Processo nº 5000851-02.2024.4.03.6334
ID: 336081996
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Gabinete JEF de Assis
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5000851-02.2024.4.03.6334
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VINICIUS CONSOLI IRENO FRANCO
OAB/SP XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000851-02.2024.4.03.6334 / 1ª Vara Gabinete JEF de Assis AUTOR: ANTONIA NELY SOARES CHAGAS Advogado do(a) AUTOR: VINICIUS CONSOLI IRENO FRANCO - SP385…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000851-02.2024.4.03.6334 / 1ª Vara Gabinete JEF de Assis AUTOR: ANTONIA NELY SOARES CHAGAS Advogado do(a) AUTOR: VINICIUS CONSOLI IRENO FRANCO - SP385298 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS S E N T E N Ç A I – RELATÓRIO A exposição dos fatos e dos elementos de convicção ocorrerá junto aos fundamentos desta sentença, estando o relatório dispensado nos termos da Lei n. 9.099/1995, art. 38. É, em síntese, o relatório. Fundamento, e decido. II – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA Estão presentes e regulares os pressupostos processuais e as condições da ação. O processo encontra-se em termos para julgamento, pois conta com conjunto probatório suficiente a pautar a prolação de uma decisão de mérito. A comprovação do fato constitutivo do direito pleiteado, ou seja, o exercício da atividade sob condições ambientais nocivas, é feita mediante a apresentação de formulário próprio [SB-40, DISES-BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 ou PPP (perfil profissiográfico previdenciário) e/ou laudo pericial a ser fornecido pelo(s) empregador(es), referentes a todos os períodos em que deseja ver convertido o tempo especial em comum. É ônus do segurado apresentar os documentos comprobatórios do exercício da atividade em condições especiais para a obtenção do enquadramento pretendido, nos termos da Legislação previdenciária. II.1 PRELIMINARMENTE A) - PRESCRIÇÃO Nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, em eventual hipótese de procedência do pedido, incidirá a prescrição sobre todas as parcelas devidas no quinquênio anterior ao do ajuizamento da ação, conforme Súmula nº 85 do STJ e o Enunciado n.º 19 das Turmas Recursais do Juizado Especial de São Paulo. B) – “TEMPUS REGIT ACTUM” – CONDIÇÕES E PRESSUPOSTOS Verifica-se que o requerimento do benefício foi efetuado após da vigência da EC nº 103/2019, devendo incidir a lei da época do pedido administrativo (“tempus regit actum” – tempo rege o ato). Estão presentes as condições da ação, nada se podendo objetar quanto à legitimidade das partes, à presença do interesse processual e à possibilidade jurídica do pedido. Estão igualmente presentes os pressupostos de desenvolvimento válido e regular do processo, em virtude do que o feito comporta exame do mérito. Com efeito, eventuais lapsos ou deficiências do PPP podem eventualmente ser supridos, mas sua substituição por completo, ou mesmo a suposta correção de dados apontados, a exemplo dos períodos de efetiva exposição a fator de risco e dos níveis de ruído (dB), especificações, qualificações e quantificações dos produtos químicos (quando se tratar de agentes nocivos químicos) são medidas que devem ser providenciadas pela parte interessada, somente se justificando a atuação do Juízo em caso de recusa ou inércia comprovadas, o que não se verifica no presente caso, sobretudo diante do princípio da inércia da jurisdição, bem como da imparcialidade e neutralidade que deve preservar o órgão jurisdicional, inclusive em observância à paridade de armas entre as partes. II.2 – MÉRITO II.2.1 – TEMPO ESPECIAL – EVOLUÇÃO LEGISLATIVA – CASO CONCRETO – LEGISLAÇÃO APLICÁVEL A aposentadoria especial é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, com prazo reduzido em virtude das peculiaridades das condições do trabalho desenvolvido, em que há exposição a agentes químicos, físicos, biológicos ou a associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, sendo atualmente prevista pelo art. 57 da Lei nº 8.213/91 e art. 64 do Decreto nº 3048/99. É de se registrar, entretanto, que a legislação aplicável ao reconhecimento da natureza especial da atividade exercida pelo segurado, bem como a forma de sua demonstração, é aquela vigente à época da prestação do trabalho - aplicação do princípio tempus regit actum -, de modo que se preservem a segurança jurídica e as situações consolidadas sob o império da legislação anterior. Até a edição da Lei nº 9.032, de 29/04/1995, a