Processo nº 5002792-30.2024.8.24.0041
ID: 280453546
Tribunal: TJSC
Órgão: Gab. 01 - 4ª Câmara de Direito Público
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5002792-30.2024.8.24.0041
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOSE SERGIO DA SILVA CRISTOVAM
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5002792-30.2024.8.24.0041/SC
APELADO
: ESCRITORIO CENTRAL DE ARRECADACAO E DISTRIBUICAO ECAD (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: JOSE SERGIO DA SILVA CRISTOVAM (OAB SC016298)
DESPACHO/DECISÃO
1. Em at…
Apelação Nº 5002792-30.2024.8.24.0041/SC
APELADO
: ESCRITORIO CENTRAL DE ARRECADACAO E DISTRIBUICAO ECAD (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: JOSE SERGIO DA SILVA CRISTOVAM (OAB SC016298)
DESPACHO/DECISÃO
1. Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com absoluta fidelidade o trâmite processual na origem:
Cuida-se de "
Ação Declaratória e Condenatória com pedido de Antecipação de Tutela e de Tutela Inibitória
", movida por ESCRITORIO CENTRAL DE ARRECADACAO E DISTRIBUICAO ECAD em face do MUNICÍPIO DE MAFRA/SC, ambos qualificados.
Relata, em síntese, que: a parte requerida promoveu diversos eventos musicais, com o consequente uso de obras literomusicais, musicais e fonogramas; a despeito disso, não se observou o recolhimento dos direitos autorais.
Requereu, em razão disso:
a) a concessão da tutela inibitória, inaudita altera parte, a fim de que, dando-se cumprimento ao art. 105 da Lei 9.610/98, seja expedido mandado judicial ordenando a suspensão ou interrupção da execução de obras musicais, lítero-musicais e fonogramas, enquanto não for providenciada a prévia e expressa autorização dos direitos autorais, sem prejuízo da multa a ser fixada por Vossa Excelência (que ora requer no mínimo de R$ 1.000,00 por obra musical indevidamente executada); não se olvidando esse MM. Juiz, em caso de descumprimento desta decisão, ordenar as medidas que se façam necessárias ao estabelecimento da ordem, nos termos do artigo 294, parágrafo único, artigo 497 c/c artigo 537 do CPC, inclusive, com a apreensão e lacre da aparelhagem sonora que será utilizada na consecução do ilícito; b) alternativamente, e ainda em caráter antecipatório da tutela, com escopo no art. 497, do CPC, que seja determinado ao réu que efetue o recolhimento ao ECAD ou o depósito judicial dos valores relativos aos direitos autorais, no montante equivalente a 15% da receita bruta estimada para o evento, se houver cobrança de ingressos e se tratar de som mecânico ou 10% em caso de música ao vivo; ou, ainda, a 10% sobre o orçamento total do evento, se não houver cobrança de ingresso, conforme previsto no Regulamento de Arrecadação do ECAD, TUDO, sob pena de suspensão das execuções musicais que estiverem programadas e consequente lacre e/ou imposição de multa pecuniária substancial e apta à reprovação, como forma de fazer valer seu cumprimento e vigência; c) a citação do réu no endereço preambularmente indicado, para, querendo, responder aos termos da presente ação no prazo legal, sob pena de confissão e revelia, determinando-se ao mesmo que apresente nos autos, na oportunidade da resposta, os orçamentos totais dos eventos em questão, acompanhado dos seguintes documentos: cópias dos contratos e documentos contábeis e fiscais, atinentes ao custo musical dos eventos em comento, trazendo os contratos das bandas, artistas, trios e congêneres, bem como contratos com equipamentos de som, montagem de palco, serviços técnicos de qualquer natureza e todos os aportes feitos por eventuais patrocinadores, sob pena de se considerar os valores do REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO CONSOLIDADO, ou liquidação por arbitramento, perícia, busca e apreensão de documentos, tudo a fim de mensurar o montante a ser liquidado, com a procedência dos pleitos aqui alinhados; d) o julgamento pela total procedência dos pedidos, com o reconhecimento do direito pleiteado, nos termos e com fundamento nas razões fáticas e jurídicas acima alinhadas, sendo condenado o réu ao pagamento da retribuição autoral, decorrente execução pública de obras musicais ocorrida nos eventos (descritos no item 1 dessa exordial): d.1) à razão de 10% sobre a receita bruta auferida (valor arrecadado com a venda de ingressos, camarotes, passaportes, etc.), relativamente aos eventos em que houve a cobrança de ingressos; e, d.2) à razão de 10% do total do orçamento do evento, calculadas nos termos do Regulamento de Arrecadação do ECAD ou sucessivamente, de acordo com o critério de parâmetro físico, caso o demandado se negue a prestar informações sobre o orçamento dos eventos, relativamente aos eventos em que não houve cobrança de ingressos; e) o julgamento pela total procedência dos pedidos, com o reconhecimento do direito pleiteado, nos termos e com fundamento nas razões fáticas e jurídicas acima alinhadas, sendo condenado o réu ao pagamento da retribuição autoral decorrente execução pública de obras musicais, à razão de 10% do total do orçamento de cada evento realizado, e calculadas nos termos do Regulamento de Arrecadação do ECAD, ou sucessivamente, de acordo com o critério de parâmetro físico, caso o réu se negue a prestar informações sobre o orçamento obtido nos eventos (descritos no item 1 dessa exordial): f) a confirmação da tutela inibitória a fim de que seja julgada procedente a presente ação, para que se imponha ao réu a proibição do uso de obras lítero-musicais e de fonogramas nos eventos futuros, sob cominação de pena pecuniária, até que diligencie, junto ao ECAD, a obtenção da autorização (prévia) exigida em lei; g) seja julgado procedente o pedido de condenação do réu, em perdas e danos, que se subsumam na retribuição autoral pertinente aos eventos citados nesta inicial, bem como pela execução desautorizada de obras musicais levadas a efeito em todos os eventos a serem promovidos pelo réu a partir da presente ação (eventos futuros), a serem calculados de acordo com o Regulamento de Arrecadação do ECAD, conforme os valores e critérios expostos na exordial;
O pedido de tutela de urgência foi indeferido (evento 11).
Citada, parte ré apresentou contestação ao evento 17, sustentando, preliminarmente, que é parte ilegítima para figurar no polo passivo, eis que a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais na hipótese de execução de obra musical em evento realizado por empresa contratada para esse fim, mediante licitação, não pode ser transferida para a Administração. No mérito, alegou ausência de provas suficientes acerca dos fatos narrados.
Intimadas quanto ao interesse na produção de provas (evento 21), postularam pelo julgamento antecipado da lide (eventos 25 e 27).
Sobreveio sentença (
evento 29, SENT1
, origem), nos seguintes termos:
DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos inaugurais formulados pelo ESCRITORIO CENTRAL DE ARRECADACAO E DISTRIBUICAO ECAD contra o MUNICÍPIO DE MAFRA para o fim de CONDENAR o réu ao pagamento das contribuições devidas pela execução de obras musicais, literomusicais e fonogramas, nos termos do art. 98 da Lei Federal nº 9.610/1998, nos eventos discriminados na inicial.
Os valores deverão ser apurados em liquidação de sentença, de acordo com o Regulamento de Arrecadação vigente na época de cada fato gerador e pagos em uma única parcela.
Consectários legais
As condenações judiciais de natureza administrativa em geral sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa
Selic
, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.
Tais índices, no entanto, serão aplicados até 08/12/21.
