Processo nº 5000018-49.2024.4.03.6183
ID: 280568100
Tribunal: TRF3
Órgão: 14ª Vara Gabinete JEF de São Paulo
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5000018-49.2024.4.03.6183
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ELISANGELA VEIGA PONTES
OAB/PR XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000018-49.2024.4.03.6183 / 14ª Vara Gabinete JEF de São Paulo AUTOR: DONIZETE ALVES DE FREITAS Advogado do(a) AUTOR: ELISANGELA VEIGA PONTES - PR68902…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000018-49.2024.4.03.6183 / 14ª Vara Gabinete JEF de São Paulo AUTOR: DONIZETE ALVES DE FREITAS Advogado do(a) AUTOR: ELISANGELA VEIGA PONTES - PR68902 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS S E N T E N Ç A Cuida-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSS por DONIZETE ALVES DE FREITAS, atualmente com 62 anos de idade, objetivando a concessão de pensão por morte em razão do falecimento de ALEXANDRE TEIXEIRA DE MENDONÇA, ocorrido em 25/03/2023 (certidão de óbito - ID 310988552 - Pág. 17), na condição de companheiro. Administrativamente, o benefício foi requerido em 07/06/2023 (ID 310988552) e restou indeferido por não comprovação da alegada condição de companheiro. Citado, o INSS apresentou contestação, alegando, preliminarmente, a prescrição quinquenal e propugnando pela improcedência da ação. É o relatório do necessário (art. 38 da Lei 9.099/95). Fundamento e decido. DA JUSTIÇA GRATUITA Concedo os benefícios da justiça gratuita, nos termos do art. 99, §3º do CPC, ante a juntada de declaração de hipossuficiência econômica. PREJUDICIAL DE MÉRITO - DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL Reconheço a prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, forte no disposto no art. 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91. Noutro giro, conforme assentado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 626.489, rel. Min. Luís Roberto Barroso, 16/10/2013 - Fonte: Informativo de Jurisprudência n° 725 – Brasília, 25 de outubro de 2013), não há que se falar jamais em prescrição do próprio fundo de direito, mesmo nos casos em que há negativa expressa do requerimento por parte do INSS, tendo em vista que o acesso à proteção previdenciária por meio da Previdência consubstancia um direito fundamental social, sendo assim inatingível pelo mero transcurso do tempo, sendo sempre passível de exercício por parte de seu titular; essa particularidade da seara previdenciária levou o STF a afastar expressamente a aplicabilidade integral da Súmula no 85 do STJ, consoante se depreende de trecho do voto do Ministro relator: “Não se aplica em matéria previdenciária entretanto, a conclusão das referidas súmulas quando há pedido administrativo indeferido. Nesse caso, somente perdem a exigibilidade as prestações atingidas pela prescrição, e não o próprio fundo de direito." Assim, pode-se falar apenas em prescrição das parcelas vencidas antes do quinquênio que antecedeu o ajuizamento do feito, mas jamais em prescrição do próprio direito ao benefício, ainda quando negado expressamente pelo INSS. DA PENSÃO POR MORTE - PARÂMETROS JURÍDICOS GERAIS Para a concessão do benefício de pensão por morte, são exigidos, além do óbito, (I) a comprovação da qualidade de segurado à época do falecimento e (II) a comprovação da qualidade de dependente. Não se exige qualquer número mínimo de contribuições a título de carência (art. 26, inc. I da Lei 8.213/91). E com base no art. 74 da mesma Lei, será a pensão devida a contar do óbito, do requerimento ou da decisão judicial, conforme o caso, levando-se em consideração também o momento do óbito, ante as alterações legais promovidas: Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data: (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997) I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997) I - do óbito, quando requerida até noventa dias depois deste; (Redação pela Lei nº 13.183, de 2015) I - do óbito, quando requerida em até cento e oitenta dias após o óbito, para os filhos menores de dezesseis anos, ou em até noventa dias após o óbito, para os demais dependentes; (Redação dada pela Medida Provisória nº 871, de 2019) I - do óbito, quando requerida em até 180 (cento e oitenta) dias após o óbito, para os filhos menores de 16 (dezesseis) anos, ou em até 90 (noventa) dias após o óbito, para os demais