comprovação do exercício de atividade especial poderia ser feita pelo mero enquadramento da categoria profissional ou do labor exercido com exposição a algum dos agentes previstos nos anexos dos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979, normas que tiveram vigência concomitante, por força dos RBPS aprovados pelos Decretos nº 357/1991 (art. 295) e nº 611/1992 (art. 292), e cujo elenco não é exaustivo, admitindo-se o socorro à analogia (Súmula TFR 198), exceto para os agentes “ruído” e “calor”, para os quais sempre se exigiu laudo técnico. Após a edição da Lei 9.032/1995 (28/04/95), passou-se a exigir comprovação da efetiva exposição do segurado a algum agente agressivo, nos termos da nova redação dada ao art. 57, § 4º, da Lei 8.213/1991. Essa comprovação poderia ser feita, até a edição do Decreto nº 2.172, de 5/3/1997, por meio dos formulários de informações sobre atividades com exposição a agentes agressivos (SB-40, DSS-8030, DIRBEN-8030, DISES BE 5235, PPP, etc.) ou por prova pericial, alternativamente. A partir da vigência do Decreto nº 2.172/97 (06/03/1997), essa comprovação deve, necessariamente, ser feita por meio de formulário emitido pela empresa ou preposto, com base em laudo técnico firmado por engenheiro de segurança do trabalho ou médico do trabalho, sendo obrigatória, a partir de 1º/1/2004, a apresentação do formulário denominado Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), nos termos da IN/INSS/DC 95/2003. No que concerne ao agente nocivo ruído, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25-03-1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24-01-1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05-3-1997, e o Anexo IV do Decreto n.º 3.048, de 06-5-1999, alterado pelo Decreto 4.882, de 18-11-2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, in verbis: Período Trabalhado Enquadramento Limites de tolerância Até 05/3/97 1. Anexo do Decreto 53.831/64; 2. Anexo I do Decreto 83.080/79. 1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB. De 06/3/97 a 06/5/99 Anexo IV do Decreto 2.172/97. Superior a 90 dB. De 07/55/99 a 18/11/2003 Anexo IV do Decreto 3.048/99, na redação original. Superior a 90 dB. A partir de 19/11/2003 Anexo IV do Decreto 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto 4.882/2003 Superior a 85 dB. Quanto ao período anterior a 05/03/1997, entende-se que são aplicáveis, para fins de enquadramento, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79, de forma que até 05/03/1997 é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto 53.831/64. Já o período posterior a 05/03/1997, se houver aplicação literal dos Decretos vigentes, seria exigível a exposição a ruídos superiores a 90 decibéis até 18/11/2003 (Anexo IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, este na redação original) e, a partir de então, ruídos superiores a 85 decibéis, conforme a alteração do Decreto 3.048/99, promovida pelo Decreto 4.882/2003. Entretanto, considerando que os novos parâmetros de enquadramento beneficiaram os segurados expostos a ruídos no ambiente de trabalho, diminuindo de 90 para 85 decibéis o nível de exposição sonora, considerando ainda o caráter social dos benefícios previdenciários, é cabível a aplicação retroativa da disposição normativa mais benéfica, considerando-se especial a atividade quando sujeita a ruídos superiores a 85 decibéis desde 06/03/1997, data da vigência do Decreto 2.172/97. Sobre essa matéria, relevante precedente do Eg. Tribunal Regional Federal da 3ª Região: “CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE SOB CONDIÇÕS ESPECIAIS. RUÍDO SUPERIOR A 85 dB. DECRETO Nº 4.882/03. NORMA MAIS BENÉFICA AO SEGURADO. APLICABILIDADE. AGRAVO DESPROVIDO. 1. É considerada insalubre a atividade desenvolvida com exposição a ruídos acima de 80 dB, conforme o item 1.1.6 do Anexo ao Decreto 53.831/64. A partir de 05.03.97, passou-se a exigir a exposição a nível superior a 90 dB, nos termos do seu Anexo IV. Após 18.11.03, data da edição do Decreto 4.882, passou-se a exigir a exposição a ruídos acima de 85 dB. 2. O uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Precedentes desta Corte. 3. O nível de ruído superior a 85dB é prejudicial à saúde, nos termos do estabelecido pelo Decreto nº 4.882/03, que retroage a 05.03.97 por ser norma mais benéfica ao segurado. Precedentes desta Corte. 