Processo nº 5007090-54.2024.4.03.6000
ID: 283526824
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 5007090-54.2024.4.03.6000
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LUCAS TADEU COIADO GALHARDE
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5007090-54.2024.4.03.6000 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDE…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5007090-54.2024.4.03.6000 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: GLAUCIA DIAS TOSTES Advogado do(a) APELADO: LUCAS TADEU COIADO GALHARDE - SP355866-A OUTROS PARTICIPANTES: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5007090-54.2024.4.03.6000 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: GLAUCIA DIAS TOSTES Advogado do(a) APELADO: LUCAS TADEU COIADO GALHARDE - SP355866-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra a sentença de Id n. 315194192, que deferiu o pedido de levantamento do sequestro de quatro veículos, determinado nos Autos n. 5004164-08.2021.4.03.6000, da 5ª Vara Federal de Campo Grande (MS), no curso das investigações da Operação Romeu Sierra India, que apura a prática do delito de crimes financeiros e lavagem de dinheiro. Alega-se, em síntese, o quanto segue: a) a restrição imposta aos veículos em questão foi ordenada no âmbito da da denominada Operação Romeu Sierra Índia, que desmantelou organização criminosa formada para cometer crimes financeiros através da empresa Rsi Negócios Financeiros, atuando por meio de corretores e por páginas na internet, que ofereciam serviços de administração de carteira de valores mobiliários, sem o devido registro/autorização da Comissão de Valores Mobiliários, além de outros ilícitos; b) a restituição de bens apreendidos e o levantamento de indisponibilidade no âmbito dos delitos de lavagem de dinheiro baseia-se na prova da onerosidade do negócio realizado; da capacidade financeira do requerente; e da ausência de elementos indicativos de envolvimento do requerente com a organização criminosa; c) a apelada é esposa de Vinícius Pereira Alves Tostes, denunciado por integrar a organização criminosa nos autos da Ação Penal n. 5001171-21.2023.403.6000, atuando direta e pessoalmente na captação de novos clientes (e, consequentemente, de novos recursos) para investirem na Rsi Negócios Financeiros, além de agir como assessor de investimentos sem autorização legal, bem como prestando apoio direto a Diego Rios, líder da Organização Criminosa; d) Vinícius Tostes foi denunciado pela prática dos crimes previstos no art. 16 da Lei n. 7.492/86, art. 27-E da Lei n. 6.385/76, art. 171, caput, do Código Penal (com imputação subsidiária do art. 2º, IX, da Lei 1.521/51) e art. 2º da Lei n. 12.850/2013, todos na forma do art. 29 e 69 do Código Penal. e) a denúncia aponta elementos indicativos de envolvimento da apelada com a associação criminosa; f) no que diz respeito à capacidade financeira e à onerosidade dos negócios, não foram juntados documentos comprobatórios relativos a nenhum dos veículos requeridos; g) considerando que a apelada é casada com um dos integrantes da organização criminosa, é imprescindível que fosse demonstrada a comprovação induvidosa da origem lícita do bem e a desvinculação do referido bem com os fatos apurados na investigação e com os recursos movimentados por seu marido, o que não foi suficientemente comprovado; h) não foi demonstrada a boa-fé da requerente, a ausência de vínculo com a OrCrim, a capacidade financeira e a licitude da origem do valor dos bens cujas indisponibilidades foram retiradas pelo Juízo a quo; i) o veículo I/LR R.ROVER SPORT3.0 SE, Placas MKM1025, foi objeto do embargos de terceiro n. 5000229-52.2024.4.03.6000, em que Ivete Aparecida Pimentel afirmava ter adquirido o veículo de Gláucia Dias Tostes em 03.11.20, por R$ 70.000,00 (setenta mil reais); j) os