dependentes; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019) II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997) III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997) O benefício de pensão por morte será devido em decorrência do falecimento do segurado aos seus dependentes, assim considerados, nos termos do artigo 16 da Lei n. 8.213/1991, para fins de percepção do benefício: Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) II - os pais; III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) § 1o A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes. (...) § 4o A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada. § 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019) § 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019) DO CASO CONCRETO DA QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO No caso concreto, não há qualquer controvérsia no tocante à comprovação da qualidade de segurado, pois o falecido era beneficiário de aposentadoria por idade NB 183.499.314-5 , com DIB em 21/08/2017 (ID 363464783), pelo que mantinha a qualidade de segurado por força do art. 15, inc. I da Lei 8.213/91. DA QUALIDADE DE DEPENDENTE DO AUTOR A respeito da união estável, ressalte-se que se está diante de prova tarifada, pelo que se exige, obrigatoriamente, a existência de início de prova material (= documental) para a comprovação da união estável, nos termos do artigo 16, §§ 5º e 6º da Lei 8.213/91; ressalte-se que, em se tratando de normas atinentes à prova, têm aplicabilidade imediata, atingindo, inclusive, fatos geradores anteriores à Lei nº 13.846, de 2019, que os incluiu. Ficou prejudicada, assim, a Súmula 63 da TNU. Delineadas essas premissas jurídicas básicas, após regular instrução, entendo que restou devidamente comprovada a união estável entre a parte autora e o falecido na data do óbito. Explico. A fim de comprovar a alegada união estável, a parte autora amealhou aos autos os seguintes documentos: - certidão de óbito na qual consta que o falecido residia na Rua André de Frias, nº 104, CS 3, Vila Santa Virgínia, São Paulo/SP (ID 310988552 - Pág. 17). A declarante do óbito foi Lívia Balbi de Mendonça, filha do falecido. - fatura de serviços de internet e telefone, referente ao mês 05/2023, emitida em nome do autor, na Rua André de Frias, nº 128, CS 2, Vila Santa Virgínia, São Paulo/SP (ID 310988552 - Pág. 19). - comprovante de conta bancária conjunta, aberta em 02/06/2021 e encerrada após o óbito, em que consta o endereço do falecido na Rua André de Frias, nº 104, CS 3, e o endereço do autor na Rua André de Frias, nº 128, CS (ID 310988552 - Pág. 23/33). - extratos de conta bancária de titularidade do autor, em que constam transferências, do autor para o falecido, em 12/2016, 02/2018, 08/2018, 09/2018, 10/2018, 05/2019, 07/2021, 08/2021, 10/2021, 11/2021, 12/2021, 05/2022, 09/2022 e 10/2022, e, do falecido para o autor, em 09/2021, 03/2022, 05/2022 e 03/2023 (ID 310986893, ID 310986894, ID 310986895, ID 310986896, ID 310986897, ID 310986898, ID 310986899 e ID 310986900). - declarações da Associação Cartão Cristão do Brasil, em que consta que o autor e o falecido permaneceram na mesma matrícula, de 15/07/2008 até 11/01/2023 (ID 310986891, ID 310986892). - escritura de inventário e partilha dos bens do falecido, em que o autor figura como companheiro (ID 310988552 - Pág. 11/16). - declarações de terceiros acerca da união estável (ID 310986886, ID 310986887, ID 310986888, ID 310986889, ID 310986890). Em audiência realizada em 12/05/2025, colheu-se o depoimento pessoal da parte autora e o relato de testemunhas. O teor dos depoimentos encontra-se parcialmente transcrito abaixo, nos pontos que reputei pertinentes para o esclarecimento da contenda, ressaltando-se que a íntegra dos áudios está carreada aos autos: PARTE AUTORA: tenho 62 anos, sou aposentado; eu moro na R. André de Frias, 128, Vila Santa Virgínia, São Paulo/SP; moro aqui desde que nasci; hoje eu moro com uma irmã; o ALEXANDRE era meu companheiro desde 1999; nós nos conhecemos por um aplicativo, e na época ele era casado, estava em vias de separação, começamos uma amizade, no fim iniciamos uma relação, ele separou da esposa, que tem a filha LÍVIA, e na separação ele veio morar comigo, ficou 2 anos morando comigo, minha mãe ainda era viva, ele trabalhava também na época em uma ONG, aí ele saiu desta