4. Agravo desprovido. (APELREE 200561830044722, JUIZ BAPTISTA PEREIRA, TRF3 - DÉCIMA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:21/09/2011 PÁGINA: 795.) – Grifou-se. Em síntese, admite-se como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997 e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferidos esses níveis por meio de perícia técnica ou formulário expedido pelo empregador com base em prova pericial. Ressalta-se que utilização de equipamento de proteção (EPI) não pode ser considerada para o afastamento da especialidade da atividade, já que o uso de equipamento de proteção não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado, mas somente reduz seus efeitos. Quanto à necessidade de laudo técnico (LTCAT) para demonstração da exposição ao agente físico, predomina a interpretação quanto à prescindibilidade da exibição do laudo correspondente quando apresentado o formulário de Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), já que esse documento traz informações quanto à natureza e aos níveis de exposição ao agente nocivo, bem como nomes dos responsáveis técnicos pela aferição. Acrescente-se que o próprio decreto que regulamenta o meio de prova da atividade especial não exige apresentação do laudo, mas simplesmente a emissão do PPP com base em laudo técnico (art. 66, §2º, Decreto nº 2.172/97 e art. 68, §2º, do Decreto nº 3048/99). Essa é a interpretação jurisprudencial verificada no âmbito do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, verbis: “CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. PPP. LAUDO. DESNECESSIDADE. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A legislação previdenciária não mais exige a apresentação do laudo técnico para fins de comprovação de atividade especial, pois, embora continue a ser elaborado e emitido por profissional habilitado, qual seja, médico ou engenheiro do trabalho, o laudo permanece em poder da empresa que, com base nos dados ambientais ali contidos, emite o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, que reúne em um só documento tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental, e no qual consta o nome do profissional que efetuou o laudo técnico, sendo assinado pela empresa ou seu preposto. 2. [...]. (APELREE 200961830003087, TRF3 - DÉCIMA TURMA,13/10/2011 - Grifou-se). Por conseguinte, impõe-se a apreciação dos fatos e do conjunto probatório dos autos a partir da observância dos requisitos legais que permitem o atendimento da pretensão formulada na petição inicial, assumindo as partes seu ônus probatório, sendo dever da parte autora provar os fatos constitutivos de seu direito, e do INSS os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito da parte autora (CPC, art. 373, incisos I e II). CASO DOS AUTOS Segundo o que consta do caso em concreto, pretende a parte autora a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição requerida em 04/02/2023, mediante o reconhecimento do período alegadamente laborado no meio rural em regime de economia familiar, de 19/09/1976 a 30/04/1987, bem como do caráter especial dos períodos compreendidos entre 09/10/1990 a 01/04/1994, 01/09/1996 a 14/14/2003, 02/07/2004 a 01/06/2005 e 01/03/2006 a 28/02/2007. Solicitou também que, em caso de necessidade, que seja oportunizado a complementação do período de 01/04/2022 a 28/02/2023, em que verteu contribuições na alíquota de 11%. Do Tempo Rural Afirma a parte autora que nasceu em 19/09/1968, na cidade de Boa Viagem. Argumenta que desde cedo exerceu atividade rural e continuou a exercer até o mês de abril de 1987, quando iniciou atividades laborativas urbanas, mesmo ainda residindo na zona rural. Esclarece que durante o período de 01/01/1971 a 31/12/1988, bem antes do período inicial pleiteado, trabalhou na Fazenda Nossa Senhora da Conceição, no município de Bo Vista, de propriedade do Sr. Raimundo Chagas de Mesquita, no cultivo de arroz, feijão e milho. Afirma ter permanecido nas lides rurais no período de 19/09/1976 (quando contava com oito anos de idade) a 30/04/1987. Juntou documentos, dentre os quais, destaco: (i) Ficha de Autodeclaração rural, constando o período como segurada especial, de 09/1976 a 04/1987; (ii) Certidão de Casamento de seus pais, contraído em 14/10/1967, constando a profissão de seu genitor como “agricultor” e de sua genitora como “doméstica”; (iii) Certidão de nascimento de sua irmã, nascida aos 08/08/1976, constando a profissão de seu genitor como “agricultor”; (iv) Declaração emitida por Raimundo Chagas de Mesquita, proprietário das terras, constando que a autora e sua família moraram e trabalharam na condição de segurado especial, no período de 