Processo nº 5000220-48.2025.4.03.6326
ID: 292886156
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Gabinete JEF de Piracicaba
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5000220-48.2025.4.03.6326
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUILHERME DRESADORI CHERVI
OAB/SP XXXXXX
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FELIPE ESTEVES MACHADO
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000220-48.2025.4.03.6326 / 1ª Vara Gabinete JEF de Piracicaba AUTOR: ANTONIO CARLOS CHERVI Advo…
PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000220-48.2025.4.03.6326 / 1ª Vara Gabinete JEF de Piracicaba AUTOR: ANTONIO CARLOS CHERVI Advogados do(a) AUTOR: FELIPE ESTEVES MACHADO - SP450451, GUILHERME DRESADORI CHERVI - SP466194 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA Trata-se de ação de conhecimento pela qual a parte autora postula a concessão de aposentadoria por idade. Dispensado o relatório (art. 38 da Lei n. 9099/95). Decido. Inicialmente, defiro a gratuidade. Da aposentadoria por idade Inicialmente, passo a analisar o ordenamento jurídico que vigorou até a promulgação da EC n. 103/2019. Nesse momento, a matriz legal do benefício de aposentadoria por idade é o art. 48, caput da Lei n. 8213/91, redigido nos seguintes termos: Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. Dessa forma, o requisito essencial para a obtenção do benefício é o atendimento à idade exigida em lei, desde que cumprido o período de carência legalmente previsto (180 contribuições mensais, nos termos do art. 25, II da Lei n. 8213/91, observada a tabela progressiva objeto da norma transitória prevista no art. 142 da mesma lei). Além dessa normativa fundamental, denominada pela doutrina e jurisprudência como aposentadoria por idade urbana, a lei prevê, no art. 48, § 1º da Lei n. 8213/91, a denominada aposentadoria por idade rural, nos seguintes termos: § 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. Assim, a aposentadoria por idade rural difere da sua congênere urbana no tocante ao requisito etário, reduzido em 5 anos para aqueles que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, nos termos do art. 48, § 2º da Lei n. 8213/91, que conta com a seguinte redação: § 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei. Importante relembrar, em relação à aposentadoria por idade rural, a tese estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça em regime de recursos repetitivos (Tema n. 692). Naquela oportunidade, interpretando a expressão “imediatamente anterior ao requerimento administrativo”, o STJ fixou a seguinte interpretação: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade. Os dois regimes de aposentadoria por idade diferem, ainda, no tocante à carência exigida do segurado especial, dispensada nas hipóteses disciplinadas no art. 39, I da Lei n. 8213/91, conforme expressamente previsto no art. 26, III, do mesmo diploma legal. Em síntese, são estas as condições para a concessão do benefício: - aposentadoria por idade urbana: idade de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e atendimento do período de carência (para tanto considerado apenas o período de trabalho urbano); - aposentadoria por idade rural: idade de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher, e atendimento do período de carência (para tanto considerado apenas o período de trabalho rural). Esse regramento original, contudo, acabava por implicar a ocorrência de situações de injustiça, nas quais o segurado, contando com períodos de atividade rural e urbana que somados atenderiam ao período de carência exigido, não poderiam obter o benefício se considerados os períodos rural e urbano de forma isolada. Essa lacuna restou suprida pela edição da Lei n. 11.718/2008, que incluiu os §§ 3º e 4º no art. 48 da Lei n. 8213/91, nos seguintes termos: § 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. § 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. Com essa inovação legislativa, a jurisprudência passou a reconhecer a existência de uma terceira modalidade de aposentadoria por idade, denominada “híbrida”, prestigiando aquele que exerceu atividades rurais, mas condicionando a concessão do benefício ao critério etário exigido para o regime urbano. A consideração concomitante de períodos de trabalho rural e urbano para a concessão de benefício não era estranha ao regime originariamente previsto na Lei n. 8213/91, conforme demonstra seu art. 55, § 2º. Dessa forma, não haveria qualquer inovação trazida pela Lei n. 11.718/2008. Contudo, nos termos do referido dispositivo legal, o trabalho rural anterior a 1991, exercido sem o recolhimento de contribuições previdenciárias, não era válido para o atendimento da carência exigida para a concessão de benefícios previdenciários. Assim, a melhor interpretação a ser dada aos §§ 3º e 4º do art. 48 da Lei n. 8213/91 é que esses dispositivos legais alteraram os efeitos do trabalho rural para fins de carência do benefício de aposentadoria por idade. Nesse sentido, o exercício de atividade rural sob regime de economia familiar, exercido em qualquer época, deve ser considerado para