ONG, ele já era psicólogo formado, fazia atendimento, aí veio para cá, morou um pouco aqui, como minha mãe era viva e estava bem de saúde, ele conseguiu trabalhar como terapeuta depois que saiu da ONG, e alugou a casa onde a ROSANA mora e foi morar lá, 2 casas depois da minha, para deixar minha mãe mais tranquila em casa, porque eu cuidava dela, depois de um tempo a minha mãe ficou bem debilitada, ficou 8 anos acamada, fiquei cuidando dela, ele vinha aqui fazer atendimentos na minha sala, usava minha casa como trabalho, e eu ia para lá, dormia um tempo lá, depois que minha mãe ficou acamada passei a ficar em casa, e eu ia para lá e ele para cá, estávamos sempre juntos em tudo, em festas e comemorações, almoçava lá e jantava com ele, ele vinha aqui e almoçava e jantava aqui também; e aí ele começou a ficar doente, aí eu comecei a fazer tudo para ele, cuidava da casa dele, a parte de pagamento, mesmo ele trabalhando, eu cuidava de tudo, ele tinha diabetes, pressão alta, marcapasso; aí a minha mãe veio a falecer, faz 5 anos, aí ele achou melhor continuarmos do jeito que estava, ele continuou morando no aluguel, estávamos bem assim, eu indo para lá, ele vindo para cá, eu cuidei dele, a mãe ficou debilitada, trouxe a mãe para morar com ele, a ROSANA estava a par de tudo, morava junto com a gente na casa de cima, a gente ficou ajudando a cuidar da mãe dele até ela falecer 2 anos depois; eu que achei ele caído na casa, eu ia todo do dia de manhã, eu tomava meu café e ia para lá ajudar a mãe, dar banho, trocar fralda, até porque ele sozinho ele não conseguia, eu dava banho nela, eu ajudava a trocar ele, como eu trabalho, mesmo aposentado, trabalho home office, quando eu precisava levava meu computador para lá e ficava trabalhando lá na casa dele, e a nossa parte financeira a gente sempre teve conta conjunta, a gente comprava comida, remédios dele e da mãe, estávamos sempre nos ajudando financeiramente; ele faleceu em em março de 2023; é no número 104 da mesma rua, é 3 casas depois da minha, na mesma calçada; nós não tratávamos o relacionamento de forma sigilosa com relação a ninguém, meus familiares adotaram ele como família, quando tinha festa da minha família ele ia comigo e participava de aniversários e casamentos, e vice-versa; tanto que a ROSANA que é a dona da casa que ele morava, é uma das testemunhas, ela vivenciou porque ela morava na casa de cima, lá onde ela mora são 4 casas; na casa do fundo morava o ALEXANDRE em baixo e ela em cima, ela presenciava toda a nossa relação e sempre estava com a gente, ia até a casa das tias dela, tínhamos essa coisa bem pública; não tínhamos nada a esconder; eu cheguei em casa ele estava sentado na cadeira arrumando as fraldas da mãe dele, eu sempre ia lá cedinho; quando eu cheguei estava ele caído no chão e estava vivo, mas não conseguia falar nem levantar, só respondia com a cabeça e não conseguia responder, foi um AVC muito forte, a ROSANA desceu, os vizinhos ajudaram, ele não conseguiu levantar, ficou deitado no meu colo, a ROSANA chamou o SAMU, colocamos ele na ambulância, dei entrada no hospital; eu que fiz a internação dele e fiz a internação dele até ele ficar internado, visitei ele 12 dias, a LÍVIA ficou indo comigo para o hospital todos os dias até ele vir a óbito; nós nunca chegamos a pensar em formalizar a união porque ele estava, devido a profissão dele, é uma opinião minha, talvez ele queria manter essa aparência assim, não precisava declarar para os pacientes dele que ele tinha uma relação com outra pessoa, então a gente acabou se acomodando; isso não o impedia de me reconhecer como companheiro na vida privada, amizades, família, parentes, todos sabiam, mãe dele, irmãos deles, a LÍVIA que é filha dele, isso nunca foi escondido de ninguém; a LÍVIA vinha periodicamente visitar a gente; ela passava o domingo com a gente; PRIMEIRA TESTEMUNHA: ROSANA: eu morava no mesmo quintal que o ALEXANDRE, na casa de cima, desde 2004; ele quem mudou, eu já estava lá; eles eram um casal; eles conviviam como um casal; eles tinham constituído uma família; até o falecimento do ALEXANDRE morei no mesmo quintal; eles moravam em casas separadas por conta da questão da mãe do DONIZETE, inicialmente eles moravam juntos, mas aí a mãe dele teve um problema de saúde e teve que passar a dormir com a mãe; aí com o tempo, com o falecimento dela, eles resolveram continuar nessa