EGFR ou ALK devem ter progredido após tratamento com anti-EGFR e anti-ALK antes de receber OPDIVO.
• Carcinoma de Células Renais Avançado (CCR)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento de carcinoma de células renais (CCR) avançado após terapia antiangiogênica prévia.
OPDIVO (
nivolumabe
) em combinação com ipilimumabe é indicado para o tratamento em primeira linha de pacientes adultos com carcinoma de células renais avançado ou metastático que possuem risco intermediário ou alto (desfavorável).
OPDIVO (
nivolumabe
) em combinação com cabozantinibe é indicado para o tratamento em primeira linha de pacientes adultos com carcinoma de células renais avançado.
• Linfoma de Hodgkin Clássico (LHc)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento de pacientes com Linfoma de Hodgkin clássico (LHc) em recidiva ou refratário após transplante autólogo de células-tronco (TACT) seguido de tratamento com brentuximabe vedotina.
• Carcinoma de Células Escamosas de Cabeça e Pescoço (CCECP)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento de pacientes com carcinoma de células escamosas de cabeça e pescoço (CCECP) recorrente ou metastático, com progressão da doença durante ou após terapia à base de platina.
• Carcinoma Urotelial (CU)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento de pacientes com carcinoma urotelial (CU) localmente avançado irressecável ou metastático após terapia prévia à base de platina.
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento adjuvante de pacientes com carcinoma urotelial músculo-invasivo (CUMI) que apresentam alto risco de recorrência após serem submetidos à ressecção radical do tumor.
• Carcinoma de Células Escamosas do Esôfago (CCEE)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento de carcinoma de células escamosas do esôfago (CCEE) irressecável avançado ou metastático após quimioterapia prévia à base de fluoropirimidina e platina.
OPDIVO (
nivolumabe
), em combinação com quimioterapia contendo fluoropirimidina e platina, é indicado para o tratamento em primeira linha de pacientes adultos com carcinoma de células escamosas do esôfago (CCEE) irressecável avançado, recorrente ou metastático, cujos tumores expressam PD-L1 ≥ 1%.
OPDIVO (
nivolumabe
), em combinação com ipilimumabe, é indicado para o tratamento em primeira linha de pacientes adultos com carcinoma de células escamosas do esôfago (CCEE) irressecável avançado, recorrente ou metastático, cujos tumores expressam PD-L1 ≥ 1%.
• Tratamento adjuvante de Câncer Esofágico ou de Câncer da Junção Gastroesofágica, completamente ressecados (CE, CJEG)
OPDIVO (
nivolumabe
) é indicado para o tratamento adjuvante do câncer esofágico (CE) ou câncer da junção gastroesofágica (CJEG), completamente ressecados, em pacientes que apresentem doença patológica residual após tratamento com quimiorradioterapia (QRT) neoadjuvante.
• Carcinoma Hepatocelular (CHC)
OPDIVO (
nivolumabe
), em combinação com ipilimumabe, é indicado para o tratamento de pacientes com carcinoma hepatocelular (CHC) que foram tratados anteriormente com sorafenibe e que não são elegíveis ao tratamento com regorafenibe ou ramucirumabe.
• Mesotelioma Pleural Maligno (MPM)
OPDIVO (
nivolumabe
) em combinação com ipilimumabe é indicado para o tratamento em primeira linha de pacientes adultos com mesotelioma pleural maligno (MPM) irressecável.
• Câncer Gástrico, Câncer da Junção Gastroesofágica e Adenocarcinoma Esofágico (CG, CJEG, ACE)
OPDIVO (
nivolumabe
), em combinação com quimioterapia contendo fluoropirimidina e platina, é indicado para o tratamento de pacientes com câncer gástrico (CG), câncer da junção gastroesofágica (CJEG) e adenocarcinoma esofágico (ACE), avançado ou metastático.
Considerando o diagnóstico da parte autora, verifica-se que não se trata de indicação em uso
off label
.
Análise CONITEC
O medicamento requerido nos autos foi analisado pela CONITEC, com recomendação de não incorporação ao SUS para o tratamento de segunda linha para pacientes com carcinoma de células renais metastático, nos termos da Portaria SCTIE/MS nº 58/2021:
Portaria SCTIE/MS nº 58/2021 - Publicada em 03/09/2021
Torna pública a decisão de não incorporar, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, o cabozantinibe e nivolumabe para o tratamento de segunda linha para pacientes com carcinoma de células renais metastático.