A partir daí (09/12/21) incidirá a SELIC
, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional n. 113, de 08/12/21 (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5048216-92.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Fernando Boller, Primeira Câmara de Direito Público, j. 22-11-2022).
Diante da sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, com fundamento no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
A parte ré é isenta de custas processuais (art. 7º, I, da Lei n. 17.654/2018).
Decisão não sujeita à remessa necessária (art. 496, § 3º, III, do CPC).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitado em julgado, arquivem-se.
Irresignada, a parte ré interpôs recurso de apelação (
evento 35, APELAÇÃO1
, origem). Em suas razões recursais, em suma, alegou que: a)
"a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais na hipótese de execução de obra musical em evento realizado por empresa contratada para este fim, mediante licitação, não pode ser transferida para a administração, salvo se comprovada a ação culposa, quanto ao dever de fiscalizar o cumprimento dos contratos públicos"
; b)
"este entendimento é da Terceira Turma do Tribunal de Justiça de Minas Gerais"
; c) "
os encargos relativos ao recolhimento de direitos autorais deveriam ser custeados pelas empresas contratadas para eventos"
; d)
"os documentos que fundamentam o pedido, não são suficientes para comprovar que de fato os eventos foram realizados pelo município de Mafra".
Por fim, requereu nos seguintes termos:
IV - DOS PEDIDOS E REQUERIMENTOS
Por todo o exposto e nos termos da fundamentação supra, requer o recebimento do presente recurso, com efeito suspensivo,
Requer ainda em sede preliminar, a declaração da tempestividade do presente recurso, para posterior conhecimento do mesmo e de suas razões, para ao final promover a reforma da sentença, no sentido de julgar improcedente os pedidos formulados pelo autor.
a condenação do apelado em custas e honorários de sucumbência, nos termos do que prevê o CPC. Nestes termos, pede e espera deferimento.
Contrarrazões apresentadas pela parte adversa, (
evento 41, CONTRAZAP1
, origem), manifestando-se pelo não conhecimento do apelo, invocando o princípio da dialeticidade. No mérito, pugnou pela manutenção da sentença.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
DECIDO.
2. De plano, ressalto que a matéria debatida no presente recurso conta com precedentes idênticos da jurisprudência, o que autoriza o julgamento monocrático da questão, vez que a
mens legis
do artigo 932, IV e V, do CPC é, justamente, fomentar solução mais breve aos casos em que existente uniformidade no questionamento posto pela via recursal.
Não se olvide, ainda, o disposto no artigo 132, XV e XVI, do RITJSC, o qual permite ao relator julgar monocraticamente o recurso, à vista de
"enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça
".
3. Como visto por intermédio do relatório, a parte autora, em sede de contrarrazões, roga pelo não conhecimento do apelo interposto pela parte ré, invocando ofensa ao princípio da dialeticidade recursal.
Pois bem.
Compulsando a insurgência, ao contrário da asserção construída pela parte apelada, tenho que a renovação dos argumentos, enquanto manejada de forma inteligível para este julgador, não obsta o seu conhecimento. Isso pois, à luz do caráter devolutivo da apelação, é plenamente cabível a rediscussão da matéria neste juízo
ad quem,
até porque, sabe-se:
"o recurso é a reiteração do exercício do direito de ação, no segundo grau de jurisdição."
(JUNIOR NERY, Nelson. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 2055).
Assim, ao contrário do que sustenta a parte recorrida, constato que o raciocínio deduzido no recurso da requerida dialoga com as razões do veredito a quo, dado que o ataca justificando o que entende por equivocado.
Colhe-se deste Sodalício:
RECURSO DO AUTOR. AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES PELA REQUERIDA. INSUBSISTÊNCIA. DEVOLUÇÃO DA MATÉRIA DEBATIDA NO PRIMEIRO GRAU. ATENDIMENTO AO DISPOSTO NO ARTIGO 514, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (ART. 1.010, II E III, DO NCPC). REGULARIDADE FORMAL DO RECURSO EVIDENCIADA. CONHECIMENTO QUE SE IMPÕE. (AC n. 0020566-13.2013.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Denise Volpato, j. 9/5/2017).
Dessa feita, por estarem preenchidos os requisitos esculpidos no art. 1.010 do Código de Processo Civil, não há falar em ofensa ao princípio da dialeticidade. Em decorrência, rechaço a preambular.
3.1. Estando presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso.
3.2. Frise-se que a demanda possui natureza meramente particular ou patrimonial, e não se enquadra nas hipóteses de intervenção do Ministério Público como fiscal da ordem jurídica, previstas nos artigos 127 da Constituição Federal e 178 do Código de Processo Civil. Em hipóteses semelhantes, aliás, o parquet reiteradamente manifesta-se pela ausência de interesse na causa.
4. A parte recorrente pugna que o reclamo seja recebido em ambos os efeitos, pretendendo assim seja concedido o efeito suspensivo à hipótese.
No entanto, verifica-se que há a perda superveniente do objeto desse pedido ante o julgamento do recurso de apelação.
Sobre o tema, colhe-se da decisão deste Sodalício:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. MENSALIDADE EM CURSO DE ENSINO SUPERIOR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL.
PLEITO DE CONCESSÃO DO EFEITO SUSPENSIVO AO RECLAMO. PETITÓRIO PREJUDICADO ANTE O JULGAMENTO EM DEFINITIVO DO MÉRITO
. [...] (TJSC, Apelação n. 0000979-69.2008.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. André Carvalho, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 16-03-2021 - grifou-se).
Dessa forma, reconheço a perda superveniente do objeto tocante ao pedido de atribuição de efeito suspensivo ao presente inconformismo.
5. No mérito, adianto que não há como conferir provimento ao recurso.
Com efeito, sobre o tema ora abordado, a Constituição Federal dispõe em seu art. 5º,
in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas;
Acerca da temática, a Lei n. 9.610/98, que altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências, preconiza em seu art. 68:
Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas, em representações e execuções públicas.
§ 1º Considera-se representação pública a utilização de obras teatrais no gênero drama, tragédia, comédia, ópera, opereta, balé, pantomimas e assemelhadas, musicadas ou não, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, em locais de freqüência coletiva ou pela radiodifusão, transmissão e exibição cinematográfica.
§ 2º Considera-se execução pública a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica.
§ 3º Consideram-se locais de freqüência coletiva os teatros, cinemas, salões de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de qualquer natureza, lojas, estabelecimentos comerciais e industriais, estádios, circos, feiras, restaurantes, hotéis, motéis, clínicas, hospitais, órgãos públicos da administração direta ou indireta, fundacionais e estatais, meios de transporte de passageiros terrestre, marítimo, fluvial ou aéreo, ou onde quer que se representem, executem ou transmitam obras literárias, artísticas ou científicas.
§ 4º Previamente à realização da execução pública, o empresário deverá apresentar ao escritório central, previsto no art. 99, a comprovação dos recolhimentos relativos aos direitos autorais.
§ 5º Quando a remuneração depender da freqüência do público, poderá o empresário, por convênio com o escritório central, pagar o preço após a realização da execução pública.
§ 6º O usuário entregará à entidade responsável pela arrecadação dos direitos relativos à execução ou exibição pública, imediatamente após o ato de comunicação ao público, relação completa das obras e fonogramas utilizados, e a tornará pública e de livre acesso, juntamente com os valores pagos, em seu sítio eletrônico ou, em não havendo este, no local da comunicação e em sua sede.
