Juliana De Almeida Timoteo x Idf - Instituto Doutor Feitosa
ID: 277171688
Tribunal: TRT9
Órgão: VARA DO TRABALHO DE TELÊMACO BORBA
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Nº Processo: 0000757-07.2024.5.09.0671
Data de Disponibilização:
23/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GISELLE GARCIA
OAB/PR XXXXXX
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DINIZAR DOMINGUES
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO VARA DO TRABALHO DE TELÊMACO BORBA ATOrd 0000757-07.2024.5.09.0671 RECLAMANTE: JULIANA DE ALMEIDA TIMOTEO RECLAMA…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO VARA DO TRABALHO DE TELÊMACO BORBA ATOrd 0000757-07.2024.5.09.0671 RECLAMANTE: JULIANA DE ALMEIDA TIMOTEO RECLAMADO: IDF - INSTITUTO DOUTOR FEITOSA INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 0fbd38f proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: VISTOS, etc. Juliana de Almeida Timoteo ajuíza reclamatória trabalhista em face de IDF – Instituto Doutor Feitosa em 5/11/2024, alegando que foi contratada em 2/1/2023, para exercer a função de “técnica de enfermagem”, percebendo remuneração final de R$ 1.500,00. Afirma que foi dispensada por justa causa em 28/8/2024 e, após exposição fática, postula, em síntese: a) reconhecimento da reversão da justa causa e deferimento de diferenças de verbas rescisórias; b) FGTS; c) vale-alimentação; d) devolução de descontos; e) diferenças salariais decorrentes da inobservância do piso; f) diferenças de adicional de insalubridade; g) intervalo intrajornada; h) horas extras; i) multa do artigo 467 da CLT; j) justiça gratuita; e, k) honorários advocatícios. Estima a causa em R$ 103.302,04 (cento e três mil, trezentos e dois reais e quatro centavos), junta procuração e outros documentos. O Reclamado é notificado e comparece na audiência inicial, ocasião que rejeita a conciliação e apresenta contestação escrita, quando impugna articuladamente os pedidos da exordial. Junta documentos, sobre os quais se manifesta a parte contrária. Na audiência de prosseguimento são ouvidas as partes e três testemunhas. Sem outras provas a produzir, resta encerrada a instrução processual. Razões finais remissivas. Conciliação final rejeitada. É o relatório. POSTO ISSO, decido: Rescisão contratual: A Reclamante alega que foi dispensada por justa causa em 28/8/2024, sob a alegação de não ter ministrado medicamento ao paciente Márcio internado no quarto 53 do Posto 4; que não recebeu comunicado formal com a descrição detalhada da conduta imputada, tendo sido informada verbalmente pela encarregada do RH de que a medida decorreu de uma queixa de paciente sobre ausência de atendimento no plantão de 26/9/2024 [segunda-feira]; que, no entanto, atendeu o referido paciente naquela data, administrando a medicação prescrita e realizando os procedimentos necessários (“a autora tem certeza de que às 02h00, deste mesmo dia, recebeu o kit da farmácia com OMEPRAZOL e que fez a administração no referido paciente, via oral”), embora não saiba se a colega lançou os registros no sistema; quanto à alegação de que em 24/9/2024 o mesmo paciente não teria sido medicado e de que o medicamento não teria sido devolvido à farmácia, assevera que nesse dia estava encarregada de relatórios e admite que sequer adentrou a enfermaria em questão (“no dia 24 a autora estava responsável pelo preenchimento dos relatórios e não havia kit da farmácia para aquele paciente, portanto a autora, neste dia, de fato não entrou na enfermaria n. 53”) e que não teve oportunidade de apresentar sua versão dos fatos; que a dispensa foi abusiva, por não ter sido proporcional, gradual e imediata; que a falta de advertência prévia, a sobrecarga de trabalho (30 a 35 pacientes para 2 técnicos e 1 enfermeiro em um posto com 23 leitos), a ausência de treinamento formal além de uma breve integração, e a falta de normas e procedimentos escritos podem contribuir para a alegada falha na ministração da medicação, bem como a ausência de protocolo para entrega e conferência de kits de medicação pela farmácia. Requer seja reconhecida a reversão da dispensa por justa causa para sem justa causa, condenando a parte Reclamada a pagar as verbas rescisórias inerentes a essa modalidade rescisória, FGTS e multa respectiva, fornecimento de guias para levantamento do FGTS e habilitação do seguro-desemprego ou deferimento de indenização substitutiva. Em contestação, o Reclamado sustenta que a dispensa por justa causa foi aplicada após apuração de falta grave, consistente em omissão na assistência a paciente internado nos dias 24 e 26/9/2024, bem como ausência de registros no prontuário e não devolução de medicações não administradas; nega a existência de sobrecarga de trabalho, falta de treinamento ou normas escritas, apresentando documentos como prova de seus argumentos; que a conduta da Reclamante foi extremamente grave, colocando em risco a saúde do paciente e que a dispensa foi proporcional e imediata. Examino. Considerando que a justa causa é a penalidade máxima aplicada ao empregado no curso da relação e por se tratar de exceção ao Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, incumbe ao empregador prová-la de forma suficiente (CLT, artigo 818, II, da CLT). Assim, cabe à parte Reclamada a demonstração de que a falta do demandante foi grave, que há tipificação legal, atualidade e proporcionalidade na punição, bem como nexo de causalidade. Friso que, diante dos efeitos jurídicos causados no contrato de trabalho e na vida do trabalhador, as situações que motivam a dispensa por justa causa são específicas e de interpretação restritiva. Consta do comunicado de rescisão apresentado no dia 28/8/2024 que a obreira foi dispensada por justa causa com esteio no artigo 482, “b” e “e”, da CLT (incontinência de conduta ou mão procedimento e desídia), por ter praticado as seguintes condutas: “- deixar de prestar assistência ao paciente durante todo o período do seu turno de trabalho; - inserir informações falsas no prontuário médico, atestando a ministração de medicamentos prescritos pelo médico, sem assim ter feito, fato que foi devidamente confessado para a gerente de enfermagem, bem como fazer constar sinais vitais sem ter feito a devida aferição, nos termos do relato do paciente; - extraviar medicamentos de propriedade do IDF, eis que os medicamentos não ministrados ao paciente não retornaram à farmácia da instituição hospitalar e não permaneceram no posto de enfermagem.” (fl. 272) Também, é juntado documento intitulado “Registro