Processo nº 5000669-64.2023.4.03.6006
ID: 306714315
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Federal de Naviraí
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5000669-64.2023.4.03.6006
Data de Disponibilização:
25/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DANIEL MELLO DOS SANTOS
OAB/MT XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5000669-64.2023.4.03.6006 / 1ª Vara Federal de Naviraí AUTOR: JANE MARQUES MOREIRA Advogado do(a) AUTOR: DANIEL MELLO DOS SANTOS - MT11386/O REU: CAIXA ECONOMICA FEDER…
PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5000669-64.2023.4.03.6006 / 1ª Vara Federal de Naviraí AUTOR: JANE MARQUES MOREIRA Advogado do(a) AUTOR: DANIEL MELLO DOS SANTOS - MT11386/O REU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF Advogados do(a) REU: IGOR FACCIM BONINE - ES22654, LEONARDO DA COSTA ARAUJO LIMA - GO26929 S E N T E N Ç A VISTOS EM INSPEÇÃO I– RELATÓRIO Trata-se de ação de procedimento comum cível versando sobre vícios de construção. Alega a parte autora em sede de petição inicial que é beneficiária do Programa Minha Casa, Minha Vida, por intermédio do qual celebrou contrato de financiamento para a aquisição de imóvel. Narra que, com o transcurso do tempo e o uso regular do bem, constatou a existência de vícios construtivos de natureza oculta, motivo pelo qual postula suas reparações pela presente ação (ID. 288578391). A Caixa Econômica Federal, devidamente citada, apresentou contestação (ID. 297128056) alegando preliminares e, no mérito, a improcedência dos pedidos formulados. Foi determinada a realização de perícia técnica (ID. 328751531). A parte autora apresentou quesitos para a realização de perícia e réplica a contestação (ID. 329638259 e ID. 329972207). A ré apresentou quesitos para a realização de perícia e anexou comprovante de pagamento do perito judicial (ID. 330792975 e ID. 331087773). O perito judicial apresentou laudo pericial (ID. 345240772). As partes apresentaram impugnação ao laudo (ID. 346110850 e ID. 347203923). Vieram os autos conclusos para julgamento. É o relatório. Fundamento e decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Considerando que a prova pericial produzida é suficiente para a formação da convicção deste juízo, sendo desnecessária a intimação do perito para complementar quesitos, passo ao julgamento do processo no estado em que se encontra, nos termos do artigo 355, inciso I do Código de Processo Civil. Passo ao exame das preliminares arguidas pela ré Caixa Econômica Federal. 1. Preliminares 1.1 Ausência de interesse de agir Rejeito a preliminar de falta de interesse de agir por ausência de prévio requerimento administrativo. A CEF contestou o pedido, oferecendo resistência ao pleito da parte autora. 1.2 Ilegitimidade passiva da CEF A Lei nº 11.977/2009 instituiu o Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV, iniciativa do governo federal que tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, abrangendo o Programa Nacional de Habitação Urbana - PNHU e o Programa Nacional de Habitação Rural - PNHR. Nesse contexto, nos programas residenciais mantidos com recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), instituído pela Lei Federal n. 10.188/2001, a Caixa não atua apenas como agente financeiro, mas sim na qualidade de gestora do respectivo Fundo, caso em que responde por eventuais vícios de construção verificados nos imóveis e atraso na realização das obras, por isso tem legitimidade para figurar no polo passivo de ações que tenham como objeto indenização ou reparação desses vícios. No caso dos autos, em se tratando de contrato de financiamento imobiliário relacionado ao Programa Minha Casa Minha Vida, atuando a Caixa na qualidade de agente operacional e gestora do Fundo de Arrendamento Residencial, deve ser confirmada sua legitimidade passiva. Logo, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela CEF. 1.3 Da desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com a construtora e de denunciação da lide. Prevê o Código de Defesa do Consumidor a responsabilidade solidária de todas as empresas que formam a cadeia de fornecedores pelos defeitos na prestação do serviço, por força de seu artigo 14. A jurisprudência do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região