efeito de carência, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, a teor do que dispõem os arts. 26, III, e 39, I, ambos da Lei n. 8213/91. Por seu turno, também são aptos a suprirem a carência exigida para a concessão da aposentadoria por idade os períodos de trabalho como empregado rural e trabalhador rural eventual, ocorridos até 31/12/2010, independentemente de recolhimento de contribuições previdenciárias, conforme interpretação decorrente da análise do art. 143 da Lei n. 8213/91 c/c o art. 2º da Lei n. 11.718/2008. Em relação ao empregado rural, ressalte-se ainda que, por não ser sua a obrigação de recolhimento das contribuições previdenciárias, mas sim do empregador, deve ser considerado como período apto a suprir a carência do benefício o trabalho exercido após 31/12/2010, mesmo sem o recolhimento das contribuições devidas. Por fim, em relação ao empresário rural (art. 11, V, “a” da Lei n. 8213/91) o cômputo do tempo de trabalho para fins de carência demanda, a qualquer tempo, o recolhimento de contribuições previdenciárias. No sentido do entendimento ora adotado decidiu o Superior Tribunal de Justiça, conforme se observa no seguinte precedente: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3º e 4º, DA LEI 8.213/1991. TRABALHO URBANO E RURAL NO PERÍODO DE CARÊNCIA. REQUISITO. LABOR CAMPESINO NO MOMENTO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. EXIGÊNCIA AFASTADA. CONTRIBUIÇÕES. TRABALHO RURAL. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. 1. O INSS interpôs Recurso Especial aduzindo que a parte ora recorrida não se enquadra na aposentadoria por idade prevista no art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, pois no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo era trabalhadora urbana, sendo a citada norma dirigida a trabalhadores rurais. Aduz ainda que o tempo de serviço rural anterior à Lei 8.213/1991 não pode ser computado como carência. 2. O § 3º do art. 48 da Lei 8.213/1991 (com a redação dada pela Lei 11.718/2008) dispõe: "§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher." 3. Do contexto da Lei de Benefícios da Previdência Social se constata que a inovação legislativa trazida pela Lei 11.718/2008 criou forma de aposentação por idade híbrida de regimes de trabalho, contemplando aqueles trabalhadores rurais que migraram temporária ou definitivamente para o meio urbano e que não têm período de carência suficiente para a aposentadoria prevista para os trabalhadores urbanos (caput do art. 48 da Lei 8.213/1991) e para os rurais (§§ 1º e 2º do art. 48 da Lei 8.213/1991). 4. Como expressamente previsto em lei, a aposentadoria por idade urbana exige a idade mínima de 65 anos para homens e 60 anos para mulher, além de contribuição pelo período de carência exigido. Já para os trabalhadores exclusivamente rurais, as idades são reduzidas em cinco anos e o requisito da carência restringe-se ao efetivo trabalho rural (art. 39, I, e 143 da Lei 8.213/1991). 5. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3º e 4º no art. 48 da Lei 8.213/1991, abrigou, como já referido, aqueles trabalhadores rurais que passaram a exercer temporária ou permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o período de carência. 6. Sob o ponto de vista do princípio da dignidade da pessoa humana, a inovação trazida pela Lei 11.718/2008 consubstancia a correção de distorção da cobertura previdenciária: a situação daqueles segurados rurais que, com a crescente absorção da força de trabalho campesina pela cidade, passam a exercer atividades laborais diferentes das lides do campo, especialmente quanto ao tratamento previdenciário. 7. Assim, a denominada aposentadoria por idade híbrida ou mista (art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/1991) aponta para um horizonte de equilíbrio entre a evolução das relações sociais e o Direito, o que ampara aqueles que efetivamente trabalharam e repercute, por conseguinte, na redução dos conflitos submetidos ao Poder Judiciário. 8. Essa nova possibilidade de aposentadoria por idade não representa desequilíbrio atuarial, pois, além de exigir idade mínima equivalente à aposentadoria por idade urbana (superior em cinco anos à aposentadoria rural), conta com lapsos de contribuição direta do segurado que a aposentadoria por idade rural não exige. 9. Para o sistema previdenciário, o retorno contributivo é maior na aposentadoria por idade híbrida do que se o mesmo segurado permanecesse exercendo atividade exclusivamente rural, em vez de migrar para o meio urbano, o que representará, por certo, expressão jurídica de amparo das situações de êxodo rural, já que, até então, esse fenômeno culminava em severa restrição de direitos previdenciários aos trabalhadores rurais. 10. Tal constatação é fortalecida pela conclusão de que o disposto no art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/1991 materializa a previsão constitucional da uniformidade e equivalência entre os benefícios destinados às populações rurais e urbanas (art. 194, II, da CF), o que torna irrelevante a preponderância de atividade urbana ou rural para definir a aplicabilidade da inovação legal aqui analisada. 