01/1971 a 12/1988; (v) sua certidão de casamento, contraído em 05/12/1987, constando que seu esposo era lavrador. Pois bem. Pretende parte autora comprovar vasto período de labor rural na condição de segurado especial, baseado apenas em prova documental extemporânea, extremamente escassa. Explico. O período pretendido abrange mais de 10 anos, de 19/09/1976 (quando contava com oito anos de idade) a 30/04/1987. Os documentos juntados são extemporâneos. A certidão de casamento de seus genitores (1967) apenas comprova a origem rurícola da família, mas não demonstra que a família se manteve nas lides rurais até 1987, ao menos. De igual forma, a certidão de nascimento de sua irmã, datada de 08/1976. Declaração firmada por particular, não contemporânea (datada de 23/06/2022, sem firma reconhecida, sem qualificação do declarante no documento), não passa de prova oral reduzida termo. E, por fim, a certidão de casamento remete a período em que a parte autora já trabalhava como professora. O início de prova documental não foi corroborado pela prova testemunhal. A parte autora justificou que “...ficou impossibilidade de apresentar, visto que, por estar atualmente residindo em cidade distante do local em que viveu no período preiteado (sic), não foi possível relacionar nenhuma testemunha” – ID 349339609. Assim, diante da ausência de provas do efetivo labor rural da autora, deixo de reconhecer o período rural pretendido. DO DISTINGUISHING EM RELAÇÃO AO PRECEDENTE FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NOS AUTOS DO RESP Nº 1.352.721 – SP Nos autos do Recurso Especial nº 1.352.721 – SP, a Corte Especial do E. STJ, nos termos de acórdão relatado pelo Min. Napoleão Nunes Maia Filho (julgamento ocorrido em 16/12/2015) proferiu decisão cuja ementa passo a transcrever: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO. 1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários. 2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. 3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas. 4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social. 5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido. De acordo com referido precedente, dotado de caráter vinculante, o feito em que se pleiteia benefício de aposentadoria por idade rural deve ser extinto sem julgamento do mérito quando ausente prova material apta à comprovação do exercício de atividade como segurado especial. A ratio da decisão é evitar que esse tipo de pedido seja julgado improcedente, o que constituiria obstáculo intransponível à repropositura da ação mais bem instruída, instruída com prova material do exercício de atividade como segurado especial no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário para a concessão desse benefício ou à formulação do requerimento administrativo. Por isso mesmo, a decisão não se aplica aos casos em que se postula o reconhecimento do exercício de atividade como segurado especial em período remoto para, somado esse período a outros períodos contributivos, obtenção de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Nesses casos, a via processual continua aberta para que se postule benefício de aposentadoria por idade rural, cujos requisitos são diversos. Do Tempo Especial (i) 09/10/1990 a 01/04/1994, para a empregadora Associação de Caridade Santa Casa de Misericórdia de Assis, no cargo de ajudante geral, conforme CTPS à ff. 04, ID 332399246. (ii) 01/09/1996 a 14/14/2003, para a empregadora Hospital e Maternidade de Assis S/C Ltda., no cargo de servente, conforme CTPS à ff. 04, ID 332399246. (iii) 02/07/2004 a 01/06/2005, para a empregadora Hospital e Maternidade de Assis S/C Ltda., no cargo de serviços de limpeza II, conforme CTPS à ff. 05, ID 332399246. (iv) 01/03/2006 a 28/02/2007, para a empregadora Nutriassis -Alimentos e serviços Ltda. - ME., no cargo de faxineira, conforme CTPS à ff. 05, ID 332399246. A questão fulcral consiste em saber se a parte requerente estava efetiva e permanentemente exposta a condições insalubres, penosas ou perigosas, ou seja, prejudiciais à sua saúde e/ou integridade física. Sobre isso, a insalubridade se caracteriza diante da exposição da pessoa a agentes nocivos à saúde em níveis superiores aos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos (CLT, art. 189). Por seu turno, consideram-se perigosas as atividades que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado (CLT, art. 193). Finalmente, penosas são as atividades geradoras de desconforto físico ou psicológico, superior ao