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Eliana Bispo Almeida x Bhp Billiton Brasil Ltda. e outros

ID: 336997994

Tribunal: TJES Órgão: Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5006197-25.2022.8.08.0030

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

ELIANA BISPO ALMEIDA

Polo Passivo:

BHP BILLITON BRASIL LTDA. FUNDACAO RENOVA SAMARCO MINERACAO S.A.

Sentença

Advogados:

CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO

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RICARDO LOPES GODOY

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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WALTER TOME BRAGA

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ROBERTO CARLOS DE FREITAS

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DEBORA ALVES FERNANDES

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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5006197-25.2022.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: ELIANA BISPO ALMEIDA REQUERIDO: FUNDACAO RENOVA, SAMARCO MINERACAO S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. Advogados do(a) REQUERENTE: DEBORA ALVES FERNANDES - ES31396, ROBERTO CARLOS DE FREITAS - ES28678, WALTER TOME BRAGA - ES35604 Advogados do(a) REQUERIDO: EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU - MG80702, IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogado do(a) REQUERIDO: IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogados do(a) REQUERIDO: CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO - ES12288, RICARDO LOPES GODOY - MG77167 SENTENÇA I - RELATÓRIO ELIANA BISPO ALMEIDA propôs a presente ação de indenização por danos materiais contra FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., sob o rito do procedimento comum cível, alegando que exercia atividade de pesca artesanal no Rio Doce e que, em razão do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 05/11/2015, teria sofrido severas restrições no exercício da atividade pesqueira, com prejuízos econômicos que entende passíveis de indenização. A petição inicial foi protocolada em 13/06/2022 e cadastrada sob ID 15103127, acompanhada de documentos pessoais (ID 15103130 – CNH; ID 15103131 – comprovante de residência; ID 15103132 – comprovante de residência de 2015), declarações de atividade pesqueira (ID 15103133), declaração de hipossuficiência (ID 15103139), CTPS (ID 15103140) e contracheques (ID 15103141), além de declarações de imposto de renda (ID 15103144). Foi concedida gratuidade de justiça, conforme registrado no sistema. Citadas regularmente, as rés FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA. apresentaram contestação. A BHP BILLITON BRASIL LTDA. apresentou sua contestação sob ID 26666837, acompanhada de documentos comprobatórios e instrumentos de mandato (IDs 26666838 a 26666851), argumentando, em síntese, que não há comprovação documental do exercício da pesca pela autora, tampouco de dano efetivo, além de invocar ausência de nexo causal e prescrição. A FUNDAÇÃO RENOVA apresentou sua contestação sob ID 31174533, também acompanhada de procuração (ID 31174534), sustentando preliminar de ilegitimidade e, no mérito, defendendo a inexistência de responsabilidade, bem como ausência de comprovação de dano. Alega, ainda, que a autora não aderiu a nenhum dos programas extrajudiciais e que não há demonstração de vínculo com a atividade de pesca à época do desastre. Posteriormente, SAMARCO MINERAÇÃO S.A., em nome próprio e na condição de sucessora da FUNDAÇÃO RENOVA, requereu sua habilitação e substituição processual, nos termos do Acordo Judicial para Reparação Integral e Definitiva homologado pelo Supremo Tribunal Federal (PET 13157/DF). Tal manifestação foi protocolada sob ID 71168158, onde expôs que, conforme cláusulas 104 e 109 do Acordo de Repactuação, a SAMARCO assumiu todas as obrigações e ações judiciais da extinta Fundação Renova. Anexou cópia do acordo homologado pelo STF (ID 71357253) e documentos comprobatórios da averbação da decisão do Conselho Curador sobre a extinção da Fundação (ID 71357254). A habilitação foi acompanhada de substabelecimento (ID 71357255) e demais documentos de representação e atos constitutivos da Fundação Renova (IDs 61825605 a 61825608, além de substabelecimento do patrono Dr. Lauro Bracarense, ID 67288785). A habilitação da SAMARCO decorre do processo de liquidação da FUNDAÇÃO RENOVA deliberado no âmbito do Acordo de Repactuação, com previsão expressa de sucessão integral de direitos e obrigações. O juízo proferiu despacho em 16/01/2025, sob ID 61338977, determinando a intimação da parte autora para manifestação no prazo legal sobre as contestações apresentadas e o pedido de habilitação da SAMARCO como sucessora da Fundação Renova. Entretanto, transcorreu o prazo legal sem qualquer manifestação da parte autora, conforme certificado em 30/06/2025, por meio de certidão lançada sob ID 71956794, assinada eletronicamente pelo Diretor de Secretaria. É o que havia a relatar. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO II.1 – PRELIMINARES E PREJUDICIAIS II.1.1. Inépcia da Petição Inicial Rejeito. A narrativa apresentada pela parte autora permite a identificação da causa de pedir e do pedido indenizatório. Ainda que não acompanhada de documentos formais robustos, a inicial delimita os prejuízos alegados e estabelece nexo com os fatos. O STJ tem reiteradamente decidido que o pedido inicial, como manifestação de vontade, deve ser interpretado à luz do princípio da efetividade e economia processual, que visam conferir à parte um máximo de resultado com um mínimo de esforço processual. II.1.2. Ilegitimidade Passiva Rejeito. A legitimidade passiva se verifica em juízo de asserção. A alegação da parte autora de que sofreu danos em razão do desastre ambiental, cuja responsabilidade seria atribuída às rés, é suficiente para sua inclusão no polo passivo. Conforme reiterado pelo TJES: […] Preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela Vale S/A. Conforme a teoria da asserção, já explicada acima, a existência ou não de prova do nexo causal para fins de responsabilização civil é questão a ser examinada no mérito da demanda, uma vez que a legitimidade passiva deve ser aferida segundo as alegações, comprovadas ou não, deduzidas pela parte autora. Preliminar rejeitada. […] (TJES; Apl 0015590-20.2016.8.08.0014; Segunda Câmara Cível; Rel. Desig. Des. José Paulo Calmon Nogueira da Gama; Julg. 09/10/2018; DJES 14/11/2018) II.1.3. Ilegitimidade Ativa Rejeito a preliminar. Aplica-se ao caso a teoria da asserção, segundo a qual a legitimidade deve ser aferida à luz das alegações contidas na petição inicial: “As condições da ação devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial, dispensando-se qualquer atividade instrutória.” (STJ, REsp 1662847/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi) II.1.4. Impugnação à gratuidade de justiça A impugnação apresentada alega que a autora apresentou apenas autodeclaração e contratou advogado particular, o que indicaria ausência de hipossuficiência. Rejeito. Nos termos do art. 99, §3º, do CPC, a parte contrária deve comprovar a capacidade econômica da parte beneficiária, o que não ocorreu nos autos. A contratação de advogado particular não é, por si só, indicativa de capacidade para arcar com as despesas processuais, conforme já consolidado pelo STJ. II.1.4. Sucessão Processual A sucessão processual da FUNDAÇÃO RENOVA pela SAMARCO MINERAÇÃO S.A. decorre de previsão expressa no “Acordo Judicial para Reparação Integral e Definitiva Relativa ao Rompimento da Barragem de Fundão”, celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo Supremo Tribunal Federal em 06/11/2024, no âmbito da PET 13157/DF. O referido acordo foi resultado de repactuação conduzida inicialmente pelo Conselho Nacional de Justiça e, posteriormente, sob a supervisão do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, visando à reestruturação dos mecanismos de reparação dos danos causados pelo desastre de Mariana/MG. Nos autos, a SAMARCO apresentou petição (ID 71168158) requerendo sua habilitação e substituição processual, fundamentando o pedido na Cláusula 104 do Acordo de Repactuação, a qual determinou a extinção da Fundação Renova, e na Cláusula 109, § 3º, que estabeleceu que a Samarco assumiria todos os direitos e obrigações da Fundação, inclusive em ações judiciais em curso. Conforme disposto no acordo: Cláusula 104: “Com a extinção dos instrumentos fundantes, os signatários reconhecem a necessidade de imediata extinção da FUNDAÇÃO RENOVA, nos termos do art. 69 do Código Civil.” Parágrafo único da Cláusula 104: “Fica estabelecido um período de liquidação, o qual se inicia com a homologação judicial do acordo e a transferência de direitos, obrigações, ações e bens da FUNDAÇÃO RENOVA para a COMPROMISSÁRIA (Samarco), e finaliza com o término da liquidação e sua respectiva averbação.” Cláusula 109, § 3º: “A COMPROMISSÁRIA (Samarco) sucederá a FUNDAÇÃO RENOVA em todos os direitos e obrigações, assumindo, em caráter definitivo, eventuais ações judiciais e processos administrativos remanescentes.” A documentação juntada comprova que a extinção da Fundação Renova foi deliberada pelo Conselho Curador (ID 71357254) e que a Samarco detém legitimidade processual para substituí-la nos presentes autos. O STF, ao homologar o acordo, reconheceu expressamente a juridicidade e eficácia dessas cláusulas (ID 71357253), conferindo-lhes força executiva nacional. Portanto, à luz do artigo 110 do Código de Processo Civil, que permite a substituição da parte no curso do processo em virtude de sucessão legal ou contratual, e considerando que a substituição está formalizada, documentada e homologada judicialmente, impõe-se o reconhecimento da sucessão processual da Fundação Renova pela Samarco Mineração S.A., que passa a figurar no polo passivo na qualidade de legítima sucessora. Tal substituição tem natureza objetiva e automática, independente de manifestação da parte autora, por se tratar de sucessão decorrente de ato homologado pelo Supremo Tribunal Federal e vinculante quanto aos seus efeitos institucionais e obrigacionais. II.2 – JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (CPC, ART. 355, I) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a matéria for exclusivamente de direito ou, sendo de fato e de direito, os autos contiverem elementos suficientes para a formação do convencimento do juízo.Tal dispositivo prestigia os princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade da tutela jurisdicional, sem prejuízo ao contraditório. Ressalte-se que o magistrado, como destinatário final das provas, detém o poder-dever de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, mediante decisão fundamentada, conforme preconiza o art. 370, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido, o STJ firmou posição de que "cabe ao juiz verificar a necessidade de dilação probatória, considerando que é o destinatário final da prova, cujo objetivo é a formação de seu convencimento", conforme se verifica no precedente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO . DANOS MORAIS DECORRENTES DA FUMAÇA. MAGISTRADO COMO DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NEXO CAUSAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL NÃO VERIFICADO . PROVAS. REEXAME. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ . (...) O destinatário final da prova é o juiz, a quem cabe avaliar quanto sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 370 do CPC/2015. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que compete às instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa, cujo reexame é vedado em recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. (...) (STJ - AgInt no AREsp: 1504747 SP 2019/0139522-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 18/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2021) O Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a mesma diretriz. Em precedente da 4ª Câmara Cível, firmou-se que “não configura cerceamento de defesa o julgamento da lide sem a produção das provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e indeferir a produção probatória que considerar desnecessária à formação do seu convencimento” (TJES, Apelação Cível 0020606-22.2020.8.08.0011, Rel. Des. Luiz Guilherme Risso, j. 20/09/2024). Ainda, em caso análogo, decidiu-se que o indeferimento da prova oral é legítimo diante da “existência de documentação coligida aos autos, e dado o fato de que o magistrado é o destinatário das provas” (TJES, Apelação Cível 5001008-22.2021.8.08.0056, Rel. Des. Carlos Magno Moulin Lima, j. 23/09/2024). A jurisprudência dos tribunais estaduais é pacífica quanto à possibilidade de julgamento antecipado em ações indenizatórias relacionadas ao desastre ambiental de Mariana, especialmente quando a parte autora não apresenta elementos probatórios mínimos sobre os danos alegados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso semelhante envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho, decidiu que, “estando a matéria suficientemente esclarecida e não sendo possível que a prova, pelas circunstâncias do caso concreto, interfira no julgamento, tem-se como desnecessária a dilação probatória” (TJMG, Apelação Cível 5000391-19.2021.8.13.0090, Rel. Des. Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, j. 20/05/2024). No presente caso, é cabível o julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, por se tratar de matéria exclusivamente de direito e de fato comprovado documentalmente, não havendo necessidade de produção de outras provas. A autora foi regularmente intimada para manifestar-se sobre as contestações apresentadas e sobre os documentos juntados pelas rés (ID 61338977), mas permaneceu inerte, conforme certificado no ID 71956794. Não houve requerimento de dilação probatória, nem indicação de outras provas a serem produzidas. Além disso, a controvérsia restringe-se à ausência de comprovação documental do alegado exercício da atividade de pesca e da existência de dano material concreto, questão que pode ser decidida com base na prova documental já constante dos autos. Dessa forma, estando o feito suficientemente instruído, mostra-se adequada e proporcional a resolução antecipada da lide, com fundamento na economia e celeridade processuais. II.3 – DO REGIME DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA AMBIENTAL A responsabilidade civil por danos ambientais, no ordenamento jurídico brasileiro, é de natureza objetiva, estando fundamentada na teoria do risco integral, conforme dispõe o §3º do art. 225 da Constituição Federal e o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 14 – [...] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.” Esse regime implica que, havendo comprovação do dano e do nexo causal com a atividade lesiva, é dispensável a demonstração de culpa, bastando a constatação da ocorrência do evento danoso e sua imputabilidade ao agente causador. Assim, qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que direta ou indiretamente contribua para a degradação ambiental, responde objetivamente pelos prejuízos resultantes de sua conduta. Por sua própria lógica protetiva e reparatória, a responsabilidade civil ambiental é também solidária e integral, recaindo sobre todos os que concorrem para o dano, independentemente do grau de participação. Ademais, a obrigação de reparar o meio ambiente é imprescritível no tocante à tutela difusa ambiental, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, cumpre ressaltar que, mesmo sob o regime da responsabilidade objetiva, não se dispensa a comprovação do dano efetivamente suportado e do nexo causal com o evento ambiental, nos termos do art. 373, I, do CPC. A aplicação da teoria do risco integral não implica presunção automática de dano moral individual em decorrência de um desastre ambiental, ainda que de grande extensão e notoriedade. Em outras palavras, ainda que se reconheça o ilícito ambiental e a responsabilização objetiva das rés no plano abstrato, a parte autora permanece incumbida de demonstrar concretamente como o evento impactou sua esfera individual, seja na dimensão patrimonial, seja na existencial, como condição para o deferimento de indenização. Esse entendimento é reforçado pela jurisprudência consolidada dos tribunais e pela doutrina especializada, sobretudo em relação às ações ajuizadas fora do sistema extrajudicial de reparação operado pela Fundação Renova ou dos programas simplificados instituídos por acordos coletivos e decisões proferidas em ações civis públicas. Nesses casos, exige-se do autor prova idônea e individualizada dos prejuízos alegados, sob pena de improcedência da demanda. II.4 – DA ANÁLISE DO CASO CONCRETO O objeto da presente demanda consiste em aferir a existência de responsabilidade civil das requeridas, FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., pelos danos materiais alegadamente sofridos pela autora, ELIANA BISPO ALMEIDA, em razão do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em Mariana/MG, no dia 05 de novembro de 2015. A controvérsia, portanto, concentra-se na verificação dos requisitos para a responsabilização civil objetiva das requeridas, quais sejam: a existência de um dano efetivo, o nexo de causalidade entre esse dano e o desastre ambiental, e a qualificação da autora como pessoa efetivamente atingida pelos efeitos do rompimento. Nos termos do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, a responsabilidade por dano ambiental independe de culpa, bastando a comprovação do dano e de seu nexo com a atividade exercida pelo agente causador. No entanto, a jurisprudência é uniforme ao exigir comprovação específica do dano, mesmo nos casos de responsabilidade objetiva, não sendo suficiente a mera presunção ou a alegação genérica de prejuízo para que se configure o dever de indenizar. No caso dos autos, a autora afirma que exercia atividade de pesca artesanal no Rio Doce e que sua subsistência foi comprometida em decorrência da poluição causada pelo desastre. Para embasar sua pretensão, juntou declarações unilaterais de hipossuficiência e de atividade pesqueira (ID 15103133), cópias de documentos pessoais e comprovantes de residência (IDs 15103130 a 15103132), além de CTPS (ID 15103140) e contracheques (ID 15103141). Contudo, não há nos autos qualquer elemento documental idôneo que comprove o exercício regular, formal ou informal, da atividade de pesca, especialmente no período imediatamente anterior ao rompimento da barragem. Não foram apresentados registros oficiais como licenças de pesca, inscrição em colônias ou associações de pescadores, documentos de comercialização de pescado, extratos bancários relativos à atividade econômica ou outro documento contemporâneo que caracterize início de prova material. A CTPS acostada não apresenta registro compatível com a atividade alegada e os contracheques não guardam relação com a pesca artesanal. A alegação de que a autora teria sido atingida enquanto pescadora no município de Linhares/ES carece também de comprovação técnica ou probatória de impacto direto e mensurável em sua atividade, o que compromete o elemento fático essencial à configuração do dano. Vale destacar que as requeridas, em suas contestações (IDs 26666837 e 31174533), impugnaram especificamente a ausência de provas mínimas da condição de pescadora da autora, asseverando, inclusive, que não houve registro de sua participação nos programas extrajudiciais de reparação implementados pela Fundação Renova, como o Programa de Indenização Mediada (PIM) ou o Sistema Indenizatório Simplificado (Novel). Esse dado é relevante, pois tais sistemas foram concebidos como forma acessível de reconhecimento de danos sofridos por atingidos, inclusive com critérios facilitadores para categorias como pescadores informais. A ausência de qualquer tentativa de adesão aos referidos programas reforça a fragilidade da tese autoral quanto à condição de atingida. Importa observar, ainda, que não foi produzida qualquer prova oral, nem houve requerimento nesse sentido, tampouco se verificou nos autos a formulação de pedido de prova pericial ou de inspeção técnica. Também não foi apresentada réplica às contestações das rés, embora regularmente intimada por despacho ID 61338977, circunstância certificada sob ID 71956794. A inércia da parte autora em se manifestar sobre os elementos trazidos pelas rés prejudicou sobremaneira a instrução probatória do feito, limitando o convencimento do juízo à análise dos documentos constantes da petição inicial. Sob o aspecto do nexo de causalidade, cumpre esclarecer que não há nos autos qualquer elemento técnico, pericial ou documental que aponte de forma objetiva que a autora teve sua atividade econômica interrompida ou restringida por conta da lama oriunda do rompimento da barragem. A jurisprudência, ainda que reconheça o impacto generalizado do desastre na Bacia do Rio Doce, não admite a concessão de indenização sem a devida demonstração do prejuízo específico. A responsabilização objetiva não exonera o autor do dever de provar o dano concreto e sua vinculação ao evento danoso. Além disso, conforme sustentado pelas requeridas e conforme documentação pública juntada ao processo (IDs 26666848, 26666850 e 26666851), não houve desabastecimento de água potável no município de Linhares após o desastre, e as estações de tratamento de água garantiram a potabilidade dos recursos hídricos da região. Assim, a alegação de prejuízos decorrentes da contaminação da água ou de consumo de pescado impróprio, sem comprovação técnica ou médica, não pode ser acolhida. A jurisprudência majoritária dos tribunais estaduais e federais reforça a necessidade de apresentação de prontuário médico, laudos laboratoriais ou relatórios oficiais para a configuração de dano à saúde. Ademais, no que se refere à sucessão processual, há nos autos documentos que atestam a extinção da Fundação Renova e sua substituição pela Samarco Mineração S.A., conforme os termos do Acordo Judicial para Reparação Integral e Definitiva, celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo Supremo Tribunal Federal em 06/11/2024 (ID 71357253). A cláusula 104 do referido acordo determina a extinção da Fundação, com transferência integral de direitos, ações e obrigações à Samarco, fato que confere legitimidade processual à requerida SAMARCO na presente demanda. Portanto, à luz dos elementos constantes nos autos, conclui-se que não há suporte probatório suficiente para reconhecer a ocorrência de dano indenizável, tampouco se comprovou o exercício da atividade de pesca pela autora à época dos fatos, circunstâncias que inviabilizam a procedência do pedido. O conjunto probatório limita-se a declarações unilaterais e documentos pessoais, incapazes de fundamentar o reconhecimento judicial de danos materiais. Conforme entendimento consolidado, a prova exclusivamente testemunhal (inexistente no caso) não supre a ausência de prova documental mínima, inclusive por analogia ao entendimento fixado em ações previdenciárias sobre atividade rural informal. A ausência de lastro probatório objetivo afasta a plausibilidade jurídica do pedido, não sendo possível presumir a condição de atingida da autora apenas com base em sua autodeclaração. A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da parte autora impede o reconhecimento do direito à indenização, como bem decidiu o Tribunal de Justiça do Espírito Santo: APELAÇÃO CÍVEL. DESASTRE AMBIENTAL. BARRAGEM DE MARIANA/MG. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. RECURSO DESPROVIDO. 1) Em razão do dano ambiental, subsiste a aplicação da responsabilidade civil objetiva, de maneira que não se debate a culpa da requerida/apelada ou a presença de alguma excludente de responsabilidade, eis que norteada pela teoria do risco integral, nos termos do previsto no art. 225, § 3º, da Constituição Federal, no art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, e no art. 927, parágrafo único, do Código Civil. 2) Apesar de ser incontestável o dano ambiental e os prejuízos causados aos pescadores e comerciantes que dependiam economicamente do exercício de sua atividade nas áreas afetadas, o ressarcimento pretendido pela apelante demanda escorreita comprovação de que exercia a atividade pesqueira à época do desastre ambiental e que teve a sua subsistência prejudicada por ele, a fim de justificar o recebimento de indenização a ser paga pela responsável pelo evento danoso. 3) O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.374.284/MG, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou entendimento de que a responsabilidade por dano ambiental exige a demonstração concreta do dano e do nexo causal, ainda que presumível o impacto ambiental. 4) A autora não apresentou provas suficientes para demonstrar o exercício da pesca comercial, tais como registros de embarcação, carteira de pescador profissional, recibos de comercialização ou declaração de associação de pescadores. Apenas relatos orais foram coligidos, sendo insuficientes para comprovar as alegações. 5) O depoimento pessoal da autora e a narrativa do informante revelam que sua pesca era predominantemente realizada em lagoas, e não em áreas diretamente impactadas pelo desastre de Mariana, afastando a presunção de prejuízo decorrente do evento. 6) A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da autora impede o reconhecimento do direito à indenização. 7) Apelação cível conhecida e desprovida. (TJ-ES, Data: 18/Dec/2024, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Número: 5003559-31.2023.8.08.0047, Magistrado: ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Assunto: Indenização por Dano Moral) Assim, em respeito ao princípio do devido processo legal e ao ônus probatório estabelecido no art. 373, inciso I, do CPC, impõe-se a improcedência da ação. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 355, inciso I, e art. 487, inciso I, ambos do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por ELIANA BISPO ALMEIDA em face de SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., diante da ausência de comprovação dos fatos constitutivos do direito alegado, notadamente a inexistência de prova documental mínima do exercício da atividade de pesca à época dos fatos e da ocorrência de dano material concreto passível de reparação. Nos termos do pedido formulado, e com fundamento nas Cláusulas 104 e 109, §3º, do Acordo de Repactuação homologado pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da PET 13157/DF, DEFIRO o requerimento da empresa SAMARCO MINERAÇÃO S.A. para que passe a figurar no polo passivo da demanda em substituição à FUNDAÇÃO RENOVA, a qual se encontra formalmente extinta por força da mencionada repactuação. Proceda-se à atualização do cadastro processual. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º do CPC. Contudo, considerando a concessão da gratuidade de justiça, a exigibilidade das verbas de sucumbência ficará suspensa, nos termos do art. 98, § 3º, do mesmo diploma legal. Ficam as partes advertidas, desde logo, de que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará à imposição da multa prevista pelo art. 1.026, § 2º do CPC. Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Linhares/ES, data registrada no sistema. Emília Coutinho Lourenço Juíza de Direito

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Processo nº 5000391-24.2024.4.03.6137

ID: 305874153

Tribunal: TRF3 Órgão: 1ª Vara Federal de Andradina Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5000391-24.2024.4.03.6137

