Banco Bradesco Financiamentos S.A. x Deliria Da Silva Cardoso
ID: 306462976
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5011264-15.2024.8.24.0075
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO
OAB/AL XXXXXX
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RAFAELA PINTER PEREIRA
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5011264-15.2024.8.24.0075/SC
APELANTE
: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO (OAB AL010715A)
APELADO
: DELIRIA DA SILVA CARDOSO (AUTOR)
A…
Apelação Nº 5011264-15.2024.8.24.0075/SC
APELANTE
: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO (OAB AL010715A)
APELADO
: DELIRIA DA SILVA CARDOSO (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: RAFAELA PINTER PEREIRA (OAB SC044769)
DESPACHO/DECISÃO
Deliria da Silva Cardoso
ajuizou “
Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais
”, em face de Banco Bradesco Financiamentos S.A., com o objetivo de ver declarada a inexistência de relação jurídica com o Réu, que passou a realizar descontos mensais indevidos em seu benefício previdenciário, além da condenação à restituição do indébito e ao pagamento de indenização por danos morais (
evento 1, INIC1
).
A pretensão foi parcialmente acolhida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Tubarão, que proferiu a sentença nos seguintes termos:
REJEITO
as questões PRELIMINARES suscitadas nos autos, por total insubsistência das alegações, nos termos da fundamentação.
Ao mesmo tempo,
JULGO PROCEDENTE
,
in totum,
o pedido formulado nos autos da presente
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
, processo n.
5011264-15.2024.8.24.0075
, ajuizada por
DELIRIA DA SILVA CARDOSO
, em face de
BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.
, todos devidamente qualificados nos autos.
Em decorrência:
1) DECLARO
, por sentença e para que produza efeitos, a INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA entre a parte autora e a parte ré, envolvendo as cédulas de crédito objeto da presente demanda, bem como a ausência de dívida em relação a esta;
2) CONDENO
a parte ré a RESTITUIR em favor da parte autora,
em dobro,
os valores que lhe foram indevidamente descontados de seu benefício previdenciário em razão das cédulas de crédito bancário objeto da presente demanda, e cujo pagamento seja efetivamente comprovado pela parte autora em fase de liquidação de sentença, por mero cálculo aritmético, na forma do art. 509, § 2°, do Novo Código de Processo Civil,
autorizada, contudo, a dedução do valor comprovadamente recebido por conta do empréstimo, que deverá ser igualmente atualizado
.
3) CONDENO
o réu ao PAGAMENTO do valor de valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, em favor da parte autora, com correção monetária pelo IPCA a contar da data da presente sentença, e acrescida de juros de mora pela taxa SELIC, com dedução do IPCA, a contar do evento danoso, considerado como tal a data do primeiro desconto efetivado junto ao benefício previdenciário percebido pela parte autora.
Encerrando,
EXTINGO O PROCESSO
, em sua fase cognitiva do procedimento COMUM que o regula, com RESOLUÇÃO DE MÉRITO e com fundamento no art. 487, inc. I (Acolher), do novo Código de Processo Civil.
CONDENO
, ainda, a parte ré ao PAGAMENTO do valor das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios da parte adversa, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, o que faço na forma do art. 85, § 2º, NCPC. (
evento 56, SENT1
)
Irresignado, o Réu interpôs Apelação e, em resumo, requereu o provimento do recurso:
a) Primeiramente, requer a atribuição do efeito suspensivo, e que sejam acolhidas as preliminares suscitadas, com base nas argumentações acima expostas.
b) No mérito, requer seja conhecido e inteiramente provido o presente recurso, para que seja reformada integralmente a Sentença, ante os argumentos acima expostos, reconhecendo a regularidade da contratação, atendido o dever da informação, afastando a condenação de dano moral ante a inexistência de dano, alterando-se, em sendo o caso, os ônus sucumbenciais.
c) Que na hipótese de não acolhimento dos pedidos anteriores, haja a reforma parcial da Sentença, no senti do de determinar a devolução simples, a redução do valor da condenação e a compensação da quantia recebida pela Parte Adversa, devendo, essa, ser realizada de forma atualizada desde a época do depósito (juros e correção);
d) Que o cômputo dos juros ocorra, exclusivamente, à partir do arbitramento decorrente da Decisão Judicial, sendo certo que, como a Decisão que advirá deste Órgão Colegiado promoverá alteração no Julgado, pleiteia-se ainda que tais juros somente iniciem após o trânsito em julgado da demanda ou, na pior das hipóteses, após a data do julgamento deste Recurso;
) Caso não entenda dessa forma, pugna que seja reduzido o quantum indenizatório por dano moral por tratar-se de valor extremamente alto, importando num enriquecimento ilícito, o que é defeso frente ao que dispõe a legislação pátria, sob pena de representar verdadeiro enriquecimento sem causa da parte autora. (
evento 65, APELAÇÃO1
)
Apresentadas as contrarrazões (
evento 71, CONTRAZ1
), os autos ascenderam a esta Corte
É o relatório.