decorrente do trabalho normal. As condições em questão devem ser vistas apenas sob o ângulo do agente, sendo irrelevante o ramo de atividade exercido pelo eventual empregador ou tomador de serviço. O trabalho a ser analisado abrange não apenas o profissional que o executa diretamente, como também o servente, o auxiliar ou o ajudante dessas atividades, desde que, obviamente, essas tarefas tenham sido executadas (de modo habitual e permanente) nas mesmas condições e ambientes de insalubridade e periculosidade, independentemente da idade da pessoa. Para o período de (i) 09/10/1990 a 01/04/1994, a autora apresentou formulário patronal PPP no ID 3324000008, que indica que a autora exerceu a atividade de ajudante geral, em setor de enfermagem, na Santa Casa de Misericórdia de Assis. Documento incompleto, porquanto não consta a descrição das atividades exercidas, ou mesmo os fatores de risco a que a autora estava eventualmente exposta. Consta o nome do responsável pelos registros ambientais a partir de 12/05/2004, Eng. José Ronan Simões Ribeiro, CREA 96841/D. Não há, pois, especialidade a ser reconhecida. *** Para os períodos de (ii) 01/09/1996 a 14/14/2003 e de (iii) 02/07/2004 a 01/06/2005, a autora apresentou formulário patronal PPP (ID 332400001 e ID 332399250) que assim descreve as atividades de servente e serviços de limpeza, no Hospital e Maternidade de Assis Ltda.: “Executar limpeza de quarto diariamente, limpando piso, parede, e banheiros, utilizando para isso, sabão líquido, água e hipoclorito; limpar secreção, vômitos, cátaros com solução de hipoclorito; recolher o lixo dos quartos que estão acondicionados em sacos plásticos e levar para o setor de serviços gerais; executar limpezas terminais nos quartos, retirando toda roupa, materiais descartáveis e etc. utilizando sabão líquido, água e hipoclorito para fazer a limpeza terminal; limpar corredores, consultórios, salas de exames e etc.; utilizar carrinho de mão que contém vassouras, buchas, baldes, sacos plásticos de lixo, detergentes, sabões líquidos, panos de limpeza e etc.”. Indica, como agentes nocivos, a exposição a materiais infecto-contagiantes, fazendo menção à utilização de EPI eficaz. Como responsável pelos registros ambientais, indica o profissional Mário Haruo Maeda, CREA/SP 0600894428. Consta do formulário patronal a seguinte observação: Embora o trabalho em estabelecimento hospitalar em contato com agentes prejudiciais à saúde enseje o reconhecimento da especialidade das atividades, é indispensável a efetiva comprovação do risco ao trabalhador, mediante formulário patronal formalmente em ordem e/ou LTCAT. O entendimento na TNU é predominantemente no sentido de que "não é necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante a integralidade da jornada de trabalho do segurado, bastando que haja efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador, satisfazendo os requisitos de habitualidade e permanência" PEDILEF 0008728-32.2009.404.7251 (no mesmo sentido, PEDILEF 00000200938017074134 e PEDILEF 50159896620164047205). A atividade de serviços gerais não encontra enquadramento nos decretos que regulamentam a matéria. A profissiografia contida no formulário patronal demonstram atividades em ambiente hospitalar, com risco efetivo e constante de contaminação e prejuízo à saúde do trabalhador, conforme se observa do trecho da descrição das atividades: limpar secreção, vômitos, cátaros com solução de hipoclorito; recolher o lixo dos quartos que estão acondicionados em sacos plásticos e levar para o setor de serviços gerais; executar limpezas terminais nos quartos, retirando toda roupa, materiais descartáveis e etc. Embora o PPP mencione a utilização de EPI eficaz, no campo observações traz a informação de que os equipamentos de proteção individual atenuam os agentes nocivos, mas não eliminam o risco inerente à atividade exercida pela autora, em ambiente hospitalar. Portanto, cabe o reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas nos períodos de (ii) 01/09/1996 a 14/12/2003 e de (iii) 02/07/2004 a 01/06/2005. *** Para o período de (iv) 01/03/2006 a 28/02/2007, a autora apresentou formulário patronal PPP, ID332399249, que assim descreve as atividades da autora (empregadora Nutriassis – Alimentos e Serviços – EPP). - 01/03/2006 a 28/02/2007 – faxineira: “Executar limpeza de quarto diariamente, limpando piso, parede, e banheiros, utilizando para isso, sabão líquido, água e hipoclorito; limpar secreção, vômitos, cátaros com solução de hipoclorito; recolher o lixo dos quartos que estão acondicionados em sacos plásticos e levar para o setor de serviços gerais; executar limpezas terminais nos quartos, retirando toda roupa, materiais descartáveis e etc. utilizando sabão líquido, água e hipoclorito para fazer a limpeza terminal; limpar corredores, consultórios, salas de exames e etc.; utilizar carrinho de mão que contém vassouras, buchas, baldes, sacos plásticos de lixo, detergentes, sabões líquidos, panos de limpeza e etc.”