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

FRANCISLAINE GOMES CRAY

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

DANILO HENRIQUE ALMEIDA MACHADO

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MARIANA COSTA

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PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5000391-24.2024.4.03.6137 / 1ª Vara Federal de Andradina AUTOR: FRANCISLAINE GOMES CRAY Advogados do(a) AUTOR: DANILO HENRIQUE ALMEIDA MACHADO - GO56253, MARIANA COSTA… PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5000391-24.2024.4.03.6137 / 1ª Vara Federal de Andradina AUTOR: FRANCISLAINE GOMES CRAY Advogados do(a) AUTOR: DANILO HENRIQUE ALMEIDA MACHADO - GO56253, MARIANA COSTA - GO50426 REU: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO - FNDE, UNIÃO FEDERAL, CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF, FACULDADES ADAMANTINENSES INTEGRADAS S E N T E N Ç A RELATÓRIO Trata-se de ação ajuizada por FRANCISLAINE GOMES CRAY em face do FNDE - FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF e FACULDADES ADAMANTINENSES INTEGRADAS, por meio da qual requer o deferimento de sua matrícula no programa de financiamento estudantil – FIES, com a realização de um contrato de financiamento que ampare todo o período acadêmico. A parte autora busca, por meio de ação judicial, obter acesso ao Financiamento Estudantil (FIES) para ingresso no curso de Medicina, alegando não possuir condições financeiras para arcar com as mensalidades da instituição de ensino pretendida, cujo valor é de R$ 9.138,40. A autora não está atualmente matriculada e não formalizou pedido administrativo para o financiamento, sob a justificativa de que sua nota no ENEM de 2016 (488,8 pontos, com 600 na redação) está muito aquém da nota de corte exigida pela instituição de interesse. Argumenta que possui renda familiar per capita inferior a três salários mínimos, atendendo, portanto, ao requisito principal do programa. Ressalta que a renda mensal declarada, no valor de R$ 3.356,39, provém de ajuda de custo dos pais, com os quais não reside. Defende que os critérios impostos pelo MEC por meio de portarias administrativas — como as Portarias nº 21/2014, nº 535, nº 534 e nº 209 — extrapolam os requisitos legais previstos na legislação federal do FIES, criando restrições indevidas por meio de atos normativos infralegais. Por esse motivo, busca a concessão do financiamento judicialmente, com fundamento na necessidade de garantir seu direito à educação. À inicial foram anexados documentos eletrônicos. A tutela de urgência foi indeferida e a gratuidade de justiça deferida (ID 326756125). A União apresentou contestação afirmando a legalidade e constitucionalidade das regras do FIES, requerendo a improcedência da ação (ID 330899772). O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE apresentou contestação alegando preliminar impugnando o valor da causa, bem como alegando sua ilegitimidade passiva, no mérito, defendeu a legalidade dos critérios para seleção do FIES e requereu a improcedência da ação (ID 331126144). A Caixa Econômica Federal apresentou contestação impugando o valor da causa e alegando a sua ilegitimidade passiva. No mérito, requereu a improcedência da ação (ID 333117459). A Faculdades Adamantinenses Integradas, devidamente intimada, não apresentou contestação (ID 343116471). A parte autora interpôs agravo de instrumento contra o indeferimento da tutela de urgência ao qual negou-se provimento (ID 359217670). A parte autora apresentou réplica (ID 364505240). Após, os autos vieram conclusos. Passa-se a fundamentar e decidir. FUNDAMENTAÇÃO Antes de adentrar ao mérito da questão, deve ser analisada a legitimidade da CEF e do FNDE para integrarem o polo passivo desta demanda. De acordo com a Lei n. 10.260/2001 (Lei do Fies), após a alteração feita pela Lei n. 3.530/2017 o FNDE deixaria de ser o agente operador do Fies de forma gradual. Vejamos o artigo 3º da Lei do Fies com as alterações posteriores: Art. 3o A gestão do Fies caberá: (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) I - ao Ministério da Educação, na qualidade de: (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) a) formulador da política de oferta de vagas e de seleção de estudantes, nos termos do que for aprovado pelo CG-Fies; (Incluída pela Lei nº 13.530, de 2017) b) supervisor do cumprimento das normas do programa; (Incluída pela Lei nº 13.530, de 2017) c) administrador dos ativos e passivos do Fies, podendo esta atribuição ser delegada ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE); II - a instituição financeira pública federal, contratada na qualidade de agente operador, na forma a ser regulamentada pelo Ministério da Educação; (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) III - ao Comitê Gestor do Fundo de Financiamento Estudantil (CG-Fies), que terá sua composição, sua estrutura e sua competência instituídas e regulamentadas por decreto, na qualidade de: (Incluído pela pela Lei nº 13.530, de 2017) a) formulador da política de oferta de financiamento; (Incluída pela pela Lei nº 13.530, de 2017) b) supervisor da execução das operações do Fies sob coordenação do Ministério da Educação. (...) O art. 20-B incluído pela Lei n. 13.530/2017 estabeleceu que o Ministério da Educação regulamentaria as condições e o prazo para a transição do agente operador, tanto para os contratos de financiamento formalizados até o segundo semestre de 2017 quanto para os contratos formalizados a partir do primeiro semestre de 2018 e que, enquanto não houvesse essa regulamentação, o FNDE daria continuidade às atribuições decorrentes do encargo de agente operador. A regulamentação se deu com a Portaria Normativa MEC n. 209/2018, de 07 de março de 2018. Esse normativo estabeleceu que “O FNDE manterá as atribuições de agente operador dos contratos do Fies celebrados até o segundo semestre de 2017 até que sejam regulamentados as condições e o prazo para a transição de suas atribuições de agente operador para a instituição financeira pública federal, referidas na alínea “b” do inciso I do caput deste artigo, nos termos do disposto no art. 20-B da Lei nº 10.260, de 2001” (art. 12, §3º). A Portaria estabeleceu ainda que a operacionalização do Fies será realizada eletronicamente por meio de sistema próprio desenvolvido, mantido e gerido pelo agente operador, sob a supervisão da SESu/MEC e do FNDE, nos termos da Lei nº 10.260, de 2001 (art. 13). Já o Comitê Gestor do Fundo de Financiamento Estudantil (CG-Fies), que tem como uma de usas atribuições a supervisionar a execução das operações do Fies sob coordenação do Ministério da Educação, foi instituído pelo Decreto sem número, de 19 de setembro de 2017, e é composto por representantes do Ministério da Educação ou de autarquias a ele vinculadas, do Ministério da Fazenda, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, da Casa Civil da Presidência da República e do Ministério da Integração Nacional (art. 2º, do Decreto sem número, de 19 de setembro de 2017). Pelos dispositivos citados, verifica-se que o FNDE teria a atribuição de agente operador, ainda que transitoriamente, mesmo após o 2º semestre de 2017. Ademais, tanto o FNDE quanto os Ministérios ligados à União, mantêm a função de supervisionar as operações do Fies, mesmo após a Lei n. 13.530/2017. No caso dos autos, tanto se está a dirimir situação atinente ao sistema FIES, como também à gestão contratual pertinente ao FIES, que é de responsabilidade da CEF, de modo que a presença da instituição financeira se dá em sua atuação como agente financeira, consoante previsão normativa contida no art. 3º, §3º da Lei n. 10.260/2001: Art. 3º. (...) § 3o Na modalidade do Fies de que tratam os Capítulos II e II-A desta Lei, as atribuições de agente operador, de agente financeiro do Fies e de gestor do Fundo Garantidor do Fies (FG-Fies), de que trata o art. 6o-G desta Lei, poderão ser exercidas pela mesma instituição financeira pública federal contratada pelo Ministério da Educação, desde que a execução das atribuições seja segregada por departamentos. (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) Assim, a CEF participa da relação contratual entabulada pela parte autora na qualidade de agente financeiro. Com base nisso, indefiro a alegação de ilegitimidade passiva da CEF e do FNDE. Em relação ao valor da causa, considero que o montante indicado pela autora representa o conteúdo patrimonial em discussão, correspondente às parcelas do financiamento estudantil do qual objetiva a concessão, tendo, quanto a tal ponto, razão a parte autora, visto que atribuiu corretamente o valor à causa, que deve corresponder ao proveito econômico pretendido, no caso o custo do curso de medicina cujo financiamento pretende. Fixadas estas premissas, passo à análise do caso concreto. A educação configura-se como um direito fundamental social, nos termos do art. 6º da Constituição Federal de 1988: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015) O art. 205 do Texto Constitucional, por sua vez, institui ser dever do Estado a promoção do direito à educação: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. O inciso V do art. 208 da Constituição Federal estabelece o dever do Estado em dar acessibilidade ao cidadão ao nível superior de educação, nos seguintes termos: Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: (...) V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; Contudo, o ensino não se apresenta como monopólio do poder estatal, sendo possível a sua realização pelos entes privados. É o que prescreve o art. 209 da Constituição Federal: Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público. O Estado Brasileiro, como forma de ampliar o acesso à educação, em especial ao ensino superior, e diante da impossibilidade ingresso de todos os estudantes nas instituições públicas de ensino superior, em razão do número reduzido de vagas no sistema público de ensino, criou o Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior – FIES. O Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior – FIES, inicialmente, foi instituído pela Medida Provisória n. 2.094-25, de 13 de junho de 2001, a qual foi convertida na Lei n. 10.260, de 12 de julho de 2001, com a finalidade de propiciar financiamento em até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais de cursos superiores não gratuitos e com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo Ministério. O art. 1º, caput, e §§1º e 6º, da Lei nº 10.260/2001, trazem as linhas gerais do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior e dá outras providências: Art. 1º É instituído, nos termos desta Lei, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), de natureza contábil, vinculado ao Ministério da Educação, destinado à concessão de financiamento a estudantes de cursos superiores, na modalidade presencial ou a distância, não gratuitos e com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo Ministério, de acordo com regulamentação própria. (Redação dada pela Lei nº 14.375, de 2022) § 1º O financiamento de que trata o caput deste artigo poderá beneficiar estudantes matriculados em cursos da educação profissional, técnica e tecnológica, e em programas de mestrado e doutorado com avaliação positiva, desde que haja disponibilidade de recursos, nos termos do que for aprovado pelo Comitê Gestor do Fundo de Financiamento Estudantil (CG-Fies). (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) (...) §6º O financiamento com recursos do Fies será destinado prioritariamente a estudantes que não tenham concluído o ensino superior e não tenham sido beneficiados pelo financiamento estudantil, vedada a concessão de novo financiamento a estudante em período de utilização de financiamento pelo Fies ou que não tenha quitado financiamento anterior pelo Fies ou pelo Programa de Crédito Educativo, de que trata a Lei no 8.436, de 25 de junho de 1992. O §8º do art. 1º da Lei n.º 10.260/2001 prescreve que é do Ministério da Educação a competência estabelecer quais os critérios de elegibilidade das modalidades do FIES: Art. 1º (...) § 8º O Ministério da Educação, nos termos do que for aprovado pelo CG-Fies, editará regulamento para estabelecer os critérios de elegibilidade de cada modalidade do Fies. (Incluído pela Lei nº 13.530, de 2017) Para que faça jus ao FIES, realizando o contrato de abertura de crédito para financiamentos de encargos educacionais, necessário que os estudantes preencham alguns requisitos estabelecidos na Lei n. 10.260/2001, dentre as quais o seguinte: Art. 3º, § 1o O Ministério da Educação, nos termos do que for aprovado pelo CG-Fies, editará regulamento sobre: (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) I - as regras de seleção de estudantes a serem financiados, devendo ser considerados a renda familiar per capita, proporcional ao valor do encargo educacional do curso pretendido, e outros requisitos, bem como as regras de oferta de vagas; (Redação dada pela Lei nº 14.375, de 2022) II - os casos de transferência de curso ou instituição, de renovação, de suspensão temporária e de dilação e encerramento do período de utilização do financiamento; (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) III – as exigências de desempenho acadêmico para a manutenção do financiamento, observado o disposto nos §§ 2o, 3o e 4o do art. 1o desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) No que se refere especificamente às regras de seleção dos estudantes a serem financiados, o art. 3º, inciso III, alínea “a”, e § 1º, inciso I, todos da Lei nº 10.260/2001, prescrevem o seguinte: Art. 3º A gestão do Fies caberá: (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) (...) III - ao Comitê Gestor do Fundo de Financiamento Estudantil (CG-Fies), que terá sua composição, sua estrutura e sua competência instituídas e regulamentadas por decreto, na qualidade de: (Incluído pela Lei nº 13.530, de 2017) a) formulador da política de oferta de financiamento; (Incluída pela Lei nº 13.530, de 2017) (...) § 1º O Ministério da Educação, nos termos do que for aprovado pelo CG-Fies, editará regulamento sobre: (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017) (...) I - as regras de seleção de estudantes a serem financiados, devendo ser considerados a renda familiar per capita, proporcional ao valor do encargo educacional do curso pretendido, e outros requisitos, bem como as regras de oferta de vagas; (Redação dada pela Lei nº 14.375, de 2022) Por sua vez, o §6º do art. 3º da Lei nº 10.260/2001 estabelece que a oferta de vagas no âmbito do FIES deve observa a disponibilidades orçamentárias e financeiras: Art. 3º (...) § 6º O Ministério da Educação, ao estabelecer a oferta de vagas no âmbito do Fies, observará a disponibilidade financeira e orçamentária e a compatibilidade com as metas de resultados fiscais estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias. Assim sendo, pela legislação acima apresentada, há expressa previsão legal atribuindo ao Ministério da Educação a edição de regulamento dispondo sobre as regras de seleção de estudantes a serem financiados. Atendendo a tais critérios a Portaria Normativa MEC n. 209/2018 definiu o seguinte: CAPÍTULO III DOS PROCESSOS SELETIVOS DO FIES E DO P-FIES Art. 29. A pré-seleção de estudantes aptos a realizarem os demais procedimentos para contratação de financiamento com recursos do Fies e do P-Fies ocorrerá exclusivamente por meio de processo seletivo conduzido pela SESu/MEC. § 1º As regras e os procedimentos referentes ao processo seletivo do Fies e do P-Fies serão tornadas públicas por meio da edição de Portaria Normativa do MEC. § 2º Os prazos e demais procedimentos referentes ao processo seletivo do Fies e do P-Fies serão tornados públicos mediante Edital da SESu/MEC, doravante denominado Edital SESu. § 3º A pré-seleção de estudante apto à realização dos procedimentos tendentes à contratação do Fies e do P-Fies, de que trata o caput, independe de aprovação em processo seletivo próprio da instituição para a qual pleiteia uma vaga. § 4º Será vedada a concessão de novo financiamento, nos termos do art. 1º, § 6º, da Lei nº 10.260, de 2001, a candidato que: I - não tenha quitado o financiamento anterior pelo Fies ou pelo Programa de Crédito Educativo de que trata a Lei nº 8.436, de 25 de junho de 1992; e II - se encontre em período de utilização do financiamento. (...) Da inscrição, classificação e pré-seleção nos processos seletivos do Fies e do P-Fies Art. 37. As inscrições para participação no processo seletivo do Fies e do P-Fies serão efetuadas exclusivamente pela internet, em endereço eletrônico, e em período a ser especificado no Edital SESu, devendo o estudante, cumulativamente, atendar as condições de obtenção de média aritmética das notas no Enem e de renda familiar mensal bruta per capita a serem definidas na Portaria Normativa do MEC a cada processo seletivo. § 1º Compete exclusivamente ao estudante certificar-se de que cumpre os requisitos estabelecidos para concorrer no processo seletivo de que trata o caput, observadas as vedações previstas no § 4º do art. 29 desta Portaria. § 2º A participação do estudante no processo seletivo de que trata esta Portaria independe de sua aprovação em processo seletivo próprio da instituição para a qual pleiteia uma vaga. § 3º A oferta de curso para inscrição na modalidade Fies não assegura existência de disponibilidade orçamentária ou financeira para o seu financiamento, a qual somente se configurará por ocasião da conclusão da inscrição do estudante. § 4º A inscrição para financiamento na modalidade P-Fies está condicionada à disponibilidade orçamentária e financeira das fontes de recursos utilizadas de que trata o art. 15-J da Lei nº 10.260, de 2001. § 5º A obtenção de média mínima de notas no Enem e de observância ao limite de renda nos termos do caput constituem apenas critérios para a inscrição aos processos seletivos do Fies, estando a realização dos demais procedimentos tendentes à contratação do financiamento do programa obrigatoriamente condicionados à classificação e eventual pré-seleção do estudante, nos termos dos arts. 38 e 39 desta Portaria e dos demais atos que regulamentam o Fies. (Incluído pela Portaria nº 839, de 22 de outubro de 2021). Art. 38. Encerrado o período de inscrição, os estudantes serão classificados em ordem decrescente de acordo com as notas obtidas no Enem, na opção de vaga para a qual se inscreveram, na sequência a ser especificada em Portaria Normativa a cada processo seletivo, nos termos do art. 1º, § 6º, da Lei nº 10.260, de 2001. § 1º A nota de que trata o caput considerará a média aritmética das notas obtidas nas provas do Enem em cuja edição o candidato tenha obtido a maior média. § 2º No caso de notas idênticas, calculadas segundo o disposto no § 1º deste artigo, o desempate entre os candidatos será determinado de acordo com a ordem de critérios a ser especificada na Portaria Normativa do MEC. Art. 39. O estudante será pré-selecionado na ordem de sua classificação, nos termos do art. 38 desta Portaria, observado o limite de vagas disponíveis no curso e turno para o qual se inscreveu, conforme os procedimentos e prazos previstos no Edital SESu. Parágrafo único. A pré-seleção do estudante assegura apenas a expectativa de direito à vaga para a qual se inscreveu no processo seletivo do Fies e do P-Fies, estando a contratação do financiamento condicionada à conclusão da inscrição no FiesSeleção no caso da modalidade Fies, à pré-aprovação de algum agente financeiro operador de crédito na modalidade P-Fies e, em ambas modalidades, ao cumprimento das demais regras e procedimentos constantes desta Portaria e da Portaria Normativa que regulamenta cada processo seletivo. Ademais, o Ministério da Educação editou, entre outros diplomas administrativos, a Portaria MEC nº 38 de 22/01/2021 que estabeleceu o seguinte: Art. 15. A inscrição dos candidatos no processo seletivo do Fies implica: I – a concordância expressa e irretratável com o disposto nesta Portaria, no Edital SESu e nos demais atos normativos do Fies; e II – o consentimento para a utilização e a divulgação de suas notas no Enem e das informações prestadas no Exame, inclusive aquelas constantes do questionário socioeconômico, dos dados relacionados ao seu CPF no Censo da Educação Superior e à sua participação no processo seletivo do Fies de que trata o caput. Art. 17. Encerrado o período de inscrição, em cumprimento ao disposto no § 6º do art. 1º da Lei nº 10.260, de 2001, e os limites de vagas, os candidatos serão classificados nos termos informados no Edital SESu, observada a seguinte sequência: (…) § 1º A nota de que trata o caput considerará a média aritmética das notas obtidas nas provas do Enem em cuja edição o candidato tenha obtido a maior média. § 2º No caso de notas idênticas, calculadas segundo o disposto no § 1º, o desempate entre os candidatos será determinado de acordo com a seguinte ordem de critérios: I – maior nota na redação; II – maior nota na prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; III – maior nota na prova de Matemática e suas Tecnologias; IV – maior nota na prova de Ciências da Natureza e suas Tecnologias; e V – maior nota na prova de Ciências Humanas e suas Tecnologias. (…) Art. 18. O candidato será pré-selecionado na ordem de sua classificação, nos termos do art. 17, observado o limite de vagas disponíveis, conforme as definições, os procedimentos e os prazos previstos no Edital SESu. Logo, extrai-se dos diplomas administrativos - Portarias MEC nº 209/2018 e nº 38/2021, que a inscrição do candidato no processo seletivo do Fies implica a concordância expressa e irretratável com as referidas Portarias e Edital, os quais fixam como critério de classificação dos candidatos a média aritmética das notas obtidas nas provas do Enem em cuja edição o candidato tenha obtido a maior média. Impende ressaltar que as Portarias MEC nº 209/2018 e nº 38/2021 são atos normativos de natureza secundária, editados pela Administração Pública à luz do normativo legal e de suas disponibilidades orçamentárias e financeiras. Verifica-se que a norma em questão não veda o acesso ao FIES para alunos, mas apenas estabelece critérios para elegibilidade dos candidatos, de modo que a renda não se sobrepõe aos demais elementos, mas apenas se soma a eles para fins de classificação final. Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o estabelecimento de condições para a concessão do financiamento do FIES está inserido na esfera de conveniência e oportunidade da Administração para o fim de disposição dos recursos financeiros. Neste sentido o seguinte precedente: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. FIES. CONCESSÃO DE FINANCIAMENTO. VEDAÇÃO À CONCESSÃO DE NOVO FINANCIAMENTO A ESTUDANTE BENEFICIADO ANTERIORMENTE PELO PROGRAMA. PORTARIA NORMATIVA Nº 10, DE 30 DE ABRIL DE 2010. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. (...) 4. A Primeira Seção do STJ já enfrentou essa discussão, tendo assentado que “O estabelecimento de condições para a concessão do financiamento do FIES insere-se no âmbito da conveniência e oportunidade da Administração, e, portanto, não podem ser modificados ou afastados pelo Judiciário, sendo reservado a este Poder apenas o exame da legalidade do ato administrativo, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo” (MS 20.074/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 1°/7/2013). (...) 7. A concessão de financiamento estudantil em instituição de ensino superior não constitui direito absoluto - porquanto sujeito a limitações de ordem financeira e orçamentária -, razão pela qual não existe direito líquido e certo a afastar o ato apontado como coator. 8. Segurança denegada. (MS n. 20.169/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 13/8/2014, DJe de 23/9/2014) A exigência da nota de corte do ENEM e o critérios classificatórias, portanto, atendem aos princípios de moralidade, impessoalidade e eficiência a que se submete a Administração Pública (art. 37, caput, da CF), não havendo que falar em violação ao ordenamento jurídico em relação ao direito fundamental à educação (art. 6º, caput, e 205, ambos da CF). Assim, os critérios elencados para a concessão do financiamento, mesmo que seletivos, não se inserem em parâmetro de inconstitucionalidade por não apresentarem vedação à educação pelo interessado, mas ao contrário, propiciar que um maior número de pessoas alcance a graduação superior, ampliando o alcance horizontal da norma constitucional. Ademais, exceto se comprovada eventual ilegalidade de normas regulamentares atinentes ao FIES e a exigência de observância das notas do ENEM, não há se falar em alteração de seus parâmetros. Neste sentido o seguinte precedente do TRF3: PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. INÉPCIA DA INICIAL AFASTADA. JULGAMENTO IMEDIATO DA CAUSA MADURA. ADMINISTRATIVO. FIES. REGULARIDADE DAS PORTARIAS MEC Nº. 209/2018 E 38/2021. OBTENÇÃO DE PONTUAÇÃO INFERIOR À NOTA DE CORTE. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1- Analisada a petição inicial, é possível identificar a causa de pedir e a sua conexão com os pedidos a final formulados. Superada a preliminar e diante da apresentação de defesa meritória pelos réus, é viável a imediata análise do mérito com fundamento no artigo 1.013, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil. 2- A Lei Federal nº 10.260/2001 atribui expressamente ao Ministério da Educação a tarefa de estabelecer os critérios de elegibilidade para o FIES. 3- Os critérios fixados por portarias do MEC não exorbitam do poder regulamentar, pois são medidas indispensáveis para a garantia da isonomia e lisura no procedimento. 4- Ademais, a efetivação da inscrição implicou em concordância expressa e irretratável com as normas do Edital. 5- A apelante participou do processo seletivo do FIES. A efetivação da inscrição implicou em concordância expressa e irretratável com as normas do Edital. A candidata classificou-se na 1.152ª posição das 15 vagas disponíveis (ID 291412506). 6- Apelação provida em parte. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - Apelação Cível - 5000763-45.2024.4.03.6113, Rel. Desembargadora Federal GISELLE DE AMARO E FRANCA, julgado em 13/08/2024, DJEN: 04/09/2024) Especificamente acerca da utilização das notas do ENEM para fins de atingimento da nota de corte de curso superior pretendido pelos candidatos, não se verifica indício de ilegalidade, vez que, uma vez autorizado o MEC por preceito normativo a escolher os critérios eletivos para contratação do FIES, e sendo as normas emanadas sem vícios e executadas adequadamente, estas devem ser observadas pelos interessados. Neste sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. FIES. REGRAS DE SELEÇÃO. PORTARIA MEC N. 38/2021. CONCORDÂNCIA EXPRESSA E IRRETRATÁVEL DO CANDIDATO NO MOMENTO DA INSCRIÇÃO. OBTENÇÃO DE NOTA INFERIOR À NOTA DE CORTE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO ÀS REGRAS DE CLASSIFICAÇÃO. LEGALIDADE DOS CRITÉRIOS ADOTADOS NO ATO NORMATIVO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Pretende a agravante a concessão do financiamento estudantil – FIES, em sede de tutela de urgência, sob o argumento de que cumpriu todos os requisitos para tanto e teve o benefício injustamente negado. 2. As regras de seleção dos estudantes a serem financiados pelo Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior (FIES) foram definidas pelo Ministério da Educação, por meio da Portaria n. 38/2021, no exercício da atribuição prevista pelo legislador no art. 3º, III, ‘b’, § 1º, da Lei n. 10.260/2001. 3. Consoante o art. 15, I, do citado diploma administrativo, a inscrição do candidato no processo seletivo do FIES implica a concordância expressa e irretratável com referida Portaria (além do Edital SESu e demais normas do Fies), que fixa como critério de classificação dos candidatos a média aritmética das notas obtidas nas provas do Enem em cuja edição o candidato tenha obtido a maior média (art. 17, § 1º). 4. No caso concreto, a própria agravante reconhece que obteve pontuação 538,36 no Enem realizado em 2021, enquanto a nota de corte para o curso pretendido (Medicina) junto à IES foi de 733,24. Diante do número de vagas para referido curso (48), a agravante ficou classificada em 533º colocação na lista de espera. 5. Não houve qualquer violação às regras de seleção dos candidatos, à ordem de classificação ou eventual preterição da agravante por descumprimento de critérios estabelecidos no edital do FIES, de modo que a não obtenção do financiamento por não estar classificada dentro dos critérios constantes daquele edital não caracteriza qualquer ilegalidade. 6. A melhor nota obtida no Enem é critério aplicado a todos os candidatos ao FIES, de modo que afastá-lo da agravante meramente em razão da insatisfação da classificação resultante de sua aplicação configura evidente violação aos princípios da isonomia e da igualdade de acesso ao ensino, previstos pelos artigos 5º1, caput e 2062, I da Constituição Federal. 7. Ausente a probabilidade do direito, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, deve ser mantida a decisão que indeferiu a tutela de urgência na origem. 8. Agravo de instrumento não provido. (TRF-3, 1ª Turma, AI 5024266-72.2022.4.03.0000, Rel. Des. Fed. WILSON ZAUHY FILHO j. 24/03/2023, DJEN: 29/03/2023) Por sua vez, ao pretender concorrer ao financiamento do FIES o estudante deve estar ciente de suas regras as quais, se não inquinadas de ilegalidade, devem ser cumpridas integralmente. Neste sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. TUTELA DE URGÊNCIA. FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. FIES. EXIGÊNCIA DE MÉDIA ARITMÉTICA E NOTA DE CORTE NO ENEM. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. (...) 3. A agravante, ao se inscrever no vestibular e, posteriormente, ao requerer a obtenção do Financiamento Estudantil, tinha plena ciência prévia das regras. Sendo assim, diretrizes legais, reguladas pelas portarias que disciplinam a matéria, devem ser cumpridas, tanto em relação ao número de vagas quanto às notas obtidas no ENEM, exatamente por haver previsão orçamentária a ser seguida. 4. Agravo de instrumento desprovido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, AI - Agravo De Instrumento - 5002024-85.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 23/06/2023, DJEN: 28/06/2023) Logo, não havendo comprovação efetiva de descumprimento de preceito constitucional ou de ilegalidade manifesta, o critério seletivo objeto destes autos não se mostra desproporcional ou discriminatório. Em síntese, não assiste direito à parte autora para desconsiderar os preceitos normativos para o fim de avançar em sua colocação na referida listagem, em detrimento dos demais candidatos, ou escolher quais critérios pelos quais será posicionada na lista de espera. Neste sentido: ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENSINO SUPERIOR. FIES. CRITÉRIO DE CLASSIFICAÇÃO. NOTA DO ENEM. RECURSO DESPROVIDO. 1. A Portaria nº 209/2018, editada pelo Ministério da Educação com fundamento na Lei nº 10.260/2010, traz como requisito para a inscrição no FIES a obtenção de média aritmética das notas do Enem, na edição em que o candidato tenha obtido a maior média (artigo 37 da Portaria nº 209/18 e artigo 17 da Portaria 38/01). 2. Ao prestar determinado concurso, seja exame vestibular ou concurso público, o candidato sujeita-se às normas contidas no edital ou regulamentação específica, desde que estas encontrem-se em consonância com à lei. Trata-se do princípio da vinculação às normas do instrumento convocatório. 3. Agravo de instrumento improvido. (TRF-3, 4ª Turma, AI 5008936-98.2023.4.03.0000, Rel. Des. Fed. MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, DJEN: 28/08/2023) Com tais elementos, a improcedência da ação é medida que se impõe. DISPOSITIVO. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I do CPC. Defiro a gratuidade da justiça. Sem custas. Suspensa a exigibilidade dos honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 98, §3º, do CPC. Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se. Andradina, data da assinatura eletrônica. VICENTE LEONARDO DOS SANTOS COSTA Juiz Federal

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Charles Do Nascimento Ribeiro Serafim e outros x Bhp Billiton Brasil Ltda. e outros

ID: 309212671

Tribunal: TJES Órgão: Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5005776-64.2024.8.08.0030

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

CHARLES DO NASCIMENTO RIBEIRO SERAFIM TATIANE DA SILVA SERAFIM RIBEIRO

Polo Passivo:

BHP BILLITON BRASIL LTDA. FUNDACAO RENOVA SAMARCO MINERACAO S.A. VALE S.A.

Sentença

Advogados:

IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU

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CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO

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RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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JACYARA MATIAS MONTEIRO

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MARIA DE FATIMA MONTEIRO

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PAULO HENRIQUE MARCAL MONTEIRO

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PAOLLA FERNANDES DA SILVA

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JACYARA MATIAS MONTEIRO

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MARIA DE FATIMA MONTEIRO

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PAULO HENRIQUE MARCAL MONTEIRO

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PAOLLA FERNANDES DA SILVA

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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5005776-64.2024.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: CHARLES DO NASCIMENTO RIBEIRO SERAFIM, TATIANE DA SILVA SERAFIM RIBEIRO REQUERIDO: SAMARCO MINERACAO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA., FUNDACAO RENOVA Advogados do(a) REQUERENTE: JACYARA MATIAS MONTEIRO - ES23407, MARIA DE FATIMA MONTEIRO - ES269-B, PAOLLA FERNANDES DA SILVA - ES38285, PAULO HENRIQUE MARCAL MONTEIRO - ES19897 Advogados do(a) REQUERIDO: EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU - MG80702, IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogado do(a) REQUERIDO: CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO - ES12288 Advogado do(a) REQUERIDO: IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogado do(a) REQUERIDO: RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES - ES8544 SENTENÇA I - RELATÓRIO Charles do Nascimento Ribeiro Serafim e Tatiane da Silva Serafim Ribeiro propuseram a presente Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Patrimoniais e Morais, com pedido de tutela provisória de urgência, em face de Samarco Mineração S.A., Vale S.A., BHP Billiton Brasil Ltda. e Fundação Renova, alegando que eram pescadores artesanais que exerciam suas atividades no Rio Doce, Rio Pequeno, Lagoa Juparanã e Praia de Regência, todos no município de Linhares/ES. Sustentam que, com o rompimento da barragem de Fundão em 2015, houve a liberação de rejeitos de minério e metais pesados, tornando inviável a continuidade da atividade pesqueira, afetando diretamente sua subsistência e integridade física. Para reforçar sua alegação, apontam como causa de pedir que foram privados da possibilidade de exercer a pesca como meio de subsistência, além de continuarem consumindo pescado contaminado, o que teria gerado risco à saúde física, com potencial violação à dignidade humana. Reclamam, também, que embora tenham buscado cadastro junto à Fundação Renova, não receberam qualquer reparação até o momento. Alegam violação ao direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e invocam a responsabilidade civil objetiva e solidária das requeridas. Ao final, pediram a condenação das rés ao pagamento de R$ 150.000,00 por danos morais, R$ 127.761,60 por Auxílio Financeiro Emergencial retroativo e R$ 90.000,00 por cestas básicas, além da concessão de tutela provisória para imediata inclusão no AFE. Com a petição inicial, foram juntados diversos documentos, entre eles: procuração outorgada por CHARLES (ID 42327021), cópia de sua CNH (ID 42327026), procuração outorgada por TATIANE (ID 42327027), cópia de seu RG (ID 42327028), declaração de hipossuficiência financeira de CHARLES (ID 42327030), extrato do CNIS de CHARLES (ID 42327031), e declaração de hipossuficiência de TATIANE (ID 42327033). Por meio do despacho de ID 42662564, foi expedida carta para citação das rés. As citações foram devidamente cumpridas, conforme certidões e avisos de recebimento constantes dos IDs 43953256 (certidão de juntada de AR), 43953260 (AR da SAMARCO), 43953264 (AR da BHP), 43953267 (AR da RENOVA) e 44781371 (AR da VALE). Em contestação de ID 44871400, Vale S.A. defendeu a ausência de responsabilidade, afirmando que não há comprovação da ingestão de pescado contaminado, tampouco de danos físicos. Alegou inexistência de nexo causal entre os danos e sua conduta e destacou que, mesmo sendo acionista da Samarco, a responsabilidade não pode ser presumida. Ressaltou que a pesca na região estava judicialmente suspensa e que qualquer indenização deveria seguir os critérios do Sistema Indenizatório Simplificado (Novel). A BHP Billiton Brasil Ltda. (ID 45254342) alegou sua ilegitimidade passiva, afirmando que não possui relação operacional direta com a barragem de Fundão, e que sua condição de acionista da Samarco não a torna automaticamente responsável. Defendeu a ausência de prova do exercício da pesca e do local de residência dos autores à época dos fatos, requerendo a extinção do feito sem julgamento do mérito. A Samarco Mineração S.A. (ID 45225776) sustentou a inépcia da petição inicial por ausência de provas mínimas do exercício da atividade pesqueira ou da residência em área afetada à época do rompimento. Contestou a legitimidade ativa dos autores e a alegação de dano ambiental coletivo, argumentando que tal pleito deve ser formulado por meio de ação civil pública, por parte legitimada. Alegou ainda ausência de nexo de causalidade e impugnou a existência de risco concreto à saúde física dos autores. A Fundação Renova (ID 61819501) também alegou inépcia da inicial e ilegitimidade ativa dos autores, além da ausência de documentos indispensáveis à propositura da ação. Defendeu que não há comprovação da residência em área afetada, do exercício da atividade pesqueira ou de danos físicos decorrentes da alegada contaminação por metais pesados. Em réplica de ID 48311430, os autores refutaram as preliminares suscitadas pelas rés, reafirmando que as provas apresentadas são suficientes para justificar a continuidade do processo, bem como que não há exigência legal de prova pré-constituída para fins de aferição de legitimidade ativa, invocando a teoria da asserção. Reforçaram que as rés devem responder solidariamente pelos danos causados. Na decisão saneadora, o juízo rejeitou as preliminares de ilegitimidade passiva, ilegitimidade ativa e inépcia da inicial. Indeferiu o pedido de tutela provisória por ausência de prova inequívoca da urgência e da verossimilhança do direito, e fixou como pontos controvertidos: (i) a relação de causalidade entre o rompimento da barragem e os danos alegados; (ii) a extensão dos prejuízos materiais e morais; e (iii) a responsabilidade solidária das rés. Determinou a produção de provas e designou prazo para especificação. Por fim, os autores manifestaram interesse na designação de audiência de conciliação e arrolaram testemunha para a instrução probatória. É o que havia a relatar. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO A controvérsia posta nos autos versa sobre a responsabilidade civil das rés – SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. e FUNDAÇÃO RENOVA – em decorrência dos danos supostamente sofridos pelos autores CHARLES DO NASCIMENTO RIBEIRO SERAFIM e TATIANE DA SILVA SERAFIM RIBEIRO, em razão do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 05 de novembro de 2015, no município de Mariana/MG. A demanda está alicerçada nos seguintes fundamentos: (i) os autores alegam exercer atividade de pesca para subsistência e complemento de renda em rios e lagoas localizados no município de Linhares/ES; (ii) sustentam que o rompimento da barragem contaminou os corpos hídricos utilizados por eles, o que teria inviabilizado o consumo e comercialização de pescado; (iii) afirmam que, apesar de terem protocolado pedido de cadastro junto à Fundação Renova, não obtiveram resposta satisfatória ou indenização por meio dos programas extrajudiciais; (iv) requerem, com base nos princípios da reparação integral e da responsabilidade objetiva ambiental, o pagamento de indenizações por danos materiais e morais, bem como a inclusão em programa de Auxílio Financeiro Emergencial. II.1 - JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (CPC, art. 355, I) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a matéria for exclusivamente de direito ou, sendo de fato e de direito, os autos contiverem elementos suficientes para a formação do convencimento do juízo. Tal dispositivo prestigia os princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade da tutela jurisdicional, sem prejuízo ao contraditório. Ressalte-se que o magistrado, como destinatário final das provas, detém o poder-dever de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, mediante decisão fundamentada, conforme preconiza o art. 370, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido, o STJ firmou posição de que "cabe ao juiz verificar a necessidade de dilação probatória, considerando que é o destinatário final da prova, cujo objetivo é a formação de seu convencimento", conforme se verifica no precedente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO . DANOS MORAIS DECORRENTES DA FUMAÇA. MAGISTRADO COMO DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NEXO CAUSAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL NÃO VERIFICADO . PROVAS. REEXAME. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ . (...) O destinatário final da prova é o juiz, a quem cabe avaliar quanto sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 370 do CPC/2015. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que compete às instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa, cujo reexame é vedado em recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. (...) (STJ - AgInt no AREsp: 1504747 SP 2019/0139522-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 18/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2021) O Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a mesma diretriz. Em precedente da 4ª Câmara Cível, firmou-se que “não configura cerceamento de defesa o julgamento da lide sem a produção das provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e indeferir a produção probatória que considerar desnecessária à formação do seu convencimento” (TJES, Apelação Cível 0020606-22.2020.8.08.0011, Rel. Des. Luiz Guilherme Risso, j. 20/09/2024). Ainda, em caso análogo, decidiu-se que o indeferimento da prova oral é legítimo diante da “existência de documentação coligida aos autos, e dado o fato de que o magistrado é o destinatário das provas” (TJES, Apelação Cível 5001008-22.2021.8.08.0056, Rel. Des. Carlos Magno Moulin Lima, j. 23/09/2024). A jurisprudência dos tribunais estaduais é pacífica quanto à possibilidade de julgamento antecipado em ações indenizatórias relacionadas ao desastre ambiental de Mariana, especialmente quando a parte autora não apresenta elementos probatórios mínimos sobre os danos alegados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso semelhante envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho, decidiu que, “estando a matéria suficientemente esclarecida e não sendo possível que a prova, pelas circunstâncias do caso concreto, interfira no julgamento, tem-se como desnecessária a dilação probatória” (TJMG, Apelação Cível 5000391-19.2021.8.13.0090, Rel. Des. Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, j. 20/05/2024). Os autores foram devidamente intimados para especificar as provas que pretendiam produzir e, apesar disso, limitaram-se a arrolar uma única testemunha, sem indicar fato novo ou controvertido que justificasse a instrução oral. Ademais, os documentos apresentados não se mostram aptos a comprovar minimamente os fatos constitutivos do direito alegado, especialmente quanto ao exercício da atividade pesqueira, à residência em área impactada e à ocorrência de danos individualizados. Nessas circunstâncias, e considerando que o juiz é o destinatário final da prova (art. 370, parágrafo único, do CPC), revela-se legítimo e adequado o julgamento antecipado, sem que isso configure cerceamento de defesa, conforme consolidado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. II.2 – DO REGIME DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA AMBIENTAL A responsabilidade civil por danos ambientais, no ordenamento jurídico brasileiro, é de natureza objetiva, estando fundamentada na teoria do risco integral, conforme dispõe o §3º do art. 225 da Constituição Federal e o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 14 – [...] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.” Esse regime implica que, havendo comprovação do dano e do nexo causal com a atividade lesiva, é dispensável a demonstração de culpa, bastando a constatação da ocorrência do evento danoso e sua imputabilidade ao agente causador. Assim, qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que direta ou indiretamente contribua para a degradação ambiental, responde objetivamente pelos prejuízos resultantes de sua conduta. Por sua própria lógica protetiva e reparatória, a responsabilidade civil ambiental é também solidária e integral, recaindo sobre todos os que concorrem para o dano, independentemente do grau de participação. Ademais, a obrigação de reparar o meio ambiente é imprescritível no tocante à tutela difusa ambiental, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, cumpre ressaltar que, mesmo sob o regime da responsabilidade objetiva, não se dispensa a comprovação do dano efetivamente suportado e do nexo causal com o evento ambiental, nos termos do art. 373, I, do CPC. A aplicação da teoria do risco integral não implica presunção automática de dano moral individual em decorrência de um desastre ambiental, ainda que de grande extensão e notoriedade. Em outras palavras, ainda que se reconheça o ilícito ambiental e a responsabilização objetiva das rés no plano abstrato, a parte autora permanece incumbida de demonstrar concretamente como o evento impactou sua esfera individual, seja na dimensão patrimonial, seja na existencial, como condição para o deferimento de indenização. Esse entendimento é reforçado pela jurisprudência consolidada dos tribunais e pela doutrina especializada, sobretudo em relação às ações ajuizadas fora do sistema extrajudicial de reparação operado pela Fundação Renova ou dos programas simplificados instituídos por acordos coletivos e decisões proferidas em ações civis públicas. Nesses casos, exige-se do autor prova idônea e individualizada dos prejuízos alegados, sob pena de improcedência da demanda. II.3 – DA PROVA DO DANO E DO NEXO DE CAUSALIDADE Embora seja inegável a magnitude do desastre e a responsabilidade objetiva das empresas envolvidas, nos termos do art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81, o que está sob exame não é a ocorrência do evento danoso em si, mas sim a necessidade de demonstração individualizada do dano efetivamente sofrido pelos autores, uma vez que se trata de ação de indenização de cunho individual, ajuizada no âmbito da Justiça Estadual, em regime de cognição plena e exauriente. A responsabilidade civil objetiva, ainda que dispense a demonstração de culpa, não afasta a necessidade de comprovação do dano e do nexo de causalidade entre o evento e os prejuízos alegados (art. 927 do Código Civil c/c art. 373, I, do CPC). Assim, incumbia aos autores demonstrar minimamente a existência de prejuízos concretos e individualizáveis, decorrentes direta ou indiretamente do rompimento da barragem, aptos a ensejar reparação pecuniária. No entanto, os elementos constantes dos autos não permitem acolher tal pretensão. A petição inicial, embora bem estruturada em suas alegações genéricas, não foi instruída com qualquer documento comprobatório de que os autores exerciam atividades econômicas afetadas pela tragédia ambiental, tampouco demonstraram vínculos de subsistência direta com o Rio Doce, como seria o caso de pescadores, agricultores ribeirinhos ou prestadores de serviços dependentes do curso hídrico afetado. Não há sequer indício de propriedade ou posse de área rural, embarcação, registro de colônia de pescadores, notas fiscais de atividade comercial, contratos de prestação de serviço, inscrição como MEI ou qualquer outro documento equivalente. Da mesma forma, não foi trazida aos autos prova técnica ou médica de prejuízos à saúde física ou psíquica decorrentes do suposto contato com a água contaminada ou consumo de pescado impróprio. Também não há comprovação de que os autores tenham sido privados de acesso à água potável ou de que tenham vivenciado restrições sanitárias específicas, sendo público e notório que o município de Linhares não enfrentou desabastecimento após o rompimento da barragem, conforme reconhecido em diversas ações correlatas analisadas neste juízo e outros. No caso dos autos, não ficou demonstrado o nexo causal entre o evento danoso e os prejuízos alegados pela parte autora. A jurisprudência tem estabelecido critérios claros para essa verificação: APELAÇÃO CÍVEL – NULIDADE DA SENTENÇA – AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – REJEITADA – MÉRITO – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS – ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE FUNDÃO – ALEGAÇÃO DE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PESQUEIRA – DANOS NÃO COMPROVADOS – AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL – RECURSO DESPROVIDO. 1. A sentença apelada considerou que a prova oral produzida não evidenciou qualquer dano sofrido pelo recorrente, causado pelo rompimento da barragem de Fundão. Por conseguinte, o mero inconformismo com o resultado da sentença proferida não implica na negativa de prestação jurisdicional ou mesmo em sua nulidade, mormente, quando, conforme se demonstrou, o juízo sentenciante analisou e considerou todo o conjunto probatório produzido nos autos para orientar seu convencimento motivado. Nulidade da sentença rejeitada. 2. Para o exercício da atividade pesqueira, seja ela profissional ou amadora, é necessário registro junto ao órgão competente. De outro lado, o Superior Tribunal de Justiça na oportunidade do julgamento do Recurso Especial nº 1.354.536/SE, sob a sistemática dos recursos repetitivos, considerou ser temerário considerar que tais documentos sejam os únicos a comprovar o exercício da atividade pesqueira, cabendo a comprovação mediante elementos idôneos com força probante. 3. No caso em exame, o recorrente não juntou provas documentais ou testemunhais aptas a comprovar, minimamente, suas alegações quanto ao exercício de atividade pesqueira, bem como de ter sido impedido de exercer atividade laborativa por conta do evento danoso descrito nos autos. De acordo com as provas produzidas, foi possível inferir que o apelante sequer era residente de comunidade mencionada na Deliberação nº 58 do CIF, ou mesmo indicou de que modo estaria vinculada a um destes locais, conforme se vê do comprovante de residência acostado aos autos. 4. A desvinculação do apelante da qualidade de pescador informal ou vendedor de pescado é corroborada pelas informações constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), emitido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), as quais revelam que este, além de nunca ter sido beneficiário do “seguro defeso” ou ter as suas atividades laborais vinculadas à condição de pescador, também demonstram que no período de 13/04/2015 a 22/08/25016, exercia atividade remunerada diversa da pescaria ou venda de pescado. 5. Malgrado seja público e notório o ato ilícito imputado as apeladas, não cuidou o apelante de comprovar, minimamente, os alegados danos suportados em decorrência do rompimento da barragem, afastando, portanto, a responsabilidade daquelas em indenizar os danos que o recorrente alega ter sofrido. 6. Recurso desprovido. (TJ-ES, Data: 22/Feb/2024, Órgão julgador: 3ª Câmara Cível, Número: 5005859-34.2021.8.08.0047, Magistrado:, SERGIO RICARDO DE SOUZA, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Assunto: Indenização por Dano Material) Ressalte-se, ainda, que os autores ajuizaram a presente ação quase nove anos após o evento danoso, sem apresentar qualquer justificativa plausível para a inércia nesse interregno, e sem que haja qualquer documento que comprove a tentativa de acesso aos programas extrajudiciais de reparação implementados pela FUNDAÇÃO RENOVA, como o Sistema Indenizatório Simplificado (Novel) ou o Programa de Indenização Mediada (PIM), os quais foram amplamente divulgados e operacionalizados ao longo dos anos. Essa ausência de iniciativa administrativa revela não apenas a falta de prova do dano, mas também a inexistência de diligência mínima por parte dos autores na tentativa de mitigar ou reparar os supostos prejuízos alegados. No que se refere à prova oral, embora seja admitida como meio legítimo de prova no processo civil, sua utilização isolada e sem qualquer suporte documental não se mostra suficiente para comprovar o exercício habitual de atividade econômica. Tal entendimento encontra respaldo na analogia com o que dispõe a jurisprudência firmada em ações previdenciárias rurais, que exigem a comprovação da atividade rural por meio de início razoável de prova material, corroborada por testemunhal. Nesse sentido, destaca-se o seguinte julgado paradigmático, aplicável ao caso concreto: APELAÇÃO CÍVEL. DESASTRE AMBIENTAL. BARRAGEM DE MARIANA/MG. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. RECURSO DESPROVIDO. (...) Apesar de ser incontestável o dano ambiental e os prejuízos causados aos pescadores e comerciantes que dependiam economicamente do exercício de sua atividade nas áreas afetadas, o ressarcimento pretendido pela apelante demanda escorreita comprovação de que exercia a atividade pesqueira à época do desastre ambiental e que teve a sua subsistência prejudicada por ele, a fim de justificar o recebimento de indenização a ser paga pela responsável pelo evento danoso. (...) A autora não apresentou provas suficientes para demonstrar o exercício da pesca comercial, tais como registros de embarcação, carteira de pescador profissional, recibos de comercialização ou declaração de associação de pescadores. Apenas relatos orais foram coligidos, sendo insuficientes para comprovar as alegações. (...) A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da autora impede o reconhecimento do direito à indenização. (TJES, Ap. Cív. 5003559-31.2023.8.08.0047, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Eliana Junqueira Munhos Ferreira, j. 18/12/2024) Ademais, as rés impugnaram especificamente a ausência de provas do dano (contestação da SAMARCO no ID 45225776, da VALE no ID 44871400, da BHP no ID 45254342 e da FUNDAÇÃO RENOVA no ID 45973476), afirmando inexistência de documentos comprobatórios mínimos, reiterando a necessidade de demonstração individual dos danos sofridos, posição que este juízo acompanha com base na orientação consolidada dos Tribunais Superiores. No tocante aos danos morais, é igualmente necessário demonstrar abalo psíquico real e concreto sofrido em decorrência dos fatos, o que não se presume em ações individuais ajuizadas tantos anos após o evento e sem qualquer elemento clínico ou laudo técnico que ateste sofrimento psicológico, medo, transtorno ou perturbação da ordem emocional. O alegado impacto ao lazer ou à vida social não se sustenta diante da realidade geográfica do município de Linhares, que dispõe de extenso potencial hidrográfico e alternativas diversas de recreação aquática, tornando inadmissível a generalização do uso do Rio Doce como único meio de fruição de lazer, salvo demonstração em sentido contrário, o que também não foi feito. A jurisprudência, embora reconheça a gravidade dos danos ambientais e sociais provocados pelo rompimento da barragem de Fundão, estabelece como requisito para a reparação civil individual a comprovação mínima do sofrimento pessoal concreto: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE FUNDÃO. IMPOSSIBILIDADE DE USO DO RIO DOCE PARA PESCA E LAZER. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DANO INDIVIDUALIZADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por residente no Município de Linhares contra sentença que julgou improcedente pedido de indenização por danos morais em razão da impossibilidade de uso do Rio Doce para pesca e lazer, em decorrência do rompimento da Barragem de Fundão. Alega a apelante que a poluição do rio e a consequente morte dos peixes afetaram sua qualidade de vida e causaram sofrimento. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se a privação do uso do Rio Doce para pesca e lazer, em razão do desastre ambiental, configura, por si só, dano moral indenizável. III. RAZÕES DE DECIDIR A responsabilidade civil exige a comprovação de ato ilícito, nexo causal e dano, nos termos dos arts. 927, 186 e 187 do Código Civil. O dano moral indenizável pressupõe a violação de direitos da personalidade ou sofrimento intenso e profundo, não bastando a mera privação de um bem ambiental de uso coletivo. A degradação ambiental do Rio Doce, ainda que notória, não implica automaticamente a caracterização de danos morais individuais a todos os residentes da região. Cabe à parte autora o ônus de comprovar o dano alegado, nos termos do art. 373, § 2º, do CPC, não se admitindo presunção genérica de sofrimento moral. Precedentes do Tribunal de Justiça de Minas Gerais reconhecem que a interrupção da pesca amadora e alegações genéricas de prejuízo à qualidade de vida não configuram, por si sós, dano moral indenizável. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A mera impossibilidade de usufruir do Rio Doce para pesca e lazer, sem comprovação de prejuízo individual concreto, não configura dano moral indenizável. O dano moral indenizável exige a violação de direitos de personalidade ou sofrimento intenso e profundo, não sendo suficiente a degradação ambiental de uso coletivo para sua caracterização. Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 927, 186 e 187; CPC, art. 373, § 2º. Jurisprudência relevante citada: TJMG, Apelação Cível 1.0000.21.014011-7/001, Rel. Des. Saldanha da Fonseca, 12ª Câmara Cível, j. 21/07/2021; TJMG, Apelação Cível 1.0000.21.141101-2/001, Rel. Des. João Cancio, 18ª Câmara Cível, j. 28/09/2021. (TJ-ES, Data: 07/Apr/2025, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Número: 5007979-33.2023.8.08.0030, Magistrado: ROBSON LUIZ ALBANEZ, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Assunto: Indenização por Dano Moral) Neste mesmo sentido, decidiu o Tribunal de Justiça do Espírito Santo: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DESASTRE AMBIENTAL. POLUIÇÃO DO RIO DOCE. ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE FUNDÃO (MARIANA-MG). DANO MATERIAL. LUCROS CESSANTES. ÔNUS DA PROVA DO QUAL A PARTE AUTORA NÃO SE DESINCUMBIU. DANO MORAL. AUSÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. É fato notório que em novembro de 2015 houve o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG, cuja operação era da Samarco S.A, causando incomensurável prejuízo ambiental e patrimonial à região e a diversos municípios capixabas, além de causar a morte de funcionários e moradores. No entanto, para o deferimento do dano material afirmado há exigência da demonstração de prova, nos termos do inciso I, do art. 373, do CPC. 2.“A indenização por lucros cessantes não é admitida sem sua efetiva comprovação, devendo ser rejeitados os lucros presumidos ou hipotéticos, dissociados da realidade efetivamente comprovada. Precedentes.” (STJ – AgInt no AREsp: 1730936 SE 2020/0178818-7, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 15/03/2021, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/03/2021). 3. O apelante não se desincumbiu do seu ônus probatório, nos termos do art. 373, I, do CPC, o que impede a procedência da indenização vindicada. 4. A indenização por danos morais pressupõe a comprovação da ofensa aos direitos da personalidade individual do apelante, não podendo se basear, em danos sofridos pela coletividade. (TJ-ES; Data: 28/Mar/2023; Órgão julgador: 1ª Câmara Cível; Número: 0006097-63.2019.8.08.0030; Magistrado: JANETE VARGAS SIMOES; Classe: APELAÇÃO CÍVEL) Especificamente quanto à alegação de impossibilidade de uso do Rio Doce para lazer, o TJES tem pacificado o entendimento de que “alegações genéricas sobre uso de áreas afetadas para lazer, sem prova específica, não configuram dano moral” (TJES; Data: 13/Feb/2025; Órgão julgador: 4ª Câmara Cível; Número: 5012678-04.2022.8.08.0030; Magistrado: ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA; Classe: APELAÇÃO CÍVEL). Em outro julgado recente, o mesmo tribunal reiterou que “o pedido de compensação por danos morais foi atrelado à impossibilidade de usufruir do meio ambiente para lazer. No entanto, alegações genéricas, sem a indicação de consequências objetivas e individualizadas, não justificam reparação por danos morais” (TJES; Data: 06/Nov/2024; Órgão julgador: 2ª Câmara Cível; Número: 5001631-45.2023.8.08.0047; Magistrado: FABIO CLEM DE OLIVEIRA; Classe: APELAÇÃO CÍVEL). Portanto, não se verifica nos autos qualquer elemento fático ou probatório que autorize o acolhimento da pretensão indenizatória, seja na esfera material, seja na moral. A procedência de pedidos dessa natureza, sem qualquer substrato probatório mínimo, abriria margem para a proliferação de ações baseadas em danos hipotéticos e subjetivos, comprometendo a coerência e a segurança jurídica do sistema de responsabilidade civil. Conclui-se, assim, que os autores não se desincumbiram do ônus que lhes incumbia, conforme disposto no art. 373, inciso I, do CPC, inexistindo prova de que sofreram, de modo concreto, qualquer prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial em decorrência do desastre de Mariana. A jurisprudência corrobora essa necessidade de prova mínima e individualizada, inclusive em hipóteses de responsabilidade objetiva ambiental, como demonstram decisões reiteradas do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo em casos análogos. Em suma: (a) os autores alegaram prejuízos decorrentes de fato público e notório, mas não apresentaram documentos que comprovassem a existência de vínculo direto com o Rio Doce ou com atividades impactadas pelo desastre; (b) tampouco demonstraram tentativas de reparação extrajudicial, tampouco juntaram prova técnica dos danos morais alegados; (c) ausente a demonstração mínima de dano ou nexo causal, a improcedência dos pedidos é medida que se impõe. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e considerando o julgamento antecipado da lide nos termos do artigo 355, inciso I, do mesmo diploma legal, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por CHARLES DO NASCIMENTO RIBEIRO SERAFIM e TATIANE DA SILVA SERAFIM RIBEIRO em face de SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. e FUNDAÇÃO RENOVA. Condeno os autores ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, conforme o disposto no artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil. Contudo, tendo sido concedida a gratuidade da justiça, a exigibilidade dessas verbas ficará suspensa, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC. No cálculo, devem ser observadas as orientações constantes dos índices da CGJ/ES As partes ficam advertidas de que eventual oposição de embargos de declaração que não se enquadre nas hipóteses do artigo 1.022 do CPC, ou que tenha caráter meramente infringente, poderá ensejar a aplicação da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do mesmo diploma legal. Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se os autos, com as anotações de praxe. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Linhares/ES, data registrada no sistema. Juiz(a) de Direito

