Processo nº 1001990-20.2024.8.11.0023
ID: 309871765
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1001990-20.2024.8.11.0023
Data de Disponibilização:
27/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GABRIEL VICENTE CORREA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001990-20.2024.8.11.0023 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001990-20.2024.8.11.0023 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). GILBERTO GIRALDELLI Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE, DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES] Parte(s): [WESLEY DA SILVA CABRAL - CPF: 042.217.001-14 (APELANTE), GABRIEL VICENTE CORREA - CPF: 039.375.721-80 (ADVOGADO), POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), JOSE CARLOS DA SILVA NOGUEIRA JUNIOR - CPF: 044.128.871-54 (ASSISTENTE), DIONATHAN ANTONIO DA SILVA PEREIRA - CPF: 063.050.511-00 (ASSISTENTE), FRANCILENE SANTANA DA SILVA - CPF: 057.163.251-30 (ASSISTENTE), POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). GILBERTO GIRALDELLI, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU A PRELIMINAR DE NULIDADE ARGUIDA E, NO MÉRITO, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ENTRADA DOMICILIAR AUTORIZADA PELO MORADOR, APÓS ABORDAGEM POLICIAL EM VIA PÚBLICA E APREENSÃO DE DROGAS NA POSSE DO APELANTE. VALIDADE DA PROVA. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA PARA CONDENAÇÃO. INVIABILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE POSSE DE DROGA PARA CONSUMO PESSOAL. VARIEDADE DE ENTORPECENTES. READEQUAÇÃO DO QUANTUM DE ACRÉSCIMO DA PENA-BASE. FRAÇÃO DE 1/6 PARA A INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA ADOTADA PELA JURISPRUDÊNCIA. RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. INDEFERIMENTO DA GRATUIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação criminal contra sentença da 2.ª Vara Criminal de Peixoto de Azevedo/MT que condenou o recorrente pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06), à pena de 5 anos, 6 meses e 20 dias de reclusão em regime semiaberto, além de 555 dias-multa. A defesa alegou nulidade da prova por violação de domicílio, ausência de materialidade, pedido de absolvição ou desclassificação para uso pessoal, além da reavaliação da dosimetria, do reconhecimento do tráfico privilegiado, abrandamento do regime prisional e isenção das custas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há seis questões em discussão: (i) verificar a nulidade da prova por suposta violação de domicílio; (ii) definir se as provas são suficientes para condenação ou se comporta desclassificação para uso; (iii) analisar a legalidade e proporcionalidade da pena-base fixada; (iv) apurar a possibilidade de correção da fração aplicada pela confissão espontânea; (v) verificar se estão preenchidos os requisitos do tráfico privilegiado; (vi) analisar a possibilidade de substituição da pena corpórea, abrandamento do regime e o pedido de isenção das custas processuais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A entrada na residência foi precedida de denúncia anônima, seguida de abordagem exitosa em via pública com a apreensão de porções de maconha na posse do apelante e a posterior anuência para o ingresso dos militares na moradia, legitimando a busca domiciliar com base no art. 5.º, XI, da CF/1988 e na tese do Tema 280 da Repercussão Geral do STF. 4. A alegação de coação por civil não vinculado à segurança pública é isolada e desprovida de respaldo probatório, não invalidando a diligência. 5. A ausência de perícia em balanças e sacos plásticos não compromete a materialidade do delito, comprovada por outros elementos válidos, em especial o laudo de constatação que aponta a natureza e quantidade das substâncias ilícitas confiscadas. 6. O conjunto probatório — boletim de ocorrência, laudos, auto de apreensão e depoimentos policiais — é suficiente para a condenação, não sendo possível a desclassificação para o delito de posse para consumo. 7. A pena-base foi exasperada com fundamento idôneo, mas o aumento na fração de 1/3 foi excessivo frente à quantidade de drogas, sendo reduzido para 1/6. 8. A fração de 1/6 aplicada à atenuante da confissão espontânea está de acordo com o entendimento consolidado da jurisprudência e não comporta modificação. 9. Comprovados os requisitos legais, reconhece-se o tráfico privilegiado na fração máxima de 2/3. 10. A pena final foi fixada em 1 ano, 7 meses e 13 dias de reclusão e 161 dias-multa, substituída por duas restritivas de direitos, com fixação do regime aberto. 11. A ausência de comprovação da hipossuficiência, aliada à constituição de advogado particular, justifica o indeferimento do pedido de justiça gratuita. IV. DISPOSITIVO E TESE 12. Preliminar rejeitada. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. A entrada domiciliar sem mandado judicial é válida quando precedida de a prévia denúncia anônima, seguida de abordagem exitosa em via pública com a apreensão de porções de entorpecentes na posse do suspeito e posterior anuência para o ingresso dos militares na moradia, conforme interpretação do art. 5.º, XI, da CF/1988 e Tema 280 do STF; 2. A suficiência probatória para condenação por tráfico não exige flagrante de comercialização, bastando a posse, guarda ou depósito de entorpecentes com evidências de finalidade mercantil. 3. A ausência de perícia em petrechos apreendidos não invalida a condenação se a materialidade está demonstrada por outros meios válidos. 4. A variedade das drogas apreendidas pode justificar a elevação da pena-base, mas a fração deve observar a proporcionalidade e razoabilidade. 5. A confissão espontânea deve ser valorada na fração de 1/6, salvo fundamentação expressa para aplicação diversa. 