Processo nº 1002685-66.2022.8.11.0015
ID: 323234657
Tribunal: TJMT
Órgão: 5ª VARA CRIMINAL DE SINOP
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 1002685-66.2022.8.11.0015
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DENER FELIPE FELIZARDO E SILVA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA CRIMINAL DE SINOP SENTENÇA Processo: 1002685-66.2022.8.11.0015. REPRESENTANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REPRESENTANTE: JULIA SABRINA …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA CRIMINAL DE SINOP SENTENÇA Processo: 1002685-66.2022.8.11.0015. REPRESENTANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REPRESENTANTE: JULIA SABRINA PAIVA ROSA I - RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ajuizou a presente ação penal em face de FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, vulgo “Mano Zé” ou “Boquinha”, como incurso nas sanções do art. 121, § 2°, incisos I (motivo torpe) e IV (recurso que dificultou a defesa da vítima), c/c art. 29, caput, ambos do Código Penal (1º FATO), e no art. 2º, §§ 2º e 3º, da Lei nº 12.850/2013 (2º FATO), na forma do artigo 69 do Código Penal; AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA, vulgo Pimenta e JULIA SABRINA PAIVA ROSA, como incursos nas sanções do art. 121, § 2°, incisos I (motivo torpe) e IV (recurso que dificultou a defesa da vítima), c/c art. 29, caput, ambos do Código Penal (1º FATO), e no art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.850/2013 (2º FATO), na forma do artigo 69 do Código Penal. Narra a denúncia (ID 78481851 - Pág. 7): “FATO 1: Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, no dia 16 de dezembro de 2021, por volta das 22h26, na residência localizada na rua Celina Dias, quadra 17, lote 01, bairro Residencial Adriano Leitão, em Sinop/MT, AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA, FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, JULIA SABRINA PAIVA ROSA e, pelo menos quatro indivíduos não identificados até o momento, agindo com evidente animus necandi (vontade de matar), por motivação torpe e recurso que dificultou a defesa das vítimas, mataram as vítimas LAURIELSON FRANÇA SOUZA, RUBENILSON DE JESUS SILVA MONTEIRO, EMERSON RENAIO RIBEIRO PEREIRA e BRUNO BECHE GARCIA SOUSA, conforme faz prova os laudos de necrópsia de ID nº 78337870, 78337872, 78337874 e 78337876. FATO 02: Extrai-se, ademais, dos inclusos autos de inquérito policial que, em datas não determinadas, mas até o dia 16 de dezembro de 2021, os denunciados AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA, FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, JULIA SABRINA PAIVA ROSA, além de outras pessoas, de forma ordenada e com divisão de tarefas, com o objetivo de obterem vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais com penas máximas superiores a 04 (quatro) anos, integraram organização criminosa armada, denominada Comando Vermelho, executando as vítimas por serem integrantes de facção criminosa rival.” Ressai do caderno investigativo que os acusados FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, JULIA SABRINA PAIVA ROSA e AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA eram integrantes da organização criminosa Comando Vermelho e, na condição de faccionados, efetivamente atuaram na divisão de tarefas engendrada para a prática do crime de homicídio em face das vítimas, por serem estas integrantes da facção rival, denominada PCC – Primeiro Comando da Capital. Segundo consta, o acusado FERNANDO é um dos líderes da facção criminosa Comando Vermelho em Sinop, sendo responsável pela expedição de ordens ligadas ao tráfico de drogas e determinação de diversos homicídios ocorridos nesta urbe. A acusada JULIA, por sua vez, detinha a confiança do denunciado para ele. Inferiu-se que, na data dos fatos, entre as FERNANDO, tanto que era responsável por fazer a coleta do dinheiro oriundo do tráfico de drogas 17h18 e 18h00, a investigada JULIA, a mando do denunciado FERNANDO, se dirigiu até dois estabelecimentos comerciais neste município de Sinop e adquiriu quatro balaclavas (capuzes), as quais foram utilizadas pelos indivíduos não identificados para execução das vítimas. Na execução do homicídio, coube ao investigado AILTON levar os executores até a residência das vítimas. Logo, referido acusado e, pelo menos mais quatro indivíduos não identificados até o momento, deslocaram-se em um veículo Toyota Hillux, de cor branca, placa FLY-3719, dirigido pelo acusado AILTON, até a casa dos ofendidos. Ao chegarem no local, enquanto o denunciado AILTON permaneceu no interior do veículo aguardando, os indivíduos não identificados, utilizando-se das balaclavas, adentraram na residência dos ofendidos, renderam todos que estavam no local e colocaram os alvos/vítimas em um cômodo separado. Após, confirmaram suas identidades através de imagens no celular e, utilizando-se de arma de fogo, executaram-nas com diversos tiros por todo o corpo. Após, empreenderam fuga, no veículo conduzido por AILTON. Conforme restou apurado, os denunciados praticaram o crime por motivo torpe, em razão das vítimas LAURIELSON FRANÇA SOUZA, RUBENILSON DE JESUS SILVA MONTEIRO, EMERSON RENAIO RIBEIRO PEREIRA e BRUNO BECHE GARCIA SOUSA serem integrante da facção criminosa rival, denominada Primeiro Comando da Capital – PCC. Ainda, apurou-se que o delito foi perpetrado mediante recurso que dificultou a defesa das vítimas, na medida em que os denunciados, portando arma de fogo, ingressaram subitamente na residência dos ofendidos, no período noturno, quando estes estavam desarmadas no refúgio do lar, o que dificultou sobremaneira a reação defensiva. A denúncia (ID 78481851) veio acompanhada de inquérito policial nº 632/2021 (ID 78337861), contendo boletim de ocorrência às fls. ID 78337866 - Pág. 1, LAUDO PERICIAL CRIMINAL N.º 500.2.06.2022.000092-01 às fls. ID 78337868, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): RUBENILSON DE JESUS SILVA MONTEIRO às fls. ID 78337870, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): BRUNO BECHE GARCIA SOUSA às fls. ID 78337872, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): LAURIELSON FRANÇA SOUZA às fls. ID 78337874, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): EMERSON RENAIO RIBEIRO PEREIRA às fls. ID 78337876, Estudo Social às fls. ID 85204594, RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO às fls. ID 78347999, ID 78348000 e ID 78348001. Os réus tiveram sua prisão temporária decretada em 27/01/2022 (ID 74389851 dos Autos nº 1000788-03.2022.8.11.0015), tendo sido cumprido o mandado de prisão em 04/02/2022 da ré JULIA e do réu AILTON em 02/02/2022, convertidas em preventiva em 04/03/2022 (ID 78606611). Notificação do réu AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA em ID 78828819), e da ré JÚLIA SABRINA PAIVA ROSA em ID 78895616. A n. Magistrada, ao verificar que não fora expedida a citação do acusado FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, por encontrar-se em lugar incerto e não sabido, determinou pelo desmembramento do presente feito no tocante ao acusado FERNANDO, com fundamento no art. 80, do Código de Processo Penal, visando não prejudicar o andamento do processo em relação aos corréus (ID 82872634), gerando o numero 1007496-69.2022.811.0015 conforme certidão de ID 82879766. Defesa preliminar do réu AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA em ID nº 79793433 e da ré JÚLIA SABRINA PAIVA ROSA em ID nº 82226466. O recebimento da denúncia se deu em 04 de março de 2022, conforme decisão acostada às fls. ID 78606611. Em uma primeira audiência de instrução e julgamento realizada em 10 de maio de 2022 (ID 84737949), ocasião em que foram inquiridas as testemunhas Jeferson Danilo Rodrigues Dinis, Rubilene de Jesus Silva Monteiro, Fabiana de Jesus Santos, Edelson Rodrigues, Helder Wellerson C. de Almeida, Maison da Silva, Sebastião de Lima Neto, Zenaide Maciel de Aquino e Celia Ribeiro Caldeira. Em audiência de continuação, realizada em 27 de maio de 2022 (ID 86131754 ), procedeu-se à oitiva das testemunhas Rodrigo Gabe Américo e Cleverton Ferreira Neves, bem como aos interrogatórios dos acusados JULIA SABRINA PAIVA ROSA e AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA. O Ministério Público requereu em memoriais finais, acostados em ID 89734592, pela procedência integral da lide, nos exatos termos da denúncia. A Defesa do réu AILTON, em memoriais de ID 90566552, manifestou pela impronúncia do denunciado, bem como pela absolvição do art.121,Caput e sua majoração do § 2º,I e IV ,c/c 29 e 69 ambos do Código Penal, subsidiariamente artigo 319 CPP ,com a substituição da Pena Preventiva por restritiva de Direito previsto no art.44,inc,III,CP,com