No julgamento do Tema nº 1.234, o Supremo Tribunal Federal decidiu que nos casos de pedido de fornecimento de medicamento não incorporado ao SUS o Poder Judiciário deve analisar o ato administrativo da não incorporação pela CONITEC, restrita a análise aos aspectos formais do ato de não incorporação (regularidade do procedimento e legalidade), sem adentrar, contudo, no mérito da decisão de não incorporação.
Aponto que a CONITEC é composta por três Comitês (Medicamentos, Produtos e Procedimentos e Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas), cada qual composto por quinze instituições com ampla representação na saúde pública brasileira, com direito a voto, além de contar com a participação de representantes do CNJ, do CNMP e do Conselho Superior da Defensoria Pública. Antes da decisão final de incorporação ou não da tecnologia avaliada as recomendação são ainda submetidas à consulta pública.
A análise da CONITEC se baseia em evidências científicas sobre a eficácia, acurácia, efetividade e segurança da tecnologia, para além da avaliação econômica.
Não há comprovação nos autos de qualquer vício de ilegalidade, de procedimento ou de existência de motivo indicado como fundamento no relatório inverídico ou inexistente, de acordo com a teoria dos motivos determinantes do ato administrativo.
Prova técnica
Com relação à adequação, necessidade/imprescindibilidade do tratamento requerido, o laudo pericial emprestado de
evento 10, LAUDOPERIC3
, que analisou a mesma situação fática, concluiu:
a) A política pública prevista no SUS para a moléstia.
Resposta. O câncer de rim avançado ou metastático não é passível de cura. Não se observa nenhuma resposta com a quimioterapia convencional. No âmbito do SUS, o tratamento preconizado é realizado com as medicações PAZOPANIBE e SUNITINIBE. A indicação de outros fármacos está defasada (Interferon, Interleucina).
b) Em se tratando de medicamento oncológico, quais os tratamentos que seriam possíveis dentro do valor da APAC correspondente?
Resposta. Não há tratamento possível dentro da APAC, pois já utilizou o Pazopanibe e Sunitinibe.
c) Há superioridade ou não do medicamento pleiteado em comparação às alternativas oferecidas pelo SUS.
Resposta. Sim. A medicação demandada pode aumentar a sobrevida global e taxa de resposta.
d) A existência, ou não, de protocolo clínico aprovado pela CONITEC quanto ao fármaco e à moléstia.
Resposta. A medicação não foi incorporada ao SUS pela CONITEC (http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2021/Sociedade/20210629_ReSoc280_ipilimu mabenivolumabe_e_pembrolizumabeaxitinibe_CCRm.pdf):
e) Em caso positivo e havendo recomendação de incorporação, informar se a situação clínica da parte autora se enquadra nos critérios apontados pela CONITEC para recomendar a incorporação.
Resposta. Não se aplica ao caso.
f) Tendo a CONITEC analisado o produto/equipamento/medicamento e recomendando a não incorporação, há estudos posteriores robustos que possam vir a alterar a decisão da CONITEC? Em caso positivo, quais? Explicar em que medida aos estudos impactam naquela decisão de não incorporação.
Resposta. A CONITEC avaliou a associação entre Nivolumabe com Pembrolizumabe. Também houve análise do Nivolumabe como segunda linha para carcinoma de células renais metastático. Não houve indicação de incorporação.
g) Há estudos clínicos com elevado nível de evidência quanto ao tratamento proposto, a partir da Medicina Baseada em Evidência, especialmente se há Revisão Sistemática que justifique a prescrição médica em substituição ao tratamento existente no âmbito do SUS?
Resposta. Sim. Os resultados de eficácia foram demonstrados num estudo de fase III publicado no The New England Journal of Medicine, 373:19 em 05-11-2015. Ao todo, 821 pacientes foram estudados para receberem Nivolumabe ou Everolimus. Houve ganho de sobrevida global com a medicação demandada (25,0 meses versus 19,6 meses) e aumento da taxa de resposta objetiva (25,1% versus 5,4%). Não houve significância estatística na sobrevida livre de progressão de doença (77,6% versus 78,3%).
Há revisão sistemática publicada em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35368898/. Os autores citam que o Nivolumabe associado ao Ipilimumabe possui ganho de sobrevida livre de progressão de doença e de sobrevida global em relação ao Sunitinibe:
k) O tratamento pleiteado é indispensável? Explicar.