6. O reconhecimento da causa de diminuição do art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/06 exige o preenchimento cumulativo dos requisitos legais. 7. A isenção de custas processuais deve ser requerida ao juízo da execução e exige comprovação da hipossuficiência, não bastando alegação genérica. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5.º, XI e LXXIV; CP, arts. 33, §§ 2.º, c, 44, 59 e 65, III, d; CPP, arts. 156 e 203; Lei n.º 11.343/06, arts. 33, caput e § 4.º, e 42. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 603.616/RO (Tema 280), rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, j. 05.11.2015; STJ, AgRg no HC 885148/SP, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, 5.ª T., j. 01.07.2024; STJ, EDcl no AgRg no HC 694.305/ES, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6.ª T., j. 08.02.2022; STJ, AgRg no AgRg no HC 789.166/RS, rel. Min. Rogério Schietti Cruz, 6.ª T., j. 27.03.2023. R E L A T Ó R I O APELANTE: WESLEY DA SILVA CABRAL APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por WESLEY DA SILVA CABRAL em face da r. sentença proferida pelo d. Juízo da 2.ª Vara da Comarca de Peixoto de Azevedo/MT nos autos da ação penal n.º 1001990-20.2024.8.11.0023, que o condenou pela prática do crime tipificado no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06, à pena de 5 anos, 6 meses e 20 dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 555 dias-multa, unitariamente calculados no mínimo legal. Por meio das razões recursais disponíveis no ID 265268871, o apelante arguiu, preliminarmente, a nulidade probatória por violação de domicílio, pois alega que inexistia justa causa para a medida invasiva, sendo a diligência realizada com fulcro unicamente em denúncia anônima. Além disso, sustenta ter havido o envolvimento da pessoa identificada como Wilkes, civil sem vínculo formal com as forças de segurança pública, que teria lhe apontado uma arma e coagido a fornecer informações, sem contar que não foi realizada a perícia nas balanças de precisão e sacos plásticos apreendidos durante a busca, a afastar a materialidade delitiva e ensejar a sua absolvição, com fulcro no art. 386, inc. II, do CPP. No mérito, pleiteia a absolvição sob o viés da insuficiência probatória e, sucessivamente, a desclassificação da conduta para aquela descrita no art. 28 da Lei n.º 11.343/06, sustentando não ter restado comprovada a destinação mercantil do narcótico apreendido. De forma subsidiária, almeja a redução da pena-base para o mínimo legal; o decote da sanção intermediária em fração superior a 1/6, em decorrência da incidência da atenuante da confissão espontânea; o reconhecimento do ‘tráfico privilegiado’, com o decréscimo da pena na fração máxima, por preencher os requisitos legais; o abrandamento do regime inicial de cumprimento de pena e a isenção das custas processuais, em razão da sua aventada hipossuficiência financeira. Nas contrarrazões constantes no ID 265268880, o Ministério Público pugna pela rejeição da preliminar de nulidade arguida e, no mérito, pelo não provimento do apelo. Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer de ID 274307380, opina pela rejeição da preliminar de nulidade e, no mérito, pelo parcial provimento do apelo, apenas para reconhecer em benefício do apelante o ‘tráfico privilegiado’. Na sequência o apelante acostou aos autos a petição e documentos de ID 275336879 e ID 275336882, aduzindo que são essenciais ao deslinde da causa por demonstrarem que figura como vítima de delito perpetrado por Wilkes em outros autos, o que poderia impactar substancialmente na revisão da r. sentença ora recorrida, justificando a juntada tardia pelo fato de a investigação ter sido sigilosa, só advindo a publicidade do processo recentemente. É o relatório. À douta Revisão. V O T O R E L A T O R VOTO [PRELIMINAR DE NULIDADE PROBATÓRIA POR VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO] EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR) Egrégia Câmara: Ab initio, registra-se que o recurso em apreço é tempestivo, foi interposto por quem tinha legitimidade para fazê-lo e o meio processual escolhido mostra-se adequado e necessário para se atingir os objetivos perseguidos, razão pela qual conheço do apelo manejado pela i. defesa técnica, uma vez que presentes os requisitos objetivos e subjetivos para tanto. Como matéria preliminar, alega o apelante serem nulas as provas diretas e por derivação provenientes da busca domiciliar realizada, pois alega que inexistia justa causa para a medida invasiva, sendo a diligência realizada com fulcro unicamente em denúncia anônima. Além disso, sustenta ter havido o envolvimento da pessoa identificada como Wilkes, civil sem vínculo formal com as forças de segurança pública, que teria lhe apontado uma arma e coagido a fornecer informações, sem contar que não foi realizada a perícia nas balanças de precisão e sacos plásticos, a afastar a materialidade delitiva e ensejar a sua absolvição, com fulcro no art. 386, inc. II, do CPP. No entanto, não vislumbro motivo para acolher a aventada nulidade. Isso porque, extrai-se das oitivas dos policiais militares que realizaram o flagrante, especialmente de Dionathan Antônio da Silva Pereira, colhidas na delegacia e em juízo, que houve prévia denúncia anônima dando conta de que um sujeito em uma motocicleta Titan, cor vermelha e placa com final 7178, estaria praticando a mercancia espúria no bairro Nova Esperança. Ao diligenciarem para averiguar a veracidade da notícia apócrifa, avistaram o apelante em um veículo com as referidas características, razão pela qual fizeram o devido acompanhamento, abordando-o em frente à sua residência. Durante a busca pessoal, localizaram no bolso