Ouvidoria”, assinado por Miriam A. Yoshida: “DESCRIÇÃO DO RELATO: Às 08:00h fui chamada no quarto a pedido do paciente para escutar o relato da experiência do mesmo durante o período de internação. Internado na tarde do dia 21/08/2024 onde foi acolhido pela equipe de enfermagem e recebeu as medicações prescritas tanto durante o dia como o plantão noturno (Vilma e Mirian). Refere que na manhã do dia 25/08 durante a visita médica referiu que não tinha obtido melhora e ao questionar o médico percebeu que não recebeu medicação conforme prescrição nos dias 22/08 e 24/08 no período noturno e que nesses dias a enfermagem não apareceu no quarto durante as 12h de plantão noturno. O paciente me apresentou um relato escrito pelo mesmo detalhando em cada dia e horário das administrações de medicamento e os nomes dos profissionais que o atenderam, porém faltava anotações do plantão. Refere também que somente na noite do dia 26 recebeu a visita e medicação da equipe noturna faltante após ele abordá-las no posto de enfermagem solicitando a verificação do soro que havia terminado. Na percepção dele, as técnicas o trataram de forma hostil demonstrando nem saber em qual quarto o mesmo estava hospedado. Por fim agradece o atendimento das equipes que fizeram a diferença no atendimento e acolhimento, deixando uma carta escrita (anexa a este relato). Relato também que antes de ser chamada pelo paciente, realizei uma conversa com as técnicas Juliana de Almeida e Celia Konopacki (na saída do plantão) referente a queixa que o paciente já havia realizado anteriormente para a equipe do dia sobre a não administração do medicamento no período noturno, as mesmas assumiram que não foi administrado, porém checado na prescrição como feito. INVESTIGAÇÃO DO SETOR Identificado equipe mencionada no relato. Verificado o prontuário médico e registro das checagens de medicações pela enfermagem dos dias e horários conforme relato do paciente, evidenciado checagem de todas as medicações prescritas. Registro de relato de enfermagem e sinais vitais.” (fl. 349) Em instrução, a Reclamante afirma que no último plantão [do dia 26, iniciado às 19h02min e encerrado às 7h33min, conforme cartão de ponto] ministrou somente o medicamento omeprazol no paciente Márcio, uma vez que havia divisão das medicações entre os técnicos; declara que era responsável pela medicação das 19h e 22h, enquanto a colega administrava às 2h e ela, novamente, às 6h; refere que entrou no quarto do paciente Márcio e ministrou o omeprazol; com relação ao penúltimo plantão [do dia 24, iniciado às 18h56min e encerrado às 7h02min, conforme cartão de ponto], lembra de ter retirado o soro do paciente após reclamação sobre o não atendimento do turno anterior; menciona que teve breve contato com o paciente, perguntando sobre o estado dele e se precisava de algo; esclarece que os sinais vitais eram responsabilidade de sua colega Célia. O preposto admite que não se lembra qual o posto de trabalho da Reclamante se 4 ou 5, relatando que atendiam somente SUS, sendo que o posto 4 tinha de 25 a 27 leitos; desconhece se as técnicas dispensadas (Juliana e Célia) tinham advertência anterior; menciona que as técnicas passam por todos os tipos de treinamentos necessários quando contratadas. A testemunha de indicação obreira, Gessica Mayara Siqueira, que trabalhou no Reclamado de março de 2018 a outubro de 2024 como técnica de enfermagem na UTI diz que trabalhou na UTI Covid e no posto 3, atendendo convênio e particular, sendo que eram dois técnicos e 20 a 25 leitos; comenta que conhece o posto 4, que atende convênio e SUS, e acha que eram 30 leitos; refere que não recebeu nenhum treinamento quando foi contratada e que não tinha protocolo escrito da forma de ministrar a medicação; comenta que não tinham intervalo de 1h, e sim de 10 a 15min, embora registrassem o tempo integral; discorre que não é normal o funcionário não entrar no quarto do paciente, salientando que as técnicas fazem rodízio (dividem-se) para atender; explica que verificam os sinais vitais, medicação e curativos quando entram no quarto do paciente. Já o primeiro testigo trazido pelo demandado, Marcio Florsz, diz que ficou internado no Reclamado por seis dias no posto 4 e que ficou duas noites sem ser assistido; relata que apesar de não ter recebido a medicação, no prontuário constava como se tivesse sido administrada, tendo entregue carta formalizando sua reclamação; diz que as técnicas do período noturno não chegaram a entrar em seu quarto nos plantões e que sequer as conhece; esclarece que foi internado na quarta à tarde pela Unimed e que não foi atendido nas noites de quinta e sexta; informa que não poderia ter ocorrido de estar dormindo durante a visita porque recebia medicação no soro e acabava ficando vazio, sendo que ele mesmo acabava retirando sem ter conhecimento; menciona que chegou a chamar pela campainha, mas não foi atendido. E a segunda, Mirian Akemi Yoshida, que trabalha no Reclamado há quase 18 anos como gerente de enfermagem, explica que todos os enfermeiros estão a ela subordinados e os técnicos a estes; comenta que tomou conhecimento dos fatos relacionados à dispensa ao chegar no hospital pela manhã ao receber o relato do paciente internado no quarto 53 do posto 4, tendo este lhe mostrado o relatório por ele redigido a punho; segundo o relato do paciente, ele estava no segundo dia do internamento e não estava tendo melhora, tendo questionado o médico sobre se havia medicamento a ser ministrado durante o turno da noite; diz que era justamente no plantão da Célia e da Juliana que não tinham entrado no quarto e ministrado o medicamento; diz que verificaram que os prontuários e os medicamentos estavam todos checados pelas técnicas; explica que ao fazer o relatório de enfermagem, primeiramente é feita a visita ao paciente, verificados os sinais vitais e os medicamentos ministrados; ressalta que verificado o prontuário das técnicas, estava com o relatório feito, sinais vitais com valores anotados e inclusive checados os medicamentos, sendo que o paciente negou ter recebido os cuidados e muito menos a medicação durante os dois plantões em que as técnicas estavam escaladas; salienta que chegou a conversar pela manhã com Célia (ao que se recorda) antes de falar com o paciente, mencionando que contou a Célia que o paciente tinha questionado que teve falta de ar e não foi feito aerolin, que é a bombinha, ou inalação, ao que Célia respondeu que “achei que não tinha”; esclarece que, porém, nunca houve falta de aerolin no hospital; complementa