observância do art.155,CPP,c/c art.5º inc.,.LVII da CF. presunção da inocência. No mesmo sentido, pleiteou a Defesa da ré JULIA em sede de memoriais acostados ao ID 92004248, pugnando pela impronúncia da acusada por ausência de indícios suficientes de autoria delitiva ou de participação no evento criminoso narrado no presente expediente, nos termos do artigo 414, do Código de Processo Penal. Contudo, em sentença de pronúncia prolatada em ID 94155903, a n. Magistrada entendeu pela responsabilidade criminal dos acusados, pronunciando os réus AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA e JULIA SABRINA PAIVA ROSA, como incursos no artigo 121, § 2°, incisos I (motivo torpe) e IV (recurso que dificultou a defesa da vítima), c/c art. 29, caput, ambos do Código Penal (1º FATO), e no art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.850/2013 (2º FATO), a fim de que sejam submetidos a julgamento pelo Tribunal Popular do Júri desta Comarca. Intimada acerca do decisum (ID 94339047 - Pág. 4), a ré JULIA interpôs recurso em sentido estrito às fls. ID 94532534. O réu AILTON, embora igualmente intimado (ID 94439324), não ofereceu qualquer resistência à pronúncia em seu desfavor, fazendo constar em seu termo de intimação que não desejava recorrer (ID 94439324 - Pág. 3). Pois bem. Intimado, o Parquet ofereceu contrarrazões ao recurso interposto (ID 115339334), pugnando pela manutenção da pronúncia em desfavor da acusada, requerendo, portanto, pelo desprovimento do recurso em sentido estrito. Remetidos os autos à instância a quo, o Egrégio Tribunal de Justiça proveu parcialmente o apelo interposto (ID 126189585), reformando a r. decisão fustigada a fim de impronunciá-la, nos termos do art. 414 do Código de Processo Penal, por ausência de indícios suficientes de sua concorrência para os delitos dolosos contra a vida narrados na denúncia. Por fim, oficiou ao Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, para que remeta a ação penal ao juízo competente no que pertine a imputação de integrar organização criminosa. Em seguida, fora prolatada decisão revogando a prisão preventiva decretada anteriormente (ID 127215135), expedindo o respectivo alvará de soltura em 27 de julho de 2023 (ID 127215137). Inicialmente enviados à 7.ª Vara Criminal de Cuiabá, o Ministério Público requereu pela remessa dos autos a este juízo competente, de forma a atender a diretriz delineada no artigo 8.º da Resolução TJMT/OE n.º 14, de 23 de novembro de 2023, pleito este que foi acatado conforme decisão acostada ao ID 157063142. Foi dada vista às partes para ratificarem ou retificarem os memoriais previamente interpostos, oportunidade na qual o Parquet reiterou o entendimento anterior (ID 161899862), bem como a Defesa da acusada JÚLIA (ID 191480717) Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. II – FUNDAMENTAÇÃO O presente processo está em ordem, inexistindo outras irregularidades ou nulidades a sanar, sendo certo, por outro lado, que as condições da ação penal e os pressupostos processuais estão preenchidos, impondo-se, pois, o julgamento do mérito, devendo ser julgada a ação parcialmente procedente, conforme fundamentos a seguir. II.A – DO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (artigo 2º, caput, da Lei n. 12.850/2013) II.A.1 - Da existência Analisando detidamente os autos, verifico que a existência da organização criminosa restou devidamente comprovada por meio do inquérito policial nº 632/2021 (ID 78337861), contendo boletim de ocorrência às fls. ID 78337866 - Pág. 1, LAUDO PERICIAL CRIMINAL N.º 500.2.06.2022.000092-01 às fls. ID 78337868, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): RUBENILSON DE JESUS SILVA MONTEIRO às fls. ID 78337870, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): BRUNO BECHE GARCIA SOUSA às fls. ID 78337872, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): LAURIELSON FRANÇA SOUZA às fls. ID 78337874, NECRÓPSIA VÍTIMA (MASCULINO): EMERSON RENAIO RIBEIRO PEREIRA às fls. ID 78337876, Estudo Social às fls. ID 85204594, RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO às fls. ID 78347999, ID 78348000 e ID 78348001. Neste prisma, para que haja a subsunção da conduta do agente ao tipo previsto no artigo 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, é necessário que se comprove a coexistência dos elementos: a) associação de 04 (quatro) ou mais pessoas; b) a associação deve ser estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente; c) o objetivo da associação deve ser obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. O requisito estrutural (associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente) acompanhou a tendência internacional definida pela Convenção de Palermo, em que o grupo deve estar ordenado e com divisão de tarefas. Como esclarece Eduardo Araújo da Silva: É necessária, assim, a figura de um chefe ou líder (boss ou capo) que dirige a organização, planejando previamente a execução dos crimes, mediante a divisão de tarefas entre os diversos integrantes da organização. A menção à informalidade teve por fim afastar qualquer dúvida de que não é necessária uma atuação meticulosamente organizada, bastando ordens verbais para atuação dos seus integrantes. (SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas: aspectos penais e processuais da Lei nº 12.850/13. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 25). O requisito temporal diz respeito à estabilidade dos envolvidos e, por consequência, não bastando a existência de um vínculo ocasional entre os seus membros. Por fim, o requisito finalístico se relaciona “com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional”, ou seja, deve existir a finalidade de obter vantagem de qualquer natureza mediante a prática de infrações penais (crimes ou contravenções), cujas penas somadas sejam superiores a quatro anos. Considerando que se trata de tipo misto alternativo, pode o agente praticar um ou mais de um dos verbos do tipo para que suas condutas se amoldem ao crime previsto no art. 2º da Lei nº 12.850/2013. Com efeito, o tipo penal descrito no art. 2º da Lei 12.850/2013 se caracteriza como crime abstrato cometido contra a coletividade, punindo-se o simples fato de se figurar como integrante do grupo. Neste sentido, como é de conhecimento geral, na cidade de Sinop/MT, a organização criminosa denominada Comando Vermelho (CV), que conta com muito mais de 04 (quatro) pessoas dentre seus membros, estabeleceu monopólio do tráfico de drogas como facção dominante no Estado de Mato Grosso. Nesse propósito, emite ordens a seus membros no sentido de que toda e qualquer pessoa que queira vender drogas na cidade precisa ser cadastrada à facção, ou ao menos autorizada, sob pena de ser considerado “cabriteiro”, como denominam aqueles que vendem drogas “clandestinamente”, e estar sujeito a morte. Nessa estrutura organizacional, a nível local, verificaram-se os “Donos da Quebrada” e “Responsáveis da Quebrada”, seus “auxiliares”, o “fornecedor”, o “setor de cadastramento”, o “corpo disciplinar”, e, por fim, os demais “irmãos” e “lojistas”. Ademais, dentre “irmão”, há uma rotatividade em micro funções como armazenamento, transporte, preparação e distribuição da droga, recolhimento de camisas (taxa mensal) e lucro do tráfico, frete de valores em específica para a cúpula da facção, além do armazenamento e ocultação de armas. Resta dos autos que a ré JULIA fazia parte do Comando Vermelho, facção destinada precipuamente ao domínio do tráfico de entorpecentes na região, bem como de outros crimes, como de ordem patrimonial e contra a vida. Portanto, o combate à atuação de seus integrantes é primordial para a garantia da ordem pública. Assim, pela análise do acervo probatório reunido, não há dúvidas quanto a existência do fato narrado. II.A.2 - Da autoria A autoria da ré é igualmente incontestável, notadamente pela atuação específica da acusada na execução do homicídio perpetrado, fornecendo apoio logístico ao comprar quatro capuzes (balaclava), a pedido FERNANDO (liderança do “Comando Vermelho – CV” em Sinop/MT) utilizados na empreitada criminosa, inclusive transferindo os valores necessários. Por se tratar de pessoa de confiança de FERNANDO no mundo do crime, JULIA se associou à facção criminosa comprando os capuzes e entregando aos responsáveis pela execução do homicídio, conforme os relatos testemunhais e interrogatórios realizados. Vejamos as provas produzidas em audiência de instrução, as quais se provaram sólidas em reproduzir os elementos de prova coletados ao longo da investigação. A testemunha Rodrigo Gabe Américo, Investigador de Polícia Civil ouvido em Juízo, declarou que, após a morte das vítimas, a equipe policial foi até o local atender à