é no sentido de que, em tais casos, a responsabilidade é solidária, podendo a parte ingressar em juízo contra a Caixa Econômica Federal e contra a construtora, em litisconsórcio, ou apenas contra uma delas, não se tratando, portanto, de litisconsórcio necessário (TRF-3 - AI: 50260439720194030000 MS, Relator.: Juiz Federal Convocado NOEMI MARTINS DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 26/03/2020, 1ª Turma, Data de Publicação: e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/03/2020). Do mesmo modo, rejeito a necessidade de promover à denunciação da lide à construtora, tendo em vista que, a CEF tem legitimidade passiva para responder pelos vícios de construção em imóvel, sem necessidade de denunciação da lide perante a construtora, sobretudo quando atua como administradora de programa social instituído pelo Governo Federal. No mais a CAIXA poderá fazer uso de seu direito de regresso contra a construtora, daí porque desnecessária a denunciação da lide. Logo, rejeito a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário entre a CEF e a construtora do imóvel bem como a denunciação da lide. 1.4 Da inépcia da petição inicial A parte ré suscita preliminar de inépcia da petição inicial, aduzindo, em síntese, que a petição inicial apresenta descrição genérica e não individualizada dos supostos vícios construtivos, o que obstaria a exata compreensão da controvérsia e prejudicaria o exercício do contraditório e da ampla defesa. Invoca, para tanto, os arts. 319, III, e 330, I, § 1º, I e II, do Código de Processo Civil (CPC), pleiteando a extinção do feito (art. 485, I, CPC). É certo que a petição inicial deve conter a exposição dos fatos e dos fundamentos jurídicos do pedido (art. 319, III, CPC), de modo a permitir à parte contrária o pleno exercício de sua defesa e ao Juízo a delimitação da atividade jurisdicional. A inépcia, como causa de extinção prematura do processo, somente se caracteriza, nos termos do art. 330, § 1º, do CPC, quando o vício da peça é de tal ordem que impossibilita o julgamento de mérito, por ausência ou ininteligibilidade da causa de pedir ou do pedido, incompatibilidade entre pedidos ou por veicular pedido juridicamente impossível. No contexto dos Juizados Especiais Federais (JEF), a interpretação de tais requisitos deve se harmonizar com os princípios da simplicidade e da celeridade que informam este microssistema (Lei n. 10.259/2001). Examinando-se o padrão das petições iniciais apresentadas em demandas desta natureza – versando sobre vícios construtivos em imóveis vinculados a programas habitacionais –, verifica-se que contém: a) A qualificação das partes e a individualização do imóvel; b) A contextualização fática (v.g., aquisição via PMCMV/FAR); c) A indicação, ainda que em linguagem comum, dos problemas construtivos alegados (infiltrações, fissuras, problemas em instalações, etc.); d) A atribuição de responsabilidade à parte ré; e) A fundamentação jurídica pertinente (responsabilidade civil, normas consumeristas, etc.); f) Os pedidos correspondentes (obrigação de fazer, indenização material e/ou moral). Tal estrutura, conquanto possa não esgotar todas as especificidades técnicas de cada vício – o que, de fato, demandaria conhecimento especializado de engenharia, não exigível do advogado na fase postulatória –, atende satisfatoriamente ao disposto no art. 319 do CPC. A inicial permite identificar com clareza a causa petendi (alegados defeitos construtivos no imóvel X, imputados à responsabilidade da ré) e os pedidos dela decorrentes. Não há que se falar em pedido "genérico" no sentido técnico-processual que invalida a peça. A descrição dos problemas, mesmo que não detalhada sob o prisma da engenharia, é suficiente para que a parte ré compreenda os fatos que lhe são imputados e possa apresentar sua contestação, negando os vícios, apontando outras causas (mau uso, falta de manutenção), discutindo prazos de garantia ou sua responsabilidade. O contraditório e a ampla defesa restam, assim, assegurados. A função da petição inicial não é exaurir a prova técnica, mas sim delimitar o objeto litigioso e indicar os fatos que serão objeto de instrução. A precisa caracterização técnica, a quantificação dos danos e a análise do nexo causal são questões próprias da fase instrutória, a serem elucidadas, primordialmente, por meio do exame técnico ou perícia judicial, cuja realização é, inclusive, frequentemente requerida pela própria parte autora em sua inicial. O indeferimento da inicial, no caso, representaria formalismo excessivo, incompatível com a instrumentalidade do processo e os princípios norteadores dos Juizados Especiais Federais, mormente quando a peça permitiu a compreensão da controvérsia e o exercício do direito de defesa. Ademais, cumpre ressaltar a impropriedade de arguir a inépcia da inicial como fundamento para a extinção do processo em sede de sentença. Eventuais vícios na petição inicial configuram matéria sujeita à análise em momento processual pretérito, tipicamente quando do recebimento da inicial ou por ocasião da resposta do réu, operando-se a preclusão se não suscitados oportunamente ou se, suscitados, foram rejeitados ou superados pelo prosseguimento do feito com a realização da instrução probatória. Permitir que o processo tramite por toda a fase cognitiva, com produção de provas, para só então, ao final, cogitar-se de extingui-lo por um suposto vício formal inicial que não impediu o seu desenvolvimento, atenta contra os princípios da economia processual, da estabilidade da demanda e da boa-fé objetiva. Ante o exposto, rejeito a preliminar de inépcia da petição inicial. 2. Da necessidade de comprovação dos fatos constitutivos do direito pelo beneficiário e acionamento da CAIXA dentro do prazo de garantia A preliminar arguida pela Caixa Econômica Federal – CEF, referente à necessidade de comprovação mínima dos fatos constitutivos do direito pela parte autora e ao acionamento da instituição dentro do prazo de garantia, não merece prosperar. Inicialmente, cumpre salientar que, embora incumba à parte autora o ônus de apresentar os fatos e fundamentos jurídicos de seu pedido (art. 319, III, CPC) e a prova mínima do fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, CPC), não se pode exigir, na fase postulatória, a demonstração cabal e tecnicamente detalhada de vícios construtivos, mormente quando se alega a existência de vícios ocultos ou que demandem conhecimento técnico específico para sua identificação e caracterização. A parte autora narrou na inicial os problemas enfrentados no imóvel e, posteriormente, em emenda, apresentou um orçamento preliminar que detalha os vícios e custos estimados, cumprindo satisfatoriamente o requisito de exposição da causa de pedir. A exata extensão e a natureza dos vícios (se decorrentes de falha na construção, materiais inadequados, falta de manutenção ou desgaste natural) são matérias eminentemente técnicas, cujo esclarecimento é próprio da fase instrutória, notadamente por meio de perícia judicial, já deferida nos autos, não sendo razoável indeferir a petição inicial por ausência de detalhamento técnico que foge à capacidade postulatória da parte. Ademais, a alegação de que a parte autora não teria acionado a CEF dentro dos prazos de garantia não se sustenta como óbice ao prosseguimento do feito ou como causa para afastar a responsabilidade da ré. Primeiro, porque a parte autora comprovou ter acionado a caixa por meio de notificação extrajudicial (ID. 288579856, ID. 288579858 e ID. 288579860), sem obter solução satisfatória, demonstrando a pretensão resistida e o interesse de agir. Segundo, porque os prazos decadenciais e prescricionais devem ser analisados à luz da natureza dos vícios alegados. Prazos de garantia mais curtos, como o previsto no art. 26 do CDC, aplicam-se a vícios aparentes ou de fácil constatação. Contudo, tratando-se de vícios ocultos ou que afetam a solidez e segurança da obra, o prazo é mais elastecido (art. 618 do Código Civil), iniciando-se, muitas vezes, a partir da ciência do defeito. Por fim, embora a CEF alegue a necessidade de comprovação de manutenções periódicas pela parte autora, tal ônus não pode ser imposto de forma absoluta como condição para a análise do mérito. A falta de manutenção pode, eventualmente, concorrer para o agravamento de danos, mas não exime, por si só, a responsabilidade da construtora e, solidariamente no caso do PMCMV-FAR, da CEF, por vícios originários da construção. A aferição de eventual culpa concorrente da autora por falta de manutenção é questão de mérito, a ser dirimida após a perícia técnica. Rejeita-se, pois, a preliminar. 3. Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça é pacífica na aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de mútuo bancário (Súmula nº 297) e na relação jurídica de direito material estabelecida entre o mutuário e o agente financeiros nos contratos de mútuo para aquisição de unidade habitacional (REsp 615553/BA, Primeira Turma, Min. Luiz Fux, DJ 28/02/2005 e REsp 1.352.227/RN, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 02/03/2015). Nessa linha, repiso que o Colendo Superior Tribunal de Justiça também reconhece a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos vinculados ao Programa de Arrendamento Residencial - PAR, que tem como objetivo justamente o atendimento da necessidade de moradia da população de baixa renda, situação análoga aos contratos no âmbito do PMCMV (REsp 1.352.227/RN, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, DJe 2/3/2015). Portanto, as regras do Código de Defesa do Consumidor aplicam-se aos contratos de financiamento vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação. 4. Mérito 4.1 Danos materiais A Lei nº 11.977/2009 instituiu o Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV, iniciativa do governo federal que tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, abrangendo o Programa Nacional de Habitação Urbana - PNHU e o Programa Nacional de Habitação Rural - PNHR. Nos termos do artigo 9º da citada Lei, a Caixa Econômica Federal qualifica-se como gestora de recursos do Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU), do Programa "Minha Casa, Minha Vida" (PMCMV). É sabido que, quando se trata de simples contrato de mútuo, não incluído no âmbito de programas governamentais, o papel da Caixa Econômica Federal restringe-se à condição de mera credora fiduciária, ao fornecer os valores necessários para saldar o pagamento do imóvel, sendo irresponsável pela integridade do imóvel e por eventuais vícios existentes na construção, uma vez que não participa da construção e nem se compromete a garantir a solidez e qualidade da obra. Todavia, não é este o caso dos autos. Nos contratos de financiamento de imóveis incluídos no Programa Minha Casa, Minha Vida preveem a obrigatoriedade da CEF em entregar o imóvel em perfeitas condições de uso e conservação e, verificado vício, tem ela a obrigação de custear os devidos reparos. A responsabilidade civil da CEF dependerá das circunstâncias em que se verifica sua intervenção no caso concreto: a) inexistirá responsabilidade da CEF, quando ela atuar como agente financeiro em sentido estrito; e b) existirá responsabilidade da CEF, quando ela como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda, isto é, nas hipóteses em que tenha atuado, de algum modo, na elaboração do projeto, na escolha do terreno, na execução das obras (construção) ou na fiscalização das obras do empreendimento. Desse modo, a responsabilidade solidária da CEF pelos vícios na construção e pela respectiva solidez e segurança do imóvel se restringe aos casos em que ela também desempenhar o papel de executora de políticas federais de promoção de moradia, casos em que assume responsabilidades próprias, definidas em lei, regulamentação infralegal e no contrato celebrado com os mutuários. Os papéis desenvolvidos em parceria pela construtora e pelo agente financeiro poderão levar à vinculação de ambos ao negócio jurídico, acarretando na responsabilidade solidária. Nesse sentido: STJ: AgRg no REsp 1522725/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 22/02/2016: TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2213692 - 0003515-76.2013.4.03.6108, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 29/05/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/06/2018. Em casos em que se vindica indenização decorrente de fato danoso ocorrido em relação consumerista, entretanto, a responsabilidade é objetiva do prestador do serviço, relevando-se, assim, a inexigência do requisito da culpa. É o quanto prevê o artigo 3º, § 2º, da Lei n.º 8.078/1990, Código de Defesa do Consumidor, bem como seu artigo 14, segundo o qual “o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua função e riscos”. Além disso, o Código Civil dispõe nos artigos 186, 927, 931 e 942 que: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação. Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932. A obrigação de indenizar nasce a partir da prática de um ato ilícito, cujos requisitos mínimos são: 1) a conduta (ação ou omissão); 2) o dano patrimonial ou moral (extrapatrimonial); 3) o nexo de causalidade entre a conduta e o dano. Em resumo, quando a CEF atuar como agente fiscalizador de prazos e qualidade da obra, gerindo os recursos financeiros e técnicos juntamente com a construtora/incorporadora, interferindo diretamente na execução do projeto, deve responder, objetiva e solidariamente, com a construtora pela reparação dos danos causados em decorrência do exercício de sua atividade. No caso dos autos, a questão consiste em examinar a responsabilidade da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF) por danos materiais e morais em razão de diversos problemas advindos à residência adquirida pela parte autora através do Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV, na forma da Lei nº 11.977/09. A parte autora adquiriu imóvel residencial localizado na Rua Amaranta 135 LOTE BL-09 QD 01 CASA N° AP-07, CEP 79950-000, RESIDENCIAL NELSON TRA, Naviraí/MS, através de financiamento habitacional, por meio de programa nacional de habitação urbana, com recursos do programa Minha Casa Minha Vida, efetuado com a ré CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF), obra que foi construída pela COPLAN CONSTR PLANEJ IND E COMERCIO - CNPJ: 03.225.646/0001-65, relatando que, após a ocupação do imóvel, iniciaram-se inúmeros problemas relacionados a vícios de construção. O laudo pericial elaborado pelo perito judicial constatou a existência de vícios ocultos (não detectáveis na entrega do imóvel) de projeto e construção no imóvel financiado (id. 345240772). Destacam-se: a) INFILTRAÇÃO EM PAREDES INTERNAS ORIUNDAS DE PROCESSO DE CAPILARIDADE DESLOCANDO UMIDADE PELO HALL DE ENTRADA (VÍCIO OCULTO) Causas: Revestimento argamassado e contrapiso do hall fissurado, que ocasiona o deslocamento de água por percolação para dentro da parede do pavimento inferior. Localização: Paredes internas e externas. b) INFILTRAÇÃO EM LAJE, PENETRAÇÃO PELA COBERTURA (VÍCIO OCULTO) Causas: Telhado com falha na instalação, desalinhamento de telhas cerâmicas, que resultam em pequenos espaços onde pode haver a penetração de água. Localização: Paredes internas. c) FISSURAS HORIZONTAL EM PAREDE (VÍCIO OCULTO) Causas: Fissura em parede com aberturas, causadas pela deformação dos componentes estruturais. Localização: Junção laje parede externa Em relação aos custos dos danos por etapa construtiva, o Sr. Perito concluiu que o custo de recuperação está estimado em R$ 5.263,82 (cinco mil, duzentos e sessenta e três reais e oitenta e dois centavos), não sendo necessária a desocupação do imóvel. Assim, entendo que as considerações constantes do laudo pericial são suficientes para esclarecer as razões de conclusão do perito. Qualquer discordância, neste ponto, possui relação com o mérito da questão técnica debatida e não com a falta de fundamentação ou clareza do laudo pericial, não se revelando, portanto, útil e pertinente nova intimação do profissional sobre os questionamentos já submetidos ao seu exame. Cabe, assim, ao julgador, neste estágio do processo, avaliar as divergências técnicas entre o laudo pericial e as manifestações das partes, decidindo qual deve prevalecer, pois, como é cediço, não está ele adstrito à prova pericial, podendo dela discordar para formar a sua convicção. Dito isso, entendo que as conclusões do laudo pericial elaborado devem predominar. Note, a forma de cálculo do perito evidencia que os fatores necessários à reparação do dano foram considerados, inclusive custos adicionais para isso. Além disso, alguns problemas verificados foram excluídos da responsabilidade da construtora por serem atribuídos a mau uso ou falta de manutenção pelo proprietário. Esses vícios não foram incluídos no cálculo dos custos de reparação. Logo, suficientemente provados os danos e as causas verificadas no imóvel, de sorte que a reparação é medida imperiosa, no valor estimado pelo perito. 4.2 Danos morais O dano juridicamente reparável nem sempre pressupõe um dano patrimonial ou econômico, podendo ocorrer única e exclusivamente um dano moral, cabendo ao magistrado verificar se a conduta violou a intimidade, vida privada, honra (objetiva e subjetiva) ou imagem do lesado. Não é qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização. O STJ já pacificou o entendimento no sentido de que o mero aborrecimento, dissabor, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral. Assim, somente deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, de forma anormal e grave, interfira no comportamento psicológico do indivíduo, atingindo a sua honra subjetiva, bem como nos reflexos causados perante a sociedade, quando atingida a sua honra objetiva. Com efeito, o mero inadimplemento contratual não configura, por si só, o dano moral, sendo necessária a comprovação de angústia e sofrimento da parte autora e de seus familiares em razão das condições de habitabilidade do imóvel e da ausência de reparos ou de intervenções ineficazes pela construtora, impedindo a utilização integral da moradia. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem decidido, nas ações que tratam de vícios de construção, que o dano moral não pode ser presumido (in re ipsa), "configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel" ( AgInt no REsp 1955291/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Quarta Turma, julgado em 14/02/2022, DJe 02/03/2022). No caso dos autos, os vícios de construção identificados no imóvel, em razão de sua quantidade e sua natureza, não configuram qualquer situação excepcional de violação a direitos da personalidade, mas sim mero dissabor ou aborrecimento à parte autora, sendo incabível, portanto, indenização por danos morais. Nesse diapasão, tem-se que os danos constatados no imóvel não são capazes de causar perturbação à paz da parte autora e de seus familiares, ensejando abalo em seu psiquismo digno de reparação por danos morais. Por tais fundamentos, com relação aos danos materiais, entendo haver responsabilidade da parte ré (CEF), porquanto responsável pela vistoria e liberação do valor da aquisição, assim como pela fiscalização da construção da obra e pela necessidade dos reparos causadores do dever de indenizar, nos termos do Código de Defesa do Consumidor e dos artigos 186, 927 e 942 do Código Civil. 4.3 Dos honorários assistenciais Considerando que a parte autora não apresentou nos autos contrato ou comprovante de pagamento do assistente técnico nomeado por ela, e que o laudo pericial indica que não houve acompanhamento deste na realização da perícia, indefiro o pedido postulado na inicial quanto à condenação do réu ao pagamento dos honorários assistenciais. III. DISPOSITIVO Ante todo o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES, com resolução do mérito, os pedidos formulados pela parte autora para: a) Condenar a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF), a pagar à parte autora indenização pelos danos materiais comprovados, no montante estimado de R$ 5.263,82 (cinco mil, duzentos e sessenta e três reais e oitenta e dois centavos), sobre o qual incidirá juros de mora a partir da data da citação e correção monetária a partir da data de juntada do laudo técnico, na forma e nos índices constantes do Manual de Procedimentos para os cálculos da Justiça Federal vigente à época da execução; Defiro/mantenho a gratuidade processual. Por consequência da sucumbência, condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios que fixo no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do § 2º do art. 85 do CPC. Havendo interposição tempestiva de recurso, intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo legal e, após, com ou sem apresentação destas, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com as formalidades de praxe. Por fim, determino o levantamento, pelo perito nomeado nos autos, dos honorários periciais depositados pelo réu. Cópia desta sentença serve como ofício de levantamento em favor do perito ROGÉRIO MARTINS VIEIRA, engenheiro civil designado para a elaboração do laudo pericial nos autos. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. Naviraí, na data da assinatura eletrônica. NAVIRAÍ, 29 de maio de 2025.
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