§ 7º As empresas cinematográficas e de radiodifusão manterão à imediata disposição dos interessados, cópia autêntica dos contratos, ajustes ou acordos, individuais ou coletivos, autorizando e disciplinando a remuneração por execução pública das obras musicais e fonogramas contidas em seus programas ou obras audiovisuais.
§ 8º Para as empresas mencionadas no § 7º, o prazo para cumprimento do disposto no § 6o será até o décimo dia útil de cada mês, relativamente à relação completa das obras e fonogramas utilizados no mês anterior.
Desse modo, tem-se que, para fins de direitos autorais a serem recolhidos ao ECAD, mostra-se irrelevante o fato da festividade realizada - que reproduziu obras musicais - ter ou não intuito lucrativo. Esse é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:
"(...) A partir da vigência da Lei nº 9.610/1998, a obtenção de lucro por aquele que executa publicamente obras musicais passou a ser aspecto juridicamente irrelevante quando se trata do pagamento de direitos autorais, regra na qual se incluem as rádios comunitárias.2. Agravo regimental não provido."
(AgRg no REsp 1420223/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/08/2016, DJe 08/08/2016).
Nesta senda:
"[...] É atualmente pacífico (e sempre foi justo) que o Poder Público responde pelos direitos autorais relativos aos eventos que promove, pouco importando intuito lucrativo. As obras artísticas devem ser remuneradas pela só utilização, não dependendo de um circunstancial atrelamento a vínculo negocial. O regime é estatutário: a só veiculação de música, por exemplo, traz para o artista o direito ao pagamento, decorrência inclusive da estatura constitucional da prerrogativa."
(TJSC, Apelação n. 5000162-82.2019.8.24.0103, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 09-12-2021).
Outrossim: "
(...) A cobrança afigura-se devida mesmo que o evento musical tenha sido oferecido gratuitamente ao público ou o pagamento de cachê tenha sido dispensado pelos artistas. Desnecessária a identificação das músicas e dos respectivos autores para a cobrança dos direitos autorais devidos, sob pena de inviabilizar-se o sistema e o consequente prejuízo dos titulares dos direitos autorais. O quantum devido a título de direitos autorais segue o Regulamento de Arrecadação e a tabela de preços previamente elaboradas e aprovadas por autores e compositores"
(TJSC, AC 2010.051378-0, rel. Joel Figueira Júnior, j. 15-8-2013).
Ademais, tendo ocorrida a exibição de obra artística, o fato gerador da cobrança pelo Ecad está configurado, sendo desnecessária a identificação das músicas e respectivos autores para a cobrança devida dos direitos autorais.
Nesta direção, extrai-se da decisão deste Areópago:
"(...) O STJ conferiu legitimidade ao ECAD para expor o valor a ser cobrado pelas exibições de obras artísticas. Bem revelados os fatos associados, a instituição está autorizada a exigir o pagamento de seus respectivos direitos autorais se valendo de seus próprios cálculos constantes de seu regulamento."
(TJSC, Apelação Cível n. 0016588-64.2013.8.24.0008, de Blumenau, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. em 08/03/2022).
Frise-se que é devido o pagamento de direitos autorais quando o intérprete é o próprio autor. Isso porque, existe diferença entre o cachê pago ao artista que se apresenta ao vivo e o direito autoral cabível ao autor/compositor da obra executada, de modo que o cachê corresponde ao pagamento pela performance como intérprete, enquanto que os direitos autorais constituem a remuneração pela criação da obra artística.
Nesse sentido, se manifestou a Corte Superior de Justiça:
"(...)É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser 'cabível o pagamento de direitos autorais em espetáculos realizados ao vivo, independentemente do cachê recebido pelos artistas, ainda que os intérpretes sejam os próprios autores da obra' (Min. Paulo de Tarso Sanseverino)." (STJ, Agravo Interno no Recurso Especial n. 1.417.851/SP, rel. Min. Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 17/12/2019).
Ainda, acerca da responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais, dispõe o art. 110, Lei n. 9.610/98, que: "
Pela violação de direitos autorais nos espetáculos e audições públicas, realizados nos locais ou estabelecimentos a que alude o art. 68, seus proprietários, diretores, gerentes, empresários e arrendatários respondem solidariamente com os organizadores dos espetáculos
".
Nesta senda, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento formado no sentido de que
"a obrigação do ente público de recolher os valores relativos aos direitos autorais decorre de sua condição de idealizador e executor da festividade na qual executadas obras musicais em logradouros públicos, nos termos do art. 68, § 3º, da Lei n. 9.610/1998"
(EDcl no AgInt no REsp n. 1.797.700/DF, Quarta Turma, Min. rel. João Otávio de Noronha. Data do julgamento: 12.09.2023).
Na peça vestibular, o ECAD solicita o pagamento da retribuição autoral decorrente dos shows levados a efeito de forma desautorizada, descrevendo os seguintes eventos: Natal Encantado Mafra 2021 (13/12/2021), I Festival de Inverno de Mafra (10/07/2022), Mafra 105 anos - Mafra Fest 2022 (08 à 11/09/2022), Mara + Natal + Cantata de Natal (17 à 23/12/2022), II Festival de Inverno de Mafra (09/07/2023), Mafra 106 anos - II Mafra Fest (07 à 10/09/2023) e Natal Mafra 2023 (10/12/2023).
Da documentação acostada aos autos, verifica-se que o Município de Mafra-SC figurou como promotor/idealizador de todos eventos descritos na exordial, que contaram com diversas apresentações musicais (
evento 1, DOC7
,
evento 1, DOC8
,
evento 1, DOC9
,
evento 1, DOC10
,
evento 1, DOC11
,
evento 1, DOC12
,
evento 1, DOC13
,
evento 1, DOC14
,
evento 1, DOC15
, origem), e, portanto, é responsável solidário pelas obrigações decorrentes da violação dos direitos autorais.
Nesse mesmo norte, já decidiu este órgão fracionário:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE PRECEITO LEGAL (TUTELA INIBITÓRIA) C/C PERDAS E DANOS. COBRANÇA DE DIREITOS AUTORAIS PELO ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD. EXECUÇÃO DE OBRAS MUSICAIS EM EVENTO PÚBLICO E GRATUITO, SEM EXPRESSA AUTORIZAÇÃO E RECOLHIMENTO DOS VALORES DEVIDOS A TÍTULO DE DIREITOS AUTORAIS. OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO.
I. CASO EM EXAME
1. Insurgência do Município de Xavantina, Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD e GDO Produções Ltda. contra a sentença que julgou procedente a ação, para condenar o ente público e a empresa, de forma solidária, ao pagamento dos direitos autorais pela realização dos shows no evento EXPO Xavantina.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. O debate versa sobre as seguintes questões: (i) responsabilidade solidária do Município; (ii) concessão de tutela inibitória; (iii) desnecessidade de liquidação de sentença para apuração dos valores devidos; (iv) nulidade por negativa da prestação jurisdicional, e (v) impugnação à cobrança dos direitos autorais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O Município detém responsabilidade solidária no caso, eis que organizou e contratou o evento sobre o qual recai a cobrança.
4. É desnecessária a incidência de tutela inibitória porque o Município é usuário eventual e os eventos são futuros e incertos; caso ocorram eventos sem a devida autorização e pagamento de direitos autorais, o ECAD dispõe dos meios legais e jurídicos para a cobrança. Desprovimento do agravo retido.