. - 30/03/2007 a 10/10/2007 – auxiliar de cozinha: “Realizar o preparo dos alimentos de acordo com o pedido da cozinheira; receber e conferir os gêneros entregues na cozinha; ajudar na distribuição e porcionamento das refeições executar limpeza da cozinha e equipamentos; lavar louças e utensílios após cada refeição; notificar às cozinheiras sobre falhas e irregularidades que prejudiquem o serviço”. Para ambos os períodos, indica, como agentes nocivos, materiais infecto-contagiantes, fazendo menção à utilização de EPI eficaz. Há observação de que a empresa fornece, treina, fiscaliza e obriga o uso do EPI, senão vejamos: Nesse período a autora laborou em sociedade empresária de alimentos e serviços – Nutriassis, exposta, segundo formulário patronal, a agentes infectocontagiosos. Laborava em serviços de limpeza e no preparo de alimentos. A parte autora não logrou comprovar o exercício de atividade em ambiente hospitalar, em contato direto com pacientes e/ou materiais infecto contagiantes, a justificar o risco elevado (em relação à população em geral), de contaminação e/ou de exposição. Na realidade, o formulário patronal tem conteúdo similar àquele já analisado no item anterior, no período em que a parte autora trabalhou no Hospital Maternidade de Assis. Traz a mesma descrição das atividades para o cargo de faxineira, sem demonstração do contato habitual e permanente a agentes agressivos à saúde. Na qualidade de faxineira, era responsável por manter o ambiente limpo. Ademais, no exercício da atividade de auxiliar de cozinha, pela descrição das atividades desenvolvidas, não havia o contato permanente com materiais infecto contagiantes (“Realizar o preparo dos alimentos de acordo com o pedido da cozinheira; receber e conferir os gêneros entregues na cozinha; ajudar na distribuição e porcionamento das refeições executar limpeza da cozinha e equipamentos; lavar louças e utensílios após cada refeição; notificar às cozinheiras sobre falhas e irregularidades que prejudiquem o serviço”). Em nenhum momento o documento cita o contato direto com pessoas doentes ou materiais infectados, na forma como ocorre, por exemplo, com médicos, dentistas, enfermeiros, agentes de saúde. Dessa forma, por entender não comprovada a efetiva exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes nocivos normatizados a respeito, não reconheço o caráter especial das atividades desenvolvidas. *** Por fim, observa-se do CNIS que as contribuições do período de 01/04/2022 a 28/02/2023 foram efetuadas na qualidade de contribuinte individual, na alíquota de 11% - LC 123. Conforme disposto no artigo 21, da Lei nº 8.212/91, com a redação dada pela LC nº 123/2006, no caso de opção pela exclusão do direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a alíquota de contribuição incidente sobre o salário mínimo mensal será de 11%, no caso do segurado contribuinte individual. Art. 21. A alíquota de contribuição dos segurados contribuinte individual e facultativo será de vinte por cento sobre o respectivo salário-de-contribuição. (...) § 2o No caso de opção pela exclusão do direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a alíquota de contribuição incidente sobre o limite mínimo mensal do salário de contribuição será de:(Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011) I - 11% (onze por cento), no caso do segurado contribuinte individual, ressalvado o disposto no inciso II, que trabalhe por conta própria, sem relação de trabalho com empresa ou equiparado e do segurado facultativo, observado o disposto na alínea b do inciso II deste parágrafo; II - 5% (cinco por cento): (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011) a) no caso do microempreendedor individual, de que trata o art. 18-A da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006; e b) do segurado facultativo sem renda própria que se dedique exclusivamente ao trabalho doméstico no âmbito de sua residência, desde que pertencente a família de baixa renda. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011) § 3º O segurado que tenha contribuído na forma do § 2º deste artigo e pretenda contar o tempo de contribuição correspondente para fins de obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição ou da contagem recíproca do tempo de contribuição a que se refere o art. 94 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, deverá complementar a contribuição mensal mediante recolhimento, sobre o valor correspondente ao limite mínimo mensal do salário-de-contribuição em vigor na competência a ser complementada, da diferença entre o percentual pago e o de 20% (vinte por cento), acrescido dos juros moratórios de que trata o § 3o do art. 5o da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011) Cabe a própria parte, se pretender complementar as contribuições, formular pedido junto ao INSS para tanto. Incluir o período na aposentadoria por tempo de contribuição, sem que antes tenha sido complementada a contribuição, de forma a atingir a alíquota de 20%, é proferir sentença condicional, o que é inadmissível. CÁLCULO DO TEMPO CONTRIBUTIVO Conforme páginas do processo administrativo, que ora faço anexar ao presente, o INSS reconheceu que a parte autora contava, na DER, em 04/02/2023 – NB 201.726.000-7, com 23 anos, 01 mês e 10 dias de serviço/contribuição. Nos termos já fundamentado acima, o período de 01/04/2022 a 04/02/2023 não pode ser incluído como tempo contribuitivo para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, sem a prévia complementação. A partir do cálculo já efetivado pelo INSS (períodos incontroversos), incluo o período especial ora reconhecido, de (ii) 01/09/1996 a 14/12/2003 e de (iii) 02/07/2004 a 01/06/2005. Vejamos: Como se vê, a parte autora não cumpre com os requisitos necessários à aposentadoria pretendida, porquanto: 1) em 13/11/2019 não tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral de que trata a EC 20, art. 9º, pois não cumpriu o requisito tempo comum (somou 24 anos e 9 meses, quando o mínimo é 30 anos); 2) em 04/02/2023 não tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição de que trata a EC 103, art. 17, pois (i) não cumpriu o requisito tempo comum (somou 24 anos e 9 meses, quando o mínimo é 28 anos) (até 13/11/2019); (ii) não cumpriu o requisito tempo com pedágio (somou 24 anos e 9 meses, quando o mínimo é 32 anos, 7 meses e 15 dias). Ainda que incluído o período na qualidade de contribuinte individual (dependente de complementação das contribuições), a autora não atingiria o tempo mínimo de contribuição. Portanto, verificando-se que a parte autora se desincumbiu, PARCIALMENTE, de seu ônus probatório em relação ao fato constitutivo de seu direito, o reconhecimento da procedência parcial do pedido é medida que se impõe. III – DISPOSITIVO Diante da fundamentação exposta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora, com resolução de mérito, nos termos previstos pelo art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para RECONHECER, como tempo especial, os períodos de (ii) 01/09/1996 a 14/12/2003 e de (iii) 02/07/2004 a 01/06/2005, por exposição a agentes biológicos/materiais infecto contagiantes, devendo o INSS efetivar a respectiva averbação, mediante fator de conversão 1,4. Sem condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099, de 1995. O prazo para eventual recurso desta decisão é de dez dias, nos termos do artigo 42, da Lei nº 9.099/95. Havendo interposição de recurso, intime-se a parte recorrida para oferecimento das contrarrazões e, após, com ou sem contrarrazões, remeter os autos a uma das Turmas Recursais com competência para julgamento do referido recurso, nos termos do art. 41, §1º, da Lei nº 9.099/95, art. 21 da Lei nº 10.259/2001 e art. 1010, §3º do Código de Processo Civil. Caso contrário, certifique-se o trânsito em Julgado e oficie-se à CEAB-DJ-SR1 para cumprimento da obrigação de fazer. Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se. Assis, data da assinatura eletrônica. ****************************************************************** SÚMULA PROCESSO: 5000851-02.2024.4.03.6334 AUTOR: ANTONIA NELY SOARES CHAGAS - CPF: 320.090.383-04 PERÍODO RECONHECIDO (TEMPO ESPECIAL) - (ii) 01/09/1996 a 14/12/2003 e de (iii) 02/07/2004 a 01/06/2005, por exposição a agentes biológicos/materiais infecto contagiantes, devendo o INSS efetivar a respectiva averbação, mediante fator de conversão 1,4. ****************************************************************** GUSTAVO CATUNDA MENDES Juiz Federal
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