que perguntou a Célia por que esta não fez, mas checou no prontuário e Célia confirmou “ai, passou desapercebido e eu chequei”; ressalta que tais condutas vão contra o Código de Ética da Enfermagem que proíbe não administrar e checar; comenta que verificação de sinais vitais e ministrar medicamentos é algo que se aprende no curso técnico; destaca que o hospital fornece cursos para os técnicos, sendo que têm protocolos de prescrição, uso e administração de medicamentos, dentro dos protocolos de segurança nacional de pacientes, físico e validado por toda equipe; acrescenta sobre estes protocolos de treinamentos que são escritos e assinados pelos funcionários; refere que à noite ficam dois enfermeiros para cada posto, sendo que no posto das técnicas Juliana e Célia havia cerca de 27 leitos; salienta que o enfermeiro chega durante o plantão e faz o dimensionamento de pessoal, verificando os setores mais ociosos, sendo que quando há necessidade de remanejamento de pessoal para outro setor isso é feito; discorre que para o grau leve até dez pacientes podem ser cuidados por cada técnico, para a média complexidade até seis, referindo que existe uma conta específica para isso; refere que o RH tem um setor de núcleo de educação permanente, não sabendo quando teve início. Os elementos colhidos na instrução revelam cenário de potencial sobrecarga de trabalho (a testemunha Mirian diz que no posto das técnicas Juliana e Célia havia cerca de 27 leitos, mas que para o grau leve até dez pacientes podem ser cuidados por cada técnico; ainda, os relatórios emitidos pelo sistema Tasy de fls. 313/318 – que indicam que havia somente onze pacientes internados no posto 4 na semana dos fatos – são expressamente impugnados pela Reclamante). Nestes termos, embora as condutas imputadas à Reclamante estejam suficientemente comprovadas, especialmente no que tange à falha na ministração de medicamentos ao paciente, constato que a penalidade aplicada mostra-se desproporcional frente às circunstâncias específicas do contrato de trabalho. A Reclamante não possuía histórico de punições disciplinares anteriores, o que indica a ausência de um percurso profissional marcado por reiteração de faltas ou comportamento incompatível com o desempenho de suas funções. Ademais, não evidencio a existência de dolo ou intenção deliberada de causar prejuízo à saúde do paciente, mas sim falha pontual de natureza funcional, em contexto que sugere sobrecarga de trabalho e eventual desorganização do ambiente de trabalho, conforme os próprios elementos trazidos pelas partes. O princípio da gradação das penalidades impõe ao empregador o dever de aplicar sanções de forma progressiva e proporcional, privilegiando medidas pedagógicas como advertências ou suspensões nos casos de faltas leves ou médias, especialmente quando não se trata de empregado com histórico funcional negativo. Entendo, assim, que a dispensa foi desproporcional, tendo havido rigor excessivo na punição aplicada, o que a invalida. Nestes termos, é imperioso reconhecer a nulidade da justa causa aplicada e determinar a conversão para dispensa sem justa causa, por iniciativa patronal, tendo em vista o princípio da continuidade da relação de emprego. Por conseguinte, condeno a parte Reclamada ao pagamento das verbas rescisórias daí decorrentes, quais sejam: aviso prévio indenizado (observando-se sua projeção legal), férias proporcionais com 1/3, 13º salário proporcional, além de FGTS e multa de 40%, determinando-se ainda o fornecimento de guias para levantamento do FGTS e encaminhamento no seguro-desemprego. Os documentos deverão ser entregues pela demandada no prazo de cinco dias contados do trânsito em julgado, sob pena de a obrigação converter-se em indenização pelo valor equivalente, devendo o Reclamante comprovar junto ao órgão competente que preenche os requisitos necessários à concessão do benefício. Fixo a data do trânsito em julgado desta sentença como termo inicial do prazo para o requerimento do benefício. Fica desde logo autorizada a dedução dos valores pagos sob os mesmos títulos no TRCT juntado às fls. 273/275 dos autos. Acolho, nestes termos. FGTS: A Reclamante acusa o Reclamado de descumprir sua obrigação de recolhimento do FGTS na conta vinculada ao longo do contrato de trabalho. Pede sua condenação a recolher o FGTS não depositado e a multa de 40%. Pois bem. Incumbe ao Reclamado o ônus de comprovar o recolhimento dos valores devidos a título de FGTS, nos termos da Súmula nº 461 do C. TST. No caso, o Reclamado sequer refuta especificamente a alegação inicial de não recolhimento do FGTS e da multa respectiva, limitando-se a aduzir que firmou termo de parcelamento com a Caixa Econômica Federal, o que bastaria para o deferimento do pedido, nos termos do artigo 341 do CPC, cabendo acrescer que não é juntado extrato de FGTS referente ao presente contrato de trabalho. Nestes termos, condeno-o a depositar na conta vinculada da Reclamante o FGTS do período sem recolhimento, incidente sobre as verbas salariais pagas no curso da contratação, além da multa respectiva. Ressalto que eventual parcelamento dos valores devidos a título de FGTS junto à Caixa Econômica Federal não suspende a exigibilidade da obrigação em relação ao empregado, mas apenas em relação ao órgão gestor, conforme previsto no artigo 25 da Lei nº 8.036/90. Assim, suposto acordo de parcelamento firmado entre o empregador e o órgão gestor do FGTS (Caixa Econômica Federal) não afasta o direito do empregado de pleitear perante a Justiça do Trabalho os valores de FGTS não depositado. As diferenças de FGTS em virtude das verbas deferidas na presente demanda já são objeto de análise nos itens próprios. O Reclamado deverá comprovar os depósitos de FGTS, em até cinco dias após o trânsito em julgado da decisão, sob pena de execução direta por valores equivalentes. Em caso de execução direta, os juros de mora e a correção monetária sobre as parcelas observarão os mesmos critérios de cálculo das demais parcelas trabalhistas, na forma da OJ nº 302, da SDI-1, do C. TST. Acolho, nestes termos. Devolução de descontos – vale-alimentação: A obreira sustenta que sofria descontos indevidos a título de vale-alimentação na média de R$ 30,00 por mês, postulando, ao final, sua devolução de forma indenizada. O Reclamado rebate as alegações iniciais, ressaltando que os descontos ocorreram em poucos meses e que a empregada continuou a ter acesso aos valores encaminhados ao seu cartão de vale-alimentação. Pois bem. À luz do artigo 462 da CLT, é vedado ao empregador efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo. No caso, o Reclamado não comprova autorização para os descontos mensais sob a rubrica “207 VALE ALIMENTACAO (VR)” (fls. 46/60 e 280/297). Também, não há prova de que tal desconto resulte de adiantamento da parcela ou de que esta derive de negociação coletiva ou de lei. Dessa forma, reputo irregular o desconto efetuado e acolho o pedido para condenar o Reclamado a reembolsar os valores descontados sob a rubrica “207 VALE ALIMENTACAO (VR)”, conforme se apurar dos holerites. Integração do vale-alimentação: A demandante explana que sempre recebeu vale-alimentação de R$ 200,00 sem previsão em norma coletiva e sem estar inscrita no PAT, restando patente a natureza salarial da parcela. Requer, assim, a integração da rubrica à sua remuneração para o fim de gerar reflexos em outras verbas, utilizando como base de cálculo o piso da enfermagem a partir de abril de 2023. Em contestação, o Reclamado aduz que “mencionados valores não decorrem de lei e são pagos aos funcionários de forma a constar em folha a pedido destes, todavia, todos são cientes de que tais valores são destinados exclusivamente à alimentação”. Pois bem. De acordo com os artigos 457, § 2º e 458 da CLT, as importâncias habituais pagas a título de auxílio alimentação, em dinheiro – caso dos autos – compreendem-se no salário e incorporam-se ao contrato de trabalho. Tal regra não teria aplicação se o Reclamado comprovasse sua adesão ao PAT ou houvesse a previsão da rubrica em comento em instrumento coletivo da categoria, o que não ocorre “in casu”. Pelo exposto, reconheço a natureza salarial do vale-alimentação adimplido ao longo de todo o contrato e defiro o pagamento de reflexos em horas extras, adicional noturno, anuênio, adicional de insalubridade, aviso prévio, férias com 1/3, 13º salários e FGTS (8%+40%), em razão da reversão da justa causa. Indevidos reflexos em DSR’s por se tratar de mensalista. Saliento que o vale-alimentação tem valor fixo e não é alterado pela base salarial encontrada a partir do deferimento do piso nacional de técnico de enfermagem, em razão do que rejeito o pedido no particular. Acolho parcialmente o pedido, nestes termos. Devolução de descontos – parcela EC-127: A laborista assevera que consta do holerite de junho de 2024 o crédito de R$ 1.220,45 na rubrica 823, mas o desconto do mesmo valor sob o título 825, levando ao saldo zero; que tal procedimento se repetiu em março do mesmo ano, sendo que houve o “repasse da verba do Piso Nacional da Enfermagem no importe de 2 x R$1.220,45 na rubrica 813 e 817”, que porém “lançou a desconto o mesmo valor de 2 x R$1.220,45 nas rubricas 601 e 810”; que isso ocorreu ainda no TRCT, com o lançamento do crédito 95.3 do valor citado e desconto de débito na rubrica 15.1 de mesmo valor. Requer a devolução dos descontos irregulares atinentes à parcela EC 127-10. Em contestação, o Reclamado justifica que “os valores somente foram abatidos pelo fato de já terem sido quitados, configurando-se como adiantamento, conforme se comprova pelos documentos em anexo”. Examino. Conquanto o Reclamado alegue que os descontos tenham sido realizados em razão de já ter sido realizado o pagamento anteriormente, nada comprova a este título (artigo 464 da CLT), ficando no vazio as alegações neste sentido. Assim, acolho para determinar a devolução dos descontos efetuados em março, junho e agosto de 2024 a título de “REPASSE EC 127 [...] SAIDA”. Diferenças salariais decorrentes da inobservância do piso: A Reclamante aduz que o Reclamado não observou o piso salarial estabelecido para sua função no Acordo Coletivo de Trabalho de 2017/2018, colacionado com a peça vestibular, cuja aplicação perdurou até 30/4/2018; que posteriormente não foram celebradas novas tratativas coletivas entre os Sindicatos das categorias econômica e profissional e tampouco entre aqueles e o Reclamado, pelo que seu piso salarial passou a ser o estadual/regional; que, porém, a partir de agosto de 2022, a Lei nº 14.434/2022 instituiu piso nacional de R$ 3.325,00, o que deve ser respeitado, sendo que a partir de então o piso deve ser acrescido pelo índice do INPC, mais o acréscimo de juros de mora de 1% a. m.. Assim, requer o pagamento da diferença entre tais pisos salariais e o salário efetivamente adimplido, com os reflexos. O Reclamado refuta a pretensão, discorrendo que “sempre pagou valores condizentes com os salários praticados na região para a categoria, conforme se depreende pelas CCT’s ora anexadas, vigentes no Município de Ponta Grossa”; que o piso nacional da enfermagem não é devido a partir de agosto de 2022, mas sim desde maio de 2023 de forma proporcional à jornada, salientando que a obreira recebeu todos os valores destinados pela União para complementação do piso da enfermagem, de forma proporcional à sua jornada de trabalho, não havendo que se falar em diferenças salariais. Pois bem. É incontroverso que, após a CCT 2017/2018, não houve mais a celebração de outras normas coletivas entre as entidades sindicais representativas das categorias econômica e profissional, tampouco entre o Reclamado e o Sindicato da categoria profissional da Reclamante. Friso ainda que, em 30 de maio de 2022, o Pretório Excelso procedeu ao julgamento da ADPF nº 323, a respeito da Súmula nº 277 do C. TST, sobre a ultratividade das normas coletivas, concluindo pela inconstitucionalidade de referido efeito. Transcrevo: “Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente a presente arguição de descumprimento de preceito fundamental, de modo a declarar a inconstitucionalidade da Súmula 277 do Tribunal Superior do Trabalho, na versão atribuída pela Resolução 185, de 27 de setembro de 2012, assim como a inconstitucionalidade de interpretações e de decisões judiciais que entendem que o art. 114, parágrafo segundo, da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, autoriza a aplicação do princípio da ultratividade de normas de acordos e de convenções coletivas, tudo nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Plenário, Sessão Virtual de 20.5.2022 a 27.5.2022.” Dessa forma, a Convenção Coletiva de Trabalho referida tem seus efeitos limitados ao período de sua vigência, não alcançando, portanto, relações futuras. Por outro lado, inexistindo a previsão de piso salarial definido em Lei Federal, Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho e, tendo em conta que a Lei Estadual nº 18.766/2016 e Decreto nº 435/2023, vigentes à época, estabelecem o salário mínimo regional, impõe-se reconhecer como aplicável ao caso dos autos. Com efeito, o serviço desempenhado pela Reclamante (técnica de enfermagem) enquadra-se na atividade de trabalhadores de técnicos de nível médio, incluída no Grande Grupo Ocupacional 3 da Classificação Brasileira de Ocupações, conforme anexo dos mencionados diplomas legais. Neste diapasão, ela faz jus a diferenças salariais entre o salário adimplido e aquele fixado pela Lei Estadual n.