Resposta. Sim. A medicação é indicada como medida para prolongar a sobrevida global.
l) Sendo indispensável, seria possível aguardar o prazo máximo de 90 dias para início da dispensação ou de 240 dias em caso de medicamento importado? Em caso de resposta negativa, deve o perito justificar. Resposta. Não. Há consenso de início do tratamento oncológico dentro de 60 dias, sob o risco de progressão de doença.
m) Há riscos com a submissão da parte autora ao tratamento oficial, em detrimento daquele postulado judicialmente? Explicar.
Resposta. Poderia ocorrer perda de oportunidade de melhor resposta, pois já houve utilização das alternativas disponíveis.
n) Explicar o tratamento já realizado pelo paciente, a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente.
Resposta. A autora alega que é portadora de câncer de rim metastático sob tratamento no Hospital Erasto Gaertner pelo SUS. Pleiteia a medicação NIVOLUMABE (OPDIVO®) na dose de 3 mg/Kg a cada 14 dias até toxicidade ou progressão de doença (Dr. Sylvio Elvis da Silva Barbosa CRM 41123 PR). Os documentos em anexo indicam que houve diagnóstico de carcinoma renal de células claras, tendo realizado nefrectomia esquerda em 07-12-2018 e segmentectomia pulmonar e toracectomia em 05-01-2023. Apresentou progressão da doença e utilizou Sunitinibe entre 08-02-2024 a 05-06-2024 e Pazopanibe entre 04-09-2024 a novembro de 2024, o qual foi suspenso por progressão em linfonodo, pulmão e pâncreas.
o) Considerando o tratamento prévio realizado pela parte autora haveria ganho terapêutico com o uso do medicamento demandado? Qual?
Resposta. Sim, poderia ocorrer prolongamento da sobrevida global e aumento da taxa de resposta (25,1%).
p) Probabilidade de cura.
Resposta. É improvável a cura.
q) Explicar a probabilidade de sobrevida global, livre de doença, livre de eventos, livre de progressão de doença em relação ao medicamento demandado.
Resposta. O câncer renal metastático infelizmente é uma doença incurável e progressiva, a despeito de qualquer tratamento. Em relação à medicação demandada, a taxa de resposta é de cerca de 25%. Houve demonstração de ganho de sobrevida global em relação ao Everolimus (25,0 meses versus 19,6 meses) e aumento da taxa de resposta objetiva (25,1% versus 5,4%).
r) Explicar na prática em que consistem os desfechos acima no caso concreto.
Resposta. Na prática, o fármaco poderia aumentar a sobrevida global.
s) Explicar qual o impacto na qualidade de vida com o desfecho que se mostrou relevante no caso concreto.
Resposta. O impacto na qualidade de vida reflete a melhora dos sintomas das metástases, como dor.
t) A probabilidade relatada nos itens anteriores se mostra custo efetiva?
Resposta. A medicação não é custo-efetiva, de acordo com a análise da CONITEC.
u) Caso o tratamento seja somente paliativo ou servir apenas para diminuição/controle da dor, poderia ser usado outro medicamento? Qual? Algum que seja disponibilizado pelo SUS?
Resposta. O tratamento analgésico não substitui a terapia antitumoral.
v) Em se tratando de medicamento paliativo ou que não acarrete impacto importante na probabilidade de cura e sobrevida (global, livre de doença, livre de eventos, livre de progressão de doença) há efeitos colaterais que impactam a qualidade de vida do paciente? Quais?
Resposta. Alguns efeitos colaterais são: diarréia, dor abdominal, náuseas. No entanto, os benefícios são maiores do que os riscos.
w) A idade do(a) paciente influencia de alguma forma no tratamento pleiteado? Explicar.
Resposta. Não há influência da idade na eficácia do tratamento.
x) Por quanto tempo deve ser usado o medicamento até que seja possível avaliação sobre a sua eficácia no caso concreto?
Resposta. Geralmente a eficácia é observada a partir de 60 dias.