do flagrado dois invólucros de maconha. Na ocasião, ele disse não possuir mais nada de ilícito e autorizou o ingresso dos militares em sua casa, onde os agentes estatais encontraram balanças de precisão, sacos plásticos utilizados para acondicionar entorpecentes, comprimidos de drogas sintéticas, porções de cocaína e maconha, além de munições calibre .38. E, como em matéria de prova no âmbito penal, os depoimentos prestados pelos policiais sobre atos de ofício realizados durante suas atribuições funcionais gozam de presunção de veracidade, em razão da função pública que ocupam, devendo seus dizeres serem tomados como críveis até que haja prova suficiente para ilidi-los; e, in casu, a i. defesa não logrou êxito em comprovar que os agentes estatais tinham a intenção de incriminar injustamente o acusado, no intuito de conferir legalidade às suas atribuições profissionais ou que faltaram com a verdade ao deporem em juízo, não há motivo para descredenciar seus relatos prestados mediante o compromisso legal de dizer a verdade (art. 203 do CPP). Logo, a prévia denúncia anônima, seguida de abordagem exitosa em via pública com a apreensão de porções de maconha na posse do apelante e a posterior anuência para o ingresso dos militares na moradia constituem circunstâncias concretas aptas a caracterizar as fundadas suspeitas e autorizar a busca domiciliar empreendida sem mandado judicial. Importa consignar que, com relação à denúncia anônima nos específicos casos que envolvem o tráfico de drogas, não se pode olvidar que os sujeitos ativos do delito revestem-se de verdadeiro poderio paralelo ao do Estado e se articulam de tal modo que são capazes de identificar os moradores da região em que atuam, além de conhecer a rotina cotidiana dessas pessoas, infundindo notório temor na comunidade circundante, não sendo de todo incompreensível que os seus delatores prefiram o anonimato, o que, todavia, não pode redundar na impunidade dos infratores e na inviabilização de medidas de interesse público como a persecução criminal e a busca da verdade real. Nesse cenário, a solução encontrada não é tolher a denúncia anônima de forma absoluta e impedir que boa parte das comunicações infracionais cheguem ao conhecimento das autoridades competentes, sob pena de ofensa aos princípios da supremacia do interesse público e da proibição da proteção deficiente. Não é senão esse o sentido do art. 5.º, §3.º do Código de Processo Penal, que atribui a qualquer pessoa do povo o poder de comunicar, verbalmente ou por escrito, a ocorrência de infração penal de que caiba ação penal pública, incumbindo à autoridade policial o dever de averiguar a procedência das informações e, acaso procedentes, determinar a instauração de inquérito. Aliás, o dispositivo legal em questão já foi interpretado pelo Superior Tribunal de Justiça como “o dever de apurar a veracidade dos fatos alegados”, que é endereçado à Polícia (EDcl no REsp 1096274/RJ, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, Sexta Turma, DJu 25.09.2012). E, in casu, diligências foram empreendidas para averiguar os fatos narrados de forma anônima, o que permitiu identificar o veículo apontado como sendo aquele utilizado na mercancia espúria de drogas e, realizada a abordagem do condutor, em sua posse foram encontradas porções de droga, a caracterizar a justa causa para a busca domiciliar empreendida em seguida. Desta feita, as circunstâncias acima mencionadas demonstram o estado de flagrância, haja vista que o tráfico de drogas é crime permanente, de modo que a sua consumação se protrai no tempo, fator este que autoriza o ingresso dos policiais na residência, em qualquer momento, sem a expedição de mandado judicial, nos moldes do que preceitua a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso XI: “A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. Oportuno consignar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 603.616/RO, submetido à sistemática da repercussão geral, firmou a tese de que “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados” (Tema 280). E ao julgar o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n.º 1447289/RS, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, foi consignado que exigir diligências investigativas prévias que evidenciassem elementos mais robustos da ocorrência do tráfico de drogas no endereço trata-se de requisito não previsto pelo legislador constituinte originário, tendo em vista que não se amolda às hipóteses excepcionais previstas no inciso XI do art. 5.º da Magna Carta e, portanto, há indevida inovação em matéria constitucional. Desse modo, pelo raciocínio acima exposto, não há falar em ofensa ao princípio da inviolabilidade de domicílio, refutando-se a nulidade arguida, não sendo o caso de manifesta ilegalidade ou arbitrariedade apta a descaracterizar os vestígios materiais colhidos durante a busca domiciliar que revelaram o envolvimento do apelante com o crime de tráfico de drogas. Acrescenta-se que a tese de que uma pessoa sem qualquer vínculo formal com as forças de segurança tenha participado da diligência policial coagindo WESLEY a fornecer informações apresenta-se isolada nos autos, sem qualquer outro elemento que a ampare, visto que os agentes estatais foram enfáticos ao dizer que havia apenas colegas de farda atuando durante o flagrante e que não conhecem sujeito algum chamado Wilkes, inexistindo nos autos qualquer indicativo de que tivessem a intenção de incriminar injustamente o sentenciado ou estivessem faltando com a verdade ao deporem. Assim, uma vez que, a teor do art. 156 do CPP, o ônus da prova compete a quem faz à alegação, não tendo a i. defesa técnica se incumbido de comprovar a versão apresentada pelo réu, torna-se inviável o acolhimento da narrativa de suposto vício durante as buscas pessoal e domiciliar. De mais a mais, a aventada situação está sendo devidamente apurada nos autos n.º 1000551-37.2025.8.11.0023. Por fim, a perícia nas balanças de precisão e nos sacos plásticos apreendidos na residência do apelante é totalmente prescindível, visto que tais itens apenas corroboram a materialidade do tráfico de drogas, que é atestada pelo laudo de constatação do entorpecente que evidencie a natureza e a quantidade da substância apreendida, o que está presente no caderno processual sob o ID 265268752 e o ID 265268768. Ademais, a referida diligência poderia ter sido pleiteada no curso da ação penal, o que não ocorreu, estando, portanto, abarcada pela preclusão. Ante o exposto, REJEITA-SE a preliminar de nulidade probatória por violação de domicílio. É como voto. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR) Egrégia Câmara: Superada a questão preliminar, verte dos autos que o apelante WESLEY DA SILVA CABRAL restou condenado pelo crime tipificado no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06, pois, no dia 19/07/2024, por volta das 23h45, na residência situada na rua Aracaju, n.º 500, bairro Nova Esperança, no município de Peixoto de Azevedo/MT, trazia consigo, tinha em depósito e guardava substâncias entorpecentes consistentes em “1 (uma) trouxa média (14,12 gramas) de cocaína, 1 (uma) trouxa pequena (0,38 gramas) de cocaína, 1 (uma) porção (18,29 gramas) de maconha, 2 (duas) trouxas médias (33,55 gramas) de maconha, 1 (uma) porção (55,94 gramas) de maconha e 8 (oito) comprimidos de ecstasy, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, bem assim, possuía essa droga, que não tinha como destino o consumo próprio, além de 2 (duas) balanças e sacos plásticos” (ID 265268778). Irresignado com o édito condenatório, recorre a esta eg. Corte Revisora, nos termos já relatados, ao que passo à análise das teses de mérito arguidas nas razões do apelo. 1. DO PLEITO ABSOLUTÓRIO, SECUNDADO PELO PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA: Nada obstante o apelante argumente que as provas produzidas durante a persecução penal não são aptas a sustentar sua condenação pelo crime de tráfico de drogas, pois não comprovada a destinação mercantil dos narcóticos apreendidos, tratando-se de mero usuário de drogas, motivo por que deve ser absolvido ou ter sua conduta desclassificada para a de uso, entendo que a razão não lhe assiste. A materialidade da infração penal está comprovada por meio do auto de prisão em flagrante (ID 265267292), do boletim de ocorrência (ID 265267293), do auto de apreensão (ID 265267299), do laudo de constatação de substância entorpecente (ID 265268752), do laudo pericial (ID 265268768), que atestou a presença de 14,5g de COCAÍNA, 107,78g de MACONHA e 8 comprimidos de MDMA no material ilícito apreendido, e das provas orais colhidas nas duas etapas da persecução penal. No que concerne à autoria, denota-se a presença satisfatória de elementos probatórios aptos a implicar o réu no evento criminoso e a respaldar sua condenação. WESLEY DA SILVA CABRAL, interrogado sob o crivo do contraditório e da ampla defesa (relatório de mídias de ID 265268834), negou a prática do crime de tráfico de drogas, assumindo-se apenas usuário de maconha. Alegou que a substância entorpecente dessa natureza, apreendida em sua residência, destinava-se unicamente ao consumo pessoal, acrescentando que não estava na posse, tampouco mantinha em depósito, qualquer outro tipo de narcótico. Relatou que, na data dos fatos, encontrava-se em casa, conversando ao telefone com sua esposa, quando percebeu a chegada de uma viatura policial em frente ao imóvel. Ao sair para verificar a situação, foi surpreendido por policiais armados, entre os quais se encontrava um indivíduo de nome Wilkes, que, segundo o apelante, não integrava os quadros da Polícia. Afirmou que os militares adentraram sua residência sem autorização, agrediram-no fisicamente e iniciaram buscas no imóvel. Rechaçou a acusação de ter deixado seu filho desacompanhado, sustentando que estava cuidando da criança no momento da abordagem. Declarou, ainda, que o menor presenciou as agressões e ficou emocionalmente abalado em razão do ocorrido. Informou que, durante a diligência, foi coagido a cooperar com os agentes, sob a promessa de que seria posto em liberdade caso indicasse outro local vinculado à comercialização de drogas. Por fim, reiterou não possuir qualquer vínculo com organização criminosa, nem estar envolvido com o tráfico de entorpecentes. Francilene Santana da Silva, convivente do sentenciado (relatório de mídias de ID 265268834), relatou judicialmente que reside com o companheiro e o filho do casal e que, no momento da ocorrência, encontrava-se em seu local de trabalho. Afirmou que WESLEY sempre foi cuidadoso com a criança, jamais a deixando desacompanhada. Asseriu que, durante a abordagem policial, recebeu mensagens do marido, inclusive com fotografias que demonstravam que ele estava em casa com o filho. No entanto, alegou que tais registros teriam sido apagados pelos agentes de segurança pública após a apreensão do celular do acusado. Declarou jamais ter presenciado drogas, armas ou munições na residência e negou qualquer conhecimento acerca de eventual envolvimento de seu esposo com o tráfico de entorpecentes, embora tenha reconhecido que ele fazia uso de maconha. Confirmou que foi chamada à delegacia para buscar o filho e, ao chegar ao local, foi algemada sem que lhe fossem prestadas explicações, tendo, ainda, sido agredida pelos policiais. Afirmou que a criança se encontrava muito abalada e chorava intensamente. A seu turno, a testemunha Dionathan Antônio da Silva Pereira, policial militar, em sua oitiva judicial (relatório de mídias de ID 265268834), afirmou que os fatos ocorreram entre 23h e 00h, após o recebimento de denúncia anônima informando que um indivíduo estaria realizando a distribuição de drogas utilizando uma motocicleta vermelha, no bairro Nova Esperança. A equipe identificou o suspeito e realizou a abordagem quando este parava diante de sua residência. Durante a busca pessoal, foram encontrados dois invólucros de maconha no bolso do abordado, o qual declarou não possuir outros itens ilícitos e convidou os agentes estatais a ingressarem no imóvel para realização de busca no local. No interior da casa, foi localizada uma criança de seis anos, com necessidades especiais, que se encontrava sozinha. No quarto do suspeito, foi apreendida uma sacola contendo diversas substâncias entorpecentes e munições calibre .38. O depoente acrescentou que a companheira do abordado não estava presente, pois se encontrava em seu local de trabalho. A criança, segundo ele, vestia apenas shorts, estava sem camisa, mas aparentava estar calma. O suspeito teria afirmado não ter mais nada a esconder e, conforme o policial, não houve resistência nem necessidade de uso de força para adentrar o imóvel. Negou ter conhecimento sobre qualquer promessa feita ao abordado em troca de colaboração e afirmou que apenas policiais militares estavam presentes na diligência, inexistindo civis no local. Por fim, declarou não conhecer ninguém com o nome de Wilkes. E José Carlos da Silva Nogueira Júnior, também policial militar, ao ser inquirido em audiência (relatório de mídias de ID 265268834), sustentou lembrar-se apenas de forma parcial da ocorrência. Informou que a guarnição recebeu uma denúncia envolvendo uma motocicleta supostamente utilizada no tráfico de drogas na região do bairro Nova Esperança. A equipe conseguiu localizar o veículo e abordou o suspeito em frente à residência. Durante a revista pessoal, foi localizada certa quantidade de substância entorpecente, cujo tipo e volume o depoente não soube precisar. Em razão disso, foi realizada a detenção do abordado. Afirmou não se recordar se houve ingresso no imóvel nem se foram localizados mais entorpecentes no interior da casa. Declarou, igualmente, não ter lembrança da presença de criança no local, tampouco se participou diretamente da apreensão dos objetos ilícitos ou se esta foi efetuada por outro integrante da equipe. Mencionou de forma vaga que poderia se tratar de uma ocorrência envolvendo droga sintética (ecstasy), mas destacou que suas memórias são imprecisas. Nada obstante, tal testemunha havia apresentado maiores detalhes acerca dos fatos na delegacia, como a seguir se verifica: “Que o 22º batalhão juntamente com a equipe de cavalaria de Nova Mutum recebeu informações de que um indivíduo, pertencente à facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), estava em uma motocicleta de cor vermelha, modelo Titan, placa final 7178, estava distribuindo entorpecentes na cidade de Peixoto de Azevedo. De imediato foi realizado rondas nas imediações do bairro Nova Esperança, onde foi possível identificar o veículo e realizar o encalço, logrando êxito em realizar a abordagem no momento em que este desceu da motocicleta em frente a sua residência para abrir o portão. Ao realizar busca pessoal e checagem foi encontrado no bolso de sua bermuda dois invólucros de maconha, sendo estes de sacola na cor branca. Diante o exposto foi realizado entrevista com o suspeito, qual relatou que não tinha mais nenhuma droga e convidou a GUPM adentrar em sua residência. Diante o fato, as equipes policiais adentraram a residência (...) Assim, procedendo a busca, foi encontrado em uma sacola plástica, acondicionada no interior do quarto da residência, duas balanças de precisão, dois invólucros contendo diversos sacos plásticos para acondicionamento de entorpecentes, um invólucro contendo oito comprimidos de uma droga sintética aparentando ser ecstazy, dois invólucros contendo uma substância em pó, na cor branca, aparentando ser cocaína e mais dois invólucros transparentes com uma substância esverdeada aparentando ser maconha, além de dezesseis munições do tipo revolver, no calibre 38, intactas. (...) Sra. Francilene Santana da Silva que estava trabalhando no momento dos fatos como cozinheira e relatou que deixou o filho sob a responsabilidade do pai e que não sabia do envolvimento deste com o tráfico de drogas. (...)” (ID 265267297). E, como se sabe, o simples fato de as testemunhas consistirem em policiais que diligenciaram na fase inquisitiva não retira a credibilidade ou elide a idoneidade de seus relatos, os quais, além de deterem fé pública e presunção de legitimidade, foram prestados mediante o compromisso legal de que trata o art. 203 do Código de Processo Penal, máxime porque não fora evidenciada qualquer tendência dos agentes estatais em incriminar injustamente os acusados, com escopo de conferir legalidade à suas atuações profissionais. Sobre o assunto, a Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal de Justiça já assentou que: “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal”. (Enunciado Orientativo n.º 8, Incidente de Uniformização de Jurisprudência n.º 101532/2015, DJE n.