º 18.766/2016 e pelo Decreto nº 435/2023 para o “Grupo 3”, observadas suas respectivas vigências e alterações por leis posteriores no curso do período do contrato de trabalho estabelecido entre a Reclamante e o Reclamado. Porém, a Lei nº 14.434/2022 instituiu piso nacional aos profissionais da área de enfermagem, estipulando que os técnicos de enfermagem (função ocupada pela demandante) têm direito a um piso salarial equivalente a 70% do piso nacional do enfermeiro que é de R$ 4.750,00, o que resulta no importe mensal de R$ 3.325,00. “In verbis”: “Art. 1º A Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 15-A, 15-B, 15-C e 15-D: "Art. 15-A. O piso salarial nacional dos Enfermeiros contratados sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, será de R$ 4.750,00 (quatro mil setecentos e cinquenta reais) mensais. Parágrafo único. O piso salarial dos profissionais celetistas de que tratam os arts. 7º, 8º e 9º desta Lei é fixado com base no piso estabelecido no caput deste artigo, para o Enfermeiro, na razão de: I - 70% (setenta por cento) para o Técnico de Enfermagem;” (destaquei) Aludida Lei foi objeto de ação declaratória de inconstitucionalidade (ADI 7222), ajuizada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), sendo que, em 4/9/2022, o Exmo. Min. Roberto Barroso concedeu liminar suspendendo seus efeitos: “Diante do exposto, concedo a medida cautelar para suspender os efeitos da Lei nº 14.434/2022, até que sejam esclarecidos os seus impactos sobre: (i) a situação financeira de Estados e Municípios, em razão dos riscos para a sua solvabilidade. Intimem-se, para tal fim, o Ministério da Economia; os vinte e seis Estados-membros e o Distrito Federal; e a Confederação Nacional de Municípios (CNM); (ii) a empregabilidade, tendo em vista as alegações plausíveis de demissões em massa. Intimem-se, para tal fim, o Ministério do Trabalho e Previdência e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS); (iii) a qualidade dos serviços de saúde, pelo alegado risco de fechamento de leitos e de redução nos quadros de enfermeiros e técnicos. Intimem-se, para tal fim, o Ministério da Saúde; o Conselho Nacional de Saúde (CNS); o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass); o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems); e a Federação Brasileira de Hospitais (FBH). Os intimados terão prazo de 60 (sessenta) dias para aportar aos autos os subsídios necessários à avaliação de cada um dos pontos. A medida cautelar se manterá vigente até que a questão seja reapreciada à luz dos esclarecimentos prestados. Inclua-se a presente decisão para ratificação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em sessão virtual.” (destaquei) Em nova decisão, datada de 15/5/2023, o Exmo. Min. Roberto Barroso revogou parcialmente a liminar anteriormente concedida, fixando que: “DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSO LEGISLATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. PISO SALARIAL DOS PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM. ASSISTÊNCIA FINANCEIRA DA UNIÃO. REVOGAÇÃO PARCIAL. 1. A ação. Ação direta de inconstitucionalidade contra a Lei nº 14.434/2022, que institui o piso salarial nacional do enfermeiro, do técnico de enfermagem, do auxiliar de enfermagem e da parteira, a ser aplicado (a) aos profissionais contratados sob o regime celetista; (b) aos servidores públicos civis da União, das autarquias e fundações públicas federais; e (c) aos servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e fundações. 2. A medida cautelar concedida. À falta de indicação da fonte adequada de custeio e considerado o iminente risco de graves prejuízos para os Estados e Municípios, demissões em massa e redução do número de leitos e da qualidade dos serviços de saúde, foi concedida medida cautelar suspendendo os efeitos da lei, até que sobreviesse a avaliação dos impactos da alteração legislativa. Em 19.09.2022, o Plenário do Supremo Tribunal Federal referendou a medida cautelar. 3. A aprovação de emenda constitucional. Na sequência, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional nº 127/2022, pr evendo competir à União, nos termos da lei, prestar assistência financeira aos entes subnacionais, às entidades filantrópicas e aos prestadores de serviços que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS, com vista ao cumprimento dos pisos salariais. Como a lei prevista na própria emenda constitucional ainda não havia sido editada, não foi possível suspender a cautelar. 4. Superveniência da Lei nº 14.581/2023. Em 11.05.2023, porém, foi editada a legislação que regulamenta a EC nº 127/2022, prevendo a abertura de crédito especial ao Orçamento da União, no valor de R$ 7,3 bilhões, para atendimento a essa programação específica. Diante disso, a medida cautelar cumpriu parte do seu propósito, pois permitiu a mobilização dos Poderes Executivo e Legislativo para que destinassem recursos para custeio do piso salarial pelos entes subnacionais e entidades integrantes da rede complementar do SUS. 5. Observância do princípio federativo. Cabe relembrar, todavia, que lei federal não pode impor piso salarial a Estados e Municípios sem aportar integralmente os recursos necessários para cobrir a diferença remuneratória, sob pena de comprometer sua autonomia financeira, violando o princípio federativo, cláusula pétrea da Constituição brasileira. 6. Impacto sobre o setor privado. Ademais, o financiamento previsto nas normas recém-editadas não reduz nem endereça, de nenhuma forma, o impacto que o piso produz sobre o setor privado, de modo que subsiste o risco de demissões em massa e de prejuízo aos serviços hospitalares. 