No mesmo sentido, veja-se a Nota Técnica 202303 (
evento 10, NOTATEC1
), elaborada pelo Telessaúde RS-UFRGS:
Evidências e resultados esperados
Tecnologia:
NIVOLUMABE
Evidências sobre a eficácia e segurança da tecnologia:
O nivolumabe é um medicamento que pertence ao grupo das imunoterapias. Trata-se de um anticorpo monoclonal de imunoglobulina G4, que se liga ao receptor de morte programada 1 (do inglês, programmed cell death 1 ou PD-1) e bloqueia sua interação com PD-L1 e PD-L2. Quando PD-1 e PD-L1 ou PD-L2 se ligam, há uma inibição da ativação do sistema imunológico, com diminuição na proliferação das células de defesa do organismo (9). Portanto, uma vez bloqueada esta ligação, há uma maior resposta do sistema imune ao tumor. O nivolumabe tem sido estudado para uso tanto em monoterapia como em associação com outros fármacos. No tratamento de pacientes com carcinoma de células renais avançado, refratários a tratamento com antiangiogênicos, este fármaco foi avaliado no estudo CheckMate 025, em comparação com o everolimo que, embora não esteja disponível no SUS, trata-se de um medicamento referência para o tratamento destes casos (10). Trata-se de um ensaio clínico randomizado de fase 3, aberto, multicêntrico, que comparou o nivolumabe ao everolimo e incluiu 821 pacientes com razão de alocação 1:1. O desfecho primário foi sobrevida global, definida como o tempo entre a randomização e a morte. Sobrevida livre de progressão foi um dos desfechos secundários mais relevantes. Após seguimento mínimo de 64 meses (mediana de 72 meses), os pacientes que receberam nivolumabe apresentaram mediana de sobrevida global de 25,8 meses (IC95% de 22,2 a 29,8) versus mediana de 19,7 meses (IC95% de 17,6 a 22,1) para os pacientes alocados para o tratamento com everolimo. Este resultado foi expresso por uma razão de riscos calculada em 0,73 (IC95% de 0,62 a 0,85), com probabilidades de sobrevida global, em 5 anos, de 26% e 18%, respectivamente. Quando considerada sobrevida livre de progressão, contudo, o resultado foi limítrofe (razão de riscos de 0,84; IC95% de 0,72 a 0,99) (11). A descontinuação do tratamento por progressão da doença foi a principal causa para perda de seguimento e ocorreu em 285 de 406 pacientes (70%) no grupo nivolumabe e em 273 de 397 pacientes (69%) no grupo everolimo (10). Os eventos adversos mais comuns relacionados ao tratamento de qualquer grau foram fadiga (34,7%) e prurido (15,5%) com nivolumabe e fadiga (34,5%) e estomatite (29,5%) com everolimo (11).
Benefício/efeito/resultado esperado da tecnologia:
ganho em sobrevida global quando comparado a everolimo.
Recomendações da CONITEC para a situação clínica do demandante:
Não Recomendada
Conclusão
Tecnologia:
NIVOLUMABE
Conclusão Justificada:
Não favorável
Conclusão:
Existe evidência demonstrando aumento de cerca de 5 meses na sobrevida global de pacientes com carcinoma de células claras renais refratários a tratamento prévio tratados com nivolumabe quando comparado ao quimioterápico everolimo (10). Entretanto, o medicamento apresenta um custo excessivo e seu impacto orçamentário, mesmo em uma decisão isolada, é elevado. Em relatório que embasou a não incorporação do tratamento pleiteado no sistema público brsaileiro, estimou-se que seu uso levaria a incremento inferior a 1 ano de vida ajustado por qualidade com um custo adicional mínimo de R$ 144.000,00 por paciente elegível; uma cifra alta mesmo se considerada decisão individual. Corroborando o ante-exposto, agências de países de alta renda, como o Canadá e o Reino Unido, chegaram a razões incrementais de custoefetividade muito elevadas, fazendo com que recomendassem seu uso apenas mediante acordo de redução de preço.