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Deivid Laass e outros x Bhp Billiton Brasil Ltda. e outros

ID: 309212812

Tribunal: TJES Órgão: Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5000207-53.2022.8.08.0030

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

DEIVID LAASS MARIA RITA DOS SANTOS OLIVEIRA

Polo Passivo:

BHP BILLITON BRASIL LTDA. FUNDACAO RENOVA SAMARCO MINERACAO S.A. VALE S.A.

Sentença

Advogados:

EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO

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RICARDO LOPES GODOY

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RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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JAIME SOUZA NETO

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MARINARA MEDEIROS TESCH

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JAIME SOUZA NETO

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MARINARA MEDEIROS TESCH

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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5000207-53.2022.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: MARIA RITA DOS SANTOS OLIVEIRA, DEIVID LAASS REU: SAMARCO MINERACAO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA., FUNDACAO RENOVA Advogados do(a) AUTOR: JAIME SOUZA NETO - ES30435, MARINARA MEDEIROS TESCH - ES33412 Advogado do(a) REU: RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES - ES8544 Advogados do(a) REU: EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU - MG80702, IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogados do(a) REU: CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO - ES12288, RICARDO LOPES GODOY - MG77167 Advogado do(a) REU: IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 SENTENÇA I - RELATÓRIO MARIA RITA DOS SANTOS OLIVEIRA e DEIVID LAASS propuseram a presente ação de indenização por danos materiais e morais em face de SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. e FUNDAÇÃO RENOVA, todos qualificados nos autos. Afirmaram que exerciam, à época do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 05 de novembro de 2015, atividades de pesca informal na região de Linhares/ES, sendo diretamente impactados pela contaminação das águas do rio Doce, o que comprometeu sua subsistência e renda familiar. Alegaram, ainda, que buscaram cadastramento junto à Fundação Renova em 2018 e novamente em 2020, tendo ambos os pedidos sido indeferidos. Sustentaram que, por conta da negativa de cadastro e da inércia das rés, restaram impedidos de aderir tempestivamente ao sistema indenizatório simplificado (NOVEL), fixado por decisão da 12ª Vara Federal de Minas Gerais. Pleitearam, com base em referida decisão, indenização de R$ 94.585,00 para cada autor a título de danos materiais e morais, bem como R$ 10.000,00 por autor a título de danos morais adicionais, totalizando R$ 209.170,00. As rés apresentaram contestações separadas. A SAMARCO MINERAÇÃO S.A. (ID 21360203) arguiu preliminarmente sua ilegitimidade passiva, sustentando que não possui controle sobre os critérios de elegibilidade dos programas indenizatórios, os quais são geridos pela Fundação Renova. Alegou, ainda, a inépcia da inicial, ausência de prova da atividade econômica dos autores e ausência de nexo causal entre o evento e os supostos danos. A FUNDAÇÃO RENOVA (ID 21314437) também impugnou a pretensão, sustentando a ilegitimidade ativa dos autores e ausência de comprovação de que estes exerciam atividade pesqueira no período do desastre, asseverando que não preencheram os requisitos para adesão ao sistema NOVEL, cujo prazo de cadastramento se encerrou em 30/04/2020. A BHP BILLITON BRASIL LTDA. (ID 18469893) apresentou defesa com ênfase na ilegitimidade passiva, por ser apenas acionista da SAMARCO, sem ingerência operacional sobre a barragem. Requereu, ainda, o indeferimento da justiça gratuita. A VALE S.A. (ID 18130779) alegou que não detinha controle sobre a operação da barragem e que sua condição de acionista não enseja responsabilidade solidária, pugnando pela improcedência total da demanda. Os autores apresentaram réplica às contestações (ID 29993991), na qual impugnaram integralmente os argumentos defensivos, especialmente a exigência de apresentação de RGP, sustentando que a jurisprudência permite comprovação da condição de pescador artesanal por outros meios, inclusive testemunhal. Requereram a produção de provas testemunhal, documental e oral, inclusive o depoimento pessoal das rés. Por meio do despacho de ID 34401470, o juízo determinou às partes a especificação de provas. Instadas a especificar provas, a parte autora reiterou o requerimento de provas orais e documentais (ID 34915126), indicando em seguida rol de testemunhas (ID 40636139). A VALE S.A. manifestou-se declarando que não tinha provas a produzir (ID 35566496), enquanto a BHP BILLITON requereu expedição de ofício ao Ministério da Pesca e Aquicultura para apurar eventual vínculo dos autores como pescadores informais (ID 35351868). A FUNDAÇÃO RENOVA informou não ter interesse na produção de outras provas (ID 34925803). A SAMARCO reiterou pedido de ofício ao INSS e ao CAGED para apuração de vínculos formais e benefícios percebidos pelos autores (ID 34806157). Posteriormente, foi proferida decisão de saneamento e organização do processo (ID 40004511), na qual foram rejeitadas todas as preliminares suscitadas, incluindo alegações de ilegitimidade ativa e passiva, ausência de interesse processual, inépcia da inicial e impugnação à justiça gratuita. O processo foi declarado saneado, foram fixados os pontos controvertidos e deferida a produção de prova oral, com intimação para apresentação de testemunhas, além de diligências documentais dirigidas ao INSS, CAGED e Fundação Renova. Contudo, antes da realização da audiência de instrução e julgamento, os autores requereram a desistência da ação (ID 68437074), alegando perda superveniente de interesse diante da abertura dos requerimentos do Programa de Indenização Definitivo da Fundação Renova, ao qual passaram a ter interesse em aderir. Pleitearam a extinção do feito sem resolução do mérito, afastando-se eventual imposição de custas. É o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO Diante da apresentação de contestações por todos os réus, entendo cabível a análise de mérito da demanda, inclusive no que tange à autora que requereu a desistência, ante a ausência de anuência das partes rés, nos termos do art. 485, § 4º, do CPC, dada a relevância do tema e a multiplicidade de ações similares. A presente ação foi proposta por MARIA RITA DOS SANTOS OLIVEIRA e DEIVID LAASS, com pedido de indenização por danos materiais e morais, em razão de alegados prejuízos decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, em 05/11/2015, sustentando-se na responsabilidade civil das rés e na decisão proferida nos autos da ação coletiva em trâmite na 12ª Vara Federal de Minas Gerais (sistema NOVEL). Os autores alegam terem sido pescadores informais afetados diretamente pela tragédia, o que justificaria sua reparação. Durante a fase de saneamento, foram fixados como pontos controvertidos (ID 40004511): (a) a responsabilidade civil das requeridas; (b) os supostos prejuízos sofridos pelos autores; (c) o impacto no sustento dos requerentes em virtude do desastre; (d) a existência de direito indenizatório fundado em decisão proferida pela Justiça Federal; e (e) a existência, extensão e nexo causal dos danos materiais e morais reclamados e seu respectivo quantum. II.1 - JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (CPC, art. 355, I) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a matéria for exclusivamente de direito ou, sendo de fato e de direito, os autos contiverem elementos suficientes para a formação do convencimento do juízo.Tal dispositivo prestigia os princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade da tutela jurisdicional, sem prejuízo ao contraditório. Ressalte-se que o magistrado, como destinatário final das provas, detém o poder-dever de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, mediante decisão fundamentada, conforme preconiza o art. 370, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido, o STJ firmou posição de que "cabe ao juiz verificar a necessidade de dilação probatória, considerando que é o destinatário final da prova, cujo objetivo é a formação de seu convencimento", conforme se verifica no precedente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO . DANOS MORAIS DECORRENTES DA FUMAÇA. MAGISTRADO COMO DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NEXO CAUSAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL NÃO VERIFICADO . PROVAS. REEXAME. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ . (...) O destinatário final da prova é o juiz, a quem cabe avaliar quanto sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 370 do CPC/2015. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que compete às instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa, cujo reexame é vedado em recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. (...) (STJ - AgInt no AREsp: 1504747 SP 2019/0139522-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 18/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2021) O Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a mesma diretriz. Em precedente da 4ª Câmara Cível, firmou-se que “não configura cerceamento de defesa o julgamento da lide sem a produção das provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e indeferir a produção probatória que considerar desnecessária à formação do seu convencimento” (TJES, Apelação Cível 0020606-22.2020.8.08.0011, Rel. Des. Luiz Guilherme Risso, j. 20/09/2024). Ainda, em caso análogo, decidiu-se que o indeferimento da prova oral é legítimo diante da “existência de documentação coligida aos autos, e dado o fato de que o magistrado é o destinatário das provas” (TJES, Apelação Cível 5001008-22.2021.8.08.0056, Rel. Des. Carlos Magno Moulin Lima, j. 23/09/2024). A jurisprudência dos tribunais estaduais é pacífica quanto à possibilidade de julgamento antecipado em ações indenizatórias relacionadas ao desastre ambiental de Mariana, especialmente quando a parte autora não apresenta elementos probatórios mínimos sobre os danos alegados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso semelhante envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho, decidiu que, “estando a matéria suficientemente esclarecida e não sendo possível que a prova, pelas circunstâncias do caso concreto, interfira no julgamento, tem-se como desnecessária a dilação probatória” (TJMG, Apelação Cível 5000391-19.2021.8.13.0090, Rel. Des. Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, j. 20/05/2024). Não obstante o pedido de desistência apresentado pela parte autora (ID 68437074), verifica-se que o feito já se encontrava saneado (ID 40004511), com delimitação dos pontos controvertidos, instrução deferida e elementos probatórios já suficientes para o julgamento do mérito, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. A desistência, apresentada em momento posterior à consolidação dos atos instrutórios relevantes e sem a devida homologação judicial, não produz efeitos automáticos, podendo ser desconsiderada quando houver prejuízo à boa-fé objetiva, à estabilidade processual ou quando o estado do processo indicar que o juiz já dispõe de elementos bastantes para prolação de sentença de mérito. No caso em exame, a prova documental constante nos autos revela ausência de elementos mínimos para a caracterização do exercício da atividade econômica alegada, bem como inexistência de comprovação dos danos materiais e morais apontados. Ademais, o pedido de desistência fundado em futura adesão a programa extrajudicial de reparação — cuja existência por si só não assegura direito subjetivo adquirido à indenização — não obsta o exame judicial do mérito já suficientemente instruído e apto ao julgamento antecipado. Diante disso, impõe-se a rejeição do pedido de desistência e o julgamento do mérito com base nos elementos constantes dos autos. II.2 – DO REGIME DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA AMBIENTAL A responsabilidade civil por danos ambientais, no ordenamento jurídico brasileiro, é de natureza objetiva, estando fundamentada na teoria do risco integral, conforme dispõe o §3º do art. 225 da Constituição Federal e o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 14 – [...] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.” Esse regime implica que, havendo comprovação do dano e do nexo causal com a atividade lesiva, é dispensável a demonstração de culpa, bastando a constatação da ocorrência do evento danoso e sua imputabilidade ao agente causador. Assim, qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que direta ou indiretamente contribua para a degradação ambiental, responde objetivamente pelos prejuízos resultantes de sua conduta. Por sua própria lógica protetiva e reparatória, a responsabilidade civil ambiental é também solidária e integral, recaindo sobre todos os que concorrem para o dano, independentemente do grau de participação. Ademais, a obrigação de reparar o meio ambiente é imprescritível no tocante à tutela difusa ambiental, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, cumpre ressaltar que, mesmo sob o regime da responsabilidade objetiva, não se dispensa a comprovação do dano efetivamente suportado e do nexo causal com o evento ambiental, nos termos do art. 373, I, do CPC. A aplicação da teoria do risco integral não implica presunção automática de dano moral individual em decorrência de um desastre ambiental, ainda que de grande extensão e notoriedade. Em outras palavras, ainda que se reconheça o ilícito ambiental e a responsabilização objetiva das rés no plano abstrato, a parte autora permanece incumbida de demonstrar concretamente como o evento impactou sua esfera individual, seja na dimensão patrimonial, seja na existencial, como condição para o deferimento de indenização. Esse entendimento é reforçado pela jurisprudência consolidada dos tribunais e pela doutrina especializada, sobretudo em relação às ações ajuizadas fora do sistema extrajudicial de reparação operado pela Fundação Renova ou dos programas simplificados instituídos por acordos coletivos e decisões proferidas em ações civis públicas. Nesses casos, exige-se do autor prova idônea e individualizada dos prejuízos alegados, sob pena de improcedência da demanda. A jurisprudência do TJES é clara nesse sentido: “A responsabilidade civil objetiva por dano ambiental exige a demonstração concreta do dano e do nexo causal, ainda que presumível o impacto ambiental.” (TJES, Apelação Cível 5003559-31.2023.8.08.0047, Rel. Des. Eliana Junqueira Munhos Ferreira, julgado em 18/12/2024). II.3 – DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA E DO NEXO CAUSAL Para o deferimento de indenização por danos materiais e morais decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, é imprescindível a demonstração de que a parte autora exercia, à época do desastre, atividade econômica impactada diretamente pelos efeitos do evento, bem como que haja nexo de causalidade entre o rompimento da barragem e os prejuízos efetivamente suportados. Ambos os requisitos, embora presumíveis em sua generalidade quando se trata de responsabilidade ambiental, devem ser individualmente demonstrados para a configuração do direito subjetivo à reparação, sobretudo em demandas indenizatórias propostas em sede judicial, sob pena de indevida generalização. No caso concreto, os autores alegaram que exerciam pesca de subsistência na região estuarina de Linhares/ES, afirmando terem sido diretamente impedidos de continuar desenvolvendo a atividade em virtude da contaminação das águas do rio Doce. Contudo, ao longo de toda a instrução processual, não foi apresentado qualquer documento contemporâneo ao evento danoso que comprove minimamente o exercício da pesca artesanal ou informal. Não há nos autos registro no RGP – Registro Geral da Atividade Pesqueira, tampouco protocolo de requerimento junto ao Ministério da Pesca. Também não foram apresentados documentos fiscais, recibos de comercialização de pescado, fotografias datadas, declarações emitidas por colônia de pescadores ou quaisquer outros meios de prova documental autônomos que evidenciem a atividade pesqueira. A alegação dos autores de que a pesca era informal e sem registro oficial não afasta a necessidade de demonstração objetiva da atividade, podendo esta ser feita por qualquer meio idôneo, desde que seja suficiente para firmar convicção do juízo – o que não se verifica na espécie. Assim, a ausência de comprovação da atividade econômica lesada inviabiliza o reconhecimento de qualquer pretensão de natureza indenizatória, nos termos do art. 373, I, do CPC. A jurisprudência do TJES é categórica ao afirmar que “a comprovação da condição de pescador é imprescindível para que o cidadão consiga, através de ação judicial, a justa reparação pelo dano sofrido” (TJES, Ap. Cív. nº 5005123-16.2021.8.08.0047, Rel. Des. ROBSON LUIZ ALBANEZ, julg. 21/09/2023). Nesse mesmo sentido, em caso semelhante, decidiu-se pela improcedência do pedido de indenização ante a ausência de documentos que demonstrassem o vínculo efetivo com a atividade pesqueira (TJES, Ap. Cív. nº 5002246-08.2021.8.08.0014, Rel. EWERTON SCHWAB PINTO JUNIOR, julg. 24/11/2022). Além da ausência de comprovação da atividade econômica, os autos tampouco evidenciam o nexo de causalidade entre o evento e qualquer prejuízo concreto experimentado pelos autores. O nexo causal é pressuposto indispensável da responsabilidade civil e deve ser demonstrado de forma clara, especialmente em ações individuais. A jurisprudência exige que se comprove que os prejuízos reclamados decorreram direta e imediatamente do evento danoso, sob pena de indeferimento do pedido. No caso, inexiste qualquer indício nos autos de que os autores tenham experimentado perda de renda, interrupção de exercício profissional, ou redução concreta de sua capacidade laboral em virtude do desastre ambiental. Conforme reforçado em precedente recente do TJES, “a desvinculação do apelante da qualidade de pescador informal [...] é corroborada pelas informações constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)” (TJES, Ap. Cív. nº 5005859-34.2021.8.08.0047, Rel. Des. SERGIO RICARDO DE SOUZA, julg. 22/02/2024). Ainda, o Tribunal reafirmou que “a ausência de comprovação pelo apelante de ser pescador não profissional esvazia a alegação de ofensa aos direitos da personalidade fundamentado em abalo psicológico sofrido”. Em outras palavras, a jurisprudência rechaça a presunção de dano individual com base apenas na magnitude do desastre coletivo, sendo necessário que a parte demonstre, com indícios mínimos, a existência de prejuízo concreto e sua relação direta com o evento. Dessa forma, não havendo nos autos prova da condição profissional alegada nem demonstração de que o rompimento da barragem tenha causado prejuízo material ou moral individual aos autores, impõe-se o reconhecimento da ausência de nexo causal e de fato constitutivo do direito, nos termos do art. 373, I, do CPC. Portanto, a improcedência da demanda é medida que se impõe, sendo juridicamente inviável presumir o exercício da atividade lesada e sua correlação com os danos alegados sem o suporte probatório mínimo exigido pela legislação e pela jurisprudência consolidada. II.4 – DOS DANOS MATERIAIS E MORAIS A parte autora requer a condenação das rés ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 94.585,00, valor este extraído da matriz de indenização fixada em decisão proferida pela 12ª Vara Federal de Minas Gerais, no bojo da Ação Ordinária nº 1024973-82.2020.4.01.3800 (sistema NOVEL), bem como a condenação ao pagamento de danos morais no importe de R$ 10.000,00 por autor, totalizando R$ 20.000,00, sob o fundamento de que, em razão do rompimento da barragem de Fundão, teriam sido impedidos de exercer sua atividade econômica de subsistência e injustamente excluídos dos programas reparatórios administrados pela Fundação Renova. Todavia, para que se reconheça o dever de indenizar, é necessário que estejam presentes os pressupostos cumulativos da responsabilidade civil: (i) conduta, (ii) dano, (iii) nexo de causalidade. A responsabilização objetiva por dano ambiental, nos termos do art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81, não dispensa a demonstração do dano concreto e do nexo com a atividade poluidora. Trata-se de responsabilidade objetiva quanto à culpa, mas não exime a parte autora do ônus de provar que sofreu efetivo prejuízo e que este decorre do evento danoso. No tocante aos danos materiais, a parte autora não logrou demonstrar qualquer perda econômica efetiva decorrente do desastre. A alegação de que auferia renda com pesca de subsistência, interrompida após a contaminação do rio Doce, não foi acompanhada de documentos capazes de comprovar essa fonte de renda, nem de demonstrar o impacto financeiro real sobre seu patrimônio. Não há qualquer nota fiscal, comprovante de venda, recibo informal, extrato bancário ou outro elemento probatório hábil que quantifique ou mesmo indique a existência de perda material. A jurisprudência é rigorosa ao exigir prova concreta para indenização por lucros cessantes ou perda da capacidade laborativa. Conforme entendimento reiterado do Superior Tribunal de Justiça, “a indenização por lucros cessantes não é admitida sem sua efetiva comprovação, devendo ser rejeitados os lucros presumidos ou hipotéticos, dissociados da realidade efetivamente comprovada” (STJ, AgInt no AREsp 1730936/SE, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 18/03/2021). No mesmo sentido, decidiu o TJES: “O apelante não se desincumbiu do seu ônus probatório, nos termos do art. 373, I, do CPC, o que impede a procedência da indenização vindicada” (TJES, Ap. Cív. nº 0006097-63.2019.8.08.0030, Rel.ª Des.ª JANETE VARGAS SIMÕES, julg. 28/03/2023). Quanto ao valor de R$ 94.585,00 indicado como base para a indenização, trata-se de parâmetro fixado exclusivamente para fins de acordo no âmbito do sistema extrajudicial NOVEL, o qual pressupõe o preenchimento de critérios objetivos e prazo de adesão, o que a parte autora reconhece não ter cumprido. Não há título judicial individual que assegure à parte o recebimento desse valor por via jurisdicional autônoma, tampouco decisão com eficácia erga omnes que o imponha como obrigação das rés em ações individuais. Portanto, não há título normativo ou fático a embasar a pretensão de recebimento do referido valor como dano material. No que se refere aos danos morais, a jurisprudência pátria é pacífica no sentido de que a sua configuração exige a violação direta aos direitos da personalidade da parte autora, não se presumindo de maneira genérica em razão da ocorrência do desastre ambiental. O dano moral indenizável pressupõe demonstração de sofrimento psíquico real, constrangimento, humilhação ou angústia com repercussões no plano existencial ou da dignidade, o que não se comprovou nos autos. Conforme entendimento reiterado do TJES, “a ausência de comprovação de circunstância concreta que demonstre abalo psicológico significativo e direto impede o reconhecimento do dano moral indenizável” (TJES, Ap. Cív. nº 0009102-59.2020.8.08.0030, Rel. Des. FERNANDO ESTEVAM BRAVIN RUY, julg. 12/12/2024). Ainda, decidiu-se que “a degradação ambiental do Rio Doce, ainda que notória, não implica automaticamente a caracterização de danos morais individuais a todos os residentes da região”, sendo necessário demonstrar o impacto direto e pessoal (TJES, Ap. Cív. nº 5007979-33.2023.8.08.0030, Rel. Des. ROBSON LUIZ ALBANEZ, julg. 07/04/2025). No presente caso, os autores não apresentaram qualquer indício de que sofreram constrangimento público, desequilíbrio emocional, abalo na honra ou na imagem, ou mesmo dano existencial em virtude da alegada restrição à pesca ou exclusão do programa de indenização. Os relatos são genéricos e desacompanhados de documentos, perícias, laudos psicológicos ou qualquer outro elemento de prova idôneo. Ademais, não se trata de ação coletiva voltada à reparação difusa ou coletiva de direitos transindividuais, mas sim de pedido de compensação individual, que exige prova individualizada do dano e de seus reflexos, o que não se verificou. Portanto, ausentes os requisitos essenciais da responsabilidade civil – especialmente o dano e o nexo de causalidade –, e não se desincumbindo a parte autora do ônus que lhe competia (CPC, art. 373, I), os pedidos de indenização por danos materiais e morais devem ser julgados improcedentes. II.5 – DA INEXISTÊNCIA DE DIREITO INDENIZATÓRIO COM BASE EM DECISÃO PROFERIDA PELA JUSTIÇA FEDERAL A parte autora fundamenta seu pedido indenizatório, em larga medida, na sentença proferida pela 12ª Vara Federal de Minas Gerais, nos autos da Ação Ordinária nº 1024973-82.2020.4.01.3800, que instituiu o sistema NOVEL de reparação extrajudicial para categorias informais de atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão. Com base nessa decisão, pleiteia o pagamento de R$ 94.585,00 por autor, valor que corresponde à quantia estipulada naquela matriz indenizatória para a categoria “pescador informal/artesanal/de fato”. Contudo, a argumentação da parte autora não se sustenta juridicamente. A sentença referida foi proferida em ação coletiva movida por Comissões de Atingidos, com efeitos limitados ao cumprimento de seus próprios termos, sem eficácia erga omnes ou ultra partes, nos moldes do art. 506 do CPC. Não se trata, portanto, de decisão com natureza normativa ou generalizante que obrigue o Poder Judiciário estadual a reconhecer, em ações individuais, o mesmo direito e o mesmo valor ali estabelecidos, sob pena de ofensa à segurança jurídica e à autonomia jurisdicional. Além disso, como reconhecido pela própria parte autora na petição inicial e em manifestações posteriores, os autores não figuraram entre os cadastrados no sistema NOVEL até o prazo limite de 30 de abril de 2020, estipulado pela própria sentença federal como requisito de elegibilidade. Trata-se de condição objetiva e insuscetível de flexibilização, cujo descumprimento exclui a pessoa do rol de beneficiários previstos. A decisão federal não cria, portanto, um direito automático e subjetivo à indenização, mas oferece um mecanismo opcional, extrajudicial e condicionado, que não vincula o juízo estadual a reproduzir seus efeitos em ações autônomas. Portanto, não há direito indenizatório subjetivo decorrente da sentença da 12ª Vara Federal, sendo inaplicável a utilização da matriz de valores do NOVEL como parâmetro de condenação judicial na presente demanda. A decisão referida tem caráter programático e delimitado às relações e condições ali pactuadas, de modo que não se presta como fonte autônoma de obrigação para o deferimento de valores fixos em sede de jurisdição estatal comum. Assim, conclui-se que a parte autora não possui direito indenizatório com base direta na decisão proferida pela Justiça Federal, seja por ausência de vinculação objetiva aos seus termos, seja por não preenchimento dos requisitos estabelecidos naquela instância. Consequentemente, o valor de R$ 94.585,00 pleiteado com fundamento exclusivo no sistema NOVEL não possui amparo legal ou fático que justifique sua imposição em sede de sentença judicial estadual autônoma, razão pela qual a pretensão deve ser rejeitada também sob este fundamento. II.6 – DO INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE DESISTÊNCIA A parte autora, após o saneamento do feito e a delimitação dos pontos controvertidos, protocolou petição requerendo a desistência da ação, sob o argumento de que teria optado por aderir ao Programa de Indenização Definitiva (PID) da Fundação Renova, e que tal adesão teria, supostamente, esvaziado o interesse processual quanto ao objeto da presente demanda (ID 68437074). Requereu, assim, a extinção do feito sem resolução do mérito, com arquivamento e afastamento de eventual exigência de custas. Entretanto, o pedido de desistência não deve ser acolhido. Embora o art. 485, VIII, do Código de Processo Civil disponha que o juiz julgará extinto o processo, sem resolução do mérito, quando o autor desistir da ação, essa desistência não opera efeitos automáticos. Nos termos do § 4º do mesmo dispositivo, “a desistência da ação só produzirá efeitos após homologação judicial”. Isso porque compete ao juiz zelar pela boa-fé processual, pela regularidade procedimental e pela proteção do interesse público na pacificação de controvérsias, especialmente quando o feito já se encontra apto ao julgamento. No caso dos autos, a desistência foi requerida após o saneamento do processo (ID 40004511), ocasião em que foram analisadas e rejeitadas todas as preliminares de mérito e de admissibilidade, fixados os pontos controvertidos e deferida a produção probatória necessária. Além disso, o juízo já havia proferido decisões de relevante densidade argumentativa e valor jurisdicional, como o deferimento de diligências junto ao INSS e CAGED, e a intimação para apresentação de rol de testemunhas, que inclusive foi cumprida pela parte autora (ID 40636139). Nessas circunstâncias, a jurisprudência admite que, por razões de economia processual e segurança jurídica, a desistência possa ser indeferida quando o feito estiver maduro para julgamento do mérito. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo, em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, já assentou que a desistência não pode ser utilizada como mecanismo estratégico para evitar um provável julgamento de improcedência, sobretudo quando o processo já se encontra em estágio avançado e com instrução suficiente para a prolação de sentença definitiva. Assim, o poder do autor de dispor da demanda encontra limites no interesse público da jurisdição e na efetividade da prestação jurisdicional. Ressalte-se, ainda, que a própria fundamentação do pedido de desistência – a futura adesão ao PID da Fundação Renova – não constitui fundamento jurídico suficiente para afastar o exercício da jurisdição estatal já instaurada, pois tal adesão depende de critérios e etapas ainda incertas, de modo que a eventual concessão da desistência geraria um risco concreto de frustração da tutela judicial e de repetição da litigância futura. Diante disso, por estar o feito amadurecido para julgamento e por se evidenciar a tentativa de abdicar da apreciação jurisdicional em momento processual já estabilizado e com acervo probatório suficiente, impõe-se o indeferimento do pedido de desistência, com fundamento nos princípios da boa-fé, da eficiência da jurisdição, da economia processual e da efetividade da tutela jurisdicional. Assim, rejeita-se o pedido de extinção do feito sem julgamento do mérito, prosseguindo-se na apreciação integral da lide. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por MARIA RITA DOS SANTOS OLIVEIRA e DEIVID LAASS em face de SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. e FUNDAÇÃO RENOVA. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC. Todavia, considerando que foi deferido o benefício da justiça gratuita (ID 11389090), fica a exigibilidade suspensa nos termos do art. 98, §3º, do CPC. Ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará à imposição da multa prevista pelo art. 1.026, § 2º do CPC. Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Linhares/ES, data registrada no sistema. Emília Coutinho Lourenço Juíza de Direito

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Silvana Gomes Dias x Bhp Billiton Brasil Ltda. e outros

ID: 276091306

Tribunal: TJES Órgão: Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5005739-71.2023.8.08.0030

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

SILVANA GOMES DIAS

Polo Passivo:

BHP BILLITON BRASIL LTDA. FUNDACAO RENOVA SAMARCO MINERACAO S.A. VALE S.A.

Sentença

Advogados:

EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

FERNANDO MOREIRA DRUMMOND TEIXEIRA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

RICARDO LOPES GODOY

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

CARLOS GOMES MAGALHAES JUNIOR

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5005739-71.2023.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: SILVANA GOMES DIAS REQUERIDO: FUNDACAO RENOVA, SAMARCO MINERACAO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. Advogado do(a) REQUERENTE: CARLOS GOMES MAGALHAES JUNIOR - ES14277 Advogados do(a) REQUERIDO: EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU - MG80702, IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogado do(a) REQUERIDO: IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogados do(a) REQUERIDO: CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO - ES12288, RICARDO LOPES GODOY - MG77167 Advogado do(a) REQUERIDO: RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES - ES8544 SENTENÇA I. RELATÓRIO SILVANA GOMES DIAS ajuizou a presente ação de indenização por danos morais e materiais em face de FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., alegando ter sido atingida pelos efeitos do rompimento da Barragem de Fundão, ocorrido em Mariana/MG, em novembro de 2015. Sustenta que, em razão do desastre, sofreu danos de ordem moral e material, em especial pela supressão de seu acesso a atividades recreativas em recursos hídricos da região e por suposta interrupção no fornecimento de água potável no município de Linhares/ES, o que lhe teria causado sofrimento psíquico, angústia e prejuízo à qualidade de vida. A autora fundamenta seu pedido na responsabilidade civil objetiva das rés, com base na teoria do risco integral (art. 927 do CC e art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81), e requereu a inversão do ônus da prova, com fundamento no CDC, alegando hipossuficiência. Postulou a condenação solidária das rés ao pagamento de R$ 70.520,00 por danos morais, sendo R$ 30.520,00 pela alegada privação de lazer e R$ 40.000,00 pela suposta falta de água potável. Requereu também a desconsideração da personalidade jurídica com base no art. 134, §2º do CPC. Juntou documentos pessoais, comprovantes de residência, planilha de danos e jurisprudência correlata (IDs 26218398 - 26219255) Despacho Inicial de Citação e Organização Processual (ID 26518542), no qual o juízo deferiu o pedido de justiça gratuita e determinou a citação das rés para apresentação de contestação no prazo legal. BHP BILLITON BRASIL LTDA. apresentou contestação (ID 27451250) na qual, em preliminar, requereu a suspensão do feito em razão da tramitação do IRDR nº 1.0273.16.000131-2/001 no TJMG. Alegou ilegitimidade passiva, por ser apenas acionista da SAMARCO, sem ingerência operacional, e sustentou que não pode ser responsabilizada solidariamente sem prova de confusão patrimonial (art. 50 do CC). Impugnou o deferimento da justiça gratuita, por ausência de comprovação de hipossuficiência. No mérito, defendeu a improcedência dos pedidos, por ausência de comprovação de dano e nexo causal, e por inexistência de adesão da autora aos programas extrajudiciais. Argumentou que não há prova documental e que seria indevida a aplicação da matriz do Sistema Indenizatório Simplificado. Ao final, requereu o indeferimento da inversão do ônus da prova, a condenação da autora aos ônus sucumbenciais, e, subsidiariamente, a limitação da indenização a R$ 1.000,00, conforme parâmetro do IRDR nº 040/2016 do TJES. VALE S.A. apresentou Contestação (ID 28975751), arguindo, em preliminar, a ausência de interesse de agir, sob o fundamento de que a autora pleiteia reparação individual para danos de natureza essencialmente coletiva. Alegou, ainda, sua ilegitimidade passiva, por não exercer ingerência sobre a gestão da SAMARCO. No mérito, negou qualquer responsabilidade civil, alegando ausência de nexo causal entre sua conduta e os danos supostamente experimentados pela autora. Asseverou que não há prova mínima de abalo psicológico, prejuízo material ou restrição de lazer, e que os fundamentos da inicial são genéricos. Contestou também a aplicação da responsabilidade objetiva e da teoria do risco integral ao caso concreto, invocando o regime jurídico da mineração, especialmente os arts. 225, §2º da CF/88 e 47, VIII do Código de Mineração. Requereu a extinção do processo sem julgamento do mérito ou, sucessivamente, a improcedência dos pedidos, com a autorização para produção de prova documental suplementar e testemunhal, além da condenação da autora aos ônus da sucumbência. FUNDAÇÃO RENOVA apresentou Contestação (ID 29676602), iniciando com a contextualização de sua criação institucional por força do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta – TTAC, firmado em 02/03/2016, com a finalidade de implementar programas de reparação. Alegou que a autora não se encontra entre os atingidos elegíveis, uma vez que realizou seu cadastro somente em 16/12/2021, fora do prazo fixado (30/04/2020) por decisão judicial e pelas comissões de atingidos. Em preliminar, apontou: (i) a inépcia do pedido de inversão do ônus da prova, por ausência de fundamentação concreta; e (ii) a ilegitimidade ativa da autora para pleitear reparação por dano ambiental de natureza difusa, hipótese que ensejaria extinção do feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC. No mérito, alegou que não há prova de qualquer dano moral ou material vinculado ao rompimento da barragem, e que não houve interrupção de abastecimento de água em Linhares/ES. Requereu, assim, a total improcedência dos pedidos. De forma subsidiária, caso fosse reconhecido algum direito à autora, pediu que a indenização fosse arbitrada em valor moderado, para evitar enriquecimento indevido. Impugnou a produção de prova testemunhal e solicitou a expedição de intimações exclusivamente em nome de seu patrono constituído, além da condenação da parte autora ao pagamento dos ônus sucumbenciais. SAMARCO MINERAÇÃO S.A. apresentou Contestação (ID 29757357), alegando, em preliminar, a inépcia da petição inicial, por ausência de causa de pedir clara e pela generalidade dos fatos narrados, o que inviabilizaria o exercício do contraditório. Sustentou, ainda, a ausência de documento essencial à propositura da ação, especialmente conta de água contemporânea aos fatos, conforme exigido no IRDR nº 040/2016. Alegou ilegitimidade ativa da autora para postular individualmente indenização por dano moral de natureza coletiva. No mérito, afirmou a inexistência de relação de consumo, defendendo a inaplicabilidade do CDC, da inversão do ônus da prova e da teoria do risco integral. Ressaltou que não houve desabastecimento de água em Linhares/ES e que a empresa adotou todas as medidas emergenciais após o desastre. Ao final, requereu a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, VI, do CPC) ou, sucessivamente, a improcedência do pedido, com a condenação da autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência. A autora apresentou Réplica à Contestação (ID 32803339), na qual impugnou todas as preliminares e argumentos de mérito das rés, reafirmando os fundamentos da inicial. Requereu a produção de prova oral, com oitiva de testemunhas e depoimento pessoal dos representantes das rés, além de audiência de instrução. Afastou a alegação de prescrição, com base na natureza contínua do dano ambiental, na interrupção por ações coletivas e na renúncia expressa das rés. Rejeitou a suspensão do feito por conta do IRDR nº 1.0273.16.000131-2/001, por não ter efeito vinculante nacional. Reafirmou a legitimidade das partes, a responsabilidade objetiva ambiental e a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica. No mérito, defendeu a aplicação da rough justice, citando a vulnerabilidade das vítimas e a notoriedade do desastre, sustentando a existência de dano com base em reportagens e estudos técnicos. Reiterou os pedidos e rebateu as teses de inexistência de dano e de nexo causal. O juízo proferiu Despacho de Especificação de Provas (ID 34401474), determinando a intimação das partes para especificação das provas, com justificação quanto à sua pertinência e utilidade, sob pena de renúncia tácita e julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355 do CPC. Advertiu que pedidos genéricos de prova seriam indeferidos de plano e que eventuais provas já indicadas deveriam ser expressamente ratificadas, sob pena de preclusão. VALE S.A. apresentou manifestação (ID 35566455), informando não ter interesse na produção de novas provas e pleiteando o julgamento antecipado da lide, por entender que os autos já demonstram sua ilegitimidade passiva e ausência de responsabilidade. BHP BILLITON BRASIL LTDA. também apresentou manifestação (ID 35350340), declarando que não pretende produzir novas provas e requerendo o julgamento antecipado com improcedência da demanda, com base no art. 355, I, do CPC, além da condenação da autora ao pagamento das custas e honorários, e requerimento de intimações exclusivamente em nome do advogado Carlos Fernando Siqueira Castro. SAMARCO MINERAÇÃO S.A. apresentou manifestação sobre o mérito (ID 34881566), reafirmando a inexistência de responsabilidade civil, sustentando que não houve desabastecimento de água em Linhares/ES, e que os alegados danos não passam de mero aborrecimento, sem comprovação suficiente. Defendeu também a falta de legitimidade da autora para pleitear indenização por dano ambiental coletivo. FUNDAÇÃO RENOVA apresentou petição (ID 34764563), manifestando desinteresse na produção de novas provas, por entender que os documentos já constantes dos autos são suficientes para o julgamento, reiterando os termos da contestação. No ID 34583856, a parte autora manifestou interesse na produção de prova oral, requerendo a oitiva de testemunhas e o depoimento pessoal dos representantes das rés, com o objetivo de demonstrar sua condição de atingida, os danos sofridos e a responsabilidade das rés pelo evento danoso. Requereu, ao final, o agendamento de audiência de instrução e julgamento para a adequada formação do convencimento judicial. O juízo proferiu Decisão de Saneamento e Organização do Processo (ID 40014916), na qual rejeitou todas as preliminares suscitadas pelas rés, incluindo ilegitimidade ativa, ilegitimidade para pleitear danos ambientais, ausência de interesse de agir, ilegitimidade passiva, inépcia da inicial, impugnação à justiça gratuita e prescrição. Declarou o feito saneado e fixou como pontos controvertidos: a responsabilidade das rés, a existência e extensão dos danos, o impacto econômico do desastre e eventual direito indenizatório com base em precedentes da Justiça Federal. Distribuiu o ônus da prova nos termos do art. 373 do CPC, atribuindo à autora a demonstração do fato constitutivo do direito. Determinou a produção de prova documental indireta, mediante ofício ao INSS para envio de extratos do CNIS e CAGED, com prazo de 15 dias para resposta. Intimou as partes para especificarem provas remanescentes, com advertência quanto à preclusão e à necessidade de fundamentação concreta. Em manifestações subsequentes à decisão de saneamento, BHP BILLITON BRASIL LTDA. (ID 47497237) ratificou integralmente sua manifestação anterior (ID 35350340), reiterando que não possui provas a produzir e pleiteando o julgamento antecipado. VALE S.A. (ID 47349267) reafirmou a inexistência de responsabilidade pelos fatos e sua ilegitimidade passiva, destacando jurisprudência favorável à sua exclusão do polo passivo em casos análogos. SAMARCO MINERAÇÃO S.A. (ID 46823842) opôs embargos de declaração contra a decisão de saneamento (ID 40014916), apontando erro material quanto à atribuição equivocada da tese de prescrição. Por sua vez, SILVANA GOMES DIAS (ID 46739112) reiterou o pedido de prova oral, com oitiva de testemunhas e depoimento dos representantes das rés, visando comprovar sua condição de atingida e os prejuízos alegados. Já a FUNDAÇÃO RENOVA (ID 46652541) declarou não ter interesse em nova produção probatória, entendendo que os elementos constantes dos autos são suficientes para o julgamento do mérito. No ID 47574826, Certidão de Juntada de Mandado/Ofício devolvido certifica que, em 29/07/2024, foi anexada aos autos a resposta do INSS ao ofício expedido com base na Decisão Saneadora (ID 40014916), visando à produção de prova documental indireta. O INSS remeteu documentos previdenciários de SILVANA GOMES DIAS, com o objetivo de verificar eventual atividade laborativa ou percepção de benefícios relacionados aos alegados prejuízos econômicos. Foram juntados: (i) extrato de benefícios (ID 47574829), indicando três auxílios por incapacidade temporária entre 2014 e 2019; (ii) extrato de vínculos empregatícios – CNIS (ID 47574830), com vínculos esporádicos e encerrados majoritariamente antes de 2015; (iii) extrato de remuneração detalhada (ID 47574834), com valores frequentemente inferiores ao salário mínimo e ausência de constância contributiva após 2015; (iv) histórico anual de rendimentos (ID 47574835), evidenciando a inexistência de atividade regular após o desastre; e (v) cadastro de dados pessoais (ID 47574837), confirmando a qualificação da autora e autenticidade dos registros. SILVANA GOMES DIAS apresentou Contrarrazões aos Embargos de Declaração (ID 62080997), defendendo a manutenção integral da Decisão Saneadora (ID 40014916). Alegou que os embargos opostos por SAMARCO MINERAÇÃO S.A. são infundados, pois não apontam qualquer omissão, obscuridade ou contradição, conforme exige o art. 1.022 do CPC. Argumentou que a decisão está devidamente motivada e que os embargos têm caráter protelatório, buscando reabrir discussão de mérito sob alegação indevida de vício. Requereu a rejeição dos embargos, com aplicação de multa por litigância de má-fé, nos termos do art. 1.026, §2º, do CPC. No ID 68045316, a autora apresentou Pedido de Suspensão do Processo, com base no Acordo de Repactuação celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo STF, que criou os programas indenizatórios PID e Agro-Pesca, alegando que sua classificação como “apta” no sistema das rés implica reconhecimento do dano e do direito à reparação. Requereu a suspensão da ação judicial até a conclusão do procedimento administrativo de pagamento, com a intimação de SAMARCO e FUNDAÇÃO RENOVA para apresentação do respectivo processo administrativo. Sustentou que a medida evitaria decisões conflitantes e duplicidade indenizatória, uma vez que o eventual pagamento administrativo resultaria na perda do objeto da demanda judicial. É o que havia a relatar. Passo a decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO II.1 - JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (CPC, art. 355, I) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a matéria for exclusivamente de direito ou, sendo de fato e de direito, os autos contiverem elementos suficientes para a formação do convencimento do juízo. Ressalte-se que o magistrado, como destinatário final das provas, detém o poder-dever de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, mediante decisão fundamentada, conforme preconiza o art. 370, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido, o STJ firmou posição de que "cabe ao juiz verificar a necessidade de dilação probatória, considerando que é o destinatário final da prova, cujo objetivo é a formação de seu convencimento", conforme se verifica no precedente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO . DANOS MORAIS DECORRENTES DA FUMAÇA. MAGISTRADO COMO DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NEXO CAUSAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL NÃO VERIFICADO . PROVAS. REEXAME. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ . (...) O destinatário final da prova é o juiz, a quem cabe avaliar quanto sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 370 do CPC/2015. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que compete às instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa, cujo reexame é vedado em recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. (...) (STJ - AgInt no AREsp: 1504747 SP 2019/0139522-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 18/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2021) O Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a mesma diretriz. Em precedente da 4ª Câmara Cível, firmou-se que “não configura cerceamento de defesa o julgamento da lide sem a produção das provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e indeferir a produção probatória que considerar desnecessária à formação do seu convencimento” (TJES, Apelação Cível 0020606-22.2020.8.08.0011, Rel. Des. Luiz Guilherme Risso, j. 20/09/2024). Ainda, em caso análogo, decidiu-se que o indeferimento da prova oral é legítimo diante da “existência de documentação coligida aos autos, e dado o fato de que o magistrado é o destinatário das provas” (TJES, Apelação Cível 5001008-22.2021.8.08.0056, Rel. Des. Carlos Magno Moulin Lima, j. 23/09/2024). A jurisprudência dos tribunais estaduais é pacífica quanto à possibilidade de julgamento antecipado em ações indenizatórias relacionadas ao desastre ambiental de Mariana, especialmente quando a parte autora não apresenta elementos probatórios mínimos sobre os danos alegados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso semelhante envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho, decidiu que, “estando a matéria suficientemente esclarecida e não sendo possível que a prova, pelas circunstâncias do caso concreto, interfira no julgamento, tem-se como desnecessária a dilação probatória” (TJMG, Apelação Cível 5000391-19.2021.8.13.0090, Rel. Des. Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, j. 20/05/2024). No caso em análise, SILVANA GOMES DIAS foi regularmente intimada a especificar as provas que pretendia produzir (ID 34401474), tendo se limitado a requerer a produção de prova oral (ID 34583856), sem apresentação de rol de testemunhas ou indicação concreta de diligência instrutória compatível com o ônus probatório que lhe incumbia (art. 373, I, CPC). Além disso, a autora posteriormente protocolou pedido de suspensão do feito (ID 68045316), sob alegação de estar apta aos programas extrajudiciais PID e Agro-Pesca, sem, contudo, apresentar documento de adesão, aceite ou proposta formal vinculativa. As rés, por sua vez, não reconheceram os fatos alegados e não trouxeram aos autos qualquer documentação administrativa que evidenciasse a aptidão ou eventual pagamento. Importa destacar que a própria decisão saneadora (ID 40014916) já havia advertido as partes quanto à necessidade de especificação fundamentada de provas, sob pena de preclusão. A autora não apresentou qualquer prova documental contemporânea ao desastre que permitisse, ainda que minimamente, aferir a veracidade das alegações de privação de lazer, desabastecimento hídrico ou dano à subsistência. A jurisprudência do TJES, em casos análogos ao presente, é pacífica ao entender que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente, exigindo-se, no mínimo, elementos documentais que indiquem de forma razoável a existência do exercício da atividade alegada e seu impacto efetivo pelo desastre ambiental. Nesse sentido, destaca-se o seguinte julgado paradigmático, aplicável ao caso concreto: APELAÇÃO CÍVEL. DESASTRE AMBIENTAL. BARRAGEM DE MARIANA/MG. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. RECURSO DESPROVIDO. (...) Apesar de ser incontestável o dano ambiental e os prejuízos causados aos pescadores e comerciantes que dependiam economicamente do exercício de sua atividade nas áreas afetadas, o ressarcimento pretendido pela apelante demanda escorreita comprovação de que exercia a atividade pesqueira à época do desastre ambiental e que teve a sua subsistência prejudicada por ele, a fim de justificar o recebimento de indenização a ser paga pela responsável pelo evento danoso. (...) A autora não apresentou provas suficientes para demonstrar o exercício da pesca comercial, tais como registros de embarcação, carteira de pescador profissional, recibos de comercialização ou declaração de associação de pescadores. Apenas relatos orais foram coligidos, sendo insuficientes para comprovar as alegações. (...) A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da autora impede o reconhecimento do direito à indenização. (TJES, Ap. Cív. 5003559-31.2023.8.08.0047, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Eliana Junqueira Munhos Ferreira, j. 18/12/2024) No presente caso, inexiste nos autos qualquer indício documental que sustente a condição de atingida pela autora. As alegações genéricas de danos não encontram respaldo mínimo, e a prova oral pretendida carece de lastro probatório prévio, revelando-se inócua para o deslinde da controvérsia. Dessa forma, diante da suficiência dos elementos constantes dos autos, da preclusão da produção de outras provas, da ausência de comprovação mínima dos fatos constitutivos do direito e da inutilidade da dilação probatória, impõe-se o julgamento antecipado do mérito, em conformidade com o art. 355, I, do CPC, sem que isso configure cerceamento de defesa, mas sim respeito aos princípios da celeridade, da efetividade da jurisdição e da racionalidade processual. II.2 - DO MÉRITO II.2.1 – DO REGIME DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA AMBIENTAL A responsabilidade civil por danos ambientais, no ordenamento jurídico brasileiro, é de natureza objetiva, estando fundamentada na teoria do risco integral, conforme dispõe o §3º do art. 225 da Constituição Federal e o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 14 – [...] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.” Esse regime implica que, havendo comprovação do dano e do nexo causal com a atividade lesiva, é dispensável a demonstração de culpa, bastando a constatação da ocorrência do evento danoso e sua imputabilidade ao agente causador. Assim, qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que direta ou indiretamente contribua para a degradação ambiental, responde objetivamente pelos prejuízos resultantes de sua conduta. Por sua própria lógica protetiva e reparatória, a responsabilidade civil ambiental é também solidária e integral, recaindo sobre todos os que concorrem para o dano, independentemente do grau de participação. Ademais, a obrigação de reparar o meio ambiente é imprescritível no tocante à tutela difusa ambiental, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, cumpre ressaltar que, mesmo sob o regime da responsabilidade objetiva, não se dispensa a comprovação do dano efetivamente suportado e do nexo causal com o evento ambiental, nos termos do art. 373, I, do CPC. A aplicação da teoria do risco integral não implica presunção automática de dano moral individual em decorrência de um desastre ambiental, ainda que de grande extensão e notoriedade. Em outras palavras, ainda que se reconheça o ilícito ambiental e a responsabilização objetiva das rés no plano abstrato, a parte autora permanece incumbida de demonstrar concretamente como o evento impactou sua esfera individual, seja na dimensão patrimonial, seja na existencial, como condição para o deferimento de indenização. Esse entendimento é reforçado pela jurisprudência consolidada dos tribunais e pela doutrina especializada, sobretudo em relação às ações ajuizadas fora do sistema extrajudicial de reparação operado pela Fundação Renova ou dos programas simplificados instituídos por acordos coletivos e decisões proferidas em ações civis públicas. Nesses casos, exige-se do autor prova idônea e individualizada dos prejuízos alegados, sob pena de improcedência da demanda. II.2.2 – DA INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS DANOS ALEGADOS Nos termos da Certidão de Juntada de Mandado/Ofício (ID 47574826), foi anexada aos autos, em 29/07/2024, a resposta do INSS ao ofício expedido com base na Decisão Saneadora (ID 40014916), visando à instrução do feito mediante prova documental indireta. A documentação previdenciária remetida teve por finalidade apurar eventual exercício de atividade laborativa por parte de SILVANA GOMES DIAS ou percepção de benefícios que pudessem demonstrar prejuízo econômico decorrente do desastre. Foram incluídos nos autos: (i) extrato de benefícios previdenciários (ID 47574829), indicando a concessão de três auxílios por incapacidade temporária entre 2014 e 2019, todos cessados; (ii) extrato de vínculos empregatícios (CNIS) (ID 47574830), demonstrando vínculos esparsos e breves, majoritariamente encerrados antes do rompimento da barragem; (iii) extrato de remuneração detalhada (ID 47574834), revelando rendimentos frequentemente inferiores ao salário mínimo e ausência de regularidade contributiva após 2015; (iv) histórico anual de rendimentos (ID 47574835), que confirma a inexistência de atividade econômica formal contínua; e (v) cadastro de dados pessoais (ID 47574837), confirmando a titularidade e qualificação da autora. O conjunto probatório demonstra, de forma inequívoca, que SILVANA GOMES DIAS não manteve atividade econômica formal ou autônoma compatível com os danos materiais alegados, tampouco há indícios de perda de renda ou de impacto em fonte de subsistência. Igualmente, não foi apresentada qualquer prova documental contemporânea ao desastre (novembro de 2015) que comprove privação de lazer, desabastecimento de água, dano à saúde ou comprometimento à qualidade de vida. A autora não acostou aos autos laudos médicos, relatórios técnicos, contas de água, registros de consumo, boletins sanitários, declarações de associações comunitárias ou documentação comprobatória de vínculo com atividade pesqueira, agrícola ou comercial relacionada ao Rio Doce ou à represa de Linhares/ES. As alegações de privação de lazer aquático são genéricas e desprovidas de comprovação, não havendo qualquer demonstração de frequência regular a áreas impactadas ou impedimento concreto à prática de atividades recreativas. Ademais, a jurisprudência consolidada do TJES afasta a possibilidade de reconhecimento automático de danos morais em casos de degradação ambiental difusa, sem prova específica de violação aos direitos da personalidade. A título exemplificativo: "A degradação ambiental do Rio Doce, ainda que notória, não implica automaticamente a caracterização de danos morais individuais a todos os residentes da região. Cabe à parte autora o ônus de comprovar o dano alegado, não se admitindo presunção genérica de sofrimento moral." (TJES, Ap. Cív. 5007979-33.2023.8.08.0030, Rel. Des. Robson Luiz Albanez, j. 07/04/2025). "A indenização por danos morais pressupõe a comprovação da ofensa aos direitos da personalidade individual do apelante, não podendo se basear em danos sofridos pela coletividade." (TJES, Ap. Cív. 0006097-63.2019.8.08.0030, Rel. Des. Janete Vargas Simões, j. 28/03/2023). Os documentos dos autos tampouco demonstram que Linhares/ES tenha sofrido desabastecimento de água potável diretamente decorrente do rompimento da barragem, como apontam relatórios técnicos acostados em outros feitos e jurisprudência consolidada. O simples fato de residir no município não permite presumir o dano. Por fim, a pretensão de produção de prova exclusivamente oral, sem respaldo em qualquer documentação prévia, não é suficiente para suprir a ausência de prova mínima dos fatos constitutivos do direito, conforme reiteradamente decidido pelo Tribunal de Justiça capixaba: "A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da autora impede o reconhecimento do direito à indenização." (TJES, Ap. Cív. 5003559-31.2023.8.08.0047, Rel. Des. Eliana Junqueira Munhos Ferreira, j. 18/12/2024). Portanto, diante da ausência de comprovação documental mínima, da fragilidade das alegações autorais e da inadequação da prova oral pretendida para suprir tal lacuna, impõe-se o reconhecimento da inexistência de danos morais ou materiais indenizáveis, inviabilizando a procedência da pretensão indenizatória. II.2.3 – DO NÃO ACOLHIMENTO DO PEDIDO DE SUSPENSÃO DO FEITO EM RAZÃO DA ALEGAÇÃO DE HABILITAÇÃO EM PROGRAMAS ADMINISTRATIVOS SILVANA GOMES DIAS, por meio da petição de ID 68045316, requereu a suspensão do presente feito, alegando que, após consulta ao portal eletrônico mantido pela FUNDAÇÃO RENOVA e SAMARCO MINERAÇÃO S.A., foi classificada como “APTA” a participar dos programas indenizatórios PID (Programa Indenizatório Definitivo) e Agro-Pesca, instituídos pelo Acordo de Repactuação celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo Supremo Tribunal Federal. Sustentou que tal aptidão implicaria o reconhecimento da condição de atingida, o que tornaria incontroverso o direito à indenização, razão pela qual requereu a suspensão do processo judicial, com a intimação das rés, especialmente da Fundação Renova e da Samarco, para que apresentem cópia do respectivo processo administrativo, a fim de evitar possível duplicidade indenizatória e decisões conflitantes. O pedido, contudo, não comporta acolhimento. Primeiramente, observa-se que a parte autora não apresentou qualquer documento oficial ou certidão emitida pelas rés ou pela Fundação Renova que comprove a existência de proposta de adesão, aceite, pagamento realizado ou encerramento do processo administrativo. Limitou-se a afirmar, de forma unilateral, a existência de aptidão com base em consulta pública realizada no ambiente eletrônico da Fundação, sem qualquer elemento formal que permita verificar a real existência ou o estágio de tramitação do procedimento administrativo. Tal consulta, ainda que indique aptidão prévia, não tem o condão de substituir a prova documental formal, nem se reveste de caráter vinculativo perante o Judiciário, sobretudo quando desacompanhada do processo administrativo completo ou de recibo de adesão formalizada e aceita. A jurisprudência do TJES e do STJ é firme no sentido de que a mera existência de programas extrajudiciais ou a participação em plataforma de cadastro não têm efeito vinculativo perante o juízo cível, sendo indispensável a comprovação de que o requerente efetivamente aderiu ao programa e recebeu o pagamento correspondente à reparação integral do dano alegado, o que não ocorreu no presente caso. Ademais, o art. 313, II, do CPC, que prevê a possibilidade de suspensão do processo em razão de fato superveniente, exige a demonstração objetiva da prejudicialidade ou da ocorrência de evento que torne temporariamente impossível o regular prosseguimento da ação. A mera alegação de possível aptidão em programa extrajudicial, sem a formalização do aceite ou do pagamento, não configura hipótese jurídica suficiente para a suspensão do feito. A autora também pleiteia a intimação das rés para apresentação do procedimento administrativo completo, contudo, tal requerimento não pode ser acolhido como fundamento autônomo para suspensão, tampouco se sobrepõe ao seu ônus probatório, conforme o art. 373, inciso I, do CPC. Compete à parte autora instruir a demanda com os documentos necessários à demonstração dos fatos constitutivos do direito postulado, não podendo transferir tal encargo à parte adversa nem ao Poder Judiciário. Por todo o exposto, não se verifica fato novo, incontroverso ou impeditivo do regular andamento do feito, razão pela qual deve ser rejeitado o pedido de suspensão formulado por SILVANA GOMES DIAS, permanecendo hígida a tramitação do processo até seu julgamento definitivo. II.2.4 – DA IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS Diante de todo o exposto, não restando comprovado de forma idônea e suficiente o exercício de atividade econômica impactada, tampouco o alegado desabastecimento de água potável ou a privação concreta de lazer aquático, e ausente qualquer prova documental contemporânea ou específica de dano material ou moral, impõe-se a improcedência integral dos pedidos, por inexistência de comprovação dos fatos constitutivos do direito da parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC. A parte autora não apresentou qualquer documento capaz de individualizar os prejuízos alegadamente sofridos, limitando-se a narrativas genéricas dissociadas de suporte probatório mínimo, o que inviabiliza a responsabilização das rés, ainda que objetiva, conforme entendimento consolidado nos Tribunais. De igual modo, afasta-se o pedido de inversão do ônus da prova, pois não restaram demonstrados os requisitos legais previstos no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, notadamente a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência técnica da autora, em grau suficiente para justificar a redistribuição da carga probatória. Também não há que se falar em reconhecimento automático de responsabilidade solidária das acionistas da SAMARCO (VALE S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA.), uma vez que a ausência de comprovação de danos concretos e individualizados à parte autora impede o exame da extensão subjetiva da responsabilidade, tornando-se desnecessário qualquer aprofundamento nesse ponto. Por fim, é oportuno destacar que a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Espírito Santo tem reiteradamente afastado o reconhecimento de dano moral com base em alegações genéricas de privação do uso do Rio Doce para lazer, quando desprovidas de comprovação objetiva e individualizada de abalo à esfera íntima da parte autora. Destacam-se os seguintes precedentes ilustrativos: “A mera impossibilidade de usufruir do Rio Doce para pesca e lazer, sem comprovação de prejuízo individual concreto, não configura dano moral indenizável. O dano moral indenizável exige a violação de direitos de personalidade ou sofrimento intenso e profundo, não sendo suficiente a degradação ambiental de uso coletivo para sua caracterização.” (TJES, Ap. Cív. 5007979-33.2023.8.08.0030, Rel. Des. Robson Luiz Albanez, j. 07/04/2025) “Alegações genéricas sobre uso de áreas afetadas para lazer, sem prova específica, não configuram dano moral.” (TJES, Ap. Cív. 5012678-04.2022.8.08.0030, Rel. Des. Arthur José Neiva de Almeida, j. 13/02/2025) “O pedido de compensação por danos morais foi atrelado à impossibilidade de usufruir do meio ambiente para lazer. No entanto, alegações genéricas, sem a indicação de consequências objetivas e individualizadas, não justificam reparação por danos morais.” (TJES, Ap. Cív. 5001631-45.2023.8.08.0047, Rel. Des. Fabio Clem de Oliveira, j. 06/11/2024) Esses entendimentos reforçam a linha exauriente da presente fundamentação, corroborando a necessidade de julgamento de improcedência dos pedidos, pela ausência de demonstração de dano moral individualizado e de nexo causal específico com os fatos narrados. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por SILVANA GOMES DIAS em face de FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., por ausência de comprovação dos fatos constitutivos do direito alegado, nos termos do art. 373, inciso I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil, observada a suspensão da exigibilidade, em razão da gratuidade da justiça deferida, conforme artigo 98, § 3º, do mesmo diploma legal. Advirto que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com intuito meramente infringente poderá ensejar a aplicação da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil. Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Linhares/ES, data registrada no sistema. Emília Coutinho Lourenço Juíza de Direito

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Alessandra Rufino Conti e outros x Bhp Billiton Brasil Ltda. e outros

ID: 280170049

Tribunal: TJES Órgão: Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5003212-49.2023.8.08.0030

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

ALESSANDRA RUFINO CONTI L. R.

Polo Passivo:

BHP BILLITON BRASIL LTDA. FUNDACAO RENOVA SAMARCO MINERACAO S.A. VALE S.A.

Sentença

Advogados:

EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

RICARDO LOPES GODOY

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

CARLOS GOMES MAGALHAES JUNIOR

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

VITOR PALHEIROS VIANA

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5003212-49.2023.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: ALESSANDRA RUFINO CONTI, L. R. REQUERIDO: FUNDACAO RENOVA, VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA., SAMARCO MINERACAO S.A. Advogados do(a) REQUERENTE: CARLOS GOMES MAGALHAES JUNIOR - ES14277, VITOR PALHEIROS VIANA - ES32005 Advogados do(a) REQUERIDO: EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU - MG80702, IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogados do(a) REQUERIDO: CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO - ES12288, RICARDO LOPES GODOY - MG77167 Advogado do(a) REQUERIDO: IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogado do(a) REQUERIDO: RICARDO BERMUDES MEDINA GUIMARAES - ES8544 SENTENÇA I - RELATÓRIO ALESSANDRA RUFINO CONTI e L. R., representado por sua genitora, propôs a presente indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes em face de SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. e FUNDAÇÃO RENOVA, alegando que foi atingida pelo rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015 no município de Mariana/MG, fato este que causou impactos diretos à sua qualidade de vida, meio ambiente e à integridade psicossocial de sua família. Na petição inicial (ID 23279324), sustentam que a autora exercia atividade de pescadora de fato e, desde o desastre, encontra-se impedida de pescar e de usufruir das águas e paisagens do Rio Doce, sofrendo prejuízos econômicos, ambientais e sociais. Alegam ainda privação de lazer, desabastecimento de água em Linhares/ES e exclusão indevida dos programas de reparação administrados pela Fundação Renova. Requerem indenização total de R$ 264.538,80, reconhecimento da responsabilidade solidária das rés, justiça gratuita, inversão do ônus da prova e condenação ao pagamento de danos materiais e morais com base na responsabilidade objetiva ambiental e jurisprudência do STJ, instruindo a inicial com os documentos de IDs 23279350 - 23279822. BHP BILLITON BRASIL LTDA. (ID 25002001) sustenta, preliminarmente, a impugnação ao pedido de justiça gratuita, alegando ausência de comprovação da hipossuficiência financeira da parte autora, e requer o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva, argumentando que é apenas acionista da Samarco e não exerceu qualquer ingerência nas operações da barragem de Fundão. Alega também a ilegitimidade ativa da autora por falta de comprovação de residência em Linhares à época dos fatos e de vínculo com atividade pesqueira. No mérito, defende que os danos alegados são de natureza individual e não configuram responsabilidade ambiental solidária, requerendo, por fim, a extinção do processo sem resolução do mérito ou a improcedência total dos pedidos por ausência de prova do dano e do nexo causal. VALE S.A. (ID 30176915) sustenta sua ilegitimidade passiva, alegando que não operava a barragem de Fundão e não possui responsabilidade direta ou indireta pelos danos alegados, pois a SAMARCO, embora sua coligada, é pessoa jurídica autônoma, responsável exclusiva pela gestão da barragem rompida. A empresa também impugna a legitimidade ativa dos autores, afirmando que não comprovaram residência em área atingida nem vínculo com atividade pesqueira à época do desastre. Quanto ao mérito, defende que a adesão ao sistema indenizatório simplificado instituído pela 12ª Vara Federal de Belo Horizonte é facultativa e não impõe responsabilidade automática às rés fora de seus critérios. Argumenta, ainda, que eventual responsabilização da acionista por dano ambiental seria, no máximo, subsidiária, e condicionada à comprovação da insolvência da operadora (SAMARCO), o que não se verifica. Reforça a inaplicabilidade da teoria do risco integral, por tratar-se de dano moral individual, exigindo prova de nexo causal e conduta culposa, elementos ausentes no caso concreto. Ao final, requer a exclusão da VALE do polo passivo ou, subsidiariamente, a total improcedência dos pedidos. SAMARCO MINERAÇÃO S.A. (ID 31050283), alega preliminarmente sua ilegitimidade passiva, sustentando que não possui competência para definir critérios indenizatórios nem gerenciar programas de reparação, responsabilidade atribuída exclusivamente à Fundação Renova, conforme previsto no Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC). Argumenta também que a inicial é inepta, por não conter exposição clara dos fatos e por ausência de prova mínima quanto à condição da autora como pescadora ou quanto a eventuais prejuízos decorrentes do desastre. Sustenta ainda que o menor impúbere L. R. não tem legitimidade ativa para postular danos morais por fatos que teriam atingido apenas sua representante legal, além de apontar que não há comprovação de vínculo contratual com o serviço de abastecimento de água (SAAE) ou residência em área afetada à época. Por fim, afirma que a autora não possui licença para atividade de pesca, tampouco comprova prejuízo concreto, sendo incabível a indenização pleiteada sem demonstração de dano direto, pessoal e atual. Requer, assim, a extinção do processo sem resolução de mérito por ilegitimidade e inépcia da inicial, ou, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos. FUNDAÇÃO RENOVA (ID 40853184) suscita as preliminares de inépcia da inicial por ausência de documentos essenciais e de ilegitimidade ativa, alegando que os autores não comprovaram residência na área afetada à época do desastre, tampouco vínculo com a atividade pesqueira ou prejuízo decorrente de desabastecimento de água. No mérito, sustenta que a responsabilidade da Fundação é subjetiva, por se tratar de ente sem fins lucrativos, instituído exclusivamente para operacionalizar medidas de reparação determinadas judicialmente, sem prática de atividade poluidora. Afirma ainda que a parte autora não está cadastrada nos programas da Fundação Renova e que os documentos juntados — como autodeclaração sem firma reconhecida e fotos genéricas — são insuficientes para comprovar a atividade de pesca ou o nexo causal dos supostos danos. Alega inexistência de prova sobre lucros cessantes e danos morais, apontando que o município de Linhares não sofreu desabastecimento de água e que não há comprovação de privação de lazer ou convívio social. Requer a improcedência total dos pedidos, o indeferimento da inversão do ônus da prova e, subsidiariamente, que eventual indenização por dano moral seja fixada com moderação e observância da razoabilidade e proporcionalidade. Na réplica, os autores impugnam todas as preliminares e argumentos das contestações, reafirmando a legitimidade ativa e passiva das partes, a suficiência da causa de pedir e a presença de elementos mínimos para instrução da ação. Sustentam que a responsabilidade das rés é objetiva e solidária, com base na teoria do risco integral e no conceito ampliado de poluidor, aplicável inclusive às acionistas (VALE e BHP) da Samarco. Defendem a aplicabilidade da desconsideração da personalidade jurídica desde a petição inicial e destacam o contexto de informalidade e vulnerabilidade social como justificativa para a ausência de documentos formais. Rebatem a tese de ilegitimidade ativa em razão da ausência de contrato com o serviço de abastecimento de água, alegando que basta a residência na área atingida, e reiteram que o dano moral prescinde de demonstração documental direta, podendo ser comprovado por outros meios. Citam jurisprudência do TJES e do STJ em apoio à tese de que a condição de pescador de fato é juridicamente reconhecível sem registro oficial. Pleiteiam a realização de audiência de instrução e julgamento para produção de prova oral, reiterando o pedido de condenação das rés à reparação pelos danos sofridos. Na decisão saneadora proferida sob o ID 55729091, o juízo rejeitou todas as preliminares levantadas pelas rés SAMARCO, VALE, BHP e FUNDAÇÃO RENOVA, incluindo as alegações de ilegitimidade passiva, inépcia da inicial e impugnação à justiça gratuita. Reconheceu a responsabilidade solidária das rés com fundamento na jurisprudência do STJ e na legislação ambiental (Lei 6.938/81 e CF/88), bem como a pertinência subjetiva das acionistas VALE e BHP por sua participação na gestão da barragem e constituição da Fundação Renova. Fixou os pontos controvertidos da demanda: (a) a comprovação dos danos materiais e morais alegados; (b) o nexo causal entre os danos e o rompimento da barragem; (c) a responsabilidade solidária ou subsidiária das rés; (d) eventual inadequação ou exclusão indevida dos autores do sistema indenizatório; e (e) a razoabilidade dos valores pleiteados. Estabeleceu a distribuição estática do ônus da prova, incumbindo à parte autora demonstrar sua condição de impactada, os danos sofridos e o nexo causal, e às rés, a inexistência de tais danos, bem como a adequação das medidas reparatórias adotadas. Determinou a intimação das partes para indicação objetiva das provas a serem produzidas, facultando o requerimento de audiência de instrução e julgamento, com abertura de vista ao Ministério Público nos termos do art. 178, II, do CPC. No pedido protocolado sob o ID 68041137, a parte autora requer a suspensão do processo judicial com fundamento na sua elegibilidade confirmada nos programas indenizatórios PID e Agro-Pesca, criados a partir do acordo de repactuação celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo STF, entre entes públicos e as rés SAMARCO, VALE, BHP e FUNDAÇÃO RENOVA. Sustenta que a aptidão verificada no portal da Renova/Samarco representa o reconhecimento de que foi atingida pelo desastre de Mariana e, portanto, de que faz jus à indenização, tornando incontroversa essa condição. Argumenta que, com base nesse reconhecimento administrativo, seria prudente suspender o feito judicial para evitar decisões conflitantes e insegurança jurídica. Requer, ainda, a intimação da SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e da FUNDAÇÃO RENOVA para apresentação do processo administrativo completo referente à autora e, caso ocorra o pagamento indenizatório na via extrajudicial, que se promova a baixa do processo judicial. É o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO II.1 - JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (CPC, art. 355, I) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a matéria for exclusivamente de direito ou, sendo de fato e de direito, os autos contiverem elementos suficientes para a formação do convencimento do juízo.Tal dispositivo prestigia os princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade da tutela jurisdicional, sem prejuízo ao contraditório. Ressalte-se que o magistrado, como destinatário final das provas, detém o poder-dever de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, mediante decisão fundamentada, conforme preconiza o art. 370, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido, o STJ firmou posição de que "cabe ao juiz verificar a necessidade de dilação probatória, considerando que é o destinatário final da prova, cujo objetivo é a formação de seu convencimento", conforme se verifica no precedente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO . DANOS MORAIS DECORRENTES DA FUMAÇA. MAGISTRADO COMO DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NEXO CAUSAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL NÃO VERIFICADO . PROVAS. REEXAME. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ . (...) O destinatário final da prova é o juiz, a quem cabe avaliar quanto sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 370 do CPC/2015. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que compete às instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa, cujo reexame é vedado em recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. (...) (STJ - AgInt no AREsp: 1504747 SP 2019/0139522-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 18/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2021) O Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a mesma diretriz. Em precedente da 4ª Câmara Cível, firmou-se que “não configura cerceamento de defesa o julgamento da lide sem a produção das provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e indeferir a produção probatória que considerar desnecessária à formação do seu convencimento” (TJES, Apelação Cível 0020606-22.2020.8.08.0011, Rel. Des. Luiz Guilherme Risso, j. 20/09/2024). Ainda, em caso análogo, decidiu-se que o indeferimento da prova oral é legítimo diante da “existência de documentação coligida aos autos, e dado o fato de que o magistrado é o destinatário das provas” (TJES, Apelação Cível 5001008-22.2021.8.08.0056, Rel. Des. Carlos Magno Moulin Lima, j. 23/09/2024). A jurisprudência dos tribunais estaduais é pacífica quanto à possibilidade de julgamento antecipado em ações indenizatórias relacionadas ao desastre ambiental de Mariana, especialmente quando a parte autora não apresenta elementos probatórios mínimos sobre os danos alegados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso semelhante envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho, decidiu que, “estando a matéria suficientemente esclarecida e não sendo possível que a prova, pelas circunstâncias do caso concreto, interfira no julgamento, tem-se como desnecessária a dilação probatória” (TJMG, Apelação Cível 5000391-19.2021.8.13.0090, Rel. Des. Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, j. 20/05/2024). No presente feito, após a prolação da decisão de saneamento (ID 55729091), que delimitou claramente os pontos controvertidos e distribuiu o ônus da prova nos moldes do art. 373 do CPC, a parte autora permaneceu inerte quanto à especificação de provas. Em vez de indicar provas úteis à demonstração dos fatos constitutivos de seu direito, limitou-se a protocolar pedido de suspensão do processo (ID 68041137), sob a alegação de estar "apta" aos programas extrajudiciais de indenização (PID e Agro-Pesca). Na presente ação, não há nos autos documentos contemporâneos ao desastre que demonstrem, ainda que indiciariamente, que ALESSANDRA RUFINO CONTI exercia atividade pesqueira ou qualquer outra atividade econômica impactada. Tampouco há prova de privação de água potável, dano à saúde, abalo moral concreto ou comprometimento das condições de lazer. As provas apresentadas se limitam a autodeclarações unilaterais e documentos genéricos, sem qualquer vínculo com os autores ou com a realidade local à época dos fatos. A simples alegação de que consta como “apta” em sistema eletrônico de consulta da Fundação Renova não supre a ausência de provas materiais nos autos, tampouco gera presunção legal de dano. Como já decidido por esta Corte em casos similares, a prova oral, desacompanhada de qualquer suporte documental prévio, é insuficiente para comprovar exercício de atividade econômica e o consequente prejuízo. Nesse sentido, destaca-se o seguinte julgado paradigmático, aplicável ao caso concreto: APELAÇÃO CÍVEL. DESASTRE AMBIENTAL. BARRAGEM DE MARIANA/MG. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. RECURSO DESPROVIDO. (...) Apesar de ser incontestável o dano ambiental e os prejuízos causados aos pescadores e comerciantes que dependiam economicamente do exercício de sua atividade nas áreas afetadas, o ressarcimento pretendido pela apelante demanda escorreita comprovação de que exercia a atividade pesqueira à época do desastre ambiental e que teve a sua subsistência prejudicada por ele, a fim de justificar o recebimento de indenização a ser paga pela responsável pelo evento danoso. (...) A autora não apresentou provas suficientes para demonstrar o exercício da pesca comercial, tais como registros de embarcação, carteira de pescador profissional, recibos de comercialização ou declaração de associação de pescadores. Apenas relatos orais foram coligidos, sendo insuficientes para comprovar as alegações. (...) A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da autora impede o reconhecimento do direito à indenização. (TJES, Ap. Cív. 5003559-31.2023.8.08.0047, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Eliana Junqueira Munhos Ferreira, j. 18/12/2024) Importante destacar que não houve requerimento formal de produção de prova oral após o saneador. A ausência de rol de testemunhas e de fundamentação concreta quanto à utilidade da instrução revela a preclusão lógica da fase probatória, por escolha e inércia da própria parte autora. Portanto, diante da suficiência dos elementos constantes dos autos, da inércia da parte autora quanto à especificação efetiva de provas e da ausência de substrato mínimo para permitir o prosseguimento da instrução, impõe-se o julgamento antecipado do mérito, sem que tal decisão configure cerceamento de defesa ou violação ao contraditório, em conformidade com o art. 355, inciso I, do CPC e em respeito aos princípios da celeridade, economia e efetividade da jurisdição. II.2 - DO MÉRITO A presente lide versa sobre pretensão de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes, ajuizada por supostos atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão, ocorrido em 2015. A controvérsia principal reside na verificação da condição de atingido da parte autora e na consequente existência de responsabilidade civil das rés, com base na alegada interrupção de atividade pesqueira informal, privação de lazer, desabastecimento de água potável e exclusão indevida dos programas de reparação. Consoante decisão saneadora (ID 55729091), foi adotada a distribuição estática do ônus da prova, cabendo à parte autora demonstrar os seguintes elementos: a) condição de impactada pelo rompimento; b) existência de danos materiais, morais e/ou lucros cessantes; c) nexo de causalidade entre os danos e o evento danoso. Às rés compete a demonstração da inexistência de nexo causal, da regularidade das ações mitigadoras, e, se alegada, da adequação do sistema de reparação extrajudicial. II.2.1 – DO REGIME DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA AMBIENTAL A responsabilidade civil por danos ambientais, no ordenamento jurídico brasileiro, é de natureza objetiva, estando fundamentada na teoria do risco integral, conforme dispõe o §3º do art. 225 da Constituição Federal e o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 14 – [...] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.” Esse regime implica que, havendo comprovação do dano e do nexo causal com a atividade lesiva, é dispensável a demonstração de culpa, bastando a constatação da ocorrência do evento danoso e sua imputabilidade ao agente causador. Assim, qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que direta ou indiretamente contribua para a degradação ambiental, responde objetivamente pelos prejuízos resultantes de sua conduta. Por sua própria lógica protetiva e reparatória, a responsabilidade civil ambiental é também solidária e integral, recaindo sobre todos os que concorrem para o dano, independentemente do grau de participação. Ademais, a obrigação de reparar o meio ambiente é imprescritível no tocante à tutela difusa ambiental, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, cumpre ressaltar que, mesmo sob o regime da responsabilidade objetiva, não se dispensa a comprovação do dano efetivamente suportado e do nexo causal com o evento ambiental, nos termos do art. 373, I, do CPC. A aplicação da teoria do risco integral não implica presunção automática de dano moral individual em decorrência de um desastre ambiental, ainda que de grande extensão e notoriedade. Em outras palavras, ainda que se reconheça o ilícito ambiental e a responsabilização objetiva das rés no plano abstrato, a parte autora permanece incumbida de demonstrar concretamente como o evento impactou sua esfera individual, seja na dimensão patrimonial, seja na existencial, como condição para o deferimento de indenização. Esse entendimento é reforçado pela jurisprudência consolidada dos tribunais e pela doutrina especializada, sobretudo em relação às ações ajuizadas fora do sistema extrajudicial de reparação operado pela Fundação Renova ou dos programas simplificados instituídos por acordos coletivos e decisões proferidas em ações civis públicas. Nesses casos, exige-se do autor prova idônea e individualizada dos prejuízos alegados, sob pena de improcedência da demanda. II.2.2 – DA CONDIÇÃO DE ATINGIDA E DA AUSÊNCIA DE PROVA DOS DANOS A parte autora, ALESSANDRA RUFINO CONTI, alega que exercia a função de pescadora artesanal de fato e que, em decorrência do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015, perdeu sua fonte de sustento, foi privada do lazer vinculado ao uso do Rio Doce e teve comprometido o acesso à água potável. No entanto, ao examinar detidamente os autos, verifica-se que não foi apresentada prova documental mínima, contemporânea ou posterior ao evento danoso, que comprove tais alegações de forma idônea e objetiva. A única documentação que sugere algum vínculo entre a autora e atividade pesqueira é a autodeclaração unilateral acostada sob o ID 23279807. Tal documento, entretanto, carece de qualquer corroboração externa ou elemento de verificação, não sendo acompanhado de registros funcionais, carteira de pescador, filiação a colônia de pesca, licenças, fotos em contexto de atividade laboral, recibos de comercialização de pescado, extratos financeiros ou qualquer outra forma de comprovação indireta que pudesse indicar a habitualidade ou economicidade da atividade. Tampouco há qualquer menção a requerimento de seguro defeso, que, embora não seja prova única e exclusiva, constitui elemento indiciário relevante em demandas dessa natureza. O mesmo se aplica à suposta restrição de acesso à água potável e à alegação de privação de lazer. Não consta nos autos qualquer comprovante de fornecimento irregular de água, atuação do SAAE no endereço da autora ou laudo técnico-sanitário que aponte condições de insalubridade no consumo doméstico. Também não há comprovação de vínculo da autora com áreas de lazer aquático efetivamente afetadas, nem fotos, vídeos ou testemunhos formalizados que sustentem sua prática rotineira de pesca ou lazer no Rio Doce, tampouco boletins médicos, psicológicos ou sociais que indiquem comprometimento de sua saúde, qualidade de vida ou bem-estar em decorrência direta e individualizada do desastre. Ainda que se admita, em tese, a figura do "pescador de fato", conforme reconhecido pela jurisprudência, tal reconhecimento não afasta o dever do autor de apresentar elementos objetivos e minimamente consistentes que apontem para o exercício regular da atividade à época do fato danoso. No presente caso, tais indícios sequer foram sugeridos. A jurisprudência do TJES é firme ao afirmar que não se pode reconhecer a condição de pescador com base apenas em declarações unilaterais, desprovidas de elementos comprobatórios complementares, mesmo quando se trate de pesca informal: “A comprovação da condição de pescador é imprescindível para que o cidadão consiga, através de ação judicial, a justa reparação pelo dano sofrido” (TJES, Ap. Cív. 5005123-16.2021.8.08.0047, Rel. Des. Robson Luiz Albanez, j. 21/09/2023). “Não há como considerar que as declarações unilaterais colacionadas aos autos sejam capazes de configurar o apelante na condição de pescador, notadamente pela ausência de outras provas para corroborar as alegações” (TJES, Ap. Cív. 5002246-08.2021.8.08.0014, Rel. Des. Ewerton Schwab Pinto Junior, j. 24/11/2022). Do mesmo modo, no tocante aos danos materiais e morais pleiteados, inexiste qualquer comprovação da efetiva existência do prejuízo alegado ou do nexo causal com o desastre ambiental. A jurisprudência rechaça a possibilidade de indenização fundada em suposições, danos hipotéticos ou presunções genéricas. Em especial quanto aos lucros cessantes e à perda de renda, o TJES tem sido categórico: “A indenização por lucros cessantes não é admitida sem sua efetiva comprovação, devendo ser rejeitados os lucros presumidos ou hipotéticos, dissociados da realidade efetivamente comprovada” (TJES, Ap. Cív. 0006097-63.2019.8.08.0030, Rel. Des. Janete Vargas Simões, j. 28/03/2023). Este juízo reconhece, como é de conhecimento público, a magnitude do dano ambiental causado pelo rompimento da barragem de Fundão. No entanto, o fato de o desastre ter gerado impactos generalizados na bacia do Rio Doce não implica, por si só, o reconhecimento do direito individual à reparação sem que haja demonstração mínima dos pressupostos específicos da responsabilidade civil: conduta (mesmo objetiva), nexo causal e dano concreto. Em outras palavras, não há presunção absoluta de dano moral ou material para qualquer habitante da região. É imprescindível que o autor comprove de forma direta que foi atingido de maneira particularizada e que sua integridade física, moral ou econômica sofreu violação derivada do desastre. O TJES, inclusive, reafirmou essa diretriz em julgado recente, que bem se aplica à situação destes autos: “O recorrente não juntou provas documentais ou testemunhais aptas a comprovar, minimamente, suas alegações quanto ao exercício de atividade pesqueira, bem como de ter sido impedido de exercer atividade laborativa por conta do evento danoso. […] Malgrado seja público e notório o ato ilícito imputado às apeladas, não cuidou o apelante de comprovar, minimamente, os alegados danos suportados” (TJES, Ap. Cív. 5005859-34.2021.8.08.0047, Rel. Des. Sérgio Ricardo de Souza, j. 22/02/2024). Assim, o conjunto probatório dos autos revela apenas uma narrativa genérica de impacto, despida de substrato probatório mínimo. A condição de atingida não pode ser presumida em juízo com base em autodeclarações ou em suposta elegibilidade em programa administrativo não comprovado, tampouco se admite o reconhecimento judicial de danos não individualizados, fundados apenas na existência de um desastre ambiental coletivo. II.2.3 – DA INSUFICIÊNCIA DO DANO AMBIENTAL COLETIVO PARA CARACTERIZAR DANO MORAL INDIVIDUAL É incontroverso que o rompimento da Barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015, constituiu um dos maiores desastres ambientais da história do país, com repercussões ecológicas, econômicas e sociais que atingiram vastas regiões de Minas Gerais e Espírito Santo. Trata-se de evento que, por sua gravidade e amplitude, afetou diversos ecossistemas e produziu impactos significativos à coletividade, notadamente à população residente ao longo da bacia do Rio Doce. Contudo, na seara da responsabilidade civil de natureza individual, não se admite a presunção automática de dano moral, sendo exigido do autor, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil, a demonstração concreta de prejuízo próprio, direto e diferenciado, que ultrapasse o desconforto generalizado enfrentado pela coletividade. Essa distinção é imperativa para preservar a lógica do sistema de responsabilização e evitar o esvaziamento do instituto do dano moral, sob pena de se banalizar a reparação e transformar o Judiciário em instância de concessão indiscriminada de compensações abstratas. A jurisprudência atual é uniforme nesse sentido. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo, em reiteradas decisões, tem reconhecido que a mera degradação ambiental, ainda que notória, não autoriza automaticamente a reparação por danos morais individuais quando ausente a comprovação de violação a direito da personalidade ou sofrimento efetivo e concreto: “A mera impossibilidade de usufruir do Rio Doce para pesca e lazer, sem comprovação de prejuízo individual concreto, não configura dano moral indenizável” (TJES, Ap. Cív. 5007979-33.2023.8.08.0030, Rel. Des. Robson Luiz Albanez, j. 07/04/2025). “O pedido de compensação por danos morais foi atrelado à impossibilidade de usufruir do meio ambiente para lazer. No entanto, alegações genéricas, sem a indicação de consequências objetivas e individualizadas, não justificam reparação por danos morais” (TJES, Ap. Cív. 5001631-45.2023.8.08.0047, Rel. Des. Fábio Clem de Oliveira, j. 06/11/2024). Tais entendimentos estão alinhados à doutrina e à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual o dano moral exige a comprovação de lesão a um bem jurídico de ordem imaterial, ligado à dignidade da pessoa, como a honra, a integridade psíquica, a imagem, a intimidade ou a liberdade, não bastando o mero dissabor ou transtorno presumido. No caso dos autos, a autora limita-se a alegar genericamente que deixou de frequentar o Rio Doce e de utilizar suas águas para fins recreativos e de consumo, sem, no entanto, indicar qualquer consequência concreta, pessoal e direta decorrente dessa privação. Não há nos autos prova de abalo emocional, comprometimento à saúde, prejuízo ao convívio familiar ou social, ou qualquer outro elemento que revele impacto de intensidade tal que justifique o reconhecimento do dano moral indenizável. É importante sublinhar que o dano moral de natureza individual não se confunde com a indignação coletiva gerada por um evento catastrófico. O primeiro depende de uma resposta subjetiva e particular do ofendido, traduzida em sofrimento real e juridicamente relevante. O segundo, por sua vez, demanda resposta institucional — administrativa, legislativa ou coletiva — não necessariamente de cunho indenizatório a cada indivíduo indistintamente. O TJES tem reiterado que a generalidade das alegações, mesmo quando relacionadas a um evento de grande magnitude, não afasta a necessidade de individualização do prejuízo: “A interrupção do uso de área afetada e a demora na concessão de benefício administrativo não configuram, por si só, dano moral indenizável” (TJES, Ap. Cív. 0009102-59.2020.8.08.0030, Rel. Des. Fernando Estevam Bravin Ruy, j. 12/12/2024). No mesmo sentido, o Tribunal tem repelido tentativas de se converter experiências comuns e generalizadas — como o incômodo por alterações ambientais ou restrições de lazer não comprovadas — em objeto de compensação pecuniária individual, sem a devida demonstração da intensidade do abalo ou da afetação do núcleo da dignidade pessoal. Isso porque a criação de mecanismos administrativos para reparar os danos, como a Fundação Renova, evidencia os esforços das rés em mitigar os prejuízos causados pelo desastre e confirma a orientação de que o Judiciário não deve presumir automaticamente a existência de dano moral, sendo necessária a comprovação de circunstância concreta que demonstre abalo psicológico significativo e direto (TJES, Ap. Cív. 0009102-59.2020.8.08.0030, Rel. Des. Fernando Estevam Bravin Ruy, j. 12/12/2024). Nesse contexto, considerando a ausência absoluta de comprovação de sofrimento real, profundo e individualizado por parte da autora — além da inexistência de laudos médicos, boletins de atendimento psicológico, relatórios sociais ou qualquer outro documento que aponte violação concreta de seus direitos da personalidade — não há como se reconhecer a existência de dano moral indenizável neste caso. Por todo o exposto, a alegação de dano moral não se sustenta juridicamente diante da ausência de lastro probatório que demonstre a ocorrência de fato gerador apto a comprometer os atributos da dignidade pessoal da autora, razão pela qual o pedido de compensação por danos morais deve ser integralmente rejeitado. II.2.4 – DA NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE RESIDÊNCIA EM ÁREA DIRETAMENTE AFETADA No tocante ao pedido de indenização por suposto desabastecimento de água em razão do rompimento da barragem de Fundão, a análise dos autos revela ausência absoluta de comprovação da residência da autora em local que tenha sido efetivamente afetado por eventual interrupção no fornecimento de água potável. A autora não juntou faturas de consumo de água emitidas pelo SAAE, nem apresentou qualquer laudo técnico, boletim municipal, ordem de serviço, relatório de campo ou histórico de atendimento técnico da concessionária que evidenciasse interrupção emergencial, redução no fornecimento, contaminação ou qualquer irregularidade hídrica ocorrida no seu domicílio. Tampouco consta nos autos comprovante de que residia, à época do desastre, em bairro ou localidade incluída nos mapas técnicos e operacionais como área de impacto direto ou indireto no fornecimento hídrico. É de conhecimento geral que o Município de Linhares/ES possui uma rede de abastecimento com múltiplas fontes, incluindo captação em mananciais distintos, o que torna tecnicamente inviável presumir, sem base documental, que toda a população tenha sido atingida indistintamente por eventual paralisação pontual dos serviços. O simples fato de residir no município não basta para presumir o impacto, sob pena de se admitir uma ficção jurídica incompatível com os princípios da responsabilidade civil e do processo justo. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Espírito Santo é clara ao exigir prova específica da residência em área efetivamente afetada pela interrupção no fornecimento de água, como condição para configuração do dano moral: “Para a configuração do dano moral in re ipsa decorrente da interrupção do fornecimento de água em razão de desastre ambiental, exige-se a comprovação da residência da parte em área afetada pela suspensão” (TJES, Ap. Cív. 5012678-04.2022.8.08.0030, Rel. Des. Arthur José Neiva de Almeida, j. 13/02/2025). Em outro precedente, o TJES reforçou que a mera alegação de interrupção do uso de áreas afetadas ou a demora na concessão de reparações administrativas não configuram, por si sós, dano indenizável, se não demonstrada a existência de prejuízo concreto: “A interrupção do uso de área afetada e a demora na concessão de benefício administrativo não configuram, por si só, dano moral indenizável” (TJES, Ap. Cív. 0009102-59.2020.8.08.0030, Rel. Des. Fernando Estevam Bravin Ruy, j. 12/12/2024). Essa diretriz é reflexo do princípio constitucional da necessidade de prova do fato constitutivo do direito alegado (art. 373, I, do CPC), e visa evitar a generalização indevida do reconhecimento de danos morais presumidos, especialmente em contextos de impacto ambiental coletivo em que os efeitos, embora amplos, devem ser individualizados na esfera judicial. Dessa forma, não há, nos autos, qualquer documento ou elemento fático capaz de demonstrar que ALESSANDRA RUFINO CONTI residia em área que, efetiva e documentalmente, tenha sofrido interrupção ou degradação no fornecimento de água potável. Tampouco se pode extrair tal condição das alegações genéricas e das provas unilaterais apresentadas, desprovidas de robustez técnica ou comprovação mínima. Nesse mesmo sentido, e em harmonia com o já analisado nos capítulos anteriores, também não há demonstração de que a autora exercia qualquer atividade econômica, como a pesca, diretamente impactada pelo desastre, ou de que seu domicílio estivesse em área geográfica reconhecida como zona de afetação direta, conforme diretrizes da Deliberação nº 58 do Comitê Interfederativo (CIF) ou dos mapas operacionais da Fundação Renova. O TJES, aliás, reforça constantemente que a ausência de comprovação de residência em local afetado e a inexistência de vínculo com atividade atingida são impeditivos para o reconhecimento de qualquer pretensão indenizatória. Diante de todo o exposto, conclui-se que a parte autora não comprovou residir em área atingida pelo alegado desabastecimento de água, nem demonstrou prejuízo individual concreto decorrente dessa suposta afetação, razão pela qual não há suporte fático ou jurídico para a concessão da indenização pretendida sob esse fundamento. II.2.5 – DOS PROGRAMAS ADMINISTRATIVOS E DO PEDIDO DE SUSPENSÃO A parte autora, ALESSANDRA RUFINO CONTI, protocolou pedido de suspensão do feito judicial sob o ID 68041137, alegando estar "apta" a receber indenização nos termos dos programas extrajudiciais PID e Agro-Pesca, criados a partir do Acordo de Repactuação homologado pelo Supremo Tribunal Federal em 25/10/2024. Fundamenta o pleito na premissa de que sua condição de apta nos sistemas geridos pela Fundação Renova equivaleria ao reconhecimento de sua qualidade de atingida, tornando a controvérsia judicial supostamente superada ou prejudicada. Entretanto, não consta nos autos qualquer documento que comprove efetivamente o deferimento da indenização na esfera administrativa, tampouco foram juntadas cópias do procedimento individual perante os referidos programas, comunicações da Fundação Renova, comprovantes de adesão, protocolo formalizado ou documentos que demonstrem o pagamento ou proposta concreta de reparação. A mera consulta ao portal eletrônico, conforme se verifica, permite apenas acesso a informações superficiais e dinâmicas sobre a tramitação de pleitos administrativos, sem constituir prova idônea ou hábil para presumir reconhecimento oficial de dano ou prejuízo indenizável. Em razão disso, não se pode conferir efeito vinculante ao suposto status de "apta" apresentado pela autora, muito menos reconhecer a perda superveniente do interesse de agir. Importante ressaltar que o processo judicial já se encontra em fase avançada, com prolação de decisão de saneamento (ID 55729091), fixação dos pontos controvertidos, distribuição do ônus da prova e regular intimação das partes para especificação de provas. O pedido de suspensão do feito apresentado não veio acompanhado de qualquer manifestação das rés no sentido de concordância com o pleito ou de juntada de documentação que reforçasse a tese da autora. A jurisprudência, tanto estadual quanto superior, tem reiterado que a existência de programas administrativos de reparação não suspende ou prejudica automaticamente a jurisdição estatal, cabendo à parte autora, no âmbito do processo judicial, cumprir com os ônus que lhe incumbem, conforme disposto no art. 373, I, do CPC. Ademais, a suspensão da marcha processual com base em expectativa de pagamento futuro, incerto e não comprovado, compromete os princípios da celeridade, segurança jurídica e efetividade da tutela jurisdicional, podendo inclusive frustrar a finalidade do processo, que é a solução definitiva do litígio à luz das provas dos autos e da legislação aplicável. Assim, considerando: a ausência de documentação comprobatória da alegada aptidão; a inexistência de proposta formal ou pagamento administrativo; a fase processual já adiantada; e os princípios que norteiam a boa condução do processo judicial, não há respaldo legal ou fático para acolher o pedido de suspensão formulado pela parte autora, o qual se mostra desprovido de base probatória, e incompatível com o grau de maturação do processo. II.2.6 – DA IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS Diante do conjunto probatório analisado, constata-se que a parte autora não logrou demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, nos termos do art. 373, inciso I, do CPC. As alegações de impacto decorrente do rompimento da barragem de Fundão não foram acompanhadas de qualquer prova documental contemporânea, técnica ou testemunhal idônea, capaz de vincular de forma direta e individualizada a autora aos efeitos do desastre ambiental. Em resumo: a) não se comprovou o exercício da pesca artesanal nem a sua suposta interrupção; b) não houve demonstração de desabastecimento de água, privação de lazer ou abalo moral concreto; c) não foi juntado qualquer comprovante de habilitação, proposta ou pagamento pelos programas extrajudiciais; d) inexiste nos autos qualquer elemento indiciário mínimo que atribua à autora a condição de atingida nos termos exigidos pela jurisprudência dominante. Permitir o acolhimento da pretensão com base apenas em declarações genéricas e desprovidas de suporte fático mínimo implicaria vulnerar os princípios da legalidade, segurança jurídica e isonomia, além de subverter o sistema de responsabilização civil ao admitir a reparação de danos presumidos e abstratos, dissociados da realidade probatória do caso concreto. Por essas razões, impõe-se o julgamento de improcedência da demanda, de forma clara, fundamentada e em respeito à coerência jurídica e à ordem processual. III - DISPOSITIVO Diante do exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por ALESSANDRA RUFINO CONTI e L. R., em face de FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A., VALE S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA. por ausência de comprovação dos fatos constitutivos do direito alegado, nos termos do art. 373, inciso I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil, observada a suspensão da exigibilidade, em razão da gratuidade da justiça deferida, conforme artigo 98, § 3º, do mesmo diploma legal. Advirto que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com intuito meramente infringente poderá ensejar a aplicação da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil. Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Linhares/ES, data registrada no sistema. Emília Coutinho Lourenço Juíza de Direito

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Processo nº 0000081-85.2024.8.13.0416

ID: 330923236

Tribunal: TJMG Órgão: Vara Única da Comarca de Mercês Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0000081-85.2024.8.13.0416

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARCIO BRANDAO DE PAIVA

Intimação

Advogados:

MARCIO BRANDAO DE PAIVA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Mercês / Vara Única da Comarca de Mercês Praça Bias Fortes, 221, Mercês - MG - CEP: 36190-000 PROCESSO Nº: 0000081-… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Mercês / Vara Única da Comarca de Mercês Praça Bias Fortes, 221, Mercês - MG - CEP: 36190-000 PROCESSO Nº: 0000081-85.2024.8.13.0416 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) ASSUNTO: [Homicídio Qualificado] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: RUAN CARLOS RODRIGUES SILVA CPF: 127.231.966-07 SENTENÇA Vistos. 1 – DO RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS, com base em inquérito policial, ofereceu Denúncia em face de RUAN CARLOS RODRIGUES SILVA, brasileiro, nascido em 01/03/1993, natural de Mercês-MG, filho de Elzo Lourenço da Silva e de Maria Auxiliadora Rodrigues da Silva, residente e domiciliado na Rua São Miguel, Bairro São Geraldo, nº 55, em Mercês-MG, atualmente recolhido no presídio de Rio Pomba-MG. Pela prática do fato delituoso previsto no art. 121, § 2º, inciso IV, cumulado com o artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal (CP). Narra a denúncia oferecida que, no dia 08 de fevereiro de 2024, por volta das 09:00, na Rua São Miguel, Bairro São Geraldo, nº 55, em Mercês-MG, o denunciado, livre e conscientemente, tentou matar Antenor Siqueira Rodrigues, mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, com diversos golpes de arma branca desferidos na nuca, braços, tronco e cabeça, ocasionando a amputação de dois dedos e corte de várias artérias, não atingindo tal objetivo por circunstâncias alheias à sua vontade, mas causando lesões no ofendido. Aduz que a vítima estava transitando em via pública, sendo certo que o denunciado o viu passar. Assevera que, motivado por memórias do passado, precisamente de um suposto abuso sexual praticado pela vítima e outro indivíduo em seu desfavor, o denunciado armou-se de facão, dirigiu-se na direção do ofendido e, de súbito, sem dar nenhuma chance de defesa à vítima, alvejou Antenor com vários golpes de arma cortante. Segundo a denúncia, com as agressões, o ofendido gritou por socorro, sendo amparado por pessoas que ao escutarem os barulhos foram até o local e presenciaram o denunciado transferindo vários golpes de facão contra ele, não consumando o delito desejado pois terceiros apartaram o denunciado da vítima, evitando desfecho ainda mais desfavorável. Relata que, de acordo com as testemunhas, a vítima ao ser alvejada pelos golpes de facão, suplicou por misericórdia do réu, a fim de que ele parasse, mas, insensível ao desespero do ofendido, não o atendeu, cessando as agressões somente mediante intervenção de outras pessoas e contra a sua vontade. Expõe que após as agressões a vítima foi levada ao Hospital Municipal, sendo acompanhada pela sua sobrinha Danubia Pereira Rodrigues, entretanto, após os cuidados devidos ao quadro clínico da vítima, foi necessário a remoção para o Hospital Santa Izabel, na cidade de Ubá. Aduz que, o denunciado que não se recordava de ter manuseado o facão, que não se lembrava dos fatos, apenas de ter sido conduzido pela guarnição policial. Auto de prisão em flagrante delito às fls. 1/12 (ID 10171211537). Boletim de Ocorrência às fls. 32/37 (ID 10171211537). Ficha de atendimento ambulatorial à fl. 31 (ID 10171211537). Relatório Policial às fls. 60/61 (ID 10171211537). CAC em ID 10497548758. FAC às fls. 38/47 (ID 10171211537). Decisão de recebimento da denúncia proferida na data de 23 de fevereiro de 2024, conforme ID 10173947500. Determinada a instauração de incidente de insanidade mental do acusado, conforme decisão em ID 10230129627. Sentença homologatória do Laudo Pericial em ID 10332735942. Resposta à acusação apresentada em ID 10454834544, pugnando a defesa pela exclusão de culpabilidade do acusado, por ausência de imputabilidade penal, conforme dispõe o artigo 26 do Código Penal. Nenhuma das hipóteses de absolvição sumária fora conhecida, razão pela qual, fora designada audiência de instrução, sendo realizada a oitiva da vítima, dois informantes, três testemunhas, bem como realizado o interrogatório do acusado, conforme se depreende da ata de audiência acostada em ID 10481251266. Em sede de alegações finais, apresentadas em forma de memoriais em ID 10488494369, o Ministério Público requereu que o acusado seja pronunciado como incurso nas penas previstas no art. 121, § 2º, inciso IV, cumulado com o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, Em suas alegações finais, também apresentadas em forma de memoriais em ID 10491361424, a defesa requereu o reconhecimento da inimputabilidade penal do acusado, nos termos do art. 26, caput, do Código Penal; a absolvição imprópria, com fulcro no art. 415, inciso IV, do Código de Processo Penal; a aplicação de medida de segurança, nos moldes do art. 97, do Código Penal, conforme decisão judicial homologatória proferida no incidente de insanidade e, por fim, a remessa de cópia à autoridade sanitária competente para avaliação do regime adequado (internação ou tratamento ambulatorial). Vieram-me os autos conclusos. É o sucinto relatório. Tendo visto e ponderado, passo a DECIDIR. 2 – DA FUNDAMENTAÇÃO Estando o feito em ordem, uma vez que presentes os pressupostos processuais, as condições de prosseguibilidade da ação penal e não havendo preliminares a analisar, nulidades a sanar, passo ao exame dos fatos. Trata-se de ação penal pública incondicionada em que é imputada ao acusado a prática do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos IV, cumulado com o artigo 14, II, do Código Penal (CP). In casu, a materialidade delitiva fora comprovada pelo Auto de prisão em flagrante delito às fls. 1/12 (ID 10171211537), pelo Boletim de Ocorrência às fls. 32/37 (ID 10171211537) e pela ficha de atendimento ambulatorial à fl. 31 (ID 10171211537). Por sua vez, é incontroverso nos autos que o réu foi o autor das agressões em desfavor da vítima: Em audiência de instrução, a vítima, ANTENOR SIQUEIRA RODRIGUES, narrou: […] Que no dia do ocorrido estava distraído trabalhando. […] Que conhece o acusado desde pequeno mas nunca conversava um com o outro. […] Que nunca teve discussão ou briga em relação ao acusado ou seus parentes. […] Que não morava perto do acusado e não trabalhou para o mesmo nem mesmo o acusado trabalhou para ele. […] Que no dia do ocorrido estava trabalhando e o acusado o atacou com facão, que não estava esperando, estava distraído. […] Que estava trabalhando mexendo com reciclagem. […] Que mora para cima perto da casa do acusado. […] Que o acusado mora para baixo de sua casa, que mora mais para cima e o acusado mais para baixo. […] Que não sabe o motivo pelo qual foi atacado. […] Que o acusado não falou nada, o atacou calado. […] Que estava de frente, o acusado foi correndo, queria correr e não conseguiu, que o acusado é mais novo do que ele. […] Que o acusado estava com um facão. […] Que o facão do acusado era do mesmo, já chegou com esse facão. […] Que o acusado não falou nada antes de atacar. […] Que o acusado chegou calado e desferiu facãozadas. […] Que o acusado o golpeou na mão, cortando dois dedos da mão e o golpeou também no pé, cortando o osso de baixo do pé. […] Que não viu se o acusado golpeou direto sua mão ou se acertou ao se proteger. O acusado lhe desferiu uma facãozada na nuca. […] Que o acusado lhe desferiu facãozada na nuca e na cabeça. […] Que o acusado lhe desferiu várias facãozadas. […] Que desmaiou e que também é diabético. […] Que sua sobrinha o socorreu, correu e gritou com o acusado. […] Que sua sobrinha gritou com o acusado e o mesmo fugiu, correu para a casa dele, depois correu para os fundos e saiu em uma oficina embaixo. […] Que deve ter um ano que o acusado foi preso. […] Que o acusado fugiu para a oficina. […] Que ligaram para a policia e foram até a oficina o pegar e levaram ele. […] Que não sabe dizer onde o acusado foi preso. […] Que uma turma segurou o acusado. […] Que nunca abusou do acusado. […] Que nunca teve nenhum tipo de relação com o acusado, que o mesmo está inventando isso. […] Que nunca teve problemas com a polícia. […] Que o acusado não tem nenhum problema de cabeça. […] Que o acusado não tem nenhum problema de cabeça pois dirigia carro. […] Que o acusado não tinha problemas de cabeça pois conhecia dinheiro. […] Que nunca conversava com o acusado. […] Que nunca fez nada com o acusado. […] Que não sabe o motivo do acusado ter o atacado. […] Que perdeu dois dedos da mão direita e tem um dedo da mão esquerda que não funciona, não abre. […] Que recebeu uma facãozada embaixo, no osso do pé. […] Que está com dificuldade para andar. […] Que chegou a ficar internado por um mês. […] Que antes do ocorrido já conhecia o acusado, é seu vizinho, só não conversava com o mesmo. […] Que não tinha relação de amizade e nem cumprimentava o acusado. […] Que nunca teve desentendimento com o acusado, que só trabalhava e nunca foi de estar com esse tipo de pessoa. […] Que não sabe se o acusado tinha algum comportamento estranho antes do ocorrido, que era o acusado para lá e ele para cá. […] Que não chegou a notar algum sinal de agressividade do acusado, nem mesmo com outra pessoa. […] Que não chegou a ouvir comentários de familiares ou vizinhos do estado emocional ou mental do acusado. […] Que no dia do ocorrido o acusado estava em silêncio enquanto o atacava, que não estava esperando nada disso. […] Que o acusado estava drogado. […] Que o acusado usava drogas. […] Que nunca teve provocação sua com o acusado. […] Que não sabe se o acusado estava com a intenção de matá-lo ou movido por algum impulso incontrolável. […] Que não sabe se o acusado demonstrava alguma atitude de arrependimento, frieza ou alguma confusão. […] Que o acusado estava sabendo o que estava fazendo, pois depois que desferiu facãozadas, dizem que ficou olhando de sua casa que tem dois andares, foi o que falaram, não viu nada. […] Que não chegou a ver o acusado na parte de cima de sua casa. Do jeito que que o acusado bateu, acabou, sua mão ficou pendurada só na pele. Deu sorte que o facão não estava amolado, que se estivesse tinha lhe matado. Quando chegou em Ubá, o médico falou que se demorasse a chegar mais 10 minutos tinha morrido, pois perdeu o sangue do corpo tudo. A testemunha, MARCOS RAEL LIMA DA COSTA, policial militar, relatou: […] Que teve acesso à declaração da fase policial. […] Que confirma o teor do histórico. […] Que estava em serviço no dia dos fatos, foram acionados via 190, onde foi relatado que o acusado teria agredido um senhor próximo a residência do mesmo. No local se depararam com as testemunhas que relataram que estavam na residência de Danubia quando ouviram um barulho vindo da rua, saíram da residência e já visualizaram o acusado agredindo a vítima com o uso de um facão, pediram que cessasse as agressões, o mesmo não cessou sendo necessário que as testemunhas intervissem segurando o acusado para cessar as agressões. Logo após, o acusado evadiu do local sentido a residência. Passaram a realizar o rastreamento, sendo o réu encontrado as margens de um córrego nos fundos de sua residência onde foi abordado, algemado e o conduziu até o quartel para registro de ocorrência. Perguntado ao acusado qual seria o motivo das agressões contra a vítima, segundo ele, no passado teria sido violentado sexualmente pela vítima e que não teria sido feito nada na época, então resolveu fazer justiça com as próprias mãos. […] Que o acusado não parecia ter alguma doença mental, no momento da abordagem o mesmo estava bem exaltado, bem nervoso, mas não parecia ser doença mental. […] Que o acusado invoca como motivo um abuso sexual que aconteceu há muitos anos atrás. […] Que o acusado disse que estava em sua casa, quando viu a vítima passando teve um lapso de memória, recordou os fatos da época e resolveu tomar aquela atitude. […] Que já atendeu ocorrência do acusado de Maria da Penha, em veículos, falta de habilitação. […] Que quando localizaram o acusado o mesmo estava bem agitado e nervoso, estava escondido em um canto, meio acuado, parecendo que estava acuado. […] Que todas as ordens que deram ao acusado o mesmo obedeceu de imediato. […] Que o acusado disse sobre os fatos espontaneamente. […] Que o acusado apresentou estar convicto de que estava fazendo justiça. […] Que não parecia que o acusado estava em pleno juízo. […] Que não tinha nenhuma ocorrência da vítima e do acusado antes do ocorrido, que se recorde. A testemunha, WELLINGTON JOSÉ DE SOUZA, policial militar, ao ser ouvido declarou: […] Que teve acesso à declaração da fase policial. […] Que confirma o teor do histórico. […] Que foram acionados, ouviram os relatos das testemunhas e do acusado, da vítima não pois a mesma não estava, foi socorrida. Participaram mesmo da apreensão do acusado. […] Que o acusado estava em um terreno, aparentemente atrás de sua casa. […] Que acha que quando fizeram a apreensão do acusado ele estava normal, só falava o tempo todo que a vítima tinha o estuprado quando criança. […] Que não falou o motivo de ter feito o que fez logo agora. […] Que quando encontraram o acusado o mesmo demonstrava agitação e nervosismo. […] Que durante a abordagem o acusado não apresentou resistência ou tentou fugir, cooperou. […] Que o acusado falou espontaneamente sobre os fatos, falava o tempo todo que a vítima tinha o estuprado quando era criança e que por isso o atacou. […] Que o acusado estava convicto de que estava fazendo justiça, inclusive continuou falando que teria feito novamente. […] Que parecia que o comportamento do acusado era de alguém em pleno juízo. […] Que não teve ocorrência anterior envolvendo a vítima e o acusado A testemunha, MERCEDES DA MERCÊS RODRIGUES DA SILVA, ao ser ouvida declarou: […] Que não mora na cidade, mora em Juiz de Fora mas é de Mercês. No dia do ocorrido, era uma quinta-feira antes do carnaval, chegou na cidade para resolver umas coisas, estava tomando café na casa de sua amiga que é sobrinha da vítima. Estavam tomando café e ouviram um barulho do lado de fora, parece que um portão ou alguma coisa estava caindo e saíram para ver o que estava acontecendo. De repente, o acusado saiu dos fundos da casa de sua mãe com um facão na mão e que o mesmo não demonstrava ansiedade, não demonstrava nada, só pegou o facão e saiu com roupa de trabalho, só ficaram observando. O acusado foi andando, a vítima estava entrando na casa da Tia Maria, que é do lado da casa da Danubia, que é sobrinha da vítima. O acusado simplesmente começou a desferir muitas facãozadas na vítima, o mesmo não falava nada, em momento alguém ele falava alguma coisa. A vítima estava entrando com um carrinho de recicláveis que pega na rua e o acusado simplesmente chegou dando muitas facãozadas. Não soube o que fazer na hora pois não conseguiu chegar perto, correu para pegar o telefone e tentar pedir socorro. Sua amiga estava com o marido, correu, pegou o telefone para tentar pedir socorro para a vítima. […] Que sua amiga a todo o momento pedia ´´Por favor, para`` ao acusado, o mesmo dando as facãozadas, a vítima gritando e nisso correu para dentro de casa para pegar o celular pois o celular não estava com ela. […] Que só viu quando o acusado começou a dar as facãozadas, não conseguiu ver depois porque correu para dentro, não sabe se por medo, com medo do acusado ir para cima da mesma. […] Que o acusado não falou nada antes de atacar a vítima, foi calado. Nunca imaginou que o acusado fosse fazer isso, porque o mesmo foi calado no sentido da vítima, não demonstrou hora nenhuma que iria fazer isso. […] Que conhece a vítima a bastante tempo, desde os seus 11 anos de idade, pois sempre morou no mesmo bairro e é amiga da sobrinha dele, então conhece o mesmo desde a quarta série do primário. Sempre esteve muito presente na casa da sobrinha da vítima. […] Que nunca ouviu falar que a vítima teria abusado de alguém. Desde criança frequenta a casa da vítima, sempre teve contato com ele e nunca tentou nada com ela. […] Que não tinha convivência com o acusado, mas no momento não parecia estar com alguma questão mental ou surto, parecia normal, o mesmo estava com roupa de trabalho, saindo de casa, até imaginaram que estava pegando a ferramenta para trabalhar. O acusado não demonstrou nervosismo, não demonstrou nada, simplesmente foi até a vítima e começou a agredi-lo. […] Que no momento das agressões o acusado não falava nada para a vítima, escutava apenas os gritos da vítima pedindo para ajudá-lo, dizendo ´´Ele vai me matar``, era só isso que tinha no momento. […] Que não deu para observar o semblante do acusado, não ficou esperando para olhar, preferiu correr, acha que foi até um meio de proteção sair de perto, correu para dentro de casa para pegar o celular e tentar um socorro, porque só via o acusado com o facão, desferindo facãozada na vítima, essa é a parte que viu. Entrou na casa e depois já não viu. Viu o acusado encima da casa, já tinha ido para a casa da mãe dele e estava lá encima nadando de um lado para o outro com um facão, mas o acusado não falou nada em momento algum. […] Que não chegou perto, viu o acontecido de longe, ficou com medo de chegar perto, sua amiga e o marido dela que correram para socorrer, ficou em estado de choque e a única coisa que pensava no momento era onde estava seu celular, tentando procurar uma ajuda para a vítima. Não chegou perto. Foi chegar perto depois, mesmo assim não ficou muito perto por não poder ver sangue, vê sangue e passa mal. Tentava ajudar da melhor forma possível mas de longe. […] Que não consegue falar se o acusado parecia entender o que havia feito pois em momento algum ficou encarando ou olhando para ele, por medo de talvez ele descer, pois a princípio, até a chegada da polícia estavam a mercê do acusado. É mulher e seu medo era do acusado descer e fazer a mesma coisa com ela ou com alguém que estivesse lá perto, por isso que tentou se manter mais afastada. […] Que não dava para ver o que o acusado demonstrava, o mesmo só olhava de um lado para o outro com o facão na mão, como se nada tivesse acontecido. O informante, MARCEL FELIPE RODRIGUES SOUSA, disse: […] Que quando chegou ao local do ocorrido já tinha acontecido. […] Que quando chegou ao local já tinha acontecido o ocorrido, dessa cena de violência. […] Que viu a vítima no chão, já machucado e o acusado estava perto. […] Que o acusado estava parado. Quando aconteceu o ocorrido, sua esposa e a amiga dela estavam dentro de casa, escutaram um grito e as duas saíram para ver o que era. Ficou dentro da casa mas quando escutou o grito da esposa e da amiga dela resolveu sair para ver o que era. Quando chegou ao local, sua esposa e a amiga dela estavam em volta da vítima, já tinha acontecido o ato e o acusado estava parado perto, olhando. Acha que na gritaria, o acusado deve ter parado com as agressões. […] Que não sabe o que levou o acusado a parar com as agressões, que teve muita gritaria e quando chegou ao local já tinha parado. […] Que a vítima estava deitada no chão. […] Que a vítima estava um pouco consciente. […] Que a vítima estava com uma sensação de que poderia desmaiar, não sabe explicar direito, estava querendo desmaiar, com o olho aberto mas para desmaiar a qualquer momento por causa da situação. […] Que aparentemente não sabe dizer se o acusado tem algum problema mental, até onde sabe acha que não. […] Que não sabe dizer se o acusado teve algum problema relacionado a abuso sexual com a vítima. […] Que cresceu junto com o acusado. O acusado sempre foi um rapaz muito calado, muito quieto no canto dele, o que sabe dizer é isso, sempre foi muito caladão e mesmo crescendo juntos nunca tiveram muita interação um com o outro, porque o acusado é um rapaz mais fechado, quieto em seu canto, isso é fato, sempre foi desse jeito. […] Que nunca percebeu se o acusado demonstrou comportamento obsessivo ou dificuldade de lidar com alguma frustração. […] Que no dia do ocorrido, o acusado estava com uma expressão séria. […] Que quando chegou ao local, sua esposa e amiga estavam gritando e o acusado estava parado, que também falou, gritou com o acusado, no calor do momento gritou e tentou fazer alguma coisa, todo mundo pediu para o acusado parar, de fato o mesmo já estava parado e entrou para dentro de casa depois dessa situação. […] Que não sabe dizer se quando o acusado ficou parado parecia estar consciente dos seus atos ou desconectado da realidade. […] Que o acusado não disse nada durante e após as agressões, só permaneceu calado, o tempo todo que viu ele estava calado. Em seguida, foi ouvida a informante DANUBIA PEREIRA RODRIGUES : […] Que presenciou tudo, estava na cozinha de sua casa quando escutaram um barulho muito forte, saiu correndo com sua filha e uma amiga que estava em sua casa, quando viram, o acusado estava descendo com um facão na mão e a vítima descendo com o carrinho de reciclado, que o mesmo mexia com material reciclado. Brincou com a vítima, perguntando onde iria com aquele carrinho e o mesmo disse que iria pegar seus reciclados e nisso o acusado foi para cima dele, não deu nem tempo de gritar, quando gritou o acusado já estava em cima da vítima. […] Que foi do nada, de repente o acusado só foi para cima da vítima e deu facãozada em sua cabeça, a vítima tentou se defender com o braço e a mão, pegou os dedos dele, braço e pé e foi só dando facãozada, não tento chance da vítima se defender. […] Que o acusado alega que a vítima o estuprou quando era criança. […] Que a vítima praticamente ajudou sua mãe a criá-la e o mesmo nunca tentou nada e acha que com o acusado não iria tentar isso, depois de tantos anos, não sabe se realmente foi ou não. […] Que conhece o acusado desde criança, foi praticamente criada dentro da casa dele. […] Que o acusado sempre foi muito estranho, sempre foi muito na dele, nunca foi de muita conversa. Saia, tinham um grupo de amigos, fazia churrasco em sua casa, o acusado ia mas ficava mais isolado. De uns anos para cá o acusado começou a ficar muito agressivo, até mesmo dentro da própria casa. Que nunca teve muita conversa com o acusado, era só ´´Oi`` e pronto, que o mesmo não era e nunca foi muito de falar. […] Que o acusado não falou nada, só olhou e foi. Começou a gritar, o acusado olhou e parou e voltou para trás, não falou nada, não expressou nada. […] Que não dava a impressão de ser um cidadão fora de si porque o acusado não esboçou nada, reação nenhuma, estava muito estranho, calmo, parecia que já estava planejando fazer aquilo. Dois dias antes do ocorrido, o acusado já tinha dado um surto na casa dele, quebrando a casa da mãe dele e dois dias depois o mesmo fez isso com a vítima, mas não expressou reação nenhuma. […] Que o acusado já tinha dado um surto umas 48 horas antes do ocorrido. […] Que não tentou dialogar com o acusado, a única coisa que falava era ´´Você está ficando doido``, ´´Você ficou doido, olha o que fez, ele é meu tio. A gente conhece ele desde criança, olha o que você fez``, e o acusado não falou nada, só olhou, se virou e foi embora. […] Que após o ataque o acusado estava diferente, na verdade não expressou reação nenhuma, não falou nada, não agiu, só ficou na lage olhando toda a movimentação depois, andando de um lado para o outro, mas não expressou reação nenhuma. […] Que acha que o acusado não reconhecia a gravidade do que havia feito naquele momento, pelo jeito dele não. O acusado chegou a apontar o facão para seu irmão, seu irmão estava embaixo. Depois do que aconteceu, antes da ambulância chegar, seu irmão chegou do serviço, ligaram para ele e ele chegou, o mesmo disse ao acusado ´´Poxa, Ruan, você é meu amigo de infância. Olha o que você fez``, o acusado foi e apontou o facão para seu irmão. Seu irmão falou que parecia que estava o ameaçando também. Não sabe se o acusado se arrependeu ou realmente acha que ele queria fazer mais. Cientificado quanto seu direito ao silêncio, realizou-se o interrogatório do acusado RUAN CARLOS RODRIGUES SILVA, que esclareceu: […] Que é usuário de drogas. […] Que usa cocaína. […] Que nunca fez tratamento. […] Que toma Tadalafila 5 mg. […] Que tem o pé quebrado. […] Que já teve outros problemas com a justiça. […] Que foi preso no tráfico mas a droga não era sua. […] Que deu uns cortes de facão na vítima, o mesmo estava se aproximando todos os dias quando estava chegando do serviço para almoçar em casa, próximo ao portão de sua residência, a vítima estava jogando o carrinho de papelão em sua direção e de sua bicicleta, ficou com medo da vítima tirar uma faca do carrinho de papelão e o agredir, foi e deu uns cortes de facão nele. Entrou em sua casa, pegou o facão e deu uns cortes nele. Dois dias antes, se não se engana, teve um problema com sua mãe dentro de casa. Já fez a denúncia da vítima. […] Que já conhecia a vítima, é seu vizinho. […] Que é verdadeiro a questão do abuso sexual que sofreu da vítima. […] Que na época que aconteceu o abuso sexual, falou para sua mãe quando chegou em casa, a mesma olhou e viu que era verdadeiro o fato, perguntou o que era, acha que explicou para ela mas não sabe se denunciou, que a vítima nunca foi presa. […] Que não ficou sabendo se a vítima fez isso com outras pessoas, só com ele mesmo. […] Que pelo motivo da vítima o ter abusado em infância e nunca ter sido preso, seus problemas nunca terem sido resolvidos e a vítima estar se aproximando em sua casa quando está chegando para almoçar, se sentiu ameaçado, ficou com medo do mesmo tirar sua vida. […] Que não chegou a conversar com a vítima a respeito da situação que viveu no passado. Há muito tempo atrás o cumprimentava mas não o respondia. […] Que não sabe qual seria a intenção da vítima em se aproximar. A vítima estava jogando o carrinho de papelão para sua direção. […] Que não sabe o motivo da vítima estar jogando o carrinho de papelão. […] Que não conversava com a vítima. A vítima tentava conversar, puxar assunto mas não dava ideia para o mesmo. […] Que não se sente arrependido do que fez porque deu uns cortes de facão na vítima para se defender. A vítima podia tirar uma faca e tentar contra sua vida, pelo que já fez com ele. […] Que não viu faca com a vítima mas ficou sabendo que o mesmo anda com faca. […] Que já viu a vítima mexendo com faca para cortar corda de papelão. […] Que provavelmente a vítima tinha faca em seu carrinho. […] Que teve um problema dentro de casa com sua mãe dois dias antes, sua mãe o denunciou, no momento em que o denunciou foi para delegacia com sua mãe e seu pai e lá fez a denuncia da vítima também. O problema que teve em casa com sua mãe foi por esse motivo, ficou nervoso pois a vítima estava encontrando com ele no portão de sua casa. […] Que já estava nervoso com a situação da vítima estar atrás dele. […] Que no dia do ocorrido não tinha usado droga. […] Que durante a semana não usava nada, só trabalhava. […] Que acha que foi 4 cortes que deu na vítima, não chegou a ser golpes de facão porque tinha um tal de Vanderlei do lado dele e segurou sua mão, não deixou dar os golpes como ia dar não. […] Que sua intenção não era matar a vítima e sim dar uns cortes de facão para não aproximar mais. A vítima sabe o que fez e sabe que foi errado. […] Que Vanderlei o segurou, por isso não conseguiu bater mais na vítima. Vanderlei segurou em seu pulso na hora em que levantou o braço para dar as facãozadas na vítima, então as facãozadas não foram como ia dar. […] Que só levou o facão e puxou para trás, deu os cortes na vítima. […] Que acha que atingiu a região das costas da vítima, na perna, foi dar no tronco, a vítima colocou a mão e pegou a mão, uma no braço perto do ombro e a outra nas costas. […] Que não atingiu a vítima na cabeça. […] Que após as facãozadas, a vítima foi caindo no chão devagar e não o viu mais, virou as costas e foi para sua residência. […] Que após as agressões foi para sua casa. […] Que jogou o facão no quintal e não o achou mais. […] Que não passou por acompanhamento médico ou psicológico antes do ocorrido. […] Que nunca foi internado em unidade de saúde mental. […] Que no dia do ocorrido estava passando mal. […] Que nos dias normais lembra do que acontece durante o dia, as vezes costuma esquecer algumas coisas dentro de sua casa mas lembra sim. […] Que não teve crise de ansiedade, surto ou momentos em que sentia que perdia o controle de si mesmo. […] Que conhece a vítima desde criança, quando o mesmo o abusou. […] Que além do que aconteceu quando era criança não teve nada há mais antes do dia dos fatos. […] Que sentia ódio da vítima, já tinha vontade de fazer alguma coisa com ele mas pensava bem e nunca fez nada. […] Que no momento em que agrediu a vítima estava com muito ódio, não estava suportando, já estava para acontecer aquilo mesmo pois todo o dia estava encontrando com ele no portão de sua casa, já não aguentava mais aquilo. […] Que não escutava vozes, estava com uma sensação estranha em suas costas apenas. […] Que se sentiu obrigado a fazer o que fez, para se proteger, para a vítima parar de se aproximar. […] Que não pensou que poderia estar fora de controle, acha que estaria certo em fazer aquilo. […] Que lembra do que fez após as agressões. […] Que viu a gravidade do que fez quando viu a vítima deitada no chão, não achou que chegaria a esse ponto, a intenção era só dar uns cortes para não se aproximar mais. […] Que não pode falar que tem arrependimento porque se sentiu obrigado a fazer aquilo, foi para se proteger, a vítima poderia ter tentado contra a sua vida. […] Que não tinha intenção consciente de matar a vítima. Em que pese o colhido em audiência, na espécie restou, também, devidamente configurada a inimputabilidade do réu, que é causa de exclusão de culpabilidade (art. 26 do Código Penal). Com efeito, depreende-se do laudo de insanidade mental acostado aos autos 5000391-06.2024.8.13.0416, ID 10332735942, que o acusado era inimputável ao tempo dos fatos. Neste sentido: O paciente submetido a exame era, ao tempo da ação ou da omissão, por motivo de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento? R - Referente ao CAPUT do artigo 26 do código penal (INIMPUTABILIDADE). Do ponto de vista da psiquiatria forense, o periciando apresenta QUADRO PSICÓTICO (CID-10 F29) E RETARDO MENTAL (CID-10 F79) ao exame mental atual e em conexão com os fatos em tela, o quê neste caso são considerados doença mental e desenvolvimento mental retardado e tolheram inteiramente as capacidades de entendimento e de determinação do periciando em conexão com os fatos em tela. Assim sendo, impõe-se a absolvição do acusado, na forma do art. 386, VI, do Código de Processo Penal. Apesar de o réu ter admitido a autoria dos fatos, é possível extrair dos seus relatos a falta de percepção, pelo acusado, da gravidade dos atos perpetrados por ele, o que se justifica pela pertubação de saúde mental sofrida. Sem embargo, os autos revelam que o réu apresentou comportamento agressivo e repentino. Do próprio laudo pericial e dos depoimentos judiciais se depreende que sua periculosidade tem relação com a imprevisibilidade e impulsividade de seu comportamento. Neste contexto, impõe-se a aplicação de medida de segurança em seu desfavor, consistente em internação, na forma do artigo 97, caput, do Código Penal. Por oportuno, colaciono: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL - TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO - ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA - INIMPUTABILIDADE RECONHECIDA - APLICAÇÃO DE MEDIDA DE SEGURANÇA DE INTERNAÇÃO - PLEITO DE SUBSTITUIÇÃO POR TRATAMENTO AMBULATORIAL - IMPOSSIBILIDADE - PERICULOSIDADE DO AGENTE E GRAVIDADE DO FATO CONSTATADAS - JUSTIÇA GRATUITA - HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO PRESUMIDA - ANÁLISE POSTERIOR PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO - RECURSO DESPROVIDO. 1. A absolvição sumária, com fundamento no reconhecimento da inimputabilidade do agente (art. 26 do CP), impõe a aplicação de medida de segurança, nos termos do art. 97 do mesmo diploma legal. 2. A medida de segurança de internação é a adequada quando o agente inimputável comete crime punível com reclusão e demonstra periculosidade, avaliada pelas circunstâncias do fato e por suas condições pessoais. 3. A gravidade da tentativa de homicídio qualificado, praticada contra a própria esposa enquanto dormia, aliada ao diagnóstico de psicose não especificada associada à perturbação mental pelo uso de álcool, evidenciam a periculosidade do agente e a necessidade da medida de internação como forma de proteção à vítima, seus familiares e à sociedade. 4. O pedido de concessão de justiça gratuita deve ser analisado pelo Juízo da Execução, não competindo sua apreciação em sede de apelação criminal. 5. Recurso conhecido e desprovido. (TJMG- Apelação Criminal 1.0000.24.502791-7/001, Relator(a): Des.(a) Luziene Barbosa Lima , 3º Núcleo de Justiça 4.0 - Cri, julgamento em 15/05/2025, publicação da súmula em 15/05/2025). Nesse espeque, a aplicação da medida de segurança visa tanto à proteção da sociedade quanto ao tratamento do agente inimputável, possuindo caráter preventivo e curativo. E por isso, a escolha da medida mais adequada deve levar em consideração a periculosidade do agente, a natureza e a gravidade do delito praticado e as suas condições pessoais. No caso, a gravidade da conduta - tentativa de homicídio, mediante cortes com facão - revela uma significativa periculosidade do agente. Nesse sentido o STJ: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ABSOLVIÇÃO IMPRÓPRIA. INIMPUTABILIDADE RECONHECIDA. SUBSTITUIÇÃO DA MEDIDA DE SEGURANÇA DE INTERNAÇÃO POR TRATAMENTO AMBULATORIAL. INADEQUAÇÃO. PARTICULARIDADES DO CASO E PERICULOSIDADE DO RÉU. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE NA VIA ELEITA. RECURSO DESPROVIDO. 1. O entendimento pacificado desta Corte Superior é no sentido de que a aplicação da medidas de segurança a inimputável não está adstrita à recomendação técnica tampouco à natureza da pena privativa de liberdade aplicável, devendo o julgador levar em consideração as particularidades do caso bem como a periculosidade do agente a fim de optar pelo tratamento mais apropriado, em homenagem aos princípios da adequação, da razoabilidade e da proporcionalidade. 2. Na hipótese, as instâncias ordinárias concluíram pela adequação da medida de internação a partir dos elementos fáticos, considerando a periculosidade do réu - evidenciada pelo fato de já ter sido recentemente absolvido impropriamente pela prática outros delitos, dentre eles, tentativa de homicídio duplamente qualificado - bem como a descontinuidade de tratamentos ambulatoriais anteriores. 3. A análise acerca da suficiência da aplicação de medida socioeducativa mais branda demanda reexame aprofundado de provas, providência vedada na via eleita. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 736.312/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 9/3/2023.) EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO - ABSOLVIÇÃO IMPRÓPRIA - IMPOSIÇÃO DE MEDIDA DE INTERNAÇÃO - ABRANDAMENTO PARA TRATAMENTO AMBULATORIAL - POSSIBILIDADE - ADEQUABILIDADE DEMONSTRADA - ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS - RÉU ASSISTIDO PELA DEFENSORIA PÚBLICA - POSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE PELO PRAZO DE CINCO ANOS - RECURSO PROVIDO. - Em se tratando de absolvição imprópria, apesar de a regra legal prever a aplicação de medida de segurança de internação para os casos envolvendo crimes punidos com reclusão, admite-se o abrandamento para tratamento ambulatorial quando estiver manifestamente demonstrada a adequabilidade da medida mais branda. - Assistido pela Defensoria Pública, faz jus o acusado à suspensão da exigibilidade do pagamento das custas processuais, nos termos do §3º do artigo 98 da Lei nº 13.105/2015, em consonância, ainda, com o entendimento firmado pelo Órgão Especial deste E. Tribunal, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 1.0647.08.088304-2/002. (TJMG - Apelação Criminal 1.0024.19.004236-6/001, Relator(a): Des.(a) Glauco Fernandes , 4ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 03/06/2020, publicação da súmula em 10/06/2020). Registre-se que, muito embora o crime de homicídio seja punível com pena de reclusão, ao juízo é facultado a escolha do tratamento mais adequado ao inimputável, que nessa situação, entendo pela internação. 3 – DO DISPOSITIVO Em face do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a denúncia e absolvo sumariamente o réu RUAN CARLOS RODRIGUES SILVA da imputação que lhe foi feita, na forma dos art. 415, IV, e art. 386, VI, do Código de Processo Penal, em combinação com o art. 26 do Código Penal. Na forma do art. 386, parágrafo único, III, do CPP, e art. 97, caput, segunda parte, e §1º, do CP, aplico-lhe a medida de segurança consistente em internação, por tempo indeterminado, ou seja, enquanto não for averiguada a cessação de periculosidade, observado o prazo mínimo de 1 (ano). Em consequência da decisão absolutória imprópria, determino a expedição de guia de execução provisória. Mantenha-se o acusado "preso" preventivamente, até que seja removido para estabelecimento adequado, presente os requisitos para a garantia da ordem pública e a possibilidade de atentar contra a vida da vítima mais uma vez. Cumpra-se ID 10480014417, com urgência, inclusive informando sobre a presente sentença e aplicação de medida de segurança de internação. Isento de custas. Após o trânsito em julgado, expeça-se a guia definitiva, na forma dos artigos 171 e seguintes da Lei 7.210/84, encaminhando a Guia à Vara de Execuções Penais. Intime-se a vítima, em observância ao teor do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Cientifique-se o Ministério Público. Sentença registrada eletronicamente neste ato. Publique-se. Intimem-se. Tudo feito, arquive-se o presente feito, com baixa na distribuição. Cumpra-se. Mercês, data da assinatura eletrônica. GUSTAVO VARGAS DE MENDONÇA Juiz de Direito em substituição (Documento assinado eletronicamente pelo Juiz) Praça Bias Fortes, nº 221, Centro – Mercês/MG – CEP: 36190-000

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Processo nº 5006465-31.2024.8.24.0041

ID: 322295928

Tribunal: TJSC Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes Classe: REMESSA NECESSáRIA CíVEL Nº Processo: 5006465-31.2024.8.24.0041

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

INDUSTRIA ERVATEIRA BONETES LTDA

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

CARLOS ALBERTO BRUSTOLIN

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

Remessa Necessária Cível Nº 5006465-31.2024.8.24.0041/SC PARTE AUTORA : INDUSTRIA ERVATEIRA BONETES LTDA (IMPETRANTE) ADVOGADO(A) : CARLOS ALBERTO BRUSTOLIN (OAB SC019433) DESPACHO/DECISÃO Em atençã… Remessa Necessária Cível Nº 5006465-31.2024.8.24.0041/SC PARTE AUTORA : INDUSTRIA ERVATEIRA BONETES LTDA (IMPETRANTE) ADVOGADO(A) : CARLOS ALBERTO BRUSTOLIN (OAB SC019433) DESPACHO/DECISÃO Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adoto o relatório constante da sentença (Ev. 26 - 1G): Trata-se de mandado de segurança impetrado por INDUSTRIA ERVATEIRA BONETES LTDA em desfavor do GERENTE DA 14ª GERÊNCIA REGIONAL DA FAZENDA ESTADUAL - ESTADO DE SANTA CATARINA - MAFRA - ESTADO DE SANTA CATARINA - MAFRA. Alega, em suma, que: a) é uma sociedade empresária cujo objeto social é o beneficiamento, moagem e preparação de erva-mate e outros produtos de origem vegetal; beneficiamento de chá, mate e outras ervas para infusão; comércio atacadista e varejista de cereais em geral, comercialização de artigos de iluminação, velas; comercialização de cuias e bombas para chimarrão, inclusive garrafas térmicas; comercialização de materiais de construção em geral; Importação e comercialização de alho, cebola, azeitona e outros; Transporte rodoviário de cargas em geral municipal; Transporte rodoviário de cargas em geral intermunicipal, interestadual e internacional; Importações e exportações; e Prestação de serviços de beneficiamento e/ou empacotamento de erva mate, chá e cereais em geral e comercio atacadista especializado em outros produtos alimentícios, conforme disposto em seu contrato social e cadastro nacional de pessoa jurídica – CNPJ; b) sujeita-se ao recolhimento do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação – ICMS; c) em razão da imunidade específica prevista no artigo 155, § 2º, X, alínea "a", da Constituição Federal, tem direito ao creditamento do saldo credor do ICMS das mercadorias para exportação, o que vem sendo negado pelo impetrado. Nesse contexto, requer a concessão da liminar para fim de impedir que a autoridade coatora obste a impetrante em realizar a transferência imediata dos créditos de ICMS disponíveis para utilização de 100% (cem por cento), para terceiro a ser indicado nas notas fiscais de transferências de créditos fiscais que serão apresentadas pela empresa para a SEFAZ- SC. A liminar foi deferida ao evento 11. Informações apresentadas ao evento 20. O Ministério Público não opinou em relação ao mérito (evento 24). Vieram os autos conclusos. Adito que, no ato compositivo da lide, sobreveio comando de outorga da segurança pleiteada pela impetrante (Ev. 26 - 1G). Os embargos de declaração opostos (Ev. 33 - 1G) foram acolhidos nos seguintes termos (Ev. 40 - 1G): Ante o exposto, conheço os presentes embargos de declaração , eis que tempestivos e dou -lhes provimento para o fim de sanar a obscuridade constante na sentença prolatada ao evento 26 , cujo dispositivo será acrescido dos seguintes termos: [...] Em que pese a isenção do ente público, está obrigado a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo pelo(s) vencedor(es), conforme art. 82, § 2º, do CPC". [...] Na forma do art. 1.026 do CPC, devolva-se o prazo para eventuais recursos. (destaques mantidos) Transcorrido in albis o prazo para interposição de reclamo voluntário, os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça em virtude da remessa oficial. Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça pelo conhecimento e desprovimento da remessa (Ev. 10 - 2G). É o relatório. Decido. 1. O reexame oficial deve ser conhecido (art. 14, § 1º, da Lei n. 12.016/2009). 2. Viável o julgamento monocrático, na forma do ditado no art. 932, IV e VIII, do Código de Processo Civil e art. 132, XV do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. 3. A decisão de primeiro grau, que concedeu a segurança para "reconhecer o direito da empresa impetrante de realizar transferências com a totalidade dos créditos disponíveis e que venha a acumular de ICMS, sem limitações, para terceiros a serem indicados nas Notas Fiscais de transferências de créditos fiscais que serão apresentadas pela empresa impetrante para a SEFAZ-SC" (Ev. 26 - 1G), deve ser conservada. Nesse sentido, retomo as considerações vertidas no julgado (Ev. 26 - 1G), que bem equacionam a celeuma retratada no feito - razão pela qual também as tenho por razões de decidir, com a devida vênia: O mandado de segurança será concedido para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data , sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação, ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. Essa é a dicção do art. 1º da Lei n.º 12.016/2009. A preliminar apresentada pelo impetrado - ausência de direito líquido e certo - se confunde com o mérito e com ele deve ser analisada. Do mesmo modo, não há que se falar em decadência. Tratando-se de mandado de segurança de obrigação de trato sucessivo, que se renova periodicamente, como ocorre na espécie, o marco inicial para a contagem do prazo decadencial não pode ser a data da norma cujos efeitos são impugnados . É o entendimento do colendo STJ: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DA RESTRIÇÃO, ESTABELECIDA PELO DECRETO 44.945, DE 10/09/2014, DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, À ISENÇÃO DO ICMS, PREVISTA NA LEI ESTADUAL 4.177, DE 2003, COM AS ALTERAÇÕES DAS LEIS ESTADUAIS 5.703 E 5.814, DE 2010. ILEGITIMIDADE DO SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA PARA FIGURAR, COMO AUTORIDADE IMPETRADA, NO POLO PASSIVO DO MANDADO DE SEGURANÇA. PRECEDENTES DO STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, RESTANDO PARCIALMENTE PREJUDICADO O RECURSO ORDINÁRIO. [...] II. Na forma da jurisprudência do STJ, não se aplica o prazo de decadência, previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009 (art. 18 da Lei 1.533/51), em se tratando de impetração de mandado de segurança de natureza preventiva, sendo firme a orientação desta Corte, outrossim, no sentido de que, havendo obrigação de trato sucessivo, que se renova periodicamente, o marco inicial para a contagem do prazo decadencial não pode ser a data da norma cujos efeitos são impugnados. Em tal sentido: STJ, EREsp 546.259/PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, DJU de 12/09/2005; AgRg no Ag 1.160.776/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 13/11/2009; RMS 22.577/MT, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 21/10/2010; REsp 1.474.606/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 06/10/2017; AgRg no REsp 742.767/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJU de 03/10/2005; EREsp 1.164.514/AM, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, DJe de 25/02/2016; AgRg no AREsp 36.550/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe de 12/08/2016. III. No caso - em que se trata de Mandado de Segurança que visa o reconhecimento do alegado direito ao não recolhimento do ICMS, relação de trato sucessivo -, extrai-se da petição inicial o caráter preventivo do Mandado de Segurança, que contém pedido, nos termos em que formulado, para "garantir o direito líquido e certo da impetrante de não se sujeitar ao recolhimento do ICMS com supedâneo ilegal, por ser isenta em suas atividades, bem como declarar seu direito à compensação dos valores indevidamente recolhidos, nos termos da Súmula 213 do STJ". Assim, não há que se falar em decadência do direito à impetração do Mandado de Segurança, por se tratar de ação mandamental com caráter preventivo. No entanto, mesmo que afastado o fundamento do acórdão recorrido, ainda assim o processo deve ser extinto, de ofício, sem resolução do mérito, por motivação diversa. [...] (STJ, Segunda Turma, RMS nº 68.200/RJ, j. 15/02/2022). Logo, rejeito as preliminares e adianto que a segurança merece ser concedida. A controvérsia desta lide diz respeito à limitação imposta pelo art. 45, §1º, II, “d”, do Regulamento do ICMS/SC, que supostamente resulta em obstáculos injustificados à utilização legítima dos créditos advindos da imunidade constante no art. 155, § 2º, 'X', 'a' da CF/1988. Almeja a parte impetrante o reconhecimento de suposto direito líquido e certo de transferir o saldo credor acumulado de ICMS decorrente de operações de exportação, sem qualquer limitação ou restrição de aproveitamento impostas indevidamente pelo Estado. A Lei Complementar n. 87/1996 (Lei Kandir), que dispõe acerca do ICMS, estabelece em seus arts. 3º, II, e 25, §1º, que: "Art. 3º O imposto não incide sobre: [...] II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços; [...]" E: "Art. 25. Para efeito de aplicação do disposto no art. 24, os débitos e créditos devem ser apurados em cada estabelecimento, compensando-se os saldos credores e devedores entre os estabelecimentos do mesmo sujeito passivo localizados no Estado. § 1º Saldos credores acumulados a partir da data de publicação desta Lei Complementar por estabelecimentos que realizem operações e prestações de que tratam o inciso II do art. 3º e seu parágrafo único podem ser, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento: I - imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado; II - havendo saldo remanescente, transferidos pelo sujeito passivo a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito. [...]" Já a Lei Estadual n. 10.297/1996, no mesmo sentido, informa que: "Art. 7 º O imposto não incide sobre: [...] II – operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços; [...] Parágrafo único. Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a: I – empresa comercial exportadora, inclusive "tradings" ou outro estabelecimento da mesma empresa; II – armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro." E: "Art. 31. Saldos credores acumulados por estabelecimentos que realizem operações e prestações de que tratam o art. 7º, inciso II, e seu parágrafo único, poderão, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento, ser transferidos, na forma prevista em regulamento: I – a qualquer estabelecimento do mesmo titular, neste Estado; II – havendo saldo remanescente, a outros contribuintes deste Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito. [...]" Desse modo, nota-se que a única limitação legal para a transferência dos créditos de ICMS acumulados por empresa nas operações de exportação é que se mantenha a proporcionalidade entre os valores acumulados pela exportação e o total de saídas realizadas pelo estabelecimento. Não obstante o caso de exportação possuir direito a crédito de ICMS, podendo ser transferido, o Regimento do ICMS estadual prevê limites para essa transferência: Art. 45. O controle do c rédito acumulado transferível, previsto no art. 40, § 3°, no art. 42 e no art. 44, II, será efetuado pelo estabelecimento transmitente, em quadro específico da DIME, segundo sua origem. § 1º O valor do crédito acumulado transferível será: I - determinado com base no saldo existente no período de apuração imediatamente anterior; II – limitado ao saldo credor existente em conta gráfica, deduzido: a) do saldo credor recebido de estabelecimentos consolidados, conforme disposto no art. 56 deste Regulamento; b) do crédito recebido de outros contribuintes por meio do documento denominado Autorização para Utilização de Crédito (AUC), previsto no art. 52 deste Regulamento; c) do crédito estornado por determinação da autoridade fiscal responsável pela análise do pedido de reserva previsto no art. 48 deste Regulamento; d) dos créditos que foram objeto de notificação fiscal, ainda não definitivamente julgados . Além disso, o art. 40, § 4º, do RICMS/SC/01 estabelece: “§ 4º O saldo credor acumulado, na hipótese do § 3º, I, poderá também: II – Ser alienado a outros contribuintes deste Estado, de acordo com a disponibilidade financeira do erário, para: ” Todavia, já se encontra consolidado o entendimento de que são ilegais essas limitações impostas pelo Estado . O Tribunal de Justiça de Santa Catarina entende, de maneira majoritária, que outras limitações adicionais previstas em ato regulador pelo estado para a transferência de tais créditos são manifestamente ilegais. Veja-se: MANDADO SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - ICMS - TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ACUMULADOS DECORRENTES DE OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO - LIMITAÇÕES IMPOSTAS POR DECRETO NÃO PREVISTAS NAS LEIS KANDIR E ESTADUAL - ILEGALIDADE - CONCESSÃO DA ORDEM MANTIDA. 1. A desoneração das operações de exportação confere, por conta da não cumulatividade do ICMS, direito ao aproveitamento do crédito relativo às operações anteriores à remessa ao exterior (está na Constituição Federal, na Lei Complementar 87/96 e na Lei Estadual 10.297/1996). Então, os créditos de ICMS acumulados por empresa exportadora podem ser (a) aproveitados na sua conta gráfica para compensação com os débitos dos seus estabelecimentos localizados no Estado e (b) transferidos (se ainda lhe restar saldo credor) a outros contribuintes do mesmo Estado (art. 25, §1º, da Lei Kandir e art. 31, caput, da Lei Estadual 10.297/1996). 2. A única condição legítima para permitir a transferência é a manutenção da proporcionalidade entre os valores acumulados por conta das exportações e o total das saídas realizadas pelo estabelecimento. Esse equilíbrio garante que eventual saldo acumulado decorrente de operações da empresa destinadas ao mercado interno não tenham o mesmo tratamento daquele saldo apurado por conta das operações destinadas à exportação. 3. O art. 45 do RICMS, ao tratar do controle do crédito acumulado transferível, previsto no art. 40, § 3º, não fez distinção entre os incs. I e II deste dispositivo, acabando por impor ilegalmente limitações à possibilidade de transferência de créditos sobre os saldos acumulados das operações de exportação. Compreensão, aliás, convergente com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o art. 25, § 1º, da Lei Complementar 87/1996 é autoaplicável e não admite a imposição de outras restrições por lei estadual ou decreto. 4. Apelação e remessa necessária desprovida. (TJSC, Apelação n. 5034684-27.2022.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 18-06-2024). APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. TRANSFERÊNCIA INTEGRAL DOS CRÉDITOS VINCULADOS ÀS VENDAS DESTINADAS À EXPORTAÇÃO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA NA ORIGEM. IRRESIGNAÇÃO DO ESTADO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NO PROCEDIMENTO ADOTADO PELO FISCO. TESE IMPROFÍCUA. RECONHECIDO O DIREITO DE CREDITAMENTO. LIMITAÇÕES IMPOSTAS POR DECRETO NÃO PREVISTAS NAS LEIS KANDIR E ESTADUAL. INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000391-37.2023.8.24.0124, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. 07-05-2024). MANDADO SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - ICMS - TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ACUMULADOS DECORRENTES DE OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO - LIMITAÇÕES IMPOSTAS POR DECRETO NÃO PREVISTAS NAS LEIS KANDIR E ESTADUAL - ILEGALIDADE - CONCESSÃO DA ORDEM MANTIDA. "1. A desoneração das operações de exportação confere, por conta da não cumulatividade do ICMS, direito ao aproveitamento do crédito relativo às operações anteriores à remessa ao exterior (está na Constituição Federal, na Lei Complementar Nacional 87/96 e na Lei Estadual 10.297/1996). Então, os créditos de ICMS acumulados por empresa exportadora podem ser: (a) aproveitados na sua conta gráfica para compensação com os débitos dos seus estabelecimentos localizados no Estado, e (b) (se ainda lhe restar saldo credor) transferidos a outros contribuintes do mesmo Estado (art. 25, §1º, da LC 87/1996 e art. 31, caput, da Lei Estadual 10.297/1996). 2. A única condição legal para permitir a transferência desses créditos é a manutenção da proporcionalidade entre os valores acumulados por conta das exportações e o total das saídas realizadas pelo estabelecimento. Esse equilíbrio garante que eventual saldo acumulado decorrente de operações da empresa destinadas ao mercado interno não tenham o mesmo tratamento daquele saldo apurado por conta das operações destinadas à exportação. 3. As limitações impostas por decreto regulamentador, que condicionam a transferência à disponibilidade financeira do Erário e ao estabelecimento de limites adicionais (como a necessidade de investimentos da empresa cedente em projetos de expansão de atividades ou na criação de novos negócios em território catarinense com um cronograma físico-financeiro e metas a serem cumpridas) , são ilegais. Compreensão, aliás, convergente com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o art. 25, § 1º, da LC 87/1996 é auto-aplicável e não admite a imposição de outras restrições por lei estadual ou decreto. 4. Recurso e reexame desprovidos."(TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5037774-66.2020.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 07-03-2023). (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5003988-64.2021.8.24.0033, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 18-07-2023). MANDADO SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - ICMS - TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ACUMULADOS DECORRENTES DE OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO - LIMITAÇÕES IMPOSTAS POR DECRETO NÃO PREVISTAS NAS LEIS KANDIR E ESTADUAL - ILEGALIDADE - CONCESSÃO DA ORDEM MANTIDA. 1. A desoneração das operações de exportação confere, por conta da não cumulatividade do ICMS, direito ao aproveitamento do crédito relativo às operações anteriores à remessa ao exterior (está na Constituição Federal, na Lei Complementar Nacional 87/96 e na Lei Estadual 10.297/1996). Então, os créditos de ICMS acumulados por empresa exportadora podem ser: (a) aproveitados na sua conta gráfica para compensação com os débitos dos seus estabelecimentos localizados no Estado, e (b) (se ainda lhe restar saldo credor) transferidos a outros contribuintes do mesmo Estado (art. 25, §1º, da LC 87/1996 e art. 31, caput, da Lei Estadual 10.297/1996). 2. A única condição legal para permitir a transferência desses créditos é a manutenção da proporcionalidade entre os valores acumulados por conta das exportações e o total das saídas realizadas pelo estabelecimento. Esse equilíbrio garante que eventual saldo acumulado decorrente de operações da empresa destinadas ao mercado interno não tenham o mesmo tratamento daquele saldo apurado por conta das operações destinadas à exportação. 3. As limitações impostas por decreto regulamentador, que condicionam a transferência à disponibilidade financeira do Erário e ao estabelecimento de limites adicionais (como a necessidade de investimentos da empresa cedente em projetos de expansão de atividades ou na criação de novos negócios em território catarinense com um cronograma físico-financeiro e metas a serem cumpridas), são ilegais. Compreensão, aliás, convergente com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o art. 25, § 1º, da LC 87/1996 é auto-aplicável e não admite a imposição de outras restrições por lei estadual ou decreto. 4. Recurso e reexame desprovidos. (TJSC, Apelação/Remessa Necessária n. 5037774-66.2020.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 07-03-2023). No mesmo sentido também já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 18 E 485, VI, DO CPC E 97, 99 E 111 DO CTN. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS DE ICMS ACUMULADOS EM DECORRÊNCIA DE EXPORTAÇÃO DE MERCADORIAS. APROVEITAMENTO DOS CRÉDITOS POR TERCEIRO ADQUIRENTE. LIMITAÇÃO POR NORMA REGULAMENTAR LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. CONSONÂNCIA DO ACÓRDÃO COM JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. 1. O Tribunal de origem não se pronunciou sobre a alegação trazida no apelo nobre acerca da aventada ofensa aos arts. 18 e 485, VI, do CPC e 97, 99 e 111 do CTN, tampouco foram opostos embargos declaratórios para suprir eventual omissão. Portanto, ante a falta do necessário prequestionamento, impossível o conhecimento do recurso especial no ponto, à incidência da Súmula 282/STF. 2. O disposto no art. 25, § 1º, da Lei Complementar n. 87/96, que trata do aproveitamento de créditos de ICMS acumulados em decorrência de operações de exportação , cuida de norma de eficácia plena, não sendo permitido à lei local impor qualquer restrição ou vedação à transferência dos referidos créditos, porquanto resultaria em infringência ao princípio da não cumulatividade. Precedentes. 3. O acórdão recorrido se encontra em consonância com a jurisprudência desta Corte no sentido de que o Estado federado exorbita de seu poder regulamentar ao limitar o aproveitamento dos créditos de ICMS de exportação de mercadorias por empresa cessionária. Precedentes: AgInt no REsp 1.888.109/RS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 16/11/2020, DJe 19/11/2020; AgInt no AREsp n. 1.921.101/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 23/5/2022, DJe de 26/5/2022; e AgRg no AREsp 187.884/RS, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 18/6/2014. 4. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp n. 2.184.718/RS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 11/9/2023, DJe de 14/9/2023) Por conseguinte, diferentemente do alegado pelo impetrado, não pode o estado impor limitações nas transferências de créditos de ICMS decorrentes de operações de exportação já homologados pelo fisco, mesmo constando em ato normativo, visto que o art. 25, §1º, da Lei Complementar n. 87/1996 e o art. 31 da Lei 10.297/1996 são normas de eficácia plena e que buscam efetivar o princípio da não cumulatividade, não podendo, portanto, terem sua aplicação limitada. Dessa forma, mostra-se plenamente possível a transferência da totalidade dos créditos acumulados de ICMS decorrentes de operações de exportação e já homologados pelo fisco pela empresa impetrante, nos termos do art. 25, §1º, da Complementar n. 87/1996 e do art. 31 da Lei Estadual n. 10.297/1996, não se admitindo restrições adicionais de outras normas para tanto. [...] (realces mantidos) Em reforço, pontuou a douta representante do Órgão Ministerial (Ev. 10 - 2G): Cinge-se a controvérsia acerca da ilegalidades das limitações para a transferência de créditos de ICMS acumulados nas operações de exportação impostas pelos arts. 40, 45, 52-C a 52-E do Regulamento do ICMS (RICMS/SC/01), ofendendo assim ao disposto no art. 155, § 2º, inciso X, alínea 'a' da Constituição Federal e art. 25, § 1º, inciso II da Lei Complementar n. 87/1996 (Lei Kandir). [...] Conforme bem pontuado na sentença vergastada, "a única limitação legal para a transferência dos créditos de ICMS acumulados por empresa nas operações de exportação é que se mantenha a proporcionalidade entre os valores acumulados pela exportação e o total de saídas realizadas pelo estabelecimento". Contudo, o Regulamento do ICMS estadual (RICMS/SC/01) prevê uma série de limitações para tal transferência, violando o direito líquido e certo da impetrante. [...] A questão não exige maiores considerações, uma vez que consolidado o entendimento jurisprudencial acerca da ilegalidade das limitações impostas pelo Estado de Santa Catarina, a saber: APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ACUMULADOS DE ICMS. OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO. LIMITAÇÃO IMPOSTA POR DECRETO NÃO PREVISTA NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. DESCABIMENTO. SENTENÇA CONCESSIVA DA ORDEM MANTIDA. RECURSO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDOS. "1. A desoneração das operações de exportação confere, por conta da não cumulatividade do ICMS, direito ao aproveitamento do crédito relativo às operações anteriores à remessa ao exterior (está na Constituição Federal, na Lei Complementar 87/96 e na Lei Estadual 10.297/1996). Então, os créditos de ICMS acumulados por empresa exportadora podem ser (a) aproveitados na sua conta gráfica para compensação com os débitos dos seus estabelecimentos localizados no Estado e (b) transferidos (se ainda lhe restar saldo credor) a outros contribuintes do mesmo Estado (art. 25, §1º, da Lei Kandir e art. 31, caput, da Lei Estadual 10.297/1996). 2. A única condição legítima para permitir a transferência é a manutenção da proporcionalidade entre os valores acumulados por conta das exportações e o total das saídas realizadas pelo estabelecimento . Esse equilíbrio garante que eventual saldo acumulado decorrente de operações da empresa destinadas ao mercado interno não tenham o mesmo tratamento daquele saldo apurado por conta das operações destinadas à exportação. 3. O art. 45 do RICMS, ao tratar do controle do crédito acumulado transferível, previsto no art. 40, § 3º, não fez distinção entre os incs. I e II deste dispositivo, acabando por impor ilegalmente limitações à possibilidade de transferência de créditos sobre os saldos acumulados das operações de exportação. Compreensão, aliás, convergente com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o art. 25, § 1º, da Lei Complementar 87/1996 é autoaplicável e não admite a imposição de outras restrições por lei estadual ou decreto. 4. Apelação e remessa necessária desprovidas." (TJSC, Apelação n. 5034684-27.2022.8.24.0008, Rel. Des. Hélio do Valle Pereira, j. em 18.6.2024). (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5044742-73.2024.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 13-05-2025 – grifou-se). MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS. OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO. SENTENÇA CONCESSIVA DA SEGURANÇA PARA AUTORIZAR A TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS NA TOTALIDADE DOS CRÉDITOS DE ICMS ACUMULADOS, SEM AS RESTRIÇÕES IMPOSTAS PELA LEGISLAÇÃO ESTADUAL. APELAÇÃO INTERPOSTA PELO ESTADO DE SANTA CATARINA. A) ALEGAÇÃO DE QUE NÃO HÁ DIREITO LÍQUIDO E CERTO A AMPARAR O PLEITO DO IMPETRANTE, POIS O PROCEDIMENTO ESTÁ PREVISTO NOS ARTIGOS 40 A 52-E DO RICMS/SC/01, ALÉM DE SER NECESSÁRIA A VERIFICAÇÃO DA PROPORCIONALIDADE DO SALDO CREDOR E A DISPONIBILIDADE FINANCEIRA DO ERÁRIO E EVENTUAL PREJUÍZO A ESTE. DESPROVIMENTO. AS NORMAS CONTIDAS NO ART. 25, § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR N. 87/1996 E NO ART. 31 DA LEI 10.297/1996 SÃO DE EFICÁCIA PLENA NÃO SENDO POSSÍVEL A LIMITAÇÃO EM LEGISLAÇÃO ESTADUAL, SOB PENA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DO TJSC. B) ARGUMENTO DE QUE HOUVE AFRONTA AOS TEMAS 619 E 633 DO STF. INAPLICABILIDADE. O TEMA 633 DO STF RELACIONA-SE AO APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS DECORRENTES E AQUISIÇÕES DESTINADOS AO USO E CONSUMO DA PRÓPRIA EMPRESA. O TEMA 619 DO STF TANGE AOS BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO DA EMPRESA. O PRESENTE FEITO TRATA DE TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITO RELATIVO A OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO. IRRELEVÂNCIA DOS TEMAS SUSCITADOS PARA A SOLUÇÃO DA LIDE. C) ASSERTIVA DE QUE O MANDADO DE SEGURANÇA NÃO É CABÍVEL CONTRA LEI EM TESE. INDEFERIMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO EM QUE SE VERIFICA O JUSTO RECEIO DA EMPRESA AUTORA DE LHE SER VIOLADO O DIREITO À TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ANTE AS LIMITAÇÕES IMPOSTAS NA LEGISLAÇÃO QUESTIONADA. INSURGÊNCIA AOS EFEITOS CONCRETOS DA APLICAÇÃO DAS NORMAS QUESITONADAS E NÃO MERA IMPUGNAÇÃO CONTRA LEI EM TESE. INTELIGÊNCIA DO ART. 1º DA LEI N. 12.016/2009. PPECEDENTES. D) ARGUIÇÃO DE QUE DEVE SER OBSERVADO O TEMA 1.262 DO STF, DIANTE DA NECESSIDADE DE OBSERVAR O SISTEMA DOS PRECATÓRIOS (ART. 100 DA CF). DESPROVIMENTO. MERO RECONHECIMENTO DO DIREITO DA EMPRESA IMPETRANTE EM REALIZAR AS TRANSFERÊNCIAS EM SUA TOTALIDADE DOS CRÉDITOS ACUMULADOS, A SER REALIZADO NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO, O QUE NÃO IMPORTA A RESTITUIÇÃO VEDADA NO TEMA 1.262 DO STF. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. SEM HONORÁRIOS RECURSAIS NA ESPÉCIE (ART. 25 DA LEI N. 12.016/2009). (TJSC, Apelação n. 5000387-97.2023.8.24.0124, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Denise de Souza Luiz Francoski, Quinta Câmara de Direito Público, j. 11-03-2025 – grifou-se). MANDADO SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - ICMS - TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ACUMULADOS DECORRENTES DE OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO - LIMITAÇÕES IMPOSTAS POR DECRETO NÃO PREVISTAS NAS LEIS KANDIR E ESTADUAL - ILEGALIDADE - CONCESSÃO DA ORDEM MANTIDA. 1. A desoneração das operações de exportação confere, por conta da não cumulatividade do ICMS, direito ao aproveitamento do crédito relativo às operações anteriores à remessa ao exterior (está na Constituição Federal, na Lei Complementar 87/96 e na Lei Estadual 10.297/1996). Então, os créditos de ICMS acumulados por empresa exportadora podem ser (a) aproveitados na sua conta gráfica para compensação com os débitos dos seus estabelecimentos localizados no Estado e (b) transferidos (se ainda lhe restar saldo credor) a outros contribuintes do mesmo Estado (art. 25, §1º, da Lei Kandir e art. 31, caput, da Lei Estadual 10.297/1996). 2. A única condição legítima para permitir a transferência é a manutenção da proporcionalidade entre os valores acumulados por conta das exportações e o total das saídas realizadas pelo estabelecimento. Esse equilíbrio garante que eventual saldo acumulado decorrente de operações da empresa destinadas ao mercado interno não tenham o mesmo tratamento daquele saldo apurado por conta das operações destinadas à exportação. 3. O art. 45 do RICMS, ao tratar do controle do crédito acumulado transferível, previsto no art. 40, § 3º, não fez distinção entre os incs. I e II deste dispositivo, acabando por impor ilegalmente limitações à possibilidade de transferência de créditos sobre os saldos acumulados das operações de exportação. Compreensão, aliás, convergente com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o art. 25, § 1º, da Lei Complementar 87/1996 é autoaplicável e não admite a imposição de outras restrições por lei estadual ou decreto. 4. Apelação e remessa necessária desprovidas. (TJSC, Apelação n. 5034684-27.2022.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 18-06-2024 – grifou-se). APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. FALTA DE PROVA DO ATO COATOR. TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITO DE ICMS PARA TERCEIROS. OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 25 DA LEI COMPLEMENTAR 87/1996. NORMA AUTOAPLICÁVEL. LIMITAÇÕES IMPOSTAS PELO RICMS/SC. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO E REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDOS E DESPROVIDOS. 1. À luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, exorbita do poder regulamentar do Estado restrições impostas por decreto que extrapolem as previsões contidas no art. 155, §2º, X, 'a', da Constituição Federal e no art. 25 da LC n. 87/1996 que asseguram o direito à transferência a terceiros de saldos de ICMS oriundos de operações de exportação. 2. Apelo e reexame necessário conhecidos e desprovidos. (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5009536-69.2022.8.24.0022, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Paulo Marcos de Farias, Segunda Câmara de Direito Público, j. 21-05-2024 – grifou-se). [...] Destarte, acertada a sentença que concedeu a ordem vindicada, não merecendo reparos. (negritos mantidos) Logo, evidenciado o direito líquido e certo da impetrante, irretocável o decisum . 4. Ante o exposto, conheço da remessa necessária, com a manutenção do julgado, nos termos da fundamentação. 5. Intimem-se.

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Processo nº 5001456-45.2024.4.03.6140

ID: 338974637

Tribunal: TRF3 Órgão: 2ª Vara Federal de Santo André Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5001456-45.2024.4.03.6140