7. Revogação parcial da cautelar. À vista do exposto, fica revogada parcialmente a cautelar concedida, a fim de que sejam restabelecidos os efeitos da Lei nº 14.434/2022, com exceção da expressão "acordos, contratos e convenções coletivas" constante do seu art. 2º, § 2º, para que seja implementado o piso salarial nacional por ela instituído, nos seguintes termos: (i) em relação aos servidores públicos civis da União, autarquias e fundações públicas federais, a implementação do piso salarial nacional deve ocorrer na forma prevista na Lei nº 14.434/2022; (ii) em relação aos servidores públicos dos Estados, Distrito Federal, Municípios e de suas autarquias, bem como aos profissionais contratados por entidades privadas que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS, a implementação da diferença resultante do piso salarial nacional deve se dar em toda a extensão coberta pelos recursos provenientes da assistência financeira da União; e (iii) em relação aos profissionais celetistas em geral, a implementação do piso salarial nacional deve ocorrer na forma prevista na Lei nº 14.434/2022, a menos que se convencione diversamente em negociação coletiva, a partir da preocupação com demissões em massa ou comprometimento dos serviços de saúde. Essa é a razão do diferimento previsto a seguir. Nesse caso, deve prevalecer o negociado sobre o legislado (RE 590.415, rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. 30.04.2015; ARE 1.121.633, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 02.06.2022). 8. Quanto aos efeitos temporais da presente decisão, em relação aos profissionais referidos nos itens (i) e (ii), eles se produzem na forma da Portaria GM/MS nº 597, de 12 de maio de 2023; e, em relação aos profissionais referidos no item (iii), para os salários relativos ao período trabalhado a partir de 01º.07.2023.” (destaquei) Tal decisão foi referendada pelo Plenário do E. STF, em decisão publicada em 6/7/2023. Ainda, em julgamento de embargos declaratórios, o Plenário atribuiu efeitos modificativos à decisão, firmando o seguinte entendimento: “Decisão: (MC-Ref-segundo-ED) O Tribunal, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração opostos pelo Senado Federal, CNSaúde e Advocacia-Geral da União, com efeitos modificativos, a fim de que: 1) seja alterado o item III e acrescentado o item IV ao acórdão embargado, nos seguintes termos: (iii) em relação aos profissionais celetistas em geral (art. 15-A da Lei nº 7.498/1986), a implementação do piso salarial deve ocorrer de forma regionalizada mediante negociação coletiva realizada nas diferentes bases territoriais e nas respectivas datas base, devendo prevalecer o negociado sobre o legislado, tendo em vista a preocupação com eventuais demissões e o caráter essencial do serviço de saúde. Sendo frustrada a negociação coletiva, caberá dissídio coletivo, de comum acordo (art. 114, § 2º, da CF/88), ou, independentemente deste, em caso de paralisação momentânea dos serviços promovida por qualquer das partes (art. 114, § 3º, da CF/88). A composição do conflito pelos Tribunais do Trabalho será pautada pela primazia da manutenção dos empregos e da qualidade no atendimento de pacientes, respeitada a realidade econômica de cada região. (iv) o piso salarial se refere à remuneração global, e não ao vencimento-base, correspondendo ao valor mínimo a ser pago em função da jornada de trabalho completa (art. 7º, inc. XIII, da CF/88), podendo a remuneração ser reduzida proporcionalmente no caso de carga horária inferior a 8 (oito) horas por dia ou 44 (quarenta e quatro) horas semanais; 2) seja sanado o erro material constante do acórdão embargado, relativamente aos itens 4 e 5 da ementa do voto conjunto lançado na Sessão Virtual de 16 a 23.06.2023; e 3) seja julgada prejudicada a análise da Questão de Ordem suscitada pela Confederação Nacional da Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços — CNSaúde. Por fim, deixou de acolher os demais embargos declaratórios. Ficaram vencidos parcialmente os Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente e Relator), Edson Fachin, Cármen Lúcia e André Mendonça. Redigirá o acórdão o Ministro Dias Toffoli. Plenário, Sessão Virtual de 8.12.2023 a 18.12.2023.” (decisão publicada em 8/1/2024) (destaquei) Do exposto no julgamento da ADI 7222, extraio que a implementação do piso salarial nacional de enfermagem dos “profissionais contratados por entidades privadas que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS” (caso da Reclamante) depende não só da vigência da Lei nº 14.434/2022, mas também do repasse de recursos provenientes da assistência financeira da União, que somente foram viabilizados após a aprovação da EC nº 127/2022 e da Lei nº 14.581/2023. O precedente em análise também estipula que “quanto aos efeitos da presente decisão, em relação aos profissionais referidos nos itens (i) e (ii), eles se produzem na forma da Portaria GM/MS nº 597, de 12 de maio de 2023”. No particular, verifico que consta do artigo 3º da mencionada Portaria a determinação ao FNS (Fundo Nacional de Saúde) de realização de transferências mensais aos entes federados, enquanto o artigo 4º atribui aos gestores o prazo de 30 dias para repasse desses recursos aos estabelecimentos de saúde, depreendendo-se, assim, que a aplicação do piso fixado pela Lei nº 14.434/2022 e seu pagamento aos trabalhadores não é imediato, dependendo do trâmite estabelecido, havendo, também, modulação de efeitos a partir de maio de 2023, tal como sustentado na defesa do Reclamado. Outrossim, conforme consta da decisão resolutiva de embargos declaratórios supramencionada – entendimento que está em consonância com a OJ nº 358, I, da SDI-1, do C. TST –, o piso nacional da enfermagem diz respeito à remuneração global e seu valor foi arbitrado levando em conta a carga semanal de 44 horas, de modo que o trabalhador que se ativa em jornada inferior faz jus ao seu recebimento de forma proporcional. No caso, o Reclamado sustenta que adimpliu o piso de técnico de enfermagem previsto na Lei nº 14.434/2022 a partir de maio de 2023 de forma proporcional à jornada. Também, observo que a Reclamante se ativava em regime 12x36, perfazendo carga horária contratual de 36 horas semanais e 180 horas mensais (fls. 329/348). E da leitura dos holerites e TRCT, evidencio a quitação de valores em alguns meses sob a rubrica “REPASSE EC 127”, inclusive na rescisão (fls. 46/60 e 280/297 – destaquei). Ocorre que, tal como apontado em impugnação (fls. 427/428), constato que o Reclamado não integrava a dita parcela à remuneração obreira para fins de gerar reflexos em outras rubricas, do que sobressai a existência de diferenças devidas. A título ilustrativo, em julho de 2024, a base de cálculo do INSS e do FGTS foi de R$ 2.294,01 (somatório das verbas salário, adicional noturno, DSR sobre adicional noturno e adicional de insalubridade, sem incluir o “repasse EC 127” – fl. 60). Assim, condeno o Reclamado ao pagamento de