5. Estabelecidos os parâmetros para o cálculo do débito, em conformidade com o Regulamento de Arrecadação do ECAD, é desnecessária a liquidação de sentença. Sobre o montante incidirá correção monetária (IPCA) e juros de mora com indexadores aplicáveis à poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009, desde a data do evento.
6. Nulidade por negativa da prestação jurisdicional não evidenciada. O magistrado não está adstrito aos fundamentos e aos dispositivos suscitados no decurso do processo, cabendo-lhe equacionar a demanda de acordo com o seu livre convencimento motivado.
7. A cobrança de direitos autorais em virtude da execução de obras musicais protegidas em eventos públicos não está condicionada ao objetivo ou obtenção de lucro.
8. Não são necessárias prova da filiação e indicação das obras executadas para validar a cobrança dos direitos autorais pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD.
9. É devido o pagamento de direitos autorais em espetáculos realizados ao vivo, independentemente do cachê recebido pelos artistas, ainda que os intérpretes sejam os próprios autores da obra.
10. O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu a validade da tabela de preços instituída pelo próprio ECAD, não podendo o Poder Público, seja por lei seja por regulamento administrativo, ou o Judiciário modificar tais valores dada a natureza privada dos direitos postulados.
IV. DISPOSITIVO E TESE
11. Os recursos interpostos são conhecidos, para (a) desprover o recurso do Município de Xavantina; (b) dar parcial provimento ao reclamo do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD; e (c) desprover o apelo de por GDO Produções Ltda..
Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.612/1998, art. 110; CPC, art. 509; CF, art. 5º, XXVIII, 93, IX.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 2.098.063/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 7/11/2023; STJ, AgInt no AREsp n. 576.772/DF, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 9/10/2018; STJ, AgInt no REsp n. 1.417.851/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 17/12/2019; TJSC, Apelação n. 5008078-71.2021.8.24.0080, rel. Alexandre Morais da Rosa, Quinta Câmara de Direito Público, j. 26-11-2024; TJSC, Apelação n. 5001427-59.2020.8.24.0047, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 05-11-2024; TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 0313743-87.2016.8.24.0005, rel. Carlos Adilson Silva, Segunda Câmara de Direito Público, j. 10-09-2024. (TJSC, Apelação n. 0300871-79.2015.8.24.0068, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 6-2-2025 - grifou-se).
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE COBRANÇA. ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD. DIREITOS AUTORAIS. EXPOSIÇÃO-FEIRA AGROPECUÁRIA, INDUSTRIAL E COMERCIAL DE CHAPECÓ 2005 - EFAPI. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM.
RECURSO DO ENTE FEDERADO. RESPONSABILIDADE DAS EMPRESAS CONTRATANTES. TESE IMPROFÍCUA. ASSUNÇÃO CONTRATUAL DO PAGAMENTO AO ECAD PELO MUNICÍPIO PERANTE OS EMPRESÁRIOS E PRODUTORES DE EVENTOS. SOLIDARIEDADE PELA VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS
.
PRETEXTADA EXCLUSÃO DAS OBRAS INTERPRETADAS PELOS PRÓPRIOS AUTORES. IMPOSSIBILIDADE. DIREITOS AUTORAIS DEVIDOS. FARTA JURISPRUDÊNCIA. SUSTENTADA ABUSIVIDADE DE EXIGÊNCIA DE 10% SOBRE OS INGRESSOS VENDIDOS. TESE ARREDADA. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA CONFORME CRITÉRIOS DO REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO DO ECAD. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
RECURSO DO AUTOR. FIXAÇÃO DOS VALORES E FORMA DE CÁLCULO CONFORME REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO. ARGUMENTO INAPLICÁVEL. PERCENTUAL EMPREGADO CONGRUENTE AO REFERIDO REGULAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE PARÂMETRO FÍSICO COMO BASE DE CÁLCULO. ARGUIÇÃO DE APLICABILIDADE DO TEMA 905 DO STJ. PROCEDÊNCIA NO PONTO. TEMA N. 810 DO STF. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) PARA FINS DE CORREÇÃO MONETÁRIA. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 113/2021. INCIDÊNCIA DA TAXA SELIC A PARTIR DA PUBLICAÇÃO. ALTERAÇÃO EX OFFICIO. ADEQUADA DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS NA ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
1. Pela violação a direito autoral, respondem, solidariamente, todos os organizadores e promotores do espetáculo (Lei 9.610/1998, arts. 68, § 3º, 86 e 110), em especial aquele que contratualmente assumiu a responsabilidade pela autorização e pagamento do ECAD.
2. Direitos autorais, vinculados à criação da obra, não se confundem com a remuneração recebida pelo artista por sua apresentação em público, sendo plenamente válida, conforme jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, a cobrança de direitos autorais ainda que diante de obras de titularidade dos próprios intérpretes.
3. Possibilidade de utilização da tabela de preços contida no regulamento de arrecadação do próprio ECAD, pois "compete ao autor do direito autoral, diretamente ou por intermédio do ECAD, a fixação dos critérios de cobrança e das importâncias correlatas" (TJSC, Apelação n. 0010161-74.2011.8.24.0023, rel. Des. Paulo Ricardo Bruschi, Quarta Câmara de Direito Público, j. 15-9-2016).
4. Correta a direção dada na origem no que toca o percentual de 10% da receita bruta e redutor de 1/3 pela música ao vivo aplicáveis ao caso, visto que o ente federado é usuário eventual e o evento sub judice se enquadra perfeitamente no item "5 - Execução musical em festas de peão de boiadeiro, exposições ou feiras agropecuárias, industriais ou agrícolas e similares" do Regulamento de Arrecadação.
5. No caso, o autor pugna pela cobrança por parâmetro físico, contudo o Regulamento de Arrecadação apenas apresenta previsão de cobrança sobre percentual de receita bruta, de modo que deve ser utilizado como base de cálculo o valor da receita auferida com a bilheteria do evento.
6. De rigor é a manutenção da distribuição dos ônus sucumbenciais fixados na origem, pois houve o afastamento da aplicação da multa de 10%, a base de cálculo utilizada não foi a inicialmente pleiteada e o percentual aplicado foi o de 10% e não 15%, fatos que substancialmente alteraram o valor final da condenação, afastando a tese de decadência de parte mínima dos pedidos exordiais.
7. A Corte Suprema declarou a inconstitucionalidade da utilização da remuneração oficial da caderneta de poupança para fins de correção monetária, porquanto não se caracteriza como instrumento hábil para reconhecer e repor as variações inflacionárias (Tema 810 do STF).
8. Adicionalmente, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do Tema n. 905, lançou compreensão para balizamento em condenações impostas à Fazenda Pública: "(a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E." (Tema 905 do STJ).
9. A partir de 9 de dezembro de 2021, considerando a vigência da Emenda Constitucional n. 113/2021, "haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente".
10. Sentença reformada para adequação dos consectários legais. Honorários recursais cabíveis. (TJSC, Apelação n. 0002695-20.2006.8.24.0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Diogo Pítsica, Quarta Câmara de Direito Público, j. 01-12-2022 - grifou-se).
De mais a mais, tem-se que: "
esse cenário não seria alterado mesmo considerando eventual obrigação contratual oriunda de processo de licitação ou de inexigibilidade de licitação, porque o ente municipal contratante possui responsabilidade decorrente da fiscalização dos respectivos contratos
"(TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5002479-03.2023.8.24.0042, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Leandro Passig Mendes, Segunda Câmara de Direito Público, j. 25-02-2025).
Desta feita, não há como afastar o encargo do ente municipal, uma vez que, como visto, se trata de responsabilidade solidária e também decorre do dever de fiscalização.
Nessa linha de raciocício, observa-se que o réu não logrou êxito em demonstrar que não foram apresentadas obras musicais, lítero-musicais e/ou fonogramas, tendo também deixado de demonstrar o adimplemento dos valores referentes aos direitos autorais dos eventos públicos realizados, não se desincumbindo do ônus que lhe era inerente, a teor do disposto no art. 373, II, do CPC.
De mais a mais, tem-se que: "
(...) O Superior Tribunal de Justiça já assentou ser válida a tabela de preços instituída pelo próprio ECAD, não podendo o Poder Público, seja por lei seja por regulamento administrativo, ou o Judiciário modificar tais valores em face da natureza privada dos direitos postulados (AgRg no REsp 998.928/RN, rel. Min. Vasco Della Giustina, j. 17.3.2011)"
(TJSC, Apelação Cível n. 2013.014588-5, rela. Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, j. 14-5-2013)" (TJSC, AC 0301878-04.2015.8.24.0005, rel. Raulino Jacó Brüning, j. 19-11-2020).
Assim, o montante deverá ser apurado em liquidação de sentença, tal como determinado no
decisum
combatido.
A propósito, verifico que a questão foi exaurida com maestria pelo juízo a quo, na pessoa do Dr. Yuri Lorentz Violante Frade, devendo a sentença permanecer incólume devido a sua acertada e brilhante fundamentação, que adoto como razões de decidir, transcrevendo-a a fim de evitar tautologia (
evento 29, SENT1
, origem):
Sentencio neste momento processual porque incidente a hipótese do art. 355, I, do Código de Processo Civil, uma vez que os elementos já juntados são suficientes à satisfatória compreensão da lide, que depende unicamente de interpretação jurídica de seus contornos, e não vislumbro possibilidade neste momento de juntada de novos documentos, uma vez que devem acompanhar a inicial e a contestação (art. 434 do CPC), e, após a fase postulatória, trata-se de proceder excepcionalíssimo cujas hipóteses não foram comprovadas (art. 436, parágrafo único, do CPC), além de nada poderem acrescentar outros tipos de prova, como a oral.
Amoldável à previsão legal, o julgamento antecipado não é mera faculdade, mas sim imposição ao juiz, em virtude dos princípios da celeridade e da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da CRFB e art. 4º do CPC).
Presentes as condições ao regular exercício do direito de ação e os pressupostos processuais, adentro o mérito.
O cerne do litígio funda-se na cobrança de valores referentes à retribuição pela execução de obras musicais resguardadas por direitos autorais, em eventos promovidos pelo Município de Mafra entre os anos de 2021 e 2023.
A proteção aos direitos autorais decorrentes de exibição pública de obras musicais em eventos públicos encontra previsão no artigo 5º, XXVII e XXVIII, "b", da Constituição Federal,
in verbis
:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
[...]
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas;
A Lei de Direitos Autorais (n. 9.610/1998), por sua vez, regulamenta a matriz constitucional, estabelecendo regras para a utilização pública de obras musicais, bem como a forma de remuneração pela utilização:
Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas, em representações e execuções públicas.
§ 1º Considera-se representação pública a utilização de obras teatrais no gênero drama, tragédia, comédia, ópera, opereta, balé, pantomimas e assemelhadas, musicadas ou não, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, em locais de freqüência coletiva ou pela radiodifusão, transmissão e exibição cinematográfica.
§ 2º Considera-se execução pública a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica.
§ 3º Consideram-se locais de freqüência coletiva os teatros, cinemas, salões de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de qualquer natureza, lojas, estabelecimentos comerciais e industriais, estádios, circos, feiras, restaurantes, hotéis, motéis, clínicas, hospitais, órgãos públicos da administração direta ou indireta, fundacionais e estatais, meios de transporte de passageiros terrestre, marítimo, fluvial ou aéreo, ou onde quer que se representem, executem ou transmitam obras literárias, artísticas ou científicas.
§ 4º Previamente à realização da execução pública, o empresário deverá apresentar ao escritório central, previsto no art. 99, a comprovação dos recolhimentos relativos aos direitos autorais.
§ 5º Quando a remuneração depender da freqüência do público, poderá o empresário, por convênio com o escritório central, pagar o preço após a realização da execução pública.
No caso concreto, a parte autora pretende cobrar do Município de Mafra os direitos autorais decorrentes dos eventos ocorridos entre os anos de 2021 e 2023, conforme lista abaixo:
A parte ré argumenta sua ilegitimidade para integrar o polo passivo do feito. Defende que a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais na hipótese de execução de obra musical em evento realizado por empresa contratada para esse fim, mediante licitação, não pode ser transferida para a Administração.
Todavia, o art. 110, da Lei Federal n. 9.610/1998 atribui responsabilidade solidária a todos os envolvidos no evento:
Art. 110. Pela violação de direitos autorais nos espetáculos e audições públicas, realizados nos locais ou estabelecimentos a que alude o art. 68, seus proprietários, diretores, gerentes, empresários e arrendatários respondem solidariamente com os organizadores dos espetáculos.
A regra estabelecida no art. 71 da Lei Federal n. 8.666/1993, vigente ao tempo dos eventos, transmite ao contratado pela Administração a responsabilidade exclusiva pelos encargos relacionados à empreitada. No entanto, essa regra não afasta a responsabilidade de fiscalização do Poder Público. Constatada a falha na fiscalização, como no caso dos autos, o ente público responde pelos direitos autorais omitidos pela empresa.
A propósito:
DIREITOS AUTORAIS – EVENTO OFICIAL – CONTRATAÇÃO DE EMPRESA – FALHA NA FISCALIZAÇÃO POR PARTE DA MUNICIPALIDADE – SOLIDARIEDADE – PRESTÍGIO AO STATUS CONSTITUCIONAL DAS PRERROGATIVAS INTELECTUAIS – VALIDADE DA TABELA DO ECAD – CARÁTER LÍQUIDO DA SENTENÇA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – BASE DE CÁLCULO: CONDENAÇÃO – RECURSO PROVIDO.
1. É atualmente pacífico (e sempre foi justo) que o Poder Público responde pelos direitos autorais relativos aos eventos que promove, pouco importando intuito lucrativo. As obras artísticas devem ser remuneradas pela só utilização, não dependendo de um circunstancial atrelamento a vínculo negocial. O regime é estatutário: a só veiculação de música, por exemplo, traz para o artista o direito ao pagamento, decorrência inclusive da estatura constitucional da prerrogativa.
2. A contratação de empresa para gerenciamento de evento público não deve alterar a responsabilidade da Administração. A Lei de Direitos Autorais prestigia a solidariedade (art. 110). É regra especialíssima para esse ramo jurídico. A jurisprudência, porém, tende a empregar o art. 71 da Lei 8.666/93 (que é constitucional: STF, ADC 16), o qual, de regra, transmite ao contratado pela Administração a responsabilidade exclusiva pelos encargos relacionados à empreitada (como obrigações tributárias e "comerciais"). Se, de todo modo, houver falha na "fiscalização", é o que diz a jurisprudência, a Fazenda Pública responde pelos direitos autorais omitidos pela empresa contratada. Caso em que essa deficiência ficou demonstrada.
3. O Ecad tem legitimidade para expor o valor a ser cobrado pelas exibições de obras artísticas. Bem revelados os fatos associados, o montante devido resultará de operação algébrica. A sentença será líquida, qualidade que não é prejudicada pela simples necessidade de futura realização de cálculos (arts. 524 do CPC). Nesse sentido, liquidação propriamente dita apenas ocorre nas modalidades por arbitramento ou por procedimento comum (art. 509, incs. I e II). Ajuste da condenação para afastar a eventual aplicação desse rito posterior à fase de conhecimento (que apenas dependerá de memória de cálculo).
4. A base de apuração dos honorários advocatícios é regida pelo art. 85 do NCPC, que estipula que a verba deve ser medida a partir de relação percentual (sucessivamente) com o montante da condenação, do proveito econômico ou do valor atribuído à causa. Daí se retira que, possível a medição da grandeza econômica em disputa, a base de cálculo do estipêndio deve respeitar aquela literal previsão.
5. Recurso provido para reconhecer a solidariedade da Administração, o caráter líquido da condenação e atrelar a honorária a esse valor. (TJSC - AC nº 5000162-82.2019.8.24.0103, Quinta Câmara de Direito Público, j. 09/12/2021).
O fato de serem eventos gratuitos também não afasta a responsabilidade do réu pelo pagamento, conforme já decidiu o STJ:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE DIREITOS AUTORAIS. ECAD. AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO NO JULGADO. CABIMENTO DA COBRANÇA DE ÓRGÃOS PÚBLICOS E SEM FINS LUCRATIVOS. INTERPRETAÇÃO AMPLA AO CONCEITO DE EMPRESÁRIO. JULGADO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Não há nenhuma omissão, contradição ou outro vício processual a ser sanado no julgamento estadual, portanto inexistentes os requisitos para reconhecimento de ofensa aos arts. 11, 489, II, § 1º, I e IV, do CPC/2015. O acórdão dirimiu a controvérsia com base em fundamentação sólida, sem tais vícios, tendo apenas resolvido a celeuma em sentido contrário ao postulado pela parte insurgente.
2. É possível a cobrança de direitos autorais, pelo ECAD, na hipótese de execução de obras musicais protegidas em eventos realizados por entes públicos, independentemente da existência de fins lucrativos. Precedentes.
[...] (AgInt no AREsp nº 1.980.824/MG, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. em 25/4/2022).
Também é importante ressaltar que não é necessária a identificação das músicas e dos respectivos autores para a cobrança dos direitos autorais, sob pena de inviabilizar o sistema e causar prejuízos aos titulares dos direitos autorais, como já decidiu o TJSC:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA E CONDENATÓRIA. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DO ECAD PARA REPRODUÇÃO DE OBRAS MUSICAIS, LITEROMUSICAIS, AUDIOVISUAIS E FONOGRAMAS. EMISSORA DE RÁDIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ.
ALMEJADO EFEITO SUSPENSIVO. PERDA DO OBJETO DA PRETENSÃO ANTE O JULGAMENTO DO APELO. ANÁLISE PREJUDICADA.
[...]
ILEGITIMIDADE ATIVA PARA ARRECADAR OS DIREITOS RELATIVOS À EXECUÇÃO DE OBRAS DE TITULARES NÃO ASSOCIADOS. INEXISTÊNCIA. PRESCINDIBILIDADE DE FILIAÇÃO OU AUTORIZAÇÃO DOS AUTORES, TAMPOUCO DE IDENTIFICAÇÃO DAS MÚSICAS. EXEGESE DO ARTIGO 99 DA LEI N. 9.610/1998. ENTENDIMENTO HÁ MUITO CONSOLIDADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
[...]
"Não é necessária a identificação das músicas e dos respectivos autores para a cobrança dos direitos autorais devidos, sob pena de ser inviabilizado o sistema, causando evidente prejuízo aos seus titulares. Precedentes" REsp n. 612.615/MG, relator Castro Filho, Terceira Turma, DJ de 7/8/2006).
[...]
SENTENÇA INALTERADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. ARBITRAMENTO.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, AC nº 0309285-11.2018.8.24.0020, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 24/05/2022).
Outrossim, revela-se imperioso ressaltar a legitimidade da parte autora para, em nome dos titulares de obras intelectuais, efetuar a cobrança do montante devido, a qual se assenta no art. 99 da Lei n. 9.610/1998:
Art. 99. A arrecadação e distribuição dos direitos relativos à execução pública de obras musicais e literomusicais e de fonogramas será feita por meio das associações de gestão coletiva criadas para este fim por seus titulares, as quais deverão unificar a cobrança em um único escritório central para arrecadação e distribuição, que funcionará como ente arrecadador com personalidade jurídica própria e observará os §§ 1º a 12 do art. 98 e os arts. 98-A, 98-B, 98-C, 99-B, 100, 100-A e 100-B.
§ 1º O ente arrecadador organizado na forma prevista no caput não terá finalidade de lucro e será dirigido e administrado por meio do voto unitário de cada associação que o integra.
§ 2º O ente arrecadador e as associações a que se refere este Título atuarão em juízo e fora dele em seus próprios nomes como substitutos processuais dos titulares a eles vinculados.
§ 3º O recolhimento de quaisquer valores pelo ente arrecadador somente se fará por depósito bancário.
§ 4º A parcela destinada à distribuição aos autores e demais titulares de direitos não poderá, em um ano da data de publicação desta Lei, ser inferior a 77,5% (setenta e sete inteiros e cinco décimos por cento) dos valores arrecadados, aumentando-se tal parcela à razão de 2,5% a.a. (dois inteiros e cinco décimos por cento ao ano), até que, em 4 (quatro) anos da data de publicação desta Lei, ela não seja inferior a 85% (oitenta e cinco por cento) dos valores arrecadados.
§ 5º O ente arrecadador poderá manter fiscais, aos quais é vedado receber do usuário numerário a qualquer título.
§ 6º A inobservância da norma do § 5o tornará o faltoso inabilitado à função de fiscal, sem prejuízo da comunicação do fato ao Ministério Público e da aplicação das sanções civis e penais cabíveis.
§ 7º Cabe ao ente arrecadador e às associações de gestão coletiva zelar pela continuidade da arrecadação e, no caso de perda da habilitação por alguma associação, cabe a ela cooperar para que a transição entre associações seja realizada sem qualquer prejuízo aos titulares, transferindo-se todas as informações necessárias ao processo de arrecadação e distribuição de direitos.
§ 8º Sem prejuízo do disposto no § 3º do art. 98, as associações devem estabelecer e unificar o preço de seus repertórios junto ao ente arrecadador para a sua cobrança, atuando este como mandatário das associações que o integram.
§ 9º O ente arrecadador cobrará do usuário de forma unificada, e se encarregará da devida distribuição da arrecadação às associações, observado o disposto nesta Lei, especialmente os critérios estabelecidos nos §§ 3º e 4º do art. 98.
Portanto,
"o ECAD, desde a edição da Lei n. 5.988, de 14 de dezembro de 1973, é detentor exclusivo da competência centralizadora da arrecadação e distribuição dos direitos relativos à execução pública, inclusive através da radiodifusão e de exibição cinematrográfica das composições musicais ou lítero-musicais e de fonogramas, e, com o advento da Lei 9.610/1998, o sistema de gestão coletiva e de cobrança centralizadora permaneceu"
(TJSC, Apelação Cível n. 2009.069092-3, de Imbituba, rel. José Volpato de Souza, Quarta Câmara de Direito Público, j. 12-04-2012).