ocorrência, de modo que descortinaram que, além das quatro vítimas, havia mais pessoas na residência. Em entrevista com tais testemunhas, estas declararam que quatro homens adentraram à residência, separaram as vítimas em u quarto e desferiram disparos de arma de fogo em face delas. Disse que uma das testemunhas aduziu que uma das vítimas já havia sido ameaçada de morte, sendo que as vítimas vieram do Estado do Maranhão para trabalhar nesta urbe. Segundo esta testemunha, a vítima teria recebido ameaças por meio de ligação telefônica, em que um terceiro dizia que iria entrar na residência daquela e “matar todo mundo”. Afirmou que, por meio das imagens de uma câmera de segurança próxima ao local dos fatos, foi possível identificar que uma camionete, de cor branca, passou em frente à residência das vítimas por várias vezes e que, em certo ponto das filmagens, quatro homens adentram ao referido veículo, evadindo-se do local em seguida. Esclareceu que uma terceira pessoa anotou a placa da camionete, sendo que a equipe policial descobriu que o veículo pertencia à genitora do acusado Ailton e que o veículo apresentava os mesmos detalhes do carro que aparece nas imagens. Informou que, descortinaram, também, que a acusada Julia receberia os valores provenientes do tráfico de drogas, ordenada pelo vulgo “Boquinha”, sendo que esta teria comprado os capuzes utilizados pelos homens que adentraram a residência e desferiram os disparos de arma de fogo em face das vítimas. Informou que conseguiram o comprovante da compra dos capuzes, bem como imagens da câmera de segurança do local em que a acusada Julia foi comprar as balaclavas. Informou que o acusado Ailton foi preso na cidade de Americana do Norte/MT e que a camionete havia ficado nesta urbe, na residência da genitora daquele. Disse que o acusado alegou, em suas declarações extrajudiciais, que passou por uma pessoa que pediu carona e que outros rapazes adentraram o veículo depois, afirmando que os rapazes haviam pedido para passar em um local para pegar uns entorpecentes, informando que teve conhecimento sobre o crime por meio de reportagem na televisão. Declarou que, em cumprimento a um mandado de busca e apreensão na residência de Julia, descobriu-se que o cartão de crédito utilizado pela acusada era de seu irmão e que a acusada alegou que não sabia para qual finalidade seriam utilizados os capuzes e que um terceiro foi buscar os objetos, tendo conhecimento a respeito do crime por meio de reportagem na televisão. Em relação à motivação do crime, afirmou que fora ventilado que as vítimas pertenciam a uma organização criminosa denominada “PCC”, rival da facção a que os autores do crime pertencem. Questionado se, pelo fato de as vítimas serem de outro Estado, poderiam ter sido mortas por engano, respondeu que poderia ter acontecido, como já houve em outros casos de homicídio. Informou que a data constante das filmagens, apesar de constar como sendo no dia 17, o crime ocorreu no dia 16, tendo sido confirmado pela testemunha que forneceu as imagens que se tratava de um erro do aparelho. Perguntado como foi feita a abordagem do acusado na cidade de Americana do Norte/MT, respondeu que adentrou à residência e fez a abordagem e prisão do acusado, tendo sido encaminhado para a Delegacia. Indagado se havia algum facão na residência no momento da prisão dele, respondeu que sim, mas que ninguém o utilizou para ameaçar nem a genitora do acusado, tampouco da namorada daquele. Informou que o acusado estava no lado externo da residência, tendo sido proferida ordem de parada e feita a prisão dele. Questionado sobre as provas coletadas em relação à acusada Julia, disse que em relação às mortes das vítimas, não havia prova de envolvimento direto dela, apenas a compra dos capuzes. Informou que surgiu a informação de que a acusada teria comprado os capuzes sob ordens de Fernando dos Santos Souza, vulgo “Boquinha”. Perguntado se existe alguma prova concreta de que a acusada recebia os valores de alguma organização criminosa, respondeu que tem informações prévias repassadas por testemunhas e que a própria acusada confirmou este fato na Delegacia. Indagado se Fernando era muito conhecido como “Rondônia” respondeu que ele utiliza várias alcunhas e que uma delas é “Rondônia”. Disse que o envolvimento da acusada foi de comprar os capuzes e o envolvimento com a pessoa de Fernando. Indagado se a acusada foi acompanhada por algum advogado no momento de sua oitiva na Delegacia, respondeu que não. Informou que a acusada confirmou que conversava com Fernando por meio de aparelho celular, de modo que esta declarou que quebrou o chip e o aparelho celular que utilizava depois de comprar os capuzes. A testemunha Sebastião de Lima Neto, Investigador de Polícia Civil inquirido em Juízo, relatou que a guarnição policial foi informada de que havia ocorrido um homicídio em uma residência, local onde havia adentrado quatro homens e desferido disparos de arma de fogo em face das vítimas. Disse que, em posse das imagens das câmeras de segurança próxima à residência, conseguiu verificar que uma camionete branca parou próximo à residência e que quatro indivíduos adentraram ao veículo, se evadindo em seguida. Informou que, no mesmo dia, um policial militar o procurou, afirmando que havia visto uma camionete branca próximo ao local e que teria anotado a placa dela. Em seguida, informou que, em pesquisa pelas características repassadas, foi possível chegar à pessoa de Adilson, bem como descortinaram que, possivelmente, ele era faccionado e que havia várias passagens. Disse que os detalhes do veículo do acusado, sendo adesivos e estribo seriam semelhantes aos do veículo que está nas imagens da câmera de segurança próximo ao local. Relatou que, em relação à acusada Julia, disse que chegaram à pessoa dela, em virtude de ter descortinado que ela havia comprado os capuzes, sendo descoberto, também, que ela fazia parte da organização criminosa Comando Vermelho e que tinha a função de arrecadar dinheiro proveniente do tráfico ilícito de entorpecentes, sob ordens do Fernando dos Santos Souza, vulgo “Boquinha” ou “Rondônia”. Informou que conseguiram um ticket do cartão de crédito utilizado para a compra dos capuzes e imagens da câmera de segurança da loja. Informou que poucos dias após, descobriram que o acusado estava tentando vender o veículo. Esclareceu que durante a prisão do acusado, este quebrou seu aparelho celular, mas que em sua oitiva perante a Autoridade Policial, este confirmou que teria participado do crime e disse que havia apenas dado carona aos autores do homicídio. Informou que descobriram que a acusada Julia recebeu uma quantia em dinheiro na conta corrente de seu irmão e que lhe fora ordenado por Fernando, vulgo “Rondônia” que ela teria que comprar os capuzes e que o acusado Ailton passou na casa dela para buscar os objetos. Concluiu que ficou concretizado que os acusados participaram do delito e que estes omitem informações sobre os nomes dos demais indivíduos, dificultando a conclusão da identificação dos executores do homicídio. Perguntado se a acusada confirmou que foi o Fernando, vulgo “Boquinha” que teria ordenado a compra dos capuzes, respondeu que sim e que ela é uma pessoa de confiança de Fernando, fazendo a coleta do dinheiro proveniente do tráfico ilícito de entorpecentes. Sobre a motivação do crime, respondeu que as vítimas eram de outro Estado e que, segundo informações, faziam parte de uma organização criminosa rival do “Comando Vermelho”, de modo que foram “decretados”. Perguntado se soube da informação de que Rubilene havia recebido uma mensagem informando que iriam adentrar a residência e matar a todos, respondeu que soube dessa informação e que ao que consta, uma das vítimas alegava que era faccionado. Esclareceu que, por vezes, a suspeita de que determinada pessoa é integrante de outra organização criminos já é suficiente para ordenar a morte dela. Indagado se “Rondônia” era o chefe da organização criminosa nesta urbe, informou que sim e que o conhecia pelo apelido, devido ao fato de o Fernando ser de Rondônia. Perguntado se a acusada adentrou ao estabelecimento para comprar os capuzes com o rosto coberto, diz que ela usava um capacete e pela jaqueta que ela utilizava no dia, fora descortinado que pertencia à ela. Questionado se havia ligação entre o acusado e a acusada Julia, declarou que aquele foi buscar os capuzes na residência de Julia, declarando que seria “o cara da camionete”. Perguntado sobre as provas concretas de que a Julia seria a pessoa que recolhia o dinheiro proveniente do tráfico ilícito de entorpecentes, respondeu que havia informações repassadas anonimamente para a guarnição policial, não podendo declinar a identidade das pessoas que prestaram