situação, cada um na sua casa; as casas eram duas casas para baixo, muito próximas, na mesma rua; eu via o DONIZETE visitando o ALEXANDRE, era sempre, todos os dias ele vinha, e várias horas, porque ele fazia várias coisas, o ALEXANDRE era uma pessoa doente, ele tinha vários problemas de saúde, não conseguia caminhar muito tempo, porque ele tinha marcapasso, cuidava da casa, passava, lavava, fazia coisas fora, bancos, essas coisas que o ALEXANDRE não conseguia; o DONIZETE ajudou a cuidar da mãe do ALEXANDRE, como ele sempre estava aqui, e o ALEXANDRE não tinha muita força, o ALEXANDRE que trocava fralda, dava banho, inclusive depois da morte do ALEXANDRE ele continuou cuidando da mãe por um tempo; o relacionamento era público, todos sabiam, não era sigiloso, era um relacionamento público; esse relacionamento foi mantido até o falecimento do ALEXANDRE, inclusive no dia do falecimento do ALEXANDRE foi o DONIZETE que estava aqui e ele que socorreu o ALEXANDRE, eu estava nesse dia; eu fui ao enterro/velório; o autor estava presente na condição de companheiro do falecido e recebendo os sentimentos de todos; SEGUNDA TESTEMUNHA: LÍVIA: (informante do Juízo): eles viveram como casal, foram 20 e poucos anos, considerando 2023, eram 23 anos; viviam como se casados fossem, tem a questão, como era um relacionamento homoafetivo, existe um grande preconceito, mas eles eram companheiros, tanto que na ocasião do inventário, eu que fiz o inventário extrajudicial a gente reconheceu o inventário na escritura; eles nunca se separaram; eu estava no enterro; nós fizemos todo o trâmite juntos; eu e o DONIZETE; eles moraram na mesma casa, no início do relacionamento, mas meu pai era uma pessoa que gostava do canto dele, e também era muito perto, acho que 4 casas, na mesma rua, eles estavam o tempo inteiro juntos; meu pai nomeou o DONIZETE como procurador para fazer tudo; tinham conta conjunta, faziam os pagamentos; Como se vê, a prova oral foi harmônica e coesa, corroborando o início de prova material produzido e confirmando de forma veemente a união estável da autora com o falecido desde longa data até a data do falecimento. Posto isso, cuida-se de um robusto conjunto probatório, apto a dar sustentáculo a versão autoral, sendo evidente o projeto de vida em comum desde longa data, mantido até o momento do óbito. Nos termos do art. 1.723 do CC/2002, é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Saliente-se que o conceito de união estável (CF/88, art. 226, § 3º) abrange a união homoafetiva para todos os efeitos civis (ADPF 132-RJ e ADIn 4.277, Rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, j. 05.05.2011). Nessa toada, a) a união deve ser pública (não pode ser oculta, clandestina); b) união deve ser duradoura, ou seja, estável, apesar de não se exigir um tempo mínimo; c) a união deve ser contínua (sem que haja interrupções constantes); d) a união deve ser estabelecida com o objetivo de constituir uma família; e) as duas pessoas não podem ter impedimentos para casar; f) a união entre essas duas pessoas deve ser exclusiva (é impossível a existência de uniões estáveis concomitantes e a existência de união estável se um dos componentes é casado e não separado de fato). Todos estes requisitos foram demonstrados satisfatoriamente nos autos, restando suficientemente provada a convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida entre o falecido e a parte autora, com o objetivo de constituir família, situação que perdurou até o falecimento do segurado, pelo que entendo caracterizado o instituto da união estável (art. 226, §3o da CF e 1723 e seguintes do Código Civil). E uma vez reconhecida a condição de companheiros, não há que se falar em comprovação da dependência econômica, dado que esta é presumida por lei, nos termos do artigo 16, §4o da Lei 8.213/91; ressalte-se que, ressalvado meu entendimento pessoal, trata-se de presunção absoluta, ou seja, que não admite prova em contrário nem mesmo por confissão, tendo em vista não só o resultado do julgamento do Tema nº 226 da TNU, como também o fato de que, naquele julgamento representativo de controvérsia, o próprio INSS, em memoriais, promoveu o reconhecimento jurídico do pedido (vide ev. 62 daqueles autos), pleiteando que, tal como a autarquia procede na própria esfera administrativa, restasse reconhecido o caráter absoluto da dependência econômica quando provada