E ainda, a Nota Técnica 262499 (
evento 10, NOTATEC2
), também do Telessaúde RS-UFRGS:
Tecnologia:
NIVOLUMABE
Conclusão Justificada:
Não favorável
Conclusão:
Atualmente, existe evidência de boa qualidade metodológica demonstrando que a combinação nivolumabe e ipilimumabe é eficaz em vários desfechos, incluindo sobrevida global e qualidade de vida, no tratamento de pacientes com diagnóstico de carcinoma renal avançado ou metastático. O fármaco pleiteado apresenta um perfil de custo-efetividade muito desfavorável - ou seja, o benefício ganho com a sua incorporação não ultrapassa o benefício perdido pelo deslocamento de outras intervenções em saúde que poderiam ser adquiridas com o mesmo investimento, perfazendo portanto mau uso dos recursos disponíveis ao sistema. Agências de avaliação de tecnologias de outros países recomendaram sua incorporação apenas após acordo de redução de preço. Por fim, a CONITEC concluiu que embora tenha apresentado eficácia superior ao tratamento disponível no SUS para indivíduos com risco intermediário ou alto, a relação de custo-efetividade foi considerada desfavorável. Finalmente, o impacto orçamentário da terapia pleiteado, mesmo em decisão isolada, é elevado, com potencial de comprometimento de recursos públicos extraídos da coletividade - recursos públicos que são escassos e que possuem destinações orçamentárias com pouca margem de realocação, e cujo uso inadequado pode acarretar prejuízos a toda a população assistida pelo SUS. Compreende-se o desejo da paciente e da equipe assistente de buscar tratamento para uma doença grave como o câncer de rim. No entanto, frente à estimativa de perfil de custoefetividade desfavorável; ao alto impacto orçamentário mesmo em decisão isolada; e à presença de avaliação desfavorável por parte da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde, entendemos que se impõe o presente parecer desfavorável.
Como se vê, tanto a perícia judicial quanto as notas técnicas indicam estudos que evidenciam a superioridade e o aumento de sobrevida do paciente submetido à terapia com NIVOLUMABE.
Ocorre que o artigo referenciado publicado pelo The New England Journal of Medicine foi avaliado pelo Relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias que concluiu pela não incorporação do NIVOLUMABE para o tratamento para pacientes com carcinoma de células renais metastático, sob o fundamento de que, apesar das evidências de eficácia superior, os valores do tratamento não são custo-efetivos.
Não há dúvida de que nos casos em que o medicamento pleiteado excede o limiar da CONITEC, o juiz não pode conceder um medicamento fora do SUS que ultrapasse de maneira significativa limiares fixados de forma técnica, por processo democrático. Ele não possui legitimidade técnica, nem democrática para tanto. A ele cabe verificar se o núcleo do direito à saúde está preservado, sem se afastar da realidade de limitações de recursos.
O princípio da equidade traz a necessidade de se tratar as pessoas, em termos de assistência e recuperação da saúde, de forma diferenciada, atendendo às suas particularidades. Todavia, diante da escassez de recursos e da ampliação de necessidades em saúde, esse princípio não pode mais se traduzir em dar tudo aquilo de que uma pessoa necessite. É necessário fazer distinção entre doenças, mas não ao ponto de investir recursos altíssimos com apenas algumas delas. Deve-se buscar um equilíbrio no tratamento diferenciado que se dá em relação a certas doenças. Por um lado, reconhece-se que será necessário se dispor a pagar mais por ele. Por outro, esse investimento maior não pode deixar de distribuir os recursos de maneira justa, maximizando o bem-estar social.
Ademais, embora a medicação seja indicada para o tratamento da parte autora, não foi possível informar o nível de evidência do NIVOLUMABE como monoterapia, o que impede a consideração pelo juízo, sendo que o parecer retrata, ainda, que a utilização da medicação não seria eficaz para cura, apresenta baixo aumento na sobrevida global em relação ao medicamento everolimus (25
versus
19,6 meses), com taxa de resposta em torno de 25%.
É preciso ter em conta que não basta o simples esgotamento das opções disponíveis no SUS para que se tenha configurada a imprescindibilidade. É preciso que haja ganho terapêutico significativo com a medida que se traduza em aumento de sobrevida com qualidade de vida e/ou redução de anos de vida perdidos ou vividos com incapacidade.
Desta forma, seja pela ausência de vício no procedimento adotado pela CONITEC para análise da medicação, pela falta de indicação de alta evidência da prescrição ou pela ausência de custo-efetividade, a tutela provisória deve ser indeferida.
O Juízo se sensibiliza com a situação da parte autora e entende que seja compreensível que esta pretenda usar toda a medicação possível. No entanto, não há como se impor ao Sistema Único de Saúde, que deve atender a toda a coletividade, o custeio de medicação em relação à qual não haja comprovação de eficácia, ganho terapêutico significativo ou superioridade em relação ao que é oferecido pelas políticas públicas.
Posto isso,
indefiro o pedido de tutela de urgência
.
CITE-SE a parte requerida para apresentar contestação, no prazo legal, nos termos dos artigos 335 a 337 e seguintes do CPC.
Apresentada contestação, intime-se a parte contrária para réplica nos termos do artigo 351, do CPC.
Cumpridos os itens anteriores e nada mais sendo requerido, registrem-se para sentença.
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear