Resultados para "1001921-74.2024.5.02.0706" – Página 105 de 105

Eberson Neuls Da Silva x Socinal S.A. - Credito, Financiamento E Investimento e outros

ID: 322977074

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE CLÁUDIA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000407-62.2021.8.11.0101

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

EBERSON NEULS DA SILVA

Polo Passivo:

SOCINAL S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO SOLFACIL SECURITIZADORA DE CREDITOS FINANCEIROS S.A. WELLINGTON SIMOES E CIA LTDA - ME

Sentença

Advogados:

SYLVIO FEITOSA DE FREITAS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

JACKSON SOKOLOVSKI ALVES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE CLÁUDIA SENTENÇA Processo: 1000407-62.2021.8.11.0101. REQUERENTE: EBERSON NEULS DA SILVA REQUERIDO: WELLINGTON SIMOES E CIA LTDA - ME, SOCINAL S.A… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE CLÁUDIA SENTENÇA Processo: 1000407-62.2021.8.11.0101. REQUERENTE: EBERSON NEULS DA SILVA REQUERIDO: WELLINGTON SIMOES E CIA LTDA - ME, SOCINAL S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, SOLFACIL SECURITIZADORA DE CREDITOS FINANCEIROS S.A. Vistos. SENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO DECORRENTES DE DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA, proposta por EBERSON NEULS DA SILVA em desfavor de WELINGTON SIMOES E CIA LTDA (W3 SOLAR ENERGIA), SOCINAL S.A. – CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO e SOLFÁCIL SECURITIZADORA DE CRÉDITOS FINANCEIROS S.A, todos qualificados nos autos. Alega que é proprietário de uma distribuidora de bebidas junto com sua família e decidiram adquirir placas solares com a requerida W3 Solar Energia, visto que seu consumo é muito elevado. Ante as vantagens oferecidas pela empresa W3 para instalação de energia solar fotovoltaico, decidiram fechar negócio e contratá-la. Disse que a requerida indicou a financiadora SOCINAL para celebrar o financiamento das placas solares e que apesar de não conhecer a empresa, confiou na indicação e contratou com a financiadora requerida. Declarou que no dia 29/10/2020, emitiu a Cédula de Crédito Bancário em favor da requerida SOCINAL no valor de R$ 133.156,00 (cento e trinta e três mil, cento e cinquenta e seis reais) parcelado em sessenta vezes, sendo a primeira parcela descontada após a carência de 90 dias até a finalização da execução do sistema de energia solar contratado. Aduziu que como garantia do contrato foi conferido a financiadora todos os equipamentos adquiridos contratualmente com a empresa de energia solar e foi autorizada a transferência de valores da financiadora SOCINAL para a empresa W3 Solar Energia, o que foi feito na mesma data. Menciona que com o pagamento, a empresa de energia solar tinha um prazo para execução da obra, porém não cumpriu e ultrapassada a carência de 90 (noventa) dias, a empresa SOCINAL protestou o nome do autor por falta de pagamento das parcelas. Esclareceu que antes mesmo do protesto acontecer entrou em contato com a empresa W3 solicitando uma solução, porque as placas solares não tinham sido instaladas e os descontos do financiamento estavam acontecendo, sendo informado que não teria problemas com a falta de pagamento, pois já estava prorrogando a carência, porém acabou sendo protestado pela requerida SOCINAL. Salienta que as requeridas, ao tomarem conhecimento da presente demanda, enviaram placas solares até o estabelecimento do autor, sem previsão de instalação, mas se negou a recebê-las. Diante do exposto, considerando o descumprimento do contrato por parte da requerida W3 Solar Energia, requer a rescisão contratual com a requerida SOCINAL e a suspensão dos descontos das parcelas referente ao financiamento feito para aquisição das placas solares, visto que as requeridas agiram por meio de “venda casada”, sendo ambas responsáveis pelos danos causados ao autor. Pleiteia pela inversão do ônus da prova. Juntou documentos à inicial. Inicial recebida e liminar deferida em Id. 68593518. Devidamente citada, a instituição financeira Socinal S.A – Crédito, Financiamento e Investimento apresentou contestação tempestiva em Id. 79596246, rebatendo os pedidos autorais. Preliminarmente, requereu a sua ilegitimidade passiva, em razão de não ser mais a credora do valor devido pelo autor. No mérito, defende a ausência de relação da Socinal com a instalação do sistema fotovoltaico, inexistência de venda casada, descabimento do pedido de rescisão da Cédula de Crédito Bancário, bem como ausência de danos morais, pela inexistência de conduta ilícita. Por fim, pugna pela improcedência da ação. Contestação apresentada pelo réu Wellington Simões & Cia LTDA (W3SOLAR). Alegando preliminarmente a ausência de condições da ação, em razão da ilegitimidade ativa. Ainda, apresentou impugnação a justiça gratuita concedida ao autor. No mérito, aduz que o reclamante agiu com deslealdade, violando a boa-fé presente nas fases do negócio, tendo em vista a recusa no recebimento do produto. Também manifestou pela ausência de dano indenizável e improcedência da demanda (Id. 114517886). Impugnação as contestações apresentadas em Id. 118480993 e Id. 118480997. Decisão de Id. 128739122, afastando a preliminar de ilegitimidade passiva apresentada pela ré Socinal, incluindo no polo passivo da demanda a empresa endossatária Solfácil Securitizadora de Crédito Financeiros S.A. Audiência de conciliação inexitosa, eis que as partes não apresentaram nenhuma proposta de acordo (Id. 133247171). Contestação da ré Solfácil Securitizadora de Créditos Financeiros S.A em Id. 136024614. Preliminarmente, alega a sua ilegitimidade (responsabilidade exclusiva do integrador). Ainda, impugnou a concessão dos benefícios da justiça gratuita ao autor. No mérito, aduz ausência de ato ilícito e, requer a não inversão do ônus da prova. Impugnação à contestação apresentada pela ré Solfácil em Id. 189973666. Intimadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir, a empresa Socinal pugnou pelo julgamento antecipado do feito, enquanto a empresa ré Wellington Simões & Cia Ltda-Me pugnou pela oitiva da parte reclamante. É, em síntese, o relatório. II – FUNDAMENTAÇÃO Nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, o feito comporta julgamento antecipado, eis que o litígio versa sobre matéria exclusivamente de direito e, por conseguinte, inexiste necessidade de produção de prova em audiência ou qualquer outro tipo de instrução. Registra-se, outrossim, que “quando for o caso, o julgamento antecipado não é faculdade, mas dever que a lei impõe ao julgador, em homenagem ao princípio da economia processual” (DIDIER JR., Fredie. “Curso de Direito Processual Civil”. Vol. 1. 12ª ed. Salvador: Juspodivm, 2009, p. 530.) Passo a analisar as preliminares. DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE. A preliminar de ilegitimidade suscitada pelo primeiro réu, tal como fundamentada, confunde-se com o próprio mérito da ação; e, portanto, com ele será analisada. DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA RÉ (SOLFÁCIL SECURITIZADORA DE CRÉDITOS FINANCEIROS S.A). Havendo pertinência subjetiva entre o pedido realizado e a parte contra qual foi ele dirigido, deve ser rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva. No caso dos autos, vê-se que a relação de compra e venda está totalmente ligada ao contrato de financiamento, de que forma que ambos os contratos possuem ligação e, no fundo, configuram um único negócio jurídico, interdependente um do outro. DA IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA E DESERÇÃO. A parte requerida alegou a inaplicabilidade da justiça gratuita ao autor, bem como deserção, em razão da ausência de correção monetária das parcelas pelo pagamento irregular do parcelamento concedido. Não assiste razão à parte requerida. Inicialmente, no que se refere à alegação de inaplicabilidade da justiça gratuita, observa-se que o benefício sequer foi concedido nos autos. Ademais, em relação à suposta deserção, verifica-se que o parcelamento das custas foi autorizado judicialmente, o qual foi devidamente cumprido pela parte. A exigência de correção monetária das parcelas, embora possa ser cabível, não pode ser invocada para afastar o direito ao parcelamento já deferido, tampouco para caracterizar a deserção. Assim, inexistindo descumprimento relevante da obrigação imposta ao autor, não há que se falar em deserção. Assim, REJEITO as preliminares ventiladas. DA APLICAÇÃO DO CDC. De início, há que se ter em conta que a relação travada entre as partes é nitidamente de consumo e, portanto, o caso deve ser julgado à luz das disposições contidas no CDC. No mesmo norte, tenho clara a verossimilhança do direito alegado pelo requerente, tal como já exposto na decisão que deferiu a tutela antecipada; bem como se faz notória a hipossuficiência técnica e econômica do autor frente as requeridas, de modo que DECRETO A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DO MÉRITO. Pois bem, trata-se de ação de rescisão contratual cumulada com indenização decorrente de danos morais, ajuizada pelo autor em razão de contrato de prestação de serviços de execução e implantação de usina fotovoltaica (energia solar), firmado com a primeira ré, a partir de contrato de financiamento celebrado pelo autor com a segunda requerida. Informa o autor que não houve a entrega e instalação dos equipamentos no prazo convencionado, o que teria ensejado a rescisão contratual, bem como os prejuízos morais, ora pleiteados. Em sua contestação a ré (SOCINAL) informa não ser parte legítima, ante o endosso do crédito à Solfácil Securitizadora. Defende, ainda, a ausência de relação da Socinal com a instalação do sistema fotovoltaico, inexistência de venda casada e/ou responsabilidade objetiva da Socinal, o descabimento do pedido de desconstituição da CCB e a ausência de danos morais ao Autor. Embora a parte requerida sustente ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, verifica-se que a empresa Socinal possui vínculo direto com o dano sofrido pelo autor, uma vez que a aquisição da usina elétrica ocorreu no contexto de uma possível venda casada entre as empresas rés. A análise cuidadosa da cédula de crédito bancário revela que a garantia do contrato firmado foi justamente o conjunto de placas solares negociadas com a empresa Wellington Simoes e Cia Ltda, o que configura a existência de vinculação negocial entre as rés, caracterizando a prática de venda casada. A ré Solfácil também alega a sua ilegitimidade, aduzindo responsabilidade exclusiva do integrador. O integrador W3SOLAR por sua vez aduz a ilegitimidade ativa, eis que o autor não é parte do Contrato de Venda e Instalação de Sistema de Geração de Energia Solar Fotovoltaico, haja vista a figura de o contratante ser o Sr. Acir João da Silva (genitor do autor). Contudo, razão não assiste à requerida. Embora o contrato de compra e venda das placas solares tenha sido formalmente assinado pelo genitor do autor, restou demonstrado que foi o próprio autor quem firmou a Cédula de Crédito Bancário utilizada para viabilizar o financiamento do referido equipamento. Ou seja, o autor assumiu, de forma direta, a obrigação financeira decorrente da aquisição do bem, sendo parte interessada e diretamente afetada pela relação jurídica questionada. Dessa forma, verifica-se que o autor possui interesse de agir e legitimidade ativa, uma vez que pleiteia a rescisão contratual com base na operação financeira da qual é titular, estando presente o nexo entre a sua posição jurídica e a pretensão deduzida. Ademais, o princípio da primazia da resolução do mérito recomenda interpretação ampliada da legitimidade, especialmente em hipóteses como a presente, em que há elementos suficientes que evidenciam a participação ativa e direta do autor no negócio jurídico objeto da demanda. Ainda, analisando os argumentos das partes e as provas carreadas aos autos, verifica-se que a pretensão Autoral merece prosperar. Extrai-se das provas existentes nos autos que, de fato, o serviço contratado não foi entregue no prazo previsto, conforme a requerida Wellington Simões e Cia Ltda informa em sua defesa. Transcrevo: “(...) Além da demora na avaliação do projeto pela Concessionária, porém já com a análise e aprovação, bem como com todos os documentos legais prontos para a execução dos serviços, ocorreu atraso no envio dos materiais, pela justificativa apresentada de ausência de matéria prima, fechamento de alguns setores e outros fatores relacionados a logística. (...) Diante do atraso, o autor informou recusa ao pagamento das parcelas do financiamento bancário e, grosseiramente, exigiu providências deste defendente no tocante a isso. Porém, como sabido por qualquer homem médio, o contrato de financiamento com a Instituição Financeira é independente do serviço contratado – o banco exige o pagamento em decorrência do empréstimo que foi tomado, sem interferência com a relação jurídica existente com a W3Solar (...)” Por óbvio que, se o serviço tivesse sido entregue no prazo, jamais teria efetuado o depósito do valor de R$ 9.097,23 (nove mil, noventa e sete reais e vinte e três centavos) como ressarcimento das faturas de consumo de energia do local. Assim, é de rigor a decretação da rescisão contratual, por culpa da requerida WELLINGTON SIMOES E CIA LTDA, pois não restam dúvidas da falha na prestação dos serviços da requerida, que culminou com o pedido de rescisão do contrato de financiamento, pelos serviços contratados e não prestados no prazo estipulado. Portanto, diante das provas juntadas aos autos, verifico que houve falha na prestação do serviço por parte da primeira requerida, atinente ao descaso com o consumidor. Em relação à responsabilidade solidária, verifica-se que também assiste razão ao autor. A interdependência dos negócios jurídicos teria, ao que parece, beneficiado ambas as empresas. No caso, ambas as rés contrataram com o autor, de modo que são passíveis de responsabilidade pelos danos alegados. Nesse quadro, seja pela participação direta na relação jurídica, seja por se tornar um elo da cadeia de fornecimento do produto, nos termos do CDC, exsurge a responsabilidade civil da mutuante e, por conseguinte, sua legitimidade passiva ad causam. Há de se reconhecer a diferença marcante entre as situações acima narradas. Uma coisa é o consumidor adquirir um bem que deseja e procurar uma instituição financeira, a seu critério de escolha, que possibilite o respectivo financiamento, seja na casa bancária em que já possui conta corrente ou em outra qualquer que atenda suas condições. Diferentemente se dá quando o próprio fornecedor do produto proporciona esse financiamento como se fosse um negócio só! Nesse sentido, ao participar da concretização do contrato, a instituição financeira atrai para si os deveres contratuais anexos da boa-fé e lealdade, devendo assim zelar pelo bom desenvolvimento da contratação, prezando por sua higidez. Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça se pronunciou: “AGRAVO INTERNO. RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATOS. COMPRA E VENDA. MÚTUO BANCÁRIO GARANTIDO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. POSSIBILIDADE. REVENDEDORA DE AUTOMÓVEIS E INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ATUAÇÃO CONJUNTA EM PARCERIA COMERCIAL. 1. Constatada a atuação da revendedora de automóveis em parceria com a instituição financeira, é possível o reconhecimento da responsabilidade solidária com a consequente rescisão dos contratos de financiamento e de compra e venda. 2 . Há distinção entre as instituições financeiras que atuam como "banco de varejo" e os "bancos de montadoras", que apenas concedem financiamento ao consumidor para aquisição de um veículo novo ou usado sem vinculação direta com o fabricante ( REsp n. 1.379.839) . 3. Agravo interno desprovido.” (STJ - AgInt no AREsp: 868170 SP 2016/0047307-0, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 23/08/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/08/2016). Em atenção a essa realidade social, o legislador nacional regulamentou relações jurídicas dessa natureza, por meio da Lei nº 14.181/2021, que inseriu o art. 54-F, no CDC, da seguinte forma: “Art. 54-F. São conexos, coligados ou interdependentes, entre outros, o contrato principal de fornecimento de produto ou serviço e os contratos acessórios de crédito que lhe garantam o financiamento quando o fornecedor de crédito: (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) I - recorrer aos serviços do fornecedor de produto ou serviço para a preparação ou a conclusão do contrato de crédito; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) II - oferecer o crédito no local da atividade empresarial do fornecedor de produto ou serviço financiado ou onde o contrato principal for celebrado. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 1º O exercício do direito de arrependimento nas hipóteses previstas neste Código, no contrato principal ou no contrato de crédito, implica a resolução de pleno direito do contrato que lhe seja conexo. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 2º Nos casos dos incisos I e II do caput deste artigo, se houver inexecução de qualquer das obrigações e deveres do fornecedor de produto ou serviço, o consumidor poderá requerer a rescisão do contrato não cumprido contra o fornecedor do crédito. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 3º O direito previsto no § 2º deste artigo caberá igualmente ao consumidor: (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) I - contra o portador de cheque pós-datado emitido para aquisição de produto ou serviço a prazo; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) II - contra o administrador ou o emitente de cartão de crédito ou similar quando o cartão de crédito ou similar e o produto ou serviço forem fornecidos pelo mesmo fornecedor ou por entidades pertencentes a um mesmo grupo econômico. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 4º A invalidade ou a ineficácia do contrato principal implicará, de pleno direito, a do contrato de crédito que lhe seja conexo, nos termos do caput deste artigo, ressalvado ao fornecedor do crédito o direito de obter do fornecedor do produto ou serviço a devolução dos valores entregues, inclusive relativamente a tributos. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)” In casu, há responsabilidade civil da instituição financeira e do correspondente bancário, nos termos das disposições legais e jurisprudenciais, sendo plenamente possível a resolução do contrato coligado, caso verificado o inadimplemento da fornecedora de serviços, participante do contrato principal. Diante do exposto, a rescisão contratual da Cédula de Crédito Bancária (Id. 55746811), com a declaração de inexistência de débitos é a medida que se impõe! Verifica-se, ainda, que a parte reclamada apresentou pedido contraposto, requerendo o ressarcimento dos valores despendidos para o cancelamento de protesto de títulos, com acréscimos de juros e correção monetária. Fundamenta seu pleito na alegação de que não teria agido com má-fé, e que, se houve falha na prestação do serviço, esta não seria suficiente para justificar a imputação do ônus financeiro à demandada. Todavia, o pedido contraposto também não merece acolhimento. A análise dos autos revela que a iniciativa da reclamada em cancelar o protesto decorreu diretamente da irregularidade na prestação do serviço, a qual resultou na judicialização do conflito. Ademais, ficou evidente que o protesto foi indevidamente realizado, sendo que o seu cancelamento foi a consequência natural da tentativa do requerido em mitigar os efeitos de uma cobrança reputada como indevida. Nesse contexto, não há respaldo jurídico para imputar ao autor o dever de ressarcir valor que a própria parte reclamada decidiu suportar, por iniciativa própria, diante do reconhecimento da controvérsia envolvendo a legalidade do título protestado. Dessa forma, inexistindo qualquer conduta ilícita ou omissiva do autor que justifique o ressarcimento pretendido, o pedido contraposto deve ser indeferido. Com relação ao dano moral, indubitável a sua ocorrência. A existência do dano moral sofrido pela parte autora está evidenciada pelo próprio fato, observada a lição do Desembargador SÉRGIO CAVALIERI FILHO "o dano moral existe in re ipsa", ou seja, "está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si" (Programa de Responsabilidade Civil, 2ª ed., Malheiros, p. 80). Assim, o desrespeito e o descaso com a consumidora ultrapassam os pequenos transtornos da vida cotidiana. Com isso, o acolhimento dos danos morais é medida necessária para o deslinde da causa. Outrossim, a fixação dos danos morais, deve-se levar em consideração, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Nesse sentido colaciono: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTENCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - VALOR DA INDENIZAÇÃO - PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. - Para fixação dos danos morais, deve-se levar em consideração as circunstâncias de cada caso concreto, tais como a natureza da lesão, as consequências do ato, o grau de culpa, as condições financeiras das partes, atentando-se para a sua dúplice finalidade, ou seja, meio de punição e forma de compensação à dor da vítima, não permitindo o seu enriquecimento imotivado.” (TJ-MG - AC: 10000180448102001 MG, Relator: Mota e Silva, Data de Julgamento: 26/06/2018, Data de Publicação: 26/06/2018). “RECURSO INOMINADO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR - PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO – REJEITADA- COMPRA PELA INTERNET - PRODUTO PAGO E NÃO ENTREGUE - TENTATIVA DE SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA INEXITOSA - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA - DEVER DE INDENIZAR - QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO - DANO MATERIAL - INDEVIDO - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1- Rejeito a preliminar de falta de interesse de agir, pois não se faz necessário o prévio requerimento ou o esgotamento da via administrativa para que a parte autora busque a tutela jurisdicional, sob pena de negar-se aplicação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, insculpido no artigo 5º, inciso XXXV, da Carta Magna de 1.988. 2- No caso, restou incontroverso que a recorrente não efetuou a entrega do produto adquirido pelo consumidor, porquanto, configurada a falha na prestação do serviço, o que tipifica a conduta ilícita ensejando a indenização por dano moral. 3- Tentativa de solução do litígio na seara administrativa inexitosa. 4- Ressalte-se ser desnecessária a comprovação específica do prejuízo, pois o dano se extrai pela só verificação da conduta, ocorrendo o chamado dano in re ipsa. 5- Com relação ao valor indenizatório, tenho que a quantia arbitrada na sentença deve ser mantida, pois se mostra adequada ao caso concreto, estando em conformidade com os parâmetros da proporcionalidade e da razoabilidade, servindo para compensar o recorrido pelos transtornos sofridos, sem lhe causar enriquecimento ilícito. 6- Não há de se falar em danos materiais, quando o valor pago pelo produto não entregue já foi estornado. 7- Recurso conhecido e parcialmente provido.” (N.U 1001921-29.2021.8.11.0011, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALDECI MORAES SIQUEIRA, Turma Recursal Única, Julgado em 22/02/2022, Publicado no DJE 23/02/2022) Assim, atento a estes critérios, fixo a indenização no valor requerido pela autora, para condenar as rés ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para o autor. III – DISPOSITIVO Isto posto, com fulcro no disposto no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE a ação, para DECLARAR RESCINDIDO O CONTRATO celebrado entre as partes (Id. 55746811) e CONDENAR solidariamente a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais ao autor, no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), atualizados com juros de mora desde a citação e correção monetária pelo INPC a partir da sentença, confirmando a tutela antecipada concedida. Declaro a extinção do processo com julgamento do mérito. Ainda, JULGO IMPROCEDENTE o pedido contraposto, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil. Com fulcro no disposto no artigo 86, parágrafo único, do CPC, condeno as requeridas ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de forma pro rata, que fixo em 15% sobre o valor da condenação, haja vista o teor do artigo 85, §2º, incisos I a IV, do CPC. Anoto que a oposição de embargos de declaração manifestamente protelatórios (inclusive voltados à mera rediscussão do julgado) poderá dar ensejo à aplicação da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil. Caso interposto recurso de apelação, dê-se vista à parte recorrida para contrarrazões, no prazo legal. Após, independentemente de juízo de admissibilidade, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso, nos termos do artigo 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil, tomando-se as providências necessárias. Ausente recurso, certifique-se o trânsito em julgado, e arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cláudia, datado eletronicamente. THATIANA DOS SANTOS Juíza de Direito

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0807648-18.2025.8.20.5004

ID: 328495957

Tribunal: TJRN Órgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 0807648-18.2025.8.20.5004

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BRUNO HENRIQUE DE OLIVEIRA VANDERLEI

Intimação

Advogados:

FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

BRUNO HENRIQUE DE OLIVEIRA VANDERLEI

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025… Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0807648-18.2025.8.20.5004 Parte autora: CAIO CESAR ALVES CAMARA DA SILVA Parte ré: BANCO C6 S.A. e outros SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. CAIO CESAR ALVES CAMARA DA SILVA ajuizou a presente demanda contra BANCO C6 S.A e ZURICH MINAS BRASIL SEGUROS S.A, narrando que: I) no dia 04 de abril de 2025, foi vítima de um roubo logo após realizar um saque no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) em um caixa eletrônico; II) imediatamente após o ocorrido, e em um gesto de cautela, procedeu ao bloqueio de seus cartões e acionou o seguro "Cartão Protegido", contratado junto ao C6 Bank em parceria com a Zurich Seguros; III) ao entrar em contato com a seguradora, foi informado por um(a) atendente de que, de acordo com os termos de uso do seguro disponíveis no website do C6 Bank, datados de 2021, a cobertura incluía casos de roubo após saque; IV) procedeu à abertura de um protocolo de atendimento, cumprindo rigorosamente todos os trâmites exigidos pela seguradora, contudo, o que se seguiu foi uma verdadeira saga de desinformação e descaso por parte das rés; V) passou a procrastinar os prazos de resposta de forma sucessiva, sem apresentar qualquer justificativa plausível ou resposta concreta, mesmo após o transcurso de quase 30 (trinta) dias do ocorrido, sendo que as promessas de contato por e-mail e telefone, reiteradamente feitas pela seguradora, jamais foram cumpridas. Com isso, requereu a restituição da quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), relativa à transação fraudulenta, bem como a condenação ao pagamento da quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de compensação por danos morais. Inicialmente, a ré ZURICH MINAS BRASIL SEGUROS S.A alegou, em síntese, ausência de responsabilidade em razão de inexistência de cobertura securitária, além da inocorrência dos danos morais. Já o réu BANCO C6 S.A, preliminarmente, suscitou, necessidade de tramitação em segredo de justiça, impugnou o pleito de concessão da gratuidade da justiça, além do comprovante de residência anexado aos autos. Inicialmente, não há razão para decretação de segredo de justiça, considerando a ausência dos requisitos e condições previstos no art. 189, do Código de Processo Civil. Dessa forma, REJEITO tal preliminar. Em razão dos procedimentos previstos na Lei 9.099/95 e da gratuidade inerente aos Juizados Especiais quando se trata de demanda no primeiro grau, assim como a consequente possibilidade de pagamento de custas processuais apenas em grau de recurso, nos termos do art. 55 da referida lei, deixo de analisar a questão preliminar para aferir a suposta hipossuficiência da parte autora apenas com eventual interposição de recurso inominado. Portanto, REJEITO a preliminar de impugnação ao pleito de gratuidade da justiça. A preliminar de ausência de comprovação de residência, sob o argumento de que o comprovante está em nome de terceiro, não merece acolhida. Isso porque é entendimento consolidado no âmbito dos Juizados Especiais que a residência pode ser comprovada por diversos meios, inclusive por documentos em nome de familiares ou terceiros, desde que compatíveis com a realidade fática apresentada. A apresentação de comprovante de residência em nome de terceiro, por si só, não invalida a demonstração do domicílio do demandante, especialmente quando não há impugnação específica quanto à veracidade do endereço informado, tampouco demonstração de prejuízo à parte contrária. Ademais, a interpretação do art. 4º da Lei nº 9.099/95 deve se dar de forma finalística, de modo a garantir o amplo acesso à Justiça, especialmente àqueles em situação de hipossuficiência, como determina o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Portanto, ausente qualquer indício de má-fé ou tentativa de manipulação da competência territorial, e não havendo controvérsia efetiva quanto ao domicílio da parte autora, REJEITO, mantendo a regularidade da tramitação do feito perante este Juízo. Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de fato negativo, isto é, a inexistência da relação jurídica mantida com a parte requerida. Nesse sentido, a demonstração da validade e regularidade das compras impugnadas é ônus que incumbe ao demandado, vez que impossível ao Requerente prova de fato negativo. Com efeito, afirma a autora que não realizou as compras e transações mencionadas, sendo vítima de furto, oportunidade na qual houve compra de quantia significativa através uso do seu cartão de crédito e compra efetivada em estabelecimentos desconhecidos, assim como transações em favor de terceiros. Portanto, reitera que as referidas transações foram concluídas em decorrência de fraude e do uso indiscriminado de seus dados pessoais. Assim sendo, como antes mencionado, às partes requeridas foi atribuído o ônus probatório de trazer aos autos subsídios que comprovassem a mecanismos eficazes, ágeis e preventivos de segurança para evitar o cometimento e a conclusão de crimes. Compulsando-se os autos, constata-se que houve ação fraudulenta de terceiros, acarretando prejuízos financeiros ao consumidor. Desse modo, tal circunstância não exonera o dever das instituições financeiras de procederem com a adoção de mecanismos de segurança eficazes contra esse tipo de fraude, visto que o consumidor não pode assumir os riscos da atividade bancária. Ademais, é perceptível que a parte autora realizou o registro do crime sofrido, porém, não se obteve o êxito necessário no tocante ao efetivo bloqueio do cartão de crédito. Há de se observar que a ausência de mecanismos eficazes de segurança por parte do sistema bancário propiciou as diversas operações bancárias sem o correto reconhecimento de padrão de consumo e de compras, inexistindo apontamento do uso destoante e mecanismo de bloqueio automático, fatos que diretamente propiciaram a conclusão da fraude. Em que pese a argumentação de que houve o bloqueio posterior à reclamação administrativa, verifica-se que mesmo assim as cobranças não foram descontinuadas, ocasionando transtornos fora do razoável. Não bastasse, recentemente o STJ deu grande avanço na proteção do consumidor e, editando a súmula 479, consagrou a responsabilidade objetiva dos bancos para fraudes ocorridas na atividade bancária. Transcrevo a íntegra da súmula: “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento recente acerca da caracterização de fortuito interno em razão do descumprimento dever de segurança: “A instituição financeira responde civilmente, caracterizando-se fortuito interno, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, quando descumpre o dever de segurança que lhe cabe e não obsta a realização de compras com cartão de crédito em estabelecimento comercial suspeito, com perfil de compra de consumidor que discrepa das aquisições fraudulentas efetivadas”. (STJ. 4ª Turma.AgInt no AResp 1.728.279-SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 8/5/2023 (Info 776). Por conseguinte, os elementos fáticos-probatórios conduzem à teoria de fraude e legitimam os pedidos contidos na exordial pela evidente falha do serviço bancário. Outrossim, a responsabilidade objetiva advém da própria aplicação do Código Civil de 2002, ao prever no art. 927, parágrafo único, a teoria da atividade de risco, um dos tripés que sustentam a teoria da responsabilidade civil do novo código privado. Não se exsurge nos autos, contudo, qualquer demonstração de que a instituição financeira demandada não tenha contribuído para tal, considerando a necessidade de maior atenção nas transações que realiza dado o risco da atividade que exerce. Urge destacar que nas relações comerciais cotidianas faz-se necessária a observância de algumas regras de cautela essenciais à continuidade da transação, buscando-se evitar o acometimento de situações prejudiciais e constrangedoras aos cidadãos de bem e aos próprios estabelecimentos contratantes. Eis que no momento da formação de negócios jurídicos em geral, devem as empresas usar de prudência e cuidados na averiguação de dados e checagem da documentação e informações apresentadas pelo consumidor. A inobservância de algumas normas de resguardo quando da contratação acarreta a incidência da Teoria do Risco da Atividade, de forma que restando caracterizada uma fraude a qual não tenha o consumidor dado causa se impõe a responsabilidade da empresa junto a qual se fez o negócio. No presente caso, verifica-se que o autor logrou êxito em demonstrar que a compra contestada foi realizada de forma fraudulenta, em decorrência de roubo qualificado do cartão de crédito, fato este incontroverso diante dos documentos anexados aos autos. A despeito da negativa da seguradora, alegando exclusão contratual de responsabilidade, constata-se que a apólice contratada prevê cobertura genérica para eventos de risco e roubo qualificado do cartão (ID 150383031 – pág. 02), não havendo cláusula clara e específica que exclua a situação ocorrida. Com efeito, a tentativa da seguradora de se eximir da obrigação contratual configura clara violação do princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, bem como do dever de informação previsto no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor, especialmente considerando a hipossuficiência técnica do consumidor frente às cláusulas de seguro muitas vezes redigidas de forma vaga ou ambígua. A interpretação de cláusulas contratuais securitárias deve se dar de forma mais favorável ao consumidor, nos termos do art. 47 do CDC. É importante destacar que, ao contratar a apólice de seguro para proteção contra fraudes e uso indevido do cartão, o consumidor buscava a tranquilidade e segurança quanto a eventos inesperados e externos à sua vontade. Havendo cobertura contratual para roubo qualificado, como no caso concreto, a exclusão de responsabilidade sem justificativa plausível configura, além de inadimplemento contratual, prática abusiva, nos termos do art. 51, IV e §1º, II, do CDC. Assim, restando comprovado que a compra contestada decorreu de evento típico coberto pelo contrato de seguro – roubo qualificado do cartão – e que a seguradora não demonstrou cláusula válida e expressa que excluísse a cobertura da situação ocorrida, impõe-se o reconhecimento da falha na prestação do serviço e o consequente dever de restituição do valor indevidamente debitado. Diante disso, deve ser julgado procedente o pleito autoral, com a consequente condenação da parte ré à restituição integral do valor debitado do cartão em virtude do roubo qualificado, atualizada monetariamente desde o evento danoso e acrescida de juros moratórios a contar da citação, em consonância com os arts. 398 e 405 do Código Civil. À vista disso, todos os que participam da cadeia de consumo possuem responsabilidade solidária (art. 18 do CDC) pelos danos decorrentes de fato ilícito ou de defeito na prestação de serviços em decorrência do princípio da solidariedade e do próprio sistema de proteção, fundado no risco-proveito do negócio, consagrado no artigo 7º, parágrafo único, do CDC. Ademais, segundo a Teoria do Risco-Proveito, todo aquele que fornece produto ou serviço no mercado de consumo auferindo lucro (proveito) responde por eventuais danos, independentemente da comprovação de dolo ou culpa (risco da atividade). Portanto, no caso sob exame, a alegação de ilegitimidade passiva ou ausência de responsabilidade não merecem prosperar, fato que o consumidor não pode ser onerado por circunstâncias decorrentes dos riscos da própria atividade. Considerando que as compras são decorrentes de fraude e concluídas e cobradas em evidente falha do serviço (fortuito interno), a procedência da restituição dos valores contestados e decorrentes da ação criminosa é medida que se impõe. Atinente ao pleito de compensação por danos morais, dispõe o art. 186 do Código Civil, que fica obrigado a reparar o dano àquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem. A reparação de danos materiais e morais encontra-se prevista em nossa Carta Magna, em seu artigo 5º, incisos V e X, sendo os requisitos para a imposição da responsabilidade civil e a consequente obrigação de indenizar uma conduta danosa, um dano e o nexo de causalidade entre aquela e este. Sob a ótica dos danos morais, percebe-se que os fatos ensejaram situação de impotência, angústia e sofrimento, elementos caracterizadores de ofensa aos direitos da personalidade, portanto, é devida a compensação por danos morais pleiteada. O consumidor viu-se à mercê de fraudadores, enquanto era vítima de golpe no qual ocasionou desfalque considerável em sua disponibilidade financeira, considerando ainda todos os demais contratempos gerados pelo necessário acionamento do Poder Judiciário, a dúvida acerca do ressarcimento do prejuízo e contratação de profissional para promover sua defesa. No mesmo sentido é o entendimento majoritário dos Tribunais pátrios acerca do tema: INDENIZAÇÃO – TRANSAÇÕES FRAUDULENTAS EM CONTA-CORRENTE VIA "PIX" - TRANSAÇÕES QUE FOGEM INTEIRAMENTE AO PERFIL DO CORRENTISTA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DO SERVIÇO, CONSIDERADA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO CONFIGURADA - RESSARCIMENTO DO DANO MATERIAL - DANO MORAL CONFIGURADO – AÇÃO PROCEDENTE – APELAÇÃO IMPROVIDA. (TJSP; Apelação Cível 1001921-84.2023.8.26.0223; Relator (a): Matheus Fontes; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guarujá - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/11/2023; Data de Registro: 24/11/2023) APELAÇÃO. CIVIL E CONSUMIDOR. GOLPE BANCÁRIO. OPERAÇÕES FINANCEIRAS. ÔNUS DA PROVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FRAUDE. FORTUITO INTERNO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REPARAÇÃO DO PREJUÍZO MATERIAL. CABIMENTO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PRETENSÃO DE REDUÇÃO. INVIABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo banco contra sentença que, na origem, julgou procedentes os pedidos do autor/apelado para condenar o réu/apelante ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, nos valores respectivos de R$6.000,00 (seis mil reais) e R$5.000,00 (cinco mil reais), além das verbas sucumbenciais. Em suma, a apelante invoca a culpa exclusiva da vítima, relativamente aos prejuízos decorrentes de golpe bancário, a afastar sua responsabilidade. Subsidiariamente, insurge-se contra o quantum indenizatório fixado. 2. A relação jurídica estabelecida entre as partes se submete ao Código de Defesa do Consumidor, o qual atribui responsabilidade objetiva ao fornecedor pelos serviços prestados (art. 14 do CDC), afastando-se a responsabilização somente com a prova da inexistência do defeito no serviço ou da ocorrência de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme previsão do art. 14, § 3º, do diploma consumerista. 3. Na hipótese, a conta bancária do consumidor foi utilizada para pagamento de dois boletos, no valor de R$3.000,00 (três mil reais) cada, sendo incontroverso nos autos que tal operação decorreu de golpe perpetrado por terceiro. No caso, o aplicativo do banco sinalizou o acesso à conta por dispositivo desconhecido e, somente após, o consumidor recebeu ligação telefônica de suposto funcionário, com aparição do número de contato oficial da instituição, solicitando o comparecimento à agência para adoção de providências, seguindo suas orientações, no terminal de autoatendimento. 4. A sequência dos fatos revela que, antes de qualquer conduta do correntista, a conta bancária já havia sido acessada por terceiro, com conhecimento das informações necessárias para prosseguimento da empreitada. A instituição financeira, por sua vez, deixou de adotar medidas de segurança eficazes diante do alerta, e, ao revés, autorizou o pagamento de dois boletos com valores vultosos e idênticos, incompatíveis com as operações realizadas usualmente pelo consumidor, em intervalo temporal ínfimo entre as transações. 5. A segurança das operações bancárias é dever indeclinável da instituição financeira e a fraude, por integrar o risco das operações bancárias, caracteriza fortuito interno. Assim, não possui habilidade técnica para configurar a excludente do art. 14, § 3º, II, da Lei n. 8.078/90, consoante Súmula n. 479 do c. Superior Tribunal de Justiça, ad litteris: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 6. Desse modo, verificada a natureza fraudulenta das transações impugnadas, decorrente de acesso indevido de terceiro à conta bancária do correntista, cumpria ao banco demonstrar haver tomado todas as cautelas necessárias a garantir a segurança do consumidor, o que não se operou no caso. Por conseguinte, configurada a falha na segurança da operação, afigura-se escorreita a sentença que reconhece a responsabilidade do banco pelo prejuízo material sofrido pelo consumidor. 7. A análise dos elementos de prova, em conjunto, permite inferir que o consumidor foi efetivamente vitimado pelo golpe bancário, experimentando, ao final, além do prejuízo material, a angústia e os contratempos decorrentes do ilícito, ao que se acresce a tentativa frustrada de resolução pela via extrajudicial com o banco. Nesse sentido, reconhece-se que a imposição de tamanha perda patrimonial, no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), correspondente aos recursos poupados pelo autor, representa lesão a direito de personalidade, especialmente à intimidade, à integridade psíquica e à subsistência, e, nessa medida, é suficiente para impor condenação por dano moral. 8. No tocante ao quantum indenizatório, a jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, bem como desta e. Corte, é no sentido de considerar válida a adoção do critério bifásico para o referido arbitramento equitativo. Sob tal perspectiva, na primeira fase, tendo em vista o interesse jurídico lesado e os precedentes oriundos de casos semelhantes, estabelece-se um valor básico para a indenização. Na segunda fase, ponderam-se as circunstâncias in concreto (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), ultimando-se o valor indenizatório, mediante arbitramento equitativo do julgador (AgInt no REsp 1608573/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 23/08/2019). 9. Da análise de precedentes deste Tribunal, é dado concluir a existência de um padrão indenizatório a título de dano moral em casos assemelhados no quantum fixado na sentença. Por sua vez, a conjuntura descrita nos autos não remete a uma solução diversa da adotada pelos julgados paradigmas, pois deles não se desbordou, não se detectando alguma peculiaridade que conduzisse a uma mitigação da compensação perfilhada. 10. Recurso conhecido e desprovido. Honorários majorados. (Acórdão 1777722, 07046681120228070008, Relator: SANDRA REVES, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 25/10/2023, publicado no PJe: 17/11/2023. Pág.: Sem Página Cadastrada.) Ademais, verifica-se que as instituições financeiras rés não cumpriram com a obrigação de devolução dos valores. Caso contrário, se houvesse agido de maneira diligente, a ré teria evitado todo o acionamento do Judiciário, poupando tempo, trabalho e aborrecimentos para o consumidor, de modo que restou configurada a teoria do desvio produtivo. Questão a ser enfrentada é a estipulação do valor pecuniário para a reparação dos danos morais pelo caráter subjetivo que possui. Vários critérios são adotados, dentre os quais destaca-se a posição social do ofendido, a capacidade econômica do ofensor e seu maior dever de cautela e a extensão do dano. Entende-se que todos esses fatores devem ser considerados quando existem dados sobre eles nos autos, mas o que deve preponderar para o arbitramento do valor há de ser o último critério acima, ou seja, a proporcionalidade em relação à extensão do dano. E, sobretudo deve haver prudência e equilíbrio, de modo que o valor a ser arbitrado não represente enriquecimento da vítima do dano e nem seja tão insignificante a ponto de não desestimular o ofensor na reiteração da conduta. Com base em tais considerações, compete ao presente órgão judicante proferir o devido provimento jurisdicional capaz de deslindar a causa. Assim, considerando todos estes balizamentos, arbitro em R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) o valor da compensação a ser paga pelos danos morais pleiteados. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão encartada na inicial para: a) CONDENAR os réus, solidariamente, a restituição/estorno do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), acrescidos de juros legais com base na Taxa Legal (art. 406, §1º, do Código Civil), a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a contar do efetivo prejuízo, segundo o teor da Súmula 43 do STJ; b) CONDENAR os réus, solidariamente, ao pagamento de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) a título de compensação por danos morais, tudo no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 523, §1º do CPC, acrescidos de juros legais com base na Taxa Legal (art. 406, §1º, do Código Civil), a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a partir da data desta sentença, nos termos da súmula 362 do STJ. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 16 de julho de 2025. JESSÉ DE ANDRADE ALEXANDRIA Juiz de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou o que procurava? Faça login para ver mais resultados e detalhes completos.

Fazer Login para Ver Mais

Processo nº 0807648-18.2025.8.20.5004

ID: 328495963

Tribunal: TJRN Órgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 0807648-18.2025.8.20.5004

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO

Intimação

Advogados:

FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

BRUNO HENRIQUE DE OLIVEIRA VANDERLEI

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025… Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0807648-18.2025.8.20.5004 Parte autora: CAIO CESAR ALVES CAMARA DA SILVA Parte ré: BANCO C6 S.A. e outros SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. CAIO CESAR ALVES CAMARA DA SILVA ajuizou a presente demanda contra BANCO C6 S.A e ZURICH MINAS BRASIL SEGUROS S.A, narrando que: I) no dia 04 de abril de 2025, foi vítima de um roubo logo após realizar um saque no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) em um caixa eletrônico; II) imediatamente após o ocorrido, e em um gesto de cautela, procedeu ao bloqueio de seus cartões e acionou o seguro "Cartão Protegido", contratado junto ao C6 Bank em parceria com a Zurich Seguros; III) ao entrar em contato com a seguradora, foi informado por um(a) atendente de que, de acordo com os termos de uso do seguro disponíveis no website do C6 Bank, datados de 2021, a cobertura incluía casos de roubo após saque; IV) procedeu à abertura de um protocolo de atendimento, cumprindo rigorosamente todos os trâmites exigidos pela seguradora, contudo, o que se seguiu foi uma verdadeira saga de desinformação e descaso por parte das rés; V) passou a procrastinar os prazos de resposta de forma sucessiva, sem apresentar qualquer justificativa plausível ou resposta concreta, mesmo após o transcurso de quase 30 (trinta) dias do ocorrido, sendo que as promessas de contato por e-mail e telefone, reiteradamente feitas pela seguradora, jamais foram cumpridas. Com isso, requereu a restituição da quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), relativa à transação fraudulenta, bem como a condenação ao pagamento da quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de compensação por danos morais. Inicialmente, a ré ZURICH MINAS BRASIL SEGUROS S.A alegou, em síntese, ausência de responsabilidade em razão de inexistência de cobertura securitária, além da inocorrência dos danos morais. Já o réu BANCO C6 S.A, preliminarmente, suscitou, necessidade de tramitação em segredo de justiça, impugnou o pleito de concessão da gratuidade da justiça, além do comprovante de residência anexado aos autos. Inicialmente, não há razão para decretação de segredo de justiça, considerando a ausência dos requisitos e condições previstos no art. 189, do Código de Processo Civil. Dessa forma, REJEITO tal preliminar. Em razão dos procedimentos previstos na Lei 9.099/95 e da gratuidade inerente aos Juizados Especiais quando se trata de demanda no primeiro grau, assim como a consequente possibilidade de pagamento de custas processuais apenas em grau de recurso, nos termos do art. 55 da referida lei, deixo de analisar a questão preliminar para aferir a suposta hipossuficiência da parte autora apenas com eventual interposição de recurso inominado. Portanto, REJEITO a preliminar de impugnação ao pleito de gratuidade da justiça. A preliminar de ausência de comprovação de residência, sob o argumento de que o comprovante está em nome de terceiro, não merece acolhida. Isso porque é entendimento consolidado no âmbito dos Juizados Especiais que a residência pode ser comprovada por diversos meios, inclusive por documentos em nome de familiares ou terceiros, desde que compatíveis com a realidade fática apresentada. A apresentação de comprovante de residência em nome de terceiro, por si só, não invalida a demonstração do domicílio do demandante, especialmente quando não há impugnação específica quanto à veracidade do endereço informado, tampouco demonstração de prejuízo à parte contrária. Ademais, a interpretação do art. 4º da Lei nº 9.099/95 deve se dar de forma finalística, de modo a garantir o amplo acesso à Justiça, especialmente àqueles em situação de hipossuficiência, como determina o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Portanto, ausente qualquer indício de má-fé ou tentativa de manipulação da competência territorial, e não havendo controvérsia efetiva quanto ao domicílio da parte autora, REJEITO, mantendo a regularidade da tramitação do feito perante este Juízo. Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de fato negativo, isto é, a inexistência da relação jurídica mantida com a parte requerida. Nesse sentido, a demonstração da validade e regularidade das compras impugnadas é ônus que incumbe ao demandado, vez que impossível ao Requerente prova de fato negativo. Com efeito, afirma a autora que não realizou as compras e transações mencionadas, sendo vítima de furto, oportunidade na qual houve compra de quantia significativa através uso do seu cartão de crédito e compra efetivada em estabelecimentos desconhecidos, assim como transações em favor de terceiros. Portanto, reitera que as referidas transações foram concluídas em decorrência de fraude e do uso indiscriminado de seus dados pessoais. Assim sendo, como antes mencionado, às partes requeridas foi atribuído o ônus probatório de trazer aos autos subsídios que comprovassem a mecanismos eficazes, ágeis e preventivos de segurança para evitar o cometimento e a conclusão de crimes. Compulsando-se os autos, constata-se que houve ação fraudulenta de terceiros, acarretando prejuízos financeiros ao consumidor. Desse modo, tal circunstância não exonera o dever das instituições financeiras de procederem com a adoção de mecanismos de segurança eficazes contra esse tipo de fraude, visto que o consumidor não pode assumir os riscos da atividade bancária. Ademais, é perceptível que a parte autora realizou o registro do crime sofrido, porém, não se obteve o êxito necessário no tocante ao efetivo bloqueio do cartão de crédito. Há de se observar que a ausência de mecanismos eficazes de segurança por parte do sistema bancário propiciou as diversas operações bancárias sem o correto reconhecimento de padrão de consumo e de compras, inexistindo apontamento do uso destoante e mecanismo de bloqueio automático, fatos que diretamente propiciaram a conclusão da fraude. Em que pese a argumentação de que houve o bloqueio posterior à reclamação administrativa, verifica-se que mesmo assim as cobranças não foram descontinuadas, ocasionando transtornos fora do razoável. Não bastasse, recentemente o STJ deu grande avanço na proteção do consumidor e, editando a súmula 479, consagrou a responsabilidade objetiva dos bancos para fraudes ocorridas na atividade bancária. Transcrevo a íntegra da súmula: “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento recente acerca da caracterização de fortuito interno em razão do descumprimento dever de segurança: “A instituição financeira responde civilmente, caracterizando-se fortuito interno, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, quando descumpre o dever de segurança que lhe cabe e não obsta a realização de compras com cartão de crédito em estabelecimento comercial suspeito, com perfil de compra de consumidor que discrepa das aquisições fraudulentas efetivadas”. (STJ. 4ª Turma.AgInt no AResp 1.728.279-SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 8/5/2023 (Info 776). Por conseguinte, os elementos fáticos-probatórios conduzem à teoria de fraude e legitimam os pedidos contidos na exordial pela evidente falha do serviço bancário. Outrossim, a responsabilidade objetiva advém da própria aplicação do Código Civil de 2002, ao prever no art. 927, parágrafo único, a teoria da atividade de risco, um dos tripés que sustentam a teoria da responsabilidade civil do novo código privado. Não se exsurge nos autos, contudo, qualquer demonstração de que a instituição financeira demandada não tenha contribuído para tal, considerando a necessidade de maior atenção nas transações que realiza dado o risco da atividade que exerce. Urge destacar que nas relações comerciais cotidianas faz-se necessária a observância de algumas regras de cautela essenciais à continuidade da transação, buscando-se evitar o acometimento de situações prejudiciais e constrangedoras aos cidadãos de bem e aos próprios estabelecimentos contratantes. Eis que no momento da formação de negócios jurídicos em geral, devem as empresas usar de prudência e cuidados na averiguação de dados e checagem da documentação e informações apresentadas pelo consumidor. A inobservância de algumas normas de resguardo quando da contratação acarreta a incidência da Teoria do Risco da Atividade, de forma que restando caracterizada uma fraude a qual não tenha o consumidor dado causa se impõe a responsabilidade da empresa junto a qual se fez o negócio. No presente caso, verifica-se que o autor logrou êxito em demonstrar que a compra contestada foi realizada de forma fraudulenta, em decorrência de roubo qualificado do cartão de crédito, fato este incontroverso diante dos documentos anexados aos autos. A despeito da negativa da seguradora, alegando exclusão contratual de responsabilidade, constata-se que a apólice contratada prevê cobertura genérica para eventos de risco e roubo qualificado do cartão (ID 150383031 – pág. 02), não havendo cláusula clara e específica que exclua a situação ocorrida. Com efeito, a tentativa da seguradora de se eximir da obrigação contratual configura clara violação do princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, bem como do dever de informação previsto no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor, especialmente considerando a hipossuficiência técnica do consumidor frente às cláusulas de seguro muitas vezes redigidas de forma vaga ou ambígua. A interpretação de cláusulas contratuais securitárias deve se dar de forma mais favorável ao consumidor, nos termos do art. 47 do CDC. É importante destacar que, ao contratar a apólice de seguro para proteção contra fraudes e uso indevido do cartão, o consumidor buscava a tranquilidade e segurança quanto a eventos inesperados e externos à sua vontade. Havendo cobertura contratual para roubo qualificado, como no caso concreto, a exclusão de responsabilidade sem justificativa plausível configura, além de inadimplemento contratual, prática abusiva, nos termos do art. 51, IV e §1º, II, do CDC. Assim, restando comprovado que a compra contestada decorreu de evento típico coberto pelo contrato de seguro – roubo qualificado do cartão – e que a seguradora não demonstrou cláusula válida e expressa que excluísse a cobertura da situação ocorrida, impõe-se o reconhecimento da falha na prestação do serviço e o consequente dever de restituição do valor indevidamente debitado. Diante disso, deve ser julgado procedente o pleito autoral, com a consequente condenação da parte ré à restituição integral do valor debitado do cartão em virtude do roubo qualificado, atualizada monetariamente desde o evento danoso e acrescida de juros moratórios a contar da citação, em consonância com os arts. 398 e 405 do Código Civil. À vista disso, todos os que participam da cadeia de consumo possuem responsabilidade solidária (art. 18 do CDC) pelos danos decorrentes de fato ilícito ou de defeito na prestação de serviços em decorrência do princípio da solidariedade e do próprio sistema de proteção, fundado no risco-proveito do negócio, consagrado no artigo 7º, parágrafo único, do CDC. Ademais, segundo a Teoria do Risco-Proveito, todo aquele que fornece produto ou serviço no mercado de consumo auferindo lucro (proveito) responde por eventuais danos, independentemente da comprovação de dolo ou culpa (risco da atividade). Portanto, no caso sob exame, a alegação de ilegitimidade passiva ou ausência de responsabilidade não merecem prosperar, fato que o consumidor não pode ser onerado por circunstâncias decorrentes dos riscos da própria atividade. Considerando que as compras são decorrentes de fraude e concluídas e cobradas em evidente falha do serviço (fortuito interno), a procedência da restituição dos valores contestados e decorrentes da ação criminosa é medida que se impõe. Atinente ao pleito de compensação por danos morais, dispõe o art. 186 do Código Civil, que fica obrigado a reparar o dano àquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem. A reparação de danos materiais e morais encontra-se prevista em nossa Carta Magna, em seu artigo 5º, incisos V e X, sendo os requisitos para a imposição da responsabilidade civil e a consequente obrigação de indenizar uma conduta danosa, um dano e o nexo de causalidade entre aquela e este. Sob a ótica dos danos morais, percebe-se que os fatos ensejaram situação de impotência, angústia e sofrimento, elementos caracterizadores de ofensa aos direitos da personalidade, portanto, é devida a compensação por danos morais pleiteada. O consumidor viu-se à mercê de fraudadores, enquanto era vítima de golpe no qual ocasionou desfalque considerável em sua disponibilidade financeira, considerando ainda todos os demais contratempos gerados pelo necessário acionamento do Poder Judiciário, a dúvida acerca do ressarcimento do prejuízo e contratação de profissional para promover sua defesa. No mesmo sentido é o entendimento majoritário dos Tribunais pátrios acerca do tema: INDENIZAÇÃO – TRANSAÇÕES FRAUDULENTAS EM CONTA-CORRENTE VIA "PIX" - TRANSAÇÕES QUE FOGEM INTEIRAMENTE AO PERFIL DO CORRENTISTA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DO SERVIÇO, CONSIDERADA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO CONFIGURADA - RESSARCIMENTO DO DANO MATERIAL - DANO MORAL CONFIGURADO – AÇÃO PROCEDENTE – APELAÇÃO IMPROVIDA. (TJSP; Apelação Cível 1001921-84.2023.8.26.0223; Relator (a): Matheus Fontes; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guarujá - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/11/2023; Data de Registro: 24/11/2023) APELAÇÃO. CIVIL E CONSUMIDOR. GOLPE BANCÁRIO. OPERAÇÕES FINANCEIRAS. ÔNUS DA PROVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FRAUDE. FORTUITO INTERNO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REPARAÇÃO DO PREJUÍZO MATERIAL. CABIMENTO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PRETENSÃO DE REDUÇÃO. INVIABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo banco contra sentença que, na origem, julgou procedentes os pedidos do autor/apelado para condenar o réu/apelante ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, nos valores respectivos de R$6.000,00 (seis mil reais) e R$5.000,00 (cinco mil reais), além das verbas sucumbenciais. Em suma, a apelante invoca a culpa exclusiva da vítima, relativamente aos prejuízos decorrentes de golpe bancário, a afastar sua responsabilidade. Subsidiariamente, insurge-se contra o quantum indenizatório fixado. 2. A relação jurídica estabelecida entre as partes se submete ao Código de Defesa do Consumidor, o qual atribui responsabilidade objetiva ao fornecedor pelos serviços prestados (art. 14 do CDC), afastando-se a responsabilização somente com a prova da inexistência do defeito no serviço ou da ocorrência de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme previsão do art. 14, § 3º, do diploma consumerista. 3. Na hipótese, a conta bancária do consumidor foi utilizada para pagamento de dois boletos, no valor de R$3.000,00 (três mil reais) cada, sendo incontroverso nos autos que tal operação decorreu de golpe perpetrado por terceiro. No caso, o aplicativo do banco sinalizou o acesso à conta por dispositivo desconhecido e, somente após, o consumidor recebeu ligação telefônica de suposto funcionário, com aparição do número de contato oficial da instituição, solicitando o comparecimento à agência para adoção de providências, seguindo suas orientações, no terminal de autoatendimento. 4. A sequência dos fatos revela que, antes de qualquer conduta do correntista, a conta bancária já havia sido acessada por terceiro, com conhecimento das informações necessárias para prosseguimento da empreitada. A instituição financeira, por sua vez, deixou de adotar medidas de segurança eficazes diante do alerta, e, ao revés, autorizou o pagamento de dois boletos com valores vultosos e idênticos, incompatíveis com as operações realizadas usualmente pelo consumidor, em intervalo temporal ínfimo entre as transações. 5. A segurança das operações bancárias é dever indeclinável da instituição financeira e a fraude, por integrar o risco das operações bancárias, caracteriza fortuito interno. Assim, não possui habilidade técnica para configurar a excludente do art. 14, § 3º, II, da Lei n. 8.078/90, consoante Súmula n. 479 do c. Superior Tribunal de Justiça, ad litteris: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 6. Desse modo, verificada a natureza fraudulenta das transações impugnadas, decorrente de acesso indevido de terceiro à conta bancária do correntista, cumpria ao banco demonstrar haver tomado todas as cautelas necessárias a garantir a segurança do consumidor, o que não se operou no caso. Por conseguinte, configurada a falha na segurança da operação, afigura-se escorreita a sentença que reconhece a responsabilidade do banco pelo prejuízo material sofrido pelo consumidor. 7. A análise dos elementos de prova, em conjunto, permite inferir que o consumidor foi efetivamente vitimado pelo golpe bancário, experimentando, ao final, além do prejuízo material, a angústia e os contratempos decorrentes do ilícito, ao que se acresce a tentativa frustrada de resolução pela via extrajudicial com o banco. Nesse sentido, reconhece-se que a imposição de tamanha perda patrimonial, no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), correspondente aos recursos poupados pelo autor, representa lesão a direito de personalidade, especialmente à intimidade, à integridade psíquica e à subsistência, e, nessa medida, é suficiente para impor condenação por dano moral. 8. No tocante ao quantum indenizatório, a jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, bem como desta e. Corte, é no sentido de considerar válida a adoção do critério bifásico para o referido arbitramento equitativo. Sob tal perspectiva, na primeira fase, tendo em vista o interesse jurídico lesado e os precedentes oriundos de casos semelhantes, estabelece-se um valor básico para a indenização. Na segunda fase, ponderam-se as circunstâncias in concreto (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), ultimando-se o valor indenizatório, mediante arbitramento equitativo do julgador (AgInt no REsp 1608573/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 23/08/2019). 9. Da análise de precedentes deste Tribunal, é dado concluir a existência de um padrão indenizatório a título de dano moral em casos assemelhados no quantum fixado na sentença. Por sua vez, a conjuntura descrita nos autos não remete a uma solução diversa da adotada pelos julgados paradigmas, pois deles não se desbordou, não se detectando alguma peculiaridade que conduzisse a uma mitigação da compensação perfilhada. 10. Recurso conhecido e desprovido. Honorários majorados. (Acórdão 1777722, 07046681120228070008, Relator: SANDRA REVES, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 25/10/2023, publicado no PJe: 17/11/2023. Pág.: Sem Página Cadastrada.) Ademais, verifica-se que as instituições financeiras rés não cumpriram com a obrigação de devolução dos valores. Caso contrário, se houvesse agido de maneira diligente, a ré teria evitado todo o acionamento do Judiciário, poupando tempo, trabalho e aborrecimentos para o consumidor, de modo que restou configurada a teoria do desvio produtivo. Questão a ser enfrentada é a estipulação do valor pecuniário para a reparação dos danos morais pelo caráter subjetivo que possui. Vários critérios são adotados, dentre os quais destaca-se a posição social do ofendido, a capacidade econômica do ofensor e seu maior dever de cautela e a extensão do dano. Entende-se que todos esses fatores devem ser considerados quando existem dados sobre eles nos autos, mas o que deve preponderar para o arbitramento do valor há de ser o último critério acima, ou seja, a proporcionalidade em relação à extensão do dano. E, sobretudo deve haver prudência e equilíbrio, de modo que o valor a ser arbitrado não represente enriquecimento da vítima do dano e nem seja tão insignificante a ponto de não desestimular o ofensor na reiteração da conduta. Com base em tais considerações, compete ao presente órgão judicante proferir o devido provimento jurisdicional capaz de deslindar a causa. Assim, considerando todos estes balizamentos, arbitro em R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) o valor da compensação a ser paga pelos danos morais pleiteados. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão encartada na inicial para: a) CONDENAR os réus, solidariamente, a restituição/estorno do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), acrescidos de juros legais com base na Taxa Legal (art. 406, §1º, do Código Civil), a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a contar do efetivo prejuízo, segundo o teor da Súmula 43 do STJ; b) CONDENAR os réus, solidariamente, ao pagamento de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) a título de compensação por danos morais, tudo no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 523, §1º do CPC, acrescidos de juros legais com base na Taxa Legal (art. 406, §1º, do Código Civil), a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a partir da data desta sentença, nos termos da súmula 362 do STJ. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 16 de julho de 2025. JESSÉ DE ANDRADE ALEXANDRIA Juiz de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0807648-18.2025.8.20.5004

ID: 328495968

Tribunal: TJRN Órgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 0807648-18.2025.8.20.5004

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

FERNANDA ALVES RODRIGUES

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

FERNANDA ALVES RODRIGUES

OAB/RN XXXXXX Desbloquear

Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025… Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0807648-18.2025.8.20.5004 Parte autora: CAIO CESAR ALVES CAMARA DA SILVA Parte ré: BANCO C6 S.A. e outros SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. CAIO CESAR ALVES CAMARA DA SILVA ajuizou a presente demanda contra BANCO C6 S.A e ZURICH MINAS BRASIL SEGUROS S.A, narrando que: I) no dia 04 de abril de 2025, foi vítima de um roubo logo após realizar um saque no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) em um caixa eletrônico; II) imediatamente após o ocorrido, e em um gesto de cautela, procedeu ao bloqueio de seus cartões e acionou o seguro "Cartão Protegido", contratado junto ao C6 Bank em parceria com a Zurich Seguros; III) ao entrar em contato com a seguradora, foi informado por um(a) atendente de que, de acordo com os termos de uso do seguro disponíveis no website do C6 Bank, datados de 2021, a cobertura incluía casos de roubo após saque; IV) procedeu à abertura de um protocolo de atendimento, cumprindo rigorosamente todos os trâmites exigidos pela seguradora, contudo, o que se seguiu foi uma verdadeira saga de desinformação e descaso por parte das rés; V) passou a procrastinar os prazos de resposta de forma sucessiva, sem apresentar qualquer justificativa plausível ou resposta concreta, mesmo após o transcurso de quase 30 (trinta) dias do ocorrido, sendo que as promessas de contato por e-mail e telefone, reiteradamente feitas pela seguradora, jamais foram cumpridas. Com isso, requereu a restituição da quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), relativa à transação fraudulenta, bem como a condenação ao pagamento da quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de compensação por danos morais. Inicialmente, a ré ZURICH MINAS BRASIL SEGUROS S.A alegou, em síntese, ausência de responsabilidade em razão de inexistência de cobertura securitária, além da inocorrência dos danos morais. Já o réu BANCO C6 S.A, preliminarmente, suscitou, necessidade de tramitação em segredo de justiça, impugnou o pleito de concessão da gratuidade da justiça, além do comprovante de residência anexado aos autos. Inicialmente, não há razão para decretação de segredo de justiça, considerando a ausência dos requisitos e condições previstos no art. 189, do Código de Processo Civil. Dessa forma, REJEITO tal preliminar. Em razão dos procedimentos previstos na Lei 9.099/95 e da gratuidade inerente aos Juizados Especiais quando se trata de demanda no primeiro grau, assim como a consequente possibilidade de pagamento de custas processuais apenas em grau de recurso, nos termos do art. 55 da referida lei, deixo de analisar a questão preliminar para aferir a suposta hipossuficiência da parte autora apenas com eventual interposição de recurso inominado. Portanto, REJEITO a preliminar de impugnação ao pleito de gratuidade da justiça. A preliminar de ausência de comprovação de residência, sob o argumento de que o comprovante está em nome de terceiro, não merece acolhida. Isso porque é entendimento consolidado no âmbito dos Juizados Especiais que a residência pode ser comprovada por diversos meios, inclusive por documentos em nome de familiares ou terceiros, desde que compatíveis com a realidade fática apresentada. A apresentação de comprovante de residência em nome de terceiro, por si só, não invalida a demonstração do domicílio do demandante, especialmente quando não há impugnação específica quanto à veracidade do endereço informado, tampouco demonstração de prejuízo à parte contrária. Ademais, a interpretação do art. 4º da Lei nº 9.099/95 deve se dar de forma finalística, de modo a garantir o amplo acesso à Justiça, especialmente àqueles em situação de hipossuficiência, como determina o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Portanto, ausente qualquer indício de má-fé ou tentativa de manipulação da competência territorial, e não havendo controvérsia efetiva quanto ao domicílio da parte autora, REJEITO, mantendo a regularidade da tramitação do feito perante este Juízo. Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de fato negativo, isto é, a inexistência da relação jurídica mantida com a parte requerida. Nesse sentido, a demonstração da validade e regularidade das compras impugnadas é ônus que incumbe ao demandado, vez que impossível ao Requerente prova de fato negativo. Com efeito, afirma a autora que não realizou as compras e transações mencionadas, sendo vítima de furto, oportunidade na qual houve compra de quantia significativa através uso do seu cartão de crédito e compra efetivada em estabelecimentos desconhecidos, assim como transações em favor de terceiros. Portanto, reitera que as referidas transações foram concluídas em decorrência de fraude e do uso indiscriminado de seus dados pessoais. Assim sendo, como antes mencionado, às partes requeridas foi atribuído o ônus probatório de trazer aos autos subsídios que comprovassem a mecanismos eficazes, ágeis e preventivos de segurança para evitar o cometimento e a conclusão de crimes. Compulsando-se os autos, constata-se que houve ação fraudulenta de terceiros, acarretando prejuízos financeiros ao consumidor. Desse modo, tal circunstância não exonera o dever das instituições financeiras de procederem com a adoção de mecanismos de segurança eficazes contra esse tipo de fraude, visto que o consumidor não pode assumir os riscos da atividade bancária. Ademais, é perceptível que a parte autora realizou o registro do crime sofrido, porém, não se obteve o êxito necessário no tocante ao efetivo bloqueio do cartão de crédito. Há de se observar que a ausência de mecanismos eficazes de segurança por parte do sistema bancário propiciou as diversas operações bancárias sem o correto reconhecimento de padrão de consumo e de compras, inexistindo apontamento do uso destoante e mecanismo de bloqueio automático, fatos que diretamente propiciaram a conclusão da fraude. Em que pese a argumentação de que houve o bloqueio posterior à reclamação administrativa, verifica-se que mesmo assim as cobranças não foram descontinuadas, ocasionando transtornos fora do razoável. Não bastasse, recentemente o STJ deu grande avanço na proteção do consumidor e, editando a súmula 479, consagrou a responsabilidade objetiva dos bancos para fraudes ocorridas na atividade bancária. Transcrevo a íntegra da súmula: “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento recente acerca da caracterização de fortuito interno em razão do descumprimento dever de segurança: “A instituição financeira responde civilmente, caracterizando-se fortuito interno, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, quando descumpre o dever de segurança que lhe cabe e não obsta a realização de compras com cartão de crédito em estabelecimento comercial suspeito, com perfil de compra de consumidor que discrepa das aquisições fraudulentas efetivadas”. (STJ. 4ª Turma.AgInt no AResp 1.728.279-SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 8/5/2023 (Info 776). Por conseguinte, os elementos fáticos-probatórios conduzem à teoria de fraude e legitimam os pedidos contidos na exordial pela evidente falha do serviço bancário. Outrossim, a responsabilidade objetiva advém da própria aplicação do Código Civil de 2002, ao prever no art. 927, parágrafo único, a teoria da atividade de risco, um dos tripés que sustentam a teoria da responsabilidade civil do novo código privado. Não se exsurge nos autos, contudo, qualquer demonstração de que a instituição financeira demandada não tenha contribuído para tal, considerando a necessidade de maior atenção nas transações que realiza dado o risco da atividade que exerce. Urge destacar que nas relações comerciais cotidianas faz-se necessária a observância de algumas regras de cautela essenciais à continuidade da transação, buscando-se evitar o acometimento de situações prejudiciais e constrangedoras aos cidadãos de bem e aos próprios estabelecimentos contratantes. Eis que no momento da formação de negócios jurídicos em geral, devem as empresas usar de prudência e cuidados na averiguação de dados e checagem da documentação e informações apresentadas pelo consumidor. A inobservância de algumas normas de resguardo quando da contratação acarreta a incidência da Teoria do Risco da Atividade, de forma que restando caracterizada uma fraude a qual não tenha o consumidor dado causa se impõe a responsabilidade da empresa junto a qual se fez o negócio. No presente caso, verifica-se que o autor logrou êxito em demonstrar que a compra contestada foi realizada de forma fraudulenta, em decorrência de roubo qualificado do cartão de crédito, fato este incontroverso diante dos documentos anexados aos autos. A despeito da negativa da seguradora, alegando exclusão contratual de responsabilidade, constata-se que a apólice contratada prevê cobertura genérica para eventos de risco e roubo qualificado do cartão (ID 150383031 – pág. 02), não havendo cláusula clara e específica que exclua a situação ocorrida. Com efeito, a tentativa da seguradora de se eximir da obrigação contratual configura clara violação do princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, bem como do dever de informação previsto no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor, especialmente considerando a hipossuficiência técnica do consumidor frente às cláusulas de seguro muitas vezes redigidas de forma vaga ou ambígua. A interpretação de cláusulas contratuais securitárias deve se dar de forma mais favorável ao consumidor, nos termos do art. 47 do CDC. É importante destacar que, ao contratar a apólice de seguro para proteção contra fraudes e uso indevido do cartão, o consumidor buscava a tranquilidade e segurança quanto a eventos inesperados e externos à sua vontade. Havendo cobertura contratual para roubo qualificado, como no caso concreto, a exclusão de responsabilidade sem justificativa plausível configura, além de inadimplemento contratual, prática abusiva, nos termos do art. 51, IV e §1º, II, do CDC. Assim, restando comprovado que a compra contestada decorreu de evento típico coberto pelo contrato de seguro – roubo qualificado do cartão – e que a seguradora não demonstrou cláusula válida e expressa que excluísse a cobertura da situação ocorrida, impõe-se o reconhecimento da falha na prestação do serviço e o consequente dever de restituição do valor indevidamente debitado. Diante disso, deve ser julgado procedente o pleito autoral, com a consequente condenação da parte ré à restituição integral do valor debitado do cartão em virtude do roubo qualificado, atualizada monetariamente desde o evento danoso e acrescida de juros moratórios a contar da citação, em consonância com os arts. 398 e 405 do Código Civil. À vista disso, todos os que participam da cadeia de consumo possuem responsabilidade solidária (art. 18 do CDC) pelos danos decorrentes de fato ilícito ou de defeito na prestação de serviços em decorrência do princípio da solidariedade e do próprio sistema de proteção, fundado no risco-proveito do negócio, consagrado no artigo 7º, parágrafo único, do CDC. Ademais, segundo a Teoria do Risco-Proveito, todo aquele que fornece produto ou serviço no mercado de consumo auferindo lucro (proveito) responde por eventuais danos, independentemente da comprovação de dolo ou culpa (risco da atividade). Portanto, no caso sob exame, a alegação de ilegitimidade passiva ou ausência de responsabilidade não merecem prosperar, fato que o consumidor não pode ser onerado por circunstâncias decorrentes dos riscos da própria atividade. Considerando que as compras são decorrentes de fraude e concluídas e cobradas em evidente falha do serviço (fortuito interno), a procedência da restituição dos valores contestados e decorrentes da ação criminosa é medida que se impõe. Atinente ao pleito de compensação por danos morais, dispõe o art. 186 do Código Civil, que fica obrigado a reparar o dano àquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem. A reparação de danos materiais e morais encontra-se prevista em nossa Carta Magna, em seu artigo 5º, incisos V e X, sendo os requisitos para a imposição da responsabilidade civil e a consequente obrigação de indenizar uma conduta danosa, um dano e o nexo de causalidade entre aquela e este. Sob a ótica dos danos morais, percebe-se que os fatos ensejaram situação de impotência, angústia e sofrimento, elementos caracterizadores de ofensa aos direitos da personalidade, portanto, é devida a compensação por danos morais pleiteada. O consumidor viu-se à mercê de fraudadores, enquanto era vítima de golpe no qual ocasionou desfalque considerável em sua disponibilidade financeira, considerando ainda todos os demais contratempos gerados pelo necessário acionamento do Poder Judiciário, a dúvida acerca do ressarcimento do prejuízo e contratação de profissional para promover sua defesa. No mesmo sentido é o entendimento majoritário dos Tribunais pátrios acerca do tema: INDENIZAÇÃO – TRANSAÇÕES FRAUDULENTAS EM CONTA-CORRENTE VIA "PIX" - TRANSAÇÕES QUE FOGEM INTEIRAMENTE AO PERFIL DO CORRENTISTA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DO SERVIÇO, CONSIDERADA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO CONFIGURADA - RESSARCIMENTO DO DANO MATERIAL - DANO MORAL CONFIGURADO – AÇÃO PROCEDENTE – APELAÇÃO IMPROVIDA. (TJSP; Apelação Cível 1001921-84.2023.8.26.0223; Relator (a): Matheus Fontes; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guarujá - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/11/2023; Data de Registro: 24/11/2023) APELAÇÃO. CIVIL E CONSUMIDOR. GOLPE BANCÁRIO. OPERAÇÕES FINANCEIRAS. ÔNUS DA PROVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FRAUDE. FORTUITO INTERNO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REPARAÇÃO DO PREJUÍZO MATERIAL. CABIMENTO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PRETENSÃO DE REDUÇÃO. INVIABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo banco contra sentença que, na origem, julgou procedentes os pedidos do autor/apelado para condenar o réu/apelante ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, nos valores respectivos de R$6.000,00 (seis mil reais) e R$5.000,00 (cinco mil reais), além das verbas sucumbenciais. Em suma, a apelante invoca a culpa exclusiva da vítima, relativamente aos prejuízos decorrentes de golpe bancário, a afastar sua responsabilidade. Subsidiariamente, insurge-se contra o quantum indenizatório fixado. 2. A relação jurídica estabelecida entre as partes se submete ao Código de Defesa do Consumidor, o qual atribui responsabilidade objetiva ao fornecedor pelos serviços prestados (art. 14 do CDC), afastando-se a responsabilização somente com a prova da inexistência do defeito no serviço ou da ocorrência de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme previsão do art. 14, § 3º, do diploma consumerista. 3. Na hipótese, a conta bancária do consumidor foi utilizada para pagamento de dois boletos, no valor de R$3.000,00 (três mil reais) cada, sendo incontroverso nos autos que tal operação decorreu de golpe perpetrado por terceiro. No caso, o aplicativo do banco sinalizou o acesso à conta por dispositivo desconhecido e, somente após, o consumidor recebeu ligação telefônica de suposto funcionário, com aparição do número de contato oficial da instituição, solicitando o comparecimento à agência para adoção de providências, seguindo suas orientações, no terminal de autoatendimento. 4. A sequência dos fatos revela que, antes de qualquer conduta do correntista, a conta bancária já havia sido acessada por terceiro, com conhecimento das informações necessárias para prosseguimento da empreitada. A instituição financeira, por sua vez, deixou de adotar medidas de segurança eficazes diante do alerta, e, ao revés, autorizou o pagamento de dois boletos com valores vultosos e idênticos, incompatíveis com as operações realizadas usualmente pelo consumidor, em intervalo temporal ínfimo entre as transações. 5. A segurança das operações bancárias é dever indeclinável da instituição financeira e a fraude, por integrar o risco das operações bancárias, caracteriza fortuito interno. Assim, não possui habilidade técnica para configurar a excludente do art. 14, § 3º, II, da Lei n. 8.078/90, consoante Súmula n. 479 do c. Superior Tribunal de Justiça, ad litteris: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 6. Desse modo, verificada a natureza fraudulenta das transações impugnadas, decorrente de acesso indevido de terceiro à conta bancária do correntista, cumpria ao banco demonstrar haver tomado todas as cautelas necessárias a garantir a segurança do consumidor, o que não se operou no caso. Por conseguinte, configurada a falha na segurança da operação, afigura-se escorreita a sentença que reconhece a responsabilidade do banco pelo prejuízo material sofrido pelo consumidor. 7. A análise dos elementos de prova, em conjunto, permite inferir que o consumidor foi efetivamente vitimado pelo golpe bancário, experimentando, ao final, além do prejuízo material, a angústia e os contratempos decorrentes do ilícito, ao que se acresce a tentativa frustrada de resolução pela via extrajudicial com o banco. Nesse sentido, reconhece-se que a imposição de tamanha perda patrimonial, no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), correspondente aos recursos poupados pelo autor, representa lesão a direito de personalidade, especialmente à intimidade, à integridade psíquica e à subsistência, e, nessa medida, é suficiente para impor condenação por dano moral. 8. No tocante ao quantum indenizatório, a jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, bem como desta e. Corte, é no sentido de considerar válida a adoção do critério bifásico para o referido arbitramento equitativo. Sob tal perspectiva, na primeira fase, tendo em vista o interesse jurídico lesado e os precedentes oriundos de casos semelhantes, estabelece-se um valor básico para a indenização. Na segunda fase, ponderam-se as circunstâncias in concreto (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), ultimando-se o valor indenizatório, mediante arbitramento equitativo do julgador (AgInt no REsp 1608573/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 23/08/2019). 9. Da análise de precedentes deste Tribunal, é dado concluir a existência de um padrão indenizatório a título de dano moral em casos assemelhados no quantum fixado na sentença. Por sua vez, a conjuntura descrita nos autos não remete a uma solução diversa da adotada pelos julgados paradigmas, pois deles não se desbordou, não se detectando alguma peculiaridade que conduzisse a uma mitigação da compensação perfilhada. 10. Recurso conhecido e desprovido. Honorários majorados. (Acórdão 1777722, 07046681120228070008, Relator: SANDRA REVES, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 25/10/2023, publicado no PJe: 17/11/2023. Pág.: Sem Página Cadastrada.) Ademais, verifica-se que as instituições financeiras rés não cumpriram com a obrigação de devolução dos valores. Caso contrário, se houvesse agido de maneira diligente, a ré teria evitado todo o acionamento do Judiciário, poupando tempo, trabalho e aborrecimentos para o consumidor, de modo que restou configurada a teoria do desvio produtivo. Questão a ser enfrentada é a estipulação do valor pecuniário para a reparação dos danos morais pelo caráter subjetivo que possui. Vários critérios são adotados, dentre os quais destaca-se a posição social do ofendido, a capacidade econômica do ofensor e seu maior dever de cautela e a extensão do dano. Entende-se que todos esses fatores devem ser considerados quando existem dados sobre eles nos autos, mas o que deve preponderar para o arbitramento do valor há de ser o último critério acima, ou seja, a proporcionalidade em relação à extensão do dano. E, sobretudo deve haver prudência e equilíbrio, de modo que o valor a ser arbitrado não represente enriquecimento da vítima do dano e nem seja tão insignificante a ponto de não desestimular o ofensor na reiteração da conduta. Com base em tais considerações, compete ao presente órgão judicante proferir o devido provimento jurisdicional capaz de deslindar a causa. Assim, considerando todos estes balizamentos, arbitro em R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) o valor da compensação a ser paga pelos danos morais pleiteados. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão encartada na inicial para: a) CONDENAR os réus, solidariamente, a restituição/estorno do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), acrescidos de juros legais com base na Taxa Legal (art. 406, §1º, do Código Civil), a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a contar do efetivo prejuízo, segundo o teor da Súmula 43 do STJ; b) CONDENAR os réus, solidariamente, ao pagamento de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) a título de compensação por danos morais, tudo no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 523, §1º do CPC, acrescidos de juros legais com base na Taxa Legal (art. 406, §1º, do Código Civil), a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a partir da data desta sentença, nos termos da súmula 362 do STJ. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 16 de julho de 2025. JESSÉ DE ANDRADE ALEXANDRIA Juiz de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Ivania Correa Barboza x Banco Bradesco Financiamento S/A

ID: 331453380

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Lençóis Paulista - 3ª Vara Cumulativa Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1001921-19.2025.8.26.0319

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

IVANIA CORREA BARBOZA

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTO S/A

Intimação

Advogados:

VITOR RODRIGUES SEIXAS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

VIDAL RIBEIRO PONCANO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CRISTIANE APARECIDA DE SOUZA PONÇANO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Processo 1001921-19.2025.8.26.0319 - Procedimento Comum Cível - Contratos Bancários - Ivania Correa Barboza - Banco Bradesco Financiamento S/A - Vistos. IVANIA CORREA BARBOZA, qualificada nos autos… Processo 1001921-19.2025.8.26.0319 - Procedimento Comum Cível - Contratos Bancários - Ivania Correa Barboza - Banco Bradesco Financiamento S/A - Vistos. IVANIA CORREA BARBOZA, qualificada nos autos do processo em epígrafe, ajuizou a presente ação em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., também qualificado, ao argumento de que as partes firmaram contrato para financiamento de valor para aquisição de veículo. Aludiu que há no contrato os seguintes encargos ilegais cobrados pela parte ré que devem ser afastados: i) juros contratados superiores ao limite legal e acima da taxa média de mercado, além de capitalizados de forma indevida; ii) venda casada de seguro; iii) tarifas de cadastro e de registro; e iv) juros moratórios abusivos. Afirmou que, afastando-se as ilegalidades aventadas, as parcelas deveriam ter o valor mensal de R$ 654,70. Pugnou pela restituição em dobro dos valores pagos a maior. Requereu, liminarmente, a redução do valor das parcelas remanescentes para R$ 654,70. Pugnou pela concessão da gratuidade da justiça. A inicial, de fls. 01/15, foi instruída com os documentos de fls. 16/52. Foi deferida a gratuidade da justiça e indeferida a medida liminar (fls. 53/55). Citada, a parte ré apresentou contestação às fls. 91/135, acompanhada dos documentos de fls. 136/152, alegando preliminar de inépcia da inicial, por ausência de pagamento do valor incontroverso. No mérito, afirmou que os fatos narrados não se adequariam à realidade, uma vez que em nenhum momento foi demonstrada qualquer conduta ilegal ou condenável da parte ré. Aludiu que as legalidades da taxa de juros remuneratórios capitalizados, encargos de mora, tarifas do contrato e contratação de seguro foram reconhecidas pela jurisprudência do C. STJ, firmada em súmulas e em recursos repetitivos, bem como que os serviços prestados estão comprovados nos autos. Aduziu que a devolução dos valores seria incabível tendo como parâmetro a origem sinalagmática do contrato. Requereu a manutenção do contrato celebrado e a improcedência dos pedidos da inicial. Em réplica de fls. 156/172, a parte autora refutou os argumentos da contestação e reiterou os termos da inicial. Os autos vieram conclusos. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Rejeito a preliminar de inépcia da inicial por ausência de pagamento do valor incontroverso, visto que o pedido de tutela provisória para o depósito das parcelas em juízo foi indeferido em decisão de fls. 53/55. No mérito, o feito comporta julgamento de plano, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, pois, pela natureza da controvérsia, não há necessidade da produção de provas de outra natureza, além da documental juntada pelas partes, para a solução da divergência. Os pedidos são procedentes em parte. Observo que se admite a revisão de contrato a fim de garantir aos contratantes o direito de discutir a validade das cláusulas. De fato, tal possibilidade visa a afastar a validação de obrigações nulas. A esse respeito, oportuno transcrever: Quanto ao mais, iterativos julgados desta Corte admitem a revisão dos contratos firmados com instituições financeiras, em virtude de a lei garantir aos contratantes o direito de discutir a validade das cláusulas constantes da avença, em especial as que possam importar em cobrança de taxas excessivas ou ilegais, independentemente de ter havido quitação integral da dívida. Destarte, em virtude da impossibilidade de se validar obrigações nulas, ainda que tenham sido objeto de novação, os contratos bancários são passíveis de revisão judicial, conforme enunciado da Súmula n. 286/STJ. (STJ AREsp 004017, Rel. Ministro Raul Araújo, 25/8/2011) O tema atinente à revisão judicial de contratos bancários é complexo e não pode ser tratado apenas sob o ponto de vista jurídico-formal ou econômico (ponto de vista dos economistas), como vem sendo predominantemente feito pela jurisprudência pátria, mas também sob o ponto de vista social, mediante análise do contexto social cujo conhecimento é fundamental para a correta aplicação das regras e princípios jurídicos. Ocorre que, como atesta ZYGMUNT BAUMAN, vivemos num cenário exitosamente transformado, de uma sociedade de produtores (com os lucros sobrevindo sobretudo da exploração do trabalho assalariado), numa sociedade de consumidores (sendo os lucros oriundos sobretudo da exploração dos desejos de consumo) em que a filosofia empresarial dominante insiste em que a finalidade do negócio é evitar que as necessidades sejam satisfeitas e evocar, induzir, conjurar e ampliar novas necessidades que clamam por satisfação e novos clientes em potencial, induzidos à ação por essas necessidades: em suma, há uma filosofia de afirmar que a função da oferta é criar demanda (in Vida a Crédito, Ed. Zahar, pág. 28, negritos nossos). Nesse contexto, os empréstimos não são exceção: a oferta de empréstimos deve criar e ampliar a necessidade de empréstimos, de modo que para garantir seu lucro, assim como o de seus acionistas, bancos e empresas de cartões de crédito contam mais com o 'serviço' continuado das dívidas do que com seu pronto pagamento. Para eles, o 'devedor ideal' é aquele que jamais paga integralmente suas dívidas. (...). Uma vez cultivadas (ou seja, incluídas no jogo dos empréstimos), não se pode mais permitir que escapem, que entrem 'em pousio'. Quem quiser quitar inteiramente seus débitos antes do prazo deve pagar pesados encargos (ob. cit., págs. 28, 30 e 31, negritos nossos). Em consonância com o acima dito, aponta CINARA PALHARES (in Evolução da proteção jurídica do consumidor de crédito no Brasil, texto ainda não publicado, negritos nossos) que na prática, o que tem ocorrido é o envio de propostas de financiamentos para a casa dos consumidores sem prévia solicitação, e sem que exista qualquer relação jurídica anterior com o banco proponente. Os atrativos nos informes publicitários são exuberantes, e as informações essenciais são insuficientes. (...). Existe, atualmente, um assédio explícito para que o consumidor se endivide, em que as promessas de crédito fácil, sem conduta cadastral e sem comprovação de renda, demonstram que muitos fornecedores de crédito estão mais preocupados em vender seu produto de qualquer maneira para o consumidor, do que em fazer uma análise efetiva das suas necessidades. Desta forma, valendo-nos novamente de BAUMAN, criou-se um hábito, cultivado com cuidado e agora já bastante arraigado, de correr para os empréstimos cada vez que temos um problema a resolver ou uma dificuldade a superar. Como poucas drogas, viver a crédito cria dependência. Talvez mais ainda que qualquer outra droga, podendo-se assim dizer que a crise do crédito ocorrida recentemente, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, não foi resultado do insucesso dos bancos. Ao contrário, é o fruto, plenamente previsível, embora não previsto, de seu extraordinário sucesso. Sucesso em transformar uma enorme maioria de homens, mulheres, velhos e jovens numa raça de devedores (ob. cit., págs. 34 e 31, negritos nossos, itálico no original). David Harvey, em sua recente obra O Enigma do Capital, arremata dispondo que O sistema de crédito tornou-se, no entanto, a grande alavanca moderna para a extração de riqueza pelo capital financeiro do resto da população. Todos os tipos de práticas predatórias bem como as legais (taxas de juros abusivas sobre os cartões de crédito, execuções hipotecárias em negócios por meio da negação de liquidez em momentos-chave e assim por diante) podem ser usados para perseguir táticas de despossessão que beneficiam os que já são ricos e poderosos. A onda de financeirização que ocorreu a partir de meados da década de 1970 foi espetacular por seu estilo predatório, com promoção de níveis de facilitação do endividamento que reduz populações inteiras, mesmo nos países capitalistas avançados, à escravidão pela dívida (Obra citada, Boitempo Editorial, pág. 198). No contexto social acima assinalado, em que, como atestado por PIERRE BOURDIEU, a coerção tem sido substituída pela estimulação, os padrões de conduta antes obrigatórios, pela sedução, o policiamento do comportamento, pela publicidade e pelas relações públicas, e a regulação normativa, pela indicação de novos desejos e necessidades (citado por BAUMAN, ob. cit., pág. 116, destaques meus) e em que o pobre é forçado a uma situação na qual tem de gastar o pouco dinheiro ou os parcos recursos de que dispõe com objetos de consumo sem sentido, e não com suas necessidades básicas, para evitar a total humilhação social e evitar a perspectiva de ser provocado e ridicularizado (BAUMAN, ob. cit., pág. 74) contexto este em relação ao qual as instituições financeiras são as principais estimuladoras e beneficiárias não há como se imputar toda a responsabilidade pelo inadimplemento de contratos bancários ao devedor, nem como se falar em devedor de má-fé ou justificar práticas contratuais na necessidade de não se beneficiar maus pagadores em detrimento de bons pagadores. Daí a imperiosa necessidade de se analisar a matéria sub judice tendo em vista o cotejo de tal contexto que por si só implica no mínimo uma coculpabilidade das instituições financeiras pelas situações de inadimplemento contratual e a exige a melhor distribuição dos riscos de inadimplemento com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, os princípios constitucionais que regem a ordem econômica e os princípios da boa-fé e da função social do contrato, como se passa a fazer abaixo. Capitalização indevida de juros remuneratórios pedido improcedente Trata-se de contrato com parcelas fixas, sendo certo que o cliente, ao contratar, toma em conta principalmente o valor da parcela, pouco importando a ele, para tal fim, se o valor e o número de parcelas foram alcançados através da aplicação de juros de 1,5% ao mês capitalizados ou 2% ao mês de forma linear. Desta forma, e como nosso ordenamento infelizmente não prevê limitação de juros para instituições financeiras (respeitada a possibilidade de limitação de juros que se revelem manifestamente abusivos), não há como se justificar juridicamente o afastamento da capitalização com vistas à redução do valor da parcela fixa. Há respeitado entendimento no sentido de que em tal hipótese sequer haveria propriamente capitalização. Não há, portanto, que se interferir no valor das parcelas fixas do contrato. Pela mesma razão, não há que se falar em excesso decorrente de utilização da Tabela Price, nem respaldo legal a obrigar a instituição financeira a utilizar a Tabela Gauss. Ademais, estabelece a súmula 541 do C. STJ: A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. No mais, no contrato em questão, a taxa anual é superior ao duodécuplo da mensal (itens VI-1, fl. 37) nos moldes da referida súmula. Juros contratuais acima da taxa média de mercado ou em desacordo com o previsto no contrato pedidos improcedentes É possível a limitação da taxa de juros contratual quando se revele manifestamente abusiva, à luz do disposto nos artigos 51, IV, e 39, V, do CDC. Nesse sentido: A Segunda Seção, por ocasião do julgamento do REsp 1.061.530/RS, submetido ao rito previsto no art. 543-C do CPC, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 10.3.2009, consolidou o seguinte entendimento quanto aos juros remuneratórios: a) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 combinado com o art. 406 do CC/02; d) é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada ante as peculiaridades do julgamento em concreto (STJ Quarta Turma, REsp 1005427, Rel. Min. Luis Felipe Salmão, j. 25.09.2012). No entanto, o fato de a taxa de juros cobrada ser um pouco superior à taxa média de mercado, por si só, não caracteriza abusividade, sendo necessário, para tal fim, haver discrepância expressiva entre as referidas taxas. No caso, a taxa média de juros mensal de contratos como o presente, de financiamento de aquisição de veículo para pessoa física, considerando o mês do contrato, pelo que se extrai do site do Banco Central do Brasil na Internet (caminho desde a página inicial do site: www.bcb.gov.br - InícioSistema Financeiro NacionalInformações sobre operações bancáriasTaxas de operações de créditoDados consolidados (mensal) Sistema Gerenciador de Séries Temporais (SGS) Indicadores de Crédito Taxas de juros Taxas de Juros com Recursos Livres marcar Taxa média de juros - Pessoas físicas - Aquisição de veículos (25471) e clicar consultar séries e depois visualizar valores) foi de 1,93% enquanto que a taxa de juros mensal cobrada pela parte ré na oportunidade foi de 2,69% (item VI fl. 37), ou seja, a taxa praticada pela parte ré estava cerca de 39% superior à média de mercado, sendo certo que sempre haverá taxas razoavelmente superiores à média para se chegar ao valor médio. Logo, no caso concreto, não há que se falar em abusividade da taxa de juros cobrada. No mais, a parte autora alegou que os juros efetivos cobrados pela parte ré seriam de 3,31% ao mês e estariam acima dos juros remuneratórios previstos no contrato (fl. 43). Contudo, no parecer técnico de fls. 42/52, a parte autora não demonstra como chegou à suposta diferença dos juros, não havendo indício de que realmente tenha ocorrido. No mais, verifica-se diferença no contrato entre a taxa de juros remuneratórios e o CET. Nos termos do art. 3º, da Resolução CMN 4.881/2020 do Banco Central, o custo efetivo total (CET) deve ser calculado considerando os fluxos referentes às liberações e aos pagamentos previstos, incluindo taxa de juros a ser pactuada no contrato, tributos, tarifas, seguros e outras despesas cobradas do cliente, mesmo que relativas ao pagamento de serviços de terceiros contratados pela instituição, inclusive quando essas despesas forem objeto de financiamento. Em outras palavras, o CET engloba não só os juros remuneratórios como os demais encargos do contrato. Nesse sentido, é entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: APELAÇÃO CÍVEL Contrato bancário Empréstimo consignado Ação revisional Sentença de improcedência Inconformismo da autora 1. Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Suficiência da prova documental para julgamento 2. Mérito. Empréstimos consignados. Taxa de juros remuneratórios pactuada em ambos os contratos no importe 2,14% ao mês, que atende ao disposto no artigo 13, inciso II, da Instrução Normativa nº 28 do INSS, com a alteração promovida pela Instrução Normativa PRES/INSS nº 125, de dezembro de 2021, que limitou a taxa a 2,14% ao mês. Custo efetivo que não se confunde com o custo efetivo total, cuja informação é obrigatória por norma do Bacen e contempla todos os custos da operação, inclusive IOF, de incidência obrigatória na operação por imposição legal, sem configurar acréscimo indevido. Inexistência de irregularidades no contrato. Descabimento de sua revisão Sentença mantida Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1004170-11.2023.8.26.0319; Relator (a):Daniela Menegatti Milano; Órgão Julgador: 19ª Câmara de Direito Privado; Foro de Lençóis Paulista -3ª Vara Cumulativa; Data do Julgamento: 27/03/2024; Data de Registro: 27/03/2024) . Portanto, não há falar em cobrança de juros acima do previsto no contrato. Ademais, só haverá redução do CET caso na presente demanda seja reconhecida alguma abusividade que resulte na redução dos encargos contratuais. Venda casada do seguro contratado pedido procedente O seguro prestamista (R$ 695,86 item 4.1, fl. 37) vinculado ao contrato de financiamento atesta a venda casada do produto. Isso porque, o seguro prestamista contratado não precisa fazer parte direta de um financiamento, sendo que o seguro foi contratado no mesmo dia do financiamento, ainda que em termo apartado (fls. 149), elementos que atestam a índole da parte ré em fazer a venda casada buscando maior lucratividade. Nesse sentido, é entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: APELAÇÃO CONTRATOS BANCÁRIOS Ação de caráter revisional Sentença de parcial procedência. SEGURO Cobrança abusiva O consumidor não pode ser obrigado a contratar seguro com seguradora indicada pela instituição financeira Restituição dobrada Entendimento consoante o REsp nº 676608/RS Modulação dos efeitos da decisão a partir de 30/03/2021 - Afastada a exigência do elemento volitivo (má-fé) - Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1004628-62.2022.8.26.0319; Relator (a):Flávio Cunha da Silva; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro de Lençóis Paulista -3ª Vara Cumulativa; Data do Julgamento: 19/09/2023; Data de Registro: 19/09/2023) *** AÇÃO REVISIONAL. Cédula de crédito bancário. MULTA CONTRATUAL. Tema deduzido em apelação, porém não alegado na petição inicial. Inovação recursal. Inadmissibilidade. Recurso não conhecido. SENTENÇA. Sentença citra petita. Pleito de ilegalidade das tarifas de registro de contrato e avaliação do bem, além do seguro, da parcela premiável e do IOF. Temas não apreciados. Omissão que não acarreta sua nulidade, impondo-se a apreciação do pedido não examinado, nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso III, do CPC, por se tratar de matéria de direito. Sentença integrada, ex officio. TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO. Matéria consolidada pelo C. STJ, Resp. 1.578.553/SP (Repetitivo tema 958/STJ). Validade da cobrança, na hipótese, mas em valor inferior, diante de abusividade identificada. Pedido parcialmente procedente. TARIFA DE AVALIAÇÃO DE BENS. Entendimento consolidado pelo C. STJ no Resp. 1.578.553/SP de 28.11.2018 (Repetitivo tema 958/STJ). Validade da cobrança, porquanto, demonstrada a efetiva prestação do serviço. Valor não excessivo. Pedido improcedente. SEGURO PRESTAMISTA. Entendimento consolidado pelo STJ (Resp. 1.639.320/SP de 12.12.2018, Repetitivo - tema 972/STJ). O consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada. Pedido procedente. TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO. Venda casada. Reconhecimento. Prática ilegal. Artigo 39, I, do Código do Direito do Consumidor. Pedido procedente. IOF. Legalidade da cobrança. É lícito o ajuste de pagamento do IOF por meio de financiamento acessório ao mútuo principal, com sujeição aos mesmos encargos contratuais. Pedido improcedente. TARIFA DE CADASTRO. Cobrança. Admissibilidade. Existência de expressa previsão contratual, de conformidade com as Resoluções do BACEN. Incidência da Súmula 566 do STJ. Sentença mantida. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. Na cédula de crédito bancário, é devida a capitalização de juros, se expressamente contratada. Artigo 28, § 1º, inciso I, da Lei nº 10.931/04. Inteligência das Súmulas 539 e 541, ambas do STJ. Sentença mantida. JUROS REMUNERATÓRIOS. Não comprovação de cobrança abusiva. Incidência da Súmula 596 do STF e Súmula 382 do STJ. Sentença mantida. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, na parte conhecida. (TJSP; Apelação Cível 1005013-05.2020.8.26.0020; Relator (a):Fernando Sastre Redondo; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional XII - Nossa Senhora do Ó -3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 17/06/2021; Data de Registro: 17/06/2021) (destaque meu) Extrai-se do inteiro teor do v. acórdão: Registre-se que o valor do prêmio foi incluído no Custo Efetivo Total do financiamento, do que resulta evidente que a assinatura de termo em apartado constituiu mera formalidade. Destaque-se, ainda, que a contratação do seguro ocorreu por intermédio da Votorantim Corretora de Seguro que é do mesmo grupo econômico do apelado, evidenciando a ocorrência de venda casada. (...) Relativamente ao título de capitalização (Cap. Parc. Premiável) previsto no item 5.5, no valor de R$. 171,36 (fls. 30), sua exigência também deve ser afastada. Na hipótese, é patente a caracterização da denominada venda casada, que se configura pela vinculação do consumidor à contratação de produto de natureza totalmente distinta do objeto do contrato comercializado pela casa bancária, cerceando a liberdade de escolha. De rigor, portanto, a devolução à parte autora do valor pago referente a tal produto, uma vez que a venda casada configura prática abusiva. A quantia deve ser restituída em dobro, tendo em vista que o contrato foi firmado em fevereiro de 2024 e o C. STJ (no julgamento do EAREsp nº 676.608-RS) fixou a dispensa do elemento volitivo para a imposição da devolução em dobro, que deve considerar a boa-fé objetiva, com modulação dos efeitos para que a devolução em dobro se opere após a publicação do v. acórdão em 30/03/2021. A quantia deve ser restituída, visto que o pagamento já ocorreu através do valor do empréstimo tomado. Tarifa de Cadastro pedido improcedente Consoante orientação firmada pelo STJ, em Recursos Repetitivos (REsp 1.251.331-RS), a tarifa de cadastro pode ser exigida somente no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. Possibilidade de cobrança, portanto, no caso em tela (item 4.3 - fl. 37). Ademais, a parte autora não apresentou elementos de que haveria discrepância entre a taxa cobrada pela parte ré e a média de mercado. Entretanto, a revisão do valor, em observância ao entendimento do STJ, seria possível se a tarifa estivesse muito acima da média de mercado, o que não ficou demonstrado no caso. Tarifa de registro de contrato (despesas do emitente) pedido improcedente O Colendo Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese acerca da tarifa de registro de contrato e da tarifa de avaliação do bem: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 958/STJ. DIREITO BANCÁRIO. COBRANÇA POR SERVIÇOS DE TERCEIROS, REGISTRO DO CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. PREVALÊNCIA DAS NORMAS DO DIREITO DO CONSUMIDOR SOBRE A REGULAÇÃO BANCÁRIA. EXISTÊNCIA DE NORMA REGULAMENTAR VEDANDO A COBRANÇA A TÍTULO DE COMISSÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO. DISTINÇÃO ENTRE O CORRESPONDENTE E O TERCEIRO. DESCABIMENTO DA COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO EFETIVAMENTE PRESTADOS. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ABUSIVIDADE DE TARIFAS E DESPESAS EM CADA CASO CONCRETO. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. 3. CASO CONCRETO. 3.1. Aplicação da tese 2.2, declarando-se abusiva, por onerosidade excessiva, a cláusula relativa aos serviços de terceiros ("serviços prestados pela revenda"). 3.2. Aplicação da tese 2.3, mantendo-se hígidas a despesa de registro do contrato e a tarifa de avaliação do bem dado em garantia. 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. (REsp 1578553/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 28/11/2018, DJe 06/12/2018) (destaque meu). No que tange à tarifa de registro de contrato, no valor de R$ 292,26 (item 4.2, fl. 37), sua finalidade é registrar a alienação fiduciária no órgão de trânsito, o que ficou demonstrado pelo CRLV do veículo, onde consta a anotação da alienação fiduciária (fl. 32). Conclusão No julgamento do REsp 1639320, em 12.12.2018, de relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, pela sistemática dos recursos repetitivos, o Colendo Superior Tribunal de Justiça fixou entendimento de que "a abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora". Desse modo, as abusividades reconhecidas não afastam a mora em caso de suspensão do pagamento das parcelas em aberto. No mais, os encargos da mora devem observar o previsto no contrato firmado entre as partes de juros de mora de 1% ao mês (fl. 36), de modo que seria abusiva a utilização de um índice inferior quando a mora for da instituição financeira e não do consumidor. Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para o fim de: (i) declarar a nulidade das cláusulas/contratação referentes à cobrança de seguro (R$ 695,86); e (ii) condenar a parte ré à restituição em dobro do referido valor à parte autora considerando as nulidades assinaladas, com correção monetária desde a contratação (20/08/2024) pelo IPCA e juros moratórios contratuais de 1% ao mês desde a data da citação. A instituição financeira ré fica autorizada a promover o abatimento do valor da condenação na presente sentença com as parcelas do financiamento em atraso ou em aberto, desde haja redução proporcional dos juros remuneratórios quanto às parcelas ainda não vencidas em razão do pagamento antecipado. Dada a sucumbência mínima da parte ré, condeno a parte autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da causa, observada a gratuidade da justiça concedida. P.R.I. - ADV: VITOR RODRIGUES SEIXAS (OAB 457767/SP), VIDAL RIBEIRO PONCANO (OAB 91473/SP), CRISTIANE APARECIDA DE SOUZA PONÇANO (OAB 101631/SP)

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0031811-81.2014.8.11.0041

ID: 334740642

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM AÇÕES COLETIVAS Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL Nº Processo: 0031811-81.2014.8.11.0041

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BROOKFIELD INCORPORACOES S.A.

Intimação

Advogados:

JOAO CELESTINO CORREA DA COSTA NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RENATO VALERIO FARIA DE OLIVEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

BETTANIA MARIA GOMES PEDROSO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

BRUNO RODRIGUES DE SOUZA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

FILINTO CORREA DA COSTA JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

HELDA FERREIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

NATALIA HORITA DE ALMEIDA COSTA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

OSWALDO DAGUANO JUNIOR

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

TARCISIO SILVIO BERALDO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Vistos, Trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em 17.7.2014 em face de TEGRA INCORPORADORA S.A., atual denominação de BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A., … Vistos, Trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em 17.7.2014 em face de TEGRA INCORPORADORA S.A., atual denominação de BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A., em que objetiva a defesa dos interesses e direitos dos consumidores adquirentes de unidades dos empreendimentos denominados Residencial Maison Classic, Harmonia e Bonavita. Em sua petição inicial, o Ministério Público alega, em síntese, que a requerida transfere aos consumidores a responsabilidade por arcar com serviço de corretagem por ela contratado sem a correspondente integração desse custo ao preço do produto adquirido. Sustenta que a prática atingiu todos os consumidores que adquiriram unidades dos empreendimentos denominados Residencial Maison Classic, Harmonia e Bonavita. Aduz que a requerida, apesar de constituir sociedades de propósito específico (SPEs) para cada empreendimento, ostenta diretamente seu nome para garantir o sucesso dos lançamentos imobiliários, participando ativamente no convencimento dos consumidores para realização dos negócios de compra e venda dos imóveis. Alega ainda que os contratos de adesão utilizados pela requerida contêm cláusulas abusivas, tais como: a) transferência da obrigação de pagamento da comissão de corretagem aos consumidores; b) método comercial coercitivo c) transferência de responsabilidade aos consumidores pelo pagamento de IPTU e despesas de condomínio antes da entrega do imóvel; d) cláusula de perda das benfeitorias úteis e necessárias introduzidas no imóvel pelos consumidores em caso de rescisão contratual; d) cláusula-mandato que constitui a requerida como procuradora dos consumidores. Ao final, requereu a concessão de liminar para vedar as práticas abusivas e, no mérito, a procedência da ação para condenar a requerida: (a) concessão de liminar para vedar as práticas abusivas; (b) condenação da requerida em obrigação de fazer, consistente em promover a retificação dos instrumentos de compra e venda e na obrigação de não fazer, consistente em proibir a imputação de ônus aos consumidores nos atos de retificação; (c) bem como a indenizar os consumidores pelos valores pagos como "sinal" para remuneração do serviço de corretagem; (d) declaração de nulidade de diversas cláusulas dos contratos; (e) fixação de indenização genérica pelos danos morais e materiais causados aos consumidores; (f) condenação da requerida na obrigação de veicular o dispositivo da sentença em jornais locais e em sua página na internet; (g) fixação de multa cominatória por descumprimento; (h) inversão do ônus da prova. Deu à causa o valor de R$ 100.000,00 (id. 56199551, pgs. 1/31). A liminar foi indeferida em 23.6.2014, ocasião em que foi determinada a citação (id. 56202465, pgs. 27/33) e não há notícias de que tenha ocorrido reforma. A requerida Brookfield Incorporações S.A. foi citada em 15.8.2014 (id. 56202465, p. 43) e apresentou contestação, em que alegou, preliminarmente, (a) ilegitimidade ativa do Ministério Público e (b) sua ilegitimidade passiva, com retificação do polo passivo para sua exclusão e inclusão das empresas Brookfield Centro-Oeste Empreendimentos Imobiliários S.A., MB Engenharia SPE039 S.A. e MB Engenharia SPE073 S.A., que seriam as únicas responsáveis pelos empreendimentos imobiliários. No mérito, em síntese, sustentou: (a) legalidade da cobrança de comissão de corretagem, ao argumento que os consumidores tinham pleno conhecimento de que o valor pago como "sinal" se destinava à remuneração do serviço de corretagem; (b) inexistência de venda casada, pois os consumidores poderiam adquirir os imóveis diretamente da construtora, sem intermediação de corretores; (c) validade das cláusulas contratuais impugnadas pelo Ministério Público e (d) inexistência de danos morais e materiais a serem indenizados (id. 56202465, pgs. 45/73). Na sua Impugnação à Contestação, o autor Ministério Público, defendeu a rejeição das preliminares arguidas pela requerida e rebateu as alegações, bem assim, reiterou os argumentos da inicial e pediu a inversão do ônus da prova (id. 56202484, pgs. 22/33). No id. 56202484, pgs. 48/63 o autor comunicou a interposição do Agravo de Instrumento nº 0152897-45.2014.811.0000 contra a decisão que indeferiu seu pedido de liminar e nas pgs. 68/73 informação do indeferimento do efeito suspensivo ao recurso. No id. 56203593, pgs. 3/12 foi juntado o acórdão de desprovimento do citado Agravo de Instrumento nº 0152897-45.2014.811.0000 interposto pelo autor. No id. 56203602, pgs 3/4 o autor manifestou discordância com a realização de audiência de conciliação, ao argumento de que “a petição inicial veicula pedidos que visam a proteção das três espécies de direitos coletivos (difusos conforme itens I a 4 às fis. 18; coletivos conforme item 4, alíneas "a", "b", "d", "e", "f' e "g" e individuais homogêneos conforme item 4, alíneas "c", "g" e "h")”, dos quais o Autor atua como substituto processual dos lesados e em relação aos quais entende não possível, assim, transigir. No mesmo id. 56203602, p. 6, a requerida também dispensou a referida audiência. No id. 56203602, pgs. 7/11 a requerida pediu a improcedência dos pedidos listados na petição inicial “(1) a condenação da rés em obrigação de fazer consubstanciada na retificação dos instrumentos de compra-e-venda e respectivos registros públicos referentes às unidades dos condomínios Maison Classic, Harmonia e Bonavita, para que seja acrescido ao preço de cada unidade o valor despendido com o pagamento da taxa de corretagem, sem que isso represente ônus aos adquirentes; (11) caso ao seja feita referida retificação, que as rés sejam condenadas a devolver aos adquirentes o valor pago a título de corretagem; (111) que sejam condenadas ao pagamento de indenização por dano moral sofrido individualmente por cada um dos adquirentes; e (IV) que sejam condenadas a publicar em dois jornais de grande circulação o dispositivo da sentença, por quinze edições, bem como em sua página na internet por seis meses, alem de fornecerem cópia integral da sentença à administração dos condomínios Maison Classic, Harmonia e Bonavita” em razão do entendimento do STJ no REsp 1.599.511/SP, representativo de controvérsia e que considerou “válida a "cláusula contratual DINAMARCO, Rossi, BERALDO & BEDAQUE ADVOCACIA 3 que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária". O autor pronunciou contrariamente ao pedido da requerida (id. 56203602, pgs. 43/45). Em 28.2.2018 foi proferida sentença que extinguiu a ação sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa (id. 56203602, pgs. 49/61), que foi reformada pelo acórdão proferido na Apelação nº 47150/2018 julgada em 11.12.2018 interposta pelo Ministério Público (id. 56203605, pgs. 60/71). O autor pediu o julgamento antecipado da lide. Alternativamente, se fosse do entendimento do julgador a realização de instrução, bem como a inversão do ônus da prova (id. 56203605, pgs. 75/76). No id. 56203605, p. 77 foi determinada a intimação das partes para especificação de provas, tendo o autor postulado pela produção de prova testemunhal (id. 56203605, pgs. 79/80). No id. 56203610, pgs. 1/3 as empresas TEGRA INCORPORADORA S.A., atual denominação de BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A., TG CENTRO-OESTE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S.A., atual denominação de BROOKFIELD CENTRO-OESTE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S.A., TGMB 039 EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA., atual denominação de MB ENGENHARIA SPE039 S.A e TGMB 073 EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA., atual denominação de MB ENGENHARIA SPE073 S.A. requereram o julgamento antecipado da lide. Em 27.5.2022, id. 86024454, foi proferida decisão saneadora, que indeferiu o pedido de retificação do polo passivo formulado no id. 56202465, p. 46 e deferiu o pedido do autor de inversão do ônus da prova, bem assim reiterou a ordem de especificação de provas. No id. 88583215 foi juntada informação de interposição do Agravo de Instrumento nº 1012144-40.2022.811.0000 pela empresa Tegra Incorporadora S.A. atual denominação da requerida BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A. contra a decisão saneadora na parte que inverteu o ônus da prova, cujo efeito suspensivo foi deferido em 29.6.2020 (id. 89293408). No id. 91452307 o autor reiterou pedido de produção de prova testemunhal e de juntada de documentos novos, ocasião que apresentou seu rol de testemunhas: “Alex Spinelli Pimenta, José Afonso Botura Portocarrero, Mônica de Oliveira e Silva Portocarrero, Flavio Ramos Pedroza e Adeildes pereira Bastos”. Informação de provimento do Agravo de Instrumento nº 1012144-40.2022.811.0000 pela empresa Tegra Incorporadora S.A. atual denominação da requerida BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A. no id. 118581368. Nova ordem de especificação das provas no id. 118687139, tendo a requerida ratificado o pedido de julgamento antecipado da lide (id. 123087447) e o autor ratificado o pleito do id. 91452307. No id. 169852020 o autor desistiu da testemunha Adeildes Pereira Bastos, cuja homologação foi feita em 2.10.2024 (id. 171131164). No id. 177719661 termo de oitiva, apenas como informante, de Flavio Ramos Pedroza testemunha do autor, conforme despacho proferido no id. 177751850. No id. 183766047 termo de oitiva de José Afonso Botura Portocarrero, Mônica de Oliveira e Silva Portocarrero na qualidade de informantes e a de Alex Spinelli Pimenta como testemunhas do autor conforme despacho proferido no id. 183774808. Alegações finais do autor no id. 185552563 e da requerida no id. 188505794. É o relatório. Decido. Conforme já consignado trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso em face de Brookfield Incorporações S.A., em que objetiva a defesa dos interesses e direitos dos consumidores adquirentes de unidades dos empreendimentos denominados Residencial Maison Classic, Harmonia e Bonavita. 1 – DAS PRELIMINARES E DO PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA FEITO PELO AUTOR Quanto as preliminares de ilegitimidade ativa e passiva, bem como quanto ao pedido de inversão do ônus da prova formulado pelo autor, já foram resolvidas. A ilegitimidade ativa foi afastada pelo acórdão da Apelação nº 47150/2018 julgada em 11.12.2018 interposta pelo Ministério Público (id. 56203605, pgs. 60/71). A ilegitimidade passiva foi afastada pela decisão saneadora, irrecorrida nesta parte, que foi proferida em 27.5.2022 (id. 86024454). O pedido feito pelo autor, de inversão do ônus da prova, embora tenha sido deferido pela decisão saneadora proferida em 27.5.2022 (id. 86024454), foi, posteriormente, indeferido pelo acórdão do Agravo de Instrumento nº 1012144-40.2022.811.0000 interposto pela requerida Tegra Incorporadora S.A. atual denominação de BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A., conforme id. 118581368. Logo, como não há preliminares a serem analisadas, passa-se a análise do mérito da ação. 2 – DO MÉRITO. O Ministério Público propôs ação contra a Brookfield Incorporações S.A. para coibir eventuais práticas abusivas nos contratos de adesão utilizados na venda de imóveis dos referidos empreendimentos, em que alegou as seguintes eventuais irregularidades: Transferência indevida aos consumidores do pagamento da comissão de corretagem, Cobrança de IPTU e despesas condominiais antes da entrega dos imóveis, Cláusulas que determinavam a perda de benfeitorias úteis e necessárias em caso de rescisão contratual e Cláusulas que nomeavam a empresa como mandatária dos consumidores. Ao final, pediu concessão de liminar e, no mérito, a procedência da ação, inclusive, com o deferimento de inversão do ônus da prova. A requerida, por sua vez, rebateu as alegações postas na petição inicial e postulou a improcedência da ação. 2.1. Da cobrança da comissão de corretagem O autor pediu a nulidade da cláusula 11.11 do contrato adesivo de compra e venda do Residencial Harmonia e a retificação dos instrumentos de compra e venda e respectivos registros públicos que tenham sido celebrados sem a inclusão dos valores despendidos pelos consumidores para pagamento do serviço de corretagem contratado pela fornecedora, e declaração, na mesma medida, que os efeitos da retificação operem para fins de rescisão contratual em relação aos três empreendimentos. O Ministério Público sustenta que a requerida transfere aos consumidores a responsabilidade por arcar com serviço de corretagem por ela contratado, sem a correspondente integração desse custo ao preço do produto adquirido. Alega que a prática configura venda casada e viola os deveres de informação e transparência. A requerida, por sua vez, defende a legalidade da cobrança, ao argumento que os consumidores tinham pleno conhecimento de que o valor pago como "sinal" se destinava à remuneração do serviço de corretagem, que a contratação da corretagem é mais transparente e vantajosa para o adquirente, e que o serviço de corretagem foi efetivamente prestado em favor dos adquirentes. Assim, a questão diz respeito à legalidade ou não da cobrança da comissão de corretagem pela requerida nos empreendimentos Residencial Maison Classic, Harmonia e Bonavita. E sobre essa questão, ou seja, possibilidade de cobrança de comissão e corretagem nos negócios jurídicos de compra e venda de imóvel, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.599.511/SP (Tema 938), fixou a seguinte tese: "Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem". Veja: “RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM ESTANDE DE VENDAS. CORRETAGEM. CLÁUSULA DE TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. VALIDADE. PREÇO TOTAL. DEVER DE INFORMAÇÃO. SERVIÇO DE ASSESSORIA TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI). ABUSIVIDADE DA COBRANÇA. I - TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 1.1. Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem. 1.2. Abusividade da cobrança pelo promitente-vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa de compra e venda de imóvel. II - CASO CONCRETO: 2.1. Improcedência do pedido de restituição da comissão de corretagem, tendo em vista a validade da cláusula prevista no contrato acerca da transferência desse encargo ao consumidor. Aplicação da tese 1.1. 2.2. Abusividade da cobrança por serviço de assessoria imobiliária, mantendo-se a procedência do pedido de restituição. Aplicação da tese 1.2. III - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. (REsp n. 1.599.511/SP, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 24/8/2016, DJe de 6/9/2016.).” (grifei). Aliás, a tese também foi reproduzida no REsp n. 1551951/SP, igualmente julgado em sede de recurso repetitivo, na mesma data que o anteriormente citado, ou seja, em 24.8.2016 (tema Repetitivo 960): “RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM ESTANDE DE VENDAS. CORRETAGEM. CLÁUSULA DE TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. ALEGAÇÃO DE ABUSIVIDADE. TEORIA DA ASSERÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA INCORPORADORA. VALIDADE DA CLÁUSULA. SERVIÇO DE ASSESSORIA TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI). COBRANÇA. DESCABIMENTO. ABUSIVIDADE. 1. TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 1.1. Legitimidade passiva 'ad causam' da incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para responder pela restituição ao consumidor dos valores pagos a título de comissão de corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, nas demandas em que se alega prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor. 2. CASO CONCRETO: 2.1. Aplicação da tese ao caso concreto, rejeitando-se a preliminar de ilegitimidade. 2.2. "Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem" (tese firmada no julgamento do REsp 1.599.511/SP). 2.3. "Abusividade da cobrança pelo promitente-vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa de compra e venda de imóvel" (tese firmada no julgamento do REsp 1.599.511/SP). 2.4. Improcedência do pedido de restituição da comissão de corretagem e procedência do pedido de restituição da SATI. 3. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, EM PARTE. (REsp n. 1.551.951/SP, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 24/8/2016, DJe de 6/9/2016.).” (grifei). No mesmo norte, veja a orientação lançada no REsp n. 1.601.149/RS, igualmente julgado em sede de recurso repetitivo, em 13/6/2018 (tema Repetitivo 960): “RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. DEVER DE INFORMAÇÃO. OBSERVÂNCIA. NECESSIDADE. 1. Para os fins do art. 1.040 do CPC/2015, fixa-se a seguinte tese: Ressalvada a denominada Faixa 1, em que não há intermediação imobiliária, é válida a cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda do Programa Minha Casa, Minha Vida, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem. 2. Solução do caso concreto: Considerando que as partes convencionaram que o valor correspondente à comissão de corretagem seria pago diretamente pelo proponente ao corretor, impõe-se julgar improcedente o pedido de repetição dos valores pagos a esse título. 3. Recurso especial provido. (REsp n. 1.601.149/RS, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, julgado em 13/6/2018, DJe de 15/8/2018.).” (grifei). Registra-se, que que, inclusive, conforme destacado pela requerida em suas alegações finais, o E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, ao dar provimento ao Agravo de Instrumento nº 1012144-40.2022.811.0000 por ela, requerida, interposto contra a decisão que inverteu o ônus da prova e também reconheceu que "o Superior Tribunal de Justiça, no que tange ao principal ponto da ação de base, tem entendimento de ser legal a transferência da obrigação pelo pagamento da comissão de corretagem, desde que observado o dever de informação". Veja o fragmento do citado acórdão: “Ademais, parece-me que a verossimilhança das alegações, também, não foi demonstrada, visto que o Superior Tribunal de Justiça, no que tange ao principal ponto da ação de base, tem entendimento de ser legal a transferência da obrigação pelo pagamento da comissão de corretagem, desde que observado o dever de informação. Veja-se: CIVIL – RECURSO ESPECIAL – RECURSO MANEJADO SOB AÉGIDE DO NCPC – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO – PLEITO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS A TÍTULO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM – LEGALIDADE DA TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO ADQUIRENTE DO IMÓVEL, DESDE QUE OBSERVADO O DEVER DE INFORMAÇÃO – LUCROS CESSANTES – MORA CONFIGURADA – TERMO FINAL – DATA DA EFETIVA ENTREGA DAS CHAVES – ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 568 DO STJ. 1. (...). 2. É válida a cláusula contratual que transfere ao promitente comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem" (tese firmada no julgamento do REsp 1.599.511/SP). (...). (AgInt no REsp n. 1.844.083/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 9/3/2020, DJe de 11/3/2020). (Negritei).” (grifo próprio). No mesmo sentido, veja a orientação do TJMG: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - CONTRATO CELEBRADO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.786/2018 - PREVISÃO DE MULTA DE 10% SOBRE O VALOR DO NEGÓCIO - APLICAÇÃO - LEGALIDADE - FRUIÇÃO DO IMÓVEL - LOTE VAGO - IMPOSSIBILIDADE - COMISSÃO DE CORRETAGEM - COBRANÇA ABUSIVA - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - SENTENÇA REORMADA EM PARTE - RECURSO PROVIDO EM PARTE. - Deve ser aplicada a Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018) se o contrato de promessa de compra e venda a ser rescindido foi firmado já sob a sua vigência - Faz jus a ré/promitente vendedora a restituição de 10% (dez por cento) sobre o valor total do contrato, na forma da cláusula penal validamente pactuada - Disposição em consonância com os parâmetros dispostos no art . 32-A da Lei nº 6.766/79 com a nova redação dada pela Lei do Distrato - Não se mostra cabível indenização pela fruição do bem, por se tratar de terreno vago - Por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.599.511/SP, submetido ao rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou o entendimento de que é válida a cláusula que transfere para o consumidor a obrigação de pagar a comissão de corretagem, exigindo-se apenas transparência nessa atribuição. Para tanto, deve a incorporadora informar ao consumidor, até o momento celebração do contrato de promessa de compra e venda, o preço total de aquisição da unidade imobiliária, especificando o valor da comissão de corretagem, ainda que esta venha a ser paga destacadamente - Inexistindo previsão no contrato quanto ao valor devido a título de comissão de corretagem, de forma destacada, sua cobrança se mostra abusiva - "Em caso de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel, a correção monetária das parcelas pagas, para efeitos de restituição, incide a partir de cada desembolso" (STJ, AgRg no REsp 1.222.042/RJ) - "Os juros moratórios, na hipótese de resolução do compromisso de compra e venda de imóvel por iniciativa dos promitentes compradores, devem incidir a partir da data do trânsito em julgado, posto que inexiste mora anterior do promitente vendedor" (STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1.133 .804/RN). (TJ-MG - AC: 10000210538476001 MG, Relator.: Mariangela Meyer, Data de Julgamento: 16/11/2021, Câmaras Cíveis / 10ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 19/11/2021).” (grifei). Logo, conforme é a orientação, em especial, a da Corte Superior, possível é a cobrança da comissão e corretagem, desde que haja transparência nesta atribuição. E a prova documental e oral, esta última produzida exclusivamente pelo autor, revelou que os consumidores foram devidamente informados sobre a cobrança da comissão de corretagem quando adquiriram suas unidades nos empreendimentos citados na petição inicial. Na instrução processual, há pedido do autor (id. 91452307), oram ouvidos três adquirentes de unidades (na condição de informantes) e um corretor de imóveis (como testemunha). A requerida pediu o julgamento antecipado da lide (id. 123087447). No id. 177719661 consta o Termo de oitiva de Flavio Ramos Pedroza e no id. 183766047 consta o termo de oitiva de José Afonso Botura Portocarrero, Monica Oliveira e Silva Portocarrero e de Alex Spineli Pimenta. Pois bem. Os adquirentes Flávio Ramos Pedroza, José Afonso Botura Portocarrero e Monica Oliveira e Silva Portocarrero, embora tenham sido ouvidos como informantes em razão do interesse na causa, confirmaram que foram atendidos por corretores de imóveis e que assinaram documentos separados para o pagamento da comissão de corretagem. Flavio Ramos Pedroza, que foi um dos adquirentes de imóvel no residencial Bonavita e que o vendeu ainda durante o processo de aquisição, em que pese algumas contradições, aliás, compreensíveis em razão do tempo decorrido, confirmou que foi atendido por um corretor de imóveis, que lhe prestou todas as informações necessárias à aquisição do apartamento, e que não assina documentos sem lê-los, bem como ainda afirmou que o valor do imóvel já constava o valor da corretagem. José Afonso Botura Portocarrero informou ter adquirido junto com sua esposa Monica Oliveira e Silva Portocarrero um apartamento no Maison Classic. Referido informante não soube dizer sobre as particularidades do negócio jurídico. Apenas relatou que a compra foi feita no escritório da empresa Brookfield, no Bosque da Saúde. “Tinha Eliane que nos atendia la”. Não lembra se Eliane apresentava como funcionaria da Brookfield. Quanto a Alex Spineli Pimenta acha que participou também, mas não lembra. Teve mais contato com Eliane, mas Alex estava também. Não recorda da forma do pagamento. Fazia pagamento em cheques. Mas não recorda dos detalhes. Desistiram da aquisição. Acha que sua esposa Monica até entrou na Justiça. Não lembra quem negociou as condições e nem quem apresentou o empreendimento. Já a esposa de José Afonso Botura Portocarrero, ou seja, a Sra. Mônica Portocarrero afirmou: “a gente fez vários cheques e alguns cheques foi dado para a corretagem, separado. Para a corretagem e para a Brookfield.”. “Foram cheques diferentes”. “Cheque para a Brookfield e cheques para a corretora”. Que quando foram comprar o imóvel, o Alex e a esposa, prestaram as informações sobre o imóvel, explicaram como era o empreendimento. Ao responder a pergunta do autor sobre quando foi comprar, pagar, acertar o negócio do apartamento, se lhe foi esclarecido sobre a cobrança de corretagem, Mônica Portocarrero afirmou: “é. A gente deu cheque separado. Nos demos o cheque separado. O que nos falaram é que esse valor da corretagem estava separado, porque era como se fosse pagar para a Brookfield e a Brookfield fosse pagar par ao corretor. “Eu paguei separado. A gente pagou separado”. Alex Spineli Pimenta, testemunha compromissada, informou que, na época, “trabalhava em uma das imobiliárias que revendia os produtos da Brookfield, inclusive, nos condomínios citados nesta ação, mas que tinham outras imobiliárias, como a Urbana e umas outras, cujos nomes não lembrava, que também negociavam. Relatou que recebia uma tabela do incorporador e negociava os valores com os compradores e que nas negociações tinha previsão de cobrança de comissão de corretagem. Afirmou que as imobiliárias recebiam um percentual, geralmente de 4% a título de comissão de corretagem e que por vezes se fazia alguma campanha esporádica onde aumentavam um pouco, bem assim, que as vezes dava um bônus quando tinha uma meta para ser atingida, mas na prática era de 4%. Pelo que lembra o valor era desmembrado. Tinha imobiliária que era credenciada para fazer a negociação. Não era possível comprar sem pagar a comissão de corretagem. A comissão era pelos trabalhos das imobiliárias. Era informado aos clientes que existia o valor do imóvel e o valor da... (inaudível, tanto é que os clientes recebiam recibos e nota fiscal sobre os valores que pagavam. Nem ele e nem colega de profissão tiveram que devolver algum valor de corretagem. Nunca fez devolução da parte que lhe coube”. Mencionada testemunha informou, categoricamente, que havia um esclarecimento na negociação e da composição do valor que integrava o preço das unidades. Informavam que um valor era do preço da unidade e que outro valor era da comissão de e corretagem. Aliás, a prova documental corrobora os depoimentos, porquanto conforme se extrai daqueles juntados aos autos, notadamente no id. 56199575, pgs. 36/ e 38, que antes da celebração do contrato de compra e venda, os consumidores adquirentes assinavam um documento denominado "pedido de aprovação de crédito com reserva de unidade", no qual estava expressamente consignado que o serviço de corretagem se exauria com a celebração do compromisso de compra e venda. Referido documento continha a seguinte informação: "os adquirentes declaram ter conhecimento de que a comercialização do imóvel é realizada por empresa de venda de imóveis e seus consultores imobiliários, devidamente inscritos no CRECI – Conselho Regional de Corretores de Imóveis, razão pela qual concordam que na hipótese de ser assinado o contrato de aquisição do imóvel efetuarão o pagamento da comissão de intermediação devida em percentual do preço do imóvel, não integrante do preço de aquisição, na forma discriminada no quadro denominado 'serviço de intermediação e forma de pagamento'". Além disso, após o pagamento da taxa de corretagem, o corretor emitia um recibo com a descrição exata do serviço que estava sendo pago, conforme se extrai dos documentos acostados aos autos, notadamente no id. 56199578, p. 14. Diante desse conjunto probatório, verifica-se que os consumidores eram devidamente informados sobre a cobrança da comissão de corretagem antes da celebração do contrato de compra e venda, tendo inclusive assinado documentos específicos para esse fim e recebido recibos discriminando o serviço prestado. Quanto à alegação do Ministério Público de que o serviço de corretagem não foi prestado em benefício dos consumidores, também não merece prosperar. Os depoimentos colhidos em audiência demonstram que os corretores prestavam informações essenciais sobre as características dos empreendimentos, condições de pagamento, requisitos para financiamento, entre outros detalhes relevantes para a tomada de decisão pelos consumidores. Portanto, resta comprovado que o serviço de corretagem foi efetivamente prestado em benefício dos consumidores, aproximando as partes e fornecendo informações essenciais para a concretização do negócio. Assim, considerando que (i) a transferência da obrigação de pagamento da comissão de corretagem ao consumidor é válida, conforme entendimento do STJ no Tema 938; (ii) os consumidores foram devidamente informados sobre a cobrança da comissão de corretagem; e (iii) o serviço de corretagem foi efetivamente prestado em benefício dos consumidores, não há que se falar em nulidade da cláusula que prevê o pagamento da comissão de corretagem pelos consumidores. 2.2. Do Método Comercial Coercitivo O Ministério Público alega que os consumidores eram condicionados ao pagamento de "sinal" destinado à remuneração dos "negociantes" eleitos pela requerida como forma de aquisição do imóvel, o que configuraria método comercial coercitivo e venda casada. A requerida, por sua vez, sustenta jamais ter condicionado a aquisição dos imóveis à contratação do serviço de corretagem, e que o serviço de corretagem, contratado por livre decisão dos adquirentes, também foi efetivamente prestado em favor dos consumidores. A prova testemunhal produzida não corroborou a tese do Ministério Público. O corretor Alex Spinelli Pimenta afirmou que se apresentava aos clientes como corretor da imobiliária e não como representante da Brookfield. Segundo ele, os corretores prestavam informações sobre o produto, mostravam o decorado, tiravam dúvidas, indicavam onde era o terreno e onde estava a obra, e explicavam o material publicitário. Inclusive, quando questionado se considerava que as informações prestadas eram úteis para que os compradores tomassem a decisão de comprar ou não o imóvel, o corretor respondeu afirmativamente: "Sim, sim. É com base nessas informações que ele começa, que ele tira todas as dúvidas. Mas é tudo colocado de uma maneira bem explícita para ele, porque ele só assina a proposta quando ele já não tem mais dúvida, ele já está com o interesse formado". Os adquirentes ouvidos como informantes também não relataram condicionamento da aquisição das unidades à contratação de corretor. Inclusive, confirmaram que os corretores, por eles contratados, prestaram informações sobre os imóveis. A informante Mônica Portocarrero afirmou: "Sim, nos mostraram, nos mostraram os panfletos e tudo mais, tinham albunzinhos. Pedíamos, inclusive, para ver. Como meu marido é arquiteto, ele pediu se a gente podia ir ver o apartamento, a construção, como que estava". Não há nos autos elementos que comprovem que a contratação do serviço de corretagem era condição sine qua non para a aquisição dos imóveis, ou que os consumidores foram impedidos de adquirir os imóveis diretamente da construtora, sem a intermediação de corretores. Portanto, não restou demonstrada a prática de método comercial coercitivo ou venda casada. 2.3. Do IPTU e das Despesas de Condomínio antes da Entrega do Imóvel O autor alegou que “nos instrumentos padrões de compra e venda firmados com os consumidores dos Residenciais Harmonia, Maison Classic e Bonavita a existência de cláusulas que lhes transferem a responsabilidade por tributos e taxas incidentes sobre o imóvel e despesas de condomínio, independentemente do seu efetivo recebimento” e defendeu, assim, a nulidade das cláusulas que imponham a arguida obrigação. No contrato de compra e venda do condomínio Harmonia, as cláusulas: “8.3. Correrá por conta do(s) ADQUIRENTE(S), a partir da data de expedição do Habite-se e da Assembleia de Instalação do Condomínio o pagamento da respectiva quota parte do IPTU em relação ao IMÓVEL, bem como demais despesas de condomínio que venham a ser estipuladas em assembleia, independentemente do efetivo recebimento da unidade imobiliária contratada.” e “11.8. O condomínio considerar-se-á parcialmente constituído para todos os efeitos jurídicos e legais na data da expedição do Habite-se em relação à primeira torre concluída do EMPREENDIMENTO, a partir de quando o(s) ADQUIRENTE(S), ainda que somente mais tarde venham a ocupar suas unidades autônomas começarão a concorrer para a satisfação das despesas ordinárias e extraordinárias do Condomínio, sendo que serão Condomínio considerado integralmente constituído e instalado na data da expedição do "Habite-se" em relação à última torre do empreendimento a ser construída e entregue" (sie: fls. 15/16 — MP; g.n.)”. No contrato de compra e venda do condomínio Bonavita, as cláusulas: “5.7. Correra por conta do(s) ADQUIRENTE(S), a partir da data de expedição do Habite-se e da Assembleia de Instalação do Condomínio o pagamento da quota parte do IPTU em relação ao IMÓVEL independentemente do efetivo recebimento da unidade imobiliária contratada” e “5.8. Correrão, ainda, por conta do(s) ADQUIRENTE(S), independentemente do efetivo recebimento da unidade imobiliária contratada, todas as despesas condomínio que forem estipuladas pela Assembleia a partir de sua instalação, mesmo que ainda não tenha recebido as chaves do IMÓVEL e ainda como promitente(s) comprador(es)”, bem como “12.19. O condomínio considerar-se-á parcialmente constituído para todos os efeitos jurídicos e legais na data da expedição do "Habite-se" Parcial em relação à primeira torre do empreendimento, a partir de quando os Condôminos ainda que somente mais tarde venham a ocupar suas unidades autônomas C0111440480 a concorrer para a satisfação das despesas ordinárias e extraordinárias do Condomínio, sendo que será o Condomínio considerado integralmente constituído e instalado na data da expedição do "Habite-se" Parcial em relação à última torre do empreendimento a ser construída e entregue" (sie: fls. 289 e 303— MP; g.n.)”. No contrato de compra e venda do Residencial Maison Classic, as cláusulas: "5,7. Correrá por conta do(s) ADQUIRENTE(S), a partir da data de expedição do Habite-se e da Assembleia de Instalação do Condomínio o pagamento da quota parte do IPTU em relação ao IMÓVEL, independentemente do efetivo recebimento da unidade imobiliária contratada.” e “5.8. Correrão, ainda, por conta do(s) ADQUIRENTE(S), irlependentemente do efetivo recebimento da unidade imobiliária contratada, todas as despesas de condomínio que forem estipuladas pela Assembleia a partir de sua instalação, mesmo que ainda não tenha recebido as chaves do IMÓVEL e ainda como promitente(s) comprador(es)" (sio: fi. 475-verso — MP; g.n.).”. O autor questiona as cláusulas dos contratos de compra e venda que transferem aos consumidores a responsabilidade por tributos e taxas incidentes sobre o imóvel e despesas de condomínio, independentemente do seu efetivo recebimento. Já a requerida defende a validade das cláusulas, ao argumento de que as despesas condominiais e tributárias somente são repassadas ao adquirente quando da expedição do "Habite-se" e da instauração da Assembleia Geral de Condomínio, bem assim, que a ressalva feita em relação ao recebimento da unidade imobiliária alcança exclusivamente os casos em que o recebimento do bem é obstado não por ato da incorporadora, mas sim pela inadimplência do adquirente. E na análise das cláusulas contratuais questionadas, verifica-se que elas realmente preveem que as despesas de condomínio e IPTU serão de responsabilidade do adquirente "a partir da data de expedição do Habite-se e da Assembleia de Instalação do Condomínio", independentemente do efetivo recebimento da unidade imobiliária. Todavia, a recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que somente a partir da efetiva posse do imóvel, com as entregas das chaves, é que o adquirente passa a ter obrigação de pagar as despesas condominiais e, inclusive, o IPTU, sendo, antes disso, da responsabilidade da vendedora. Veja: “AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. CLÁUSULA PENAL. VARIAÇÃO ENTRE 10% (DEZ POR CENTO) E 20% (VINTE POR CENTO). TRIBUTOS INCIDENTES SOBRE A PROPRIEDADE DO IMÓVEL. AUSÊNCIA DE IMISSÃO NA POSSE. RESPONSABILIDADE DO PROMITENTE-VENDEDOR. 1. É admitida a flutuação do percentual da retenção pelo vendedor entre 10% (dez por cento) a 25% (vinte e cinco por cento) do total da quantia paga nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por iniciativa do comprador. Precedentes. 2. SOMENTE A PARTIR DA EFETIVA POSSE DO IMÓVEL, COM A ENTREGA DAS CHAVES, PASSA O ADQUIRENTE A TER A OBRIGAÇÃO DE PAGAR AS DESPESAS CONDOMINIAIS E IPTU, SENDO RESPONSABILIDADE DA VENDEDORA ATÉ A IMISSÃO NA POSSE. 3. Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (AREsp n. 2.829.230/MT, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 12/5/2025, DJEN de 19/5/2025.).” (grifei). Ainda o STJ: “DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO. ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. DESPESAS CONDOMINIAIS E IPTU. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo interno interposto contra decisão que negou provimento a recurso especial, discutindo a responsabilidade pelo atraso na entrega das chaves de um imóvel e a definição de quem deve arcar com as despesas condominiais e de IPTU durante o período anterior à imissão da compradora na posse do bem. 2. As agravantes alegam que a demora na entrega das chaves é imputável à agravada, devido à natureza burocrática do pagamento por carta de consórcio. A Corte estadual concluiu que a documentação apresentada contraria essa alegação. II. Questão em discussão 3. A questão em discussão consiste em saber se a responsabilidade pelas despesas condominiais e de IPTU antes da imissão na posse do imóvel pode ser atribuída à compradora, considerando a alegação de mora por parte dela. 4. A questão também envolve a análise da aplicação dos dispositivos legais invocados pelas agravantes, que dependeria do reconhecimento de uma premissa fática - a mora da compradora -, afastada pelo Tribunal a quo. III. Razões de decidir 5. A decisão monocrática foi mantida, pois os argumentos das agravantes não foram suficientes para infirmar os fundamentos apresentados, que indicam que o atraso na entrega das chaves não ocorreu por culpa da compradora. 6. A RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS TAXAS CONDOMINIAIS E DO IPTU É DO ADQUIRENTE A PARTIR DA EFETIVA POSSE DO IMÓVEL, QUE SE DÁ COM A ENTREGA DAS CHAVES. A transferência desses encargos antes da imissão na posse é considerada abusiva, salvo culpa exclusiva do comprador, o que foi afastado no caso. 7. A pretensão das agravantes de reverter a conclusão demandaria o reexame do acervo fático-probatório, vedado em recurso especial, conforme Súmula n. 7 do STJ. IV. Dispositivo e tese 8. Agravo interno desprovido. Tese de julgamento: "1. A RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS TAXAS CONDOMINIAIS E DO IPTU É DO ADQUIRENTE A PARTIR DA EFETIVA POSSE DO IMÓVEL. 2. A transferência desses encargos ao comprador antes da imissão na posse é considerada abusiva, salvo culpa exclusiva do comprador, o que não foi demonstrado no caso. 3. A pretensão das agravantes de reverter a conclusão relativa à culpa pela demora na entrega das chaves demandaria o reexame do acervo fático-probatório, vedado em recurso especial, conforme Súmula n. 7 do STJ". Dispositivos relevantes citados: Código Civil, arts. 421, 422, 476, 1.345, 1.336.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.441.849/RN, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 2.9.2024; STJ, AgInt no AgInt no AREsp n. 2.511.460/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 12.2.2025. (AgInt no AREsp n. 2.645.630/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 11/6/2025, DJEN de 18/6/2025.).” (grifei). Também: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ALEGAÇÃO GENÉRICA. SÚMULA Nº 284/STF. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 282/STF. REVISÃO DAS PREMISSAS ESTABELECIDAS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS N.º 5 E 7 DO STJ. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA Nº 284/STF. DESPESAS CONDOMINIAIS E IPTU. VENDEDORA. RESPONSABILIDADE. 1. É deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegação de ofensa ao art. 1.022 do CPC se faz de forma genérica, sem a demonstração exata dos pontos pelos quais o acórdão tornou-se omisso, contraditório ou obscuro. Aplica-se, por analogia, o óbice da Súmula nº 284/ STF ao caso concreto. 2. Ausente o prequestionamento, até mesmo de modo implícito, do artigo 141 do Código de Processo Civil apontado como violado no recurso especial, incide, por analogia, o disposto na Súmula nº 282 do Supremo Tribunal Federal. 3. Para infirmar as conclusões a que chegou o acórdão recorrido, no sentido da existência de exclusiva responsabilidade da recorrente pelo atraso na entrega dos imóveis, seria imprescindível o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos e a interpretação de cláusulas contratuais, o que é vedado nesta instância especial, conforme dispõem as Súmulas 5 e 7 do STJ. 4. No caso, inviável a análise da pretensão recursal relacionada com o recálculo do saldo devedor, pois a recorrente não indicou os dispositivos legais que teriam sido violados, a inviabilizar a compreensão da controvérsia posta nos autos. Inteligência da Súmula nº 284/STF. 5. SOMENTE A PARTIR DA EFETIVA POSSE DO IMÓVEL, COM A ENTREGA DAS CHAVES, PASSA O ADQUIRENTE A TER A OBRIGAÇÃO DE PAGAR AS DESPESAS CONDOMINIAIS E IPTU, SENDO RESPONSABILIDADE DA VENDEDORA ATÉ A IMISSÃO NA POSSE. PRECEDENTES. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (REsp n. 1.883.864/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 28/4/2025, DJEN de 6/5/2025.).” (grifei). No mesmo sentido veja a jurisprudência do TJDFT: “APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATOS DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA OU EM CONSTRUÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA SEM FUNDAMENTAÇÃO. REJEIÇÃO. CLÁUSULAS CONTRATUAIS. REPASSE DE CUSTOS AO CONSUMIDOR ANTES DA ENTREGA DAS CHAVES E IMISSÃO NA POSSE. ABUSIVIDADE. RESILIÇÃO POR CULPA DO PROMITENTE COMPRADOR. RETENÇÃO DE VALORES. PARÂMETRO. 25% (VINTE E CINCO POR CENTO). ATRASO NA ENTREGA DOS IMÓVEIS. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. INEXISTÊNCIA. VENDA AD CORPUS. LEGALIDADE. PUBLICIDADE SEM CONTRAPRESTAÇÃO. NULIDADE PARCIAL. GARANTIA HIPOTECÁRIA. NULIDADE. AUSÊNCIA. JUROS DE OBRA. RESTITUIÇÃO SIMPLES AO COMPRADOR REFERENTE AO PERÍODO DE ATRASO. LUCROS CESSANTES. ADMISSIBILIDADE. HONORÁRIOS CONTRATUAIS. COBRANÇA DA PARTE SUCUMBENTE. DESCABIMENTO. MULTA PELO DESCUMPRIMENTO. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS COLETIVOS. INOCORRÊNCIA. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. O Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos. O órgão ministerial atua em defesa dos consumidores que possuem relação contratual com as construtoras, responsáveis pela edificação de diversos empreendimentos imobiliários no Distrito Federal, o que confere interesse social ao feito. Preliminar de ilegitimidade ativa rejeitada. 2. O juiz é o destinatário da prova, logo sua produção tem por escopo auxiliá-lo na formação de seu convencimento (artigo 371 do Código de Processo Civil). E entendendo que os elementos de convencimento carreados são suficientes e possibilitam o julgamento da causa, deverá indeferir aquelas provas que reputar inúteis ou protelatórias (par. único, art. 370, CPC). Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. 3. Não se considera sem fundamentação a sentença que declina com suficiência e clareza as razões de decidir, indicando os motivos do convencimento de acordo com a prova dos autos. Rejeito a preliminar de cassação da sentença por falta de fundamentação. 4. O adquirente de unidade autônoma somente tem o dever de pagar as taxas condominiais, despesas e impostos respectivos depois da efetiva entrega do bem. Até lá, as taxas de condomínio e os impostos são de responsabilidade da incorporadora ou titular do parcelamento urbano, assim como os custos com ligação definitiva dos serviços de água, luz e esgoto. No entanto, ao comprador caberá as despesas com escrituração do contrato de compra e venda (art. 490, do Código Civil). 5. Não esteira da jurisprudência pacificada por Corte Superior, não é cabível a cobrança do réu sucumbente os honorários contratuais pela parte vencedora. Portanto, afigura abusividade a cláusula que prevê a possibilidade de cobrança dos honorários e em razão da necessidade de ajuizamento de pretensão judicial. 6. Ocorrendo rescisão da promessa de compra e venda de imóvel, por culpa do promitente comprador, as partes devem retornar ao status quo ante, com a devolução pela vendedora de todos os valores recebidos pelo imóvel, sob pena de incorrer em enriquecimento sem causa, sem prejuízo de cobrança ou retenção da multa, quando prevista. A retenção de até 25% (vinte e cinco por cento), conforme entendimento do STJ, já serve ao propósito de indenizar a incorporadora. 7. O afeiçoamento da construção à legislação vigente, determinadas pelos órgãos responsáveis por sua inspeção, segurança e prestadoras de serviços públicos, não pode ser elevado à condição de caso fortuito ou força maior, mas situação própria e específica relacionada à própria atividade econômica. 8. A previsão contratual de venda ad corpus está conforme a lei e, em tese, não coloca o consumidor em desvantagem exagerada a ponto de provocar a declaração de nulidade, até porque a própria legislação autoriza o comprador a reclamar, se for o caso, e provar que “em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio.” (art. 500, §1º, do CC). 9. A cláusula que submete os compradores a suportarem, ad eternum, a publicidade gratuita da incorporadora na área comum condomínio, viola o direito do consumidor. A expressão “em caráter definitivo” e “em local escolhido a seu critério” compromete o equilíbrio contratual. É uma imposição unilateral desproporcional. Cabível a limitação temporal e para fixar em 10 (dez anos) o prazo máximo para a permanência da publicidade, até porque suficientes para que haja a venda de todas as unidades pela vendedora do empreendimento. Porém, é imprescindível que sejam observadas a convenção de condomínio, o regimento interno, a segurança dos moradores e do empreendimento quanto à escolha do local de instalação da propaganda. 10. Nos casos de incorporação imobiliária, porque necessária a obtenção de financiamento de grande vulto, a lei permite a instituição de garantia, que pode recair sobre o empreendimento. De igual modo, também é possível que após o financiamento, a prestação seja arrecadada pelo financiador e não mais pela incorporadora, razão pela qual não se verifica qualquer ilegalidade na oferta do próprio empreendimento em garantia ao agente financeiro. A jurisprudência já fixou interpretação razoável com relação a esse gravame, assim como acerca de sua subsistência ou não após a quitação do preço, a teor da Súmula 308, do STJ, e as disposições da Lei 4.864/65. 11. Há abusividade na cláusula-mandato no ponto em que se outorgam poderes ad judicia e inclusive dos poderes especiais, como receber citações e notificações judiciais, porque, não só representam desequilíbrio na relação contratual em prejuízo do consumidor, como não guardaram correlação lógica com a natureza do negócio jurídico principal. Há nulidade também na parte em que se outorga poderes para, em nome dos promitentes compradores, a promitente vendedora possa avalizar e endossar títulos de crédito. 12. Os juros de obra correspondem à remuneração de capital do agente financeiro, sem amortização do principal, no período de obra. Este ônus é suportado pelo adquirente na fase de construção da unidade imobiliária e até a averbação do respectivo alvará de conclusão. A mora no cumprimento do contrato, mais precisamente na entrega do imóvel, assegura ao adquirente o direito à indenização pelos prejuízos suportados (art. 43, Lei no. 4.591/64 e art. 395, CC). Os danos materiais são equivalentes às importâncias desembolsadas a título de juros de obra além do prazo previsto e necessário para a conclusão da obra e averbação da respectiva carta de habite-se. 13. A jurisprudência é pacífica no sentido de que o atraso na entrega da unidade ou na conclusão da obra acarreta prejuízo ao adquirente, pela impossibilidade de usar, usufruir, gozar e até dela dispor, considerada a natureza do bem e os frutos que são passíveis de gerar (STJ/ REsp 331.496/MG, EDcl no REsp 151.175/DF, REsp 109.821/SP, AgRg no REsp 1202506/RJ e AgRg no Ag 1036023/RJ). Daí o entendimento consolidado do dano ser presumido e passível de ser liquidado utilizando-se o valor locativo, segundo as regras do mercado imobiliário. 14. A partir do NCPC, estabeleceu no art. 537, a possibilidade de modificação do valor ou periodicidade das astreintes ou até excluí-la, mas no que toca às multas vincendas. De igual modo, o Superior Tribunal de Justiça, após diversas oscilações em sua jurisprudência, tem admitido a revisão da multa cominatória, quando o critério de sua fixação se demonstrar desproporcional. 15. Os eventos que permitem a condenação em indenização por danos morais coletivos devem atingir direitos sensíveis à sociedade, de natureza difusa ou coletiva, ou seja, aqueles que ultrapassam a esfera individual ou um grupo individual de pessoas (interesse individual homogêneo). Jurisprudência. Embora se reconheça a gravidade dos fatos e sua reiteração por algumas incorporadoras, a justa e plena reparação no plano individual atende suficientemente o restabelecimento da ordem social e jurídica violada. Até porque, muitas das violações sequer ultrapassariam os efeitos do mero inadimplemento. 16. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. (Acórdão 1331223, 0711429-55.2017.8.07.0001, Relator(a): LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, 4ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 13/04/2021, publicado no DJe: 26/04/2021.).” (grtifei). Portanto, as cláusulas que transferem aos consumidores a responsabilidade pelo pagamento de IPTU e despesas de condomínio independentemente do efetivo recebimento do imóvel são mesmo abusivas, na medida em que contrariam a jurisprudência consolidada do STJ e devem, assim, ser declaradas nulas. 2.4. Da Cláusula de Perda das Benfeitorias Úteis e Necessárias O autor alegou a indevida existência de cláusulas que estipulam perda das benfeitorias úteis e necessárias feitas pelos adquirentes no caso de ocorrer rescisão contratual. O autor relatou que as estipulação estão na “cláusula 5.3, do contrato relativo ao Residencial Harmonia (fl. 11 — MP), e na clausula 7.3, dos contrato relativos ao Residencial Bonavita (fls. 291/292 — MP) e Maison Classic (fls. 476/477)” e apresentam o seguinte teor: “... ficando bem claro que o não atendimento do(s) ADQUIRENTE(S) à referida interpelação determinará, de pleno direito e a juízo exclusivo da VENDEDORA: (a) a rescisão imediata do presente compromisso revertendo à VENDEDORA a posse do IMÓVEL com todas as suas acessões e benfeitorias úteis e necessárias, bem como as voluptuárias que não possam ser retiradas do local sem danificar ou descaracterizar o IMÓVEL sem que possa(m) o(s) ADOUIRENTE(S1 invoca:item) o direito de indenização ou retenção, a qualquer título ou pretexto..."(g.n)”. O Ministério Público questiona, assim, as referidas cláusulas dos contratos que determinam a perda das benfeitorias úteis e necessárias introduzidas no imóvel pelos consumidores, no caso de rescisão contratual. Já a requerida defende a validade das cláusulas, ao argumento que a Lei nº 6.766/79, invocada pelo Ministério Público, é inaplicável ao caso concreto, e que as cláusulas foram redigidas em linguagem clara e transparente. Destaca-se que a relação jurídica estabelecida entre as partes está submetida às normas do Código de Defesa do Consumidor, notadamente por tratar de típico contrato de adesão firmado entre incorporadora imobiliária e consumidor adquirente. Assim, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, conforme prevê o art. 47 do CDC. E eventuais cláusulas que estabeleçam obrigações desproporcionais ou coloquem o consumidor em desvantagem exagerada devem ser consideradas abusivas, nos termos do art. 51 do mesmo diploma legal. O citado art. 51, XVI, do Código de Defesa do Consumidor considera nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que "possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias". Por sua vez, o art. 34 da Lei nº 6.766/79 dispõe que "Em qualquer caso de rescisão por inadimplemento do adquirente, as benfeitorias necessárias ou úteis por ele levadas a efeito no imóvel deverão ser indenizadas, sendo de nenhum efeito qualquer disposição contratual em contrário". Embora a Lei nº 6.766/79 trate especificamente do parcelamento do solo urbano, o princípio nela contido, de proteção ao adquirente quanto às benfeitorias necessárias e úteis, é aplicável por analogia aos contratos de compra e venda de unidades autônomas em condomínios edilícios, em consonância, inclusive, com o disposto no art. 51, XVI, do CDC. Portanto, as cláusulas que determinam a perda das benfeitorias úteis e necessárias introduzidas no imóvel pelos consumidores, no caso de rescisão contratual, são abusivas e devem ser declaradas nulas. Neste sentido veja a recente orientação da Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça deste Estado: “DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. INADIMPLEMENTO DO PROMITENTE COMPRADOR. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS. TAXA DE FRUIÇÃO. CONTRATO CELEBRADO ANTES DA LEI N. 13.786/2018. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que, em Ação Rescisória de Compromisso de Venda e Compra c/c Reintegração de Posse, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para declarar rescindido o instrumento pactuado entre os litigantes, por culpa da ré, determinando o retorno das partes ao status quo ante, devendo o direito de retenção recair sobre 20% (vinte por cento) dos valores pagos, com a liberação do restante à requerida, bem como determinar a reintegração de posse da autora no imóvel objeto da lide, resguardando o direito da demandada à indenização pelas benfeitorias realizadas, cujo valor deve ser apurado em liquidação de sentença. A apelante pleiteia que seja afastada a indenização por benfeitorias e fixada uma taxa de fruição (aluguel) pelo uso do imóvel. De forma subsidiária, almeja que o ressarcimento se limite às benfeitorias tidas como necessárias. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em verificar se: (i) é devida indenização por benfeitorias realizadas pelo comprador inadimplente; e (ii) é cabível a fixação de taxa de fruição pelo uso do imóvel, nos termos do contrato celebrado entre as partes. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A relação jurídica estabelecida entre as partes está submetida às normas do Código de Defesa do Consumidor, devendo as cláusulas contratuais serem interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, conforme art. 47 do CDC. 4. O direito à indenização por benfeitorias foi corretamente reconhecido na sentença, com fundamento no art. 34 da Lei n. 6.766/79, que estabelece expressamente que “em qualquer caso de rescisão por inadimplemento do adquirente, as benfeitorias necessárias ou úteis por ele levadas a efeito no imóvel deverão ser indenizadas, sendo de nenhum efeito qualquer disposição contratual em contrário”. 5. Não houve comprovação pela apelante de que as melhorias foram realizadas em desconformidade com as normas legais ou com o contrato, ônus que lhe incumbia nos termos do art. 373, I, do CPC, sendo vedado o enriquecimento sem causa do vendedor. 6. A taxa de fruição não pode ser exigida, por ausência de cláusula expressa nesse sentido, e por ser o contrato anterior à vigência da Lei n. 13.786/2018, em respeito ao ato jurídico perfeito, conforme art. 6º da LINDB. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso conhecido e desprovido. Teses de julgamento: “1. É devida a indenização pelas benfeitorias necessárias ou úteis realizadas pelo promitente comprador em contrato de compra e venda de lote urbano, ainda que inadimplente, nos termos do art. 34 da Lei n. 6.766/79, recaindo sobre o promitente vendedor o ônus de comprovar eventual ilicitude ou desconformidade com a legislação que afastaria tal direito. 2. É incabível a cobrança de taxa de fruição por ocupação do imóvel quando não expressamente pactuada em contrato celebrado antes da vigência da Lei n. 13.786/2018, em observância ao princípio do ato jurídico perfeito.” Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 47 e 51; CPC, art. 373, I; Lei n. 6.766/79, art. 34; Lei n. 13.786/2018, art. 67-A, III; Decreto-Lei n. 4.657/42, art. 6º. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, EAREsp n. 1.847.842/PR; TJMT, N.U 1001921-51.2020.8.11.0015. (N.U 1023762-58.2019.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/04/2025, Publicado no DJE 09/04/2025).” (grifei). No mesmo norte o Tribunal de Justiça de São Paulo: “APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS C.C. PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. Sentença de improcedência. Inconformismo do autor. Descabimento. Preliminar afastada. Cerceamento de defesa não configurado. Provas dos autos suficientes para a formação da convicção do Juízo. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Nulidade da cláusula de renúncia aos direitos de indenização e retenção por benfeitorias. Necessidade de ressarcimento das benfeitorias realizadas no imóvel. Vedação ao enriquecimento sem causa. RECURSO PROVIDO. (TJ-SP - AC: 10028158620208260604 Sumaré, Relator.: Lia Porto, Data de Julgamento: 10/11/2023, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 10/11/2023).” (grifei). Aliás, inclusive, o direito ao ressarcimento de benfeitorias ainda encontra amparo na previsão do art. 1.219 e art. 1.220. ambos do Código Civil, que dispõem: “Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis. Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.” Sobre o assunto: “EMENTA: É entendimento do STJ que, sendo possível identificar a existência da pretensão reconvencional na peça de contestação e não havendo prejuízo ao contraditório, estará configurada mera irregularidade formal que é insuficiente para impedir o exame da pretensão. O possuidor que introduz benfeitorias tem, pois, nos termos dos arts. 1.219 e 1 .220 do CC, o direito de levantar as benfeitorias ou de ser indenizado, conforme sua natureza e de acordo a presença ou não de boa-fé, e até mesmo, eventualmente, o direito de reter o bem principal até que o valor correspondente às vantagens que a ele foram acrescidas e não podem ser levantadas lhe seja restituído. O instituto da cláusula penal compensatória detém como característica prefixar os danos decorrentes do inadimplemento total, compensando, assim, os danos. Já as perdas e danos objetivam ressarcir pelos danos materiais em razão da mora, com natureza também punitiva. Logo, a cumulação de multa compensatória e perdas e danos implica bis in idem . Recurso desprovido. APELAÇÃO CÍVEL, Processo nº 7000480-59.2022.822 .0013, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, 2ª Câmara Cível, Relator (a) do Acórdão: Des. José Torres Ferreira, Data de julgamento: 20/05/2024. (TJ-RO - APELAÇÃO CÍVEL: 7000480-59.2022.8 .22.0013, Relator.: Des. José Torres Ferreira, Data de Julgamento: 20/05/2024).” (grifei). Logo, é caso de reconhecer a invalidade das cláusulas que estipulam perda das benfeitorias úteis e necessárias feitas pelos adquirentes no caso de ocorrer rescisão contratual. 2.5. Da Cláusula-Mandato No contrato de compra e venda do condomínio Harmonia (sic fls. 09 e 13 — MP), as cláusulas: "2.3. Para os fins do disposto acima [2.2], o(s) ADQUIRENTE(S), como condição essencial do presente Contrato, constitui(em) e nomeia(m) sua bastante procuradora a VENDEDORA, de forma irevogável e irretratável, na forma prevista no artigo 684 do Código Civil, â qual outorga(m) os poderes para em nome dele(s) atuar junto ao agente financiador, podendo assinar ou aditar o contrato de financiamento da obra com garantia hipotecária, convencionando cláusulas e condições, especialmente constituindo hipoteca e/ou alienação fiduciária sobre a fração ideal do TERRENO e suas acessões, podendo ainda representar o(s) ADQUIRENTE(S) junto ao Oficio de Registro de Imóveis, praticando todos os atos que se fizerem necessários ao cumprimento do presente mandato, inclusive substabelecer ou assinar termo aditivo a este Contrato. 6.2.1. Para os fins mencionados acima [6.2] o(s) ADQUIRENTE(S) nomeia(m) e constitui(em) sua bastante procuradora a VENDEDORA com poderes para representa-10(s) junto a repartições públicas, federais, estaduais, municipais, administrações regionais, autárquicos, empresas concessionárias de serviços públicos e o oficio de registro de imóveis, podendo, para tanto, assinar todo e qualquer documento, por mais especial que seja, relativo ao EMPREENDIMENTO, inclusive promover modificações do PROJETO APROVADO e a aprovação dessas modificações, assinar plantas, promover a retificação do MEMORIAL DE INCORPORAÇÃO, acompanhar o processamento das modificações, bem como a denunciar a incorporação em razão de direito de carência, concordando expressamente com a denúncia da incorporação, satisfazer exigências, interpor recursos administrativos e judiciais, discriminar e rediscriminar frações ideais do TERRENO, para o fim de re-ratificar a convenção de condomínio do EMPREENDIMENTO, pagar taxas e contribuições, assinar termos, suas re-ratificações e aditivos; subscrever requerimentos, concordar com avaliações, assinar termos de cessão gratuita, como proprietários ou como afluentes, com as condições e obrigações exigidas pelo poder público ou pelas empresas concessionárias de serviços públicos, por mais especiais que sejam, se necessário, doar áreas de recuo nos termos exigidos pelo poder publico, transferir e ou ceder redes internas e ou áreas à empresas concessionárias de serviços públicos, averbar a construção, promover a inscrição do IMÓVEL retirar certidões, realizar modificações resultantes de normas legais e ou administrativas, de normas de concessionárias de serviços públicos, de prevenção contra incêndio, bem assim, podendo, ainda assinar o contrato de rescisão do presente Contrato quando o valor consignado no item "SINAL" do Quadro Resumo não for pago, quer pela não compensação do cheque, quer em qualquer outra hipótese em que se verifique a não transferência do valor devido, por supor-se, em tal hipótese, na forma do disposto no art. 49, da Lei n° 8.078/90, ter o(s) ADQUIRENTE(S) desistido do contrato, e também os poderes de substabelecer com ou sem reservas". No contrato de compra e venda do Residencial Bonavita (sic: fls. 286 e 295/296 - MP): "4.3. Assinado o referido contrato, a totalidade do terreno e suas acessões serão hipotecadas, figurando como credor hipotecário o agente financiador, com o que o(s) ADQUIRENTE(S) concorda(m) em caráter irrevogável e irretratável, ficando a VENDEDORA proprietária desde já constituída procuradora do(s) ADQUIRENTE(S) na forma da Cláusula 4.4. abaixo, inclusive, se necessário, para atender exigências do agente financeiro e ou do Registro de Imóveis, com poderes para assinar contrato de aditamento do presente. 4.4. Desta forma, o(s) ADQU1RENTE(S), qualificado(s) acima, como condição essencial do presente instrumento, e para fins do disposto na Clausula 4.3., constitui(em) e nomeia(m) sua bastante procuradora a VENDEDORA, a qual outorgam os poderes irrevogáveis e irretratáveis na forma prevista no artigo 684 do Código Civil, para em nome deles, ADQUIRENTE(S), junto ao agente financiador com quem está contratando o financiamento deste EMPREENDIMENTO, assinar, aditar, re-ratificar, alterar o contrato de abertura de crédito com garantia hipotecária e outras avenças, para produção do EMPREENDIMENTO, podendo ajustar cláusulas e condições, prazos, taxas de financiamento, etc., oferecendo garantias reais, hipotecando as frações ideais do terreno, benfeitorias e acessões que a acederão, podendo ainda representar o(s) ADQUIRENTE(S), para registro de hipoteca e da alienação fiduciária perante Cartório de Registro de Imóveis, podendo, enfim, praticar todos os atos, assinar papéis, documentos, por mais especiais que sejam e que se fizerem necessários ao bom e fiel cumprimento do presente mandato, inclusive substabelecer. 82.1. Para os fins mencionados na Cláusula 8.2, o(s) ADQUIRENTE(S), desde já, nomeia(m) e constitui(em) sua bastante procuradora a VENDEDORA com poderes para representá-lo(s) junto a repartições públicas, federais, estaduais, municipais, administrações regionais, autárquicos, empresas concessionárias de serviços públicos e o Registro Geral de Imóveis, podendo, para tanto, assinar projeto de remembramento, assim como todo e qualquer documento, por mais especial que seja, necessário ao registro imobiliário do projeto de remembramento aprovado, inclusive a necessária retificação do MEMORIAL DE INCORPORAÇÃO, assinar guias, promover a modificação do projeto aprovado e a aprovação dessas modificações, assinar plantas, promover a retificação do Memorial de Incorporação, acompanhar o processamento das modificações, bem como a denunciar a incorporação, concordando, expressamente, com a denúncia da incorporação, promover as substituições que se fizerem necessárias no Memorial de Incorporação, satisfazer exigências, interpor recursos administrativos e judiciais, discriminar e rediscriminar frações ideais do terreno; para o fim de te-ratificar a convenção de condomínio do EMPREENDIMENTO, pagar taxas e contribuições, assinar termos, suas re-ratificações e aditivos; a procuradora acima nomeada poderá subscrever requerimentos, concordar com avaliações, assinar termos de cessão gratuita, como proprietários ou como anuentes, com as condições e obrigações exigidas pelo Poder Público ou pelas empresas concessionárias de serviços públicos, por mais especiais que sejam, se necessário, doar áreas de recuo nos termos editados pelo poder público, transferir e ou ceder redes internas e ou áreas A empresas concessionárias de serviços públicos, assinando os respectivos termos, assinar termos de investidura, obrigar pela evicção de direito, assinar aditivos, promover os registros que se fizerem necessários, averbar a construção, promovera inscrição do IMÓVEL, retirar certidões, aceitar modificações resultantes de normas legais e ou administrativas, de normas de concessionárias de serviços públicos, de prevenção contra incêndio, bem assim, a regularização da propriedade, assinar, re-ratificar ou aditar o Memorial de Incorporação e a Convenção de Condomínio do EMPREENDIMENTO, podendo, ainda assinar a escritura de rescisão da presente desde que comprovado que o valor consignado no item "II. SINAL" do Quadro Resumo e pago a titulo de sinal e principio de pagamento não ocorreu, quer pela não compensação do cheque, quer em qualquer outra hipótese em que se verifique a não transferência do valor devido, por supor-se, em tal hipótese, na forma do disposto no art. 49, da Lei tf 8.078/90, ter o(s) ADQUIRENTE(S) desistido do contrato, e também os poderes de substabelecer com ou sem reservas". No contrato de compra e venda do Residencial Maison Classic (sic: fls. 478-v/479 -MP): “8.2.1. Para os fins mencionados na Cláusula 8.2, o(s) ADQUIRENTE(S) promitente(s) comprador(es), qualificado(s) acima, desde já, nomeia(m) e constitui(em) sua bastante procuradora a VENDEDORA com poderes para representa-10(s) junto a repartições públicas, federais, estaduais, municipais, administrações regionais, autárquicos, empresas concessionárias de serviços públicos e o Registro Geral de Imóveis, podendo, para tanto, assinar projeto de remembramento, assim como todo e qualquer documento, por mais especial que seja, necessário ao registro imobiliário do projeto de remembramento aprovado, inclusive a necessária retificação do Memorial de Incorporação, assinar guias, promover a modificação do projeto aprovado e a aprovação dessas modificações, assinar plantas, promover a retificação do Memorial de Incorporação, acompanhar o processamento das modificações, bem como a denunciar a incorporação, concordando, expressamente, com a denúncia da incorporação, promover as substituições que se fizerem necessárias no Memorial de Incorporação, satisfazer exigências, interpor recursos administrativos e judiciais, discriminar e rediscriminar frações ideais do terreno; para o fim de re-ratificar a convenção de condomínio do EMPREENDIMENTO, pagar taxas e contribuições, assinar termos, suas re-ratificações e aditivos; a procuradora acima nomeada poderá subscrever requerimentos, concordar com avaliações, assinar termos de cessão gratuita, como proprietários ou corno anuentes, com as condições e obrigações exigidas pelo Poder Público e/ou pelas empresas concessionárias de serviços públicos, por mais especiais que sejam, se necessário, doar áreas de recuo nos termos editados pelo poder público, transferir e/ou ceder redes internas e/ou áreas empresas concessionárias de serviços públicos, assinando os respectivos termos, assinar termos de investidura, obrigar pela evicção de direito, assinar aditivos, promover os registros que se fizerem necessários, averbar a construção, promover a inscrição do Imóvel retirar certidões, aceitar modificações resultantes de normas legais e/ou administrativas, de normas de concessionárias de serviços públicos, de prevenção contra incêndio, bem assim, a regularização da propriedade, assinar, re-ratificar ou aditar o Memorial de Incorporação e a Convenção de Condomínio do EMPREENDIMENTO, podendo, ainda assinar o termo de rescisão do presente desde que comprovado que o valor consignado no item "II. SINAL" do Quadro Resumo e pago a titulo de sinal e principio de pagamento não ocorreu em até 10 (dez) dias após o respectivo vencimento, quer pela não compensação do cheque, quer em qualquer outra hipótese em que se verifique a não transferência do valor devido, por supor-se, em tal hipótese, na forma do disposto no cin. 49, da Lei n° 8078/90, ter o(s) ADQUIRENTE(S) desistido do contrato, e também os poderes de substabelecer com ou sem reservas". O Ministério Público questiona as cláusulas dos contratos que constituem a requerida mandatária dos consumidores, alegando que violam o disposto no art. 51, VIII, do CDC. Já a requerida defende a validade das cláusulas, ao argumento que a outorga de mandato específico para que os adquirentes sejam representados perante agente financiador da obra e perante Cartórios de Registro de Imóveis não traz prejuízo ou desvantagem alguma, e que tais cláusulas são fundamentais do ponto de vista operacional para a execução dos empreendimentos imobiliários. É certo que a regra do art. 51, VIII, do CDC reconhece como será nula a cláusula-mandato no contrato de promessa de compra e venda de imóvel que outorga à vendedora poderes para realizar negócios jurídicos em nome do adquirente do imóvel, na condição de procuradora, porquanto impõe vantagem excessiva a seu favor (em favor da vendedora). Veja o disposto no citado art. 51, VIII, do CDC: “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: [...] VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor;” (grifei). Mas da análise das questionadas cláusulas, verifica-se que elas outorgam poderes à requerida para as restritas providências da concretização do próprio objeto contratual, ou seja, para representar os adquirentes perante repartições públicas, agentes financiadores, Cartórios de Registro de Imóveis, entre outros, para a realização de atos relacionados à execução do empreendimento imobiliário e não para realizar outro negócio jurídico. Essas cláusulas revelam-se fundamentais do ponto de vista operacional para a execução dos empreendimentos imobiliários, pois seria inviável impor à incorporadora que localizasse, contatasse e obtivesse autorizações específicas de cada um dos adquirentes para resolver as inúmeras providências burocráticas, que vão desde tratativas com a administração pública até a interface com agentes financeiros responsáveis pelo financiamento das obras. Assim, tais cláusulas não se enquadram na hipótese prevista no art. 51, VIII, do CDC, porquanto não restou comprovado que impõem representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor, mas, sim, para a realização de atos necessários à concretização do próprio objeto contratual. Sobre o assunto: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA EM EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULAS. LEGITIMIDADE ATIVA. DESPESAS CONDOMINIAIS. HIPOTECA. CLÁUSULA AD CORPUS. I - Inexiste nulidade da r. sentença por conter fundamentação concisa, pois foi suficiente para rejeitar os argumentos declinados pelas partes, e as questões suscitadas e não solucionadas pelo Juízo a quo serão devolvidas ao Tribunal, art. 1.013, §1º, do CPC. Rejeitada a preliminar de nulidade da r. sentença. II – O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios possui legitimidade ativa para a propositura de ação civil pública que visa tutelar direitos individuais homogêneos dos adquirentes de unidade em empreendimento imobiliário. III – As empresas que integram a cadeia de fornecimento do bem, cujo contrato é questionado, possuem legitimidade passiva para a demanda, com fundamento na teoria da aparência e porque integram o mesmo grupo econômico. IV – É abusiva a cláusula contratual que prevê desconto na taxa condominial de 70% para as unidades não comercializadas pela incorporadora/construtora. V – A cláusula contratual que estabelece a possibilidade de a incorporadora oferecer o imóvel em hipoteca para garantir o financiamento da construção do empreendimento não é abusiva, uma vez que ineficaz frente aos adquirentes de unidades imobiliárias (Súmula 308, STJ). VI – Não se verifica abusividade na cláusula mandato inserida em contrato de promessa de compra e venda de imóvel em empreendimento imobiliário, para a prática de atos relacionados ao financiamento de construção e instituição do condomínio, por si só. A abusividade demanda a prática de atos que extrapolem os limites dos poderes outorgados. VII – Não é abusiva a cláusula que disciplina a não serem indenizáveis diferenças de área de até 5% para mais ou para menos no imóvel. Trata-se de aplicação do art. 500 do CC. VIII – Apelações parcialmente provida. (Acórdão 1288896, 0710066-62.2019.8.07.0001, Relator(a): VERA ANDRIGHI, 6ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 06/10/2020, publicado no DJe: 27/10/2020.).” (grifei). Aliás, não há nos autos qualquer prova de que a requerida tenha utilizado os poderes conferidos pelos consumidores para finalidades diversas daquelas previstas nos contratos ou que tenha causado prejuízos aos consumidores. Portanto, não se verifica abusividade nas cláusulas-mandato questionadas pelo Ministério Público. 2.6. Dos Danos Morais e Materiais O Ministério Público requer a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais e materiais aos consumidores. Já a requerida sustenta a impossibilidade de fixação de indenização por dano moral individual no bojo de uma ação civil pública, e a inexistência de danos a serem indenizados. Em relação aos alegados danos morais, não há nos autos elementos que comprovem que os consumidores tenham sofrido constrangimentos ou abalos psíquicos em decorrência das condutas da requerida. Os adquirentes ouvidos como informantes não relataram qualquer tipo de qualquer abalo moral, constrangimento, humilhação ou sofrimento psíquico decorrente da relação contratual com a requerida. Além disso, o dano moral, por sua natureza subjetiva, varia de pessoa para pessoa, sendo inviável sua apuração de forma genérica em uma ação civil pública. Cada consumidor que se sentir lesado poderá buscar individualmente a reparação pelos danos morais eventualmente sofridos. Quanto aos arguidos danos materiais, também não há, nestes autos, prova de que algum consumidor tenha sofrido prejuízo material em decorrência das cláusulas contratuais questionadas. Não há relatos de consumidores que tenham pago valores indevidos ou que não tenham sido ressarcidos em caso de rescisão contratual. Em relação à comissão de corretagem, conforme já analisado, a conduta da requerida está em conformidade com a tese fixada pelo STJ no Tema 938, não havendo, portanto, danos materiais a serem indenizados. Em relação às cláusulas que transferem aos consumidores a responsabilidade pelo pagamento de IPTU e despesas de condomínio independentemente do efetivo recebimento do imóvel e às cláusulas que determinam a perda das benfeitorias úteis e necessárias, não há, neste processo, prova de que tenham sido cobradas e, em especial, pagas. Ressalta-se, entretanto, que caso seja tenha ocorrido alguma cobrança e pagamento feito por outros adquirentes, fica resguardado o direito de postularem eventual indenização na via específica. Portanto, não há se falar em condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos materiais e morais aos consumidores. Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso em face de Brookfield Incorporações S.A., para: 1. DECLARAR a nulidade das disposições contratuais que transferem aos consumidores a responsabilidade pelo pagamento de IPTU e despesas de condomínio independentemente do efetivo recebimento do imóvel, contidas nas cláusulas 8.3 e 11.8 do contrato adesivo de compra e venda do Residencial Harmonia, nas cláusulas 5.7, 5.8 e 12.19 do contrato adesivo de compra e venda do Residencial Bonavita, e nas cláusulas 5.7 e 5.8 do contrato adesivo de compra e venda do Residencial Maison Classic, restringindo suas aplicações somente após a efetiva entrega do bem ao adquirente; 2. DECLARAR a nulidade das disposições contratuais que determinam a perda das benfeitorias úteis e necessárias introduzidas nos imóveis sem que o adquirente possa invocar direito de indenização ou retenção, contidas na cláusula 5.3 do contrato relativo ao Residencial Harmonia e na cláusula 7.3 dos contratos relativos ao Residencial Bonavita e Maison Classic; 3. CONDENAR a requerida na obrigação de não fazer, consistente em abster de inserir nos instrumentos de compra e venda que vier a celebrar, em relação aos empreendimentos presentes e futuros, cláusulas que estipulem aos consumidores a responsabilidade de arcar com IPTU e as despesas de condomínio antes da entrega das chaves e cláusulas que determinem a perda das benfeitorias úteis e necessárias sem direito à indenização em caso de rescisão contratual, sob pena de multa de R$30.000,00 por cada eventual contrato firmado; 4. CONDENAR a requerida à restituição, na forma simples, porquanto não demonstrada que houve cobrança, indevido pagamento e violação da boa-fé objetiva, requisitos exigidos pelo art. 42 do CDC, dos valores eventualmente exigidos de outros consumidores com base nas cláusulas declaradas nulas, a ser apurado em liquidação de sentença, de forma atualizada, com incidência de juros de mora de 1% a.m. a partir da citação e correção monetária pelo INPC a partir da data de cada eventual indevido pagamento; 5. DETERMINAR que a requerida, em sede de obrigação de fazer, que veicule o dispositivo da sentença em dois jornais de grande circulação, por 10 edições, com disponibilização, na integra, durante o período de 6 (seis) meses em sua pagina na internet, além de fornecer cópia integral desta sentença para a administração de cada um dos citados condomínios (harmonia, Bonavita e Maison Classic). Julgo improcedentes os demais pedidos e declaro extinta a ação, com resolução do mérito, forte no art. 487, I, do Código de Processo Civil. Sem custas processuais e honorários advocatícios por tratar de ação proposta pelo Ministério Público. Após o trânsito em julgado, arquive-se mediante as anotações de estilo. Registre-se. Intimem-se. (datado e assinado digitalmente) PORTARIA CGJ N. 81/2025-GAB-CGJ.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou 1046 resultados. Faça login para ver detalhes completos e mais informações.

Fazer Login para Ver Detalhes