a união estável. Destarte, a parte autora autora faz jus à inserção de seu nome no rol de dependentes previdenciários do segurado extinto. DA DATA DO INÍCIO DO BENEFÍCIO A DIB deve ser fixada na data do óbito, tendo em vista que o requerimento administrativo foi efetuado em 07/06/2023 (ID 310988552), ou seja, menos de 90 dias após o óbito (art. 74 da LBPS vigente à época do falecimento). DA DURAÇÃO DA PENSÃO - ÓBITOS OCORRIDOS APÓS 18/06/2015 – VIGÊNCIA DA LEI 13.135/2015 Considerando que o óbito (fato gerador do benefício em tela) ocorreu após 18/06/2015, data da publicação (e vigência) da Lei 13.135/2015, a duração da cota de pensão do cônjuge ou companheiro não é mais, em regra, vitalícia, estando submetida às seguintes condicionantes do art. 77, §2º da Lei 8.213/91, na nova redação que lhe conferiu a Lei nº 13.135/2015: § 2º O direito à percepção de cada cota individual cessará: II - para filho, pessoa a ele equiparada ou irmão, de ambos os sexos, ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência; III - para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez; IV - para filho ou irmão que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, pelo afastamento da deficiência, nos termos do regulamento; V - para cônjuge ou companheiro: a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas “b” e “c”; b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado; c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável: 1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade; 2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade; 3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade; 4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade; 5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade; 6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade. Saliente-se, ainda, que as idades previstas acima foram alteradas pela PORTARIA ME Nº 424, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2020, em vigor a partir de 1º de janeiro de 2021, que estabelece: O MINISTRO DE ESTADO DA ECONOMIA, SUBSTITUTO, no uso da atribuição que lhe foi conferida pelo § 3º do art. 222 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e pelo § 2º-B do art. 77 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, resolve: Art. 1º O direito à percepção de cada cota individual da pensão por morte, nas hipóteses de que tratam a alínea "b" do inciso VII do art. 222 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e a alínea "c" do inciso V do § 2º do art. 77 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, cessará, para o cônjuge ou companheiro, com o transcurso dos seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas dezoito contribuições mensais e pelo menos dois anos após o início do casamento ou da união estável: I - três anos, com menos de vinte e dois anos de idade; II - seis anos, entre vinte e dois e vinte e sete anos de idade; III - dez anos, entre vinte e oito e trinta anos de idade; IV - quinze anos, entre trinta e um e quarenta e um anos de idade; V - vinte anos, entre quarenta e dois e quarenta e quatro anos de idade; VI - vitalícia, com quarenta e cinco ou mais anos de idade. No caso concreto, considerando que o falecida tinha vertido mais de 18 (dezoito) contribuições mensais (vide ID 363464783), a união estável superou com folga o interregno de 2 (dois) anos e a idade do dependente era superior a 45 anos de idade no momento do fato gerador, tem-se que o autor faz jus à pensão vitalícia. DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA Sobre as parcelas vencidas incidirá correção monetária a partir do vencimento de cada prestação e juros de mora a partir da citação, nos termos da Resolução 134/2010 do Conselho da Justiça Federal (Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal), com as alterações promovidas pela Resolução no 267, de 02/12/2013, tendo em vista o decidido nas ADINs no 4357 e 4425, nas quais se declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 1o-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/09, observada a prescrição quinquenal e o limite de 60 salários mínimos na data do ajuizamento da ação – valor a ser apurado pela contadoria do juízo. Tal entendimento, inclusive, foi recentemente ratificado por unanimidade em Enunciado do III Encontro de Juízes Federais de Turmas Recursais e Juizados Especiais Federais da 3ª Região (11/2017): Enunciado n.