as informações por questões de segurança. Questionado acerca da divergência das datas da câmera de segurança, respondeu que foi um problema relatado pelo proprietário do estabelecimento e constado no relatório do processo. Indagado se participou da prisão do acusado, respondeu que não participou. A testemunha Cleverton Ferreira, Policial Militar, afirmou que, no dia do fato, estava em uma oficina e que logo chegou um condutor de uma camionete Hilux, de cor branca, bem suja, sendo que saíram de dentro dela três homens em atitude suspeita. Declarou que desconfiou da situação, anotou a placa do veículo e repassou para a guarnição policial. Informou que no período da noite ocorreu o fato e, em conversas com a equipe de inteligência da Polícia Civil, repassou as características do citado veículo, verificando, ainda, pelas imagens da câmera de segurança que o veículo possuía outras características semelhantes ao do veículo das imagens, como um adesivo identificador e um sinal no mesmo local. Questionado se reconheceu algum dos rapazes que viu saindo da camionete no dia do fato, respondeu negativamente. Perguntado sobre o que chamou a atenção sobre o veículo, respondeu que continha uma placa de fora da cidade e estava suja. Disse que o veículo somente parou no local e os rapazes adentraram rapidamente. Informou que desceram três rapazes da camionete e que o declarante estava à paisana. Declarou que o veículo parou em frente à uma boate, ao lado da oficina onde estava o depoente. Indagado se viu as vestimentas dos homens que saíram da camionete, respondeu que eles saíram muito rápido, de modo que não conseguiu observar as roupas que eles vestiam. Perguntado se conseguiu identificar se havia alguma mulher dentre as pessoas que estavam na camionete, respondeu que não viu nenhuma mulher saindo do veículo. O informante Edelson Rodrigues relatou em juízo que, no dia do fato, estava conversando com sua esposa, por mensagens, e se preparando para dormir, quando ouviu os barulhos e alguém arrombando a porta da residência. Declarou que, em seguida, os homens começaram a separar as pessoas que estavam na residência, olhando fotografias em um aparelho celular e colocando os rapazes em quarto separado, sendo que após, ouviu os disparos de arma de fogo. Informou que ficou na sala, de joelhos, e viu os autores mais ou menos, sendo quatro homens encapuzados e de camiseta preta de manga comprida. Declarou que todos estavam armados e disseram que eram da polícia. Informou que separaram o Emerson, Bruno, Rubenilson e Laurielson. Perguntado se sabia a razão de terem separado as vítimas e as matado, respondeu que não entendeu e não sabia dizer o que aconteceu. Declarou que fazia menos de um mês que as vítimas estavam residindo nesta urbe. Indagado se sabia de uma mensagem que a Rubilene recebeu, afirmando que iria matar todos da residência, respondeu que somente ficou sabendo depois. Questionado se sabia se as vítimas eram integrantes de organização criminosa, respondeu que não sabia e que no dia do fato, os homens somente entraram na residência dizendo que eram da polícia. Esclareceu que duas das vítimas eram usuárias, sendo o Laurielson e Emerson, não sabendo dizer se tinham dívidas provenientes de drogas. Informou que ficou na sala, juntamente com as vítimas, de joelhos, de modo que mataram Laurielson na sua frente. Indagado se identificou alguma mulher junto com os acusados, respondeu que não e que não efetuaram ligação telefônica. Perguntado se conseguia identificar tatuagem ou alguma característica dos autores do crime, respondeu que eles estavam usando camisetas de manga longa, não sendo possível identificar nenhuma característica visível. Informou que Rubenilson, antes de ser morto, declarou que não havia feito nada. (grifo nosso). Em seguida, fora inquirida a testemunha informante Fabiana de Jesus Santos, esposa da vítima Rubenilson. Declarou que estava dormindo e que acordou com um barulho. Informou que um homem levou Rubenilson para a sala da residência e que a depoente pediu para não fazer isso. Disse que o homem estava de capuz, de cor preta e apontou uma arma de fogo para a depoente, informando que permaneceu no quarto. Informou que os homens que adentraram a residência declaravam que era da polícia e que, após, somente ouviu os disparos de arma de fogo. Declarou que foram muitos disparos. Disse que não sabia a motivação do crime e que seu esposo trabalhava em uma empresa metalúrgica. Esclareceu que havia, aproximadamente, dois anos que havia se casado com a vítima e uma semana que a declarante estava nesta urbe. Questionada se a vítima era usuário de entorpecente, respondeu que não. Perguntada sobre uma questão de um fogão que fora “penhorado” em uma “boca de fumo”, disse que não sabia. Informou que uma pessoa falou que chegaria alguém na residência e mataria todo mundo, de modo que a vítima disse que não tinha nada a esconder e ficaria no local. Perguntada se algum dos autores do crime falaram algo sobre facção, respondeu que não e que a vítima estava ajoelhada. Questionada se alguma das vítimas tinha envolvimento com drogas, disse que não sabia responder. Perguntada se notou a presença de alguma mulher entre os autores do crime, respondeu que não viu. A informante Rubilene de Jesus Silva Monteiro, irmã das vítimas Rubenilson e namorada de Laurielson, informou que não sabe porque o fato aconteceu, mas que os homens invadiram a residência, arrombando a porta e dizendo que eram a polícia. Disse que um dos autores do crime estavam com uma camiseta laranjada e a calça preta. Informou que dois deles entraram pela porta dos fundos e dois pela porta da frente e que os quatro estavam encapuzados. Informou que moravam em 11 pessoas naquela residência e que vieram do Maranhão, aduzindo que seu irmão já residia nesta urbe há sete anos e que, na data do fato, estava cuidando do filho de seu namorado. Questionada como se deu o ocorrido, respondeu que os homens entraram na residência, a declarante foi para o quarto com a criança e as vítimas e outros rapazes ficaram na sala. Informou que eles não eram usuários de entorpecente e que recebeu um áudio em seu aparelho celular ameaçando que iriam entrar na residência e matar todos que ali estavam. Disse que agendou o número de telefone que lhe ameaçou e que era conhecido, sendo chamado de Batista. Indagada se sabia o motivo da ameaça, a depoente disse que não sabia. Questionada sobre uma confusão a respeito de um fogão que estava “penhorado” em uma “boca de fumo”, respondeu que era de outro irmão da depoente e que não houve briga por causa do fogão. Informou que estava residindo há pouco tempo na cidade e que não sabia se houve desentendimento das vítimas com organização criminosa. Relatou que houve muitos disparos de arma de fogo e que não falaram nada, somente que “eram da polícia”. Informou que a vítima, irmão da depoente, tinha um filho de 21 anos, um de 18 anos e um de 08 anos de idade e esposa. Questionada se havia alguma mulher com os autores do delito, respondeu que não. O informante Jeferson Danilo Rodrigues Dinis, ouvido em Juízo, aduziu que estava no local do crime, mas não viu os autores do delito. Informou que estavam morando todos na mesma casa, sendo de 10 a 12 pessoas. Declarou que escutou uns barulhos na residência e logo adentraram quatro homens dizendo que eram da polícia. Logo em seguida, separaram as vítimas e desferiram disparos de arma de fogo em face delas. Disse que não viu muita coisa e se escondeu na hora em que os autores do crime adentraram a residência, bem como que as demais testemunhas afirmaram que os autores do crime estavam encapuzados. Afirmou que os homens confirmaram a identidade das vítimas, por meio de fotografias no aparelho celular, e que desferiram os disparos em face das vítimas na sala da residência. Informou que pediram os aparelhos celulares das vítimas e mandaram tirar a criança que estava na residência para outro cômodo. Questionado se sabia dizer se as vítimas eram faccionadas, respondeu que não e disse que não entendeu a motivação do crime. Perguntado se as vítimas eram usuárias de entorpecentes, respondeu que o Rubenilson e o Bruno não eram usuários, mas que as outras duas vítimas utilizavam maconha. Questionado qual o nome da vítima que possuía filho, respondeu que era o Laurielson. Perguntado se sabia de uma mensagem que Rubilene afirmou que recebeu, dizendo que uma pessoa mataria odos da residência, disse que ficou sabendo, mas não deram importância, pois não eram faccionados nem faziam nada errado. Indagado se havia alguma mulher em companhia dos homens que entraram na residência, declarou que não. Declarou que seis pessoas dormiam na sala, em colchões no chão e que no dia do fato, a porta e