11. Assim, seja qual for a predominância do labor misto no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo, o trabalhador tem direito a se aposentar com as idades citadas no § 3º do art. 48 da Lei 8.213/1991, desde que cumprida a carência com a utilização de labor urbano ou rural. Por outro lado, se a carência foi cumprida exclusivamente como trabalhador urbano, sob esse regime o segurado será aposentado (caput do art. 48), o que vale também para o labor exclusivamente rurícola (§§1º e 2º da Lei 8.213/1991). 12. Na mesma linha do que aqui preceituado: REsp 1.376.479/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Julgado em 4.9.2014, pendente de publicação. 14. Observando-se a conjugação de regimes jurídicos de aposentadoria por idade no art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, denota-se que cada qual deve ser observado de acordo com as respectivas regras. 15. Se os arts. 26, III, e 39, I, da Lei 8.213/1991 dispensam o recolhimento de contribuições para fins de aposentadoria por idade rural, exigindo apenas a comprovação do labor campesino, tal situação deve ser considerada para fins do cômputo da carência prevista no art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, não sendo, portanto, exigível o recolhimento das contribuições. […] 17. Recurso Especial não provido. (REsp 1407613/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 28/11/2014). Também de interesse para a análise da aposentadoria por idade híbrida é a tese adotada em julgamento de recursos repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça (Tema n. 1007), admitindo-se o reconhecimento e contagem de tempo rural remoto para possibilitar a referida modalidade de aposentação. Confira-se: O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo. Em síntese, a aposentadoria por idade híbrida é devida quando: atingida a idade de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e atendida a carência exigida (para tanto sendo considerados períodos de atividade urbana ou rural, ainda que remotos, independentemente de recolhimento de contribuições previdenciárias nos casos de segurado especial rural, empregado rural e trabalhador rural eventual, este até 31/12/2010). Da aposentadoria por idade a partir da EC n. 103/2019 A concessão da aposentadoria por idade a partir da promulgação da EC n. 103, em 13/11/2019 (data na qual passou a ser identificada como modalidade de aposentadoria programada), deverá observar as novas alterações, em especial o disposto no art. 201, § 7º da CF, assim redigido: § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: I - 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, observado tempo mínimo de contribuição; II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. Outrossim, devem ser observados os artigos 18 e 19 da referida emenda constitucional, que prescrevem normas de transição, nos seguintes termos: Art. 18. O segurado de que trata o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 60 (sessenta) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem; e II - 15 (quinze) anos de contribuição, para ambos os sexos. § 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade de 60 (sessenta) anos da mulher, prevista no inciso I do caput, será acrescida em 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade. § 2º O valor da aposentadoria de que trata este artigo será apurado na forma da lei. Art. 19. Até que lei disponha sobre o tempo de contribuição a que se refere o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20(vinte) anos de tempo de contribuição, se homem. […] Observadas as alterações promovidas por esses dispositivos constitucionais, todas as demais considerações lançadas nesta decisão são plenamente aplicáveis, seja para o direito adquirido previamente à edição da emenda constitucional, seja nas hipóteses de atendimento dos requisitos para aposentação apenas após as alterações constitucionais acima referidas. Da comprovação de atividade rural para a concessão de aposentadoria por idade A comprovação de tempo de serviço para fins previdenciários, inclusive de natureza rural, tem seus regramentos básicos delineados pelos art. 55, § 3º e 108, ambos da Lei n. 8213/91, cuja redação é a seguinte: Art. 55. […] § 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento. […] Art. 108. Mediante justificação processada perante a Previdência Social, observado o disposto no § 3º do art. 55 e na forma estabelecida no Regulamento, poderá ser suprida a falta de documento ou provado ato do interesse de beneficiário ou empresa, salvo no que se refere a registro público. Pelo teor do § 3º do art. 55, a comprovação de tempo de serviço não pode ser feita por prova exclusivamente testemunhal, salvo situações efetivamente comprovadas de força maior ou caso fortuito. A validade de referido dispositivo legal foi reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça, sendo objeto da Súmula n. 149, assim redigida: A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário. Contudo, a interpretação conjunta desses dois dispositivos de lei nos indica a desnecessidade de que a prova material abranja todo o período de trabalho cujo reconhecimento é pleiteado, ano a ano. De fato, o art. 108, ao admitir a justificação administrativa para suprir a falta de prova documental, indica que não há necessidade de apresentação de documentos relativos a cada um dos anos pleiteados pelo interessado. Assim sendo, a prova documental deve ser analisada pelo julgador de maneira razoável, em cotejo com o restante do conjunto probatório, a fim de determinar se é apta a comprovar todo o período de atividade discutido em juízo. Nesse sentido, confira-se precedente jurisprudencial: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O Tribunal a quo ao afirmar que não há início razoável de prova material devidamente corroborada pela prova testemunhal, aplicou a jurisprudência do STJ consolidada no sentido de que: 1) a prova testemunhal deve ser conjugada com início de prova material; 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. 2. A revisão do entendimento do Tribunal a quo, que afirmou a inexistência de um conjunto probatório harmônico acerca do efetivo exercício de atividade rural, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 584.390/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/11/2014, DJe 02/12/2014). Ainda em relação ao indispensável início de prova material para comprovação de períodos de atividade rural para fins previdenciários, pende regra de experiência que nos aponta para a dificuldade de sua produção por trabalhadores rurais, por inúmeras razões, tais como o grande tempo decorrido entre o exercício da atividade rural e a postulação perante o INSS e a baixa instrução formal observada entre os rurícolas. Por essas razões, tem-se admitido que o início de prova material seja realizado pela apresentação de documentos em nome de outros integrantes do núcleo familiar, em especial pais e maridos. Confira-se precedente que ilustra essa afirmação: AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO ONDE CONSTA O MARIDO LAVRADOR. EXTENSÃO DA QUALIDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR À ESPOSA. PRECEDENTES. 1. Conforme consignado na análise monocrática, consta dos autos a certidão de casamento da autora com o Sr. Sebastião Maurilio da Silva, já falecido, e lá qualificado como lavrador que, aliada à prova testemunhal, dão conta do exercício de atividade rural exercido em regime de economia familiar. Tal fato é reconhecido pela própria Corte. 2. Ora, se o Tribunal de origem reconheceu que há documento público do qual se consta como profissão do marido da autora lavrador e que houve testemunha para corroborar o depoimento da recorrente, não poderia ter decidido que "o Plano de Benefícios da Previdência Social, Lei n.º 8.213/91, não admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço, dispondo em seu artigo 55, parágrafo 3º, que a prova testemunhal só produzirá efeito quando baseada em início de prova material." Isto, frise-se novamente, porque há certidão de casamento onde a profissão de seu falecido esposo como rurícola. 3. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o documento probante da situação de camponês do marido é extensível à esposa, ainda que desenvolva tarefas domésticas, ante a situação de campesinos comum ao casal. 4. Saliente-se, por fim, que não há violação do enunciado da Súmula 7/STJ quando a decisão desta Corte se fundamenta nas próprias premissas traçadas pela Corte de origem para fundamentar sua decisão. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1448931/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 02/06/2014). Contudo, entendo que essa linha jurisprudencial não pode ser adotada de forma indiscriminada para todas as hipóteses em que exista prova documental do exercício de atividade rural por familiar da pessoa interessada, devendo ser submetida a limites. O primeiro desses limites deve ser a observância de que o entendimento jurisprudencial em questão, ainda que válido nos casos de segurado especial em regime de economia familiar, não pode ser admitido nas outras hipóteses de segurados rurícolas, como empregado rural, trabalhador rural eventual ou avulso. Isso porque, nessas hipóteses, o exercício de atividade rural é questão individual do trabalhador, cujas consequências jurídicas não se estendem obrigatoriamente a seus familiares. O segundo limite está relacionado aos marcos temporais existentes na legislação previdenciária. No caso, o art. 16, I da Lei n. 8213/91 indica que o vínculo familiar, em relação ao filho de segurado, é mantido apenas até que este complete 21 anos. Após essa idade, para fins previdenciários, há uma presunção absoluta de que o filho já não compõe o núcleo familiar. Assim sendo, é razoável que o interessado possa se valer de prova documental que indique seus genitores como rurícolas apenas até a ocasião em que tenha completado 21 anos de idade. Ainda em relação aos marcos temporais existentes na legislação previdenciária, e que devem ser necessariamente observados pelo julgador, observo que em sua redação original o art. 11, VII da Lei n. 8213/91 considerava como segurado apenas o filho maior de 14 anos de segurado especial, idade que foi aumentada para 16 anos com a edição da Lei n. 11718/2008. Esse requisito etário deve ser considerado válido. Isso porque a condição do segurado especial é excepcional, pois admite o acesso aos benefícios da previdência social a quem não efetua o recolhimento de contribuições previdenciárias. Por essa razão, é possível o estabelecimento de critérios pelo legislador para a definição de segurado especial, não sendo admissível a interpretação extensiva contrária ao texto expresso da lei. Nesse sentido, confira-se precedente: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. TRABALHO DO MENOR DE 14 ANOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS MORATÓRIOS. 1. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço é devida quando cumpridos os requisitos determinados nos arts. 52 e 53 da Lei 8.213/91. 2. Nos termos do apontado Diploma legal, mostra-se suficiente à comprovação do tempo de serviço rural o início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 3. A apresentação de documentos em nome do chamado "chefe da unidade familiar" pode servir como início de prova material para os demais membros da família, vez que interpretação contrária acabaria por alijá-los de eventual vinculação previdenciária como segurados especiais, inversamente à vontade do próprio legislador. 4. Resta pacificado pela 3ª Seção desta Corte a impossibilidade de contagem do tempo de labor rural prestado com idade inferior a 14 anos, face à inexistência de relação empregatícia no regime de economia familiar, obedecendo-se à norma infraconstitucional. […] (AC 200104010723473, LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, TRF4 - SEXTA TURMA, DJ 21/08/2002 PÁGINA: 831). Não se desconhece a existência de entendimento do STJ e de outros tribunais indicando o cabimento do reconhecimento de atividade rural em regime de economia familiar de menor de 14 anos. Referido entendimento está baseado em afronta ao texto constitucional, no sentido de que a vedação de trabalho de menores de 14 anos é regra em benefício do trabalhador, não podendo ser interpretada em seu desfavor. Contudo, entendemos que essa linha de interpretação não nos vincula pois tem natureza constitucional, cabendo a interpretação final ao Supremo Tribunal Federal. Ademais, ao reconhecer a inconstitucionalidade do art. 11, VII da Lei n. 8213/91, o STJ não adotou o rito processual adequado, qual seja, aquele previsto no art. 97 da CF (“Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”) e ratificado pelo Supremo Tribunal Federal em sua Súmula Vinculante n. 10, assim redigida: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”. Por fim, o art. 11, VII da Lei n. 8213/91 não é norma trabalhista, mas previdenciária, o que fragiliza o entendimento em questão. Feitas essas considerações, sintetizamos o caminho a ser adotado para a análise das provas, com o fim de comprovação de atividade rural para a concessão de aposentadoria por idade: - é indispensável o início de prova material; - a prova material não precisa cobrir todo o período de carência, desde que seja corroborada por outros elementos probatórios; - é possível a utilização de prova material em nome de parentes, quando o período de atividade rural alegado ocorreu em regime de economia familiar, devendo ser corroborada por prova testemunhal; - a prova documental em nome de genitores somente poderá ser utilizada se relativa a período no qual o interessado ainda não computava 21 anos de idade; - não é possível o reconhecimento de trabalho em regime de economia familiar alegadamente desenvolvido com menos de 14 anos de idade. Do reconhecimento de tempo comum de contribuição Inicialmente, observo que o reconhecimento do tempo de contribuição decorre dos dados existentes no CNIS, nos termos do art. 29-A e seus parágrafos, da Lei n. 8213/91. A melhor intepretação desse dispositivo legal indica que os dados constantes do CNIS gozam de presunção de veracidade, que cede apenas se o segurado postula e demonstra a necessidade de sua retificação (§2º), ou se há fundada dúvida por parte do INSS (§ 5º). Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA. COMPENSAÇÃO DE VALORES. FORÇA PROBANTE DAS INFORMAÇÕES CONSTANTES DO CADASTRO NACIONAL DE INFORMAÇÕES SOCIAIS-CNIS-. ARTIGO 29-A DA LEI 8.213/1991. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. PRESUNÇÃO RELATIVA. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA CONTRÁRIA. RECURSO ESPECIAL DO INSS CONHECIDO E PROVIDO. 1. Discute-se no caso a força probante das informações constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais-CNIS-, nos termos do artigo 29-A da Lei 8.213/1991. 2. A Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei Complementar 128/2008, trata do CNIS em seu artigo 29-A, o qual impõe ao Instituto Nacional do Seguro Social o dever de utilizar a base de dados ali constante, que goza de presunção de veracidade, mercê do princípio da presunção de veracidade dos atos administrativos, para fins de cálculo do salário de benefício; comprovação de filiação ao Regime Geral de Previdência Social; contagem de tempo de contribuição; recolhimentos da contribuição previdenciária; relações de emprego do trabalhador segurado. 3. A presunção de veracidade das informações constantes no CNIS é relativa, podendo ser ilidida por outros meios de prova, em momento processual a ser oportunizado à parte interessada, o que no caso concreto não ocorreu. 4. Recurso especial conhecido e provido, para reformar o acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de Justiça da Bahia, para que converta o julgamento da apelação do INSS em diligência, a fim de oportunizar ao segurado a produção de provas que afastem a veracidade das informações constantes do CNIS. (REsp 1573943/BA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/10/2018, DJe 24/10/2018). Outrossim, o segurado pode demonstrar a existência de tempo de contribuição não inserido no CNIS, mediante o procedimento previsto no art. 55, § 3º da Lei n. 8213/91, segundo o qual “A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento”. Nesse contexto, a anotação do vínculo em Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS goza de presunção relativa quanto à veracidade do que nela se contém. Com efeito, não se pode exigir do segurado empregado mais do que a exibição de sua CTPS para a comprovação dos vínculos empregatícios, atuais ou pretéritos, ainda que esses vínculos não constem do CNIS. Ao se negar valor probatório à CTPS, ante a ausência de contribuições ou de referência no CNIS, o INSS parte do princípio de que o segurado age de má-fé, utilizando documentos fraudulentamente preenchidos para a obtenção do benefício previdenciário. À evidência, constatando-se a existência de fraude, a autarquia pode e deve apontar esse fato para, concretamente, desconstruir o documento como fonte de prova do tempo de serviço. Contudo, simplesmente negar o reconhecimento do vínculo empregatício anotado em CTPS é recusar o efeito que lhe é próprio de comprovar o tempo de serviço e demais termos do contrato de trabalho. Outro não é o entendimento do Supremo Tribunal Federal favorável à presunção relativa de veracidade das anotações em CTPS, conforme se observa na leitura de seu verbete de Súmula n. 225, pelo qual “Não é absoluto o valor probatório das anotações da carteira profissional”. No mesmo sentido, confira-se a Súmula nº 75 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais: “A Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)”. Do reconhecimento de período de trabalho doméstico para efeitos previdenciários De plano, há que se afirmar que tudo quanto acima exposto para fins de comprovação de tempo de contribuição é plenamente aplicável, por princípio de isonomia, aos empregados domésticos. Contudo, pende entendimento do INSS de que os períodos trabalhados como empregado doméstico, anteriores à edição da LC n. 150/2015, não podem ser computados para fins de carência. Nesse sentido, o texto atual do art. 27 da Lei n. 8213/91, com redação dada pela LC n. 150/2015, dispõe: Art. 27. Para cômputo do período de carência, serão consideradas as contribuições: I - referentes ao período a partir da data de filiação ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), no caso dos segurados empregados, inclusive os domésticos, e dos trabalhadores avulsos; II - realizadas a contar da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, no caso dos segurados contribuinte individual, especial e facultativo, referidos, respectivamente, nos incisos V e VII do art. 11 e no art. 13. A partir da leitura do dispositivo legal, inexiste dúvida de que mesmo as contribuições dos empregadores domésticos, recolhidas em atraso, devem ser computadas para fins de carência. Porém, o INSS adota o entendimento de que esta sistemática somente é aplicável para o período contributivo ocorrido a partir da edição da LC n. 150/2015. Para períodos anteriores, o INSS se apoia no texto revogado do art. 27, que excluía do cômputo do período de carência as contribuições de empregadores domésticos recolhidas em atraso, somente computando aquelas realizadas a partir do primeiro recolhimento em dia. Confira-se o texto revogado: Art. 27. Para cômputo do período de carência, serão consideradas as contribuições: I - referentes ao período a partir da data da filiação ao Regime Geral de Previdência Social, no caso dos segurados empregados e trabalhadores avulsos referidos nos incisos I e VI do art. 11; II - realizadas a contar da data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, no caso dos segurados empregado doméstico, contribuinte individual, especial e facultativo, referidos, respectivamente, nos incisos II, V e VII do art. 11 e no art. 13. O entendimento do INSS não pode prevalecer, por caracterizar ofensa ao princípio da isonomia. De fato, a obrigação do recolhimento das contribuições previdenciárias do trabalho doméstico sempre esteve a cargo do empregador, a teor do art. 24 da Lei n. 8212/91. Logo, desconsiderar as contribuições recolhidas em atraso pelo empregador doméstico, ou mesmo o período de trabalho no qual não houve esse recolhimento, seria impor ao empregado doméstico um ônus que nunca foi imposto ao empregado de outra natureza, haja vista que nas duas situações a obrigação do recolhimento das contribuições previdenciárias é do respectivo empregador. Dessa forma, a alteração do texto do artigo 27 da Lei n. 8213/91, promovida pela LC n. 150/2015, não criou nova situação jurídica, mas sim expurgou do ordenamento jurídico um texto de lei já então inválido, por ofensa ao princípio da isonomia. Em conclusão, não se trata de atribuir efeitos retroativos ao novo texto do art. 27 da Lei n. 8213/91, mas sim de declarar a inconstitucionalidade do texto anterior, reconhecendo que todo o período de trabalho doméstico, devidamente comprovado, ostenta os efeitos previdenciários de tempo de contribuição e carência. Do reconhecimento de tempo intercalado em gozo de benefício por incapacidade Os períodos de gozo de benefício por incapacidade, intercalados a períodos contributivos, bem como os períodos objeto de anotação regular em CTPS devem ser computados para fins de concessão de aposentadoria por idade, em qualquer uma de suas modalidades. Com efeito, os períodos de fruição de auxílio-doença devem ser considerados para efeitos do cômputo da carência para fins de aposentadoria por idade, tendo em vista a expressa previsão legal existente no art. 55, II, da Lei n. 8213/91, assim redigido: Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado: […] II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez; […] Ademais, a leitura conjunta do art. 24 e do § 5º do art. 29, ambos da Lei n. 8213/91, nos impõe o cômputo para fins de carência do período em gozo de benefício por incapacidade intercalado a períodos contributivos. Confira-se a redação dos referidos dispositivos legais: Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências. Art. 29. […] § 5º Se, no período básico de cálculo, o segurado tiver recebido benefícios por incapacidade, sua duração será contada, considerando-se como salário-de-contribuição, no período, o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal, reajustado nas mesmas épocas e bases dos benefícios em geral, não podendo ser inferior ao valor de 1 (um) salário mínimo. Observo que o entendimento ora adotado está amparado na jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, conforme se observa nos seguintes precedentes: PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA. CÔMPUTO DO TEMPO DE RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE PARA EFEITO DE CARÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO EM PERÍODO INTERCALADO. POSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - O tempo em que o segurado recebe benefício por incapacidade, se intercalado com período de atividade e, portanto, contributivo, deve ser contado como tempo de contribuição e, consequentemente, computado para efeito de carência. Precedentes. III - Recurso especial desprovido. (REsp 1602868/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/10/2016, DJe 18/11/2016). PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. CABIMENTO. 1. É possível a contagem, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, desde que intercalado com períodos contributivos (art. 55, II, da Lei 8.213/91). Precedentes do STJ e da TNU. 2. Se o tempo em que o segurado recebe auxílio-doença é contado como tempo de contribuição (art. 29, § 5º, da Lei 8.213/91), consequentemente, deve ser computado para fins de carência. É a própria norma regulamentadora que permite esse cômputo, como se vê do disposto no art. 60, III, do Decreto 3.048/99. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1334467/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 05/06/2013). Por fim, verifico que a questão foi objeto de julgamento em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal (RE n. 1.298.832, Tema 1125), no qual foi adotada a seguinte tese: É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa. Contribuição do contribuinte individual que presta serviço a empresa ou equiparada A partir da competência de abril de 2003, data de vigência da Lei nº 10.666/2003, as empresas (e equiparadas) tornaram-se responsáveis por arrecadar a contribuição previdenciária do contribuinte individual que lhe presta serviços, descontando-a da respectiva remuneração. Desse modo, anteriormente à competência de abril de 2003, o cômputo do tempo de contribuição previdenciária dos contribuintes individuais depende do recolhimento pelo próprio segurando, ao passo que, a partir desse marco temporal, o ônus de arrecadação as contribuições previdenciárias foi legalmente atribuído às empresas tomadoras de serviço, e entidades equiparadas. Logo, neste último caso, ainda que inexista recolhimento de contribuição previdenciária pela empresa em nome do contribuinte individual, não se pode negar ao segurado o reconhecimento do tempo de contribuição correspondente ao período em que esteve comprovada sua prestação de serviços, uma vez que essa obrigação não mais lhe era incumbida. Segundo o parágrafo único do art. 15 da Lei nº 8.212/91, equiparam-se a empresa, para os efeitos desta Lei, o contribuinte individual e a pessoa física na condição de proprietário ou dono de obra de construção civil, em relação a segurado que lhe presta serviço, bem como a cooperativa, a associação ou a entidade de qualquer natureza ou finalidade, a missão diplomática e a repartição consular de carreira estrangeiras. Do caso concreto Trata-se de pedido de concessão de benefício de Aposentadoria por Idade Rural. Aduz o autor que iniciou sua vida laborativa na condição de segurado autônomo. Contudo, afirma ter trabalhado majoritariamente na roça, na condição de EMPREGADO RURAL, o que o faz até os dias atuais. O INSS entende que o vínculo de trabalho iniciado em 04/12/2018 com CARLOS EDUARDO FREIRE VEIGA, no cargo de SERVIÇOS GERAIS é de natureza URBANA. No entanto, o autor defende que o vínculo controvertido é de natureza RURAL. Na própria petição inicial, foi colacionado cópia do cartão de CNPJ do empregador, onde consta a atividade CRIAÇÃO DE OVINOS – PRODUTOR RURAL, além de declaração de próprio punho emitida pelo empregador. Nesta esteira, o autor requer o reconhecimento dos períodos de 01/12/1996 a 30/09/2018, laborado para ALICE DE ALMEIDA MARINHO e de 04/12/2018 a 31/10/2024 laborado para CARLOS EDUARDO FREIRE VEIGA, como tempo de serviço rural. O autor também requer o deferimento de TUTELA ANTECIPADA e reafirmação da DER se necessário. O procedimento administrativo de concessão foi juntado no ID 351666362: A CTPS do autor com a anotação dos vínculos controvertidos está nas folhas 08/13. Na folha 14 consta declaração de próprio punho firmada por Carlos Eduardo Freire Veiga de que o autor presta serviços como EMPREGADO RURAL em sua propriedade com criação de animais bovinos, cultivos de plantas, manejo de pasto, controle de pragas, roça e manutenção de cerca, jardim e arborização. Foi realizada audiência de instrução e julgamento. JOSÉ CARLOS HABERMANN foi ouvido na condição de informante. Conheceu o autor na infância. O autor trabalha como rurícola com serviços gerais. O autor trabalha com gado de leite em um sítio. O autor trabalha aproximadamente oito horas por dia. O autor tem um patrão que é o dono do sítio. O autor alimenta o gado e tira leite. O autor trabalha apenas no sítio. FLORISVALDO HABERMANN também foi ouvido na condição de informante. Conheceu o autor há vários anos na época em que o pai do autor tinha sítio. O autor trabalha em um sítio que fica no bairro do Matão. A testemunha não conhece o proprietário do sítio. A testemunha trabalhou na roça por mais de 40 anos e foi vizinho do autor. O local onde o autor trabalha atualmente fica na zona rural. O autor tira leite, alimenta o gado, conserta cerca, roça o pasto, em resumo, serviços gerais de lavoura. O autor trabalha o dia todo neste sítio. O conjunto probatório permite o reconhecimento dos dois vínculos controvertidos como tempo de serviço rural. Feitas tais considerações, a planilha anexa demonstra que em 10/01/2025 (DER) o autor implementou 27 anos, 11 meses e 07 dias de tempo de serviço rural, razão pela qual faz jus à concessão do benefício de Aposentadoria por Idade Rural a contar desta data. Dispositivo Face ao exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o réu a: - averbar o tempo de contribuição reconhecido nesta decisão e identificado na súmula abaixo; - implantar o benefício previdenciário/assistencial conforme fundamentação acima exarada e súmula abaixo identificada. Indefiro a antecipação dos efeitos da tutela. Embora a fundamentação confirme a probabilidade do direito, e apesar do caráter alimentar da prestação, existe risco concreto de irreversibilidade da medida (art. 300, § 3º, CPC), considerando, especialmente, a decisão vinculante proferida pelo E. Superior Tribunal de Justiça no Tema nº 692 (Pet 12482/DF): "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475-O, II, do CPC/73)". Esse risco se agrava pela circunstância de a parte autora ser beneficiária de gratuidade da Justiça, pela qual, por definição legal, não disporia de recursos econômicos para arcar com despesas e custas processuais (art. 98, CPC), o que, por ilação, inviabilizaria a restituição ao estado anterior (art. 520, II, CPC), na eventualidade de reforma da presente decisão. Logo, a implantação do benefício deverá aguardar o trânsito em julgado. Sem condenação ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais nesta instância (art. 55 da Lei n. 9099/95). Caso haja interesse em recorrer desta decisão, cientifico de que o prazo para recurso é de 10 (dez) dias. Em sendo apresentado recurso inominado, intime-se a parte recorrida para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo legal. Vindas estas, ou certificada pela Secretaria sua ausência, encaminhem-se os presentes autos para a Turma Recursal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. SÚMULA PROCESSO: 5000220-48.2025.4.03.6326 DATA DO AJUIZAMENTO: 24/01/2025 18:33:11 Nome: ANTONIO CARLOS CHERVI Endereço: Avenida 6, 47, Zona Rural, Jardim Residencial da Colina, CORUMBATAí - SP - CEP: 13540-000 PRESTAÇÃO DEFERIDA: APOSENTADORIA POR IDADE RURAL RMI: A CALCULAR RMA: A CALCULAR DIB: 10/01/2025 DIP: 01/06/2025 ATRASADOS: A CALCULAR PERÍODOS RECONHECIDOS: - de 01/12/1996 a 30/09/2018 (TEMPO RURAL) - de 04/12/2018 a 31/10/2024 (TEMPO RURAL) Piracicaba, data da assinatura eletrônica
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