º 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017; destaques apostos). Por conseguinte, os depoimentos coesos e firmes dos policiais nas duas fases da persecução, agregados às circunstâncias fáticas e à apreensão de 2 porções de MACONHA totalizando 33,55g, que estavam no bolso do apelante, e de 2 invólucros contendo 14,5g de COCAÍNA, 4 porções de MACONHA pesando 74,25g, 8 comprimidos de Ecstasy (MDMA) e 2 balanças de precisão, que estavam acondicionados no quarto, após prévia denúncia anônima indicando que o suspeito estaria praticando a mercancia espúria na condução de uma motocicleta de cor vermelha, com placa final 7178, na qual WESLEY foi surpreendido e abordado em frente à sua casa, constituem elementos suficientes para a certeza da prática do crime de tráfico de drogas, de sorte que tal convicção deve prevalecer sobre a isolada negativa de autoria do sentenciado. Aliás, faz-se relevante salientar que o fato de o agente não ter sido flagrado na efetiva mercancia de substâncias ilícitas não obsta a configuração do delito de tráfico de drogas, pois para a sua caracterização é prescindível prova flagrancial do comércio ilícito, bastando que a pessoa seja surpreendida praticando quaisquer das ações descritas no tipo penal, em contexto que evidencie à saciedade o seu envolvimento com o comércio malsão, porquanto se trata de tipo penal misto alternativo, cuja consumação se dá com o cometimento de quaisquer das condutas nele especificadas (Enunciado Orientativo n.º 07 da TCCR/TJMT). Ademais, muito embora a i. defesa técnica insista na alegação de que o apelante é apenas usuário de drogas, a referida tese não restou devidamente comprovada nos autos, máxime porque WESLEY declarou fazer uso de tão somente maconha, todavia, em sua casa foram apreendidos, além desse tipo de droga, entorpecentes de naturezas diversas – cocaína e ecstasy, sendo certo, ainda, que o fato do agente ser usuário de droga não obsta a compreensão de que pode, em concomitância com a satisfação da dependência química, traficar entorpecentes, inclusive para manter o vício. A propósito, nos termos do Enunciado Orientativo n.º 03 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT, “a condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006”. Logo, sendo pródigo o conjunto probatório ao evidenciar a traficância por parte do recorrente, o qual, com finalidade mercantil e o objetivo de entrega ao consumo alheio, possuía, guardava e tinha em depósito psicotrópicos de uso proscrito no país, subsome-se o fato à norma incriminadora do art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006. Com tais considerações, à luz do princípio da persuasão racional, estou convencido de que as provas produzidas no curso de ambas as etapas da persecução criminal são suficientes para demonstrar a autoria de WESLEY DA SILVA CABRAL pelo crime de tráfico de drogas, com todas as elementares que lhe são inerentes, a inviabilizar o acolhimento da pretensão absolutória, assim como da almejada desclassificação da conduta para a de uso de drogas. Mantém-se, pois, a condenação em que incursionado o sentenciado. 2. DA ALMEJADA REVISÃO DA PENA-BASE: Subsidiariamente, almeja o apelante a redução da sanção básica para o mínimo legal, pedido este que comporta parcial acolhimento. Com efeito, o Código Penal não elenca limites mínimo e máximo para fixar o aumento justificador da aferição negativa das circunstâncias judiciais previstas em seu artigo 59, tampouco para quantificar as atenuantes e agravantes de pena, conferindo ao julgador, nas duas primeiras fases da dosimetria penal, a discricionariedade para estabelecer os quantitativos que entender necessários para a reprovação e prevenção dos delitos, desde que respeitados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Nessa toada, firmou-se nesta eg. Corte de Justiça que “Inexiste critério estritamente aritmético aplicável para fixação da pena-base, de modo que cada circunstância judicial pode ser valorada e quantificada de maneira distinta, por meio de juízo de discricionariedade, observando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.” (Enunciado Orientativo n.º 39 do Incidente de Uniformização de Jurisprudência n.º 101.532/2015, Disponibilizado no DJE Edição n.º 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017). Destaquei. Entretanto, no intuito de garantir a segurança jurídica, consolidou-se na jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça que, para cada vetorial do art. 59 do CP negativado, o juiz deve observar a fração de 1/6 (um sexto) sobre o mínimo legal ou de 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre as penas mínima e a máxima abstratamente previstas no tipo penal incriminador, ressalvados os casos em que há fundamentação idônea para a adoção de parâmetros mais severos (ex vi dos AgRg no HC 579.203/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 25/05/2021, DJe 01/06/2021; PET no REsp 1659662/CE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 11/05/2021, DJe 14/05/2021). Todavia, em situações envolvendo significativas apreensões de substâncias proscritas, o eg. Superior Tribunal de Justiça tem chancelado a elevação da pena acima do mínimo na primeira fase do cálculo dosimétrico em patamares diferentes dos dois critérios de incremento da pena base. In casu, depreende-se do édito condenatório que, na primeira fase da dosimetria, o MM. Magistrado singular distanciou a reprimenda basilar do mínimo legal na fração de 1/3, fixando-a em 6 anos e 8 meses e 666 dias-multa, em razão da depreciação apenas da natureza das drogas, haja vista a apreensão de três diferentes tipos de entorpecente – COCAÍNA, MACONHA E MDMA. Sobre a temática, faz-se adequado pontuar que, por força do disposto no artigo 42 da Lei n.º 11.343/2006, “o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente”. Logo, como se vê, o próprio legislador impôs ao juiz o dever de considerar a natureza e a quantidade da droga, dentre outros fatores, na fixação das penas, inclusive com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Código Penal. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “No delito de tráfico de drogas não há ilegalidade na exasperação da pena-base acima do mínimo legal com fulcro no art. 42 da Lei n. 11 .343/2006, uma vez que a quantidade e a natureza da droga apreendida é fundamento idôneo para exasperar a pena-base e deve preponderar sobre as demais circunstâncias judiciais, nos exatos termos do art. 42, da Lei n. 11.343/2006” (STJ - AgRg no HC: 885148 SP 2024/0010860-0, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 01/07/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/07/2024). Grifei. Por outro lado, nada obstante a variedade dos narcóticos e a natureza altamente deletéria de um deles, a quantidade de drogas apreendidas (14,5g de cocaína, 107,78g de maconha e 8 comprimidos de MDMA) não é tão significativa a ponto de justificar o incremento da sanção básica do réu na fração de 1/3, quantum este superior aos parâmetros ideais adotados pela jurisprudência. Desta feita, retifico parcialmente a pena-se do apelante, apenas para aplicar a fração de 1/6 de recrudescimento em razão da valoração negativa da natureza variada das drogas apreendidas. 3. DA PRETENDIDA READEQUAÇÃO DA PENA INTERMEDIÁRIA: No que se refere ao pedido de redução da pena intermediária, em decorrência da aplicação da atenuante da confissão espontânea (art. 65, inc. III, alínea d, do CP), em fração superior a 1/6, não comporta acolhimento. Como já adiantado no tópico anterior, o Código Penal não elenca limites mínimo e máximo para quantificar as atenuantes e agravantes de pena, conferindo ao julgador a discricionariedade para estabelecer os quantitativos que entender necessários para a reprovação e prevenção dos delitos, desde que respeitados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Todavia, no intuito de garantir a segurança jurídica, consolidou-se na jurisprudência que “deve ser adotada a fração paradigma de 1/6 (um sexto) para aumento ou diminuição da pena pela incidência das agravantes ou atenuantes genéricas, ante a ausência de critérios para a definição do patamar pelo legislador ordinário, devendo o aumento superior ou a redução inferior à fração paradigma estar devidamente fundamentado" ( AgRg no HC n. 370.184/RS, Rel. Ministro Felix Fischer, 5ª T ., DJe 22/5/2017)” (STJ - AgRg no AgRg no HC: 789166 RS 2022/0387348-6, Relator.: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 27/03/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/04/2023). E, in casu, na segunda fase de individualização da pena, ao reconhecer em prol do sentenciado a atenuante da confissão espontânea, o d. julgador singular aplicou justamente o quantum de 1/6 para reduzir a sanção, de modo que não há retificação alguma a ser feita. 4. DA PRETENDIDA INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 33, §4.º, DA LEI N.º 11.343/06: WESLE pleiteia também o reconhecimento da figura comumente denominada de “tráfico privilegiado”; e, após detida análise do caso concreto, entendo que o pedido faz jus à acolhida. Como é cediço, ao tempo em que conferiu tratamento mais rigoroso aos grandes traficantes e àqueles que se entregam com frequência ao narcotráfico, majorando as penas outrora previstas na lei que a precedeu, a Lei n.º 11.343/06 instituiu, por outro lado, uma benignidade modulada em relação ao traficante iniciante ou de menor porte, passando a prever a causa especial de diminuição da pena comumente denominada “tráfico privilegiado”. A benesse em questão, positivada pelo legislador no §4.º do art. 33 do aludido diploma legal, visa conferir tratamento distinto aos infratores que, embora não se dediquem a atividades criminosas, praticam de forma isolada o tráfico de entorpecentes, por um lapso social ou financeiro. Ou seja, tem por objetivo abrandar a sanção penal do traficante ocasional, e não daquele que faz do tráfico o seu meio de vida. Em outras palavras, a teleologia da minorante diz respeito ao caráter esporádico da conduta típica realizada pelo agente e pressupõe que o beneficiário não ostente sinais objetivos de que faz do crime uma profissão, circunstância que deverá ser aferida casuisticamente, com base nos múltiplos aspectos que permeiam a situação concreta. Nesta toada, a própria dicção do dispositivo legal condiciona a aplicação do redutor ao preenchimento cumulativo de quatro requisitos indispensáveis, a saber, (i) que o agente seja primário; (ii) com bons antecedentes; (iii) não se dedique às atividades delituosas; e (iv) não integre organização criminosa. Partindo dessas premissas e volvendo-se à hipótese em apreço, infere-se da r. sentença que o MM. Magistrado a quo não apresentou justificativa alguma para afastar a referida causa de diminuição da pena, limitando-se a afirmar que “na terceira fase, não se constatam causas de aumento ou diminuição, de modo que TORNO DEFINITIVA a pena de 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e o pagamento de 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa” (ID 265268848). Sucede que o apelante é primário, possui bons antecedentes e nada nos autos evidencia que se dedica a atividades delituosas ou integre organização criminosa, uma vez que não houve a apreensão de caderno de anotações, inexistem relatórios investigativos, tampouco notícias de que foram empreendidas diligências policiais posteriores à prisão acerca do envolvimento de WESLEY com a mercancia espúria, assim como também não houve a quebra de sigilo dos dados telemáticos e/ou interceptações telefônicas autorizadas judicialmente que tenham colhido elementos reveladores da habitualidade do apelante no mundo da ilicitude. Soma-se a esse cenário que a quantidade e natureza das substâncias entorpecentes apreendidas foram utilizadas na primeira etapa da dosimetria, obstando, assim, que sejam empregadas novamente no terceiro momento, por vedação ao bis in idem. Destarte, comprovada a primariedade e ausência de antecedentes criminais do apelante e inexistindo provas da sua dedicação a atividades criminosas ou de que integre organização criminosa, induvidoso que faz jus à causa de diminuição do art. 33, §4.º, da Lei n.º 11.343/06, na fração máxima de 2/3 (dois terços). Nesse sentido é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: “PENAL E PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. 45 PEDRAS DE CRACK E 30 BUCHAS DE MACONHA. PEDIDO DE AFASTAMENTO DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NA DECISÃO. PACIENTE PRIMÁRIO E SEM ANTECEDENTES. PENA-BASE FIXADA NO PISO MÍNIMO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA MINORANTE. REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. 1. Na sentença, não houve menção à dedicação a atividade criminosa por parte do paciente. No acórdão hostilizado, constou apenas a existência de registro criminais. Nada foi mencionado sobre uma efetiva dedicação ao tráfico. A quantidade de drogas não se mostra extremamente excessiva. O paciente é primário e sem antecedentes. A existência de registros, por si só, não é empecilho ao reconhecimento do privilégio, conforme precedentes desta Corte. 2. Embargos de declaração rejeitados” (EDcl no AgRg no HC n. 694.305/ES, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 8/2/2022, DJe de 15/2/2022). Grifei. Por conseguinte, passo à materialização da nova reprimenda: Na primeira etapa do cálculo, consoante exposto no ITEM 2 desse voto, mantenho a valoração negativa da natureza e quantidade das drogas apreendidas readequando-se apenas a fração de recrudescimento para 1/6, atingindo a pena o patamar de 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa. No segundo momento, incide a atenuante da confissão espontânea na fração de 1/6, de modo que a sanção intermediária fica estabelecida em 4 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão e 485 dias-multa. E, na terceira etapa, acolhida neste grau de jurisdição a pretensão defensiva de aplicação em favor do apelante da minorante prevista no §4º do art. 33 da Lei nº. 11.343/06, com a incidência da fração máxima de 2/3, fixo a pena final em 1 ano, 7 meses e 13 dias de reclusão e 161 dias-multa, que torno definitiva à míngua de outras causas de diminuição ou aumento. Diante da revisão da pena nesta instância ad quem e sendo majoritariamente favoráveis os vetores judiciais do art. 59 do CP e do art. 42 da Lei n.º 11.343/06, fixo o regime inicial aberto, com fulcro no art. 33, §§ 2.º, alínea c, do CP. E preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, viável a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos a serem definidas pelo d. Juízo da Execução Penal. No mais, permanecem inalterados os termos da r. sentença 5. DO PLEITO DE ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS: No que concerne à almejada concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, entendo que a referida providência deve ser pugnada ao Juízo da Vara de Execuções Penais, o qual, a meu ver, é o órgão jurisdicional competente para aferir a hipossuficiência econômica do condenado, na acepção legal do termo, sobretudo diante da possibilidade de ser alterada sua situação financeira após a condenação. (Nesse sentido: TJMT, Ap 165014/2016, Des. PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, julgado em 01/03/2017, DJE 07/03/2017; TJMT, Ap 31930/2018, Des. ALBERTO FERREIRA DE SOUZA, Segunda Câmara Criminal, julgado em 15/08/2018, DJE 20/08/2018.) Ademais, o artigo 5º, inc. LXXIV, da CF/88 preceitua que o Estado prestará a assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem que não possuem recursos suficientes para arcar com as custas processuais, de modo que não basta a simples menção à ausência de condições econômicas para arcar com os ônus do processo, devendo o apelante comprovar a real necessidade de se valer do benefício, sendo certo que a declaração de hipossuficiência possui presunção relativa de veracidade, podendo, pois, ser confrontada com outras provas constantes nos autos. E na hipótese em tela, além de não ter comprovado nos autos a sua situação de pobreza, o apelante esteve assistido por advogado particular durante a instrução processual e também na fase recursal, não havendo notícias de que o defensor constituído teria atuado de forma graciosa, razões pelas quais não se afigura razoável presumir que se trata de pessoa hipossuficiente, mesmo porque se dispõe de recursos para arcar com os honorários do seu patrono, também pode dispor da quantia necessária ao pagamento das custas judiciais e demais despesas processuais. Com tais considerações, indefiro o pedido de concessão dos benefícios da Justiça Gratuita. CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do apelo interposto por WESLEY DA SILVA CABRAL em face da r. sentença proferida pelo d. Juízo da 2.ª Vara da Comarca de Peixoto de Azevedo/MT nos autos da ação penal n.º 1001990-20.2024.8.11.0023, rejeitando-se a preliminar de nulidade arguida e, no mérito, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO tão somente para readequar a fração de recrudescimento da pena-base para 1/6 e aplicar em benefício do réu a causa de diminuição prevista no §4.º do art. 33 da Lei n.º 11.343/06 na fração máxima de 2/3, de modo que fica a sua pena final e definitiva fica estabelecida em 1 ano, 7 meses e 13 dias de reclusão, no regime inicial aberto, e pagamento de 161 dias-multa, unitariamente calculados no mínimo legal; substituída a pena privativa de liberdade por duas sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo d. Juízo da Execução Penal. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025
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