No caso sob análise, não sobrevieram aos autos quaisquer provas de que tenha havido recolhimento dos valores referentes aos direitos autorais dos eventos públicos realizados ou apoiados pelo requerido nos anos de 2021, 2022 e 2023, discriminados no evento 1, INIC1, p. 2-3.
Ainda, a realização dos eventos referidos restou devidamente comprovada pelos documentos que instruem a inicial (
evento 1, DOC7
,
evento 1, DOC8
,
evento 1, DOC9
,
evento 1, DOC10
,
evento 1, DOC11
,
evento 1, DOC12
,
evento 1, DOC13
,
evento 1, DOC14
,
evento 1, DOC15
), o que, inclusive, não foi negado pelo requerido na peça contestatória, cumprindo o autor com o ônus do art. 373, I, do Código de Processo Civil.
De outro lado, a parte ré deixou de demonstrar existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (art. 373, II, do Código de Processo Civil), ou seja, deixou de comprovar a realização do pagamento.
Dessa forma, a procedência do pedido de condenação a municipalidade ao pagamento da retribuição autoral, decorrente execução pública de obras musicais ocorrida nos eventos acima mencionados, é medida que se impõe.
O valor devido deverá ser apurado em liquidação de sentença, levando-se em consideração Regulamento de Arrecadação do ECAD.
Da tutela inibitória
A Lei Federal n. 9.610/1998 regulamenta os direitos autorais e dentre as sanções civis estabelece o seguinte:
Art. 105. A transmissão e a retransmissão, por qualquer meio ou processo, e a comunicação ao público de obras artísticas, literárias e científicas, de interpretações e de fonogramas, realizadas mediante violação aos direitos de seus titulares, deverão ser imediatamente suspensas ou interrompidas pela autoridade judicial competente, sem prejuízo da multa diária pelo descumprimento e das demais indenizações cabíveis, independentemente das sanções penais aplicáveis; caso se comprove que o infrator é reincidente na violação aos direitos dos titulares de direitos de autor e conexos, o valor da multa poderá ser aumentado até o dobro.
Assim, com base nessa regra, a parte autora também pleiteou a tutela inibitória com a finalidade de suspender as execuções futuras de obras musicais, lítero-musicais e fonogramas enquanto não for providenciada a prévia e expressa autorização dos direitos autorais ou, alternativamente, a determinação de depósito judicial dos valores relativos aos direitos autorais.
O Município é um usuário eventual e os eventos são futuros e incertos. Aliás, não há qualquer indicação de que existam eventos agendados para o futuro, o que torna inócuo o pedido de suspensão e/ou de depósito de valores.
De mais a mais, caso esses supostos eventos aconteçam sem a devida autorização e com violação de direitos autorais, a parte autora dispõe de meios legais e jurídicos para a cobrança.
Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE TÍTULO E DE INEXIGÊNCIA DE OBRIGAÇÃO. DIREITOS AUTORAIS EM FESTAS MUNICIPAIS SEM FINS LUCRATIVOS. RECONVENÇÃO DO ECAD, COM O OBJETIVO DE VER RECONHECIDO O MESMO DIREITO COM RELAÇÃO A FESTIVIDADES OCORRIDAS EM OUTRO ANO. [...] PRETENDIDA APLICAÇÃO DA TUTELA INIBITÓRIA PREVISTA NO ART. 105 DA LEI 9.610/98, COM A SUSPENSÃO DOS EVENTOS FUTUROS ENQUANTO NÃO PROVIDENCIADA A PRÉVIA AUTORIZAÇÃO À EXECUÇÃO PÚBLICA DAS OBRAS MUSICAIS. NÃO ACOLHIMENTO. INAPLICABILIDADE A EVENTOS FUTUROS E INCERTOS. PRECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0002997-16.2010.8.24.0113, de Camboriú, Quinta Câmara de Direito Público, j. 12/12/2019).
Desse modo, o pedido deve ser rejeitado nesse ponto.
Da multa
O TJSC já pacificou entendimento de que não é cabível a cobrança de multa estipulada unilateralmente pelo ECAD, uma vez que não há relação contratual com a ré.
Nesse sentido:
COBRANÇA. ECAD. DIREITOS AUTORAIS. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DO RÉU. EMPRESA DO RAMO HOTELEIRO. UTILIZAÇÃO DE OBRAS MUSICAIS POR MEIO DA DISPONIBILIZAÇÃO DE TELEVISORES NO INTERIOR DOS QUARTOS. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO DE TELEVISÃO POR ASSINATURA. OPERADORA QUE JÁ REALIZA O PAGAMENTO DE DIREITOS AUTORAIS. IRRELEVÂNCIA. FATOS GERADORES DISTINTOS. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO [TEMA 1066]. MULTA MORATÓRIA DE 10%. INAPLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE RESPALDO EM DISPOSIÇÕES LEGAIS OU CONTRATUAIS. APLICAÇÃO AFASTADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC - AC nº 5012838-11.2019.8.24.0023, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 03/08/2023).
Dessa feita, levando-se em conta a fundamentação acima, a cobrança de multa deve ser afastada.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos inaugurais formulados pelo ESCRITORIO CENTRAL DE ARRECADACAO E DISTRIBUICAO ECAD contra o MUNICÍPIO DE MAFRA para o fim de CONDENAR o réu ao pagamento das contribuições devidas pela execução de obras musicais, literomusicais e fonogramas, nos termos do art. 98 da Lei Federal nº 9.610/1998, nos eventos discriminados na inicial.
Os valores deverão ser apurados em liquidação de sentença, de acordo com o Regulamento de Arrecadação vigente na época de cada fato gerador e pagos em uma única parcela.
Consectários legais
As condenações judiciais de natureza administrativa em geral sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa
Selic
, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.
Tais índices, no entanto, serão aplicados até 08/12/21.
A partir daí (09/12/21) incidirá a SELIC
, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional n. 113, de 08/12/21 (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5048216-92.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Fernando Boller, Primeira Câmara de Direito Público, j. 22-11-2022).
Diante da sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, com fundamento no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
A parte ré é isenta de custas processuais (art. 7º, I, da Lei n. 17.654/2018).
Decisão não sujeita à remessa necessária (art. 496, § 3º, III, do CPC).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitado em julgado, arquivem-se.
Em abono a este convencimento, extrai-se da jurisprudência desta Corte de Justiça:
AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE PRECEITO LEGAL COM PEDIDO DE TUTELA INIBITÓRIA E PERDAS E DANOS. DIREITOS AUTORAIS. LEGITIMIDADE ATIVA DO ECAD. ART. 99, § 2º, DA LEI 9.610/1998.
EVENTOS PROMOVIDOS PELO MUNICÍPIO
BALNEÁRIO ARROIO DO SILVA.
USO DE OBRAS MUSICAIS EM ESPETÁCULOS QUE, MESMO GRATUITOS, ENSEJA COBRANÇA DE DIREITOS AUTORAIS. EXIGÊNCIA LEGÍTIMA AINDA QUE AS CANÇÕES SEJAM EXECUTADAS PELO PRÓPRIO INTÉRPRETE. RETRIBUIÇÃO AUTORAL QUE NÃO SE CONFUNDE COM CACHÊ.