embargos foram julgados improcedentes em razão de não terem sido juntados documentos comprobatórios, o que suscita dúvidas acerca da real propriedade do veículo; k) requer a reforma da sentença para que seja mantida a indisponibilidade sobre os veículos VW Virtus HL AD, Placas QAS 7814; Fiat Strada WK CC E, Placas QAL 3245; I LR R.Rover Sport3.0 SE, Placas MKM 1025; e VW Kombi, Placas EDP 4982 (Id n. 315194196). O presente feito foi livremente distribuído à relatoria do Exmo. Des. Fed. Mauricio Kato, nesta 5ª Turma, e após consultas ao SIAPRO - Sistema Informatizado de Acompanhamento Processual e ao Sistema PJe – Processo Judicial Eletrônico desta Corte, foi redistribuído à minha relatoria em razão da anterior distribuição do HCCrim n. 5027234-12.2021.4.03.0000 e da ApCrim n. 5007757-45.2021.4.03.6000, além de outros processos sigilosos, relativos aos feitos n. 5004164-08.2021.4.03.6000 e n. 5000088-66.2020.4.03.6002, mencionados no Id n. 315194186, p. 1 e aos feitos n. 5002603-46.2021.4.03.6000 e n. 5004164-08.2021.4.03.6000, mencionados no Id n. 315194188, p. 3 (Id n. 315577630). Foram apresentadas contrarrazões (Id n. 319706512). O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Marcus Vinícius de Viveiros Dias, manifestou-se pelo provimento da apelação (Id n. 320003990). É o relatório. Dispensada a revisão, nos termos regimentais. APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5007090-54.2024.4.03.6000 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: GLAUCIA DIAS TOSTES Advogado do(a) APELADO: LUCAS TADEU COIADO GALHARDE - SP355866-A V O T O Trata-se de sequestro determinado nos Autos da medida cautelar n. 5004164-08.2021.4.03.6000, distribuídos por dependência aos autos do Inquérito Policial n. 5000088-66.2020.4.03.6002, da Operação Romeu Sierra Índia, que investigou organização criminosa que atuava no mercado imobiliário por meio de instituição financeira, empresa RSI Negócios Financeiros, sem autorização do órgão competente, captando recursos e investidores no sistema de pirâmide financeira. As investigações deram origem às Ações Penais n. 5008059- 74.2021.4.03.6000 (sócios e mentores) e 5001171-21.2023.4.03.6000 (núcleo dos corretores, captadores de recursos). A apelada, Gláucia Dias Tostes, protocolou pedido de levantamento de sequestro dos veículos VW Virtus HL AD, Placas QAS 7814; Fiat Strada WK CC E, Placas QAL 3245; I LR R.Rover Sport3.0 SE, Placas MKM 1025; e VW Kombi, Placas EDP 4982, sustentando que não fora denunciada nos Autos n. 5001171-21.2023.4.03.6000, sendo desnecessária a medida. O Juízo da 5ª Vara Federal de Campo Grande deferiu o requerimento, conforme decisão que reproduzo: Compulsando os autos principais, verifica-se que a requerente não foi denunciada e o inquérito policial contra si instaurado, arquivado (ID 279374848). Nesse cenário, entendo que não subsiste a medida assecuratória patrimonial na medida em que sua finalidade precípua é, essencialmente, salvaguardar bens em quantidade suficiente para a hipotética reparação do dano, impedindo a dilapidação do patrimônio da pessoa investigada. É certo que o mero não oferecimento de denúncia não necessariamente leva ao desbloqueio dos bens constritos, mas, por outro lado, no caso concreto não há notícia de que a requerente continue investigada pelos fatos sub judice. Aliás, como destacado na petição inicial, colhe-se da cota ministerial de ID 276531003 da ação penal que “[...] não foram produzidas provas suficientes de que era corretora da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS, sendo as suspeitas de que suas contas foram usadas pelo marido, VINÍCIUS TOSTES, que foi denunciado. Portanto, ausente provas de seu conhecimento [referindo-se a GLÁUCIA DIAS TOSTES] sobre as irregularidades (elemento subjetivo).” Ainda que assim não fosse, a jurisprudência pátria firmou a compreensão de que embora o prazo aludido no art. 131, inc. I, do Código de Processo Penal não seja peremptório, pois a caracterização do excesso de prazo não decorre do simples decurso temporal, mas de razoável análise casuística, é inadmissível que a constrição seja perpetuada no tempo se inexistente sólida demonstração da efetiva necessidade. A propósito, cito julgados: (...) Diante do exposto, defiro o requerimento de GLÁUCIA DIAS TOSTES e, independentemente do trânsito em julgado, determino o levantamento da restrição judicial advinda dos autos de n. 5004164-08.2021.4.03.6000 sobre os automóveis VW/VIRTUS HL AD de placas QAS7814/MS, FIAT/STRADA WK CC E de placas QAL3245/MS, I/LR R. ROVER SPORT3.0 SE de placas MKM1025/MS e VW/KOMBI de placas EDP4982/MS, todos de propriedade da requerente, e extingo o processo com resolução de mérito, na forma do art. 487, I do CPC c/c art. 3º do Código de Processo Penal (Id n. 315194192). O Ministério Público Federal interpôs a presente apelação requerendo a manutenção da indisponibilidade sobre os bens por ser a apelada esposa de Vinícius Pereira Alves Tostes, denunciado como integrante da organização criminosa, atuando na captação de novos clientes, assessor de investimentos sem autorização legal e prestando apoio direto a um dos líderes da organização. Sustenta a acusação que Vinícius Tostes, marido da apelada, foi denunciado pela prática dos crimes previstos no art. 16 da Lei n. 7.492/86, art. 27-E da Lei 6.385/76, art. 171, caput, do Código Penal (com imputação subsidiária do art. 2º, IX, da Lei n. 1.521/51) e art. 2º da Lei n. 12.850/2013, todos na forma do art. 29 e 69 do Código Penal, havendo registros de que o denunciado utilizava a conta de Gláucia em favor da empresa RSI, além de não ter sido juntado nenhum documento comprobatório da capacidade financeira e da onerosidade dos negócios jurídicos sobre nenhum dos veículos, que pudessem comprovar a origem lícita dos veículos. Por fim, afirma que o veículo LR R.Rover foi objeto de embargos de terceiro de pessoa que dizia ter adquirido o veículo de Gláucia em 03.11.20. Assiste razão ao Ministério Público Federal. Conforme denúncia nos Autos n. 5001171-21.2023.4.03.6000, a apelada, a despeito de não ter sido denunciada, não desconhecia os fatos e teve sua conta bancária utilizada em favor da organização criminosa: O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por seus membros subscritores, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, especialmente a prevista no art. 129, inciso I, da Constituição Federal, oferece DENÚNCIA em desfavor de: (…) 10. VINÍCIUS PEREIRA ALVES TOSTES, brasileiro, portador do CPF n. 336.887.058-07, nascido em 17/09/1986, com endereço na Rua Rodrigues Alves, n. 164, Bairro da Granja, Ponta Porã/MS; em virtude dos seguintes fatos criminosos: 1- IMPUTAÇAÃO FÁTICA E JURÍDICA 1. Imputação fática 1: No período compreendido aproximadamente entre março de 2018 a novembro de 2019, no município de Dourados/MS, os denunciados LUCELENA DA SILVA, CESAR TRINDADE, ARMANDO CASTELLAN, FELIPE PRETO, ADRIANA CALDEIRA, RENATO VASQUEZ, CAIQUE VEIGA, SALOMÃO CORREA, MATEUS MACHADO e VINÍCIUS TOSTES, dolosamente e cientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, concorreram com os já denunciados CLODOALDO PEREIRA DOS SANTOS, LUCAS CARVALHO LOPES, DIEGO RIOS DOS SANTOS e JOSÉ PAULO ALFONSO BARROS, e fizeram operar instituição financeira, sem autorização do órgão regulador, contribuindo para a captação de recursos de terceiros na monta estimada de R$ 40.000.000,00 (quarenta milhões de reais), administrando-os, e aplicando-os parcialmente no mercado de valores mobiliários. Imputação fática 2: 2. Nas mesmas condições de tempo e lugar, os denunciados LUCELENA DA SILVA, CESAR TRINDADE, ARMANDO CASTELLAN, FELIPE PRETO, ADRIANA CALDEIRA, RENATO VASQUEZ, CAIQUE VEIGA, SALOMÃO CORREA, MATEUS MACHADO e VINÍCIUS TOSTES, de forma consciente e voluntária, e de comum acordo entre si e com terceiros que lhes contrataram, exerceram e concorreram para o exercício, no mercado de valores mobiliários, de atividade de administrador de carteira de tais valores, sem que nenhum deles possuísse autorização ou registro perante a Comissão de Valores Mobiliários – CVM, em que pese essa autorização seja necessária e indispensável. Imputação fática 3: 3. Nas mesmas condições de tempo e lugar, os denunciados LUCELENA DA SILVA, CESAR TRINDADE, ARMANDO CASTELLAN, FELIPE PRETO, ADRIANA CALDEIRA, RENATO VASQUEZ, CAIQUE VEIGA, SALOMÃO CORREA, MATEUS MACHADO e VINÍCIUS TOSTES, após a captação dos recursos de terceiros por meio do funcionamento aparentemente regular da instituição financeira por dado período de tempo, com o ingresso constante de novos investidores em claro esquema de pirâmide financeira, concorreram para que os denunciados CLODOALDO DOS SANTOS, LUCAS CARVALHO, DIEGO RIOS e JOSÉ PAULO obtivessem vantagem ilícita consistente no proveito financeiro de milhões de reais, em prejuízo de centenas de vítimas induzidas a erro em virtude do meio fraudulento acima descrito, ja que esses últimos sacaram parte dos respectivos valores imediatamente, sem sequer aplicá-los no mercado financeiro. Posteriormente, os líderes da organização apropriaram-se de todos os valores investidos e ainda remanescentes, os quais, atualmente, encontram-se em lugar desconhecido. Imputação fática 4: 4. Nas mesmas condições de tempo e lugar, LUCELENA DA SILVA, CESAR TRINDADE, ARMANDO CASTELLAN, FELIPE PRETO, ADRIANA CALDEIRA, RENATO VASQUEZ, CAIQUE VEIGA, SALOMÃO CORREA, MATEUS MACHADO e VINÍCIUS TOSTES integraram organização criminosa, pois estavam associados entre si e com terceiros, de forma estruturada e ordenada, com divisão de tarefas, com o objetivo de obter diretamente vantagem econômica mediante a captação irregular de recursos de terceiros, sua aplicação parcial no mercado de capitais, bem como o saque imediato de altas quantias (estelionato) até que, finalmente, DIEGO RIOS se apropriou do valor ainda existente por ocasião do colapso da empresa, ocorrido entre maio e agosto de 2019. (…) 11. Conforme apurado, aproximadamente entre março de 2018 e novembro de 20194, no município de Dourados/MS, funcionou a empresa RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS LTDA (CNPJ 09.118.176/0001-17), que oferecia por meio de seus corretores e por suas páginas na internet - https://www.investimentos.rsi.com/ e https://www.facebook.com/rsiinvestimentos/ - serviços de administração de carteira de valores mobiliários, sem o devido registro/autorização da Comissão de Valores Mobiliários, condutas essas que se amoldam àquelas capitulados nos Art. 27- E, da Lei 6.385/76. 12. 492740082 12. A atuação da empresa era feita à revelia da CVM, que expediu, em 25/06/2019, ordem para a imediata suspensão da veiculação no Brasil de qualquer oferta de serviço de administração de carteiras de valores mobiliários pela empresa, ordem essa descumprida pela RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS. Daí que a CVM tenha reiterado a ordem em março de 2020. 13. Tendo por base esses fatos, foi verificado que a RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS possuía cadastro ativo na Receita Federal e capital social de R$ 100.000,00 (cem mil reais) divididos entre seus sócios: CLODOALDO DOS SANTOS, com 75% das cotas; e LUCAS CARVALHO com 25% das cotas. 14. O CNPJ vinculado à RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS inicialmente foi cadastrado como pertencente à empresa S. S. CORREA, sediada em Ponta Porã/MS, tendo ocorrido a mudança de nome e de endereço em 26/02/2018 15. No bojo de tais alterações contratuais, em 22/05/2019, foi lavrada em cartório procuração pública na qual os sócios da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS concedem plenos e amplos poderes, por tempo indeterminado, ao denunciado CESAR TRINDADE), residente na cidade de Ponta Porã/MS, destacando-se no documento a possibilidade de atuação perante diversas instituições financeiras. 16. Conforme consta dos seus atos constitutivos, a RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS é uma microempresa que tem como principal atividade econômica a intermediação e agenciamento de serviços e negócios financeiros. 17. Segundo informações obtidas no site da empresa, que atualmente encontra-se inativo, a RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS seria uma consultoria de investimentos fundada em 2016 com extensa experiência e sucesso nesse ramo de atividade. 18. Em que pese a aparência de empresa séria e de operar de forma regular e sólida, as investigações demonstram que a RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS funcionava de forma diversa à apresentada oficialmente e, diferentemente do que se espera de uma microempresa em termos de faturamento, captou e intermediou recursos de terceiros na casa dos milhões de reais. 19. Após extenso trabalho investigativo, o material coletado demonstrou a existência de um sofisticado e convincente esquema de captação de dinheiro, com a suposta finalidade de investimentos agressivos na bolsa de valores, utilizando a modalidade day trade, de modo que ao final de cada dia se obtinha o resultado líquido da operação, com garantia de ganhos muito acima dos valores praticados no mercado, que seriam, no mínimo, de 10%8. (…) 37. No decorrer da investigação, foi apurada a existência, muito bem definida, de três núcleos de atuação e atribuições no seio do grupo criminoso, quais sejam: o núcleo dos sócios (gestão), o núcleo dos corretores e o núcleo de apoio logístico. 38. O núcleo dos sócios é composto por aqueles que possuem participação ostensiva (formal) ou oculta na RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS e, como tal, são os responsáveis pela aplicação no mercado de capitais dos valores investidos pelos clientes na empresa além dos outros crimes ora denunciados. Trata-se do núcleo que detém o poder de gestão, mormente sobre a destinação dos recursos captados. 39. Os sócios foram, também, os maiores beneficiados com os prejuízos causados aos investidores em decorrência da mal administração dos recursos de terceiros, em especial porque a maior parte dos valores investidos na RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS encontram-se ocultados por esses e foram sacados ainda quando a empresa aparentava regular funcionamento e logo após serem investidos. (…) 45. Na presente ação penal, são denunciados como integrantes do núcleo dos corretores as seguintes pessoas: A - LUCELENA DA SILVA; B – SALOMÃO CORREA; C - RENATO VASQUEZ; D - FELIPE PRETO; E- ADRIANA CALDEIRA; F- CAIQUE VEIGA; G- VINÍCIUS TOSTES. 46. Por fim, há o núcleo de apoio logístico composto pelos indivíduos que formularam o site da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS, o manual de investimentos, e por aqueles que receberam vultosas quantias depositadas pelos investidores da empresa em suas contas pessoais a título de investimento na empresa para aplicação no mercado de valores mobiliários. (…) 51. Estima-se que o esquema criminoso tenha movimentado mais de R$ 40 milhões, como narrado acima, sendo que a maior parte dessa quantia não retornou ao patrimônio das vítimas que suportaram o prejuízo. (…) 53. A quantidade de vítimas que já ingressaram com ações de ressarcimento é muito inferior ao número total de pessoas que foram lesadas, o que demonstra a sofisticação da fraude, bem como o exercício da atividade financeira por razoável período, gerando confiança nos investidores/vítimas, o que levou à escalada de atuação do grupo criminoso e à magnitude da lesão provocada. 54. Frisa-se que, conforme depoimento do investigado ARMANDO CASTELLAN, responsável pelo site da empresa, estima-se que a RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS tenha angariado cerca de 5.000 clientes durante seu período de operação. (…) 5.10. VINÍCIUS TOSTES 175. No período de atuação da organização criminosa, VINÍCIUS TOSTES concorreu com as atividades ilícitas desenvolvidas por CLODOALDO DOS SANTOS, LUCAS CARVALHO, DIEGO RIOS e JOSÉ PAULO, dedicando-se direta e pessoalmente na captação de novos clientes (e, consequentemente, de novos recursos) para investirem na RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS, atuando como assessor de investimentos sem autorização legal para tanto, bem como prestando apoio direto a DIEGO RIOS, líder da OrCRIM. 176. VINÍCIUS TOSTES é apontado pelas vítimas como um dos corretores mais ativos e atuantes da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS, mantendo contato direto com os possíveis clientes da empresa, apresentando-lhes o negócio, as faixas de investimento e lucratividade altíssima e impraticável (e, por isso, atrativa). Ele também emprestou sua conta para utilização em favor da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS para saques e depoísitos. 177. JOSÉ PAULO aponta VINÍCIUS TOSTES como corretor da RSI. (...) 181. Por sua vez, a análise dos dados bancários de VINÍCIUS TOSTES sinaliza que ele movimentou em suas contas bancárias, no período abrangido pela quebra de sigilo bancário (01/01/2017 a 17/05/2021), o montante de - ao menos - R$ 1.213.659,41 (crédito) e R$ R$ 1.205.565,69 (débito), valores incompatíveis com sua renda de policial militar de Mato Grosso do Sul. 182. VINICIUS TOSTES disse ter investido na RSI NEGOÓCIOS FINANCEIROS o valor de R$ 102 mil através de sua esposa, GLAUCIA DIAS. No entanto, os débitos para GLAUCIA DIAS somam R$ 47.210,00 e os creíditos R$ 87.751,20 no período analisado, de forma que o casal teve lucro de ao menos R$ 40 mil com a prática criminosa. 183. A Receita Federal também aponta que VINÍCIUS TOSTES teve movimentação financeira muito superior aos rendimentos. 184. A forma pela qual os valores foram movimentados na conta de VINÍCIUS TOSTES sugerem que foram atividades ilícitas. Isto porque durante o período analisado foram recebidos cerca de R$ 306 mil em créditos e enviados pouco mais de R$ 464 mil em débitos de/para pessoas desconhecidas. 185. Ouvido sobre os fatos105, VINÍCIUS TOSTES disse ter investido R$ 102 mil por meio de sua esposa na empresa, e que nada recebeu da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS. Feita análise dos dados bancários, não foi possível localizar esse suposto investimento de R$ 102 mil nas contas da RSI NEGÓCIOS FINANCEIROS. 186. Diante disso, as evidências dos autos dão conta de que VINÍCIUS TOSTES concorreu para o funcionamento irregular de instituição financeira, exerceu e concorreu para o exercício no mercado de valores mobiliários de atividade de administrador de carteira, bem como prestou auxílio material para que centenas de crimes de estelionato fossem praticados por meio da obtenção de ganhos ilícitos em detrimento de número indeterminado de pessoas mediante a prática de pirâmide financeira. 187. Por fim, estava o denunciado VINÍCIUS TOSTES associado com diversas outras pessoas, especialmente CLODOALDO DOS SANTOS, LUCAS CARVALHO, DIEGO RIOS e JOSÉ PAULO para cometimento de vários crimes, dentre eles o de estelionato, exercendo no seio criminoso a função de captação de clientes e de recursos, atribuição relevante no funcionamento da OrCrim” (Excertos retirados do parecer ministerial, Id n. 320003990). Conforme se comprova pela leitura da denúncia, Gláucia tinha conhecimento da utilização de suas contas bancárias para os negócios do marido, ainda que não tenha atuado diretamente como corretora da RSI Negócios Financeiros. Atuando Vinícius Tostes como Policial Militar, a renda movimentada, que superava a casa dos milhões, permite a conclusão de que os bens adquiridos pelo casal tenham origem nos delitos cometidos pelo denunciado, marido da apelada. Conforme apontou a acusação, não foi juntado pela apelante nenhum documento que permita comprovar, sem sombra de dúvidas, a origem lícita dos veículos, havendo ainda um dos veículos com registro de compra por terceiro (Id n. 315999911). Tratando-se o sequestro de medida cautelar de natureza patrimonial, que visa garantir o ressarcimento dos danos causados em caso de condenação, o art. 125, analisado em conjunto com o art. 132, ambos do Código de Processo Penal, estabelece que cabe o sequestro dos bens adquiridos com os proventos da infração, ainda que já tenham sido transferidos a terceiro. Não havendo comprovação da capacidade econômica que evidencie a origem lícita dos valores utilizados para a compra dos veículos, bem como da onerosidade das transações, que confirmem, sem sombra de dúvida, a boa-fé da apelada, é o caso de manter-se a constrição sobre os bens. Ainda que não denunciada, há indícios suficientes de que os bens estão relacionados à prática criminosa, como é o caso, em que há fartas evidências de que os veículos são fruto dos valores obtidos de forma ilícita. Por fim, as medidas assecuratórias, como a retenção e sequestro de bens pelo juízo criminal, devem se pautar pelo princípio da razoabilidade, podendo o Juízo rever sua decisão quando fatos supervenientes implicarem alterações no cenário processual (Informativo 17 – STJ, EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp n. 1.792.372 (PR), Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, 5ª Turma, j. 08/03/22). Dessa forma, por ora, havendo fortes indícios de que os bens são fruto de crime, sem comprovação de sua origem lícita, deve ser mantido o sequestro sobre os veículos. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para manter o sequestro sobre os veículos VW Virtus HL AD, Placas QAS 7814; Fiat Strada WK CC E, Placas QAL 3245; I LR R.Rover Sport3.0 SE, Placas MKM 1025; e VW Kombi, Placas EDP 4982. É o voto. E M E N T A PENAL. PROCESSO PENAL. INCIDENTE DE RESTITUIÇÃO. CRIMES FINANCEIROS. TERCEIRO NÃO DENUNCIADO. ENVOLVIMENTO COM OS FATOS. ORIGEM DO BEM NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Sequestro determinado em feito que investigou organização criminosa com atuação no mercado imobiliário por meio de instituição financeira, sem autorização do órgão competente, captando recursos e investidores no sistema de pirâmide financeira. 2. Pedido de levantamento de bens por terceira, não denunciada, esposa de denunciado com grande participação nos eventos criminosos. 3. Não havendo comprovação da capacidade econômica que evidencie a origem lícita dos valores utilizados para a compra dos veículos, bem como da onerosidade das transações, que confirmem, sem sombra de dúvida, a boa-fé da apelada, é o caso de manter-se a constrição sobre os bens. 4. Apelação ministerial provida para manter o sequestro sobre os veículos VW Virtus HL AD, Placas QAS 7814; Fiat Strada WK CC E, Placas QAL 3245; I LR R.Rover Sport3.0 SE, Placas MKM 1025; e VW Kombi, Placas EDP 4982. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade decidiu DAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para manter o sequestro sobre os veículos VW Virtus HL AD, Placas QAS 7814; Fiat Strada WK CC E, Placas QAL 3245; I LR R.Rover Sport3.0 SE, Placas MKM 1025; e VW Kombi, Placas EDP 4982, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. ANDRE NEKATSCHALOW Desembargador Federal
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