º 31: O índice de correção monetária para atrasados previdenciários até a expedição do precatório é o INPC, por força do art. 31 do Estatuto do Idoso, não declarado inconstitucional, mantendo-se hígida a Resolução nº 267/2013 do CJF (Manual de Cálculos); a menção ao IPCA-E no RE 870.947, j. em 09/2017, foi decorrente do índice que constava do acórdão recorrido, mantido pela rejeição do recurso do INSS que defendia a aplicação da TR. Por fim, a decisão proferida pelo relator no RE 870.947, em 25/09/2018, limitou-se a atribuir efeito suspensivo aos embargos de declaração interpostos naqueles autos, não havendo, porém, qualquer determinação para suspensão de feitos em outras instâncias; corroborando tal conclusão, destaco que o próprio relator (Min. Luiz Fux) assim decidiu em despacho proferido aos 28.11.2018 nos autos do RE 870.947: (...) Por fim, em resposta ao Ofício nº 091/GMMCM, encaminhado pelo Ministro Mauro Luiz Campbell Marques, do Superior Tribunal de Justiça, registro que não houve nestes autos determinação do sobrestamento de qualquer demanda judicial. (...) Há, ao revés, verdadeira imposição de efeito erga omnes decorrente das ADINs 4357 e 4425, cujas atas de julgamento já foram publicadas, sendo este o marco inicial da sua eficácia cogente (ADI 711, Rcl 2576, Recl 3309 e Inf. 395/STF). Evidentemente, se no momento da liquidação da presente sentença tiverem ocorrido inovações no ordenamento jurídico, tal como o advento de nova legislação ou nova decisão proferida pelo STF com eficácia erga omnes, deverão as mesmas serem observadas, sem que isso implique em violação à coisa julgada, tendo em vista a cláusula rebus sic stantibus que acompanha toda sentença, o princípio tempus regit actum, a regra da aplicação imediata das leis (art. 6o da LINDB) e, por fim, o entendimento de que a correção monetária e os juros moratórios renovam-se mês a mês, aplicando-se a eles a legislação vigente à época da sua incidência (REsp 1111117/PR, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, CORTE ESPECIAL, DJe 02/09/2010) DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA Cuidando-se de prestação de natureza alimentar, é ínsita a urgência do provimento requerido; quanto à prova inequívoca da verossimilhança, encontra-se presente já que a demanda foi julgada procedente em cognição exauriente. Assim, presentes os pressupostos do art. 300 do CPC, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela, determinando ao INSS que proceda à implantação do benefício ora deferido observando a DIB fixada no dispositivo, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, conforme Portaria SP-JEF-PRES Nº 256, DE 29 DE AGOSTO DE 2023. Fica a parte autora ciente de que, consoante entendimento mais recente do e. Superior Tribunal de Justiça, poderá ser instada a devolver os valores recebidos a título de antecipação dos efeitos da tutela no caso de reforma da presente decisão (vide REsp 1384418/SC, Primeira Seção, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 30/08/2013 e AgInt no REsp 1624733/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe 29/05/2017). Diante disso, em não havendo interesse pela tutela, deverá peticionar nos autos requerendo a cessação da mesma. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, resolvendo o mérito nos termos do art. 487, inc. I do CPC, condenando o INSS a proceder da seguinte forma: Beneficiário(a): DONIZETE ALVES DE FREITAS Requerimento de benefício nº 209.812.506-7 Espécie de benefício: PENSÃO POR MORTE DIB: 25/03/2023 RMI: A SER CALCULADA PELO INSS RMA: A SER CALCULADA PELO INSS Prazo de duração: VITALÍCIA Antecipação de tutela: SIM Condeno o INSS, ainda, ao pagamento dos atrasados após o trânsito em julgado. O cálculo dos valores vencidos desde 25/03/2023 caberá à Contadoria Judicial, que deverá: 1) respeitar a Resolução vigente do Conselho da Justiça Federal que instituiu o Manual de Cálculos aplicável. 2) respeitar a prescrição quinquenal; 3) descontar eventuais benefícios previdenciários percebidos pela parte autora administrativamente, ou a título de tutela antecipada; 4) observar as regras de acumulação de benefícios previstas no artigo 24 da EC 103/2019. Sem custas e sem honorários nessa instância (art. 55 da Lei 9.099/95). P.R.I. FELIPE RAUL BORGES BENALI Juiz Federal
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