Processo nº 5000341-06.2021.8.13.0312
ID: 335865378
Tribunal: TJMG
Órgão: 2ª Vara Cível, Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de Ipanema
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 5000341-06.2021.8.13.0312
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Ipanema / 2ª Vara Cível, Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de Ipanema Avenida 7 de Setembro, 1030, Cent…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Ipanema / 2ª Vara Cível, Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de Ipanema Avenida 7 de Setembro, 1030, Centro, Ipanema - MG - CEP: 36950-000 PROCESSO Nº: 5000341-06.2021.8.13.0312 CLASSE: [CÍVEL] AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) ASSUNTO: [Vigilância Sanitária e Epidemológica, Interesses ou Direitos Difusos] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: CLAUDINEI SOARES LOUZADA CPF: não informado e outros SENTENÇA RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS contra EVANDRO DIAS GOMES CAMPOS, LUCAS ALEXANDER DE ANDRADE SILVA e CLAUDINEI SOARES LOUZADA, todos devidamente qualificados nos autos. Narra a exordial (ID 2856746421), em síntese, que os requeridos, em flagrante desrespeito às normas sanitárias vigentes durante a pandemia de COVID-19, promoveram e participaram de eventos que resultaram em grande aglomeração de pessoas. Sustenta que, em 20 de março de 2021, período em que o Município de Ipanema/MG se encontrava classificado na "onda roxa" do plano Minas Consciente, o réu Evandro Dias Gomes Campos organizou uma festa com aproximadamente sessenta pessoas na propriedade do réu Claudinei Soares Louzada, localizada no Córrego Limoeiro. Agravando a situação, alega que o réu Lucas Alexander de Andrade Silva, ciente de seu diagnóstico positivo para COVID-19 e sob a obrigação de cumprir isolamento domiciliar até 23 de março de 2021, descumpriu a determinação sanitária e participou do referido evento, expondo os demais presentes a elevado risco de contágio. Relata, ainda, que, após a intervenção da Vigilância Sanitária e da Polícia Militar, que resultou na autuação dos envolvidos, o réu Evandro Dias Gomes Campos teria utilizado suas redes sociais para debochar da fiscalização, publicando vídeos e áudios nos quais zombava das medidas de proteção e incitava a continuidade de tais encontros. Ademais, no dia seguinte, 21 de março de 2021, o mesmo réu Evandro foi novamente flagrado na propriedade do réu Claudinei, na companhia de outras seis pessoas, em nova situação de aglomeração, o que culminou em sua prisão em flagrante pelo crime de desobediência. Diante da gravidade dos fatos e do manifesto descaso dos requeridos com a saúde pública, o Ministério Público pleiteou, em sede de tutela de urgência, a determinação para que os réus se abstivessem de promover, organizar ou participar de quaisquer novos eventos capazes de gerar aglomerações, sob pena de multa. No mérito, pugnou pela confirmação da medida liminar e pela condenação dos réus ao cumprimento de obrigação de não fazer, a veicular em suas redes sociais mensagens de conscientização sobre as normas de prevenção ao contágio da COVID-19 e, por fim, ao pagamento de indenização por danos morais coletivos e danos sociais, cada um no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a serem revertidos ao Fundo Estadual do Ministério Público (FUNEMP). A petição inicial veio instruída com vasta documentação, incluindo o Procedimento Investigatório Criminal nº MPMG-0312.21.000043-5 (ID 2856746422), boletins de ocorrência (IDs 2856746425, 2856746427, 2856746429), e materiais de mídia digital (ID 2856746428). A tutela de urgência foi deferida por este Juízo (ID 2859921429), determinando que os réus se abstivessem da prática de novos atos ou eventos que gerassem aglomeração, sob pena de multa. Os réus foram devidamente citados e intimados da decisão liminar, conforme mandados juntados aos autos (IDs 3020551418, 3020551441 e 3020531454). O réu Claudinei Soares Louzada apresentou contestação (ID 3198401432), arguindo, em sede preliminar, sua ilegitimidade passiva, ao argumento de que apenas cedeu gratuitamente a chácara ao corréu Evandro, sem ter conhecimento de que seria realizada uma festa com aglomeração, e que não se encontrava na cidade na data dos fatos. Suscitou, ainda, a inépcia da petição inicial por ausência de descrição pormenorizada de sua conduta. No mérito, negou a existência de danos sociais e morais coletivos, reiterando que não possuía intenção de contribuir para a realização de evento clandestino. Pugnou pelo acolhimento das preliminares ou, subsidiariamente, pela improcedência dos pedidos. Requereu, ao final, os benefícios da justiça gratuita. Os réus Evandro Dias Gomes Campos e Lucas Alexander de Andrade Silva, embora regularmente citados, não apresentaram contestação no prazo legal, conforme certificado (ID 3794892994), o que ensejou a decretação de sua revelia por meio da decisão de ID 10122211891. O Ministério Público apresentou impugnação à contestação (ID 4797213265), rechaçando as preliminares arguidas e, no mérito, reiterando os termos da exordial. Realizada audiência de conciliação, a tentativa de acordo restou infrutífera (ID 6517063019). Em decisão de saneamento (ID 10165183006), as preliminares de inépcia da inicial e ilegitimidade passiva foram afastadas, fixando-se como pontos controvertidos a verificação da inobservância das normas de prevenção ao contágio da COVID-19 pelos réus e a existência de danos morais coletivos e sociais indenizáveis. Na mesma oportunidade, foi deferida a produção de prova oral. Durante a fase de instrução, realizou-se audiência (ID 10443379315), na qual foram ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes. Os réus Evandro e Lucas, embora intimados para depoimento pessoal, não compareceram ao ato. As partes apresentaram suas alegações finais por memoriais. O Ministério Público (ID 10478649911) pugnou pela procedência parcial dos pedidos, para condenar os réus Evandro Dias Gomes Campos e Lucas Alexander de Andrade Silva nos termos da inicial, e pela improcedência em relação ao réu Claudinei Soares Louzada, por entender não comprovado o dolo ou culpa deste último. A defesa do réu Claudinei (ID 10479198865), por sua vez, reiterou os termos de sua contestação, pleiteando a improcedência dos pedidos em relação a si. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório do essencial. Fundamento e decido. FUNDAMENTAÇÃO O processo encontra-se em ordem, sem nulidades a serem sanadas. As condições da ação e os pressupostos processuais de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo estão presentes. As preliminares foram devidamente analisadas e rechaçadas na decisão de saneamento (ID 10165183006), cujos fundamentos ora reitero, operando-se a preclusão. Passo, pois, à análise do mérito da causa. A controvérsia central da presente demanda reside em apurar a responsabilidade civil dos requeridos pela promoção e participação em eventos com aglomeração de pessoas durante o período mais crítico da pandemia de COVID-19, em desrespeito às normativas sanitárias vigentes, e a consequente configuração de danos morais coletivos e danos sociais. O contexto em que os fatos se inserem é de notória gravidade. Em março de 2021, o Estado de Minas Gerais e, especificamente, o Município de Ipanema, vivenciavam a fase mais restritiva do plano de contingenciamento da pandemia, a denominada "onda roxa". Tal classificação implicava a imposição de medidas severas, como a suspensão de atividades não essenciais e a expressa proibição de realização de eventos, festas e quaisquer reuniões que pudessem gerar aglomeração, com o objetivo precípuo de conter a disseminação do vírus SARS-CoV-2 e evitar o colapso do sistema de saúde, que já operava em sua capacidade máxima, conforme amplamente noticiado e demonstrado pelo boletim epidemiológico juntado aos autos (ID 2856746430), que indicava 239 casos ativos e 27 óbitos no município. Nesse cenário de calamidade pública, a conduta esperada de cada cidadão era a de máxima cautela e estrita observância às determinações do poder público, em um esforço coletivo para a preservação da vida e da saúde de toda a comunidade. Contudo, o conjunto probatório carreado aos autos demonstra, de forma inequívoca, que os réus Evandro Dias Gomes Campos e Lucas Alexander de Andrade Silva agiram em sentido diametralmente oposto, com manifesto desprezo pela vida e pela saúde coletiva. A responsabilidade do réu Evandro Dias Gomes Campos restou sobejamente comprovada. Ele não apenas foi o organizador do evento clandestino ocorrido em 20 de março de 2021, como confessou tal fato em seu termo de declarações perante a autoridade policial (ID 3198616418), admitindo ter promovido uma "reunião de amigos" com aproximadamente dezoito pessoas. As testemunhas ouvidas em juízo, em especial os agentes públicos que atuaram na fiscalização, foram uníssonas em confirmar a ocorrência do evento e a posição de Evandro como responsável. O policial militar Vinícius Ferreira Werneck declarou em audiência que, ao chegar ao local, "tinha várias pessoas numa festa" e que "o Evandro se apresentou como o promotor do evento". A reprovabilidade da conduta de Evandro é exponenciada pela sua reação posterior à fiscalização. Conforme narrado na inicial e corroborado pelos depoimentos, o réu utilizou suas redes sociais para debochar das autoridades e das medidas sanitárias, publicando conteúdos em tom de escárnio e incitando a continuidade das aglomerações. O áudio em que convida outras pessoas a retornarem à chácara no dia seguinte, dizendo "tá paga mesmo, vamos embora, quem anima?", é a materialização de seu dolo e de sua completa indiferença para com as consequências de seus atos. A reiteração da conduta no dia 21 de março de 2021, quando foi novamente flagrado com outras pessoas no mesmo local, culminando em sua prisão por desobediência, coroa a sua postura de afronta deliberada à ordem pública e sanitária. Sua revelia, decretada nestes autos, reforça a presunção de veracidade dos fatos que lhe são imputados, nos termos do art. 344 do Código de Processo Civil. Quanto ao réu Lucas Alexander de Andrade Silva, sua responsabilidade é igualmente inconteste. A prova documental, notadamente o boletim de ocorrência de ID 9893472052, é clara ao atestar que o requerido havia sido diagnosticado com COVID-19 e estava formalmente notificado para cumprir período de isolamento domiciliar. Ao descumprir deliberadamente a quarentena para participar de uma festa com “dezenas” de pessoas, o réu praticou ato de extrema irresponsabilidade, colocando em risco concreto e iminente a saúde e a vida de todos os presentes, que, por sua vez, poderiam se tornar vetores de transmissão do vírus para seus familiares e para a comunidade em geral. A sua conduta, além de configurar ilícito civil, constituiu infração de medida sanitária preventiva, tanto que resultou na lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência. Sua revelia, da mesma forma, corrobora os fatos alegados pelo autor. Por outro lado, no que tange ao réu Claudinei Soares Louzada, proprietário do imóvel onde os eventos ocorreram, a análise probatória conduz a uma conclusão diversa. Em sua contestação, alegou ter apenas cedido o imóvel a Evandro, a título de favor, sem conhecimento de que seria utilizado para a realização de festas. Em seu depoimento na fase inquisitorial, o próprio Evandro afirmou que Claudinei "sabia que ia só uns amigos mais chegado, pra uma social entre amigos" (ID 3198616418). Embora tal declaração indique que Claudinei não era completamente alheio a uma reunião de pessoas, não há nos autos prova robusta de que ele tivesse ciência da dimensão do evento, da reiteração da conduta ou da participação de uma pessoa sabidamente infectada. A testemunha de defesa, Selmir José Rodrigues, ouvida em juízo, corroborou a versão de que o empréstimo da chácara se deu a título de favor e que Claudinei "ficou chateado" com o ocorrido, sendo uma pessoa "direita, trabalhadora, sistemática". O próprio Ministério Público, em suas alegações finais (ID 10478649911), reconheceu a insuficiência de provas quanto ao dolo ou culpa do réu Claudinei, pugnando pela improcedência do pedido em relação a ele. De fato, para a configuração da responsabilidade civil, é indispensável a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta do agente e o dano, o que, no caso de Claudinei, não restou demonstrado com a certeza necessária para um decreto condenatório. A mera propriedade do imóvel, por si só, sem a prova de sua adesão subjetiva ao propósito ilícito dos demais réus, não é suficiente para imputar-lhe a responsabilidade pelos danos causados. Assim, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade civil dos réus Evandro Dias Gomes Campos e Lucas Alexander de Andrade Silva e a improcedência do pedido em relação a Claudinei Soares Louzada. Do Dano Moral Coletivo e do Dano Social Configurado o ato ilícito praticado pelos réus Evandro e Lucas, passa-se à análise da ocorrência dos danos extrapatrimoniais alegados pelo Ministério Público. O dano moral coletivo se caracteriza pela lesão injusta e intolerável a valores fundamentais de uma coletividade, independentemente da prova de dor ou sofrimento individual. Trata-se de uma violação ao patrimônio moral da comunidade, que transcende a esfera individual dos seus membros. No caso em tela, a conduta dos réus Evandro e Lucas atingiu frontalmente valores essenciais para a sociedade ipanemense durante a pandemia. Em um momento de luto coletivo, de sacrifícios diários por parte da esmagadora maioria da população e de sobrecarga extrema dos profissionais de saúde, a promoção de festas clandestinas e a quebra de quarentena por pessoa infectada representam um profundo abalo no sentimento de solidariedade, de respeito à vida e de confiança nas instituições. A ostensiva zombaria e o desprezo demonstrados por Evandro em suas redes sociais agravaram a lesão, gerando na coletividade um sentimento de indignação, impotência e injustiça, configurando, assim, o dano moral coletivo, que se presume in re ipsa a partir da própria gravidade do fato. Por sua vez, o dano social distingue-se do dano moral coletivo por seu caráter de rebaixamento do nível de segurança e tranquilidade da sociedade. Ele decorre de comportamentos socialmente reprováveis que, por sua natureza, diminuem a qualidade de vida coletiva e geram um custo social. A indenização por dano social possui uma função eminentemente punitiva e dissuasória, visando desestimular a reiteração de condutas lesivas à sociedade. A conduta dos réus Evandro e Lucas também se amolda perfeitamente a essa categoria de dano. Ao promoverem a aglomeração de dezenas de pessoas, uma das quais sabidamente portadora de um vírus altamente contagioso, os réus não apenas violaram normas, mas também criaram um risco concreto e mensurável de um surto localizado da doença. Tal atitude representa um rebaixamento deliberado do nível de segurança sanitária da comunidade, gerando um custo social difuso, seja pelo potencial aumento da demanda sobre o já combalido sistema de saúde, seja pela intranquilidade e insegurança impostas a toda a população. A jurisprudência tem reconhecido a autonomia e a cumulatividade de ambas as espécies de dano. Conforme bem decidido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais em caso análogo, a participação em eventos clandestinos durante a pandemia caracteriza ato ilícito e gera responsabilidade civil por dano moral coletivo: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUSÊNCIA DE INQUÉRITO CIVIL PRÉVIO. DESNECESSIDADE. NULIDADE POR VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO MORAL COLETIVO. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS SANITÁRIAS DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelações cíveis interpostas contra sentença que condenou os réus ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, em razão da participação em eventos clandestinos com aglomeração de pessoas durante a pandemia de COVID-19, em descumprimento das normas municipais e federais de enfrentamento da crise sanitária. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há quatro questões em discussão: (i) definir se a ausência de inquérito civil prévio acarreta falta de interesse de agir do Ministério Público; (ii) verificar se há nulidade processual por vício de representação em razão da renúncia das advogadas sem a devida comunicação do mandante; (iii) estabelecer se houve cerceamento de defesa pela ausência de instrução probatória adequada; e (iv) determinar a responsabilidade civil dos réus por dano moral coletivo, bem como a proporcionalidade do valor indenizatório arbitrado. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O inquérito civil não constitui requisito obrigatório para o ajuizamento de ação civil pública, sendo dispensável quando o Ministério Público dispõe de elementos suficientes para a propositura da demanda, inexistindo, portanto, ausência de interesse de agir. 4. A renúncia do mandato pelas advogadas dos réus não seguiu a exigência do art. 112 do CPC, pois não houve comprovação de comunicação ao mandante. Assim, considera-se ineficaz a renúncia, permanecendo válida a representação dos réus durante a tramitação processual, inexistindo nulidade por vício de representação. 5. Não há cerceamento de defesa quando a parte teve op ortunidade de produzir provas e não se manifestou no momento oportuno, operando-se a preclusão. 6. A realização de eventos com aglomeração durante a pandemia, em desrespeito às normas sanitárias, caracteriza ato ilícito passível de responsabilização civil, configurando o dano moral coletivo, pois a conduta dos réus colocou em risco a saúde pública. 7. A indenização deve ser reduzida para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por réu apelante, considerando a proporcionalidade e a capacidade econômica dos envolvidos. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: O inquérito civil não é requisito obrigatório para a propositura da ação civil pública, podendo o Ministério Público ajuizá-la diretamente se possuir elementos suficientes. A renúncia do mandato sem a devida comunicação ao mandante não produz efeitos no processo, mantendo-se a representação válida. Oportunizada a produção de provas e não manifestado interesse pela parte, inexiste cerceamento de defesa. A participação em eventos clandestinos com aglomeração durante a pandemia de COVID-19 caracteriza ato ilícito e gera responsabilidade civil por dano moral coletivo. O valor da indenização por dano moral coletivo deve observar a proporcionalidade e a capacidade econômica dos réus, admitindo-se a redução quando cabível. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV; CC, arts. 186 e 927; CPC, arts. 112 e 373; Lei nº 13.979/2020, art. 3º, §4º. Jurisprudência relevante citada: TJSP, Apelação Cível nº 1045687-69.2021.8.26.0576, Rel. Des. Magalhães Coelho, j. 25.03.2024; TJSP, Apelação Cível nº 1001792-45.2021.8.26.0063, Rel. Des. Luiz Antonio Costa, j. 20.03.2024; TJSP, Apelação Cível nº 1009834-54.2021.8.26.0590, Rel. Des. Luís Francisco Aguilar Cortez, j. 22.06.2023. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.24.427955-0/001, Relator(a): Des.(a) Manoel dos Reis Morais , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 11/03/2025, publicação da súmula em 13/03/2025). Do quantum Indenizatório e das demais obrigações A fixação do valor da indenização por danos morais coletivos e sociais deve pautar-se pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, atendendo à dupla finalidade do instituto: compensar, ainda que de forma indireta, a coletividade pelo dano sofrido e, principalmente, desestimular a prática de atos semelhantes pelo ofensor e por terceiros (caráter pedagógico-punitivo). Deve-se considerar a gravidade da conduta, a extensão do dano potencial e a capacidade econômica dos ofensores. No presente caso, a conduta dos réus Evandro e Lucas foi de extrema gravidade, demonstrando total desrespeito pela vida humana e pela ordem social. O Ministério Público pleiteou a quantia de R$ 100.000,00 para cada tipo de dano. Considerando a reprovabilidade da conduta, o risco gerado e o necessário caráter pedagógico da medida, mas também atentando-se à capacidade econômica presumida dos réus, que não demonstraram possuir elevado patrimônio, entendo que os valores pleiteados se mostram excessivos. Assim, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e ponderando a capacidade econômica dos réus, fixo a indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) e a indenização por danos sociais no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), a serem pagos de forma solidária pelos réus Evandro Dias Gomes Campos e Lucas Alexander de Andrade Silva. Quanto às obrigações de fazer e não fazer, a confirmação da tutela de urgência, para que os réus se abstenham de promover novas aglomerações, é medida que se impõe. A obrigação de veicular em suas redes sociais a necessidade de observância das normas sanitárias também se mostra pertinente, como forma de mitigar o mau exemplo dado e de utilizar o mesmo meio pelo qual o escárnio foi propagado para promover a conscientização. DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: A) CONFIRMAR a tutela de urgência deferida no ID 2859921429. B) CONDENAR os réus EVANDRO DIAS GOMES CAMPOS e LUCAS ALEXANDER DE ANDRADE SILVA, de forma solidária, ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) e por danos sociais no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), totalizando R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a ser revertido ao Fundo Estadual do Ministério Público (FUNEMP), nos termos do artigo 13 da Lei nº 7.347/85. O valor deverá incidir juros de mora e correção monetária com base na SELIC até 30/08/2024, momento a partir do qual, por aplicação da Lei 14.905/2024, a correção monetária deverá ser baseada no IPCA e o juros de mora na taxa SELIC, deduzido o IPCA (arts. 398 e 406 do CC/2002). O termo inicial dos juros de mora para os danos morais deverá ser a data do evento danoso, enquanto o termo inicial da correção monetária, por sua vez, deve ser a data do arbitramento da indenização. C) CONDENAR os réus EVANDRO DIAS GOMES CAMPOS e LUCAS ALEXANDER DE ANDRADE SILVA na obrigação de fazer, consistente em veicular, em seus perfis pessoais nas redes sociais Instagram e Facebook, por 30 (trinta) dias consecutivos, uma postagem fixa sobre a importância da observância das normas de prevenção ao contágio de doenças infectocontagiosas, cujo conteúdo deverá ser previamente aprovado pelo Ministério Público, sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais), limitada a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). D) JULGAR IMPROCEDENTES os pedidos formulados contra o réu CLAUDINEI SOARES LOUZADA, extinguindo o processo, com resolução de mérito, em relação a ele, por insuficiência de provas de sua participação dolosa ou culposa nos atos ilícitos. Em razão da sucumbência mínima do autor, condeno os réus Evandro Dias Gomes Campos e Lucas Alexander de Andrade Silva ao pagamento das custas e despesas processuais. Deixo de condená-los em honorários advocatícios em favor do Ministério Público, por vedação constitucional e legal. Transitada em julgado, arquivem-se os autos com as devidas baixas. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Ipanema, data da assinatura eletrônica. CYNARA SOARES GUERRA GHIDETTI Juiz(íza) de Direito 2ª Vara Cível, Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de Ipanema
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