diferenças salariais até abril de 2023 entre o salário adimplido à Reclamante e aquele fixado pela Lei Estadual nº 18.766/2016 e pelo Decreto nº 435/2023 para o “Grupo 3”. Ainda, são devidos reflexos de tais diferenças em adicional de insalubridade, adicional noturno, horas extras, anuênio, aviso prévio, 13º salário, férias acrescidas do terço constitucional e FGTS (8%+40%), ante a reversão da justa causa aplicada. Porém, são indevidos reflexos em DSR’s, pois a Reclamante é mensalista. Por fim, quanto ao lapso a partir de maio de 2023 são devidos reflexos das parcelas quitadas a título de “REPASSE EC-127” nas mesmas rubricas acima especificadas. Acolho parcialmente os pedidos, nestes termos. Diferenças de adicional de insalubridade: A Reclamante assevera que sempre recebeu adicional de insalubridade com base no salário nominal, e não no salário mínimo, o que se tornou um direito adquirido, de modo que, caso deferidas diferenças decorrentes da inobservância do piso regional de salários e do piso nacional de enfermagem, são devidas diferenças de adicional de insalubridade. Ressalta, também, que o percentual correto devido é de 40%, e não de 20% como pago, uma vez que fazia parte de suas funções dar banho nos pacientes internados, tocar as fraldas e curativos, com contato direto com fezes, urina e sangue humano, saliva e outras secreções, o que poderá ser comprovado por perícia técnica. Postula, assim, o deferimento de diferenças de adicional de insalubridade e reflexos. Em contestação, o Reclamado aduz que o adicional em comento é devido sobre o salário mínimo, bem como nega o alegado direito ao percentual de 40%, uma vez que a obreira não laborava em setor de isolamento em contato com doenças infectocontagiosas. Analiso. Em tópico retro já estão sendo deferidos reflexos em adicional de insalubridade das diferenças derivadas da inobservância do piso regional de salários (até abril de 2023), bem como decorrentes da integração da rubrica “REPASSE EC-127” (a partir de maio de 2023). Friso que o adicional de insalubridade é salário-condição, sendo devido apenas àqueles que efetivamente se sujeitam a condições insalubres de trabalho. Ademais, tratando-se de questão de cunho eminentemente técnico, imperiosa a necessidade de aferição técnica de todo o ambiente laborativo, de modo a se poder concluir pela efetiva exposição à insalubridade em grau máximo. Uma vez que a obreira silencia quanto à produção da imprescindível prova técnica pericial, autorizando o encerramento da instrução processual, a improcedência do pleito em epígrafe, nos moldes dos artigos 193 e 195, § 2º, da CLT, é medida que se impõe. Rejeito. Intervalo intrajornada: A Reclamante assevera que dispunha de somente 15min de intervalo intrajornada, requerendo, assim, o pagamento do tempo suprimido, com o adicional de 50%, com as repercussões. Pois bem. A despeito da impugnação lançada aos espelhos de ponto juntados aos autos (fls. 329/348), não há prova robusta a infirmar aquela documentalmente constituída, já que a prova oral colhida não se mostra apta a tal desiderato, sequer tendo versado sobre o tema. Saliento que no período em que consta o registro “manutenção do relógio ponto”, prevalece a pré-assinalação constante dos documentos, autorizada pelo artigo 74, § 2º, da CLT, eis que não infirmada por prova em contrário. Tendo em vista que os cartões de ponto tidos como válidos não indicam suposta violação intervalar, rejeito o pedido no particular. Horas extras: A laborista argumenta que as horas extras quitadas na rescisão não integraram sua remuneração, postulando, assim, o deferimento de reflexos. Sem razão. Da análise do TRCT, verifico o pagamento da parcela “95.2 D.S.R. S/ HORA EXTRA 50% 4 D”. Diante disso, não comprovada a existência de diferenças de reflexos devidas (artigo 818, I, da CLT), indefiro o pedido. Multa do artigo 467 da CLT: Em não havendo parcelas rescisórias incontroversas, indefiro a multa prevista no artigo 467 da CLT. Compensação/dedução: Rejeito o pedido de compensação por não haver qualquer dívida da parte empregada para com o empregador provada capaz de justificar a extinção recíproca de obrigações. As deduções, quando cabíveis, restam autorizadas em itens próprios. Juros e correção monetária: Os índices de atualização monetária e juros de mora seguirão os parâmetros definidos pela OJ EX SE nº 6 deste E. Regional. A atualização monetária, quanto aos salários, deve ser apurada a partir do mês seguinte ao da prestação dos serviços, em atenção ao que estabelece o artigo 459, parágrafo único, da CLT, mesmo na hipótese de o pagamento dos salários ser efetuado pelo empregador ainda dentro do mês trabalhado, porque o que se deve considerar é o momento em que esse salário era efetivamente exigível, conforme Súmula nº 381 do C. TST. Contribuições previdenciárias e fiscais: Natureza das verbas contempladas nesta decisão na forma do artigo 28, § 9º, da Lei nº 8.212/91, devendo os recolhimentos previdenciários (de empregador e empregado) ser efetuados pela parte Reclamada, mas autorizada a dedução dos valores cabíveis à parte Reclamante (Súmula nº 368, III, do C. TST), sendo que o artigo 33, § 5º, da mesma Lei não repassa ao empregador a responsabilidade pelo pagamento do valor relativo ao empregado, mas tão somente a responsabilidade pelo recolhimento (OJ nº 363, da SBDI-I, do C. TST). Verifico que o Reclamado junta documento comprobatório de renovação do CEBAS (Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social) até 31/12/2025 (Portaria SAES/MS nº 1.234, de 8/1/2024 – fl. 208). Dessa forma, faz jus à imunidade prevista no artigo 195, § 7º, da CF/88, ficando isento da cota patronal da contribuição previdenciária. Autorizo, ainda, a retenção do imposto de renda incidente sobre o valor tributável da condenação, cujo recolhimento deve ser comprovado nos autos, no prazo de 15 dias (artigo 28 da Lei nº 10.833/2005). Conforme nova redação da Súmula nº 368 do E. TST (alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 16/4/2012), “O imposto de renda decorrente de crédito do empregado recebido acumuladamente deve ser calculado sobre o montante dos rendimentos pagos, mediante a utilização de tabela progressiva resultante da multiplicação da quantidade de meses a que se refiram os rendimentos pelos valores constantes da tabela progressiva mensal correspondente ao mês do recebimento ou crédito, nos termos do art. 12-A da Lei nº 7.713, de 22/12/1988, com a redação conferida pela Lei nº 13.149/2015, observado o procedimento previsto nas Instruções