POSSIBILIDADE DA TUTELA INIBITÓRIA A EVENTOS FUTUROS E INCERTOS. ART. 105 DA LEI N. 9.610/1998. COMPETÊNCIA DO ECAD PARA FIXAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE CÁLCULO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA QUE SE COADUNA A PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. MODIFICAÇÃO APENAS DO ÍNDICE A SER APLICADO PARA A CORREÇÃO MONETÁRIA. TEMA 905 DA CORTE SUPERIOR. DECISÃO ALTERADA PARCIALMENTE EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. (TJSC, Remessa Necessária Cível n. 0010839-78.2013.8.24.0004, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jorge Luiz de Borba, Primeira Câmara de Direito Público, j. 14-09-2021 - grifou-se).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. PRETENSÃO AUTORAL DECLINADA PELO ECAD VISANTE À SATISFAÇÃO DE EXIGÊNCIAS DECORRENTES DE SUPOSTAS UTILIZAÇÕES PÚBLICAS DE OBRAS MUSICAIS EM FESTIVIDADES PROMOVIDAS PELO MUNICÍPIO RÉU. FATO CONSITUTIVO DO DIREITO ALMEJADO, DEVIDAMENTE DEMONSTRADO. CONTEÚDO PROBATÓRIO ENCARTADO AOS AUTOS QUE RVELA TER HAVIDO A EXECUÇÃO DE MÚSICAS CUJA UTILIZAÇÃO POR PARTE DO ENTE PÚBLICO ENSEJARIA O PAGAMENTO PERSEGUIDO NA EXORDIAL. AUSÊNCIA DE FINS LUCRATIVOS. IRRELEVÂNCIA. DESNECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DAS MÚSICAS E RESPECTIVOS AUTORES PARA LEVAR A CABO A COBRANÇA DOS DIREITOS AUTORAIS DEVIDOS. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS RELEGADA A FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECURSO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5001682-40.2020.8.24.0104, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 07-02-2023).
Nesse mesmo norte, já decidiu este órgão fracionário:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE COBRANÇA. ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD. DIREITOS AUTORAIS. EXPOSIÇÃO-FEIRA AGROPECUÁRIA, INDUSTRIAL E COMERCIAL DE CHAPECÓ 2005 - EFAPI. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM.
RECURSO DO ENTE FEDERADO. RESPONSABILIDADE DAS EMPRESAS CONTRATANTES. TESE IMPROFÍCUA. ASSUNÇÃO CONTRATUAL DO PAGAMENTO AO ECAD PELO MUNICÍPIO PERANTE OS EMPRESÁRIOS E PRODUTORES DE EVENTOS.
SOLIDARIEDADE PELA VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS.
PRETEXTADA EXCLUSÃO DAS OBRAS INTERPRETADAS PELOS PRÓPRIOS AUTORES. IMPOSSIBILIDADE.
DIREITOS AUTORAIS DEVIDOS. FARTA JURISPRUDÊNCIA
. SUSTENTADA ABUSIVIDADE DE EXIGÊNCIA DE 10% SOBRE OS INGRESSOS VENDIDOS. TESE ARREDADA. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA CONFORME CRITÉRIOS DO REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO DO ECAD. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
RECURSO DO AUTOR. FIXAÇÃO DOS VALORES E FORMA DE CÁLCULO CONFORME REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO. ARGUMENTO INAPLICÁVEL. PERCENTUAL EMPREGADO CONGRUENTE AO REFERIDO REGULAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE PARÂMETRO FÍSICO COMO BASE DE CÁLCULO. ARGUIÇÃO DE APLICABILIDADE DO TEMA 905 DO STJ. PROCEDÊNCIA NO PONTO. TEMA N. 810 DO STF. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) PARA FINS DE CORREÇÃO MONETÁRIA. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 113/2021. INCIDÊNCIA DA TAXA SELIC A PARTIR DA PUBLICAÇÃO. ALTERAÇÃO EX OFFICIO. ADEQUADA DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS NA ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
1. Pela violação a direito autoral, respondem, solidariamente, todos os organizadores e promotores do espetáculo (Lei 9.610/1998, arts. 68, § 3º, 86 e 110), em especial aquele que contratualmente assumiu a responsabilidade pela autorização e pagamento do ECAD.
2. Direitos autorais, vinculados à criação da obra, não se confundem com a remuneração recebida pelo artista por sua apresentação em público, sendo plenamente válida, conforme jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, a cobrança de direitos autorais ainda que diante de obras de titularidade dos próprios intérpretes.
3. Possibilidade de utilização da tabela de preços contida no regulamento de arrecadação do próprio ECAD, pois "compete ao autor do direito autoral, diretamente ou por intermédio do ECAD, a fixação dos critérios de cobrança e das importâncias correlatas" (TJSC, Apelação n. 0010161-74.2011.8.24.0023, rel. Des. Paulo Ricardo Bruschi, Quarta Câmara de Direito Público, j. 15-9-2016).
4. Correta a direção dada na origem no que toca o percentual de 10% da receita bruta e redutor de 1/3 pela música ao vivo aplicáveis ao caso, visto que o ente federado é usuário eventual e o evento sub judice se enquadra perfeitamente no item "5 - Execução musical em festas de peão de boiadeiro, exposições ou feiras agropecuárias, industriais ou agrícolas e similares" do Regulamento de Arrecadação.
5. No caso, o autor pugna pela cobrança por parâmetro físico, contudo o Regulamento de Arrecadação apenas apresenta previsão de cobrança sobre percentual de receita bruta, de modo que deve ser utilizado como base de cálculo o valor da receita auferida com a bilheteria do evento.
6. De rigor é a manutenção da distribuição dos ônus sucumbenciais fixados na origem, pois houve o afastamento da aplicação da multa de 10%, a base de cálculo utilizada não foi a inicialmente pleiteada e o percentual aplicado foi o de 10% e não 15%, fatos que substancialmente alteraram o valor final da condenação, afastando a tese de decadência de parte mínima dos pedidos exordiais.
7. A Corte Suprema declarou a inconstitucionalidade da utilização da remuneração oficial da caderneta de poupança para fins de correção monetária, porquanto não se caracteriza como instrumento hábil para reconhecer e repor as variações inflacionárias (Tema 810 do STF).
8. Adicionalmente, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do Tema n. 905, lançou compreensão para balizamento em condenações impostas à Fazenda Pública: "(a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E." (Tema 905 do STJ).
9. A partir de 9 de dezembro de 2021, considerando a vigência da Emenda Constitucional n. 113/2021, "haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente".
10. Sentença reformada para adequação dos consectários legais. Honorários recursais cabíveis. (TJSC, Apelação n. 0002695-20.2006.8.24.0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Diogo Pítsica, Quarta Câmara de Direito Público, j. 01-12-2022 - grifou-se).
Destarte, a manutenção da sentença é medida que se impõe.
6. Por derradeiro, considerando que a decisão recorrida foi publicada na vigência do atual CPC, necessário o arbitramento de honorários recursais em favor dos causídicos da parte recorrida, nos termos do § 11 do artigo 85 do referido diploma legal.
Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça editou o Enunciado Administrativo nº 7 no sentido que "
somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC
".
Assim, tendo em vista os parâmetros do § 2º do mesmo dispositivo legal, fixo, de ofício, os honorários recursais em 5%, totalizando os honorários de sucumbência em 15% sobre a mesma base de cálculo estabelecida na sentença, observado o disposto no §3º do art. 85 do CPC.
7. Ante o exposto, com fundamento no art. 932, do CPC e no art. 132, do Regimento Interno desta Corte, conheço do recurso e nego-lhe provimento, fixando-se honorários recursais, nos termos da fundamentação.
Intimem-se.
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