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

CICERO LUIZ RODRIGUES

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

ROSELENE DOS SANTOS SILVA PAIVA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001456-45.2024.4.03.6140 AUTOR: CICERO LUIZ RODRIGUES ADVOGADO do(a) AUTOR: ROSELENE DOS SANTOS SILVA PAIVA - SP386146 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS… PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001456-45.2024.4.03.6140 AUTOR: CICERO LUIZ RODRIGUES ADVOGADO do(a) AUTOR: ROSELENE DOS SANTOS SILVA PAIVA - SP386146 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA TIPO A Vistos, etc. Trata-se de ação de procedimento comum proposta por CÍCERO LUIZ RODRIGUES, nos autos qualificado, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, perante a 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Mauá, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB 204.078.210-3, requerido em 12/07/2022. Subsidiariamente, pleiteia a reafirmação da DER. Narra o autor que, em 12/09/2018, requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/187.942.560-0 e houve o indeferimento do benefício, considerando que apurados 30 anos, 01 mês e 24 dias de tempo de contribuição. Inconformado, interpôs recurso administrativo e a 2ª Composição Adjunta da 13ª Junta de Recursos do Conselho da Previdência Social – CRPS solicitou diligência preliminar para que o segurado comprovasse a atividade nos anos de 2004, 2005 e 2007. Alega que entregou a documentação solicitada e PPP comprovando o exercício de atividade especial na Agência da Previdência Social de Mauá, e houve nova contagem de tempo de contribuição, alcançando 33 anos e 24 dias na data do requerimento administrativo, com o enquadramento do período de 03/08/1987 a 05/03/1997 como especial. Reporta que foi negado provimento ao recurso administrativo, pois não foi possível o enquadramento como especial do período de 06/03/1997 a 13/02/2002, laborado na empresa Liquigás Distribuidora. Relata que, em 12/07/2022, efetuou novo requerimento administrativo para concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 204.078.210-3) e que houve o indeferimento do pedido, sob fundamento de que não contava com os requisitos previstos na EC 103/2019 ou de direito adquirido até 13/11/2019. Afirma que, considerando o tempo de contribuição apurado no primeiro requerimento administrativo, de 33 anos e 24 dias até 12/09/2018, conta com os requisitos necessários para concessão do benefício na DER 12/07/2022. Por fim, busca a condenação do réu ao pagamento das parcelas devidas e não pagas desde a DER, corrigidas e aplicados os juros legais, bem como honorários advocatícios. A inicial veio instruída com documentos. Deferidos os benefícios da Justiça gratuita e afastada a relação de prevenção com o processo que tramitou sob nº 0002176-46.2019.403.6343 (ID 353079048). Regularmente citado, o réu apresentou a contestação do ID 360379000. Suscita a preliminar de ausência de interesse de agir quanto ao período especial já reconhecido administrativamente pela autarquia. No mérito, discorre acerca da comprovação do tempo de serviço, sustenta a presunção relativa das anotações em CTPS e afirma que, para contribuinte individual, há a necessidade de contribuições por iniciativa própria e sem atraso. Discorre, ainda, acerca do tempo de contribuição do segurado facultativo e de período recolhido no plano simplificado e sustenta que o tempo de serviço indenizado após a EC 103/2019 impossibilita a concessão de aposentadoria com regra anterior à EC 103/2019. Pleiteia a improcedência do pedido. Houve réplica (ID 361135164). O autor manifestou desinteresse na produção de outras provas e os autos foram conclusos para sentença. Por fim, considerando o Provimento CJF3R nº 154, de 15 de maio de 2025, o qual, dentre outras providências, alterou a jurisdição das Varas Federais desta Subseção Judiciária de Santo André para incluir os municípios de Mauá e Ribeirão Pires, exceto nas matérias criminais, o presente feito foi redistribuído para este Juízo. É o relatório. Fundamento e decido. Partes legítimas e bem representadas; presentes as condições da ação e os pressupostos processuais de formação e de desenvolvimento válido e regular da relação processual. Afasto a preliminar de ausência de interesse de agir quanto ao período especial já reconhecido administrativamente, uma vez que o autor não pleiteia o reconhecimento de períodos especiais nesta ação. Outrossim, conforme já ressaltado pela decisão do ID 353079048, também não verifico a existência de coisa jugada com o feito de nº 0002176-46.2019.403.6343, uma vez que, naquela ação, o autor pretendia a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição na DER 12/09/2018, mediante o reconhecimento do período especial de 06/03/1997 a 13/02/2002, pedido diverso do formulado neste feito. Desta forma, a matéria posta em debate deve atender aos parâmetros legais estabelecidos a seguir. Os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, anteriormente à EC 103/2019, encontram-se previstos no artigo 9º da Emenda Constituição nº 20/98 e, basicamente, consistem em: a) tempo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para homem, e de 30 (trinta) anos, para mulher; b) contar com 53 (cinquenta e três) anos de idade, se homem, e 48 (quarenta e oito), se mulher. Prevê a lei, ainda, a concessão de aposentadoria proporcional se, atendido o requisito da idade, contar o segurado com um período adicional de contribuição equivalente a quarenta por cento do tempo que, na data da publicação da Emenda 20/98, faltaria para atingir o limite de tempo mínimo de 30 (trinta) anos, se homem ou 25 (vinte e cinco) anos, se mulher. Finalmente, restou assegurado o direito adquirido à concessão do benefício proporcional, nos termos anteriores à Emenda Constitucional nº 20/98, se completado o tempo de serviço mínimo de 30 (trinta) anos para homens e de 25 (vinte e cinco) anos para mulheres, independentemente do atendimento ao requisito idade mínima. Ainda, dispõe a Lei nº 8.213/91 a respeito da aposentadoria por tempo de contribuição sem incidência do fator previdenciário, com a redação dada pela Lei n. 13.183/15: “Art. 29-C. O segurado que preencher o requisito para a aposentadoria por tempo de contribuição poderá optar pela não incidência do fator previdenciário no cálculo de sua aposentadoria, quando o total resultante da soma de sua idade e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações, na data de requerimento da aposentadoria, for: (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) I - igual ou superior a noventa e cinco pontos, se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco anos; ou (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) II - igual ou superior a oitenta e cinco pontos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição de trinta anos. (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) § 1º Para os fins do disposto no caput, serão somadas as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade. (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) § 2º As somas de idade e de tempo de contribuição previstas no caput serão majoradas em um ponto em: (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) I - 31 de dezembro de 2018; (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) II - 31 de dezembro de 2020; (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) III - 31 de dezembro de 2022; (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) IV - 31 de dezembro de 2024; e (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015) V - 31 de dezembro de 2026. (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015)”. Com o advento da EC nº 103/2019, novas regras foram estabelecidas para a concessão da aposentadoria, resguardando, igualmente, o direito daqueles já vinculados ao RGPS, vejamos: “Art. 3º A concessão de aposentadoria ao servidor público federal vinculado a regime próprio de previdência social e ao segurado do Regime Geral de Previdência Social e de pensão por morte aos respectivos dependentes será assegurada, a qualquer tempo, desde que tenham sido cumpridos os requisitos para obtenção desses benefícios até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, observados os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão da aposentadoria ou da pensão por morte.” Outrossim, caso não implementados os requisitos para aposentadoria até 12/11/2019, foram estabelecidas as seguintes regras de transição: “Art. 15. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, fica assegurado o direito à aposentadoria quando forem preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e II - somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, equivalente a 86 (oitenta e seis) pontos, se mulher, e 96 (noventa e seis) pontos, se homem, observado o disposto nos §§ 1º e 2º. § 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a pontuação a que se refere o inciso II do caput será acrescida a cada ano de 1 (um) ponto, até atingir o limite de 100 (cem) pontos, se mulher, e de 105 (cento e cinco) pontos, se homem. § 2º A idade e o tempo de contribuição serão apurados em dias para o cálculo do somatório de pontos a que se referem o inciso II do caput e o § 1º. § 3º Para o professor que comprovar exclusivamente 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, se mulher, e 30 (trinta) anos de contribuição, se homem, em efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, será equivalente a 81 (oitenta e um) pontos, se mulher, e 91 (noventa e um) pontos, se homem, aos quais serão acrescidos, a partir de 1º de janeiro de 2020, 1 (um) ponto a cada ano para o homem e para a mulher, até atingir o limite de 92 (noventa e dois) pontos, se mulher, e 100 (cem) pontos, se homem. § 4º O valor da aposentadoria concedida nos termos do disposto neste artigo será apurado na forma da lei. Art. 16. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e II - idade de 56 (cinquenta e seis) anos, se mulher, e 61 (sessenta e um) anos, se homem. § 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade a que se refere o inciso II do caput será acrescida de 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem. § 2º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o tempo de contribuição e a idade de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão reduzidos em 5 (cinco) anos, sendo, a partir de 1º de janeiro de 2020, acrescidos 6 (seis) meses, a cada ano, às idades previstas no inciso II do caput, até atingirem 57 (cinquenta e sete) anos, se mulher, e 60 (sessenta) anos, se homem. § 3º O valor da aposentadoria concedida nos termos do disposto neste artigo será apurado na forma da lei. Art. 17. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional e que na referida data contar com mais de 28 (vinte e oito) anos de contribuição, se mulher, e 33 (trinta e três) anos de contribuição, se homem, fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e II - cumprimento de período adicional correspondente a 50% (cinquenta por cento) do tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem. Parágrafo único. O benefício concedido nos termos deste artigo terá seu valor apurado de acordo com a média aritmética simples dos salários de contribuição e das remunerações calculada na forma da lei, multiplicada pelo fator previdenciário, calculado na forma do disposto nos §§ 7º a 9º do art. 29 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Art. 18. O segurado de que trata o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 60 (sessenta) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem; e II - 15 (quinze) anos de contribuição, para ambos os sexos. § 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade de 60 (sessenta) anos da mulher, prevista no inciso I do caput, será acrescida em 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade. § 2º O valor da aposentadoria de que trata este artigo será apurado na forma da lei. Art. 19. Até que lei disponha sobre o tempo de contribuição a que se refere o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20(vinte) anos de tempo de contribuição, se homem. § 1º Até que lei complementar disponha sobre a redução de idade mínima ou tempo de contribuição prevista nos §§ 1º e 8º do art. 201 da Constituição Federal, será concedida aposentadoria: I - aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, nos termos do disposto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, quando cumpridos: a) 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 15 (quinze) anos de contribuição; b) 58 (cinquenta e oito) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 20 (vinte) anos de contribuição; ou c) 60 (sessenta) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição; II - ao professor que comprove 25 (vinte e cinco) anos de contribuição exclusivamente em efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio e tenha 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem. § 2º O valor das aposentadorias de que trata este artigo será apurado na forma da lei. Art. 20. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se voluntariamente quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem; II - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; III - para os servidores públicos, 20 (vinte) anos de efetivo exercício no serviço público e 5 (cinco) anos no cargo efetivo em que se der a aposentadoria; IV - período adicional de contribuição correspondente ao tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição referido no inciso II. § 1º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio serão reduzidos, para ambos os sexos, os requisitos de idade e de tempo de contribuição em 5 (cinco) anos. § 2º O valor das aposentadorias concedidas nos termos do disposto neste artigo corresponderá: I - em relação ao servidor público que tenha ingressado no serviço público em cargo efetivo até 31 de dezembro de 2003 e que não tenha feito a opção de que trata o § 16 do art. 40 da Constituição Federal, à totalidade da remuneração no cargo efetivo em que se der a aposentadoria, observado o disposto no § 8º do art. 4º; e II - em relação aos demais servidores públicos e aos segurados do Regime Geral de Previdência Social, ao valor apurado na forma da lei. § 3º O valor das aposentadorias concedidas nos termos do disposto neste artigo não será inferior ao valor a que se refere o § 2º do art. 201 da Constituição Federal e será reajustado: I - de acordo com o disposto no art. 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, se cumpridos os requisitos previstos no inciso I do § 2º; II - nos termos estabelecidos para o Regime Geral de Previdência Social, na hipótese prevista no inciso II do § 2º. § 4º Aplicam-se às aposentadorias dos servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios as normas constitucionais e infraconstitucionais anteriores à data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, enquanto não promovidas alterações na legislação interna relacionada ao respectivo regime próprio de previdência social”. RECONHECIMENTO DE TEMPO COMUM – CONTRIBUINTE INDIVIDUAL – COMPETÊNCIAS RECOLHIDAS EXTEMPORANEAMENTE a) Responsabilidade pelo pagamento das contribuições previdenciárias devidas pelo contribuinte individual Nos termos do art. 30, inciso II, da Lei n. 8.212/1991 (Lei de Custei da Previdência Social – LBPS), o contribuinte individual é responsável pelo recolhimento de suas contribuições previdenciárias, senão vejamos: Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas: (...) II - os segurados contribuinte individual e facultativo estão obrigados a recolher sua contribuição por iniciativa própria, até o dia quinze do mês seguinte ao da competência; Tal regramento, contudo, possui uma exceção: o contribuinte individual que, a partir da competência de abril/2003, tenha prestado serviços a empresas (pessoa jurídica) ou por meio de cooperativas de trabalho, visto que, nessas hipóteses, a obrigação pelo desconto e recolhimento das contribuições previdenciárias incidentes sobre a remuneração do segurado incumbe às empresas ou às cooperativas, na condição de substitutos tributários. Nesta senda, transcrevem-se os artigos 4º e 5º, da Lei n. 10.666/2003: Art. 4º Fica a empresa obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da competência, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia. § 1º As cooperativas de trabalho arrecadarão a contribuição social dos seus associados como contribuinte individual e recolherão o valor arrecadado até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao de competência a que se referir, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia. § 2º A cooperativa de trabalho e a pessoa jurídica são obrigadas a efetuar a inscrição no Instituto Nacional do Seguro Social - INSS dos seus cooperados e contratados, respectivamente, como contribuintes individuais, se ainda não inscritos. § 3º O disposto neste artigo não se aplica ao contribuinte individual, quando contratado por outro contribuinte individual equiparado a empresa ou por produtor rural pessoa física ou por missão diplomática e repartição consular de carreira estrangeiras, e nem ao brasileiro civil que trabalha no exterior para organismo oficial internacional do qual o Brasil é membro efetivo. Art. 5º O contribuinte individual a que se refere o art. 4o é obrigado a complementar, diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem inferiores a este. Da leitura das normas supratranscritas depreende-se que a situação do contribuinte individual que presta serviços à pessoa jurídica ou por intermédio de cooperativa, assemelha-se muito à condição do empregado ou do empregado doméstico, pois em tais situações o recolhimento da contribuição previdenciária do segurado é presumido e, portanto, as respectivas competências são computadas para todos os fins (tempo de contribuição e carência), independentemente de as contribuições previdenciárias terem sido solvidas pela empresa ou pela cooperativa, na medida em que o segurado não pode ser prejudicado pela inadimplência de terceiro. Porém, cumpre ressaltar que cabe ao contribuinte individual comprovar a efetiva prestação do serviço em favor de empresa ou por meio de cooperativa, mediante a apresentação de recibo de prestação de serviços a ele fornecido, no qual conste a razão ou denominação social, o CNPJ da empresa contratada, a retenção/destaque da contribuição previdenciária, o valor da remuneração percebida e a identificação do segurado (art. 32, inciso X, da IN n. 77/2015 do INSS). Lado outro, cumpre ressaltar que a benesse prevista no art. 4º da Lei n. 10.666/2003 não aproveita ao contribuinte individual empresário que participa da administração da pessoa jurídica à qual presta serviços, visto que, ao fim e ao cabo, é ele o próprio responsável pelo recolhimento de sua contribuição previdenciária, não podendo, portanto, se beneficiar da própria inadimplência. Logo, para o contribuinte empresário aplica-se, indistintamente, a regra geral insculpida no art. 30, inciso II, da Lei n. 8.212/1991 (Lei de Custeio da Previdência Social – LCPS). Nessa esteira, revela-se propícia a transcrição dos seguintes arestos que bem elucidam o ponto em comento: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL / EMPRESÁRIO. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RECOLHIMENTO A DESTEMPO. INCIDÊNCIA DE JUROS E MULTA. EMISSÃO DE GUIA DE RECOLHIMENTO. 1. A empresa, pessoa jurídica, é uma ficção, sempre administrada por uma pessoa natural - gerente, diretor etc. - que detém a responsabilidade de realizar os atos jurídicos em seu nome, razão pela qual não há como negar que a "vontade" da pessoa jurídica é, em última análise, a própria "vontade" daqueles administradores, sendo inevitável, portanto, concluir que, não obstante fosse a empresa responsável pelo desconto e recolhimento das contribuições previdenciárias devidas pelos segurados empregadores (Lei n. 3.807/60, art. 79; Decreto n. 48.959-A/60, art. 243; Decreto n. 60.501/1967, art. 176; Decreto n. 72.771/73, art. 235; e Decreto n. 83.081/79, art. 54), cabia, em verdade, aos próprios administradores o dever de recolhê-las, na condição de responsáveis pela empresa. 2. A partir de 24 de julho de 1991, a Lei n. 8.212/91, através de seu art. 30, inciso II, na redação original, atribuiu aos empresários - hoje denominados contribuintes individuais - a responsabilidade pelo recolhimento de suas contribuições. (...) (TRF 4ª Região, Apelação Cível n. 0002478-12.2017.4.04.9999, Relatora: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Órgão julgador: SEXTA TURMA, Data do julgamento: 31/05/2017, Data da Publicação: 08/06/2017) “(...) O ponto controverso da lide, e objeto da insurgência recursal, reside no fato de que o INSS não computou, quando do requerimento administrativo, e para fins de carência, os recolhimentos previdenciários efetuados pela empresa AR FERREIRA E OLIVEIRA CONSULTORIA EM INFORMÁTICA LTDA, com indícios de extemporaneidade, da qual a demandante seria sócia-empresária. 3. O empresário e o autônomo, segurados obrigatórios da Previdência Social, atual contribuinte individual, estão obrigados, por iniciativa própria, ao recolhimento das contribuições previdenciárias, não sendo possível a utilização de contribuições recolhidas fora do prazo para fins de carência, mesmo que indenizadas, independentemente de qualquer justificativa. (...) Quanto à alegação da autora de que a empresa em questão seria a responsável pela retenção e recolhimento das contribuições previdenciárias devidas pelos sócios, porquanto o artigo 4º da Lei 10.666/03 determina, literalmente, que “Fica a empresa obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da competência, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia”, entendo não lhe assistir razão, na medida em que se observa dos autos que a autora seria sócia do referido estabelecimento, sendo uma das responsáveis por seu empreendimento e, evidentemente, também pelo recolhimento dos tributos devidos. Não há como desonerá-la de uma obrigação que, em última instância, lhe é devida. (...) (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0349301-90.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 31/07/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/08/2020) “O autor completou 65 anos de idade em 17.01.2016 e pretende averbar o período laborado como sócio de empresa EMPREITEIRA SAMMES LTDA, INSCRITA NO CNPJ N. 45.873.502/0001-65, para CONCESSÃO de aposentadoria por idade desse 20.01.2016 (DER/NB 176.114.914-5) desde 01.10.2006, conforme Alteração de Contrato Social de fls. 36/39 do anexo 2. Por sua vez, a documentação anexada sob andamento 27 nada acrescenta em relação ao período de contribuição em discussão nos autos. Consta do apontado contrato a qualidade de sócio administrador do autor (cláusula quarta a sexta) e, assim, a responsabilidade deste na prestação de todas as contas da sociedade, inclusive no que se refere à distribuição do pró-labore e ao pagamento de dívidas fiscais e previdenciárias. Como o autor era sócio com poderes gerenciais, era indubitável a sua responsabilidade pela administração adequada dos valores pagos em sociedade, bem como da regularidade pelo pagamento em dia e individualização. Ou seja, a ausência de pagamento das contribuições de 01.10.2006 em diante são de responsabilidade do autor, como administrador da sociedade. O autor não pode ser enquadrado como mero contribuinte individual prestador de serviço à empresa em situação semelhante a de um empregado, visto que ele fazia parte do quadro societário da apontada empresa e não pode se beneficiar por sua inadimplência. Por sua vez, o CNIS possui cadastro da atividade de pedreiro autônomo em 1980, ratificando a sua responsabilidade no recolhimento das contribuições. A prova da atividade não é suficiente para averbação de todo o período (01.10.2006 até 20.01.2016/DER). Dessa forma, não é possível revisar o ato administrativo de indeferimento do benefício do INSS relativamente à DER 20.01.2016, pois, nesta data, o autor deixou de comprovar os valores recolhidos e delimitação do valor cabível a cada sócio, não sendo possível a alteração da soma administrativa de 139 contribuições, INSUFICIENTE para a concessão de aposentadoria em seu caso. (...) De fato, não há como reconhecer o período em que a parte autora alega ter sido empregada da empresa Empreiteira Sammes Ltda. Como sócio-administrador, o recolhimento das contribuições previdenciárias era sua responsabilidade. (TRJEF-SP, Recurso Inominado n. 0010305-40.2017.4.03.6301, Relatora: Juíza Federal GABRIELA AZEVEDO CAMPOS SALES, Órgão Julgador: 13ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO, Data do Julgamento: 16/12/2019, Data da Publicação/Fonte: e-DJF3 Judicial DATA: 26/12/2019) b) Requisitos para o reconhecimento de competências que não foram recolhidas tempestivamente pelo contribuinte individual O contribuinte individual, como espécie de segurado obrigatório, pode, a qualquer tempo, computar períodos em que deixou de efetuar o pagamento tempestivo das contribuições previdenciárias devidas, desde que logre provar o efetivo exercício da atividade laboral alegada e, a seguir, efetue o recolhimento das contribuições em atraso ou o pagamento da indenização ao sistema previdenciário. É o que se extrai do art. 29-A, §2º, §3º e §5º, combinado com o art. 55, §3º, da Lei n. 8.213/1991: Art. 29-A. O INSS utilizará as informações constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS sobre os vínculos e as remunerações dos segurados, para fins de cálculo do salário-de-benefício, comprovação de filiação ao Regime Geral de Previdência Social, tempo de contribuição e relação de emprego. § 1o O INSS terá até 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir da solicitação do pedido, para fornecer ao segurado as informações previstas no caput deste artigo. § 2o O segurado poderá solicitar, a qualquer momento, a inclusão, exclusão ou retificação de informações constantes do CNIS, com a apresentação de documentos comprobatórios dos dados divergentes, conforme critérios definidos pelo INSS. § 3o A aceitação de informações relativas a vínculos e remunerações inseridas extemporaneamente no CNIS, inclusive retificações de informações anteriormente inseridas, fica condicionada à comprovação dos dados ou das divergências apontadas, conforme critérios definidos em regulamento. § 4o Considera-se extemporânea a inserção de dados decorrentes de documento inicial ou de retificação de dados anteriormente informados, quando o documento ou a retificação, ou a informação retificadora, forem apresentados após os prazos estabelecidos em regulamento. § 5o Havendo dúvida sobre a regularidade do vínculo incluído no CNIS e inexistência de informações sobre remunerações e contribuições, o INSS exigirá a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação, sob pena de exclusão do período. Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado: (...) § 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. Como argutamente destacado pelo Exmo. Juiz Federal ERIVALDO RIBEIRO DOS SANTOS, no julgamento do Recurso Inominado n. 5016517-56.2018.4.04.7003/PR, caso fosse admitido o recolhimento de contribuições previdenciárias em atraso pelo contribuinte individual, independentemente da efetiva comprovação do exercício da atividade, haveria nítida burla e desvirtuamento do caráter securitário da previdência social, visto que o segurado poderia deixar de contribuir durante grande parte sua vida laboral (deixando de participar do “jogo previdenciário”) e, ao final, quando preenchidos os demais requisitos para a obtenção do benefício pretendido, recolher retroativamente apenas o número mínimo de contribuições necessárias para a obtenção do benefício previdenciário, o que se assemelharia, em termos práticos, a uma espécie de “compra” de benefício e não de participação de um regime securitário. Nesse sentido, transcrevem-se as pertinentes colocações do insigne magistrado federal: “Deste modo, a princípio, não há óbices ao cômputo do tempo de serviço do período contributivo recolhido em atraso. Porém, deve haver comprovação do exercício de atividade remunerada no período em que se requer o cômputo, sob pena de ferir o caráter de seguro do sistema, o qual garante, mediante contribuição - e esta deve ser prévia, pois se trata de um seguro - a universalidade de participação nos planos previdenciários (artigo 3º, parágrafo único, aliena 'a', Lei 8.212/91). Se fosse permitido o recolhimento de contribuições em atraso de períodos que não fossem de atividade, haveria burla ao sistema, que deixaria de ser um seguro para uma espécie de "compra" de um benefício, o que, a considerar o sistema de solidariedade vigente na Previdência Social brasileira, poderia resultar na perda do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema.” (TRJEF-PR, Recurso Inominado n. 5016517-56.2018.4.04.7003, Relator: Juiz Federal ERIVALDO RIBEIRO DOS SANTOS, Órgão Julgador: 3ª TURMA RECURSAL, julgado em 29/11/2019) Lado outro, quanto ao pagamento das competências não solvidas no tempo adequado, cumpre diferenciar o recolhimento de contribuições em atraso do pagamento de indenização ao sistema previdenciário. Desde que comprovado o exercício da atividade laboral, as contribuições previdenciárias atinentes a competências que não foram alcançadas pela decadência do direito de o fisco constituir o crédito tributário (art. 173 do CTN e art. 348 do RPS), podem ser solvidas em atraso pelo segurado, mediante o recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, acrescido dos respectivos encargos moratórios. Todavia, caso as competências que o segurado deseja pagar tenham sido atingidas pela decadência do direito de a administração fazendária constituir o crédito tributário (art. 173 do CTN e art. 348 do RPS), deixa de ser possível o recolhimento em atraso das contribuições previdenciárias, passando a ser necessária a abertura de processo administrativo perante o INSS para que seja autorizado o pagamento de indenização ao sistema previdenciário, na forma do art. 45-A da Lei n. 8.212/1991 (LCPS). c) Recolhimento de contribuições previdenciárias de competências ANTERIORES ao pagamento da primeira contribuição sem atraso Na hipótese de o segurado pretender efetuar o recolhimento em atraso de competências não atingidas pela decadência, anteriores à sua inscrição como contribuinte individual (art. 18, IV, “a”, do RPS e art. 21 da IN n. 77/2015 do INSS), deverá apresentar, perante a autarquia previdenciária, requerimento de Retroação da Data do Início das Contribuições – DIC. Conforme previsto no art. 124 do RPS e no art. 23 da IN n. 77/2015 do INSS, a retroação da DIC depende da comprovação do exercício da atividade e o pagamento do valor calculado pelo INSS, conforme a sistemática prevista no art. 216, §11 e §14, do RPS. Confira-se: Da Retroação da Data do Início das Contribuições Art. 124. Caso o segurado contribuinte individual manifeste interesse em recolher contribuições relativas a período anterior à sua inscrição, a retroação da data do início das contribuições será autorizada, desde que comprovado o exercício de atividade remunerada no respectivo período, observado o disposto no § 7º e nos § 9º ao § 14 do art. 216 e nos § 8º e § 8º-A do art. 239. Parágrafo único. O valor do débito poderá ser objeto de parcelamento desde que solicitado pelo segurado à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia. (REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – RPS – Decreto n. 3.048/1999) Do reconhecimento do tempo de filiação e da retroação da data do início das contribuições - DIC Art. 22. Reconhecimento de filiação é o direito do segurado de ter reconhecido, em qualquer época, o tempo de exercício de atividade anteriormente abrangida pela Previdência Social. Art. 23. Considera-se Retroação de Data do Início da Contribuição- DIC o reconhecimento de filiação em período anterior à inscrição mediante comprovação de atividade e recolhimento das contribuições. (INSTRUÇÃO NORMATIVA N. 77/2015 DO INSS) Lado outro, para efetuar o recolhimento em atraso de competências não atingidas pela decadência, posteriores à inscrição do segurado como contribuinte individual, porém, anteriores ao pagamento da primeira contribuição sem atraso, bastará a comprovação da efetiva prestação do labor e o recolhimento das contribuições previdenciárias em atraso. Contudo, cumpre ressaltar que, nos termos do art. 27, inciso II, da Lei n. 8.213/1991, as contribuições vertidas em atraso, atinentes a competências anteriores à primeira contribuição previdenciária solvida tempestivamente, poderão ser computadas como tempo de contribuição, porém, não como carência. Vejamos: Art. 27. Para cômputo do período de carência, serão consideradas as contribuições: (...) II - realizadas a contar da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, no caso dos segurados contribuinte individual, especial e facultativo, referidos, respectivamente, nos incisos V e VII do art. 11 e no art. 13. (LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – LBPS – Lei n. 8.213/1991) d) Recolhimento de contribuições previdenciárias de competências POSTERIORES ao pagamento da primeira contribuição sem atraso As competências em atraso, referentes a período posterior à primeira contribuição previdenciária recolhida em dia, poderão ser solvidas e serão computadas para fins de carência e tempo de contribuição desde que atendidas 2 (duas) condições: 1) que as contribuições previdenciárias não tenham sido alcançadas pela decadência do direito de o fisco constituir o crédito tributário (art. 173 do CTN e art. 348 do RPS), e; 2) que na data do recolhimento das contribuições em atraso a parte mantenha a qualidade de segurado. Nesse sentido, se traz à baila os seguintes julgados: PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. APOSENTADORIA. INVALIDEZ PERMANENTE. CONTRIBUIÇÕES EFETUADAS COM ATRASO, POSTERIORMENTE AO PRIMEIRO RECOLHIMENTO EFETUADO SEM ATRASO. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE, DESDE QUE PRESERVADA A CONDIÇÃO DE SEGURADO. PEDIDO PROCEDENTE. 1. É da data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso que se inicia a contagem do período de carência quando se tratar de contribuinte individual. Precedentes. 2. Nos termos do art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991, não são consideradas, para fins de cômputo do período de carência, as contribuições recolhidas com atraso, referentes a competências anteriores à data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso. 3. Impõe-se distinguir, todavia, o recolhimento, com atraso, de contribuições referentes a competências anteriores ao início do período de carência, daquele recolhimento, também efetuado com atraso, de contribuições relativas a competências posteriores ao efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso (início do período de carência). 4. Na segunda hipótese, desde que não haja a perda da condição de segurado, não incide a vedação contida no art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991. 5. Hipótese em que o primeiro pagamento sem atraso foi efetuado pela autora em fevereiro de 2001, referente à competência de janeiro de 2001, ao passo que as contribuições recolhidas com atraso dizem respeito às competências de julho a outubro de 2001, posteriores, portanto, à primeira contribuição recolhida sem atraso, sem a perda da condição de segurada. 6. Efetiva ofensa à literalidade da norma contida no art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991, na medida em que a sua aplicação ocorreu fora da hipótese que, por intermédio dela, pretendeu o legislador regular. 7. Pedido da ação rescisória procedente. (AR 4.372/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/04/2016, DJe 18/04/2016) TNU - PEDILEF n. 0502048-81.2016.4.05.8100/CE: “A TNU reafirmou a tese no sentido de que, no caso de contribuinte individual, especial e facultativo, as contribuições previdenciárias recolhidas com atraso devem ser consideradas para efeito de carência desde que posteriores à primeira paga sem atraso e que o atraso não importe nova perda da condição de segurado.” (Boletim TNU n. 35 – Sessão de 21.04.2019) Caso não reste atendido o primeiro requisito, ou seja, caso as competências que a parte pretende recolher de forma extemporânea tenham sido alcançadas pela decadência do direito da administração fazendária constituir o crédito tributário (art. 173 do CTN), já não se estará diante de hipótese de recolhimento em atraso de contribuição previdenciária e, sim, de indenização de contribuição previdenciária, instituto jurídico de natureza diversa, que apenas confere direito ao cômputo do período como tempo de contribuição (e não como carência), conforme previsto no art. 45-A da LCPS. De outra banda, caso não preenchido o segundo requisito, ou seja, na hipótese de a parte ter efetuado o recolhimento em atraso das contribuições previdenciárias após ter perdido a qualidade de segurado em virtude de ter permanecido sem efetuar recolhimentos tempestivos por prazo superior ao período de graça (art. 15 da LBPS), os recolhimentos extemporâneos efetuados serão computados apenas como tempo de contribuição, porém, não como carência (Tema Representativo da Controvérsia n. 192 da TNU) Conforme argutamente pontuado no julgamento do PEDILEF n. 2009.71.50.019216-5/RS, no qual foi assentada a tese do Tema n. 192 da TNU, “havendo perda da qualidade de segurado, somente as contribuições ‘realizadas a contar da data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso’ (após a reaquisição da qualidade de segurado) podem ser computadas para efeito de carência, ‘não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores’ (art. 27, II, da Lei n.º 8.213/91)”. Nessa esteira, por imprescindível, transcreve-se a ementa do referido julgado, que analisa com profundidade a questão em foco: PREVIDENCIÁRIO. CARÊNCIA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTO COM ATRASO DAS CONTRIBUIÇÕES POSTERIORES AO PAGAMENTO DA PRIMEIRA CONTRIBUIÇÃO SEM ATRASO. ART. 27, § 2º DA LEI Nº 8.213/91. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DAS CONTRIBUIÇÕES RECOLHIDAS COM ATRASO RELATIVAS AO PERÍODO ENTRE A PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO E A SUA REAQUISIÇÃO PARA EFEITO DE CARÊNCIA. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO. 1. Alega o recorrente que o acórdão proferido pela 2ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul diverge da jurisprudência dominante desta Turma Nacional de Uniformização, pois haveria computado, para fins de carência, contribuições recolhidas com atraso após a perda da qualidade de segurado, enquanto que o acórdão apontado como paradigma somente admitiria a contagem de contribuições recolhidas com atraso, para esse fim, quando não houvesse perda da qualidade de segurado (PEDILEF nº 200772500000920, Rel. Juiz Federal Derivaldo de Figueiredo Bezerra Filho, DJ 09/02/2009). 2. Segundo o acórdão recorrido, “No caso dos autos, para completar a carência para o benefício pretendido, a parte autora requer o reconhecimento de período contributivo, na condição de contribuinte individual, nos lapsos de 06/1981 a 03/1982, 04/1995 a 11/2001, de 01/2002 a 11/2004, 02/2007 e de 04/2007 a 12/2008, sendo que as respectivas contribuições foram recolhidas em 01/2009”. Fundamenta que as contribuições relativas ao período de 1995 a 2008, mesmo tendo sido recolhidas com atraso, poderiam ser computadas porque posteriores às contribuições do período de 01/1980 a 05/1981 e 04 a 05/1982, que foram recolhidas nas épocas próprias. Citou acórdão proferido por esta Turma Nacional em que se admite a contagem de contribuições recolhidas em atraso, para efeito de carência, desde que não haja perda da qualidade de segurado. 3. O acórdão recorrido diverge da jurisprudência desta Turma Nacional, na medida em que, pela leitura do próprio julgado, verifica-se que houve perda da qualidade de segurado (entre 1984 e 2009), não sendo possível o cômputo das contribuições recolhidas com atraso após a desvinculação do segurado do RGPS. Havendo perda da qualidade de segurado, somente as contribuições “realizadas a contar da data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso” (após a reaquisição da qualidade de segurado) podem ser computadas para efeito de carência, “não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores” (art. 27, II, da Lei n.º 8.213/91). 4. O objetivo da norma do art. 27, II da Lei nº 8.213/91 é impedir que o segurado, desvinculado do regime geral da previdência social, volte a contribuir apenas quando já enquadrado em alguma das situações que ensejam o pagamento de benefício, efetuando recolhimento retroativo de contribuições e garantindo assim o pagamento de nada mais que o número mínimo de contribuições. Trata-se de norma complementar à prevista no art. 59, parágrafo único, do mesmo diploma legislativo, relativa aos benefícios por incapacidade. 5. A previdência social é regida pelo princípio da solidariedade, devendo os segurados, para se beneficiarem de suas prestações, se manterem filiados e contribuindo para o regime, não fazendo jus aos seus benefícios aqueles que deixam de contribuir por longo período, vindo a perder a qualidade de segurado, e retornam ao regime apenas quando já enquadrados em alguma das situações que ensejam o recebimento de contraprestações, mediante o pagamento retroativo de contribuições. A exigência do requisito carência e as normas que lhes são correlatas existem para garantir a solidariedade e a sustentabilidade financeira do regime. 6. A qualidade de segurado afirmada no acórdão recorrido, adquirida pela parte em decorrência do pagamento retroativo das contribuições, não se confunde com a exigência de que a parte mantivesse a qualidade de segurado no momento em que efetuou o recolhimento das contribuições com atraso (isto é, antes de realizá-lo), preconizada pela jurisprudência desta Turma Nacional de Uniformização. Do contrário, seria inútil condicionar o cômputo destas contribuições à ausência de perda da qualidade de segurado, já que todo recolhimento, independente da data em que realizado, sempre provocaria a reaquisição da qualidade de segurado. Não é a esta qualidade de segurado, adquirida em virtude do recolhimento extemporâneo, que a jurisprudência da Turma Nacional se refere quando permite a contagem das contribuições recolhidas com atraso para fins de carência. 7. Incidente de uniformização conhecido e provido.” (TNU - PEDILEF n. 2009.71.50.019216-5/RS, Relator: Juiz Federal ANDRÉ CARVALHO MONTEIRO, Data do julgamento: 20/02/2013, Data da publicação: 08/03/2013) Na mesma toada, destaca-se o entendimento da TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO: INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CONTRIBUIÇÕES RECOLHIDAS EM ATRASO. CÔMPUTO PARA EFEITOS DE CARÊNCIA. 1. Após o recolhimento da primeira contribuição tempestiva, as contribuições vertidas em atraso pelo contribuinte individual poderão ser computadas para efeito de carência, desde que o seu recolhimento se dê enquanto mantida a qualidade de segurado relativa àqueles recolhimentos válidos. 2. Indevido o cômputo, para efeitos de carência, das contribuições recolhidas em atraso que se refiram a momento anterior à nova filiação, quando não ostentava, o contribuinte, a qualidade de segurado da Previdência Social. 3. Incidente de Uniformização de Jurisprudência conhecido e desprovido. (TRU 4ª Região – Pedido de Uniformização Regional de Interpretação de Lei n. 5000391-81.2012.4.04.7118, Relator: Juiz Federal João Batista Lazzari, Relator para acórdão: Juiz Federal FERNANDO ZANDONÁ, juntado aos autos em 28/05/2012) e) Pagamento de INDENIZAÇÃO para o cômputo de competências alcançadas pela decadência (art. 173 do CTN e art. 348 do RPS) Conforme prevê o art. 45-A da Lei n. 8.212/1991 (Lei de Custeio da Seguridade Social - LCPS), é possível ao contribuinte individual computar, como tempo de contribuição, competências não recolhidas na época oportuna e alcançadas pela decadência do direito de a administração fazendária constituir o respectivo crédito tributário (art. 173 do CTN e art. 348 do RPS). Nesta senda, transcreve-se a aludida norma da Lei de Custeio da Previdência Social – LCPS: Art. 45-A. O contribuinte individual que pretenda contar como tempo de contribuição, para fins de obtenção de benefício no Regime Geral de Previdência Social ou de contagem recíproca do tempo de contribuição, período de atividade remunerada alcançada pela decadência deverá indenizar o INSS. § 1º O valor da indenização a que se refere o caput deste artigo e o § 1o do art. 55 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, corresponderá a 20% (vinte por cento): I – da média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, reajustados, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994; ou II – da remuneração sobre a qual incidem as contribuições para o regime próprio de previdência social a que estiver filiado o interessado, no caso de indenização para fins da contagem recíproca de que tratam os arts. 94 a 99 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, observados o limite máximo previsto no art. 28 e o disposto em regulamento. § 2º Sobre os valores apurados na forma do § 1º deste artigo incidirão juros moratórios de 0,5% (cinco décimos por cento) ao mês, capitalizados anualmente, limitados ao percentual máximo de 50% (cinquenta por cento), e multa de 10% (dez por cento). § 3º O disposto no § 1º deste artigo não se aplica aos casos de contribuições em atraso não alcançadas pela decadência do direito de a Previdência constituir o respectivo crédito, obedecendo-se, em relação a elas, as disposições aplicadas às empresas em geral. Isso posto, cumpre repisar que não se deve confundir o recolhimento em atraso de contribuição previdenciária com a indenização ao sistema previdenciário devida pelo contribuinte individual que pretenda o reconhecimento, como tempo de contribuição, de competências em que exerceu atividade remunerada e que foram atingidas pela decadência referida no art. 173 do CTN e no art. 348 do RPS, visto que se trata de institutos jurídicos distintos. Nessa esteira, note-se, por exemplo, que o recolhimento de contribuições previdenciárias de competências não atingidas pela decadência (art. 173 do CTN e art. 348 do RPS) apresenta natureza compulsória, ou seja, constitui um dever imposto ao segurado, visto que às citadas contribuições aplica-se o regime tributário (art. 3º do CTN). Já o pagamento da indenização de que trata o art. 45-A da LCPS, por não se revestir de natureza tributária, constitui uma faculdade para o segurado. Feita essa breve digressão, cumpre salientar que para que o INSS autorize o pagamento da indenização prevista no art. 45-A da LCPS é necessário, inicialmente, comprovar o efetivo exercício da atividade laboral nas competências atingidas pela decadência, visto que a prestação do labor constitui pressuposto fático, ou requisito elementar, que deve ser demonstrado pelo beneficiário para que exsurja o direito ao pagamento da compensação. Ademais, por se tratar de meio de inclusão tardia de tempo de contribuição no CNIS, exige-se a apresentação de início de prova material demonstrando o efetivo exercício de atividade remunerada no período alegado, nos termos do art. 55, §3º, da LBPS; art. 19, “caput”, §1º e §2º e art. 19-B, “caput” e §1º, do RPS, e; art. 58, §1º, e art. 61, inciso III e §3º, da IN 77/2015 do INSS. Lado outro, cumpre destacar que, diferentemente do recolhimento em atraso de contribuição previdenciária, em que se exige o pagamento do respectivo tributo acrescido dos consectários moratórios, o valor da indenização ao sistema previdenciário é calculado de forma diversa, sendo apurado a partir da “média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, reajustados, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994” (§2º do art. 45-A da LCPS). Por fim, impende destacar que o pagamento da indenização prevista no art. 45-A da LCPS não confere direito ao cômputo das competências indenizadas para fins de carência (art. 154, III, da IN 77/2015 do INSS). Com efeito, por definição técnica, carência consiste no número mínimo de contribuições previdenciárias necessárias para a obtenção de determinado benefício e a indenização ao sistema previdenciário, como o próprio nome revela, não tem natureza jurídica de contribuição previdenciária, mas sim, de forma de ressarcimento (compensação) pelo não recolhimento de contribuição previdenciária. CASO CONCRETO Compulsando os autos do procedimento administrativo de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/204.078.210-3, requerida em 12/07/2022, constato que houve o indeferimento do benefício, uma vez que computados apenas 33 anos, 05 meses e 12 dias de tempo de contribuição até a DER (págs. 06/07 do ID 347075181). Destaco que houve o reconhecimento administrativo do período especial de 03/08/1987 a 05/03/1997, conforme se verifica das págs. 06/07 do ID 347075181 e pág. 20 do ID 347074566, sendo, portanto, incontroverso. Considerando o que constou dos autos do procedimento administrativo do NB 204.078.210-3, cinge-se a controvérsia posta nos autos ao reconhecimento e cômputo do tempo comum de trabalho quanto ao recolhimento das competências de 01/2004, 03/2004 a 12/2005, 01 a 12/2007 e 02/2009, como contribuinte individual, com a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Alega a parte autora que, no requerimento administrativo efetuado em 12/09/2018, houve o reconhecimento do tempo de contribuição de 33 anos e 24 dias na DER. De fato, a leitura do procedimento administrativo referente ao NB 42/187.492.560-0, requerido em 12/09/2018, indica que o benefício foi indeferido, uma vez que computados apenas 30 anos, 01 mês e 24 dias de tempo de contribuição (págs. 09/11 do ID 347074570). O autor interpôs recurso administrativo e o feito foi baixado em diligência para que o segurado comprovasse a atividade nos anos de 2004, 2005 e 2007, juntando documentos (pág. 17 do ID 347075156). Diante dos documentos juntados pelo autor, a autarquia constatou o atendimento da diligência (pág. 18 do ID 347075158) e foi efetuada nova contagem de tempo de contribuição, restando apurados 33 anos e 24 dias até a DER, em 12/09/2018 (págs. 16/17 do ID 347075158). Considerando que o período de 06/03/1997 a 13/02/2002 não foi reconhecido como especial, foi negado provimento ao recurso do autor e não concedido o benefício (págs. 21/22 do ID 347075158). Não obstante o reconhecimento do tempo de contribuição de 33 anos e 24 dias até a DER, em 12/09/2018, nos autos do procedimento administrativo do NB 42/187.492.560-0, a autarquia previdenciária pode rever seus atos, nos termos do que prevê artigo 103-A da Lei 8.213/1991. Por ocasião do requerimento administrativo formulado em 12/07/2022, acerca dos recolhimentos das competências de 01/2004, 03/2004 a 12/2005, 01 a 12/2007 e 02/2009, constatou o INSS o seguinte (pág. 26 do ID 347075181): “Todas as contribuições regulares como Contribuinte Individual constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS foram consideradas, e somadas ao Tempo de Contribuição, exceto as contribuições de alguns períodos que não puderam ser consideradas por não atendimento de requisitos previstos na legislação: o recolhimento da competência 02/2009 foi realizado em atraso, sem a comprovação da atividade, nos termos do §12, art. 216 do Decreto nº 3.048/99; e o recolhimento das competências 01/2004, 03/2004 a 12/2005, 01 a 12/2007 foram realizados através de GFIPs extemporâneas, cujos documentos anexados no NB anterior que serviram de base para esta análise com o objetivo de comprovação da remuneração auferida (Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física, anos -Base 2004, 2005 e 2007), os Rendimentos tributáveis declarados estão abaixo dos salários e contribuições constantes no CNIS não sendo passível de comprovação das respectivas remunerações com marcas de extemporaneidade nos termos do §3º, art. 29-A da Lei nº 8.213/91. Não há qualquer indício de contribuições como Facultativo, em documentos ou no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.” Embora não tenham sido carreadas aos autos as GFIPs e os respectivos comprovantes de pagamento de todas a competências não reconhecidas pelo INSS, verifica-se que a autarquia previdenciária não alegou que tais competências não foram solvidas pelo demandante, razão pela qual o pagamento, ainda que a destempo, das aludidas contribuições previdenciárias considera-se fato incontroverso. Nessa esteira, verifica-se que o óbice erigido pela administração previdenciária para o não reconhecimento da competência de 02/2009 é a ausência de comprovação do efetivo exercício da atividade alegada pelo segurado. Quanto às demais competências não reconhecidas, alega a autarquia que os rendimentos tributáveis informados nas Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física estão abaixo dos salários de contribuição constantes do CNIS. Destaco que as datas de envio das GFIPs, os valores das remunerações e os valores retidos constam do documento das págs. 22/24 do ID 347075166. Passo a analisar os períodos controvertidos: Competência de 02/2009 Consta das págs. 03/05 do ID 347075166 que o autor efetuou a complementação da contribuição em 04/07/2022, com código de pagamento nº 1201. De fato, conforme se verifica da contagem efetuada no requerimento administrativo anterior (págs. 16/17 do ID 347075158), a competência de 02/2009 não havia sido computada como tempo de contribuição, uma vez que estava abaixo do salário mínimo (pág. 16 do ID 347075166). Cumpre ressaltar que o INSS não impugna o valor do pagamento efetuado a título de complementação. Não consta do procedimento administrativo do NB 204.078.210-3 qualquer documento que comprove o exercício da atividade remunerada na referida competência. No entanto, a pág. 02 do ID 347074561 (procedimento administrativo do NB 42/187.492.560-0) indica que, na competência de 02/2009, o autor atuava na função de “Diretor” da empresa MTM Comércio de Gás LTDA ME, CNPJ 02.418.451/0001-79, da qual era sócio. O documento apresentado indica o pró-labore e o salário de contribuição, com a indicação de desconto da contribuição previdenciária. Além disso, consta das págs. 01/06 do ID 347074563, cópia da Declaração de Ajuste Anual de Imposto de Renda do exercício de 2010, ano-calendário 2009, indicando que o autor era sócio da empresa MTM COMERCIO DE GÁS LTDA ME. A consulta ao CNIS da parte autora não demonstra indicação de qualquer pendência na referida competência. Assim, diante da complementação da contribuição efetuada, a competência 02/2009 deve ser computada para todos os efeitos (carência e tempo de contribuição). Competências 01/2004 e de 03/2004 a 12/2004 A consulta ao CNIS da parte autora demonstra que há o seguinte indicativo de pendência nas referidas competências: “IREM-INDPEND”, o que denota remuneração com indicadores/pendências. Consta do CNIS das competências de 01/2004, de 03/2004 e de 04/2004, a remuneração de R$ 240,00, com o valor retido de R$ 26,40, Nas competências de 05/2004 a 12/2004, consta a remuneração de R$ 260,00, com o valor retido de R$ 28,60. As remunerações foram informadas fora do prazo, portanto, deve ser comprovadas. A Folha de Pagamento da empresa MTM COMERCIO DE GÁS LTDA ME, referente aos meses de janeiro, março e abril de 2004 (págs. 17/21 do ID 347075170 - NB 204.078.210-3) demonstra o recebimento de pró-labore pelo autor, na importância de R$ 240,00, com o valor retido à título de contribuição previdenciária de R$ 26,40. Nas competências de 05/2004 a 12/2004, os documentos das págs. 22/32 do ID 347075170 e págs. 01/07 do ID 347075174 denotam o recebimento de pró-labore no montante de R$ 260,00, com valor retido de R$ 28,60 em cada mês. Os valores indicados nas folhas de pagamento são exatamente os valores que constam do CNIS. Não consta dos procedimentos administrativos do NB 187.492.560-0 ou do NB 204.078.210-3, cópia da Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda Pessoa Física do exercício de 2004, ano-calendário 2005. Nos termos do artigo 38 da Instrução Normativa nº 77, de 21 de janeiro de 2015 e, nos termos do artigo 95 da Instrução Normativa PRES/INSS nº 128, de 28 de março de 2022, os documentos apresentados pelo autor podem ser aceitos como comprovação da remuneração do contribuinte individual. Assim, não verifico a incompatibilidade alegada pela autarquia, sendo possível o cômputo das competências de 01/2004 e de 03/2004 a 12/2004 para todos os efeitos. Competências de 01/2005 a 12/2005 A consulta ao CNIS das referidas competências demonstra que há o indicativo de pendência: “IREM-INDPEND”, o que denota remuneração com indicadores/pendências. Consta do CNIS da competência de 01/2005, a remuneração de R$ 260,00, com o valor retido de R$ 28,60 e, das competências de 02/2005 a 12/2005, a remuneração de R$ 415,00, com o valor retido de R$ 45,65. As remunerações foram informadas fora do prazo, portanto, deve ser comprovadas. A folha de pagamento do mês de janeiro de 2005 traz exatamente o mesmo valor que consta do CNIS (págs. 08/10 do ID 347075174). No entanto, as folhas de pagamento dos meses de fevereiro, março e abril de 2005 trazem o valor de remuneração de R$ 260,00, com o valor retido de R$ 28,60 (págs. 11/19 do ID 347075174), valores inferiores ao que consta do CNIS. Da mesma forma, quanto às competências de maio a dezembro de 2005, as folhas de pagamento do autor indicam pró-labore de R$ 300,00, com valor de retido de contribuição previdenciária de R$ 33,00 (págs. 20/32 do ID 347075174 e págs. 01/07 do ID 347075178), tais valores também são inferiores do que consta do CNIS. Não consta dos procedimentos administrativos do NB 187.492.560-0 ou do NB 204.078.210-3, cópia da Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda Pessoa Física do exercício de 2005, ano-calendário 2006. Dessa forma, considerando que apenas o demonstrativo da competência de janeiro de 2005 espelha exatamente o valor constante do CNIS, apenas essa competência pode ser computada como tempo de contribuição e carência. Competências de 01 a 12/2007 A consulta ao CNIS das referidas competências demonstra que há o indicativo de pendência: “IREM-INDPEND”, o que denota remuneração com indicadores/pendências. Consta do CNIS o seguinte: a) da competência de 01/2007, a remuneração de R$ 350,00, com o valor retido de R$ 38,50; b) da competência 02/2007, a remuneração de R$ 623,37, com o valor retido de R$ 68,57; c) da competência 03/2007, a remuneração de R$ 350,00, com o valor retido de R$ 38,50; e d) das competências 04/2007 a 12/2007, a remuneração de R$ 380,00, com valor retido de R$ 41,80. As folhas de pagamento dos meses de janeiro a dezembro de 2007 refletem os valores que constam do CNIS (págs. 08/26 do ID 347075178). A cópia da Declaração de Ajuste Anual do exercício de 2007, ano-calendário 2008 indica os rendimentos tributáveis declarados abaixo dos salários de contribuições constantes no CNIS (págs. 16/19 do ID 347074561). No entanto, considerando o constante das folhas de pagamento juntadas ao procedimento administrativo e nos termos do artigo 38 da Instrução Normativa nº 77, de 21 de janeiro de 2015 e, nos termos do artigo 95 da Instrução Normativa PRES/INSS nº 128, de 28 de março de 2022, os documentos apresentados pelo autor podem ser aceitos como comprovação da remuneração do contribuinte individual. Assim, é possível o cômputo das competências de 01/2007 a 12/2007 para todos os efeitos. Somando os períodos de trabalho comuns do autor, com o período especial incontroverso de 03/08/1987 a 05/03/1997, convertido para comum, aos períodos de recolhimento como contribuinte individual (computando-se as competências de 01/2004, de 03/2004 a 12/2004, de 01/2005, de 01/2007 a 12/2007 e de 02/2009), o autor não alcança na DER 12/07/2022 os requisitos necessários para concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Diante do pedido subsidiário de reafirmação da DER, em 20/05/2024, o autor alcança os requisitos necessários para concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com as regras do artigo 17 da Emenda Constitucional 103/2019, pois alcança tempo comum superior a 33 anos até 13/11/2019, cumpre o requisito de tempo com pedágio superior a 35 anos, 10 meses e 2 dias e, atinge carência superior a 180 contribuições. Assim, é procedente o pedido subsidiário de reafirmação da DER. Assevero que os efeitos financeiros deverão se dar a partir da data da citação, considerando que nesse momento houve a ciência do réu acerca da pretensão de reafirmação. Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos formulados, com resolução do mérito, a teor do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para determinar ao INSS a averbação e cômputo dos recolhimentos como contribuinte individual nas competências de 01/2004, de 03/2004 a 12/2004, de 01/2005, de 01/2007 a 12/2007 e de 02/2009, bem como condenar o INSS a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/204.078.210-3, em favor da parte autora, desde a DER reafirmada para 20/05/2024, com efeitos financeiros a partir da data da citação, consoante fundamentação supra. Insta salientar que o autor faz jus aos atrasados, desde a data da citação. Não há parcelas prescritas. As verbas vencidas e não adimplidas administrativamente serão pagas corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora desde a citação, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução do CJF em vigor na data da liquidação. Diante da sucumbência mínima do autor, condeno o réu ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do montante das prestações vencidas até a data da sentença, corrigidas monetariamente, a teor do art. 85, caput e §§ 2º e 3º, I, todos do Código de Processo Civil e Súmula nº 111 do E. STJ. Custas na forma da lei. Sentença não sujeita à remessa necessária, pois, em que pese a iliquidez da sentença, o valor atribuído à causa está muito aquém do limite estabelecido no artigo 496, § 3º, I, do CPC. Tendo em vista que a condenação do INSS consiste em obrigação de fazer, o tópico síntese do julgado segue preenchido, em anexo, para processamento e cumprimento via PrevJud, conforme Resolução CNJ nº 595, de 21 de novembro de 2024. Publique-se. Intimem-se. Santo André, data do sistema.

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