DECIDO
Inicialmente, registre-se a possibilidade de julgamento do presente recurso por decisão unipessoal, tendo em vista que, sobre as matérias de direito alegadas, a posição desta Corte, assim como do Superior Tribunal de Justiça, é uniforme, sendo necessário ressaltar que o julgamento monocrático do feito encontra amparo nos incisos XV e XVI do art. 132 do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça, os quais dispõem, respectivamente, que são atribuições do Relator, além de outras previstas na legislação processual, "
negar provimento a recurso nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça
", ou quando, "
depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento a recurso nos casos previstos no inciso V do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando a decisão recorrida for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça
".
Da mesma forma, o art. 932, VIII, do Código de Processo Civil, preconiza que incumbe ao Relator "
exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal
", pelo que não há prejuízo no julgamento monocrático deste feito.
Dito isso, verifica-se que o Réu, primeiro, reiterou as teses preliminares de ausência de interesse de agir e de prescrição, as quais foram assim examinadas e afastadas na sentença:
II - Das Preliminares:
a) Da
Falta de Interesse de Agir
A parte ré suscitou a FALTA DE INTERESSE DE AGIR, ao argumento de que, ante a ausência de requerimento administrativo, inexiste pretensão resistida, razão pela qual é desnecessária a prestação da tutela jurisdicional para a satisfação da pretensão deduzida em juízo.
Contudo, razão não lhe assiste.
Isso porque dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil que
a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito
(inciso XXXV do artigo 5º) .
Trata-se do Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, também previsto no artigo 3º do Código de Processo Civil, que garante o acesso à justiça.
Dessa feita, entende-se que, como regra, não se pode restringir o acesso à jurisdição, exigindo-se do Autor o pleito administrativo prévio como condição à propositura da ação na via judicial. Embora seja possível que a lei faculte ao particular um procedimento administrativo, este não pode ser obstáculo para o acesso à Jurisdição.
Segundo a doutrina processual, o interesse de agir possui dois aspectos: utilidade/adequação e necessidade.
Assim, o interesse de agir consubstancia-se na necessidade de a parte socorrer-se ao Poder Judiciário para ver o seu direito material efetivado por meio da prestação de uma tutela jurisdicional, assim como na adequação da via processual eleita para a satisfação da pretensão posta em juízo.
Portanto,
"O
interesse
de
agir
consubstancia-se no binômio “necessidade-utilidade”, correspondente à necessidade de o titular do direito material alegado recorrer às vias judicias, no intuito de obter um provimento jurisdicional a ele favorável, bem como à adequação do pedido ao procedimento escolhido."
(TJSC, Apelação Cível nº. 2006.028122-0, de Tubarão. Rel. Desa. Salete Silva Sommariva, j. Terceira Câmara de Direito Civil, em 16.01.2007).
A exigência de prévio requerimento administrativo liga-se ao interesse processual sob o aspecto da necessidade.
No caso em tela, havia, sim, necessidade, tendo em vista que a atuação do Estado-Juiz era imprescindível para a satisfação da pretensão da parte autora.
Somente de modo excepcional é que é possível obstaculizar o ingresso primeiro ao Judiciário. Ora, diz-se "excepcional", porque toda vez que o legislador constituinte quis excepcionar, ele o fez. Assim, à luz da Constituição, existe condição para o ingresso no Judiciário nas situações ligadas à Justiça do Trabalho, nos dissídios coletivos de natureza econômica, à Justiça Desportiva, quanto a competições.
Em demandas específicas envolvendo concessão de benefício previdenciário (RE 631240 – Tema 350) o Supremo Tribunal Federal entendeu pela necessidade de requerimento prévio. Tal entendimento, porém, foi excepcional.
A demanda em questão não se encaixa nessas hipóteses excepcionadas. Latente é, portanto, o interesse processual de agir da parte autora.
O argumento de que, no caso em tela, haveria necessidade de pleito administrativo prévio não procede.
Isso porque a previsão de procedimento específico não vincula o Interessado, o qual pode optar por propor demanda na via administrativa ou judicial.
Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência que
"[...] É pacífico o entendimento no sentido de que a contestação do mérito em sede judicial, por si só, configura a pretensão resistida e, portanto, o
interesse
de
agir
da parte autora, não se exigindo o prévio requerimento na esfera administrativa."
(TRF4, APELREEX nº 2004.72.04.003250-4. Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona, j. 16/06/2009).
Não obstante seja importante e salutar a resolução de litígios por meios alternativos, não se admite exigir-se o pleito administrativo como condição para a ação judicial, sob pena de afronta ao acesso à justiça, direito fundamental imanente do Estado Democrático de Direito.
Assim sendo, considerando que não há mácula no exercício do direito de ação, está afastada qualquer alegação de falta de interesse de agir.
Destarte, a preliminar aventada não merece amparo.