a janela estavam abertas quando os homens chegaram. Perguntado se viu quantas pessoas adentraram na residência, informou que eram quatro pessoas e que lhe contaram que estavam com capuzes. Helder Wellerson Castilho de Almeida, inquirido em Juízo sobre os fatos, respondeu que mora próximo ao local dos fatos e informou que no dia do fato estava em frente à sua residência, quando ouviu barulhos de tiro e, em seguida, quatro indivíduos correndo pela rua, encapuzados. Ato contínuo, informou que adentrou sua residência para sua segurança. Indagado se viu algum carro suspeito pela rua, respondeu que não, pois logo adentrou a residência. Disse que ouviu os barulhos e, após, quatro homens correndo. Informou que não viu camionete passando pela rua, pois foi rápido e entrou na residência. Questionado se viu as imagens das câmeras, respondeu que viu na Delegacia, mas que não soube informar mais detalhes. Declarou que viu nas imagens a camionete passando pela rua da sua casa, mas no momento em si, não prestou atenção a este fato. Indagado se no momento em que ouviu os barulhos de tiro, estava dentro de casa, respondeu que estava do lado de fora, em frente à residência. A informante Célia Ribeiro Caldeira, genitora do acusado AILSON, informou que tinha ido na residência em que o acusado morava, quando de repente, alguém pulou o muro da residência com uma arma de fogo e começou a gritar “você pulou! ”. Disse que ficou apavorada com a situação e não se moveu, declarando que o acusado fora algemado em seguida. Relatou que os policiais ordenaram que a depoente ficasse contra a parede. Informou que os policiais perguntavam sobre a camionete, tendo o acusado respondido que estava em Sinop/MT. Indagada se sabia informar quem era o policial que foi agressivo, disse que não sabia o nome dele. Informou que o acusado trabalha como pedreiro. Disse que o acusado confirmou que deu carona para os autores do homicídio. Indagada se podia afirmar que que no dia do fato o acusado estava nesta urbe, respondeu que não sabia dizer com certeza porque ele sempre vem a Sinop e volta para Americana do Norte, pois a declarante possui um comércio naquela cidade. Questionada qual era o nome do policial que a depoente disse que colocou um facão no pescoço do acusado, respondeu que ouviu o chamarem de Tiago. A testemunha de Defesa Zenaide Maciel de Aquino, inquirida em Juízo, aduziu que conhece o acusado há, aproximadamente, 15 anos e que ele é uma pessoa boa e trabalhadora. Informou que o acusado é usuário de drogas e que reside em Americana do Norte/MT há uns 06 anos. Declarou que não tem contato diário com o acusado e que somente o cumprimenta e conversam quando ele está nesta urbe. Questionada se sabia se o acusado possuía algum veículo, disse que sabe que ele tem uma camionete Hilux. A testemunha Maison da Silva declarou que conheceu o acusado Ailton em um trabalho e que atualmente ele ficava mais em Americana do Norte, trabalhando em seu empreendimento. Declarou que sabia que o acusado era usuário de maconha e cigarro, mas era tranquilo. Questionado se o acusado tinha algum carro, declarou que ele possuía uma camionete, de cor branca. O réu AILTON CÉSAR CALDEIRA, interrogado em juízo, negou a autoria dos fatos. Asseverou que sobre o homicídio não tem conhecimento. Questionado sobre a camionete Hillux, se carregou alguém, respondeu que não e que não tem muito conhecimento nesta cidade. Indagado o que fazia no Bairro Adriano Leitão, disse que tinha ido para comprar entorpecentes. Questionado se conhece a acusada Julia, disse que não a conhece. Indagado se conhecia as vítimas, respondeu que não. Perguntado se compra entorpecentes de conveniados de organização criminosa, respondeu que não. Negou a participação no crime de homicídio ora em questão. Indagado se o veículo tinha um adesivo escrito “4x4”, respondeu que sim e declarou que um lado da camionete não possuía adesivo. Perguntado sobre seu depoimento na Delegacia, respondeu que estava apanhando e foi obrigado a dizer certas coisas, mas nega que teria dado carona para os autores do crime. Perguntado se quebrou seu aparelho celular na Delegacia, respondeu que sim, pois estava apanhando muito. Indagado quando tentou vender a camionete, disse que em novembro e estava tentando vender nesta urbe. Em seguida, a ré JULIA SABRINA PAIVA ROSA, interrogada em juízo, também negou a autoria dos fatos. Aduziu que o “Rondônia” pediu para a interroganda comprar as balaclavas pois iria pescar e precisava dos objetos. Declarou que adentrou ao estabelecimento de capacete, mas estava com a viseira aberta e que possui vitiligo, de modo que, ao andar sob o sol, usa roupa de manga. Negou a participação no crime de homicídio e quanto à amizade com “Rondônia”, declarou que ele namorou com uma amiga da interroganda e que ele entrou em contato com ela por um grupo de compra e venda de uma rede social. Afirmou que essa amiga já faleceu e que mantinha contato apenas por redes sociais e que ela faleceu de um acidente. Indagada se conhece Fernando, disse que não e que conhece o “Rondônia” que é a pessoa de Marcos. Disse que comprou as balaclavas e entregou para uma pessoa em uma camionete, de cor cinza. Questionada quanto ganhou por esse favor que fez para o “Rondônia”, disse que não ganhou nada, bem como que a pessoa que pegou os objetos não falou nada também. Declarou que no veículo havia duas pessoas. Negou a participação no crime em questão e disse que sofre de ansiedade e que tem dificuldade em dormir. Questionada com que dinheiro comprou os capuzes, disse que o Marcos, vulgo “Rondônia”, enviou um dinheiro via “pix” para uma conta de seu irmão e que não se recorda qual o nome da pessoa que enviou. Perguntada se comprou as balaclavas no mesmo dia em que recebeu os valores, respondeu que sim. Indagada se quebrou seu aparelho celular, respondeu que não o quebrou e que ele caiu ao solo quando os policiais chegaram em sua residência. Perguntada se costumava fazer favores para “Rondônia”, negou e que fazia muito tempo que não conversava com ele, pois tinha sido namorado de uma amiga. Disse que não era faccionada e que não fazia favores para integrantes de organização criminosa. Perguntada se usa entorpecentes, negou e disse que somente usa remédio para ansiedade. Indagada se conhece a pessoa de Fernando dos Santos Souza, disse que não e conhece apenas a pessoa de Marcos, vulgo “Rondônia”. Questionada se já fora presa por recolher dinheiro de organização criminosa, respondeu que não. Disse que fora ouvida na Delegacia sem o acompanhamento de advogado e que não leu o depoimento, pois estava nervosa. Informou que faz tratamento de ansiedade e de vitiligo. Dos fatos narrados na denúncia e da análise acurada da prova carreada nos autos, denota-se que estão presentes os elementos indicativos de que a acusada integra a organização criminosa armada, cujo escopo compreende a prática de crimes diversos, mormente os de tráfico de entorpecentes, delitos contra o patrimônio e relacionados à aquisição, posse, porte, guarda, manutenção em depósito, transporte, fornecimento, empréstimo e emprego de armas de fogo, além de crimes contra a vida, etc. As provas produzidas revelam claramente o envolvimento dos denunciados AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA e FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, vulgo “Boquinha”, e demais comparsas não identificados (processados em autos próprios) no crime de homicídio qualificado ordenado pelo “Comando Vermelho – CV”, tendo como vítimas LAURIELSON FRANÇA SOUZA, RUBENILSON DE JESUS SILVA MONTEIRO, EMERSON RENAIO RIBEIRO PEREIRA e BRUNO BECHE GARCIA SOUSA por integrarem o “Primeiro Comando da Capital – PCC”. Em análise das imagens de segurança obtidas no estabelecimento comercial em que a acusada realizou as compras, entre 17h18 e 18h00, bem como pelos comprovantes de pagamentos obtidos junto ao estabelecimento, é possível confirmar as provas trazidas em sede do relatório de investigação acostado em ID 78347999, cujo conteúdo corrobora o envolvimento de JULIA com o faccionado FERNANDO DOS SANTOS SOUZA. Abaixo, colacionamos as referidas imagens: Vejamos trecho do relatório neste sentido: “(…) Ao mesmo tempo em que trabalhávamos na identificação do proprietário do veículo usado pelos suspeitos no dia do crime, chegou a informação através de colaboradores anônimos de que uma moça de nome JULIA teria sido a responsável por comprar as máscaras (balaclavas) utilizadas pelos suspeitos no cometimento do crime. Segundo a denúncia, JULIA teria efetuado a compra em duas lojas diferentes, comprando as quatro máscaras utilizadas pelos suspeitos. Em checagem a essa informação, chegamos até a pessoa de JULIA SABRINA PAIVA ROSA, que é pessoa de confiança de FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, vulgo BOQUINHA ou MANO ZÉ, um dos líderes da facção criminosa Comando Vermelho na cidade de Sinop. JULIA seria a responsável por fazer a coleta do dinheiro oriundo do tráfico de drogas do entorpecente de propriedade de FERNANDO, mostrando o alto grau de envolvimento da moça com a organização criminosa. Em uma das lojas em que JULIA efetuou a compra de uma balaclava, obtivemos as imagens do momento em que ela chega no estabelecimento, quando efetua o pagamento da mercadoria e o momento em que sai do local, como se vê nas imagens que seguem. Nota- se nas imagens que em nenhum momento JULIA tira o capacete da cabeça, numa clara tentativa de ocultar sua identidade diante das câmeras de segurança do local. Outro ponto relevante é que essa compra desse material foi feito no mesmo dia em que o fato ocorreu, mas no período da tarde, como indicado nas imagens. Nessa loja, obtivemos o comprovante de pagamento da compra, onde confirma-se que foi comprada uma balaclava no valor de R$ 46,00, e que o pagamento é feito à vista através de um cartão de débito. Segundo repassado na denúncia, nessa loja, JULIA comprou uma balaclava, e depois teria ido em outra loja, onde comprou outras três balaclavas, sendo primeiramente duas e depois mais uma. Nessa segunda loja não foi possível obter imagens da suspeita realizando as compras, mas nos foi fornecido os comprovantes do pagamento via cartão de débito, mesma maneira do primeiro comprado (...)”. (g.n) Ademais, o depoimento dos policiais foi uníssono, seguindo no mesmo sentido, de forma que meros desencontros sobre circunstâncias acessórias e paralelas ao núcleo central do comportamento criminoso não são suficientes para retirar a credibilidade que merece a prova testemunhal produzida no decorrer da lide. Até porque, não há nos autos qualquer elemento indicativo de que os policiais quisessem incriminar gratuitamente a acusada, motivo pelo qual não se pode desmerecer a fala dos policiais pelo só fato de pertencerem aos quadros da Polícia Civil. Sobre a validade do depoimento de policiais, relembro que o eminente Ministro Moreira Alves, quando atuava no Supremo Tribunal Federal, deixou assentado que “o simples fato de as testemunhas serem policiais não invalida, por si só, seu depoimento” (STF – RHC – Rel. Min. Moreira Alves – JSTF-Lex 125/332). Vale lembrar, ainda, que tais informações foram confirmadas em sede de contraditório judicial, por meio do depoimento do investigador de polícia RODRIGO GABE AMÉRICO, responsável por esclarecer os seguintes fatos sobre as investigações: “Que os policiais que atenderam a ocorrência e constataram imagens no local próximo; Que as quatro vítimas estavam em Sinop a trabalho, sendo que todos vieram do estado do Maranhão; Que segundo repassado pela esposa de uma das vítimas, eles receberam ameaças por telefone por algum integrante da facção comando vermelho, dizendo que entrariam na residência e matariam todos; Que as imagens mostram uma camionete branca passando algumas vezes na rua lateral à casa; Que um dos moradores do local indicou ter visto a camionete parada na esquina, na direção em que os indivíduos correram; Que as imagens circularam no meio policial e um PM disse ter visto uma camionete semelhante com características semelhantes; Que o PM anotou a placa e repassou para outras guarnições; Que realizaram levantamentos e identificaram que a camionete estava no nome da mãe do acusado Ailton; Que nos levantamentos restou identificado que ele utilizava a camionete; Que a camionete apresentava os mesmos detalhes do veículo que aparece nas imagens nas proximidades do local; Que, ao mesmo tempo, receberam informações de uma moça chamada Júlia que fazia o recolhe de dinheiro de drogas para o FERNANDO, vulgo “boquinha”; Que ela teria comprado, na tarde do crime, quatro capuzes; Que conseguiram imagens de uma das lojas e os comprovantes das compras, indicando que foi realizado com um cartão de débito; Que solicitaram mandado de prisão e busca dos dois suspeitos, AILTON e JULIA; Que localizaram o suspeito AILTON no Distrito de Americana do Norte, em Tabaporã; Que a camionete estava na casa da mãe dele no bairro Jardim das Violetas; Que AILTON foi preso e conduzido à Delegacia de Sinop; Que AILTON confirmou ter dado carona para um rapaz que ele não conhece, dizendo que era comum ele dar carona para desconhecidos; Que teria passado em outro local, buscando mais alguns rapazes e, após, teriam ido até o bairro do crime para buscar drogas; Que segundo AILTON ele permaneceu andando com a camionete porque não gosta de ficar parado e depois os rapazes entraram; Que não viu ninguém com capuz ou armas; Que segundo ele não tinha conhecimento de nada do crime (….) Que realizaram busca na residência da JÚLIA, ocasião em que foi apreendido um capacete e uma jaqueta, os quais foram utilizados por ela foi na loja, conforme aparece nas imagens; Que, de início, ela disse que o cartão pertencia à mãe, mas a genitora mostrou todos os cartões; Que a JULIA então confirmou que a cartão era do irmão dela; Que a mãe forneceu uma foto do cartão do irmão; Que a numeração final do cartão era compatível com a numeração dos comprovantes; Que JULIA confirmou ter feito a compra de quatro capuzes, mas disse que não sabia para que era; Que quem pediu para comprar foi o RONDÔNIA (FERNANDO); Que ele passou o dinheiro para a conta do irmão dela e ela comprou; Que após a compra uma camionete passou em sua casa e recolheu os capuzes (…) Que as quatro vítimas foram apontadas por serem integrantes de facção rival do Comando Vermelho; Que vieram do estado do Maranhão, local em que a facção dominante é PCC; Que uma das testemunhas disse dias antes estavam em um bar, um rapaz que ela não conheceu tirou foto das quatro vítimas que foram mortas; Que as vítimas receberam ameaças; Que para a investigação essa foi a motivação do crime (…) Que quando fizeram a análise das imagens perceberam que a data está com data diferente, mas tem testemunha que confirma que esses fatos ocorreram no dia 16 de dezembro (…)”. (grifos nossos) Ainda, vejamos a jurisprudência pacífica deste Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso a respeito da validade dos depoimentos policiais: APELAÇÃO CRIMINAL – DIREITO PENAL – ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS, RESTRIÇÃO DE LIBERDADE DA VÍTIMA E EMPREGO DE ARMA DE FOGO (CP, ART. 157, § 2º, II E V, § 2º-A, I) – EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO COM RESULTADO MORTE (CP, ART. 159, § 3º) – RECEPTAÇÃO QUALIFICADA (CP, ART. 180, §1º) – RECURSOS DEFENSIVOS – PRELIMINAR DE NULIDADE DO INTERROGATÓRIO POLICIAL – SUPOSTA OFENSA AO DIREITO AO SILÊNCIO E CONSULTA COM DEFENSOR – INOCORRÊNCIA – DIREITOS OPORTUNIZADOS – CIÊNCIA DO RÉU REGISTRADA NO TERMO DE INTERROGATÓRIO – AUSÊNCIA DE PREJUÍZOS – CONDENAÇÃO PAUTADA EM OUTRAS PROVAS INDEPENDENTES – MÉRITO – PLEITO ABSOLUTÓRIO – IMPOSSIBILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – AUSÊNCIA DE DÚVIDA RELEVANTE – CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL CORROBORADA POR DEPOIMENTOS DE TESTEMUNHAS E AGENTES POLICIAIS ENVOLVIDOS NAS INVESTIGAÇÕES – APREENSÃO DE PARTE DA RES FURTIVAE EM POSSE DOS RÉUS – PRÁTICA DELITIVA COMPROVADA – SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA – DESCLASSIFICAÇÃO INVIÁVEL – CRIME PRATICADO COM DIVISÃO DE TAREFAS – CIRCUNSTÂNCIAS MAJORANTES COMPROVADAS – CONDENAÇÃO MANTIDA – REVISÃO DA DOSIMETRIA – PENA-BASE DO CRIME DE EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO – CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS – CULPABILIDADE E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME – CARGA NEGATIVA AFASTADA – INIDONEIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO – ELEMENTOS ANALISADOS PELO TIPO – AUMENTO DECOTADO – PENA REDIMENSIONADA – EXTENSÃO DOS EFEITOS, DE OFÍCIO, AOS CORRÉUS – PRELIMINAR REJEITADA – RECURSO DEFENSIVO PROVIDO EM PARTE, APENAS PARA REDUZIR A PENA DO CRIME DE EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. Demonstrado ter sido informado ao réu dos seus direitos constitucionais, em especial de permanecer em silêncio, ser acompanhado de um advogado e de informar seus familiares de sua prisão, inexiste qualquer nulidade a ser declarada. Os interrogatórios policiais dispensam maior rigor e forma, diante de sua natureza administrativa, que não se confunde com o processo penal conduzido em juízo. A delação extrajudicial de um dos acusados tem plena validade quando em consonância com outros elementos de prova. Havendo harmonia entre as afirmações dos agentes policiais e os demais elementos probatórios dos autos, não há razões para afastar o édito condenatório, uma vez que a prova consistente no testemunho de policiais diretamente envolvidos nas diligências que deflagraram a prisão do acusado é de reconhecida idoneidade e tem forte valor probante para o amparo de um decreto condenatório. O fato de se tratar de policial civil, em nada desmerece a prova judicializada, notadamente quando não há indicação concreta de que os agentes ouvidos tenham interesse em prejudicar os réus, imputando-lhes falsamente a prática dos crimes. Mantém-se irretocável a condenação prolatada, porquanto presente outras provas válidas e independentes a demonstrar a autoria delitiva dos réus. Inviável o decote da circunstância qualificadora prevista no § 1º, do art. 180, do Código Penal, quando comprovada que a atividade comercial possibilitou a execução do fato criminoso. A avaliação das circunstâncias judiciais, na primeira fase da dosimetria, não pode pautar-se em elementos inerentes à própria caracterização do crime. No crime de extorsão mediante sequestro com resultado morte, eventuais traumas causados à família da vítima, embora profundos e verdadeiros, já foram avaliados pelo legislador e não permite a exasperação da pena-base. (N.U 1010807-21.2021.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PAULO DA CUNHA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 05/12/2023, Publicado no DJE 13/12/2023) (destaquei) APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS E CORRUPÇÃO ATIVA - CONDENAÇÃO - ACESSO A DADOS DE CELULAR SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL; INSUFICIENCIA PROBATÓRIA – PEDIDOS DE NULIDADE DA SENTENÇA E ABSOLVIÇÃO – PRELIMINAR DE ILICITUDE DE PROVAS – ACESSO AOS DADOS TELEFINICOS – NULIDADE RECONHECIDA PELO JUIZ DA CAUSA – SENTENÇA FUNDADA EM OUTRAS PROVAS - FONTE INDEPENDENTE E AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CAUSALIDADE – NULIDADE NÃO CARACTERIZADA – ARESTOS DO STF, STJ E TJMT – LIÇÃO DOUTRINÁRIA – REJEITADA - INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – APREENSÃO DE MACONHA FRACIONADA EM PORÇÕES MENORES [PRONTAS PARA A VENDA] E MAIORES – BALANÇA DE PRECISÃO – EMBALAGENS PLÁSTICAS – FORMA DE ACONDICIONAMENTO DA DROGA – CONFIRMAÇÃO DA MERCANCIA – OFERECIMENTO DE VANTAGEM ILÍCITA PARA EVITAR BUSCA DOMICILIAR E PRISÃO – DEPOIMENTO DOS POLICIAIS MILITARES – APREENSÃO DE CHEQUE E DINHEIRO EM ESPÉCIE - PROVAS SUFICIENTES PARA RESPONSABILIZAÇÃO PENAL – LIÇÃO DOUTRINÁRIA – JULGADOS DO STJ E TJMT - ENUNCIADO CRIMINAL 8 DO TJMT – RECURSO DESPROVIDO. A “Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada [...], consagrada no art. 5º, LVI, da nossa Constituição da República, repudia as provas supostamente lícitas e admissíveis, obtidas [...] a partir de outra contaminada por ilicitude original” (STJ, AgRg no HC 695.815/SP), porém a ilicitude por derivação somente alcança os meios probatórios afetados “por efeito de repercussão causal” (STF, RHC 90.376/RJ). A fonte independente é aquela “que a prova obtida ‘aparenta’ ser derivada de outra, reputada ilícita, porém, em melhor e mais detida análise, deduz-se que ela seria conseguida de qualquer jeito, independentemente da produção da referida prova ilícita. Deve ser validada. (...). O importante em relação à prova advinda de fonte independente é a consideração de que, mesmo conectada, de algum modo, à prova ilícita, ela poderia ter sido conseguida de qualquer modo, fundada em bases lícitas” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. – 15. ed. rev. atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 928). “A condenação do acusado não se baseou [...] nos dados extraídos do celular em questão, mas em uma série de outros elementos, devidamente acostados aos autos, não podendo falar em ilicitude por derivação das demais provas (‘Teoria da árvore envenenada’) e, muito menos, em nulidade absoluta do processo” (STJ, AgRg no REsp 1853702/RS).“Certo é que a jurisprudência deste Tribunal Superior tem se orientado no sentido de que [...] a existência de provas imaculadas oriundas de fontes independentes hábeis à manutenção do decreto condenatório, o que afasta o pleito de absolvição veiculado." (STJ, AgRg no REsp 1.808.791/DF). “A despeito da ilegalidade na obtenção de informações resguardadas por sigilo legal diretamente pela autoridade policial, em razão da apreensão do aparelho celular do agente quando de sua prisão em flagrante, ou seja, sem que o acesso aos dados protegidos tenha sido submetido ao crivo judicial, na hipótese dos autos o decreto condenatório foi subsidiado por outros elementos de provas capazes de, por si sós, demonstrar a autoria delitiva imputada ao apelante. Provadas a autoria e a materialidade delitivas deve ser mantida a condenação do apelante.” (TJMT, AP 0008545-25.2016.8.11.0064). O fracionamento “em pequenas quantidades e em embalagem plástica demonstra que a droga foi preparada para comercialização, de forma que sejam vendidas pequenas frações para cada usuário” (BARBOZA, Bruna Santos. “Usuário ou Traficante?”. Disponível em: https://brunasbarboza.jusbrasil.com.br - acesso em: 28.2.2022). “Os depoimentos dos policiais, a respeito das funções que desempenham na qualidade de agentes públicos, possuem presunção de veracidade e os atos por eles praticados no exercício do cargo gozam de presunção de legitimidade, motivo pelo qual seus testemunhos constituem relevantes elementos probatórios.” (STJ, 00011028220198070014). “[...] Comprovado nos autos que o réu incorreu em uma das condutas do art. 33 da Lei 11.343/06, diante da prova oral colhida e demais circunstâncias que envolveram a ação delituosa, tais como a apreensão de [...] droga, impossível a absolvição. Os depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante são meio idôneos e suficientes para a formação do édito condenatório, quando em harmonia com as demais provas dos autos e colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa” (TJMT, N.U 1001782-65.2021.8.11.0015). “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal” (TJMT, Enunciado Criminal 8). (N.U 1000892-72.2020.8.11.0012, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 24/05/2022, Publicado no DJE 27/05/2022) (destaquei) Mosaico probatório forte e coeso em desfavor da acusada, seguindo a trilha apontada pelo Ministério Público na denúncia, possibilita a prolação de sentença condenatória. Por oportuno, registro que nada veio aos autos que pudesse comprovar eventual coação sofrida pelas testemunhas para lançar sobre os ombros da ré a responsabilidade criminal pelo crime de compor organização criminosa, tornando certa a prova neste sentido. Afinal, seu envolvimento com o “Comando Vermelho – CV” é reforçado na medida que o Ministério Público ajuizou medida cautelar requerendo o afastamento de sigilo bancário da conta bancária nº 987514, banco Sicoob, cartão nº 4660 6600 0584 5957, em nome de João Marcos Paiva Rosa (irmão de JULIA), conta utilizada para comprar as máscaras. A partir da resposta encaminhada pelo banco SICOOB (id. nº 87139932 – Pág. 78) noticiando que a transferência recebida na conta bancária do irmão de JULIA foi realizada por LETICIA S. PELEGRINO, foi possível apurar o vínculo entre LETICIA e JULIA, constatando-se, à época, que LETICIA mantinha relacionamento com FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, cuja função de liderança no “Comando Vermelho – CV” motivou o pedido à JULIA, sua pessoa de confiança, para que comprasse as máscaras, ordenando a respectiva transferência dos valores. Mencione-se que o artigo 239 Código de Processo Penal reconhece os indícios como meio de prova válida, caracterizando-os como as circunstâncias conhecidas e provadas que, tendo relação com o fato, autorizam, por indução, a conclusão da existência de outras circunstâncias. Assim, indícios múltiplos, concatenados e impregnados de elementos positivos de credibilidade são suficientes para dar base a uma decisão condenatória, máxime quando excluem qualquer hipótese favorável à acusada (in Processo Penal, 2ª ed.,Atlas,1992,Júlio Fabbrini Mirabete, p.305). Desta forma, entendo que as provas testemunhais obtidas, principalmente as oitivas dos policiais que participaram das investigações, foram suficientes a relatar, de maneira categórica, pela participação da acusada nos crimes narrados na denúncia, constituindo robusto lastro probatório apto a subsidiar sua condenação. II.A.3. Quanto a causa de aumento prevista no § 2º do artigo 2º da Lei 12.820/2013 Ainda, perfeitamente cabível a incidência da causa de aumento referente a organização criminosa armada a que pertence a ré, pois conforme fundamentado anteriormente, as provas produzidas revelam que os denunciados AILTON CESAR RIBEIRO CALDEIRA e FERNANDO DOS SANTOS SOUZA, vulgo “Boquinha”, e demais comparsas não identificados (processados em autos próprios) praticaram o crime de homicídio qualificado enquanto integrantes do “Comando Vermelho – CV”, tendo como vítimas LAURIELSON FRANÇA SOUZA, RUBENILSON DE JESUS SILVA MONTEIRO, EMERSON RENAIO RIBEIRO PEREIRA e BRUNO BECHE GARCIA SOUSA por integrarem o “Primeiro Comando da Capital – PCC. Não há dúvidas, portanto, que os comparsas de JULIA fizeram uso de arma de fogo em conflito com integrantes da facção rival, sendo de rigor a incidência da majorante pois precisamente o caso dos autos. III - DOSIMETRIA DA PENA Passo, com fulcro no artigo 68 do Código Penal, à fixação da pena. A pena cominada para o delito previsto no artigo art. 2º, da Lei nº 12.850/2013, é a de reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas. Aponto que a pena de multa será fixada de acordo com as mesmas frações de aumento ou redução aplicadas à pena privativa de liberdade. 1ª Fase - Circunstâncias do artigo 59 do Código Penal: A culpabilidade da ré, consistente na reprovabilidade de sua conduta, não excede ao dolo normal para o tipo penal. Averigua-se, ainda, que a ré não possui maus antecedentes. Em relação à personalidade e a conduta social, não existem nos autos elementos suficientes para que tais circunstâncias sejam consideradas desfavoráveis. Os motivos do crime, correspondentes aos fatores que levaram a pessoa a praticar os delitos são próprios do tipo penal. Quanto às circunstâncias do crime, não há ponto relevante a acrescentar. Ainda, no que concerne as consequências do delito, estas mostram-se tipicamente severas. Com relação ao comportamento da vítima, por tratar-se de norma de perigo abstrato, deixo de valorar neste ponto, em razão da subjetividade da conduta. Assim, tendo em vista a ausência de circunstâncias a serem consideradas, mantenho a pena em seu respectivo piso legal. 2ª Fase - Das agravantes/atenuantes: Ainda, tampouco vislumbro pela presença de quaisquer agravantes ou atenuantes, mantendo a pena inalterada nesta fase intermediária da dosimetria. 3ª Fase - Das causas de aumento/diminuição: Por fim, nesta 3ª e derradeira fase da dosimetria da pena, pertinente a consideração da causa de aumento prevista no § 2º (emprego de arma) do art. 2º da Lei n.º 12.850/2013. Isso, porque conforme plenamente demonstrado nos autos, a ré participou de conflito armado contra membros de facção criminosa rival à sua, qual seja, Comando Vermelho, auxiliando no homicídio de quatro membros da facção rival “Primeiro Comando da Capital”. Tais circunstâncias, devidamente computadas nos autos, elevam consideravelmente a reprovabilidade do delito, devendo, no cálculo da pena final, acrescer à pena da ORCRIM a fração de 1/6 (um sexto), resultando, assim, na pena final de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa. Fixação do regime inicial de cumprimento da pena O regime inicial é o aberto (art. 33, § 2º, alínea “c”, c/c Súmula 269 STJ). Nos termos do artigo 387, § 2º, do CPP “o tempo de prisão provisória será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Neste caso, observa-se que a réu cumpriu pena cautelarmente desde o cumprimento do mandado de prisão em 04/02/2022 da ré JULIA até a sua revogação em decisão de ID 127215135, expedindo o respectivo alvará de soltura em 27 de julho de 2023 (ID 127215137). Portanto, tal período de aproximadamente um ano e seis meses de reclusão deverá ser, no momento oportuno, detraído pelo competente juízo da execução. Da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e da suspensão condicional da pena Cabível a substituição da pena privativa de liberdade por outras restritivas de direitos, tendo em vista a quantidade de pena arbitrada em desfavor da ré, podendo ser substituída a pena por duas restritivas de direitos, a critério do juízo da execução. Do valor da pena de multa Ausentes elementos sobre a condição econômica do réu, fixo o valor dos dias-multa em 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido (art. 49, § 1º, do CP). IV - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 387 do Código de Processo Penal, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva deduzida na denúncia e o faço para CONDENAR a ré JULIA SABRINA PAIVA ROSA como incursa nas penas do art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.850/2013, a pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, substituíveis por duas penas restritivas de direitos, em regime inicial aberto, e pagamento de12 (doze) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, corrigidos monetariamente. Do direito de recorrer e liberdade Tendo em vista que a ré encontra-se atualmente em liberdade, bem como o quantum de pena aplicado em seu desfavor, somado ao período de um ano e meio já cumprido cautelarmente em regime fechado, defiro o direito da ré de recorrer em liberdade. Fixo as seguintes medidas cateulares diversas da prisão: i) Manutenção de contato telefônico e endereço atualizados; ii) Comparecimento mensal ao fórum da comarca onde reside, nos primeiros 10 (dez) dias do mês, para justificar as suas atividades. Da indenização mínima Estando ausente requerimento por parte do Parquet, deixo de fixar valor mínimo para reparação dos danos causados à vítima pela infração (CPP, art. 387, inciso IV). Da comunicação ao ofendido dos atos processuais Em concordância com o disposto no artigo 201, parágrafo 2º, e 392, ambos do Código de Processo Penal, comunique-se a vítima Ana Carolina acerca da sentença prolatada em desfavor do acusado. V - DISPOSIÇÕES FINAIS Intimem-se na forma do art. 392 do Código de Processo Penal. Em sendo réu solto, a intimação se dará pela sua Defesa Técnica, sendo ela pública, constituída ou dativa, nos termos do provimento nº 04/2025 da Corregedoria-Geral da Justiça do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Transitada em julgado esta sentença condenatória, determino: a) Comunique-se ao TRE/MT para fins do art. 15, inciso III, CR/88; b) Comuniquem-se os institutos de identificação estadual e federal; c) Expeça-se guia de execução penal, nos termos do CNGC (ou Expeça-se mandado de prisão definitiva através do BNMP, em relação ao condenado em regime inicial fechado e remeta o feito ao arquivo provisório aguardando o cumprimento, em seguida, com o mandado de prisão cumprido expeça-se a guia de execução definitiva); d) Condeno a ré ao pagamento das custas processuais; e) Caso exista(m) objeto(s)/bens apreendidos: e.1) em caso de condenação, decreto a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: e.1.1) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito; e.1.2) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso. e.1.3) em se tratando de bens lícitos ou numerário, não relacionados ao crime: e.1.3.1) determino a devolução mediante requerimento a ser efetuado no prazo de 5 (cinco) dias da intimação da presente sentença e desde que comprovada a titularidade, propriedade ou posse ou desde que não exista dúvida quanto ao direito do reclamante; ou ainda, mediante apresentação dos dados bancários; em caso de comprovação de ambas as situações, expeça-se termo de restituição e encaminhe-se ao setor em que se encontra o bem, enquanto se tratando de numerário, expeça-se o devido alvará de pagamento de valores; e.1.3.2) decorrido o prazo acima ou não comprovando o réu a propriedade e origem, no que diz respeito aos bens móveis antieconômicos, expeça-se ofício à Diretoria do Foro para destinação dos objetos (doação e/ou destruição), devendo fazê-lo, nos termos do art. 123 do CPP e do Manual de Bens Apreendidos - CNJ, qual seja, aguardando-se o prazo de 90 dias do trânsito em julgado, cuja certidão deverá acompanhar o ofício a ser enviado à Diretoria do Foro para providências – de mesmo modo (após 90 dias), deverá o fazer (doação e/ou destruição) em caso de inércia da parte em realizar a retirada do bem, ficando o réu ciente da perda do bem, desde o momento da sua intimação de sentença; ou ainda, em se tratando de numerário, determino o perdimento ao FUNESD; em se tratando de veículo automotor, determino, outrossim, o perdimento ao FUNESD, observando-se as normativas pertinentes; e.2) em caso de absolvição ou extinção da punibilidade: e.2.1) em se tratando de bens ilícitos, determino a destruição; e.2.2) em se tratando de bens lícitos ou numerário, cumpra-se o disposto nos itens e.1.3.1, e.1.3.2; e.2.3) havendo fiança recolhida nos autos, determino a restituição, mediante intimação do(s) réu(s), para que no prazo de 05 (cinco) dias apresente dos dados bancários; decorrido o prazo sem manifestação, decreto o perdimento em favor do FUNESD. Às providências e expedientes necessários. Sinop/MT, data inserida no movimento. Anderson Clayton Dias Batista Juiz de Direito
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