Normativas da Receita Federal do Brasil”. Por força do artigo 404 do CC/02 e seguindo posicionamento do E. TST a respeito da matéria, o cálculo não deverá computar o imposto de renda sobre juros, inclusive decorrentes de parcelas salariais. Limitação da condenação aos valores dos pedidos: Em que pese a presente demanda tenha sido ajuizada após a vigência da Lei nº 13.467/2017, a qual inseriu no § 1º do artigo 840 da CLT a obrigação de indicação de valor do pedido, a matéria atinente à limitação da condenação aos valores constantes da petição inicial foi objeto de análise recente no Incidente de Assunção de Competência (IAC) 0001088-38.2019.5.09.0000, julgado pelo Pleno deste E. Regional na sessão de 28/6/2021, que decidiu, por maioria, fixar a Tese Jurídica nº 09, “in verbis”: “INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. POSSIBILIDADE DE INDICAÇÃO ESTIMADA DOS VALORES DOS PEDIDOS APRESENTADOS NA PETIÇÃO INICIAL (ART. 840, § 1º, DA CLT). AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES APRESENTADOS. Diante da interpretação sistemática e gramatical dos artigos 840, §1º da CLT e 12, § 2º, da Instrução Normativa n° 41 do TST, conclui-se, de forma insofismável, que é possível aceitar cálculos simplificados, notadamente considerando que a mera indicação de valores é suficiente para fazer prosseguir a ação, sendo desnecessária a liquidação antecipada dos pedidos. A fixação do valor da causa e da condenação no processo do trabalho só são relevantes na fase de conhecimento do processo, na medida em que servem apenas para fixar rito e admissibilidade recursal, sem interferir em questões de competência funcional. Na fase de cumprimento (execução), o valor do pedido é totalmente irrelevante e se desvincula de sua origem na medida em que se apura mediante realização de operações aritméticas o valor devido, com no mínimo, acréscimo de juros e correção monetária, sem prejuízo de multas, o que certamente vai elevar o valor do quantum debeatur, e isto não pode significar prejuízo ou decréscimo patrimonial à parte exequente. Portanto, reconhece-se neste incidente a possibilidade de apresentação por estimativa dos valores de cada pedido (artigo 840, §1º da CLT), não estando a liquidação adstrita aos valores indicados na petição inicial.” Portanto, considerando que as decisões proferidas em julgamento de IAC pelo Tribunal Pleno constituem precedente de observância obrigatória no âmbito deste Regional, reconheço que a liquidação de sentença não está adstrita aos valores indicados na petição inicial, os quais tratam de meras estimativas. Justiça gratuita e honorários advocatícios: Nos termos do artigo 791-A da CLT, considerando que os pedidos são julgados parcialmente procedentes, defiro honorários de sucumbência para os procuradores da Reclamante, no montante de 10% sobre o valor da condenação apurado na fase de liquidação de sentença, sem a dedução dos descontos fiscais e previdenciários atinentes ao trabalhador, à luz da OJ nº 348 da SDI-I do TST, porém excluída a cota-parte previdenciária do empregador por esta não compor o crédito daquele. Defiro, ainda, honorários de sucumbência para os procuradores do Reclamado, no montante de 10% sobre o proveito econômico obtido, calculado sobre os valores descritos na petição inicial para os pedidos julgados totalmente improcedentes, cujo valor também deverá ser apurado em liquidação de sentença. Os honorários são fixados considerando o grau de zelo dos procuradores das partes, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa bem como o trabalho realizado pelos profissionais (artigo 791-A, § 2º, da CLT). É vedada a compensação de honorários (§ 3º do artigo 791-A da CLT). Haja vista que a declaração de insuficiência econômica juntada com a inicial (fl. 37) não é infirmada por prova em contrário, considero que resta comprovada a insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo, razão pela qual concedo à Reclamante o benefício da Justiça Gratuita, na forma do artigo 790, § 4º, da CLT. Ainda, esclareço que a execução dos honorários de sucumbência devidos pela Reclamante seguirá o entendimento do C. STF, conforme decisão proferida na ADI nº 5766. Por fim, quanto ao pedido do Reclamado, ainda que a pessoa jurídica faça jus ao benefício da justiça gratuita, nos termos das Súmulas nº 481 do E. STJ e nº 463 do C. TST, não se pode olvidar que recebe tratamento distinto da pessoa física, não sendo suficiente ao deferimento a mera declaração de insuficiência econômica, devendo demonstrar de forma patente sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais. Considerando que o demandado não comprova suficientemente a ausência de condições econômicas para arcar com as despesas processuais (não sendo suficiente para tanto o CEBAS), a rejeição do pedido de justiça gratuita é medida que se impõe. Ante o exposto, na ação movida por Juliana de Almeida Timoteo em face de IDF – Instituto Doutor Feitosa, decido: - deferir o benefício da justiça gratuita à Reclamante; - julgar parcialmente procedentes os pedidos para condenar o Reclamado ao pagamento das verbas deferidas na fundamentação, nos termos e parâmetros desta, a qual passa a fazer parte deste dispositivo. Os valores serão apurados em liquidação de sentença, com juros e correção monetária na forma da fundamentação. O Reclamado deverá deduzir e comprovar nos autos os recolhimentos das contribuições previdenciárias e imposto de renda incidentes sobre a remuneração paga por força desta sentença, observados os limites legais e hipóteses de isenção, ficando responsável pelo acréscimo de juros e multas decorrentes do atraso nos recolhimentos. O recolhimento dos valores devidos ao INSS deverá observar o Ato Declaratório Executivo CODAR nº 2, de 5/1/2023, que criou o código “6092 - Contribuições Previdenciárias - Recolhimento Exclusivo pela Justiça do Trabalho”, mediante apresentação nos autos do Documento de Arrecadação de Receitas Federais (DARF), o qual deve ser gerado dentro do programa DCTFWeb, sob pena de expedição de ofício à Receita Federal do Brasil, visando à aplicação da multa prevista no artigo 32-A da Lei nº 8.212/1991. Custas de R$ 600,00, calculadas sobre o valor da condenação, ora arbitrado em R$ 30.000,00, pelo Reclamado. Honorários advocatícios na forma da fundamentação. Intimem-se as partes. Cumpra-se após o trânsito em julgado. JOCELIA MARA MARTINS SAMAHA Juíza Titular de Vara do Trabalho
Intimado(s) / Citado(s)
- IDF - INSTITUTO DOUTOR FEITOSA
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