[...]
d) Da Prefacial de Prescrição:
Suscitou, ainda, a parte ré, a prejudicial de mérito de prescrição, ao argumento de que a pretensão indenizatória estaria prescrita.
Contudo, melhor sorte não lhe socorre.
Isso porque a presente ação tem por objeto a declaração de inexistência de débitos decorrentes de descontos indevidamente lançados em benefício previdenciário da parte autora, sujeita ao Código de Defesa do Consumidor, de modo que se aplica ao caso o prazo quinquenal, consoante o disposto no art. 27 do referido diploma legal,
in verbis
:
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria
.
Ademais, o prazo prescricional, nas ações declaratórias de inexistência de débito cumuladas com pedidos de repetição de indébito e indenização por danos morais, tem como termo inicial a data do último desconto realizado no benefício previdenciário do consumidor, visto que se trata de contrato de prestações continuadas.
Com efeito,
O instituto da
prescrição
é regido pelo princípio da actio nata, ou seja, o curso do prazo prescricional tem início com a efetiva lesão ou ameaça do direito tutelado, momento em que nasce a pretensão a ser deduzida em juízo. (AgRg no REsp 1148236/RN, j. em 07/04/2011).
(Mandado de Segurança n. 2011.006893-4, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 9-5-2012).
Ora, o pleito indenizatório tem por fundamento os descontos mensais indevidos que ocorrem junto ao benefício previdenciário percebido pela parte autora, em razão de empréstimo consignado supostamente celebrado com a parte ré.
Deste modo, resta evidente que o conhecimento do fato que deu ensejo à pretensão deduzida nos autos, não ocorreu com o contrato celebrado, mas sim mês a mês, quando ocorre o desconto indevido junto ao benefício previdenciário percebido pela parte autora.
Por conseguinte, não há o que falar em prescrição da pretensão ressarcitória.
Ora,
Em se tratando de pretensão de reparação de danos morais e/ou materiais dirigidas contra a Fazenda Pública, o termo inicial do prazo prescricional de cinco anos (aplicação do art. 1º do Decreto n. 20.910/32)
é contado da data em que a vítima ficou ciente do dano em toda a sua extensão.
Aplica-se, no caso, o princípio da actio nata, uma vez que não se pode esperar que alguém ajuíze ação para reparação de danos antes de ter ciência desses danos. (REsp 931896, rel. Min. Humberto Martins)
(TJSC, Apelação Cível n. 2011.095675-6, de Chapecó, rel. Des. Carlos Adilson Silva , j. 31-07-2012).
Então,
O termo inicial da
prescrição
coincide com o momento da ocorrência da lesão ao direito, consagração do princípio universal da actio nata
(TJSC, Apelação Cível n. 2011.064065-7, da Capital, rel. Des. Vanderlei Romer, j. 27-09-2011).
Neste sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
[...]
Em igual sentido, colhe-se do egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
[...]
Por fim:
[...]
Destarte, a prejudicial aventada não merece amparo. (
evento 56, SENT1
)
Como se vê, a prejudicial relativa à falta de interesse de agir foi afastada porque, na ótica do Juízo de origem, "
O argumento de que, no caso em tela, haveria necessidade de pleito administrativo prévio não procede
", o que reflete o posicionamento desta Corte de Justiça, que reconhece que não se apresenta como condição ao direito de ação a
comprovação da prévia reclamação administrativa, pois, do contrário, há direta afronta à garantia constitucional de inafastabilidade do Judiciário (Art. 5º, XXXV, da CRFB/88).
Nesse sentido:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - OBRIGAÇÕES - RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - SENTENÇA EXTINTIVA SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO (ART. 485, VI, DO CPC) - RECURSO DO AUTOR - TESE DE DISPENSABILIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTOADMINISTRATIVO - PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO E DO ACESSO À JUSTIÇA - ART. 5º, INC. XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DE ACESSO À JUSTIÇA - PROCESSO QUE NÃO SE ENCONTRA EM CONDIÇÕES DE IMEDIATO JULGAMENTO (ART. 1.013, §3º, INC. I, DO CPC) - RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA PROSSEGUIMENTO DO FEITO - SENTENÇA CASSADA - RECURSO PROVIDO.
Como o art. 5º, XXXV, da CF garante o livre acesso ao Judiciário, é ilícito exigir-se a solução alternativa de conflitos para o exercício do direito à jurisdição. (Apelação Civel n
o
5001855-92.2021.8.24.0051. Relator Desembargador Monteiro Rocha. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 10.11.2022)
Na mesma linha:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. INSURGÊNCIA DA AUTORA. TESE DE DISPENSABILIDADE DO PRÉVIO REQUERIMENTOADMINISTRATIVO. SUBSISTÊNCIA. DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DAS VIAS ADMINISTRATIVAS PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO INDENIZATÓRIA. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO (CF/88, ART. 5º, XXXV). PROCESSO QUE NÃO SE ENCONTRA EM CONDIÇÕES DE IMEDIATO JULGAMENTO (CPC, ART. 1.013, § 3º, I). RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Apelação Cível n
o
5000072-52.2022.8.24.0141. Relatora Desembargadora Rosane Portella Wolff. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 13.10.2022)
Da mesma forma, é incabível a preliminar de prescrição, pois, de fato, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, "
fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor
" (AgInt no AREsp 1728230 / MS. Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze. Terceira Turma. j. em 8.3.2021)
Na mesma linha já decidiu este Tribunal: "
em se tratando de demanda cuja causa de pedir está relacionada à contratação de empréstimo consignado fraudulento, plenamente aplicável o prazo prescricional quinquenal estabelecido no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor
" (Apelação Cível n°
:
5001665-39.2020.8.24.0060. Relatora Desembargadora Rosane Portella Wolff. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 28.2.2021) .
Estabelecida a aplicação do prazo quinquenal do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, tem-se que o termo inicial do prazo, como ressaltou o Magistrado, é contado a partir do dano causado ao consumidor, mais especificamente o último dano provocado, ou seja, o último desconto indevido de cada contrato bancário.
Nesse norte:
No tocante ao termo inicial do prazo prescricional, o Tribunal de origem entendeu sendo a data do último desconto realizado no benefício previdenciário da agravante, o que está em harmonia com o posicionamento do STJ sobre o tema: nas hipóteses de ação de repetição de indébito, "o termo inicial para o cômputo do prazo prescricional corresponde à data em que ocorreu a lesão, ou seja, a data do pagamento" (AgInt no AREsp n. 1056534/MS, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2017, DJe 3/5/2017).
Incidência, no ponto, da Súmula 83/STJ. (AgInt no AREsp 1372834 / MS. Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO. Quarta Turma. j. em 26.3.2019).
Desta Câmara de Direito Civil, no mesmo sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. JUÍZO A QUO QUE DECIDIU PELA EXTINÇÃO DO FEITO, EM RAZÃO DA DECADÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. PLEITEADA REFORMA DO DECISUM. ACOLHIMENTO. FATOS NARRADOS NA INICIAL QUE TRATAM DE DESCONTOS MENSAIS RELATIVOS A EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E NÃO CARTÃO DE CRÉDITO (RMC). INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DE 5 (CINCO) ANO PREVISTO NO ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, O QUAL TEM POR TERMO INICIAL O ÚLTIMO DESCONTO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO NÃO OBSERVADA. DESCONTITUIÇÃO DA SENTENÇA, COM O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Apelação Cível n
o
5012965-32.2021.8.24.0005. Desta Relatoria. j. em 8.9.2022)
Sendo assim, porque todos os contratos impugnados pelo Autor foram supostamente firmados no ano de 2021 (
evento 1, INIC1
, fl. 3), evidente que não transcorreu o prazo de 5 (cinco) anos para o reconhecimento da prescrição.
Devidamente afastadas, assim, as prefaciais aventadas, adentra-se o exame do mérito recursal, no qual o Réu apontou a regularidade da contratação bancária, sobretudo ao argumento de que "
o extenso lapso temporal decorrido entre o primeiro desconto ou o desconto em 30/03/2021 e a data da distribuição da ação 19/08/2024, ou seja, o importe de mais de 3 anos, aponta em sentido contrário ao alegado à exordial, posto que, se de fato indevidos os descontos em relação ao produto contratado, a parte autora certamente deles teria reclamado em tempo anterior
" (
evento 65, APELAÇÃO1
, fl. 10).
Em que pesem as alegações, melhor sorte não assiste ao Réu, pois, como bem registrado na sentença, "
não restou demonstrado nos autos que as assinaturas apostas nos contratos de empréstimo consignado objeto da presente demanda pertencem à parte autora, ônus que incumbia à parte ré
" (
evento 56, SENT1
)
Com efeito, ao julgar o Recurso Especial n
o
1846649/MA, representativo da controvérsia relativa ao TEMA n
o
1.061, o Superior Tribunal de Justiça sinalizou a afirmação da tese de que, "
Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II)
".
Veja-se:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO PROFERIDO EM IRDR. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DOCUMENTO PARTICULAR.IMPUGNAÇÃO DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA. ÔNUS DA PROVA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
1. Para os fins do art. 1.036 do CPC/2015, a tese firmada é a seguinte: "Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II)."
2. Julgamento do caso concreto.
2.1. A negativa de prestação jurisdicional não foi demonstrada, pois deficiente sua fundamentação, já que o recorrente não especificou como o acórdão de origem teria se negado a enfrentar questões aduzidas pelas partes, tampouco discorreu sobre as matérias que entendeu por omissas. Aplicação analógica da Súmula 284/STF.
2.2. O acórdão recorrido imputou o ônus probatório à instituição financeira, conforme a tese acima firmada, o que impõe o desprovimento do recurso especial.3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão,desprovido. (REsp n
o
1846649/MA. Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze. Segunda Seção. j. em 24.11.2021).
No mesmo sentido, tem-se deste Tribunal:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA EMPRESA RÉ.
ALEGADA A INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NÃO ACOLHIMENTO. ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA ABERTA. EXEGESE DA SÚMULA 563 DO STJ. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
MÉRITO. PRETENSA REFORMA DA SENTENÇA. ALEGADA REGULARIDADE NA CONTRATAÇÃO. INSUBSISTÊNCIA.
RÉU QUE APRESENTA O CONTRATO SUPOSTAMENTE ASSINADO PELA AUTORA. FIRMA NEGADA EXPRESSAMENTE PELA AUTORA. COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA QUE ERA ÔNUS DO RÉU, NOS TERMOS DO ART. 429, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
INEXISTÊNCIA, NO ENTANTO, DE COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE. RÉU QUE NÃO PLEITEOU A PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DESTA. SENTENÇA MANTIDA.
[...]
REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível n
o
5002295-43.2019.8.24.0024. Relator Desembargador Rubens Schulz. Segunda Câmara de Direito Civil. j em 3.12.2020)
Igualmente:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E COMPENSATÓRIA DE DANOS MORAIS. DESCONTOS MENSAIS SUPOSTAMENTE INDEVIDOS EFETUADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA PELA ASSOCIAÇÃO RÉ. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIAS DE AMBAS AS PARTES. INSISTÊNCIA DA RÉ NA REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO COM AMPARO EM TERMO DE ADESÃO.
AUTORA QUE, CONTUDO, EXPRESSAMENTE IMPUGNOU A AUTENTICIDADE DA ASSINATURA NELE APOSTA EM SEU NOME. ÔNUS DE PROVAR A VERACIDADE DO DOCUMENTO QUE INCUMBE A QUEM APRESENTA, SOB PENA DE ARCAR COM AS CONSEQUÊNCIAS DA INÉRCIA. RÉ QUE, INSTADA A ADIANTAR OS HONORÁRIOS PERICIAIS PARA FINS DE REALIZAÇÃO DE PROVA GRAFOTÉCNICA, SOB PENA DE DESISTÊNCIA, QUEDOU-SE INERTE. RELAÇÃO JURÍDICA NÃO COMPROVADA.
DESCONTOS INDEVIDOS. RESTITUIÇÃO DOS VALORES QUE DEVE SE DAR DE FORMA SIMPLES. AUSÊNCIA DE MÁ FÉ DA ASSOCIAÇÃO. DANOS MORAIS DEMONSTRADOS. DESCONTOS MENSAIS APTOS A CAUSAR ABALO ANÍMICO. PRIVAÇÃO DE PARTE DA RENDA EM RAZÃO DE SERVIÇO NÃO CONTRATADO. ESTABELECIMENTO DA REPARAÇÃO PECUNIÁRIA DO PREJUÍZO EXTRAPATRIMONIAL EM R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS). PRETENSÃO RECURSAL DA DEMANDANTE PELA MAJORAÇÃO E DA DEMANDADA PELA MINORAÇÃO. RECHAÇO. ADEQUAÇÃO FRENTE AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS NO MÍNIMO LEGAL. CAUSA DE REDUZIDA COMPLEXIDADE. SENTENÇA MANTIDA INTEGRALMENTE. RECURSOS DESPROVIDOS. (Apelação Cível n
o
5000882-39.2019.8.24.0074. Relator Desembargador Saul Steil. Terceira Câmara de Direito Civil. j. em 7.12.2021)
Importante observar que o Superior Tribunal de Justiça, em melhor análise sobre a questão referente à autenticidade de assinaturas constantes em contratos bancários, passou a admitir a possibilidade de outros meios de prova, além da perícia grafotécnica, para a comprovação da relação jurídica entre consumidor e instituição financeiras. Confira-se:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. INEXIGIBILIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO CUMULADA COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO E DANOS MORAIS. REGULARIDADE NA CONTRATAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBLIDADE. SÚMULA N. 7/STJ.
1. O Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema n. 1061 firmou a seguinte tese: "na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II).".
2.
Havendo impugnação da autenticidade da assinatura constante de contrato bancário por parte do consumidor, caberá à instituição financeira o ônus de provar sua autenticidade, mediante perícia grafotécnica ou outro meio de prova
.
3. Hipótese em que o acórdão recorrido está em consonância com o Tema 1061 do STJ tendo em vista que a instituição financeira, através de outros meios de prova, comprovou a relação contratual firmada entre as partes.
4. Rever as conclusões a que chegou o Tribunal de origem acerca da legitimidade dos descontos, ante a comprovação da contratação regular e a similaridade das assinaturas, demandaria o reexame de fatos e provas, o que é vedado ao STJ, em recurso especial, por esbarrar no óbice da Súmula n. 7 do STJ.
Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp n. 2.114.745/PR, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 19/8/2024, DJe de 22/8/2024 - grifou-se)
Ocorre que, na hipótese
sub judice
, não havia outras provas que não a perícia grafotécnica capazes de dirimir a dúvida acerca da veracidade da assinatura da Autora, em especial porque, devidamente intimado para especificar as provas que pretendia produzir, o Réu se manifestou afirmando que "
não possui mais provas para indicar e requer o julgamento antecipado do feito
" (
evento 42, PET1
).
Sendo assim, porque não houve por parte da instituição bancária o cumprimento do dever de comprovar a relação jurídica com a Autora, a manutenção da responsabilidade civil pelos prejuízos causados é medida que se impõe.
Na sequência, subsidiariamente, o Réu impugnou a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, afirmando que "
a parte autora não traz aos autos qualquer evidência, ou mero indício de que tais cobranças lhe causaram danos que ultrapasse a esfera do mero aborrecimento
" (
evento 65, APELAÇÃO1
, fl. 13).
Sobre a questão, importa observar que o Grupo de Câmaras de Direito Civil deste Tribunal de Justiça admitiu na data de 15.8.2022 o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n
o
5011469-46.2022.8.24.0000, no qual se pretendia a discussão do seguinte tema: "
É (não é) presumido o dano moral quando há o desconto indevido em benefício previdenciário decorrente da inexistência da efetiva contratação do empréstimo consignado (fato negativo)"
(TEMA 25).
Na sessão de julgamento do dia 11.8.2023, "
o Egrégio Grupo de Câmaras de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por maioria, [...], fixar a seguinte tese:
Não é presumido o dano moral quando o desconto indevido em benefício previdenciário decorrer de contrato de empréstimo consignado declarado inexistente pelo Poder Judiciário
, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado
" (IRDR n
o
5011469-46.2022.8.24.0000. Relator Desembargador Marcos Fey Probst).
Destaca-se que a Segunda Câmara de Direito Civil desta Corte, alinhada à posição alcançada no referido Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, já possuía o entendimento de que "
a mera incidência de descontos indevidos em benefício previdenciário não enseja, presumidamente, abalo anímico no prejudicado. Isso porque os danos morais apenas se justifica quando há verdadeira violação a algum dos direitos da personalidade, os quais gozam, inclusive, de proteção constitucional
" (Apelação Cível n
o
5006228-65.2021.8.24.0020. Relatora Desembargadora Rosane Portella Wolff. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 31.3.2022).
No mesmo norte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO BANCO RÉU.
PRETENSA REFORMA DA SENTENÇA. ALEGADA CONTRATAÇÃO VÁLIDA. INSUBSISTÊNCIA. BANCO RÉU QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR DE MANEIRA INEQUÍVOCA A SUPOSTA CONTRATAÇÃO DO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PELA AUTORA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO HÁBIL A COMPROVAR A CONTRATAÇÃO. ÔNUS QUE LHE CABIA, NOS TERMOS DO ART. 373, II, DO CPC. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA QUE DEVE SER MANTIDA.
[...]
DANO MORAL. ALMEJADO O AFASTAMENTO. ACOLHIMENTO. DESCONTO INDEVIDO QUE, POR SI SÓ, NÃO GERA A PRESUNÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE O EVENTO TENHA CAUSADO CONSEQUÊNCIA GRAVE E LESIVA À DIGNIDADE DA AUTORA. SITUAÇÃO QUE NÃO DESBORDA O MERO ABORRECIMENTO. AUTORA QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR SITUAÇÃO EXCEPCIONAL ADVINDA DA NARRATIVA DOS FATOS. ABALO ANÍMICO NÃO EVIDENCIADO. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA.
REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS, NA FORMA DA FUNDAMENTAÇÃO.
RECURSO DO BANCO RÉU CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível n
o
5025428-53.2020.8.24.0033. Relator Desembargador Rubens Schulz. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 26.8.2021)
Igualmente:
DIREITO CIVIL - OBRIGAÇÕES - RESPONSABILIDADE CIVIL - SERVIÇOS BANCÁRIOS - DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - IMPROCEDÊNCIA EM 1º GRAU - RECURSO DO AUTOR - 1. PRESCRIÇÃO - INOCORRÊNCIA - PREFACIAL AFASTADA - 2. REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO - ASSINATURA DO AUTOR - INACOLHIMENTO - FIRMA NEGADA EXPRESSAMENTE PELO AUTOR - AUTENTICIDADE A SER CONFIRMADA POR PERÍCIA GRAFOTÉCNICA - DESISTÊNCIA EXPRESSA DA PRODUÇÃO DA PROVA - CONTRATAÇÃO ILEGÍTIMA - 3. DEVER DE INDENIZAR ABALO MORAL - COMPROMETIMENTO DE RENDA - INCOMPROVAÇÃO - MERO DISSABOR - INDENIZAÇÃO AFASTADA - RECURSO DO REQUERIDO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
[...]
3. Desconto não autorizado por pensionista, a título de mensalidade, sem nenhum reflexo moral ou econômico grave, não enseja indenização porque a tolerância é um dos esteios do ordenamento jurídico. (Apelação Cível n
p
0304370-79.2016.8.24.0054. Relator Desembargador Monteiro Rocha. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 27.10.2021)
Com base no entendimento supra, fica claro, na esteira do que decidiu o Magistrado, que houve abalo anímico em razão da conduta ilícita praticada pelo Réu, mormente porque as parcelas descontadas da pensão por morte de R$ 1.315,47 auferida pela Autora somaram a quantia total de R$ 140,90 (cento e quarenta reais e noventa centavos), ou seja, houve a redução de mais de 10% (dez por cento) do benefício previdenciário.
Daí porque, no caso em tela, há presunção de comprometimento da subsistência do beneficiário, de modo que é necessário reconhecer que efetivamente houve dano moral indenizável, o que, inclusive, encontra amparo na jurisprudência desta Corte de Justiça, que assim já decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PRETENSAMENTE NÃO CONTRATADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELA MENSAL SUPERIOR A 10% (DEZ POR CENTO) DO BENEFÍCIO. PRESUNÇÃO DE COMPROMETIMENTO DA SUBSISTÊNCIA DO PENSIONISTA. DANO ANÍMICO VERIFICADO. INDENIZAÇÃO IMPERATIVA. [...] (Apelação Cível n° 5014957-28.2021.8.24.0005. Relator Desembargador Eduardo Gallo Jr.. Sexta Câmara de Direito Civil. j. em 19.12.2023).
Igualmente:
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - DESCONTOS INDEVIDOS REALIZADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO QUE NÃO INFLUÍRAM CONSIDERAVELMENTE NO ORÇAMENTO DO PENSIONISTA - ABALO ANÍMICO NÃO CARACTERIZADO - RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E DESPROVIDO.
A mera ocorrência de descontos indevidos em benefício previdenciário não é automaticamente indutora de abalo anímico. Para que o dano moral reste configurado, o decote financeiro deve ser igual ou superior a 10%, o que, presume-se, teria potencial capaz de influir no orçamento do pensionista. (Apelação Cível n° 5000097-72.2021.8.24.0053. Relator Desembargador Roberto Lepper. Sexta Câmara de Direito Civil. j. 14.2.2023).
Mantém-se, portanto, o pagamento de indenização por danos morais e, não obstante o pleito subsidiário de redução do
quantum
indenizatório, entende-se que o patamar de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) é condizente com as particularidades do caso.
Cumpre ressaltar, nesse ponto, que não há no ordenamento jurídico pátrio parâmetros rígidos para a fixação do valor da indenização por dano moral, de modo que prevalece na doutrina e jurisprudência o entendimento de que a delimitação da quantia devida fica adstrita ao prudente arbítrio do juiz, que deve se pautar pelas peculiaridades do caso concreto, à luz dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, a fim de evitar o enriquecimento ilícito.
A respeito do tema, leciona Carlos Alberto Bittar:
A indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que não se aceita o comportamento assumido, ou evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser a quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante (Reparação civil por danos morais. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 233).
Nesse entendimento, verifica-se que, em casos dessa natureza, a Segunda Câmara de Direito Civil deste Tribunal de Justiça entende proporcional e razoável a fixação da indenização em torno de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a depender das particularidades do caso, o qual se mostra suficiente para reprimir o ato ilícito praticado e, também, compensar o abalo sofrido.
Para corroborar:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - OBRIGAÇÕES - RESPONSABILIDADE CIVIL - EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO - DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - SENTENÇA QUE RECONHECEU A FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO DO DESCONTO - PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS EM 1º GRAU - RECURSO DA AUTORA - 1. MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO POR ABALO MORAL - BINÔMIO RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - VALOR ADEQUADO - 2. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - APLICAÇÃO DO ART. 85, § 2º, DO CPC -VERBA INADEQUADA - AUMENTO ACOLHIDO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E EM PARTE PROVIDO.
1. Mantém-se o quantum indenizatório em patamar que respeita os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, com valor que não seja fonte de lucro à vítima e que não gere revolta ao patrimônio moral do ofendido.
[...]
Sopesando as peculiaridades do caso e visando uma valoração razoável e proporcional ao dano, entendo adequado o montante arbitrado em sentença,
motivo pelo qual mantenho o quantum em R$ 5.000,00, valor este que não gera desvalia ao patrimônio moral do ofendido e sanciona pedagogicamente o ofensor.
(Apelação Cível n
o
0000948-89.2014.8.24.0071. Relator Desembargador Monteiro Rocha. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 5.4.2021 - grifou-se)
Sendo assim, fixado em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), não há desproporcionalidade capaz de ensejar a modificação do
quantum
indenizatório, que deve ser mantido tal como arbitrado na sentença, inclusive com a manutenção do termo de incidência dos juros moratórios, que foi aplicado "
a contar do evento danoso
" (
evento 56, SENT1
), o que encontra-se em consonância com o enunciado da Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça: "
Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual
".
A propósito: "
Em repetição de indébito por ilícito extracontratual, incidem correção monetária pelo INPC e juros moratórios de 1% ao mês desde o evento danoso
" (Apelação Cível no 0016428-03.2009.8.24.0. Relator Desembargador Monteiro Rocha. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 3.8.2023).
Ato contínuo, o Réu impugnou a forma com que foi condenado à repetição do indébito, pois, conforme argumentou, "
a devolução como foi realizada na sentença, isto é, da forma dobrada, é incabível para situações como a do presente caso
", sobretudo porque, em relação às parcelas decorrentes dos contratos impugnados, "
todas elas foram cobradas de boa-fé
" (
evento 65, APELAÇÃO1
, fl. 14).
Sem razão, sabe-se que a restituição em dobro de valor cobrado indevidamente é medida prevista pelo artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, sendo que, conforme o mais recente entendimento do Superior Tribunal sobre a matéria, a repetição dobrada pressupõe tão somente a inexistência de engano justificável, não se podendo deixar de aplicar tal determinação apenas porque
"foram cobradas de boa-fé
" (
evento 65, APELAÇÃO1
, fl. 14), como alegou a instituição financeira.
É o que decidiu a Corte Superior no julgamento dos Embargos de Divergência n
o
600663/RS, de Relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura:
Os requisitos legais para a repetição em dobro na relação de consumo são a cobrança indevida, o pagamento em excesso e a inexistência de engano justificável do fornecedor. A exigência de indícios mínimos de má-fé objetiva do fornecedor é requisito não previsto na lei e, a toda evidência, prejudica a parte frágil da relação.
Na mesma linha:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES.
[...]
RECURSO DO AUTOR. PRETENSA CONDENAÇÃO DA RÉ À DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS. ACOLHIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE EVIDENCIA OS DESCONTOS INDEVIDOS REALIZADOS PELA PARTE RÉ. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO DO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PELO AUTOR.
RESTITUIÇÃO DOS VALORES DEVIDA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ. ÔNUS DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ DE COMPROVAR O ENGANO JUSTIFICÁVEL. EXEGESE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO DO CDC. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE FIXOU TESE EM EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SENTIDO DA PRESCINDIBILIDADE DA COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE COBROU O VALOR INDEVIDO. CONDENAÇÃO EM DOBRO QUE MOSTRA-SE APLICÁVEL NOS CASOS DE CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA
(STJ, EARESP 676.608/RS). RESTITUIÇÃO DOS VALORES EM DOBRO DEVIDA. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO.
[...]
RECURSOS CONHECIDOS, SENDO DESPROVIDO DO RÉU E PARCIALMENTE PROVIDO DO AUTOR. (Apelação Cível n
o
5001785-40.2020.8.24.0074. Relator Desembargador Rubens Schulz. Segunda Câmara de Direito Civil. j. em 18.11.2021 - grifou-se)
Dispensável, portanto, a comprovação de má-fé para que seja devida a restituição em dobro, devendo somente estar evidenciada a conduta contrária à boa-fé objetiva.
Nesse passo, caberia ao Réu comprovar o engano justificável, o que não foi o caso, pois, como visto, não foram tomadas as devidas cautelas na cobrança dos valores, os quais não possuíam respaldo contratual, advindo daí a culpa pela desídia nos descontos mensais, que devem ser restituídos em dobro, como determinado na sentença.
Por fim, requereu o Réu "
a devolução atualizada do valor pago em favor do recorrido ou o abatimento – também atualizado - deste valor do montante total da condenação, posto que devidamente comprovado o recebimento e utilização dos valores, pela Recorrida
" (
evento 65, APELAÇÃO1
, fl. 15).
Nesse ponto, entretanto, não há interesse recursal por parte da instituição financeira, pois o Magistrado já determinou na sentença "
a dedução do valor comprovadamente recebido por conta do empréstimo, que deverá ser igualmente atualizado
" (
evento 56, SENT1
).
Por sinal: "
Inexistindo sucumbência, não deve ser conhecido de pleito acolhido anteriormente, tendo em vista a falta de interesse recursal
" (TJSC. Apelação n° 0008515-97.2018.8.24.0018. Rel. Des. Sidney Eloy Dalabrida. j. 06-06-2024).
No mais, em observância ao artigo 85, §§ 2º e 11º, do Código de Processo Civil e considerando o trabalho adicional exercido pelo procurador da parte Autora em sede recursal, fixam-se os honorários recursais em favor do patrono em 10% (dez por cento) incidente sobre o montante já fixado na sentença.
À vista do exposto, por decisão monocrática terminativa, conheço parcialmente do recurso e, na parte conhecida, nego-lhe provimento.
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